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PRÁTICA PENAL DELEGADO DE POLÍCIA 5ª edição revista, ampliada e atualizada MÁRCIO ALBERTO GOMES SILVA 2021

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PRÁTICA PENALDELEGADO DE POLÍCIA

5ª ediçãorevista, ampliada e atualizada

MÁRCIO ALBERTO GOMES SILVA

2021

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Capítulo 1

INQUÉRITO POLICIAL

A voo de pássaro, inquérito policial pode ser conceituado como procedi-mento administrativo, sigiloso, escrito, investigativo ou apuratório1, dispensável (mas obrigatório), indisponível, elaborado pela polícia judiciária (presidido por delegado de polícia de carreira), que tem por objetivo elucidar fato suposta-mente criminoso (não se pode perder de vista a possibilidade de, ao final do apuratório, restar demonstrado que não houve crime – quando se conclui, por exemplo, que a morte suspeita foi um suicídio). Caso se constate que o fato investigado é efetivamente criminoso, o inquérito deve ter em mira coligir indí-cios de autoria e prova da materialidade do delito.

Analisando os elementos do conceito acima rabiscado, temos:Procedimento administrativo: é administrativo em contraposição ao processo, que é judicial. É importante salientar que, em que pese ser o inquérito policial descrito e delineado pelo Código de Processo Penal, ele não conta com uma sequência de atos predeterminada pelo legisla-dor, tal qual o processo. As diligências ordenadas pelo delegado de polí-cia são discricionárias (o que não retira da autoridade policial o dever de seguir o ritual imposto pelo CPP para produção da prova que tenciona coligir).Sigiloso: o sigilo deve ser mantido para facilitar as investigações, con-forme determina o artigo 20 do CPP. Alhures, quando da análise de despacho que nega o acesso do feito ao advogado, farei estudo mais pro-fícuo do sigilo, em especial do inciso XIV e dos §§ 10 a 12 do artigo 7º do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil – Lei 8.906/94 e da Súmula Vinculante 14.

1 A doutrina tradicional afirma que o inquérito policial é inquisitivo. Opto, a partir dessa edição, por abandonar por completo essa nomenclatura, que remonta ao sis-tema processual inquisitivo (medieval, secreto, pautado pelo desrespeito aos direi-tos/garantias fundamentais da pessoa investigada, utilizado para perseguir mulheres apontadas como bruxas durante a Inquisição).

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Escrito: todos os atos devem ser reduzidos à forma escrita, conforme determinado pelo artigo 9º do CPP. Nesta toada, o delegado de polícia deve cuidar de determinar que todos os atos praticados no curso do feito sejam documentados (apreensões e entregas de bens, vistas concedidas a advogados, dentre outros atos). A autoridade policial deve ter espe-cial cuidado em relação às apreensões levadas a efeito no curso do feito. É importante que seja cuidadosamente documentado todo ingresso de itens no bojo do inquérito, o local onde os mesmos ficarão guardados até que se ultime a investigação (em geral nos depósitos das delegacias) e o destino final dos bens quando do encerramento do feito (se foram devolvidos a seus donos, se acompanharão o inquérito quando do seu envio à justiça, se serão objeto de destruição, etc.). Tudo por escrito.Investigativo ou apuratório: no curso do inquérito policial não vigora o princípio do contraditório, presente apenas na fase processual. Emrápidas linhas, o direito ao contraditório se traduz na necessidade deaudiência bilateral. Na oportunidade dada à parte de se manifestar acer-ca da prova produzida pela parte adversa. Em sede de inquérito policial,não há que se falar na existência de partes, nem na existência de acusa-ção formal em face de alguém, daí porque desnecessário o contraditório.Em que pese investigativo, admite-se que o investigado/indiciado indique ou solicite a juntada de provas ou documentos com o fito de comprovar suas alegações (artigo 14 do CPP). A efetiva produção da prova requerida ou a juntada de documentos solicitada pelo investigado/indiciado está na esfera da discricionariedade da autoridade policial, que pode julgá-las irre-levantes ou protelatórias. Em um caso ou em outro (admissão da prova ou rejeição da mesma), deve o delegado despachar de forma fundamentada.De igual forma, o direito do investigado/indiciado de se fazer acompa-nhar por advogado ou defensor público é evidente. O que não se exige é a indispensabilidade da presença do causídico. Nesta toada, é impor-tante a análise do inciso XXI do artigo 7º do EOAB, inserido pela Lei 13.245/16:

Art. 7º. São direitos do advogado:

(...)

XXI – assistir a seus clientes investigados durante a apuração de infrações, sob pena de nulidade absoluta do respectivo interrogatório ou depoimento e, subsequentemente, de todos os elementos investigatórios e probatórios dele decorrentes ou derivados, direta ou indiretamente, podendo, inclusive, no curso da respectiva apuração:

a) apresentar razões e quesitos;

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Capítulo 1: Inquérito policial29

A leitura do dispositivo deixa claro que é direito do advogado assistir a seu cliente no bojo do procedimento investigativo criminal. O direito não pode ser confundido com a necessidade de presença obrigatória de advogado em toda e qualquer oitiva na seara policial. O investigado/in-diciado tem direito, como dito supra, de constituir, se quiser, advogado. Uma vez constituído, o delegado de polícia não pode impedir que o cau-sídico acompanhe seu cliente na oitiva, sob pena de nulidade absoluta do ato, nos termos do dispositivo acima transcrito (e de eventual prática do crime de abuso de autoridade pelo delegado de polícia, na forma dos artigos 7º-B da Lei 8.906/942 e 20 da Lei 13.869/19, presente o especial fim de agir reclamado pelo § 1º do artigo 1º deste mandamento legal). É preciso salientar ainda que caso o cidadão seja investigado em mais de um procedimento, será necessário demonstrar a constituição de advo-gado em cada um dos feitos (caso se tencione a obrigatória participação do causídico em todos os apuratórios).No curso da oitiva, fica claro que o advogado poderá apresentar razões (eventual petição explicitando a versão do seu cliente e indicando meios probantes que a sustentem – a efetiva materialização das diligências so-licitadas pelo causídico, como já desenhado supra, será decidida fun-damentadamente pelo delegado) e quesitos (sugestiono que o delegado faça as perguntas que entender pertinentes ao esclarecimento dos fatos e, ao final, permita que o advogado formule quesitos a seu cliente – caso a autoridade policial entenda que alguma pergunta é impertinente, po-de indeferir a mesma, fazendo constar os motivos no termo).Outro ponto: o delegado avaliará o pedido de adiamento da audiência previamente agendada em face da impossibilidade de comparecimento do advogado do investigado/indiciado. Caso se perceba que se trata de expediente procrastinatório, não vejo problema no seu indeferimento, dando-se ciência a ambos (investigado/indiciado e advogado). Em re-gra, não há problema em adiar a audiência e tal mudança de data não afeta sobremaneira o curso do procedimento investigativo.Importante salientar que o artigo 14-A do Código de Processo Penal3, com redação determinada pela Lei 13.964/19 (Pacote Anticrime) pare-ce ter enxertado hipótese de participação obrigatória de advogado no

2 Com redação determinada pela Lei 13.869/19.3 Art. 14-A. Nos casos em que servidores vinculados às instituições dispostas no art.

144 da Constituição Federal figurarem como investigados em inquéritos policiais, in-quéritos policiais militares e demais procedimentos extrajudiciais, cujo objeto for a investigação de fatos relacionados ao uso da força letal praticados no exercício profis-sional, de forma consumada ou tentada, incluindo as situações dispostas no art. 23 do

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curso do inquérito policial (quando a investigação versar sobre fatos relacionados ao uso de força letal praticados por servidores vincula-dos às instituições listadas no artigo 144 da Constituição Federal, no exercício profissional, de forma consumada ou tentada). É que referido dispositivo determinou a citação4 do investigado acerca da instauração do inquérito, facultando-lhe a constituição de advogado no prazo de 48 horas. Caso não seja nomeado defensor pelo investigado, a autoridade policial deverá intimar a instituição a que estava vinculado o servidor à época dos fatos para que esta indique defensor para sua representação, também no prazo de 48 horas (o disposto no artigo também se aplica aos servidores militares listados no artigo 142 da Constituição Federal, quando os fatos investigados se relacionarem com missões para Garan-tia da Lei e da Ordem).Penso que andou mal o legislador, ao determinar obrigatoriedade de constituição de advogado no bojo de inquérito policial (como dito supra, a constituição de advogado é direito conferido ao investigado/indiciado, não sendo o causídico um sujeito obrigatório ao curso da in-vestigação). Outra falha: a citação do investigado acerca do início da investigação afeta a necessidade de sigilo interno para o tranquilo an-damento do trabalho apuratório, podendo afetar a coleta de elementos informativos e provas de eventual prática delitiva.Se o servidor vinculado às forças listadas no artigo 144 da Constituição Federal usar de força letal em evento não relacionado ao exercício das

Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), o indiciado poderá constituir defensor.      § 1º Para os casos previstos no caput deste artigo, o investigado deverá ser citado da instauração do procedimento investigatório, podendo constituir defensor no prazo de até 48 (quarenta e oito) horas a contar do recebimento da citação.§ 2º Esgotado o prazo disposto no § 1º deste artigo com ausência de nomeação de defensor pelo investigado, a autoridade responsável pela investigação deverá intimar a instituição a que estava vinculado o investigado à época da ocorrência dos fatos, para que essa, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, indique defensor para a representa-ção do investigado.§ 3º (VETADO).§ 4º (VETADO).§ 5º (VETADO).§ 6º As disposições constantes deste artigo se aplicam aos servidores militares vincu-lados às instituições dispostas no art. 142 da Constituição Federal, desde que os fatos investigados digam respeito a missões para a Garantia da Lei e da Ordem.

4 Trata-se de termo equivocado, vez que citação significa cientificar alguém da existên-cia de uma acusação, chamando o citado a se defender. Na verdade, a natureza do ato “citatório” determinado pela lei é de notificação.

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Capítulo 1: Inquérito policial43

Modelo 2 – Ofício encaminhando notícia de crime eleitoral ao Minis-tério Público Eleitoral

Ofício nº _____ (número do expediente)

_______ (local), __de ____de____ (data).

A Sua Excelência o Senhor

__________ (nome do Promotor Eleitoral)

Promotor Eleitoral titular da ___ Zona Eleitoral (indicar zona eleito-ral do MPE)

Assunto: encaminha notícia de crime

Senhor Promotor Eleitoral,

Sirvo-me do presente para comunicar a Vossa Excelência a possível ocorrência do crime de corrupção eleitoral, tipificado no artigo 299 do Código Eleitoral (Lei 4.737/65).

Aportou na Polícia Federal notícia de crime prestada pelo eleitor ______ (nome do noticiante), que relatou suposta compra de vo-tos realizadas pelo candidato ao cargo de prefeito do Município de _______ (cidade), ________ (nome do suposto autor do fato).

De acordo com a narrativa do noticiante, o autor do fato estaria pro-movendo reuniões em sua propriedade rural, recolhendo os números dos títulos dos munícipes e fornecendo-lhes dinheiro e outras benes-ses (tijolos, dentaduras, roupas, etc.) em troca de votos nas eleições que se avizinham.

Em levantamento de campo materializado com o fito de atestar a verossimilhança da notícia, o aparelho policial constatou que tais re-uniões vêm, de fato ocorrendo e que há suspeita de distribuição de vantagens indevidas (vide informação em anexo).

Diante deste quadro, cumpre, nos termos do artigo 8º da Resolução 23.396, de 17 de dezembro de 2013, do TSE (alterada pela Resolu-ção 23.424, de 27 de maio de 2014), encaminhar a presente notícia ao juízo Eleitoral para análise e eventual encaminhamento de requi-sição para instauração de inquérito policial.

Atenciosamente,

Márcio Alberto Gomes Silva Delegado de Polícia Federal

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Observações relevantes

A Resolução 23.396/2013 do TSE (alterada pela Resolução 23.424) afirma em seu artigo 8º que o inquérito policial para apuração de crime eleitoral (de atribuição da Polícia Federal) só pode ser instaurado mediante requisição da Justiça Eleitoral (seguindo a linha acima adotada, parece-me que a requisição de instauração de inquérito policial pelo Judiciário afronta o sistema processual idealizado pela Lei 13.964/19, razão pela qual penso que as requisições para instauração de inquérito policial por suposta prática de crime eleitoral devem partir unicamente do MPE) ou do Ministério Público Eleitoral.

O artigo citado da resolução em questão (em sua redação original que só permitia o início do inquérito policial para apuração de crime eleitoral median-te requisição da Justiça Eleitoral) foi suspenso por medida cautelar do Pretório Excelso, nos autos da ADI 5.104 (o Procurador-Geral da República afirmou ofensa ao sistema acusatório, porque a requisição, nos termos do dispositivo atacado, só podia ser materializada pelo Poder Judiciário).

Depois da suspensão do artigo por decisão do STF, o TSE editou a Resolu-ção 23.424/2014, incluindo a legitimação do Ministério Público Eleitoral para requisitar início de inquérito policial para apurar crime eleitoral no artigo 8º da Resolução 23.396.

Penso que o artigo 8º da Resolução 23.396 do TSE (tanto a redação revoga-da, quanto a atual) não se justifica. Parece-me teratológico limitar a atuação do Estado-Investigação na apuração de crimes eleitorais, condicionando a instau-ração de inquérito policial à requisição do Judiciário e do MPE.

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Capítulo 2

PROVAS

2.1. Introito

O presente capítulo tratará da materialização dos elementos informativos e das provas em espécie no curso do inquérito policial (o inquérito policial não é procedimento meramente informativo, vez que nele é possível a coleta de pro-vas). É extremamente relevante atentar para colheita hígida de provas no bojo do procedimento inquisitivo, evitando funesta declaração futura de nulidade, que poderá redundar na absolvição do real autor do fato.

2.2. Cadeia de custódia

O Pacote Anticrime inseriu no Código de Processo Penal o conceito de ca-deia de custódia (caput) e de vestígio (§ 3º) no artigo 158-A (mera leitura) – parece-me que o desrespeito à cadeia de custódia não induz necessariamente a nulidade da prova pericial (as conclusões dos peritos podem ser fragilizadas pelo desrespeito às prescrições do CPP, mas não vislumbro necessária nulidade na inobservâncias das regras que gravitam em torno da cadeia de custódia):

Art. 158-A. Considera-se cadeia de custódia o conjunto de todos os proce-dimentos utilizados para manter e documentar a história cronológica do vestígio coletado em locais ou em vítimas de crimes, para rastrear sua posse e manuseio a partir de seu reconhecimento até o descarte.

§ 1º O início da cadeia de custódia dá-se com a preservação do local de crime ou com procedimentos policiais ou periciais nos quais seja detectada a existência de vestígio.

§ 2º O agente público que reconhecer um elemento como de potencial inte-resse para a produção da prova pericial fica responsável por sua preservação.

§ 3º Vestígio é todo objeto ou material bruto, visível ou latente, constatado ou recolhido, que se relaciona à infração penal.

O artigo 158-B descreve as etapas da cadeia de custódia:

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Art. 158-B. A cadeia de custódia compreende o rastreamento do vestígio nas seguintes etapas:

I - reconhecimento: ato de distinguir um elemento como de potencial inte-resse para a produção da prova pericial;

II - isolamento: ato de evitar que se altere o estado das coisas, devendo isolar e preservar o ambiente imediato, mediato e relacionado aos vestígios e lo-cal de crime;

III - fixação: descrição detalhada do vestígio conforme se encontra no local de crime ou no corpo de delito, e a sua posição na área de exames, podendo ser ilustrada por fotografias, filmagens ou croqui, sendo indispensável a sua des-crição no laudo pericial produzido pelo perito responsável pelo atendimento;

IV - coleta: ato de recolher o vestígio que será submetido à análise pericial, respeitando suas características e natureza;

V - acondicionamento: procedimento por meio do qual cada vestígio coleta-do é embalado de forma individualizada, de acordo com suas características físicas, químicas e biológicas, para posterior análise, com anotação da data, hora e nome de quem realizou a coleta e o acondicionamento;

VI - transporte: ato de transferir o vestígio de um local para o outro, utili-zando as condições adequadas (embalagens, veículos, temperatura, entre ou-tras), de modo a garantir a manutenção de suas características originais, bem como o controle de sua posse;

VII - recebimento: ato formal de transferência da posse do vestígio, que deve ser documentado com, no mínimo, informações referentes ao número de procedimento e unidade de polícia judiciária relacionada, local de origem, nome de quem transportou o vestígio, código de rastreamento, natureza do exame, tipo do vestígio, protocolo, assinatura e identificação de quem o recebeu;

VIII - processamento: exame pericial em si, manipulação do vestígio de acor-do com a metodologia adequada às suas características biológicas, físicas e químicas, a fim de se obter o resultado desejado, que deverá ser formalizado em laudo produzido por perito;

IX - armazenamento: procedimento referente à guarda, em condições ade-quadas, do material a ser processado, guardado para realização de contra-perícia, descartado ou transportado, com vinculação ao número do laudo correspondente;

X - descarte: procedimento referente à liberação do vestígio, respeitando a legislação vigente e, quando pertinente, mediante autorização judicial.

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Capítulo 2: Provas183

Confira tabela para facilitar a memorização:

Etapa Conceito

Reconhecimento Ato de distinguir um elemento como de potencial in-teresse para a produção da prova pericial

Isolamento Ato de evitar que se altere o estado das coisas, de-vendo isolar e preservar o ambiente imediato, mediato e relacionado aos vestígios e local de crime

Fixação Descrição detalhada do vestígio conforme se encontra no local de crime ou no corpo de delito, e a sua po-sição na área de exames, podendo ser ilustrada por fotografias, filmagens ou croqui, sendo indispensável a sua descrição no laudo pericial produzido pelo perito responsável pelo atendimento

Coleta Ato de recolher o vestígio que será submetido à análi-se pericial, respeitando suas características e natureza

Acondicionamento Procedimento por meio do qual cada vestígio coletado é embalado de forma individualizada, de acordo com suas características físicas, químicas e biológicas, para posterior análise, com anotação da data, hora e nome de quem realizou a coleta e o acondicionamento

Transporte Ato de transferir o vestígio de um local para o outro, utilizando as condições adequadas (embalagens, veí-culos, temperatura, entre outras), de modo a garantir a manutenção de suas características originais, bem como o controle de sua posse

Recebimento Ato formal de transferência da posse do vestígio, que deve ser documentado com, no mínimo, informações referentes ao número de procedimento e unidade de polícia judiciária relacionada, local de origem, nome de quem transportou o vestígio, código de rastreamento, natureza do exame, tipo do vestígio, protocolo, assi-natura e identificação de quem o recebeu

Processamento Exame pericial em si, manipulação do vestígio de acordo com a metodologia adequada às suas carac-terísticas biológicas, físicas e químicas, a fim de se obter o resultado desejado, que deverá ser formali-zado em laudo produzido por perito

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Modelo 1 – Perícia em local de morte violenta

a) Qual a descrição da cena do crime?

b) Qual a data e o horário provável do evento?

c) Quantas pessoas participaram do evento?

d) Qual a dinâmica do evento? Como se deu a morte?

e) Há vestígios que possam auxiliar na indicação de autor do crime(material biológico, fragmentos de impressões digitais, pedaços deroupas, etc.)?

f) Houve utilização de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ououtro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo co-mum?

g) Houve traição, emboscada, dissimulação ou outro recurso que di-ficultou ou tornou impossível a defesa da vítima?

h) Analisando as lesões evidenciadas no cadáver, é possível indicara arma/instrumento usado para prática do crime?

i) Outros dados úteis a juízo do corpo técnico.

Observações relevantes

A perícia em local de morte violenta é fundamental para elucidação do cri-me. É preciso detectar quantas pessoas participaram do evento, como se deu a morte, qual arma do crime, se há vestígios que auxiliem na elucidação do delito, dentre outras importantes questões que a perícia pode ser chamada a responder.

A par disso, a equipe de policiais lotada na unidade policial deverá diligen-ciar nas proximidades da cena, identificando testemunhas, câmeras que tenham gravado a ação, entrevistando parentes e amigos (para levantar possíveis moti-vações e suspeitos).

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Capítulo 3

PRISÕES CAUTELARES

3.1. Generalidades sobre a prisão cautelar

Aqui analisaremos a prisão em flagrante, a prisão preventiva e a pri-são temporária.

Genericamente, para decretação da prisão preventiva ou temporária, será preciso demonstrar o fumus comissi delicti e o periculum libertatis. O primeiro é representado pela existência de prova de materialidade delitiva e indícios sufi-cientes de autoria; o segundo pelo perigo à sociedade representado pela liberda-de do sujeito ativo da prática delitógena.

Acerca do tema, chamo a atenção para leitura do artigo 84 da Lei de Execu-ções Penais (Lei 7.210/84):

Art. 84. O preso provisório ficará separado do condenado por sentença transitada em julgado.

§ 1º Os presos provisórios ficarão separados de acordo com os seguintes critérios:

I – acusados pela prática de crimes hediondos ou equiparados;

II – acusados pela prática de crimes cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa;

III – acusados pela prática de outros crimes ou contravenções diversos dos apontados nos incisos I e II.

§ 2º O preso que, ao tempo do fato, era funcionário da Administração da Justiça Criminal ficará em dependência separada.

§ 3º Os presos condenados ficarão separados de acordo com os seguintes critérios:

I – condenados pela prática de crimes hediondos ou equiparados;

II – reincidentes condenados pela prática de crimes cometidos com violên-cia ou grave ameaça à pessoa;

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III – primários condenados pela prática de crimes cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa;

IV – demais condenados pela prática de outros crimes ou contravenções em situação diversa das previstas nos incisos I, II e III.

§ 4º O preso que tiver sua integridade física, moral ou psicológica ameaçadapela convivência com os demais presos ficará segregado em local próprio.

Caso repute interessante, o delegado de polícia poderá representar, alterna-tivamente (em atenção ao princípio da eventualidade, no bojo de uma represen-tação por decretação de prisão cautelar) ou isoladamente a decretação de uma das medidas cautelares diversas da prisão descritas no artigo 319 do CPP:

Art. 319. São medidas cautelares diversas da prisão:

I – comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades;

II – proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permane-cer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações;

III – proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela per-manecer distante;

IV – proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja con-veniente ou necessária para a investigação ou instrução;

V – recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quan-do o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos;

VI – suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais;

VII – internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inim-putável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração;

VIII – fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o compareci-mento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial;

IX – monitoração eletrônica.

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Capítulo 3: Prisões cautelares307

3.2. O uso de algemas

O aparelho policial deve justificar o uso de algemas, na forma prescrita pela Súmula Vinculante 11:

Súmula Vinculante 11: Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agen-te ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado.

Importante salientar que, nos termos do parágrafo único, do artigo 292, do Código de Processo Penal (acrescentado pela Lei 13.434/17), é vedado usar al-gemas em mulheres grávidas durante a preparação para o parto, bem como no período de puerpério imediato:

Art. 292. (...)

Parágrafo único. É vedado o uso de algemas em mulheres grávidas durante os atos médico-hospitalares preparatórios para a realização do parto e du-rante o trabalho de parto, bem como em mulheres durante o período de puerpério imediato.

Por fim, cumpre deixar claro que não há exigência de termo ou auto pró-prio, podendo o uso de algemas ser justificado no bojo do auto de prisão em flagrante, em relatório de ocorrência policial da polícia militar, em despacho nos autos do inquérito ou em peça própria criada pela autoridade para esse fim (a seguir, sugestiono modelo de auto).

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Modelo – Auto circunstanciado de prisão com uso de algemas

OPERAÇÃO ____ (nome da operação)

AUTO CIRCUNSTANCIADO DE PRISÃO

EQUIPE ___ (número da equipe)

Às ___h___ (horário da prisão) do dia __/__/_____ (data da pri-são), nesta cidade de _______ (cidade da prisão), em cumprimento ao mandado de prisão expedido no interesse do Inquérito Policial nº _____ (número do inquérito), Processo nº ______ (número do processo referente à medida cautelar de prisão temporária/pre-ventiva), que tramita na __ Vara Criminal da Comarca de ________ (juízo que determinou a prisão), a equipe de policiais, formada por ___________, matrícula _____, ________________, matrícula _____, e ____________, matrícula _____ (nome dos policiais que efetuaram a prisão do alvo) PRENDEU ___________________ (nome do preso), entregando-lhe uma via do mandado de prisão, com estrita observância das formalidades legais previstas no artigo 286 do Código de Processo Penal, e cientificando o detido acerca de seus direitos expressos no artigo 5º, incisos XLIX, LXII, LXIII, LXIV da Constituição da Federal.

Observações relevantes (neste tópico os policiais descreverão como a prisão se deu e porque foi necessário usar algemas, nos termos da Súmula Vinculante 11):

Nada mais havendo, encerra-se o presente auto, que depois de lido e achado conforme, é assinado pelos policiais que participaram da prisão.

Policial: _______________________________________________

Policial: _______________________________________________

Policial: _______________________________________________

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Capítulo 4

PEÇAS PRÁTICAS DE CONCURSOS PÚBLICOS

4.1. Estrutura geral da representação em concursos públicos (pe-tição)

O delegado de polícia pode, no curso do inquérito policial, lançar mão de várias diligências aptas a elucidar o fato criminoso investigado. Como visto su-pra, algumas destas técnicas se traduzem em medidas cautelares judicialmente determinadas (atendendo a representações formuladas pela autoridade policial) – busca e apreensão, interceptação telefônica, interceptação telemática, infiltra-ção policial, quebra de sigilo fiscal, quebra de sigilo bancário, dentre outras. Há ainda medidas cautelares que tencionam acautelar a investigação, seja por meio da segregação cautelar do investigado/indiciado (prisão temporária e pri-são preventiva), seja por meio das chamadas medidas assecuratórias (sequestro, arresto e hipoteca legal).

Esta parte final da obra é voltada para aspirantes ao cargo de delegado de polícia e tem o objetivo de demonstrar como devem ser confeccionadas repre-sentações e outras peças em concursos públicos. Tratarei da estrutura geral da representação (a peça mais complexa) e dos pleitos que considero mais impor-tantes – busca e apreensão, prisão preventiva, prisão temporária, interceptação telefônica e infiltração policial (até porque todos os outros pleitos cautelares já foram desenhados nos itens retro).

Em concursos públicos, as bancas normalmente cobram a confecção de uma representação e diversos são os pontos a serem observados pelo candidato, com o fito de obter a nota máxima (competência, tipificação de crimes, escolha da medida cautelar correta, indicação da fundamentação legal, pedidos, dentre outros aspectos).

Com o fito de ampliar a preparação do candidato, trarei quesitos que envol-vam confecção de portaria e de decretação de medida protetiva pelo delegado.

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Em primeiro lugar, é preciso organizar sua peça. Uma representação (ou qualquer outra peça) elaborada corretamente, tópico a tópico, torna a leitura agradável e o examinador poderá identificar mais facilmente os pontos recla-mados pelo espelho de correção.

A sugestão para montagem da representação cobrada em concursos públi-cos é a seguinte (prefira a peça elaborada na forma de petição):

Endereçamento: o candidato, atento às regras relativas à competência fixadas no Código de Processo Penal (artigos 69 e seguintes), aos en-sinamentos da doutrina e às Súmulas dos Tribunais Superiores, deve dirigir a peça ao juízo competente. Atente que o Pacote Anticrime deter-minou atuação do juízo das garantias na fase pré-processual.Nesse tópico é preciso avaliar o quanto decidido pelo Supremo Tribunal Federal, no bojo da Ação Penal 937, que restringiu o foro por prerroga-tiva de função de deputados federais e senadores. Eis o julgado:

O Tribunal, por maioria e nos termos do voto do Relator, resolveu ques-tão de ordem no sentido de fixar as seguintes teses: “(i) O foro por prer-rogativa de função aplica-se apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas; e (ii) Após o final da instrução processual, com a publicação do despacho de intima-ção para apresentação de alegações finais, a competência para processare julgar ações penais não será mais afetada em razão de o agente públicovir a ocupar outro cargo ou deixar o cargo que ocupava, qualquer queseja o motivo”, com o entendimento de que esta nova linha interpretativadeve se aplicar imediatamente aos processos em curso, com a ressalva detodos os atos praticados e decisões proferidas pelo STF e pelos demaisjuízos com base na jurisprudência anterior, conforme precedente firma-do na Questão de Ordem no Inquérito 687 (Rel. Min. Sydney Sanches, j.25.08.1999), e, como resultado, no caso concreto, determinando a baixada ação penal ao Juízo da 256ª Zona Eleitoral do Rio de Janeiro para jul-gamento, tendo em vista que (i) os crimes imputados ao réu não foramcometidos no cargo de Deputado Federal ou em razão dele, (ii) o réu re-nunciou ao cargo para assumir a Prefeitura de Cabo Frio, e (iii) a instru-ção processual se encerrou perante a 1ª instância, antes do deslocamentode competência para o Supremo Tribunal Federal. Vencidos: em parte,os Ministros Alexandre de Moraes e Ricardo Lewandowski, que diver-giam do Relator quanto ao item (i); em parte, o Ministro Marco Aurélio,que divergia do Relator quanto ao item (ii); em parte, o Ministro DiasToffoli, que, em voto reajustado, resolveu a questão de ordem no sentidode: a) fixar a competência do Supremo Tribunal Federal para processare julgar os membros do Congresso Nacional exclusivamente quanto aos