Projecto Campanhas PSD CDS

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1 PROJETO DE LEI N.º 530/XII LEI QUE DEFINE OS PRINCÍPIOS QUE REGEM A COBERTURA JORNALÍSTICA DAS ELEIÇÕES E REFERENDOS NACIONAIS Exposição de motivos 1) A democracia representativa requer eleições plurais e competitivas. No período da campanha eleitoral, torna-se particularmente importante o papel dos meios de comunicação social enquanto mediadores de informação, dado que, na maioria das vezes, é através deles que os cidadãos conhecem as propostas dos candidatos e formam as suas convicções. Mas tal como não existem direitos absolutos e que prevaleçam absoluta e incondicionalmente sobre outros, o princípio constitucional da igualdade de tratamento das candidaturas deve ser harmonizado com a liberdade editorial dos jornalistas e dos órgãos de comunicação social. Reclama-se uma ponderação entre realidades de igual dignidade constitucional, uma vez que ambos beneficiam do regime de proteção dos direitos, liberdades e garantias, nos termos do artigo 18.º da Constituição da República Portuguesa (CRP).

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    PROJETO DE LEI N. 530/XII

    LEI QUE DEFINE OS PRINCPIOS QUE REGEM A COBERTURA JORNALSTICA DAS ELEIES E

    REFERENDOS NACIONAIS

    Exposio de motivos

    1) A democracia representativa requer eleies plurais e competitivas. No

    perodo da campanha eleitoral, torna-se particularmente importante o papel

    dos meios de comunicao social enquanto mediadores de informao, dado

    que, na maioria das vezes, atravs deles que os cidados conhecem as

    propostas dos candidatos e formam as suas convices. Mas tal como no

    existem direitos absolutos e que prevaleam absoluta e incondicionalmente

    sobre outros, o princpio constitucional da igualdade de tratamento das

    candidaturas deve ser harmonizado com a liberdade editorial dos jornalistas e

    dos rgos de comunicao social. Reclama-se uma ponderao entre

    realidades de igual dignidade constitucional, uma vez que ambos beneficiam

    do regime de proteo dos direitos, liberdades e garantias, nos termos do

    artigo 18. da Constituio da Repblica Portuguesa (CRP).

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    Contudo, o progressivo dfice de adaptao realidade jornalstica dos

    distintos regimes que regulam as campanhas eleitorais e a contradio

    crescente entre estes conduziram a uma lgica de inexequibilidade das regras

    existentes, o que se tornou patente na campanha eleitoral para a eleio dos

    titulares dos rgos das autarquias locais de 2013.

    A omisso de cobertura jornalstica por parte de muitos rgos de

    comunicao social que ento se verificou prejudicou o esclarecimento dos

    eleitores e retirou dimenso social a esse ato que deveria coroar plenamente

    a democracia.

    Muitas foram as exortaes provenientes da sociedade civil e de titulares de

    rgos de soberania, nomeadamente o Senhor Presidente da Repblica, para

    que se criassem condies que permitissem superar a situao.

    O poder legislativo no poderia ficar indiferente a este impasse democrtico.

    Por um lado, est em causa o princpio da igualdade de oportunidades e de

    tratamento das diversas candidaturas, previsto no artigo 113., nmero 3,

    alnea a) da CRP, que constitui uma concretizao, em sede de direito

    eleitoral, do princpio geral da igualdade (artigo 13.). Por outro, releva a

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    liberdade de informao e de imprensa, constituindo a garantia dos direitos

    dos jornalistas uma dimenso concretizadora do direito liberdade de

    imprensa. O artigo 38. da CRP eleva os direitos dos jornalistas dignidade de

    direito formalmente constitucional e isso reveste a maior importncia,

    imunizando-os contra qualquer tipo de funcionalizao do seu exerccio.

    Um dos fatores que mais tem contribudo para o conflito potencial entre os

    princpios da liberdade editorial e o da igualdade de oportunidades e de

    tratamento das diversas candidaturas resulta da equiparao integral entre os

    perodos de pr-campanha e de campanha eleitoral que tem sido feito por

    alguma jurisprudncia e doutrina. Urge separar legislativamente os dois

    perodos que so substancialmente distintos, permitindo que ambos se

    complementem com evidentes vantagens para o processo democrtico.

    Conforme resulta da interpretao conjugada dos artigos 37. e 38. da CRP,

    esta protege especificamente a atividade dos meios de comunicao social

    como veculos da liberdade de expresso e de informao. Neste contexto,

    note-se que uma das dimenses fundamentais da liberdade de radiodifuso

    consiste precisamente na liberdade de conformao da programao, sendo

    esta definida de acordo com as ideias de criatividade e de trabalho editorial

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    ou redatorial 1; Por isso, a liberdade de programao deve ser entendida

    como direito negativo, de defesa contra o Estado e atravs dele, justificando-

    se uma forte suspeita de inconstitucionalidade sobre todas as interferncias

    do Estado, diretas ou indiretas, na definio de contedos conformados pela

    liberdade editorial e protegidos pelos direitos constitucionais dos jornalistas.

    No ano em que se comemoram 40 anos da revoluo do 25 de abril, cumpre-

    nos constatar que a questo do tratamento jornalstico das campanhas

    eleitorais tem sido contaminada por uma turbulncia conceptual em sede

    legislativa entre realidades potencialmente antagnicas:

    jornalismo/informao e propaganda eleitoral. Alis, mesmo possvel

    sustentar que, em princpio, no plano constitucional, aquilo que torna estes

    dois conceitos especialmente valiosos em especfico ambiente eleitoral

    reclama, precisamente a sua autonomia recproca. Acresce a este quadro a

    confuso legislativa e jurisprudencial sobre esta matria que perturba a

    proteo da confiana a que o Estado deve especial ateno.

    O problema adquire expresso plena no Decreto-lei n. 85-D/75 (lei especial

    destinada a regular a campanha eleitoral para a Assembleia Constituinte).

    1 Jnatas Machado, (2002), Liberdade de Expresso: Dimenses Constitucionais da Esfera

    Pblica no Sistema Social, Coimbra Editora: Coimbra; p. 632.

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    Alguma doutrina constitucional tem inclusivamente sustentado que este

    Decreto-Lei padece de inconstitucionalidade superveniente, por fora da

    entrada em vigor da Constituio de 1976, no resistindo a uma anlise de

    conformidade material com o novo ordenamento jurdico-constitucional,

    conforme determina o artigo 290., n. 2, da CRP, e que deveria considerar-se

    duplamente caducado pela feio provisria que revestia e pela

    contrariedade aos princpios constitucionais 2 . No abona a favor da

    idoneidade daquele regime conter restries e imposies pensadas na

    dcada de setenta do sculo XX para a imprensa estatizada, quando agora so

    dirigidas generalidade dos rgos de comunicao social privados, num

    contexto meditico totalmente modificado, e sem que seja tida em conta a

    correspondente mutao do domnio da realidade regulado pela norma3.

    Outro fator que tem contribudo largamente para a insegurana jurdica o

    aparente conflito positivo de competncias entre a Comisso Nacional de

    Eleies (CNE) e a Entidade Reguladora para a Comunicao Social (ERC).

    2

    No mesmo sentido - ALEXANDRINO, Jos de Melo (2010), Anotao ao Artigo 37.,

    Constituio Portuguesa Anotada, Tomo I, 2. Edio, MIRANDA/Jorge/MEDEIROS, Rui, p. 855. 3 ALEXANDRINO, Jos de Melo (2013), O mbito constitucionalmente protegido da Liberdade

    de Expresso, Verso desenvolvida da Interveno na I Curso de Ps Graduao de Direito da

    Comunicao da FDL (a aguardar publicao).

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    A CNE competente em todas as matrias atinentes propaganda eleitoral

    (como alis decorre do artigo 5., nmero 1, alnea e) da Lei da CNE n.

    71/78, de 27 de dezembro). Este preceito legal atribui competncia CNE

    para assegurar a igualdade de oportunidades de ao e propaganda das

    candidaturas durante as campanhas eleitorais, um direito das candidaturas de

    exercerem todas as atividades que visem direta ou indiretamente a sua

    promoo.

    Compete expressamente ERC, pessoa coletiva de direito pblico, com

    natureza de entidade administrativa independente (artigo 1. da Lei n.

    53/3005 e artigo 1. dos Estatutos) a atribuio de assegurar nos meios de

    comunicao social o direito informao e a liberdade de imprensa, nos

    termos do artigo 39., nmero 1, alnea a) da CRP e a possibilidade de

    expresso e confronto das diversas correntes de opinio, nos termos da alnea

    f) do mesmo preceito constitucional.

    Um comando que foi concretizado pelo legislador na Lei reforada que

    aprovou os Estatutos da ERC4 em 2005 e que atribuiu ao regulador dos media

    competncias e atribuies de vasto alcance em matria de pluralismo e rigor

    informativo (artigos 7., alnea a) e 8., alnea e) dos Estatutos), no mbito

    4 Estatutos da ERC: Lei n. 53/2005 de 8 de Novembro publicado no Dirio da Repblica, I

    Srie - A, n. 214 de 8 de Novembro de 2005.

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    dos seus poderes de regulao e de superviso de todas as entidades que, sob

    jurisdio do Estado Portugus, prossigam atividades de comunicao social

    em Portugal (artigo 6. dos Estatutos).

    So atribuies da ERC garantir a efetiva expresso e o confronto das diversas

    correntes de opinio, em respeito pelo princpio do pluralismo e pela linha

    editorial de cada rgo de comunicao social (artigo 8., alneas d) e e) dos

    Estatutos). Constitui ainda objetivo da regulao do sector da comunicao

    social, entre outros, promover e assegurar o pluralismo cultural e a

    diversidade de expresso das vrias correntes de pensamento (alnea a) do

    artigo 7. dos Estatutos.

    Importante reforar a diviso de competncias, em conformidade com um

    critrio material constitucionalmente exigido.

    2) As leis eleitorais e do referendo estabelecem uma proibio de utilizao

    de meios de publicidade comercial para efeitos de propaganda poltica, a

    partir da publicao do decreto que marque a data da eleio.

    Uma vez que o legislador no indica quais os meios de publicidade comercial

    proibidos, tem cabido s candidaturas, CNE e aos tribunais interpretar as

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    disposies legais, procurando um equilbrio entre a propaganda eleitoral

    permitida e proibida.

    Acresce que tanto o Decreto-Lei n. 85-D/75, de 26 de fevereiro (Tratamento

    Jornalstico s Diversas Candidaturas) como a Lei Eleitoral para os rgos das

    Autarquias Locais (LEOAL) preveem uma exceo proibio de utilizao de

    meios de publicidade comercial para efeitos de propaganda poltica (a norma

    idntica):

    Durante o perodo da campanha, as publicaes no podero inserir qualquer

    espcie de publicidade redigida relativa propaganda eleitoral. Apenas sero

    permitidos, como publicidade, os anncios, que perfeitamente se

    identifiquem como tal, de quaisquer realizaes, no podendo cada um

    desses anncios ultrapassar, nas publicaes dirias de grande formato e nas

    no dirias que se editem em Lisboa e no Porto, de expanso nacional, e

    tambm de grande formato, um oitavo de pgina, e nas restantes

    publicaes, um quarto de pgina (artigo 10. do DL 85-D/75). Note-se que a

    norma da LEOAL aplica-se a todo o perodo eleitoral e no apenas campanha

    eleitoral.

    A CNE tem aplicado esta exceo, com as necessrias adaptaes, a todos os

    meios de comunicao onde possa ser inserida publicidade. Recentemente, no

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    mbito das ltimas eleies autrquicas, foi confrontada, com a insero de

    publicidade em redes sociais, com especial destaque para o Facebook.

    A CNE aprovou, por unanimidade dos Membros presentes, em 14 de janeiro de

    2014, a Informao n. 242/GJ/2013, na qual se consolida a sua posio em

    matria de propaganda poltico eleitoral atravs dos meios de publicidade

    comercial. Clarificar legislativamente esta matria constitui, tambm, um dos

    propsitos da presente lei.

    Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicveis, os Deputados do

    PSD e do CDS-PP abaixo assinados, apresentam o seguinte projeto de lei:

    Artigo 1.

    Objeto

    A presente lei define os princpios que regem a cobertura jornalstica das

    eleies para Presidente da Repblica, Assembleia da Repblica, Parlamento

    Europeu e titulares dos rgos das autarquias locais, bem como dos

    referendos nacionais.

    Artigo 2

    mbito de aplicao

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    1. A presente lei aplica-se a todos os rgos de comunicao social que

    esto sujeitos jurisdio do Estado Portugus, independentemente do

    meio de difuso e da plataforma utilizada.

    2. Os atos de propaganda dos candidatos ou partidos, incluindo os tempos

    de antena, so da sua iniciativa e inteira responsabilidade, no sendo

    confundveis com o trabalho editorial.

    Artigo 3

    Princpios e regras jornalsticas

    1. O tratamento editorial das vrias candidaturas deve respeitar os direitos e

    os deveres consagrados na legislao que regula a atividade dos jornalistas

    e dos rgos de comunicao social, bem como os respetivos estatutos e

    cdigos de conduta.

    2. O direito informao deve ser salvaguardado, com respeito dos princpios

    de liberdade, independncia e imparcialidade dos rgos de comunicao

    social e dos jornalistas face a todas as candidaturas.

    3. Os jornalistas devem exercer a atividade com respeito pela tica

    profissional, informando com rigor e iseno, e respeitando a orientao e

    os objetivos definidos no estatuto editorial do rgo de comunicao social

    para que trabalhem.

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    4. Consideram-se atividades jornalsticas, para efeitos da presente lei, todas

    as notcias, reportagens, bem como entrevistas ou debates ou outro gnero

    jornalstico, sob orientao editorial.

    Artigo 4

    Tratamento jornalstico das candidaturas

    1. Sem prejuzo do disposto no nmero seguinte, no perodo de pr-campanha

    eleitoral, considerando-se como tal o perodo compreendido entre a data

    da publicao do decreto que marque a data do ato eleitoral ou do

    referendo e a data de incio da respetiva campanha eleitoral, vigora o

    princpio da liberdade editorial e de programao dos rgos de

    comunicao social.

    2. No perodo de pr-campanha eleitoral deve ser garantida no tratamento

    jornalstico ou na realizao de entrevistas e debates a participao em

    igualdade de circunstncias das foras polticas com representao

    parlamentar.

    3. No perodo de campanha eleitoral vigora o princpio da igualdade de

    oportunidades e de tratamento das diversas candidaturas.

    Artigo 5

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    Competncias da ERC

    Sem prejuzo das competncias atribudas a outros rgos, cabe ERC

    Entidade Reguladora para a Comunicao Social, acompanhar e garantir o

    cumprimento do disposto no presente diploma especificamente no que ao

    tratamento jornalstico das candidaturas diz respeito.

    Artigo 6.

    Anncios publicitrios

    1. A partir da data da publicao do decreto que marque a data do ato

    eleitoral ou do referendo, apenas sero permitidos os anncios

    publicitrios, como tal identificados, em publicaes peridicas, desde que

    no ultrapassem um quarto de pgina e se limitem a utilizar a

    denominao, smbolo e sigla do partido, coligao ou grupo de cidados e

    as informaes referentes realizao anunciada.

    2. A partir da data da publicao do decreto que marque a data do ato

    eleitoral ou do referendo continua a ser assegurada a plena liberdade de

    utilizao das redes sociais e demais meios de expresso atravs da

    Internet, sendo a aquisio de anncios nesses meios de comunicao e

    participao pblica admissvel em termos homlogos aos previstos no

    nmero anterior, com as devidas adaptaes.

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    3. Nos vinte dias posteriores marcao do dia de realizao do ato

    eleitoral, os partidos polticos e demais entidades concorrentes ao mesmo

    devem notificar, por via eletrnica, a Comisso Nacional de Eleies sobre

    os servios de publicidade comercial que pretendem utilizar.

    Artigo 7.

    Norma revogatria

    1. revogado o Decreto-Lei n. 85-D/75, de 26 de fevereiro.

    2. So ainda revogados:

    a) O artigo 54. do Decreto-Lei n. 319-A/76, de 3 de maio;

    b) O artigo 64. da Lei n. 14/79, de 16 de maio;

    c) O artigo 49. da Lei Orgnica n. 1/2001, de 14 de

    agosto.

    Palcio de S. Bento, 7 de maro de 2014

    Os Deputados do PSD e do CDS-PP,

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    Lus Montenegro

    Nuno Magalhes

    Carlos Abreu Amorim

    Telmo Correia