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REFLEXÃO SOBRE O PROCESSO DE ORIENTAÇÃO PROFISSIONAL
Adenir Scopel de Oliveira Bona 1
Suzete Terezinha Orzechowski2
RESUMO
Este estudo, de natureza teórica e descritiva faz parte de um Projeto de Intervenção Pedagógica realizado no Programa de Desenvolvimento Educacional da Secretaria de Estado da Educação do Paraná. O objetivo principal foi pesquisar e refletir sobre a relação trabalho/educação no Ensino Médio em uma perspectiva histórica e verificar propostas de uma educação democrática para este nível de ensino considerando o trabalho como princípio educativo, a partir do enfoque da orientação profissional. Para tanto foram obtidas informações por meio de publicações nacionais e sites governamentais. Apresenta-se também um projeto de intervenção prática, como alternativa de trabalho para os colegas atuantes no Ensino Médio. As conclusões desta pesquisa indicam que o entendimento das relações trabalho/educação contextualizadas historicamente conduzem a uma melhor compreensão sobre a escolha profissional. Neste sentido é preciso destacar a importância do educando ter acesso ao reconhecimento do direito ao trabalho e aos saberes sobre o mesmo os quais podem fazer parte do currículo possibilitando um repensar sobre o processo de orientação profissional como uma etapa que possibilita a reflexão sobre a relação com o mundo do trabalho contemplando a humanização.
Palavras-chave: Ensino Médio. Trabalho-Educação. Orientação Profissional.
O presente estudo pretende discutir o tema trabalho e educação no Ensino Médio
tendo como foco principal a reflexão sobre a proposta de educação para o Ensino Médio
paranaense considerando o trabalho como princípio educativo, enfocando a orientação
profissional. Seu principal objetivo é pesquisar e refletir sobre a relação trabalho educação no
Ensino Médio numa perspectiva histórica e verificar propostas de uma educação democrática
para este nível de ensino. Para desenvolver tal pesquisa fizeram-se objetivos específicos:
contextualizar historicamente a relação trabalho e educação como atividades especificamente
humanas; analisar os aspectos históricos da ligação trabalho e educação no Ensino Médio
brasileiro; estudar propostas e concepções de Ensino Médio e suas relações com o trabalho
1 Professora e Pedagoga, lotada no Colégio Estadual Olavo Bilac de Cantagalo participante do Programa de Desenvolvimento Educacional da SEED do Paraná.
2 Professora Orientadora Mestre em Educação, pertencnte ao quadro de pofessores do Curso de Pedagogia da UNICENTRO de Guarapuava.
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considerando que preparar para o mundo do trabalho é um dos objetivos deste nível de ensino.
Apresenta-se também um projeto de intervenção prática, como alternativa de trabalho para os
colegas atuantes no Ensino Médio.
Considerando a Identidade do Ensino Médio definida pela Secretaria de Estado da
Educação do Paraná que define “(...) a especificidade do Ensino Médio, enquanto Educação
Básica, não o afasta nem o dissocia da vida e do mundo do trabalho, mas não deve submetê-lo
aos interesses do mercado” (PARANÁ, 2007, p.9), a reflexão de que trabalho e educação são
atividades especificamente humanas (SAVIANI, 2007), a importância de contextualizar o
Ensino Médio com as mudanças do processo produtivo e a possibilidade de desenvolver um
trabalho educativo para este nível de ensino que pretenda estender aos excluídos os benefícios
da globalização (KUENZER, 2000) é que se decidiu elaborar o realizar o presente estudo.
Também se leva em consideração os fins da educação na Lei de Diretrizes e Bases para a
Educação Nacional 9394/96, que apresenta em seu artigo 35o as finalidades do Ensino Médio,
das quais se destaca a “Preparação para o trabalho e exercício da cidadania”, diante deste
contexto justifica-se a presente pesquisa.
Diante destes estudos chega-se a identificar, nas considerações finais, que o
entendimento das relações trabalho e educação, contextualizadas historicamente, conduzem a
uma melhor compreensão de que a escolha profissional leva as pessoas a participarem
diretamente do mundo do trabalho, deixando de ser apenas consumidores para ser também
produtores. Esse conhecimento possibilitará compreender que a escolha profissional possui
graus de liberdade e que o indivíduo não é o único responsável por sua trajetória. Assim, a
reflexão com os educandos a respeito dos determinantes sociais de suas escolhas no mundo do
trabalho profissional se dará de forma mais consciente e comprometida com a realidade
visando encontrar uma síntese consistente diante da complexidade e não apenas submetê-los
às limitações da realidade.
2. Fundamentos históricos da relação trabalho-educação como atividade especificamente
humana.
Segundo Saviani (2007), trabalho e educação são atividades especificamente humanas,
ou seja, apenas o ser humano trabalha e educa. Diferente do animal que vem programado pela
natureza e não projeta a sua existência, apenas se adapta e responde instintivamente ao meio,
os seres humanos criam e recriam pela ação consciente do trabalho sua própria existência,
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afirma Lukács (apud FRIGOTTO, 2002). Os homens adaptam a natureza a si, agindo sobre
ela transformando-a e ajustando-a conforme suas necessidades:
Podemos distinguir o homem dos animais, pela religião ou por qualquer
coisa que se queira. Porém o homem se diferencia propriamente dos animais
a partir do momento em que começa a produzir seus meios de vida, passo
esse que se encontra condicionado por sua organização corporal. Ao produzir
seus meios de vida, o homem produz indiretamente sua vida material. Marx
& Engels, (apud SAVIANI 2007, p. 154, grifos do original).
O ato de agir sobre a natureza adaptando-a em função das necessidades humanas é o
que denominamos trabalho. A essência humana não é dada ao homem e também não precede
a sua existência, mas é produzida pelos próprios homens.
(...) o trabalho é a relação social fundamental que define o modo humano de
existência, e que enquanto tal, não se reduz à atividade de produção material
para responder à reprodução físico-biológica (mundo de necessidade), mas
envolve as dimensões sociais, estéticas, culturais, artísticas, de lazer, etc.
(FRIGOTTO, 200 p. 14).
O trabalho é a relação fundamental que define o modo humano de existência e não
pode reduzir-se apenas à dimensão da subsistência, mas a todas as outras dimensões que
compõem a vida humana.
Nesse sentido Saviani (2007) afirma que o homem não nasce homem, ele necessita
aprender a ser homem, produzir sua própria existência. Portanto, a produção do homem é ao
mesmo tempo a formação do homem e um processo educativo. Dessa forma pode-se defender
que a origem da educação coincide com a origem do homem. O homem ao produzir-se e
transformar a realidade a sua volta se educa. Esta produção humana que é entendida como
trabalho relaciona-se, portanto, à educação. Trabalho e educação acontecem simultaneamente,
um transformando o outro.
Os homens, nas comunidades primitivas, aprendiam a produzir a sua existência
lidando com a natureza. Relacionando-se uns com os outros se apropriavam coletivamente
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dos meios de produção, educavam-se e educavam as novas gerações. Não havia divisões de
classes e a educação identificava-se com a vida. Educação e trabalho coexistiam produzindo-
se e transformando-se.
O desenvolvimento da produção e a apropriação privada da terra conduziram à
divisão do trabalho e ao fim da unidade das comunidades primitivas. Assim configuram-se
duas classes sociais fundamentais: a classe dos proprietários e dos não proprietários. Esse fato
é importantíssimo para a história da humanidade e a sua compreensão, pois se afirmou
anteriormente que o trabalho define a essência do homem, ou seja, é impossível viver sem
trabalhar. Mas o controle privado da terra tornou possível aos proprietários viverem do
trabalho alheio.
Essa divisão dos homens em classes irá provocar também uma divisão na educação. A
partir do escravismo antigo teremos modalidades diferentes de educação: uma para a classe
proprietária (centrada nas atividades intelectuais, na arte da palavra e da guerra) e outra para a
classe não proprietária assimilada no próprio processo de trabalho. Dessa forma consumou-se
a separação entre educação e trabalho que só foi possível a partir da própria determinação do
processo de trabalho, ou seja, o modo como se organiza o processo de produção é que
permitiu a organização da escola como um espaço separado da produção.
Com o surgimento da sociedade capitalista (economia de mercado) em substituição a
sociedade feudal (economia de subsistência) a relação trabalho/educação irá sofrer uma nova
determinação. A estrutura da sociedade deixa de fundar-se em laços naturais para pautar-se em
laços sociais (produzidos pelos homens). O domínio de uma cultura intelectual passa a ter
mais importância e a escola é erigida como principal via de acesso a esse tipo de educação.
Segundo Frigotto (2005), a revolução capitalista imprime um caráter civilizatório em
relação aos modos de produção pré-capitalistas, porém os avanços desse novo sistema são
restritos e relativos a uma pequena parcela da sociedade detentora dos meios de produção.
Neste aspecto o trabalho, a propriedade, a ciência e a tecnologia não são mais produtores de
valores dos trabalhadores. Agora a força de trabalho se transforma em produtora de valores de
troca com o fim de gerar mais lucro, reduzindo-se à mercadoria a força de trabalho tendendo a
confundir-se com emprego. Assim o capital detém os meios e instrumentos de produção e a
classe trabalhadora apenas a sua força de trabalho para vender. Ao capitalista interessa
gerenciar e comprar o tempo de trabalho do trabalhador pelo menor valor possível e pagando,
ao final de um determinado período, de forma que o pagamento (salário) represente apenas
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uma parte do tempo pago sendo que a outra irá se transformar em lucro para o capitalista.
No plano das ideologias constrói-se a representação de que o ganho do trabalhador é
justo, pois o mesmo vende a sua força de trabalho para os detentores do capital numa situação
de igualdade e por sua livre escolha. Dessa forma, a classe detentora do capital torna-se
hegemônica apagando os processos históricos que transformaram as relações de classe. Essa
dissimulação fica mascarada por meio do contrato de trabalho que legaliza uma relação
desigual.
A educação tem sido utilizada, em contextos históricos diversos, como suporte
ideológico dessa dissimulação mediante as noções de capital humano, sociedade do
conhecimento e pedagogia das competências para a empregabilidade. Passa-se a idéia de que
os países pobres, regiões e grupos menos favorecidos economicamente assim o são por
investirem pouco em educação. Mas como investir bastante em educação se são pobres? Seria
mais coerente afirmar que essa condição os impede de investir em educação por terem sido
expropriados de diferentes formas. Nesse contexto, afirma o autor, cinicamente as vítimas da
espoliação passam a serem culpados por serem explorados.
De acordo com Saviani (2007) o advento da indústria moderna trouxe a
universalização da escola básica a qual se bifurcou em escolas de formação geral e escolas
profissionais devido às necessidades provocadas pela Revolução Industrial. Esta separação
entre escolas profissionais para os trabalhadores e “escolas de ciências e humanidades” para
os futuros dirigentes (escola dualista) distribui os educandos conforme as funções sociais a
que se destinam em consonância com sua origem social.
Esta forma de organizar a educação está permeada por um discurso liberal, que aponta
para uma igualdade social, mas que na prática continua mantendo as diferenças. A partir do
séc. XX este discurso esteve presente nos textos e na fala dos educadores que defendiam uma
escola pública, obrigatória e gratuita. Mas na realidade o que prevaleceu foi uma escola
propedêutica e preparatória para a universidade para os filhos da burguesia e uma educação
direcionada às atividades práticas para os filhos dos trabalhadores, ou seja, a escola pública
para a maioria da população não aconteceu. Assim nasce a divisão da escola pública e privada
concretizando-se a chamada escola para classes sociais distintas. Portanto, uma escola para
ricos outra para pobres.
Considerando estas argumentações cabe agora refletir sobre a relação educação e
trabalho e o delineamento do Ensino Médio brasileiro contextualizado historicamente.
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3. O Binômio Educação-Trabalho e o Ensino Médio no Brasil: Aspectos Históricos
A identidade do Ensino Médio esteve, ao longo da história, vinculada a dois aspectos:
um que privilegia a formação do aluno para o mercado de trabalho e outro voltado para a
continuidade dos estudos. Esta dicotomia está historicamente ligada à organização e a
permanência da sociedade de classes. (PARANÁ, 2007)
No Brasil esta ligação institucionalizou-se com a Primeira República e a abolição dos
escravos, quando a educação era entendida como um instrumento que poderia garantir a
ordem via submissão do trabalho ao capital atendendo aos interesses da classe dominante
conforme afirma Kuenzer:
Essas escolas, antes de pretender atender às demandas de um
desenvolvimento industrial praticamente inexistente, obedeciam a uma
finalidade moral de repressão: educar, pelo trabalho, os órfãos, pobres e
desvalidos da sorte, retirando-os da rua. Assim, na primeira vez aparece a
formação profissional como política pública, ela o faz na perspectiva
moralizadora da formação do caráter pelo trabalho. (KUENZER, 2000,
p.27).
Essa tendência hierarquizante aprofundou-se a partir do Estado Novo (1937-1945).
Nesta época surgiram novos ramos profissionais e foi regulamentado o ensino técnico, que
não possibilitava o acesso ao ensino superior (procurado pela classe média) paralelo ao ensino
clássico, que possibilitava o acesso ao ensino superior (procurado pela elite).
Do fim do Estado Novo até o início dos anos 60 o país viveu um período de
contradições político-ideológicas e era dominado pelo nacionalismo liberal. Em função de
pressões da clientela interessada, foi elaborada a Lei 4.024/61, a primeira que regulamentou a
educação em nível nacional. Esta Lei garantia a equivalência (para ingresso na universidade)
entre os cursos técnicos e propedêuticos, mantendo a dualidade estrutural da educação. É
importante destacar que esta equivalência e valorização dos cursos técnicos estiveram ligadas
ao crescimento dos setores secundário e terciário da economia. Do ponto de vista
administrativo o MEC administrava as escolas oficiais e o SENAI e SENAC, mantido pelas
empresas, ajustando-se a lei poderia equivaler os seus cursos profissionalizantes aos
oferecidos na rede oficial. (PARANÁ, 2007)
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Esta política permaneceu até o início dos anos 70 sendo que em 64 iniciou-se o
processo de internacionalização da economia brasileira e a escola foi responsabilizada pelo
atraso do país devido ao academicismo do curso propedêutico. Em 69, via decreto
presidencial, propôs-se a nova Lei da Educação a qual ficou pronta em 70 e promulgada no
ano seguinte sob a euforia do milagre brasileiro, a 5.692/71. Com relação ao Ensino Médio,
esta lei estabeleceu o ensino técnico compulsório para o segundo grau buscando resolver na
escola a divisão entre trabalho intelectual e trabalho manual e as diferenças de classe.
No entanto, a dualidade não deixou de existir, pois a escolas particulares continuaram
oferecendo o curso propedêutico enfatizando as disciplinas clássicas em detrimento das
técnicas e as escolas públicas foram duplamente penalizadas por terem que reformular suas
grades curriculares sem recursos financeiros para implementar as disciplinas técnicas. O
resumo expandido apresentado por Silva & Gandra (2008), sobre o discurso do ministro
Jarbas Passarinho, demonstra a criação de cursos profissionalizantes para atender a
necessidade de mão-de-obra, configura ainda a dualidade de classes e despreza um projeto de
educação continuada e transformadora.
De fato, a Lei 5692/71, aprovada quarenta dias depois da publicação da
entrevista do ministro, pretendia que o segundo grau tivesse a terminalidade
como característica básica, através do ensino profissionalizante, contrapondo-
se à frustração da falta de uma habilitação profissional. Contudo, a oferta dos
dois diferentes níveis de formação profissional (o de segundo grau e o
superior) se revelou como estratégia duplamente orientada: para proporcionar
mão-de-obra ao setor produtivo e, ao mesmo, para conter o aumento da
demanda de vagas aos cursos superiores. Sobre as diferenças entre as duas
categorias de pessoas que se pretendia formar pela Lei 5692, o ministro
Passarinho já havia afirmado que “nem todos são migradores de grandes vôos.
Muitos se darão por satisfeitos antes da Universidade.” (Revista Veja 1971,
p.56). (SILVA & GANDRA, 2008, s/p.)
Do ponto de vista sócio-cultural e educacional esta mudança não atendeu aos anseios
populares que viam na educação uma forma de ascensão social e do ponto de vista produtivo
não havia demanda para absorver a mão-de-obra que saía da escola a cada ano.
Diante destas pressões, o Parecer 76 de 1975 modificou a lei 5.692/71 quando o
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segundo grau passou a “preparar” para a continuidade da escolarização e não mais qualificar
para o trabalho, ressurgindo uma espécie de dualidade implícita não declarada. Enfim, a Lei
7.044/82 extingue a escola única de profissionalização obrigatória que não chegou a existir
completamente na realidade. Neste período se fortalecem os cursos profissionalizantes
ofertados pelo SENAC, SEBRAE, SESI, e pelos CEFETs. Enfim, a dualidade,
profissionalização e preparação geral, continua.
Apesar das mudanças legais, percebemos que o tempo todo houve a separação entre a
educação para a elite e a educação profissional, aspectos coerentes com os princípios do modo
de produção capitalista. É importante destacar que a população menos favorecida e com
menos possibilidades de inserção social não tinha acesso à educação apesar das matrizes
curriculares deste período estarem fortemente vinculadas a estas classes sociais.
Na década de 90, a Lei 9394/96 suprimiu os cursos profissionalizantes em nível
médio estabelecendo a generalização do propedêutico o qual, segundo Ramos (2004, p. 39)
deveria “desenvolver competências genéricas e flexíveis, de modo que as pessoas pudessem
se adaptar facilmente às incertezas do mundo contemporâneo”. Em última análise, o foco da
formação para o mercado de trabalho é mantido.
No entanto, a lei 9394/96 permitiu o retorno da dualidade estrutural por meio do
ensino técnico e propedêutico ainda que com o “... intuito de tratar diferentemente os
desiguais, conforme seus interesses e necessidades, para que possam ser iguais.” (KUENZER,
2000, p. 36).
A posterior regulamentação da nova LDB possibilitou a criação de cursos técnicos em
três níveis: o Básico, independente de escolarização prévia com o objetivo de qualificação e
requalificação profissional para o qual se encaminham os mais carentes com a ilusão de um
emprego futuro; o Técnico, que confere habilitação aos matriculados ou egressos do Ensino
Médio e o Tecnológico, curso de nível superior, tecnológico, para os egressos do Ensino
Médio. Para o técnico e o tecnológico irão àqueles que, pelas mais diversas razões, não
entraram na universidade. (PARANÁ, 2007).
No Paraná, antecipando-se às reformas, através do PROEM – Programa Expansão,
Melhoria e Inovação do Ensino Médio, financiados pelo Banco Interamericano do
Desenvolvimento/BID são suprimidos os cursos profissionalizantes em nível médio. A partir
do decreto 2.208/97 o PROEM passou a financiar apenas o Ensino Médio uma vez que os
cursos de Educação profissional passaram a ser financiado pelo Programa de Expansão da
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Educação Profissional/PROEP também com financiamento parcial do BID. Esta política
contrariava a proposta nacional de Ensino Médio da lei 9394/96 que permite que a
profissionalização seja desenvolvida paralelamente ou posteriormente ao Ensino Médio e
constituiu-se numa regressão a dualidade que mantém duas redes de ensino: a propedêutica e
a profissional, destruindo a integração entre elas. Percebemos neste rápido apanhado histórico
do Ensino Médio que ele esteve, na maioria das vezes, centrado no mercado de trabalho e não
na pessoa humana.
Em 2003, com os novos rumos políticos assumidos pelo Brasil revoga-se o decreto
2.208/97 o qual foi substituído pelo decreto 5.154/2004, o qual, apesar das contradições
defende:
Consolidação da base unitária do Ensino Médio, que comporte a diversidade
própria da realidade brasileira, inclusive possibilitando a ampliação de seus
objetivos, como a formação específica para o exercício de profissões
técnicas. Em termos ainda formais, o decreto n.º 5154/2004 tenta
restabelecer as condições jurídicas, políticas e institucionais que se queira
assegurar na disputa da LDB na década de 1980. Daqui por diante,
dependendo do sentido que se desenvolva a disputa política e teórica, o
‘desempate’ entre as forças progressivas e conservadoras poderá conduzir
para a superação do dualismo na educação brasileira ou consolidá-la
definitivamente. (FRIGOTTO, CIAVATTA, RAMOS, 2005, p. 37-380).
A partir de 2004, houve no Paraná a abertura de cursos de Ensino Médio Integrado
atendendo a demandas regionais relacionadas a cursos profissionalizantes com a criação das
Escolas Técnicas e dos Centros Técnicos e/ou Tecnológicos. A dicotomia ainda persiste, mas
apontam-se discussões no sentido de “construir um projeto de ensino médio que supere a
dualidade entre a formação específica e a formação geral e que desloque o foco de seus
objetivos do mercado de trabalho para a pessoa humana” (RAMOS, 2004, p. 40),
possibilitando ao egresso desse nível de ensino, mais do que se inserir no mundo do trabalho,
compreender a realidade em que vive e sentir-se capaz de nela agir visando sua
transformação.
Nesse contexto, verificamos a importância de refletirmos sobre o currículo para o
Ensino Médio, suas principais definições, concepções, abordagens, finalidades e influências.
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4. Ensino Médio: o direito à reflexão sobre os saberes à luz dos conteúdos escolares na
preparação para a inserção no mundo do trabalho.
Fundamentados em Orlowski (2002), percebemos a necessidade de discutirmos a
prática curricular abordando as posturas curriculares mais freqüentes no cotidiano da escola.
Segundo a autora, no Brasil não existe um consenso acerca da conceituação de currículo. A
elaboração de um currículo é um processo social, onde convivem os fatores lógicos,
epistemológicos, intelectuais e determinantes sociais como poder, interesses, conflitos
simbólicos e culturais, propósitos de dominação dirigidos por fatores ligados à classe, raça e
gênero. Considerando que é uma prática complexa, encontram-se enfoques diversos com
distintos graus de aprofundamento fundamentados em pressupostos de natureza filosófica.
Moreira (apud Orlowski 2002) aponta que desde a sua incorporação ao vocabulário
pedagógico os sentidos mais comuns ao termo currículo referem-se ao conhecimento escolar e
às situações vividas pelos alunos sob a orientação da escola. A superação do caráter técnico-
prescritivo no conceito de currículo só ocorre no final da década de 60, início da década de
70, quando surgem as abordagens mais críticas das questões curriculares. A teoria de Paulo
Freire foi o primeiro passo para enfocar currículo a partir de um interesse de emancipação,
propondo a superação de um currículo abstrato, teórico e dissociado da realidade. Ao longo do
tempo as idéias que fundamentaram as proposições curriculares acompanharam as
transformações econômicas, políticas, sociais de cada momento histórico brasileiro.
A visão contemporânea de currículo inclui planos e propostas (currículo formal), a
prática escolar efetiva (currículo em ação) e normas e valores implícitos nas relações em sala
de aula e transmitidos pela escola (currículo oculto). Da mesma forma que a educação, o
currículo também não é neutro, ou seja, as finalidades que se atribuem à escola refletem-se
nos objetivos que orientam o currículo. Neste sentido, destaca a mesma autora, nas discussões
sobre qualidade de ensino é importante ressaltar o papel do currículo como instrumento de
recuperação do valor da escola.
Com o objetivo de classificar as posturas curriculares mais freqüentes nas práticas
escolares, J. O. McNEIL, traduzido por SANTOS FILHO (apud ORLOWSKI, 2002)
agrupou-as nas seguintes categorias:
a) Currículo Acadêmico: O núcleo da educação é o currículo cujo
elemento essencial é o conhecimento, patrimônio cultural da humanidade,
transmitido às novas gerações por meio das disciplinas clássicas,
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acadêmicas e de natureza intelectual.
b)Currículo Humanístico: Desloca a atenção disciplinar para o
indivíduo visando sua libertação e auto-realização, cerne do currículo. Os
processos educacionais são conduzidos pelos próprios alunos visando
ajudá-los na integração de emoções, pensamentos e ação.
c)Currículo Reconstrutivista Social: Concebe o homem e o mundo
de forma interativa onde a educação é o agente social promotor de
mudanças. Nesta visão de currículo o indivíduo poderá refletir sobre si
mesmo e sobre o contexto social em que está inserido alterando a ordem
social. Sua preocupação não reside na informação e sim na formação de
sujeitos históricos, enfatizando as relações sociais.
d) CurículoTécnológico: Nesta perspectiva a educação consiste na
transmissão de conhecimentos e comportamentos que propiciem o controle social. O
professor é o detentor e controlador do processo educativo. Ao aluno cabe absorver
passivamente a eficiência técnica atingindo os objetivos propostos. O currículo é concebido
fundamentalmente no método e tem a função de identificar meios para atingir resultados pré-
determinados. Dessa forma percebemos que as práticas curriculares brasileiras nunca foram
“puras” revelando influências de várias racionalidades e diferentes posturas curriculares.
Saviani (2007), inspirado nas reflexões de Gramsci sobre o trabalho como princípio
educativo da escola unitária procurou delinear a conformação do sistema de ensino em
consonância com as condições da sociedade brasileira. Conforme Gramsci, a escola unitária
corresponderia, no Brasil, hoje a educação básica, mais especificamente ao ensino médio e
fundamental. No Ensino fundamental a relação entre trabalho e educação é implícita e
indireta. Aprender a ler, escrever e contar, conhecer rudimentos das ciências naturais e sociais
são requisitos para entender o mundo e a incorporação pelo trabalho dos conhecimentos
científicos no âmbito da vida em sociedade.
Se no Ensino Fundamental a relação é implícita, no Ensino Médio o papel da escola
deveria ser o de recuperar essa relação entre a prática do trabalho e o conhecimento. Trata-se
de explicitar as relações entre o domínio teórico e prático sobre o modo como o saber se
articula com o processo produtivo, desvelando a realidade a partir dos conteúdos escolares
que iluminam os saberes analisando-os, refletindo-os e transformando-os em conhecimentos
capazes de levar os sujeitos à compreender de forma crítica a sua inserção no mundo do
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trabalho.
Nesse sentido, a concepção de Ensino Médio seria aquela que busca uma progressiva
generalização como formação necessária para todos, independente da ocupação que terão na
sociedade. Seria uma escola do “saber desinteressado”, expressão e conceitos criados por
Gramsci e que se contrapõe ao saber “interesseiro, individualista, de curta visão, imediatista e
até oportunista”. (NOSELLA, 1992, p. 18).
Para superação dos interesses hegemônicos do capital, o proletariado,
partindo das condições de trabalho concretas, deve construir sua própria
pedagogia do trabalho, cujas bases serão os seus próprios interesses
hegemônicos e dentre os quais a qualificação compreendida como domínio do
conteúdo do trabalho é fundamental. (SILVA, 2008, VII Jornada do
HISTEDBR)
Neste sentido, Arroyo (2007) afirma que o trabalho é inerente a condição humana e
que reconhecer o direito ao trabalho e ao saberes sobre o mesmo deve ser o ponto de partida
para indagar os currículos, indo além do referente mercantil, do aprendizado de competências.
Segundo Frigotto (1999), os processos educativos que interessam aos trabalhadores não
podem ter no mercado e no capital seu horizonte conceptual e prático.
Devido à histórica dicotomia deste nível de ensino e a possibilidade de se considerar
trabalho como princípio educativo remete-se a necessidade de repensar o currículo. O grande
desafio a ser enfrentado é a busca de um currículo através do qual o aluno possa se apropriar
dos conhecimentos historicamente constituídos, desenvolvendo um olhar crítico e reflexivo
sobre os mesmos, e por outro lado possibilite uma compreensão da lógica e dos princípios
técnicos científicos que marcam o atual período histórico e afetam as relações sociais e de
trabalho. Uma proposta de educação que possibilite ao estudante condições tanto de se inserir
no mundo do trabalho quanto de continuar seus estudos.
Equacionar o currículo no referente ao direito do ser humano à produção cultural da
humanidade será torná-lo mais rico e plural onde o trabalho com a oralidade, a escrita, a
matemática, as ciências, as técnicas de produção, o domínio dos instrumentos e equipamentos
culturais produzidos para qualificar o trabalho como atividade humana, serão contemplados.
No referente ético, as inovações tecnológicas na comunicação e informação, os sistemas
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simbólicos e de linguagens e o domínio de lógicas e formas de pensar e aprender irá capacitar
as novas gerações para pensar e agir. (LIMA, 2007).
Arroyo (2007) defende que este currículo pautado pelo referente ético da garantia do
direito irá ampliar a experiência humana dos educandos sobre os processos de produção, as
relações sociais de produção, as vivências do trabalho, as negações do trabalho, a exploração
do trabalho, o trabalho pela sobrevivência, a falta de horizontes no trabalho, etc.
Há muitos conhecimentos acumulados na Sociologia, Economia, História do Trabalho
sobre o desemprego, as desigualdades, a segregação, e a exclusão dos setores populares, das
pessoas com necessidades especiais, por diferenças de gênero e raça, cidade ou campo. É
importante abordar as formas de trabalho na produção camponesa, na agricultura familiar, a
resistência dos povos do campo à destruição dessas formas de produção e de trabalho.
O acesso a esses conhecimentos, dentro dos conteúdos escolares, proporcionaria ao
aluno o conhecimento da perversa realidade social e econômica do mundo do trabalho.
Possibilitaria aos alunos se reconhecerem como sujeitos de direito ao trabalho e se
conhecerem nos limites desse direito. Nesse sentido Kuenzer (2000) afirma que o Ensino
Médio deve superar a sua versão conteudista e propedêutica para promover mediações
significativas entre os jovens e o conhecimento científico, articulando saberes tácitos,
experiências e atitudes. A aproximação das finalidades do Ensino Médio será feita por
diferentes mediações conforme a realidade de cada escola, região e clientela. Essa mudança é
importantíssima para a sobrevivência num mundo imerso em profunda crise econômica,
política e ideológica em que a falta de alternativas de vida com dignidade tem levado o jovem
ao individualismo, ao hedonismo e a violência em virtude da perda de significado da vida. O
projeto político pedagógico definido teórica e praticamente nas escolas apresenta-se como
uma das alternativas possíveis, dentro desta realidade histórica.
Arroyo (2007) escreve que a renovação curricular se enriquece na medida em que for
dada a devida centralidade ao direito humano ao trabalho e aos saberes acumulados sobre a
nossa condição de trabalhadores. Nesse sentido a pedagogia crítica dos conteúdos tem
contribuído sobre o direito aos saberes sobre cidadania, porém o direito ao trabalho (e aos
saberes sobre o trabalho) base da cidadania, ainda não tem recebido a devida atenção. Ou
melhor, tem uma atenção voltada à mercantilização da educação, preparando os alunos
cidadãos, mas como mercadorias a serem qualificadas e inseridas no mercado. As demandas
exigidas pelo capital têm maior destaque nos currículos do que os direitos aos saberes sobre o
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trabalho. O mesmo autor defende a importância de repensarmos o currículo onde os
educandos passem de mercadoria para sujeitos do direito ao trabalho e aos saberes sobre o
mesmo.
Ciavatta (2006) destaca o papel dos profissionais da educação como formadores de
cidadãos emancipados promovendo a análise crítica da informação e de todas as formas
ideologizadas que escondem a submissão e a opressão. Infelizmente não há receitas prontas,
mas existem critérios de análise da realidade social que podem mostrar o lado oculto, aquele
que está além das aparências que contraria os padrões de dignidade a que tem direito o ser
humano. Nesta tarefa torna-se imperativo uma boa dose de utopia, pois sem esta não há
educação e nem futuro humano. É a utopia que nos ajuda a afirmar os princípios da igualdade,
solidariedade e generosidade humana. (FRIGOTTO, 2001).
5. O Trabalho pedagógico e a Orientação profissional: uma proposta de atuação Apresentamos uma proposta de orientação profissional baseada nos trabalhos de
Lucchiari (1993) e Orzechowski (2000), não com o intuito fornecer uma receita, mas apenas
servir de sugestão, a qual poderá ser adaptada e transformada de acordo com a realidade de
cada escola. Estas sugestões pretendem desencadear um rol de novas formas de perceber a
orientação profissional, dinamizando e desafiando o trabalho sobre o referido assunto.
Conforme a proposta teórico-metodológica abordada neste trabalho, as atividades
podem ser realizadas coerentes com o assunto em questão e consideradas no âmbito em que se
inserem. Apresenta-se a seguir a organização de um projeto de aplicação prática na escola.
TÍTULO: O Trabalho pedagógico e a orientação profissional -Uma proposta de
atuação.
TEMA: Orientação Profissional
SÉRIE: 3º ano do Ensino Médio
PROBLEMATIZAÇÃO:
Durante muito tempo a Orientação Profissional tem trabalhado assumindo os
princípios do liberalismo no processo de escolha profissional, pois enquanto admite a
existência de falhas no processo de escolhas profissionais considera que as mesmas são
“falhas” do indivíduo, sendo que para resolvê-las bastaria habilitá-lo a fazer escolhas mais
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adequadas. Teoricamente todos teriam a mesma liberdade para fazer suas escolhas, de acordo
com suas aptidões e características pessoais, respeitando as limitações impostas pela
realidade. As opções inadequadas são de responsabilidade individual e devem ser creditadas
ao indivíduo que escolhe. Dessa forma a Orientação Profissional ajudou a manter as
discriminações sociais admitindo o potencial individual como o único determinante, sem
considerar as condições de vida que influenciaram profundamente este potencial.
(FERRETTI, 1992)
Os temas trabalho e orientação profissional são extremamente complexos, pois
permeiam muitas esferas da vida humana criando condições e condicionamentos. Nesse
sentido propõe-se uma abordagem a partir da análise crítica dos valores dos alunos como
consumidores e/ou produtores de bens. Essa linha de atuação mostra-se muito produtiva para
os alunos porque pode gerar condições para que ao refletir sobre a sua prática social possam
ter dela uma visão crítica para realizar opções mais conscientes, com maior autonomia e
segurança.
JUSTIFICATIVA:
Considerando que a ação educativa é mediação para a aquisição de conhecimentos sobre a
realidade e pode servir tanto para a reprodução das condições existentes quanto à sua
contestação, é nesse espaço de contradições que surgem as oportunidades para novas opções e
propostas de orientação profissional. Entendendo que a escola é responsável pela formação
integral do aluno dando-lhe condições favoráveis (ferramentas) para a ampliação de sua visão
do mundo do trabalho e ressaltando a importância da escolha profissional como um projeto de
vida a ser desenvolvido é que se justifica este estudo. A reflexão sobre o trabalho enquanto
atividade social, processo de modificação da natureza e determinante de relações sociais é
fundamental, tanto para os que optam como para aqueles que não o fazem, para que
desenvolvam uma consciência crítica dessa atividade humana que influencie o seu exercício
profissional. Nesse sentido faz-se necessário realizar um projeto que aborde as questões
sociais, éticas e econômicas possibilitando ao jovem realizar escolhas profissionais autônomas
e conscientes ampliando a visão do mesmo sobre o mundo do trabalho.
Buscando atender as dificuldades do adolescente atual diante da urgência em tomar
uma decisão cada vez mais cedo frente à instabilidade social e a forma atual de organização
do trabalho, complexa e injusta, e visando possibilitar ao jovem vislumbrar formas de
inserção social através de uma opção profissional acertada, justifica-se o presente projeto.
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OBJETIVO GERAL:
Auxiliar o jovem a tomar conhecimento dos inúmeros fatores que interferem na sua
escolha profissional facilitando esse processo a fim de que ele possa escolher com a maior
autonomia possível.
OBJETIVOS ESPECÍFICOS:
- Discutir e refletir com os educandos sobre as relações educação-trabalho.
- Aprimorar os conhecimentos dos alunos a respeito da realidade do mundo do
trabalho.
- Proporcionar aos alunos oportunidades de adquirir informações reais e críticas sobre
as diversas profissões.
- Estimular a exploração de fontes de informações sobre as profissões, cursos e
escolas.
- Possibilitar condições de visitas às Universidades, informações pertinentes a
Vestibulares e cursos oferecidos.
- Criar espaços de discussão e reflexão sobre o processo de escolha profissional.
– Favorecer contato com profissionais atuantes no mercado de trabalho e com ex-
alunos universitários e recém-formados.
DESCRIÇÃO DO PROJETO:
Este projeto é composto por temas que serão trabalhados nas turmas dos terceiros anos
do Ensino Médio do período diurno, no contra turno do horário de aula. Os encontros serão
semanais, com duração de duas horas/aulas, durante um semestre letivo (terceira etapa do
Programa de Desenvolvimento Educacional - PDE). Na medida do possível será desenvolvido
um tema e/ou subtemas em cada encontro, sempre complementado e enriquecido com
atividades práticas e dinâmicas de grupo.
ESTRATÉGIAS:
- Conversa inicial sensibilizando toda a comunidade escolar sobre o tema do projeto;
- Sondagem e discussões com os alunos sobre suas experiências pessoais e planos
profissionais;
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- Estabelecimento de um contrato de trabalho com os envolvidos no projeto;
- Trabalhos em grupos;
- Apresentação de seminários;
- Visitas às Universidades e feiras de profissões;
- Palestras com profissionais de diversas áreas;
- Construção de painéis informativos;
- Mostras de material áudio-visual;
- Entrevistas com profissionais de diversas áreas;
- Debates sobre o tema entre os alunos;
- Dinâmicas de grupos sobre o tema;
- Leituras de material específico sobre o assunto.
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CRONOGRAMA – 2009
Atividades Fev. Mar. Abr. Maio Jun. Julho Ago. Set. Out. Nov. Dez.
Fundamentação e adaptação do projeto
X X
Divulgação do projeto para a comunidade escolar
X
Implementação do projeto de Intervenção ped. junto a comunidade escolar.
X X X X X
Avaliação do projeto X XElaboração de relatório final e artigo completo.
X X X X X
TEMAS QUE SERÃO ABORDADOS:
Construção da identidade:
- Puberdade e adolescência;
- Autoconhecimento (interesses, características, habilidades e capacidades);
- Formação da personalidade;
- Valores;
- Projeto de vida.
O mundo do trabalho:
- O que é trabalho?
- Carreira e ocupação;
- Mercado de trabalho;
- O que eu espero do mundo trabalho;
- Minha experiência de trabalho.
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Informação profissional
- O que é profissão;
- Informação sobre as diversas profissões e suas subdivisões;
- Conhecendo alternativas e possibilidades de cursos, faculdades e instituições de ensino
profissionalizantes oficiais e não oficiais;
- Enem;
- Vestibular;
- PROUNI;
- FIES.
Escolha profissional
- Escolher é um processo contínuo em nossas vidas;
- Fatores intervenientes na escolha profissional;
- Calma, refletir e pesquisar é muito importante!
- Estabelecendo objetivos de longo prazo;
- As profissões na sociedade;
AVALIAÇÃO
Será realizada durante e ao final de cada encontro através da participação e interação
dos alunos nas atividades propostas, por meio da auto-avaliação. Também será elaborada uma
avaliação de todo o projeto para ser aplicada ao final do mesmo.
Acredita-se que este projeto pode contribuir para a formação dos alunos sobre a
relação trabalho/educação. É um projeto que poderá compor as atividades extra-classe, como
mais uma atividade que a escola oferta aos seus educandos.
6. Considerações finais
Ao concluirmos esta breve reflexão sobre as relações trabalho e educação
contextualizadas com a orientação profissional, observamos que as mesmas conduzem a uma
melhor compreensão de que a escolha profissional faz com que as pessoas passem a participar
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diretamente do mundo do trabalho, deixando de ser apenas consumidores para ser também
produtores.
Verificamos que o trabalho pode ser entendido como toda a ação sobre a natureza com
o objetivo de transformá-la para atender a uma determinada necessidade sendo que ao
transformar a natureza o homem também se transforma. O homem tornou-se capaz de
planejar a sua ação e transmitir às gerações futuras a cultura material e intelectual que
produziu atingindo o progresso atual. Apesar do homem ser capaz de tal evolução, nem todos
têm acesso aos bens materiais e intelectuais produzidos porque, ao que tudo indica, esse
progresso foi alcançado em benefício de poucos à custa do sacrifício de muitos. Enquanto que
nos animais motivação e execução são inseparáveis, no homem a unidade de concepção e
execução pode ser dissolvida. Existem aqueles que planejam a ação e aqueles que apenas
executam o trabalho. A diferença entre ambos é que o primeiro detém o poder econômico e o
segundo não. Surge o trabalho alienado e desumano onde o progresso de alguns acontece
devido ao retrocesso da maioria que não tem acesso aos benefícios dessa evolução.
Percebemos nesse contexto a importância de um espaço para a discussão sobre a
necessidade do educando ter acesso ao reconhecimento do direito ao trabalho e aos saberes
sobre o mesmo os quais deveriam fazer parte do currículo. Dessa forma entendemos o valor
de repensarmos sobre o processo de orientação profissional como uma etapa que possibilite ao
sujeito refletir sobre a sua relação com o mundo do trabalho optando por caminhos que o
levem a humanização.
Sugerimos que os profissionais da educação que atuam no Ensino Médio conheçam a
realidade social, política e econômica em que os alunos estão inseridos. Esse conhecimento
possibilitará compreender que a escolha profissional possui graus de liberdade e que o
indivíduo não é o único responsável por sua trajetória. Assim, a reflexão com os educandos a
respeito dos determinantes sociais de suas escolhas no mundo do trabalho profissional se dará
de forma mais consciente e comprometida com a realidade visando encontrar uma síntese
diante da complexidade e não apenas submetê-los às limitações da realidade.
Esta pesquisa contribuiu para a melhoria de minha prática profissional na medida em
que oportunizou a aquisição de conhecimentos fundamentais para realizar um trabalho de
orientação profissional dentro de uma proposta crítica e que pretenda auxiliar o jovem em
suas escolhas profissionais para que as mesmas aconteçam de forma consciente e autônoma.
Possibilitou um aprofundamento maior sobre o tema trabalho e educação no Ensino Médio
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articulado com o processo de orientação profissional, que apesar de ser modesto pode servir
de indicação para reflexões futuras. Através deste estudo não tivemos a pretensão de esgotar a
temática, mas apenas levantar algumas questões para futuras discussões, e pesquisas.
Lembramos também a necessidade de serem estabelecidas políticas públicas que
institucionalizem o trabalho de orientação profissional nas escolas do estado possibilitando
um atendimento contínuo e organizado aos alunos destes estabelecimentos.
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UFSCar, São Carlos/SP, 2008.