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14 • Metal-Mecânica - Fevereiro / Março - 2004 Os bons resultados que vêm sendo obti- dos pela Petrobras na prospecção de novos poços na costa brasileira - e a conseqüente ampliação do seu parque de equipamentos - começam a influir positivamente na área de pesquisa tecnológica. Uma modalidade avançada e inédita de soldagem, a chamada soldagem molhada (soldagem subaquática direta), está, desde novembro do ano passa- do, sendo testada pela companhia em servi- ços de reparos na plataforma semi-submer- gível P-27, que opera na Bacia de Campos, no Estado do Rio de Janeiro. Os testes de- vem terminar no final de fevereiro. O cro- nograma original previa o fim da operação para o último mês de dezembro, mas o mau tempo obrigou a Petrobras a interromper várias vezes o trabalho. Caso a nova tecnologia seja aprovada, poderá ser posteriormente agregada pela Petrobras ao seu instrumental de manu- tenção, que vem sendo ampliado quanti- tativamente e atualizado em termos tec- nológicos para acompanhar o processo de expansão da companhia. “Estamos analisando desde os aspectos técnicos até a relação custo-benefício da nova tecnologia”, diz o engenheiro Alexan- dre Pope, técnico da Petrobras encarregado de coordenar os testes juntamente com pesquisadores do Laboratório de Solda- gem da Universidade Federal de Santa Ca- tarina (Labsolda), que desenvolveu a tec- nologia por encomenda da estatal. Ela foi disponibilizada para a Petrobras em duas versões, os aparelhos Hiper 1 e Hiper 2, ambos empregados na soldagem de peças estruturais danificadas da P-27. O grande diferencial da soldagem mo- lhada é permitir ao operador-mergulhador trabalhar diretamente sobre as partes sub- mersas das peças sem a proteção de um am- biente artificial, como na tradicional solda- gem a seco, método usado pela indústria naval para reparos subaquáticos. Na soldagem molhada, em vez de tra- balhar protegido por uma campânula, juntamente com o equipamento de solda- gem, o operador trabalha a descoberto, munido apenas dos cabos de solda conec- tados às fontes de soldagem. É um siste- ma, naturalmente, muito mais rápido e barato. “É o operador que se desloca, não a pesada campânula de proteção”, expli- ca Jair Carlos Dutra, pesquisador do Lab- solda e coordenador do projeto pelo lado da universidade, que é sediada em Floria- nópolis, a capital catarinense. “A nova tecnologia reduz à metade o tempo gasto neste tipo de conserto”. Foi, aliás, a necessidade de reduzir os custos e os tempos de operação das solda- gens submersas, assim como o número de dias parados, que levou a Petrobras a asso- ciar-se com o Labsolda para o desenvolvi- mento da nova tecnologia. A soldagem a seco tende a tornar-se cada vez mais antie- conômica à medida que a Petrobras investe TECNOLOGIA Soldagem debaixo d’água Laboratório catarinense desenvolve solda subaquática para a Petrobras Alberto Mawakdiye tecnologia mm 129 7/20/04 11:09 AM Page 14

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Os bons resultados que vêm sendo obti-dos pela Petrobras na prospecção de novospoços na costa brasileira - e a conseqüenteampliação do seu parque de equipamentos- começam a influir positivamente na áreade pesquisa tecnológica. Uma modalidadeavançada e inédita de soldagem, a chamadasoldagem molhada (soldagem subaquáticadireta), está, desde novembro do ano passa-do, sendo testada pela companhia em servi-ços de reparos na plataforma semi-submer-gível P-27, que opera na Bacia de Campos,no Estado do Rio de Janeiro. Os testes de-vem terminar no final de fevereiro. O cro-nograma original previa o fim da operaçãopara o último mês de dezembro, mas o mautempo obrigou a Petrobras a interrompervárias vezes o trabalho.

Caso a nova tecnologia seja aprovada,poderá ser posteriormente agregada pelaPetrobras ao seu instrumental de manu-tenção, que vem sendo ampliado quanti-tativamente e atualizado em termos tec-nológicos para acompanhar o processo deexpansão da companhia.

“Estamos analisando desde os aspectostécnicos até a relação custo-benefício danova tecnologia”, diz o engenheiro Alexan-dre Pope, técnico da Petrobras encarregadode coordenar os testes juntamente compesquisadores do Laboratório de Solda-gem da Universidade Federal de Santa Ca-tarina (Labsolda), que desenvolveu a tec-nologia por encomenda da estatal. Ela foi

disponibilizada para a Petrobras em duasversões, os aparelhos Hiper 1 e Hiper 2,ambos empregados na soldagem de peçasestruturais danificadas da P-27.

O grande diferencial da soldagem mo-lhada é permitir ao operador-mergulhadortrabalhar diretamente sobre as partes sub-mersas das peças sem a proteção de um am-biente artificial, como na tradicional solda-gem a seco, método usado pela indústrianaval para reparos subaquáticos.

Na soldagem molhada, em vez de tra-balhar protegido por uma campânula,juntamente com o equipamento de solda-gem, o operador trabalha a descoberto,munido apenas dos cabos de solda conec-tados às fontes de soldagem. É um siste-ma, naturalmente, muito mais rápido ebarato. “É o operador que se desloca, nãoa pesada campânula de proteção”, expli-ca Jair Carlos Dutra, pesquisador do Lab-solda e coordenador do projeto pelo ladoda universidade, que é sediada em Floria-nópolis, a capital catarinense. “A novatecnologia reduz à metade o tempo gastoneste tipo de conserto”.

Foi, aliás, a necessidade de reduzir oscustos e os tempos de operação das solda-gens submersas, assim como o número dedias parados, que levou a Petrobras a asso-ciar-se com o Labsolda para o desenvolvi-mento da nova tecnologia. A soldagem aseco tende a tornar-se cada vez mais antie-conômica à medida que a Petrobras investe

TECNOLOGIA

Soldagem debaixo d’água

Laboratório catarinense desenvolve solda subaquática para a Petrobras

Alberto Mawakdiye

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em novos equipamentos de prospecção,transporte e armazenamento de petróleo,por força do vertiginoso crescimento daempresa em termos de produção do com-bustível registrado de alguns anos para cá.

As recentes descobertas de poços de pe-tróleo pela empresa e pelas companhias pe-trolíferas concessionárias, como a Shell,principalmente na Bacia de Campos, eleva-ram a produção brasileira de 165 mil barrisdiários na década de 1970 para os atuais 1,6milhão de barris, obrigando a Petrobras aencomendar a estaleiros nacionais três no-vas plataformas de petróleo e vários naviosde apoio, além do reparo e modernização deplataformas e navios antigos ou obsoletos.A descoberta, no ano passado, de um poçono litoral norte de São Paulo com uma re-serva de 400 bilhões de metros cúbicos degás natural deve aumentar ainda mais a ne-cessidade de novos equipamentos, e de fer-ramentas de manutenção cada vez mais mo-dernas e econômicas.

Apoio - Iniciada pelo Labsolda aindaem 1997, a pesquisa sobre a soldagemmolhada teve 25% dos recursos de finan-ciamento destinados pela Petrobras, atra-vés do Programa de Apoio ao Desenvolvi-mento Científico e Tecnológico do Minis-

tério da Ciência e Tecnologia. O montantedespendido foi, até agora, de R$ 500 mil.A Petrobras já garantiu mais recursos para2004, que deve ser o sexto e último ano depesquisa. Quatro pesquisadores do Lab-solda trabalharam no projeto, incluindo odesenvolvimento dos aparelhos. Os mer-gulhadores contratados pela Petrobraspara os reparos também foram treinadospelos pesquisadores do Labsolda.

Em condições naturais, o Hiper 1 e o Hi-per 2 geram calor por processo físico, seme-lhante ao da solda seca, resultante da dife-rença de potencial e de tensões entre o ma-terial a ser soldado e o eletrodo, constituídode um bastão de metal do tamanho de umacaneta, que é fundido juntamente com apeça soldada. No caso de operação subaquá-tica, no entanto, a queima do revestimentoespecial do eletrodo produz um ambientegasoso em torno da área de soldagem, comouma pequena bolha. Gases como do dióxidode carbono e o hidrogênio formam uma ca-mada de cerca de 10 mm de espessura, queisola a solda da água que a rodeia.

A diferença entre o Hiper 1 e o Hiper 2está no tipo de eletrodo utilizado. Enquan-to o Hiper 1 funciona apenas com eletrodosde tamanho comum, que precisam ser fre-

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qüentemente trocados, o Hiper 2 pode ope-rar com soldagem de fluxo contínuo. Oaparelho admite a acoplagem de eletrodotubular, arame contínuo enrolado em umcarretel e gasto de forma ininterrupta du-rante o processo de soldagem.

A principal limitação da soldagem mo-lhada é a relativamente pequena profundi-dade em que pode ser executada. Dado queos mergulhadores trabalham sem ambientede proteção, o procedimento só pode serempregado até a profundidade máxima de30 metros. Profundidades maiores conti-nuarão a exigir a soldagem a seco, que podeser executada inclusive em águas profun-das. A soldagem hiberbárica a seco, realiza-da em recipiente pressurizado, admite pro-fundidades de até 1 mil metros, embora sol-dagens experimentais já tenham sido feitasa 2 mil metros de profundidade. O Labsol-da chegou a testar um equipamento hiper-bárico em seu laboratório à profundidadeexperimental de 500 metros.

A soldagem molhada pode ser feita naágua doce ou salgada e, com algumas adap-tações, até em dutos e reservatórios deefluentes industriais, onde a água contémelementos químicos não presentes natural-mente. Como a tecnologia é muito específi-

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ca, não há, por enquanto, interesse das in-dústrias na produção em escala dos apare-lhos. A situação, obviamente, deve mudarse a tecnologia for adotada pela Petrobras.

Foguetes - O Labsolda também está in-vestindo em solda para foguetes. Juntamen-te com técnicos do Centro Técnico Aeroes-pacial (CTA), de São José dos Campos(SP), pesquisadores do laboratório vêmatualmente desenvolvendo uma modalidade

inédita de solda-gem plasma, to-talmente auto-matizada, paraatender à de-manda de fabri-cação dos enve-lopes-motoresdos foguetes de-senvolvidos noBrasil. Baseadano processoTIG, a tecnolo-gia já está sendousada nas linhasde produção doCTA, como, porexemplo, na

montagem da Sonda III-XV30. O sistemaemprega um arco elétrico forçado a atraves-sar um orifício calibrado para executar a fu-são do material, de modo a garantir maioresdensidades de energia em comparação como processo manual, que era antes utilizado.

“Esta nova técnica aumenta a qualidade,o nível de segurança e a produtividade dotrabalho”, diz o engenheiro José AugustoOrlowski, técnico do CTA e um dos coorde-nadores da pesquisa. “Isso, sem falar na re-

dução dos custos de fabricação”. SegundoOrlowski, a tecnologia destaca-se pela fle-xibilidade. Na soldagem plasma automati-zada, o que define o trabalho é o diâmetrodo orifício por onde o arco - formado entreo eletrodo de tungstênio embutido na tochae a peça - é obrigado a passar, assim comoda amperagem usada. Quanto maior o orifí-cio e a amperagem, maior a espessura dotrabalho de solda, que é resultante, como noprocesso clássico, da fusão entre o metal-base e o arame de preenchimento.

A tecnologia é indicada para soldagemde aços de ultra-alta resistência, com bai-xíssimos teores de fósforo e enxofre e quetenham grande resistência mecânica e ex-trema tenacidade, além de serem alta-mente resistentes a trincas sob altas tem-peraturas, por exemplo – nos aços parafoguetes, estas características são reforça-das por elementos de ligas. “É um tipo desoldagem que resolve uma série de pro-blemas tecnológicos criados pelos açossuperespeciais”, afirma Jair Dutra, doLabsolda. “Uma vez transferida para ainiciativa privada, esta tecnologia poderáser aplicada sem nenhum problema pelaindústria automobilística, farmacêutica,nuclear e de alimentos”.

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Soldagem plasma: automatização

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