Projeto de Reforma Trabalhista – Negociado sobre o legislado · Com tais garantias, vê-se que é...

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REVISTA LINHA DIRETA Anna Gilda Dianin Advogada especialista em Direito Educacional e Direito Sindical. Presidente do Sinepe/Sudeste/MG TEXTURA JURÍDICA Projeto de Reforma Trabalhista – Negociado sobre o legislado D ecididamente, a negociação coletiva é instrumento da maior relevância para a fixa- ção e regulamentação das condições de trabalho. As Convenções Coletivas de Trabalho que dela resultam são – ou deveriam ser – mais dinâmi- cas e flexíveis que a lei, por responde- rem melhor aos interesses específicos dos trabalhadores e empresários envol- vidos em cada processo negocial. Daí por que o debate em curso no Con- gresso Nacional, no âmbito do Projeto de Lei (PL) n. 6.787/2016 – Reforma Trabalhista (de iniciativa do Executivo Federal), é de fundamental importân- cia. Dentre outras mudanças igual- mente significativas, contempla a que confere prevalência ao negociado sobre o legislado, nas hipóteses que menciona. Assim, nos termos do PL, acrescenta-se à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) o art. 611-A, com a seguinte redação: “A convenção ou o acordo coletivo de trabalho tem força de lei quando dis- puser sobre: I. parcelamento de período de férias anuais em até três vezes, com pa- gamento proporcional às parcelas, de maneira que uma das frações necessariamente corresponda a, no mínimo, duas semanas ininterrup- tas de trabalho; II. pacto quanto à de cumprimento da jornada de trabalho, limitada a duzentas e vinte horas mensais; III. participação nos lucros e resul- tados da empresa, de forma a in- cluir seu parcelamento no limite dos prazos do balanço patrimo- nial e/ou dos balancetes legalmen- te exigidos, não inferiores a duas parcelas; IV. horas in itinere; V. intervalo intrajornada, respeita- do o limite mínimo de trinta mi- nutos; VI. ultratividade da norma ou do instrumento coletivo de trabalho da categoria;

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Anna Gilda DianinAdvogada especialista em Direito Educacional e Direito Sindical. Presidente do Sinepe/Sudeste/MG

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Projeto de Reforma Trabalhista – Negociado sobre o legislado

Decididamente, a negociação coletiva é instrumento da maior relevância para a fixa-ção e regulamentação das

condições de trabalho. As Convenções Coletivas de Trabalho que dela resultam são – ou deveriam ser – mais dinâmi-cas e flexíveis que a lei, por responde-rem melhor aos interesses específicos dos trabalhadores e empresários envol-vidos em cada processo negocial.

Daí por que o debate em curso no Con-gresso Nacional, no âmbito do Projeto de Lei (PL) n. 6.787/2016 – Reforma Trabalhista (de iniciativa do Executivo Federal), é de fundamental importân-cia. Dentre outras mudanças igual-mente significativas, contempla a que confere prevalência ao negociado sobre o legislado, nas hipóteses que menciona. Assim, nos termos do PL, acrescenta-se à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) o art. 611-A, com a seguinte redação:

“A convenção ou o acordo coletivo de trabalho tem força de lei quando dis-puser sobre:

I. parcelamento de período de férias anuais em até três vezes, com pa -gamento proporcional às parcelas, de maneira que uma das frações necessariamente corresponda a, no mínimo, duas semanas ininterrup-tas de trabalho;

II. pacto quanto à de cumprimento da jornada de trabalho, limitada a duzentas e vinte horas mensais;

III. participação nos lucros e resul-tados da empresa, de forma a in-cluir seu parcelamento no limite dos prazos do balanço patrimo -nial e/ou dos balancetes legalmen- te exigidos, não inferiores a duas par celas;

IV. horas in itinere;

V. intervalo intrajornada, respeita- do o limite mínimo de trinta mi-nutos;

VI. ultratividade da norma ou do instrumento coletivo de trabalho da categoria;

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VII. adesão ao Programa de Seguro--Emprego (PSE), de que trata a Lei n. 13.189, de 19 de novembro de 2015;

VIII. plano de cargos e salários;

IX. regulamento empresarial;

X. banco de horas, garantida a con-versão da hora que exceder a jornada normal de trabalho com acréscimo de, no mínimo, cinquenta por cento;

XI. trabalho remoto;

XII. remuneração por produtividade, incluídas as gorjetas percebidas pelo empregado; e

XIII. registro de jornada de trabalho.”

O tema – mesmo circunscrito aos itens acima, além de polêmico, não é novo, já que no final do governo Fernando Henrique Cardoso se tentou, sem sucesso, promover a mudança. Outros projetos posteriores também não tive-ram êxito. Porém, no momento em que o Brasil contabiliza 13 milhões de desempregados, há um forte apelo a empurrar a reforma trabalhista.

Conquanto a Constituição Federal re -conheça as convenções e acordos co -letivos como direito dos trabalhado-res urbanos e rurais (art. 7º, XXVI), o fato é que historicamente domina na doutrina e jurisprudência trabalhista o conceito de adoção da norma mais favorável ao trabalhador.

A substituição desse modelo pelo que consta no PL n. 6.787/2016, longe de debilitar os direitos trabalhistas, como querem fazer seus representantes, implicará maior responsabilidade dos sindicatos de empresas e trabalhado-res convenentes, à vista desse pode-roso estímulo à negociação.

Atente-se que, para além de a preva-lência do negociado sobre o legislado ser restrita aos assuntos descritos no art. 611-A, do PL, há expressa disposi-ção, no § 2º, de que é vedada a altera-ção por meio de acordo ou convenção de norma de segurança e medicina do trabalho, as quais são disciplinadas nas Normas Regulamentadoras do Minis-tério do Trabalho ou em legislação que disponha sobre direito de terceiro.

Impõe ainda, o PL, que as hipóteses de flexibilização de norma legal rela-tiva a salário e jornada de trabalho e a convenção ou acordo coletivo de tra-balho deverão explicitar a vantagem compensatória concedida em relação a cada cláusula redutora de direito legal-mente assegurado (§ 3º do PL).

Com tais garantias, vê-se que é vazio o discurso de precarização das normas trabalhistas, por meio do PL denomi-nado Reforma Trabalhista. Importa aos empregadores agir para que o Projeto seja aprovado e convertido em lei.

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