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1 “Vigilância em saúde e participação social na perspectiva do território em transformação” por Queli Cristina Lorena dos Santos Dissertação apresentada com vistas à obtenção do título de Mestre Modalidade Profissional em Saúde Pública. Orientador: Prof. Dr. Eduardo Navarro Stotz Rio de Janeiro, agosto de 2013.

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“Vigilância em saúde e participação social na perspectiva do território

em transformação”

por

Queli Cristina Lorena dos Santos

Dissertação apresentada com vistas à obtenção do título de Mestre

Modalidade Profissional em Saúde Pública.

Orientador: Prof. Dr. Eduardo Navarro Stotz

Rio de Janeiro, agosto de 2013.

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Esta dissertação, intitulada

“Vigilância em saúde e participação social na perspectiva do território

em transformação”

apresentada por

Queli Cristina Lorena dos Santos

foi avaliada pela Banca Examinadora composta pelos seguintes membros:

Prof. Dr. Maurício Monken

Prof. Dr. Gil Sevalho

Prof. Dr. Eduardo Navarro Stotz – Orientador

Dissertação defendida e aprovada em 22 de agosto de 2013.

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Agradecimentos

À Deus, por estar sempre ao meu lado e no meu coração, guiando os meus caminhos e

me dando força e coragem para que eu possa levantar dos tropeços da vida e superar as

dificuldades. E aos Orixás por sua benção, proteção e força.

À Minha Família que é o meu alicerce, referência e vida. E por estarem sempre ao meu

lado com seu apoio incondicional, fazendo com que a caminhada seja repleta de Amor.

Ao Professor Gil Sevalho, que sem ele esse trabalho não teria se realizado, pois nessa

caminhada foi mais que um professor, mas sim um grande companheiro com toda sua

Solidariedade, generosidade, gentileza, amizade, paciência, atenção, auxílio, estímulo,

orientações, reflexões.

Ao Professor Eduardo Stotz pela generosidade, gentileza e seus escritos que foram

fundamentais para a realização deste trabalho.

Ao Fabiano (Chico), seu companheirismo foi um dos pilares que me sustentou nesse

processo, com muitos risos e paciência inesgotável. Sua generosidade se refletiu em;

incentivo permanente; ombro para lágrimas; ouvido para todas as reclamações e trocas

muito frutíferas.

As amigas e aos amigos que compartilham alegrias e tristeza. Rosane, por acreditar e

ser a primeira a me incentivar a trilhar o caminho da Geografia e Saúde ainda na

Graduação. Rejany que esteve presente nesse processo e muito contribui para a

realização do trabalho com seus conselhos e a transcrição das entrevistas. A Gláucia,

Dejany, Marcelo Pedra, Marcelo Alves, André, Walase e Betão pelas trocas, amizade,

apoio e contribuições. E ao Willian por me acalmar e me ensinar a andar com Fé.

Aos Colegas de turma por suas contribuições. Em especial a Luciana, a Paula e ao

Wanderson e toda a sua doçura, obrigada pela amizade, carinho, incentivo, trocas,

sorrisos, por compartilhar aflições e pelo colo nos momentos mais difíceis nessa

caminhada. A Lídia e a Dona Maria pelo Carinho e Cuidado. E ao Pedro por todo

auxílio e paciência. A Carla Moura e toda a vibração positiva nos momentos mais

tortuosos desse ciclo.

Agradeço imensamente aos entrevistados atores fundamentais para a construção deste

trabalho com seus relatos e vivências.

Agradeço profundamente a todos que contribuíram direta ou indiretamente para a

conclusão deste Trabalho.

4

Dedicatória

À minha Mãe, pelo carinho,

compreensão, apoio e incentivo de

cada dia e por todos os seus

ensinamentos e dignidade. E toda à

Família, sem vocês eu não teria

superado mais essa etapa da minha

vida.

Amo vocês.

In Memória a meu Pai Nei Rodrigues

dos Santos

5

“E aquilo que nesse momento se

revelará aos povos

Surpreenderá a todos, não por ser

exótico

Mas pelo fato de poder ter sempre

estado oculto

Quando terá sido o óbvio.”

Caetano Veloso

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RESUMO

Vigilância em Saúde e Participação Social Na Perspectiva do Território em

Transformação

O conceito de Vigilância na Saúde Pública evoluiu historicamente após percorrer vários

campos da saúde até se estabelecer na atualidade como Vigilância em Saúde. Ao

aplicar-se a orientação e aprimoramento das ações em base territorial local, a vigilância

em saúde contribuiu para a reorganização do sistema único de saúde e

operacionalização de seus princípios básicos, avançando na perspectiva da

intersetorialidade e incorporação da participação popular, assim como na relação entre

processo saúde doença cuidado e condições sociais. Os presente trabalho tem por

objetivo estudar os limites e as possibilidades da vigilância em saúde num território em

transformação. O estudo teve como foco o olhar do profissional da vigilância em saúde

sobre a participação social integrada a vigilância em saúde com base no território.Trata-

se de uma abordagem de natureza qualitativa, onde a seleção da amostra é intencional.

As técnicas de coleta de dados utilizados foram à analise documental e entrevistas semi-

estruturadas. Os dados obtidos com a realização das entrevistas foram analisados pela

técnica da análise de conteúdo. Quanto aos resultados encontrados, mostraram que no

tocante a vigilância em saúde a prática está distante dos discursos oficiais e uma

dificuldade do profissional em saúde de absorver o que é participação social na

vigilância em saúde. O estudo reafirma a necessidade da incorporação da participação

popular na vigilância em saúde para a aproximação do processo saúde doença as

condições sócias.

PALAVRAS-CHAVE: Vigilância em Saúde; Participação Social; Território.

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ABSTRACT

Surveillance in Healthcare and Social Participation In Perspective the Territory in

Transformation

The concept of Public Health Surveillance historically evolved after cover various

fields. Today, can say there is a new concept, health Surveillance.

when applyed to guidance and improvement of actions on a territorial basis local, The

health surveillance contributed to the reorganization of the unified health system with

the operationalization of its basic principles, advancing in the perspective of

intersectionality and incorporation of popular participation, as well as the relationship

between health-disease process care and social conditions. The present work aimed to

study the limits and possibilities of health surveillance in a territory in transformation.

The study had as its focus the gaze of the professional of health surveillance on social

participation integrated surveillance in health based on territory. It is an approach of

qualitative nature, where the sample selection is intentional. The data collection

techniques used were the documentary analysis and semi-structured interviews. The

data obtained with the completion of the interviews were analyzed by content analysis

technique. The study reaffirms the need for incorporation of popular participation in

health surveillance for the approximation of the health-disease relationship social

conditions. As regards the results found, showed that with regard to health surveillance

practice is distant from the official speeches and has a difficulty of the health

professional to absorb what is social participation in health surveillance.

KEYWORDS: Health Surveillance; Social Participation; Territory.

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Sumário:

1. Introdução .......................................................................................................... 09

2. Justificativa.............................................................................................................11

3. Objetivo .............................................................................................................. 12 3.1. Objetivo Geral .................................................................................................. 12 3.2. Objetivo Específico ........................................................................................... 12

4. Caracterização do Município de Estudo..............................................................13

5. Referencial Teórico ............................................................................................ 15 5.1. Vigilância Epidemiológica – Breve Histórico .................................................. 15

5.2. Da vigilância Epidemiológica à Vigilância em Saúde ..................................... 20

5.3. Vigilância em Saúde no Território .................................................................. 26 5.4. Vigilância em Saúde e Participação Social ...................................................... 33

5.5. Estudos sobre o desenvolvimento da Vigilância em Saúde no Nível Local.....42

6. Metodologia ........................................................................................................ 45

6.1. Pesquisa Qualitativa .......................................................................................... 45 6.2. Seleção da Amostra...............................................................................................46 6.3. Entrevista Semi-Estruturada ............................................................................ 47

6.4. Diário de Campo ............................................................................................... 49

6.5. Análise dos Resultados ...................................................................................... 49

6.6. Aspectos Éticos .................................................................................................. 52

7. Apresentação e Discussão .................................................................................. 52

7.1. Cenário Encontrado na Pesquisa de Campo......................................................52

7.2. Características dos entrevistados.........................................................................53

7.3. Vigilância em Saúde...............................................................................................53

7.4. Participação Social.................................................................................................60

7.5. O Território............................................................................................................65

7.6. Participação Social Integrada a Vigilância com base no território..................70

8. Considerações Finais..............................................................................................77

9. Referências Bibliográficas .................................................................................... 80

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1 - INTRODUÇÃO

O processo saúde doença na população sempre esteve condicionado por várias

causas. Historicamente construída, a vigilância epidemiológica não fugiu à regra da

relação entre causa, tempo e espaço para o seu desenvolvimento.

Conceitos atuais de Vigilância Pública evoluíram historicamente a partir de

atividades de saúde pública desenvolvidas para controlar doenças (Thacker, 1988). O

conceito de vigilância percorreu vários campos da saúde até se estabelecer na atualidade

como vigilância em saúde. As concepções são várias, onde vigilância está relacionado

com o relato de doenças aos serviços de saúde.

Embora suas raízes históricas possam situar-se nas medidas de isolamento e

quarentena da peste negra dos séculos XIV e XV, a consolidação da vigilância

epidemiológica, como disciplina e conceito, inicia-se com a criação da Organização

Panamericana de Saúde (OPAS) em 1902, que fica responsável pela organização e

notificação internacional de doenças. Em 1923 a Fundação Rockeffler tem uma

importante colaboração, pois é através desta que acontece a erradicação da Febre

Amarela no Brasil, reforçando a importância da vigilância epidemiológica. Para

Romero e Trancoso (1981), o marco da materialidade da vigilância epidemiológica

estabelece-se quando o Centro de Controle de Doenças do EUA (CDC), em 1995,

propõe um sistema de vigilância que compreende a coleta sistemática de dados.

Segundo Albuquerque et al. (2002), a sistematização da Vigilância

Epidemiológica, no Brasil, originou-se com as campanhas de erradicação da malária e

da varíola. No país, inicialmente utilizava-se o termo vigilância médica e,

posteriormente, sanitária, e, sob a influência da 21ª Assembléia da Organização

Mundial de Saúde (OMS), em 1968, o conceito de vigilância epidemiológica se

consolidou como o controle de doenças transmissíveis, ficando a vigilância sanitária

encarregada das ações nas áreas e fronteiras. Com o movimento sanitário e a

concretização do Sistema Único de Saúde as ações em vigilância epidemiológica e

sanitária foram reorganizadas (Arreaza e Moraes, 2010).

4

10

Essa reorganização visou responder questões da saúde que estão diretamente

ligadas às condições de vida nas suas múltiplas formas.

Em sua evolução histórica e de acordo com suas diversas concepções teóricas, a

vigilância admite uma certa polissemia: vigilância epidemiológica, vigilância em saúde

pública, vigilância à saúde, vigilância da saúde, vigilância em saúde. Uma revisão

realizada por Faria e Bertolozzi (2009) procura organizar e sistematizar essas diversas

concepções unindo epidemiologia, promoção da saúde, informação em saúde. Para as

autoras, as diversas noções de vigilância examinadas têm em comum a tentativa de

reorganizar e aprimorar as ações no nível local, por meio de propostas que procuram

corrigir fragmentações, afastando-se dos modelos assistenciais tradicionais e avançando

na perspectiva do trabalho intersetorial e na incorporação da população no processo,

percebendo as relações da saúde-doença com o ambiente e as condições de vida.

Pode-se, nessa evolução prática e conceitual da vigilância, apontar três vertentes:

a primeira é a integração entre a vigilância epidemiológica e vigilância sanitária, com

objetivo de eliminar a fragmentação das ações no âmbito local do sistema de saúde; a

segunda amplia o escopo da vigilância epidemiológica, unindo registros de agravos e

análise de grupos populacionais; e a terceira compreende a vigilância em saúde como

um instrumento de transformação dos determinantes saúde e doença, baseado no

território, intervindo sobre problemas ao nível da promoção da saúde e da participação

popular, considerando-se a estratégia de saúde da família (ESF) (Faria e Berlolozzi,

2009).

O presente trabalho busca estudar os limites e as possibilidades da vigilância em

saúde num território em transformação. Ao estabelecer uma relação entre saúde e

participação popular, pretende-se contribuir teoricamente para a continuidade do

desenvolvimento da vigilância civil em saúde, termo desenvolvido por Victor Valla

(1998), que unia conceitos do campo das ciências sociais e do campo das ciências em

saúde, incorporando a pesquisa participante e a educação popular em saúde. Tal

investigação tem como recorte espacial um município, identificado para efeito do

estudo como de médio porte situado na Região Leste do Estado do Rio de Janeiro, na

área de influência do Complexo Petroquímico do Estado do Rio de Janeiro (Comperj).

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2 – JUSTIFICATIVA

A fragmentação das atividades relacionadas à vigilância na área da saúde pública

no Brasil tem mostrado uma superposição de conceitos e práticas. Desde a tradicional

vigilância epidemiológica até a proposta de vigilância em saúde, os serviços parecem

não corresponder ao que é formulado nos discursos oficiais. Tal situação tem forte

impacto das relações vigilância em saúde, fundamentalmente na questão da participação

social.

A estruturação do SUS (Sistema Único de Saúde) no país compreende na

operacionalização dos seus princípios básicos a participação da população desde o nível

da oferta e de possibilidade de serviço até a avaliação desses. Por outro lado, ainda são

escassas e inconclusivas as pesquisas sobre a incorporação da participação social nas

ações de vigilância em saúde.

A Região Leste do Estado do Rio de Janeiro está submetida a fortes tensões

sociais devido à instalação do Complexo Petroquímico do Estado do Rio de Janeiro

(Comperj), e é sabido, pela leitura dos documentos oficiais disponíveis, que o nível das

transformações econômicas, ambientais, sociais, culturais serão profundamente

intensificadas, sendo óbvias as implicações desse estado de coisas a saúde da população

local.

Pretende-se com esse estudo contribuir para o esclarecimento crítico das

relações entre a participação social e a vigilância em saúde e de sua operacionalização

pelo serviço.

A questão da vigilância, e do território, está presente na minha trajetória

profissional a partir da experiência na Coordenadoria de Saúde Área Programática 5.1,

referente às Regiões Administrativas de Bangu e Realengo, no Município do Rio de

Janeiro, quando como geógrafa e sanitarista integro a partir do Teias a Equipe de

Expansão do Saúde da Família, desenvolvendo um trabalho relacionando ações de

saúde e territorialização. A formação em geografia possibilita um olhar diferenciado

para o território, destacando potencialidades e limites, e, sobretudo, facilitando o

diálogo entre o conhecimento técnico e o saber local. Por outro lado, também a minha

vivência em movimentos sociais, como Verdejar (Movimento Ambientalista) e Pré –

Vestibular para Negros e Carentes (Educafro), permitem reconhecer a importância do

saber local. A busca pela emancipação e autonomia expressa nas práticas e objetivos

12

dos movimentos sociais possibilita o desenvolvimento de um pensamento crítico sobre

as politicas públicas de acordo com a realidade no contexto da saúde.

3 – OBJETIVOS

3.1- Objetivo Geral

Estudar os limites e possibilidades da Vigilância em Saúde num território em

transformação.

3.2 – Objetivos Específicos

3.2.1 – Caracterizar a situação de saúde da população do município de estudo,

situado na Região Leste do Estado do Rio de Janeiro.

3.2.2 – Descrever o sistema e as ações de vigilância em saúde no município de

estudo, situado na Região Leste do Estado do Rio de Janeiro.

3.2.3 – Identificar de que modo a participação popular é apreendida no âmbito

do serviço de vigilância em saúde.

3.2.4 – Analisar as possibilidades e os limites da vigilância em saúde no

município de estudo, situado na Região Leste do Estado do Rio de Janeiro.

13

4 - CARACTERIZAÇÃO DO MUNICÍPIO ESTUDADO

A pesquisa se debruça sobre um município de médio porte, situado no Estado do

Rio de Janeiro, na área de influência do Complexo Petroquímico do Estado do Rio de

Janeiro (Comperj), um empreendimento de grande porte liderado pela Petrobrás.

Mapa da Área de Influência do COMPERJ

Fonte: Criado pela autora

O município está localizado em área de baixada litorânea, às margens da Baía de

Guanabara.

Apresenta um relevo variado, cercado de serras; a vegetação é composta por

pastagens, mata de encosta, mangues e brejos; nas serras a mata é tipicamente

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secundária, resultante da regeneração da exploração de madeira para a obtenção de

carvão e lenha.

Sua economia gira em torno da manufatura, fruticultura, apicultura, pecuária

extensiva, comércio e serviços. O setor manufatureiro é uma importante atividade

econômica e foco de conflitos ambientais. É a maior fonte de arrecadação e de geração

de empregos locais e, ao mesmo tempo, responsável por um passivo ambiental ligado à

degradação dos solos. Cabe ressaltar, que os moradores relatam preocupação com os

impactos no solo em decorrência da poluição gerada pela produção local.

A participação social se dá por meio da associação de moradores, entidades

religiosas e outras organizações da sociedade civil. A informação sobre os programas

existentes, a estrutura e recursos, contudo, não chega à população, o que causa o

cerceamento dos direitos, dos deveres e da participação na elaboração de políticas

públicas. E o reflexo da desinformação é o não comprometimento do poder público com

a participação social em atender às necessidades demandadas. Os moradores se

orgulham de sua história, dos patrimônios culturais e artísticos e do poder de suas

comunidades, pois as associações de moradores locais são atuantes e têm grande poder

de mobilização.

A saúde no Município tem Gestão Plena, dispondo de rede de hospitais

conveniados com o SUS e unidades ambulatoriais.

O Município possui cerca de 30 unidades e um número equivalente de equipes

da Estratégia Saúde da Família (ESF).

Hoje, dentro de uma estrutura em desenvolvimento, a Secretaria Municipal de

Saúde organiza os serviços de vigilância, contando com a vigilância epidemiológica no

nível central e da subsecretaria de vigilância em saúde responsável pelas no nível local.

Dados epidemiológicos disponíveis apontam uma tendência de queda dos

indicadores de mortalidade, queda das internações hospitalares relacionadas a todos os

grupos de causa e aumento de internações por pneumonia e diarreia, ocorrência de casos

esporádicos de dengue e redução de registros de turberculose.

A localização do município na área de influência do Comperj atrairá

investimentos e incrementará a geração de empregos e a arrecadação de impostos na

região.

Há expectativas da população sobre as mudanças, positivas e negativas,

acarretadas com a instalação e o desenvolvimento do Comperj. O receio vem da

experiência do município não contar com projetos e programas de reflorestamento e

15

recuperação do solo, nascentes, morros, florestas, margens de rios e áreas de recarga. O

que se observa é a falta de um plano de contingência e o pouco envolvimento das

comunidades nas questões.

5 -REFERENCIAL TEÓRICO

5.1-Vigilância Epidemiológica – breve histórico

A epidemiologia é uma disciplina que tem um ampla área de atuação, e a

vigilância é um dos seus braços, apoiando nos serviços de saúde a tomada de decisão na

formulação de políticas de saúde e na organização do sistema de saúde, caso do Brasil

como veremos adiante.

Paim (2003) enumera os campos de ação para cada atuação de epidemiologia.

Nos serviços de saúde, se propõe ao estudo da situação de saúde em diferentes grupos

populacionais e seus determinantes, a investigação causal e explicativa sobre problemas

prioritários de saúde, também avalia o impacto em saúde dos serviços, tecnologias e

outras ações, e completa sua atuação com a vigilância epidemiológica de doenças e de

outros problemas de saúde.

No que diz respeito à tomada de decisões em saúde, tem como foco as políticas

de saúde, apoiando a definição de prioridades, objetivos e estratégias, assim como age

na configuração dos serviços, especialmente na descentralização e integração dos

serviços nos programas, nas práticas profissionais, sobretudo na avaliação da eficiência

e eficácia e nas práticas de gestão e nas prioridades de investigação. E acerca da

organização do sistema atua no processo de formulação de políticas, na definição de

critérios para a repartição de recursos, na elaboração de diagnósticos e análises de

situação de saúde, na elaboração de planos e programas, na organização de ações e

serviços e na avalição de sistemas, políticas, programas e serviços de saúde (Paim,

.2003).

Em um breve histórico do desenvolvimento da vigilância epidemiológica, fica

claro como a organização da sociedade e as formas de expressão do processo saúde-

doença da população interferiram no desenvolvimento da epidemiologia e seus

conceitos. As origens históricas da vigilância epidemiológica se confundem com

aquelas da própria epidemiologia ampliando seu escopo das doenças infecciosas

transmissíveis para as doenças não infecciosas e outros agravos de importância sanitária

16

(Sevalho, 2000).

Na perspectiva das doenças infecciosas no inicio do século XIX duas teorias

surgiram para explicar a causa e a natureza das doenças (Romero e Trancoso, 1981), a

do contágio e a dos miasmas. As doenças eram transmitidas através do contágio, que

intensificou com a migração e o livre comercio em virtude da abertura dos portos. Para

Sevalho (2000), o desenvolvimento dessa “vigilância de doentes” acompanhou o

esforço conquistador dos estados nacionais mercantilistas nos séculos XVII e XVII, no

que diz respeito a sua soberania bélica e produtiva, contando-se a população e as

doenças que atingiam e levavam a morte seus trabalhadores e soldados. Como medidas

de proteção sanitária figuravam a quarentena e o isolamento. Essas medidas, se por um

lado protegiam, por outro tornaram-se limitadoras do desenvolvimento comercial, que

se mostrava necessário e promissor.

Como resultado da revolução industrial e o nascimento da teoria dos germes por

volta de 1870, ressurgiu de forma vitoriosa uma nova abordagem para a teoria do

contagio (Romero e Trancoso, 1981), acordando com esse contexto de intensificação

dos processos produtivos e econômicos.

Cabe ressaltar que o termo vigilância epidemiológica estava relacionado com o

isolamento e com a quarentena nos séculos XVII e XVIII (Romero e Trancoso, 1981), o

que configurava separar os indivíduos sã os dos doentes, aprisionando o indivíduo em

seu próprio corpo. Contudo, restringir o corpo da circulação não foi o suficiente e desta

forma lançou-se mão do cordão sanitário, que expressava uma restrição aos bairros e

cidades de áreas especiais. Significou a proteção dos ricos em detrimento dos pobres.

Essas medidas punitivas criaram sérias dificuldades ao comércio entre países e

metrópole. Porém, o processo histórico mostra que este cenário se modifica, pois ao

considerar a força de trabalho como força motriz para impulsionar o processo de

industrialização, esse individuo, corpo, mercadoria, tem a sua “saúde valorizada e

cuidada”. O resultado foi o surgimento de novos e mais eficazes medidas de controle

(Romero e Trancoso, 1981).

O desenvolvimento das práticas epidemiológicas e sua utilização no mundo

foram diferentes em diversos países, em função das condições sociopolíticas

econômicas. No início do XVIII os Estados Europeus, com destaque para Alemanha,

França e Inglaterra, tiveram práticas e intenções diferentes, mais ou menos autoritários e

prescritivos, e nos EUA a vigilância surgiu como um conceito e se desenvolveu durante

o século XIX.

17

Na Alemanha a epidemiologia estava ligada à análise e interpretação de dados

para intervir através da policia médica. Como o processo de urbanização e

industrialização na França e na Inglaterra estavam avançados, os principais objetivos da

prática epidemiológica foram compreender e controlar a força de trabalho (Romero e

Trancoso, 1981)

Nos EUA, após a segunda guerra mundial, com a introdução da malária desde os

campos de batalha, a vigilância ganha importância (Sevalho, 2000). Contudo, a

vigilância epidemiológica ganhou destaque a partir do sucesso contra poliomielite na

década de 1950.

A evolução do conceito de vigilância epidemiológica está historicamente

centrada nos Estados Unidos. Até 1950,o CDC (Centers for Disease Control) ampliou o

uso do termo vigilância, abrangendo a doença e uma ampla variedade de condições, e

após 1950 liderado por Langmuir, o CDC incluiu as suas atividades a investigação

epidemiológica, coleta ordenada e análise de dados de morbidade e mortalidade

(Langmuir, 1971). Diferente da “vigilância de doentes” e suspeitos, esta nova prática,

uma “vigilância das doenças”, centrou a atenção no comportamento da doença e não do

indivíduo (Sevalho, 2000).

Langmuir (1971) destaca que um importante instrumento da vigilância,

sobretudo no sucesso contra a poliomielite, foram os relatórios como base para as

notícias consistentes para o público, e ressalta que o mais importante é que manteve

todos em posição de responsabilidade plenamente informados, desta forma

possibilitando decisões a partir de um comum de fato. Sevalho (2000) aponta que deve

ser observado que para Langmuir cabia à vigilância apenas a coleta, a manipulação e a

difusão de dados e suas “interpretações”, e que as medidas de controle não eram

responsabilidade direta da vigilância. Ressalta Sevalho, porém, que o caráter coercitivo

da vigilância não pode ser afastado, pois as transformações nas práticas da vigilância

estão intimamente ligadas ao processo histórico, cultural e político de conquista das

liberdades civis, superando o domínio restrito do “desenvolvimento tecnológico e

científico”.

A expansão do termo vigilância assumiu uma importância internacional,

primeiro liderado por Karel Raska e mais tarde pela Organização Mundial de Saúde,

que dá destaque para a Vigilância em escala global (Langmuir, 1971). E é na 21ª

Assembléia da OMS,de 1968, a vigilância passa a compreender também a pesquisa

científica, dada a sua importância como uma função essencial em saúde pública

18

(Arreaza e Moraes, 2010 ).

Na América Latina, o desenvolvimento da medicina, saúde pública e

epidemiologia ocorreu com características diferentes, mas a prática epidemiológica de

controle de doenças dos EUA influenciou o México, a América Central e o Caribe

Espanhol, e após a II Guerra Mundial também a América do Sul, em especial o Cone

Sul (Romero e Trancoso, 1981).

No Brasil, a prática epidemiológica ganhou força com a medicina higienista

instituída pelo poder público, voltada para o controle de endemias, o saneamento nos

núcleos urbanos e nos portos. Diferente das experiências europeias, que ainda no século

XVIII, através a Alemanha, França e Inglaterra, estabeleceram-se a partir de medicinas

mais diretamente relacionadas às questões políticas e sociais. Na Alemanha, a medicina

de Estado estava voltada para a morbidade, onde saberes e práticas médicos

caminhavam juntas e os médicos estavam subordinados a administração central. Na

França era a medicina urbana, onde se pautava a medicalização das cidades, através da

vigilância e hospitalização representados pelo sistema politico-médico da quarentena. E

na Inglaterra a medicina caracteriza-se pela assistência e controle autoritário dos pobres,

um cordão sanitário para controlar a classe trabalhadora (Monken e Barcellos, 2007)

No Brasil, a partir da década de 1990, com a necessidade de reorganizar as

práticas de saúde na perspectiva do Sistema Único de Saúde (SUS), a vigilância

epidemiológica passou a integrar as práticas coletivas e individuais com um olhar para

as necessidades sociais de saúde, ampliando-se o seu escopo conceitual e concebeu-se

outro modelo de vigilância, a vigilância da saúde (Arreaza e Moraes, 2000).

Paim (2003) ressalta que no início da década de 1990 a epidemiologia no nível

federal estava restrita à Fundação Nacional de Saúde (Funasa), no nível estadual

concentrava-se nas ações de vigilância epidemiológica (imunização e controle de

doenças) implementados pelas estruturas próprias das secretarias de saúde, reforçando a

dicotomia com as Coordenações Regionais da Funasa e no âmbito municipal a

epidemiologia tendia a ser residual.

Com a implantação do SUS surgiu um cenário onde as práticas epidemiológicas

precisam se recompor para se adequar à nova realidade da saúde pública. A

epidemiologia amplia seu escopo de atuação e assume o papel de produzir

conhecimento por meio da pesquisa, para subsidiar políticas públicas e formular

soluções dos problemas de saúde individual e coletiva, para tanto tendo como um dos

seus braços a vigilância (Paim, 2003).

19

Nesse sentido, o maior desafio colocado é o amplo papel da epidemiologia para

romper com a lógica de uma assistência à saúde dominada pelo mercado, em uma

perspectiva hospitalocêntrica, e contribuir para promover uma saúde digna de um estado

democrático de direito.

Neste sentido,

“São identificados avanços e recuos desse processos durante

a implementação do SUS e apresentadas algumas proposições

para a construção coletiva de uma epidemiologia

contrahegemônica que contribua na constituição de sujeitos

sociais comprometidos com uma prática sanitária que aposte na

planificação e gestão de um sistema de saúde efetivo,

democrático, humanizado e equânime” (Paim, 2003, p. 558).

Para tanto se faz necessário uma epidemiologia “subversiva”, onde a formulação

de políticas públicas, a organização e interações do sistema de saúde e a resolução de

problemas partem da construção coletiva.

Paim (2003), baseando-se no Seminário Nacional de Vigilância Epidemiologia

realizado em 1992, defende que para uma reorganização do Sistema de Vigilância

Epidemiológica seria fundamental acabar com a clássica dicotomia entre vigilância e

assistência, incorporando ao sistema de saúde a Vigilância à Saúde e as ações de

vigilância em todas as unidades da atenção a saúde, inclusive hospitais. Essas mudanças

permeariam desde a utilização das tecnologias até os recursos financeiros, passando

pela inserção da participação social nas discussões sanitárias.

Apesar das reorganizações administrativas dos serviços suportadas por um

discurso oficial de integração das ações de controle e da agregação da participação da

população, as ações de vigilância permanecem fragmentadas, desde o nível central do

Sistema, e a participação da população no processo ou não existe na prática ou é

absolutamente pontual e não sistematizada no nível local (Albuquerque et al., 2002;

Faria e Bertolozzi, 2009).

Como assinala Sevalho (2002), a prática da vigilância epidemiológica ainda se

limita centralmente a ações de controle das doenças transmissíveis, embora tenha

passado por transformações, ampliando-se, pelo menos em proposta, o escopo da

20

vigilância, fazendo surgir as expressões vigilância em saúde, vigilância à saúde ou

vigilância da saúde para simbolizar teorizações e intervenções mais amplas e mais

complexas.

5.2 – Da Vigilância Epidemiológica à Vigilância em saúde

O termo vigilância, ao longo da história, tem sido associado a vários conceitos,

isso de acordo com o entendimento e concepção do que é designado como área de

atuação. Desta forma, tem sido objeto de redefinições com significados

internacionalmente reconhecidos, a partir de suas ações (Albuquerque et al, 2002),

adquirindo as denominações vigilância epidemiológica ou vigilância em saúde publica,

pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e Organização Pan-Americana de Saúde

(OPAS), passando, no Brasil, por vigilância à saúde, vigilância da saúde e vigilância em

saúde.

Até meados do século XX prevaleceu uma vigilância de doentes, onde os

indivíduos são punidos com a quarentena e o isolamento, e, a partir dos anos 1950,

surgiu uma vigilância das doenças, que centrou a atenção no comportamento da doença

e não do indivíduo. Nessa perspectiva, as ações tem sido até hoje centradas nas doenças

infecciosas (Sevalho, 2002).

Não muito diferente, no Brasil, a vigilância também pautou as suas ações

direcionadas para as doenças transmissíveis. Foi nesse contexto que, em nosso país,

inicialmente o termo utilizado era vigilância médica e, logo deu lugar à vigilância

sanitária (Arreaza e Moraes, 2010).

Arreaza e Moraes (2010) ressaltam que, a partir das determinações da 21ª

Assembleia da OMS de 1968, consolidou-se no Brasil o conceito de vigilância

epidemiológica, ficando assim o controle de doenças transmissíveis distinto da

vigilância sanitária, que restringiu sua atuação, inicialmente, aos portos e fronteiras e, a

partir dos anos 1960, também assumiu o controle de produtos e serviços de interesse à

saúde. Nesse aspecto, coube à vigilância epidemiológica o posicionamento técnico de

acompanhamento e controle de doenças e à vigilância sanitária o poder policial de

fiscalização devidamente alicerçado no suporte legal.

Segundo Albuquerque et al (2002), foi no contexto da V Conferência Nacional

21

de Saúde, e com a Lei Federal 6.259/75, que ficou definido que à vigilância

epidemiológica “compreende as informações, investigações e levantamentos

necessários à programação e avaliação das medidas de controle de doenças e de

situações de agravos à Saúde” (Brasil. Lei ; 1975: 4433).

Já no caderno de Atenção Básica do Ministério da Saúde (Ministério da Saúde,

2007, p. 11), vigilância epidemiológica é definida como: “um conjunto de ações que

proporciona o conhecimento, a detecção ou prevenção de qualquer mudança nos fatores

determinantes e condicionantes da saúde individual ou coletiva, com a finalidade de

recomendar e adotar as medidas e controle das doenças e ou agravos.”

As transformações vivenciadas pela sociedade modificaram as ações em saúde.

Isso pode ser observado com as mudanças do perfil epidemiológico das doenças e o

avanço do conhecimento científico, o que certamente exige constantes atualizações das

normas e procedimentos técnicos de vigilância epidemiológica (Ministério da Saúde,

2009)

Os novos modelos de vigilância propostos estão claramente associados a

mudanças nos perfis epidemiológicos, visíveis nas ultimas décadas, com o declínio das

taxas de mortalidade por doenças infecciosas e o crescente aumento das mortes por

causas externas e pelas doenças crônico-degenerativas (Ministério da Saúde, 2007).

Esse processo de mudança não diz respeito somente às expressões, mas

representam estratégias para atender os desafios de uma sociedade que vem passando

por mudanças estruturais, que se intensificam com a industrialização e, na década de

1980, no contexto da redemocratização. Isso significou romper com uma conjuntura

política e social do silenciar, e a retomada da democracia marcou de forma incontestável

o sistema de saúde, abrindo-se a discussão para outros atores políticos que passaram a

interferir e reivindicar uma nova organização das ações e serviços de saúde. Nesse

contexto as mudanças das práticas em saúde, na perspectiva do Sistema Único de Saúde

(SUS), reorientaram as ações de vigilância, inserindo nessas a consideração dos

determinantes da saúde coletiva e individual (Arreaza e Moraes, 2010).

O processo de reforma do sistema de saúde brasileiro adotou como estratégia a

descentralização e regionalização dos serviços. A descentralização tem início com as

Normas Operacionais Básicas de 1993 e 1996, respectivamente NOB 01/93 e NOB

01/96, e em 2001, dando sequência ao processo de descentralização tem início a Norma

Operacional da Assistência à Saúde (NOAS 2001), configurando o que Teixeira (2002)

chama de (re) centralização.

22

O que figurava era o estímulo ao fortalecimento das Secretarias Estaduais de

Saúde, colocando-se estas à frente da coordenação do processo de regionalização da

assistência, criando-se as microrregiões e desta forma barrando o processo de

descentralização da gestão ocorrido com as Normas Operacionais Básicas, pois esse

processo foi considerado excessivo.

A descentralização significou um movimento de reorganização da gestão do

SUS, onde cada esfera de governo, tornava-se responsável pela gestão, organização e

prestação de serviços de saúde, sendo o nível federal e estadual e os responsáveis em

transferir para o nível municipal os recurso financeiros, esse processe dividiu-se em três

frentes, político-institucional, econômico financeiro e técnico-assistencial,

respectivamente representados na NOB 01/93, NOB 01/96 e NOAS.

A Norma Operacional da Assistência à Saúde (NOAS 2001), no processo de

descentralização, assume o papel possibilitar real do alcance de uma das diretrizes do

SUS, a integralidade do cuidado, pois a proposta é a construção de sistemas de saúde

que ultrapassam os limites territoriais dos municípios, assumem que a referência é o

grau de complexidade tecnológica dos serviços existentes nos diversos municípios, a

partir da atenção básica ampliada que está disposto no espaço como módulo assistencial

e a atenção integral à saúde inserido em uma microrregião de saúde (Teixeira, 2002).

Teixeira (2002), ao mesmo tempo em que articula a possibilidade de se realizar a

integralidade do cuidado, questiona a possibilidade de tal realização, pois acredita que

os limites da integralidade está associado a um modelo de saúde médico assistencial

privatista, que ainda hoje vem se reproduzindo em um serviço de saúde que funciona na

lógica de atendimento à demanda espontânea. Este modelo hegemônico se contrapõe ao

modelo sanitarista, que representa o posicionamento para o enfrentamento dos

problemas de saúde específicos de determinados grupos, através de ações coletivas, de

forma a propiciar a população atenção integral de qualidade e equidade.

Para Teixeira (2002), a regionalização de assistência é passível de um debate

mais profundo em direção ao avanço para além da assistência e sim da garantia à

integralidade da atenção a saúde, o que já nos últimos anos já vem ocorrendo no meio

acadêmico, porém se faz necessário transformar a teoria em prática governamental. A

integralidade da atenção à saúde consiste em respeitar a heterogeneidade das condições

de vida e da situação epidemiológica dos diversos grupos da população nas várias

regiões e dos estados do país, os programas de saúde da família, após redefinição,

apresentam-se como proposta para o avanço em direção a esse modelo de integralidade,

23

embora o programa ainda não tenha ressaltado essas mudanças (Teixeira, 2002).

Paim (2003, p. 563) destaca que a “redefinição das ações programáticas de saúde

no âmbito das unidades básicas, a reestruturação dos estabelecimentos de saúde para

assegurar a oferta organizada e programada das ações e serviços e a formulação de

politicas públicas que tomem como referências básicas a promoção e a proteção da

saúde (cidades saudáveis, vigilância sanitária em defesa da saúde, ação intersetorial em

saúde empowermente, etc)”.

A mudança do modelo de atenção à saúde, não se limita somente em uma

transformação do serviço, mas sobretudo incide nas relações sociais, ou seja uma

mudança na relação entre o profissional de saúde e a população.

Cabe ressaltar que no processo de descentralização e regionalização, o termo

local, ao longo dos anos adquiriu várias acepções, seja como distrito sanitário, no início

do processo entre 1988-1993, seja enquanto sistema municipal de saúde, quando se

enfatizou a municipalização (1993-2000) e, mais recentemente, microrregião de saúde,

conforme a proposta governamental de regionalização da assistência à saúde definida

pela (NOAS 2001).

É nesse contexto que a vigilância em saúde de insere, pois coloca a discussão da

descentralização e regionalização da saúde. Faz-se oportuna na medida em que o

processo que tem início com as NOBs e ganha maior sustentação com a NOAS dá

visibilidade para um espaço geográfico local. Esse contexto é propício para a incerção

de estratégias que veham, Teixeira (2002) incorporar de forma articulada práticas de

promoção da saúde e prevenção de riscos e agravos, individual e coletiva.

Ressalta-se, porém, como afirma, Paim (2003), que a Reforma do Estado

implantada pelo Governo na saúde, através da descentralização e municipalização está

longe de atender ao que se dispõem, que é a modernização e a democratização na saúde.

A participação epidemiológica no processo decisório está prejudicada em função dos

interesses burocráticos associados aos das classes hegemônicas.

Para Arreaza e Moraes (2010), reorganizar o setor saúde em face dos princípios

de universalização, integralidade e equidade, incitou a epidemiologia a ampliar os

horizontes e perceber várias questões que emergiram com a construção do SUS. Assim,

a vigilância epidemiológica transcende o modelo anterior e incorpora na sua essência a

importância das condições de vida.

A vigilância em saúde, entendida como uma forma de pensar e agir em saúde,

tem como objetivo a análise permanente da situação de saúde da população e a

24

organização e execução de práticas de saúde adequadas ao enfrentamento dos

problemas existentes (Ministério da Saúde, 2007).

As ações de vigilância, promoção, prevenção e controle de doenças e agravos à

saúde devem constituir um espaço de articulação de conhecimentos e técnicas vindos da

epidemiologia, do planejamento e das ciências sociais. A vigilância em saúde é, pois

referencial para mudanças do modelo de atenção (Ministério da Saúde, 2007).

Albuquerque et al. (2002) apontam, na evolução histórica conceitual da

vigilância epidemiológica, a importância do projeto VIGISUS (Vigilância em Saúde no

Sistema Único de Saúde), que teve como objetivo a construção de um Sistema Nacional

de Vigilância em Saúde, hierarquizado, integrando vigilância epidemiológica e

vigilância sanitária, orientado para uma divisão de atribuições da vigilância,

privilegiando pessoas e território.

O Projeto de Estruturação do Sistema Nacional de Vigilância em Saúde,

VIGISUS, começou a figurar na década de 1990 (Monken e Barcellos, 2007). Esse

amplo projeto engloba a vigilância epidemiológica, vigilância sanitária e a vigilância

ambiental.

O projeto VIGISUS objetiva a construção de um Sistema Nacional de Vigilância

em Saúde (SNVS), hierarquizado, onde as ações de prevenção e controle das doenças e

agravos poderá ser exercido por cada instância (municipal, estadual e federal) com

maestria. Para alcançar o seu objetivo o VIGISUS teve como proposta a estruturação de

sistemas de vigilância em saúde adequados ao principio da descentralização do SUS,

onde cada instância do SUS é responsável pelo monitoramento global da saúde de sua

comunidade, assim como dos fatores determinantes e condicionantes de sua

comunidade, de forma a intervir de acordo com as reais necessidades dessa população,

desta forma a vigilância deixa de ser da doença e passa a ser a vigilância da saúde,

beneficiando as pessoas e o território (Albuquerque et al, 2002).

Para Monken e Barcellos (2007), a vigilância em saúde traz consigo um

importante debate sobre a reorganização de secretarias estaduais e municipais, devendo

as ações incorporar os conceitos estruturantes, que são o território e população, os

problemas de saúde relacionando também os determinantes e condicionantes sociais, a

intersetorialidade e a interdisciplinaridade.

A reorganização das práticas de saúde deve levar em conta o território, tendo em

vista suas necessidades de ações e serviços de saúde em função das características

sociais, epidemiológicas e sanitárias, com ações permanentes de vigilância em saúde

25

(Ministério da Saúde, 2007).

Nessa concepção do discurso oficial a territorialização é base do trabalho para a

prática da vigilância em saúde. O fundamental nesse processo é eleger prioridades para

o enfrentamento dos problemas identificados nos territórios de atuação, o que se

refletirá na definição das ações mais adequadas, contribuindo para o planejamento e

promoção local, e isso só é possível a partir de um reconhecimento do território que

inclui conhecer as relações existentes e, sobretudo, as condições de vida (Ministério da

Saúde, 2007).

Para Milton Santos (2002), o território é o conjunto de sistemas naturais mais os

acréscimos históricosmateriais impostos pelo homem. Ele seria formado pelo conjunto

indissociável do substrato físico, natural ou artificial, e mais o seu uso, ou, em outras

palavras, a base técnica e mais as práticas sociais, isto é, uma combinação de técnica e

de política.

Santos (2002) ressalta que o território deve ser considerado em suas divisões

jurídico-políticas, suas heranças históricas e seu atual conteúdo econômico, financeiro,

fiscal e normativo. É desse modo que se constitui, no lugar, aquele quadro da vida social

onde tudo é interdependente, levando, também, à fusão entre o local, o global invasor e

o nacional sem defesa.

Segundo Santos (2006), a afetividade se faz necessária para acontecerem a

cooperação e a solidariedade. E a solidariedade é marcada pela comunicação e

informação, o que transforma esse lugar no espaço da resistência, pois é onde se

manifesta a identidade, o coletivo e o subjetivo.

Identifica-se, claramente, no discurso oficial da área de saúde a influência da

geografia crítica, da qual Milton Santos é autor de influência central, e de sua definição

de território.

O território assume um importante papel na vigilância em saúde e propicia um

outro olhar para o processo saúde-doença-cuidado nas políticas públicas de saúde. No

Caderno de Atenção Básica (Ministério da Saúde, 2007) a compreensão de território na

saúde ao mesmo tempo em que se apresenta como área delimitada de abrangência para

a distribuição dos serviços em saúde, também se estabelece como espaço onde as

pessoas vivem e mantém suas relações sociais. É através do vivido, da percepção e da

afetividade existente no território/lugar que a participação social se efetiva.

Em especial, o território estudado no Rio de Janeiro vivencia ao mesmo tempo o

geral e o particular. O geral, identificado através dos investimentos econômicos

26

oriundos da indústria do petróleo oque coloca a região no cenário global, o particular,

representado pela força do lugar em resistir as imposições hegemônicas do sistema

capitalista.

Assim como afirma Rosélia Piquet (2007), esse território, que identificamos

como um território em transformação, deve ser analisado não somente com um olhar

sobre as implicações relacionadas com o desenvolvimento econômico, mas sobretudo

do ponto de vista das perdas e ganhos das regiões que abrigam investimentos em

projetos de grande porte.

O que significa realizar estudos e diagnósticos sobre os impactos provocados

pela implantação das atividades do setor, que têm implicações com mudanças

socioespaciais, e as políticas de desenvolvimento local (Piquet, 2007).

5.3 – Vigilância em Saúde no território

O conceito de território é um dos mais utilizados no processo de reorientação do

modelo de assistência à saúde pública no Brasil, e, neste sentido, é ferramenta

fundamental para se compreender mudanças de modelo na Estratégia Saúde da Família

(ESF), na Promoção da Saúde e na Vigilância em Saúde. A reorganização do SUS com

base no território é apresentada como garantia de respostas mais fidedignas para as reais

necessidades de saúde da população, por possibilitar uma junção entre população e

serviços de saúde, tornando-se ambos responsáveis ou co-responsáveis pelo processo

saúde-doença-cuidado.

A associação entre espaço geográfico e saúde está diretamente vinculada com o

debate sobre os modelos de atenção à saúde e com a vigilância em saúde, que, por

articular saberes e práticas sanitárias, é um dos principais pilares de sustentação na

formulação de políticas, estratégias e consolidação do ideário e princípios do Sistema

Único de Saúde (SUS). As ações e práticas vislumbradas pela vigilância em saúde dão

conta de intervir sobre os problemas de saúde que requerem atenção e acompanhamento

contínuos na perspectiva da identificação e controle de riscos, articulação entre ações de

promoção da saúde, prevenção de doenças, cura e reabilitação, atuação intersetorial,

educação em saúde. Para tanto faz-se necessário outro aporte conceitual, o de território,

pois é nele que as relações sociais se desenvolvem no contexto da heterogeneidade

econômica e social que determina a saúde ou o adoecimento das populações.

27

Compreender, então, as dinâmicas existentes no território é o que permite definir suas

necessidades de cuidados a saúde (Monken e Barcellos, 2007).

O reconhecimento do território é a ferramenta para a caracterização da

população e de seus problemas de saúde, para avaliação dos serviços sobre os níveis de

saúde da população, e para o estabelecimento do vínculo entre os serviços de saúde e a

população. Instituir o território como balizador do novo modelo de vigilância em saúde

justifica-se pelo agravamento das desigualdades sociais associado a uma segregação

socioespacial que leva à restrição do acesso aos serviços ou até mesmo à exclusão da

população no que concerne às condições de saúde e vida (Monken e Barcellos, 2005).

O termo território tem origem no latim, em que territorium deriva de terra,

significando pedaço de terra apropriada, em sentido mais antigo é uma porção

delimitada da superfície terrestre (Godim e Monken, 2009).

Raffestin (1993), um dos principais teóricos da construção desse conceito,

aponta que o território se apoia no espaço, mas não é o espaço, pois não são termos

equivalentes, sendo o espaço anterior ao território. O espaço geográfico ou

simplesmente espaço é multidimensional, concebido como absoluto, relativo, reflexo e

condição social, experênciado e vivido, simbólico e campo de lutas, aceita práticas

sociais diferenciadas e por isso conceito de espaço é distintamente construído (Corrêa,

2000). É com este sentido que o território é tratado em uma visão político-

administrativa, ou seja um espaço delimitado, o território é visto, então, como um

espaço físico, representado pelo Estado-Nação, com uma determinada ordem jurídica e

política que orienta demarcações de limites e fronteiras.

O autor ainda afirma que o território é uma produção do espaço, resultado da

ação de vários níveis de dependência de um ator. Nesse espaço, onde a energia e a

informação se projetam em forma de trabalho todas as relações envolvidas, estão

inseridas num campo de poder (Raffestin, 1993).

Rogério Haesbaert (2004) dialoga com Raffestin (1993) no sentido do território

ser um espaço delimitado, utilizando a vertente jurídica- política, mas acrescenta o

poder de controle que o Estado tem sobre esse território.

A relação entre território e poder é destacada por Raffestin (1993). O território é

um espaço produzido pelo homem de forma a atender as suas necessidades, onde as

relações de poder, muitas vezes conflituosas, estão relacionadas com o poder político

que não é restrito ao Estado, pois existem múltiplos poderes que se manifestam em

territórios regionais e locais.

28

Nesse sentido, o Estado-Nação funcionava como regulador, assegurando as boas

relações externas e internas, e nessa perspectiva o território era ao mesmo tempo

normatizado e normativo, equilibrando as relações externas e internas (Santos, 2002).

Milton Santos (2002) entende que o território é um conjunto de sistemas naturais

e artificiais, que abriga pessoas, instituições, empresas, sem importar o seu poder. Desta

forma, o território deve considerar não só as divisões jurídico-politicas no escopo do

espaço físico, mas sobretudo suas heranças históricas e seu conteúdo econômico,

financeiro, fiscal e normativo. Para o autor esse olhar para o território aponta para um

quadro de vida pautado na interdependência, constituída pelos lugares, que vai levar à

fusão entre o local, o global invasor e no caso do Brasil ao nacional sem defesa.

Com essa abordagem do território, Milton Santos (2002) traz o papel da

globalização e a sua interferência no território, na perspectiva da uniformização,

universalização, e homogeneização dos padrões econômicos e culturais a serviço da

domesticação social. Tendo como instrumento a individualização e a competitividade.

Segundo Haesbaert (2004), o território, a partir de sua perspectiva material,

representa o embate entre classes sociais e capital-trabalho.

A globalização, que figurava de forma abstrata, é sentida concretamente a partir

de sua imposição absoluta e arrebatadora. De forma indiscriminada acomete às

sociedades e aos territórios e, desta forma, o uso do território ganha outro sentido.

Mostra-se cada vez mais unitário, a fim de facilitar a nova ordem mundial, decretando a

morte do sentimento de pátria e da solidariedade e da própria ideia de nação, agravando-

se, assim, as tensões no território (Santos, 2002).

“As tensões agora reveladas pelo território resultam de um

conjunto de forças estruturais agindo nos lugares. Daí a desordem

geral que se instala, como uma vingança do território contra a

perversidade do seu uso” (Santos, 2002, pag. 86).

Milton Santos (2008) afirma que a nova construção do espaço e o novo

funcionamento do território revelam novos recortes, advindos da horizontalidade, que

são os lugares vizinhos reunidos por uma contiguidade territorial, e a verticalidade que

são os pontos distintos ligados por formas e processos socais.

Godim e Monken (2009) assimilam esta teorização de Milton Santos sobre o

encontro permanente de forças horizontais, da resistência local, com forças verticais,

29

alienantes, da globalização.

Santos (2008) reafirma a importância do lugar nessa forma de pensar o território:

“Em uma palavra: caminhamos, ao longo dos

séculos, da antiga comunhão individual dos lugares com o

Universo à comunhão hoje global: a interdependência

universal dos lugares é a nova realidade do território”

(Santos, 2008, pag. 137).

“O território, hoje, pode ser formado de lugares

contíguos e de lugares em rede, esses lugares formam as

redes e o espaço banal (Santos, 2008, pag. 139).

O território a partir do lugar é um contraponto à visão do território político

administrativo, que acaba por transformá-lo em mera porção de terra delimitada.

Nesse sentido, Monken et al (2008) pensam que com a implantação do SUS se

tem o despertar para o funcionamento dos serviços em sua base territorial,

movimentando-se a reflexão sobre os critérios para a definição do território em saúde,

de forma diferente da delimitação de área politico-administrativa que promove a

repartição do espaço sem levar em conta os processos sociais.

Moken e Barcellos (2000) apontam que muitas vezes o conceito de território é

reduzido a um formato simplificadamente administrativo e físico no serviço de saúde,

negligenciando-se o potencial que esse conceito tem para compreender os reais

problemas de saúde e propostas de solução.

Os autores expressam que o território é muito mais que uma extensão

geométrica, muito mais que um espaço político-operativo no sistema de saúde; o

território onde se verifica a interação entre população e serviço local é vivência de uma

população específica vivendo em tempo e espaços determinados e com problemas de

saúde definidos.

Essa reflexão sobre o território na organização e práticas da vigilância em saúde

coloca em cheque os limites dos territórios, pois a saúde e o adoecer não se comportam

de acordo com a delimitação estabelecida.

A análise do território pode se dar a partir do operacional, permitindo uma

30

avaliação objetiva das condições de produção, circulação, residência, comunicação e a

condição de vida, ou a partir de uma avaliação subjetiva sobre as relações sociais

específicas, ou seja, do meio percebido.

Por ser abordado por diversos pontos de vista, o território por vezes é impreciso,

e a sua interpretação referencia-se a um espaço dado pelas relações sociais, ou uma

simples localização, referenciada por diferentes escala, como global, regional, da

cidade, da rua e até mesmo de uma casa (Monken e Barcellos, 2005).

Alexandre André Santos (2009), em seu estudo acerca do lugar e território em

saúde no sistema de saúde brasileiro, toma por base a geografia e a promoção da saúde

e, nesta perspectiva, avança para além do terrritório delimitado. Para o autor, é preciso

buscar conceitos com potencialidade para problematizar a realidade, identificar

problemas e formular soluções técnicas e politicas apropriadas. Na concepção de André

Santos é necessário lançar mão de outras categorias geográficas como a de lugar.

Não é que o conceito de território não proporcione resposta, mas é que trouxe

consigo elementos com contradições intrínsecas que podem ser suplantadas por outro

conceito como o de lugar (André Santos, 2009).

Ao estabelecer contrapontos entre o território e o lugar, André Santos (2009)

afirma que o lugar é um território com vida e identidade, e um território pode conter

um, vários ou nenhum lugar. Uma das maiores diferenças estabelecidas, para o autor, é

que o território tem ligação com o poder, enquanto o lugar tem com a cultura, sendo o

lugar identificado, enquanto o território é delimitado.

Haesbaert (2004), por sua vez, compreende as intervenções do cultural na

própria dimensão de território, que é apreendido e apropriado a partir das dimensões

simbólicas, o imaginário e a identidade social construídos devido ao pertencimento ao

espaço.

Coexistem no território a dimensão simbólica ou cultural e a dimensão material,

que é de natureza econômica-politica (Monken et al., 2008). O território é construído a

partir das relações sociohistóricas, sendo as vertentes politicas, econômicas, sociais e

culturais intimamente ligadas à conjugação espaço-tempo. As relações sociais ao

mesmo tempo que produzem o espaço, acontecem no espaço, e, assim, o território é

produzido e também produz.

Como são espaços e lugares construídos socialmente, são muitos, variáveis e

dinâmicos (Monken e Barcellos, 2007).

É no percurso entre o político e o cultural que o território é visto como escala

31

social cotidiana, representando uma abordagem que propicia as análises em saúde, em

especial na atenção básica, para a compreensão do processo saúde-doença-cuidado

(Monken et al, 2008).

O processo de globalização e a reafirmação do lugar fazem surgir no cenário

científico a dimensão local, aproximando os verdadeiros significados da realidade social

através do cotidiano (Monken e Barcellos, 2005). Os chamados territórios do cotidiano

têm como parâmetros a co-presença, a vizinhança, a intimidade, a emoção, a

cooperação e a socialização com base na contiguidade, reunindo na mesma lógica

interna todos os seus elementos: pessoas, empresas, instituições, formas sociais e

jurídicas e formas geográficas.

O cotidiano imediato, localmente vivido, traço de união de todos esses dados é a

garantia da comunicação (Moken et al, 2008).

Para Milton Santos (2008),

“O território atual é marcado por um cotidiano compartido

mediante regras que são formuladas ou reformuladas localmente”

(Santos, 2008, pag. 140).

Na constituição de uma base organizativa dos processos de trabalho nos sistemas

locais de saúde é importante o reconhecimento do território e seus contextos de uso,

uma vez que estes materializam diferentemente as interações humanas, os problemas de

saúde e as ações sustentadas na intersetorialidade (Monken e Barcellos, 2005).

Neste movimento de identificação faz-se necessário o planejamento das ações,

que terá como cenário o território, onde as relações sociais acontecem, sendo assim

primordial para a investigação e apropriação/dominação do espaço e sua relação com a

saúde (Faria e Bortolozzi, 2009).

Desenvolver o trabalho com base no território, destacando o poder local,

favorece a atuação politica e social dos atores sociais na dimensão do cotidiano,

exaltando a resistência, a experiência, a vivência, a organização espontânea e a

solidariedade.

Na Carta de Ottawa a promoção da saúde é o processo de capacitação da

comunidade para atuar na melhoria de sua qualidade de vida e saúde, incluindo uma

maior participação no controle desse processo. A Carta ainda ressalta a importância de

32

se considerar as diferenças dos sistemas sociais, culturais e econômico e assim se

adaptarem as necessidades locais. Compõem a construção de políticas públicas

saudáveis, na perspectiva da promoção da saúde, a criação de ambientes favoráveis à

saúde, o reforço na ação comunitária, o desenvolvimento de habilidades pessoais e a

reorientação dos serviços de saúde (WHO, 1986).

Vinculam-se ao projeto de promoção da saúde, no Brasil, as ações em saúde da

família. O Programa Saúde da Família (PSF), hoje chamado Estratégia Saúde da

Família (ESF) é a orientação política fundamental para o desenvolvimento do SUS, e

tem o território como base para o desenvolvimento do trabalho. O Programa foi

proposto em 1994, contando com equipes multiprofissionais e tendo como referência na

convivência com a população o agente comunitário de saúde, que deve residir na

comunidade onde desenvolve seu trabalho. As equipes são responsáveis pelo

acompanhamento de uma população localizada em um território delimitado, onde

realizam ações de promoção da saúde, prevenção de doenças e agravos, recuperação,

reabilitação e vigilância em saúde.

O território na ESF é a área delimitada para atuação dos serviços, área onde é

reconhecido um ambiente, com uma determinada população com específica dinâmica

social existente nessas áreas (Pereira e Barcellos, 2006).

Há, no entanto, críticas quanto ao projeto hegemônico de promoção da saúde,

calcado na mudança de comportamentos e estilos de vida tidos como carreadores de

risco e prejudiciais à saúde. Autores como Carvalho (2004) identificam a promoção da

saúde vista nestes termos com a política neoliberal que domina a dinâmica e as relações

do capitalismo globalizado, submetendo todo o universo social às leis do mercado. A

promoção da saúde fundamenta-se, na percepção do autor, na culpabilização dos

indivíduos e orienta a consideração das questões de saúde para o nível de escolhas

pessoais de formas de se viver, sem vinculações com os processos coletivos de

reprodução social, negando e escondendo as injustiças e desigualdades geradas pelo

sistema social.

Pensando também a promoção da saúde em uma perspectiva crítica, desta feita

aludindo ao emprego da teorização desenvolvida pelo sociólogo e epistemólogo

Boaventura de Sousa Santos no campo da saúde coletiva, Freitas e Porto (2011)

destacam a necessidade de se trabalhar com critérios críticos na percepção dos cenários

prospectivos de produção de saúde no território, com uma perspectiva emancipatória em

relação às populações vulneráveis. Neste sentido, os saberes e práticas locais devem ser

33

considerados, segundo os autores, tendo em conta o futuro como contexto de sonhos e

esperanças.

A categoria território assume, portanto, importante papel para a implementação

da reforma democrática na saúde. O território, com sua materialidade histórica, constitui

espaço de trocas e pactuações entre população e serviços, sendo o suporte da

organização das práticas em saúde, da vida da população, da conformação dos contextos

que explicam a produção dos problema de saúde e da responsabilidade de atuação sobre

a realidade social (Monken et al., 2008).

5.4 – Vigilância em Saúde e participação social

A participação de grupos populares de classes sociais pobres nos movimentos de

reivindicação dos direitos sociais rompe com o domínio de uma burguesia brasileira,

que monopoliza o conhecimento adquirido nos bancos acadêmicos. Entender esse

processo político é buscar significado nos movimentos de resistência e procurar

descobrir o sentido da participação social na dinâmica das políticas públicas instituídas

e desenvolvidas pelo Estado, ou seja, desvendar os espaços em que devem se encontrar

e agir os movimentos sociais que têm atuação ou repercussão na saúde.

Historicamente a participação social tem início com as lutas que buscaram

reorientar o modelo de saúde que privilegia a assistência curativa, individual e a

medicina privada. Trata-se, no contexto da reforma sanitária que instituiu o SUS, de

lutas da sociedade civil na reivindicação de acesso a serviços de qualidade e direitos que

asseguram a manutenção da saúde.

A discussão sobre o conceito de participação, no entanto, é nova nas esferas

acadêmica e pública. O debate teórico e político no século XX consistiu em substituir

participação politica por participação social, como se as expressões fossem sinônimos,

porém no uso clássico o primeiro se refere à participação de todos os membros da polis

(condição de direito ou de dever universal) e o segundo se aplica a segmentos

específicos da população: os pobres, os excluídos, as minorias (Vianna et al, 2009).

Stotz (2008) aponta que o conceito genérico de participação social usado na

sociologia tem o sentido de integração, para indicar a natureza e o grau de incorporação

do indivíduo ao grupo e de norma ou valor pelo qual se avaliam tipos de organização de

natureza social, econômica, política etc.

34

O autor destaca que, do ponto de vista sociológico, participação é um conceito

relacional e polissêmico e do ponto de vista politico, participação é a democratização,

onde os cidadãos de forma ampla estão inseridos nos processos decisórios em uma dada

sociedade (Stotz, 2008).

Participação social é apontado por Vianna et al (2009) como a intervenção, além

da dimensão politica pública, na dimensão privada: como morar, como manter a saúde

etc, ou seja, trata-se de intervir em processos decisórios que atingem o coletivo. Em

uma sociedade privada de seus direitos mais básicos a busca por esses direitos torna-se

a expressão legítima do exercício da cidadania e de busca de uma sociedade mais

democrática.

Stotz (2008) afirma que participação social é tema central recorrente em

programas sociais e doutrinas reformistas generalizadas a partir dos anos 60,

contrapondo-se "à massificação, à centralização burocrática e aos monopólios de

poder". Participação social surgiu como "princípio democrático segundo o qual todos os

que são atingidos por medidas sociais e políticas devem participar do processo

decisório", seja qual for "o modelo político ou econômico adotado” (Rios, 1987 p.869).

Cabe ressaltar que as lutas populares elegeram a saúde como objeto de

reivindicação, em várias cidades brasileiras, desde fins da década de 1970 (Stotz, 1994).

Foi durante a década de 1980 que as manifestações populares chegaram ao ápice

no Brasil (Valla, 1998).

No início dos anos 1980 o agravo da recessão no país levou a uma grande crise

no sistema previdenciário de saúde. Para solucionar a crise o Ministério da Previdência

propõe cortar os gastos com assistência médica. Como a crise também era política

várias forças entram em luta, o faz surgir a CONASP (Conselho de administração de

Saúde), em substituição ao Ministério da Previdência ,e criação das Ações Integradas de

Saúde (AIS) que segue os mesmos passos da Medicina Comunitária, afim de alcançar as

metas do “Saúde para Todos no Ano 2000”.

A 8ª Conferência Nacional de Saúde em 1986 supera as AIS, e dá sequência às

propostas da Reforma Sanitária, cujos princípios básicos são os da criação de um

Sistema Único de Saúde (SUS).

No país, após um longo período de privação da liberdade e cerceamento dos

princípios democráticos com a ditadura militar, a Constituição de 1988 é o marco da

institucionalização da participação social, revelada a partir da mobilização social na luta

política por um Estado democrático de direito.

35

A garantia dos direitos em saúde e a participação social representam a expressão

dos indivíduos com autoridade nas decisões politicas que têm relação com suas vidas,

democratização do estado e da sociedade no que se relaciona com as politicas públicas,

gestão distribuição de recursos e acesso aos serviços de saúde, e, sobretudo, a

responsabilização do indivíduo, família e comunidade juntamente com o Estado pela

atenção às condições de saúde da população (Vianna et al, 2009).

A Constituição de 1988 incorporou em seu texto demandas de cunho

universalista em matéria de proteção social, a exemplo do direito à saúde (Stotz, 2008).

Diante desses movimentos populares, a Constituição Federal Brasileira de 1988,

no artigo 196, torna a saúde um direito e define que cabe ao Estado garantir esse direito,

provendo os cuidados necessários, mediante politicas sociais e econômicas que visem a

redução do risco de doenças e agravos proporcionando o acesso universal e igualitário

às ações e serviços para sua prevenção, proteção e recuperação (Constituição Brasileira,

1988).

“Entretanto a Constituição aprovada é bastante clara: a

participação da comunidade restringe-se à gestão administrativa

das ações e dos serviços de saúde, ficando exluida a possibilidade

de decidir sobre a formulação da política de saúde” (Valla e Stotz,

1991, pag. 26).

“Cabe ressaltar que a participação social, já no contexto da

Reforma Sanitária, era entendida como controle social enquanto

um princípio político e doutrinário que deveria nortear a

construção jurídico-institucional do Sistema de Saúde. Ainda no

Jornal da Reforma Sanitária, aparecem mais propostas a cerca da

participação popular, seriam o envolvimento da comunidade,

participação da sociedade civil, participação de entidades

representativas da população e ou de usuários, participação de

entidades dos trabalhadores, participação paritária de

represntantes do governo, trabalhadores e empregadores” (Valla e

Stotz, 1991, pag. 24).

Valla e Stotz (1991) apontam que participação popular compreende as múltiplas

36

ações que diferentes forças sociais desenvolvem para poder influenciar a formulação,

execução, fiscalização e avaliação das políticas públicas na área social (saúde,

educação, habitação, transporte etc).

Os autores chamam a atenção sobre como a participação social ao mesmo tempo

que pode ser ampla, também pode ser particularizada, e desta forma possibilitar vários

tipos de Interpretação. Segundo (Valla e Stotz, 1991), é difícil saber o que se quer

quando se fala de participação social e, assim, quando setores diversos da sociedade,

instituições e movimentos sociais referem-se ao tema podem estar querendo dizer coisas

diferentes envolvendo concepções várias.

Para Valla (1993), os sentidos mais correntes da participação social, além da

participação popular aqui destacada, são a modernização, integração dos grupos

“marginalizados”, o mutirão e o desenvolvimento comunitário.

Segundo Valla e Stotz (1991), a modernização é entendida como a superação dos

atrasos tecnológicos e culturais de uma determinada sociedade. Nessa perspectiva, uma

sociedade moderna configura avanço na forma de produzir e consumir, construída

através de uma determinada ordem que associa participação social à melhora de vida da

população pelo acesso à inovações tecnológicas.

Contudo os autores desfazem essa associação “lógica” ao pontuarem que para a

população a melhora de vida está relacionada com boas condições de trabalho, bons

salários e quando seus direitos sociais são respeitados (Valla e Stotz, 1993).

A integração dos grupos marginalizados é um dos sentidos mais perversos da

participação social, pois parte da premissa da exclusão social. Parte do pressuposto de

que a grande massa da população está fora da sociedade, devido a sua pobreza, que é

medida pela capacidade de consumo de mercadorias e pelo acesso aos serviços básicos,

com destaque para educação e saúde.

Esta forma de ver a participação, quando é medida pela capacidade de consumo,

transforma cidadania em mercadoria. Só a tem quem pode pagar por ela.

A crítica apresentada por Valla e Stotz (1993) a essa concepção de participação

social enfatiza a culpabilização dos pobres pela situação de pobreza. É neste contexto

que, segundo os autores, surgem os “animadores”, esses vem de fora da realidade da

população que tem sua capacidade de participação reduzida, limitada, e vem com a

missão de animar, incentivar, esclarecer, motivar, encorajar, como verdadeiros

redentores.

Poderíamos acrescentar a esses animadores a função, ou papel, de

37

“empoderadores” que têm o objetivo de convencer a população sobre seus limites de

reivindicação diante das boas intenções do Estado ou de outro poder organizado.

Empoderar, neste sentido, é fazer o outro repetir um discurso que lhe foi transmitido

como verdade, convencendo-os a acomodar-se às precárias condições de vida e

vulnerabilidade social que definem sua existência.

É neste contexto que surgem soluções como o mutirão, que surge como um

apelo, um convite que geralmente vem de governos, grupos políticos e religiosos

interessados na manutenção de uma determinada ordem, à população trabalhadora que

mora, trabalha, vive em um dado território que apresenta vulnerabilidade e risco, para

realizar com seu próprio trabalho, tempo e lazer e às vezes dinheiro obras que são da

responsabilidade de quem faz o convite, ou seja o governo (Valla e Stotz, 1991).

No desenvolvimento comunitário o Estado contribui financeiramente e a

população planeja e toma as decisões. Valla e Stotz (1991) destacam que a população

trabalhadora participa dos planos de desenvolvimento sem ter sua participação na

riqueza, e completam:

“... é sutil e, ao nosso ver, contém uma meia-verdade, pois é

efetivamente a população trabalhadora que deve decidir suas

próprias condições de vida, só que deve também fiscalizar os

especialistas, determinando para quem as melhorias são

desejáveis e para quem terão efeitos mais definidos. Na verdade,

o que falta mencionar na proposta é que os recursos do Governo

são provenientes da própria população” (Valla e Stotz, 1991, pág.

12).

Dentre todas as formas de participação social, a participação popular tem a

faculdade de interferir politicamente, através das entidades representativas da sociedade

civil em órgãos, agências ou serviços do Estado. Dependendo da forma como é

compreendida e desenvolvida, esta forma de participação traz implicações politico-

ideológicas para as entidades populares, a ponto de colocá-las em contradição e em

disputa. Quando, ao mesmo tempo que a participação legitima a política do Estado,

sendo ela favorável ou não à grande massa trabalhadora, também estimula a disputa

pelo controle e a destinação da verba pública, colocando em cheque a independência e a

idoneidade das entidades populares (Valla e Stotz, 1991).

38

Valla e Stotz (1991 defendem a participação popular como uma prática capaz de

transformar a sociedade, ressaltando, contudo, que exercer tal prática sempre esbarrará

no impedimento dos representantes da burguesia, que lutam pela manutenção de seus

privilégios, fazendo uso da restrição de acesso às informações, limitando a participação

e atribuições, retardando decisões ou até mesmo encaminhando as discussões para

instâncias superiores onde o poder de reivindicação perde sua força. Em outra

perspectiva, funcionam como bloqueio das manifestações e movimentos populares os

atrativos mecanismos da cooptação e do clientelismo.

Em saúde, sobretudo, a participação popular é a garantia da valorização de

várias realidades vivenciadas pelo indivíduo e o coletivo que contribuem para a

conscientização e, fundamentalmente, para a luta pela mudança rumo à constituição de

uma sociedade igualitária em direitos e democracia (Valla, 1993).

Como nova estratégia de saúde pública, recomendada e adotada

internacionalmente, têm-se desenvolvido desde a década de 1970, o Projeto da

Promoção da Saúde. Surgida nos países capitalistas desenvolvidos, a partir de modelo

canadense, esta é uma das principais propostas da Organização Mundial de Saúde e do

Banco Mundial para o desenvolvimento de políticas de saúde em diversos países. No

Brasil, a proposta acompanha o desenvolvimento da Vigilância em Saúde e a

reorganização da rede básica, sustentada pela ESF.

O eixo da promoção da saúde voltado para a participação popular tem como

estratégia o desenvolvimento da capacidade dos sujeitos individuais e o fortalecimento

das ações comunitárias. Guardem-se, neste aspecto, os aportes críticos de Carvalho

(2004) e Freitas e Porto (2011) já apresentados em tópico anterior.

Carvalho (2004), como já foi dito, aponta o caráter não transformador do Projeto

de Promoção da Saúde, um ajuste neoliberal que procura passar para os indivíduos e

para a comunidade a responsabilidade pelos cuidados de saúde.

Jairo de Freitas e Marcelo Firpo Porto (2011), por sua vez, prucram fazer

convergir reflexões de Boaventura de Sousa Santos e Paulo Freire para aplicação crítica

ao modelo de promoção da saúde. De Sousa Santos trazem o reconhecimento do caráter

predominantemente regulador das atuais ciências sociais, produzidas no Norte, e sua

proposta de construir uma ciência emancipadora que, produzida no Sul, releve

centralmente o conhecimento popular. Nesta concepção, Freitas e Porto enfatizam a

dimensão que identifica a saúde como direito contraposta àquelas que privilegiam a

saúde como bem econômico e espaço de acumulação de capital. De Freire trazem a

39

ideia de “inédito viável”, onde o educador sublinha o conhecimento das razões

históricas e econômicas para ultrapassar a desesperança construindo uma sustentação

utópica que se opõe a uma visão fatalista de realidade. A experiência do sujeito histórico

expõe o confronto entre o senso comum e o saber científico, estabelecendo um

movimento de ruptura e avanço, marcado pela identificação do conflito entre direito,

igualdade e reconhecimento das diferenças, sendo essas tensões que impulsionam o

desenvolvimento social contra-hegemônico.

A combinação entre saberes populares e práticas comunitárias e técnicas

confronta o modelo médico que serve de orientação dominante para os modelos

assistenciais em saúde, como identifica Teixeira (2002), e aproxima as ações das

necessidades reais e da reorganização da relação entre os sujeitos, profissionais e

usuários.

Carvalho (2004) envolve nesta reflexão crítica ao Projeto de Promoção da Saúde

o conceito de empoderamento, chamando a atenção para a possibilidade de sua

compreensão sob formas conservadoras ou transformadoras, alimentando ou não o

controle dos indivíduos e coletivos sobre os determinantes da saúde.

Empowerment é um conceito complexo, influenciado por vários campos do

conhecimento. Tem sua origem associado às lutas pelos direitos civis nos EUA, o

movimento feminista e a ideologia da ação social. A influência dos movimentos de

auto-ajuda e da psicologia comunitária, que contribuem para a elaboração e

entendimento do conceito, podem conduzir e justificar políticas para a manutenção de

uma ordem conservadora ou para a construção de empreendimentos libertários. O

conceito se firma na década de 1990 ao inserir no seu escopo o direito a cidadania em

todas as práticas da vida social, inclusive na ordem médica e na educação em saúde

(Carvalho 2004).

Meirelles e Ingrassia (2006) ressaltam que o conceito de empoderamento é

controverso, e deve ser desenvolvido como um processo dinâmico que é produzido a

partir dos sujeitos no contexto em que estão inseridos, ou seja, deve ser entendido como

algo que é muito mais do que simplesmente transferir ou tomar posse de elementos de

um processo decisório na coletividade.

Na percepção de Paulo Freire, como esclarece Guareschi (2008),

empoderamento é um processo que emerge das relações sociais. Não é outorgado por

ninguém a ninguém, é resultado da reflexão crítica sobre o mundo. Na visão de Freire,

como aponta Guareschi, o sentimento de liberdade de nada serve se não implicar na

40

conscientização e no compromisso de lutar pela libertação do outro e da comunidade

por meio da transformação social. O que está em jogo no empoderamento é a

capacidade do sujeito de se apropriar dos meios para ultrapassar os limites que são

impostos e não percebidos por uma consciência ingênua, e com isso protagonizar a sua

própria história, tornando-se cidadão crítico e consciente.

Ninguém, rigorosamente, transfere poder, o processo de empoderamento na

visão de Paulo Freire, complementa Guareschi (2008), faz-se no sentido de ativar a

potencialidade criativa de alguém. Não é ato individual, psicológico, mas político e

social.

No contexto da promoção da saúde, o desenvolvimento da capacidade dos

sujeitos é passível de uma interpretação de que a pessoa vence pelo próprio esforço,

com os próprios recursos, e, nesse sentido, o empoderamento, unido a um discurso de

produção da autonomia, é utilizado para justificar a dificuldade de acesso a serviços

públicos e bens sociais, isentando-se o Estado e suas instituições de responsabilidade.

É desta forma que surge a estratégia de culpabilização individual ou coletiva que

orienta a forma dominante de entender a promoção da saúde.

São estas contradições que dão suporte para estratégias que têm o objetivo de

fortalecer a auto-estima e a capacidade de adaptação ao meio por meio do

desenvolvimento de mecanismos de auto-ajuda (Carvalho, 2004).

O empoderamento é um processo de ressignificação e politização, destacando-se

o poder como um recurso, material e não-material, e diversas instâncias da vida em

sociedade como intra-psiquica, intersubjetiva, familiar, comunitária e étnico-cultural.

Transportar o conceito para a lógica da saúde é pensá-lo de forma crítica.

A incorporação dos saberes e práticas cotidianas locais é parte do processo de

empoderamento, pois estes estão baseados em valores solidários que se contrapõem à

lógica do mercado (Dias e Porto, 2011).

Com uma visão que acompanha estas reflexões críticas, Victor Valla criou o

conceito de Vigilância Civil da Saúde (Guimarães et al., 2011). Ligado

fundamentalmente à educação popular em saúde, esse conceito se desenvolveu a partir

de um sistema de escuta acerca do saber local, do lugar, vivido e experienciado, sobre o

processo saúde-doença-cuidado e seus determinantes sociais (Valla, 1998).

Valla (1998) afirma que há um acúmulo de conhecimentos resultante da pesquisa

científica, de um lado, e há um acúmulo de conhecimentos resultantes das experiências

de vida, escolarização e luta políticas dos setores organizados da sociedade civil, do

41

outro, que devem ser envolvidos no processo de educação em saúde.

A vigilância civil da saúde é o processo que privilegia a abordagem qualitativa e

a pesquisa participante, enfatizando a prática da educação popular em saúde,

destacando-se nessas intervenções a Ouvidoria Coletiva (Guimarãres et al., 2011).

Segundo Stotz (2009), para Victor Valla, a Ouvidoria Coletiva era a

concretização da Vigilância Civil da Saúde. O projeto da vigilância civil da saúde,

centrado na Ouvidoria Coletiva, era uma expressão concreta e frutífera do diálogo entre

sociedade civil e os profissionais de saúde. Essa experiência recebeu o Prêmio Antônio

Sérgio Arouca de gestão participativa.

Os fóruns da Ouvidoria Coletiva eram espaços de troca de saberes científicos e

saberes populares, promovendo uma construção compartilhada do conhecimento

(Guimarães et al., 2011).

Pensamos que a vigilância civil da saúde vai ao encontro da defesa feita por

Breilh (2002), quando afirma que a vigilância em saúde é um instrumento de poder, que

deve ser usado pelo coletivo. Pensar essa concepção significa unir as ciências sociais à

vigilância em saúde de modo a trabalhar entendendo que os saberes técnicos e

populares, embora distintos, são ambos importantes para pensar o processo saúde-

doença.

A partir desta reflexão podemos compreender cenários prospectivos como

estratégia para a vigilância em saúde. Os saberes e práticas locais se encontram com a

técnica, por meio de trocas vivenciadas pela população e pelo profissional de saúde.

Esse encontro carreia sonhos e esperanças e potencial imaginativo a construção de outra

vigilância em saúde onde se façam presentes os movimentos sociais.

Para Breilh (2002) uma postura subversiva se faz necessária para modificar o

sistema de vigilância epidemiológica vigente. O autor defende a proposta de

transformar a vigilância da saúde em um instrumento funcional de poder, em um

instrumento de poder coletivo para a prevenção profunda. Para isso, ressalta a

importância de compreender a fase histórica e os direitos sociais. Numa sociedade em

que o modelo produz e reproduz as desigualdades sociais e econômicas, a vigilância

epidemiológica não pode estar limitada a uma técnica de monitoramento de doenças. O

efetivo diálogo amplo com a saúde requer um olhar atento para os determinantes

sociais. O autor defende uma vigilância epidemiológica de técnicas, mas também

sociobiológica, em que os corpos expressem o que acontece na ordem social.

42

5.5 – Estudos sobre o desenvolvimento da Vigilância em Saúde no nível local

Alguns estudos abordam a perspectiva de ampliação da vigilância

epidemiológica no desenvolvimento de uma vigilância em saúde, em consonância com

a proposta do discurso oficial. Isso significa reorganizar as ações da vigilância

epidemiológica de nível central em ações de nível local. Assim sendo, é necessário

redirecionar a vigilância epidemiológica ampliando seu escopo, considerando a saúde

numa perspectiva social, tendo um olhar especial para os determinantes sociais e como

estes interferem no processo saúde-doença-cuidado.

O estudo de Rodrigues et al. (2001) teve como objetivo identificar, descrever e

analisar o quanto as ações de vigilância epidemiológica se aproximam da estratégia de

vigilância à saúde e caracterizar a prática das enfermeiras nesse contexto operacional.

Elegeu-se como local para desenvolvimento do estudo uma unidade de saúde (US) sob a

supervisão do NRS-1(Núcleo Regional de Saúde do Estado de São Paulo), localizada na

região oeste da cidade de São Paulo, no bairro de Pinheiros. A unidade deve servir como

porta de entrada do Sistema de Saúde e atuar como referência de segunda linha para as

especialidades médicas de clínica geral, cardiologia, dermatologia, endocrinologia,

neurologia, oftalmologia, otorrinolaringologia, ortopedia, pneumologia, proctologia,

psiquiatria, tisiologia e urologia.

Com base nas ações da vigilância epidemiológica preconizadas pelo Ministério

da Saúde, foi elaborado um roteiro tipo check-list para a coleta de dados. Os dados

evidenciaram que as ações do serviço de vigilância epidemiológica estão relacionadas à

notificação, tratamento e prevenção do contágio das Doenças de Notificação

Compulsória. E que, pelas ações listadas e pela frequência de realização, o trabalho das

enfermeiras apresentou-se diluído e aparentemente em concordância com o modelo

clínico hegemônico, constatando-se que a prática ampliada da vigilância epidemiológica

ainda não se encontra incorporada ao trabalho da Unidade de Saúde em estudo

(Rodrigues et al., 2001).

O estudo realizado por Santos e Melo (2008) teve como objetivo avaliar a

implantação da descentralização das ações de vigilância epidemiológica para a Equipe

de Saúde da Família (ESF) do segundo maior município do Estado da Bahia. A

descentralização aconteceu no ano de1993, com a criação da Divisão de Controle

Epidemiológico da Secretaria Municipal da Saúde. O município dispõe de 72 equipes de

43

Saúde da Família, estando 19 localizadas na zona rural e 53 na zona urbana, com

cobertura de 50% do total da população de referência.

Assumiu-se como referência a evolução histórica e conceitual da vigilância

epidemiológica, a descentralização da saúde e os aspectos conceituais da avaliação.

Trata-se de um estudo de caso, foi selecionada uma unidade de saúde da família do

município. Implantada em maio de 2002, a equipe tem sob a sua responsabilidade sete

microáreas, abrangendo 883 famílias. Para coleta de dados primários foi aplicada a

entrevista semi-estruturada. Os dados secundários foram obtidos através da análise de

documentos. Para análise dos achados, utilizou-se a técnica de análise temática e a

técnica de análise de avaliação, adaptada pelos autores, o que permitiu analisar as

representações dos atores da pesquisa na emissão de enunciações (Santos e Melo,

2008).

O estudo identificou que tanto os trabalhadores de saúde como os gestores

compreendem a vigilância epidemiológica como uma prática voltada para o poder de

polícia médica, a vigilância voltada para o controle das doenças transmissíveis e como

uma vigilância de riscos e danos. A prática de vigilância epidemiológica é centrada no

controle de doenças e agravos, direcionado para o indivíduo e fragmentada. A

descentralização da vigilância epidemiológica para a ESF contribuiu para a melhoria de

alguns indicadores de saúde, confirmando o pressuposto do estudo. Concluiu-se que a

descentralização ainda não está implantada, caracterizando-se o processo encontrado

como desconcentração de atividades (Santos e Melo, 2008).

Faria e Bertolozzi (2007) buscaram em seu estudo identificar e analisar a

estruturação das práticas de vigilância na Atenção Básica em um território do Município

de São Paulo. Foi realizado um estudo exploratório-descritivo e qualitativo, pautado no

referencial teórico da vigilância epidemiológica. Foi constituída amostra referida à

abrangência do Programa de Saúde da Família e Modelo Médico-Assistencial Privatista.

Os dados foram analisados segundo técnica de análise de discurso orientada pela Teoria

Gerativa de Sentido de Greimás.

Os dados apontaram que o trabalho cotidiano se apresentou fragmentado,

segundo a concepção materialista do processo de trabalho e da determinação social da

saúde-doença. A implantação da vigilância à saúde se mostrou limitada, em virtude da

precariedade da infra-estrutura, falta de qualificação profissional apropriada, incentivo

político-gerencial e da participação da população. Porém, segundo as autoras, no nível

local há potencial para transformar a organização do trabalho em saúde e atender às

44

necessidades de saúde da população através da operacionalização da vigilância em

saúde (Faria e Bertolozzi, 2007).

Villa et al (2002) procuraram analisar como se conforma a prática da vigilância

epidemiológica na Secretaria Municipal da Saúde de Ribeirão Preto, sob a orientação

dos princípios do Sistema Único de Saúde(SUS) e da perspectiva da vigilância em

saúde face ao processo de municipalização da saúde na década de 1990.

Foi realizado um estudo qualitativo, utilizando-se como instrumento de coleta de

dados, fontes documentais e entrevista semi-estruturada. O critério de escolha dos

entrevistados foi intencional, a partir do posto de trabalho que cada sujeito ocupava no

sistema local de saúde. A análise dos dados contou com a técnica de análise de

conteúdo. Os dados apontaram que o trabalho realizado na vigilância epidemiológica se

organiza tomando com ponto de partida o dano e, a partir deste, se realizam as medidas

de controle e prevenção. A vigilância epidemiológica se apresenta como prática de

controle e prevenção, com realização de notificação e bloqueio e ações de educação,

treinamento, orientação, discussão e reuniões com a comunidade que envolvem grupos

da população e profissionais de saúde. Os dados também apontaram para uma

ampliação da concepção da vigilância epidemiológica no processo saúde-doença, que

leva em consideração as condições de vida e moradia, constituindo uma abordagem

interdisciplinar intersetorial. Existe uma potência positiva confirmando a proposta de

construção da vigilância em saúde, onde as ações da vigilância epidemiológica estão

relacionadas ao trabalho no território (Villa et al,2002).

Os estudos apresentados demonstraram que a possibilidade de reestruturação das

práticas de vigilância é possível, contudo ainda não aconteceram. Tal dificuldade se

estabelece, pois as atividades de vigilância epidemiológica estão estruturadas sobre os

pilares de uma medicina centrada na assistência e em pressupostos biomédicos para

identificação e abordagem da saúde. O processo saúde-doença não incorpora os

condicionantes sociais e, embora baseando-se na multicausalidade, existe um

predomínio do modelo clínico hegemônico.

A proposta de descentralização das ações da vigilância epidemiológica associada

à atenção básica e à ESF é, contudo, apontada como estratégia para promover uma

saúde local e construir uma vigilância epidemiológica que se preocupe com as

necessidades locais, privilegiando a participação de outros atores sociais que não

aqueles ligados profissionalmente aos serviços de saúde.

45

6 – METODOLOGIA

6.1– Pesquisa qualitativa

O presente estudo é uma pesquisa de natureza qualitativa. A pesquisa qualitativa

“permite desvelar processos sociais ainda pouco conhecidos referentes a grupos

particulares, propicia a construção de novas abordagens, revisão e criação de novos

conceitos e categorias durante a investigação” (Minayo, 2008 p. 57).

O método cientifico que fundamenta nossa pesquisa está baseado nas teorias das

ciências sociais, configurando uma pesquisa estratégica. Serão utilizadas técnicas de

coletas de dados, pesquisa bibliográfica, fontes documentais e entrevista semi-

estruturada, sendo os dados produzidos analisados pelo método de análise de conteúdo.

O objeto das ciências sociais é por natureza qualitativo, e o método qualitativo

se aplica ao estudo dos produtos das interpretações do pensar, sentir e agir dos sujeitos e

suas relações sociais (Minayo, 2008).

Para Minayo (2008) a pesquisa qualitativa está balizada pelas vivências do

indivíduo e da coletividade, estabelecendo-se dessa forma como objeto das ciências

sociais, onde a historização das vivências imprime significado e intencionalidade

diferente da visão do pesquisador, e assim dão sentido ao trabalho intelectual.

A pesquisa qualitativa é a interpretação da compreensão subjetiva das pessoas a

respeito do mundo e de sua vida cotidiana, ou seja, em seus ambientes naturais em vez

de ambientes artificiais ou experimentais, e, por isso, é uma pesquisa interpretativa

(Mays e Pope, 2009).

Os métodos qualitativos aplicados à estudos de atenção à saúde sobre serviços

em saúde oferecem uma abrangência de compreensão e entendimento dos profissionais

e pesquisadores com uma formação biomédica, já que esses métodos tradicionalmente

são empregados nas ciências sociais (Mays e Pope, 2009).

A percepção dos atores sociais e sua coletividade são marcadas pela crença,

cultura, relações que constroem representações que só podem ser percebidas por quem

as vive, e na pesquisa qualitativa a relação entre pesquisador e pesquisado dá um caráter

subjetivo e ao mesmo tempo concreto ao objeto.

Segundo Minayo (2008),as expressões humanas, em suas múltiplas dimensões,

se expressam através das abordagens qualitativas, e por isso esta é a melhor para

46

investigar os grupos e segmento delimitado e focalizados, tomando-se as relações e

histórias sociais sob a perspectiva do sujeito e para análises de discursos e de

documentos.

A relação entre o sujeito investigador e o sujeito investigado é crucial para

construção do conhecimento desde a concepção do objeto investigado até a conclusão

do trabalho, ambos são atores sociais e sujeitos históricos. O objeto das ciências sociais

é histórico, a sociedade e os indivíduos têm consciência histórica, os investigadores

vivem um processo dialético como autores e frutos de seu tempo, uma relação de

identidade entre o sujeito e o objeto de investigação e a ideologi a está presente de

forma intrínseca e extrínseca (Minayo, 2008).

Nessa pesquisa foram realizadas entrevistas, anotações do diário de campo e

pesquisa documental. A combinação de fontes de dados e abordagens busca a

comparação e complementação de informações em uma perspectiva de triangulação.

É importante ressaltar, como pontuam Mays e Pope (2008), que a descrição

detalhada de sua metodologia é critério de rigor para a pesquisa qualitativa.

6.2 – Seleção da amostra

Nesse estudo a seleção da amostra foi intencional, o critério de escolha para

definir os entrevistados levou em conta o posto de trabalho que cada pessoa ocupa no

serviço de vigilância epidemiológica do Município considerando-se sua relação com a

proposta da investigação.

Na pesquisa qualitativa a amostragem requer toda uma atenção especial, pois

esse é um dos principais passos para a pesquisa. A escolha do grupo determina quem vai

ser entrevistado, a quem observar e o que observar, o que discutir e com quem. O

critério de escolha não privilegia uma representatividade numérica e sim a busca do

pesquisador pelo aprofundamento, abrangência e diversidade no processo de

compreensão do grupo, organização, instituição, política ou representação selecionado

(Minayo, 2008).

Cabe ressaltar que a pesquisa é formulada para fornecer uma visão de dentro do

grupo pesquisado, buscando estudar sempre um grupo pequeno de pessoas, onde os

critérios de escolha são definidos conforme os objetivos do estudo (Victora et al, 2000).

Minayo (2008) aponta critérios no processo de definição da amostra, dentre os

quais destacamos: privilegiar os sujeitos sociais que detêm os atributos que o

47

investigador pretende conhecer; definir o grupo de maior relevância, para centralizar

nele o foco da abordagem.

Desta forma, os escolhidos para serem entrevistados foram os profissionais de

nível superior atuantes no serviço de vigilância epidemiológica nos níveis central e local

do Município.

Considera-se nível local o serviço da Unidade Hospitalar Municipal.

A escolha dos profissionais de nível superior destaca-se em função de sua

posição estratégica na definição e desenvolvimento das práticas de vigilância.

Diante da grande rotatividade de profissionais nos serviços que se agrava no

momento da pesquisa, com a realização das eleições municipais e as mudanças nos

quadros de técnicos, consideraremos também a escolha daqueles com atuação recente

nos serviços que, por ventura, não estejam mais atuando nos serviços na oportunidade

do estudo.

Sendo assim, teremos um total de seis entrevistados, três do nível central e três

do nível local.

6.3 – Entrevista semiestruturada

É através da entrevista que se constroem informações acerca do objeto de

pesquisa e determinado tema cientifico que está inserido no contexto do trabalho de

campo, propiciando a conversa entre dois ou vários interlocutores, estando essa

interação social sujeita à dinâmica aplicada às relações sociais. Na realização se faz

necessária a apresentação, menção do interesse da pesquisa, apresentação de credencial

institucional, explicação dos motivos da pesquisa, justificativa da escolha do

entrevistado, garantia do anonimato e sigilo, e a conversa inicial (Minayo, 2008).

Os dados da entrevista são constituídos por sentimentos, sentidos e sensações

que marcam a vivência e a experiência da pessoa. Refletir sobre essa realidade constitui

subsídios para a informação de natureza primária (Minayo, 2008).

Para Minayo (2008) as informações de natureza primária constituem uma

representação da realidade subjetiva, por isso cada entrevista é exteriorizada de forma

ímpar. Tanto no ato da realização da entrevista como na produção de dados.

Com a entrevista, “o investigador terá em mãos elementos de relações, práticas,

cumplicidades, omissões e imponderáveis que pontuam o cotidiano” (Minayo, 2008,

p.263)

48

Neste contexto, os pesquisadores qualitativos utilizam a conversa como forma

de entrevista para coletar dados que estão relacionados com a visão que as pessoas têm

sobre suas experiências (Mays e Pope, 2009).

Mays e Pope (2009) apontam três tipos de entrevista: estruturada,

semiestruturada e em profundidade. Em nosso trabalho escolhemos trabalhar com a

entrevista semiestruturada.

Foi aplicado, no início do encontro, um questionário breve para caracterização

sociodemográfica e da capacitação técnica e experiência de trabalho dos entrevistados,

que consta de informações como idade, sexo, função, formação em nível de graduação e

pós-graduação, capacitação em serviço, tempo de atuação na vigilância, tempo de

atuação no município.

A entrevista semiestruturada destaca-se por ter como uma das principais

características a variabilidade, quando as questões não são pré-codificadas e permitem

aprofundar a comunicação verbal (Minayo, 2008).

Como definem Mays e Pope (2009), entrevista semiestruturada tem como base a

flexibilidade, onde as questões semiabertas definem a área a ser explorada. Tanto o

entrevistador como a pessoa entrevistada podem divergir quanto a manter uma ideia e

aprofundaras respostas.

Segundo Minayo (2008), este tipo de entrevista combina perguntas fechadas e

abertas e, assim, o entrevistado não fica preso a um questionário, inclusive podendo

discorrer sobre o tema. O roteiro é apropriado de acordo com o pesquisador, a autora

chama a atenção, embora combine perguntas é importante seguir a sequência das

questões, o que assegura que as hipóteses e os pressupostos sejam considerados na

conversa.

O roteiro nos serviu como um guia que visa compreender o ponto de vista do

sujeito/objeto e contém poucas questões. É uma lista de temas dos indicadores

qualitativos de uma investigação, e os conceitos que representam as faces dos objetos

investigados também devem estar presentes. A bordagem empírica do ponto de vista do

entrevistado deve apresentar tópicos que guiam uma conversa, com o fim de ampliar e

aprofundar a conversar e possibilitar observar relevâncias e ênfases (Minayo, 2008).

Minayo (2008) destaca que o roteiro da entrevista semiestruturada é elaborado

de forma a permitir flexibilidade nas conversas e absorver novos temas de relevância, a

lista deve conter um item a induzir uma conversa sobre a experiência. O guia de

entrevista deve conter alguns itens indispensáveis para o delineamento do objeto em

49

relação à realidade empírica e as questões do roteiro devem está de acordo com o

delineamento.

As entrevistas foram gravadas em meio eletrônico e, posteriormente, transcritas

para análise. As entrevistas foram agendadas e realizadas em local de escolha do

participante, reservado o suficiente para evitar interrupções e observação de outros,

resguardando-se sua identidade e livre palavra.

O questionário sobre o perfil sociodemográfico e funcional e o roteiro da

entrevista semiestruturada são apresentados no Apêndice 1.

6.4 – Diário de campo

O diário de campo é um instrumento onde o pesquisador diariamente faz

anotações sobre elementos observados, impressões pessoais, conversas espontâneas e

informais, comportamentos e quaisquer manifestações que interessem ao estudo

percebidas pela pesquisadora (Minayo, 2008).

Para Mays e Pope (2009) o diário de campo é o mais básico, fiel e detalhado

instrumento de registro de dados do pesquisador a cada visita ao campo. É um

documento pessoal do pesquisador, em que tudo deve ser registrado, as observações,

experiências, sentimentos. Ressaltam os autores que muitas vezes são as informações do

diário de campo que nos dão subsídios para analisar os dados coletados de outra forma.

6.5 – Análise dos resultados

Minayo (2008) apresenta-nos a definição de Bardin (1979), onde análise de

conteúdo é um conjunto de técnicas de análise de comunicação visando obter, por

procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens,

indicadores (quantitativos ou não) que permitem a inferência de conhecimentos

relativos à condições de produção/recepção destas mensagens.

A análise de conteúdo constitui uma metodologia de pesquisa usada para

descrever e interpretar o conteúdo de documento e texto, a descrição é sistemática, o

que favorece a reinterpretação das mensagens (Moraes, 1999).

Para Minayo (2008), análise de conteúdo representa o tratamento dos dados de

uma pesquisa qualitativa, que, para além de ser um procedimento técnico, marca uma

busca histórica da teoria e da prática no campo das investigações sociais. Sendo assim, a

50

autora esclarece que a técnica permite tornar replicáveis e válidas interferências sobre

dados de um determinado contexto, para isso são utilizados procedimentos

especializados e científicos.

Nas definições de Minayo (2008) e Bardin (1979) o processo de inferência é

ressaltado.

Moraes (1999) aponta que análise de conteúdo é uma técnica de leitura e

interpretação do conteúdo dos documentos oriundos da pesquisa, em que a análise

adequada possibilita o conhecimento de aspectos e fenômenos da vida social de outro

modo inacessíveis, e um texto pode conter muitos significados como:

a) o sentido que o autor pretende expressar pode coincidir com o sentido

percebido pelo leitor do mesmo;

b) o sentido do texto poderá ser diferente de acordo com cada leitor;

c) um mesmo autor poderá emitir uma mensagem, sendo que diferentes leitores

poderão captá-la com sentidos diferentes;

d) um texto pode expressar um sentido do qual o próprio autor não esteja

consciente.

Na análise de conteúdo o pesquisador, mesmo seguindo uma técnica de leitura e

interpretação, tem que lançar mão da percepção e da subjetividade, o que torna a

interpretação ausente de neutralidade e presente do componente pessoalidade.

Dentre as modalidades de Análise de Conteúdo, Minayo (2008) destaca a

Análise Temática, pois esta é a mais apropriada para pesquisas qualitativas na saúde.

Na análise temática o tema está ligado a um determinado assunto, consistindo

essa técnica na identificação e posterior interpretação da presença ou frequência de

elementos discursivos numa comunicação, pretende-se descobrir os núcleos de sentido

para o objeto analisado. Está dividida em três etapas (Minayo, 2008): pré-análise,

exploração do material e tratamento dos resultados obtidos e interpretação.

Primeira Etapa: Pré-Análise – Nessa etapa são selecionados os documentos e

discursos a serem analisados, as hipóteses e objetivos iniciais são revistos, assim como

a relação entre as etapas realizadas para elaboração de indicadores utilizados na

compreensão do material e posterior interpretação. Para o desenvolvimento desta etapa,

há três fases a serem seguidas: a leitura flutuante, constituição do corpus e formulação e

reformulação de hipóteses e objetivos.

Na Leitura Flutuante do conjunto das comunicações, o conteúdo do material de

campo invade o pesquisador, a partir de um profundo e intenso mergulho nesse

51

universo, em que as dinâmicas entre hipóteses iniciais e emergentes, e as teorias

relacionadas ao tema transformam o material que antes representava o caos em uma

leitura sugestiva.

Já a Constituição do Corpus significa o estudo em toda a sua dimensão e

totalidade, representado pela exaustividade, representatividade, homogeneidade e

pertinência que respectivamente simbolizam contemplar todo o roteiro; conter

características essenciais do objeto; critérios de escolhas precisos para os temas,

técnicas e interlocutores; e que os documentos analisados respondam aos objetivos do

trabalho.

Por último e não menos importante encontra-se a etapa da Formulação e

Reformulação de Hipóteses e Objetivos, que consiste na leitura exaustiva do material

orientada pela busca de um saber inicial, nesse processo podem aparecer novos rumos

para a interpretação e novas indagações, por isso que essa fase também pode significar a

reformulação de hipóteses e objetivos.

Segunda Etapa: Exploração do Material - Essa etapa é classificatória, através da

categorização de expressões ou palavras significativas a fala será organizada na busca

da compreensão do texto. Para alcançar a classificação, na pré-analise o texto é

recortado em unidades de registro (palavras, frases, temas, personagens, e

acontecimentos), depois é codificado, e por fim é feito a classificação e agregação dos

dados, para a escolha das categorias teóricas responsáveis pela especificação dos temas.

Terceira Etapa: Tratamento dos resultados obtidos e interpretação - Os dados

trabalhados são inferidos e interpretados de acordo com o referencial teórico inicial,

desta forma essa relação pode apontar para novos referenciais teóricos e outras

interpretações.

Essa etapa é retomada as explicações e hipóteses, e essa serão unidas aos

achados dando sentido a pesquisa.

A interpretação dos dados pode levar a teorias que foram confirmadas ou

rejeitadas em outros estudos (Vazquez et al., 2006).

52

6.6 – Aspectos éticos

Essa pesquisa foi submetida ao Comitê de Ética da Escola Nacional de Saúde

Pública Sérgio Arouca, e recebeu parecer favorável em 07/12/2012.

As atividades da pesquisa relacionadas com a coleta de dados estão em

consonância com as Diretrizes e Normas Reguladoras de Pesquisas envolvendo Seres

Humanos, estabelecidas pela Resolução CNS 196/96, assegurando assim, o anonimato

dos autores e o sigilo das informações relatadas.

No caso específico da investigação proposta, para manutenção do sigilo quanto à

identidade dos entrevistados, estes nomeados apenas por números sequenciais, sendo

suprimida na publicação dos resultados a identificação do município envolvido, que

será nomeado apenas como um município de médio porte da Região Leste do Estado do

Rio de Janeiro localizado na área de influência do Comperj.

Foi fornecido ao entrevistado um termo de consentimento livre e esclarecido

(TCLE) (Apêndice 2), para que este, após informado sobre a presente investigação e

seus procedimentos, possa autorizar de forma voluntária, o prosseguimento do trabalho.

Esse processo visa, fundamentalmente, resguardar o respeito às pessoas, reconhecendo-

se a autonomia de cada indivíduo e garantindo-se a livre escolha, após o esclarecimento

sobre a pesquisa.

A Carta de Autorização das autoridades municipais do município de realização

da pesquisa foi e enviada ao CEP.

7 – Apresentação e Discussão dos Resultados

7.1 - Cenário encontrado na Pesquisa de Campo

Ao iniciarmos o trabalho em campo vivenciamos um cenário tenso, gerado pela

realização das eleições municipais. Os conflitos no território no momento de nossa

pesquisa inegavelmente influenciaram bastante o nosso trabalho, a começar pelas

mudanças nos quadros técnicos, o que interferiu inclusive na quantidade de entrevistas e

53

na seleção de pessoas participantes. Entrevistaríamos seis profissionais técnicos do

serviço de vigilância epidemiológica e acabamos por entrevistar quatro técnicos. As

mudanças políticas e administrativas atingiram de forma concreta os profissionais, e

presenciamos substituição de quadros e mudanças de propostas de trabalho.

Toda essa conjuntura, além de ter influenciado na disposição dos entrevistados,

também se fez presente na própria entrevista, pois os espaços conseguidos para a

realização das entrevistas foram os de trabalho. Isso fez com que houvesse certo

constrangimento para responder às questões, surgindo até mesmo um certo cuidado

sobre o que falar.

7.2 – Características dos entrevistados

São profissionais de nível superior da Vigilância epidemiológica e da

Vigilância em Saúde e Ambiental.

Usando um código para efeito de identificação, chamamos os entrevistados

de (TV), em referência a Técnico da Vigilância, e os numeramos.

Os profissionais entrevistados são na maioria mulheres. O tempo de

atuação dos profissionais na Vigilância do Município varia entre sete meses o

menor tempo de atuação e 9 anos o maior tempo de atuação. Todos os

profissionais relataram ter capacitação em serviço, a muitos específicos a

vigilância epidemiológica como monitoramento e avaliação, capacitação em

agravos, febre maculose, leptospirose, dengue, imunização e vigilância em

saúde.

7.3 - Vigilância em Saúde

O termo vigilância epidemiológica abrange a doença e uma ampla variedade de

condições, incluindo investigação epidemiológica, coleta e análise de dados, de uma

vigilância de doentes, passou-se para uma vigilância de doenças (Langmuir, 1971), e,

recentemente para uma vigilância em saúde, focando não mais o indivíduo, mas

situações de saúde.

Essa vigilância em saúde significa a prática desenvolvida no nível local

54

(Teixeira, 2002; Faria e Bertolozzi, 2010), mas a pergunta feita aos entrevistados nesta

pesquisa sobre o entendimento da prática permite interpretações diversas e até

contraditórias.

“Isso é muito amplo.” TV-4

“Ela tem que ser um pouco até mais ampla do que na realidade ela está, da

forma como ela está implantada no município.” TV-2

As duas expressões acima demonstram não somente uma divergência quanto ao

escopo da vigilância em saúde, mas também o embate entre teoria e prática, que se

consolida no seguinte dizer de outro entrevistado.

“Bem, é, não pela literatura e tudo mais, eu vou mais pela nossa vivência.”

TV-1

Esse embate entre teoria e prática está relacionado com o processo de

reorganização do SUS a partir da década de 1990, onde a vigilância epidemiológica

passou a ter maior relevância na estrutura do sistema de saúde. Neste sentido, as

mudanças vieram através de uma teoria, porém não acompanhada na prática.

Assim como assinala Sevalho (2002), a vigilância epidemiológica passou por

transformações conceituais que acompanharam, à reboque, as mudanças de escopo da

própria epidemiologia, pelo menos em proposta, fazendo surgir a vigilância em saúde

para simbolizar teorizações e intervenções mais amplas e complexas.

As falas dos sujeitos entrevistados parecem pontuar um processo transicional.

Na perspectiva do SUS, a vigilância em saúde passou a compreender a

vigilância epidemiológica, a vigilância sanitária, a vigilância ambiental e mais

recentemente a vigilância da saúde do trabalhador, e está direcionada para a análise da

situação de saúde da populações e para a organização e execução das práticas de saúde

para o enfrentamento dos problemas (Ministério da Saúde, 2007). Essa abrangência da

vigilância em saúde, expressa no discurso oficial, é trazida pelo profissional

entrevistado.

55

“Ela abrange a vigilância sanitária, a vigilância epidemiológica e a

vigilância ambiental e a vigilância em saúde do trabalhador.” TV-2

“A questão do ambiente também não deixa de ser, é, os serviços.” TV-3

“Se a gente for pensar em vigilância sanitária, de que forma os serviços

mal prestados podem influenciar na saúde do ser humano.” TV-3

A proposta da união das vigilâncias é marcada pela vigência do Projeto

VIGISUS de 1999 e pela recriação do Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica

com a instituição do SUS, mas, de fato, a vigilância epidemiológica, com sua concepção

limitada à dimensão técnica, e a vigilância sanitária, com seu poder fiscalizador de

polícia, permanecem práticas separadas, que pouco interagem.

Ainda dentro da perspectiva de qual entendimento se tem sobre vigilância em

saúde, fica claro que nos serviços a prática prioritária está relacionada à vigilância

epidemiológica em seus moldes tradicionais de registro, acompanhamento e controle de

casos, prioritariamente, de doenças infecciosas e transmissíveis. Cabe lembrar que

vigilância epidemiológica surgiu historicamente atrelada estava ao isolamento e à

quarentena (Romero e Trancoso, 1981), passando a envolver a coleta, elaboração,

difusão e interpretações de dados e informações (Sevalho, 2000). Essa prática está

presente no dia a dia e por isso é refletida nos seguintes relatos.

“A gente registra tudo.” TV-2

“É alimentar o sistema de informação.” TV-1

“Fazer o serviço básico da vigilância, ter aquele cuidado para que aquilo

não se torne uma epidemia.” TV-1

Há, no entanto, a busca dos profissionais por uma humanização da prática, para

além dos números, rompendo os limites da estrutura tradicional da vigilância,

enquadrada conceitualmente como um “sistema de informação para ação” (Langmuir,

1971). Os discursos não perdem, entretanto, a dimensão do jargão médico, onde o

“paciente” é o foco.

56

“Mas, assim, naquela ficha ali tem uma pessoa.(...) Muitas vezes em um

hospital a família, o familiar não sabe nem a causa do que aconteceu. A gente aqui tem

informações que muita das vezes o paciente não sabe o que esta acontecendo. (...) Mas

também a gente tem que ter esse contato com esse paciente, de conversar com o

paciente, com o familiar do paciente, contar de fato o que aconteceu.” TV-1

Os profissionais procuram ir mais adiante, revelando uma prática mais complexa

de relação com a população orientada por uma perspectiva social.

“A gente avaliar um conjunto de fatores que estão relacionados ao meio

onde nós vivemos interferindo na saúde do indivíduo ou do coletivo.” TV-3

Nos serviços de saúde é possível observar as ações de vigilância, mas é rara a

sua priorização, já que a prática acaba assumindo um status de pouco prestígio e por

isso dispõe de poucos profissionais dedicados à questão. Mesmo porque a sensação que

pode dominar as atividades de vigilância é de um trabalho repetitivo de coleta de dados,

sem que esses sejam analisados e possam ser relacionados com a realidade social de um

dado território, o que seria, de fato, incorporar no serviço a vigilância em saúde. E é

nesse sentido que as cobranças de se desenvolver um trabalho de vigilância mais amplo

permanecem.

Embora os relatos dos entrevistados apontem para uma relação entre profissional

e população, esta parece dominada por uma hierarquização estabelecida na relação

médico-paciente, sendo sua compreensão limitada à mera transmissão de informações

sobre “o caso” registrado e atendido.

Cabe ressaltar, nesse sentido, que a vigilância epidemiológica dominada pelo

foco na imunização e no acompanhamento e controle de doenças imunizáveis é

marcante pelo menos até o início da década de 1990 (Paim, 2003). Trata-se de uma

vigilância restrita ao objeto dos programas de imunização.

Faz-se necessário avançar para uma vigilância que compreenda a realidade

social.

Teixeira (2002) sinalizou para o fato de que a descentralização e a

regionalização da saúde, e a perspectiva de uma vigilância em saúde de realização local,

57

propiciaram uma aproximação da vigilância com as práticas de promoção da saúde e

prevenção de riscos e agravos, individual e coletivo. A consideração dessa aproximação

está presente nas seguintes falas.

“Ela é um trabalho preventivo.” TV- 2

“Vigiar a saúde nada mais é que você esta tentando de alguma forma de

prevenir.” TV-3

“A vigilância em saúde ela é muito preventiva, é um trabalho de prevenção,

a atenção básica também, mas a vigilância é muito mais do que a atenção básica.” TV-

2

“Os cuidados aí, aquela coisa que vem da promoção, o cuidado básico

com a saúde, o cuidado, aliás o cuidado básico não, o principal cuidado com a saúde.

(...) O cuidado principal com a saúde é cuidar do paciente, tratar, é acolher quando

precisa acolher os familiares, acolher e acompanhar este paciente.” TV-1

Além da promoção, chama-se a atenção para o cuidado e o acolhimento que

também são questões de suma importância com referência às práticas de saúde. Parece,

no entanto, permanecer uma determinada superposição de significados, quase uma

indistinção de sentidos, entre promoção da saúde e prevenção de doenças.

As ações de vigilância, promoção da saúde, prevenção e controle de doenças e

agravos à saúde devem constituir um espaço de articulação de conhecimentos e técnicas

vindos da epidemiologia, do planejamento e das ciências sociais (Ministério da Saúde,

2007). E para completar a vigilância adequada a uma nova realidade, também estão

inseridos a pesquisa e o planejamento com o sentido de produzir conhecimento para

subsidiar as políticas públicas (Paim, 2003).

“Vigilância em saúde ela é planejamento. (...) Adequar, fazer projetos,

projetar, planejar. (...) um núcleo de projeto (...) tem que ter um núcleo de pesquisa.”

TV-2

Da mesma forma que as ações de vigilância integradas à promoção da saúde

58

destacam um avanço nas ações da vigilância em saúde, o planejar é a segurança para

que não se realize um trabalho incessante de apagar de incêndio, o que foi explicitado

por um dos entrevistados.

“É um trabalho que, talvez, não é apagar incêndio, e às vezes você dentro

no setor da saúde tem o olhar hospitalesco.” TV-2

O planejamento requer ferramentas próprias, teóricas e práticas, para sua

realização, de forma a aproximar o trabalho do contexto do território e surge, assim, o

superdimensionamento de tecnologias que pretensamente deem conta da complexidade

da realidade social.

“Acredito eu que deva estar também dentro, inserido nisto, o

geoprocessamento. (...) nós precisamos de mapas, nós precisamos ter esse acesso a essa

proximidade.” TV-2

Tecnologias representam o território, possibilitando uma visão do espaço e uma

determinada compreensão do local, mas não substituem a experiência do contato com a

população em seu ambiente social.

Cabe ressaltar que no processo de descentralização e regionalização, o termo

local, ao longo dos anos adquiriu várias acepções (NOAS 2001). A ação localizada traz

a possibilidade de um planejamento que privilegia as reais necessidades em saúde, mas

só é possível a partir do reconhecimento e da vivência no e do território, o que inclui

conhecer as relações existentes e, sobretudo, as condições de vida (Ministério da Saúde,

2007).

Conforme Monken e Barcellos (2005) ressaltam, o território é o balizador do

novo modelo de vigilância em saúde.

Paim (2003), por sua vez, pontua que as mudanças que permearam as ações de

vigilância em saúde, vão desde a utilização de tecnologias e o aporte de recursos

financeiros, e passam pela inserção da participação social nas discussões sanitárias.

“A gente é que vai nas localidades. (...) É um trabalho que tem que estar

junto com as comunidades, tem que trazer a comunidade.” TV-2

59

“A gente acaba se adaptando assim às necessidades, e até mesmo às

necessidades do município, e até mesmo às necessidades dos pacientes.” TV-1

Embora o discurso oficial aponte para a integração entre ações e participação

popular, essa participação, se e quando existe, ainda é muito pontual, isso quando há,

assim como afirmam Albuquerque et al. (2002) e Faria e Bertolozzi (2009).

A participação da população significa um maior conhecimento da situação de

saúde local e caracteriza uma estratégia para se obter a adesão da população às ações,

quando estas são uma proposta conjunta. O trabalho efetivo com a população, além se

ser marcante contribuição para pensar e agir sobre as necessidades em saúde, também

traz a vertente da educação em saúde, que não é esquecida pelos sujeitos entrevistados,

ganhando destaque, nesse sentido, a contribuição de um “núcleo de educação em saúde”

que atue na vigilância em saúde.

“O trabalho da vigilância tem a participação do próprio núcleo de

educação e saúde.” TV-2

Se a importância da educação em saúde é percebida pelos entrevistados, esta

parece restringir-se ao contato formal com as escolas. As escolas aparecem assim como

um espaço de participação em ações que parecem envolver intervenções pontuais nos

moldes das práticas tradicionais de educação sanitária, na qual a população é envolvida

como objeto.

“Pensando nas ações, ah, vamos na escola.” TV-4

“Levar para a escola oque, aquilo ali, acontece uma dengue, uma

leptospirose ou até mesmo muito aids, a tenção para essa doenças ou até mesmo outros

assuntos como a droga também. (...) O núcleo de educação em saúde que faz, no nosso

caso o que acontece quando alguma escola solicita, algum esclarecimento, tudo mais,

que a gente tem que ir.” TV-1

Conforme apontam Arreaza e Moraes (2010), a ampliação do escopo da

epidemiologia em consonância com os princípios do SUS, universalidade, integralidade

60

e equidade, obrigaram a vigilância epidemiológica a superar o modelo anterior e desta

forma incorporar a condição de vida. Não basta, contudo, somente uma teorização para

acontecer a vigilância em saúde, para o que seria necessário que a essência do modelo

proposto, entendido em sua profundidade, invada o cotidiano de profissionais, gestores

e população. Neste sentido, a compatibilização, sempre desejada, entre discurso e

prática ainda figura em um cenário de abstração, distante das pessoas que protagonizam

os fatos.

7.4 - Participação Social

A participação social que figura hoje no debate político e teórico, vem se

destacando não somente conceitualmente, mas sobretudo em sua prática na dimensão

dos assuntos público, sendo discutido por vários autores.

Viana et al (2009) destacam que a participação social aparece em substituição à

participação política, como se estas fossem sinônimos. Discorrendo sobre esse assunto,

Stoz (2008) destacou que, no âmbito da sociologia, participação social diz respeito à

incorporação do indivíduo ao grupo. O autor refere que a participação está relacionada

com a democracia, onde os cidadãos têm ampla participação nos processos decisórios.

Ainda sobre o tema, Valla (1993) pontua que dentro do escopo da participação

social está inserida, além da participação popular, a integração dos grupos chamados

marginalizados, o mutirão e o desenvolvimento comunitário.

Essa diversidade de entendimento sobre participação social também ficou

marcada nas entrevistas realizadas em nossa pesquisa, pelo seu caráter relacional,

polissêmico e complexo.

Valla e Stotz (1991) chamam a atenção para o fato de que a participação social

pode ser ampla e particularizada, e assim ser passível de várias interpretações.

Buscando atentar para esta complexidade da participação socoal, enquanto tema,

nas perspectivas conceitual e prática, relacionamos os resultados, a partir da categoria e

do sentido, envolvendo na discussão também a questão do empoderamento, conceito

que é também, por sua vez, de amplo e contraditório entendimento (Carvalho, 2004).

Os discursos seguintes representam o que os entrevistados entendem por

participação social, compreendendo desde a participação popular na comunidade local

61

como prática cotidiana até uma dimensão social mais ampla.

“É a participação da população, da comunidade, voltada para a saúde. (...)

É restrita.” TV-1

“Tem muito ainda que caminhar em relação à participação social. (...)

Então, a participação social, eu entendo, ela é totalmente necessária para que um

serviço público seja sério e consiga caminhar de fato. É para que a população possa

fazer uma cobrança.” TV-2

“Então é tudo na vida, a sociedade não pode ficar passiva, ela tem que ser

ativa, ela tem que estar participando, ela é a principal interessada. (...) A gente colocar

em prática nossos direitos e deveres, que é o de estar preocupado com o país, com o

ambiente etc.” TV-3

“É a população se manifestar, manifestar, assim, diversas formas, de forma

organizada por meio de conselho, de associação, de várias formas.” TV-4

Chama a atenção a verbalização de que a população tem que se manifestar de

“diversas formas”, alicerçando-se, no entanto, a participação social na estrutura do que

o SUS define como controle social.

“Desde que a comunidade reclame que não tem saneamento básico, o

município vai ter que se virar nos trinta e vai ter que fazer, isso é participação social,

não é só existir uma associação e fazer uma coisinha às vezes só para aparecer.” TV-2

“É ver o que precisa melhorar, aonde está errado, aonde está certo.” TV-1

Segundo Stotz (2006), na perspectiva do SUS, a expressão “controle social”

aparece em 1992 no documento final da IX CNS no lugar da, anteriormente usada,

“participação popular” ou “da população”, referindo-se ao controle da população sobre

políticas e atividades desenvolvidas, configurando um controle da sociedade sobre o

Estado. O autor explica que, oriunda das ciências sociais, a expressão controle social

62

remete ao condicionamento ou limitações das ações dos indivíduos, em termos de

valores, normas e comportamentos, pelos grupos sociais aos quais pertencem.

Em uma perspectiva marxista, complementa Stotz (2006), a expressão conota a

reprodução dos interesses das classes dominantes.

Na perspectiva dada pelo SUS ao controle social o sentido pretendido é o

inverso, o de controle do Estado, de suas políticas, pela população, mediado estrutural e

formalmente pelas Conferências e Conselhos de Saúde.

“O conselho deve participar na elaboração da saúde, nos projetos de

saúde.” TV-1

“Participar no sentido de mudar a realidade, buscar a realidade que a

população quer para ela.” TV-4

Os conselhos, que deveriam representar uma fundamental instância da

participação social na saúde, têm atuado limitadamente como órgãos fiscalizadores, ao

invés de participarem nos processos decisórios de construção das políticas que atingem

o coletivo.

Para Pereira Neto (2012), as atribuições dos conselhos de formular estratégias,

diretrizes, examinar propostas e fiscalizar a execução da política e o funcionamento dos

serviços são transpassadas por uma permanente relação de favorecimento mútuo entre o

conselheiro e o poder político formalmente estabelecido, em uma dinâmica que pode

preceder e, nesse caso, determinar a eleição para o conselho ou se estabelecer depois,

gerada pelo poder auferido com o investimento do cargo.

Valla e Stotz (1991) apresentam e discutem sobre as várias formas de ação que

as diferentes forças sociais podem influenciar na formulação, execução, fiscalização,

execução e avaliação das políticas públicas em todas as áreas da sociedade. Para Vianna

et al. (2009), a participação social deve ser uma intervenção, além da dimensão politica

pública, na dimensão privada: como morar, como manter a saúde etc, ou seja, trata-se

de intervir em processos decisórios que atingem o coletivo. A participação popular é a

garantia da construção de projetos na saúde de acordo com a realidade da população,

que como é apontada precisar ser mudada de acordo com a população.

A forma que os indivíduos têm de se expressar e decidir politicamente sobre

suas vidas é fundamentada na garantia dos direitos em saúde e da participação social, o

63

que significa o compartilhamento da responsabilidade sobre a saúde entre indivíduo,

comunidade e Estado (Vianna et al, 2009).

Na realidade encontrada e estudada por Pereira Neto (2012) em municípios da

região nordeste do Brasil, prevalece uma cultura da troca recíproca de favores

predominante entre o cidadão, o conselheiro representante do usuário e o político de

carreira. Esta dinâmica configura o que o autor chama de “conselhos de favores”.

Um dos entrevistados percebe esta relação de favores nas associações

comunitárias que podem ou não ter relação com os conselhos.

“Elas têm que opinar, elas têm que dar a opinião delas, mas isso se perdeu

um pouco, pelo menos em nosso município, não sei, acredito que não seja em todos,

porque as pessoas começaram a ver isso como moeda de troca. (...) Arrumando um

empreguinho aqui, um empreguinho lá. (...) A associação tem que trazer a comunidade,

tem que estar orientando a comunidade, tem que levar informações para a

comunidade, o técnico tem que ir a essa comunidade escutar e ser ouvido. ” TV-2

Este cenário de cooptação, da colocação da população organizada a serviço do

poder do governo formal, é mais frequente nos conselhos, mas também está presente

nas associações comunitárias. Os conselhos, com sua atribuição formal na estrutura do

SUS, limitam-se a homologar decisões segundo as necessidades dos gestores, e as

associações comunitárias a dar suporte popular aos interesses dominantes.

Na medida em que não se tem efetiva participação social na formulação das

políticas públicas, o controle social do SUS desenvolvido pelos conselhos pode se

deformar ou mesmo fazer valer o sentido original da expressão, ou seja, o de um

controle do Estado sobre a população.

Os próximos relatos representam uma alternativa à cooptação, na interpretação

dos sujeitos entrevistados, que é o conhecimento como estratégia de poder, o que está

também relacionado com o conceito de empoderamento, na concepção de Paulo Freire

apresentada por Guareschi (2008) .

O conhecimento, o saber faz toda a diferença para a participação popular e,

sobre isso, a reflexão deve contemplar os processos que envolvem apropriação de

conhecimento por profissionais da vigilância e comunidade. As falas a seguir

representam o desejo e a importância da aquisição de conhecimento pela população, na

visão dos entrevistados.

64

“É obrigação dela, ela precisa ser sabedora.” TV-2

“Então ela precisa estar ciente do que ela precisa saber na hora de fazer

um consumo consciente.” TV-3

“Estarem realmente participando e estarem conscientes, assim, conscientes

não seria a palavra certa, mas, assim, acompanhando mesmo, de olho no que está

acontecendo e interagindo com aquilo ali da melhor forma.” TV-4

Na percepção dos entrevistados, os atores sociais de consciência ingênua, tal

como são apontados, ao não ultrapassarem os limites impostos socialmente impostos,

perdem a oportunidade de protagonizar sua própria história.

No sentido dado por Freire, segundo Guareschi (2008), empoderamento é

processo político de ativação do potencial criativo de alguém, o que na saúde implica no

envolvimento do profissional na relação com a comunidade, o que aprece não ser

compreendido pelos entrevistados, quando insistem em trabalhar colocando-se à parte

da população.

“Aí a gente tem que explicar, cada um fazer a sua parte, né, mesmo que o

vizinho não faça eu estou fazendo a minha, então assim.” TV-1

Afinal, como vimos anteriormente, o conceito e o entendimento do que seja

empoderamento é controverso (Carvalho, 2004; Meirelles e Ingrassia, 2006). Se o

profissional se colocar como o agente empoderador da comunidade caracterizam o que

Valla e Stotz (1991) chamam de “animadores”, desempenhando o papel de influenciar e

controlar as pessoas, ao invés de, em um processo relacional, contribuir com o sujeito

para o desenvolvimento e ativação de suas próprias habilidades.

Em uma relação que, a princípio, estabelece hierarquia de saberes e participação

não se dá processo de empoderamento.

“Primeiro as pessoas elas precisam conhecer um pouco para realmente elas

estarem dando as suas sugestões, as suas opiniões, falarem de suas angústias, de suas

necessidades, elas precisam ler um pouco mais, elas precisam meter o dedo realmente

65

naquele local público dizendo assim eu estou aqui, eu quero dar a minha opinião. (...)

Não gosto desse termo capacitado não, mas seriamente orientada, instruída de forma

séria, né, pra não sofrer variações totalmente desastrosas dos maus políticos, o que dá

num processo assistencialista que não vai levar nada para ela, que vai sugar ela.” TV-2

A fala do entrevistado manifesta suas próprias contradições em relação ao

empoderamento, de um lado o compromisso social e o desejo de mudança, de outro a

dificuldade de admitir o conhecimento do outro, que é fundamental para o

desenvolvimento de um processo educativo desenvolvido entre diferentes que se

respeitam a ponto de se verem como sujeitos de um mesmo processo.

A participação social se dá em várias esferas e de diversas formas, seja ela

individual ou coletiva, organizada ou não, mas deve ser exercida não somente por ser

um direito, mas também por possibilitar uma formulação da realidade muito mais

próxima, e para isso o indivíduo e a comunidade precisam se apropriar de todos os

conhecimentos acerca de seus direitos e deveres para o exercício da cidadania.

O empoderamento entendido por Paulo Freire, que não é pautado somente no

indivíduo, e sim na classe social, se desenvolve no processo relacional alicerçado no

conhecimento da realidade e na conscientização, que é, por sua vez, a aproximação

crítica da realidade por parte de quem vivencia a relação (Guareschi, 2008; Freitas,

2008).

7.3 – O Território

O território na vigilância em saúde é ferramenta de aproximação entre as

questões sociais e a saúde, levando em consideração as especificidades locais, dadas

pelas desigualdades socioeconômicas, políticas e culturais.

Como definiram Monken e Barcellos (2005), o território é o balizador do novo

modelo de vigilância em saúde, capaz de propiciar a leitura da dinâmica do acesso da

população aos serviços a saúde.

O entendimento da importância do território para a orientação dos trabalhos

(ações) de vigilância em saúde aparece nas seguintes falas dos entrevistados.

“A vigilância em saúde aí é no todo mesmo, as vigilâncias no modo geral,

66

até a saúde do trabalhador, você tem que fazer levantamentos do território para você

fazer diagnósticos, para você fazer as intervenções em cada local.” TV-2

“O território acho que é o grande alvo da vigilância, é lá que tudo

acontece, né. (...) Você observar o que tem acontecido no território em termos de

doença ou de agravos.” TV-3

O olhar para o território enquanto orientador do trabalho da vigilância pode

apresentar-se compreendido como uma abstração quantitativa, assim como observamos

na seguinte fala.

“A gente costuma falar do território, estou pensando nos cálculos, que a

gente pega a população daquela área e faz os cálculos.” TV-4

A orientação predominantemente quantitativa da epidemiologia, e sua

dificuldade para considerar as questões sociais, são fatos por demais conhecidos.

Na perspectiva do território, a relação da ESF, inerente à estruturação do SUS,

com a vigilância em saúde é referenciada pelos entrevistados.

“O que a gente faz aqui por exemplo é tentar dividir, se a gente precisar de

ajuda de uma unidade da saúde da família. (...) Aí a gente pede para aquela equipe

para dar suporte naquele caso que agente precisa. (...) É assim por unidade a saúde da

família, mas também das áreas que são cobertas, nem todo município é coberto, as

áreas que são descobertas a gente pede ajuda ao médico da atenção básica para fazer

uma palestra e tudo mais.” TV-1

Observa-se no depoimento do entrevistado que o trabalho local da vigilância é

esporádico, restrito ao acompanhamento casos específicos registrados. Além disso, a

menção do entrevistado a “fazer uma palestra” deixa entrever uma ideia calcada na

concepção tradicional de educação em saúde, prescritiva e autoritária, distante do ponto

de vista crítico sobre empoderamento e participação social apresentado nesta discussão.

Além do que, o atrelamento das ações de vigilância às áreas de abrangência

definidas pela ESF conduz a uma visão de território de natureza preponderantemente

administrativa e retorna neste contexto a dimensão quantitativa com uma população

67

adstrita.

“A gente usa essa parte demarcada pras taxas, pros cálculos, mas quando

você vai raciocinar encima daquilo, né, vê que a taxa me mostra isso, mas o que está

acontecendo, vamos ver, o vizinho está assim e tal.” TV-4

O profissional repensa e reconhece, contudo, a limitação dessa abordagem.

“Na dinâmica de não respeitar este território fechadinho que a gente usa

para os cálculos, o mosquito da dengue não obedece a fronteira.” TV-4

O entrevistado identifica a necessidade de ver o território em suas várias

concepções e não somente como um espaço administrativa e fisicamente delimitado,

com vistas ao desenvolvimento de um trabalho de vigilância em saúde.

Monken e Barcelos (2007) chamaram a atenção para a precariedade desta noção

administrativa de território que distancia as ações da realidade e impedem a perspectiva

da participação social.

O território é conceito operacional e ferramenta para a reorientação do modelo

de assistência de saúde, centrado até então no modelo biomédico de explicação e

abordagem do processo saúde-doença ainda dominante tanto na ESF como na promoção

da saúde e na vigilância. As falas apresentadas, contudo, mostram que a vigilância

parece caminhar para uma aproximação do nível local e uma readequação de sua prática

na perspectiva da territorialização.

“As vigilâncias tem que conhecer local por local, não é fazer uma colcha de

retalhos não, mas elas têm que conhecer os locais para ali, naquele local estar

inserindo propostas, projetos junto com a comunidade, que atendam à comunidade

para aquele local.” TV-2

“O território, ele é uma área que a vigilância precisa conhecer na palma

da mão para que através disso ela consiga desenvolver suas atividades, ver quais são

as necessidades, as prioridades, é através do território, é conhecendo o território que

agente vai definir o que é prioritário ou não. (...) Uma vez que problemas tem vários é

através do território que a gente consegue identificar nossa atuação.” TV-3

68

O conceito de território, em sua amplitude, permite a identificação de problemas

de saúde e intervenções cabíveis, especificamente direcionadas, localmente

direcionadas.

“De repente tem um local que me apresenta ali um problema sério de

roedor, o outro local porque as pessoas jogam lixo, né. (...) Tem um outro local que o

problema maior é desmatamento.” TV-2

As abordagens locais, refletidas a partir das relações políticas e econômicas que

se estabelecem no sistema capitalista de produção, sob a égide da globalização,

desencadeou diferentes funções e usos do território, devidamente delimitadas para as

intervenções sociais planejadas com vistas à alocação e acumulação de capital e, assim,

se dá na área da saúde. Perde-se, então, de vista o entendimento da tensão permanente

entre forças de resistência, horizontalidades produzidas na solidariedade do lugar, e

forças de alienação e exploração, verticalidades manejadas à distância pelo sistema

global, tal como identificadas por Milton Santos (2006).

A constituição do território como meio percebido está presente na abordagem de

Monken e Barcelos (2005), quando apontam a influência da subjetividade na produção

das representações sociais que conformam diversas demarcações territoriais associando

diferentes escalas, global, regional, da cidade, da rua, de uma casa.

Esse olhar a partir da escala local é refletido nas falas seguintes.

“Primeiro você tem que identificar, identificar bairros, cada local tem

características dentro do próprio município, cada local tem uma característica.” TV-2

A identificação das possibilidades e limites, políticos e econômicos, do território

tem sua importância reconhecida pelos entrevistados. Neste aspecto, a construção de

oportunidades vislumbrada no território não alcança a dimensão coletiva, limitando-se à

iniciativa individual voltada para o consumo, para o mercado.

“Sem a gente conhecer o território, pra quem a gente está trabalhando, a gente

não consegue avançar.” TV-3

69

“Tem que ver as possibilidades de emprego, possibilidade de venda de alguma

coisa que se faça, possibilidade cultural, né.” TV-2

Haesbaert (2004) afirma que o território é apreendido e apropriado a partir de

dimensões simbólicas, do imaginário e da identidade sociais. Monken et al. (2008)

destacam que coexistem no território a dimensão material e a dimensão simbólica.

O território é um espaço socialmente produzido e, para Cavalcanti (2008), esta

produção é dada pela relação de poder entre os atores sociais. Assim, o território é o

espaço do acontecer, onde as pessoas circulam, moram, trabalham, experienciam suas

vivências, adoecem, morrem.

“Então a gente pensa, né, na relação desse território, na relação mesmo onde é

que essas pessoas dali. (...) Onde estão essas pessoas, elas estão circulando, elas

trabalham onde? Elas estão morrendo onde? Se é no seu território de residência.” TV-

4

A consideração do pertencimento, do território vivo, vem acompanhada,

percebe-se também no discurso dos entrevistados, da relação sempre presente da

vigilância com o controle do risco das doenças transmissíveis.

“Território é onde existem várias outras coisas, animais, várias outras

coisas que podem estar contribuindo, né, para no nosso caso o adoecimento ou não da

população.” TV-3

Viver no território é misturar riscos e oportunidades diversas, mas não a da

organização para a transformação social.

André Santos (2009) identifica o território, mais especificamente o lugar, com a

afetividade, o pertencimento. O território é a interdependência dos lugares, é o cotidiano

compartilhado, e essa é a garantia da comunicação e da solidariedade (Santos, 2008).

Podemos observar que as entrevistas realizadas nos propiciaram informações

valiosas para a reflexão sobre a apropriação do território como ferramenta da vigilância

em saúde, com um grau de importância que permite examinar em que estado se

encontra o projeto de reorientação para um novo modelo e forma de atuar da vigilância.

Entendemos que os entrevistados percebem a relevância do território, conseguem

70

entendê-lo como território vivo, em movimento, mas têm dificuldade para vislumbrar a

atuação da vigilância intervindo sobre a determinação social do processo saúde-doença.

Neste sentido, marcante é a ausência da menção dos entrevistados sobre as

possibilidades do território enquanto local de mobilização social acompanhando a

prática da vigilância em saúde.

7.4 - Participação Social Integrada a Vigilância com base no Território

As entrevistas realizadas apontaram para uma diversidade de aspectos acerca da

Participação Social Integrada à Vigilância com base no Território. A questão é vista com

dúvidas e contradição pelos entrevistados.

“Não, eu acho que está integrado.” TV-1

“Com certeza, eu acho que está integrado. (...) Eu acho que pode até ser

ampliada.” TV-2

“Oh, deveria, mas nem sempre assim.” TV-3

“Eu acho que seria o ideal, né, mas é pouco, muito pouco perto do que é a

força do povo, né, do que deveria e diante do tamanho do empreendimento e de tudo

que está acontecendo.” TV-4

Percebem os entrevistados que há certa participação social integrada à vigilância

com base no território, mas esta é incipiente. A dúvida maior quanto a essa questão é

colocada exatamente por quem destaca a existência do Comperj enquanto grande

empreendimento.

Volta-se, então, a aludir à ESF e sua relação com a territorialização das ações, e

desta feita enfatizando-se o papel do agente comunitário de saúde.

“O Programa Saúde da Família, acho que ele foi o grande motivador, né, e

o precursor dessa discussão de território dentro da saúde, e com participação social

uma vez que ele traz a questão do agente comunitário.” TV-3

71

O agente comunitário de saúde, por residir no território onde atua, é um elo

fundamental entre a comunidade e os serviços de saúde. O agente conhece a população

da sua área, onde trabalha. Nesta perspectiva é identificado também como agente de

mobilização da população.

“A gente deve aproveitar a garotada que está rodando os bairros, os

agentes da comunidade.” TV-2

“É o agente de mobilização dessa comunidade, uma vez que ele mora ali

ele levantaria os problemas. (...) A gente tem poucos fóruns para estar trocando isso

com eles, né, mais uma vez a saúde da família é uma boa proposta.” TV-3

A participação social, em sua vinculação com a prática da vigilância no

território, volta a ser compreendida contraditoriamente, ora como um trabalho que une

profissionais dos serviços de saúde e população, ora como uma espécie de algo que fica

por conta da população desde que o serviço oferece uma oportunidade à população.

“Acho que a vigilância em saúde em um todo, em particular a vigilância

ambiental e epidemiológica, tem que trazer esta comunidade junto de você de alguma

forma. (...) Você está oferecendo formas e maneiras de uma parceria e colhendo dela

parcerias.” TV-2

O trabalho da vigilância junto à comunidade é oportunidade de troca de

experiências.

“Você precisa estar presente. (...) Para ter aquela base territorial na

comunidade.” TV-2

Atuar no território é a possibilidade de realizar um trabalho de acordo com a

situação social, econômica, política e cultural local e descobrir a vocação do lugar.

Descobrir a vocação é ampliar os limites e possibilidades do lugar e da

população, mas, segundo a fala dos entrevistados, a capacidade de identificar potenciais

locais parece não partir de uma relação entre população e profissional.

72

“De repente ali se descobre, vamos supor, você tem um local no município

que de repente possa se transformar em uma área turística que cada um produz uma

coisa, um circuito para venda, daquela comunidade ali que você pode ter uma

sustentabilidade de emprego.” TV-2

Em seus discursos, os entrevistados identificam a responsabilidade do poder

público na abertura para a participação social.

“O poder público, de uma forma geral, ele tem que estar tentando trazer

esta comunidade para que eles sejam parceiros realmente.” TV-2

Neste sentido, um dos entrevistados propõe um comitê gestor como canal de

promoção da participação social em uma perspectiva intersetorializada, ainda alicerçado

à ESF. O comitê seria mais uma instância representativa.

“Mas o que essa pessoas precisam, os agentes, essa equipes, precisam ser

trabalhadas, fazer isso de alguma forma que pode ser através do comitê gestor que

agente chama, que é uma estratégia que já vem sendo tentada em alguns lugares, mas

com pouco êxito, que é você identificar dentro dos territtórios um colegiado, com

participação da saúde, da educação e da sociedade que defina, esse seja um definidor

de prioridades etc., é isso.” TV-3

A dimensão dos passos ao caminhar, a gradação das escalas a serem vencidas, é

lembrada no desenvolvimento do trabalho desde o território. Neste aspecto, a

necessidade de partir da realidade local na atuação com a população é enfatizada pelos

entrevistados.

“Não adianta você querer fazer isso aí macro, porque você vai se perder,

tem que começar no território. (...) Depois que as coisas estiverem caminhando, e aí,

você consegue ampliar.” TV-2

As mudanças no território são sentidas em sua rapidez. A desterritorialização,

sobretudo, é percebida.

73

“Esses últimos cinco anos de transformação do município. (...) Está com

uma outra característica. (...) Você está vendo, mas você vê e não vê ao mesmo tempo,

você vê aquela coisa no município crescendo, com a população, construções.” TV-1

Presencia-se a rápida transformação do modo de ocupação do solo.

“E as características dos terrenos assim, são terrenos grandes, então,

assim, se eles juntarem uns três terrenos eles conseguem construir um condomínio perto

do centro, uma boa localização, então é isso que eles estão fazendo.” TV-1

Mudanças também são sentidas na escala menor do território, os lugares perdem

sua identidade, o sentimento de pertencimento é ferido com o crescimento forçado pela

valorização da terra.

“O meu bairro está perdendo a característica dele, era um lugar ótimo de

se viver, está todo mundo vendendo as suas casas, eu vivo, eu moro em um lugar que a

construção de prédios está um absurdo, então, assim, é muita poeira.” TV-1

A fala do entrevistado nos faz refletir acerca do que esse grande

empreendimento vai trazer para a população além de poeira, é inevitável considerar esta

questão.

Mais uma vez o embate entre forças globais e locais ameaça a existência do

território, tal como teorizada por Santos (2002).

Haesbaert (2004) considera o território a partir de sua perspectiva material,

representando o embate entre classes sociais, trabalhadores, e capital.

As mudanças privilegiam e se fazem em benefício do capital. Criam-se

expectativas da população em relação a possíveis melhorias das condições de vida

provenientes do desenvolvimento do empreendimento.

Piquet (2007), refletindo sobre a dinâmica da indústria de petróleo e sua

realização no território, aponta que o estabelecimento de novas unidades de produção

alimenta a ilusão de oferta de empregos e salários que atrai grandes contingentes de

famílias e pessoas que nem sempre têm suas expectativas atendidas, quer em curto ou

médio prazo. Surgem, assim, bolsões de pobreza onde se alojam aqueles que não

74

conseguem postos de trabalho.

A precarização da saúde pode ser uma consequência desse processo que se

constitui manejado à distância pelos interesses do capital globalizado, estranhos às

formas de existência locais (Santos, 2002). A esperança de melhoria de vida é frustrada.

“Alunos do meu amigo, eles estão super empolgados. (...) Algumas escolas

até pouco tempo atrás abriram cursos, até cursos que a gente não está acostumado a

ver, uma semana de inscrição e os cursos não aconteceram. (...) Outras escolas que vêm

com aquela promessa de vaga no Comperj, vaga no Comperj, que a gente sabe que é

só. (...) Está todo mundo morando aqui e continua a mesma coisa.” TV-1

O sentimento é de alienação, desrespeito, impotência.

“As coisas estão acontecendo e a gente tá sendo atropelado, né. (...) Somos

espectadores. (...) A gente pouco sabe do que acontece no Comperj, a gente não

consegue entrar lá. (...) Se acontecer alguma coisa no Comperj e a gente, eles lá não

dão uma resposta pra gente.” TV-1

“O que acontece é muito boato.” TV-1

Ao pensar a participação social, o entrevistado enfatiza a necessidade de uma

mobilização para enfretamento da imposição de mudanças.

“Eu não acho que é todo mundo que está com o braço cruzado.” TV-1

Finalmente a participação social é lembrada, sem, no entanto, que seja pensada

enquanto prática cotidiana desenvolvida com o trabalho de saúde.

“Com a implantação do Comperj, tem a sociedade, a sociedade é chamada

para participar e alguns membros da sociedade estão organizados para quando não

são chamados estarem pressionando para que sejam.” TV-3

“Essa participação social ainda é muito tímida e pouco atuante, por culpa

dos dois lados.” TV-3

75

A dificuldade em participar do processo de transformação do território e ter

informações sobre o Comperj, no entendimento dos entrevistados, se estende ao setor

saúde.

“Não tem uma ponte da secretaria de saúde, vigilância de saúde e

Comperj.” TV-1

O reconhecimento das mudanças críticas acontecendo no território, por força do

surgimento do Comperj, não suscita dos entrevistados uma proposta de trabalho de

vigilância em saúde.

No entendimento de Breilh (2002), a vigilância em saúde é um instrumento de

poder coletivo, de participação, e, assim, não pode estar limitada a uma técnica de

monitoramento de doenças que funcione sem o concurso da população, limitada a um

sistema de informações sobre morbidade. Para o autor a vigilância deve ser

compreendida como instrumento de negociação na luta pelo bem estar, envolvendo-se

criticamente, enquanto prática de saúde, no processo histórico de preservação e

conquista de direitos sociais.

Partindo desta consideração, percebemos que é necessário procurar entender

como o profissional de vigilância pensa propostas de integração da vigilância com a

participação social no nível local.

“Através da participação desse coletivo, e de uma forma protagonista, e

não como a gente vê em vários programas, inclusive na dengue onde a população é

coadjuvante. (...) Se a população, a comunidade não se sente parte do trabalho, ela não

vai conseguir fazer a mudança que a gente precisa fazer.” TV-3

Dessa perspectiva emerge uma interpretação de participação social e trabalho

com a população que pode dar um sentido crítico e transformador para a vigilância em

saúde.

“A gente da saúde vai definir o que é prioridade e eu acredito no trabalho

inverso, que a necessidade tem de vir de forma ascendente, para isso a gente tem que

ter uma sociedade, uma comunidade organizada em uma base de educação forte, né.

76

(...) A participação social, ela é fundamental para isso, para o levantamento das

necessidades, principalmente na definição de prioridades na saúde. Nada melhor do

que aquela pessoa que mora no território para identificar quais são os problemas,

acredito também no potencial que isso tem de multiplicação.” TV-3

Tratando da promoção da saúde e do empoderamento, fortemente envolvidos na

atuação pensada para a vigilância em saúde, Carvalho (2004) destaca o reforço da ação

comunitária e da participação popular, e, neste aspecto, o autor entende que o

protagonismo também coloca a comunidade como um agente multiplicador.

O protagonismo da comunidade não permite a tutela, o controle, da população

pelo profissional de saúde.

Na constatação de que o trabalho de vigilância deve ser realizado com a

população, os entrevistados percebem a necessidade de envolver a participação social

de forma contínua, no cotidiano dos serviços.

“O que acontece hoje, vai, a gente chama para discutir muito

pontualmente, muitas vezes a gente não discute, a gente leva um pacote pronto, despeja

ali.” TV-3

Faz-se, então, menção ao sentimento de prazer e felicidade que pode

acompanhar o desenvolvimento de um trabalho do qual a população se percebe parte

atuante. A participação livre de constrangimentos parece aproximar-se do significado de

empoderamento dado por Paulo Freire, como processo político construído a partir da

conscientização, quando a percepção de liberdade só se concretiza na medida em que é

vista como instrumento de libertação coletiva, da comunidade.

“As pessoas, elas precisam participar porque elas querem e não por

obrigação, elas precisam sentir prazer de estar se dando, porque ela está se dando ali,

né. (...) Elas vão acabar se apaixonando por aquilo e não ser obrigadas, nada obrigado

é legal, né. (...) Então, ela está se doando por uma coisa em prol de todos e a gente está

ganhando para fazer o trabalho com essa comunidade.” TV-2

Dias e Porto (2011), em sua reflexão sobre um projeto emancipador de

promoção da saúde, entendem que o trabalho em saúde com a participação da

77

população deve incluir a construção de cenários prospectivos onde se inscrevem os

sonhos e a esperança.

Qualquer perspectiva, no entanto, depende do conhecimento da população sobre

a existência do o trabalho de vigilância.

“Conhecer pra talvez ela sentir aquilo como um problema dela, mexer de

alguma forma e tentar mudar esta realidade, que só está prejudicando a ela e às

pessoas.” TV-4

“O cidadão tem direito de saber o que que é, então se essa participação fosse

assim divulgar para a população, saber que tem uma vigilância epidemiológica. (...)

Ninguém conhece, ninguém sabe o serviço, mas também é compreensivo porque a

gente só chega no momento do caso, a gente não chega antes, as pessoas só conhecem a

partir do caso, quando a gente vai lá se apresentar para fazer uma investigação as

pessoas falam: o que é isso!. (...) “As pessoas não conhecem o nosso trabalho, não

sabem que a gente está aqui. (...) A gente precisa mostrar o nosso rosto, para poder ver

que a gente está aqui se precisarem de ajuda, não é precisar de ajuda assim, mas sim

dizer que a gente está aqui, conhecer o nosso trabalho, daí eles virem até a gente e ....”

TV-1

8 - Considerações Finais

Essa dissertação de mestrado assumiu como objetivo estudar os limites e

possibilidades das ações da Vigilância em Saúde num Território em Transformação.

Para tanto, esta análise amparou-se em informações sobre as ações da vigilância

em saúde, o território e a participação social, a fim de compreender a integração destas

categorias para a reorientação da vigilância em saúde.

Iniciamos a pesquisa com uma revisão bibliográfica. Sobre vigilância na saúde

pública, apresentaram-se perspectivas de diversos autores que definiam o território

como balizador do novo modelo de vigilância em saúde e a participação social como

parte integrante desse processo.

78

Em seguida fomos a campo e realizamos entrevistas com os profissionais da

vigilância em saúde do território estudado.

Conforme os objetivos deste estudo, pode-se concluir que:

- quanto ao entendimento sobre vigilância em saúde, verificou-se interpretações

diversas e até mesmo contraditórias, e um distanciamento entre teoria e prática.

- quanto ao entendimento sobre participação social, destacam-se as contradições

e equívocos sobre esta categoria. Mas, evidenciou-se também um desejo de mudança

quanto a hierarquização do conhecimento, ao admitir-se que o conhecimento do outro é

importante para a construção coletiva e para as ações em vigilância em saúde.

- quanto ao conhecimento sobre o território, este é reconhecido pela sua

materialidade e subjetividade, assim como território político-administrativo e território

do pertencimento e da afetividade. Contudo, a dificuldade em aplicar esse conhecimento

dobre o território para a reorientação das ações da vigilância em saúde também se

apresentou como um ponto de destaca.

- quanto a participação social integrada a vigilância em saúde com base no

território, o que ficou evidente foi a dúvida sobre a matéria, e que tem como reflexo

uma aproximação entre participação social na vigilância em saúde ainda incipiente. E

mesmo depois da influencia do Comperj sobre esse território, não surgiu nenhuma

proposta de trabalho da vigilância em saúde com a integração da participação Social de

nível local.

Na caminhada para a construção desse trabalho, encontramos alguns entraves,

que ao invés que se concretizar como uma limitação, serviram para refletir sobre o

próprio trabalho.

No campo, vivenciamos diretamente, em menos intensidade, as tensões do

território em estudo. Ao mesmo tempo que essas tensões simbolizaram um desafio,

também se tornou um dado para nossa pesquisa.

Os conflitos existentes nesse território, foram sentidos em vários setores, em

nosso trabalho de campo acompanhamos com certa aproximação o reflexo desses

conflitos, inclusive no setor saúde, onde presenciamos a substituição de profissionais na

vigilância epidemiológica.

Isso atesta a precariedade do profissional diante das tensões do território. Para a

vigilância em saúde, tal instabilidade irá acarretar em dificuldade na continuidade da

realização do trabalho e com isso na construção do vínculo. Essa insegurança

profissional ficou visível na realização das entrevistas, pois constatamos que o

79

profissional com mais tempo de trabalho demostra uma espécie de credenciamento que

possibilitou um posicionamento profissional para falar das possibilidades e limitações

da vigilância em saúde nesse território em transformação, o que foi muito diferente dos

outros profissionais.

O que vimos é que os profissionais entrevistados refletem a situação de toda a

população do município, ou seja estão sob pressão e sufocados.

Desta forma, sobre a vigilância em saúde concluímos que a realidade encontrada

é a de superposição de conceitos, os serviços não correspondem aos discursos oficiais,

observa-se uma teoria distante da prática, isso é ratificado com a realidade descrita na

literatura considerada nos estudos de Rodrigues et al (2001); de Villa et al (2002); de

Faria e Bertolozzi (2007) e o realizado por Santos e Melo (2008).

Tal situação tem forte impacto na reorientação do novo modelo da vigilância em

saúde e fundamentalmente no tocante a questão da participação social.

Neste contexto, evidenciou-se a dificuldade do profissional da saúde em

absorver o que é participação social, desde a participação popular na comunidade local

como prática cotidiana até uma ampla participação social, como necessária para a

reorientação das ações da vigilância em saúde.

É importante destacar que a absorção da participação social na vigilância em

saúde, ou seja estabelecer uma relação entre saúde e participação popular, é a garantia

da continuidade da Vigilância Civil em Saúde, termo desenvolvido por Victor Vicenti

Valla, que união conceitos das ciências sociais e da saúde, pesquisa participante e a

educação em saúde.

Por fim, queremos destacar que ainda são escassas e inconclusivas as pesquisas

sobre a incorporação da participação social nas ações de vigilância em saúde. E que esse

estudo representa apenas uma contribuição para a construção do conhecimento sobre

vigilância em saúde e participação social. E que a importância do tema e a sua

contribuição para a sociedade consideramos que há muitas contribuições a serem feitas,

portanto é um campo frutífero para outras pesquisas.

80

9 – Referências Bibliográficas

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86

9 - APÊNDICE

APÊNDICE 1

Questionário que será aplicado ao Profissional do Serviço de Vigilância

em Saúde

Número de identificação do entrevistado:

Idade:

Sexo:

Função:

Formação em nível de graduação:

Pós-graduação:

Capacitação em serviço:

Tempo de Atuação na Vigilância:

Tempo de Atuação no Municipio:

Questões Norteadoras do Roteiro de entrevista:

1) O que você entende por vigilância em saúde?

2) Quais são as ações que a vigilância desenvolve hoje?

3) O que você entende por território na perspectiva da vigilância em

87

saúde?

4) Como você avalia, do ponto de vista da vigilância em saúde, as

transformações que ocorrem no município atualmente?

5) Como você vê a participação da população nas ações de vigilância em

saúde?

88

APÊNDICE 2

Temo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE)

FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ –

FIOCRUZ Escola Nacional de Saúde Pública

Comitê de Ética em Pesquisa da ENSP

Você está sendo convidado(a) para participar da pesquisa de dissertação de

Mestrado Vigilância em Saúde e Participação Social na Perspectiva do Território em

Transformação desenvolvida pela mestranda Queli Cristina Lorena dos Santos, do

curso do Mestrado Profissional de Vigilância em Saúde na Região Leste do Estado do

Rio de Janeiro, da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca da Fundação

Oswaldo Cruz (ENSP/FIOCRUZ).

O objetivo central do estudo é estudar os limites e as possibilidades da vigilância

em saúde num território em transformação.

A entrevista será gravada, sendo a gravação armazenada em arquivo digital, mas

somente terão acesso à mesma o pesquisador e sua equipe. Ao final da pesquisa o

destino do material seguirá o inciso IX.2.e., da Resolução 196/96, cabendo ao

pesquisador “manter em arquivo, sob sua guarda, por 5 anos, os dados da pesquisa,

contendo fichas individuais e todos os demais documentos recomendados pelo CEP”.

A escolha de sua pessoa deve-se à sua importante atuação no serviço de

vigilância em saúde do munícipio.

A qualquer momento você pode desistir de participar e retirar seu

consentimento. Sua recusa não trará nenhum prejuízo em sua relação com a equipe da

pesquisa ou com a instituição. Você também poderá deixar de responder qualquer

89

pergunta que considere imprópria.

O roteiro da entrevista conterá os seguintes

tópicos: 1)O que você entende por vigilância em

saúde?

2) O que você entende sobre participação social?

3) Você acha que participação social é integrada à vigilância em Saúde com

base no território?

4) O que você entende por território na perspectiva da vigilância em saúde?

5) Como você acha que a participação social deve ser integrada às ações de

vigilância em saúde?

As entrevistas individuais não serão identificadas, sendo o Município de realização

identificado apenas como, um município de médio porte situado na região Leste do

Estado do Rio de Janeiro. Ainda assim, para minimizar qualquer dano pessoal e

garantir sigilo, os dados serão armazenados pelo pesquisador em local seguro,

preservado da exposição a quaisquer pessoas externas à equipe da pesquisa e destruídos

após a transcrição das gravações.

Os benefícios advindos de sua colaboração nesta pesquisa relacionam-se ao

avanço do conhecimento sobre a vigilância e saúde e a participação popular na

90

perspectiva de um território em transformação.

A análise dos resultados será de responsabilidade do pesquisador. Os nomes dos

participantes somente serão citados no trabalho, caso haja interesse e autorização dos

mesmos.

Você receberá uma cópia deste termo onde consta o telefone e o

endereço

institucional (ENSP/FIOCRUZ) do pesquisador responsável e do Comitê de Ética em

Pesquisa (ENSP/FIOCRUZ), podendo tirar suas dúvidas sobre o projeto e sua

participação, agora ou em qualquer momento.

__________________________________________________

Eduardo Stotz – Tel: 2598-2664

Contato com o Comitê de Ética em Pesquisa da ENSP:

Tel e Fax - (0XX) 21- 25982863

E-Mail: [email protected]

http://www.ensp.fiocruz.br/etica

Endereço: Escola Nacional de Saúde Pública/ FIOCRUZ

Av. Leopoldo Bulhões, 1480 – Andar Térreo

Manguinhos - Rio de Janeiro – RJ

CEP: 21041-210

Declaro que entendi os objetivos e condições de minha participação na pesquisa e

concordo em participar.

91

( ) SIM ( ) NÃO