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  Relações entre crianças e adultos na Educação Infantil Iza Rodrigues da Luz 1  – Universidade Federal de Minas Gerais/ Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre a Infância e a Educação Infantil [email protected] Apresentação Caras professoras 2  falar sobre o tema das relações entre crianças e adultos na Educação Infantil é importante dada a sua relação com as temáticas mais gerais do processo de desenvolvimento das crianças e das finalidades dessa etapa da educação. Em tempos em que a mídia traz de forma recorrente episódios de violência entre alunos e destes com  professores como um problema das escolas de Ensino Fundamental e Médio, resta-nos interrogar se a Educação Infantil também enfrenta questões parecidas. Devemos destacar que na sociedade contemporânea a violência tem estado presente cotidianamente na vida de uma grande parcela da população e “assombrado” os que estariam mais distantes. As questões ligadas a esse fenômeno chegam às diversas instituições sociais e inclusive as creches e pré-escolas. As crianças tomam conhecimento de relatos de crimes, assaltos, assassinatos que são veiculados pela televisão, ou mesmo presenciam esses fatos em seus locais de moradia. Desse modo, é  preciso r efletir e colocar em ação estratégias que possibilitem uma ação educativa que auxiliem as crianças a lidar com as diversas formas de violência. Além disso, é bastante comum ouvirmos queixas sobre mordidas, empurrões e outros comportamentos de enfrentamento entre as crianças que são interpretadas pelos adultos como indisciplina e até mesmo como violência. Problematizar essa interpretação pode auxiliá-la, professora, na condução diante de tais comportamentos e ajudá-la a pensar em formas mais construtivas de promover a resolução de conflitos e as relações entre as crianças de modo geral. Para enriquecer a reflexão sobre as relações que se estabelecem nas instituições de Educação Infantil consideramos importante trabalhar com os conceitos de indisciplina, violência e agressividade. As pesquisas indicam uma utilização indiscriminada dos termos indisciplina e violência no ambiente escolar. Apesar disso, os estudiosos defendem o emprego do conceito de 1  Agradeço a leitura e as sugestões dos professores da Universidade Federal de Minas Gerais Isabel de Oliveira e Silva, Lincoln Coimbra Martins e Luiz Alberto Oliveira Gonçalves, assim como das  pesquisadoras e bolsistas do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre a Infância e a Educação Infantil da mesma Universidade – NEPEI. 2 Escolhemos adotar o feminino da palavra professor devido à prevalência de mulheres em exercício docente na Educação Infantil.

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Artigo da área Educação e Saúde

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  • Relaes entre crianas e adultos na Educao Infantil

    Iza Rodrigues da Luz1 Universidade Federal de Minas Gerais/ Ncleo de Estudos e

    Pesquisas sobre a Infncia e a Educao Infantil

    [email protected]

    Apresentao

    Caras professoras2 falar sobre o tema das relaes entre crianas e adultos na Educao

    Infantil importante dada a sua relao com as temticas mais gerais do processo de

    desenvolvimento das crianas e das finalidades dessa etapa da educao. Em tempos em

    que a mdia traz de forma recorrente episdios de violncia entre alunos e destes com

    professores como um problema das escolas de Ensino Fundamental e Mdio, resta-nos

    interrogar se a Educao Infantil tambm enfrenta questes parecidas. Devemos

    destacar que na sociedade contempornea a violncia tem estado presente

    cotidianamente na vida de uma grande parcela da populao e assombrado os que

    estariam mais distantes. As questes ligadas a esse fenmeno chegam s diversas

    instituies sociais e inclusive as creches e pr-escolas. As crianas tomam

    conhecimento de relatos de crimes, assaltos, assassinatos que so veiculados pela

    televiso, ou mesmo presenciam esses fatos em seus locais de moradia. Desse modo,

    preciso refletir e colocar em ao estratgias que possibilitem uma ao educativa que

    auxiliem as crianas a lidar com as diversas formas de violncia. Alm disso, bastante

    comum ouvirmos queixas sobre mordidas, empurres e outros comportamentos de

    enfrentamento entre as crianas que so interpretadas pelos adultos como indisciplina e

    at mesmo como violncia. Problematizar essa interpretao pode auxili-la, professora,

    na conduo diante de tais comportamentos e ajud-la a pensar em formas mais

    construtivas de promover a resoluo de conflitos e as relaes entre as crianas de

    modo geral. Para enriquecer a reflexo sobre as relaes que se estabelecem nas

    instituies de Educao Infantil consideramos importante trabalhar com os conceitos

    de indisciplina, violncia e agressividade.

    As pesquisas indicam uma utilizao indiscriminada dos termos indisciplina e violncia

    no ambiente escolar. Apesar disso, os estudiosos defendem o emprego do conceito de 1 Agradeo a leitura e as sugestes dos professores da Universidade Federal de Minas Gerais Isabel de Oliveira e Silva, Lincoln Coimbra Martins e Luiz Alberto Oliveira Gonalves, assim como das pesquisadoras e bolsistas do Ncleo de Estudos e Pesquisas sobre a Infncia e a Educao Infantil da mesma Universidade NEPEI. 2Escolhemos adotar o feminino da palavra professor devido prevalncia de mulheres em exerccio docente na Educao Infantil.

  • indisciplina somente para os comportamentos que desrespeitam as regras criadas

    estritamente para garantir as condies necessrias realizao do trabalho pedaggico.

    Destaca-se que os estudos sobre a indisciplina e/ou violncia escolar tm sido feitos no

    Ensino Fundamental e Mdio e que na Educao Infantil no possvel utilizar o termo

    violncia se estivermos nos referindo ao comportamento das crianas. Isto porque a

    intencionalidade uma qualidade da ao violenta. Isto , preciso que o autor tenha

    conscincia de que a sua ao pode causar danos ou prejuzos a outras pessoas. Alm

    disso, os estudiosos chamam a ateno para a dimenso moral da violncia, que s pode

    ser assim entendida quando quem age consegue reconhecer o certo e o errado na

    vida e nas relaes com outras pessoas.

    Desse modo a realizao de atos violentos pressupe que a pessoa j tenha desenvolvido

    a capacidade de compreender e interpretar as situaes vividas. Por essas caractersticas

    que definem o ato violento (ou a violncia), e considerando o desenvolvimento das

    crianas na faixa etria de 0 (zero) a 5 (cinco) anos, no h como dizer que essas

    crianas agem de forma violenta. Pois, mesmo que a vontade de incomodar ou

    machucar possa estar presente nos motivos da criana, elas no conseguem avaliar de

    forma completa as possveis consequncias de seus atos. Alm disso, no possuem

    controle completo do prprio comportamento, estando mais suscetveis as reaes

    provocadas pelas emoes. Devemos, ainda, lembrar que diferentemente das crianas

    maiores e dos adultos, nessa faixa etria de 0 (zero) a 5 (cinco) anos, as crianas ainda

    no tm completamente desenvolvida a linguagem. Por essa razo a emoo ainda

    traduzida basicamente por meio de gestos. Esse entendimento coloca em questo

    tambm a atitude de qualificar o comportamento das crianas de indisciplina, pois para

    isso teramos que assegurar que elas j possussem pleno entendimento das regras de

    convivncia social adotadas pelas instituies de Educao Infantil.

    Os estudos pioneiros do psiclogo suo Jean Piaget alertam para o fato de a criana ir

    construindo progressivamente sua moralidade, portanto, na Educao Infantil

    complicado falarmos de indisciplina e violncia. J que esses conceitos tratam

    respectivamente do desrespeito a regras e da inteno de prejudicar outro ser humano e

    que as crianas atendidas pela Educao Infantil esto se inserindo no mundo da

    moralidade e construindo paulatinamente as noes de certo e errado. Portanto, no

    possvel cobr-las por agirem de determinado modo j que entre as finalidades dessa

    etapa da educao est a promoo do desenvolvimento social a ajuda para que essas

    crianas possam construir relaes com os outros de forma respeitosa.

  • Outro conceito comumente utilizado nas escolas e em outros contextos para definir

    determinados comportamentos das crianas o de agressividade. No entendimento do

    psicanalista ingls Donald Woods Winnicott a agressividade vista como nossa energia

    para ir ao encontro do mundo e do outro, como uma tendncia inata ao movimento, a

    ao. As pessoas so ento desafiadas cotidianamente a encontrar meios de exercer sua

    agressividade, o que pode ser feito, por exemplo, atravs das atividades de trabalho e

    das brincadeiras. Sendo assim, a agressividade no est associada a comportamentos

    negativos, ruins. Entretanto, essa mesma energia que nos pe em movimento pode

    passar a ter outra funo quando no estamos nos sentindo bem conosco, com nosso

    mundo interno. Nessas situaes a agressividade pode ser utilizada de modo a

    hostilizar os que esto a nossa volta e nesse sentido que pode ser tida como um

    sinnimo do conceito de violncia. Mesmo com essa segunda finalidade os atos de

    agressividade hostis podem ser vistos como um pedido de socorro por parte da criana.

    Como uma tentativa de encontrar no ambiente algo que lhe ajude a restaurar um

    equilbrio interior perdido. Tendo como referncia essas diferenciaes seria mais

    apropriado dizer que as crianas da Educao Infantil apresentam comportamentos

    agressivos hostis e no comportamentos violentos ou mesmo comportamentos de

    indisciplina.

    O fato do comportamento das crianas no poder ser interpretado como violncia ou

    indisciplina no diminui a importncia de se discutir esses temas na Educao Infantil,

    j que as crianas podem, e so como j indicaram vrias pesquisas, vtimas de aes

    violentas por parte dos adultos que deveriam educ-las. Ao agirem assim, esses adultos

    no s desrespeitam os vrios direitos das crianas, como perpetuam modelos de ao

    violentos que so extremamente danosos para o desenvolvimento dessas crianas.

    Considerando essas idias, no presente texto temos como objetivo refletir sobre as

    relaes entre crianas e adultos a partir das temticas da violncia, indisciplina e

    agressividade. Inicialmente veremos as indicaes das Diretrizes Curriculares Nacionais

    para a Educao Infantil que se relacionam a esses temas. Depois trazemos aspectos

    tericos que ajudam a compreend-los melhor. Aps estas reflexes apresentamos

    propostas e sugestes de atividades e experincias que possam lhe ajudar professora, a

    criar um ambiente onde as relaes entre voc e as crianas, e delas entre si, possam

    ocorrer de forma mais respeitosa e saudvel. Para concluir, sugerimos algumas leituras

    sobre o desenvolvimento infantil e sobre os temas da violncia, indisciplina e

    agressividade.

  • Diretrizes

    Um primeiro aspecto a ser destacado nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a

    Educao Infantil, estabelecidas pela Resoluo da Cmara de Educao Bsica do

    Conselho Nacional de Educao CEB/CNE N 05, de 17 de dezembro de 2009, a

    concepo de criana e de seu processo de desenvolvimento que deve orientar as

    propostas pedaggicas. No Art. 4, a criana, tida como centro do planejamento

    curricular, compreendida como um sujeito histrico e de direitos, que por meio das

    interaes, relaes e prticas cotidianas que vivencia, constri sua identidade pessoal e

    coletiva, assim como constri sentidos sobre a natureza e a sociedade, produzindo

    cultura. Esse processo de construo de sentido para o mundo fsico e social ocorre

    atravs de diversos comportamentos, destacando-se: brincar, imaginar, fantasiar,

    desejar, aprender, observar, experimentar, narrar, questionar.

    Essa concepo sobre a criana e o modo como se desenvolve fortalece o lugar da

    instituio de Educao Infantil como um ambiente privilegiado de trocas e relaes.

    Onde as experincias particulares vividas no ambiente familiar podem ser ampliadas e

    enriquecidas pelas interaes com outras crianas, adultos e objetos que no faziam

    parte do cotidiano das crianas. A participao nesse novo ambiente vai tambm

    influenciar o desenvolvimento da prpria identidade, sendo esse tambm um dos

    objetivos da Educao Infantil. Ao acentuar a condio da criana como sujeito de

    direitos as Diretrizes chamam a ateno para a legitimidade da presena da criana nas

    instituies de Educao Infantil pelos benefcios que essa experincia pode trazer para

    ela e no somente para que as necessidades de suas famlias sejam atendidas. Esse um

    aspecto central e que a professora deve levar em considerao quando pensa nas

    interaes que desenvolve com a criana nesse espao.

    Ao longo da Resoluo outros aspectos complementam o Art. 4, reforando que as

    propostas pedaggicas devem respeitar princpios ticos, polticos e estticos (Art. 6) e

    que devem garantir o cumprimento das funes sociopoltica e pedaggica das

    instituies de Educao Infantil, em especial por oferecer condies e recursos para

    que as crianas usufruam seus direitos civis, humanos e sociais (Art. 7, inc. I). Ao tratar

    do objetivo central das propostas pedaggicas garantir a criana acesso a processos de

    apropriao, renovao e articulao de conhecimentos e aprendizagens de diferentes

    linguagens as Diretrizes vo novamente evidenciar a necessidade de assegurar o

    direito proteo, sade, liberdade, confiana, ao respeito, dignidade,

    brincadeira, convivncia e interao com outras crianas. (Art. 8). Destaca-se aqui a

  • importncia de que as relaes entre adultos e crianas sejam pautadas pelo respeito,

    ficando explicitamente condenadas aes violentas, de negligncia, repreenso ou

    castigo que possam causar prejuzos fsicos e psicolgicos as crianas (Art. 8, 1, inc.

    X). O respeito aos direitos das crianas se coloca como algo central a ser contemplado

    nas aes pedaggicas das instituies. Suas funes de cuidado e educao que so

    compartilhadas e complementares a ao das famlias (Art. 7, inc. II) devem romper

    com as vrias formas de relaes de dominao. Entre elas se destacam a que se

    alimenta da diferena de idade, exigindo que as professoras estejam atentas para que os

    comportamentos e atitudes exigidos dos adultos no se imponham sobre as necessidades

    das crianas. Um exemplo disso pode ser a exigncia de que as crianas permaneam

    quietas e caladas por longos perodos de tempo sem o envolvimento com atividades de

    seu interesse. Esse controle j possvel e esperado por parte dos adultos pode ser motivo

    de muita tenso e desgaste para as crianas. O respeito s especificidades das crianas

    um meio de romper com o adultocentrismo largamente difundido na nossa sociedade.

    Esse adultocentrismo se expressa quando o modo de se comportar do adulto

    considerado o jeito mais correto e superior de lidar com a realidade. Por essa razo, a

    principal tarefa educativa seria lapidar as crianas para que seu comportamento

    inquieto, ilgico, desordenado, desse lugar ao controle do comportamento, uso da razo

    e ordem presentes no comportamento adulto. Os estudos da sociologia da infncia

    alertam o quanto esse adultocentrismo pode impedir que reconheamos a criana como

    um sujeito pleno, que tem um modo particular de lidar com a realidade e que no

    inferior ao do adulto. Esse alerta deve est presente cotidianamente nas instituies de

    Educao Infantil. As atividades e rotinas devem ser planejadas de modo a assegurar

    que essas aes sejam promotoras do processo de desenvolvimento dessas crianas,

    considerando seus interesses, desejos e capacidades atuais, aes que devem ter sentido

    para essas crianas e no para os adultos ou para o modelo de adulto que se pretende

    atingir. Com isso no estamos dizendo que os adultos no devam colocar limites a ao

    das crianas, quando essas se colocam em risco ou desrespeitam outras pessoas. O que

    se coloca como relevante o modo como esse limite deve ser colocado. O dilogo, a

    explicao, a indicao de como a criana deve agir em determinada situao, deve ser

    o ponto de partida dessa atitude educativa. Uma criana que machuca o colega, por

    exemplo, pode ser convidada a ajudar na limpeza de um corte ou arranho, para que

    compreenda melhor as conseqncias de sua ao. Novamente as estratgias devem ser

    pensadas considerando o momento de cada criana e no somente o ideal de adulto ou

  • de disciplina da instituio. O objetivo de garantir igualdade de ateno e tratamento as

    crianas pode auxiliar as instituies a romperem com as relaes de dominao

    socioeconmica, tnico-racial, de gnero, regional, lingustica e religiosa (Art. 7, inc.

    V). Ressalta-se aqui a necessidade de que as atividades, materiais e procedimentos

    desenvolvidos nas instituies promovam a auto-estima das crianas. Nesse sentido

    destaca-se a exigncia de que as condies particulares das crianas, como o sexo e cor

    da pele, sejam foco de trabalhos que ajudem a enriquecer seu desenvolvimento.

    Meninos e meninas precisam receber estmulos para desenvolver suas vrias

    habilidades, sejam elas relativas ao movimento ou cuidado com o corpo. Pesquisas

    evidenciam que as instituies tendem a repetir os modelos da sociedade quanto ao que

    adequado aos meninos e as meninas. Estimulando nos meninos as brincadeiras de

    movimento e luta e nas meninas as brincadeiras de cuidados com a casa e com o corpo.

    As relaes de dominao tnico-racial tambm merecem destaque. As crianas

    aprendem a se valorizar e se respeitar por meio das relaes com as outras pessoas. A

    professora deve manter uma vigilncia atenta para que suas atitudes transmitam as

    crianas o sentimento de que so aceitas e valorizadas, independentemente da cor de sua

    pele. Pois, o modo como toca, conversa e escuta a criana pode faz-la se sentir aceita

    ou rejeitada. Alm disso, importante que os materiais utilizados tambm no

    reproduzam um ideal de beleza nico, em geral o da cor da pele branca e cabelos lisos,

    que possa causar constrangimento as crianas que no tm essas caractersticas. Essa

    ateno ao modo como as prticas pedaggicas devem acontecer so reforadas nos

    incisos do Art. 9. Destacando-se a garantia de que as experincias promovam o

    conhecimento de si e do mundo por meio da ampliao de experincias sensoriais,

    expressivas, corporais que possibilitem movimentao ampla, expresso da

    individualidade e respeito pelos ritmos e desejos da criana (inc. I); e ampliem a

    confiana e a participao das crianas nas atividades individuais e coletivas (inc. V).

    A adoo da noo de criana e de processo de desenvolvimento colocada pelas

    Diretrizes fortalece a importncia das instituies de Educao Infantil como contextos

    privilegiados de desenvolvimento. No entanto, para que isso acontea necessrio

    mudar as formas de relao entre adultos e crianas, seja na famlia ou na escola. Os

    adultos so responsveis pelos cuidados e pela educao das crianas. Mas, preciso

    lembrar que isto no retira dos meninos e das meninas, sua condio de sujeitos de

    direitos que devem ser ouvidos e terem suas necessidades respeitadas no processo

    educativo.

  • Destaques

    Compreendendo a criana como um sujeito scio-histrico que se desenvolve a partir

    das relaes que vivencia, destacamos a seguir o modo como o conceito de

    agressividade participa do processo de desenvolvimento infantil.

    Os bebs nascem com a capacidade de tornar-se um ser social em todos os sentidos,

    bastando que lhe deem as condies para desenvolver essa capacidade. A funo do

    meio ambiente (a famlia, em primeiro lugar, e depois a pequena "sociedade" em que a

    criana cresce) de proporcionar ao novo indivduo suficiente estabilidade e

    confiabilidade para que ele se sinta seguro de si e, em consequncia, seja capaz de

    perceber o outro e de devolver-lhe o que recebeu. Quando aqueles que cuidam da

    criana atrapalham seu desenvolvimento, interferem demais (invadindo) ou de menos

    (abandonando), surgem s doenas. Nessa concepo de desenvolvimento a

    "agressividade" tida como o impulso para agir, para ir em busca de algo, para sair do

    lugar. sinnimo de iniciativa, de energia empregada num movimento ou do uso livre

    da capacidade de desejar e tentar alcanar a coisa desejada. Nesse sentido, ela

    fundamental no desenvolvimento saudvel da criana. Alm dessa primeira funo, a

    agressividade pode se transformar em hostilidade, quando a criana no se sente bem

    consigo mesma e demonstra isso machucando outras pessoas ou a si mesma. Esses atos

    so um pedido de socorro para que as outras pessoas possam ajud-la a modificar seus

    sentimentos ruins. Nessas situaes a agressividade pode ser tida como um sinnimo

    da violncia, se o autor pode distinguir o certo do errado e tem conscincia dos

    danos que pode causar as outras pessoas.

    Retomando a definio trazida anteriormente de restringir o conceito de indisciplina aos

    comportamentos que dificultam o exerccio da prtica pedaggica; vale destacar que os

    prprios autores alertam para o fato de o conceito ser traduzido de modo particular em

    cada contexto escolar. As regras so socialmente construdas e isso faz com que um

    mesmo comportamento seja avaliado de modo diferente conforme o lugar em que

    acontea. No que se refere Educao Infantil, esse alerta se torna ainda mais

    contundente, pois primeiramente devemos pensar nos objetivos dessa etapa da educao

    e na adequao dos modelos pedaggicos que utiliza. Estudos indicam que muitas

    instituies de Educao Infantil importaram o modelo pedaggico tradicional das

    outras etapas da educao. Colocando como comportamento ideal das crianas o mesmo

    esperado de um bom aluno que deve permanecer quieto e calado. A adoo desse

    modelo complicada se considerarmos a necessidade de promover o desenvolvimento

  • integral das crianas. O uso do corpo e da linguagem deve ser amplamente estimulado

    visto que so ferramentas essenciais apreenso do mundo fsico e social. Alm disso,

    as crianas devem contar com o apoio dos adultos e das outras crianas para

    progressivamente aprenderem a coordenar e dirigir voluntariamente seus

    comportamentos.

    O entendimento do conceito de agressividade na forma proposta neste texto compartilha

    dessa idia da criana como um ser ativo no seu processo de desenvolvimento que lana

    mo dos recursos de que possui para se relacionar com o mundo e as pessoas que esto

    sua volta. Quando essas relaes vo bem e conseguem propiciar criana a sensao

    de que ela amada, o ambiente permite que a criana vivencie a sensao de segurana.

    Esse sentimento possibilita criana encontrar formas construtivas para lidar com a

    raiva, a frustrao, o medo etc. Um dos principais mecanismos para fazer isso so as

    brincadeiras de faz-de-conta onde as crianas podem exercer suas fantasias de

    destruio de modo inofensivo. Entretanto quando a criana no est se sentindo em

    segurana, ela tem dificuldades em aceitar seus sentimentos negativos e sente a

    necessidade de externar seu mal-estar para que algum lhe ajude a conter-se, para que

    ela no coloque em risco seu prprio corpo e sua frgil personalidade que est em

    construo.

    A professora de Educao Infantil deve estar atenta para diferenciar a agressividade

    espontnea, que coloca a criana em constante movimento e atividade, da agressividade

    hostil presente nos comportamentos em que a criana machuca os colegas ou a si

    mesma. Por exemplo, o beb que comea a morder os objetos e acaba tambm

    mordendo o colega, pode estar fazendo isso por ainda no diferenciar o que pode e o

    que no pode ser mordido. Como ele ainda no tem plena conscincia de seu corpo ele

    tambm no tem como se colocar no lugar do outro e saber que ir causar dor e

    desconforto. Portanto, a conduta deve ser de ajud-lo a fazer essa distino, indicando o

    que pode e o que no pode ser mordido. J se outra criana maior, que j tem noo do

    que pode ou no ser mordido, morde um colega preciso que a professora procure

    investigar junto com a criana as razes dessa conduta, mostrando-lhe formas

    alternativas de resolver os conflitos, demonstrar a raiva, a insatisfao. Uma

    possibilidade de ajuda oferecer a essa criana atividades em que possa descarregar sua

    energia sem machucar os colegas as atividades motoras so propicias a essa funo

    pular corda, saltar pneus, danar, subir e descer escadas etc. preciso tambm que a

    professora ajude a criana a nomear seus sentimentos e emoes, perguntando se ela

  • estava com raiva, se estava nervosa etc.; e tambm que apresente a criana o dilogo

    como a principal ferramenta de negociao entre as pessoas. A professora pode

    inclusive apresentar para a criana possveis frases para que ela falasse para o colega de

    seus sentimentos/emoes ou mesmo ajudar a criana a ter essa conversa com o colega,

    se ela assim desejar. A noo da infncia como uma fase de descoberta da cultura deve

    contemplar tambm o mundo da moralidade, compreendendo que as crianas aprendem

    o que certo e errado e o modo como devem se comportar atravs das experincias que

    vivem. Portanto, fundamental propiciar momentos em que sejam trabalhadas as

    noes de eu-outro, meu-seu, certo-errado, cooperao, colaborao. A grande temtica

    dos direitos humanos pode servir de eixo condutor de vrias atividades, j que

    contemplam os temas maiores das relaes democrticas e respeitosas entre as pessoas.

    O respeito diversidade e a considerao da riqueza que ela proporciona ajuda a

    construir um ambiente cooperativo. O modo de prevenir a agressividade hostil

    justamente oferecer um ambiente em que a criana se sinta segura e respeitada e tenha

    liberdade para demonstrar sua raiva e insatisfao.

    As reflexes acima reforam a importncia das relaes entre adultos e crianas e

    indicam o quanto essas interaes podem promover ou dificultar o desenvolvimento das

    crianas. Como vimos, a agressividade hostil pode ser resultado de interaes de m

    qualidade vivenciadas pelas crianas. Essas interaes tanto podem acontecer no

    ambiente familiar quanto nas instituies de Educao Infantil e nos dois casos

    preciso uma interveno dessas instituies.

    No caso de suspeita de que a criana esteja sendo vtima de violncia no ambiente

    familiar, as instituies devem se portar conforme indicado na Constituio Federal de

    1988 e no Estatuto da Criana e do Adolescente (Lei 8069 de 13 de julho de 1990) -

    ECA. A garantia da proteo dos direitos das crianas e adolescentes como dever do

    Estado e da famlia aparecem nesses instrumentos legais e indicam o imperativo de

    denunciar a suspeita ou confirmao de maus tratos e demais violncias contra as

    crianas. Como colocado pelo art. 13 do ECA a instituio deve comunicar suas

    suspeitas ao Conselho Tutelar do municpio. Considerando o pblico atendido pela

    Educao Infantil essa denncia se coloca como ainda mais necessria, visto que nos

    anos iniciais as crianas so totalmente dependentes dos cuidados dos adultos, no

    tendo fora fsica, compreenso e mesmo condies financeiras para se afastar

    voluntariamente de um agressor.

  • Cabe destacar que as denncias ao Conselho Tutelar podem ser feitas de forma

    annima, garantindo a segurana de quem prestou essa informao.

    Merece especial ateno nesse texto, as ocorrncias de maus tratos no interior das

    instituies de Educao Infantil. Para tratarmos desse tema voltaremos a falar de

    violncia e disciplina. Muitas ocorrncias de violncia contra as crianas ocorrem

    porque a professora acredita est fazendo o que melhor para a criana, tendo como

    base um modelo disciplinar que prega a necessidade da obedincia a qualquer custo.

    Uma criana que obrigada a ficar ao lado da professora porque bateu em um colega,

    est sendo castigada e esse ato pode ser interpretado como uma violncia fsica e

    psicolgica contra essa criana. Entretanto, se a professora estiver somente preocupada

    em manter a disciplina na sua sala de aula, pode considerar que essa atitude

    importante para que essa criana aprenda a controlar seus movimentos e a no

    desobedecer. Aqui vemos novamente o adultocentrismo em cena e a desconsiderao

    das necessidades da criana. Esse castigo pode criar um desgaste fsico e emocional

    para essa criana. Ao se sentir desconfortvel, ela provavelmente vai novamente repetir

    o comportamento agressivo hostil contra o colega, j que no foi ajudada a entender e

    resolver a situao de outro modo. Diante do novo episdio de bater no colega a

    professora pode repetir o mesmo castigo, ou vari-lo deixando essa criana sem o seu

    tempo de parque, por exemplo, e assim o ciclo de castigos ser mantido.

    Abrir os olhos e a percepo fundamental, professora, se quisermos de fato promover

    uma educao respeitosa, que retire o grande poder dos adultos sobre as crianas.

    Somos fisicamente mais forte e temos como principal tarefa servir de exemplo para o

    comportamento dessas crianas. Se ao agirmos nos utilizamos de meios violentos para

    educ-las, o que poderemos esperar do comportamento delas? Essas reflexes devem

    ser feitas diariamente para que consigamos quebrar com as armadilhas dos modelos

    autoritrios de educao das crianas. Esses modelos entendiam e defendiam as

    punies e os castigos como ferramentas eficazes na formao de pessoas dceis e

    obedientes. O mais difcil de romper com esses modelos que eles estariam justificados

    por um ideal nobre tornar a criana um adulto de bem. Portanto, cabe novamente

    questionar e refletir sobre as regras e normas das instituies de Educao Infantil,

    lembrando que devem promover o desenvolvimento integral das crianas, no momento

    presente e no pelo que futuramente elas devam ser. Esse objetivo maior invalida as

    aes disciplinares que exijam controle corporal e da fala. Desse modo fundamental a

    avaliao cotidiana das atitudes dos adultos com as crianas para que esses modelos

  • violentos sejam banidos das instituies de Educao Infantil. Tendo em vista todas as

    reflexes acima, passemos ento s propostas concretas de atuao no cotidiano das

    creches e pr-escolas.

    Sugestes de Aes, Propostas, Projetos

    Neste tpico resolvemos dividir as sugestes em trs partes: a) orientaes gerais de

    organizao das prticas pedaggicas nas instituies de Educao Infantil; b) sugestes

    para o trabalho com crianas de 0 a 3 anos; c) sugestes para o trabalho com crianas de

    4 e 5 anos.

    Orientaes gerais

    Considerando o modo como compreendemos a agressividade, antes de apresentar

    sugestes de prticas diretas com as crianas consideramos importante tratar de aspectos

    gerais do modo de organizao das instituies de Educao Infantil que podem

    contribuir para o desenvolvimento scio-afetivo das crianas e para a promoo de seu

    desenvolvimento moral.

    O estabelecimento de um ambiente de confiana fundamental para a tranqilidade e

    bem-estar daqueles que partilham um mesmo espao. Tornar a instituio de Educao

    Infantil um lugar agradvel para os adultos e crianas um primeiro passo para

    fortalecer o trabalho educativo que acontece. Como estamos falando de um sentimento,

    o modo de garantir a ocorrncia e manuteno dele se d por meio das relaes que se

    estabelecem entre as crianas e delas com os adultos. Uma relao para propiciar

    segurana precisa contar com os ingredientes do respeito, da ateno e do cuidado.

    Considerando as especificidades da infncia e o direito proteo que essa etapa exige,

    os adultos devem garantir que as relaes vivenciadas no ambiente das instituies

    ocorram do melhor modo possvel. Para tanto devem estar constantemente atentos

    postura corporal, modulao de voz e utilizao da linguagem oral. O modo como

    nos comunicamos com o outro ajuda bastante na promoo de uma relao respeitosa e

    cuidadosa, portanto devemos buscar a proximidade com a criana, tentar falar no tom

    mais baixo possvel e escolher palavras que possam facilitar o entendimento do que

    queremos dizer. Agindo desse modo as professoras oferecem s crianas modelos de

    relao que podem servir de inspirao para as relaes que as crianas desenvolvem

    com as demais crianas e adultos. Esses princpios podem inclusive ser trabalhados e

    ensinados por meio de atividades que promovam a cooperao e a colaborao.

  • Outro item que pode auxiliar o estabelecimento de um ambiente de confiana a

    familiaridade com os espaos e tempos da instituio. Esse um aspecto relevante e que

    por vezes mal compreendido. A organizao das atividades nas instituies de

    Educao Infantil deve seguir uma rotina que auxilie as crianas a antecipar os eventos

    e com isso minimizar a ansiedade diante do desconhecido. Entretanto, o

    estabelecimento da rotina no pode engessar as interaes e se impor aos ritmos e

    especificidades das crianas. A utilizao dos espaos e a realizao das atividades

    devem acontecer de forma prazerosa e possibilitar o aproveitamento de situaes

    inusitadas que podem enriquecer o processo de aprendizagem das crianas. Para isso

    preciso que o tempo pensado pelo adulto seja flexvel de modo a respeitar o ritmo das

    crianas. Um exemplo do que estamos falando pode ser a hora do descanso momento

    planejado para que as crianas durmam, em geral depois do almoo e na troca de turno

    de alguns profissionais. No razovel que o sono seja uma atividade imposta s

    crianas, portanto apesar de planejar esse momento preciso que se tenham outras

    opes para as crianas que por ventura no tenham sono ou no queiram permanecer

    deitadas. Se no houver essa flexibilidade um momento que poderia ser de grande

    relaxamento para a criana poder se transformar em tenso e desconforto.

    desejvel que tambm se minimize a rotatividade de professoras que lidam

    diretamente com as crianas. A convivncia diria favorece o estabelecimento de

    vnculos e trocas afetivas saudveis entre as crianas e os adultos responsveis pela sua

    educao. Conhecendo de modo particular cada criana as professoras podem

    desenvolver estratgias mais adequadas para a sua educao. Sendo assim, quando no

    possvel manter o mesmo profissional, essa troca deve ser feita com a informao s

    crianas sobre os motivos que levaram a sada da professora. Essa mesma ateno deve

    orientar a organizao da jornada de trabalho dos profissionais que atendem os bebs e

    as crianas que ficam nas instituies em horrio integral. Deve-se minimizar a

    rotatividade dos adultos para garantir o estabelecimento de relaes mais estveis com

    os bebs e as crianas. As instituies devem tambm ter no planejamento do horrio de

    trabalho das professoras momentos de formao continuada e planejamento das

    atividades, garantindo com isso a sade e satisfao das mesmas com o ambiente de

    trabalho. A ateno as condies de trabalho das professoras pode facilitar bastante o

    trabalho que elas desenvolvem diretamente com as crianas. Sentindo-se valorizadas e

    respeitadas podero tambm promover esses sentimentos nas crianas.

  • O nmero de crianas por adulto outro fator relevante na criao de um ambiente de

    segurana e proximidade. O Parecer CNE/CEB N 20/2009, publicado no Dirio Oficial

    da Unio do dia 11/11/2009, recomenda, no caso de agrupamento de crianas por faixa

    de idade, a proporo de 6 a 8 crianas por professora (no caso de crianas de zero e um

    ano), 15 crianas por professora (no caso de criana de dois e trs anos) e 20 crianas

    por professora (nos agrupamentos de crianas de quatro e cinco anos). As instituies

    que trabalham em turno integral precisam aumentar o nmero de adultos e de

    preferncia prever a existncia de duas professoras por turma para garantir que a

    realizao das atividades de higiene e alimentao aconteam de forma tranquila.

    O acesso das famlias ao espao da instituio tambm favorece o estabelecimento de

    um ambiente de confiana. Percebendo que seus familiares podem transitar pela

    instituio e que valorizam este espao, as crianas podem se sentir mais motivadas a

    permanecer nesse ambiente. Esse acesso deve ser privilegiado no momento de ingresso

    e adaptao das crianas na instituio. O momento de adaptao fundamental para

    um bom vnculo da criana com a instituio e a professora, portanto, deve ser

    planejado de modo a contemplar as necessidades, anseios e sentimentos dos bebs,

    crianas e de seus familiares. Sendo assim no possvel pensar um tempo rgido para

    que um familiar acompanhe o beb ou a criana nos primeiros dias. J so conhecidas as

    estratgias do familiar da criana permanecer perodos de tempo na instituio que

    progressivamente vo sendo diminudos. Aqui, novamente cabe o alerta quanto a

    procedimentos rgidos que ignoram ou menosprezam os choros e demais expresses dos

    bebs e crianas no perodo de adaptao. Nas instituies que zelam pelos direitos das

    crianas no h lugar para antigas crenas de que os bebs devem ficar chorando

    sozinhos sem aconchego para que se acostumem com o lugar e no fiquem

    manhosos, Ou seja, no h justificativa para negligenciar a expresso da criana e no

    auxili-la nesse momento delicado. E no caso de no acolher o beb, a professora est

    agindo de modo violento, desrespeitando os direitos de segurana e sade desse beb.

    Resta ainda destacar que mesmo depois do perodo de adaptao importante manter o

    acesso das famlias nas instituies de preferncia com a realizao de atividades

    coletivas entre crianas, professoras e familiares.

    A capacidade de brincar j est presente desde o nascimento e se estende por toda a

    nossa vida, sendo na infncia o principal meio de construo de conhecimentos e

    apropriao da cultura. A brincadeira deve ser estimulada e integrada em todo o

    cotidiano do trabalho das instituies de Educao Infantil. Ressalta-se que alm de

  • planejar e estimular brincadeiras compatveis com a faixa etria das crianas deve-se

    planejar tempos e espaos para a brincadeira livre, entendida como aquela que as

    crianas escolhem o qu e como fazer. O ato de brincar j em si uma atividade que

    promove o desenvolvimento, portanto, no preciso que as professoras fiquem

    preocupadas em tornar essa atividade pedaggica atravs de perguntas ou intervenes

    que direcionem o comportamento das crianas. Deve-se, entretanto, manter um olhar

    atento que garanta uma interveno rpida no caso de algum acidente ou na ocorrncia

    de brigas e discusses entre as crianas. Outro item de destaque, em especial no que diz

    respeito ao tema da agressividade uma crena de que no se devem permitir

    brincadeiras de lutas e combates entre as crianas e em especial entre os meninos

    porque isso seria um estmulo violncia. Conforme dito anteriormente a brincadeira

    um dos modos de manifestar a agressividade de forma construtiva, portanto, no h

    porque proibir as lutas e combates j que atravs delas as crianas podem liberar energia

    sem machucar o outro. Ressalta-se a necessidade de que as crianas sejam percebidas

    como sujeitos que partilham com os outros seres humanos todos os sentimentos e

    emoes, tanto as consideradas positivas, como as consideradas negativas. Essa

    percepo auxilia os adultos a no condenarem as expresses de raiva e frustrao e a

    ajudarem as crianas a encontrar formas construtivas para essas expresses.

    Outro aspecto que merece ser ressaltado a necessidade de trabalhos individualizados

    com as crianas nas instituies de Educao Infantil. Como cada criana tem um

    percurso nico importante que as professoras estejam atentas as necessidades

    singulares que precisam ser trabalhadas de modo particular. Pensando especificamente

    na situao de crianas que apresentem uma grande frequncia de comportamentos

    agressivos contra os colegas fundamental que se busque conhecer as motivaes dessa

    criana e que se encontre alternativas que lhe auxilie a modificar sua conduta. Uma

    criana com a linguagem oral pouco desenvolvida pode recorrer somente aos gestos

    para retirar os brinquedos da mo dos colegas. Agindo assim pode acabar sendo

    rejeitada e excluda do grupo. Nesse caso a professora precisa intervir ajudando essa

    criana a se comunicar melhor para que ela consiga interagir de forma mais saudvel

    com as outras crianas. Para tanto pode usar atividades de dramatizao e reconto de

    histrias tanto para promover a linguagem oral como para estimular os valores de

    cooperao e solidariedade. Tenho como exemplo o relato de uma professora de

    Educao Infantil ao perceber que uma das crianas estava sendo rejeitada pelos

    colegas. Em vez de pedir diretamente para que a turma aceitasse e acolhesse a criana

  • rejeitada, ela contou uma histria para a turma. Nessa histria uma criana expressava o

    quanto se sentia triste porque no era convidada pelos colegas de escola para participar

    das brincadeiras. Com essa histria as crianas se sensibilizaram e passaram a incluir

    aquela que estava sendo discriminada pelo grupo.

    Por fim, nessas orientaes gerais, destaca-se a novamente a necessidade de abolir os

    castigos fsicos e as humilhaes do ambiente das instituies de Educao Infantil. Se

    quisermos promover um ambiente de confiana incompatvel expor as crianas a

    situaes que provoquem desconforto e mal-estar, especialmente perante os colegas.

    Essa questo bastante sria e fere frontalmente a concepo da criana como um ser

    de direito, como cidad. No incomum ouvirmos ou presenciarmos crianas que

    desobedeceram as ordens da professora sendo colocadas de p, ou sentadas em um lugar

    mais afastado da sala ou do ptio para pensar no que fizeram, ou mesmo serem

    humilhadas perante os colegas com afirmaes do tipo: Fulano um beb gente, ainda

    no sabe calar o tnis. Esse tipo de atitude desrespeitosa por parte da professora pode

    no s estigmatizar essa criana perante os colegas como dificultar o seu envolvimento

    nas demais tarefas da instituio. O sentimento de inadequao proveniente desse tipo

    de castigo e humilhao pode fazer com que a criana repita o padro de conduta

    indesejado, j que no ajudada a agir de forma diferente. Outras formas de violncia

    mais silenciosas podem acontecer na rotina dos bebs. Temos como exemplo os

    momentos de alimentao e higiene, quando so obrigados a comer alimentos que no

    querem ou permanecer muito tempo com as roupas molhadas e sujas. A situao nesses

    casos ainda mais preocupante porque os bebs so completamente indefesos,

    dependendo inteiramente dos cuidados de outras pessoas. Destaca-se aqui a necessidade

    de que as professoras compreendam as diversas linguagens dos bebs e crianas e em

    especial o papel e lugar das emoes. A importncia de reconhecer e escutar o choro das

    crianas, acolhendo e respeitando essa forma de manifestao exige que a professora

    consiga controlar suas prprias emoes. A teoria do psiclogo francs Henri Wallon

    pode ajudar nesta tarefa. Ela nos adverte sobre o poder de contgio das emoes e sobre

    a necessidade de interromper o estado alterado de percepo que ela acarreta se

    quisermos desenvolver alguma atividade cognitiva. Portanto, cabe a professora ajudar a

    criana a sair do estado emocional alterado e recobrar sua estabilidade. Nesse sentido,

    se corrobora a necessidade de momentos coletivos de formao continuada que

    garantam s professoras reflexes sobre seus prprios comportamentos. Essas

    consideraes nos colocam novamente as concepes de disciplina e violncia, pois o

  • uso dos castigos geralmente est apoiado em um modelo disciplinar rgido em que a

    criana deve obedecer a todas as ordens dos adultos. Ao agir conforme esse modelo a

    professora, s vezes at de modo inconsciente, se torna violenta, j que desrespeita os

    direitos e necessidades dos bebs e crianas. Alm disso, conforme colocamos no incio

    desse texto, as crianas j so expostas cotidianamente a modelos violentos de

    relacionamento, por essa razo a instituio deve promover e apresent-las outras

    formas de relao. A professora deve sempre ter em mente que por meio das

    interaes que a criana constri o conhecimento sobre o mundo e sobre si mesma. Por

    isso, o modo como as relaes ocorrem na instituio uma das principais ferramentas

    de formao das crianas e bebs. Isso coloca a relevncia de que as crianas no sejam

    expostas a modelos violentos nesses ambientes, j que diante dessas experincias podem

    acabar aprendendo que esse o modo como tambm devem agir e resolver seus

    conflitos. Relembramos, novamente, como destacado nas Diretrizes, o compromisso

    tico das professoras e gestoras em garantir e promover a implementao dos direitos

    sociais e civis das crianas dentro e fora das instituies. Ao perceber que um beb ou

    uma criana esteja sendo vtima de violncia no ambiente familiar, a professora e/ou

    gestora deve comunicar o Conselho Tutelar do municpio.

    Sugestes para o trabalho com crianas de 0 a 3 anos

    Um primeiro aspecto necessrio no trabalho com essa faixa etria modificar antigas

    crenas de que at o surgimento da linguagem os bebs no teriam inteligncia, ou no

    seriam inteligentes. Jean Piaget nos mostra com uma riqueza de detalhes o quanto o

    desenvolvimento se incrementa e se enriquece no primeiro ano de vida, possibilitando

    aos bebs avanos na compreenso do mundo, das pessoas e de si mesmo. Essa viso

    acentua a necessidade de um cuidado atento e respeitoso que possibilite ao beb a

    sensao de que est constantemente amparado e seguro. De modo prtico isso pode ser

    atingido com uma resposta dos adultos s necessidades de alimentao e higiene quando

    estiverem causando desconforto ao beb. Nos primeiros anos de vida importante

    manter um padro de comportamento que interprete as expresses sonoras e fsicas do

    beb e lhe oferea o cuidado adequado: troca de fralda, substituio de roupa, oferta de

    alimento etc. Alm disso, com o incremento das habilidades motoras importante que

    esse beb tenha oportunidades de exercitar essas habilidades. Promover oportunidades

    de deslocamento seguro e contato com objetos auxilia a progressiva construo que o

    beb faz do mundo objetivo e de si mesmo como um objeto separado desse mundo. No

    ambiente da Educao Infantil, que recebe as crianas desde os primeiros meses de

  • idade, os rituais de higiene e alimentao merecem, portanto toda a ateno da

    professora, j que sua funo est muito alm da satisfao fsica dessas necessidades,

    contribuindo efetivamente no desenvolvimento desses bebs. Perceber a importncia

    desses momentos e realiz-los com a ateno devida significa colocar em prtica a viso

    da indissociabilidade do cuidado e da educao, o que se faz imperativo nesse momento

    da vida dos bebs. O toque, o acolhimento e o afago so aliados do processo de

    desenvolvimento sendo to educativos quanto oferta de um brinquedo ou a leitura de

    uma histria.

    Estimular a expresso dos bebs e crianas por diversas linguagens facilita o

    desenvolvimento scio-afetivo e moral. O conforto proporcionado pelas cantigas de

    ninar que tm uma funo tanquilizadora para os bebs pode inspirar vrias atividades

    com essa faixa etria. O estmulo aos movimentos tambm pode ser desenvolvido com

    msicas mais didticas que tm em suas letras referncias diretas s partes do corpo,

    como com msicas clssicas e populares que tenham ritmo agradvel e convidem s

    crianas e bebs ao movimento e dana. A leitura e dramatizao de histrias tanto

    auxiliam na aquisio e incremento da linguagem verbal como na insero na cultura,

    ajudando-os a reconhecerem os valores e comportamentos estimulados pelo grupo onde

    vivem. Todas essas atividades podem auxiliar os bebs e as crianas a se sentirem

    respeitados, amados e acolhidos, facilitando, portanto seu processo de desenvolvimento

    scio-afetivo e de construo de sua personalidade. Desse modo, a instituio possibilita

    a expresso da agressividade de forma construtiva, o que pode minimizar a necessidade

    de comportamentos agressivos hostis por parte das crianas. Ainda assim, a professora

    deve estar preparada e aberta para lidar com a ocorrncia de comportamentos agressivos

    hostis, buscando compreender esses comportamentos e auxiliando a criana a encontrar

    outras formas de manifestar sua agressividade. Lembramos que a qualificao do

    comportamento como agressivo uma atitude da professora ou do adulto que est

    interagindo com a criana, pois ela mesma ainda no tem plena compreenso de si e do

    outro. Vejamos um exemplo: um beb est sentado ao lado de outro e ao pegar um

    boneco de borracha que faz barulho, bate com esse boneco no cho e depois no colega

    algumas vezes. O adulto ao ver essa ao quem interpreta e qualifica esse

    comportamento como uma agresso ao colega, pois o beb provavelmente s est

    interessado na mudana de sons que ocorre quando deixa de bater o boneco no cho e

    bate com o boneco no colega. Mesmo considerando o ponto de vista do beb, a

    professora deve intervir na situao explicar a ele que a sua ao pode incomodar o

  • colega e que ele no deve repeti-la. Pode inclusive oferecer outros objetos, como uma

    cadeira, para que o beb possa bater o boneco e perceber as mudanas de sons. Resta-

    nos explicitar que a interpretao do comportamento influencia no modo como os

    adultos interagem com os bebs e crianas. Portanto, uma interpretao equivocada que

    considerasse que o beb sabe o que est fazendo e tentou machucar o colega,

    poderia fazer com que a professora olhasse para o beb e se comunicasse com ele de

    forma grosseira. Passando a impresso de que ele fez algo errado e que deve ser

    repreendido por isso. Agindo assim, a professora pode perder a oportunidade de

    enriquecer os conhecimentos do beb e ainda faz-lo sentir-se mal. Por isso, insistimos

    na relevncia de buscar compreender a motivao dos comportamentos de bebs e

    crianas considerando suas especificidades.

    As dramatizaes de histrias se constituem em elemento que pode contribuir bastante

    para o desenvolvimento moral das crianas. Vygotsky j nos alertou para a importncia

    da brincadeira do faz-de-conta como um exerccio dos papis sociais e das regras

    inerentes a eles. Com os bebs j possvel familiariz-los com essa linguagem

    oferecendo espetculos de teatro. Instituies italianas j desenvolvem essa atividade h

    alguns anos e evidenciaram o interesse dos bebs desde os 6, 7 meses para os

    espetculos teatrais. Com as crianas de 2 e 3 anos j possvel inclusive fazer

    pequenas dramatizaes, respeitando o ritmo e envolvimento delas. A possibilidade de

    vivenciar os personagens oferece as crianas um modo de se aproximar dos valores

    culturais e do ponto de vista dos outros, o que contribui bastante para seu

    desenvolvimento moral. Alm disso, por meio das dramatizaes as crianas podem

    exercitar sua capacidade destrutiva, se permitindo exteriorizar os sentimentos ruins e

    angstias que podem lhe causar sensaes desagradveis. As possibilidades da

    linguagem teatral so muitas e se estendem para a prxima faixa etria.

    Lembramos, que conforme a teoria de desenvolvimento moral de Piaget por volta dos

    2 anos que a criana inicia sua relao com o mundo das regras e normas. O acesso

    linguagem verbal inaugura um novo universo que amplia sobremaneira a relao da

    criana com a cultura, portanto, todas as formas de enriquecer e aprimorar essa

    poderosa forma de comunicao e expresso so vlidas.

    Sugestes para o trabalho com crianas de 4 e 5 anos.

    O incremento das capacidades motoras e lingusticas ocorrido nos trs primeiros anos

    pode ser potencializado no trabalho com as crianas de 4 e 5 anos. A advertncia s

    professoras dessa fase no perder de vista o fato de que essas crianas continuam

  • necessitando e utilizando os movimentos e brincadeiras como modos predominantes de

    relao com o mundo e a cultura. O fato de j estarem atentas ao mundo das regras e

    normas acentua a possibilidade de envolver as crianas na definio dos modos de

    funcionamento da instituio. Essa participao pode ocorrer tanto no mbito da turma,

    estabelecendo as regras vlidas para as atividades que acontecem no grupo; como pode

    envolver todas as crianas da instituio, para estabelecer regras gerais que valem em

    todos os espaos. Essa participao oferece criana a possibilidade de ampliar seu

    ponto de vista e reconhecer as necessidades das outras pessoas. O fato de ter ajudado a

    construir uma regra, torna a criana mais comprometida com seu cumprimento.

    Outra tarefa importante auxiliar as crianas a reconhecerem e nomearem seus

    sentimentos. Devemos lembrar que como recm-chegadas cultura ainda no

    conseguem compreender e nomear o que sentem. Uma tarefa digna de ateno ajudar

    a criana a expressar o que est sentindo. No momento que ela consegue fazer isso

    interrompe a descarga de energia prpria das emoes e pode ento recuperar sua

    estabilidade emocional.

    O processo de desenvolvimento uma teia que vai sendo construda a partir de nossas

    experincias com as outras pessoas e com os objetos. Nossas capacidades afetivas

    (relativas s emoes, sentimentos, valores, crenas), motoras (relativas ao

    movimentos) e cognitivas (relativas a inteligncia, conhecimento e compreenso do

    mundo) so os instrumentos que possibilitam essas experincias. Ao mesmo tempo, as

    experincias promovem modificaes em cada uma dessas esferas, ampliando,

    reduzindo, ou mesmo cristalizando nossas capacidades afetivas, motoras e cognitivas.

    Sendo assim, as instituies de Educao Infantil devem continuar valorizando a

    diversidade de linguagens das crianas de 4 e 5 anos, entendendo que sua finalidade

    promover o desenvolvimento em todas as suas esferas e no somente na dimenso

    cognitiva. A ateno aos comportamentos e relaes que a criana vivencia se afigura

    como central nessa viso, j que o conhecimento do mundo no ocorre de modo

    dissociado do autoconhecimento.

    Jean Piaget j defendia que as atividades escolares acontecessem por meio do trabalho

    em grupo e do autogoverno. Essas ferramentas podem auxiliar a criana em seu

    desenvolvimento moral promovendo a internalizao das regras e a construo do

    sentimento de justia. Conforme sua teoria at aproximadamente os 2 (dois) anos a

    criana desconhece o mundo das regras, estando no estgio denominado de anomia.

    Este termo refere-se ao desconhecimento da existncia das regras e leis; ou seja, nesses

  • primeiros anos a criana sequer tem conscincia de que existem leis e regras a serem

    seguidas. Com o uso da linguagem a criana inicia seu contato com as regras e comea

    a distinguir progressivamente o que considerado certo e errado na cultura onde vive.

    Num primeiro momento a criana acredita que as regras tm fora por virem de um

    agente externo de maior autoridade, como os adultos ou mesmo Deus. Depois com a

    maior convivncia com outras crianas e adultos em situaes diversificadas que sejam

    reguladas por normas e regras, a criana passa a compreender que as regras so criadas

    pelas pessoas e que podem mudar conforme o lugar e as situaes. Esse perodo que se

    estende at os 11, 12 anos denominado de heteronomia. Com a adolescncia pode ter

    incio o terceiro estgio, denominado de autonomia, quando conseguimos entender as

    regras e normas, ter conscincia do valor relativo delas e fazer a opo consciente de

    adot-las pelo seu valor intrnseco, ou seja, por compreender que ela traz benefcios.

    Essa viso acentua a importncia das escolas contriburem para o desenvolvimento

    moral das crianas ajudando-as a construrem as noes de certo e errado e a

    internalizarem os valores presentes em nossa cultura O sentimento de justia

    acompanha essa evoluo do desenvolvimento moral, no estgio da heteronomia o

    julgamento das aes est atrelado as suas consequncias sem levar em considerao a

    intencionalidade do autor. Por exemplo, se perguntarmos a uma criana de 4, 5 anos de

    idade o que deve acontecer com um menino que quebrou sem querer 10 pratos e um

    menino que quebrou por querer 1 prato, provavelmente ela ir nos dizer que o que

    quebrou dez pratos deve receber um castigo maior, desconsiderando o fato de essa ao

    ter acontecido por acidente e no por vontade do menino. A transio desses estgios

    no acontece de forma espontnea e as crianas s chegaro ao estgio da autonomia se

    tiverem experincias sociais que favoream o autogoverno, tambm chamado de

    autocontrole. Sendo assim, o estmulo e a possibilidade de exerccio da autonomia

    devem estar presentes no ambiente das instituies de Educao Infantil desde os

    primeiros anos das crianas, podendo ser incrementado nessa faixa etria de 4, 5 anos.

    A organizao do material pessoal nos momentos de chegada e sada da instituio

    uma atividade que pode ser estimulada desde as crianas de 2, 3 anos. A escolha de

    atividades e de parceiros pode fazer parte da rotina das crianas de 4 e 5 anos. Os jogos

    com regras podem auxiliar o desenvolvimento moral, facilitando a compreenso e

    internalizao das normas. Auxiliam tambm na aprendizagem do modo como lidar

    com os sentimentos de orgulho, em geral provenientes das vitrias, como com a

    frustrao, que costuma acompanhar as derrotas. Retomando diretamente o tema da

  • agressividade, os jogos podem servir como outra modalidade de expresso da

    agressividade. A garra, a disposio e o envolvimento exigido nas situaes de

    competio possibilitam a criana manifestar sua fora atravs dos movimentos e

    palavras. Ressalta-se que as professoras podem desenvolver tarefas tanto com jogos j

    disponveis na cultura, como desenvolver novos jogos com as crianas. Os jogos que

    envolvem a aquisio de conhecimentos so boas ferramentas para trabalhar no s o

    desenvolvimento afetivo e motor, mas tambm o desenvolvimento cognitivo.

    Considerando as possibilidades j descritas das dramatizaes, vale reafirmar a

    possibilidade de desenvolver essas atividades com a faixa etria de 4, 5 anos. Nessa

    idade j possvel incrementar as representaes trabalhando no s com a atuao

    direta das crianas, mas tambm com a criao e confeco de figurinos, msicas,

    cenrios e adaptaes de textos. O encanto despertado pelas leituras das histrias

    clssicas pode ser bastante aproveitado para propiciar s crianas a troca de papis,

    saindo do lugar de expectadores para o lugar de atores e produtores. Essa atividade um

    bom exemplo do conceito de criana como protagonista de seu processo de

    desenvolvimento, conforme defendido nas Diretrizes.

    Finalizamos nossas sugestes reiterando que o aspecto mais central da educao

    ofertada nas instituies de Educao Infantil est nas relaes estabelecidas entre as

    professoras e as crianas. As reflexes sobre os conceitos de disciplina, violncia e

    agressividade auxiliam a pensar o modo como essas relaes se concretizam no

    cotidiano das instituies. Acreditamos que todas as posturas e atividades recomendadas

    precisam ser primeiramente discutidas pelo grupo de professoras. O efeito dessas

    atividades e posturas depender da avaliao e compreenso das professoras sobre a

    validade dessas aes no processo educativo. O protagonismo das crianas, em

    momento algum, prescinde do protagonismo das professoras como principais

    mediadoras da cultura no espao da instituio. Portanto, da sua atuao, professora,

    depende a implementao do que sugerimos. As aes devem ser acompanhadas por

    momentos coletivos de reflexo e anlise, que auxiliem as necessrias adaptaes as

    questes trazidas pela realidade de cada instituio.

    Reflexes e Indagaes

    O estudo do desenvolvimento scio-afetivo das crianas e em especial das

    manifestaes de agressividade ainda um desafio para os estudiosos das diversas reas

    das cincias humanas. Compreender melhor esses temas requer a abertura para as

    experincias concretas que esses sujeitos vivenciam nos diferentes contextos, em

  • especial, nas instituies de Educao Infantil. Deste modo todos so convidados a

    contribuir na melhor compreenso do comportamento infantil, sendo que a observao e

    escuta atenta das crianas so elementos essenciais nessa tarefa. Portanto, o que

    trouxemos aqui no deve ser tomado como verdade nica e fechada, mas sim inspirar

    novas reflexes e indagaes sobre o modo como ocorrem as relaes entre crianas e

    adultos.

    Um melhor conhecimento das idias dos autores aqui citados pode auxiliar nessa

    permanente construo de saberes sobre o comportamento infantil e sobre as relaes

    entre crianas e adultos. Para um contato inicial sugerimos a leitura dos livros:

    Henri Wallon: uma concepo dialtica do desenvolvimento infantil, de Isabel Galvo

    (Petrpolis: RJ, Vozes, 1995);

    Piaget, Vygotsky, Wallon: Teorias psicogenticas em discusso, de Yves de La Taille,

    Marta Kohl Oliveira e Heloisa Dantas (So Paulo: Summus, 1992);

    Vygotsky - Aprendizado e desenvolvimento, um processo socio-histrico, de Marta

    Kohl Oliveira (So Paulo: Scipione, 1993).

    Para conhecer mais especificamente o tema do desenvolvimento moral e da

    agressividade sugerimos a leitura do livro de Jean Piaget, O julgamento moral na

    criana (So Paulo: Mestre Jou, 1977); e da coletnea de artigos de Donald Woods

    Winnicott, Privao e Delinquncia, (Rio de Janeiro: Martins Fontes, 1994).

    O entendimento das temticas da violncia e da disciplina tambm se coloca como uma

    questo para a Educao Infantil j que permeia as relaes que acontecem em todas as

    instituies sociais. Para tanto sugerimos a leitura do livro A sndrome do medo

    contemporneo e a violncia na escola, organizado por Luiz Alberto Oliveira Gonalves

    e Sandra de Ftima Pereira Tosta (Belo Horizonte: Autntica, 2008).

    A relao dessas temticas com os estudos da sociologia da infncia podem ser melhor

    compreendidas com a leitura do nmero especial da revista Educao e Sociedade

    (Volume 26, nmero 91, 2005) que apresenta vrios artigos dessa recente rea da

    sociologia. Entre as contribuies dos diversos artigos destacamos os que auxiliam a

    compreender melhor as armadilhas do adultocentrismo, a pensar a organizao dos

    tempos e espaos nas instituies de Educao Infantil, a incluir as crianas nas

    pesquisas, e a pensar a relao com as crianas deficientes.

    Essas leituras acima indicadas possibilitam uma melhor compreenso das crianas e da

    infncia e das potencialidades e dificuldades das relaes entre crianas e adultos. Nesse

    sentido podem auxiliar na construo de novas formas de interao entre adultos e

  • crianas e dos adultos entre si, que sejam mais democrticas e respeitosas. Esse o

    principal desafio dos familiares e professoras responsveis pela educao das crianas

    nos primeiros anos de vida, j que esse um perodo especial no desenvolvimento

    scio-afetivo e que a atitude dos adultos fundamental para assegurar a sade e bem-

    estar das crianas.