Rebecca Winters - [Amores Perfeitos] - Luz de Esperança (Special 95.2)

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Luz de Esperança BABY OUT OF THE BLUE Rebecca Winters AMORES PERFEITOS Durante férias na Grécia, Fran Myers é surpreendida pelo acaso: encontra um pequeno bebê que fora trazido por um tornado! Ao aninhar a frágil criança em seus braços, o instinto maternal desperta dentro de si. Enquanto isso, o poderoso CEO Nik Angelis fica aliviado ao ver Fran com sua sobrinha, Demi. Ao notar o laço afetivo que se formara entre elas, o desejo de ter uma família volta a dominá-lo. Ambos já tiveram o coração partido e seus sonhos destruídos, mas estarão dispostos a dar uma segunda chance ao amor? Digitalização: Simone R. Revisão: Carmita

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Luz de EsperançaBABY OUT OF THE BLUE

Rebecca Winters

AMORES PERFEITOS

Durante férias na Grécia, Fran Myers é surpreendida pelo acaso: encontra um pequeno bebê que fora trazido por um tornado! Ao aninhar a frágil criança em seus braços, o instinto maternal desperta dentro de si. Enquanto isso, o poderoso CEO Nik Angelis fica aliviado ao ver Fran com sua sobrinha, Demi. Ao notar o laço afetivo que se formara entre elas, o desejo de ter uma família volta a dominá-lo. Ambos já tiveram o coração partido e seus sonhos destruídos, mas estarão dispostos a dar uma segunda chance ao amor?

Digitalização: Simone R.Revisão: Carmita

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Rebecca Winters - [Amores Perfeitos] - Luz De Esperança (Special 95.2)

Tradução Rafael Bonaldi

HARLEQUIN2014

Querida leitora,Milagres se manifestam de tantas formas diferentes que seria impossível nomear

todas. Quando planejei escrever histórias sobre o milagre que são os bebês, criei uma lista de possibilidades.

Enquanto estava pensando sobre o que eu realmente queria, lembrei de uma manchete: Pequeno Milagre! Logo abaixo tinha a foto de uma criança que já conseguia se sentar sozinha, mas você nunca imaginaria onde ela estava — no meio de uma plantação de milho no centro-oeste do Estados Unidos! Seus pais haviam morrido durante um tornado a 16 quilômetros dali. Fiquei instantaneamente inspirada e soube que tinha que criar Luz de esperança.

E lembre-se, a vida é mais estranha do que a ficção.Aproveite! Rebecca Winters

PUBLICADO MEDIANTE ACORDO COM HARLEQUIN BOOKS S.A.Todos os direitos reservados. Proibidos a reprodução, o armazenamento ou a

transmissão, no todo ou em parte.Todos os personagens desta obra são fictícios. Qualquer semelhança com pessoas vivas

ou mortas é mera coincidência.

Título original: BECOMING THE PRINCE’S WIFECopyright © 2014 by Rebecca Winters

Originalmente publicado em 2014 por Mills & Boon Romance

Título original: BABY OUT OF THE BLUECopyright © 2013 by Rebecca Winters

Originalmente publicado em 2013 por Mills & Boon Romance

Projeto gráfico de capa:Nucleo i designers associados

Arte-final de capa:Isabelle Paiva

Editoração eletrônica:EDITORIARTE

Impressão:RR DONNELLEY

www.rrdonnelley.com.br

Distribuição para bancas de jornais e revistas de todo o Brasil:FC Comercial Distribuidora S.A.

Editora HR Ltda.Rua Argentina, 171,4° andar

São Cristóvão, Rio de Janeiro, RJ — 20921-380Contato: [email protected]

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Rebecca Winters - [Amores Perfeitos] - Luz De Esperança (Special 95.2)

CAPÍTULO 1

Os olhos de Fran Myers absorviam a paisagem que se revelava a cada curva da estrada costeira. Contra o azul-celeste do mar Egeu, os quilômetros de praias brancas margeadas por pinhos verde-escuros não pareciam reais. Nuvens negras e pesadas se desdobravam rapidamente no céu, dando um aspecto dramático à cena. O panorama das cores era espetacular.

— Não sabia que a Riviera Grega era tão linda, Kellie. Estou maravilhada. Tudo é tão intocado.

— É por isso que meu marido construiu aqui o resort onde vamos ficar nos próximos dias. O Perséfone é o mais novo refúgio para os poucos privilegiados que podem desfrutar de paz e tranquilidade no mais absoluto luxo.

O lugar era tão fabuloso que a notícia não surpreendeu Fran.

— Foi por isso que viemos de Atenas? Você acha que eu preciso de paz e tranquilidade?

— Muito pelo contrário. Muitos nobres vêm passar as férias aqui. Espero que você conheça um deles, solteiro e lindo. Vocês vão trocar um olhar, e será amor à primeira vista.

— Isso nunca vai acontecer, não depois do meu péssimo casamento.

A melhor amiga de Fran, desde a infância, a observou.

— Não faça essa cara, Kellie.

— Não estou fazendo cara nenhuma. É que faz muito tempo que você precisa de férias. Todas as vezes que eu liguei depois do divórcio você estava no hospital, trabalhando pacientemente dia e noite, sem poder conversar mais do que alguns minutos. Você precisa de uma paixão para voltar a viver!

— Você é hilária. É verdade que me joguei no trabalho para não pensar nisso, mas já faz um ano. Estou bem melhor agora.

— Mentirosa. Sua mãe não precisava me contar que você não tem mais uma vida e que necessita de um tempinho longe de tudo. Quero que você seja coberta de mimos da cabeça aos pés. Vamos relaxar, nadar, velejar, fazer caminhada e outras coisas enquanto procuramos por solteiros interessantes.

— Você é incorrigível, e eu te amo por isso. Sabe muito bem que, quando aceitei vir, eu não esperava que você teria todo esse trabalho por mim. Achei que ficaríamos em Atenas e veríamos todas as atrações que não pude ver quando vim para seu casamento. Além disso, não acho que seu marido esteja muito contente com isso tudo.

Kellie fez um gesto de desprezo com a mão.

— Julho é a época mais atarefada para Leandros. Ele viajou a negócios para o Peloponeso a fim de pesquisar lugares para um novo resort. É o momento perfeito para passar um tempo com a pessoa que sempre foi uma irmã para mim. Foi por isso que não aceitei um “não” como resposta. Temos muitos assuntos para pôr em dia.

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— Concordo.

As duas eram amigas desde que frequentaram a mesma escola primária na Filadélfia. Elas conseguiam ler o estado de espírito uma da outra. Tendo passado o melhor e o pior de suas vidas juntas, tornaram-se mais próximas do que a maioria das irmãs.

Quando estavam planejando a viagem, pensaram em setembro. Mas Kellie mudara de ideia e insistira que Fran fosse o quanto antes. Estava acontecendo alguma coisa: a amiga normalmente viajava com o marido. Era como se ela precisasse conversar com Fran em pessoa.

Dois anos antes, Kellie se casara com o empresário e milionário grego Leandros Petralia, em Atenas. Fran fora a dama de honra da amiga. Embora trocassem e-mails e conversassem pelo telefone sempre, elas só se viam nas poucas vezes que Kellie ia para a Pensilvânia passar alguns dias com a família. Naquelas visitas curtas, Fran via que a amiga era tão louca pelo marido que não suportava ficar longe dele mais do que algumas noites.

Porém, claramente aquele não era mais o caso. Kellie parecia dispersa, e sua boa disposição, um tanto artificial. Ela também parecia mais magra. Na viagem de vinte e quatro horas para o resort ao sul de Tessalônica, as respostas de Kellie não soavam nem um pouco típicas dela.

Fran decidiu esperar até o dia seguinte para ter uma conversa franca com a amiga de cabelos dourados. Naquele instante ela queria que a amiga se concentrasse no volante do sedã de luxo azul-claro — veloz demais para o gosto de Fran. Fran olhou para o céu tempestuoso.

— Você percebeu aquelas nuvens?

— Sim. O vento está tão forte que chega a desestabilizar o carro. É muito estranho. Este lugar é famoso pelo tempo ensolarado. O tempo escolheu mudar bem no dia da sua chegada.

— Talvez seja um mau presságio, e seu marido volte mais cedo para Atenas e descubra que você sumiu.

— Não seja ridícula — respondeu Kellie com uma rapidez suspeita. — Ele está com a secretária. Talvez eles estejam em alguma ilha do Dodecaneso, um dos lugares favoritos dele para relaxar.

Com a sra. Kostas? Ela estava com quase 50 anos.

A explosão emocional da amiga pegou Fran de surpresa.

— Eu só estava brincando com você. — Ela nunca vira Kellie surtar daquele jeito.

— Prefiro falar de você. Rob já ligou, querendo voltar com você?

— Não. Na verdade, ouvi dizer que ele está saindo com alguém do trabalho.

— Logo vai perceber que perdeu uma das melhores coisas que já aconteceram com ele.

— Falou a minha melhor amiga.

Kellie fora a dama de honra no casamento de Fran. Quatro anos atrás ela se casara com Rob Myers depois de conhecê-lo por meio de amigos mútuos na Filadélfia. Ele era um promissor advogado trabalhando para uma firma local de prestígio. No terceiro encontro ela contou para Rob que não poderia ter filhos e que, se ele não quisesse vê-la nunca mais, ela entenderia.

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Ele disse que não tinha problemas com a adoção. Além disso, estava interessado nela e provou isso ao se casar com Kellie. Depois de um ano, ela deu a ideia de darem entrada nos papéis de adoção, mas ele disse que era muito cedo para pensar nisso.

Com o tempo ela percebeu que Rob tinha certas restrições e sugeriu o aconselhamento de casais para que pudessem conversar melhor. Porém, o aconselhamento revelou que, com o crescente sucesso da firma de advocacia, ele não tinha mais interesse e muito menos tempo para aumentar a família, especialmente quando a criança não poderia ser sangue do sangue deles. Fran já lhe bastava.

Ela queria muito ter filhos. Depois de três anos de uma vida infeliz e vazia como casal, eles decidiram se separar. Era a única forma de acabar com a dor. Desde então, Fran decidiu que o casamento não era para ela. Kellie riu daquele absurdo e disse que ela com certeza encontraria um marido.

— Kellie? Não sei você, mas estou com sede. Vamos parar na villa logo adiante e tomar uma bebida em um daqueles charmosos bares de hotéis.

— Só faltam 30 quilômetros até Perséfone — respondeu a amiga. — Vamos pedir um jantar em nossa suíte de luxo, onde poderemos relaxar. Mas, claro, se você não pode esperar...

— Espero que não se incomode.

As mãos de Kellie apertaram com força o volante, prova de que ela mal conseguia segurar o nervosismo.

— Claro que não.

A amiga respondeu em um tom vazio. No entanto, Fran estava mais preocupada com o fato de Kellie estar dirigindo acima do limite de velocidade. Ela nunca foi de correr. Depois da parada, talvez trocasse de lugar com a amiga, dirigindo pelo resto da viagem. Ela usaria o pretexto de nunca ter dirigido uma Mercedes antes.

Fran queria que as duas chegassem ao resort inteiras. O vento estava perigoso. Para seu temor, ocorreu-lhe que Kellie poderia nem estar vendo a estrada. A intuição lhe dizia que seu belo casamento estava com problemas.

Até Kellie.

Quando elas chegaram à villa, o vento estava tão forte que havia lixo e detritos voando pelos ares.

— Pare naquele hotel de esquina, Kellie. Está começando a chover granizo.

As pequeninas bolas de gelo esvaziaram a rua. Todas as lojas e cafés recolheram suas mesas e exibidores. Quando as duas entraram no bar do hotel, turistas e funcionários conversavam em grupos enquanto se secavam.

— Kellie, você entende grego. O que eles estão dizendo?

— Não sei, mas vou descobrir.

Fran seguiu a amiga até o balcão, onde ela arrancou uma resposta de um garçom.

— Alguém lá nos fundos ouviu no rádio que ventos como os de um tornado atingiriam a região. A polícia emitiu um aviso para que todos fiquem em lugares fechados até o perigo passar. Foi bom você ter parado aqui.

— Vamos então nos sentar e tomar uma bebida enquanto o temporal não passa.

Depois de servidas, elas levaram seus refrigerantes até uma mesa desocupada. O granizo havia parado, e uma chuva forte caía.

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Kellie franziu o cenho.

— Não posso acreditar nesse tempo.

— Já que saiu a notícia, é melhor ligar para Leandros e avisar que você está bem.

— Ele sabe. Sempre que saio de casa, meu guarda-costas Yannis me segue. Se meu marido estiver interessado, ele que me ligue. — Ela tirou o celular da bolsa.

— Não. Nenhuma ligação. Viu? — Mostrou a tela para a amiga. — Nenhuma mensagem.

— Kellie. — Fran colocou a mão no braço da amiga. — Conte-me o que está acontecendo. Tinha planejado fazer essa pergunta amanhã de manhã, mas já que não vamos a lugar nenhum vou perguntar agora. Quero saber o que aconteceu com a esposa mais feliz que eu já vi. Para onde ela foi? — O motivo pelo qual Kellie queria que a amiga fosse para a Grécia não era mais um segredo.

Kellie desviou os olhos castanhos.

— Talvez você devesse perguntar isso para Leandros.

— Ele não está aqui. Você está. Diga o que está errado.

O rosto de Kellie era a própria definição da dor.

— Estou perdendo-o, Fran. Na verdade, descobri que eu nunca o tive e não estou aguentando essa situação.

A amiga estava tão frágil que desmoronaria se Fran forçasse a barra. Em vez de argumentar que aquilo não era possível, ela respirou fundo antes de dizer:

— Isso não tem nada a ver com o fato de você ainda não ter engravidado? Você provavelmente está se cobrando muito para dar um filho a Leandros. Essas coisas levam tempo.

— Depois que fui diagnosticada com sensibilidade ao plasma seminal, esse é o eufemismo do ano. Eu não queria falar sobre isso, mas você merece uma explicação.

“Nosso casamento começou a ruir quando descobri que as dores e pontadas que eu sentia depois da relação sexual eram porque meu corpo é alérgico ao esperma de Leandros. Quando o médico me contou que mais de 20 mil mulheres sofrem disso só nos Estados Unidos, eu mal pude acreditar.”

Fran balançou a cabeça.

— Eu não tinha ideia.

— Eu também nunca soube que isso existia. Leandros deve ter ficado devastado, mas ele foi maravilhoso.

Desde então usa camisinha todas as vezes, mas eu sei que lá no fundo ele detesta.

“O médico sabia que nós queremos um bebê e disse que poderíamos tentar inseminação artificial com uma boa chance de sucesso. Eles precisam retirar as proteínas do esperma dele antes do procedimento. Estamos tentando esse método desde o ano passado, mas infelizmente não está dando certo com a gente. Ele disse que está disposto a adotar. Qual a ironia disso, depois de tudo pelo que você passou? Acho que nessa altura do campeonato, dá na mesma.”

Fran não podia acreditar no que estava ouvindo.

— O que você quer dizer?

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— Estou falando de Karmela Paulos. Ela começou a trabalhar para Leandros um mês atrás, como parte da equipe de digitação.

Ah. Karmela. A mulher não conseguia tê-lo por outros meios, então resolveu insinuar-se para ele no escritório. Agora as coisas estavam fazendo sentido.

Linda e de cabelos negros, Karmela Paulos era a irmã mais nova da primeira esposa de Leandros, Petra. Petra estava grávida quando morreu em um acidente de helicóptero no mar Jônico.

Dois anos depois, Leandros conheceu Kellie por acaso no Cassandra, um dos famosos hotéis cinco estrelas dos Petralia, em Atenas. Não demorou muito para que eles se casassem, mas parecia que desde o funeral da primeira esposa Leandros estava sempre na companhia de Karmela.

Fran a conhecera no casamento e não gostara nada do comportamento possessivo dela para com Leandros. Embora ele estivesse casado pela segunda vez, era como se ela tivesse galgado uma posição que a colocava mais próxima a Leandros do que antes. Aquilo era puro jogo baixo. Sendo cunhado dela, ele não podia simplesmente se afastar dela.

— Ficou claro para mim no casamento que você frustrou os sonhos dela de se tornar a nova sra. Petralia. — Qualquer que fosse o subterfúgio, Fran tinha certeza de que Karmela estava tramando separá-los. Ela claramente desejava Leandros.

Que pena. Fran estava decidida a resolver aquela situação antes de voltar para a Pensilvânia dali duas semanas.

— Diga o que quiser, Kellie. Você ouviu o aviso da polícia, e eu tenho uma ideia. Já que não devemos ir lá fora, que tal passarmos a noite aqui?

— Parece uma boa ideia.

— Também acho. Vai ser divertido. Há quanto tempo não ficamos em um hotelzinho aconchegante como esse?

— Não me lembro.

— Vamos ver o noticiário quando o sinal da TV voltar e pediremos comida. Daí conversaremos a noite toda, se quiser. Tenho uma ideia de como frustrar Karmela sem seu marido perceber o que está acontecendo.

— Não sei se isso é possível.

Fran sorriu.

— Você ainda não ouviu meu plano. — Ela se levantou da mesa. — Vou falar com o gerente e conseguir um quarto para nós. Quando a chuva parar, vamos buscar a bagagem no carro.

Fran apostava que o guarda-costas de Kellie já tinha avisado Leandros que a esposa estava sã e salva. Ela esperava que ele ligasse para a amiga logo. Os problemas no casamento estavam acabando com Kellie. Ninguém conhecia melhor aquela dor do que Fran.

Nik Angelis acabara de entrar em sua cobertura em Atenas quando um de seus irmãos telefonou para ele.

— Sandro? E aí? — Eles tinham passado a maior parte do dia em uma extensa

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reunião na Corporação Angelis. Nik assumira recentemente o posto do pai, que se aposentara.

— Ligue a TV. Todos os canais estão falando do tornado.

— Eu estive nele, lembra-se? — Só se falava nisso na sede da Angelis. Depois de ver a família partir para Tessalônica naquela manhã no jato da empresa, Nik foi para a sessão de envio de cargas internacionais. Enquanto conversava de negócios com um funcionário, um funil desceu das nuvens sobre Atenas, bem em cheio sobre a central de cargas.

Ele se dissipou depois de alguns minutos, mas nesse meio-tempo causou muita destruição em seu caminho. Felizmente ninguém se feriu. Antes de instruir o motorista da limusine para que o levasse para o escritório, ele ligou para o piloto. O alívio tomou conta dele ao descobrir que já tinham deixado a área de turbulência por causa dos ventos severos antes de o tornado começar.

— Não, não. Não esse — falou Sandro, ansioso. — Estou falando do tornado que atingiu Tessalônica há alguns minutos.

Outro?

— Vamos rezar para que Melina e Stavros estejam bem.

O coração de Nik já tivera trabalho naquela manhã e quase falhou nesse instante.

— Espere. — Ele ligou a TV.

E então outro tonado atingiu parte da Riviera Grega às 3h13 dessa tarde. Foi constatado que se tratava de um F-4, e já despareceu, mas ainda não sabemos a verdadeira extensão dos danos. Há rumores de que algumas villas e suítes do famoso resort Perséfone da Corporação Petralia foram destruídas. ”

Nik sentiu como se uma granada tivesse explodido dentro de si. O Perséfone era onde Melina, Stavros e a filhinha bebê deles iriam ficar nas duas primeiras noites das férias. Leandros Petralia, grande amigo de Nik nos negócios e socialmente, era o dono do resort.

— Eu tentei ligar para o celular dela, mas está sem sinal — disse Franco, preocupado.

A ideia congelou o sangue nas veias de Nik.

“Até agora, 20 pessoas estão desaparecidas”. Repetimos, isso não significa que sejam casos de fatalidade. A ajuda está chegando de todos os lugares. Pedimos que as pessoas fiquem longe da área afetada e deixem a polícia, os bombeiros e o resgate trabalharem.

Os celulares não estão funcionando. Colocamos uma série de linhas de ajuda na tela caso vocês queiram informar ou obter informações sobre algum ente querido.”

O mais puro terror acometeu o coração dele.

— Acho que Cosimo já chegou do escritório?

— Não sei, mas vou tentar falar com ele.

— Diga para ele nos encontrar no aeroporto, Sandro. — Nik queria os dois irmãos junto dele. — Vamos para Tessalônica.

— Estou a caminho!

Nik desligou e depois pediu que o motorista trouxesse o carro. Enquanto se encaminhava para a porta, ligou para o piloto e pediu que ele se preparasse para outro

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voo para Tessalônica, Em pouco menos de uma hora Nik e os irmãos chegariam. Eles precisariam de um carro.

A caminho do aeroporto, ligou para os pais na villa da família em Míconos. Eles haviam acabado de saber das notícias e estavam em total agonia.

— Nossa Melina preciosa, nossa Demitra. — A mãe dele soluçou as palavras.

— A suíte delas pode não ter sido afetada, Mana. Nesse caso, Stavros estará protegendo-as. Precisamos ter fé. Sandro e Cosimo vão comigo de avião para lá agora. Ligue para uma dessas linhas de ajuda e veja o que consegue descobrir! Ligue quando souber de alguma coisa. Vamos rezar para que os serviços telefônicos retornem logo. Eu ligarei quando tiver notícias.

Uma batida à porta do hotel acordou as meninas na manhã seguinte. Com a TV fora do ar, elas conversaram por horas sobre Karmela. Antes de adormecerem, Fran certificou-se de que a amiga estivesse com um plano firme em mente para depois que as férias terminassem.

Kellie levantou a cabeça e olhou o relógio.

— São dez e dez!

— Talvez seja uma empregada, esperando para arrumar nosso quarto. — Fran saiu da cama, de pijamas. — Quem é? — perguntou pela porta.

— Yannis.

— Vou falar com ele — murmurou Kellie. Ela saiu da cama e conversou em grego com o guarda-costas de cabelos negros no corredor do hotel. Depois, Kellie deu um grunhido e fechou a porta. O rosto dela estava lívido.

Fran achou que a amiga ia desmaiar e a segurou pelos ombros.

— O que foi? Venha se sentar e me conte.

Mas Kellie apenas ficou ali parada, com as lágrimas descendo pelas bochechas.

— Um tornado atingiu a região a 20 quilômetros daqui ao norte, na noite passada, e matou nove pessoas. Entre eles havia cinco hóspedes do P-Perséfone.

Elas se encararam, incrédulas.

— Não posso acreditar — sussurrou Fran. — Se não tivéssemos parado aqui... — Ela começou a tremer.

— Yannis disse que Leandros ouviu a notícia na televisão, mas ele estava a quase 16 mil quilômetros, em Rhodes. Ele voou imediatamente para cá, mas mesmo com o próprio jato e a escolta da polícia, só conseguiu entrar no local no meio da noite. Três das 12 suítes individuais foram destruídas. Não sobrou nada delas.

Fran estava embasbacada.

— Leandros contou a Yannis que o lugar está um pesadelo e que ainda não há serviços de telefone, internet ou televisão na área. Ele contou com a ajuda da polícia para me avisar o que aconteceu. E pediu que ficássemos aqui até ele se juntar a nós. Yannis disse que não vai demorar. — Os dentes de Kellie tiritavam.

— Venha. Precisamos nos aprontar e descer. Conhecendo seu marido, ele deve estar absolutamente devastado e precisando mais do que nunca de sua ajuda. — Aquele

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era o momento para Kellie se aproximar de Leandros e colocar em prática o plano que elas bolaram.

Elas se aprontaram rapidamente. Fran vestiu uma calça branca de linho e uma blusinha de estampa verde e branca. Prendeu os cabelos loiros cor de mel com um lenço de chiffon branco. Depois de vestir um par de sandálias brancas, anunciou que estava pronta. Nada parecia real enquanto elas levavam as malas para o saguão a fim de esperar por Leandros.

Para a surpresa de Fran, as portas principais estavam abertas para que os hóspedes tomassem café nas mesas em frente ao hotel. Uma brisa agradável as saudou, e o sol brilhava em um céu anil. Nas ruas, a vida continuava como sempre. Ninguém diria que um desastre natural acontecera a 20 quilômetros dali.

Um garçom aproximou-se dela.

— As mesas da frente estão cheias. Nós podemos servi-las no pátio de trás.

Fran agradeceu e puxou Kellie de lado.

— Yannis está no carro dele, ao lado do nosso. Vamos guardar as malas e avisar que estaremos no pátio de trás. Quero aproveitar o sol antes de Leandros chegar. Tudo bem?

— Acho que sim — respondeu a amiga, sem ânimo.

Elas foram até o carro e colocaram as bagagens no porta-malas.

— Este hotel parece ser bem popular. Fale com Yannis enquanto eu pego uma mesa para nós.

— Certo.

Fran seguiu o caminho de pedras até a parte de trás do hotel, onde cadeiras e mesas azuis estavam decoradas com alvas toalhas brancas e azuis.

Buganvílias despejavam-se fartamente sobre a porta dos fundos e, mais adiante, havia um jardim. Uma pena o vento ter desmantelado a maioria das flores. Havia apenas algumas rosas de pé.

Ela sentou-se ao sol enquanto esperava, pensando que estava sozinha. Porém, ouviu um som estranho, como um gemido. Surpresa, olhou ao redor e depois para cima. Talvez o som estivesse vindo de uma das janelas abertas.

Fran ouviu o choro fraco novamente. Agora parecia vir da área do jardim. Talvez fosse um gatinho que fora ferido durante a tempestade, coitadinho. Ela foi até lá investigar.

Quando olhou em um canto, um grito de espanto escapou por seus lábios. Ali, de bruços em meio aos arbustos, estava um bebê de cabelos pretos, todo sujo e com cortes da cabeça aos pés...

Fran não podia acreditar. A criança vestia somente uma camisetinha rosa. O bebê de pele morena-clara não tinha mais do que sete meses. De onde viera? Fran se perguntou há quanto tempo a criança estava naquelas condições.

Tentando ser o mais gentil possível, Fran ergueu o corpinho frágil — e ficou petrificada, pois a criança devia estar com hipotermia. Os pequenos olhinhos estavam fechados.

— Fran? — chamou Kellie, correndo até ela. — O que foi?

Fran se voltou para a amiga com os olhos cheios de lágrimas.

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— Olhe, encontrei esse bebê no jardim.

— Isso eu percebi, mas não acredito no que estou vendo.

— Eu sei. Rápido, pegue um cobertor e vamos para o hospital. Tenho medo de que ele esteja morrendo.

Kellie girou os olhos antes de correr para o hotel, gritando por socorro em grego. Funcionários vieram correndo em segundos, e um deles trouxe um cobertor. Fran envolveu o bebê com cuidado e foi para a frente do hotel, onde Kellie falava com Yannis.

— Ele vai nos levar ao hospital.

O guarda-costas ajudou Fran a entrar com a criança no banco de trás. Ela achou que ele estava mais branco que Kellie no banco da frente. Ela olhou para Fran.

— O que você acha que aconteceu?

— Quem vai saber? Talvez a mãe estivesse na rua no instante em que foi pega pela chuva.

— Mas ela está vestindo só uma camiseta rasgada.

— Eu sei, nada faz sentido.

— Acha que ela pode ter ficado a noite toda lá fora?

— Não sei — respondeu Fran com a voz trêmula. — Mas qual seria a outra explicação? O bebê está com cortes pelo corpo todo.

— Ainda estou em choque. Você não acha que a mãe pode estar caída, inconsciente, em algum lugar do hotel?

— É uma possibilidade — murmurou Fran. — Nós sabemos do que um tornado é capaz. Aquele em Dallas jogou caminhões pelos ares como se fossem de brinquedo. Mas nunca tinha ouvido falar de um tornado na Grécia.

— Acontece de tempos em tempos. Leandros me disse que eles geralmente acontecem na costa.

O bebê estava tão imóvel que era como segurar uma boneca.

— Diga para Yannis ir mais rápido, Kellie. Ela não está fazendo mais nenhum barulho. A polícia precisa ser notificada para começar a procurar pelos pais dela.

Assim que entraram na emergência, tudo aconteceu muito rápido. O bebê foi levado pelas enfermeiras. Fran queria acompanhar a criança, mas foi levada a um balcão para preencher alguns formulários.

O homem da recepção informou que ninguém entrara em contato com o hospital procurando por um bebê e que nenhuma mãe ou pai chegara ao hospital durante a tempestade. Só um homem cujo carro derrapara na estrada aparecera, precisando de alguns pontos.

Ao fim das perguntas, o recepcionista informou:

— Um membro da nossa equipe já avisou a polícia. Um policial deve chegar em uma hora para recolher o depoimento de vocês. Por favor, aguardem na sala de espera da emergência ou na lanchonete no fim do corredor.

Ao saírem, Kellie tocou o braço de Fran.

— Acho melhor comermos alguma coisa agora.

— Concordo.

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Depois de um breve café da manhã, elas voltaram para a emergência.

— Se o bebê sobreviver, será graças a você e seu pensamento rápido. Se você tivesse chegado um pouco mais tarde no pátio, talvez ele não tivesse mais forças para chorar.

Lágrimas quentes escorreram pela bochecha de Fran.

— Ela tem de sobreviver, Kellie, senão a vida não terá sentido.

— Eu sei. Pensei a mesma coisa. — Kellie vinha tentando engravidar, e pelo acaso do destino Fran não podia conceber. Que belo par elas formavam!

— Eu queria que Leandros estivesse aqui. Depois de ver esse bebê, estou preocupada com o que ele precisou lidar. Vidas foram tomadas pelo tornado.

— Ainda não consigo acreditar que isso aconteceu. Quando eu a vi nos arbustos, achei que estava alucinando.

Então, dois policiais chegaram para falar com elas. Ainda não havia notícias dos pais. Depois que eles se foram, Fran levantou-se.

— Não consigo ficar parada. Vamos para a emergência. Talvez alguém possa nos dar alguma notícia da criança.

Kellie também se levantou.

— Enquanto você faz isso, vou falar com Yannis. Talvez ele tenha falado com Leandros.

Rapidamente, Fran passou pelas portas da emergência e aproximou-se da recepção.

— Você pode me dizer se há alguma notícia da criança que trouxemos agora há pouco?

— Pergunte ao dr. Xanthis. É aquele ali.

Fran virou-se para o médico de meia-idade que entrara na emergência.

— Com licença, sou a sra. Myers. Acredito que o senhor possa me contar como está a criança que minha amiga e eu trouxemos ao hospital. Ela vai sobreviver?

— Só saberemos daqui a algumas horas — respondeu ele com um forte sotaque grego.

— Posso vê-la?

Ele balançou a cabeça.

— Só familiares são permitidos na UTI infantil.

— Mas ninguém localizou a família dela ainda. Ela não tem ninguém. Eu a encontrei nos arbustos do jardim de um hotel. Posso vê-la só um pouquinho, enquanto os pais dela não são localizados?

O homem a estudou com seu olhar afiado.

— Por que você quer fazer isso?

— Por favor? — pediu ela com a voz trêmula.

— Ela não é da sua família.

Fran mordeu o lábio.

— Ela é um bebê. Eu... Sinto que ela precisa de alguém.

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Rebecca Winters - [Amores Perfeitos] - Luz De Esperança (Special 95.2)

De repente, um sorriso surgiu do canto da boca do médico.

— Venha, vou levar você até ela.

— Só um instante. — Ela voltou-se para o recepcionista. — Se minha amiga vier me procurar, diga que estou com o bebê e que volto logo.

O médico a levou até o segundo andar, onde a apresentou a uma enfermeira.

— Eu dei permissão para Kyria Myers ficar com o bebê até os pais serem localizados.

— Por aqui. — A outra indicou enquanto falavam.

— Muito obrigada, sr. Xanthis.

Ele ergueu as sobrancelhas.

— Obrigado por estar disposta a ajudar.

— O prazer é meu, acredite.

CAPÍTULO 2

Fran seguiu a enfermeira até uma antessala para lavar as mãos. Ela não era estranha ao ambiente, pois trabalhara em um hospital durante a faculdade fazendo acompanhamento de pacientes que acabavam de receber alta.

Depois de vestir uma máscara, as duas foram para a UTI neonatal. A criança que ela encontrara no jardim estava na terceira incubadora, ligada a um soro, a tubos de oxigênio e um a monitor cardiopulmonar. Fran precisou conter um grito de dor. Pelo que pôde ver, os cortes por todo o corpinho dela, agora sem a sujeira, não eram profundos.

A enfermeira puxou uma cadeira para que Fran se sentasse ao lado da incubadora.

— Todos esperam que ela acorde logo. Pode tocá-la e falar com ela. Eu já volto.

Finalmente sozinha com a criança, Fran estudou seus lindos traços, os cílios negros, os lábios esculpidos. Ela era perfeita e aparentemente saudável antes do terrível ocorrido.

Com aquela tez tão peculiar, ela parecia um querubim pintado por Raphael. Mas os olhos daquele anjo estavam fechados, sem movimento.

Ela colocou a mão pela abertura e tocou o braço dela.

— De onde você veio? Você caiu do céu por acidente? Volte à vida, por favor, querida. Abra os olhos. Quero ver a cor deles.

Não houve resposta ao coração partido de Fran. Ela acariciou a pele da criança com os dedos, com cuidado para não tocar em nenhum corte.

— Sei que você pertence a outras pessoas, mas eu adoraria ter um bebê como você. Você não tem ideia de como é maravilhosa. — Lágrimas desciam-lhe pelas

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bochechas. — Você não pode morrer, não pode... — Os ombros de Fran tremeram. Não ia fazer bem à criança ouvi-la chorar. Com toda a sua força de vontade, Fran então se recompôs e cantou-lhe uma canção de ninar.

A enfermeira então voltou.

— Tenha certeza bem que sua presença está fazendo bem a ela, mas precisam de você na recepção. Pode voltar quando quiser.

Fran ergueu a cabeça. Ela estava tão concentrada que não percebera que estava ali havia horas.

— Obrigada.

Com relutância, retirou a mão e se levantou.

— Eu vou voltar, querida.

Ao chegar à recepção, encontrou Kellie conversando em particular com Leandros. O marido de sua amiga parecia ter envelhecido muito desde a última vez que ela o vira, na Páscoa.

No instante em que Kellie a viu, pulou do sofá e correu até ela.

— O bebê vai sobreviver? — perguntou Kellie, ansiosa.

— Não sei. Ela está inconsciente na incubadora, mas a respiração e os batimentos cardíacos estão estáveis. A polícia já encontrou os pais dela?

— Nada ainda.

Leandros se aproximou.

— Fran... — sussurrou ele com a voz trêmula, demonstrando a profundidade de sua dor. Eles se abraçaram longamente.

— Bom te ver de novo, Leandros, mas gostaria que as circunstâncias fossem diferentes. Sinto muito. Tenho certeza de que você se sente como se tivesse sobrevivido a uma guerra.

Ele assentiu, olhando com pesar para a esposa. Algo dizia a Fran que a dor que ela via não era apenas por causa da tragédia. Ela podia sentir a tensão entre Kellie e o marido. A amiga não estava exagerando. O relacionamento deles parecia estar com problemas maiores do que Fran imaginara.

— Cinco hóspedes do hotel morreram — murmurou ele morosamente. Podemos agradecer a Deus porque o casal em lua de mel não estava na suíte na hora, do contrário contaríamos mais duas vítimas. Infelizmente, as outras duas estavam ocupadas. Sr. Pappas, ex-presidente do banco Hellenic, e a esposa, celebrando o sexagésimo aniversário de casamento.

— Que terrível! E o outro casal? — perguntou Fran ao perceber a hesitação dele.

Leandros parecia angustiado.

— A irmã do meu amigo Nikolos Angelis e o marido haviam chegado há apenas algumas horas com um neném.

— Um neném? — exclamou ela.

— Sim, mas, quando os corpos foram encontrados, não havia sinal da criança. A polícia está procurando por toda parte. Vocês podem imaginar o desespero da família Angelis. Eles estão em estado de choque.

— Nik é o brilhante irmão mais novo dos Angelis — informou Kellie. — É o

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presidente de uma megacorporação multimilionária, fundada pela família há 30 anos. Ele estava fora do país quando Leandros e eu nos casamos.

— Lembro-me de ter visto algumas fotos dele em revistas quando eu estava no avião, vindo para cá. — Lindo foi a única palavra que lhe veio em mente.

— Nós colocamos dinheiro para que voluntários vasculhassem a área, mas até agora, nada — contou Leandros. Os pais dele estão devastados. Eles perderam a nora e a única neta.

Neta?

— Quantos anos a criança tem?

— Sete meses.

— Qual a cor do cabelo dela?

— Preto.

Um grito escapou dos lábios dela.

Talvez ela não tivesse caído do céu.

Seria possível que tivesse sido levada pelo vento, indo parar no jardim do hotel? Coisas estranhas aconteciam durante tornados.

— Kellie?

— Sei o que você está pensando, Fran — murmurou Kellie. — Também estou. — As duas se encararam. — Lembra-se da garotinha que, há alguns anos, foi encontrada em um campo a 16 quilômetros de onde um tornado passou e matou toda a família dela? Nós vimos a notícia e não acreditamos.

— Sim!

— Isso explicaria muita coisa.

As sobrancelhas negras de Leandros se juntaram.

— Do que vocês estão falando?

— Rápido, Kellie. Enquanto você conta a ele o que aconteceu, eu vou lá em cima ver a criança. Talvez ela tenha acordado. Acho que pode ser a filha desaparecida de que Leandros falou! Tem de ser! Não há outra explicação. Ela precisa viver.

Aquelas palavras se transformaram no mantra de Fran.

A polícia montara um esquema para os voluntários seguirem. Nik e os irmãos receberam a incumbência de cobrir uma área no pinheiral atrás do resort. Eles procuraram por horas em busca de qualquer sinal de Demi.

Destroços estavam espalhados como confete, mas ele não viu nenhum pertence de sua família. O tornado destruíra tudo em seu caminho, incluindo vidas. A dor o atingia de novo e de novo.

Onde diabos estava o bebê? Como eles poderiam ir embora sem o corpo? Como encarariam os pais dela?

Cada irmão dele tinha dois filhos, todos meninos. A família deles e a de Stavros foram para Míconos para ficarem com os pais de Nik. Ele sabia que Sandro e Cosimo estavam agradecendo aos céus por aquilo não ter acontecido com os próprios filhos, mas

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no momento seus corações estavam tão pesados que não conseguiam falar.

Demi era a única menininha da família, tão linda — como a mãe. Por ainda não ser casado, Nik tinha um apreço muito grande pela sobrinha. Ela o encantara no instante em que nascera.

O filho de Melina era o tipo de criança que ele gostaria de ter se acabasse se casando. Mas isso significava ter de encontrar uma mulher que conseguisse lidar com o que ele tinha para contar antes que se casassem.

Até o momento ele não a encontrara e era obrigado a lidar com o que a opinião pública pensava dele. No último ano, vários tabloides estamparam capas com fotos dele e a manchete “O mais novo astro grego dos negócios — o solteiro mais cobiçado da década”. Ele estava enojado pela publicidade indesejada. Mas a tragédia fazia os problemas pessoais dele parecerem minúsculos.

Duas semanas atrás comprara um brinquedo para Demi, no qual se coloca uma bolinha em um tubo e ela sai pelo outro lado. Ela o amava e ficava esperando a bola sair do outro lado para depois engatinhar de barriga atrás dela. Ela conseguia ficar sentada sozinha a maior parte do tempo e colocava na boca tudo que conseguia pegar. O sorriso da sobrinha o deixava feliz. Nunca poder vê-la de novo... Ele não conseguiria suportar. Nenhum membro da família conseguiria.

Lágrimas quentes queimaram os olhos dele ao pensar que a criança de sete meses e os pais haviam partido. Era um golpe do qual ele não tinha certeza se conseguiria se recuperar. Melina e ele tinham uma ligação especial. Ela lhe dera apoio no momento mais sombrio de sua vida. Uma careta tomou sua face diante da constatação de que não estava conseguindo nem achar a filha dela. Ele era um completo inútil.

Sandro segurou o braço dele.

— Acabamos essa área.

— Vamos para a outra.

— Alguém já a vasculhou — murmurou Cosimo.

— Eu não ligo. — exclamou ele. — Vamos olhá-la de novo, mais detalhadamente desta vez. Vamos examinar cada árvore.

Os irmãos o seguiram. Cinco minutos depois, o telefone dele tocou.

— Petralia falando.

Todos olharam para ele com a esperança de a criança tivesse sido encontrada.

— Leandros? Alguma notícia? — perguntou Nick ao atender.

— Talvez. Se você acreditar em milagres.

— O que você quer dizer?

— Estou com minha esposa no hospital da villa de Leminos. Fica a 30 quilômetros ao sul. Venha rápido. Esta manhã a melhor amiga dela, sra. Myers, dos Estados Unidos, que vai passar algumas semanas conosco, encontrou um bebê vivo no jardim do hotel.

Nik segurou o celular com mais força.

— Eu ouvi direito?

— Sim. Ela estava no meio de alguns arbustos, acredite se quiser. Ontem a tempestade piorou quando elas estavam a caminho do Perséfone, e resolveram pernoitar em Leminos.

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— Quer dizer que sua esposa e a amiga...

— Poderiam estar na lista de mortos. — A emoção na voz de Leandros não precisava de tradução. — Fran foi para o pátio pegar uma mesa para elas tomarem café e ouviu um choro fraquinho.

— O quê?

— É uma história incrível. A criança está com cortes e ferimentos e vestia apenas uma camisetinha rasgada. Elas a trouxeram para a UTI. Por enquanto, ninguém veio reclamá-la.

— Você a viu?

— Sim. Ela tem cerca de sete meses e o tom de pele da sua família. Ela está viva, mas não está acordada. Essas são as boas notícias por enquanto, segundo o médico; eles acharam que ela não ia sobreviver. Venha o mais rápido possível.

Ele olhou para os irmãos.

— Estamos a caminho. Minha gratidão não tem tamanho.

— Ainda não me agradeça. Essa criança pode não ser sua sobrinha.

— Preciso acreditar que ela está viva!

Nik desligou, e ele e os irmãos começaram a correr pela floresta. No caminho contou-lhes a história fantástica. Ao chegarem ao carro alugado, eles partiram para Leminos, com Nik ultrapassando todos os limites de velocidade.

Ao chegarem ao hospital, Leandros e a esposa os aguardavam na entrada da emergência. Kellie estava em prantos pelo que acontecera com a família de Nik. Ele ficou comovido pela compaixão dela. Ela apresentou-lhes o médico responsável pelo bebê.

— Vamos ver se ela é da família de vocês — disse o médico a caminho da UTI. — Fico feliz em informar que há uma hora o bebê abriu os olhos pela primeira vez e olhou ao redor. Acho que isso tem algo que ver com Kyria Myers, que ficou cantando e fazendo carinho na criança. Foi ela que ouviu o bebê chorar antes de perder a consciência.

Depois de lavarem as mãos, a enfermeira abriu a porta da UTI e gesticulou para que a seguissem até a incubadora do canto. Uma mulher de avental e máscara, como eles, estava sentada ao lado da incubadora com a mão acalentadora sobre o bebê, dentro da incubadora. De costas para a entrada, ele só conseguiu ter um vislumbre dos cabelos cor de mel amarrados por um lenço. Ela cantava para a criança com o tipo de amor que uma mãe teria pelo próprio filho.

Tocado pela devoção a uma criança que ela nem ao menos conhecia, Nik sentiu uma sensação sufocante no peito ao se aproximar para olhar o bebê.

— Demi...

Os irmãos se juntaram ao redor, igualmente extáticos por descobrirem a sobrinha ligada a aparelhos, contorcendo-se como se não gostasse de estar ali. Ela ficava virando a cabeça para os lados. Sons de felicidade e lágrimas eram ouvidos pela UTI, junto com o nome dela. Mas Demi deu uma olhadinha neles e abriu um berreiro. Ela se assustara com aquelas máscaras.

A mulher que a acariciava falou mansinho, acalmando-a. Nik mal podia acreditar. As palavras eram ditas em inglês, mas o bebê de Melina respondia ao tom de afeto contido nelas.

Depois de um minuto, a mulher tirou a mão e se levantou. Nik notou ela era de

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estatura média. Ao virar-se para eles, ele descobriu-se encarando olhos azul-violeta que só vira nas flores crescendo em certos lugares de Míconos. E estavam banhados de lágrimas.

— Sra. Myers? Sou Nik Angelis. — disse ele. — Estes são meus irmãos, Sandro e Cosimo. Acredito que seja você quem precisamos agradecer por encontrar nossa sobrinha antes que fosse tarde demais.

— Aconteceu de eu ser a primeira hóspede a ir para o pátio de trás do hotel — foi a resposta abafada pela máscara. — Quando eu a ouvi chorando, achei que fosse um gatinho ferido pela tempestade. Quase desmaiei ao vê-la no meio dos arbustos. Qual o nome dela?

— Demitra, mas nós a chamamos de Demi.

— Que nome lindo. — Ele a ouviu respirar fundo. — Não posso expressar minha dor pela perda da sua irmã e do marido dela, sr. Angelis. Mas fico agradecida por vocês terem encontrado Demi. Ela é a criança mais preciosa que já vi — disse ela com a voz trêmula. Nik concordou com ela. — Se vocês pudessem tirar as máscaras, acho que isso faria diferença para ela.

— Demi não parece ter problemas com você vestindo uma.

Ele percebeu nitidamente que a mulher corava por detrás da máscara.

— É por que estou conversando com ela desde que a trouxemos para cá. Não suportei a ideia de não haver ninguém aqui para lhe dar amor. Bebês precisam de suas mães. Essa experiência toda deve ter sido horrível para ela.

Nem todas as mulheres possuem um instinto maternal tão forte como o de Melina, mas, sendo uma mulher casada, ele presumira que a sra. Myers tivesse filhos.

— Leandros me disse que você estava de férias. Abrir mão de tudo para cuidar de Demi é um ato de generosidade e altruísmo que nós agradecemos infinitamente. Nossos pais não viveriam sem ela.

— É verdade — concordaram os irmãos antes de agradecerem.

Nik se aproximou.

— Nossa família tem uma dívida com você que nunca conseguiremos pagar.

Ela balançou a cabeça.

— Que outro pagamento alguém iria querer além de ver essa doce menininha junto à família novamente? — Os olhos dela ainda tinham um brilho líquido enquanto o estudavam. — Qualquer um pode ver que ela é uma Angelis da cabeça aos pés. Claro que não sei dos narizes e bocas. — A voz rouca perturbou os sentidos dele de uma forma que o surpreendeu.

Apesar das últimas vinte e quatro horas, o comentário dela fez um canto da boca de Nik se curvar. Até entrar na UTI e ver a maneira adorável como ela tratava a filha de Melina, ele achava que jamais teria outra razão para sorrir.

Ela deu um passo para trás.

— Bem... Vou deixar os senhores a sós com Demi. Ao falarem com ela, as vozes de vocês serão abençoadamente familiares e vão confortá-la.

Nik não sabia ao certo se Demi iria começar a chorar no segundo em que a sra. Myers saísse da sala.

— Aonde você vai?

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— Ao saguão, me encontrar com Kellie.

— Não saia do hospital ainda. Precisamos conversar.

— Estou aqui como convidada e não sei quais são os planos deles.

Tomando uma daquelas decisões por puro instinto caso ela fosse embora, ele disse:

— Vou lá embaixo com você. Preciso ligar para meus pais e dar a notícia que lhes darão um novo fôlego de vida. E o mais importante, eles vão querer agradecer. — Ele se virou e contou aos irmãos seus planos antes de ir para a antessala com ela.

Ali, os dois retiraram as máscaras e os aventais. Embora ela fosse casada, ele era o tipo de homem que gostava de olhar para uma mulher bonita e estava curioso para saber como ela era sem a máscara.

Ele descobriu uma figura esguia, com uma estrutura óssea clássica e um rosto mais do que à altura de seus olhos. Resumindo: ela o deixou sem ar.

— Qual o veredito? — perguntou ele depois que ela o estudou.

Novamente ele viu-lhe as bochechas corarem, mas ela não desviou o olhar.

— Por um acaso eu vi uma foto sua na capa de uma revista quando estava no avião. — Nik cerrou os dentes à menção daquilo. — Se quer minha opinião honesta, fico feliz por sua sobrinha ter herdado os traços femininos da família.

Nik esperava que ela dissesse algo a respeito da reputação dele. O comentário surpreendente melhorou seu ânimo.

— Sua irmã deve ter sido muito bonita para ter tido uma filha como Demi.

Nik pegou a carteira e lhe mostrou uma foto dela.

— Foi tirada no 30° aniversário de Melina, dois meses atrás. Stavros e ela tentaram ter um filho por quatro anos antes de Demi nascer.

Kellie precisava ouvir aquilo. Nem todas as mulheres ficavam grávidas de acordo com as próprias vontades.

Fran estudou a foto por um instante.

— Que família adorável. — A voz dela tremia. — Vejo muito da sua irmã nela.

A garganta dele doía de tanta emoção bruta.

— Sim. Ela viverá através de Demi. — Ele abriu a outra porta. — Vamos lá para baixo?

— Vou com vocês — disse o dr. Xanthis. — Precisaremos de uma confirmação do seu parentesco com o bebê através de um teste de DNA.

— Claro. Vou pedir para que o hospital em Atenas envie minhas informações para o teste.

— Excelente. Vou pedir para que o laboratório agilize o processo.

Fran imaginou que circunstâncias teriam sido graves a ponto de Nik precisar ir ao um hospital e ceder uma amostra de DNA, mas aquilo não era de sua conta. Ela desejou não prestar tanta atenção nele.

Embora Fran sempre tivesse achado Leandros um verdadeiro pedaço de mau caminho, Nikolos Angelis era a classe em pessoa. Apesar dos traços de dor e cansaço em seu semblante notoriamente grego, ele era de longe o homem mais atraente que ela

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já vira na vida. As fotos na mídia não lhe faziam justiça.

Além da masculinidade, ele tinha a aura de um homem em controle da própria vida — alguém que conseguiria alcançar o que quisesse. A esperança de Kellie de que Fran encontrasse um lindo nobre na viagem e se apaixonasse instantaneamente ainda era risível, mas ela precisava admitir que Nik Angelis era um homem maravilhoso de se olhar.

Ele devia ter 1,85m de puro músculo naquele corpo esbelto. Ela não ficou surpresa em perceber que ele ainda usava uma austera calça social e uma camisa azul amarrotada com as mangas enroladas até o cotovelo. Os irmãos também chegaram com a roupa que estavam quando souberam do tornado. Naturalmente deixaram tudo para viajar até Tessalônica em busca da criança. Nenhum deles havia dormido.

Apesar da barba por fazer, a virilidade masculina dele era ainda mais potente. Seus cabelos negros e ondulados tinham um brilho tão saudável que dava vontade de passar a mão. Antes que a porta se abrisse, ela deu-lhe outra olhada furtiva.

Sobrancelhas tão negras quanto os cabelos emolduravam olhos escuros como a noite, com cílios indecentemente longos e pretos como os de Demi. Ela precisou se forçar a parar de olhar. Até então, nenhum homem com o qual trabalhara tivera algum tipo de impacto nela.

Notá-lo dessa forma, quando ele acabara de ser pego pela morte da irmã e do cunhado, deixou-a com vergonha. Fran saiu do elevador na frente dele. Mas quando ela estava prestes a virar no corredor para a recepção, Nik segurou-a pelo cotovelo. Uma corrente acalentadora atravessou o corpo dela, por vontade própria.

— Vamos lá fora comigo, onde meu celular pega melhor. Meus pais vão querer fazer algumas perguntas a você.

— Tudo bem.

Eles passaram pelas portas deslizantes, direto para o sol do fim de tarde. Já eram quinze para as cinco. Ela ouviu enquanto ele se comunicava com os pais em um grego ininteligível. Durante os silêncios, ela tentava captar alguma coisa. Seu coração chegava a todos eles.

Depois de alguns segundos o olhar penetrante de Nik pousou nela. Ele lhe passou o telefone:

— Eles falam inglês e estão ansiosos para ouvir o que você tem a dizer.

Fran pegou o aparelho e disse oi.

— Estamos muito felizes em ouvir notícias da nossa Demitra — falou primeiro a mãe dele com um forte sotaque grego. Com uma voz cheia de lágrimas, ela continuou: — Nosso filho nos disse que você ficou esse tempo todo ao lado dela no hospital.

— Sim. Ela é a coisinha mais fofa que eu já vi. Um querubim. E, agora que está acordada, ela me parece bem.

— Ah... É a notícia que esperávamos ouvir — disse o pai de Nikolos. — Nós queremos te conhecer. Eu falei para ele trazer você e os Petralia para Míconos quando Demi for liberada. Depois do funeral, você vai ser nossa convidada pelo tempo que quiser. Ele me contou que você acabou de sair de férias. Gostaríamos que você passasse esse tempo conosco. Graças a você, um milagre aconteceu.

— Outra pessoa a teria encontrado, sr. Angelis, mas muito obrigada. Vou passar para Nik. — Ela entregou o celular a ele, sussurrando: — Vou para a recepção.

— Já vou para lá. — A voz profunda dele ressoou pelo corpo dela.

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Ela encontrou Kellie e Leandros sentados em um sofá. Não era necessário saber ler mentes para perceber que eles estavam tendo uma conversa intensa, que não estava indo muito bem. A julgar pela tensão do corpo de Kellie e o semblante fechado de Leandros, ambos estavam em agonia. Porém, ao verem Fran, pararam de falar e se levantaram.

Kellie foi até a amiga, como se estivesse feliz pela interrupção.

— O dr. Xanthis veio falar conosco e disse que liberará a criança amanhã, assim que o teste de DNA estiver pronto. Estava falando para Leandros que, uma vez que ela está junto da família, você e eu podemos continuar com nossas férias, enquanto Leandros volta para Rhodes.

Obviamente, Kellie queria que Fran aceitasse os desejos dela independentemente do que Leandros tinha a dizer. O comentário o fez ranger os dentes, deixando Fran desconfortável.

— Meu supervisor de projetos pode terminar o trabalho aqui. Há um helicóptero esperando nós três para nos levar de volta a Atenas. Um dos meus funcionários levará o carro.

Kellie jogou os cabelos loiros.

— Não seja tolo, Leandros. Não quero interferir em seu trabalho. Além disso, Fran e eu queremos conhecer lugares turísticos que ainda não vimos.

— Quais, exatamente? — exigiu saber Leandros. Fran nunca o ouvira tão tenso.

— Nós vamos fazer uma caminhada, mas ainda não decidimos todos os detalhes. Após o jantar, vamos planejar nosso próximo destino.

E, quando Fran achava que não conseguia mais aguentar a tensão, Nik chegou e foi até eles.

— Você contou para eles sobre o convite de meus pais?

As meninas trocaram um olhar antes de Fran dizer:

— Ainda não deu tempo.

Então Nik convidou-os todos a voar para Míconos na manhã seguinte e passar alguns dias com a família dele.

— Meus pais insistem.

— Estava planejando fazer uma visita pessoal para eles, Nik. Ficaremos honrados em aceitar o convite — disse Leandros antes que Kellie pudesse dizer qualquer coisa. — Nessas circunstâncias, nós vamos no carro de Kellie até Atenas. Amanhã voaremos para sua villa.

Essa não! Isso significava muitas horas para eles conversarem, mas Fran decidiu que isso era uma coisa boa. Kellie poderia botar em prática o plano que elas haviam bolado na noite passada.

— Excelente. — Nik lançou um olhar para Fran. — Sei que você está aqui de férias, mas, se não for muito inconveniente, se importaria de passar a noite aqui comigo? Com nós dois fazendo turnos, vamos conseguir confortar Demi enquanto meus irmãos aprontam o envio dos corpos de Melina e Stavros no jatinho da empresa. Gostaria muito também de sua ajuda com Demi no helicóptero para Tessalônica, de manhã. De lá, voaremos para Míconos.

O coração de Fran disparou. Nik queria honestamente a ajuda dela com a

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sobrinha? Não havia como saber que ela não estava pronta para dizer adeus para aquela adorável garotinha.

Tentando parecer sob controle, Fran disse:

— Se você acha que é necessário, eu adoraria ajudar. — Ela olhou para Kellie, sabendo que a amiga não queria ser deixada sozinha com o marido. A situação deles era precária. — O que você acha, Kellie? Tudo bem para você?

Fran sabia que Kellie estava dividida. Ela não podia dizer não para Nik, que já perdera parte da família — mas isso implicaria ter de encarar Leandros antes do que ela imaginava. A ideia das duas tinha de funcionar!

— Claro. A gente se vê amanhã, e então continuaremos nossas férias.

Se Kellie acertasse as coisas com Leandros, talvez desistisse das férias. Fran esperava esse resultado.

— Tudo bem, então.

A notícia pareceu deixar Leandros um pouco mais relaxado. Sem dúvida ficou grato por aquela oportunidade para falar com a esposa.

— Fran? Vou colocar sua bagagem no carro.

Nik balançou a cabeça.

— Não se incomode, Leandros. Vou colocá-las no carro alugado. — Ele virou-se para Fran. — Volto em um minuto.

Depois que os dois homens deixaram a recepção, Fran colocou o braço ao redor dos ombros de Kellie.

— Desculpe. Não tinha ideia de que Nik fosse me pedir para ficar. Francamente, eu não sabia o que responder.

— Nenhuma de nós tinha escolha. Seria tolice recusar.

— Você vai ficar bem?

A amiga respirou fundo.

— Achei que ia ter duas semanas para ficar longe de Leandros, mas a situação mudou as coisas, e não há nada que possamos fazer. Deseje-me força para colocar o plano em prática — sussurrou ela com a voz um tanto dolorida.

— Kellie, ontem à noite nós conversamos sobre Karmela, mas sinto que há algo que você não me contou. O que é?

A cabeça dela estava baixa.

— Estava com medo de contar. Na noite retrasada, eu contei a ele que essa viagem era algo mais. Disse que eu queria me separar.

— Não é a toa que ele parece arrasado. — Fran estava pasma pelo casamento deles já estar ameaçado.

A amiga comprimiu os lábios.

— Ele disse que eu não estava pensando direito antes de sair do quarto mais furioso do que eu jamais tinha visto. Na volta para Athenas, vou fazer o que você disse. Vou dizer que, já que não engravidei, eu preciso de algo substancial para fazer e que quero trabalhar com ele no escritório particular. Vou lembrá-lo de que já fiz parte de uma agência de publicidade e de que sou perfeitamente capaz. Mas, se ele recusar, e temo que irá, então vai ouvir o que tenho a dizer sobre a sagrada Karmela. Até agora tive

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cuidado para não dizer nada negativo, mas chega. É melhor abrir o jogo.

Fran queria lhe dizer não tocar no assunto de Karmela com Leandros ainda. Para deixar a ideia do trabalho afundar na mente dele, primeiro. Porém, os dois homens voltaram para a recepção nesse instante.

Leandros colocou o braço ao redor da esposa.

— Vai ser uma viagem longa. Precisamos ir.

— Vejo você amanhã. — Fran a abraçou. — Diga a ele que você o ama tanto que quer a oportunidade de trabalhar com ele — implorou ela em um sussurro. — Não vejo por que ele recusaria isso.

Leandros então segurou a mão da esposa, e ela foi embora sem responder.

Ela sentiu o olhar de Nik.

— Precisamos comer. Vamos para o hotel onde vocês ficaram hospedadas para que possamos reservar dois quartos e jantar. Nós nos sentiremos muito mais preparados para passar a noite com Demi.

— Parece uma boa ideia. — Ela deveria ter dito mais, como o fato de não ter dormido na noite anterior, mas contaria isso depois.

Ele a acompanhou até o carro alugado. Os olhos escuros de Nik captavam todos os detalhes, e ela ficou feliz por estar usando calça de linho. Ao se sentar lado do motorista, ele disse:

— Você terá de me guiar até o hotel.

— Fica no lado sul da villa, próximo à rodovia principal. — Ela passou-lhe algumas informações, não acreditando que Nik a estava levando para o lugar onde encontrara a sobrinha dele. — Ali, na esquina. — Ele fez uma volta e parou perto da entrada principal. — Antes de entrarmos, vou lhe mostrar o jardim dos fundos.

— Isso. Quero tirar algumas fotos enquanto ainda há luz.

Ela saiu do carro antes que ele pudesse ajudá-la, e os dois foram para a parte de trás do hotel, onde algumas pessoas jantavam.

— Eu a encontrei bem ali. — Fran apontou para os arbustos em um canto.

— Ainda é inacreditável. Encontrá-la viva tão longe do Perséfone é um milagre inexplicável.

Seus olhos se encontraram.

— Encontrá-la a tempo de salvá-la é outro milagre. Por sua conta. — A voz de Nik saiu profunda e emotiva.

Ele abaixou-se para examinar o local, passando os dedos sobre os arbustos. Ao se levantar, sacou o celular e tirou várias fotos. Antes que Fran pudesse detê-lo, ele tirou uma dela e então algumas do hotel.

— Quando Demi for grande o suficiente, vou lhe mostrar essas fotos.

— Deixe-me tirar uma de você aqui — disse ela impulsivamente. — Demi vai adorar ver o tio no lugar onde ela pousara. Ela será sempre conhecida como a versão grega de Dorothy Gale, de O Mágico de Oz. Deve ter feito uma baita viagem. — A voz de Fran tremeu.

Algo brilhou naquelas profundezas escuras.

— Amém — disse ele ao lhe passar o telefone. Seus dedos tocaram os dela,

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Rebecca Winters - [Amores Perfeitos] - Luz De Esperança (Special 95.2)

quentes. Fran se afastou o suficiente para pegar a grande figura de Nik na frente do jardim.

Então, o proprietário do lugar apareceu.

— Foi você que encontrou o bebê milagroso?

— Sim. E esse é Nikolos Angelis, o tio do bebê. Estava mostrando onde eu a descobri.

O dono olhou para Nik.

— Você é o presidente da Corporação Angelis. Vi sua foto na televisão.

— Isso mesmo — murmurou ele.

Fran disse:

— A irmã dele e o cunhado foram mortos no tornado, mas o bebê sobreviveu e vai receber alta amanhã. Vou pedir que eles devolvam o cobertor para o hotel.

— Não se preocupe com isso. Nós sentimos muito pela tragédia, Kyrie Angelis.

Nik apertou a mão do homem.

— Obrigado.

— Podemos oferecer um jantar a vocês? Seria um prazer.

— Nós adoraríamos, não é, sra. Myers? — A maneira como ele a incluiu, como se eles fossem amigos havia muito tempo, veio do nada. A pulsação dela acelerou sem nenhum motivo.

— Vamos até a recepção. — disse o dono.

— Vamos precisar de dois quartos para nos trocarmos. Mais tarde, meus irmãos chegarão para passar a noite.

— Muito bem.

Nik indicou que ela entrasse pela porta dos fundos. O toque dele foi impessoal, mas Fran o sentiu em cada átomo do corpo.

Na recepção, o dono deu uma chave para cada um.

— Os quartos ficam no segundo andar.

— Obrigado. — Nik virou-se para ela.

— Por que você não sobe enquanto eu levo as malas? Sempre tenho uma comigo, em caso de uma emergência.

Fran assentiu e subiu as escadas. Fazia calor, e ela ansiava por outro banho. Quando Nik chegou ao quarto dela, seus olhares se encontraram.

— Encontro você no pátio de trás em uma hora. Depois de comermos, iremos para o hospital.

— Demi deve estar assustada.

Ele sorriu.

— Meus irmãos prometeram ficar com ela até chegarmos.

Os olhos dela arderam por causa das lágrimas.

— Ela ainda estará procurando pelos pais.

Ele encostou no batente da porta.

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— Claro, mas não ficaria surpreso se ela estivesse procurando por você também. Até mais.

Fran desviou o olhar. Ele era muito intenso.

A atração física era uma coisa poderosa. Em outras circunstâncias, ela estaria caidinha por ele. Mas Fran aprendera a lição com Rob. Descobrira que uma bela aparência não era suficiente para manter uma relação, muito menos um casamento. Ele dissera que estava disposto a adotar, mas então mudara de ideia, e isso causara em Fran uma dor indescritível. Ela não só perdera a esperança de ser mãe, como também a habilidade de confiar.

CAPÍTULO 3

Depois de ligar para o hospital em Atenas, Nik tomou banho e se barbeou. Depois de uma refeição, sentia-se revigorado e imaginou que a sra. Myers também estaria se sentindo assim. Ele quase a chamou de Fran na frente do proprietário do hotel, mas percebeu que precisava continuar pensando nela como a sra. Myers, uma mulher casada.

A caminho do hospital, telefonou para Sandro, que contou que o médico mandara Demi para um quarto particular na ala pediátrica. Eles não precisariam mais usar máscaras e poderiam segurá-la.

— Que maravilha — declarou Fran quando ele lhe informou as boas novas.

— Depois de tudo que passou, ela precisa de carinho corpo a corpo.

Os pensamentos exatos de Nik.

No caminho ele inalara a fragrância floral dela. Quando os dois entraram no hospital, Nik mal podia tirar os olhos de sua figura impressionante, vestindo uma saia de verão estampada e uma blusinha branca, além das sandálias de couro. Com os cabelos soltos à atura do ombro, repartidos de um canto, ela era uma visão sedutora de uma feminilidade da qual ele duvidava que ela estivesse ciente.

Ele pensou no fato de ela estar sozinha na Grécia. Mulheres americanas tinham uma tendência a serem independentes. Ele não deveria estar surpreso com o fato de ela e a mulher de Leandros estarem viajando sozinhas. O marido de Fran era tolo de deixar a atraente esposa viajar sozinha em um país estrangeiro.

Ele se perguntou como Leandros conseguia ficar longe da esposa, mas não tinha o direito de especular. A mídia pintara Nik como o playboy mais cobiçado da Grécia, um rótulo que ele era forçado a usar. Porém, usava-o apenas para esconder o verdadeiro motivo para não estar casado. Assim, ele não estava em posição para julgar o que acontecia no casamento ou na vida de outro homem.

Na verdade, ele sentia vergonha por ter qualquer tipo de pensamento envolvendo sra. Myers e Kellie. Se as duas não estivessem de férias, Fran não teria encontrado a preciosa Demi. Aquilo fora um verdadeiro milagre. Assim como o desejo dela de fazer companhia à criança no hospital. Aliás, era interessante o fato de ter sido Fran, e não

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Kellie, quem se prontificou a ficar plantada ao lado de Demi na UTI.

Ele se perguntou o motivo...

Por um instante Nik pensou em Lena, a última mulher que ele namorara. Depois de dois encontros ela sugeriu que fossem morar juntos. Ela era uma mulher atraente, mas ele não acreditava em morar junto. Por causa de um acontecido doloroso em seu passado que o impedia de ter compromisso com qualquer mulher, ele não quisera encorajá-la. Para não ser cruel, parou de vê-la.

Na verdade, nenhum de seus relacionamentos amorosos passou do ponto onde Nik sentia que as coisas podiam ficar sérias. Quanto a Lena, ele não podia deixar de se perguntar o que teria acontecido se tivesse sido ela quem descobrira Demi. Ela teria deixado de lado seus planos para confortar a criança? Teria um instinto materno tão forte assim?

Nik duvidava. Porém, no instante em que fizera tais questionamentos, ele se puniu. Não era justo comparar qualquer mulher de seu passado com Fran. No instante em que descobrira Demi no jardim, ela sentiu uma responsabilidade especial de cuidar da criança. Era uma situação singular. Ela era a esposa de outro homem — e ele precisava se lembrar disso antes de se meter em encrencas.

Como assim antes? Nik já estava encrencado, pois lá no fundo sentia que ela era o tipo de mulher em que ele poderia confiar para revelar seu doloroso segredo. Por que ela, e por que naquele momento?

Seguindo as instruções do irmão, ele encontrou o quarto de Demi. Ao entrar com Fran, ele deparou-se com Cosimo exausto andando de um lado para outro com a criança, inquieta. Sandro estava desmaiado em uma cadeira.

Nik acenou para o irmão e foi até ele para pegar a criança. Ainda não acreditava que ela estava viva. Demi o reconheceu, mas não houve nenhum sorriso de reconhecimento, pois ela não era mais a mesma. O mundo dela fora literalmente pelos ares.

— Sou eu, Demi, seu tio Nikolos. — Ele a beijou na bochecha com cuidado para não ferir os cortes que já cicatrizavam. — Onde está meu pequeno raio de sol, hein? — Porém, ela continuou inquieta.

Fran aproximou-se e tocou os cachos negros da criança.

— Oi, Demi. Lembra-se de mim? É a Fran.

O bebê ouviu a voz dela e virou-se, começando a chorar e esticando os bracinhos para Fran. Nik não podia acreditar na ligação que se formara tão rapidamente entre a sobrinha e Fran. Mais impressionante ainda foi a maneira como Demi se aquietara e encostara o rostinho no pescoço de Fran, da mesma forma que fazia com Melina.

Fran a ninou, cantando uma música. Nik aproveitou a oportunidade para falar em particular com Cosimo.

— Reservei quartos para você e Sandro no hotel onde Fran achou Demi. — Ele passou o endereço. — Leve Sandro com você, e descansem. Voltem amanhã de manhã, e usaremos o helicóptero do hospital para ir à Tessalônica antes de voarmos para casa. Os corpos já devem estar no avião. Tristeza encheu os olhos de Cosimo.

— Tem certeza de que não precisa de ajuda?

— Positivo. Fran e eu faremos turnos.

— Ela está disposta a ficar?

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Nik assentiu.

— Mas você nem dormiu.

— Vou dormir agora.

— Acho que Demi não conseguiu dormir. Ela fica procurando por Melina. Eu nunca me senti tão perdido.

— Tenho a sensação de que ela vai conseguir descansar agora, que Fran está aqui. Vocês dois podem ir.

Cosimo concordou e acordou o irmão. Nik os acompanhou até o corredor. Depois de se despedir, foi até a recepção e pediu uma cama dobrável.

Depois de alguns minutos, uma enfermeira a trouxe. Finalmente sozinho com Fran, Nik desligou a luz. Ainda que estivesse muito cansado, ele ainda queria conversar com ela antes de dormir um pouco. Suspirando fundo, deixou-se cair em uma das cadeiras, maravilhando-se com a conexão ente Fran e a sobrinha.

— Acho que você conseguiu fazê-la dormir.

— Sim — sussurrou ela. — Ela devia estar tão cansada e confusa.

— Com você a segurando assim, é evidente que ela vai ter o descanso de que precisa. Quando você estiver muito cansada, eu assumo o posto.

— Não estou precisando dormir tanto assim, como você. Kellie e eu dormimos até as dez hoje. Por que não desdobra a cama e deita um pouco? Eu acordo você quando for sua vez.

— Promete?

Ela sorriu de canto.

— Pode acreditar.

Na semiescuridão, a boca generosa dela lhe chamou a atenção.

— De onde você veio?

— Não fui trazida por um tornado, se é o que você quer dizer.

— Mas poderia. Hoje meus irmãos e eu estávamos vasculhando o resort e ficamos devastados pela falta de pistas de Demi. Então Leandros ligou e disse que um milagre havia acontecido de repente. Do nada, eu descubro uma americana tomando conta da minha sobrinha, como se fosse a mãe dela. Ainda não tenho certeza se estou sonhando ou não.

Fran beijou os cachos de Demi antes de se sentar.

— Então nós dois estamos tendo esse sonho inexplicável. Eu cheguei anteontem da Filadélfia para passar as férias com Kellie. Leandros estava em Rhodes, a negócios. Saímos de Atenas às seis da manhã, pois tínhamos muito chão pela frente. Tínhamos planejado visitar novas áreas da Grécia que nunca visitamos. Ela queria conhecer o mais novo resort de Petralia, então decidimos passar a primeira noite no Perséfone. Mas uma tempestade muito forte surgiu, e eu sugeri que parássemos em Lemos para procurar abrigo, então entramos no primeiro hotel que vimos.

“Quando descobrimos que um tornado havia destruído as suítes do Perséfone, nós duas desabamos. Não só porque percebemos que poderíamos ter perdido a vida, mas porque ela sabia que Leandros ficaria devastado com a destruição no resort. E não havia como falar com ele pelo celular.”

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Nik inclinou-se para a frente.

— Por um tempo, foi um caos. Você soube do outro tornado?

Os lindos olhos dela se arregalaram.

— Do que você está falando?

— Houve um no aeroporto, ontem de manhã.

— Você está brincando!

Ele balançou a cabeça.

— Eu cheguei perto de ser atingido. Depois de visitar minha família por volta das seis e meia da manhã, fui para a área de cargas resolver uns negócios quando o tornado nos atingiu. Ninguém ficou ferido, mas foi aterrorizante ver quanto dano foi feito em tão pouco tempo.

— Agora eu entendo por que estava ventando tanto quando partimos, mas não ficamos sabendo desse outro.

— Isso não me surpreende. Estava saindo do escritório quando meu irmão telefonou e me contou do segundo tornado.

— Há muitos tornados nos Estados Unidos, mas não sabia que eles aconteciam aqui também.

— De vez em quando — murmurou ele. — Mas o fenômeno de ontem foi do tipo que acontece uma vez em algumas décadas.

— Quando eu liguei a TV, o que ouvi foi suficiente para fazer meu sangue gelar. Meus irmãos e eu pegamos um avião em Tessalônica. Quando chegamos ao resort, descobrimos que Melina e Stavros eram duas das vítimas. E para nosso horror, não havia sinal de Demi.

— Não sei como vocês estão aguentando a barra. — A tristeza na voz dela tocou fundo o coração dele.

— Estamos preocupados com nossos pais. É por isso que é tão importante que você venha para a villa amanhã. Eles amam os netos, mas Demi tem um lugar especial no coração dele por ser a única menina.

— Entendo. — Fran olhou para a menina aninhada em seus braços, adormecida. — Ela é preciosa demais. Será sempre uma alegria especial para eles.

— E para mim.

Um tremor percorreu seu corpo. No aniversário de Melina, ela puxou Nik de canto e pediu que ele fosse o guardião de Demi se algo acontecesse com ela e Stavros. E sem hesitar ele aceitara, mesmo não compreendendo a ideia de algo lhes acontecer. Lembrando-se do pedido, os cabelos de sua nuca se eriçaram. Será que ela teve uma premonição?

— Demi é abençoada por ter uma família tão amorosa.

— Como você é casada e possui um carinho muito especial pela minha sobrinha, imagino que tenha filhos.

Ela não olhou para ele.

— Não.

Não?

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— Como seu marido deixa você viajar sem ele por tanto tempo? — A pergunta que jurara não fazer deixou os lábios dele antes que pudesse impedir.

— Somos divorciados.

— Há quanto tempo?

— Um ano.

Que marido em sã consciência abriria mão de uma mulher como ela? Nik sentia que entraria em território proibido se fizesse mais perguntas, mas ainda estava intrigado. Agora que sabia aqueles fatos pertinentes, estava determinado a aprender mais e não se sentir culpado. Com tempo e paciência, teria suas respostas.

— Estou bem. Ia sugerir que você fosse dormir.

— Talvez eu durma um pouco mesmo.

Ele abriu a cama, tirou os sapatos e se acomodou, emitindo um longo suspiro.

— É tão gostoso que eu temo nunca mais querer levantar. Tem certeza de que não se importa?

— Positivo. Segurar este anjinho é uma delícia. Você precisa dormir, senão não vai estar disposto amanhã.

— Você está certa. Se já não disse isso, estou muito grato por você estar aqui com Demi.

— Eu é que estou grata.

Os instintos dele diziam que aquelas não eram palavras vazias. Nik precisava descobrir quais emoções estavam por trás dela, mas, antes que ele pudesse perguntar, o vazio o engoliu.

Quando descobriu onde estava, já era de manhã.

Nik levantou-se, tirando o cobertor que Fran deve ter posto sobre ele. Seu olhar voltou-se para ela como um dardo. Ela estava adormecida na cadeira enquanto Demi dormia no berço.

Ele não fazia ideia de quanto tempo Fran ficou acordada, mas ela escolhera não perturbá-lo por alguma razão. Incapaz de se conter, Nick estudou-lhe as feições. Sem maquiagem e com os cabelos loiros um pouco bagunçados, ela era mais adorável do que a maioria das mulheres que se esforçavam para permanecer arrumadas o dia inteiro.

Como Demi ainda estava dormindo, ele andou pé ante pé até o corredor a fim de ligar para os irmãos. Enquanto Nik falava com eles, o médico entrou no quarto. Ao se virar, ele se deparou com os dois conversando ao lado do berço. Ela arrumara os cabelos e passara batom, parecendo incrivelmente linda para alguém que ficou acordada a maior parte da noite.

O médico virou-se para ele com um sorriso.

— O laboratório confirmou que ela é sua sobrinha. Estou feliz em informar que os cortes estão cicatrizando. Ela está bem e pode ser liberada. Mantenha-a hidratada. Ela precisa agora é do amor da família, o que eu vejo que não vai ser um problema. Só para você saber, os jornalistas estavam inundando o hospital atrás de informações. Para dispersá-los, eu dei uma declaração que espero que os satisfaça e que dê à sua família uma chance de respirar antes que eles voltem a rondar vocês. Quando estiverem prontos

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para partir, venham até a recepção e alguém vai escoltá-los até o telhado, onde o helicóptero os aguarda.

Nik balançou a cabeça.

— Obrigado por tudo, doutor. A família Angelis está em dívida com o senhor.

Os olhos do médico brilharam.

— E com Kyria Myers, que fez a criança se sentir segura e amada até vocês chegarem. Poderíamos ter mais pessoas como ela aqui na UTI. — Ele olhou para Fran. — Você é enfermeira?

— Não. Mas trabalho em um hospital fazendo acompanhamento dos pacientes, assim que recebem alta, para ter certeza de que estão tendo os cuidados apropriados.

— Você não aceitaria trabalhar com a gente, aceitaria? — disparou ele.

— Já tenho uma proposta de trabalho em mente para ela — informou Nik, olhando para ela. Fran o encarou, confusa. — Obviamente, eu ainda não a discuti com ela.

A ideia circulava em sua mente desde o dia anterior, mas antes de descobrir que ela divorciada ele a manteve em segredo. Antes que pudesse explicar mais, o médico disse:

— Estarei na recepção. — Ele saiu no momento em que os irmãos de Nik chegavam com uma manta e um macacãozinho novo para a sobrinha.

Toda a conversa acordou Demi, que se virou para as grades do berço, tentando levantar-se. Ela balbuciou e deu um olhar suplicante para Fran, pedindo que a resgatasse. Todo mundo sorriu quando Fran a tirou da prisão. Dando um beijo em cada bochecha da criança, Fran foi recompensada com o sorriso que até então estava faltando. Aquela expressão de felicidade edificou a ideia que Nik planejava propor a Fran quando chegasse a hora.

Ela falou com a criança:

— Olha quem está aqui... Seus tios!

Ele presenciava outro milagre, desta vez da comunicação, pois Fran não falava grego e Demi não entendia inglês.

A enfermeira chegou com uma sacola de fraldas e leite suficiente para alimentá-la até que chegassem em casa. Depois de trocá-la e colocar a roupinha cor-de-rosa nova, ela olhou ao redor:

— Quem quer alimentá-la?

Sandro tirou Demi dos braços dela, mas a criança não queria saber dele.

— Bem, acho que essa é sua resposta. — Ele beijou a cabeça da menina e a devolveu para Fran. — Temo que seja você, Kyria Myers.

— Pode me chamar de Fran, e eu não me importo nem um pouco.

A enfermeira lhe entregou a mamadeira. Logo Demi estava contente, sendo alimentada. Ela então soltou um arroto, anunciando que bebera até a última gota. Mais risadas de todos. Apesar da tristeza que os aguardava em Míconos, Demi era a luz que impedia que eles afundassem no luto.

Nik caminhou até Fran.

— Estamos prontos para ir. Eu levo Demi até o helicóptero. Depois que estivermos a bordo, tomaremos um café da manhã. — Ele pegou a criança do colo de Fran e a

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envolveu na manta.

— Venha, Demitza. Nós vamos dar uma volta.

Quando todos já estavam acomodados no helicóptero, Nik percebeu Fran segurar a mãozinha de Demi na cadeirinha ao seu lado antes de sentar-se no banco do copiloto. O gesto o tocou e lhe disse ainda mais sobre aquela mulher compassiva que deixara as férias de lado para proteger Demi. Ele se perguntou novamente quantas mulheres que conhecia teriam feito isso.

Em alguns instantes eles decolaram. Nik ouviu os irmãos conversando com Fran.

— Queremos agradecê-la novamente por toda a ajuda. Demi não teve muito contato com pessoas fora da família, então é uma verdadeira surpresa ela ter se apegado tanto a você.

— Tenho certeza de que é porque fui eu quem a encontrei no jardim.

— Acho que é mais do que isso — confidenciou Sandro. Você tem um jeito amável com ela, assim como nossa irmã.

— Obrigada. É um prazer estar com ela, acredite.

— Quanto tempo você vai ficar na Grécia?

— Volto para casa em menos de duas semanas.

Talvez não, imaginou Nik. Antes de apresentá-la aos pais, ele precisaria ter uma conversa em particular com ela. O melhor lugar para isso seria a bordo do jato, na salinha usada como escritório.

— Acho que você sabe que nossos pais vão querer que você fique em Míconos com a gente.

— É muito generoso da parte deles, Cosimo, mas isso vai depender da minha amiga Kellie Petralia, que foi quem me convidou. Ela planejou essa viagem para passarmos um tempo juntas.

— Ela e o marido são bem-vindos para ficarem conosco — acrescentou Sandro.

— Seus pais disseram a mesma coisa por telefone.

— É porque estamos muito gratos a vocês.

Gratidão não definia os sentimentos mais profundos de Fran. Por muitos anos, perdurava um vazio dentro dela. Estar de repente cuidando de um bebê feliz em estar nos braços dela fazia com que se sentisse completa pela primeira vez em muito tempo. Mesmo sabendo que teria de entregar a menina no dia seguinte, ela guardaria e saborearia para sempre o tempo que passara com Demi.

Na adolescência Fran descobrira que não podia ter filhos. Foi como se uma luz tivesse se apagado, mas com o passar dos anos ela se acostumou à ideia da adoção.

Durante o curto voo para Tessalônica, Fran olhou o cintilante mar Egeu lá embaixo, desejando conseguir se concentrar no panorama espetacular. Em vez disso, descobriu-se revivendo o momento doloroso em que Rob estilhaçou seu sonho de ser mãe.

Mesmo que conseguisse amar outro homem novamente, a ideia de encontrar um que estivesse disposto a adotar não era uma opção para ela. Talvez um dia se apaixonasse por um viúvo com filhos. Daí então talvez pudesse assumir o papel de mãe e preencher o vazio em seu coração.

Fran simplesmente não conseguia ver isso acontecendo, mas Kellie não permitia que ela pensasse de outra forma. Pobre Kellie... A amiga estava enfrentando uma barra.

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Seus olhos se voltaram para Demi, que passou a viagem toda acordada. Ela estava ranhenta e manhosa por estar confinada. Para acalmá-la, Fran sacou outra mamadeira — mas a criança apenas mordiscou e brincou com o bico, sem absorver o líquido.

Fran ficou surpresa com o comportamento brincalhão daquela menina que poderia ganhar facilmente o prêmio de criança mais linda do ano. Demi tinha os traços clássicos da mãe e os cabelos negros e brilhantes de Nik... e dos irmãos dele, Fran apressou-se em acrescentar.

Só que Nik possuía uma sensualidade e uma sofisticação inatas, que o destacavam dos irmãos. Ela inclinou a cabeça para trás e fechou os olhos por um minuto a fim de não ficar encarando a parte de trás da cabeça dele. De vez em quando ele se virava para falar alguma coisa aos irmãos, dando-lhe um vislumbre de seu perfil marcante e do queixo esculpido.

Vestindo uma camisa esporte marrom-claro e calça preta, nenhum outro homem era páreo para a beleza de Nik. O charme do famoso solteiro ia muito além de seu físico. Ele era gentil e generoso — ela duvidava que houvesse uma nesga de egoísmo nele. Nik era tão diferente de Rob...

Logo o helicóptero pousou, e eles foram levados para o jato da Corporação Angelis, um 727 que os aguardava na pista. Enquanto Sandro e Cosimo ajudavam Demi e Fran a descer, Nik foi falar com os encarregados em colocar os corpos da família na área de carga.

Ele entrou no avião alguns minutos depois, sentando-se diante de Demi e Fran. O meio-sorriso dele fez o coração dela dar voltas.

— O voo para Míconos não é longo, e então iremos de helicóptero para a villa. Assim que decolarmos, vamos tomar café. Depois, gostaria de ter uma conversa em particular com você no meu escritório, ali nos fundos.

Ela assentiu, imaginando o que Nik tinha em mente. Ele mencionara algo sobre um trabalho ao médico. O que ele quis dizer, exatamente?

Eles então decolaram, e assim que a luz indicou que podiam soltar os cintos a comissária chegou com a comida. Fran precisava de uma boa refeição, pelo menos para se preparar para a conversa deles.

Assim que a aeromoça recolheu as bandejas, Fran soltou Demi da cadeirinha para trocar-lhe a fralda. Com a menina trocada, prendeu-a de novo e lhe deu uma mamadeira a fim de mantê-la ocupada.

Tocando o cotovelo dela, Nik sussurrou:

— Venha comigo.

Ela se levantou, mas não demorou muito para que ouvissem Demi chorar.

Fran sentiu-se mal, mas continuou a segui-lo. Assim que entraram no compartimento que funcionava como escritório, Nik fechou a porta e a convidou para se sentar em uma cadeira diante dele. Ainda ouviam o choro de Demi, que agora parecia mais calmo. Fran sabia que os tios da menina cuidariam dela, mas aquele som a molestava.

Nik sentou-se com a aura de um chefe de negócios em seu hábitat natural. Seus olhos negros a escrutinizavam como se procurassem por segredos que Fran tentava manter ocultos. Em resposta, a pulsação dela acelerou.

— Antes de chegarmos a Míconos, gostaria que você respondesse algumas

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perguntas pessoais.

Pessoais?

— Se eu puder.

— Você está empregada em tempo integral no hospital?

— Sim.

Ele inclinou a cabeça para a frente.

— E se você precisasse ficar afastada por mais tempo? Eles dariam esse tempo a mais sem problemas?

— Acho que sim, mas teria de ser por causa de uma emergência.

— Claro. Mais uma questão. Você está envolvida com outro homem no momento?

Ela piscou. Ele obviamente tinha seus motivos para aquele interrogatório.

— Não.

— E sua amiga, Kellie. Ela ficaria terrivelmente desapontada se você não passasse o resto das férias com ela?

— Sim — respondeu Fran com honestidade. — Por quê?

A pergunta o fez inclinar-se para a frente com as mãos entrelaçadas. Aqueles olhos inteligentes pareciam atravessá-la.

— Por que eu preciso lhe pedir um grande favor. Sei que não tenho esse direito, mas as necessidades de Demi serão a principal prioridade de minha família nos próximos dias.

— Entendo.

— E a julgar pelo comportamento dela no hospital e pelo fato de ela ter começado a chorar no minuto em que você se afastou dela, aqui no avião, está claro que Demi formou um vínculo muito forte com você. Tenho medo de como as coisas vão ser quando você for continuar suas férias com Kellie. Ela vai procurar pelos pais, mas por você também.

Fran também estava preocupada com isso, mas jamais teria tocado no assunto.

— Quando ela estiver rodeada pela família, com certeza conseguirá fazer a transição.

Ele inalou profundamente.

— Eu achava que ver a mim e a meus irmãos era tudo de que ela precisava. Nós somos uma família unida e nos vemos bastante.

— E seus pais? Sua mãe? Ela se parece com Melina?

— Elas possuem certas semelhanças. — Ele olhou no fundo dos olhos de Fran.

— Mas não sei se ela vai se apegar a nós da mesma forma que a você. Estou curioso para ver o que acontecerá quando estiver com eles de novo. Algo me diz que isso não será suficiente para fazer Demi se sentir segura.

— Você terá de dar tempo a ela.

— Com certeza. Ainda assim, pretendo consultar um psiquiatra infantil depois do funeral. Eu farei o que ele sugerir. Mas, por enquanto, gostaria de contratá-la para cuidar dela até você precisar voltar para a Filadélfia. Até lá, terei uma ideia de como prosseguir.

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Fran acomodou-se na cadeira. Embora estivesse extasiada pela oportunidade de amar aquela garotinha por um tempinho a mais, sabia o quão doloroso iria ser quando tivesse de dizer adeus. Primeiro a morte do irmão, depois a morte do um sonho que acabou em divórcio.

Sem irmão, sem marido e sem filhos depois de três anos de casamento. Fran se conhecia muito bem. Mais vinte e quatro horas cuidando daquele bebê precioso ia ser duro. Mas dez dias? Ela não podia se arriscar de sofrer a dor inevitável.

— Ela vai acabar se adaptando, uma vez que estiver com seus pais ou com a família de um dos seus irmãos.

Ele arqueou uma daquelas sobrancelhas negras.

— Não sei. É muito cedo para saber, e eu quero uma opinião médica antes. A única coisa que sei é que Demi quer você. Se pudesse nos ajudar, você seria recompensada consideravelmente. O que você quiser.

Ela balançou a cabeça.

— É muita generosidade, Nik, mas eu não faria isso por dinheiro.

— Se Kellie não se importar com uma mudança em seus planos, você se importaria? Você ficará em uma suíte na villa. Haverá também um quarto de hóspedes e outro menor, que será o quarto do bebê. Kellie é bem-vinda para ficar o tempo que quiser com você. Mas acho que ainda não fiz a pergunta mais importante: você estaria disposta?

Disposta? Se ele soubesse... Demi galgara um lugar no coração dela onde estaria para sempre. Era como se o destino tivesse colocado a criança naqueles arbustos para que Fran a encontrasse.

Mas ela também sabia que, se não se importasse, precisaria se preparar para um rio de angústia quando tiver de abandonar a criança. Um trauma do qual nunca se recuperaria.

— Fran? — O tom sedoso da voz dele derrotou-a.

Embora fosse o mais novo, Nik claramente carregava o peso da família Angelis nos ombros. Ela percebeu que os irmãos o seguiam. Aquele era um problema que ninguém havia enfrentado antes. Ela reconheceu que ele precisava de um tipo diferente de ajuda — e queria a ajuda de Fran.

Mas para sua autopreservação ela precisava manter-se firme.

— Não é questão de me importar. É que sei qual será a resposta de Kellie quando eu perguntar. Nós planejamos essa viagem há muito tempo. Ela ficará chateada, e não posso desapontá-la. Sinto muito. Mas até o fim do funeral ficarei feliz em ajudar.

— Então, fico grato por sua ajuda. — Ele se levantou. — Vamos voltar para Demi, antes que meus irmãos corram com ela para cá?

Fran odiava desapontá-lo, mas sua prioridade tinha de ser ela mesma.

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Rebecca Winters - [Amores Perfeitos] - Luz De Esperança (Special 95.2)

CAPÍTULO 4

As três da tarde seguinte, Nik deixou Demi com Fran e caminhou para encontrar Leandros e a esposa no helicóptero atrás da villa. Eles não conseguiram chegar antes porque ficaram para prestar apoio e mostrar respeito àqueles que perderam pessoas no tornado.

— Fran ficará aliviada por você estar aqui. É isso que importa. — Ele os levou até o pátio da villa da família Angelis, onde todos haviam se reunido para conversar e comer. Mais lágrimas se verteram quando os dois foram recebidos.

Incrivelmente, a dor por terem perdido Melina e Stavros fora amenizada pela alegria por Demi estar viva, uma bênção que ninguém esperava. Nik ficou tocado em ver que o ânimo da família melhorara, apesar da perda.

— Está em todos os lugares — informou Sandro. — Demi é conhecida como o bebê milagroso. Sabiam que o hotel em Leminos ficou famoso da noite para o dia?

— E o hospital também — declarou Cosimo. — Eles até entrevistaram o médico de Demi no noticiário do meio-dia.

Embora a família toda estivesse morrendo de vontade de abraçá-la, Demi grudou em Fran como Nik havia suspeitado. O único instante em que ela não chorou foi quando os pais dele a seguraram. Mesmo assim, depois de alguns minutos, Demi começou a procurar por Fran e a fazer barulhos que indicavam que não queria estar com mais ninguém.

Nik sabia que seus pais estavam magoados, mas eles escondiam bem. Quando a convidaram para que fosse sua hóspede pelo tempo possível, eles não tinham ideia de que precisariam dela para manter Demi feliz. Ele sorriu para si mesmo. Embora ela tivesse recusado a oferta para ficar, Nik não sabia que a história ainda não havia terminado.

O pai dele observou Fran, que segurava Demi sob o ombro. A criança olhava ao redor, mastigando o mordedor.

— Conte-nos como a encontrou. Queremos detalhes — suplicou ele.

Fran esboçou um sorriso meigo. Mais uma vez, ela repetiu o acontecido.

— O hotel fica em uma esquina. Meu primeiro pensamento foi que a mãe ou o pai estavam andando com ela no carrinho do outro lado do hotel quando os ventos fortíssimos fizeram com que eu e Kellie buscássemos abrigo. Parecia mais do que plausível que a criança tinha sido levada pelo vento até lá. Mas se isso fosse verdade, onde estavam os pais dela? Fiquei em choque em pensar que ela passara a noite exposta à tempestade. Honestamente, me parecia que ela havia caído do céu.

As cunhadas de Nik murmuraram ao pensar em tal hipótese.

Kellie contou sua parte:

— Eu dei a volta e encontrei Fran segurando um bebê inconsciente, vestindo apenas uma camiseta rasgada. Achei que estava alucinando.

— Você não era a única — acrescentou Fran. Quando nem a polícia nem o hospital receberam queixas de uma criança desaparecida, comecei a achar que era exatamente

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isso que estava acontecendo, que ela fora carregada pelo vento e jogada nos arbustos.

— Mas 20 quilômetros... — exclamou a mãe de Nik, levando a mão à boca. — Deus quis que ela vivesse. — O pai dele balançou a cabeça grisalha com os olhos marejados.

— Nik? — chamou Fran do balanço. — Sua família já viu as fotos que você tirou?

Ele planejava mostrá-las mais tarde.

— Vamos fazer isso agora — disse Nik com certa dificuldade. Tirou o celular do bolso e abriu a galeria de fotos antes de entregá-lo aos pais. — Deslize para o lado para ver todas. Tirei algumas no hospital também. — Ele certificou-se de tirar algumas de Fran também.

Pelos próximos minutos a família dele e os Petralia revezaram o celular de Nik. Os sobrinhos dele, de 6 e 7 anos, também estavam loucos para vê-las. Os mais novinhos, de 3 e 4 anos, não tinham ideia do que estava acontecendo e continuavam brincando. Em silêncio, os olhos de Fran encontraram os dele. Ambos se recordavam do momento em que ela lhe mostrou o agora famoso local.

Enquanto todos conversavam, ele caminhou até ela.

— Você acha que ela está pronta para alguma outra coisa além da mamadeira?

— Espero que sim. Ela precisa se nutrir.

— Era o que eu estava pensando. Vou pedir que o cozinheiro prepare a papinha favorita dela.

Fran abraçou a criança.

— Você quer comida, querida?

Querendo ou não, ela precisava comer. Decidido, Nik foi para a cozinha. Em instantes voltou com a comida e uma cadeirinha de bebê que já tinha vários anos de uso.

Ele a colocou diante de Fran e então tirou a criança dos braços dela e a colocou no assento. O cozinheiro lhe dera um babador, que ele prendera no pescoço da menina. Fran e Demi olharam com surpresa para ele.

— Nós dois vamos alimentá-la — explicou ele, sentando-se no balanço ao lado dela. — Ele lhe entregou um potinho. — Você fica com a carne, e eu, com as frutas.

— Covarde — sussurrou ela. Ele riu com vontade.

Para seu alívio, o bebê começou a comer, o que significava que o trauma inicial passara e Demi estava relaxada o suficiente para voltar a comer alimentos semissólidos.

— Bem, olha só — disse Fran para Demi com um grande sorriso. — Não sabia que você era boa de garfo.

Demi sorriu para os dois. Nik nunca havia alimentado a sobrinha antes. Auxiliado e encorajado por Fran, ele estava se divertindo mais do que imaginava. A boquinha dela estava toda lambuzada, o que a deixava ainda mais adorável. Os dois riram de satisfação ao vê-la se comportando normalmente.

Ele terminou de alimentá-la enquanto a família assistia com variados níveis de curiosidade. Não estavam acostumados a ver Nik dando comida para ela. Mas, mais do que isso, estavam chocados de ver como Demi respondia a Fran. O pesar nos olhos dos pais dele se intensificou. Nik não ficou surpreso quando o pai se levantou e deu um beijo na bochecha da neta.

— Ninguém pode imaginar o que você já passou, Demi — falou ele em grego. —

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Venha com o vovô. — Limpou a boca da criança com o babador antes de retirá-lo e levá-la até a mãe de Nik.

Demi adorava a avó, mas, quanto mais eles se afastavam de Fran, mais ela se contorcia e se virava na direção dela. A mãe de Nik se levantou e estendeu os braços para Demi, que começou a chorar.

— O que foi, querida? — falou a mãe dele na língua materna da neta, tentando acalmá-la.

Nik sabia a resposta. Ela queria Fran. Era impressionante perceber que, mesmo com toda a família reunida, Demi queria uma estranha se não podia ter a mãe e o pai. Ele olhou discretamente para Fran, desafiando-a a fechar a mente e o coração para o que estava acontecendo.

Os músculos da barriga dele se retesaram ao ver a confusão e a surpresa de todos, mas especialmente ao ver a dor nos rostos dos pais quando Demi aprontou um berreiro.

Eles haviam perdido Melina, mas nunca lhes ocorreu que Demi não iria receber o amor que estavam prontos para lhe dar. Nik acreditava que se tratava de algo passageiro. Tinha de ser. Porém, algo precisava ser feito para acalmar a criança.

— Sabe o que eu acho? — disse ele em inglês. — Demi acabou de chegar do hospital e precisa ir para a cama. — E os pais dele também, que precisavam descansar para aquela provação.

— Claro — concordou a mãe.

— Fran e eu vamos colocá-la para dormir e já voltamos.

Ele pegou a criança e caminhou em direção à villa. Fran se levantou do balançou e o seguiu. Juntos eles aprontaram Demi para a soneca da tarde com uma fralda limpa e um macacãozinho branco, de pezinhos.

— Você está tão fofinha com essa roupa — disse Fran, beijando as bochechas dela várias vezes. Nik ficou mais uma vez maravilhado de ver como ela estava à vontade com Demi, como se fosse filha dela. Uma não entendia a língua da outra, mas isso não importava. Elas falavam o idioma especial do amor, transcendente. Ao observar Demi, qualquer um pensaria que Fran era a mãe dela. Como isso poderia ser? A menos que...

Seria que possível que Demi tivesse sofrido um ferimento na cabeça e tivesse desenvolvido amnésia?

Havia casos assim que aconteciam com crianças? Isso poderia explicar a conexão dela com Fran. Ela fora a primeira pessoa que Demi vira ao acordar no hospital.

Mas, se isso fosse verdade, por que ela respondia à família, a Nik? Mesmo que hesitante, ela reconhecia todo mundo. Ele estava ansioso para conversar com um médico na manhã seguinte.

Nik tirou uma mamadeira pronta da sacola de fraldas. Quando Fran a colocou no berço, ele entregou a mamadeira à sobrinha. Falando em grego, Nik disse que a amava e que queria que ela fosse dormir.

Antes de começar a mamar, ela fez barulhinhos e olhou para os dois com aqueles olhos que poderiam muito bem ser os de Melina.

— Venha — sussurrou ele para Fran.

— Até mais tarde, querida — disse Fran antes de sair do quarto. Eles mal haviam chegado à porta quando Demi começou a chorar.

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Fran o encarou com os olhos suplicantes.

— Ainda não posso deixá-la sozinha.

Nik contava com isso.

— Ela ama você.

Fran desviou o olhar novamente, pois sabia que o que ele dizia era verdade.

— Vá e fique com sua família, Nik. Tenho certeza de que vocês precisam discutir coisas antes do funeral de amanhã. Diga a Kellie para vir me fazer companhia.

— Direi. Talvez quando ela vir o quanto o bebê quer a sua presença, dirá que as férias de vocês podem esperar alguns dias.

— Eu... Acho improvável. — A hesitação dela indicava que Fran não estava mais tão confiante disso quanto estivera no avião.

— Veremos — murmurou ele.

— Demi está exausta por causa de toda a agitação e precisa de tempo para se acomodar e cair no sono. Vou para o pátio depois.

Aquela mulher extraordinária estava certa em tudo, mas, verdade seja dita, ele preferiria ficar ali com ela.

— Certo, mas volto aqui para ficar no seu lugar se ela não se acalmar.

Ele foi para o pátio e falou com Kellie:

— Fran quer conversar com você. Vou te mostrar onde fica o quarto do bebê.

Ela falou com Leandros, que assentiu com a cabeça, e então seguiu Nik até a casa. Antes de entrarem, ele falou:

— Acho que teria acontecido uma tragédia se Fran não estivesse aqui para cuidar de Demi.

Kellie sorriu.

— Depois da faculdade Fran foi trabalhar na área administrativa de um hospital, mas eles logo perceberam que ela era boa demais com pessoas, jovens e velhas. Foi por isso que a colocaram no cargo em que está. Aposto que já estão sentindo muito a falta dela. Tenho sorte de ela ter conseguido essas duas semanas de folga.

Nik concordou, tendo em vista como ela era com Demi. Ele também entendeu o recado de Kellie, para ele não contar com a generosidade dela depois daquela noite. Isso o deixou ainda mais determinado a convencer Fran a ficar mais.

Eles chegaram à porta do quarto.

— Voltem para junto da minha família quando Demi adormecer.

Meia hora depois, as duas saíram do quarto na ponta dos pés.

— Acho que agora ela dormiu. Conte o que aconteceu com Leandros.

— As coisas pioraram. Mas, antes de entrarmos nesse assunto, diga o que está rolando com Nik.

— O que você quer dizer?

Kellie sentou-se na beirada de uma cama king size.

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— Ele instalou você neste maravilhoso apartamento com a sobrinha no quarto ao lado, quase como se fosse algo permanente.

— Eu disse que iria ajudá-lo até amanhã, depois do funeral.

— Mas ele gostaria que você ficasse mais, certo?

Kellie não perdia nada. Fran assentiu.

— Durante o voo para Míconos, Nik me perguntou se eu ficaria para cuidar de Demi até que ela se acostumasse com a família novamente. Ele espera que eu fique aqui até precisar voltar para a Filadélfia. Eu disse não, pois estamos de férias.

— Você espera que eu fale para você não fazer isso?

Ela balançou a cabeça.

— Não, Kellie. Só falei isso como desculpa. Isso não tem nada a ver com você ou nossa viagem. Eu preciso ir embora amanhã antes que me dê vontade de levá-la para casa comigo. Se isso fosse possível, eu gostaria de adotá-la.

— Adotar uma Angelis?

— Eu sei o quão absurdo isso soa. É por isso que estou feliz de ir embora amanhã.

Parecendo assustada, Kellie levantou-se da cama.

— Eu sei o quanto você já está apegada à criança e o quanto gostaria de dizer sim para ele.

— Na verdade, eu não diria sim a ele.

— Você deve achar que estou sendo difícil, mas é porque estou com medo de você se magoar de novo. Quando penso no que passou com Rob...

Fran inspirou profundamente.

— Acredite em mim, também não quero esse tipo de dor de novo. Quando encontrei Demi no jardim, achei que tinha recebido uma dádiva. Eu a queria para mim. Mas ela não é minha! Se eu ficasse aqui mais dez dias, iria morrer na hora de me separar dela, e isso a traumatizaria novamente. Eu me recuso a me colocar nessa situação. Já tive muitas perdas na minha vida.

— Oh, Fran... — Kellie deu-lhe um abraço terno.

Ela secou os olhos.

— Estou feliz por ir embora depois do funeral. Preciso colocar essa experiência no passado e esquecer que Demi existe. Preciso seguir em frente.

Os olhos de Kellie já estavam marejados.

— Então somos duas. Leandros não quer que eu trabalhe no escritório.

— Ele nem ao menos considerou a ideia?

— Não. Ele disse que quer poder voltar para casa depois de um dia duro de trabalho e poder me encontrar lá, mas o motivo está claro como água. Embora Leandros nunca tenha dito nada, nossa vida amorosa nunca foi satisfatória para ele. E como poderia, com uma noiva que passou por dores terríveis já na primeira noite de amor? O casamento dele com Petra não fora como o nosso. Eles estavam esperando um filho quando... quando... — Ela não conseguiu dizer. — É por isso que preciso me distanciar dele. Karmela pode lhe dar o que está faltando. Nosso casamento terminou.

— Não acredito, Kellie.

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— É para o melhor, eu me recuso a chafurdar ainda mais na dor. Quanto à família Angelis, eles precisam contratar uma babá amanhã depois do funeral.

— Concordo. Sei que Demi vai sentir minha falta, mas ela vai superar. Precisa superar. Eu deixei isso claro para Nik.

— Estou feliz por você. — Elas se encararam por um longo instante. — Embora eu esteja com uma dor de cabeça terrível, que tal se colocássemos nossos melhores sorrisos e fôssemos para o pátio, como se não houvesse nada de errado com o mundo? Depois de socializarmos um pouco, pretendo dormir cedo.

— Eu também. Demi precisará de outra mamadeira antes de dormir a noite toda.

Elas chegaram até a porta.

— Leandros ficará socializando por mim até a hora de dormir. É nisso que ele é bom. Você deve saber que não dormimos juntos há um mês.

Fran entendia a dor dela. Ela não dormira com Rob nos últimos três meses antes da separação. Fora o começo do fim.

O dia terminava. A mãe e as cunhadas de Nik conversavam enquanto ele falava com os homens. Mas todos pararam para admirar as duas beldades americanas que se aproximavam do pátio.

Ao ver Fran, Nik sentiu o pulso acelerar. A mesma coisa acontecera no hospital quando eles retiraram as máscaras.

A maioria das mulheres gregas que conhecera e namorara falavam demais, e apenas sobre elas mesmas — e eram famosas pelo drama ocasional. Suas cunhadas eram assim. Melina não era tão teatral. Deve ter sido por isso que chamara a atenção do reservado Stavros.

Fran era de um tipo completamente diferente de mulher. Parecia confortável sendo ela mesma, fazendo-o pensar em águas calmas mas profundas. Será que aquela aura de calma escondia chamas desconhecidas? Nik sentia no fundo do âmago que aquela mulher podia se tornar de vital importância para ele.

Depois de refletir, reconheceu que seus motivos para manter Fran em Atenas não era exclusivamente o bem-estar de Demi. Ele inclusive já estava tentando encontrar uma maneira de persuadi-la a ficar, por seus próprios motivos. Porém, Nik temia que se baixasse a guarda e a deixasse ver sua alma e ela não aceitasse o que ele tinha a confessar, a escuridão engoliria seu mundo.

Será que ele devia fugir do que mais temia? Ou será que devia ir atrás do que poderia lhe proporcionar uma imensa alegria?

De impulso, virou-se para os outros:

— Com licença, preciso falar com Kyria Myers.

Kellie fora para junto do marido, deixando Fran sozinha. Ele a observou ir até a parede ao fim do pátio e observar a água. Os olhos violeta dela cintilaram ao vê-lo se aproximar.

— Não consigo imaginar contemplar essa vista idílica todas as noites da minha vida. Todas as histórias sobre as ilhas gregas são verdade. Você mora no paraíso, especialmente aqui em Míconos.

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— Concordo que não há na Terra outro lugar como este. Nos fins de semana eu fico ansioso para sair do escritório e vir para casa.

Ela sorriu.

— Há um artista americano que fez algumas serigrafias sobre Míconos. Ele capturou perfeitamente o estilo cúbico e branco de uma villa como a de sua família.

— Sei de quem você está falando. Também gosto muito do trabalho dele, particularmente de algumas obras-primas italianas.

— Elas não são maravilhosas?

Ele assentiu, apreciando aquela conversa, mas impaciente para ir direto ao assunto.

— Quanto tempo Demi levou para finalmente dormir?

— Hum, talvez dez músicas — brincou ela. A risada doce dele penetrou-lhe pela pele.

— Vamos dar um passeio pela praia. — Ele tirou os sapatos. — Tire as sandálias. Você pode deixá-las aqui, perto dos meus sapatos.

— Certo. — Eles desceram juntos os degraus até a areia. Estavam apenas a alguns metros da água. — Oh, que agradável a areia morna.

Nik deu uma risadinha.

— O crepúsculo é minha hora favorita do dia para nadar. Se você aguardar um pouco, verá a lua surgir. Então, tudo se torna mágico.

— As coisas já estão mágicas.

Eles caminharam em um silêncio agradável por um longo tempo. Diferentemente das mulheres que ele conhecia, ela não tinha a necessidade de preencher o vazio com conversa. Aquela era uma qualidade da qual ele gostava muito, exceto naquele dia. Naquele instante Nik tinha o desejo perverso de que ela conversasse com ele. Fran sabia que ele estava esperando para ouvir que ela mudara de ideia.

Tomando a iniciativa, ele disse:

— Você e Kellie ainda pretendem partir amanhã?

Ela parou. À luz do entardecer, encarou-o.

— Sim. Eu gostaria muito de poder ajudar, mas não posso. Mas saiba que foi um privilégio cuidar de Demi nos últimos dias. Se desejar, eu fico cuidando dela até o fim do funeral. Então voarei de volta para Atenas com Kellie e Leandros.

O coração dele pulou uma batida. Ela lhe negara o pedido sem cerimônias. Ao longo dos anos, Nik fez um estudo das pessoas no mundo dos negócios para saber o que as motivava. Antes de Kellie ficar a sós com ela no quarto, ele podia jurar que Fran estava considerando a proposta. Ele esfregou a parte de trás do pescoço. Tentando uma tática diferente, disse:

— Você poderia esperar outro dia? Com o funeral amanhã, não vou poder fazer nada em relação a Demi até depois de amanhã. Eu gostaria de entrevistar algumas babás para a função. Seria de grande ajuda se você estivesse aqui também. Seu trabalho no hospital a torna uma espécie de especialista em ler pessoas. Se nós bolássemos algumas perguntas, tenho certeza de que escolheremos a babá certa para ela.

— Sinto muito, Nik, mas prometi a Kellie que partiríamos assim que vocês voltassem do funeral. Com certeza sua mãe e suas cunhadas serão perfeitas para o

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trabalho.

Desapontado, ele cerrou os dentes.

— Elas seriam se Demi deixasse que a segurassem. Temo que um bebê histérico possa afugentar uma boa babá.

— Se for esse o caso, então você precisará continuar procurando por uma que saiba lidar com a situação, independentemente das dificuldades.

Caramba, por trás do exterior ultrafeminino ela pensava como um homem...

Nik sentiu um intenso respeito por ela, mas a batalha estava longe de terminar — e ele estava determinado a vencê-la.

— E se eu oferecesse o emprego de babá permanente? É no que eu venho pensando desde que vi você cuidando dela no hospital. Melhor do que a mãe dela, só você.

— Agradeço o elogio, mas já tenho um emprego — respondeu ela sem nem ao menos piscar. — Por mais que eu ame aquela garotinha, esse é o último emprego que eu assumiria.

Nik ficou pasmo.

— Você é tão apaixonada pelo seu trabalho no hospital a ponto de não conseguir se imaginar deixando-o por um emprego que bancaria uma vida aqui, nesses arredores?

— Na verdade, não posso aceitar esse dinheiro.

Ela era a última de uma raça em extinção.

— Deixe-me fazer a mesma pergunta, Nik. Você ama o que faz para viver?

Os olhos dele se estreitaram, focando particularmente na generosa boca de Fran.

— O que uma coisa tem a ver com a outra?

— Só estava pensando em uma maneira de solucionar seu problema. No hospital, você cuidou de Demi como um pai cuidaria. Talvez você devesse se tornar a babá dela e dar aos seus irmãos mais responsabilidades para cuidar da Corporação Angelis. Sua irmã e Stavros olhariam lá do Céu e o amariam por todo o sempre por fazer tamanho sacrifício.

Fran não sabia que ele concordara em ser o guardião de Demi se algo acontecesse com os pais da menina. O comentário o pegou bem na jugular. Ele podia sentir a pressão sanguínea subindo.

— Ou você poderia encontrar uma adorável esposa que amasse Demi, e então vocês teriam um lindo lar. Isso resolveria os problemas. Seus pais devem estar preocupados por você ainda não ter se casado.

A adrenalina levou aos limites a raiva que Nik sentia.

— Chegamos ao xis da questão. Depois de ler os tabloides no avião, seria possível que você estivesse se oferecendo para ser minha noiva e acabar com meu terrível estilo de vida? É aonde você quer chegar com esse exercício verbal?

A risada gentil de Fran soou no ar.

— Por Deus, não. Você não é mais terrível do que nenhum outro homem.

Enquanto ele digeria aquele surpreendente comentário, ela disse:

— Já fui casada e não tenho vontade de ficar trancafiada em uma prisão infeliz novamente. Só estava brincando com você, Nik, mas foi um erro meu fazer isso às

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vésperas de um funeral. Perdoe-me. Vejo por que você é tão magnânimo nos negócios. É quase impossível lhe dizer não.

— Ainda assim, você acabou de me dizer não. — As veias das têmporas dele pulsavam. Aquela mulher estava lhe dando nos nervos.

— Você disse que admira o que aprendi no meu trabalho no hospital. Se isso é verdade, então me ouça. Vai ficar tudo bem com Demi. Eu prometo. Nós sabemos que ela vai sentir falta dos pais por um tempo, mas vai acabar se acostumando com sua família adorável. Eles são todos maravilhosos e estão dispostos a fazer qualquer coisa. Deixe-os ajudarem. Não leve tudo nas costas, ou vai acabar ficando esgotado.

— Do que você está falando? — ele rosnou com impaciência.

— Estou falando de você. Leandros está orgulhoso por tê-lo como o novo cérebro da Corporação Angelis. Mas você não pode fazer tudo para todos, dia e noite, da maneira como tem agido desde o tornado. Você me lembra Atlas, carregando o mundo nos ombros.

Atlas?

— Já vi isso acontecer com famílias depois que pacientes voltam para casa. Há sempre uma pessoa, como você, que carrega toda a carga, seja por causa de uma imensa capacidade de sentir compaixão ou uma necessidade mais forte ser útil. Quem sabe? Mas a questão é que isso se torna um hábito, e você é muito jovem para que isso aconteça com você.

Sem dúvida, Fran Myers era a pessoa mais singular que ele já conhecera.

Nenhuma mulher jamais o deixara tão perturbado.

Nik inspirou fundo.

— Vamos voltar? No caminho, quero saber por que seu casamento foi tão ruim a ponto de você não acreditar mais na instituição.

— Resumindo, eu posso contar por que ele deu errado. Ele era o circuito elétrico da firma de advocacia onde trabalhava e estava tentando subir na carreira. Além disso, não achava que tinha tempo para ser um pai de família. O trabalho o consumia muito.

— Que ingrediente vital você deixou faltar?

Quando Fran quase tropeçou, ele percebeu que atingira um ponto fraco.

— Acho que o amor acabou para ambos. Acontece o tempo todo com milhares de pessoas.

— Mas não com alguém como você. Se ele não estava tendo um caso, então qual o motivo para ter dado errado?

— Prefiro não discutir isso.

— Já que você me colocou contra a parede agora há pouco, que tal um pouco de honestidade em troca?

— Acho que é justo. — Ela jogou os cabelos para trás, fazendo com que aquela massa sedosa e brilhante de fios loiros acariciasse seus ombros. — Digamos que, quando ele não honrou o trato que fizemos antes de nos casarmos, não havia mais nada que pudesse nos manter juntos.

— Então ele mentiu para você.

— Eu não diria que foi uma mentira... Foi mais uma falha humana. Quando ficou diante da realidade do compromisso que assumira quando estávamos namorando, ele

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não aguentou. Eu não o culpo, mas minha decepção foi tão profunda que meu coração se fechou.

— Sinto muito. Quanto tempo você ficou casada?

— Três anos.

E sem filhos.

Ele queria saber mais.

— Ele foi seu primeiro amor?

— Não. Eu namorei vários caras que achei que fossem ser aquela pessoal especial. Tenho certeza de que a mesma coisa aconteceu com você.

— É verdade que já saí com muitas mulheres e ainda saio. Todas elas possuem características que eu admiro.

— Mas ainda assim nenhuma delas é o pacote completo. Pelo menos é isso que os tabloides dizem — disse ela em um tom jocoso. — Foi a mesma coisa comigo até Rob surgir em minha vida. Ele tinha tudo que eu queria, e não hesitei quando me pediu em casamento.

As sobrancelhas negras de Nik se ergueram.

— E quando vocês disseram “aceito”, o elemento essencial para fazer o casamento funcionar estava faltando, no final das contas, e isso afastou vocês dois.

— Precisamente.

Ela era boa em manter a calma, mas de vez em quando, quando seus braços ou pernas se tocavam conforme caminhavam, ele podia senti-la tremendo, por estar ocultando alguma informação essencial. Kellie poderia esclarecer as coisas para ele, mas Nik sabia lá no fundo que esse não era o caminho. Ele precisava encontrar Leandros.

Como se o pensamento de Nik o tivesse conjurado, os dois descobriram Leandros nadando no mar. Como Nik, ele nascera em uma ilha no mar Egeu e considerava a água o melhor lugar para esfriar a cabeça depois de um longo dia. Mas Nik precisava admitir estar surpreso por a mulher dele não estar ali com ele.

— Ei, Leandros — chamou Fran. — Onde está Kellie?

Ao vê-los, Leandros nadou até a praia. Depois de pegar uma toalha, ele se secou.

— Ela estava com dor de cabeça e foi dormir.

— Depois do horror dos últimos dias, não estou surpresa — comentou ela discretamente. — Estou pronta para cair na cama. — Ela olhou para Nik. — Obrigada pela hospitalidade e pelo privilégio de poder cuidar de Demi mais uma noite. Vejo vocês amanhã, antes do funeral. Boa noite.

Ela abraçou Leandros antes de subir os degraus para o pátio. No topo, ela acenou para eles antes de desaparecer.

— Você se importaria em me deixar a par de algumas coisas?

Leandros se voltou para ele.

— Não.

— Perguntei se Fran estaria disposta a ficar mais uma semana para me ajudar enquanto nossa família tenta encontrar a babá certa. Como ela cuidou de Demi desde o instante em que a encontrou, achei que iria estar disposta. Mas ela informou que irá viajar com a sua esposa e que não mudará de planos.

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Um sorriso surgiu no rosto dele.

— Minha esposa está resoluta.

Leandros não estava contando alguma coisa, mas aquilo não era da conta de Nik, não até ele resolver se explicar.

— Então isso alivia meu medo. Achei que ela dissera não como uma desculpa por causa de algo que eu pudesse ter dito ou feito. Na minha tentativa de elogiá-la para tentar fazer com que cuidasse de Demi, acho que consegui o oposto. Quando eu disse que ela iria ser bem recompensada pelo sacrifício, acho que Fran entendeu isso como uma ofensa, que era a última coisa que eu queria fazer.

Leandros balançou a cabeça.

— Não, Fran não entenderia assim. Ela ficou com sua sobrinha no hospital porque queria. Tenho certeza de que teria concordado em ajudar você se Kellie não estivesse insistindo tanto nessa viagem.

— Para onde elas vão?

— Elas querem viajar de carro para outras partes da Grécia e fazer caminhadas na natureza.

— Entendi.

— O primeiro casamento de Fran não deu certo, e desde então Kellie se preocupa com ela. Cá entre nós, minha esposa está determinada a encontrar um marido para a amiga.

Aquela era uma notícia interessante.

— Ela tem em mente alguém em particular?

— Duvido. Acho que ela espera encontrar algum americano solteiro na viagem com as credenciais certas para fazer Fran andar nas nuvens. Mas fique tranquilo, pois a decisão de Fran não tem nada a ver com você ou o bebê. Eu sei que ela é tão louca por crianças quanto Kellie.

Finalmente Nik obteve a resposta que queria, embora já tivesse a prova do amor de Fran por crianças em sua ligação com Demi.

Ele deu um tapinha no ombro de Leandros.

— Obrigado pela conversa. Você me deixou mais aliviado do que imagina. Vejo você pela manhã. E não sei se já lhe disse isso, mas minha família e eu estamos honrados em ter vocês aqui conosco.

— É o mínimo que posso fazer por um bom amigo. Planejo também ir ao funeral das outras famílias neste fim de semana.

Mas a esposa de Leandros não iria acompanhá-lo. Algo estava errado, o que faz Nik ter uma ideia.

— Leandros? Antes de se recolher, gostaria de conversar com você sobre outro assunto se não se importar. Ando pensando em uma maneira de recompensar Fran por tudo que ela tem feito e gostaria de saber sua opinião.

— Tudo bem. Ainda não estou pronto para ir para a cama.

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Rebecca Winters - [Amores Perfeitos] - Luz De Esperança (Special 95.2)

CAPÍTULO 5

A família Angelis vivia em uma parte particular da ilha com vista para um cintilante mar azul. Fran descobriu que o pátio principal da suntuosa villa branca era o ponto central para a reunião da família, uma maravilha arquitetônica. Ela também entendia por que as Cíclades eram um local tão procurado para férias na Grécia, especialmente a região da praia de Kalo Livadi, onde ela caminhara com Nik na noite anterior.

A conversa deles criou uma tensão que a acompanhou para a cama, tornando difícil cair no sono. Ela nunca fora tão franca e direta com alguém na vida antes, mas o medo de sentir dor de novo a impulsionou a dizer aquelas coisas.

Enquanto os empregados aprontavam as coisas para a refeição que iria ser servida quando a família voltasse, o olhar de Fran recaiu sobre a bela criança que colocara na cadeira alta para lhe dar o lanchinho da tarde. Colocara Demi sob a sombra de um guarda-sol e estava aproveitando o máximo que podia dos raios solares. Logo as pessoas iriam voltar. E depois Kellie e ela deixariam Atenas.

Por respeito à família de Nik, ela se vestiu mais formalmente, com um terninho azul de verão e um par de sandálias brancas de salto. Por baixo do paletó ela usava uma camiseta branca. Depois de passar batom, prendeu os cabelos com uma presilha de casco de tartaruga. Ela geralmente usava o cabelo assim para trabalhar.

Rob dizia que preferia os cabelos dela assim, pois parecia mais sofisticado. Para ele, o visual certo era tudo. Mas Fran decidira usá-lo daquela forma porque Demi gostava de ficar puxando-o, e ela era forte.

— Sabia que você é uma comilona? — Embora a menina de sete meses não pudesse entendê-la, ela sorriu e abriu a boca para comer mais pêssegos. — Você gosta mais de pêssego do que de ameixas, não é? Mais duas colheradas e terminamos. Ela brincou com a colher para distraí-la, antes de colocá-la na boca da menina. Demi riu, encorajando Fran a fazer isso de novo.

Enquanto a criança ria, uma sombra recaiu sobre Fran. Não podia ser uma nuvem. Ela se virou e descobriu Nik as observando com uma expressão sombria, aqueles olhos escuros que ela não conseguia ler. Parado ali, alto e musculoso, ele estava lindo de terno negro e gravata, que usara para o funeral.

— Não há nada melhor do que a risada de Demi para alegrar os ânimos, não é? — murmurou ele, abaixando-se para beijar as bochechas da sobrinha. — Desculpe a demora, mas havia muita gente na hora do enterro, muitas pessoas que queriam expressar as condolências.

Fran assentiu, sentindo a dor dele. Os pais de Demi foram sepultados. Ela jamais os conheceria. A enormidade da responsabilidade de criar aquela garotinha, que iria depender da família Angelis dali em diante, envolveu Fran como um manto.

Ela conseguia apenas imaginar os sentimentos mistos de Nik de amor e inadequação, naquele instante. A família toda precisava assumir o peso que fora posto sobre os ombros dele. Movida pela compaixão, ela ergueu-se e limpou a boca de Demi com o babador. Movida pelas próprias emoções, pegou a criança e a entregou para Nik, que devia estar se sentindo vazio.

— Demi vai precisar de todos vocês agora. Com licença, eu preciso terminar de

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arrumar minhas coisas.

Ela praticamente correu para dentro da villa para não ouvir a criança chorar.

Nik era adulto; iria lidar com aquela crise da maneira como lidava com suas transações de negócios.

Fran já havia feito as malas, mas precisava daquela desculpa para se afastar de Demi. Para ter certeza de que não estava deixando nada para trás, ela foi mais uma vez até o banheiro.

— Fran? Está pronta?

— Sim. — Ela saiu e encontrou Kellie, que trocara o vestido preto por uma calça branca de pregas e uma blusinha vermelha.

— Pedi a Leandros que informasse à família que não poderíamos ficar para comer. Nós já nos despedimos deles. Vou ajudar você a levar suas malas até o helicóptero. — Ela pegou a maior, enquanto Fran ficou com a menor.

No meio do caminho as duas encontraram Leandros, cuja expressão fechada o envelhecia consideravelmente. Ele abraçou Fran.

— Você está linda.

— Obrigada — sussurrou ela.

Um silêncio ameaçador se instalou quando ele pegou a mala da mão de Kellie, e os dois caminharam até os fundos da villa. Ninguém tinha nada a dizer. Fran estava tão desconfortável que poderia gritar.

Ela avistou de longe o helicóptero à espera deles. Quase correu até lá, mas ao se aproximar reconheceu uma figura alta conversando com o piloto. Era Nik!

O coração de Fran pulou uma batida, pois ela achou que não o veria mais. Ao passar a criança para ele no pátio, ela pretendia que esse fosse seu adeus.

— Aqui. Deixe-me pegar sua mala enquanto você sobe.

Fran não teve escolha senão deixar que ele a ajudasse a entrar no helicóptero. O toque de sua mão incendiou-lhe o corpo. Assim que ela acomodou-se em um assento, ele sentou-se ao seu lado. Atrás dele subiu Kellie. Leandros se sentou ao lado do piloto e bateu a porta.

Chocada, ela virou-se para Nik.

— Você não vai ficar com sua família? — Mas a pergunta veio tarde demais, pois os rotores entraram em ação e eles levantaram voo.

Ele esboçou um sorriso.

— Noite passada, depois que fui para a cama, pensei sobre a nossa conversa e decidi seguir seu conselho. Todos que amam Demi estão lá para cuidar dela. Vou me dar o direito de tirar férias e deixar que minha família cuide dela. Em uma semana eles já terão decidido o que é melhor para ela, sem a minha ajuda.

A culpa por ter sido tão enfática a acometeu.

— Você está brincando... Não está? — disparou ela, consternada.

— Nem um pouco. Você tem toda a razão. Acho que tenho a tendência de querer fazer tudo sozinho. Graças a você, vou poder agora trabalhar nessa falha. Um tempo longe dos meus problemas é tudo de que preciso. Há mais de um ano não tiro férias.

Ela piscou.

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— E para onde você vai?

— Bem, eu gostaria de saber se vocês não deixariam Leandros e eu dirigir para você e Kellie. Conversei com ele noite passada sobre isso. Eu nunca passeio com ninguém. Acredite ou não, dirigir costumava ser uma de minhas grandes paixões. Isso não só seria um grande prazer, como também uma forma de pagar por tudo que você fez por mim e minha família.

Kellie ficou ainda mais pálida do que Fran estava de manhã. Ela mandou uma mensagem no celular de Fran antes de olhar para Nik.

— É muita consideração da sua parte, mas Fran e eu decidimos voltar para os Estados Unidos pela manhã e passar as férias na Califórnia.

Essa não. Para Kellie ter decidido isso, a situação entre ela e o marido deve ter chegado ao limite.

O olhar penetrante de Nik atingiu Fran.

— Não vou para lá há anos. Vocês se importariam de ter a companhia de outra pessoa?

Fran não teve escolha senão apoiar a amiga.

— Não sabia que você podia ser tão brincalhão.

— Acontece que nós formamos um belo par. — O comentário de Nik era para lembrá-la da maneira como Fran falara com ele na noite anterior. — Mas se você não for me levar a sério pelo menos aceite jantar comigo esta noite. Eu me recuso a deixar você sair do país sem desfrutar de uma noite em Plaka. Devo muito a você.

Temendo que ele não fosse deixá-la em paz, ela capitulou.

— Seu convite me parece ótimo, mas se eu o aceitar terá de ser bem cedo.

— Ótimo. Nesse caso, vou pedir que Leandros nos deixe em meu apartamento. Você pode se trocar lá. Vamos dar uma volta casual, brincar de turistas e comer o que quisermos.

No instante seguinte ele falou com Leandros, que assentiu e deu instruções ao piloto. Logo, o esplendor de Antenas revelou-se para Fran à luz do fim da tarde. O magnífico Parthenon, um dos marcos mais famosos do mundo, destacava-se na Acrópole.

Ver aquela maravilha de vista no céu junto a Nik deu ao momento um significado especial. Justo quando ela achava que o tinha compreendido, ele fez algo inesperado, que iluminou outras facetas atraentes de sua personalidade intrigante. Fran tinha de admitir que queria passar o resto do dia com ele.

Naquele momento, a espontaneidade de Nik deixava-a arrepiada até os dedos dos pés. Com Rob, cada movimento era calculado e planejado. Ela não queria comparar os dois homens, mas não conseguia evitar. Rob não era uma pessoa ruim, mas esperava que Fran se conformasse. E, como ela não o fez, ele entrou em um intenso mau humor até ela dar o braço a torcer e se desculpar.

Nik, por outro lado, não saberia como fazer birra. Ele possuía recantos ocultos. Ela já havia percebido que sua maneira de agir era analisar a situação e mudar sua tática até conseguir o resultado desejado. Se Nik se conformasse, seria para ficar com uma mulher tão imprevisível quanto ele. Sua psique era um desafio.

Infelizmente, Nik ocupava muitos dos pensamentos de Fran e estava se tornando importante para ela. Qualquer mulher que se envolvesse com ele conheceria a felicidade

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por um tempo — mas no fim, porém, acabaria pagando por isso. Não era isso que Kellie dizia sobre Leandros? A ideia era aterrorizante.

Nik ainda estava na mente dela quando o helicóptero pousou no prédio do apartamento dele. Ela precisou desviar o olhar para não ficar zonza. Aquela forma de locomoção era tão natural quanto respirar para homens de negócios como Leandros, mas Fran aquele seria um hábito a ser adquirido.

Virou-se para Kellie. No pé do ouvido da amiga, ela disse:

— Vejo você mais tarde.

— Volte antes da meia-noite — respondeu a amiga, taciturna. Kellie tinha algo sombrio em mente, o que deixou Fran apreensiva.

— Eu prometo.

Nik pegou as malas de Fran. Enquanto caminhavam para as escadas, o helicóptero partiu, criando uma ventania que colou a saia de Fran em suas pernas torneadas. Ela a segurou com as mãos, mas era tarde demais. Ao entrarem no elevador, ele pôde vê-la com as bochechas coradas. Que bom estar com uma mulher verdadeiramente modesta. Aquilo a tornava mais interessante.

— Chegamos. — As portas se abriram para a cobertura panorâmica de Nik.

Ela entrou no hall. Por um instante, contemplou o apartamento dele.

— Se eu não soubesse onde estou, diria que esta é a sala de controle do aeroporto.

Ele gargalhou. Fran Myers era um sopro de ar fresco.

— Sinto muita falta do mar de quando estou trabalhando na cidade.

— A vista é espetacular. — Ela lhe lançou um olhar malicioso. — Eu diria que Atlas está muito bem, dividindo seu tempo entre Míconos e aqui.

— Não há nenhum Atlas aqui, hoje. Não percebeu que não estou carregando o mundo em minhas costas?

Ela o estudou intensamente.

— Qual a sensação de ter o peso aliviado por um tempo?

— Eu lhe digo mais tarde. Primeiro, tenho certeza de que você quer tomar uma ducha e se trocar. O quarto de hóspedes fica no fim do corredor.

Após deixar as malas de Fran no quarto e fechar a porta, ele foi para seus aposentos tomar um banho. A ideia de se misturar à multidão visitando Atenas como qualquer estrangeiro lhe agradava. Por causa do calor, ele vestiu um jeans gasto e uma camisa polo de linho, calçando sandálias.

O funeral lhe roubara o apetite, mas a ideia de sair com Fran o trouxera de volta. Na verdade ele estava faminto e apostava que ela também estava.

Mais surpresas o aguardavam ao descobrir que ela o aguardava na janela com vista para o Stygmata Square. Fran vestira jeans e uma blusinha de algodão de mangas curtas, cor de framboesa. Com os lustrosos cabelos presos para cima, ela lhe presenteou com um olhar formal e sério, fazendo com que ele desejasse ardentemente lhe beijar o pescoço.

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Nik caminhou até ela, mais uma vez ciente de sua fragrância de flores silvestres.

— Vamos caminhar por aquela área depois da praça — apontou ele. — Conheço uma taverna que serve linguiças picantes e trutas grelhadas de se comer de joelhos. Mas, se isso não te interessar, há dezenas de restaurantes que oferecem o que você consideraria a tradicional cozinha grega.

Centelhas púrpuras brilharam nos olhos dela.

— Sou uma turista que não quer comida típica.

— Então se prepare para uma aventura gastronômica. Venha.

Eles foram em direção a Plaka, a parte mais antiga da cidade. O lugar estava apinhado de pessoas comprando de tudo, desde mobília até joias, nas lojas das ruas.

A fome os levou a comer antes de fazer qualquer outra coisa. Ela comeu linguiça e truta com ele. Enquanto estavam sentados observando as pessoas, inventando histórias absurdas sobre quem elas eram e de onde vinham, uma garota vendendo flores se aproximou deles.

— Ela não é uma doçura, Nik?

— Concordo. — Ele comprou uma gardênia e a colocou nos cabelos de Fran. A flor lhe deu uma desculpa para tocá-la, um desejo que crescia cada vez mais.

Depois do vinho e da boa comida, eles se aventuraram pelas ruas. Ao passo que ela estava maravilhada com todas as lojas de suvenires, ele estava maravilhado com ela. Ela não queria comprar nada, só olhar.

Os dois acabaram em um teatro ao ar livre, bem no topo. Com a Acrópole toda acesa de fundo, eles assistiram a um filme local com legendas em inglês.

— A história trágica foi ridícula, mas eu adorei — confidenciou ela depois que eles foram explorar outra rua. Nik ficara tão atento a ela que mal conseguiu se concentrar no filme.

— Virando a esquina há uma taverna famosa por seu uzo1, gostaria de provar?

— Eu experimentei da última vez que estive em Atenas e não achei interessante, mas, por favor, não deixe de ir por minha causa.

Ele sorriu.

— Eu também não gosto.

O comentário de Nik arrancou-lhe uma risada.

— Que falta de patriotismo! Prometo que não conto a ninguém. Vamos ver que tesouros nos esperam nesse pequeno beco.

Uma das lojas vendia todos os tipos de figuras baratas, religiosas e mitológicas. Ele achou que Fran ia apenas olhar e continuar andando. De repente, parou e pegou uma pequena figura de metal de Atlas segurando o mundo. Ela perguntou ao dono quanto custava. Ele deu o preço, e ela pagou em euros.

— Embrulho para presente?

— Não, obrigada.

Um pouco mais adiante, ela virou-se para Nik.

— Está ficando tarde, e eu preciso me encontrar com Kellie. Antes de irmos, aceite

1 Bebida alcoólica grega feita à base de anis. (N. do T.)

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este presente por passear comigo. Se você o colocar em seu escritório, ele o lembrará da necessidade de tirar um tempinho para si mesmo de vez em quando.

— O criado-mudo ao lado da minha cama será um lugar bem melhor — respondeu ele. — A cada noite, ele vai ser a última coisa que eu verei. É uma ótima maneira de manter minhas prioridades.

Eles se encararam por um instante.

— Obrigada por esta noite, Nik. Nunca me diverti tanto.

Nem ele. Perceber isso o tornou outro homem.

Ele pegou o presente simples. Aquilo significava mais para ele do que ela imaginava. Em vez de implorar para que ele lhe comprasse algo como suas antigas namoradas, ela virara a mesa. O espírito de generosidade de Fran ia de salvar um bebê depois de um tornado a presenteá-lo com uma lembrança que ele estimaria para sempre.

— No caminho de volta para o apartamento, há mais um lugar que eu gostaria que você visitasse.

— Eu vou gostar?

— Vou deixar que você mesma descubra.

Nik estava guardando aquela parada para o final. Ele precisava se aproximar dela. A taverna Psara situava-se em duas mansões, com um jardim no telhado. Era possível dançar e ao mesmo tempo apreciar a vista de Plaka. Tê-la em seus braços era tudo em que ele conseguia pensar.

Nik pediu que ela guardasse a figura na bolsa até mais tarde. Depois de comerem uma sobremesa, levou-a até o telhado. A banda tocava o tipo de rock de apelo praticamente universal. Pelo menos ele ficou abraçado a ela enquanto dançavam.

— Você é uma ótima dançarina — sussurrou-lhe no pescoço. — Eu poderia ficar assim a noite toda.

— Eu também estou gostando.

— Você saiu com muitos caras depois do divórcio?

— Houve alguns, mas, se você está esperando por elogios, já lhe digo que nenhum deles dançava como você.

— Está no meu sangue grego, mas, por favor, continue. Os elogios podem levá-la a qualquer lugar, Kyria Myers.

Ela riu discretamente.

Ele aproveitou toda a sensação de tê-la perto e a puxou para junto do corpo.

— Não volte para os Estados Unidos amanhã.

— Eu preciso, Nik.

Ele beijou a têmpora dela.

— Sei que você percebeu que Kellie está fugindo do marido.

No instante em que ele falou, ela parou e o encarou.

— Leandros conversou com você? — Fran soou ansiosa.

— Ele não me contou nada, mas está claro que eles estão tendo problemas. Senti que havia algo de errado desde o início. Leandros não é mais a pessoa que eu conhecia.

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— Nem Kellie — disse ela com a voz trêmula.

Infelizmente, a mudança no clima era culpa de Nik.

— São onze e meia. Sei que ela não quer que você chegue tarde. Vamos voltar para buscar suas malas. Meu motorista vai levar você para o apartamento deles. Está tudo pronto?

— Sim. Eu as deixei do lado de fora do quarto.

— Então vou pedir que as tragam para baixo.

Enquanto caminhavam pela multidão, Nik tirou o celular e fez os preparativos. Ao chegarem ao apartamento, a limusine os aguardava.

Ele a ajudou a entrar. Depois de informar o motorista para onde ir, sentou-se na frente dela, para poder olhá-la. Fran tinha um brilho peculiar, que ele notara enquanto dançavam.

— Vocês não estão indo para a Califórnia.

Ela colocou as mãos espalmadas sobre o assento.

— Sinceramente, não sei.

— Então, se eu viajar para os Estados Unidos também, vou encontrar você em casa, ou não?

— Você está interessado em mim? — perguntou ela com franqueza.

— Não é óbvio? Sei que você não é indiferente a mim.

— Nenhuma mulher poderia ser indiferente a você, Nik, e você sabe disso.

— Você está me tachando de Romeu namorador.

Fran desviou o olhar.

— Você é que está dizendo isso.

— Os tabloides nunca mostram a verdade, mas o público os consomem de qualquer jeito.

Ela girou os olhos.

— Me dê um pouco de crédito por não acreditar em tudo que leio. Enquanto continuar solteiro, você continuará sendo tachado. Mas eu não fiz isso.

— Se o problema não é comigo, então ele diz respeito a você.

— Não exatamente. Mas nós dois sabemos que você não vai para a Pensilvânia.

— Se você me conhecesse de verdade, não faria uma afirmação tão infundada.

No silêncio que se seguiu, o telefone de Fran tocou. Ele olhou o relógio de pulso.

— É cinco para meia-noite, Cinderela.

Ela o olhou quase que culposamente antes de tirar o celular da bolsa.

— É Leandros... — A voz de Fran soou trêmula antes de atender, e depois de dizer alô seu rosto empalideceu. Ela disse apenas algumas outras palavras antes de desligar.

— O que aconteceu?

— É Kellie. Ela desmaiou no apartamento, agora à noite. Eles estão no pronto-socorro local. Você poderia pedir que seu motorista nos levasse até lá?

Nik alertou o motorista e então se sentou ao lado dela. Sem pensar, ele a envolveu

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com os braços, sussurrando-lhe contra a cabeça:

— Tenho certeza de que vai ficar tudo bem.

Se Nik ao menos não tivesse se sentado ao lado dela...

Se ao menos não a tivesse abraçado com tanto carinho...

Enquanto dançavam, o contato havia sido moderadamente perturbador. Mas aquela sensação doce e reconfortante fora muito inesperada e bem-vinda para que ela pudesse se desvencilhar dele. Estava muito preocupada com Kellie. Agora tinha certeza de que seus piores medos haviam se confirmado.

— Você tem alguma ideia do que pode ter causado o desmaio? — Os lábios de Nik roçaram-lhe a testa antes de Fran enterrar o rosto entre as mãos.

— Você deve saber. Ela dará entrada na separação legal assim que voltar para a Filadélfia. Eles devem ter discutido hoje. Kellie tem estado tão frágil emocionalmente que temo que o estresse tenha sido demais para ela.

— Não tinha percebido que os problemas deles haviam chegado a esse estado. Do contrário, eu não teria sugerido que viajássemos nós quatro juntos.

Ela pôde sentir a sinceridade dele.

— Não se sinta culpado. Na verdade, não suspeitei que havia algo errado até ela me ligar, algumas semanas atrás, insistindo que eu tirasse duas semanas de férias. Ela alegou que Leandros estaria em uma viagem de negócios e que seria a hora perfeita.

— Não pude acreditar que ela não quis viajar com ele, da maneira como sempre faziam. Foi o primeiro sinal de que as coisas não estavam bem.

— Sinto muito por eles. E por você.

A Limusine parou perto das portas do pronto-socorro.

— Vamos encontrar Leandros.

Fran teve um déjà-vu ao entrarem no pronto-socorro. Nik provavelmente pensou a mesma coisa, pois agarrou o braço dela.

— É difícil acreditar que há apenas alguns dias eu corri para um hospital para descobrir que o bebê que você resgatou é nossa Demi.

— Graças a Deus!

Abatido, Leandros aproximou-se e a abraçou.

— Obrigado por vir.

— Como se eu não fosse vir. Você sabe por que ela desmaiou?

— Os médicos não descobriram nada de errado, mas ainda aguardamos os resultados dos exames de sangue. Kellie não quer que eu entre e pediu para vê-la. Talvez se você conversar com ela, ela se acalme.

Fran nunca vira Leandros tão tenso.

— Vou lá agora. Onde ela está?

— No último cubículo.

— Tente não se preocupar. — Ela então se voltou para Nik. — Volto daqui a alguns

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minutos.

Os olhos cheios de compaixão de Nik estudaram-lhe o rosto.

— Fique o tempo que precisar. Vou fazer companhia a Leandros.

— Obrigada. — Ela teve vontade de beijar-lhe na bochecha por ser tão compreensivo, mas se conteve. Sem perder mais tempo, foi até o último cubículo e puxou a cortina.

— Fran... Achei que você não viesse mais.

— Desculpe, Kellie. — Ela puxou uma cadeira. — Como você está se sentindo?

— Como uma tola. O médico acabou de me informar que os exames não mostraram nada. Ele disse que eu desmaiei porque não comi nada o dia todo. Eles me deram algo para comer, e agora estou melhor. Quero ir embora e fazer check-in em um hotel. A última coisa que quero é ir para casa com Leandros.

— Ele não vai permitir que você vá a lugar algum sem ele. Pelo menos não hoje. Kellie? O que você não está me contando? Agora é a hora da verdade. Não posso ajudar você se não souber o que está acontecendo.

Ela ergueu o corpo na cama.

— Nem dez minutos depois que a gente chegou ao apartamento, Karmela entrou sem avisar carregando uma pilha de papéis para Leandros. Ela ficou visivelmente chocada por me encontrar ali.

As sobrancelhas de Fran se juntaram.

— Se Karmela tinha planos para ficar a sós com ele, ela é que deveria ter desmaiado por perceber que você não está de férias comigo.

— Ela não é do tipo que desmaia. Aquela mulher é fria como uma pedra de gelo e me trata como se eu fosse a intrusa, e não a esposa dele. Sem dúvida Karmela tinha permissão para usar o código de segurança de acesso quando a irmã estava viva, e Leandros nunca o apagou. Ele foi para o escritório com ela por alguns minutos. Quando Karmela saiu, me mostrou um sorriso de satisfação e me desejou um bom voo. Fran, como ela poderia conhecer meus planos, se Leandros não lhe contara nada? Não quero que ela saiba da minha vida. Estou falando, essa foi a gota d’água.

— Teria sido para mim também.

— Quando Leandros veio falar comigo, eu estava na cozinha pegando um suco e não falei nada sobre ela. Ele ficou zanzando ao meu redor até que me deixar louca, então eu disse boa-noite e fui para o quarto de hóspedes. Um pouco depois, ele entrou e me encontrou ao telefone com tia Sybil. Ele disse para eu desligar, pois tinha algo sério para conversar.

— E você desligou?

— Sim. Eu nunca o tinha visto tão enfurecido. Leandros jurou que não sabia que Karmela iria aparecer. Quanto mais ele tentava se explicar, menos eu conseguia ouvi-lo. De repente eu me senti mal e desmaiei.

— Isso não me surpreende. Nessas circunstâncias, é bom termos um voo marcado para os Estados Unidos amanhã.

— Por favor, me perdoe, Fran. Fui terrivelmente egoísta em forçar você a vir para Atenas agora, e não em setembro.

— Nada disso importa. Você precisa de ajuda.

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— E você também — comentou Kellie. Ela encarou longamente a amiga. — Você voltou tarde. Não preciso perguntar se você se divertiu com Nik.

— Eu me diverti. — Foi uma noite da qual sempre se lembraria.

— Com essa gardênia em seu cabelo, posso imaginar. Ele a colocou aí antes ou depois de beijar você?

— Não houve beijo nenhum. — Exceto na testa.

— Ainda não, talvez, mas logo. O charme dos Angelis funciona como um relógio. Só tome cuidado para não se deixar perder completamente.

— Por que diz isso?

— Ele já quer sair de férias com você!

— Kellie, ele estava apenas flertando.

— Não. Nik Angelis é uma força motriz no mundo dos negócios e é uma força ainda mais avassaladora quando o assunto são as mulheres. Uma das secretárias do escritório de Leandros disse que ele já teve várias, ao longo dos anos. Leandros contou que, quando Nik deseja alguma coisa, ele é incansável até consegui-la. Posso ver em ação as táticas de persuasão dele em você.

— Como assim?

— Ele não pensaria duas vezes em convidar você para largar o emprego no hospital e se mudar para a Grécia a fim de ser a babá de Demi.

Fran engoliu em seco.

— Ele já fez o convite. Eu recusei. Quando o médico em Leminos mencionou que ele deveria contratar alguém como eu, Nik disse alguma coisa sobre ter outros planos em mente para mim.

— Eu sabia! — murmurou Kellie. — Ele vai usar cada truque em seu arsenal para fazer com que você cuide de Demi. O plano é conquistar você para garantir a vitória. Ele está contando com uma divorciada linda e vulnerável. Você já contou que não pode ter filhos?

— Não, claro que não!

— Então não diga! Essa informação é tudo de que ele precisa para fazer você dizer sim. Você não pode contar, Fran, do contrário vai enfrentar uma dor de cabeça maior do que essa de agora. Ele tem dinheiro suficiente para comprar quem quiser, mas não você. — Os olhos dela ficaram úmidos. — Digo isso porque você é a melhor pessoa que eu já conheci e está acima de qualquer preço.

— Oh, Kellie... — Ela deu um grande e demorado abraço na amiga.

— Prometa que não deixará que Nik a convença. Se ele conseguir, isso significará que você desistiu de uma vez de se casar. Nós conversamos sobre você se apaixonar por um viúvo com filhos pequenos. Não foi isso que você disse?

Ela se afastou de Kellie e limpou os olhos.

— Sim, e você sabe que eu adoraria que isso acontecesse.

— Então não se envolva mais com Nik. Garanto que, se você o fizer, vai acabar presa na casa dos Angelis como uma empregada de luxo. Não me importa o quão forte seja seu instinto materno. Os anos passam rápido. Pense, Fran! Um dia ela vai crescer e não vai mais precisar de você. E então o que você vai fazer? Estará velha demais para o que realmente quer e viverá o resto da vida com o coração partido. Quando chegarmos

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em casa, eu a ajudarei a encontrar um cara excelente. Há centenas de viúvos procurando por uma esposa on-line.

— Ugh. Isso me parece terrível.

— Talvez não. Você merece conhecer uma pessoa fantástica e se apaixonar. Acontece com casais sortudos o tempo todo. Casar-se pela segunda vez pode ser maravilhoso se você não estiver desesperada e se investir o tempo necessário para conhecer uma pessoa sem a qual não consiga viver.

— Eu sei.

— Então, lembre-se de mais uma coisa. Um dia desses os pais de Nik farão pressão para que ele tenha filhos, e então ele se casará, igualando seu status ao dos irmãos. Todos terão famílias, menos você. E aí? Quando Demi for para a faculdade, você voltará para os Estados Unidos e trabalhará novamente em um hospital, cuidando dos outros?

As palavras eram doloridas, mas ela sabia que Kellie estava dizendo em parte pela própria experiência e em parte para ajudar Fran a pensar direito.

— Você precisa tomar as rédeas da sua vida e viver por você. Acho que você deveria ter pulado fora do casamento na primeira vez que Rob disse que não queria ter filhos. Isso foi um ano depois de vocês se casarem. Olha o tempo que você perdeu! Nunca lhe disse nada sobre isso, mas sempre quis.

Fran olhou para a amiga, surpresa.

— Não fazia ideia que você tinha uma opinião tão forte sobre o assunto.

Ela mordeu o lábio.

— Você não sabe metade das coisas que pensei sobre Rob e o profundo egoísmo dele em relação a você. Sua situação me fez repensar meu casamento. É por isso que estou planejando me separar de Leandros. Eu me recuso a ficar mais um ano com ele e com Karmela por perto. Não sei se eles já são amantes, mas não se engane. Ela está só à espera da oportunidade.

Ontem, voltando para Atenas, era como conversar com uma parede. Leandros não consegue enxergar os sentimentos dela para com ele. Depois que se cansar dela, ele vai querer outra pessoa, esperando que eu olhe para o outro lado. Sabia que era bom demais para ser verdade o fato de ele ter se apaixonado por mim, mas eu estava tão louca por ele que não enxerguei a verdade.

Kellie agarrou o braço de Fran.

— Não faça o que eu fiz. Não se deixe enganar pelo charme de deus grego de Nik. Não o deixe conquistar você. E acima de tudo, não durma com ele. Ele atrai as mulheres naturalmente, como Leandros. É a dádiva e a maldição deles.

— Kellie, eu nunca te vi assim.

— É porque eu percebi que meu casamento foi um erro. Karmela já estava na parada quando conheci Leandros. Os sinais de aviso estavam por toda parte, mas eu não prestei atenção.

Fran estava abalada, pois, apesar do amargor da amiga, ela estava certa.

— Quando voltar para casa, vou entrar com o pedido de divórcio através do advogado de meu tio. Vou ficar com eles até pensar no que vou fazer.

— Eles sabem que seu casamento está em perigo?

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— Ainda não.

Fran abraçou a amiga.

— De todos os casamentos que já vi, eu achava que o seu era o mais sólido. Estou devastada com o fim dele.

— Estou em agonia desde que percebi que Karmela não irá embora. Então não deixe Nik convencê-la a aceitar uma situação da qual será difícil sair depois. Não importa o quanto você ame a garotinha, ela não é sua! Ela é uma Angelis. Eles formam um círculo fechado, e você jamais fará parte integral dele.

Fran ergueu-se, não suportando ouvir mais nada.

— Quer que eu volte para o apartamento esta noite?

— Não. Seria a gota d’água para Leandros. Preciso mostrar para ele que estou no controle e que posso cuidar da minha vida sozinha. Ele pensa que sou muito dependente. Chega disso! Ele deveria ter se casado com Karmela. Não consigo entender por que não se casou com ela.

Ela deixou escapar um gemido exasperado.

— Peça que Nik a leve até o Cassandra. Já liguei para o hotel e avisei que você vai ficar em nossa suíte particular. Nós pegamos você pela manhã a caminho do aeroporto.

— Estarei pronta. — Ela abaixou-se para abraçar a amiga. — Saiba que meu coração está partido por você e Leandros.

— Agora você tem uma ideia de como me senti quando me contou que Rob não queria adotar um filho. Mas você passou por uma provação terrível. Dê tempo ao tempo; vai superar isso, também.

Fran mandou um beijo para a amiga e foi em direção ao saguão do pronto-socorro. Os dois homens se levantaram ao vê-la. A expressão sombria de Leandros a assustou.

— Como ela está?

— Está surpreendentemente bem e pronta para viajarmos amanhã de manhã. Vou cuidar dela, Leandros. Sinto muito pelo que vocês estão passando. Kellie obviamente precisa de espaço. Na Filadélfia, o tempo fará com que ela veja as coisas de forma mais clara. De uma coisa eu tenho certeza: ela ama você com cada fibra de seu ser. Não se esqueça disso. — A voz dela tremia.

Ele comprimiu os lábios.

— Eu me esqueci de uma coisa. Se ela quer viajar amanhã pela amanhã, eu mandarei meu jato levá-la. Temos coisas para discutir. Como ela deve ter lhe contado, está tudo certo para que você fique no Cassandra hoje. Amanhã, meu motorista te buscará. Reservei um voo para você, de primeira classe, que sai às oito.

CAPÍTULO 6

Fran jamais havia visto Leandros agir de forma tão intimidante. Não havia nada que

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ela pudesse fazer. Ela deu um último beijo na bochecha dele. Nik a levou até a limusine, onde se sentou ao lado dela.

— Você vai ficar em casa esta noite. Está tarde, e seria um absurdo você ficar em outro lugar quando eu tenho um apartamento perfeito às moscas. Amanhã será um novo dia. Depois de uma boa noite de sono você conseguirá tomar decisões melhores. Quem sabe, talvez decida até passar o resto de suas férias aqui.

Ela sentia que não tinha mais forças para lutar.

— Você me convenceu. Obrigada — disse ela, suspirando as palavras. — Estou exausta, como você também deve estar. Não consigo expressar o quanto aprecio sua generosidade.

Ele exibiu um sorriso branco que quase derreteu os ossos dela.

— É uma chance de fazer algo por você.

— Quantas vezes preciso lembrar que cuidar de Demi foi uma alegria? — De repente, a voz dela soou apreensiva. — Você já conversou com sua família?

— Sim. Meu pai me ligou.

— Eles devem estar sentindo muito sua falta.

— Não tive essa impressão. Ele me telefonou para agradecer por eu ter deixado Demi na casa deles. Ele disse que minha mãe é outra pessoa agora, que está com o bebê com quem se preocupar. Demi chorou e fez birra o dia todo, mas as meninas ajudaram-na, e na hora de dormir ela já estava mais calma.

— Sinto falta dela, Nik.

— Eu também nunca paro de pensar nela. Meu pai disse que a presença de Demi afastou a escuridão e que os ânimos estão melhorando. Ele também admitiu ter inveja de mim por poder voltar para o trabalho. Eu disse que ele se aposentou cedo demais e que deveria voltar para o escritório por meio período ou, pelo menos, por alguns dias por semana.

Nik era um filho maravilhoso. Embora Kellie tivesse apontado a verdade sobre a natureza determinada dele, Nik tinha um lado nobre que ela não podia deixar de notar.

— Isso deve tê-lo deixado animado.

— Ele disse que ia pensar sobre o assunto, o que indica que quer colocar a mão na massa. Eu disse outra coisa para ele.

— O quê?

— Que saí de férias por uma semana e que deixei todos os problemas nas mãos de meus assistentes. Sugeri que ele desse uma olhada nas coisas por mim.

— E? — perguntou ela, pois os olhos dele estavam sorrindo.

— Ele não respondeu não.

— Se ele for parecido com você, aposto que está louco para cair de cabeça no trabalho.

— Você deve estar certa. Viu, seu conselho já está rendendo. Se você não tivesse me convencido a abrir mão do peso do mundo, eu não teria percebido que meu pai está com problemas para aceitar a aposentadoria. Eu lhe devo muito pelo que está acontecendo na villa, Fran.

Antes que ela pudesse pensar, ele lhe deu um beijo rápido nos lábios. O beijo

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durou um mero instante, mas o abalo sísmico viajando pelo sistema nervoso dela foi tão poderoso quanto os avisos de Kellie. Não faça o que eu fiz. Não se deixe enganar pelo charme de deus grego de Nik. Não o deixe conquistar você.

Ele segurou a mão dela.

— Por falar em férias, você precisa parar um pouco de se preocupar com Kellie. E com Leandros, que planeja ficar na Filadélfia por uns tempos com ela. Sua amiga terá tempo para reconsiderar tudo e repensar a decisão do divórcio. Por que você não fica aqui na Grécia por mais alguns dias? Sem você por lá, Kellie e Leandros terão de confrontar os sentimentos. Sei que Leandros não quer o divórcio.

O convite era tentador...

— Até onde eu saiba, não existe homem melhor do que ele no mundo. Tenho a impressão de que Kellie significa o mundo para ele.

— Ela também venera o chão que ele pisa. Eu gostei dele no instante em que o conheci, e isso nunca mudou. Mas não sou casada com ele. Os problemas pessoais deles não são da minha conta.

Só que na verdade Fran sabia o que estava angustiando a amiga. Não era apenas Karmela. Às vezes Fran tinha a sensação de que Kellie usava Karmela como uma desculpa para ocultar as próprias inseguranças. Ela se casara com um homem poderoso, cujo primeiro casamento não fora feliz. Kellie precisava conversar com um profissional sobre seus problemas.

— Nesse caso, vamos nos concentrar em desfrutar de nossas férias — sugeriu Nik.

Fran riu para ocultar a súbita aceleração do coração.

— Nossas férias? Não sabia que estávamos juntos nessa.

— Leandros quer ficar a sós com a esposa e você ainda está aqui na Grécia, desejando viajar. A ideia de passarmos um tempo juntos a assusta?

Um tremor menor estremeceu o corpo dela.

— Vou perguntar de novo: você está com medo da ideia de ficar a sós comigo?

A adrenalina jorrava nas veias de Fran.

— Por que eu estaria?

— Mentirosa — sussurrou ele.

A resposta a fez rir antes de puxar a mão de volta.

— Admita que está com medo de gostar demais.

Ele a lia bem demais.

— Oh, eu posso admitir isso. O que me incomoda mais é o que virá depois que as férias terminarem.

— Não pense nisso agora. Quando se está de férias, não se pode pensar demais, apenas aceitar as coisas que acontecem como dádivas.

Os lábios dela curvaram-se.

— A maneira como você mudou de assunto foi inigualável.

— Imagino que você mal possa esperar para embarcar em nossa jornada. Para onde gostaria de ir?

— Essa é fácil. Que tal uma escalada até o topo do monte Olimpo? — provocou

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ela.

— A morada dos deuses.

— É um lugar tão famoso que quero conhecê-lo. Embora eu esteja fora de forma, Kellie e eu planejamos a aventura antes de o tornado atingir a Grécia e mudar nossas vidas.

— Achei essa ideia sensacional. Nós não vamos apenas escalar, vamos também acampar. É uma das coisas que mais gosto de fazer, além de esportes aquáticos.

— E dirigir — acrescentou ela.

Ele sorriu.

— Sua mente é como uma armadilha de ferro. Essa viagem vai ser uma experiência memorável. Vou jogar todo o meu equipamento de acampamento no helicóptero e partiremos amanhã depois do café.

— Você já o escalou, claro.

— Duas vezes. Uma com meus irmãos e outra com meus amigos.

Ela lançou um olhar certeiro.

— Há alguma coisa que você já não tenha feito?

— Ainda não escalei todas as montanhas gregas e nunca acampei com uma mulher.

— É provavelmente a melhor ideia que você já teve.

Mais uma vez ele deu aquela gargalhada máscula e cavernosa que balançou a parte de trás da limusine e criou uma sensação gostosa dentro dela, aplacando por hora as preocupações de Kellie.

Nik puxou Fran para o canto da trilha da floresta para permitir que um grupo de burros de carga passasse. Era um bom lugar para parar e beber água. Eles estavam caminhando havia uma hora, passando e sendo passados por outros grupos.

Dali uma hora chegariam ao refúgio onde todos passariam a noite. Nik tinha em mente outro lugar para armar a barraca, onde eles teriam total privacidade. No dia seguinte escalariam o Mytikas, o pico mais alto.

Nik não sabia o que esperar, mas até então Fran estivera acompanhando o ritmo dele, carregando a própria mochila sem reclamar. Seu cabelo estava preso para cima a fim de não ficar caindo no rosto. Vestindo jeans e uma blusa cor de creme que fazia maravilhas para a silhueta dela, ele mal conseguia desviar o olhar.

— Está pronta para prosseguir? Passaremos por uma garganta e então veremos o topo vermelho do refúgio.

— A quantos metros de altura ele se encontra?

— Dois mil.

— Nós vamos passar a noite lá?

— Não. Vamos armar acampamento um pouco mais acima. Você não sabe a sorte que tem por podermos ver o topo da montanha hoje. Geralmente ela está encoberta por nuvens. Isso significa que veremos estrelas esta noite.

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— Mal posso esperar!

Nem ele.

Ela voltou a caminhar sem Nik. Ele correu até alcançá-la conforme caminhavam em direção ao local que ele tinha em mente para passarem a noite. Eles dormiriam entre os pinheiros, onde o ar era mais fresco.

Durante o trajeto ela usou os binóculos à espera de avistar um pouco da vida selvagem que proliferava da montanha. Depois de dez minutos, exclamou:

— Oh, Nik! Olhe aquele pássaro imenso!

Ele entendia sua animação.

— Consigo ver sem os binóculos. É um abutre-barbudo.

— Barbudo?

— Ele tem um bigode. — Ela riu como uma garotinha. — Aquele ali provavelmente pesa uns quatro quilos.

— Imagino. A envergadura das asas dele é enorme.

— Por volta de 1,20m. Esse é um ecossistema protegido e que abrange várias regiões climáticas. Algumas plantas e animais daqui não são encontrados em nenhum outro lugar do mundo.

O rosto de Fran se iluminou.

— Estou tão feliz por estarmos aqui. Eu não perderia a chance de contemplar uma vista dessas por nada no mundo.

Até onde Nik sabia, a vista diante deles não tinha igual. Se não houvesse outras pessoas indo e vindo na trilha, ele a teria pegado em seus braços e a beijado até deixá-la sem ar.

— Isso é só o começo — murmurou. — Venha, vamos continuar. Estou com fome, e você?

Ela riu.

— Precisa perguntar? — Os dois foram em direção à parte mais difícil da caminhada, mas ela provou ser capaz da tarefa. Em pouco tempo eles alcançaram o refúgio, onde os alpinistas podiam comer e passar a noite.

— Um pouco mais de água vai ser suficiente para chegarmos até o local sagrado.

Os lábios dela se curvaram.

— Sagrado?

— Vai ser quando nós o batizarmos.

— Essa foi uma escolha interessante de palavras — disse ela com um meio riso, bebendo o resto da água.

Nik assistiu à garganta dela trabalhando. A beleza natural de Fran fazia todos os homens ao redor dar uma segunda e terceira olhada. Um alpinista que passava cochichou em grego para o colega que Nik estava feito com aquela deusa morena. Ele ignorou o comentário. Se fosse ele o alpinista que viu Fran parada ali com outro cara, iria ter desejado tê-la encontrado primeiro. Mas, enfim, estava muito feliz de estar com ela para se ofender por tão pouco.

Apesar da tragédia que se abatera sobre sua família, apesar de Demi não ter mais

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os pais, apesar dos problemas de ser o novo chefe da Corporação Angelis, mais uma vez Nik ficou maravilhado pelo fato de que estar ali com Fran parecia a coisa certa e preenchia o vazio dentro dele. Ela lhe dava um novo propósito para a vida, que lhe faltava havia tempos.

Noite passada ele dormira segurando a pequena estatueta de Atlas, encantado pelo carisma inimitável e o extraordinário insight dela. Desejou tê-la conhecido antes que ela tivesse conhecido o marido. Mas não havia motivos para tantas divagações.

O passado precisava ficar no passado. Ela estava ali naquele instante. Isso é que era importante, e ela estava com Nik. Se não tivesse sentido a forte conexão entre eles tornando-se mais forte a cada minuto, Fran teria voltado para os Estados Unidos. Por hora, ele guardou seu medo mais forte no fundo da mente.

— Está ficando escuro. Daqui a dez minutos já será noite. Vamos.

Ela o seguiu pela trilha, que ficara ainda mais íngreme.

— Estou surpresa por sermos os únicos que não vão ficar aqui.

Ele sorriu para si mesmo.

— Eles não possuem seu senso de aventura.

— Que pena não podermos escalar o monte Athos depois.

Nik riu.

— Você quer dizer a grande montanha grega proibida para mulheres?

— Sim, mas isso não deteve a autora francesa Maryse Choisy. Kellie e eu lemos o artigo que ela escreveu.

— “Un mois avec les hommes?”

— Isso! “Um mês entre os homens.” Ela entrou disfarçada em um dos monastérios para descobrir como os monges vivem. Nas palavras da autora, ela recusou as investidas de um deles. Kellie e eu achamos que ela partiu o coração dele.

— O orgulho dele, eu diria — teorizou Nik.

— Ele deve ter achado que estava vendo coisas ao notar uma mulher ali.

Nik não resistiu a fazer um comentário.

— Ela deve tê-lo achado desinteressante, do contrário teria passado muito mais tempo lá e nenhum livro teria sido escrito.

De repente o ar ficou repleto do delicioso som da risada de Fran. Ele assustou alguns esquilos que estavam nos galhos mais altos de um pinheiro.

— Vamos agradecer por estarmos no monte Olimpo, onde Zeus permitiu que deuses e deusas rolassem juntos nos campos Elíseos.

— Deve ter sido uma época e tanto — brincou ela. — Eu sempre imaginei esses campos sendo brancos.

— Quando estivermos no topo estéril, escorregadio e repleto de rochas, você descobrirá a verdade. Temo que a mitologia tenha muito a explicar.

— Acho que gosto mais da realidade.

— Que bom, pois nós chegamos à nossa realidade. — Nik caminhou por entre as árvores, indo longe o suficiente da trilha para que ninguém os avistasse. Ele logo chegou a uma pequena clareira cercada por pinheiros. Animado por estar ali, tirou a mochila. —

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Em alguns minutos a barraca já estará armada, e nós comeremos alguma coisa. — Ele tirou uma imensa lanterna e a ligou.

— Deixe-me ajudá-lo. — Ela retirou a própria mochila e colocou a mão na massa. Eles trabalharam juntos em um silêncio cheio de companheirismo.

— Posso notar que você já fez isso antes. Você é a companhia perfeita para um acampamento.

— Vindo de você, fico lisonjeada. A verdade é que eu costumava acampar com meus pais e meu irmão mais novo, Craig. Geralmente nós levávamos Kellie junto. Ela é uma ótima campista, também. Nós sempre viajávamos com parentes que amavam a vida ao ar livre.

Nik digeriu as informações antes de olhar para ela.

— Não sabia que você tinha um irmão.

— Ele morreu aos 15 anos, de leucemia. Eu achei que não conseguiria me recuperar dessa perda, mas o tempo levou a maior parte da dor. Um dia, a dor por ter perdido a sua irmã também desaparecerá.

A novidade o deixou sério.

— Fale sobre seus pais.

— Papai trabalha em um jornal; ele tem a própria coluna sobre política. Minha mãe trabalha como administradora em uma escola. Tenho bastantes tios e tias e primos, dos dois lados da família. Ela é bem grande, como a sua.

Fran já havia passado por muito sofrimento. A morte de um irmão amado, o divórcio agonizante... Não era à toa que Fran tinha tanto caráter.

— Onde você mora?

— Em um condomínio pequeno.

— Com seus pais?

— Não, mas é perto da casa dos meus pais, onde eu cresci.

— Você é mais independente do que a maioria das mulheres que conheço. Eu a admiro por isso.

— Eu poderia ter voltado para a casa deles, mas preciso do meu espaço. E meus pais também.

Eles entraram na barraca para abrir os sacos de dormir. Ele procurou dentro da mochila as comidas de piquenique que os dois haviam comprado antes de sair de Atenas. Salada, frutas, sanduíches e alguns salgados.

Nik posicionou a luz para que conseguissem se enxergar enquanto comiam, sentados um diante do outro.

— Hum, isso está maravilhoso.

Ele lançou-lhe um olhar.

— Já comentei como você foi fabulosa hoje?

Ela terminou de comer antes de falar.

— Estava pensando a mesma coisa de você. Você é tão simpático. Depois de Rob, eu... — Ela parou por um minuto. — Desculpe. Não acredito na frequência com que eu tenho citado o nome dele. Perdoe-me.

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— Perdoar o quê? Você ficou casada o que, três anos? É normal.

— Talvez, mas é rude com você e desrespeitoso com ele.

— Uma mulher de consciência forte. É uma das muitas coisas que gosto em você. — Ele colocou algumas uvas na boca. — Estou curioso sobre uma coisa. Seu nome é Fran, mesmo?

Ela pegou um pedaço de baclava.

— Não. Meu nome de verdade é Francesca, mas as crianças me zoavam no jardim de infância, então eu o encurtei para Fran.

Nik franziu o cenho.

— As crianças implicavam com ele?

— Isso vai soar pretensioso, mas fui batizada em homenagem à minha avó materna.

— Como você se sentiria se eu a chamasse de Francesca?

— Por que você faria isso?

— Porque eu gosto do seu nome.

— Meus pais só me chamavam assim quando eu estava encrencada.

Ele ergueu uma das sobrancelhas.

— Isso acontecia com frequência?

— Mais do que eu gostaria de admitir. Na sétima série me matriculei em uma aula de dança com Kellie sem pensar direito. Quando meus pais receberam a conta, não acreditaram no que eu havia feito. Eles não ficaram exatamente bravos. Papai me disse que isso demonstrava ingenuidade, mas ainda assim fiquei de castigo.

Nik riu.

— E houve a vez que nós decidimos pular o último ano de colegial e ir para um colégio interno na França. Nós escrevemos para esse pensionnat de brincadeira, pensando que eles não nos aceitariam, pois estávamos nos inscrevendo muito tarde. Quem iria saber que meus pais receberiam outra carta, dessa vez de Paris? A diretora o informou que estava feliz em me aceitar no colégio e que ele precisava enviar dois mil dólares para garantir minha vaga.

“Mais uma vez fui chamada no quarto dos meus pais, e eles me mostraram a carta. Eu honestamente não conseguia acreditar e disse que Kellie e eu só estávamos brincando.”

— Mas seus pais reconheceram esse seu espírito indomável e deixaram você ir — adivinhou Nik.

— Sim. Eles acharam que a experiência iria fazer bem para mim.

— E fez?

— Sim, depois que eu superei as primeiras duas semanas brutais de saudade de casa. Nós passamos pelas aventuras mais sensacionais de nossas vidas e voltamos falando um francês decente.

Intrigado, ele perguntou:

— Você herdou sua franqueza do seu pai ou da sua mãe?

— Dos dois, na verdade.

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Fran limpou os dedos nos guardanapos que haviam levado. Tendo terminado de comer, ela deitou-se sobre o saco de dormir com a cabeça sobre as mãos.

— Como você nunca se casou, me responda uma coisa. Já morou com uma mulher?

— Não.

— Que resposta conclusiva. Então me conte qual foi o último interesse amoroso na vida de Nikolos Angelis. E não minta. Sua reputação lendária o precede. — Ele teve de rir. — Por que você não a levou para acampar? Não consigo pensar em uma maneira melhor de conhecer alguém do que em uma viagem como esta.

— Concordo. — Depois de guardar os restos da comida, ele se deitou com as mãos atrás da cabeça.

— Lena teria fingido que está gostando só para me agradar.

— Sééério? — Ela esticou a palavra.

Ele virou a cabeça na direção dela.

— Então, não senti vontade de conhecê-la melhor. Isso responde sua pergunta?

Fran ergueu o corpo, parecendo chocada.

— Por quanto tempo vocês namoraram?

— Só tivemos dois encontros.

— Isso acontece com todas as mulheres, depois que vocês saem duas vezes?

— Às vezes três, mas na maioria das vezes acontece depois da primeira.

— Você não está brincando, está? — disse ela em um tom quase silencioso.

— Não.

— Se isso é verdade, então por que me trouxe para acampar?

Ele virou o corpo de lado, aproximando-se dela.

— Você é uma mulher inteligente. Vai descobrir sozinha.

— Você está começando a me assustar, Nik.

— Que bom. Pois é hora de começar a me levar a sério. Com certeza não lhe escapou à atenção que me sinto atraído por você, correto? Fiz tudo para evitar que você fosse embora de Atenas. Nenhuma mulher jamais fez com que eu abandonasse minha família e meu trabalho. Você sabe o quanto eu a desejo.

— Você não deveria dizer coisas assim para mim. Nossa relação não é como as outras.

— Fico feliz por você ter notado.

— Por favor, não se aproxime mais. Nós dois vamos nos arrepender disso depois.

Ele tocou o rosto dela com a mão livre.

— Não finja que você não quer o mesmo que eu — sussurrou ele contra os lábios de Fran. — Eu vejo em seus olhos. Nesse instante, esse pequeno nervo pulsante em seu pescoço está pedindo que eu o beije.

— Não, Nik...

Mas ele não pôde evitar. Consumido por um desejo muito maior do que jamais experimentara, levou os lábios até a garganta de Fran, deliciando-se com o sabor da pele

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aveludada dela.

Quando isso não foi suficiente, os lábios estudaram-lhe os traços, cobrindo cada centímetro de seu rosto antes de encontrar a boca tremulante de Fran. Lentamente, ele convenceu seus lábios a se abrir, e ela então começou a responder com uma fome que não conseguiria ocultar.

Seus gemidos de satisfação se misturaram conforme os beijos foram se tornando cada vez mais intensos e longos. Como a água arrebentando uma represa, não havia como voltar atrás. O tempo perdeu o sentido enquanto eles davam prazer um ao outro. Nik não conseguia se satisfazer. E Fran, muito menos. Quando ele se sentira assim na vida? Nunca.

— Você é muito linda — murmurou ele, soltando-lhe os cabelos para poder acariciá-los. — Você sabe há quanto tempo eu quero fazer isso? — Nik enterrou o rosto naquelas madeixas cor de mel. Ele não conseguia parar de beijá-las.

Quando sentiu as mãos dela deslizarem até seus cabelos, arrepios de desejo percorreram-lhe o corpo.

— Admita que você também me deseja — disse ele, sem fôlego.

— Eu não preciso admitir nada — retrucou ela.

— Mas eu quero ouvir as palavras. — Ele tomou-lhe a boca mais uma vez.

— Eu tenho medo de me aproximar demais de você.

— Porque seu ex-marido a magoou?

— É difícil voltar a confiar em alguém.

— Então eu fui condenado sem ao menos um julgamento?

— Se fosse esse o caso, eu teria voltado para casa hoje de manhã.

Nik sentou-se.

— Saiba que eu jamais magoaria você.

— Eu quero acreditar nisso — disse ela com a voz trêmula.

Seu marido causara muitos danos. Ele percebeu que aquilo iria levar bastante tempo. Frustrado, levantou-se.

— Preciso ir lá fora, mas não vou demorar muito. — Ele pegou a lanterna e abriu o zíper da frente da barraca.

— Nik...

Ele se virou.

— O quê?

— Nada. Só tome cuidado.

O coração de Fran batia convulsivamente de medo de tê-lo ofendido. Ela esperou cinco minutos antes de sair da barraca para procurá-lo. Embora o céu estivesse repleto de estrelas, a lua era um mero risco. A escuridão dava aos arredores um aspecto selvagem.

— Nik? Onde você está?

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— Estou bem atrás de você — respondeu a voz forte e masculina.

Ela girou o corpo e quase perdeu o equilíbrio. As mãos de Nik seguraram-lhe os ombros, mas mantiveram seus corpos separados.

— Explique para mim o que aconteceu de errado em seu casamento para deixar você com tanto medo dos homens. De mim. — A voz dele era implacável.

— Eu... Perdi a crença em mim mesma — balbuciou ela. — Quando você se doa por completo a um casamento que dá errado, o medo de isso acontecer novamente é imobilizador. É melhor nem procurar outros relacionamentos.

Fran ouviu-o respirar profundamente.

— Você é a mulher mais honesta que já conheci na vida, mas não me contou tudo. Quero saber o que foi que ele fez para matar seu amor. — As mãos dele seguraram-lhe os ombros com mais força. Só então ela percebeu o quanto ele era forte.

Com um som minguante, Nik a deixou ir. Depois de um dia tão lindo, Fran não suportava a ideia de eles estarem tendo problemas naquele momento. Mas a verdade era que ela estava na beira de um precipício. Se perdesse o equilíbrio, despencaria de cabeça para um mundo onde o risco de se apaixonar por aquele homem era grande demais.

Ela vinha brincando com fogo desde que concordara em passar uma noite com ele em Plaka. Agora não sabia mais como voltar atrás. Era melhor escapar dele com algumas cicatrizes do que ficar na Grécia e ver sua vida toda ser destruída. Aquela situação não era mais sobre Demi.

— Como fui eu quem sugeriu a caminhada, tenho total responsabilidade pela nossa noite, Nik. Gostaria que nós dois apreciássemos a viagem. Você tem sido tão maravilhoso comigo, não tenho palavras para agradecer. Acha que é possível sermos amigos daqui em diante?

— Não — retrucou ele. — Essa situação está mais complicada do que nunca, e no momento não me sinto nem um pouco amigável com você. Mas em honra da minha eterna dívida por você ter encontrado Demi e por ter cuidado dela, vou ser seu guia até sairmos da montanha. Se você não consegue se abrir comigo, então que seja. Agora vou dormir.

— Nik...

— Esteja acordada às seis. De manhã é o melhor horário para chegarmos ao pico. — Ele colocou a lanterna nas mãos de Fran antes de desaparecer dentro da barraca.

Ela mordeu os nós dos dedos, odiando a si mesma por ter causado aquele impasse. Por uma questão de autopreservação, freou as coisas antes que eles fizessem amor. Ele superaria isso sem problemas. Fran desejou poder fazer o mesmo.

Naquela noite ela fora acometida pela paixão mais avassaladora que já sentira. Ela chegara muito perto de pagar o preço de saber como seria ser possuída por ele. Não parecia ser possível que, depois de um período tão curto de tempo, ela estivesse pronta para dar o que quer que ele queira.

Depois de se recompor, ela entrou na barraca com cuidado para não acordá-lo com a luz. Ele se enfiara no saco de dormir com o corpo grande e rijo voltado para a lona da barraca. Depois de tirar as botas, Fran entrou no dela.

Nik havia aberto a janela no topo da barraca. Ela podia ver as estrelas, como ele prometera, mas elas ficaram borradas por causa das lágrimas, e ela sabia que viriam muitas outras.

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— É hora de irmos — chamou Nik. Ela deixou escapar um gemido, pois ainda estava escuro. — O café da manhã estará pronto quando você sair da barraca. Vamos deixar as coisas aqui e as recolheremos depois que descermos do pico.

Eles passaram as próximas duas horas em uma caminhada excruciante, com Nik, taciturno, dando-lhe apenas informações vitais quando necessário. Ao longo da trilha eles foram deixando para trás os pinheiros e a vegetação farta. Dali, seguiram uma cordilheira até o cume. Ele contou que aquela parte do trajeto era chamada de Kaki Scala. A parte mais estreita consistia apenas em cascalho e pedregulhos, caminho acima.

Os dois finalmente pararam para tomar água. Ela estava sem fôlego, mas Nik não parecia nem um pouco cansado. Seu porte era atlético demais para se deixar abater por uma subida como aquela.

O pico do monte Mytikas ainda estava a quarenta e cinco minutos de caminhada. Os músculos de Fran doíam tanto e de maneira tão explícita que Nik declarou que eles iriam optar pelo monte Scolio, o segundo pico mais alto, que ficava apenas a vinte minutos de escalada.

Nuvens começavam a se formar quando eles chegaram, bloqueando a vista do mar Egeu. Talvez a natureza estivesse mandando um presságio. Eles tiraram algumas fotos com o celular. Quando voltasse para casa, ela as imprimiria para poder deliciar-se com as imagens sempre que quisesse.

— Obrigada por me trazer aqui, Nik.

— De nada.

Ele estava sendo civilizado, mas não estava cedendo. Antes da noite anterior, teria lhe dito histórias fascinantes sobre os deuses que ali habitaram. Ela sentia falta do homem animado que a fizera viver de uma forma que ela jamais conheceria novamente. Fran já estava de luto por ele.

Depois de assinarem o registro de presença, Nik sugeriu que eles voltassem. Agora que já tinha cumprido seu papel, ela sentia que ele estava ansioso para descer a montanha e voltar para casa.

Ela o seguiu, mas a descida era muito mais difícil. Era possível torcer o tornozelo, se não prestasse muita atenção. Fran tinha a sensação de que iria sofrer muitas dores nos tornozelos nos dias seguintes, mais do que em qualquer outra parte do corpo.

Quando eles chegaram ao acampamento, a barraca parecia tão convidativa que Fran entrou e desabou no saco de dormir. Ele parou na entrada para observá-la. Ela o encarou com suspeita:

— Podemos descansar aqui por meia hora antes de voltarmos?

Ele comprimiu os lábios.

— Faça como quiser.

— Nik, por favor. Não quero que a situação fique assim entre a gente.

Parado ali, ele terminou a garrafa de água, encarando-a com os olhos semicerrados.

— A caminhada dessa manhã a deixou exausta a ponto de você poder me contar o que eu desejo saber?

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Ela sentou-se, envolvendo as pernas com os braços.

— Isso é muito difícil para mim — sussurrou ela.

— Por quê?

A tensão preenchia o ar. Ele abaixou-se para pegar frutas em sua mochila.

Sendo o homem decente que era, Nik as dividiu com Fran.

— Porque eu quero coisas que não tenho e que provavelmente não terei.

Nik apertou os olhos.

— Que tipos de coisas?

— Você vai tirar sarro se eu contar.

— Tente.

— Eu anseio por algo que já me iludiu. Principalmente, um bom casamento e filhos. Eu preciso me colocar em uma posição onde possa encontrar um homem que queira as mesmas coisas que eu. Quando você me perguntou se eu consideraria ser a babá permanente de Demi, pensei seriamente no assunto antes de recusar. Demi é muito preciosa e eu já a amo, mas ser babá me colocaria fora de circulação.

— Fran...

— Eu sei do que estou falando — interrompeu ela. — Você precisaria ser mulher para entender. Ser dama de honra para o resto da minha vida é algo muito assustador para eu poder contemplar. Eu ainda tenho alguns bons anos pela frente e...

— Quantos anos você tem, aliás? — Ele a cortou, parecendo chateado. Uma careta bagunçava os belos traços dele.

— Vinte e oito. Sei que sou nova, mas por já ter sido casada eu me sinto mais velha. E, vamos admitir, estou fora do jogo faz tempo. Como você nunca foi casado, não reconheceria esses sentimentos, mas eles são reais, pode acreditar.

Ele deu algumas amêndoas açucaradas a ela.

— Como você não é um homem solteiro, tampouco faz ideia de como a minha vida é. Todos veem o solteirão como alguém que pode dormir com a mulher que quiser, sem compromisso. Minha vida é constantemente retratada como algo que não é, e nada que eu diga vai mudar isso. Pelo corar das suas bochechas, vejo que você pensou a mesma coisa sobre mim.

Não havia motivos para negar a verdade.

— Depois de ler sobre você em uma revista eu tive essa noção, mas não mais.

— Mesmo depois de eu ter chegado perto de devorar você na noite passada?

— Nik, tudo que aconteceu ontem foi porque nós dois queríamos.

— Honestamente, você continua me deixando confuso.

— Por quê? A maior parte das mulheres que você conheceu era falsa?

Ele guardou o saquinho de amêndoas de volta na mochila antes de se aproximar dela.

— Não. A culpa é inteiramente minha por nunca ter dado a elas nem uma mísera chance.

Fran inclinou a cabeça.

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— Conte-me como é sua vida, a versão que ninguém conhece.

CAPÍTULO 7

Os olhos de Nik estudaram o rosto dela.

— Como você, eu era muito aventureiro e passei da minha cota de viagens ao pronto-socorro para levar pontos e por causa de contusões causadas por acidentes, escalando e praticando esportes aquáticos. Meus pais enfiaram na minha cabeça que, se eu não tirasse boas notas, me proibiriam de fazer as coisas de que mais gosto. Como eu não suportava nem pensar nisso, eu fiz um trato com eles: eu iria dar duro nos estudos e na empresa, e em troca eu receberia meu prêmio. Como resultado, quando chegava a hora de brincar, eu brincava com mais ímpeto que meus irmãos e apreciava com muito mais intensidade minhas namoradas. Passei por uma fase de querer ser o maior jogador de futebol da Grécia, mas então essa fantasia passou e eu decidi que queria ser um piloto de corrida famoso.

— Você acreditava que era invencível — disse ela com um sorriso.

— Com as boas notas vieram outras recompensas. Eu guardei o dinheiro que ganhava e viajei para os Estados Unidos e a América do Sul. Enquanto escalava os Andes eu conheci um cara que estava montando uma expedição para escalar o monte Everest. Quando voltei para casa, tirei uma licença e fui com eles. Essa viagem mudou a minha vida.

— De que maneira?

— Uma nevasca nos atingiu e nós perdemos dois homens. A corda me salvou, mas fui jogado contra o paredão de pedra e tive danos internos. Na hora, todos acharam que eu havia morrido.

— Nik...

— Fiquei no hospital por mais de duas semanas para uma série de cirurgias. Levei um ano para me recuperar completamente, e então percebi que tinha sorte por estar vivo. Como você, fiz coisas sem nem ao menos pensar no impacto que teriam em minha família. Eles sempre me deram muito amparo, pois sabiam que eu não poderia ser impedido de fazer tais coisas. Foi preciso uma força da natureza para me fazer ter noção dos meus atos.

— Então é por isso que você não escalou todas as montanhas de seu país.

Ele piscou para ela.

— É um dos motivos. Quando percebi o baque que meus pais tiveram com meu acidente, eu decidi que era hora de levar a sério o trabalho. No dia em que me juntei a meu irmão no alto escalão da empresa, boa parte da minha diversão morreu.

— Apesar das fofocas, minhas experiências com mulheres sempre foram esporádicas. Eu percebi que gostava de trabalhar. O desafio estimulante de aumentar os

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lucros e reduzir custos me fascinava de uma forma totalmente nova. Eu mergulhei de cabeça para compensar o tempo perdido. Sem dúvida, foi aí que desenvolvi meu complexo de Atlas.

— Ah. Agora começo a entender.

— Isso foi há cinco anos.

— Quantos anos você tem agora?

— Trinta e quatro.

— E ainda assim, nesse curto período de tempo você superou as expectativas de todos e ganhou seu espaço no coração da empresa. Você é jovem para ter tanta responsabilidade, mas obviamente a conquistou por mérito. Tenho muito orgulho de você e sinto muito pela perda de sua irmã. A dor deve ser excruciante.

— Você também conhece essa dor.

— Sim. Mas no seu caso você tem a adorável Demi, que sempre proporcionará alegria a você e a sua família. Ela é tão divertida. Eu adoraria vê-la novamente.

Com um movimento rápido, ele segurou as mãos dela. Lentamente ele beijou as palmas, enviando sensações eróticas através do braço para outras partes do corpo de Fran.

— Sempre que você fala dela, eu sinto essa ferida profunda dentro de você. Se você falar sobre isso, talvez consiga com o tempo superá-la.

Oh, Nik... Ela baixou a cabeça, aturdida pela ternura inesperada dele.

— Conte para mim — insistiu Nik.

— No fim da adolescência eu desenvolvi uma doença chamada endometriose. Muitas mulheres sofrem disso. Meu caso era tão severo que impede que eu tenha filhos. Eu cresci com a esperança de que um dia fosse me casar e ter um menininho fofo como meu irmão, mas...

— Francesca...

Quando percebeu, ela estava nos braços de Nik. O abraço dele abriu as comportas. Por alguns minutos ela soluçou em silêncio no ombro dele, inalando seu maravilhoso perfume masculino.

— Desculpe — disse ela, por fim. — Rob sabia da minha condição antes de nos casarmos. Ele disse que estava de acordo com a ideia da adoção. Eu acreditei nele. Ainda assim, depois de um ano ele ainda não estava pronto. Por fim acabei pedindo que fôssemos à terapia de casal, pois eu queria um filho. Já na primeira sessão ele desabafou que queria um filho do sangue dele, caso contrário não teria filho algum. Disse que eu era suficiente para ele. A confissão acabou comigo.

— Agape mou — sussurrou Nik, cobrindo o rosto dela de beijos delicados. Fran não sabia o que aquelas palavras queriam dizer, mas o tom delas era profundamente doce. Ela aninhou-se ainda mais nos braços dele, desejando nunca mais sair dali.

Nik acordou quando Fran ainda dormia. Com ambos já emocionalmente exaustos, a fadiga da escalada foi a cereja no topo. Eles dormiram a tarde toda. Ela ainda estava adormecida junto a ele, com um braço sobre o peito de Nik — quase possessivamente, pensou ele.

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Por mais que não quisesse deixá-la sozinha, ele sabia que logo Fran estaria acordada e que eles precisariam comer. Saindo com cuidado dos braços dela, ele deixou a barraca e correu até o refúgio. Os funcionários providenciaram algumas bebidas e pratos quentes embalados.

No caminho de volta, ele ligou para o piloto do helicóptero. Nik instruiu que ele os encontrasse no ponto combinado às sete da manhã seguinte. Depois de desligar, verificou as mensagens no celular. Seu pai avisara que Demi estava se comportando melhor.

Aquilo lhe proporcionou um alívio muito grande. Nas circunstâncias, não havia motivos para Nik ligar de volta. Ele estava de férias. Fran mostrara que ele cumpria seu trabalho e os dos outros sem ao menos pensar no que estava fazendo, e ela estava certa.

Ao voltar para a barraca, ele encontrou Fran de pé, escovando os cabelos lustrosos. Ele pairava ao redor dos ombros dela. Seus olhos azuis acinzentados se iluminaram ao vê-lo.

— Comida... — exclamou ela. — Estou faminta. Deus te abençoe.

Nik colocou tudo entre os sacos de dormir.

— Vamos comer e depois vamos até o córrego para tomarmos um banho.

Os olhos dela se arregalaram.

— Ele é fundo o suficiente?

— Provavelmente não para imersão total.

— Tudo bem, até porque não trouxe roupa de banho.

Ambos se sentaram para comer.

— Não deixe que isso te impeça.

Ela lhe lançou um sorriso ímpio.

— Então, está dizendo que não ficaria escandalizado se eu entrasse na água sem roupa nenhuma?

A pulsação dele se acelerou.

— Eu iria ficar tão contente que provavelmente iria cair morto ali mesmo, de um ataque fulminante do coração.

— Eu amo as coisas que você diz.

— Idem.

— Você acha que os deuses usavam roupas durante os piqueniques no cume da montanha?

A risada reverberou pelo peito dele.

— Nunca pensei sobre isso. Estou deslumbrado com a beleza diante de meus olhos. — Depois dessa observação, ele começou a devorar seu sanduiche.

— Kellie considera você um deus grego.

— Que bom então que ela não conseguiu ver as cicatrizes na minha barriga enquanto eu segurava o mundo.

O sorriso de Fran acalentou os cantos mais escondidos dele.

— Tenho certeza de que ela estava falando de maneira geral. Mulheres

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americanas, e provavelmente todas as outras mulheres do mundo, possuem uma queda pelo tipo deus grego. Como eu disse no hospital, o fato de Demi ter herdado as características da mãe é uma coisa muito boa. Mas, mesmo assim, ela é linda demais para ser real. Os cabelos negros e a pele cor de azeite ainda me deixam maravilhada.

— Assim como suas madeixas loiras do norte europeu e seus olhos violeta são de parar o tráfego aqui.

— Gostaria de ver isso acontecer, só uma vez.

Ela nunca conseguia levá-lo a sério.

— Isso aconteceu na trilha, ontem.

— O que você quer dizer?

— Dois caras ficaram de olho em você a caminho do refúgio. Em um dado momento eles pararam. Pude ouvi-los comentando que eu estava feito com uma deusa como você.

— Eles me chamaram mesmo de deusa? — Ela riu, genuinamente incrédula. — Obrigado por me contar isso. Ganhei o dia. — E tomou um gole do refrigerante.

— Leandros me contou que Kellie queria encontrar um marido para você aqui, na Grécia. Devo dizer que ela sabia o que estava fazendo quando a convidou para esta viagem. Meu piloto de helicóptero, Keiko, não conseguiu tirar os olhos de você. E meus irmãos...

— Oh, pare. — Fran colocou a latinha no chão. — Vamos falar sério por um instante. Não achava que devemos levantar acampamento e descermos antes que escureça?

Sem olhar para ela, Nik respondeu:

— Mudança de planos. Como nós dormimos demais agora à tarde, eu telefonei para meu piloto. Ele estará nos esperando no local combinado amanhã pela manhã, às sete.

Ele a ouviu suspirar longa e demoradamente.

— Nesse caso, vou ao riacho tomar um banho de esponja.

— Precisa de ajuda?

Nik olhou a tempo de ver as bochechas de Fran ganharem um tom róseo. Ela pegou a mochila e pisou fora da barraca como uma donzela recatada sentindo a presença do caçador.

Enquanto estava a só, ele limpou a barraca. Quando ela voltou, cheirando a sabonete perfumado, pasta de dente e vestindo uma blusa limpa, ele pegou suas coisas e saiu. Seguindo o riacho até um uma piscina natural, Nik despiu-se e tomou um bom banho.

Meia hora depois se juntou a ela usando uma camiseta e um par de jeans limpos e a descobriu lendo um livro com a lanterna. Ela havia prendido os cabelos em uma trança que pendia sob o ombro como uma estola de pele brilhante, implorando para que Nik a desfizesse. Aquela mulher não fazia ideia do efeito que tinha sobre ele.

A escuridão recaíra sobre a floresta, selando-os dentro da barraca. Tudo que restava para fazer era aconchegar-se no saco de dormir, aproveitando a noite de verão que ele desejava que durasse para sempre.

Nik se deitou sobre o saco de dormir e se virou para ela.

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— O que você está lendo?

— O Massacre de Memphremegog. É sobre um assassinato brutal que ocorre em um monastério. Mas, depois de um dia como esse, simplesmente não consigo entrar no clima. — Ela colocou o livro de lado e desligou a luz. — Você demorou um pouco. Alguma novidade lá da sua casa?

— Sim. Meu pai deixou uma mensagem.

— Problemas? — perguntou ela, um tanto ansiosa.

— Não. Demi parece estar bem.

— Oh, graças a Deus. Você chegou a conversar com ele?

— Não. Eu segui seu conselho e não liguei de volta. Estou de férias com a primeira mulher com quem já acampei e quero aproveitar cada minuto.

Depois de um instante de silêncio.

— E você está? Aproveitando, digo.

— E se eu dissesse que, apesar de tudo, nunca me senti tão feliz?

— Nik...

— E você? Está se divertindo?

Ele ouviu o roçar do saco de dormir de Fran. Ela então colocou o braço ao redor do pescoço dele e o beijou nos lábios.

— Apesar de tudo, estou no paraíso. — E beijou-o novamente por todo o rosto, as sobrancelhas, os olhos e o nariz, beijou-o com vontade. — Decidi que estou no paraíso porque nenhum homem poderia ser tão maravilhoso quanto você. Boa noite.

— Não vá dormir ainda — implorou ele antes que ela o deixasse e voltasse para o saco de dormir. — Preciso falar com você.

Algo na voz dele deve ter alertado Fran de que o assunto era sério, mas ela ergueu a cabeça para vê-lo melhor.

— O que foi?

— Depois de você ter sido tão aberta e honesta comigo, quero que saiba a verdade sobre mim. Antes que eu fosse liberado do hospital, depois do acidente de alpinismo, o médico me disse que eu jamais poderia dar um filho a uma mulher.

Um minuto se passou, então:

— Oh, Nik... — Lágrimas encheram os olhos dela imediatamente. — Se alguém entende o que essa notícia causou em você, essa pessoa sou eu. Isso explica muita coisa.

Ele beijou-lhe a boca sensual.

— Os danos foram tão fortes que comprometeram minha produção de sêmen. Em um instante, todos os meus sonhos de gerar descendentes morreram. Como você, tive tempo para digerir o fato. Porém, isso gerou um efeito colateral muito negativo. Eu não consigo ter relacionamentos amorosos. Se me entregasse a uma mulher que não soubesse lidar com esse fato, temo que eu não iria saber lidar com isso. De certa forma, fiquei emocionalmente incapacitado.

— Eu passei pela mesma coisa. Você vem sofrendo esse tempo todo.

— Embora eu não estivesse procurando por ninguém em específico antes do

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acidente, a situação mudou depois que voltei para casa.

— Alguém mais sabe?

— Apenas meu médico, e agora você.

Ela tentou se sentar, mas ele colocou as mãos sobre seus ombros.

— Deixe-me terminar. Depois de perder minha irmã e meu cunhado, você surgiu do nada em minha vida, amando minha sobrinha. Dois milagres aconteceram naquela noite. Demi foi encontrada viva, e eis você aqui.

— Nik...

— Não quero que você vá embora da Grécia.

— Eu sei.

Ele ergueu o corpo e sentou-se de chofre.

— Estou falando sério.

— Nik, achei que fôssemos esquecer nossas preocupações e aproveitar as férias. Foi você que me falou para não pensar no que irá acontecer depois que tudo terminar e para receber cada dia como se fosse uma dádiva.

— Não consigo parar de pensar nisso. A ideia de você voltar para os Estados Unidos está arruinando a viagem para mim.

Uma risada gutural escapou dela.

— Você é impossível, sabia?

— Mas você ainda acha que sou maravilhoso.

— Sim. Isso nunca vai mudar.

Continue, Fran.

— Como você sabe?

Ela suspirou.

— Eu apenas sei.

— Você parece ter muita certeza.

— Por que a pergunta? Tenho a impressão de que está preocupado com alguma coisa.

— Eu não estava, até você mencionar.

— Então vamos conversar sobre isso agora mesmo.

— Talvez amanhã.

— Isso não é justo! — exclamou ela. — Então, o que irá acontecer amanhã?

— Uma surpresa que eu garanto que você vai gostar.

— E depois me contará o que está preocupando você?

— Veremos.

— Essa surpresa vai deixar meus joelhos ainda mais doloridos?

Ele riu.

— Você não precisará erguer um dedo, muito menos um pé.

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— Jura?

— Confie em mim.

— Vamos passar o dia deitados em uma praia.

— Só no dia depois de amanhã.

— Não ganho nem uma dica?

Nik aproximou-se alguns centímetros para brincar com os cabelos dela.

— Tem a ver com uma de suas obsessões.

— Não tenho nenhuma obsessão.

— Tem, sim. Fazem parte de seu espírito aventureiro. Mas não quero mais conversar. É minha vez de lhe dar um beijo de boa-noite.

— Acho que não conseguiria lidar com um desses agora.

— Que bom. Gosto quando você fica um pouco desprevenida. Dê-me um mês, Francesca. Com ou sem sua rendição, eu preciso sentir seu gosto de novo.

Ela ainda estava de costas para ele quando Nik começou a beijar-lhe o pescoço, subindo aos poucos até chegar do outro lado de Fran. Ele entrelaçou as pernas com as dela, esmagando-lhe o corpo contra o dele como havia tempos desejava. A boca de Fran o seduzia, o excitava para além da imaginação. Depois de trinta e quatro anos, aquilo finalmente estava acontecendo.

— Acho que você não tem ideia do que está fazendo comigo — murmurou ele com a voz febril. — Mas não quero que você pare jamais.

O corpo de Fran estremeceu de um jeito voluptuoso.

— Também não quero parar. Amo a maneira como você me faz sentir, mas as coisas estão acontecendo rápido demais, e nem sempre nós podemos ter o que queremos.

— Dê-me apenas um bom motivo.

— Muito em breve eu vou embora da Grécia. Não quero chegar ao ponto de sentir tanta dor que não consiga viver direito. Não sei as outras mulheres, mas eu não consigo ter um caso amoroso e passar para o próximo assim, sem pensar.

— Nós nos conhecemos nas circunstâncias mais singulares possíveis. Eu jamais o esquecerei e guardarei todos os momentos que passamos juntos para o resto da vida, mas isso não está certo. E a culpa disso tudo é minha. O charme dos Angelis funcionou direitinho comigo, mas agora você precisa me ajudar a ser forte.

Abalado pelas palavras dela, Nik levantou-se.

— Quer pelo menos ver o que planejei para amanhã antes de voltarmos para Atenas?

— Claro.

Com medo de que, se a beijasse novamente não iria conseguir parar, Nik afastou-se o máximo que podia. Sem ela em seus braços, a noite ia ser infindável.

O helicóptero os aguardava em Pironia. Com a ajuda de Nik, Fran subiu a bordo depois que eles tomaram um café da manhã substancial. O sol já estava quente,

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prometendo um dos dias ensolarados pelos quais a Grécia era famosa naquela época do ano.

Ela sentiu o olhar do piloto ao sentar-se e prender o cinto. Ele era atraente e usava uma aliança. Por causa dos comentários de Nik da noite anterior ela estava atenta a tudo.

Nik entregou-lhe um binóculo.

— Nós vamos conhecer lugares belíssimos. Você vai querer usar isso. — Assim que ele prendeu o cinto, os rotores entraram em ação.

O estômago de Fran deu voltas. Ela ficava tranquila voando, mas achava que nunca iria se acostumar com decolagens e aterrissagens. Mas, então, castigou-se por pensar isso, pois provavelmente jamais iria voltar a voar de helicóptero depois que voltasse para casa.

Casa. Estranho como a palavra soava tão remota. A aventura grega das duas amigas acabou se transformando em algo tão mais extraordinário que Fran sentia como se tivesse se tornado parte do local. Era como se seu mundo começasse e terminasse com ele e a pequena Demi. Como seria a vida quando não houvesse mais Nik e nem aquela doce garotinha? Ela não suportava pensar nisso, e mal podia esperar para segurar aquela garotinha de novo.

Um tempo após a decolagem, ela se inclinou e perguntou:

— Para onde vamos? Ainda é segredo?

Ele ligou o comunicador:

— À esquerda você pode ver que estamos nos aproximando de uma península estreita. O nome dela é monte Athos.

— Você está de brincadeira! Digo, vamos mesmo para lá? Mas mulheres não são permitidas!

— Verdade, mas como você está louca para conhecer o lugar, vou mostrá-lo daqui de cima.

— Oh, Nik... Isso é a coisa mais excitante que já aconteceu em minha vida!

— Esse lugar é um tesouro nacional, mas você já deve saber disso. Ainda assim, vendo daqui de cima você entenderá melhor por que ele é chamado de Montanha Sagrada. Acho que é um dos lugares mais bonitos da Terra.

— Você já veio para cá?

— Quando fiz dezoito anos, meu pai me trouxe aqui com meus irmãos. Para mim, era como uma fantasia. Os monastérios marcam a paisagem por todo o lugar. Como você vai ver, alguns são tão grandes como castelos. Meu favorito é o Monastério de Saint Docheiariourthe, situado bem diante do mar Egeu. A praia é imaculada, pois os monges não têm o costume de nadar.

— Eu invejo essa sua experiência.

— É uma lembrança que nunca vou esquecer. Nós andamos por todos os lugares, descobrimos cavernas que ainda abrigavam eremitas. Você sabia que muitas igrejas possuem mais ouro do que muitos países? A beleza da arquitetura do local e de seus ícones é admirável.

— Todos os monges são gregos?

— Não. São de todos os países ortodoxos do mundo e alguns são da parte não-ortodoxa. Você notará que os jardins são mantidos com meticulosidade. O lugar como um

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todo possui uma atmosfera espiritual.

— Montanhas me parecem ter essa aura, com ou sem monastérios. Eu senti isso ontem no topo do monte Olimpo. Aliás, em suas viagens, você chegou a escalar o monte Sinai?

— Ainda não. Talvez um dia. Ouvi dizer que há monastérios lá também.

O coração de Fran doeu ao pensar nele viajando para lá sem ela.

O piloto aproximou o helicóptero o máximo possível para que ela tivesse uma vista privilegiada da península. Nos vinte minutos seguintes Fran banqueteou-se com a vista maravilhosa diante de seus olhos. Ela sabia que seus murmúrios de exclamação estavam divertindo os homens, mas não conseguia evitar. O lugar era incrível. Nik apontou seu monastério favorito.

— Posso ver o porquê. O mar forma um pano de fundo indescritível. — E ele amava a água.

— Se estiver tudo bem com você, vamos agora para Tessalônica.

— Não acho que eu conseguiria enjoar desse lugar. Muito obrigada por esse privilégio. Obrigada por nos trazer até aqui em total segurança, Keiko. Estou deslumbrada com sua experiência.

— Ele é o melhor no que faz — Interpôs Nik, ao que o piloto apenas sorriu.

Um tempo depois eles aterrissaram no heliporto do aeroporto, onde um luxuoso carro esporte negro os aguardava. Nik a levou até ele e a ajudou a entrar.

— Pedi que meu motorista trouxesse meu carro favorito para voltarmos dirigindo para Atenas com todo o tempo do mundo. — Depois de guardar as malas, ele se sentou atrás do volante.

Então ele colocou a mão na coxa de Fran, fazendo com que ela arfasse.

— Como o carro está levando uma carga preciosa, prometo não correr muito.

— A que velocidade ele chega?

— Trezentos e vinte quilômetros por hora. — Depois de uma pausa, ele acrescentou: — Se quiser que eu alugue um carro, tudo bem. A escolha é sua.

Ela percebeu o brilho de excitação nos olhos escuros de Nik e por nada do mundo o privaria daquele prazer. Além disso, ela nunca tinha entrado em um carro esporte antes. Com Nik todas as suas experiências eram uma primeira vez, mas a pessoa dele não precisava de elogios e incentivos. Ele era um dos homens mais cativantes do mundo — com uma queda por ela.

— Muito bem, querido — disse ela de forma arrastada, exagerando na imitação do sotaque do Texas. — Por que você não me mostra seu famoso talento atrás do volante?

Uma explosão de risadas ecoou de dentro do carro.

Fran dissera as palavras mágicas. Nik estava em seu hábitat natural, e ela lhe dera permissão para ser ele mesmo. Essa era uma das coisas que ela mais gostava nele. Nik considerava os sentimentos dela antes de fazer qualquer coisa. O fato de sempre a colocar em primeiro lugar lhe garantia uma vaga na classe de seres humanos muito especiais.

Ele não era exibido de forma alguma — e era exatamente por isso que ela queria vê-lo livre das preocupações e se divertindo. Um segundo depois eles entraram na rodovia e, com a costa limpa, praticamente voaram na pista. Nik exibiu-lhe um sorriso que

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dizia que não tinha nenhuma preocupação no mundo. Era maravilhoso vê-lo feliz depois de toda a dor por que passara.

O homem parecia estar no paraíso, dirigindo com a habilidade dos verdadeiros pilotos de corrida que ela vira pela TV. O entusiasmo dele a dominava.

Os dois por fim chegaram ao limite da cidade adjacente. Ela virou-se para ele:

— Tenho certeza de que você teria se dado bem no mundo da corrida.

Nik olhou para ela.

— Eu tive muita vontade, mas então uma novidade mais instigante surgiu na minha vida.

— Você é como eu, sempre querendo ver o que há depois da próxima curva, com medo de perder alguma coisa.

— Isso nos descreve muito bem, Fran. Como você mencionou o monte Sinai, gostaria de escalá-lo comigo?

Ela piscou.

— Antes de eu voltar para casa, você diz?

— Por que não? Nenhum de nós já fez isso. Será uma primeira vez que teremos juntos.

Fran balançou a cabeça.

— Eu não poderia me aproveitar da sua generosidade dessa forma.

— Acho que está com medo que eu me aproveite de você, então eu vou fazer uma promessa. Ontem você perguntou se poderíamos ser apenas amigos para terminarmos nossa escalada até o topo do monte Olimpo. Eu estava frustrado demais para conseguir concordar. Porém, se você me der uma segunda chance, eu gostaria de passar mais tempo com você. Viajaremos apenas como dois amigos, e nada mais.

— Oh, Nik...

— Estar com você me fez esquecer os problemas por um tempo. Adoro essa sensação de liberdade. É fácil conversar com você, é fácil estar com você quando não estamos falando. Eu gosto da sua companhia. Honestamente, você não consegue dizer que sente o mesmo em relação a mim?

Nik já sabia a resposta para aquela pergunta. Como ela poderia lhe dizer não, sabendo ele estava sendo totalmente sincero? Naquela viagem ele vira e sentira o peso dos anos sobre ele. Ela tivera um vislumbre do Nik jovem e livre de responsabilidades que existira antes do acidente. Com ele, Fran também se sentia livre.

Os dois eram bons juntos. Bons um para o outro. Eles trocaram confidências, e ela sentia que podia confiar nele. E depois do que lhe dissera sobre confiança, isso significava muito.

— Muito bem. Você me convenceu a viver perigosamente um pouquinho mais.

Como resposta o carro disparou, deixando-a zonza. Entre as curvas zigue-zagueantes, ela demorou dez minutos para voltar a falar.

— Odeio dizer isso, mas você está alto de adrenalina.

— Mas você não se importa — disse ele, com uma confiança que parecia ser parte integral de si mesmo.

— Não. — Não me importo. Ela olhou pela janela do passageiro. Seu coração

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palpitava com tanta força no peito que ela não conseguia emitir som algum.

Eles dirigiram até o próximo vilarejo, onde ele parou em um posto. Depois de desligar o motor, soltou o cinto e se voltou para ela.

— Vou dar um pulo lá dentro e pegar algumas coisas para comermos dentro do carro mesmo. Agora que temos novos planos, mal posso esperar para chegar até Atenas. Você gosta de carneiro?

— Eu adoro. — A resposta dela ocorreu concomitantemente com o som da vibração do celular dele. — Não vai atender?

Ele olhou quem estava ligando.

— É Sandro. Que estranho.

— Talvez seja melhor você atender.

Ele lhe lançou outro olhar de parar o coração.

— É a sra. Atlas que está falando agora? — provocou ele.

O som da risada dela encheu o carro enquanto ele abria a mensagem de texto. O título da mensagem de Sandro era Emergência:

Demi começou a ter febre de noite e desde então não parou de chorar. Mamãe não conseguiu baixar a temperatura dela e chamou um médico. Ele disse para a levarmos para o hospital em Míconos. É onde estamos agora. Não sabemos se é um resfriado ou se ela ainda está sofrendo por causa do trauma. Ela não quer comer e nem beber. Prometi para mamãe que eu manteria você informado. Ela quer todo mundo aqui.

Nik pressionou responder.

Estou no carro a aproximadamente 260 quilômetros de Míconos. Devo chegar aí em duas horas. Mande um helicóptero me esperar na doca.

E um motorista para cuidar do meu carro. Mantenha-me informado.

Fran o encarou enquanto ele guardava o celular.

— Algo muito sério colocou linhas de preocupação em seu rosto. Diga o que está errado.

— Seus instintos estão certos. Demi voltou para o hospital.

— Oh, não... — Lágrimas surgiram dos olhos dela. — Não a nossa pequenina...

— A febre não quer baixar. Temo que minha mãe esteja desesperada. Espere aqui por mim. Vou voltar com a comida. Sandro me manterá informado se algo pior acontecer.

Fran observou as pernas longas e poderosas de Nik levarem-no para dentro do posto. Ela sentia que os planos de levá-la ao monte Sinai ficariam em espera para sempre. Nenhum dos dois conseguiria pensar com a pequena Demi no hospital.

Nik voltou antes que ela percebesse.

— Fico feliz por estarmos neste carro. Temos de chegar ao porto em duas horas. O helicóptero nos levará ao hospital.

Ela abriu os sacos de comida e distribuiu-a.

— Seus irmãos me disseram que Melina nunca deixou Demi com outras pessoas,

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então não estou surpresa que ela esteja agindo assim. Claro que ela fica confortável com a sua família, mas seu elo era com os pais. Pelo visto, essa transição vai levar mais tempo que eu pensei.

— Concordo. Quando chegarmos ao hospital, vou marcar uma consulta com um psiquiatra infantil. Quero outras opiniões além da do pediatra. E há também outra possibilidade. Talvez ela tenha ferimentos internos, assim como eu tive quando estava escalando o monte Everest. Cair de costas pode ter ferido algum órgão vital, causando muita dor.

— Lembre-se de que ela estava bem quando você a levou para casa.

— Muitas vezes, ferimentos internos demoram a aparecer.

— Se isso for verdade, o médico descobrirá. Ela vai ficar bem, Nik. Aquela criança sobreviveu a um tornado. Vocês estão fazendo o possível por ela.

Ele fez um careta.

— Mas e se tudo isso não for suficiente? Se nossa família perdê-la...

Ela tocou-o no braço.

— Nem pense nisso! — Porém, lá no fundo, ela também estava preocupada com isso. Adorava aquela criança. Aquele era um território completamente novo para ela. O amor dele pela sobrinha nunca fora tão evidente.

— Eu gostaria de poder ajudar.

— Você já está ajudando, simplesmente por estar aqui comigo. — Ele agarrou-lhe a mão, entrelaçando os dedos. Mas logo ele precisou soltá-la para responder outra mensagem. Elas continuaram chegando com informações até os dois chegarem ao heliporto perto das balsas.

Mais uma vez, correram para o helicóptero.

— Vamos para o hospital de Míconos.

Fran se sentou no lugar de sempre e prendeu o cinto. Suas emoções estavam em tamanha ebulição que ela mal percebeu a decolagem. Descobriu-se repetindo um novo mantra: Não pode ter acontecido nada de grave com Demi. Não pode.

A viagem até a ilha parecia infinita. O piloto aterrissou perto do pronto-socorro do hospital de Míconos. Nik ajudou Fran a descer, então pegou as bagagens e ambos correram para dentro.

— Cosimo disse que ela está em um quarto particular maior para acomodar a família. Fica por aqui, nesta ala.

No instante em que abriram a porta, a família caiu sobre Nik como se ele fosse o salvador. Ele era a força em volta da qual todos gravitavam, pois tinha aquela aura intangível que fazia todos se sentirem bem.

Fran se sentiu péssima por ter tentado fazer com que ele se afastasse um pouco da família. Ainda assim, por outro lado, ela o vira livre das responsabilidades por alguns dias, e ele se tornara um homem diferente, revitalizado.

Nik virou-se para Fran. Depois que todos a cumprimentaram, ele a levou até o berço. Demi estava deitada ali, com um soro preso ao pezinho. Ela ainda estava com febre.

— A temperatura ainda está muito alta — sussurrou Nik.

Fran olhou para a mãe dele. Ela era uma mulher elegante, com mechas prateadas

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adornando os cabelos pretos curtos.

— Já fizeram todos os testes necessários?

A sra. Angelis assentiu, agarrando a borda do berço.

— Eles não conseguem encontrar nada de errado. Os médicos estão perplexos.

— Ela tem dormido?

— Não, mas eles lhe deram algo para ajudá-la a descansar, para a febre baixar.

Nik colocou o braço ao redor dos ombros da mãe.

— Ela deve estar sentindo falta de Melina.

Os olhos da mãe dele se encheram de lágrimas.

— Ela era a melhor mãe do mundo. A maneira como foi tirada de nós foi muito brutal. Eu me sinto tão inútil. Minha querida Demitra.

— Ela vai sair dessa, sra. Angelis — garantiu Fran. Porém, lá no fundo, estava arrasada por ver Demi ali deitada, enferma. Lembrou-se de como a encontrara no jardim do hotel. — A saudade dos pais pode causar uma série de sintomas, mas eles não duram para sempre — disse ainda, tentando ao menos convencer a si mesma.

O pai de Nik, cujos cabelos grisalhos começavam a rarear na parte de cima, parou do outro lado do berço.

— Claro que não vai durar para sempre.

Incapaz de se segurar, ela acariciou os cachinhos negros da menina com os dedos.

— Demi, querida? É Fran. O que foi?

Nik abraçou a cintura dela.

— Cante para ela. Talvez sua voz consiga dar ânimo a ela.

Fran cantou várias cantigas, mas não houve resposta. Ela achou que o coração fosse se partir e então começou outra. De repente, os olhos de Demi se abriram e se voltaram para Fran. A menina então choramingou e estendeu o bracinho para ela.

Todos ficaram em silêncio no quarto, e todos os olhos se voltaram rapidamente para o bebê.

— Vá em frente, pegue-a no colo — murmurou Nik.

Ao ouvir o pedido, ela abaixou-se e pegou a menina nos braços.

— Olá, minha doçura. Você acabou de acordar? — Fran tomou cuidado com o soro preso ao pé dela.

Demi se aconchegou nos braços dela. Era quase como se dissesse que sentira sua falta. A demonstração de afeto foi demais para Fran, que precisou esconder o rosto entre os cachos da menina por um instante. Ela beijou-lhe a testa e as bochechas.

— Eu também senti sua falta. E seu tio Nik também.

Ela fez sinal para que ele pegasse a sobrinha no colo, mas Nik balançou a cabeça.

— Ela quer você.

De canto de olho, ela notou o resto da família. Eles pareciam bastante abismados.

— Vamos ver se com você ela pega a mamadeira. — Ele se voltou para a mãe.

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— Você trouxe alguma?

— Oh, sim. Há várias na bolsa de fraldas sobre a mesa.

Nik pegou uma e a levou até Fran. Depois de puxar uma cadeira até o berço, ele a convidou para se sentar e ver se Demi queria tomar um pouco de leite.

Fran então se sentou, ninando a criança.

— Você está com fome, minha coisinha fofa? Vai um pouco de leite? — Ela colocou o bico na boca da criança, sem ter ideia do que aconteceria em seguida.

Exclamações de surpresa surgiram de todos quando Demi encarou Fran com aqueles lindos olhos castanhos e começou a mamar. Os pais de Nik, exaustos, sorriram para ela com lágrimas nos olhos. Sua expressão de alívio falava por todos. Os irmãos de Nik abraçaram-no, felizes.

Sem saber o que dizer, ela olhou para Nik.

— Eu sinceramente não sei por que Demi responde a mim.

Os olhos negros dele estavam com brilho suspeito.

— Você a resgatou do jardim e foi a primeira pessoa a mostrar amor por ela quando Demi acordou. Acho que não precisamos procurar por outras respostas. E vocês? — Ele olhou primeiro para ela e depois para todos da família.

O pai dele secou o rosto molhado de lágrimas.

— Nosso problema agora, Kyria Myers, é convencer você a ficar conosco até Demi se sentir confortável novamente com todos.

— Ela só piorou depois que você e Nik partiram da ilha — informou a mãe dele.

— Por favor, fique. — Fran podia sentir o coração dela na voz.

Aflita pelo medo do que estava acontecendo ali, Fran não conseguia olhar para eles.

— E, então, qual a sua decisão? — Nik ainda deixava a decisão final em suas mãos. E Fran o a amava por isso.

CAPÍTULO 8

— Mas é claro que vou ficar.

Como se Fran precisasse ser convencida...

Demi capturara seu coração no instante em que Fran a encontrara em meio aos arbustos. Ela podia ser sangue do sangue de Nik, mas Fran também a amava.

— Não será incômodo algum ajudar.

Ele tocou-lhe o ombro, fazendo-a sentir um novo tipo de calor humano.

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— Vou contar ao médico. Assim que ele a liberar, iremos para casa juntos. — Perto do ouvido dela, ele sussurrou:

— Deixaremos a escalada no monte Sinai para depois.

Não. Não iriam. Mas aquele era um desejo bonito que ela estimaria para sempre.

Depois de quinze minutos eles tiveram permissão para deixar o hospital. Ficou decidido que Fran seria levada na cadeira de rodas até o lado de fora segurando Demi para evitar que a menina adoecesse de novo.

A família viera em dois carros. Nik a ajudou a entrar no carro dos pais antes de se sentar ao lado dela. Os irmãos o seguiram. A cena toda era tão surreal que ela precisou se beliscar.

Qualquer pessoa que a visse pensaria que se tratava de uma mãe de primeira viagem — exceto que Demi já estava grande e o tom de pele dela era completamente diferente da de Fran. Ainda assim, imaginou como seria a sensação de estar levando um filho para casa pela primeira vez. Como desejava que Demi fosse realmente dela! Bebês eram milagres, e aquele ali era ninguém menos que o bebê milagroso de quem toda a Grécia estava falando!

Ao chegarem à villa, Nik carregou as bagagens de Fran até a suíte onde ela ficara anteriormente.

— Vamos dar um banho nela.

Os dois trabalharam em harmonia. Ele pegou tudo de que ela precisava para dar um banho em Demi e depois encheu a banheira. Juntos lavaram os cabelos dela, brincando ao mesmo tempo. Demi chutava o ar com as perninhas.

— Isso, Demi, chute com mais força. — Com o encorajamento dele, a menina bateu a perna na água e molhou o rosto, mas não chorou. Ambos se acabaram de rir.

— Você é uma garota muito forte!

Depois de enrolá-la em uma toalha, Nik a carregou até o quarto e a colocou sobre a cama. Fran colocou um pouco de talco nela, antes de vestir a fralda e um macacãozinho de dormir. Nik secou os cabelos e penteou os cachos.

— É hora de tirar a temperatura dela. Vou pegar o termômetro. — Fran correu até a penteadeira. — Aqui — disse, entregando o instrumento a Nik.

Fran segurou a respiração enquanto ele conferia os números. Depois de alguns segundo, ele a olhou.

— Trinta e sete graus.

— Maravilha! Você está quase novinha em folha. — Ela beijou a barriga da bebê, fazendo-a rir e gorgolejar.

— Vamos levá-la até o pátio. Quando todos a verem feliz, ficarão despreocupados e terão uma boa noite de sono. — Nik a levou para fora. O crepúsculo caía sobre eles, a hora mística que dava à villa um brilho especial.

Dessa vez a família não a pegou. Deixaram Nik no comando. Ele se sentou no balançou e gesticulou para que Fran se sentasse a seu lado.

— A temperatura dela abaixou. Vocês ficarão felizes em saber que Fran concordou em ficar por mais alguns dias para nos auxiliar. Com sorte, a vida logo voltará ao normal.

— Demitra não é a mesma criança que levamos ao hospital esta manhã — reparou a mãe dele. Ela olhou para Fran. — É simplesmente inacreditável como ela responde a

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você. Estamos gratos por ainda estar conosco.

Fran sentiu-se na obrigação de responder.

— Antes do tornado, Kellie e eu estávamos indo para o monte Olimpo.

— Ah, você gosta de escalar? Nosso Nikolos também.

— Foi o que eu descobri. Kellie não estava bem, e ele me levou até lá. E hoje de manhã sobrevoamos o monte Athos.

— Um lugar intrigante — comentou o pai de Nik.

— Para vocês, homens — brincou Fran. Todos riram.

Nik lançou-lhe um olhar com a mensagem privada de que estava ansioso para escalar o monte Sinai com ela.

— Nós levantamos cedo e fizemos uma longa viagem até aqui. Se vocês nos dão licença, vamos colocar Demi para dormir e nos veremos pela manhã.

O pai assentiu, mas ela percebeu seu olhar especulativo quando eles se levantaram. A família sabia que Nik não ficava muito tempo com a mesma mulher. Ela sabia que os irmãos estavam igualmente curiosos.

— Nik? Sinto que seus pais querem falar com você. Por que não deixa Demi comigo? — Ela tirou a criança dos braços dele.

— Mas não vou demorar.

— Leve o tempo que precisar.

Fran ficou feliz em escapar para a suíte. Sentou-se ao lado da cama para dar uma mamadeira para a criança. Depois de cantar algumas músicas, o bebê dormiu em pouco tempo, surpreendendo-a. Talvez ainda tivesse um pouco do sedativo no organismo dela. Juntando isso ao cansaço, ela não tinha dúvidas de que Demi ia dormir a noite toda.

Fran saiu de mansinho do quarto do bebê e checou o celular. E encontrou duas mensagens. Uma da mãe, perguntando o que andava aprontando. Fran não tivera a chance de contar nada para ela. A outra era de Kellie.

Estou tentando falar com você há dois dias. O que está acontecendo?

Por que você não me ligou?

Fran olhou o relógio. Ainda estava cedo na Filadélfia. Enquanto esperava Nik voltar, decidiu ligar para a amiga.

— Kellie?

— Graças a Deus, é você. Estava começando a ficar preocupada.

— Desculpe. Tanta coisa aconteceu depois que você foi embora de Atenas que eu mal sei por onde começar. Mas, antes de falar de mim, preciso saber como você está. Seu tio e sua tia já devem saber de tudo agora.

— Sim, e eles estão sendo maravilhosos. — Fran ouviu as lágrimas na voz dela.

— E Leandros? Ainda está aí?

— Não. Pedi que ele fosse embora, mas prometi ligar quando estiver pronta para conversar. Ele finalmente desistiu e voltou para Atenas.

Fran se sentou na beirada da cama.

— Você está se sentindo fisicamente bem?

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— Não. Minha tia disse que vai me engordar.

— Você perdeu alguns quilos desde a Páscoa.

— Chega de falar de mim. Você vem logo para casa?

Fran respirou fundo.

— Não por enquanto.

— Como assim?

Ela segurou com mais força o telefone.

— Demi foi para o hospital de novo, desta vez com muita febre.

— Você está brincando.

— Bem que eu queria. Ela ainda sente falta dos pais, e a família não sabe mais o que fazer.

— Demi ainda procura você?

Fran não ia mentir para a amiga.

— Sim. A família de Nik está muito chateada com isso. Ninguém sabe dizer o porquê. O temperamento dela melhorou depois que a trouxemos para a villa. É inacreditável.

— E Nik...

— Não, Kellie — interrompeu Fran, lendo os pensamentos dela. — Ele não mencionou a palavra babá de novo. Amanhã vão se consultar com um psiquiatra infantil para descobrir o que está acontecendo com Demi. Prometo não ficar muito mais tempo aqui.

— Oh, Fran... Por que você não voltou para casa no voo que Leandros reservara para você?

Boa pergunta.

— Por que Nik se convidou para me levar ao monte Olimpo antes de eu voltar para os Estados Unidos.

Depois de um silêncio carregado.

— Você foi?

— Sim. Na descida ele recebeu a mensagem de que Demi estava no hospital de novo. — Uma mentirinha podia ser perdoada.

— Ela é a prioridade número um dele. Eu estive lá antes e depois do funeral. Era perceptível que ele colocava Melina em um pedestal e faria qualquer coisa por ela. Eu ouvi dizer que ele foi de vital importância para que ela e Stavros se conhecessem. Você sabia que já Nik sofreu um acidente feio enquanto escalava?

— Ele me contou.

— Você sabia também que Melina se prontificou a ficar ao lado dele no hospital e durante sua recuperação? A devoção dela para com Nik foi louvada no funeral.

Fran fechou os olhos com força. Ela não sabia disso.

— Se você ficar mais tempo, vai acabar cuidando desse bebê. É maneira dele de trazer Melina de volta.

Fran não achava que Nik tinha planos secretos, não depois de os dois terem aberto

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os corações um para o outro. Mas ela não podia evitar pensar na pequena possibilidade que a amiga estivesse certa. Fran ainda estava na Grécia por livre vontade, sem previsão de quando voltaria. Sua ligação com Demi se fortalecia cada vez mais. E a com Nik também.

— Ainda está aí? Está me ouvindo?

— Sim.

— Lembra-se do velho clichê sobre laços de sangue serem mais fortes do que qualquer outra coisa? Então, acontece que é verdade. Pode acreditar, eu sei. Depois de me casar com Leandros, eu tenho a prova.

Para Kellie, Karmela transformara seu casamento em um caso a três. Talvez houvesse um pouco de verdade nisso, mas Fran sabia que deveria haver outras coisas envolvidas. Kellie tinha muita dificuldade em falar de seus medos mais profundos. Fran duvidava que ela falasse deles com Leandros.

— Está ouvindo o que estou dizendo, Fran?

— Sim. — Ela teria dito mais coisas se não tivesse ouvido um barulho. Nik entrou e fechou a porta. Virando-se de costas para ele, Fran disse: — Desculpe,

Kellie, mas eu ligo para você mais tarde. Prometo.

Ela desligou e virou-se.

— Estava falando com Kellie.

Nik ficou parado aos pés da cama com as mãos na cintura.

— Ela está bem agora, junto dos tios? Ela foi criada por eles, certo?

— Sim. Fisicamente está bem, mas emocionalmente, eu nunca a vi tão devastada. Leandros voltou para Atenas.

— Sinto muito ouvir isso, especialmente porque a dor dela parece ferir você também.

Fran estava destruída por causa da conversa com Kellie.

— Tenho de admitir que estou preocupada com eles.

— Sinto muito, mas preciso dizer boa-noite. Depois do café, poderemos andar de barco com Demi. Com sorte o médico ligará amanhã com novas informações.

— Seria ótimo. Boa noite, Nik.

Para seu desagrado, Fran queria que ele a agarrasse e a beijasse até deixá-la atordoada, mas Nik era um homem de palavra e não tentou nada. Ele entrou no quarto de Demi, e da porta ela o observou acariciar os cachos da menina. O doce momento a deixou às lagrimas.

Os olhos de Nik pareciam duas piscinas negras na semiescuridão.

— Kalinitha, Fran.

Uma brisa gentil inflava a vela. Com a superfície do mar Egeu cintilando como diamantes, Fran sentia que estava no céu.

— Para onde vamos, Nik?

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Ele manejava os remos com a mesma habilidade com que fazia outras coisas. De calção de banho e uma camiseta azul que revelava o corpo musculoso, ele estava espetacular.

— Delos. É aquela ilhazinha que você vê daqui. Os Jônios a colonizaram em 1000 a.C., tornando-a sua capital religiosa. Há um motivo específico para eu estar nos levando para lá.

— Há uma estátua de Atlas lá? Se tiver, quero tirar uma foto.

Ele sorriu.

— Desculpe desapontar. Ele mora muito longe daqui, na África.

— Claro. Na cordilheira do Atlas. Tinha me esquecido.

— Delos foi o berço de Apolo e Artêmis, mas isso não é muito interessante.

Ela beijou a bochecha de Demi.

— Somos todos ouvidos, não somos, querida?

— A ilha acabou por se tornar um lugar tão sagrado que ninguém era permitido nascer ou morrer ali.

— Mentira!

— Aqueles que estavam prestes a deixar ou a entrar neste mundo eram levados às pressas para a ilhota de Rinia.

Ela riu.

— Às vezes, nenhuma dessas coisas pode ser evitada.

— O que me faz lembrar as regras do monte Athos.

— Estava esperando você fazer essa conexão. Pelo menos aqui em Delos homens e mulheres podem conhecer as ruínas e as praias.

— E crianças? São permitidas?

— Sim, mas Demi terá de esperar até ter 6 ou 7 anos. Hoje, vamos apenas dar a volta na ilha. Enquanto os outros turistas passeiam por lá, vamos poder relaxar e ver as ruínas do deque.

— O dia está maravilhoso para fazermos turismo.

— Com uma brisa leve, meu tipo favorito.

Ela sentiu o olhar dele.

— Qual o nome do seu barco? Não sei ler em grego.

— Phorcys.

— Uma criatura mitológica?

— Com certeza. Eu cresci ouvindo os mitos. Quando era criança, botei na cabeça que, quando fosse grande o suficiente para comprar meu próprio barco, eu o nomearia em homenagem ao deus do mar da antiguidade, que habita as profundezas mais ocultas e perigosas.

— Isso soa exatamente como algo que Atlas faria.

Uma risada reverberou do peito dele.

— Ele se parece com você?

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— Quer saber, um dia eu virei só com você para Delos. — Não diga uma coisa dessas, Nik. Em alguns dias eu irei para casa e você nunca mais me verá. — Vamos caminhar até o ponto mais alto da ilha, onde eu vou lhe mostrar um antigo mosaico dele. Atlas é um deus de cabelos grisalhos e rabo de peixe, com a pele espinhosa de um caranguejo e patas dianteiras, que carrega uma tocha.

— Minha nossa. Acho que ele conseguia muito bem manter as pessoas afastadas. — Eles estavam se aproximando da ilha.

— Ele era muito bom nisso — Nik brincou. — Com a esposa, Ceto, eles tiveram filhos monstruosos, conhecidos como as Greias, as Górgonas, Equidna e Ladão.

— Que terrível! Que triste eles nunca terem tido uma criança linda como Demi. — Fran a colocou sobre o ombro e a abraçou. — Se os deuses existem mesmo, teriam inveja da filha de Melina. E mesmo sem eles, ela terá de ser muito bem protegida.

E Nik se certificaria disso.

Pela próxima hora eles circundaram lentamente a ilha, mas na maior parte do tempo Fran simplesmente brincou com a criança, que ficava de pé com sua ajuda e pulava quando Nik falava com ela. Demi balbuciava muito, o que fazia com que os dois rissem bastante.

— Ela está feliz e está dizendo que ir para a praia.

— Sei que você quer, Demitza, mas você não pode ter tudo que deseja.

— Acho que está ficando quente demais para ela, Nik.

— Pode ir na frente enquanto eu prendo o barco.

Fran desceu os degraus até o quarto e trocou a fralda da menina, antes de levá-la até a galeria para lhe dar comida.

— O que minha princesinha quer de almoço? Que tal carneiro e pêssegos?

Depois de um tempo, Nik apareceu. Com sua pele cor de oliva, ele não precisava de muita exposição ao sol para se transformar em um deus de bronze.

— Não há nada de errado com o apetite dela — observou Nik. Ele se sentou ao lado da criança e ficou observando-as. Fran mal conseguia respirar com tamanha proximidade. Ela podia sentir até o cheiro do sabão que ele usara, seu calor.

— Termine de dar papinha para ela, enquanto eu vou tiro a comida da geladeira. — Qualquer coisa para que ela não se concentrasse nele.

Demi obviamente adorava Nik e se divertia à beça com ele. Entre sorrisos e risadas, ela ficava cada vez mais encantada com o tio. Nik seria um pai incrível futuramente. Demi tinha sorte em tê-lo em sua vida. Só não sabia o quanto.

Fran colocou a comida na mesa — salada e pães, frutas frescas, doces folheados e suco. Um banquete.

— Isso está delicioso — Ela sorriu para ele. — Vejo que também não há nada de errado com seu apetite. — Nik comera sem reservas.

— É porque você está aqui comigo e com Demi. Nós combinamos muito bem, sob as condições certas. — Venha, pequenina. É hora de dormir. — Ele a pegou e a levou para o quarto.

Fran o seguiu com uma mamadeira. Depois de colocá-la na cadeirinha e acionar o mecanismo que também a tornava um balanço, ele lhe deu a mamadeira. Demi olhou para eles e deu o sorriso mais doce que Fran já vira.

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Nik levou Fran até a cama ali perto.

— Teremos de ficar aqui até ela dormir, então é melhor ficarmos confortáveis.

Ela deitou-se de lado, olhando para a criança. Nik aproximou-se e colocou o braço ao redor da cintura dela.

— Isso é o que eu chamo de paraíso.

Eles ficaram ali por um tempo. Fran estava muito feliz nos braços de Nik, e o som do balanço tinha um efeito hipnotizante nela. Demi acabara de adormecer.

Fran suspeitava que o balanço suave das ondas havia feito Nik adormecer também, mas se enganara. Com um movimento inesperado ele a rolou para o lado, deixando-a quase de frente para ele.

— Shhh — disse ele contra os lábios dela antes de sua boca faminta cobri-los em um beijo longo e lânguido, incendiador. — Sei que prometi ser apenas um amigo — sussurrou roucamente. — Mas não vai dar. Não posso parar o que estou sentindo. — Nik tremia. — Eu nunca quis tanto uma mulher na minha vida como quero você. — Seus dedos seguraram os cabelos dela. — Antes de eu me esquecer de todas as minhas boas intenções, é melhor você correr para o deque enquanto pode. Estou lhe dando essa chance.

Ela percebeu pelo tom constrito que ele falava a verdade.

Porém, quando finalmente encontrou forças para se levantar, Fran o ouviu gemer. Isso quase fez com que se jogasse de volta nos braços dele, mas ela olhou para Demi, dormindo na cadeirinha.

Nenhum dos dois vai ser seu. Vá para o deque, Fran.

Ao chegar lá em cima, tirou o vestido e se jogou na água. Já era fim de tarde, e as águas estavam mornas. Mas Fran não reparou nisso enquanto dava braçadas para aplacar a guerra dentro de si.

Será que deveria render-se a um único momento de paixão aos 28 anos para depois ter de viver o resto da vida sendo torturada pela lembrança? Ou deveria evitar o fogo? As duas opções eram insustentáveis. Ainda bem que a água ocultava suas lágrimas.

Quando Fran finalmente começou a nadar de volta para o barco, descobriu Nik se aproximando da borda com Demi no colo.

— Demi? Consegue me ver?

— Ela está pedindo para pular aí com você.

Um homem diferente emergia do quarto. Esse era calmo e reservado. Ela morreu um pouco por dentro, sabendo que aquele outro provavelmente não apareceria de novo. Como dissera, ele dera uma chance a Fran. Agora ela sofria as consequências.

— A água está maravilhosa. Eu vou subir para você poder entrar e relaxar.

Nik jamais relaxaria novamente. Uma febre acometeu-lhe desde o primeiro instante em que vira Fran. Ele já dera algumas braçadas de manhã, quando a água estava mais fria, mas isso não o ajudara. Havia só um remédio para aquela febre.

Com medo de tocá-la, ele deixou que ela subisse sozinha a bordo. Depois de colocar o vestido, ela se sentou ao lado de Demi, que Nik colocara na cadeirinha.

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— Não quer nadar?

— Talvez de noite. Prefiro aproveitar a brisa da tarde para voltarmos.

— Claro. Quanto tempo ela dormiu?

— Ela dormiu até cinco minutos atrás.

— Ela não parece estar com fome ainda. Acho que vou segurá-la um pouco.

Fran não conseguia ficar longe de Demi. Sentou-se com ela no banco, dando beijos em sua barriguinha, fazendo-a rir. Enquanto isso, Nik os levou de volta a Míconos.

Eles desceram do barco e foram para dentro da villa. Não havia ninguém no pátio — o que era bom, pois assim nenhum dos familiares notaria a tensão entre os dois.

— Vou começar o banho de Demi. — Fran disse sobre o ombro. — Quando ela estiver pronta, você pode levá-la para sua mãe.

Quando ele foi para o banheiro, Fran já estava terminando de lavar os cabelos da menina.

— Demi é um bebê tão bonzinho, é uma maravilha.

— Ela tem o jeito de Melina.

Quando Fran ergueu a criança da água, ele pegou uma toalha para secá-la e então lhe ocorreu que sua irmã realmente se fora. Lágrimas feriram-lhe os olhos. Ele segurou a sobrinha contra o peito enquanto lutava para manter a compostura.

— Tudo bem, pode chorar, Nik — murmurou Fran gentilmente. — Até mesmo Atlas precisa chorar de vez em quando. O problema é que as emoções pegam você nos momentos mais inesperados. Eu sei como é. É um clichê, mas a dor passa com o tempo.

Ele ergueu a cabeça.

— Vou tentar me lembrar disso. — Nik colocou a menina sobre a cama.

Sentindo-se um pouco melhor enquanto arrumava a sobrinha, a sensação de perda passou.

— Pronto, agora você está pronta para ver sua yiayia e seu papou.

— Como sabe essas palavras? — Ela continuava a surpreendê-lo de formas maravilhosas.

— Eu reparei no que as crianças diziam. Na França eu costumava passear pelo parque perto da escola e praticar meu francês com elas. Eles são professores maravilhosos, Kyrie Angelis.

Ouvi-la falando grego o deixava muito excitado.

— Estou impressionado.

— Por que você não leva Demi para seus pais? Quero tomar um banho para estar disponível quando eles precisarem de mim.

Nik encontrou os pais na sala, junto com os pais de Stavros. Ele estivera tão focado na própria dor que se esquecera de que eles também precisavam do amor de Demi. Quatro pares de olhos se iluminaram ao verem a neta se aproximar. Pelos próximos instantes ela passou de colo em colo. O jantar ia ser servido. Eles gravitaram até o pátio, onde a família se reunira.

Ele então voltou para a suíte de Fran, pois precisava muito conversar com ela.

— Fran?

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Nik prendeu a respiração quando ela abriu a porta, deslumbrante, recém-saída do banho.

— Presumo que esteja tudo bem com Demi.

— Eu a deixei com minha família. Vamos ver o que acontece. Antes de tomar banho, eu preciso conversar com você. É importante. Posso entrar?

— Claro.

Ele fechou a porta com as costas.

— O que aconteceu no barco me fez perceber que não posso continuar do jeito que as coisas estão.

Fran estava a alguns metros dele, esfregando as mãos nos quadris nervosamente.

— Nem eu. No banho tomei a decisão de ir embora pela manhã, custe o que custar.

— Eu tenho outra solução.

— Não há outra.

— Há, sim, mas eu não a mencionei porque nós nos conhecemos há pouco mais de uma semana. Quero que você se case comigo.

— Casar?

O mundo girou. Ela ficou zonza e sentou-se na beirada da cama. O aviso de Kellie soava em seus ouvidos: ele fará de tudo para que você cuide de Demi.

— Você não quer se casar comigo.

— Você está com medo de novo. — Ela desviou o olhar. O nervo palpitando na base de seu pescoço ameaçava estrangulá-la. — Você sabe que a excitação do momento vai passar.

— Eu nunca fui casado, mas você já. Essa é sua experiência negativa falando.

— Estou falando sério, Nik.

— E eu também. Estou esperando sua resposta.

— Você não está pensando direito. Por exemplo, eu não posso lhe dar filhos.

— Isso serve para nós dois. Nós adotaremos.

— Foi o que Rob disse.

— Não ouse me comparar com seu ex-marido. Para provar, nós deixaremos a papelada para a adoção pronta com meu advogado antes da cerimônia. Assim que estivermos casados, ele dará entrada no processo o mais rápido possível.

Ela balançou a cabeça.

— Você não sabe o que está dizendo. Ele segurou-lhe o rosto entre as mãos.

— Eu estou apaixonado por você, Francesca Myers. Não sei exatamente quando isso aconteceu e posso dizer que você sente o mesmo, mas está com muito medo de admitir.

Antes que ela pudesse dizer qualquer coisa, ele lhe deu um beijo ardente, o beijo de um marido com a intenção de possuir.

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— Não posso deixar que você vá embora da Grécia. Seu lugar é aqui.

Lágrimas escorriam pelo rosto de Fran.

— Você diz isso agora.

— Não sou Rob. Seu ex deixou grandes estragos em você, mas ele não representa a maioria dos seres do sexo masculino.

Ela limpou as lágrimas.

— Você me deixou deslumbrada, Nik.

— Desculpe, mas sou assim. No monte Olimpo você disse que eu era maravilhoso e que nunca mudaria de opinião sobre isso. Foi uma mentira?

Aquela vulnerabilidade de Nik foi uma revelação para ela.

— Você sabe que não.

— Então prove, dizendo o que eu quero ouvir.

Ela mordeu o lábio.

— Preciso pensar, Nik.

— Você ainda não confia em mim?

— Não é isso. É que as coisas estão acontecendo depressa demais. E as circunstâncias são diferentes. Eu já fui casada, você não. Você precisa começar com uma mulher sem um passado.

— Não se esqueça da legião de mulheres que eu já abandonei.

— Como eu poderia me esquecer delas?

Ele a abraçou. Depois de um tempo, Fran ergueu a cabeça e o encarou. Enquanto estava com coragem, ela precisava fazer uma pergunta. A felicidade do resto de sua vida dependida da resposta dele.

— Nik, tente ser o mais honesto possível. Vou fazer uma pergunta hipotética.

— Pode fazer.

— Se você tivesse me conhecido em circunstâncias diferentes, sem Demi, você acha que me pediria em casamento?

Um silêncio sombrio preencheu o quarto. Com o corpo rígido, ele não se moveu e ficou apenas a estudando como se Fran fosse uma espécie nova de inseto no microscópio.

— Kellie influencia você tanto a ponto de transformá-la em uma pessoa que eu não conheço?

— Isso não tem nada a ver com ela.

— Claro que tem. O que foi que ela disse?

— Ela estava com medo que você fizesse algo para me fazer cuidar de Demi.

O rosto de Nik se transformou em uma máscara inexpressiva.

— Acho que nunca saberemos se ela está certa ou não, correto?

Um arquejo de espanto escapou dos lábios dela.

Ele saiu pela porta com tanta rapidez que Fran ficou atordoada.

O que foi que ela fizera?

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CAPÍTULO 9

Nik correu para a praia. Depois de jogar a camisa na areia, mergulhou no mar e nadou até barco, do outro lado da doca. Era uma boa distância, mas também o exercício de que ele precisava. Pretendia subir a bordo, velejar sob o calmo luar e entregar-se a uma garrafa de uísque até ser engolido pelo esquecimento.

Depois de encontrar a garrafa que procurava, ele soltou as cordas e estava prestes a ligar o motor externo quando ouviu o que parecia ser uma voz chamando. Enfim, provavelmente era só uma gaivota. Colocou o motor em uma velocidade baixa, e o barco começou a lentamente se afastar da doca.

Foi então que ouviu a voz o chamando novamente, só que mais forte. Ele desligou o motor.

— Nik...

Ele virou-se para trás e viu uma figura dando braçadas no mar, tentando alcançá-lo.

— Espere por mim — gritou Fran.

Ele jogou-se na água e nadou até ela. Em pouco tempo levou-a até o barco e a ajudou a subir. Ela estava com as mesmas roupas de pouco tempo antes.

Nik rangeu os dentes.

— Você poderia ter quebrado o pescoço.

— Mas não quebrei.

Ele a levou para tomar uma ducha e trocar as roupas molhadas. Enquanto isso, preparou duas xícaras de café, tentando não pensar no motivo que a fez ir até ele.

Depois de um tempo ela apareceu na cozinha minúscula do barco, com um roupão azul. Ele lhe entregou uma caneca, da qual ela bebeu com prazer.

Nik recostou-se na bancada.

— Como você sabia que eu estava aqui?

— Eu fui atrás de você. Cosimo me viu e se prontificou a ficar com Demi. Eu corri o mais rápido que pude, mas você se move como o vento.

— Estava com pressa — murmurou ele.

— Eu sei. Foi tudo culpa minha. Perdoe-me. Kellie nunca fala desse jeito, mas os problemas no casamento a tornaram tão infeliz que ela não consegue imaginar mais nada dando certo para ela ou para mim.

— Isso não é problema seu.

— Acha que não sei disso? Ela chegou a todas as conclusões erradas do ponto de vista de alguém de fora, mas não sabe de uma coisa, Nik. Eu o amo. Você não sabe o

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quanto. — Ela abraçou o pescoço dele.

Ele a pegou nos braços e a carregou até a cama. Porém, depois de deitá-la, sentou-se na beirada.

— Nik, você precisa me perdoar.

— Eu é que preciso de perdão. Eu me apaixonei por você no instante em que a conheci e, para manter você na Grécia, usei Demi.

— Eu não acredito! — exclamou ela.

— Mas acho que prefiro este final. Ver você nadando em direção ao barco como se sua vida dependesse disso mostrou que eu estava errado sobre você.

O rosto dela iluminou-se.

— Chega de papo, então?

Ele riu.

— Ainda não. Vamos voltar para casa.

Meia hora depois, ele segurou-a pela mão, e, juntos, entraram de mansinho no quarto de Demi, que dormia. Ele a puxou para mais perto.

— Desde que estávamos no hospital em Leminos, eu sonho que nós nos casamos e a adotamos. Eu honestamente acredito que Melina a colocou em seu caminho para que você fosse a nova mamãe dela. É por isso que Demi é tão ligada a você.

Fran o abraçou com toda a força.

— Eu senti como se o céu tivesse me dado um presente.

— Vamos então adotar nosso bebê milagroso e lhe dar todo o amor do mundo. Depois, adotaremos mais crianças.

— Você está me fazendo muito feliz — suspirou ela no peito de Nik.

CAPÍTULO 10

Três semanas depois...

— Hora da naninha, querida. — Demi terminara o almoço. Fran a pegou da cadeirinha e a carregou pela cobertura até o quarto da menina.

Depois de trocar-lhe a fralda, Fran a pôs no berço e cantou uma canção.

— Agora, seja uma boa garota e durma. Tenho muito a fazer antes que o papai chegue em casa esta noite.

O relógio dizia uma e meia. Havia tempo de sobra para limpar a cozinha e aprontar as coisas para a noite. Ela até comprara um vestidinho preto, na esperança de deslumbrar o novo marido.

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O dia marcava o aniversário de uma semana de casados deles. Ela estava preparando as comidas favoritas de Nik para o jantar e queria que tudo ficasse perfeito. Fran pegara as receitas com a mãe dele e já ligara para ela duas vezes para ter certeza de que estava fazendo tudo direitinho.

Fran mal reconhecia mais o elegante apartamento de solteiro de Nik. A cobertura estava cheia de luz e mais espaçosa, e uma família morava ali agora. Ela estava tão feliz que chegava a ficar assustada.

Por causa do bebê, os dois não tiveram uma lua de mel oficial. Dali um mês esperavam que Demi já estivesse bem para ficar alguns dias longe deles, mas nada disso importava. No instante em que disseram seus votos na capela de Míconos, rodeados pelos familiares, eles se tornaram amantes insaciáveis.

O único desfalque no evento foi a ausência de Kellie. Depois de descobrir a verdade, ela ficou desolada por tudo que dissera. Mas Nik lhe telefonara e a tranquilizara. Quando Fran achava que não conseguia amá-lo ainda mais, ele fazia algo para ganhar o coração dela. Infelizmente, Kellie não estava se sentindo bem e decidiu não viajar.

Fran acreditou na amiga, mas sabia também que ela estava com medo de ir para a Grécia. Leandros iria ficar sabendo se ela fosse ao casamento.

Fran correu descalça para o quarto e estava alisando o vestido quando foi agarrada pela cintura e girada no ar.

— Nik! — gritou ela de alegria e espanto. — Você só deveria estar de volta de noite! Estou horrível.

Os olhos escuros dele devoraram-na.

— Todo marido deveria ter a sorte de chegar em casa e ver a mulher com um short desse. Não há escapatória para você — disse ele, carregando-a para a cama que ela acabara de arrumar. — Dei uma olhadinha em Demi, e ela está apagada.

— Mas hoje não era seu primeiro dia de volta ao trabalho?

— Era. Sandro disse que eu não estava ajudando em nada e me mandou para casa.

— Ele não...

Ele a colocou por cima do corpo.

— Não. Eu fiquei sentado na minha mesa e não prestei atenção em nada do que minha assistente dizia. Meus irmãos foram almoçar comigo, e, quando percebi que não conseguia nem manter uma conversa decente, descobri o que tinha de fazer.

Ele a colocou deitada de novo.

— E algo está cheirando bem.

— É meu jantar surpresa para você.

Ele esboçou um sorriso de partir corações antes de tirar um colar do bolso.

— Esse é um colar de gemas da cor dos seus olhos. Feliz aniversário, sua criatura linda. Se um homem pudesse morrer de felicidade, eu teria morrido uma semana atrás.

— Eu amo você, Nik. — Então, eles ouviram Demi chorando.

— Precisamos fazer alguma coisa a respeito disso. No meu escritório, pensei na possibilidade de você vir trabalhar comigo. Poderíamos levar um cercadinho para Demi.

— A ideia funcionaria pelos primeiros dez minutos. Talvez se seu pai fosse para o

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escritório duas vezes por semana, nós poderíamos ter tempo para velejar pelo Egeu com nossa garotinha. O que acha?

Ele deu-lhe um beijo longo e forte na boca.

— Vou ligar para ele mais tarde.

— Faça isso agora. Pense no quanto ele vai ficar feliz.

Nik franziu o cenho.

— O que foi? Já está cansada de mim?

— Querido... — Ela inclinou-se, beijando cada centímetro de seu rosto.

— Só acho que, se meu Atlas fizer isso agora, ele vai parar de se preocupar. Acho que sou muito egoísta e quero toda a sua atenção voltada para mim.

— Mas você não sabe que ela já está? Por que acha que voltei mais cedo para casa hoje?

Ela beijou-lhe os lábios.

— Então venha me mimar.

Uma risada escapou dos lábios dele.

— Quem poderia imaginar que eu teria uma esposa tão “maliciosa”?

— Ainda há muita coisa que você não sabe sobre mim. — Ela entregou o telefone para Nik.

Enquanto ele digitava os números, ela sussurrou-lhe ao ouvido:

— Diga que precisamos que ele comece a trabalhar o quanto antes. Quero você só para mim. Quando o tornado trouxe Demi para mim, ele trouxe também o tio dela. Estava escrito no vento.

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DOCE REBELDE

Marion Lennox

Ele estava esperando por um gerente, alguém que conhecesse números e pudesse discutir as más notícias em um ambiente de negócios.

O que encontrou foi uma mulher com um sobretudo rosa e calças com estampa de tigre conversando com um camelo.

— Estou procurando por Henry Miski — declarou ele, caminhando cuidadosamente através das poças enquanto a garota colocava o balde de ração no chão e desviava a atenção do camelo para ele. Uma pequena matilha de terriers ao lado dela apontou o focinho na direção dele para cumprimentá-lo.

Mathew Bond raramente trabalhava longe de seus escritórios. Sua empresa financiava alguns dos grandes projetos de infraestrutura da Austrália. Se aventurar nos territórios do circo Sparkles era uma aberração.

Conhecer essa mulher era uma aberração.

O cabelo castanho dela estava preso em um complicado nó. Os olhos escuros eram emoldurados por cílios com quase dois centímetros de comprimento, e a maquiagem parecia ser um trabalho de arte.

— Espere enquanto eu alimento Pharoah — ela disse. — Ele teve uma tosse e não pode trabalhar hoje, mas a menos que ele pense que está recebendo um tratamento especial irá zurrar durante a apresentação inteira. — Ela esvaziou o balde na lata do animal e acariciou-lhe as orelhas. Finalmente satisfeita por Pharoah estar feliz, voltou à atenção para ele.

— Desculpe por isso, mas a última coisa que quero é um camelo com o nariz desconjuntado. O que posso fazer por você?

— Estou aqui para ver Henry Miski — ele repetiu.

— Meu avô não está se sentindo bem — informou. — Vovó quer que ele fique na van até a hora do show. Sou a neta dele... Alice, ou A incrível Mischka, mas meus amigos me chamam de Allie.

— Ela trocou um aperto de mãos com ele. — É algo importante?

— Sou Mathew Bond — ele disse e entregou-lhe um cartão. — Do Banco Bond.

— Algum parentesco com James? — Ela sorriu, observando-o da cabeça aos pés. Notou a altura dele, o terno feito sob medida, o sobretudo de cashmere e o clássico sapato irlandês sujo de lama.

— Ou a semelhança é apenas uma coincidência? Esse casaco é lindo.

Allie ainda o observava, o examinava, e ele começou a se sentir desconcertado. Outra pessoa deveria estar fazendo isso, Matt pensou, não pela primeira vez. Ele deveria ter mandado alguém da sua equipe.

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Mas estava fazendo isso como um favor para sua tia Margot. Banqueiros não aplicavam dinheiro no escuro.

— Seu avô está me esperando — disse ele, tentando soar profissional novamente. — Tenho uma reunião com ele às 14h.

— Mas este é o horário do show. — Ela apanhou um relógio de bolso e o consultou. — É daqui a dez minutos. Vovô nunca teria marcado uma reunião na hora do show. E em um domingo.

— Henry disse que era o único horário que ele estava disponível. Eu lhe disse, sou do banco.

— Sinto muito. — Alice uniu as sobrancelhas. — Banco Bond. O Banco que vovô paga o empréstimo? Ele deve estar na última parcela. Por que você esta aqui?

Empréstimo? Não havia nenhum empréstimo. Não até onde ele sabia.

Mas Mathew não iria discutir os negócios de um cliente com uma estranha.

— Isso é entre o seu avô e eu.

— Sim, mas ele não está bem — repetiu ela. — Precisa de toda a energia para o show. — Alice consultou o relógio novamente, depois se virou para a caravana e partiu com uma velocidade que ele quase não conseguiu acompanhar. Mathew estava evitando as poças e ela não. Estava simplesmente passando por cima da água com os cães abrindo caminho.

— O tempo não está ruim? — Alice declarou por sobre um dos ombros. — Tivemos problemas para atrair o público na noite passada. Felizmente a previsão para as próximas duas semanas é ótima. Temos a maior parte das cadeiras reservadas. A casa vai ficar cheia. Olhe, você pode trocar algumas palavras com ele, mas se for levar muito tempo terá que esperar até mais tarde. Aqui está o trailer do meu avô. — Ela ergueu o tom de voz. — Vovô?

E leia também em Sopro de Vida, edição 96 de Harlequin Special

Furacão de mudanças, de Marion Lennox.

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