relatorio-formacao-continuada
-
Upload
silmary-schinnaydd -
Category
Documents
-
view
220 -
download
0
Transcript of relatorio-formacao-continuada
-
8/3/2019 relatorio-formacao-continuada
1/129
2011. Fundao Victor Civita. Todos os direitos reservados.
1
FORMAO CONTINUADA DE PROFESSORES: UMA
ANLISE DAS MODALIDADES E DAS PRTICAS EM
ESTADOS E MUNICPIOS BRASILEIROS
RELATRIO FINAL
Estudo realizado pela Fundao Carlos Chagaspor encomenda da Fundao Victor Civita
JUNHO/2011
Fundao Carlos Chagas
Realizao:Parceria:
-
8/3/2019 relatorio-formacao-continuada
2/129
2011. Fundao Victor Civita. Todos os direitos reservados.
2
A Fundao Victor Civita, que tem por misso contribuir para a melhoria da qualidade daEducao Bsica no Brasil, produzindo publicaes, sites, material pedaggico, pesquisas eprojetos que auxiliem na capacitao dos professores, gestores e demais responsveis peloprocesso educacional, implantou uma rea de estudos com o objetivo de levantar dados einformaes que auxiliem as discusses sobre prticas, metodologias e polticas pblicas deEducao.
Para acompanhar outros trabalhos, visite o nosso sitewww.fvc.org.br/estudos.
EQUIPE DA FUNDAO VICTOR CIVITA
DIRETORIA EXECUTIVAAngela Cristina Dannemann
COORDENAO PEDAGGICARegina Scarpa
REVISTA NOVA ESCOLA E GESTO ESCOLARGabriel Grossi
Paola Gentile
ESTUDOS, PESQUISAS E PROJETOSMauro MorellatoAdriana Derbio
http://www.fvc.org.br/estudoshttp://www.fvc.org.br/estudoshttp://www.fvc.org.br/estudoshttp://www.fvc.org.br/estudos -
8/3/2019 relatorio-formacao-continuada
3/129
2011. Fundao Victor Civita. Todos os direitos reservados.
3
EQUIPE DA FUNDAO CARLOS CHAGAS
ASSESSORIA GERALBernardete A. Gatti
COORDENAO
Claudia Leme Ferreira Davis
Marina Muniz Rossa Nunes
Patrcia Cristina Albieri de Almeida
PESQUISADORES DE CAMPO
Ana Maria Lima Teixeira
Ana Maria Gimenes Corra Calil
Ani Martins da Silva
Bruna Casiraghi Panardes
Claudia Leme Ferreira Davis
Eleny Mitrulis
Juliana Cedro de Souza
Luciane Maria Schlindwein
Maria Eloisa Fam D AntinoMaria Helena da Rocha Besnosik
Marina Muniz Rossa Nunes
Mary Julia Martins Dietzsch
Neusa Banhara Ambrosetti
Patrcia Cristina Albieri de Almeida
Patricia Davis Ribeiro da Silva
ASSISTENTES DE PESQUISAAna Paula Ferreira da Silva
Juliana Cedro de Souza
-
8/3/2019 relatorio-formacao-continuada
4/129
2011. Fundao Victor Civita. Todos os direitos reservados.
4
SUMRIO
Introduo ...........................................................................................07
Parte I ..................................................................................................09
1. Formao Continuada de professores ............................................... 091.1. A preocupao com a Formao Continuada .................................. 121.2. Abordagens de Formao Continuada que se centram na figura do
professor .................................................................................. 161.2.1. A Formao Continuada como desenvolvimento decaractersticas ticas e polticas essenciais para o exerccioprofissional .............................................................................. 161.2.2. A Formao Continuada como meio de suprir os dficits daformao inicial de professores .................................................. 17
1.2.3. A Formao Continuada pautada pelo ciclo de vidaprofissional .............................................................................. 19
1.3. Abordagens de Formao Continuada que se centram nodesenvolvimento das equipes escolares e das escolas....................... 22
1.3.1 O coordenador pedaggico como principal responsvel pelosprocessos de Formao Continuada nas escolas ........................... 22
1.3.2 A Formao Continuada como meio de fortalecer e legitimar aescola como lcus de formao contnua e permanente para todosnela presentes ......................................................................... 25
2. Incurses governamentais relativas Formao Continuada deprofessores no Brasil ............................................................................29
2.1. O novo papel do Governo Federal ................................................ 312.1.1. Fundo de Manuteno e Desenvolvimento do EnsinoFundamental e de Valorizao do Magistrio (FUNDEF) ................. 31
2.1.2. Sistemas de avaliao das redes de ensino........................... 33
2.1.3. Parmetros Curriculares Nacionais (PCNs)........................... 34
2.1.4. Livros didticos .............................................................. 35
2.1.5. Classes de acelerao ...................................................... 35
2.1.6. Qualificaes do professor e planos de carreira ................... 362.1.7. Formao Continuada de docentes .................................... 36
Parte II ................................................................................................42
3. Procedimentos metodolgicos ..........................................................423.1. Caracterizao das Secretarias de Educao .................................. 44
Parte III ...............................................................................................49
-
8/3/2019 relatorio-formacao-continuada
5/129
2011. Fundao Victor Civita. Todos os direitos reservados.
5
4. Principais achados ............................................................................494.1. Viso sobre as aes de Formao Continuada .............................. 494.2. Demandas da Formao Continuada ............................................ 57
4.2.1. A natureza das demandas em Formao Continuada............. 624.2.2. Perfil dos professores interessados em Formao Continuada 64
4.2.3. Incentivos Formao Continuada ..................................... 654.3. Prticas formativas mais frequentes............................................... 66
4.3.1. Perspectivas individualizadas............................................. 674.3.2. Perspectivas colaborativas................................................. 74
4.3.2.1. A perspectiva colaborativa do ponto de vista do centrode formao ........................................................... 79
4.3.2.2. A perspectiva colaborativa do ponto de vista da escola. 814.4. Equipes de Formao Continuada................................................. 84
4.4.1. O perfil dos formadores..................................................... 85
4.4.2. O coordenador pedaggico e a formao continuada ............ 874.5. Formas de avaliao e acompanhamento ...................................... 904.6. Dificuldades enfrentadas nas aes formativas .............................. 95
Parte IV ..........:.....................................................................................97
5. Discusso final..................................................................................975.1. Principais concluses .................................................................. 975.2. Principais proposies para polticas pblicas relativas Formao
Continuada de professores .......................................................... 104
6. Referncias bibliogrficas ................................................................ 108
ANEXO I................................................................................................114
ANEXO II ..............................................................................................120
-
8/3/2019 relatorio-formacao-continuada
6/129
2011. Fundao Victor Civita. Todos os direitos reservados.
6
LISTA DE TABELAS E BOXES
Tabelas
Tabela 1. Identificao das Secretarias de Educao por regio do pas43
Tabela 2. Caracterstica das redes estaduais ..................................... 45
Tabela 3. Caracterstica das redes municipais .................................... 46
Boxes
Boxe N. 1 SEE da Regio Centro-Oeste (SECO) ................ 55
Boxe N. 2 Programa Gesto da Aprendizagem Escolar (Gestar)......... 71
Boxe N. 3 SEE da Regio Sul (SES)................................... 73
Boxe N. 4 SEE da Regio Sudeste (SESE)................................ 76
Boxe N. 5 SEE da Regio Centro-Oeste (SECO) ..................... 78
-
8/3/2019 relatorio-formacao-continuada
7/129
2011. Fundao Victor Civita. Todos os direitos reservados.
7
INTRODUO
Este texto apresenta os resultados de uma pesquisa que teve por objetivo
identificar como se configuram, atualmente, as aes de formao continuada de
professores em diferentes estados e municpios brasileiros, as modalidades por
meio das quais elas so implementadas e os processos de monitoramento e
avaliao empregados.
A Educao brasileira tem passado nas ltimas duas dcadas por muitas
mudanas. Ganham destaque os avanos observados nos diferentes campos de
conhecimento, as reformas curriculares ocorridas nos anos 1990, a utilizao de
avaliaes censitrias sistemticas em nvel nacional e estadual, a implementao
do sistema de ciclos etc. interessante notar que essas medidas importantes por
buscarem superar os problemas de acesso e assegurar a permanncia bem-
sucedida em escolas pblicas de boa qualidade acabaram por descortinar a
fragilidade da formao inicial dos docentes, como bem mostram os estudos de
Gatti e Nunes (2009) e Gatti e Barreto (2009). De fato, a chamada
redemocratizao da Educao pblica implicou o desequilbrio entre a ampliao
da oferta de vagas e a capacidade das instituies escolares de atender os alunos
em conformidade com o esperado. Na medida em que os sistemas escolares no
mais conseguiram enfrentar os desafios postos, as condies de trabalho foram
tambm piorando sensivelmente. De acordo com o Ministrio da Educao (MEC),no final da dcada de 1990, a formao disponibilizada aos professores brasileiros
no contribuiu para que seus alunos tivessem sucesso nas aprendizagens escolares
(BRASIL/MEC, 1999).
nesse contexto de dupla preocupao de um lado, com a qualidade da
escolarizao oferecida s crianas e aos jovens e, de outro, com o
desenvolvimento profissional dos docentes que a Formao Continuada de
professores, em sua articulao com o trabalho docente, alvo de interesse. Diantedas novas polticas educacionais, vrios autores, como Fusari (1998), Nvoa
(1998), Andr (2000), Mizukami (2002), Oliveira (2003), Souza (2005) e Tardif
(2005), tm se preocupado com o processo de trabalho nas escolas. , portanto,
oportuno e necessrio aprofundar a discusso sobre como e mediante quais
circunstncias a Formao Continuada tem contribudo para o desenvolvimento
profissional dos docentes e para a qualidade dos processos educativos no pas. Da
a pretenso deste estudo: verificar como ela tem ocorrido em diferentes estados e
municpios brasileiros, focando, em especial, as escolhas das secretarias estaduais
(SEE) e municipais (SEM) de Educao diante das demandas existentes, as
-
8/3/2019 relatorio-formacao-continuada
8/129
2011. Fundao Victor Civita. Todos os direitos reservados.
8
modalidades por meio das quais as aes desencadeadas so implementadas, os
processos de monitoramento e avaliao empregados. Buscou-se, ainda, analisar
as diversas prticas de formao continuada com vistas a subsidiar o fortalecimento
de novos paradigmas na rea, mais capazes de propiciar o aprimoramento
profissional dos docentes e a melhoria da qualidade da Educao oferecida pelasredes pblicas de ensino.
Trata-se, portanto, de um estudo das aes adotadas pelas secretarias de
educao estaduais e municipais em relao formao continuada de seus
professores. A pesquisa foi realizada em quatro etapas distintas, que resultaram no
texto que se segue. Na primeira etapa, procedeu-se ao levantamento e ao estudo
bibliogrfico da produo acumulada na rea, de modo que, conhecendo-a, fosse
possvel definir a viso terica que orientaria a anlise dos dados. Na segunda
etapa, foram elaborados os instrumentos de pesquisa e realizada a coleta de dados
junto a gestores das SE1 e/ou seus agentes executores. A terceira fase voltou-se
para o tratamento e a anlise dos dados, e os resultados obtidos foram objeto de
discusso com especialistas na rea. Com a contribuio do painel de especialistas2,
a ltima etapa consistiu na organizao do texto final, cuja meta foi problematizar
algumas hipteses exploratrias decorrentes dos dados e sinalizar
encaminhamentos que venham a contribuir para os elaboradores de polticas
pblicas e para novos estudos no campo da Formao Continuada de professores.
O texto que aqui se apresenta est organizado em quatro partes. A primeira
permite ao leitor situar-se em relao temtica tratada (por meio da anlise de
conceitos bsicos do campo) e compreender os modelos encontrados na literatura
disponvel. Ainda nessa parte, discorre-se sobre as incurses governamentais
relativas formao continuada de professores no Brasil. Na segunda parte,
descreve-se o delineamento metodolgico da pesquisa, especificando os caminhos
percorridos. Na terceira parte, os resultados obtidos so apresentados e, na quarta
parte, encontram-se a problematizao dos principais achados da pesquisa e osencaminhamentos dela decorrentes.
1Neste relatrio, sero usadas as terminologias: Secretaria(s) de Educao, com a sigla SE, Secretarias Estaduais de
Educao, com a sigla SEE, e Secretaria Municipal de Educao, com a sigla SEM.
2 Especialistas que participaram do painel desse estudo, com objetivo de debater os resultados encontrados e
elencar proposies com foco em polticas pblicas, em ordem alfabtica:, Angela Dannemann (Fundao VictorCivita), Regina Scarpa (Fundao Victor Civita), Bernadete Gatti (Fundao Carlos Chagas), Beatriz BontempiGouveia (Instituto Avisa L), Patrcia Mota Guedes (Fundao Ita Social), Mirta Torres (Especialista em didtica daleitura e escrita), Denise Vaillant ( Universidade ORT Uruguai), Elba Siqueira de S Barreto (Fundao Carlos Chagas),Guilherme do Val Toledo Prado (UNICAMP), Helena de Souza Freitas (CAPES), Sofia Lerche Vieira (UniversidadeEstadual do Cear) e Silvana Tamassia (Gestora Nota 10 Prmio Victor Civita 2008).
-
8/3/2019 relatorio-formacao-continuada
9/129
2011. Fundao Victor Civita. Todos os direitos reservados.
9
PARTEI
1. FORMAO CONTINUADA DE PROFESSORES
A partir da dcada de 1980 e especialmente na de 1990, algumas
proposies relativas formao inicial e continuada de professores ganharam
repercusso internacional e influenciaram as polticas de formao em vrios pases
da Europa e da Amrica. Esse movimento iniciou-se quando vrios segmentos da
sociedade comearam a manifestar insatisfao e preocupao com a qualidade da
Educao. Em textos oficiais e acadmicos (DUSSEL, 2006; FANFANI, 2007;
TEDESCO; FANFANI, 2004), a crise da escola e as novas demandas decorrentes das
transformaes sociais tm assumido lugar de destaque, evidenciando os reflexosdas mudanas da sociedade globalizada sobre o trabalho dos professores e sua
profissionalidade3.
O diagnstico tem apontado o baixo desempenho dos alunos, o qual tem
sido atribudo, em grande parte, aos professores e a sua formao.
Contraditoriamente, espera-se dos docentes que atuem como agentes responsveis
e se incumbam de promover as mudanas esperadas na qualidade do ensino. As
polticas educacionais nesses pases tm como ponto de partida a necessidade de
melhorar a formao dos professores e dos formadores de professores, os quais
so considerados atores fundamentais na estratgia global da construo da
sociedade do conhecimento em um contexto de mudanas e novas demandas. Dito
de outro modo, os professores esto no centro das preocupaes e das polticas
educacionais, que conferem um papel central aos processos de educao e
formao, bem como uma responsabilidade acrescida a professores e formadores.
As crticas ao desempenho dos sistemas escolares tambm tm sido
direcionadas ao modelo de pesquisa utilizado nas faculdades de Educao. Oprofessor foi, inicialmente, compreendido como ser abstrato e pertencente a um
conglomerado homogneo (GATTI, 1996) e o exerccio profissional concebido como
atividade essencialmente instrumental. Esse modelo no s afastou a pesquisa
acadmica da prtica profissional como tambm desvalorizou ou mesmo ignorou
as necessidades e os conhecimentos dos profissionais da Educao. Assim, os
novos estudos nesse campo tm apresentado um redirecionamento de seu foco de
3
Entende-se por profissionalidade, conforme Altet, Perrenoud e Paquay (2003, p. 235), o conjunto de competnciasque um profissional deveria ter ou, ainda, o conjunto de competncias reconhecidas socialmente como caracterstica deuma profisso.
-
8/3/2019 relatorio-formacao-continuada
10/129
2011. Fundao Victor Civita. Todos os direitos reservados.
10
anlise, que passa da viso mais esttica de profisso docente para a
compreenso da docncia como uma atividade humana complexa, com
caractersticas prprias, exercida em unidades escolares que so singulares e, por
isso, requerem e mobilizam novas perspectivas de anlise (TARDIF; LESSARD,
2005). Os professores, desse modo, comeam a ser vistos como pessoasessencialmente sociais:
[...] com suas identidades pessoais e profissionais, imersos numavida grupal, na qual partilham de uma cultura, derivando dessasrelaes seus conhecimentos, valores e atitudes, com base nasrepresentaes constitudas nesse processo que , ao mesmotempo, social e intersubjetivo (GATTI, 2003, p. 196).
Paulatinamente, o conhecimento terico e a prtica da formao continuada
do professor vo refletindo avanos no modo de pensar a docncia. Nesse contexto
de transformaes, implementaram-se importantes mudanas no ensino emdiferentes pases (LDKE; MOREIRA; CUNHA, 1999; TARDIF; LESSARD; GAUTHIER,
2001), as quais foram fortemente influenciadas pelo movimento reformista na
formao de professores da Educao Bsica iniciado nos Estados Unidos e no
Canad no final dos anos 1980. No mbito dessas reformas, uma das principais
discusses diz respeito formao de professores e profissionalizao do ensino
(GAUTHIER, 1998; POPKEWITZ, 1992).
As polticas de formao em curso e seus desdobramentos de naturezapoltica, econmica e social tm suscitado, na comunidade acadmica, intenso
debate e, inclusive, movimentos de resistncia, o que denota a grande preocupao
com o trabalho simblico de proposio e imposio de tendncias e orientaes,
que influem nas formas de pensar da sociedade e na atuao poltica mais ampla.
No entanto, preciso reconhecer que as prticas e polticas de formao tm
mudado, e conhec-las implica um exerccio de anlise que permita considerar
tanto restries, limitaes e equvocos quanto suas possibilidades de ao e
avano.
A maioria dos estudos sobre a formao continuada, como explica Imbernn
(2010), passou de uma fase descritiva para uma fase mais experimental em
decorrncia da difuso dos cursos de formao e do interesse poltico sobre o tema.
Nas ltimas dcadas, foram realizados inmeros programas de formao
continuada de professores e muitos deles foram avaliados e tornaram-se objeto de
pesquisa. Alguns desses estudos apontaram problemas srios, mas tambm
identificaram propostas inovadoras, que trazem rea novas reflexes. Como bem
destaca Imbernn, os conhecimentos tericos e prticos acerca da formao
-
8/3/2019 relatorio-formacao-continuada
11/129
2011. Fundao Victor Civita. Todos os direitos reservados.
11
continuada de professores, consolidados nos ltimos 30 anos, permitem identificar
evidncias [...] para todos aqueles que, de uma forma ou de outra, se dedicam
formao continuada de professores. Conhec-las implica analisar os acertos e os
erros e ter conscincia de tudo o que nos resta conhecer e avanar (IMBERNN,
2010, p. 10). No entanto, a despeito de todo o investimento e esforo realizadopara a implementao de programas inovadores de formao de professores, o
retorno verificado tem estado sempre aqum do esperado, como mostram os
relatrios do Programa de Promoo da Reforma Educativa na Amrica Latina e
Caribe (Preal), do Programa Internacional de Avaliao de Alunos (Pisa) e da
Organizao para Cooperao e Desenvolvimento Econmico OCDE. Neles,
reiteradamente apontado o baixo impacto dos programas de capacitao,
transformao e aprimoramento das prticas docentes, de modo que se faz
necessria uma reviso crtica dos modelos de formao permanente
predominantes nas polticas de aperfeioamento e, sobretudo, um avano nas
anlises e na elaborao de novos enfoques para o desenvolvimento profissional
dos docentes (VAILLANT, 2007; VEZUB, 2005, 2007).
Em 2007, a Comisso das Comunidades Europeias elaborou um documento
de base que traa um diagnstico dos principais problemas decorrentes do contexto
atual em que o professor exerce a docncia, dando destaque s novas
competncias e aos papis que lhe so exigidos. O documento-base tambm
descreve como problemtica a presente situao da formao de professores,reconhecendo no s as principais necessidades formativas dos educadores como
tambm as lacunas das polticas de formao. O quadro retratado no referido
documento, bem como os objetivos e os princpios que subsidiam as discusses e
as aes no mbito da formao de professores na Unio Europeia, podem tambm
ser observados em documentos e relatrios de outros pases, em artigos cientficos,
livros, dissertaes e teses. recorrente a utilizao dos mesmos conceitos e
linguagens, das mesmas maneiras de falar e pensar os problemas da profisso
docente, conforme discorre Nvoa (2007, p. 3) em O regresso dos professores,seu texto de participao na conferncia Desenvolvimento profissional de
professores para a qualidade e para a equidade da aprendizagem ao longo da vida.
Para o autor, estamos diante de uma espcie de consenso discursivo (p. 3), o que
considera uma boa notcia, pois isso significaria a compreenso da necessidade de
um acordo quanto ao que preciso fazer. No entanto, apesar de termos um
discurso coerente e em muitos aspectos consensual, a m notcia que
raramente temos conseguido fazer aquilo que dizemos que preciso fazer (p. 4).
-
8/3/2019 relatorio-formacao-continuada
12/129
2011. Fundao Victor Civita. Todos os direitos reservados.
12
Ao empreender um levantamento da bibliografia e dos documentos
disponveis sobre o tema da formao continuada de docentes, Vezub (2005, 2007)
elenca uma srie de problemas comuns a diferentes pases. Entre eles, destacam-
se as aes isoladas, pontuais e de curta durao, que reproduzem as mesmas
relaes de poder/saber prprias do vnculo escolar. Prevalecem as formaesorientadas ao indivduo, ao docente isolado de seu contexto de trabalho, sendo
poucas as propostas dirigidas a grupos de profissionais especficos, com base na
etapa de desenvolvimento profissional em que se encontram, em seus contextos de
atuao ou, ainda, nos contextos institucionais nos quais esto inseridos. Pesam
tambm, nas aes de formao implementadas, o monitoramento e as avaliaes
sistemticas insuficientes, que se somam descontinuidade de polticas e sua
desarticulao em face das adotadas na formao inicial.
Tendo em vista as discusses citadas, o objetivo deste texto , justamente,
apresentar e problematizar a diversidade de abordagens, de estratgias e de
assuntos que se encontram disponveis para quem se adentra no estudo da
formao de professores. De fato, como ser visto a seguir, as iniciativas que tm
sido discutidas e propostas nos Estados Unidos e no Canad, na pennsula Ibrica e
em alguns pases da Amrica Latina vo ao encontro de alguns dos
questionamentos mais bsicos do campo. Destacam-se, entre eles, as
possibilidades de conectar as aprendizagens dos professores s dos alunos, as de
entender os processos de mudana pessoal e profissional e, ainda, as de comopromover o desenvolvimento profissional tanto de docentes (novatos ou
experientes) que atuam nas salas de aula como daqueles que se encontram delas
afastados, situao dos gestores e dos supervisores de ensino. A leitura deste texto
deve permitir tambm uma melhor compreenso dos conceitos bsicos da rea,
bem como uma reflexo mais bem fundada acerca dos modelos sugeridos, das
etapas centrais e dos procedimentos empregados.
1.1. A PREOCUPAO COM A FORMAO CONTINUADA
Baldock, Manning e Vickerstaff (2003) apontam que, na atualidade,
indiscutvel a importncia da Educao: um pas com uma populao
adequadamente escolarizada em termos de anos de estudo, frequentando uma
escola de boa qualidade, apresenta ndices de criminalidade mais baixos, melhores
indicadores relativos sade, menor mortalidade infantil, menores taxas de
desemprego e, em especial, menor possibilidade de vir a enfrentar situaes de
instabilidade econmica. Pases desenvolvidos tendem a dispor, portanto, de
sistemas educacionais bastante democrticos, os quais atendem mais e melhor sua
-
8/3/2019 relatorio-formacao-continuada
13/129
2011. Fundao Victor Civita. Todos os direitos reservados.
13
clientela, assegurando-lhe um percurso escolar mais longo e mais bem-sucedido.
Por outro lado, pases em desenvolvimento precisam ainda investir esforos e
recursos para alcanar essa situao.
Dessa forma, nada mais compreensvel que haja, hoje, independentemente
de que lugar os pases ocupam no continuum naes desenvolvidas/naes em
desenvolvimento, a preocupao com a formao contnua dos professores para
que possam atuar melhor no instvel mundo globalizado. De fato, as escolas atuais
requerem, com urgncia, a Formao Continuada de seus professores, como
condio sine qua non para conseguirem fazer frente aos desafios que a profisso
lhes coloca. O panorama tal que no se concebe mais uma oferta educacional
pautada apenas pela formao inicial e/ou pela prtica acumulada dos docentes. A
mudana no sentido esperado exige e apoia-se na formao contnua e, portanto,
na atualizao dos recursos humanos disponveis. Para melhor compreender a
situao da Formao Continuada no Brasil, foi necessrio levantar e classificar os
principais modelos e concepes de Formao Continuada disponveis na literatura
especializada. Esse esforo de organizao foi, inegavelmente, orientado a fim de
oferecer um panorama amplo desse campo. Por outro lado, ele ser de pouca valia
se no se considerar que nenhum modelo se encontra em estado puro,
apresentando, usualmente, caractersticas de vrias propostas ao mesmo tempo.
Uma ideia bastante arraigada na Formao Continuada a de que ela se faznecessria em razo de a formao inicial apresentar muitas limitaes e
problemas, chegando, em muitos casos, a ser de extrema precariedade. Nesse
sentido, a Formao Continuada decorre da necessidade de suprir as inadequaes
deixadas pela formao inicial, que repercutem fortemente no trabalho docente. Em
outras palavras, defende-se que a Formao Continuada precisa formar um
professor carente de conhecimentos gerais e pedaggicos e com poucas habilidades
didticas. Segundo os defensores desse modelo de dficit, a situao agrava -se
diante das demandas educacionais de sociedades to complexas, levando necessidade de estabelecer polticas amplas e bem pensadas de formao docente,
to central ela para a melhoria da qualidade da Educao.
Por outro lado, h tambm modelos que veem a importncia da Formao
Continuada como consequncia da constatao de que o campo educacional
muito dinmico, requerendo que os educadores lidem constantemente com novos
conhecimentos a respeito do processo de ensino-aprendizagem. Essa situao
requer, assim, que a base conceitual e as habilidades pedaggicas dos professores
-
8/3/2019 relatorio-formacao-continuada
14/129
2011. Fundao Victor Civita. Todos os direitos reservados.
14
sejam constantemente expandidas e aprimoradas, de modo que consigam atender
s novas demandas que a profisso lhes coloca.
Guskey e Huberman (1995) salientam que, apesar dessa crescente
conscincia do papel renovador da formao continuada, a literatura mostra limites
e problemas, apontando tentativas de encontrar solues aceitveis. Nesse sentido,
vrias propostas acerca de quais devem ser os objetivos da Formao Continuada
e de como deve ser conduzida surgem, umas colidindo com outras. Os autores
indicam, assim, que alguns estudos salientam que:
- A Formao Continuada deve tentar modificar a situao de ensino-
aprendizagem nas escolas e, por isso, deve emanar das necessidades
sentidas pelos prprios professores e focar as situaes cotidianas que
eles vivem junto aos alunos. Por outro lado, alguns estudos indicam quecentrar tanta ateno na figura do professor pode impedir e/ou levar ao
fracasso a implementao de propostas mais sistmicas, que focam a
organizao da escola como um todo, as quais so percebidas como mais
importantes do que as questes pessoais dos docentes;
- A Formao Continuada tem de ser uma iniciativa que parta dos prprios
professores e que seja, igualmente, levada a cabo por eles mesmos e/ou
por pessoas que atuem no espao escolar. Em contraposio, os autores
salientam a presena de argumentos vigorosos contra isso, mostrandoque bons projetos de formao continuada no podem ser elaborados
nem por professores nem por escolas, pois ambos encontram-se to
imersos no cotidiano escolar que no conseguem ter dele o necessrio
distanciamento para precisar quais so suas necessidades, hierarquiz-
las e, sobretudo, delinear propostas de como execut-las. A
recomendao , assim, delegar o planejamento e a execuo de
programas de Formao Continuada a pessoas vinculadas Educao
que, trabalhando com professores atuantes nas redes de ensino,consigam discernir o central do irrelevante na vivncia das salas de aula
e no interior das escolas;
- A melhor abordagem para a Formao Continuada aquela que tem em
vista que a mudana no ocorre de forma rpida e em pouco tempo,
mas de maneira gradual e paulatina. Assim, a recomendao no
colocar expectativas muito elevadas para os professores, sob o risco de
que elas impliquem um efeito paralisante. H tambm aqui quem
discorde, afirmando a necessidade de adotar, na formao continuada,
abordagens arrojadas, que exijam mudanas drsticas por parte dos
-
8/3/2019 relatorio-formacao-continuada
15/129
2011. Fundao Victor Civita. Todos os direitos reservados.
15
docentes. Sem isso, argumentam os autores, corre-se o risco de que os
professores no se sintam motivados, deixando de encarar o processo de
mudana educacional como algo necessrio e de investir nele a energia e
o empenho devidos.
A despeito dessa falta de acordo, uma leitura mais atenta da bibliografia
disponvel mostra que os estudos encontrados podem ser reunidos em dois grandes
grupos. O primeiro deles centra a ateno no sujeito professor. Vrios tipos de
suposio embasam essa vertente, entre elas as seguintes: (i) uma maior
qualificao dos docentes em termos ticos e polticos levar os professores a
aquilatar melhor sua importncia social, seu papel e as expectativas nele colocadas,
levando-o, assim, a conferir um novo sentido a sua profisso; (ii) a formao inicial
dos docentes aligeirada e precria, de modo que central ajud-los a superar os
entraves e as dificuldades que encontram no exerccio profissional, relativos falta
de conhecimentos cientficos essenciais, de habilidades para o adequado manejo da
sala de aula e, ainda, de uma viso objetiva sobre temas que se manifestam
constantemente no dia a dia escolar, como violncia, uso abusivo de drogas,
gravidez e/ou paternidade na adolescncia etc.; (iii) os ciclos de vida profissional
precisam ser considerados em uma viso ampla, holstica, de formao continuada,
na qual se consideram a experincia no magistrio, as perspectivas que marcam as
vrias faixas etrias, seus interesses e suas necessidades.
O segundo grupo de estudos sobre Formao Continuada de docentes,
diferentemente, no mira o desenvolvimento do professor individualmente
considerado, e sim aquele das equipes pedaggicas (direo, coordenao, corpo
docente) das escolas, devendo ocorrer, prioritariamente, no interior de cada uma
delas, luz dos problemas que enfrentam. Os estudos dessa vertente dividem-se
em dois subgrupos: (i) aqueles que entendem ser o coordenador pedaggico (CP) o
principal responsvel pelas aes de formao continuada na escola; e (ii) aqueles
que buscam fortalecer e legitimar a escola como um lcus de formao contnua epermanente, possibilitando o estabelecimento, nela, de uma comunidade
colaborativa de aprendizagem. Vejamos, a seguir, como se configuram esses
distintos pontos de vista, reiterando que eles no so, de maneira nenhuma,
excludentes.
-
8/3/2019 relatorio-formacao-continuada
16/129
2011. Fundao Victor Civita. Todos os direitos reservados.
16
1.2. ABORDAGENS DE FORMAO CONTINUADA QUE SE CENTRAM NA FIGURA DO
PROFESSOR
1.2.1.AFORMAO CONTINUADA COMO DESENVOLVIMENTO DE CARACTERSTICAS
TICAS E POLTICAS ESSENCIAIS PARA O EXERCCIO PROFISSIONAL
Esses estudos consideram que a Formao Continuada central para o
desenvolvimento subjetivo e profissional dos professores e faz parte de um projeto
pessoal, como uma escolha necessria para que se possa dar sentido e valor
atividade docente. Representa bem essa viso a proposta de Hargreaves (1995),
para quem tanto a formao individual como a continuada negligenciam o lugar que
as metas e os objetivos do trabalho docente ocupam para os educadores. O autor
aponta que, se o conhecimento daquilo que se ensina e de como se ensina so
centrais para a boa docncia, no se pode deixar de lado a importncia deconseguir dar sentido docncia, identificando os propsitos e as razes pelos
quais a sociedade precisa de professores e os sentidos que estes atribuem ao ato
de ensinar.
Nesse aspecto, Hargreaves (1995) mostra a inutilidade de prescrever formas
de desenvolvimento profissional para professores sem estabelecer, antes, por que e
para quem os professores ensinam. Com isso, o autor chama a ateno para outras
dimenses importantes do magistrio, alm da tcnica: a tica, a poltica e oaspecto emocional. A primeira implica preocupar-se genuinamente com o bem-
estar e o desenvolvimento dos alunos. A segunda indica que s a reflexo no
basta para construir um bom professor: ele precisa aprender a refletir de maneira
crtica sobre si mesmo, sobre a profisso e sobre seus alunos para poder lutar
melhor, na escola e fora dela, pela construo do futuro almejado. Finalmente, no
que tange ao envolvimento emocional, Hargreaves indica ser central recuperar a
alegria de ensinar e aprender, a surpresa diante do novo, a satisfao por
conseguir enfrentar novos desafios e por superar conflitos, sentimentos que foram,
aparentemente, excludos da escola, deixando em seu lugar a angstia, a
ansiedade e a frustrao. Salienta, ainda, que essas dimenses no devem ser
tratadas isoladamente, mas em conjunto. Todas precisam receber um tratamento
integrado em programas de formao continuada de docentes, para que
professores e alunos possam aprender continuamente nas escolas, com
contentamento e criatividade.
Efetivamente, tratar do desenvolvimento tico dos docentes considerar
que esse um aspecto vinculado ao posicionamento poltico, que requer no
-
8/3/2019 relatorio-formacao-continuada
17/129
2011. Fundao Victor Civita. Todos os direitos reservados.
17
apenas mais reflexo, e sim mais reflexo crtica sobre: (i) a prpria docncia; (ii)
as condies sociais em que se atua; (iii) os contextos escolares; (iv) as
consequncias do ensino que se oferecem aos alunos. Segundo Hargreaves (1995,
p. 20), cabe Formao Continuada desenvolver essa reflexo crtica para que as
redes de ensino contem com professores com um maior e melhor conhecimentoacerca de cinco aspectos tidos como fundamentais:
- As microconfiguraes polticas da escola em que se atua, ganhando
conscincia das relaes de poder nela presentes;
- A necessidade de fortalecer pares, auxiliando-os a ganhar um pleno
compromisso como o ensinar, capaz de motiv-los a se tornarem mais
competentes para imprimir maior eficcia em sua prtica pedaggica;
- A importncia de retirar as famlias dos alunos do papel passivo que a
escola tende a lhes atribuir (o de ser apenas informado sobre as decises
tomadas) e envolv-las nos assuntos escolares, por meio de parcerias na
elaborao e implementao de novas aes;
- A inutilidade de evitar conflitos, aquiescendo ou sendo envolvido em
consensos superficiais sobre questes de ensino-aprendizagem e de
assumir uma postura proativa, na qual dilemas e impasses so
analisados e discutidos;
- Os efeitos sociais e polticos de longo prazo decorrentes do trabalho
desenvolvido em sala de aula, assumindo uma postura em quepreconceitos cedem lugar convico de que todas as crianas podem
aprender se receberem auxlio para tanto.
Nessa tica, a Formao Continuada deve permitir que se viva, na profisso,
uma experincia prazerosa, valorizada por permitir tanto desvendar novas formas
de ser, pensar e sentir como a construo de projetos coletivos ticos para o
mundo em que se vive.
1.2.2. A FORMAO CONTINUADA COMO MEIO DE SUPRIR OS DFICITS DA
FORMAO INICIAL DOS PROFESSORES
Nesse mesmo modelo, o da educao contnua como meio de
desenvolvimento pessoal, uma abordagem bastante conhecida a que entende ser
a Formao Continuada de professores imprescindvel para contornar as mazelas
deixadas pela formao inicial. Nessa tica, o docente precisa passar por um
processo de aprimoramento amplo, que atua como remdio para sanar os muitos
problemas que a pobre, heterognea e superficial formao de base coloca para o
-
8/3/2019 relatorio-formacao-continuada
18/129
2011. Fundao Victor Civita. Todos os direitos reservados.
18
ensino e para a educao das futuras geraes. Essa abordagem centra-se,
sobretudo, nas caractersticas que faltam aos docentes e constitui, justamente por
isso, o que se pode denominar de abordagem do dficit. Quando se parte do
princpio de que a formao inicial foi insuficiente, porque se acredita que as
competncias, as habilidades e os conhecimentos imprescindveis para o trabalhodocente no foram trabalhadas ou no foram adequadamente apropriados , o
que priva o professor dos recursos necessrios para exercer sua profisso.
Dessa forma, os contedos disciplinares, as teorias relativas ao processo de
ensino-aprendizagem e avaliao de rendimento dos alunos, os procedimentos
envolvidos na gesto da sala de aula e, inclusive, os modos de conduzir a prpria
prtica pedaggica precisam receber um tratamento mais sistemtico, mais
aprofundado e mais slido. Tanto professores que acabaram de se formar quanto
os que j se encontram lecionando precisam passar por essa modalidade de
formao profissional. Os primeiros em razo de sua formao deficitria e os
segundos porque precisam de constante atualizao, tendo em vista que a cincia
pedaggica est sempre avanando. Nessa viso a do dficit , muito embora o
foco esteja na construo de novos modos de ser e de atuar na sala de aula, os
docentes no so vistos como sujeitos em busca de aprimoramento pessoal e
profissional, mas como objetos de aes de capacitao.
De fato, a proposta do dficit pressupe que os professores nada tm a dizerem termos do que necessrio para aprimorar sua formao e, por esse motivo,
no h razo para consult-los acerca do que precisam ou no que esperam ser
capacitados. Consequentemente, tudo que diz respeito formao continuada
definido em outras instncias e/ou por nveis hierrquicos superiores dos sistemas
de ensino, que, em geral, contratam institutos ou organizaes externas para
conceber e executar projetos de formao. Sem considerar as especificidades dos
professores e de seus locais de trabalho, tais propostas tendem a ser uniformes, no
formato tamanho nico e unissex, uma vez que a meta atingir o conjunto dosprofessores, independentemente de seu sexo, de sua idade, de seu tempo de
experincia, da disciplina que ministra e de seus interesses.
Por outro lado, a abordagem centrada no dficit apoia-se em argumentos
slidos, razo pela qual no pode ser simplesmente descartada. Quando a formao
inicial no fornece a base suficiente e adequada para o ensino, os professores
efetivamente no conseguem levar seus alunos a se apropriarem, na quantidade e
na qualidade adequada, daquilo que supostamente a escola lhes deve oferecer.
Assim, se a formao inicial , indubitavelmente, importante para o desempenho
-
8/3/2019 relatorio-formacao-continuada
19/129
2011. Fundao Victor Civita. Todos os direitos reservados.
19
adequado dos futuros professores, possvel prever que, enquanto os estudos
apontarem no haver nela a qualidade desejada, a abordagem do dficit continuar
sendo adotada. As principais crticas no recaem, assim, sobre a importncia da
formao inicial, e sim no fato de que ela nem sempre ruim ou incipiente, caso
em que a Formao Continuada pautada por essa suposio se torna incua. Maisgrave ainda, dizem os crticos dessa abordagem Eraut (1995) e Fullan (1995b), a
imagem frgil e desamparada que se faz dos professores e que se propaga para o
grande pblico.
1.2.3.AFORMAO CONTINUADA PAUTADA PELO CICLO DE VIDA PROFISSIONAL
Sem focar diretamente as falhas da formao inicial, outras abordagens
tambm compreendem a formao continuada como um empreendimento de cunho
pessoal, ligado ao percurso profissional do docente, mais precisamente ao ciclo devida profissional. Nesse sentido, a busca por aprimoramento marcada pela
aspirao de ganhar novos conhecimentos, de superar desafios, de empreender
mudanas no conhecido e no familiar. Muitos estudos tm apontado, no entanto,
que nem sempre a vida profissional algo ascendente. Para Mevarech (1993, 1994,
1995), que empreendeu muitos estudos contrastando a atividade de professores
novatos com a de experientes, a carreira docente implica, mais frequentemente, o
aparecimento de fases de desorientao, marcadas por experincias regressivas e
negativas, por sentimentos de anomia e de rebaixamento da autoimagem, queprecisam ser entendidos em sua fenomenologia e receber auxlio adequado para
que sejam devidamente canalizados, ensejando mudanas subjetivas e objetivas.
Caso isso no ocorra, essas vivncias acabam por converter-se apenas em
experincias duras e sofridas, que podem paralisar e quase sempre o fazem o
desenvolvimento pessoal e profissional dos docentes.
Essa abordagem de formao continuada aposta na ideia de que conhecer os
estgios que compem a carreira docente permite identificar as necessidades e
carncias que os professores vivem. Ciente delas, a questo , portanto, delinear
formas personalizadas de apoio, capazes de auxiliar os docentes a enfrentarem
melhor as etapas da vida profissional. Fessler (1995), Fuller e Brown (1995) e
Gregorc (1973) mostraram como os docentes relatam sentir-se ao longo de sua
carreira. De maneira geral, os resultados convergem, na medida em que apontam
para momentos crticos, tais como:
- O estgio de formao inicial, durante o qual as pessoas ainda no se
definiram plenamente em relao escolha da carreira do magistrio,
-
8/3/2019 relatorio-formacao-continuada
20/129
2011. Fundao Victor Civita. Todos os direitos reservados.
20
embora estejam, nesse momento, construindo as ideias bsicas sobre as
metas educacionais, sobre o papel da escola e do professor e, ainda,
sobre como situar-se no processo de ensino-aprendizagem;
- O estgio de entrada no campo profissional, que marcado pela
preocupao em fazer frente s demandas do trabalho e em ser bem-sucedido na avaliao de seus superiores. Pela primeira vez, constata-se
a distncia entre o aprendido na formao inicial e a realidade da sala de
aula e da vida na escola. O foco, desse modo, est em afirmar-se como
professor, em obter controle da sala de aula, em lidar com perfis
diferenciados de alunos, em dominar melhor os contedos a serem
ensinados e buscar novas estratgias de ensino mais eficazes.
Claramente, esse um tempo em que os professores sentem-se muito
pressionados, sem encontrar tempo para dedicar-se a outras atividades
que no as de ensino, nas quais recaem expectativas elevadas, que nem
sempre conseguem alcanar;
- O estgio intermedirio da carreira, momento em que o professor
procura harmonizar as presses da fase anterior com suas prprias
ideias acerca do magistrio. Observa-se que, nessa etapa, os professores
se distribuem entre dois polos opostos. No positivo, esto os que se
sentem confortveis no ofcio, satisfeitos com os resultados que obtm
junto aos alunos, felizes com seu ambiente de trabalho, que permite e
incentiva trocas constantes, seja com o grupo-classe, com os colegas ou
com os gestores. Outros, entretanto, adotam uma posio menos
favorvel diante da docncia. Os que a se situam no esto certos de
que optaram corretamente pelo magistrio e esto insatisfeitos com a
carreira docente, considerada desgastante;
- Finalmente, h a etapa da maturidade que se estende at a
aposentadoria, na qual os professores tendem a sentir-se seguros na
profisso, independentemente de como a veem. Nesse momento,
como se no tivessem mais desafios a superar, nem nada de muito novo
a aprender. Conseguem identificar pontos positivos e negativos na
carreira docente. o momento em que o perfil dos docentes se torna
mais homogneo, sendo difcil discernir suas especificidades.
Os estudos mostram que o magistrio uma carreira constituda de vrias
etapas, desencadeadas por fatores vinculados ao modo de vida dos docentes e,
portanto, s prprias condies das organizaes de ensino. Desse modo, o
conhecimento de como se processa a carreira docente e de como se configuramseus ciclos abre um leque de opes para os projetos de formao continuada.
-
8/3/2019 relatorio-formacao-continuada
21/129
2011. Fundao Victor Civita. Todos os direitos reservados.
21
Alguns deles centram-se no desenvolvimento pessoal, ou seja, tico, poltico,
cognitivo e afetivo dos docentes; outros atacam suas condies de trabalho;
outros, ainda, tentam identificar os melhores suporte e apoio para, com base nas
prprias escolas, propiciar aos professores oportunidades de desenvolvimento
profissional. O pressuposto , sempre, o de que ambientes adequados,interessantes e motivadores permitem uma progresso positiva na carreira, da
mesma forma que espaos sem tais atributos tm impacto negativo na profisso.
As caractersticas mais importantes de tais ambientes so classificadas em
dois grandes grupos: as influncias de carter pessoal (presena ou no de
estruturas familiares de apoio; recursos pessoais para lidar com crises; outros
interesses que constituem fontes de gratificao etc.) e as relativas s escolas e
aos sistemas escolares (as regulaes s quais os professores esto submetidos; o
estilo de gesto; o clima do ambiente de trabalho; as expectativas acerca dos
resultados da docncia; a pertena a uma associao docente etc.). A tendncia de
perceber o ciclo da carreira como sendo linear grande, adverte Marcelo (2009).
simples e fcil conceber as etapas da trajetria docente: preparo para a vida
profissional, entrada no magistrio e progresso nele medida que se passa por
suas vrias etapas. Os estgios dessa carreira, mais adequadamente, so
concebidos como uma forma de auxiliar o entendimento da natureza dinmica da
docncia e dos problemas nela enfrentados, que vo muito alm dos tcnicos:
envolvem, tambm, aspectos pessoais e circunstanciais. Os projetos de formaocontinuada precisam contemplar, assim, muitos e diversificados fatores e oferecer
mltiplas solues, desde a oferta de auxlio para o enfrentamento de problemas e
crises pessoais at polticas organizacionais que explorem alternativas de melhor
adaptao carreira.
Em sntese, todas essas abordagens entendem a Formao Continuada
como um processo que salienta a tarefa de oferecer aos professores oportunidades
de desenvolvimento profissional e, em especial, no plano pessoal independentemente de esse desenvolvimento ser definido pelos prprios docentes
ou por especialistas contratados pelos sistemas educacionais e, ainda, de conferir
a esse processo um carter mais estruturado ou mais informal. Dessa forma, como
bem colocam Huberman e Guskey (1995, p. 271), propostas norteadas por tais
ideias supem que a formao profissional deve ser til aos professores em suas
vidas profissionais e em suas salas de aula, mas sempre apenas e exclusivamente
no mbito de suas prprias instituies. Nessa perspectiva, as trocas entre
docentes no so valorizadas, uma vez que se pretende incidir somente em
caractersticas pessoais dos professores, sem tentativas de transformar as culturas
-
8/3/2019 relatorio-formacao-continuada
22/129
2011. Fundao Victor Civita. Todos os direitos reservados.
22
docentes. De fato, para que isso acontea, preciso ir alm do espao institucional
para articul-lo com outros semelhantes.
1.3. ABORDAGENS DE FORMAO CONTINUADA QUE SE CENTRAM NO DESENVOLVIMENTO
DAS EQUIPES ESCOLARES E DAS ESCOLAS
1.3.1. O COORDENADOR PEDAGGICO COMO PRINCIPAL RESPONSVEL PELOS
PROCESSOS DE FORMAO CONTINUADA NAS ESCOLAS
Uma parte importante dos estudos de Formao Continuada de professores
(CHRISTOV, 2007; PLACCO; ALMEIDA, 2003) entende que seu foco deve recair no
coletivo de professores de cada escola e atribui ao coordenador pedaggico um
papel central: o de articulador das aes formativas na escola, as quais devem
promover o desenvolvimento da equipe pedaggica (e no de cada professor). Paratanto, faz-se necessrio dispor de uma organizao do tempo escolar capaz de
garantir a regularidade, a contextualizao e a participao necessrias para que as
discusses do coletivo constituam momentos efetivos de aprendizagem. Conforme
afirma Placco e Almeida (2003, p. 57-58):
Uma funo fundamental do coordenador pedaggico cuidar daformao e do desenvolvimento profissional dos professores. fundamental pensar a formao como superao da fragmentaoentre teoria e prtica, entre escola e prtica docente, de modo que
as dimenses da sincronicidade possam se revelar e integrar, nacompreenso ampliada de si mesmo, do processo de ensino eaprendizagem e das relaes sociais da e na escola, sntese daformao e da prtica docente como momentos com peculiaridadese especificidades que provocam contnua mudana nos professorese em sua prtica.
No mbito nacional (CHRISTOV, 2007; PLACCO e ALMEIDA, 2003, 2006), o
coordenador pedaggico tem como principais funes coordenar o trabalho
pedaggico na escola e, ainda, intermediar a formao de sua equipe, segundo as
necessidades e demandas presentes na realidade escolar em que atua. Compete-
lhe, tambm, mobilizar a equipe escolar para que ela elabore/reelabore o ProjetoPoltico-Pedaggico (PPP) da escola, auxiliando-a para que possa propor e
implementar as medidas que, na viso do grupo, se fazem necessrias. Dessa
forma, sua funo muito abrangente, compreendendo desde atividades afeitas s
disciplinas do currculo, ao processo de ensino-aprendizagem (incluindo-se, a, a
avaliao), aos materiais didticos e pedaggicos at assuntos de carter disciplinar
e tico e questes relativas interao da escola com sua comunidade.
Em outros pases, caso da Gr-Bretanha, nem sempre existe algum quecumpra as funes do coordenador pedaggico. Nos pases de lngua francesa,
-
8/3/2019 relatorio-formacao-continuada
23/129
2011. Fundao Victor Civita. Todos os direitos reservados.
23
como a Frana e o Canad, as atribuies do coordenador pedaggico (que recebe
outras designaes) so muito semelhantes s que esto previstas para essa
funo no Brasil. No Canad, o conselheiro pedaggico atua nas escolas com o
objetivo de auxiliar o corpo docente a gerenciar seu tempo e otimizar a organizao
e o funcionamento dos ciclos de ensino. Faz parte de suas atribuies, assim,acompanhar o desenvolvimento e a implementao de projetos escolares,
oferecendo apoio e sustentao s equipes de professores na execuo dessas
atividades.
Cabe-lhe ainda: (i) propor programas de estudos; (ii) orientar a escolha dos
mtodos, das tcnicas, dos equipamentos e dos materiais didticos e pedaggicos
que possam favorecer a qualidade de ensino oferecido; (iii) acompanhar as
mudanas no campo educacional (tanto em termos de investigaes como de
inovaes no ensino); (iv) verificar a pertinncia dos objetivos pedaggicos; (v)
verificar os resultados escolares obtidos pelos alunos; (vi) projetar, organizar e
ministrar cursos de formao para professores; (vii) colaborar para o
desenvolvimento de programas de educao continuada oferecidos pelas
universidades; (viii) organizar e realizar encontros com professores, verificando
suas necessidades e propondo solues adequadas4.
O sistema educacional francs, diferentemente, no prev um profissional
que atue nas escolas, mas elas podem contar com um servio de consultoria e deapoio educativo, cuja meta orientar os professores, as equipes pedaggicas e as
escolas nas quais o servio de inspeo geral encontrou algum problema. Esse
servio composto de consultores pedaggicos nomeados pelo governo. Dentre as
responsabilidades de consultoria s escolas, destacam-se as seguintes:
- Apoiar as escolas na construo do seu projeto escolar em consonncia
com os projetos educativos e pedaggicos da comunidade francesa e em
conformidade com a lei;
- Colocar, a servio das equipes educativas e pedaggicas das instituies
de ensino ou de grupos de escolas, tanto seu conhecimento como sua
experincia pedaggica, buscando superar problemas e aprimorar a
qualidade da formao oferecida aos estudantes;
4 Todos esses dados esto disponveis no site http://www.bdeb.qc.ca/futurs-etudiants/programmes/preuniversitaires/sciences-humaines/site-des-carrieres-en-sciences-humaines/psychoeducation. Acesso em: 13 de novembro de2010.
-
8/3/2019 relatorio-formacao-continuada
24/129
2011. Fundao Victor Civita. Todos os direitos reservados.
24
- Participar da anlise das necessidades de formao dos professores e
fazer sugestes para a elaborao do plano de formao coletiva e
individual das instituies;
- Ajudar as instituies e as equipes pedaggicas no trabalho de anlise
dos resultados obtidos pelos alunos nas avaliaes externas
5
.
Fica claro, portanto, que, tanto no Brasil como no exterior, quando a figura
do coordenador pedaggico existe, entende-se ser sua tarefa assegurar a qualidade
do processo educativo oferecido pelas escolas populao, fazendo isso,
sobretudo, por meio do acompanhamento e da formao continuada dos
professores. No entanto, nas escolas brasileiras, essa concepo de formao
contnua do docente realizada nas escolas mediante a ao do coordenador
pedaggico tem sido adotada nas polticas pblicas de formao, observando a
transferncia, para as escolas, de partes substanciais do desenvolvimento
profissional do professor. Adicionalmente, nem sempre a ao do coordenador
pedaggico pautada pelas necessidades e demandas da escola, uma vez que
projetos e programas do governo assumem carter prioritrio e a prpria cultura
docente resiste s propostas feitas por ele.
Dessa maneira, perde-se o carter colaborativo e coletivo do trabalho do
coordenador uma vez que ele se v obrigado a seguir as determinaes polticas
assumidas pelos governos federal, estadual ou municipal. Com isso, no s eleperde sua independncia como contribui para a alienao do trabalho docente ao
assumir, sozinho, a coordenao pedaggica da escola, relegando os professores
funo de executores de aes que lhes so externamente impostas (S et al.,
2001). Alm disso, quando o coordenador eleito por voto dos professores, nem
sempre os descontentes aceitam sua liderana, notadamente quando ele carece de
formao inicial slida e/ou experincia de ensino. Por ltimo, a postura do
coordenador muitas vezes no compatvel com o que se espera de uma escola
democrtica, na qual se apregoa uma liderana que reconhea os professores e seapoie nas aes pedaggicas junto aos alunos e nas formativas junto ao corpo
docente. Talvez, como bem aponta Domingues (2009, p. 203), os coordenadores
pedaggicos brasileiros ainda no tenham construdo:
...uma identidade formativa que possibilite legitimar, junto sequipes escolares e ao sistema, uma liderana pautada naadequao do tempo s tarefas da coordenao; na compreensodo papel do coordenador pedaggico, no como tcnico, mas como
5 Esses dados encontram-se disponveis no site http://www.elul.ulaval.ca/sgc/pid/6403. Acesso em: 13 de novembrode 2010.
-
8/3/2019 relatorio-formacao-continuada
25/129
2011. Fundao Victor Civita. Todos os direitos reservados.
25
sujeito aprendente do seu fazer numa perspectiva reflexiva ecrtica; e, na formao como intradeterminada pelos docentes,tambm responsveis pela sua elaborao, implementao eavaliao.
1.3.2. A FORMAO CONTINUADA COMO MEIO DE FORTALECER E LEGITIMAR A
ESCOLA COMO UM LCUS DE FORMAO CONTNUA E PERMANENTE PARA TODOS NELAPRESENTES
H processos de formao continuada de professores que consideram outros
aspectos, como a ateno ao clima de colaborao entre os professores, que
importante e deve estar associado ao apoio externo nos processos formativos. Dito
de outro modo, a aceitao das mudanas propostas nos cursos de formao
continuada requer uma organizao minimamente estvel do contexto em que o
professor atua (respeito, colaborao e participao) bem como o apoio e a
presena de recursos necessrios s inovaes. De igual modo, a participao dos
professores desejvel e central durante todo o processo formativo, desde seu
planejamento, passando pela execuo e chegando avaliao dos resultados. Isso
implica considerar as opinies dos professores e, sobretudo, ouvi-los falar dos
problemas que enfrentam quando se veem diante de prticas inovadoras ou
maneiras de lecionar desconhecidas, que demandam apoio por parte dos pares ou
de assessores externos.
Assim, em oposio s tendncias de formao continuada individualizadas,que se centram na figura do professor, existem os modelos nos quais a formao
continuada concebida sempre em termos coletivos, envolvendo uma srie de
atividades em grupo. Essa perspectiva denominada aqui de colaborativa. Nela, os
professores renem-se para estudar, para fazer anlise curricular e propor
modificaes nos contedos trabalhados em cada ano e nvel, para elaborar e
realizar pesquisas e avaliaes internas e assim por diante. Essa modalidade de
formao continuada assume que h, por parte dos professores, questionamento
constante acerca de sua prtica pedaggica, de modo que privilegia a interao nosprprios locais de trabalho. a que o corpo docente deve, em conjunto, definir o
tipo de formao que almeja, especificando sua finalidade e sua forma de
implementao. Desse modo, a formao continuada deve ocorrer primariamente
nas instituies de ensino ou nas demais dependncias do sistema educacional.
A expectativa dessa vertente promover, via colaborao entre pares, uma
discusso rica acerca dos vrios fatores da profisso docente, que, por aumentar a
conscincia acerca de seus aspectos crticos, incentiva tambm a experimentao
didtica, o uso de novas estratgias de ensino e a adoo de uma organizao mais
-
8/3/2019 relatorio-formacao-continuada
26/129
2011. Fundao Victor Civita. Todos os direitos reservados.
26
eficiente da prtica docente. Alm disso, espera-se que a reflexo e a discusso
entre pares sejam capazes de estabelecer um clima de confiana, que permita o
entrosamento de docentes com diferentes nveis de experincia, lecionando
matrias distintas em diferentes nveis de ensino. Pode-se dizer, portanto, que o
foco est em fazer da escola uma comunidade de aprendizagem (FULLAN;GERMAIN, 2006), na qual se observe e se fale acerca do que se faz e,
especialmente, na qual o que foi observado converta-se em feedback para
aprimorar o processo de ensino-aprendizagem. Mesmo que a formao profissional
esteja ligada busca de aprimoramento pessoal, como nos primeiros modelos, essa
corrente reporta-se, mais de perto, s mudanas que se fazem necessrias ou
que j se encontram em andamento no plano institucional. Alguns de seus
resultados so utilizados como argumentos cruciais para endossar essa viso: um
maior comprometimento dos docentes em inovar e em experimentar mais; uma
coordenao mais eficiente do trabalho realizado intra e intersries, uma slida
articulao dos diferentes nveis de ensino em uma mesma organizao escolar;
maior empenho em suprimir ou alterar drasticamente procedimentos de ensino
que no contribuem nem para motivar nem para provocar nos alunos as
aprendizagens pretendidas.
O desenvolvimento profissional, dizem os que endossam essa viso, no
pode ficar circunscrito ao domnio pessoal e utilitrio. S faz sentido propor
programas de Formao Continuada se eles forem capazes de desencadearmudanas pertinentes e necessrias nas escolas, capazes de auxili-las a atender
mais e melhor sua clientela. Essa no , de maneira alguma, uma tarefa simples.
As expectativas so pretensiosas por buscarem alterar a prpria mentalidade do
professorado, incidindo nas polticas de contratao, acompanhamento e avaliao
de docentes, que devem se pautar pela obteno de determinados resultados,
definidos mediante acordos estabelecidos entre os sindicatos da categoria, os
representantes dos sistemas de ensino e, em especial, a comunidade que se
beneficia das escolas.
Essas mudanas podem implicar alteraes nas relaes dos professores
com outros profissionais atuantes no espao escolar, na medida em que as muitas
e contraditrias demandas a presentes vo se definindo e sendo solucionadas. Ora,
mudanas no so eventos singulares: elas, em geral, ocorrem em cascata e, por
essa razo, precisam ser administradas simultaneamente. Desse modo, alm de
delinear, executar, acompanhar e avaliar as modificaes que o coletivo profissional
quer imprimir em sua atuao profissional, os professores precisam tambm aferir
seu impacto na escola como um todo, aprendendo, sobretudo, a negociar conflitos
-
8/3/2019 relatorio-formacao-continuada
27/129
2011. Fundao Victor Civita. Todos os direitos reservados.
27
e discordncias, evitando acordos rpidos e simplistas que no constituem, de
modo nenhum, uma soluo. Quando tais problemas aparecem, necessrio que
os conflitos sejam explicitados, mesmo que gerem incertezas e rupturas nos grupos
envolvidos e promovam a sensao de ameaa e de desequilbrio. Se os
profissionais da escola souberem ser esse um passo necessrio para passar de umestado insatisfatrio para outro, mais gratificante, no qual se alcana uma viso
compartilhada acerca do que se espera da escola e do que preciso fazer para
atingir esse fim, conflitos e incertezas sero devidamente apreciados.
Da a necessidade de no se contentar com um desenvolvimento profissional
de carter meramente tcnico ou instrumental. preciso promover tambm a
sensibilidade poltica e tica, condio para que se perceba que o mundo docente
ultrapassa, em muito, as paredes da escola. Conhecer de perto o macrocontexto
em que se atua significa perceber que as iniquidades e as disfunes presentes na
escola fazem parte da sociedade mais ampla e so dela apenas manifestaes.
Conhecer as vicissitudes da escola e empreender nela as mudanas necessrias
pode levar os professores a combater tambm os problemas da sociedade, sua
injusta distribuio de riquezas e de poder.
Existe, dessa maneira, um imenso rol de tpicos a serem tratados em
programas de formao profissional de docentes, que vo desde aqueles que se
referem ao microuniverso da sala de aula at os assuntos mais abrangentes, queenvolvem teorias e sistemas educacionais e, ainda, sua articulao com as
questes econmicas, polticas e sociais do mundo atual, globalizado. Tudo isso
mostra que a formao de professores est longe de ser um campo bem delineado.
Ao contrrio, h nele uma pluralidade de vozes que, frente a distintas ideologias,
defendem modelos que privilegiam aspectos muito diversos da profisso,
descortinando cenrios alternativos de formao profissional, passveis de ser
escolhidos com base em uma anlise cuidadosa dos resultados que alcanam.
Um dos principais defensores da abordagem colaborativa Fullan (1993),
para quem a rea de desenvolvimento profissional de professores tem apresentado
resultados muito aqum dos esperados. Os fatores identificados como responsveis
por esse desempenho insatisfatrio so a falta de base terica e,
consequentemente, de foco nas aes voltadas para o aprimoramento docente e,
ainda, o fato de os programas de desenvolvimento profissional no irem alm da
frequncia a cursos e seminrios, cujos contedos no se articulam s necessidades
postas pelo exerccio da profisso. Segundo Fullan (1995a), algumas aes podem
reverter esse quadro. A primeira delas consiste em entender melhor quais so os
-
8/3/2019 relatorio-formacao-continuada
28/129
2011. Fundao Victor Civita. Todos os direitos reservados.
28
propsitos da Educao, que carrega em si quatro imperativos morais, a saber, as
tarefas de:
- Formar criticamente as crianas e os jovens, desenvolvendo nelas um
senso de verdade, de beleza e de justia que sirva de critrio para que
possam julgar as virtudes e imperfeies de sua sociedade e de si
mesmos (GOODLAD et al., 1990, p. 48);
- Oferecer acesso ao conhecimento socialmente construdo, pois cabe s
escolas levar as geraes mais jovens a se apropriarem dos saberes j
constitudos acerca do mundo fsico, biolgico, sociocultural e
psicolgico, impedindo que atitudes, crenas ou prticas preconceituosas
ou equivocadas impeam o bom exerccio de seu papel social;
- Assegurar que professores e alunos relacionem-se de maneira saudvel
e produtiva, de modo que o ensino se paute pelo conhecimento, pela
compreenso e pela sensibilidade acerca das condies de aprendizagem
dos alunos;
- Promover o processo de atualizao institucional, colocando as escolas
em compasso com as demandas de seu tempo.
Fullan (1993) conclui ser preciso construir um novo conceito de
desenvolvimento profissional, no qual o termo passe a significar aprendizagem
contnua dos docentes, para que eles ofeream a seus alunos um ensino sempremelhor. Assim conceituado, o desenvolvimento profissional busca aprimorar os
conhecimentos e a atividade dos professores para ampliar os horizontes de alunos
que vivem sob circunstncias muito complexas que, pode-se dizer, chegam mesmo
a ser caticas. Fullan (1995a) entende que imperativo tornar a noo de
aprendizagem contnua intrnseca cultura das escolas. Nesse sentido, Nias et al.
(1992) afirmam ser fundamental que as escolas partilhem algumas crenas, como
as seguintes: a) sempre possvel fazer mais e melhor; b) a autocrtica parte do
processo de melhoria profissional; c) reconhecer uma prtica pedaggica de boaqualidade uma virtude a ser cultivada; e d) sem disposio para aprender, no se
consegue realizar o que precisa ser feito. Uma anlise mais aprofundada dessas
crenas revela que elas reconhecem o quo complexo o ofcio de ensinar e
apontam, justamente por isso, para a necessidade de uma oferta constante de
apoios e auxlios para bem realiz-lo. Desse modo, esforos devem ser investidos
na escola como um todo e no apenas na atividade dos professores, pois a tarefa
maior do que se supe: no se trata de transformar pessoas, mas sua cultura.
-
8/3/2019 relatorio-formacao-continuada
29/129
2011. Fundao Victor Civita. Todos os direitos reservados.
29
Nias et al. (1992) tambm apontam o quanto necessrio articular a
formao inicial e a continuada, coordenando as estratgias utilizadas. Nessa
direo, Fullan (1995a, p. 256) cita Sarason (1993):
...ser pedir muito aos programas de formao docente que
preparem seus estudantes para um mundo real, o qual elesdevem entender e procurar transformar, se que como pessoas ecomo profissionais pretendem no apenas sobreviver, mas,sobretudo, crescer?
Fullan (1995a) entende que as habilidades de colaborao e de
aprendizagem contnua so aspectos centrais a serem desenvolvidos pelos
professores, mediante parcerias estabelecidas entre universidades, escolas e
sistemas educacionais. Atuando em conjunto, torna-se possvel, segundo o autor,
desenvolver culturas escolares que ofeream apoio a professores diferentes, em
momentos distintos do ciclo profissional. Um exemplo desse tipo de parceria oprojeto Consrcio de Aprendizagem, iniciado em 1993, em Toronto, Canad. A
meta desse consrcio aprimorar a qualidade da educao para alunos de escolas
e de universidades capacitando os professores e as duas instituies e, ao
mesmo tempo, levar os sistemas educacionais e o corpo docente das faculdades de
educao a oferecer auxlio e suporte constante para as melhorias j
implementadas e para que se alcancem as que ainda no o foram. Espera-se, desse
modo, que seja possvel promover o desenvolvimento profissional das escolas
(DPE), ou seja, que as escolas constituam modelos de excelncia e centros deinvestigao, por meio da colaborao permanente entre sua equipe e o pessoal
das universidades. Cabe ressaltar, no entanto, que as principais diretrizes e linhas
mestras dessa abordagem ainda no se encontram plenamente desenvolvidas,
merecendo maior dotao de recursos nas polticas pblicas e maior ateno por
parte dos pesquisadores. Talvez, assim seja possvel gerar subsdios que possam
respaldar a ao dos professores nas unidades escolares, alm daquela de seus
respectivos gestores, da administrao pblica e, notadamente, a das
universidades.
2.INCURSES GOVERNAMENTAIS RELATIVAS FORMAO CONTINUADA DEPROFESSORES NO BRASIL
O objetivo deste captulo oferecer um panorama geral do cenrio das
polticas educacionais a partir da dcada de 1990 a fim de contextualizar a leitura
dos principais achados desta pesquisa. Decidiu-se comear pelos anos 1990 pelo
fato de eles constiturem um perodo marcado por muitas mudanas educacionais
tanto no cenrio internacional quanto no nacional. Em relao ao primeiro, cabe
-
8/3/2019 relatorio-formacao-continuada
30/129
2011. Fundao Victor Civita. Todos os direitos reservados.
30
destacar dois eventos: a Conferncia Mundial de Educao para Todos, convocada,
em 1990, pela Organizao das Naes Unidas para a Educao, a Cincia e a
Cultura (Unesco), pelo Fundo das Naes Unidas para a Infncia (Unicef), pelo
Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) e pelo Banco Mundial
e que teve lugar em Jomtien, na Tailndia (Unicef, 1990). Essa reunio foiprecedida por reunies preparatrias em diversos pases, inclusive o Brasil, e em
diferentes regies do mundo. O segundo evento foi a reunio de Nova Dli
(Conferncia Mundial de Educao para Todos), em 1993, na qual se reuniram os
nove pases em desenvolvimento com maior contingente populacional Indonsia,
China, Bangladesh, Brasil, Egito, Mxico, Nigria, Paquisto e ndia.
Na Conferncia de Jomtien, os pases presentes, reconhecendo que a
Educao um dos direitos fundamentais dos homens, estipularam os seguintes
objetivos para ela: satisfazer as necessidades bsicas de aprendizagem de todos,
universalizar o acesso Educao e promover a equidade. Para tanto, os pases
signatrios centrariam seus esforos na aprendizagem, bem como ampliariam os
meios e o escopo das aes da Educao Bsica, desenvolvendo uma poltica
contextualizada de apoio, capaz de mobilizar recursos e fortalecer alianas em
todos os nveis, demandando, inclusive, a solidariedade internacional (Unesco,
1993). Na reunio de Nova Dli, os representantes de governo assinaram um termo
no qual se comprometiam com o esforo de atender s necessidades bsicas de
aprendizagem para todos (crianas, jovens e adultos) e com a universalizao daeducao fundamental.
O Brasil, que participou desses dois eventos, endossou as recomendaes
neles feitas. Em consonncia, portanto, com os compromissos assumidos e de
acordo com as demandas nacionais, foi empreendida uma srie de reformas que,
privilegiando o ensino fundamental, implicaram uma nova regulao educativa, na
qual trs aspectos destacavam-se: a gesto local, o financiamento por aluno e a
avaliao dos resultados escolares. Coube ao MEC coordenar a elaborao do PlanoDecenal de Educao para Todos (1993-2003), no qual se delineavam as diretrizes
para que se pudesse oferecer, com equidade, um ensino fundamental de boa
qualidade. Nele, uma nova viso de Educao era apresentada, buscando articular
aspectos estratgicos distintos, como a formao dos professores, o
desenvolvimento institucional, a gesto e os incentivos a serem dados ao ensino-
aprendizagem. Balizavam as propostas algumas experincias em andamento em
vrios pases da Amrica Latina e tambm medidas tomadas em pases
desenvolvidos para aprimorar seus indicadores educacionais. As principais reformas
educacionais repercutiram fortemente nos estados e municpios e chegaram,
-
8/3/2019 relatorio-formacao-continuada
31/129
2011. Fundao Victor Civita. Todos os direitos reservados.
31
inclusive, at as escolas, com implicaes para o professorado. Sero descritas
inicialmente, de forma mais abreviada, as medidas que compuseram as reformas
da dcada de 1990 no Brasil, para, em seguida, centrar a ateno naquelas
atinentes Formao Continuada de professores.
2.1.O NOVO PAPEL DO GOVERNO FEDERAL
De acordo com a Constituio brasileira, votada em 1988, os municpios
ficaram responsveis, preferencialmente, pela Educao infantil e pelos anos iniciais
do ensino fundamental, e os estados, pela oferta dos anos finais do ensino
fundamental e do ensino mdio. Essa deciso do Congresso brasileiro pretendia dar
fim a um sistema no qual as responsabilidades de estados e municpios no eram
claras, com os nveis de governo se sobrepondo uns aos outros. Dessa forma, os
gastos das diferentes esferas administrativas eram muito desiguais e implicavamdesigualdades na qualidade dos servios educacionais oferecidos. Ao Governo
Federal caberia o papel de articulao entre os entes federados, de realizar polticas
integradoras e cuidar das Diretrizes Curriculares Nacionais. A Lei de Diretrizes e
Bases da Educao Nacional LDBEN , de dezembro de 1996, consolidou o papel
do Governo Federal na coordenao e na formulao de polticas nacionais de
Educao para que fosse possvel assegurar a todos os estudantes brasileiros um
ensino de boa qualidade, em condies de equidade.
2.1.1.FUNDO DE MANUTENO E DESENVOLVIMENTO DO ENSINO FUNDAMENTAL
E DE VALORIZAO DO MAGISTRIO (FUNDEF)
A Constituio Federal de 1988 tem sofrido vrias alteraes desde sua
promulgao at os dias atuais. Merece destaque, dentre tais mudanas, a Emenda
Constitucional n 14, de 1996, que entrou em vigor aps regulamentao em lei,
em 1998. Por meio dela, alterou-se a estrutura de financiamento do ensino
fundamental no pas, adotando uma nova sistemtica para a redistribuio dos
recursos destinados a esse nvel de ensino. Se a Constituio estipulava que 25%
da receita de estados e municpios deveriam ir para a Educao, a Emenda
Constitucional n 14 determinou, por sua vez, que 60% desses recursos ou 15%
do total arrecadado por meio de impostos estaduais e municipais ficassem
reservados exclusivamente ao ensino fundamental. Esse montante, que compe o
fundo de natureza contbil, redistribudo para ser utilizado entre estados e
municpios de acordo com o nmero de alunos atendidos em suas respectivas redes
de ensino.
-
8/3/2019 relatorio-formacao-continuada
32/129
2011. Fundao Victor Civita. Todos os direitos reservados.
32
O MEC estipula o valor do gasto aluno/ano para o pas a fim de reduzir as
disparidades existentes entre estados e no interior de cada um deles, por meio do
financiamento pblico do ensino fundamental. Se esse limite no puder ser
alcanado, o Governo Federal complementar os gastos estaduais e municipais.
Com a proposio da emenda, havia, ainda, a pretenso de que o Fundefimpactasse positivamente o mercado de trabalho para professores, na medida em
que 60% de seus recursos foram destinados ao pagamento dos salrios dos
docentes. Essa medida deveria ter, em especial, maior efeito nas regies mais
pobres do pas (as regies Norte e Nordeste), valorizando a profisso. O Fundef
levou a uma descentralizao da educao em termos financeiros, administrativos e
pedaggicos, com a Unio repassando novas incumbncias a estados, municpios e,
inclusive, escolas, que se viam, agora, encarregados de novos papis. Por um lado,
essa situao promoveu, nos entes federados e, particularmente, nas escolas, uma
maior autonomia administrativa, ao requerer uma melhor gesto dos recursos
financeiros; de outro, exigiu que elas oferecessem uma Educao de boa qualidade,
a ser aferida por meio do rendimento escolar dos alunos. Criou-se, assim,
paralelamente, um sistema nacional de avaliao, iniciativa seguida de perto por
muitos estados, caso, entre outros, de Cear, So Paulo e Minas Gerais e, mais
recentemente, Acre.
O Fundef requeria, ainda, que estados e municpios elaborassem um plano
de carreira para seus respectivos professores, no qual fossem estimuladas aformao e a certificao daqueles que lecionavam sem a devida habilitao, aes
que poderiam ser financiadas, por um perodo de cinco anos, com os recursos
desse fundo. Os sistemas de ensino municipais deveriam ser, segundo as
expectativas, os principais beneficirios do Fundef, na medida em que a
transferncia de recursos permitiria um aumento significativo nos gastos por aluno
e um aumento nos salrios dos docentes (BRASIL/MEC, 2000). A implementao do
Fundef teve efeitos benficos e outros nem tanto. A participao dos municpios na
oferta de vagas no ensino fundamental, notadamente em suas sries finais, de fatoaumentou. Alm disso, o fato de se ter condicionado o repasse dos recursos s
matrculas levou estados e municpios a tentarem atrair e/ou reter seus alunos,
oferecendo-lhes, por exemplo, transporte escolar. Mais tarde, com a ampliao
desse fundo para toda a Educao Bsica, consolidando o Fundo de Manuteno e
Desenvolvimento da Educao Bsica e de Valorizao dos Profissionais da
Educao (Fundeb), o MEC manteve em vigor as formas anteriormente previstas de
repasse e utilizao dos recursos destinados capacitao e ao aperfeioamento
profissional em servio. No entanto, as diferenas existentes entre esses entesfederados no foram superadas, dado que ainda persistem grandes disparidades
-
8/3/2019 relatorio-formacao-continuada
33/129
2011. Fundao Victor Civita. Todos os direitos reservados.
33
entre eles tanto nas modalidades de contratao como na remunerao dos
docentes (BRASIL/MEC, 2011; SENNA, 2008).
2.1.2.SISTEMAS DE AVALIAO DAS REDES DE ENSINO
Em sintonia com seu novo papel, o Governo Federal entendeu ser
importante contar com informaes educacionais, capazes de orientar a elaborao
de suas polticas. Desse modo, o MEC estabeleceu um sistema de informao
educacional no Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Ansio
Teixeira (Inep), instituio fundada em 1937, e que foi totalmente reestruturada
para assumir a funo de realizar levantamentos estatsticos. Em 1990, implantou-
se o primeiro sistema de avaliao do rendimento escolar de alunos brasileiros: o
Sistema de Avaliao da Educao Bsica (Saeb), que, desde ento, recolhe
informaes junto a uma amostra representativa da 4 8 srie do ensinofundamental e do 3 ano do ensino mdio no pas, acompanhando a aprendizagem
dos alunos e analisando os fatores que nela incidem. Em 1996, o Inep acolheu a
Secretaria de Avaliao e Informao Educacional do Ministrio da Educao, que
se ocupava de, em intervalos variados, coletar dados censitrios de escolas,
professores e instituies de ensino superior. O Inep passou, ainda, a empreender
estudos relativos aos gastos e ao financiamento da educao, entendendo serem
eles centrais para a distribuio de recursos e a avaliao de programas.
Implantou-se em 1998 o Exame Nacional do Ensino Mdio (Enem), de carteropcional, a ser realizado por alunos que estiverem finalizando o ensino mdio. Os
resultados por instituio, nvel de ensino e disciplinas passaram a constituir
insumos cada vez mais importantes para que o MEC construa uma poltica em que
estados, municpios e escolas se responsabilizem pela qualidade da oferta
educacional.
Para avaliar a qualidade dos cursos da Educao superior, criou-se o Exame
Nacional de Cursos, aplicado obrigatoriamente aos alunos em fase de concluso de
seus estudos como condio para receber o diploma de graduao. Ele possuiu oito
edies que foram realizadas anualmente pelo Inep entre os anos de 1996 e 2003.
O objetivo da avaliao era ranquear as instituies de ensino superior exigindo a
qualificao das mais mal avaliadas por meio de medidas como a contratao de
mestres e doutores, melhorias em instalaes de laboratrios e bibliotecas, entre
outras. A reincidncia de um curso nas piores classificaes poderia causar seu
fechamento pelo MEC. Em 2004, foi criado o Sistema Nacional de Avaliao da
Educao Superior (Sinaes), formado por trs componentes principais: a avaliao
das instituies, dos cursos e do desempenho dos estudantes. O Sinaes avalia
-
8/3/2019 relatorio-formacao-continuada
34/129
2011. Fundao Victor Civita. Todos os direitos reservados.
34
todos os aspectos que giram em torno desses trs eixos: o ensino, a pesquisa, a
extenso, a responsabilidade social, o desempenho dos alunos, a gesto da
instituio, o corpo docente, as instalaes, dentre outros aspectos. Ele possui uma
srie de instrumentos complementares: autoavaliao, avaliao externa, Exame
Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade), avaliao dos cursos degraduao6 e instrumentos de informao (censo e cadastro). Os resultados das
avaliaes possibilitam traar um panorama da qualidade dos cursos e das
instituies de Educao superior no pas.
Os resultados dos vrios exames nacionais tm ficado muito aqum do
esperado em comparaes internacionais e avanado muito lentamente ao longo do
tempo. bem verdade que o acesso s sries iniciais do ensino fundamental foi,
com a expanso da Educao Bsica, praticamente universalizado. Permanecem, no
entanto, problemas graves no que concerne aprendizagem de conhecimentos e
habilidades previstos para cada etapa da escolarizao e, ainda, dficits de
atendimento nos demais anos da escola bsica. Esse quadro revela que h ainda
um longo caminho a ser feito para que o sistema educacional brasileiro consiga
superar as desigualdades educacionais nele presentes, as quais apenas reiteram as
desigualdades socioculturais e econmicas que marcam a sociedade brasileira
(BONAMINO; FRANCO, 1999; INEP, 2011).
2.1.3.PARMETROS CURRICULARES NACIONAIS (PCNS)
Ao salientar a importncia de oferecer a todos os estudantes uma formao
bsica comum, a LDBEN reafirmou a responsabilidade de a Unio oferecer diretrizes
que possam orientar os currculos da Educao Bsica e determinar quais so seus
contedos mnimos. Indicou, ainda, que a organizao curricular deve ser flexvel
ao lidar com seus vrios componentes, enfatizando a necessidade de uma base
nacional comum, que possa ser complementada por outra, de carter diversificado,
no mbito dos sistemas estaduais e municipais e, tambm, em cada escola. Assim,
foi proposto que, na escolaridade bsica, os alunos devem estudar Lngua
Portuguesa, Matemtica, Cincias e a realidade social e poltica, notadamente no
que tange ao Brasil. Adicionalmente, a Arte, a Educao Fsica e, no mnimo, uma
6 Para aprimorar a qualidade do ensino superior, o Governo Federal introduziu, em 1997, uma legislao que condicionaa continuidade do funcionamento das instituies de ensino superior (IES) aprovao em um novo credenciamento ereconhecimento a cada cinco anos. O MEC avalia os diversos cursos em termos de qualificao do corpo docente,organizao pedaggica, condies fsicas e acadmicas propcias e condizentes com sua proposta educativa. Visitaslocais de especialistas tambm so realizadas com o intuito de tecer recomendaes sobre cada curso, as quais devemser incorporadas pelas instituies e detalhadas em relatrio. Busca-se, com isso, imprimir um carter avaliativocontnuo ao credenciamento das IES no pas e ao reconhecimento dos cursos.
http://www.inep.gov.br/superior/condicoesdeensino/default.asphttp://www.inep.gov.br/superior/condicoesdeensino/default.asphttp://www.inep.gov.br/superior/condicoesdeensino/default.asphttp://www.inep.gov.br/superior/condicoesdeensino/default.asphttp://www.inep.gov.br/superior/condicoesdeensino/default.asphttp://www.inep.gov.br/superior/condicoesdeensino/default.asp -
8/3/2019 relatorio-formacao-continuada
35/129
2011. Fundao Victor Civita. Todos os direitos reservados.
35
lngua estrangeira moderna (aps a 5 srie) foram aladas condio de
componentes curriculares obrigatrios. O MEC, elaborou, ento, os PCNs,
ressaltando, neles, a importncia de auxiliar os estudantes a: (i) aprender de