Puerpério normal e patológico - Professor Marlon -...

35
Medicamentos na gestação e na lactação Celene Maria Longo da Silva

Transcript of Puerpério normal e patológico - Professor Marlon -...

Medicamentos na gestação e na lactação

Celene Maria Longo da Silva

Introdução

• Alguns medicamentos e drogas, quando ingeridos no ciclo gravídico-puerperal, podem provocar efeitos deletérios tanto a gestante quanto ao seu concepto, nas fase de embrião, feto e mesmo ao recém-nascido

• Objetivo– Preservar a higidez materno-fetal– Evitar o fator iatrogênico, responsável por 5% das

malformações e 20% do obituário infantil

Evolução da obstetrícia• Primeira etapa

– hemorragia intracraniana e tocotraumatismos• Parto exclusivamente via baixa• Elevada taxa de mortes maternas (582/100.000 nascimentos)

– Avanço da anestesiologia• Parto pela via alta• Redução dos índices de mortalidade materna (3,3/ 100.000

nascimentos)

• Segunda etapa– Melhora na assistência ao parto– Conhecimento sobre as patologias clínicas na gravidez

• combate a anoxia• Melhora do bem estar fetal

Evolução da obstetrícia

• Terceira etapa– Medicina fetal

• incidência de malformações• Útero não mais conhecido como ‘torre de marfim’• Gênese das malformações

– Genético (20%)– Cromossômico (15%)– Ambientais (10%)

» irradiações e infecções(2 a 3%)» patológicos maternos(1 a 2%)» fármacos e outros agentes químicos (4 a 5%))

– Multifatoriais (65%)

Evolução da obstetrícia

• Teratogênese induzida por drogas ou por medicamentos– Ainda que não tenha alta prevalência, parece

ser a causa de mais fácil prevenção– depende do conhecimento científico baseado

em evidências– uso terapêutico racional, idealmente

concentrado na prática médica

Índice terapêutico• Informações relativa à eficácia e à janela

terapêutica, indicando a segurança do produto quanto às quantidades utilizadas– Relação dose-efeito– Probabilidade de ocorrência de efeitos colaterais

indesejáveis– Não indica as manifestações espécie-específicas (ex:

talidomida)– Não indica a farmacocinética do medicamento– Limitado à decisão médica racional, avaliando risco-

benefício de cada medicamento

Farmacocinética• Parte integral da boa prática médica• Conhecer a biodisponibilidade do medicamento

– Concentrações plasmática subliminares (ineficazes)– Concentrações tóxicas

• Conhecer a distribuição e processos de interrupção da ação do fármaco

• Evitar interações medicamentosas e reações iatrogênicas

• Especialmente importante no ciclo gestacional e puerperal

Organismo materno

• Vias de administração– Pode interferir diretamente na ação do

fármaco– Próximas ao local de ação

• Vantagem de menor dose• Não estão sujeitas aos processos de absorção e

distribuição• Podem ter ação prolongada

Organismo materno

• Vias de administração– Distantes do local de ação: as mais utilizadas,

dependem da absorção• Intramuscular: bem vascularizada• Subcutânea: favorece o depósito do medicamento• Endovenosa: adaptada a grandes volumes• Oral: mais cômoda• Transcutânea: lenta• Retal: evita metabolismo hepático de primeira

passagem• Sublingual: níveis sanguíneos não depurados

Organismo materno

• Absorção– Mesmo na gravidez a via oral é a mais

utilizada• Sob ação da progesterona• Aumento no fluxo sanguíneo e redução da

motilidade gastrointestinal– Fármaco permanece mais tempo no tubo digestivo– Absorção mais lenta, mas mais eficaz

Organismo materno

• Distribuição– Depende da afinidade de ligação do fármaco às

proteínas plasmáticas– Lipossolubilidade da droga– O percentual ‘livre’ distribui-se para os tecidos afins e

órgãos-alvo– Aumento contínuo dos hormônios esteróides e de

ácidos graxos livres (competidores dos fármacos na ligação com as seroproteínas) pode determinar o aumento dos fármacos ‘livres’

Organismo materno• Metabolismo

– Ocorre primariamente no fígado• Fluxo sanguíneo hepático• Sistema enzimático

– Fármacos sofrem biotransformação• Oxidação (citocromo P450)• Redução• Hidroxilação (fase I)• Conjugação (fase II)

– Estrogênios• diminuem a capacidade de metabolização enzimática -> acúmulo

de medicamentos na circulação sanguínea– Progesterona

• inibem algumas enzimas do sistema P450 (CYP 1A2)• alterando o clearance de algumas substâncias (teofilina e cafeína)• ativando o clearance de outras enzimas (CYP 3A4 e CYP2C9) que

podem alterar outras substâncias (fenitoína e sertralina)

Sistema citocromo P450• tem implicações importante na medicina estando

envolvido em 5 funções:– conversão de produtos químicos em moléculas

altamente reativas, que podem causar dano celular indesejado, com morte celular ou mutações neoplásicas

– inibição ou indução enzimática, que resulta em interações droga-droga e idiossincrasias

– inativação ou ativação de agentes terapêuticos– produção de hormônios esteróides– metabolísmo de ácidos graxos, prostaglandinas,

leucotrienos e retinóides

Sistema citocromo P450

• A indução ou inibição das enzimas pode originar fenômenos de toxicidade aumentada ou atividade diminuída

• Sua ação é influenciada por:– Medicamentos (rifampicina, isoniazida,… ) – Alimentação – Hábitos sociais (álcool, tabaco, … ) – Estado de saúde (diabetes, hipertiroidismo,...)

Citocromo 450• Inibição

– aumento rápido dos níveis sanguíneos da droga, exacerbando os efeitos tóxicos, podendo mesmo chegar a overdose

– altera a biodisponibilidade de outros fármacos também metabolizados por esta via

• Indução– diminui os níveis sanguíneos, o que compromete a eficácia

terapêutica – aumenta a ativação de procarcinigêneos a metabolitos que

reagem com o DNA, levando ao aumento da formação de tumores

– O etanol e a isoniazida são indutores da CYP2E1os quais aumentam a ativação do acetaminofeno, embora com resposta retardada pois depende do tempo necessário para a síntese de CYP2E1 e para a eliminação dos indutores

Organismo materno

• Excreção– O rim é a via mais importante para a

eliminação dos fármacos e seus metabólitos • Filtração glomerular • Secreção tubular ativa

– Na gravidez o fluxo renal pode aumentar até 80% e a taxa de filtração glomerular em torno de 50%

Placenta

• A passagem do fármaco pela placenta está subordinada às mesmas condições que outras membranas do organismo– Baixo peso molecular– Não associação a seroproteínas– Lipossolubilidade– pH ligeiramente ácido

• Atua como complemento metabólico do fígado– Possui 50% das enzimas encontradas no fígado

materno

Placenta• Pequena família de glicoproteínas na superfície

das células– função de exportar compostos orgânicos do citosol

para o meio extracelular (também no citotrofloblasto da placenta humana)

• Esses fatores atuam como barreira, dificultando a transferência de medicamentos do compartimento materno para o fetal– Passagem reduzida na vigência de inflamações– Degenerações vasculares– Redução da área de inserção placentária

Unidade Feto-PlacentáriaVilosidade corial - Transferência de gases e metabolitos

Sentido Mãe-Feto

Sentido Feto-Mãe

Concepto• O desenvolvimento do concepto envolve 3

períodos– Fertilização e nidação

• 3 primeiras semanas do desenvolvimento• Intensa atividade mitótica• Agentes tóxicos determinam a morte do ovo• Período do ‘tudo ou nada’

– Embrionário• De 4 a 7 semanas• Fase da organogênese• Estádio mais sensível à teratogênese

– Morfológicas e de grande vulto• Período extremamente delicado

– poucas semanas de atraso menstrual

Concepto• O desenvolvimento do concepto envolve 3

períodos– Fetal

• Da 8ª semana ao termo da gestação• Fase de desenvolvimento• Menos exposta aos efeitos teratogênicos

– Se presentes, podem ser morfológicos (de pequena monta) ou funcionais

– Influências nocivas atuam no número e tamanho celular• 50% do fluxo que chega ao concepto retorna de imediato ao

organismo materno– Maior parte do fluxo destina-se à oxigenação dos órgãos

nobres (cérebro e coração)– Pequena porcentagem aos demais tecidos

Concepto

• Distribuição– Fármaco associam-se a seroproteínas,

retardando sua ação farmacológica– Teor de proteínas: 20% do plasma fetal– Feto exposto aos medicamento

• aumento da área de inserção placentária• Aumento do aporte sanguíneo quando diminui a

espessura da membrana sincício capilar• Alteração do pH fetal -> dissociação das drogas

Concepto

• Metabolismo– Fígado fetal apto a realizar

• síntese proteica a partir de 4 a 6 semanas• Produzir glutamil-Co-A na 10ª semana• Uridinofosfato-glicogênio-sintetase na 13ª semana• Citocromo P450 na 14ª semana• Exercer função metabólica de oxidação, redução,

hidroxilação, assim como conjugação a partir da 20ª semana

Concepto

• Excreção– Feto começa a filtrar os medicamentos devido

ao amadurecimento renal e ao aporte sanguíneo

• eliminando-os para o líquido amniótico• Clearence do líquido amniótico

– Parte devolvido ao organismo materno– Parte deglutido pelo feto– Placenta devolve os produtos que metaboliza no espaço

interviloso– Até a supressão do aporte medicamentoso na mãe

Concepto • Variáveis que interferem no uso de

medicamentos na gravidez– Estado de saúde materno– Genótipos materno e fetal– Evidências pré-clínicas podem não ser extrapoláveis

para a espécie humana– Dose ingerida pela mãe– Concentração do medicamento no feto– Tratamento crônico pode atuar de diferentes

maneiras • induzir a síntese de enzima• destruir gradativamente de células embrionárias importantes

Classificação dos fármacosA Estudos controlados em mulheres não demonstraram risco para o feto

quando administrado no 1º ou nos demais trimestresPossibilidade de lesão fetal é remota

0,7%

B Estudos na reprodução animal não demonstraram risco fetal, mas não há estudos controlados em mulheresEfeitos adversos em animais, mas não confirmados em estudos controlados em gestantes nos 3 trimestres

19%

C Estudos em animais revelaram efeitos adversos em fetos, mas não há estudos controlados em mulheresEvitar

66%

D Evidência de risco fetal humano, porém os benefícios terapêuticos heróicos do uso em gestantes justificam o uso

7%

X Estudos em animais e em humanos revelam efeitos deletérios sobre o concepto que ultrapassam o benefício terapêutico almejadoEstão contra-indicados na gestação e em mulheres que pretendem engravidar

7%

Prescrição de medicamentos

• Cautelosa• Informações atualizadas, com base em

estudos controlados e consensos• Classificação é dinâmica (FDA e ANVISA)• Muitos dados de classificação podem ter

sido fornecidos somente pelos fabricantes– Produtos novos no mercado

Vitaminas e suplementosVitamina A AVitamina B1: tiamina AB12: cianocobalamina AB2: riboflavina AB3: niacina AB6: piridoxina AC: ácido ascóbico AC tópica BD AE AH: biotina BK1: fitonadiona BÁcido fólico AFerro mineral AFerro quelato glicinato D/B

VacinasBCG XFebre amarela XPoliomielite: vacina oral trivalente de vírus vivos atenuados XVaricela: vírus vivos atenuados XTríplice viral contra sarampo, caxumba e rubéola: vírus vivos atenuados XHepatite A: vírus inativados DMeningococos A e C: vacina polissacrídica DHepatite B: antígeno de superfície de vírus purificado por engenharia genética (recombinante)

C

Influenza: vírus inativados CQuadrivalente contra HPV (papilomavírus humano): vacina polissacarídica CRaiva: vírus inativados CCombinada inativa contra hepatite A e B r-DNA BPoliomielite (SALK): vacina trivalente de vírus inativados APneumocócica polivalente: vacina polissacarídica ADupla adulto: toxóide tetânico e toxóide diftérico A

Analgésicos e antiinflamatórios

Acido acelitsalicílico B / DAcetaminofeno B / D

Dipirona B

Diclofenaco sódico B / D

Acido mefenâmico B / D

Antibióticos

Amoxicilina BAmpicilina A

Cefalexina B

Cefalotina B

Nitrofurantoína B / D (no termo: anemia hemolítica)

Norfloxacino C

Ciprofloxacino C

Sulfametoxazol /trimetroprim C / D

Antieméticos

Metoclopramida BDimenidrato B /D

Antifúngicos

Fluconazol X / CNistatina BFenticonazol CItraconazol D / C

Bibliografia consultada

• Tratado de Obstetrícia – FEBRASGO, 2001

• Obstetrícia Fundamental, Rezende / Montenegro, 2003

• Kulay Junior, Luiz. Medicamentos na gravidez e lactação: guia prático – 2ª edição – Baueri, SP: Manole, 2009

• FEBRASGO. Drogas na gravidez e lactação – São Paulo: Ponto, 2003

Sistema citocromo P450• Metabolizam compostos lipofílicos de origem endógena

– colesterol (convertido na cortéx adrenal em aldosterona e cortisol)

– hormônios esteróides (testosterona nos testículos e estradiol nos ovários)

– ácidos graxos• Metabolizam compostos de origem exógena

– drogas– aditivos de alimentos– componentes de cigarros– pesticidas– produtos químicos que penetram no organismo pelas formas

alimentares, inalação ou absorção pela pele