Psicanálise II - Aula 2: Transferência (parte I)
-
Upload
alexandre-simoes -
Category
Documents
-
view
1.840 -
download
1
description
Transcript of Psicanálise II - Aula 2: Transferência (parte I)
Curso de Psicologia
Disciplina: Abordagem Psicanalítica II
(72 hs/aula) Período: 7o
Professor Alexandre Simões
ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de
autor reservados.
Tema:
A TRANSFERÊNCIA(parte 1)
ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de
autor reservados.
Textos de Freud que elucidam introdutoriamente o tema da transferência:
Tratamento psíquico (1905, vide vol. VII da Edição Standard); neste texto, Freud aponta a sua trajetória
instrumental pela hipnose e seu subsequente abandono;
A dinâmica da transferência (1912) [obs.: texto integrante da série ‘Artigos sobre técnica e outros trabalhos’];
Observações sobre o amor de transferencial (1914) [obs.: texto integrante da série ‘Artigos sobre técnica e outros
trabalhos’];
Esboço de psicanálise (1938, vide vol.l XXIII, a partir da pag. 201)
ALEXANDRE SIMÕES
® Todos os direitos de autor
reservados.
Em todos os momentos em que Freud aborda o tema da transferência, dois aspectos são sempre
apresentados (e problematizados):
• O vínculo ou as articulações que se constroem na cena analítica (e não podemos deixar de perceber que uma articulação que se sobressai aqui é a que se estabelece entre PACIENTE e ANALISTA);
• A PRODUÇÃO (mais especificamente, o que é produzido, o efeito do processo) por meio da articulação estabelecida na transferência;
ALEXANDRE SIMÕES
® Todos os direitos de autor reservados.
Em função destas observações prévias, antes de se buscar definições excessivamente esquemática da transferência, vale
perguntar:
• O que se vincula na transferência ?# em outros termos: quais elementos se articulam na
transferência e sob quais modos se dá esta articulação?
• O que é produzido a cada forma de
vinculação ?ALEXANDRE
SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
Para localizarmos melhor estas indagações, vejamos a amplitude do
termo transferência na língua alemã e os usos realizados por Freud deste
termo: (vide Dicionário comentado do alemão de Freud, de Luiz
Hanns. Rio de Janeiro: Imago, 1996)
•Transferência -> Übertragung
• Esta palavra traz consigo a idéia de um processo de ida e vinda (tal como uma gangorra, um bumerangue, um vai e vem etc.). Este movimento tanto pode ser relativo ao tempo (ida e vinda entre o passado e a atualidade) ou ao espaço (o longe e o perto, de uma pessoa para outra)
ALEXANDRE SIMÕES
® Todos os direitos de autor reservados.
• Übertragung é ainda um termo que, em seus usos na língua, conota plasticidade e reversibilidade;
• De forma genérica, implica na transposição (movimento, bem ao pé da letra) de um contexto para outro de uma estrutura, um modo de ser, uma forma de se relacionar;
ALEXANDRE SIMÕES
® Todos os direitos de autor reservados.
• Todas estas faces do termo e, especialmente, o caráter plástico da transferência (deslocar, sair do lugar, empurrar, inserir, introduzir, mudar, carregar, portar, usar, movimento em direção a algo, transmitir, etc.) são imprescindíveis para se compreender devidamente o que Freud propõe ao falar em transferência no espaço analítico;
• Freud, ao início do texto A dinâmica da transferência (1912), vai propor que “... a transferência é necessariamente ocasionada durante o tratamento psicanalítico” e ele nos convida a verificar “... como vem ela a desempenhar neste seu conhecido papel.”
ALEXANDRE SIMÕES
® Todos os direitos de autor reservados.
Na nossa língua portuguesa, o verbo ao qual a palavra transferência remete (übertragen; sendo que über
significa ‘por sobre’ e tragen, ‘carregar’) se aproxima bastante do que queremos dizer quando falamos
‘carregar-de-lá-para-cá-e-deixar-aqui’ (considerando que daí a pouco, por conta da plasticidade e
reversibilidade já apontadas, possamos outra vez ‘carregar-de-lá-para-cá-e-deixar-ali’):
ALEXANDRE SIMÕES
® Todos os direitos de autor reservados.
Portanto, ao falar em transferência não podemos deixar de pensar em:
• transferir um encontro para outra data;• transferir sua residência para outro bairro ou cidade;
• transferir sua voz de comando para outra pessoa;• transferir um desenho de uma página de livro para uma
folha de caderno;• transferir dados da internet para um texto ou pasta;
• enfim, mudanças que comportam a chegada ou entrada em um novo local;
ALEXANDRE SIMÕES
® Todos os direitos de autor reservados.
Por fim, não podemos deixar de apontar que a transferência abre caminho para uma forma de passagem ou travessia (ainda que o termo que Freud utilize aqui seja outro, aparentado com a
transferência: Übergang):
“A transferência (Übertragung) cria, assim, uma região intermediária entre a doença e a vida real, através da qual
a travessia (Übergang) de uma para outra é efetuada” (Freud, in: Recordar, repetir e elaborar. 1914)
ALEXANDRE SIMÕES
® Todos os direitos de autor reservados.
Veremos, a seguir, que é precisamente pelas características da transferência como elemento de passagem e trânsito entre tempos, pessoas, investimentos (ocupações libidinais) e contextos que se torna possível o trabalho analítico;
Por conta disso, Freud frisará constantemente que a transferência (múltipla em suas faces) é a
condição sine qua non do tratamento psicanalítico;
As questões iniciais (O que se vincula na transferência? O que é produzido a cada forma de vinculação?) devem ser abordadas
nos cenários que foram aqui expostosALEXANDRE
SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
O ‘clichê estereotípico’ e as ‘idéias libidinais antecipadas’
comopontos de dobra
“Deve-se compreender que cada indivíduo, através da ação combinada de sua disposição inata e das influências
sofridas durante os primeiros anos, conseguiu um método específico próprio de conduzir-se na vida erótica - isto é, nas precondições para enamorar-se que estabelece, nas pulsões que satisfaz e nos objetivos que determina a si
mesmo no decurso daquela. Isso produz o que se poderia descrever como clichê estereotípico (ou diversos deles),
constantemente repetido - constantemente reimpresso - no decorrer da vida da pessoa, na medida em que as
circunstâncias externas e a natureza dos objetos amorosos a ela acessíveis permitam, e que decerto não é
inteiramente incapaz de mudar, frente a experiências recentes. (...) Se a necessidade que alguém tem de amar
não é inteiramente satisfeita pela realidade [-> demanda], ele está fadado a aproximar-se de cada nova pessoa que
encontre com idéias libidinais antecipadas.” (FREUD. A dinâmica da transferência, p. 133/134)
ALEXANDRE SIMÕES
® Todos os direitos de autor reservados.
A ‘figura do médico’ ou a posição do psicanalista (posição de investimento por parte do analisando):
“Assim, é perfeitamente normal e inteligível que a catexia [ocupação] libidinal de alguém que se acha parcialmente
insatisfeito, uma catexia que se acha pronta por antecipação, dirija-se também para a figura do médico. Decorre de nossa hipótese primitiva que esta catexia
recorrerá a protótipos, ligar-se-á a um dos clichês estereotípicos que se acham presentes no indivíduo; ou,
para colocar a situação de outra maneira, a catexia incluirá o médico numa das séries psíquicas que o paciente
já formou.”
(FREUD. A dinâmica da transferência, p. 134)ALEXANDRE
SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
Portanto, Freud nos apresenta aqui a forma como o analisando se articula com o analista:
através de um investimento libidinal.
Vale notar que este investimento não é inteiramente elucidado ou submetido a um controle da razão, pois Freud
nos propõe, ao falar das ‘idéias libidinais antecipadas’ “...que ambas as partes de sua libido, tanto a parte que é
capaz de tornar-se consciente quanto a inconsciente, tenham sua cota na formação dessa atitude.”
(FREUD. A dinâmica da transferência, p. 134)
ALEXANDRE SIMÕES
® Todos os direitos de autor reservados.
É precisamente este processo de investimento (demarcado por aquilo que se sabe bem como por aquilo que não se sabe) que impulsiona as trajetórias de uma análise.
Nesta condição, a transferência mostra-se como a mola propulsora da psicanáliseALEXANDRE
SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
Em outros termos, não há psicanálise sem transferência
deve ser ressaltado que a transferência se manifesta de modos bem diversos
ALEXANDRE SIMÕES
® Todos os direitos de autor reservados.
Todavia, esta não é a única face da transferência
“... na análise, a transferência surge como a resistência mais poderosa ao tratamento.” (FREUD. A dinâmica da transferência, p. 135)
ALEXANDRE SIMÕES
® Todos os direitos de autor reservados.
Prosseguiremos na próxima aula!
Prof. Alexandre Simões
Contatos:
ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de
autor reservados.