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Maxwell Silvrio de Sousa

Relato n6 Salientando a unio entre sujeito e objeto que estava na origem da vivncia do homem antigo e de sua imaginao mtica, preciso perguntar: como se deu a passagem, do mito a racionalidade propriamente dita, entendida enquanto processo pelo qual se possa dominar o mundo, sublevar a condio humana acima da natureza e investir contra ela, no anseio de se livrar do temor das potncias naturais? Esse processo pode estar na base da dessacralizao da cidade antiga.

Lendo Fustel, se percebe que a formao dos Estados foi acompanhado de um processo de secularizao das instituies, quando as normas da religio no se compatibilizavam mais com as reivindicaes concretas dos homens. O direito a terra, a existncia em famlia, a contrao do matrimnio, direitos testamentrios, etc. Todos estes itens estavam limitadas as classes mais nobres, que por natureza divina os possuam. As relaes sociais de ento destinavam a manter pela eternidade a relao entre nobre e servo. Estavam fundadas diretamente no direito ao culto, e no pensamento mistificados dos primeiros povos. A conscincia de ento, estava submetida ao sagrado de tal forma que a passagem para uma forma de compreenso racionalizvel do mundo estava interditada.

A cristalizao de formas de vida derivada da constituio psquica do homem. A construo de uma identidade capacitada a investir sobre o mundo estaria intimamente associada ao afeto que inicialmente dotou os homens da vontade de superar o terror da vida em natureza. As formas de sociabilidade adquiridas aps os tempos mticos, formas depuradas de sua caracterstica sagrada, conseguiram usar de sua identidade para derrotar as velhas relaes baseadas na religio antiga, no culto aos deuses. Para isso, foi preciso uma conscincia manipuladora da realidade.

O movimento que vai dos tempos de vivncia mtica ao processo de desencantamento do mundo, tem por fundamento a ciso da unidade instauradora do perodo mtico. No surgimento do sujeito, reconhece-se sua capacidade de determinar os processos que regulam sua vida poltica e social de maneira conforme ao projeto designado por suas necessidades prementes, as quais prescindem do sagrado, porquanto esto ligados a meios e fins idealizados por uma razo que se questiona sobre o que significam tais aspectos da vida em sociedade, e sobre as questes que pairam sobre suas cabeas, ligadas ao divino.

Como bem apontado por Fustel, o desenvolvimento da filosofia na Grcia antiga mostra bem como os deuses foram pouco a pouco deixando o espao da vida concreta dos indivduos, para serem objeto de inteleco. As inquiries sobre a natureza do universo no deixavam dvidas para algumas correntes mais notveis da antiguidade, como o estoicismo. Os esticos so expresso notvel da separao entre sujeito e objeto operada no pensamento humano. A noo de cosmopolitismo, que ganha corpo com estes, j sintoma da precariedade das cidade em manterem os cidados circundados por suas fronteiras limtrofes em funo do culto. No h obstculo para uma racionalidade que se pretende livre da sujeio ao mtico. Este passa a ser alegoria de tempos passados, nada significando, a no ser o continusmo de formas de opresso estabelecidas por homens de conscincia obscurantista.

A criao da cincia, o desenvolvimento de formas refinadas de vida em sociedade, a filosofia, so a consequncia de um EU capaz de se elevar acima das condies impostas pelo o que j era considerado arcasmo sem sentido. Escolas filosficas da antiguidade como o estoicismo eram a expresso da mudana de concepo sobre a relao entre o homem e universo, que se indignavam contra o conservantismo arbitrrio das camadas mais nobres em nome do pensamento mistificado.

Entretanto, digno de nota que mesmo os estoicos cultuavam divindades, e que o projeto totalizante da separao entre sujeito e objeto, se d no perodo das grandes navegaes. Em particular com Bacon, para o qual a instrumentalidade da razo era condio do desenvolvimento humano. Trata-se aqui da radicalizao da ruptura entre sujeito e objeto, numa poca de consolidao de formas sofisticadas de controle social e formao poltica.