PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma...

34
CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE MENTAL PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES LISBOA – Setembro 2002

Transcript of PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma...

Page 1: PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma informação muito pobre. Além de ... permanecem demasiadas vezes mal esclarecidos. Por

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE MENTAL

PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES

LISBOA – Setembro 2002

Page 2: PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma informação muito pobre. Além de ... permanecem demasiadas vezes mal esclarecidos. Por

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE MENTAL

2

PREÂMBULO

Ao abrigo do disposto no Decreto-Lei nº 35/99, de 5 de Fevereiro, que o criou, e do artigo 12º do seu Regulamento Interno superiormente aprovado, o Conselho Nacional de Saúde Mental organizou Comissões Especializadas para analisar alguns temas da Saúde Mental do País e para sobre eles emitir propostas e recomendações. Dessas actividades divulgamos alguns relatórios, enquanto prosseguem estudos nestas e noutras Comissões. Fazendo de cada parcela este breve Sumário: Promoção da Saúde Mental ... vinca-se a necessidade duma Pedagogia da Saúde Mental, apresentando-se propostas de informação e de sensibilização da população em geral e dos "mass-media" em particular, lutando contra o estigma e o "fácil" adoecer dos nossos dias. Legislação da Saúde Mental ... faz-se uma avaliação crítica da Lei de Saúde Mental e dos outros diplomas legais vigentes, apresentando-se sugestões de melhoria quanto à sua funcionalidade aplicada. Institutos Religiosos ... faz-se uma apresentação do conjunto da assistência psiquiátrica feita pelos Institutos Religiosos, incluindo-se propostas de melhoria do seu funcionamento e da sua integração no S. N. S. Direitos das crianças e adolescentes ... faz-se um desenho crítico da actual assistência pedopsiquiátrica, das suas insuficiências e das suas perspectivas. Apresenta-se um conjunto de Recomendações e Propostas, analisam-se os seus problemas e desafios, sugerem-se objectivos a curto e a médio prazo.

Page 3: PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma informação muito pobre. Além de ... permanecem demasiadas vezes mal esclarecidos. Por

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE MENTAL

3

Reabilitação Psicossocial ... faz-se uma avaliação do estado da arte deste tipo de reabilitação em Portugal. Analisam-se os actuais recursos e as suas incapacidades, seguindo-se uma série de sugestões e recomendações quanto ao futuro. ... informamos que os textos foram aprovados, por unanimidade, na reunião plenária do Conselho de 5 de Julho de 2002. Jaime Milheiro

( Presidente do Conselho Nacional de Saúde Mental ) Setembro de 2002 Participaram na elaboração dos textos: Dr. Álvaro de Carvalho, Dr.ª Ana Vitória Raimundo, Dr. António Leuschner, Sr. Delfim Oliveira, Dr.ª Fátima Palma, Dr.ª Isabel Fazenda, Irmã Isabel Morgado, Dr. Jaime Milheiro, Dr. José Adriano Fernandes, Enf. José Manuel Oliveira Santos, D. Lisette Canas, Dr.ª Margarida Fornelos, Dr.ª Maria Gabriela Santos, Dr.ª Maria João Antunes, Dr.ª Maria João Heitor, Dr.ª Maria José Vidigal, Enf. Maria José Viana de Almeida, Dr.ª Maria Júlia Valério, Dr. Nuno Miguel, Dr. Paulo Oliveira, Dr. Vítor Cotovio na sua qualidade de membros do Conselho.

Page 4: PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma informação muito pobre. Além de ... permanecem demasiadas vezes mal esclarecidos. Por

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE MENTAL

4

INDICE

Pág.

• Promoção da Saúde Mental 5 • Relatório da Comissão de Avaliação da Legislação

de Saúde Mental 8

• Relatório da Comissão dos Institutos Religiosos 13

• Relatório da Comissão dos Direitos das Crianças e Adolescentes 20

• Relatório da Comissão de Reabilitação

Psicossocial 30

Page 5: PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma informação muito pobre. Além de ... permanecem demasiadas vezes mal esclarecidos. Por

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE MENTAL

5

PROMOÇÃO DA SAÚDE MENTAL

Necessidade Há uma necessidade cada vez mais premente de dar a conhecer e de sensibilizar a população para os problemas da Saúde Mental. Há necessidade de promover uma campanha nesse sentido, porque as suas perturbações aumentam em flecha no nosso País, tal como nos países mais desenvolvidos. Alguns números são já assustadores:

• Mais de 20% da população adulta sofre de algum problema de Saúde Mental em certa altura da sua vida.

• O número de suicídios nos países da comunidade europeia é igual ou

superior ao número de mortos em acidentes de viação.

• A depressão ocupa o quarto lugar na lista das doenças com mais prejuízos económicos (DALYs. Na progressão actual ocupará o segundo, daqui por quinze anos (OMS).

• As doenças mentais acarretam um custo equivalente a 3-4 % do

produto nacional bruto na Região Europeia (C. E.). Mas a atitude geral (mentalidade) mantém-se altamente segregante. O estigma da doença mental e do doente continua. Hoje ter-se-á de interrogar: PERANTE UMA PESSOA DOENTE ... QUAL A ATITUDE A TOMAR?

PERANTE UMA PESSOA SAUDÁVEL ... QUAL A ATITUDE A TOMAR PARA QUE ELA NÃO ADOEÇA ?

Page 6: PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma informação muito pobre. Além de ... permanecem demasiadas vezes mal esclarecidos. Por

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE MENTAL

6

A Saúde Mental pode ser promovida através de modelos de acções psicossociais interdisciplinares:

• Educação • Campanhas nos media: informação e esclarecimento • Aconselhamento individual e familiar • Intervenção precoce na crise • Desenvolvimento de sistemas de saúde ocupacional • Treino dos profissionais prestadores de cuidados sociais • Programas junto da sociedade civil

Necessidade de indicadores de avaliação Uma das grandes dificuldades da promoção será a focagem de objectivos de Saúde Mental, em vez dos tradicionais objectivos contra a doença. Será a focagem dos indicadores de Saúde. O indicador mais frequentemente usado até agora tem sido a taxa de morte por suicídio, o que só por si fornece uma informação muito pobre. Além de que não existe uma verdadeira correlação entre a taxa de suicídio e a prevalência de perturbações mentais nas diferentes populações. Será necessário procurar indicadores da Saúde Mental de sentido positivo, nos indivíduos, famílias, organizações e comunidades. SERÁ NECESSÁRIO UMA PEDAGOGIA DA SAÚDE MENTAL Prioritariamente será necessário :

• Lembrar a toda a gente que o “ambiente” inafectivo e stressante é causa fundamental da actual subida em flecha das perturbações psiquiátricas.

• Acentuar a importância e a visibilidade da Saúde Mental: sensibilizar a comunidade, a opinião pública, a comunicação social.

• Promover a Saúde Mental nas Escolas: nas crianças e adolescentes sabendo-se quanto isso mais tarde representará na Saúde dos adultos.

Page 7: PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma informação muito pobre. Além de ... permanecem demasiadas vezes mal esclarecidos. Por

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE MENTAL

7

• Promover a Saúde Mental no trabalho, focando igualmente os problemas de sub-emprego e desemprego.

• Promover a Saúde Mental e qualidade de vida dos idosos. • Integrar socialmente os grupos marginalizados (incluindo os do álcool

e das drogas). • Desenvolver o estudo dos indicadores de Saúde Mental. • Promover a Saúde Mental através da telemática. • Apoiar pesquisas e desenvolvimentos. • Desenvolver a informação dos sistemas de Saúde Mental • Fomentar intercâmbios esclarecedores entre os técnicos de Saúde e a

comunidade. • Sensibilizar os técnicos de Saúde em geral, que nesta área

permanecem demasiadas vezes mal esclarecidos. Por tudo isto:

O Conselho Nacional de Saúde Mental propõe continuidade da campanha

anti-estigma iniciada com os Cartazes do Ano Mundial da Saúde Mental (2001).

Propõe que se continue essa mesma actividade, este e os anos seguintes, com o mesmo fim, por formas várias. Propõe que, além da elaboração de cartazes, folhetos e outro material de divulgação na luta contra o estigma, se realizem palestras, reuniões, escritos ou outras acções informativas e de sensibilização da comunidade e dos "media" para estas questões.

Page 8: PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma informação muito pobre. Além de ... permanecem demasiadas vezes mal esclarecidos. Por

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE MENTAL

8

RELATÓRIO DA COMISSÂO DE AVALIAÇÃO DA LEGISLAÇÃO DE SAÚDE MENTAL

A Comissão procedeu a uma avaliação da aplicação da legislação na área da Saúde Mental, nomeadamente:

1. Lei n.º 36/98, de 24 de Julho (Lei de Saúde Mental) 2. Decreto-lei n.º 35/99, de 5 de Fevereiro (Organização dos Serviços) 3. Despacho conjunto n.º407/98, de 18 de Junho (Respostas articulares

de Saúde Mental) 4. Portaria n.º 348-A/98, de 18 de Junho (Empresas de Inserção) 5. Plano de Acção contra o Alcoolismo (Resolução do Conselho de

Ministros n.º 166/2000, de 29 de Novembro).

1. No que se refere à Lei de Saúde Mental, ela contempla quatro aspectos essenciais:

a. Um primeiro capítulo de disposições gerais, em que são enunciados

os seus objectivos, as medidas conducentes à protecção e promoção da Saúde mental, os princípios gerais a que deve obedecer a política nesta área, os direitos e deveres do utente dos serviços prestadores de cuidados e a constituição deste Conselho Nacional;

Sendo certo que é prematuro fazer uma apreciação da concretização de princípios tão genéricos, salienta-se, no entanto, que a medida executiva fundamental, a entrada em funções deste órgão consultivo, foi efectivamente aplicada, não nos cabendo proceder a uma avaliação dos aspectos práticos do seu funcionamento.

b. Um vasto capítulo dedicado ao enquadramento legal do

internamento compulsivo, cuja aplicação, de acordo com os relatórios oportunamente enviados aos Ministérios da Justiça e da Saúde, numa apreciação genérica a Comissão para

Page 9: PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma informação muito pobre. Além de ... permanecem demasiadas vezes mal esclarecidos. Por

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE MENTAL

9

Acompanhamento da Execução daquele regime avaliou de forma positiva. Destaca, nomeadamente: nos dois primeiros anos de vigência da Lei, a percentagem dos internamentos compulsivos correspondeu apenas a 3% do número total de internamentos; a Comissão não recebeu qualquer reclamação sobre as condições do internamento, quer dos internados, quer das pessoas com legitimidade para requerer o internamento; não teve conhecimento de qualquer recurso interposto de decisão de internamento ou de decisão sobre a revisão da situação do internado; não teve conhecimento do recurso à providência de habeas corpus, em virtude de privação ilegal da liberdade. Por outro lado, pese embora o dever de cooperação consagrado na Lei de Saúde Mental, os tribunais continuam a remeter um número pouco significativo de decisões à Comissão de Acompanhamento, o que poderá comprometer a organização de uma base de dados. A este propósito, note-se que só em Dezembro de 2001 a Comissão obteve resposta da Comissão Nacional de Protecção de dados, quanto à legalização do tratamento dos dados em questão.

c. Uma norma referente à necessidade de regulamentação da gestão do

património dos doentes mentais; Esta questão, apesar de sensível, tendo motivado inclusivamente uma recomendação deste Conselho Nacional, e mau grado ter sido encetado um processo de elaboração de diploma próprio, com a colaboração dos Ministérios da Justiça e da Saúde e do Centro de Estudos de Direito da família da Universidade de Coimbra, carece ainda da necessária regulamentação. Subsiste, a este propósito, toda a indefinição anterior à publicação da Lei, dando azo aos mais variados modelos de gestão do património destes doentes, nomeadamente dos institucionalizados

d. Relegação para diploma orgânico das questões referentes à

organização dos serviços de saúde mental

Cerca de dez dias após a entrada em vigor da Lei de Saúde Mental, foi publicado o decreto-lei n.º 35/99, de 5 de Fevereiro, que será objecto de avaliação específica no ponto seguinte.

2. Este diploma define os princípios orientadores da organização, gestão e

avaliação dos serviços de psiquiatria e saúde mental. Para além de especificar os princípios gerais que norteiam este serviços, define a sua regulamentação, planeamento, avaliação e organização e regulamenta as competências, composição e

Page 10: PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma informação muito pobre. Além de ... permanecem demasiadas vezes mal esclarecidos. Por

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE MENTAL

10

funcionamento deste Conselho Nacional. Refira-se, a este propósito, a sentida lacuna da não integração no Conselho de um representante do Ministério da Educação, ao contrário do que se verifica nos Conselhos Regionais. Da experiência deste três anos, constata-se que é insuficiente a definição das competências do gabinete de apoio técnico que garante a assessoria dos Conselhos de Administração das ARS’s, cujo coordenador é, por inerência, o Presidente do Conselho Regional. Não é clara a forma como esse apoio é garantido, nem o tipo de articulação que deve existir entre este gabinete regional e os diversos serviços locais, para além da participação destes no referido Conselho. Refira-se, quanto aos Conselhos Regionais, que parece existirem dificuldades no funcionamento dos das regiões de Lisboa e Vale do Tejo, Centro e Alentejo, que, nos dois primeiros casos, não têm sequer coordenador nomeado. As dificuldades enunciadas constituem claro constrangimento à aplicação da Lei de Saúde Mental, pelo que se considera urgente a sua ultrapassagem. Quanto à organização dos serviços prestadores, foi publicada em Abril de 2001, a Rede de Referenciação Hospitalar de Psiquiatria e Saúde Mental. Estão constituídos Grupos de trabalho, na DSPSM da Direcção Geral da Saúde, relativos às seguintes estruturas e/ou medidas previstas no decreto-lei: • Criação de Centros Regionais de Psiquiatria Forense; • Serviços Regionais para “doentes difíceis”.

3. O despacho conjunto n.º 407/98, de 18 de Junho, constituiu, sem dúvida,

um notável avanço na estruturação de respostas de reabilitação psicossocial. Não possuindo a Comissão um levantamento detalhado das diversas acções empreendidas no seu âmbito a nível nacional (o qual competiu à respectiva Comissão de Acompanhamento, no período experimental), não pode deixar de alertar para as dificuldades que se levantam para a sua implementação, quer no que respeita ao desenho das respostas, quer, em especial, ao seu financiamento. Entretanto, tem-se conhecimento de que foi elaborado um documento integrado entre a Saúde e a Segurança Social, onde se redefinem princípios e normas gerais orientadoras para a implementação e funcionamento das respostas. Nestas, incluem-se os diversos tipos de respostas ou apoios a prestar, em termos de cuidados continuados à população, nomeadamente:

Page 11: PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma informação muito pobre. Além de ... permanecem demasiadas vezes mal esclarecidos. Por

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE MENTAL

11

• Apoio Domiciliário Integrado (ADI) • Centro de Promoção de Autonomia (CPA) • Unidade de Apoio Integrado Transitório (UAI-T) • Unidade de Apoio Integrado Prolongado (UAI-PRO) • Unidade de Apoio Integrado Permanente (UAI-PER) Neste documento é contemplada a Saúde Mental, que foi incluída de forma específica, tendo para tal adaptado as tipologias das respostas enunciadas às especificidades inerentes a esta área, tendo a DSPSM, participado na sua elaboração. Importará que sejam revistos os modelos de financiamento, por forma a contornar a situação actual de aplicação do Despacho Conjunto, que tem inviabilizado muitas das iniciativas neste campo. Deverão ser estudados benefícios, quer para a aquisição de equipamentos para fins de reabilitação psicossocial por parte das Associações, quer para a aquisição de habitação independente, pelos doentes ou seus familiares. Os encargos decorrentes destas medidas poderão ser suportados, pelo menos parcialmente, pela reafectação de recursos financeiros actualmente dispendidos na hospitalização psiquiátrica, sobretudo dos doentes de longo internamento.

4. Não dispõe esta Comissão de dados que lhe permitam efectuar uma

avaliação rigorosa das iniciativas no âmbito da Portaria 348-A/98, de 18 de Junho, no campo da Saúde Mental, tanto mais que os relatórios disponíveis da Comissão para o Mercado Social de Emprego, não avaliam o impacto desta medida, de forma discriminada, relativamente aos diferentes grupos de trabalhadores desfavorecidos, nomeadamente as “pessoas com perturbações psiquiátricas em processo de recuperação”. De qualquer modo, é a Comissão de parecer que os apoios concedidos por esta medida não se deverão restringir aos encargos com os trabalhadores em processo de inserção, devendo estender-se aos custos com a área de gestão e a equipa de enquadramento. Existe, todavia, um Grupo de Trabalho, constituído na DSPSM da DG Saúde, que elaborou um documento em Dezembro de 2001, sobre Emprego Apoiado (E.A.), no qual é proposto o desenvolvimento de políticas de integração dos trabalhadores com doença e/ou deficiência mental no mercado laboral competitivo e a criação do respectivo suporte legal. Por fim, entende esta Comissão congratular-se com a publicação do Decreto-lei n.º 18/2002, de 29 de Janeiro, que estabelece a simples suspensão da pensão social de invalidez, aquando do exercício de

Page 12: PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma informação muito pobre. Além de ... permanecem demasiadas vezes mal esclarecidos. Por

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE MENTAL

12

actividade profissional e da frequência de acções de formação, por pessoas com deficiência.

5. Relativamente ao Plano de acção contra o Alcoolismo, e conforme

previsto na Resolução do Conselho de Ministros que o aprovou, consideramos importante e urgente a constituição de uma Comissão para acompanhamento da aplicação e do desenvolvimento das medidas nele propostas.

Page 13: PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma informação muito pobre. Além de ... permanecem demasiadas vezes mal esclarecidos. Por

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE MENTAL

13

RELATÓRIO DA COMISSÃO DOS INSTITUTOS RELIGIOSOS

I - ACTIVIDADE ASSISTENCIAL DOS INSTITUTOS O Instituto S. João de Deus e o Instituto das Irmãs Hospitaleiras do Sagrado Coração de Jesus, IPSS’s, constituem a forma de intervenção, quer da Ordem quer da Congregação, na área da saúde. Têm como carisma e esfera de acção a concretização da doutrina social da Igreja na promoção da saúde e assistência na doença aos mais necessitados e, predominantemente, aos mais excluídos. Assim sendo, os doentes mentais têm sido população alvo dos cuidados de saúde e da hospitalidade destas duas Instituições que os assistem através de 417 obras assistenciais distribuídas pelos cinco continentes, num total de 48 países. Em Portugal, a actividade assistencial, baseada nos modernos conhecimentos técnico-científicos, é realizada secularmente, e permanentemente actualizada, nos seguintes estabelecimentos hospitalares e comunidades envolventes com respectivas valências que a seguir se discriminam:

Page 14: PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma informação muito pobre. Além de ... permanecem demasiadas vezes mal esclarecidos. Por

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE MENTAL

14

A – Instituto S. João de Deus

CENTRO HOSPITALAR ACTIVIDADE LOCALIZAÇÃO

Casa de Saúde do Telhal

Psiquiatria (Agudos e Crónicos), Alcoologia e Serviços de Reabilitação

Psiquiátrica/Psicossocial com Unidades de Vida Protegida e Autónoma e Área de

Dia

SINTRA

Casa de Saúde S. João de Deus

Psiquiatria (Agudos e Crónicos), Alcoologia e Serviços de Reabilitação

Psiquiátrica/Psicossocial BARCELOS

Casa de Saúde S. José Psiquiatria AREIAS DE VILAR

Casa de Saúde S. João de Deus

Psiquiatria (Agudos e Crónicos), Alcoologia e Serviços de Reabilitação

Psiquiátrica/Psicossocial FUNCHAL

Casa de Saúde S. Rafael

Psiquiatria (Agudos e Crónicos), Alcoologia e Serviços de Reabilitação

Psiquiátrica/Psicossocial com Unidades de Vida

ANGRA DO HEROÍSMO

Casa de Saúde S. Miguel

Psiquiatria (Agudos e Crónicos), Alcoologia, Toxicodependência e Serviços de Reabilitação Psiquiátrica/Psicossocial

com Unidades de Vida

PONTA DELGADA

Hospital S. João de Deus

Cirurgias: de Ortopedia, Geral, Plástica, Pediátrica, Vascular, de Otorrino e de Oftalmologia. Serviço de M.F.R. com

secção de Próteses e Ortóteses

MONTEMOR-O-NOVO

Residência S. João de Ávila Geriatria LISBOA

Page 15: PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma informação muito pobre. Além de ... permanecem demasiadas vezes mal esclarecidos. Por

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE MENTAL

15

B – Instituto das Irmãs Hospitaleiras do Sagrado Coração de Jesus1

CENTRO HOSPITALAR

ACTIVIDADE

LOCALIZAÇÃO

Casa de Saúde da Idanha

Psiquiatria (Agudos e Crónicos), Serviços de Reabilitação

Psiquiátrica/Psicossocial e Unidades de Vida Protegida e Autónoma

IDANHA - SINTRA

Casa de Saúde Santa Rosa de Lima

Psicogeriatria

BELAS - SINTRA

Casa de Saúde Câmara Pestana

Psiquiatria (Agudos e Crónicos), Serviços de Reabilitação

Psiquiátrica e Psicossocial

FUNCHAL

Casa de Saúde Bom Jesus

Psiquiatria (Agudos e Crónicos) Serviços de Reabilitação Psiquiátrica/ Psicossocial com Unidades de Vida

Protegida, Autónoma, Toxicodependência

BRAGA

Centro Psicogeriátrico Nª Sra. de Fátima

Psicogeriatria PAREDE /CASCAIS

Centro de Reabilitação

Psicopedagógica S. Família

ReabilitaçãoPsicossocial e Psicopedagógica de crianças e jovens

FUNCHAL

Clínica Psiquiátrica S. José

Psiquiatria (Agudos e Crónicos), Serviços de Reabilitação Psiquiátrica/Psicossocial

Residência Protegida/Unidade de Vida Autónoma

LISBOA

Casa de Saúde

Rainha S.ta Isabel

Psiquiatria (Agudos e Crónicos), Serviços de Reabilitação

Psiquiátrica/ Psicossocial

CONDEIXA-A-NOVA

Casa de Saúde

Nª Sra. da Conceição

Psiquiatria (Agudos e Crónicos), Serviços de Reabilitação Psiquiátrica/Psicossocial

PONTA DELGADA Casa de Saúde Espírito Santo

Psiquiatria (Agudos e Crónicos), Serviços de Reabilitação

Psiquiátrica/Psicossocial com Unidades de Vida Protegida e Autónoma

TERCEIRA

Casa de Saúde Bento Menni

Psiquiatria (Agudos e Crónicos), Serviços de Reabilitação

GUARDA

NOTA: A Ordem e a Congregação criaram IPSS-s, respectivamente designadas – Instituto S. João de Deus e Instituto das Irmãs Hospitaleiras do Sagrado Coração de Jesus – às quais foram cedidos, a título precário, os edifícios onde funcionam os estabelecimentos de saúde e que são propriedade da Ordem e da Congregação. 1 O Instituto das Irmãs Hospitaleiras do Sagrado Coração de Jesus também tem a administração do Centro de Recuperação de Menores – ASSUMAR / PORTALEGRE, propriedade do Estado.

Page 16: PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma informação muito pobre. Além de ... permanecem demasiadas vezes mal esclarecidos. Por

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE MENTAL

16

II – PREÂMBULO ÀS PROPOSTAS Tendo em conta a Lei de Bases da Saúde pode dizer-se que: 1. Os cuidados de saúde se efectivam através da actividade do próprio

Estado nos seus serviços e estabelecimentos e ainda, sob a fiscalização do mesmo, em estabelecimentos privados com ou sem fins lucrativos (Base I).

2. Todos os cidadãos são iguais perante a lei no acesso aos cuidados de

saúde, independentemente da sua condição económica e do local onde residam. Porém, a lei prevê a tomada de medidas especiais para alguns grupos de cidadãos, por estarem sujeitos a maiores riscos, entre os quais se contam os deficientes, os toxicodependentes e os idosos (Base II).

3. Os serviços de saúde têm o dever de se estruturarem e funcionarem de

acordo com o que for o interesse dos utentes e ainda de se articularem entre si.

4. Compromete-se o Estado a apoiar o desenvolvimento do sector privado

da saúde, mas de modo particular as iniciativas das IPSS’s. 5. O Estado adopta uma política de saúde com carácter evolutivo,

adaptando-se permanentemente às condições da realidade nacional, às suas necessidades e aos seus recursos.

6. Para que o direito à protecção da saúde se efective, o Estado

compromete-se a actuar através dos seus serviços próprios, celebrar acordos com entidades privadas e apoiar e fiscalizar a restante actividade privada na área da saúde.

7. O Sistema de Saúde é constituído pelo Serviço Nacional de Saúde, por

todas as entidades públicas que desenvolvam actividades de promoção, prevenção e tratamento e por todas as entidades privadas e profissionais livres que acordem a prestação de serviços de saúde.

8. Tendencialmente devem ser adoptadas as mesmas regras no pagamento

de cuidados e no financiamento de unidades de saúde da rede nacional de prestação de cuidados de saúde (Base XIII, n.º 5), integrando esta não

Page 17: PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma informação muito pobre. Além de ... permanecem demasiadas vezes mal esclarecidos. Por

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE MENTAL

17

só os estabelecimentos do SNS, mas ainda todas as entidades privadas com acordos ou contratos de prestação de serviços na área da saúde (Base XIII n.º4).

9. Em função das vantagens sociais decorrentes das iniciativas privadas de

prestações de cuidados de saúde e em concorrência com o sector público, o Estado apoia o desenvolvimento do sector privado da saúde (Base XXXVII).

10. O referido apoio pode assumir várias formas, nomeadamente:

a) Mobilidade do pessoal do SNS que deseje trabalhar no sector privado;

b) Incentivos à criação de unidades privadas de saúde; c) Reserva de quotas de leitos de internamento em cada região de

saúde. 11. No tocante às IPSS’s o referido apoio tem um carácter alargado,

podendo ser subsidiadas financeiramente e apoiadas tecnicamente pelo Estado e pelas autarquias.

A Lei de Saúde Mental ao integrar-se no sistema jurídico, estabelecendo embora os princípios gerais da política de saúde mental, não pode nem deve ser interpretado ou aplicado pondo de lado os princípios e directrizes previstos na Lei de Bases da Saúde. Assim, é à luz deste quadro legislativo vasto que devem ser lidas as propostas feitas por este grupo de trabalho que partindo de uma realidade concreta e vivida ao longo de dezenas de anos por estas duas instituições (Parte I), pretendem continuar a servir as populações deste País através de iniciativas enformadas por um conceito de saúde mental actual, sem se afastarem dos valores que sempre defenderam e em que avultam tanto a dignidade do ser humano portador de doença ou deficiência mental, como a humanização de cuidados.

III - PROPOSTAS Assim, face ao papel assistencial que os dois Institutos desempenham no espectro da saúde, pretendem potenciar a sua intervenção em face das necessidades reais, apresentando disponibilidade para:

Page 18: PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma informação muito pobre. Além de ... permanecem demasiadas vezes mal esclarecidos. Por

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE MENTAL

18

1. Reforçar serviços e valências já existentes

• Resposta aos doentes psiquiátricos agudos, aos alcoólicos e aos toxicodependentes, respectivamente nas nossas Unidades de Internamento de Agudos, Centros de Recuperação de Alcoólicos e Unidades de Tratamento de Toxicodependentes, de acordo com o previsto na Lei das Bases da Saúde (Lei n.º 48/90) quanto ao “Princípio da livre escolha” (Base I – n.º 1, Base V – n.º 5 e Base XIV – n.º 1,a).

• Resposta aos doentes de evolução prolongada e

crónicos/residentes das nossas instituições e do SNS, no âmbito dos Equipamentos Instalados e das Estruturas de Reabilitação já existentes e da criação de novas Unidades de Reabilitação Psicossocial, conforme Decreto-Lei nº 35/99, de acordo com protocolos específicos e Despacho Conjunto 407/98, procurando ganhos em saúde assentes no princípio da complementaridade.

2. Negociar sectorizações geo-demográficas

3. Fornecer novas valências/serviços, na base da respectiva

contratualização dos mesmos, assente em contratos-programa

4. Disponibilidade imediata para:

• Abertura e funcionamento de Unidades de Dia ou Áreas de Dia e Hospitais Dia/Noite para doentes psiquiátricos, na base de protocolos.

• Promover novas respostas na área da reabilitação psicossocial

(Unidades de Vida Protegida, ... Apoiada, ... Autónoma, Foruns Socio-ocupacionais, Ateliers de Actividades Ocupacionais, Ateliers de Actividades Produtivas, Actividades Pré-Profissionais e Formação Profissional), com base em parcerias consubstanciadas em protocolos e em conformidade com o Plano Nacional de cuidados continuados e integrados (Rede Mais) na resolução do Conselho de Ministros 59/2002, nomeadamente no seu ponto 9 (respostas específicas e cuidados continuados para as pessoas com doença mental crónica).

Page 19: PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma informação muito pobre. Além de ... permanecem demasiadas vezes mal esclarecidos. Por

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE MENTAL

19

IV – ARTICULAÇÃO INSTITUTOS – S.N.S.

De acordo com o que preconiza a Lei de Bases da Saúde, os nossos Institutos querem ver reconhecidos, com a dignidade devida, os serviços desenvolvidos junto das populações mais carenciadas, solicitando uma igualdade de tratamento no que se refere:

• Apoio financeiro compatível com a qualidade dos serviços prestados, nas valências existentes.

• Protocolar a abertura de novas valências, explicitadas na Parte III –

PROPOSTAS.

• Dar continuidade ao trabalho iniciado no sentido de definição do papel dos Institutos, no âmbito da Psiquiatria e Saúde Mental, de modo a conseguirmos uma articulação das respostas assistenciais dos Institutos - S.N.S., o que implica, no nosso entender criação de legislação específica ( Portaria ou outra).

Page 20: PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma informação muito pobre. Além de ... permanecem demasiadas vezes mal esclarecidos. Por

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE MENTAL

20

RELATÓRIO DA COMISSÃO DOS DIREITOS DAS CRIANÇAS E ADOLESCENTES

RECOMENDAÇÕES : A União Europeia estabeleceu em 1996 um Plano de Acção para a Saúde, no qual incluiu a Saúde Mental. Em 27 de Novembro de 1997 foi adoptada em Bruxelas a seguinte recomendação : As crianças têm o direito de serem protegidas e apoiadas no seu desenvolvimento, para uma vida mentalmente sã e de bem estar Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança (20 de Novembro de 1989) --- independentemente da raça, religião, género, incapacidade e condição médica Artigo 13 do Tratado das Comunidades Europeias, Amesterdão, Junho de 1997. A Promoção da Saúde Mental em idade precoce conduz a um amplo conjunto de resultados positivos, incluindo um menor risco de problemas e de comportamentos, melhor qualidade de vida e uma multiplicidade de resultados sociais e económicos. Todas as doenças físicas e mentais têm uma génese multifactorial; não podemos valorizar um factor em detrimento do outro. A Rede Europeia de Promoção da Saúde Mental recomenda um maior conhecimento da importância da Saúde Mental e do desenvolvimento de políticas para a promover nas crianças e nas famílias. A Presidência Finlandesa da União Europeia, que decorreu de 1 de Julho a 31 de Dezembro de 1999, escolheu como tema para a Saúde a Promoção da Saúde Mental que teve como lema “Não há Saúde sem Saúde Mental”. A Promoção da Saúde Mental Infantil e Juvenil implica medidas nos vários níveis de Prevenção: • Primária • Secundária • Terciária

Page 21: PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma informação muito pobre. Além de ... permanecem demasiadas vezes mal esclarecidos. Por

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE MENTAL

21

PREVENÇÃO PRIMÁRIA Medidas preventivas gerais : desenvolver a saúde em geral, promover uma maior resistência à doença, diminuir a vulnerabilidade, através de: • Planeamento familiar • Saúde materna • Promoção da saúde individual e do meio • Desenvolvimento de cuidados pré e perinatais • Prevenção de acidentes na infância Medidas preventivas específicas :

• Reduzir a exposição aos problemas psicossociais, incluindo a prevenção da insuficiente estimulação cognitiva e emocional, na primeira infância e infância precoce.

• Diminuir a hospitalização desnecessária, as separações prolongadas dos pais, a descontinuidade dos padrões de cuidados.

• Modificar as estruturas escolares, de acordo com os princípios da saúde mental.

• Promover a detecção precoce de atrasos do desenvolvimento e de perturbações emocionais.

• Reduzir o fracasso escolar, através de intervenções a partir da escola, dirigidas aos problemas de aprendizagem.

• Preparar a parentalidade, através de programas específicos. • Proteger crianças e famílias expostas a problemas socioculturais

(migração) e o abuso de álcool ou substâncias psicoactivas. PREVENÇÃO SECUNDÁRIA Desenvolver respostas suficientes e adaptadas às necessidades da população infantil e juvenil – através de Serviços de Saúde Mental dirigidos a populações definidas, que possuam critérios de cuidados integrados com base na comunidade. Os investimentos efectuados neste nível vão permitir resolver ou minorar situações que poderão representar, no futuro, custos económicos muito mais pesados para o País.

Page 22: PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma informação muito pobre. Além de ... permanecem demasiadas vezes mal esclarecidos. Por

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE MENTAL

22

PREVENÇÃO TERCIÁRIA Dirigida às perturbações prolongadas, implicando colaboração e coordenação entre os sectores da saúde, social e comunitário, fomentando a reabilitação. ∗ ∗ ∗ Estas Recomendações mostram como a saúde mental deve impregnar todo o tecido institucional de saúde e comunitário. Depois destas recomendações gerais aceites pela comunidade técnica, pergunta-se : o que se faz em Portugal neste Século XXI? Vamos tentar dar resposta a esta questão:

• apresentando um quadro geral da saúde mental infantil e juvenil. • estabelecendo e ordenando objectivos a curto e médio prazo.

ESTRUTURAS DA SAÚDE MENTAL INFANTO-JUVENIL EXISTENTES

1. De acordo com o penúltimo censo (1991), Portugal tinha 9.867.147 habitantes dos quais 2.654.144 são crianças e adolescentes dos 0-18 anos, ou seja, 26,9 % da população total . Nesta fase do planeamento adoptou-se o rácio de um Pedopsiquiatra para 66.000 habitantes. 2. O Colégio da Especialidade da Ordem dos Médicos, em 1998, tinha 99 pedopsiquiatras, assim distribuídos:

• 57 na Região Sul • 34 na Região Norte • 8 no resto do país

(Não temos dados actuais, mas o aumento não foi significativo) Destes, cerca de 20,9 % tinham mais de 60 anos, sendo idêntica a percentagem dos que tinham idades até 40 anos (in Psiquiatria e Saúde Mental – Rede de Referenciação Hospitalar, D.G.S., 2001)

Page 23: PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma informação muito pobre. Além de ... permanecem demasiadas vezes mal esclarecidos. Por

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE MENTAL

23

Os especialistas estavam quase exclusivamente concentrados nas cidades de Lisboa, Porto e Coimbra. A Associação Portuguesa de Psiquiatria da Criança e do Adolescente (APPIA) tinha 125 membros, incluindo os que estavam em formação. Todavia, nem todos trabalhavam como psiquiatras da criança e do adolescente. Apenas 39 especialistas se encontravam em hospitais do Estado . A formação dos especialistas é efectuada nos Departamentos de Psiquiatria da Infância e da Adolescência do Hospital D. Estefânia (Lisboa), do Hospital Maria Pia (Porto) e do Centro Hospitalar de Coimbra . Nas cinco Faculdades de Medicina do País existe um movimento no sentido de começarem a contratar pedopsiquiatras para os Quadros das Universidades, para serem eles próprios a darem as matérias desta área. Os alunos fazem um estágio de uma semana nos serviços de psiquiatria e saúde mental infantil. Se bem que curto, pode já considerar-se um progresso. 3 As estruturas necessárias para uma acção directa em Saúde Mental Infanto-Juvenil são :

• Ambulatório • Hospital de Dia / Creches / Unidades Terapêuticas Específicas • Internamento

Tem havido um aumento considerável de pedidos de consultas, sobretudo à custa de fracassos escolares, problemas do comportamento, crianças negligenciadas, maltratadas e abusadas sexualmente, filhos de toxicodependentes. Além disso, as situações das famílias disfuncionais são cada vez mais graves. Os pedidos de ajuda são feitos directamente pela própria família ou através das instituições da comunidade. Nos últimos anos, as educadoras e as professoras têm melhor conhecimentos dos problemas emocionais e da necessidade duma resposta atempada para prevenir danos psicológicos mais incapacitantes e com mais pesadas consequências no futuro. Os problemas da pedopsiquiatria são muito específicos: a Infância é a “idade de ouro” para a prevenção. Assim, a Saúde Mental e a Psiquiatria Infantil, a par da sua intervenção directa (diagnóstico e tratamento) numa perspectiva de desenvolvimento, tem também a vertente preventiva. Será necessário desenvolver medidas específicas junto das comunidades, através da colaboração com outros sectores tais como Serviços Sociais, Justiça, Escola, ou seja, todos os que têm crianças e adolescentes à sua responsabilidade.

Page 24: PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma informação muito pobre. Além de ... permanecem demasiadas vezes mal esclarecidos. Por

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE MENTAL

24

Nas cinco Regiões de Saúde: No momento actual, não há nenhum médico ou técnico de saúde mental infanto-juvenil a trabalhar na Direcção de Serviços de Saúde Mental da Direcção Geral de Saúde. Na Região de Saúde do Norte há 23 Pedopsiquiatras para 150 Psiquiatras Gerais; há 6 Psicólogos da Saúde Mental Infantil para 23 dos Serviços de Psiquiatria. Na Região de Saúde do Centro há 11 Pedopsiquiatras para 96 Psiquiatras; há 2 Psicólogos dos Serviços de Infância para 16 dos serviços de adulto. Na Região Sul e Vale do Tejo há 30 Pedopsiquiatras para 176 Psiquiatras: há 14 Psicólogos dos serviços de infância para 26 Psicólogos dos serviços de adultos. Apenas nesta Região existe um Gabinete de Saúde Mental na sede, com funções consultivas, onde participa um pedopsiquiatra. Na Região de Saúde do Alentejo há 2 Pedopsiquiatras. Na Região de Saúde do Algarve foi assinado, em 06.11.01, um Protocolo de Colaboração entre a A.R.S. Algarve e o Hospital Dona Estefânia de Lisboa, visando a constituição de quatro equipas multidisciplinares na Área dos Cuidados de Saúde Primários, para atendimento de crianças e jovens com problemas de Saúde Mental. Haverá supervisão em casos de reconhecida dificuldade de abordagem e tratamento, a fazer pela Clínica do Parque do Departamento de Psiquiatria e Saúde Mental Infantil e Juvenil desse Hospital Dona Estefânia.

Nas Ilhas existem 2 Pedopsiquiatras e um interno. Nota: (Trata-se de dados obtidos in Psiquiatria e Saúde Mental – Rede de Referenciação Hospitalar, D.G.S., 2001). Será de acentuar, sobretudo, a insuficiência de número de técnicos e a sua má distribuição.

Page 25: PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma informação muito pobre. Além de ... permanecem demasiadas vezes mal esclarecidos. Por

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE MENTAL

25

PROBLEMAS E DESAFIOS As estruturas actuais de saúde mental infantil e juvenil, são insuficientes e desadaptadas para o cumprimento das recomendações da União Europeia, sendo Portugal um dos países da Europa mais atrasados em termos da organização desta área, devido à falta preocupante de técnicos. Esta situação não tem sido resolvida, apesar dos esforços desenvolvidos nos últimos anos. Os directores dos hospitais pediátricos, onde estão integrados os Departamentos, salvo ocasionais excepções, não estão suficientemente motivados e sensibilizados para esta área, pelo que não será de estranhar que afirmem que a pedopsiquiatria não seja prioritária. Se há quem coragem de assumir publicamente essa opinião, outros não o fazem, se bem que nas atitudes venham dar no mesmo. Com efeito, no confronto real com a morte da criança, poderia parecer legítimo que as opções se orientassem para outros campos que não os da saúde mental. No entanto, que dizer da “morte psíquica”? As crianças com perturbações invasivas do desenvolvimento (autismos e psicoses precoces) exigem, para serem convenientemente tratadas, uma convergência de diversos tipos de intervenções. São situações clínicas graves, que não curam completamente mas em que se podem prevenir défices importantes. Além disso, a experiência mostra a necessidade da continuidade dos cuidados, sendo necessárias todas as articulações para estabelecer essa continuidade na passagem de uma etapa à outra da vida. Incluindo a continuidade dos cuidados específicos (educação, trabalho, formação, etc.) tendo como pano de fundo a continuidade da existência. Não havendo essas articulações necessárias, interrompe-se o processo, correndo-se o risco de perder um trabalho de anos e anos, com graves prejuízos para o doente, família e sociedade! E que dizer das perturbações menos graves do desenvolvimento que frequentemente só são visíveis no insucesso escolar da criança? Ou as situações de depressão apenas reconhecidas de imediato quando surgem tentativas de suicídio, toxicodependência ou problemas graves do comportamento, como a marginalidade e a delinquência? É fundamental dar particular atenção à formação dos terapeutas e de todos os técnicos que possam integrar equipas multidisciplinares. A formação dos pedopsiquiatras tem na base uma organização assegurada pelo Internato Médico, que compreende a existência de “tutores” que funcionam nas equipas. No Departamento de Lisboa, os técnicos da área da pedagogia do ex-Centro de Saúde Mental Infantil e Juvenil de Lisboa, antigos discípulos de João dos Santos, constituem um património humano inexcedível e alguns exercem funções que ultrapassam em muito a área da pedagogia. Foi através da sua

Page 26: PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma informação muito pobre. Além de ... permanecem demasiadas vezes mal esclarecidos. Por

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE MENTAL

26

integração nas equipas, juntamente com outros técnicos, que se conseguiu um trabalho verdadeiramente inovador, actual ainda hoje. Acreditam, com Victor Hugo, que L’utopie c’est la vérité de demain. 1. Défice de pedopsiquiatras em formação :

A partir de 95/96 deu-se um aumento razoável de entradas na especialidade de Pedopsiquiatria. Houve um aumento considerável de vagas nos Hospitais gerais, onde as unidades de Pedopsiquiatria estão dependentes dos Departamentos de Psiquiatria ( excepto no Hospital de Santa Maria e no Hospital Garcia da Orta em Almada, onde dependem dos serviços de Pediatria). Será necessário que as regras sejam claras, para que não surjam problemas. Os Departamentos Pedopsiquiatria de Lisboa, Porto e Coimbra estão incluidos nos hospitais pediátricos. Em Lisboa, entre o número de Internos de entrada e os de saída, há um drop-out elevado, pelas seguintes razões: • alguns não tiveram entrada inicial na especialidade que pretendiam,

pelo que a tentam posteriormente, abandonando a pedopsiquiatria. • alguns estrangeiros (mais frequentemente espanhóis) regressam ao

país de origem. • alguns abandonam porque não se sentem vocacionados ou porque

não têm condições emocionais para prosseguirem uma carreira cuja formação é considerada difícil e complexa em todos os países.

Praticamente, todos os anos há internos que terminam o Internato, mas em número muito reduzido (2/3), se bem que a capacidade formativa declarada pelo Departamento de Lisboa seja de 6 Internos por ano. O Departamento de Coimbra declarou capacidade de formação apenas para 1 Interno e o do Porto declarou poder receber anualmente 4 Internos. Nestes Departamentos do Centro Hospitalar de Coimbra e do Hospital Maria Pia não há praticamente “drop-out.”

2. Foram ultrapassadas as dificuldades para a organização do

Internamento no Departamento de Saúde Mental Infantil e Juvenil de Lisboa do Hospital D. Estefânia, tendo sido inaugurada essa unidade a 10 de Outubro de 2001. A Unidade de Pedopsiquiatria do Hospital de Santarém beneficia de duas camas, cedidas pelo Departamento de Psiquiatria.

Lisboa era a única capital europeia que não tinha uma clínica de internamento para crianças. Trata-se, portanto, dum passo importante para se sair duma situação que parecia insuperável.

Page 27: PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma informação muito pobre. Além de ... permanecem demasiadas vezes mal esclarecidos. Por

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE MENTAL

27

3)- Os serviços de Pedopsiquiatria, além da intervenção directa, desenvolvem um trabalho importante a nível comunitário (apoios às creches, jardins de infância, escolas, etc.) já de longa tradição, que resultam na integração da criança no seu meio natural. Pode entender-se o alcance desta intervenção a longo prazo, tornando possível no futuro a não exclusão do doente mental na sociedade. Não basta afirmar que os doentes mentais não devem ser segregados. Será necessário, simultaneamente, um trabalho de longos anos, em que a participação das equipas de saúde mental infanto-juvenil tem um papel fundamental.

4)- Actualmente, apenas existem equipas multidisciplinares nos

Departamentos dos Hospitais Maria Pia (Região Norte); Centro Hospitalar de Coimbra (Região Centro); e Hospital D. Estefânia (Região de Lisboa e Vale do Tejo). No entanto, verifica-se um mal-estar crescente devido à lenta e progressiva saída de médicos e doutros técnicos, originando-se um verdadeiro “esvaziamento” e a quase impossibilidade de seguimentos terapêuticos.

5)- Há necessidade urgente de dotar todos os Departamentos e unidades de

saúde mental infantil e juvenil de equipas multidisciplinares, contrariando a tendência actual de uma progressiva medicalização das intervenções, face às dificuldades de aplicar outro tipo de tratamento e da directividade dessas intervenções centradas no orgânico. Este facto corresponde a um retrocesso de décadas na História da Psiquiatria Infanto-Juvenil em Portugal (e na Europa). Não nos podemos esquecer do aviso de especialistas, nacionais e estrangeiros, ao referirem que a administração de ansiolíticos na infância e da ritalina nas crianças com hiperactividade, preparam o “terreno” para a utilização das drogas na adolescência e na vida adulta! A limitação da intervenção pedopsiquiátrica às consultas e a resolução dos problemas da criança através da medicação, rapidamente leva à degradação dos serviços. É muito difícil um trabalho em pedopsiquiatria sem uma equipa de suporte, dada a multiplicidade e complexidade de tarefas ao nível do diagnóstico e da orientação terapêutica.

Page 28: PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma informação muito pobre. Além de ... permanecem demasiadas vezes mal esclarecidos. Por

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE MENTAL

28

OBJECTIVOS DE CURTO E DE MÉDIO PRAZO PARA A SAÚDE MENTAL INFANTIL E JUVENIL

• Nos próximos dois anos deveria dar-se prioridade à expansão das Unidades de Psiquiatria e Saúde Mental Infanto-Juvenil : As cinco Regiões do País estão divididas em Sub-Regiões que, por sua vez, têm várias Unidades de Saúde. Seria necessário criar Unidades ou Serviços de Pedopsiquiatria em todas as Unidades de Saúde das Sub-Regiões. A nível dos Centros de Saúde há vantagem em colocar técnicos para acções sobretudo indirectas, com possibilidade estabelecida de recorrer aos serviços centrais Departamentos e Unidades que funcionam na retaguarda.

• Depois desses dois anos, deveria seguir-se uma fase de consolidação

das Unidades de Pedopsiquiatria, com os seguintes objectivos:

1) Renovar os quadros de pessoal técnico, com aberturas de vagas que possibilitem a transmissão de conhecimentos e experiências.

2) Reforçar, com outro pessoal técnico, as Unidades de Pedopsiquiatria. Na maioria dos casos existem “embriões” dessas Unidades, beneficiando algumas delas do apoio de técnicos, ora dos Departamentos de Psiquiatria e Saúde Mental, ora da Pediatria e de outros Departamentos do Hospital, o que é francamente insuficiente. À medida que se desenvolvem, estas Unidades vão ocupando o seu próprio espaço, permitindo o desenvolvimento de equipas.

3) Melhorar a intervenção comunitária, desenvolvendo a colaboração com outros sectores: Centros de Saúde, Justiça, Educação, Serviços de intervenção social.

4) Desenvolver ou implementar a descentralização, através de núcleos de consultoria.

5) Prestar particular atenção à prevenção e sinalização precoce, desenvolvendo competências para o diagnóstico e apoiando serviços preventivos na comunidade (aconselhamento, apoio social, intervenção em crise, organizações de solidariedade).

6) Informatização do Programa Sonho, para permitir rever os critérios estatísticos, tendo que ser adaptado à classificação oficial portuguesa C.I.D.10.

7) Acrescentar internos na Especialidade, sobretudo no Departamento de Lisboa, para se poderem preencher vagas do Algarve, Alentejo, Madeira e Açores.

Page 29: PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma informação muito pobre. Além de ... permanecem demasiadas vezes mal esclarecidos. Por

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE MENTAL

29

8) Criar representantes de Pedopsiquiatria nas A.R.S. das regiões de Saúde do Norte e do Centro.

9) Definir a Carreira dos Psicólogos. CONCLUSÃO : Os Serviços de Saúde Mental Infantil e Juvenil deverão: • Integrar-se na comunidade e dirigir-se a pequenas áreas populacionais,

de forma a facilitar o acesso e a continuidade dos cuidados. • Facultar uma diversidade de cuidados à população a que se dirigem. • Garantir a continuidade dos cuidados em todas as fases do tratamento. • Garantir a qualidade dos cuidados. Para atingir estes objectivos será necessário implementar, a curto prazo, programas de inclusão da Saúde Mental Infantil e Juvenil na política nacional de saúde, aos níveis regional e local, fortalecendo a cooperação intersectorial. A política de saúde mental deve ter em conta o critério humano. Sabemos que o drama principal de muitas das nossas crianças é só poderem contar com a família, para as ajudar a sobreviver num mundo de angústias destruturantes. Mas quando os pais e os próximos não podem, ou não desejam assumir as funções básicas, essas só poderão ser realizadas por terapeutas, educadores, assistentes sociais e outros “profissionais da relação.” É muito difícil realizar um tal trabalho, se houver apenas o espectro dos custos económicos e se ficar no limiar do “faz-de-conta.” A maioria dos técnicos vive uma profunda insatisfação e frustração pela impossibilidade de realizar intervenções com a qualidade que essas patologias merecem.

Page 30: PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma informação muito pobre. Além de ... permanecem demasiadas vezes mal esclarecidos. Por

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE MENTAL

30

RELATÓRIO DA COMISSÃO DE REABILITAÇÃO PSICOSSOCIAL INTRODUÇÃO Foi intenção inicial desta Comissão encontrar um conceito de Reabilitação Psicossocial, no âmbito da prevenção terciária, que pudesse servir de base comum ao nosso trabalho. Podemos considerar a Reabilitação Psicossocial como o processo pelo qual a pessoa é ajudada a adaptar-se às limitações da sua incapacidade, a recuperar capacidades perdidas e a desenvolver novas competências, por forma a ultrapassar a situação de desvantagem psicológica e social que lhe adveio da sua perturbação psiquiátrica, tendo em vista melhorar a sua autonomia e a sua qualidade de vida. Reflectimos ainda que a Reabilitação tem duas vertentes, uma que inclui todo o processo de aprendizagem e treino de competências, outra que implica a criação e mobilização de suportes comunitários, com o respectivo enquadramento legal, nomeadamente o Despacho Conjunto 404/98 e a Portaria 348 A/98. Decidimos pois, avaliar os serviços de Reabilitação existentes na área da saúde mental, através de um inquérito dirigido às instituições públicas (adultos, crianças e adolescentes, Centros Regionais de Alcoologia e Serviço de Prevenção e Tratamento da Toxicodependência) e privadas de solidariedade social. E, por outro lado, fazer uma recolha de legislação, que se encontra à disposição do Conselho em dossier próprio. Apresentamos os resultados dessa avaliação, assim como algumas recomendações que nos parecem oportunas. Dadas as dificuldades logísticas relacionadas com o envio dos inquéritos, a recolha não foi completamente exaustiva. No entanto, a percentagem de respostas foi suficientemente significativa para nos permitir a análise da realidade predominante. No sector da toxicodependência, as respostas recebidas, ainda insuficientes, não foram contempladas nesta versão do relatório.

Page 31: PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma informação muito pobre. Além de ... permanecem demasiadas vezes mal esclarecidos. Por

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE MENTAL

31

1 – O ESTADO DA ARTE DA REABILITAÇÃO PSICOSSOCIAL NO PAÍS

1.1. Tendências A análise dos dados do inquérito lançado às instituições públicas e privadas de solidariedade social, revela que a reabilitação no campo da saúde mental teve um desenvolvimento extraordinário na última década no nosso país. O aparecimento de novos serviços e estruturas deveu-se, certamente, a um movimento de opinião fortemente emergente em vários grupos profissionais envolvidos na saúde mental, que deu origem à criação de instituições privadas de solidariedade social com fins de reabilitação. Foi também muito importante a influência da experiência de outros países da Europa, através das trocas proporcionadas pelos programas comunitários como o “Horizon” e outros, assim como a nova perspectiva de cooperação entre os serviços de reabilitação e o Instituto do Emprego e Formação Profissional (I.E.F.P.) que veio contribuir para este desenvolvimento, através do financiamento dos novos projectos. Este dinamismo atingiu os Hospitais Psiquiátricos, que estão a desenvolver diversos serviços de reabilitação, a fim de promover a desinstitucionalização dos doentes de evolução prolongada. Os Serviços e Departamentos de Psiquiatria dos Hospitais Gerais, mais condicionados nas suas opções pela dependência em relação aos respectivos Conselhos de Administração, muito marcados por uma lógica hospitalar e pouco abertos a favorecer a criação de serviços de reabilitação, tiveram que recorrer a protocolos com as instituições privadas de solidariedade social para desenvolver esses programas. 1.2. Recursos Verifica-se que os Serviços e Departamentos de Psiquiatria dispõem apenas de terapia ocupacional, hospital ou unidade de dia, por vezes grupos de auto-ajuda e grupos de famílias. Referem ainda o apoio domiciliário, mas apenas como intervenção pontual e não como um serviço organizado dirigido à aquisição das competências da vida diária.

Page 32: PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma informação muito pobre. Além de ... permanecem demasiadas vezes mal esclarecidos. Por

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE MENTAL

32

Os Hospitais Psiquiátricos dispõem de um leque mais alargado de serviços: terapia ocupacional, hospital de dia, formação profissional, empresas de inserção, unidades residenciais, grupos de auto-ajuda e grupos de famílias. Quanto às instituições privadas de solidariedade social, elas cobrem, no seu conjunto, embora com diversas combinações, quase todas as hipóteses previstas no inquérito: orientação profissional, formação profissional, apoio na procura de emprego, UNIVA, emprego apoiado, apoio post-contratação, empresa de inserção, forum socio-ocupacional, unidades de vida, apoiada, protegida e autónoma, grupos de auto-ajuda, grupos de famílias e apoio domiciliário. Os serviços mais frequentes são a formação profissional, apoio na procura de emprego e apoio post-contratação, o que se compreende à luz da existência, já de longa data, de legislação e financiamento para este tipo de projectos, através do I.E.F.P. Os menos frequentes são as empresas de inserção, as escolas-oficina, o emprego apoiado, as unidades de vida autónoma e o apoio domiciliário. As unidades de vida apoiada e protegida estão razoavelmente representadas, mas são ainda insuficientes para as necessidades da população-alvo. No que se refere às Unidades de Vida e Foruns Socio-ocupacionais, alguns foram criados ao abrigo do despacho Conjunto 407/98, outros são informais e eventualmente já existiam antes. 1.3. Dificuldades Da análise das dificuldades resulta como a mais premente a falta de pessoal qualificado para fazer face às tarefas da reabilitação, proveniente não só da falta de financiamento, como da inadequação dos quadros de pessoal e ainda da escassez de formação. Encontra-se ainda referida a escassez de estruturas e serviços face às necessidades da população-alvo, nomeadamente de unidades residenciais, sendo por vezes apontada como causa a dificuldade de obter instalações adequadas. O atraso no pagamento dos financiamentos, a burocracia excessiva, a falta de autonomia técnica e financeira (nos serviços públicos) foram sentidos como obstáculos ao desenvolvimento de programas de reabilitação. Finalmente, foram referidas dificuldades de inserção dos doentes no mercado de trabalho e ausência de medidas que permitam a acumulação de rendimentos das pensões de invalidez com os rendimentos do trabalho protegido a tempo parcial.

Page 33: PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma informação muito pobre. Além de ... permanecem demasiadas vezes mal esclarecidos. Por

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE MENTAL

33

2 – SUGESTÕES E RECOMENDAÇÕES Face à análise feita anteriormente, deveriam ser implementadas medidas que permitissem: 2.1 – A realocação de recursos nos serviços públicos, canalizando as

verbas que são progressivamente desafectadas dos Hospitais Psiquiátricos, à medida que se reduzem os seus efectivos em doentes de evolução prolongada, para a criação de serviços de reabilitação na comunidade.

2.2– Aproveitamento pelos serviços públicos, nomeadamente os

Departamentos e Serviços de Psiquiatria, de novas formas de enquadramento e de financiamento, tais como as provenientes do Plano Nacional dos Cuidados Continuados Integrados, em preparação.

2.3 – Desenvolvimento de serviços de apoio domiciliário estruturado,

adequado às necessidades de reabilitação, isto é, de serviços de intervenção no domicílio com o objectivo de promover a aquisição de competências de vida diária e não com a finalidade de substituir o doente no desempenho dessas actividades.

2.4 – Facilitação dos processos de candidatura e melhoria dos

financiamentos para as Unidades de Vida, para promover a sua disseminação pelas zonas mais carenciadas do país.

2.5 – Avaliação pela Comissão para o Mercado Social do Emprego dos

resultados obtidos com a modalidade “empresas de inserção” com doentes psiquiátricos, de modo a ajustar a medida às suas necessidades. Nomeadamente a existência de um técnico ou equipa de acompanhamento deveria ser financiada pela medida.

2.6 – Promover maior informação e participação dos utentes e famílias nos

processos de decisão e na avaliação dos serviços de reabilitação. 2.7- Concessão de juro bonificado para compra de habitação a instituições

sem fins lucrativos que trabalhem em reabilitação psicossocial.

Page 34: PROPOSTAS E RECOMENDAÇÕES - sg.min-saude.pt · por suicídio, o que só por si fornece uma informação muito pobre. Além de ... permanecem demasiadas vezes mal esclarecidos. Por

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE MENTAL

34

2.8 – Acumular os rendimentos de pensões sociais de invalidez com rendimentos de trabalho protegido ou em tempo parcial, até ao valor do salário mínimo nacional.

2.9 – Chamar a atenção das Autarquias para a necessidade de cedência de

espaços habitacionais para estruturas de reabilitação. 2.10 – Desenvolvimento de acções de formação para técnicos de

reabilitação. 2.11 – Desenvolvimento de serviços de voluntariado social com formação

adequada para trabalhar em saúde mental e reabilitação. 2.12 – Criação de melhores incentivos ao emprego de pessoas com

problemas de saúde mental. 2.13 – Facilitação das parcerias entre o sector público e o privado. 2.14 – Desenvolvimento de metodologias de emprego apoiado e respectivo

enquadramento legal. 2.15 – Apoiar instituições que desenvolvem diversos tipos de acções de

reabilitação, tais como: S.O.S. telefone, apoio psicossocial, sessões psico-educacionais, e divulgação através de documentação impressa.

Finalmente uma recomendação de carácter mais geral nos parece oportuna: que se favoreça a diversidade de estruturas, para que se respeitem os diferentes níveis de dependência dos doentes, os quais exigem níveis de resposta diversos e com diferentes graus de intervenção, no âmbito de um planeamento rigoroso e da uma articulação com a Rede de Referenciação Hospitalar de Psiquiatria e Saúde Mental.