Ratzinger - Eu Vos Explico a Teologia Da Libertação

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"EU V OS EX PLICO A TEOLOGIA DA LIBERT AÇÃO" Por Card. Joseph Ratzinger Tr adução: d. Estêvão Bettencourt Fonte: Rev. Pergunte e Responderemos !"#$% Para esclarecer a minha tarefa e a minha intenção, com relação ao tema, parecem-me necessárias algumas observações preliminares: 1. A teologia da liber taçã o fen!meno e"trao rdinar iamente comple" o. # poss$vel fo rmar-s e um conceito da te ologia da libertação segundo o %ual ela vai das posições mais radicalmente mar"ist as at a% uelas %ue pr opõem o luga r ap ro pr iado da necessária responsabilidade do cristão para com os pobres e os oprimidos no conte"to de uma correta teologia eclesial, como fi&eram os documentos do '()A*, de *edellin a Puebla. +es te nosso te"to, usaremos o conceito teologia da libertação em sentido mais restrito: sentido %ue compreende apenas a%ueles telogos %ue, de algum modo, fi &eram pr pria a opçã o fu ndamental mar"ista. *esmo a%ui e"istem, nos particulares, muit as diferenças %ue imposs$vel apr ofundar nesta refle"ão geral. +este conte"to posso apenas tentar p!r em evid/ncia algumas linhas fundamentais %ue, sem desconhecer as diversas matri&es, são muito difundidas e e"ercem certa influ/ncia mesmo onde não e"iste teologia da libertação em sentido estrito. 0. 'om a análise do fen !meno da teologi a da liber taçã o torna-se manifesto um peri go fundamen ta l para a f da g re 2a. 3em d4vida, preciso ter presente %ue um erro não pode e"istir se não contm um n4cleo de verdade. 5e fato, um erro tanto mais perigoso %uanto maior for a proporção do n4cleo de verdade assumida. Alm disso, o erro não se poderia apropriar da%uela parte de verdade, se essa verdade fosse suficientemente vivida e testemunhada ali onde o seu lugar, isto , na f da gre2a. Por isso, ao lado da demonstração do erro e do perigo da teologia da libert ão , pr ec iso se mp re acrescentar a pe rg unta: %u e verdade se esconde no erro e como recupera-la plenamente6 7. A teolo gia da lib ertação um fen!meno universal sob tr/s pontos de

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  • 5/21/2018 Ratzinger - Eu Vos Explico a Teologia Da Libertao

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    "EU VOS EXPLICO A TEOLOGIA DA LIBERTAO"Por Card. Joseph Ratzinger

    Traduo: d. Estvo Bettencourt

    Fonte: Rev. Pergunte e Responderemos !"#$%

    Para esclarecer a minha tarefa e a minha inteno, com relao aotema, parecem-me necessrias algumas observaes preliminares:

    1. A teologia da libertao fen!meno e"traordinariamente comple"o. #poss$vel formar-se um conceito da teologia da libertaosegundo o %ual ela vai das posies mais radicalmente mar"istas

    at a%uelas %ue propem o lugar apropriado da necessriaresponsabilidade do cristo para com os pobres e os oprimidosno conte"to de uma correta teologia eclesial, como fi&eram osdocumentos do '()A*, de *edellin a Puebla. +este nossote"to, usaremos o conceito teologia da libertao em sentidomais restrito: sentido %ue compreende apenas a%ueles telogos%ue, de algum modo, fi&eram prpria a opo fundamentalmar"ista. *esmo a%ui e"istem, nos particulares, muitasdiferenas %ue imposs$vel aprofundar nesta refle"o geral.+este conte"to posso apenas tentar p!r em evid/ncia algumaslinhas fundamentais %ue, sem desconhecer as diversas matri&es,so muito difundidas e e"ercem certa influ/ncia mesmo onde noe"iste teologia da libertao em sentido estrito.

    0. 'om a anlise do fen!meno da teologia da libertao torna-semanifesto um perigo fundamental para a f da gre2a. 3emd4vida, preciso ter presente %ue um erro no pode e"istir se

    no contm um n4cleo de verdade. 5e fato, um erro tanto maisperigoso %uanto maior for a proporo do n4cleo de verdadeassumida. Alm disso, o erro no se poderia apropriar da%uelaparte de verdade, se essa verdade fosse suficientemente vivida etestemunhada ali onde o seu lugar, isto , na f da gre2a. Porisso, ao lado da demonstrao do erro e do perigo da teologia dalibertao, preciso sempre acrescentar a pergunta: %ueverdade se esconde no erro e como recupera-la plenamente6

    7. A teologia da libertao um fen!meno universal sob tr/s pontos de

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    vista:

    a8 (ssa teologia no pretende constituir-se como um novotratado teolgico ao lado dos outros 2 e"istentes9 no

    pretende, por e"emplo, elaborar novos aspectos da tica socialda gre2a. (la se concebe, antes, como uma nova hermen/uticada f crist, %uer di&er, como nova forma de compreenso e dereali&ao do cristianismo na sua totalidade. Por isto mesmo,muda todas as formas da vida eclesial: a constituioeclesistica, a liturgia, a cate%uese, as opes morais9

    b8 A teologia da libertao tem certamente o seu centro degravidade na Amrica )atina, mas no , de modo algum,fen!meno e"clusivamente latino-americano. +o se podepens-la sem a influ/ncia determinante de telogos europeus etambm norte-americanos. Alm do mais, e"iste tambm nandia, no 3ri )an;a, nas an, na ?frica -embora nesta 4ltima este2a em primeiro plano a busca de umateologia africana. A unio dos telogos do =erceiro *undo fortemente caracteri&ada pela ateno prestada aos temas dateologia da libertao9

    c8 A teologia da libertao supera os limites confessionais. @mdos mais conhecidos representantes da teologia da libertao,ugo Assman, era sacerdote catlico e ensina ho2e comoprofessor em uma

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    resposta, podemos di&er: a teologia da libertao pretende dar novainterpretao global do 'ristianismo9 e"plica o 'ristianismo como umapr"is de libertao e pretende constituir-se, ela mesma, um guia paratal pr"is. *as assim como, segundo essa teologia, toda realidade

    pol$tica, tambm a libertao um conceito pol$tico e o guia rumo Clibertao deve ser um guia para a ao pol$tica. +ada resta fora doempenho pol$tico. =udo e"iste com uma colocao pol$tica DEutierre&8.@ma teologia %ue no se2a prtica Do %ue significa di&eressencialmente pol$tica8 considerada idealista e condenada comoirreal ou como ve$culo de conservao dos opressores no poder.

    Para um telogo %ue tenha aprendido a sua teologia na tradio

    clssica e %ue tenha aceitado a sua vocao espiritual, dif$cilimaginar %ue seriamente se possa esva&iar a realidade global do'ristianismo em um es%uema de pr"is scio-pol$tico de libertao. Acoisa , entretanto, mais dif$cil, 2 %ue os telogos da libertaocontinuam a usar grande parte da linguagem asctica e dogmtica dagre2a em clave nova, de tal modo %ue a%ueles %ue l/em e %ueescutam partindo de outra viso, podem ter a impresso de reencontraro patrim!nio antigo com o acrscimo apenas de algumas afirmaesum pouco estranhas mas %ue, unidos a tanta religiosidade, nopoderiam ser to perigosas.

    ("atamente a radicalidade da teologia da libertao fa& com %ue a suagravidade no se2a avaliada de modo suficiente9 no entra em nenhumes%uema de heresia at ho2e e"istente. A sua colocao, 2 de partida,situa-se fora da%uilo %ue pode ser colhido pelos tradicionais sistemasde discusso. Por isto tentarei abordar a orientao fundamental dateologia da libertao em duas etapas:

    Primeiramente necessrio di&er algo acerca dos pressupostos %ue atornaram poss$vel9 a seguir, dese2o aprofundar alguns dos conceitosbase %ue permitem conhecer algo da estrutura da teologia dalibertao.

    'omo se chegou a esta orientao completamente nova dopensamento teolgico, %ue se e"prime na teologia da libertao6 Fe2oprincipalmente tr/s fatores %ue a tornaram poss$vel:

    1. Aps o 'onc$lio GFaticano H, produ&iu-se uma situao teolgica

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    nova:

    0. a8 3urgiu a opinio de %ue a tradio teolgica e"istente at entono era mais aceitvel e, por conseguinte, se deviam procurar, a

    partir da (scritura e dos sinais dos tempos, orientaesteolgicas e espirituais totalmente novas9

    7. b8 A idia de abertura ao mundo e de compromisso no mundotransformou-se fre%Ientemente em uma f ing/nua nas ci/ncias9uma f %ue acolheu as ci/ncias humanas como um novoevangelho, sem %uerer reconhecer os seus limites e problemasprprios. A psicologia, a sociologia e a interpretao mar"ista dahistria foram considerados como cientificamente seguras e, aseguir, como instBncias no mais contestveis do pensamentocristo9

    J. c8 A critica da tradio por parte da e"egese evanglica moderna,especialmente a de Kultmann e da sua escola, tornou-se umainstBncia teolgica inamov$vel %ue barrou a estrada Cs formasat ento vlidas da teologia, encora2ando assim tambm novasconstrues.

    L. A situao teolgica assim transformada coincidiu com uma situaoda historia espiritual tambm ela modificada. Ao final da fase dereconstruo aps a segunda guerra mundial, fase %ue coincidiupouco mais ou menos com o trmino do 'oncilio, produ&iu-se nomundo ocidental um sens$vel va&io de significado, ao %ual afilosofia e"istencialista ainda em voga no estava em condiesde dar alguma resposta. +esta situao, as diferentes formas doneo-mar"ismo transformaram-se em um impulso moral e, ao

    mesmo tempo, em uma promessa de significado %ue parecia%uase irresist$vel C 2uventude universal. M mar"ismo, com asacentuaes religiosas de Kloch e as filosofias dotadas de rigorcient$fico de Adorno, ar;heimer, abernas e *arcuse,ofereceram modelos de ao com os %uais alguns pensadoresacreditavam poder responder ao desafio da misria no mundo e,ao mesmo tempo, poder atuali&ar o sentido correto damensagem b$blica.

    N. M desafio moral da pobre&a e da opresso no se podia mais ignorar,

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    no momento em %ue a (uropa e a Amrica do +orte atingiamuma opul/ncia at ento desconhecida. (ste desafio e"igiaevidentemente nova respostas, %ue no se podiam encontrar natradio e"istente at a%uele momento. A situao teolgica e

    filosfica mudada convidava e"pressamente a buscar o respostaem um cristianismo %ue se dei"asse regular pelos modelos daesperana, aparentemente fundados cientificamente, dasfilosofias mar"istas.

    II. A Estrutura Gnoseolgica Fundaental do Teologia doLibertao

    (sta resposta se apresenta totalmente diversa nas formas particularesde teologia da libertao: teologia da evoluo, teologia pol$tica, etc.+o pode, pois, ser apresentada globalmente.

    ("istem, no entanto, alguns conceitos fundamentais %ue se repetemcontinuamente nas diferentes variaes e e"primem comuns intenesde fundo. Antes de passar aos conceitos fundamentais do conte4do, necessrio fa&er uma observao acerca dos elementos estruturais da

    teologia da libertao.

    Para tal, podemos retomar o %ue 2 afirmamos acerca da situaoteolgica mudada aps o 'oncilio. 'omo 2 disse, leu-se a e"egese deKultmann e da sua escola como um enunciado da ci/ncia sobreOesus, ci/ncia %ue devia obviamente ser considerado como vlida. MOesus histrico de Kultmann, entretanto, apresentava-se separado porum abismo Do prprio Kultmann fala de Eraben, fosso8 do 'risto da f.3egundo Kultmann, Oesus pertence aos pressupostos do +ovo=estamento, permanecendo, porm, encerrado no mundo do 2uda$smo.M resultado final dessa e"egese consistiu em abalar a credibilidadehistrica dos (vangelhos: o 'risto da tradio eclesial e o Oesushistrico apresentado pela ci/ncia pertencem evidentemente a doismundos diferentes. A figura de Oesus foi erradicada da sua colocaona tradio por ao da ci/ncia, considerada como instBncia suprema9deste modo, por um lado, a tradio pairava como algo de irreal nova&io, e, por outro, devia-se procurar para a figura de Oesus uma nova

    interpretao e um novo significado.

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    Kultmann, portanto, ad%uiriu importBncia no tanto pelas suasafirmaes positivas %uanto pelo resultado negativo da sua cr$tica: on4cleo da f, a cristologia, permaneceu aberto a novas interpretaespor%ue os seus enunciados originais tinham desaparecido, na medida

    em %ue eram considerados historicamente insustentveis. Ao mesmotempo desautori&ava-se o magistrio da gre2a, na medida em %ue oconsideravam preso a uma teoria cientificamente insustentvel e,portanto, sem valor como instBncia cognoscitiva sobre Oesus. Ms seusanunciados podiam ser considerados somente como definiesfrustadas de uma posio cientificamente superada.

    Alm disso, Kultmann foi importante para o desenvolvimento posterior

    de uma segunda palavra-chave. (le trou"e C moda o antigo conceito dehermen/utica, conferindo-lhe uma dinBmica nova. +a palavrahermen/utica encontra e"presso a idia de %ue uma compreensoreal dos te"tos histricos no acontece atravs de uma merainterpretao histrica9 mas toda interpretao histrica inclui certasdecises preliminares. A hermen/utica tem a funo de atuali&ar, emcone"o com a determinao de dado histrico. +ela, segundo oterminologia clssica, se trata de um fuso dos hori&ontes entreento Gna%uele tempoH e o ho2e. Por conseguinte, ela suscita apergunta: o %ue significa o ento Dna%uele tempo8 nos dias de ho2e6

    M prprio Kultmann respondeu a esta pergunta servindo-se da filosofiade eidegger e interpretou, deste modo, a K$blia em sentidoe"istencialista. =al resposta, ho2e, no apresenta mais algum interesse9neste sentido Kultmann foi superado pela e"egese atual. *aspermaneceu a separao entre a figura de Oesus da tradio clssica ea idia de %ue se pode e se deve transferir essa figura ao presente,

    atravs de uma nova hermen/utica.

    A este ponto, surge o segundo elemento, 2 mencionado, da nossasituao: o novo clima filosfico dos anos sessenta. A anlise mar"istado histria e da sociedade foi considerada, nesse $nterim, como a 4nicadotada de carter cientifico, isto significa %ue o mundo interpretadoC lu& do es%uema da luta de classes e %ue a 4nica escolha poss$vel entre capitalismo e mar"ismo. 3ignifica, alm disso, %ue toda arealidade pol$tica e %ue deve ser 2ustificada politicamente.

    M conceito b$blico do pobre oferece o ponto de partida para a

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    confuso entre a imagem b$blica da histria e a dialtica mar"ista9 esseconceito interpretado com a idia de proletariado em sentido mar"istae 2ustifica tambm o mar"ismo como hermen/utica legitima para acompreenso da K$blia. Mra, 3egundo essa compreenso, e"istem, e

    s podem e"istir, duas opes9 por isso, contradi&er essa interpretaoda K$blia no seno e"presso do esforo da classe dominante paraconservar o prprio poder. Eutierre& afirma: A luta de classes umdado de fato e a neutralidade acerca desse ponto absolutamenteimposs$vel. A partir dai, torna-se imposs$vel at a interveno domagistrio eclesistico: no caso em %ue este se opusesse a talinterpretao do 'ristianismo demonstraria apenas estar ao lado dosricos e dos dominadores e contra os pobres e os sofredores, isto ,

    contra o prprio Oesus, e, na dialtica da histria, aliar-se-ia C partenegativa.

    (ssa deciso, aparentemente cient$fica e hermeneuticamenteindiscut$vel, determina por si o rumo da ulterior interpretao do'ristianismo, se2a %uanto Cs instancias interpretativas, se2a %uanto aosconte4dos interpretados.

    +o %ue di& respeito as instBncias interpretativas, os conceitos decisivos

    so: povo, comunidade, e"peri/ncia, histria. 3e at ento a gre2a, isto, a gre2a 'atlica na 3ua totalidade, %ue, transcendendo tempo eespao, abrange os leigos Dsensus fidei8 e a hierar%uia Dmagistrio8,fora a instBncia hermen/utica fundamental, ho2e tornou-se acomunidade tal instBncia. A viv/ncia e as e"peri/ncias da comunidadedeterminam agora a compreenso e a interpretao da (scritura.

    5e novo pode-se di&er, aparentemente de maneira muito cient$fica, %ue

    a figura de Oesus, apresentada nos (vangelhos, constitui uma s$ntesede acontecimentos e interpretaes da e"peri/ncia de comunidadesparticulares, onde no entanto a interpretao muito mais importantedo %ue o acontecimento, %ue, em si, no mais determinvel.

    (ssa s$ntese original de acontecimento e interpretao pode serdissolvida e reconstru$da sempre de novo: a comunidade interpretacom a sua e"peri/ncia os acontecimentos e encontra assim suapr"is. (sta idia, podemos encontra-la em modo um tanto diverso do

    conceito de povo, com o %ual se transformou a acentuao conciliar daidia de povo de 5eus em mito mar"ista. As e"peri/ncias do povo

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    e"plicam a (scritura. Povo torna-se assim um conceito oposto ao dehierar%uia e em ant$tese a todas as instituies indicadas como forasda opresso.

    Afinal, povo %uem participa da luta de classes9 a igre2a popularacontece em oposio C gre2a hierr%uica. Por fim, o conceito dehistria torna-se instBncia hermen/utica decisiva. A opinio,considerada cientificamente segura e irrefutvel, de %ue a K$bliaraciocine em termos e"clusivamente de histria da salvao, e portantode maneira anti-metaf$sica, permite a fuso do hori&onte b$blico com aidia mar"ista da histria %ue procede dialeticamente como aut/nticaportadora de salvao9 a histria a aut/ntica revelao e, portanto, a

    verdadeira instBncia hermen/utica da interpretao b$blica.

    =al dialtica apoiada, algumas ve&es, pela pneumatologia. (m todocaso, tambm esta 4ltima, no magistrio %ue insiste em verdadespermanentes, v/ uma instBncia inimiga do progresso, dado %ue pensametafisicamente e assim contradi& a histria. Pode-se di&er %ue oconceito de histria absorve o conceito de 5eus e de revelao. Ahistoricidade da K$blia deve 2ustificar o seu papel absolutamentepredominante e, portanto, deve legitimar, ao mesmo tempo, a

    passagem para a filosofia materialista-mar"ista, na %ual a histriaassumiu a funo de 5eus.

    III. Conceitos Fundaentais da Teologia da Libertao

    'om isto, chegamos aos conceitos fundamentais do conte4do da novainterpretao do 'ristianismo. @ma ve& %ue os conte"tos nos %uais

    aparecem os diversos conceitos so diferentes, gostaria de citar algunsdeles, sem a pretenso de es%uemati&a-los.

    'omecemos pela nova interpretao da f, da esperana e dacaridade. 'om relao a f, por e"emplo, O. 3obrinho afirma: ae"peri/ncia %ue Oesus tem de 5eus radicalmente histrica. A sua fconverte-se em fidelidade. Por isso 3obrinho substituifundamentalmente a f pela fidelidade C histria Dfidelidad a lahistoria, 1J7-1JJ8. Oesus fiel C profunda convico de %ue o mistrioda vida do homem realmente o 4ltimo D1JJ8. A%ui produ&-se

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    a%uela fuso entre 5eus e histria %ue d a 3obrinho a possibilidadede conservar para Oesus a frmula de 'alced!nia, ainda %ue com umsentido completamente mudado9 pode-se ver como os critriosclssicos da ortodo"ia no so aplicveis C anlise dessa teologia,

    gnacio (llacuria, na capa do livro sobre este assunto, afirma: 3obrinhodi& de novo %ue Oesus 5eus, acrescentando, porm,imediatamente, %ue o 5eus verdadeiro somente a%uele %ue se revelahistoricamente em Oesus e nos pobres, %ue continuam a sua presena.3omente %uem mantm unidas essas duas afirmaes, ortodo"o .

    A esperana interpretada como confiana no futuro e como trabalhopelo futuro9 com isso ela subordinada novamente ao predom$nio da

    histria das classes.

    Amor consiste na opo pelos pobres, isto , coincide com a opopela luta de classes.

    Ms telogos da libertao sublinham com fora, diante do falsouniversalismo, a parcialidade e o carter partidrio da opo crist9tomar partido , segundo eles, re%uisito fundamental de uma corretahermen/utica dos testemunhos b$blicos. +a minha opinio, a%ui se

    pode reconhecer muito claramente a mistura entre uma verdadefundamental do 'ristianismo e uma opo fundamental no crist, %uetorna o con2unto to sedutor: o sermo da montanha , na verdade, aescolha por parte de 5eus a favor dos pobres. *as a interpretao dospobres no sentido da dialtica mar"ista da histria e a interpretao daescolha partidria no sentido da luta de classes um salto eis allogenos Dgrego: para outro g/nero8, no %ual as coisas contrarias seapresentam como id/nticas.

    M conceito fundamental da pregao de Oesus o de reino de 5eus.(ste conceito encontra-se tambm no centro das teologia da libertao,lido porm no conte"to da hermen/utica mar"ista. 3egundo O.3obrinho, o reino no deve ser compreendido espiritualmente, nemuniversalmente, no sentido de uma reserva escatologicamenteabstrata. 5eve ser compreendido em forma partidria e voltado para apr"is. 3omente a partir da pr"is de Oesus, e no teoricamente, poss$vel definir o %ue seria o reino: trabalhar na realidade histrica %ue

    nos circunda para transform-la no reino D1NN8.

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    A%ui ocorre mencionar tambm uma idia fundamental de certateologia ps-conciliar %ue impulsionou nessa direo. *uitosapregoaram %ue, segundo o 'onc$lio, se deveriam superar todas asformas de dualismo: o dualismo de corpo e alma, de natural e

    sobrenatural, de iman/ncia e transcend/ncia, de presente e futuro.Aps o desmantelamento desses dualismos, resta apenas apossibilidade de trabalhar por um reino %ue se reali&e nesta histria eem sua realidade pol$tico-econ!mica.

    *as 2ustamente dessa forma dei"ou-se de trabalhar pelo homem deho2e e se comeou a destruir o presente, a favor de um futurohipottico: assim produ&iu-se imediatamente o verdadeiro dualismo.

    +este conte"to gostaria de mencionar tambm a interpretao,impressionante e definitivamente espantosa, %ue 3obrinho d da mortee da ressurreio. Antes do mais, ele estabelece, contra as concepesuniversalistas, %ue a ressurreio , em primeiro lugar, uma esperanapara a%ueles %ue so crucificados9 estes constituem a maioria doshomens: todos a%ueles milhes aos %uais a in2ustia estrutural seimpe como uma lenta crucifi"o D1QN e seguintes8.

    M crente, no entanto, participa tambm do senhorio de Oesus sobre ahistria, atravs da edificao do reino, isto , na luta pela 2ustia e pelalibertao integral, na transformao das estruturas in2ustas emestruturas mais humanas. (sse senhorio sobre a histria e"ercitadoao se repetir o gesto de 5eus %ue ressuscita Oesus, isto , dandonovamente vida aos crucificados da histria D1R18. M homem assumiu ogesto de 5eus e a%ui a transformao total da mensagem b$blica semanifesta de maneira %uase trgica, se se pensa em como essa

    tentativa de imitao de 5eus se desenvolveu e se desenvolve ainda.Eostaria de citar apenas alguns outros conceitos: o /"odo setransforma em uma imagem central da histria da salvao9 o mistriopascal entendido como um s$mbolo revolucionrio e, portanto, a(ucaristia interpretada como uma festa de libertao no sentido deuma esperana pol$tico-messiBnica e da sua pr"is.

    A palavra redeno substitu$da geralmente por libertao, a %ual, por

    sua ve&, compreendida, no conte"to da histria e da luta de classes,como processo de libertao %ue avana, por fim, fundamental

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    tambm a acentuao da pr"is: a verdade no deve ser compreendidoem sentido metaf$sico9 trata-se de idealismo. A verdade reali&a-se nahistria e na pr"is. A ao a verdade.

    Por conseguinte, tambm as idias %ue se usam para ao, em 4ltimainstBncia so intercambiveis. A 4nica coisa decisiva a pr"is. Apr"is torna-se, assim, o 4nica e verdadeira ortodo"ia. 5esta forma

    2ustifica-se um enorme afastamento dos te"tos b$blicos: a cr$ticahistrica liberta da interpretao tradicional, %ue aparece como no-cient$fica.

    'om relao C tradio, atribui-se importBncia ao m"imo rigorcientifico na linha de Kultmann. *as os conte4dos da K$blia,determinados historicamente, no podem, por sua ve&, ser vinculantesde modo absoluto. M instrumento para a interpretao no , em 4ltimaanlise, a pes%uisa histrica, mas, sim, a hermen/utica da histria,e"perimentada na comunidade, isto , nos grupos pol$ticos, sobretudodado %ue a maior parte dos prprios conte4dos b$blicos deve serconsiderada como produto de tal hermen/utica comunitria.

    Suando se tenta fa&er um 2ulgamento geral, deve-se di&er %ue, %uando

    algum procura compreender as opes fundamentais da teologia dalibertao no pode negar %ue o con2unto contm uma lgica %uaseincontestvel. 'om as premissas da critica b$blica e da hermen/uticafundada na e"peri/ncia, de um lado, e da anlise mar"ista da histria,de outro, conseguiu-se criar uma viso de con2unto do cristianismo %ueparece responder plenamente tanto Cs e"ig/ncias da ci/ncia, %uantoaos desafios morais dos nossos tempos. (, portanto, impe-se aoshomens de modo imediato o tarefa de fa&er do 'ristianismo um

    instrumento da transformao concreta do mundo, o %ue pareceria uni-lo a todas as foras progressistas da nossa poca.

    Pode-se, pois, compreender como esta nova interpretao do'ristianismo atraia sempre mais telogos, sacerdotes e religiosos,especialmente no conte"to dos problemas do terceiro mundo. 3ubtrair-se a ela deve necessariamente aparecer aos olhos deles como umaevaso da realidade, como uma ren4ncia C ra&o e C moral.

    Porm, de outra parte, %uando se pensa o %uanto se2a radical ainterpretao do 'ristianismo %ue dela deriva, torna-se ainda mais

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    urgente o problema do %ue se possa e se deva fa&er frente a ela.

    T T T T T

    Comentrios de !. Este"o #ettencourt$

    guisa de comentrio, parece oportuno salientar os seguintes pontos:

    1) A Teologia da Libertao no um novo tratado teolgico ao lado deoutros e!istentes, mas uma nova interpretao do "ristianismo,

    #ue revira radicalmente as verdades da $, a constituio da %grea, aLiturgia, a cate#utica e as op&es morais'

    () Todos os valores e toda a realidade so considerados do ponto de

    vista poltico' *ma teologia #ue no sea essencialmente poltica, encarada como $ator de conservao dos apressares no poder'

    +) A di$iculdade de se perceber esse carter subversiva da Teologia daLibertao est, em grande parte, no $ato de #ue os seus arautos

    continuam a usar a linguagem asctica e dogmtica da %grea, emboraem cave nova' %sto d aos observadores a impresso de #ue estodiante do patrim-nio da $ acrescido de algumas a$irma&es religiosas

    #ue no podem ser perigosas'

    .) A gravidade da Teologia da Libertao no su$icientemente

    avaliada/ no entra em nenum es#uema de eresia at oe e!istente'

    0) O cristo no pode ser, de forma alguma, insensvel misriados povos do Terceiro Mundo. Todavia, para acudir cristmente a

    tal situao, no lhe necessrio adotar um sistema de

    pensamento que anticristo como a Teologia da i!ertao"

    e#iste a doutrina social da $gre%a, desenvolvida pelos &apas desdeeo '$$$ at (oo &aulo $$ de maneira cada ve) mais incisiva e

    penetrante. *e fosse posta em prtica, eliminaria graves males de

    que sofrem os homens, sem disseminar o +dio e a luta de classes.

    Para itar este arti!o

    CARD#$ %ose&' Rat(in!er. Apostolado Veritatis Splendor: &E' ()* E+P,-C) TE),)/- 0 ,-BERT12)&. Disponvel emhttp://www.veritatis.com.br/article/4734. Desde 5/5/2!.