Projeto selecao mestrado - DFE UEM · jesuítas e colonos. Um dos motivos deste conflito era o modo...
-
Upload
hoangkhanh -
Category
Documents
-
view
215 -
download
0
Transcript of Projeto selecao mestrado - DFE UEM · jesuítas e colonos. Um dos motivos deste conflito era o modo...
1. Introdução
O presente trabalho parte de um recorte definido momentaneamente, sendo este o
processo que envolveu o estabelecimento de um colégio jesuítico na comarca de
Paranaguá. No entanto, se faz necessária uma ampliação de nossos horizontes nesta
breve introdução do tema em questão. Para tanto, partiremos do princípio da inserção
do nosso objeto, o colégio de Paranaguá, em um contexto muito mais amplo: a
fundação dos primeiros colégios jesuíticos, e uma breve retomada do papel histórico da
Companhia de Jesus e seus missionários na empreitada de colonizar a possessão
além-mar de Portugal na América.
A escolha deste tema deveu-se ao fato de que pretendemos dar continuidade a uma
linha de pesquisa já iniciada desde a graduação. Em nosso primeiro projeto, de
iniciação científica, estudamos também a presença jesuítica no Brasil - colônia, mais
especificamente, o teatro de José de Anchieta.1 Foram analisadas duas peças de
Anchieta, e estas foram comparadas com outras duas obras do teatrólogo português Gil
Vicente. Estamos atualmente dando continuidade ao mesmo tema no curso de
especialização em Pesquisa Educacional, onde nos propusemos a analisar todas as
peças do teatro anchietano e compará-las com mais obras de Gil Vicente. Acreditamos
ser de extrema importância e relevância para qualquer pesquisador seguir uma linha de
pesquisa, e por esta razão pretendemos continuar estudando o mesmo tema na
presente proposta de pesquisa.
No momento em que o Brasil começou a ser colonizado, a Igreja católica tinha por
objetivo deter o avanço protestante e a propagação da doutrina reformista, introduzida
por Lutero na primeira metade do século XVI. Tal movimento ficou conhecido pela
história como Contra Reforma Católica, que encontrou na Europa fortes aliados para tal
empreitada: o tribunal da Santa Inquisição e a recém fundada Companhia de Jesus. A
Companhia de Jesus foi uma ordem fundada por Inácio de Loyola, ex-cavaleiro
medieval, no ano de 1540, e era caracterizada por uma rígida disciplina, além de
1 Este projeto de iniciação científica recebeu o seguinte título: A filosofia educacional dos jesuítas no teatro anchietano.
4
possuir um voto a mais que todas as outras ordens: o quarto voto de obediência
máxima ao papa, de extrema importância no contexto da já mencionada Contra
Reforma Católica. Em um primeiro momento o apostolado educacional não fazia parte
dos planos de Inácio e seus companheiros. Todos os companheiros eram formados
pela Universidade de Paris, cidade onde conheceram Inácio, quando este freqüentava a
mesma universidade. Pelo fato de ter estudado fora da idade que seria convencional,
ou seja, enquanto jovem, Inácio de Loyola encontrou dificuldades no aprendizado,
experiência que seria importante quando da elaboração de um método pedagógico para
os colégios da Companhia de Jesus. A partir disto, para Inácio, a educação dos jovens
era a ideal para que se aprendesse de forma que produzissem frutos. Segundo Egídio
Schmitz2, interessada em fazer crescer o número de membros da Companhia o mais
depressa possível, a Ordem decidiu então formar os jovens que seriam os futuros
padres jesuítas, e não somente recebê-los já letrados.3 Inácio, devido à experiência de
seus estudos em Paris, dava importância ao estudo de temas pagãos aliados ao ensino
cristão - era o modus parisiensis influenciando na concepção educacional dos jesuítas.
Os primeiros colégios foram fundados juntos às Universidades já a partir de 1540. O
primeiro colégio foi fundado em Paris em 1540, seguido dos colégios de Coimbra,
Lovaina e Pádua, em 1542. Para completar as aulas, que eram assistidas nas
Universidades, eram passados nos colégios os Exercícios Espirituais.4 Logo os colégios
passaram a aceitar também alunos externos, e na segunda metade do século XVI,
grande parte da Europa passou a contar com instituições de ensino jesuíticas. O desejo
inclusive de pessoas externas na fundação de colégios em seus países foi
impulsionado principalmente na Alemanha e na Índia, em um primeiro momento, pois
necessitavam de um ensino cristão, tanto para deter a propagação da doutrina de
2 Cf. SCHMITZ, Egídio Francisco. Os jesuítas e a educação: filosofia educacional da Companhia de Jesus. 3 A partir de então, eram aceitos jovens inclusive sem instrução necessária para se tornar um jesuíta. Desta forma, a ordem toma para si a incumbência de instruir estes mesmos jovens, instrução esta que veio da necessidade em aumentar o número de membros da ordem o mais depressa possível. 4 Os assim chamados Exercícios Espirituais são uma série de exercitações de caráter reflexivo e moral exigidos de todo jesuíta. São inspirados no processo de conversão do fundador da Ordem. Veja-se IGNACIO DE LOYOLA, (San). Ejercicios espirituales. In: Obras Completas. p.207-290. Uma boa introdução aos Exercícios Espirituais pode ser lida em: FLEMING,(S.J.) David L.
5
Lutero no primeiro, quanto para a conversão de gentios no segundo. Inácio não mais
pensava somente em formar novos membros para a Ordem, mas também bons
cristãos, quaisquer fossem os cargos que estes viessem a adquirir no futuro.
Em 1553, Inácio declarou em uma regra escrita para os mestres que os meninos
deveriam ser ensinados nas escolas da Ordem “para a maior glória de Deus”, lema
maior da Companhia de Jesus. Um primeiro documento chamado “Fundación de
collegio” foi lançado no ano de 1541, com os princípios a serem seguidos pelos
escolásticos. Esta regra instruía os mestres a primeiro ensinar as letras aos jovens,
para só então começar os estudos acerca de filosofia e teologia. Outro ponto na
filosofia educacional jesuítica é o princípio de que deve se dar de graça o que de graça
se recebeu. O colégio não deveria sobreviver de esmolas, mas sim a própria fundação
deveria sustentá-lo por si mesma. A fundação geralmente se dava por meio de um
benfeitor, que não tinha o direito de dar ordens no colégio ou interferir na
administração. Para os professores nada era oferecido além do sustento, e eram
aceitos professores leigos e até mesmo ex-jesuítas, desde que estes não procurassem
remuneração. Suas recompensas deveriam ser somente Cristo, sua recompensa
maior.
Para regulamentar o ensino nos colégios jesuíticos, foi elaborada a Ratio
Studiorum, um conjunto de normas elaboradas com a finalidade de ordenar as
atividades, funções e os métodos de avaliação nas escolas jesuítas. Sua primeira
edição, de 1599, além de sustentar a educação jesuítica ganhou status de norma para
toda a Companhia de Jesus. Não estava explícito no texto o desejo de que a Ratio
Studiorum se tornasse um método inovador que influenciasse a educação moderna,
mesmo assim, foi ponte entre o ensino medieval e o moderno.5 Antes do documento
em questão ser elaborado, a Ordem tinha suas normas para o regimento interno dos
colégios, os Ordenamentos de Estudos, que serviram de inspiração e ponto de partida
para a elaboração da Ratio Studiorum. O objetivo maior da Companhia não era o de
inovar, mas sim de cumprir as palavras de Cristo: “Docete omnes gentes, ensinai,
(org.) Notas sobre os Exercícios Espirituais de Santo Inácio de Loyola. Nesta obra, podem ser encontrados textos de vários autores sobre o tema. 5 ARNAUT DE TOLEDO, Cézar de Alencar. “Razão de estudos e razão política: um estudo sobre a Ratio Studiorum.” In: Acta Scientiarum, 22, 1, p. 181-187, 2000.
6
instrui, mostrai a todos a verdade”. Esse objetivo foi um dos motivos pelos quais os
jesuítas desempenharam no Brasil, o papel de educadores, unido à veia missionária
da Ordem.
A característica missionária da Ordem foi forte aliada da coroa portuguesa no
processo de colonização do Brasil. O regime do padroado unia igreja católica e
Estado português em torno de objetivos comuns: colonizar as novas terras, levando
aos nativos a “civilização” européia, seus costumes e seu Deus. Ao desembarcarem
em terras brasílicas os primeiros jesuítas no ano de 1549, adaptações foram feitas
para a instrução do gentio, segundo a cultura destes. Isto porque para os jesuítas,
muito além de estudar a teologia ou ensinar a catequese a partir de livros, esta era
estudada e assimilada por meio da vivência dos padres. O primeiro colégio de
catecúmenos que houve no Brasil foi o de São Vicente, fundado em 1554 pelo padre
jesuíta Manuel da Nóbrega. As escolas eram em pequenas casas, e permaneceram
com tal característica de 1550 a 1560. Os três grandes colégios a serem inaugurados
na segunda metade do século XVI foram: em Salvador (1572); no Rio de Janeiro
(1573); e em Olinda (1576). Além destes, foi fundado um colégio na vila de
Paranaguá, comarca da província de São Paulo, curiosamente naqueles que seriam
os últimos anos da Companhia de Jesus no Brasil, ou seja, de 1755 a 1759. Tal
colégio demorou a ser fundado devido ao trâmite burocrático, pois, diferentemente de
uma casa jesuítica, um colégio necessitava de uma licença, ou seja, uma permissão
direta do rei de Portugal, mesmo depois de ter passado o pedido por todas as
instâncias da Companhia de Jesus. Segundo Serafim Leite, estudioso dos jesuítas no
Brasil, foi fundada a princípio uma casa anexada ao colégio de Santos, para depois de
um processo muito longo, quase meio século, ser fundado o colégio na vila de
Paranaguá.6
Um cenário conflitivo começou a se configurar a partir do século XVII entre
jesuítas e colonos. Um dos motivos deste conflito era o modo de conversão dos
índios: o confinamento em escolas, em vez de trabalharem em prol da colônia (ou dos
colonos). Outro motivo de insatisfação era que – justificavam os colonos no Amazonas
– os jesuítas não permitiam que os índios trabalhassem na extração das drogas do
6 LEITE, Serafim. História da Companhia de Jesus no Brasil , p. 441-456.
7
sertão, porém lhes era permitido, e incentivado, trabalhar nas missões. Seguindo tal
insatisfação, bandeirantes paulistas invadiram entre 1619 e 1631 as missões
jesuíticas. Por esta razão, os jesuítas foram para o sul com mais de dez mil nativos,
onde estabeleceram os Sete Povos das Missões. Em virtude da resistência à
mudança de margem do rio Uruguai, em cumprimento do tratado de Madrid, iniciaram-
se as chamadas Guerras Guaraníticas. Como resultado desta resistência dos índios
liderados pelos jesuítas, além dos constantes conflitos com os próprios colonos e
autoridades na colônia, o marquês de Pombal ordenou a expulsão da Companhia de
Jesus de terras brasileiras no ano de 1759.
Este é o contexto, conforme indicamos, no qual pretendemos inserir o processo
de fundação do colégio de Paranaguá. Pretendemos investigar qual clientela visava
atingir a instrução dos jesuítas, bem como o grau de relevância da catequese dos
indígenas na vila de Paranaguá e circunvizinhanças. Perifericamente pretendemos
discutir brevemente os métodos de ensino empregados pelos mestres jesuítas nesta
instituição.7 Para tanto, utilizaremos como referência o sexto volume da obra do padre
jesuíta Serafim Leite - referência para estudos jesuíticos no Brasil – intitulada História
da Companhia de Jesus no Brasil. Nesta obra poderemos encontrar documentos na
íntegra e também excertos acerca do trâmite burocrático para a fundação do colégio
de Paranaguá, além de importantes referências documentais para nossas
investigações. Dentre estas referências estão a Revista do Instituto Histórico e
Geográfico de São Paulo e o Arquivo Histórico do Rio de Janeiro. Além deste
importante referencial, pautaremos nossos estudos nos documentos contidos no
Arquivo Histórico Ultramarino de Lisboa8, alguns digitalizados, microfilmados ou
fotocopiados e enviados via correio. Há também uma grande quantidade de material
7 . Não iremos estabelecer uma relação entre as regras mais gerais para os colégios jesuíticos, contidas na Ratio Studiorum e as regras do colégio de Paranaguá, devido à distância temporal entre as mesmas e o diferente contexto, onde poderíamos inclusive cometer um anacronismo. 8 O catálogo de tais documentos foi publicado pela EDUSC: ARRUDA, José Jobson de Andrade (org.). Documentos manuscritos avulsos da Capitania de São Paulo , 2000. Neste catálogo estão organizadas as fichas catalográficas, bem como o assunto do qual tratam os documentos, individualmente. O primeiro volume conta inclusive com um índice onomástico, e o terceiro volume, que consiste em um índice referente aos documentos contidos no segundo volume, está entre os próximos lançamentos da EDUSC.
8
no Arquivo da Torre do Tombo, com serviços que vão desde o levantamento dos
documentos, até a microfilmagem e gravação em cd do material.
9
2. Justificativas
O colégio jesuítico na vila de Paranaguá, comarca da província de São Paulo,
fundado oficialmente no ano de 1755, inaugurou o ensino público, primário e
secundário, no que hoje reconhecemos como estado do Paraná, além de ter sido
também seu primeiro seminário. Recuperar estas informações faz parte da
reconstrução de uma parcela da História do Brasil, bem como da formação da
cultura brasileira, formação esta que certamente recebeu contribuições dos padres
da Companhia de Jesus no Brasil. Estas contribuições provavelmente se deram
tanto na catequese dos meninos índios, quanto na instrução dos filhos dos colonos.
No contexto apresentado, faz-se necessária uma discussão acerca da clientela
atendida no colégio de Paranaguá pelos padres jesuítas, além de uma análise sobre
os primeiros professores, bem como quais conteúdos eram lecionados neste colégio.
Para que tal resgate seja efetivado, pretendemos analisar qual o significado
da fundação de um colégio jesuítico em um contexto de disputas entre colonos e
jesuítas, conflitos estes que, poucos anos após a fundação de tal colégio, levou à
expulsão dos jesuítas de terras brasileiras. Além deste fator, outra importante análise
se faz necessária acerca do longo processo de estabelecimento para a fundação do
colégio, visto que desde 1708 os próprios colonos da vila de Paranaguá
reivindicavam um colégio da Ordem na mesma. Partiremos, portanto, da
necessidade inicial dos colonos, que, dada a distância de outros colégios desejavam
que houvesse um colégio na Vila de Paranaguá.
Devemos atentar para este período em especial, uma vez que desde a
fundação da casa dos jesuítas em Paranaguá em 1708, os padres iniciaram
trabalhos de catequese, sacramentos, entre outras assistências à vila e também à
circunvizinhança. Acreditamos que a educação não acontece somente nas
instituições escolares, mas se dá principalmente nas relações sociais, na práxis
humana. Por esta razão não serão enfocadas somente as atividades no colégio após
sua fundação oficial, mas sim todas as atividades - possíveis de serem identificadas
10
nos documentos a serem analisados - dos jesuítas desde seu estabelecimento na
vila de Paranaguá, bem como o processo de estabelecimento do mesmo colégio.
A escassez de material bibliográfico foi fator que nos chamou a atenção e que
pretendemos adicionar à análise, verificando as causas do descaso da historiografia
da educação em relação a este processo. Para tanto, pretendemos consultar
detalhadamente nos arquivos disponíveis, tanto no Brasil quanto em Portugal e na
Itália.9 Quando não pudermos lançar mão deste recurso, alguns arquivos, como por
exemplo, o Pátio do Colégio dos Jesuítas, na cidade de São Paulo, o Arquivo
Nacional, e o Arquivo da Torre do Tombo oferecem serviços via correio, tanto de
levantamento de dados quanto de fotocópias e gravação de documentos em cds.
Pretendemos, desta forma, resgatar este episódio que faz parte de nossa
história, mais especificamente, faz parte da história da educação no Brasil, não
perdendo de vista as determinações do contexto e das relações sociais da época
como fator primeiro para a formação da sociedade, e mesmo da educação para a
formação do homem que atenderia a sociedade colonial do Brasil.
9 Tal consulta nos é viável mesmo sem nos deslocarmos propriamente a estes países, uma vez que, com o advento da informática, grande parte destes documentos está disponível na rede mundial de computadores, alguns inclusive microfilmados.
11
3. Objetivos
3.1 Gerais:
3.1.1 Recuperar parte da história da educação em nosso país a partir da
contribuição dos padres da Companhia de Jesus no colégio da vila de
Paranaguá;
3.1.2 Analisar as causas que levaram à um longo processo de estabelecimento
do colégio na vila de Paranaguá;
3.1.3 Verificar qual o significado da fundação de um colégio jesuítico em um
cenário de conflitos entre jesuítas e colonos;
3.2 Específicos:
3.2.1 Detectar qual era a clientela atendida pelo colégio de Paranaguá, bem
como seus primeiros professores;
3.2.2 Constatar quais os conteúdos ministrados no colégio de Paranaguá;
3.2.3 Verificar a assistência dos jesuítas tanto à vila de Paranaguá quanto à
circunvizinhança;
3.2.4 Identificar as possíveis causas para a escassez bibliográfica em relação ao
tema;
12
4. Breve revisão da literatura e fundamentação teórica
Antes mesmo da análise propriamente dita discutiremos os valores da sociedade
colonial brasileira. Tal contextualização se faz necessária uma vez que nosso recorte é
momentâneo e não perde de vista o todo, a estrutura:
O concreto é concreto porque é a síntese de muitas determinações, isto é, unidade do diverso. Por isso o concreto aparece no pensamento como o processo da síntese, não como ponto de partida, ainda que seja o ponto de partida efetivo, e, portanto, o ponto de partida também da intuição e representação10
Sem o contexto nossa análise estaria flutuando em um campo de suposições, e
pautados em uma análise idealista. Nossa proposta é inserir o colégio de Paranaguá,
com nossos objetivos gerais e específicos, em um prisma de significações mais amplo,
a sociedade colonial brasileira e suas relações econômicas, sociais e culturais.
Conforme já foi mencionado, a escassez bibliográfica nos direcionou a analisar as
fontes primárias acerca das questões jesuíticas a partir do final do século XVII e início
do século XVIII. Uma de nossas fontes será a obra de Serafim Leite, em seu sexto
volume da História da Companhia de Jesus no Brasil. O autor traz toda uma discussão
acerca do pedido da câmara de Paranaguá por uma casa dos jesuítas na comarca de
Paranaguá, província de São Paulo, atualmente território paranaense. O primeiro
jesuíta a se dirigir para o interior, segundo Serafim Leite, foi o padre Leonardo Nunes,
seguido dos padres Pero Correia e João Souza. Sobre estes padres podemos encontrar
referência em outra obra de Serafim Leite, intitulada Novas Cartas Jesuíticas.11
No ano de 1682, a câmara de Paranaguá escreveu uma carta à Roma ao padre
Geral da Companhia, em agradecimento à uma missão jesuítica, de onde nasceu
pedido da casa jesuítica por parte da vila. Tal carta encontra-se integralmente transcrita
no volume em questão da História da Companhia de Jesus no Brasil. Serafim atribui a
este documento o princípio da fundação da casa e mesmo do colégio, no entanto o
pedido não foi atendido, mesmo após mais uma carta da câmara dirigida a Roma, no
10 MARX, Karl. Para a crítica da economia política. In: Os pensadores, p.39-40.
13
ano de 1685. O motivo para que o pedido não fosse atendido, segundo o autor, foi a
falta de recursos financeiros e garantias de subsistência para os padres jesuítas.
Conforme mencionamos, um dos aspectos na filosofia educacional jesuítica é o
princípio de que deve se dar de graça o que de graça se recebeu. Um colégio jesuítico
não deveria sobreviver de esmolas, mas sim deveria ter recursos próprios para se
manter. Poderia contar com a ajuda de benfeitores para a inauguração, o que
aconteceu em Paranaguá. Muitas doações foram feitas para que se estabelecesse um
colégio na vila. Sobre tais doações, Serafim Leite indica um número da Revista do
Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo.12
No dia 14 de maio de 1708 a casa, devido às contribuições, pôde ser estabelecida
em Paranaguá, sob o comando dos padres António da Cruz e Tomás de Aquino, que
eram, segundo o autor, beneméritos da terra. A característica missionária da Ordem
pode ser observada no fato de que, tão logo a casa jesuítica havia sido inaugurada e
instituiu-se na vila de Paranaguá um seminário da Ordem. Serafim Leite traz ainda
informações a respeito da oficialização do colégio, somente no ano de 1775, no
entanto, o colégio já funcionava desde 1772. O texto de Leite traz uma observação que
nos chamou a atenção e insere este episódio em nosso contexto maior. O autor afirma
que no meio século que o colégio existiu – e aqui o autor se refere a todo o período de
estabelecimento do colégio, desde a fundação da casa jesuítica – serviu, sobretudo,
para propagar a doutrina da Igreja Católica, em um contexto, conforme destacamos
anteriormente, da tentativa em deter o protestantismo e conquistar novos adeptos.
11 LEITE, Serafim. Novas Cartas Jesuíticas, p.207. 12 O número da revista citado por Serafim Leite é Revista do Instituto de São Paulo, XX, anexo à p.694.
14
5. Descrição e fundamentação da metodologia a ser usada
Nesta pesquisa serão utilizadas fontes primárias na investigação, uma vez já
constatada a escassez bibliográfica mais detalhada acerca do tema em questão. Para a
análise das fontes teremos alguns procedimentos. Em um primeiro momento iremos
fazer o levantamento destes documentos: datação, assunto e local onde os mesmos se
encontram. Alguns destes documentos, conforme mencionado, encontram-se no sexto
volume da obra de Serafim Leite, História da Companhia de Jesus no Brasil, alguns na
íntegra, outros somente excertos. Nas linhas de sua obra, Serafim Leite traz
informações acerca da fundação do colégio de Paranaguá, sobretudo do trâmite legal e
burocrático que caracterizou o processo para o estabelecimento do mesmo. Em um
segundo momento, tais fontes serão analisadas, por meio de consulta direta nos
arquivos, em documentos microfilmados ou publicados em livros. A partir destes
documentos e obras que nos ajudem a entender o período colonial, sobretudo no
século XVIII, iniciaremos então a redação do texto para a qualificação. Por fim, iremos
corrigir o texto e redigiremos o texto final para a defesa.
O tratamento aos documentos deve ter uma preocupação hermenêutica, ou seja,
não podemos perder de vista o contexto em que este foi escrito; devemos ainda
analisá-los sem a pretensão de encontrar informações diretas. Estamos cientes de que
não iremos utilizar os documentos como mera ilustração, nem acreditar que estes falem
por si mesmos:
Ao debruçar-se sobre um documento, o historiador deve sempre atentar (...) para o modo através do qual se apresenta o conteúdo histórico que pretende examinar, quer se trate de uma simples informação quer se trate de idéias.13
Devemos ainda atentar para o conteúdo histórico, uma vez que estudaremos a
formação cultural do Brasil:
13 CARDOSO, Ciro Flamarion; VAINFAS, Ronaldo. História e análise de textos. In: Domínios da História, p.377.
15
Especialmente no caso de pesquisas voltadas para a história das idéias (...) e da cultura, o conteúdo histórico que se pretende resgatar depende muito da forma do texto: o vocabulário, os enunciados, os tempos verbais etc.14
Da mesma forma que não devemos utilizar as fontes como ilustração, também não
devemos partir do princípio de que o texto relata a história tal qual esta aconteceu. Ou
seja, não devemos reduzir a história ao texto, mas sim relacionar o texto ao contexto,
pois sabemos que todo texto é um discurso, que faz parte de uma época e de um grupo
específicos.
Após fazermos todo o levantamento e seleção do material disponível para que
possamos cumprir com nossos objetivos, iniciaremos a contextualização do nosso
objeto, visando inserir o processo que envolve a inauguração do colégio de Paranaguá
na sociedade como um todo. Será necessário entender o contexto da Contra Reforma
Católica, bem como o objetivo da Companhia de Jesus na empresa colonial. O segundo
passo metodológico será entender um pouco mais sobre as relações de produção na
colônia, bem como as relações sociais entre os colonos, jesuítas e indígenas. Entender
as relações de produção no Brasil – colônia, por conseqüência, é entender a sociedade
colonial:
Indivíduos produzindo em sociedade, portanto a produção dos indivíduos determinada socialmente, é por certo o ponto de partida. (...) Quanto mais se recua na História, mais dependente aparece o indivíduo, e portanto, também o indivíduo produtor, e mais amplo é o conjunto a que pertence.15
Finalmente, chegaremos à discussão acerca do papel do colégio, e de todos os outros
objetivos que nos propusemos a analisar, sem perder de vista o fio condutor de nossa
análise, buscando uma visão mais total, no sentido de não permanecermos
exclusivamente em um recorte desvinculado da sociedade e da temporalidade, ou seja,
desvinculado da sociedade colonial brasileira no século XVIII.
14 CARDOSO, Ciro Flamarion; VAINFAS, Ronaldo. Op. cit. p. 377
16
6. Cronograma de execução
• Primeiro semestre: Freqüência às aulas e seleção de material;
• Segundo semestre: Freqüência às aulas e seleção de material;
• Terceiro semestre: Elaboração do texto para a qualificação;
• Quarto semestre: Correção do texto e elaboração do texto final para a defesa;
15 MARX, Karl. Op. Cit. p. 25-26.
17
7. Referências
ACERVO: revista do Arquivo Nacional. v. 10, n. 1 (jan./jun. 1997). Rio de Janeiro:
Arquivo Nacional, 1997.
ACERVO: revista do Arquivo Nacional. v. 12, n. 1-2 (jan./dez. 1999). Rio de Janeiro:
Arquivo Nacional, 2000.
ARNAUT DE TOLEDO, Cézar de Alencar. “Razão de estudos e razão política: um
estudo sobre a Ratio Studiorum.” In: Acta Scientiarum, 22, 1, p. 181-187, 2000.
CARDOSO, Ciro Flamarion; VAINFAS, Ronaldo. História e análise de textos. In: ______
(orgs.). Domínios da História . Rio de Janeiro: Campus, 1997, p. 375-400.
CHAMBOULEYRON, Rafael. Jesuítas e as crianças no Brasil quinhentista. In: DEL
PRIORI, Mary (org.). História das crianças no Brasil. São Paulo: Contexto, 1999,
p.55-83.
DE ASSUNÇÃO, Paulo. Negócios Jesuíticos : o cotidiano da administração dos bens
divinos. São Paulo: Edusp, 2004.
DEL PRIORE, Mary. Religião e Religiosidade no Brasil colonial. São Paulo: Ática,
1997.
FRÖHLICH, Roland. Curso Básico de História da Igreja. São Paulo: Edições
Paulinas, 1987.
GARCÍA-VILLOSLADA, Ricardo (S.J.). Santo Inácio de Loyola: uma nova biografia.
São Paulo: Loyola, 1991.
18
GREEN, V.H.H. Renascimento e Reforma. A Europa entre 1450 e 1660. Lisboa:
Publicações Dom Quixote, 1984.
HOORNAERT, Eduardo. Formação do Catolicismo Brasileiro. 1500-1800.
Petrópolis: Vozes, 1991.
IGNACIO DE LOYOLA (San). Obras Completas. Madri: Biblioteca de Autores
Cristianos, 1982.
INACIO DE LOYOLA (Santo). Constituições da Companhia de Jesus: e normas
complementares. São Paulo: Edições Loyola, 1997.
KANTOR, Íris. Festa: cultura e sociabilidade na América Portuguesa, vol. 1. São
Paulo: Edusp/Hucitec/Imprensa Oficial/Fapesp, 2001, p.37-54.
LEITE, Serafim. História da Companhia de Jesus no Brasil. Belo Horizonte:
Itatiaia, volume VI, 1935.
LOPES, Eliane Marta Teixeira; FARIA FILHO, Luciano Mendes; VEIGA, Cynthia
Greive (orgs). 500 anos de Educação no Brasil. 2ª edição. Belo Horizonte:
Autêntica, 2000.
MANACORDA, Mário Alighiero. História da Educação da Antigüidade aos nossos
dias. São Paulo: Cortez, 1997.
MARX, Karl. Para a crítica da economia política. In: MARX, Karl. Os pensadores .
São Paulo: Nova Cultural, 1999.
PEREIRA, M. R. de Mello; SANTOS, A. C. de Almeida. O poder local e a cidade : a
câmara municipal de Curitiba – séculos XVII a XX. Curitiba: Aos Quatro Ventos,
2000.
19
PEREIRA, Magnus; NICOLAZZI JR, Norton (orgs). Audiências e correições os
almotacés (Curitiba - 1737 a 1828). Curitiba: Aos Quatro Ventos, 2000.
SANTOS, Antônio César de Almeida; SANTOS, Rosângela Maria Ferreira (orgs).
Eleições da Câmara Municipal de Curitiba (1748 a 1827). Curitiba: Aos Quatro
Ventos, 2000.
Obs.: Ao final da pesquisa, novos títulos poderão ser acrescentados.