RESENHA CRÍTICA

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RESENHA CRÍTICA SOBRE O LIVRO ROMANCE MACUNAÍMA LÍDIA MARIA DOS SANTOS UNIVERSIDADE FEEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE ENSINO SUPERIOR SO SERIDÓ CULTURA BRASILEIRA I LETRAS/ESPANHOL - 9º NÍVEL RESUMO Trata-se de uma resenha crítica do livro "Macunaíma, o herói sem nenhum caráter" do escritor modernista Mário de Andrade. Lançado pela primeira vez em 1938, este livro representa bem a mudança artística que estava ocorrendo desde a Semana de Arte de 1922, quando foi mostrado pela 1ª vez ao público, um novo estilo, que mais tarde ficou conhecido como Modernismo. O livro foi muito festejado, pelos chamados modernistas, por refletir os ideais do movimento. Compreendia-se por um não apego as formas e a não idealização de um herói, fato que se opunha completamente a 1ª fase do romantismo, chamada de nacionalismo/ufanismo. E realmente o que chama atenção no livro é o não apego às formas. O autor não parece preocupado em se fazer entender ou em tornar o livro polido, mas tenta retratar de forma fidedigna o modo de falar de uma tribo indígena e do interior do país. Desta forma, os regionalismos e neologismos estão sempre presentes, o que é um dos pontos negativos do livro, uma vez que faz com que a leitura fique pesada.

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RESENHA CRÍTICA SOBRE O LIVRO ROMANCE MACUNAÍMA

LÍDIA MARIA DOS SANTOS

UNIVERSIDADE FEEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE ENSINO SUPERIOR SO SERIDÓ

CULTURA BRASILEIRA I

LETRAS/ESPANHOL - 9º NÍVEL

RESUMO

Trata-se de uma resenha crítica do livro "Macunaíma, o herói sem nenhum caráter" do

escritor modernista Mário de Andrade. Lançado pela primeira vez em 1938, este livro

representa bem a mudança artística que estava ocorrendo desde a Semana de Arte

de 1922, quando foi mostrado pela 1ª vez ao público, um novo estilo, que mais tarde

ficou conhecido como Modernismo. O livro foi muito festejado, pelos chamados

modernistas, por refletir os ideais do movimento. Compreendia-se por um não apego

as formas e a não idealização de um herói, fato que se opunha completamente a 1ª

fase do romantismo, chamada de nacionalismo/ufanismo. E realmente o que chama

atenção no livro é o não apego às formas. O autor não parece preocupado em se fazer

entender ou em tornar o livro polido, mas tenta retratar de forma fidedigna o modo de

falar de uma tribo indígena e do interior do país. Desta forma, os regionalismos e

neologismos estão sempre presentes, o que é um dos pontos negativos do livro, uma

vez que faz com que a leitura fique pesada.

RESENHA CRÍTICA

O escritor Mário de Andrade nasceu em São Paulo, em 1893 e faleceu em 1945, foi

um dos precursores do modernismo no Brasil e um dos responsáveis pela Semana de

Arte Moderna de São Paulo. Poeta, contista, romancista, cronista e crítico de arte, teve

uma atuação visível como músico e folclorista e como ficcionista, que escrevia com

inspiração e liberdade. Sua obra Macunaíma falando criticamente, é, na visão

modernista, o sonho do autor, escrever coisas nossas, desvinculando-se de toda

influência europeia e buscando construir a identidade nacional.  Iniciou sua carreira em

1917 com o livro Há uma gota de sangue em cada poema. Sua segunda obra,

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Paulicéia Desvairada, também de poesia, foi publicada em 1922, ano em que Mário de

Andrade, participou da Semana de Arte Moderna de São Paulo e só então publicou

Macunaíma, o herói sem nenhum caráter em 1928. Como houve falta de editora foram

publicados somente oitocentos exemplares, no entanto o livro foi festejado pela crítica

modernista por sua inovação narrativa e de linguagem.

Passando a uma análise da história, podemos entender porque Macunaíma fez tanto

sucesso entre os artistas modernistas da época. É a história de um índio chamado

Macunaíma que nasce "preto retinto e filho do medo da noite". Apesar de ser chamado

de "herói da nossa gente", o personagem principal é na verdade o contrário de uma

pessoa que poderia ser considerado, em condições normais, um herói. Preguiçoso,

mentiroso, mulherengo e encrenqueiro, ele tem como seu bordão principal a frase "Ai

que preguiça". E apesar de a primeira vista parecer estranho é exatamente esta crítica

que Mário de Andrade vem fazer. Em oposição clara ao herói do período romancista-

ufanista que era perfeito, com caráter exemplar, Macunaíma é um homem com mais

defeitos do que qualidades, que mesmo assim é considerado herói.

O herói tem uma mãe e dois irmãos Maanape e Jiguê, os últimos serão os que mais

sofrerão ao longo do livro com as traquinagens de Macunaíma. Jiguê logo no começo

do livro ao escolher uma companheira, de nome Sofará, é traído por ela e pelo próprio

irmão diversas vezes quando esta leva Macunaíma para passear no mato. Ele não

demora a descobrir a traição e mandar a moça de volta para casa de seu pai. Jiguê

não fica sozinho e logo depois vai morar com outra moça chamada Iriqui. Como

Macunaíma não perde tempo acaba traindo o irmão novamente. Jiguê, entretanto, não

briga mais e deixa Iriqui para o irmão. A mãe de Macunaíma não se demora na história

e acaba morrendo logo. O que faz com que os 4 saiam da tribo e vão vagar pelo

Brasil. Iriqui acaba ficando pelo meio do caminho. É quando Macunaíma encontra Ci, a

mãe do mato virgem, o grande amor do herói da história. Após se deitar com ela,

Macunaíma vira o Imperador do Mato Virgem e vai morar com Ci no capão de Meu

Bem na Venezuela. Lá eles moram em outra tribo onde Ci comandava as mulheres

nas brigas.

A vida do herói é só alegria e preguiça. Eles chegam a ter um filho que é adorado

por todos da tribo. Entretanto, a felicidade dura pouco e Ci morre envenenada por uma

Cobra Preta, e o bebê ao tomar o leite da mãe acaba morrendo também. Nesta parte

temos o primeiro contato com uma característica muito forte no livro: as lendas. Ao

morrer Ci sobe em um cipó e vai morar no céu, vira a estrela Beta da constelação de

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Centauro. No lugar onde o filho deles é enterrado nasce uma planta, o guaraná. Este

tipo de história se repetirá por todo o livro e é um de seus pontos fortes.

Ci tinha um colar de Muiraquitã que antes de morrer deu para Macunaíma que fez

deste um tememberá. Esta pedra é o que moverá toda a história. Macunaíma cheio de

tristeza decide ir embora com seus irmãos e voltam para o Brasil. No caminho

encontram monstro Capei que após ser derrotado pelo herói vira a Lua. É durante este

ocorrido que Macunaíma perde a Muiraquitã. Descobre depois que a pedra fora parar

na barriga de uma tartaruga e que depois a pedra fora vendida a um peruano

chamado Vencesleu Pietro Pietra que enriquecera e agora morava em São Paulo. É

assim que o herói decide ir com seus irmãos para São Paulo. No caminho ele encontra

uma água mágica e ao se banhar fica branco e lindo, enquanto Jiguê continua negro e

Manaape fica vermelho como índio. Nesta pequena parte do livro o autor faz uma

pequena reflexão sobre as miscigenação do povo brasileiro apresentando os 3

principais povos a partir dos quais se formou a "nossa gente".

Ao chegarem a São Paulo, o herói se assusta com as máquinas e carros e acredita

que os homens viraram maquinas também. É uma das criticas mais interessantes

feitas por Mário de Andrade. Um índio que nunca teve contato com a cidade acaba

enxergando que os que aqui vivem se tornaram tão dependentes das máquinas que já

são elas. Macunaíma vai atrás de Venceslau e descobre ser este o gigante Piamã

comedor de gente. Ele tenta achar o muiraquitã, porém sem sucesso. Tem a ideia de

se disfarçar de francesa para comprar a pedra, no entanto, Venceslau tem segundas

intenções e acaba descobrindo que se trata do herói vestido com roupas de mulher.

Com raiva Macunaíma vai à macumba da Tia Ciata e durante o ritual tem seu pedido

atendido de poder bater em alguém no terreiro e Venceslau sentir, mesmo estando em

casa. O autor nesta parte detalha o ritual, o que é em minha opinião bem assustador,

mas que serve totalmente ao propósito do livro ao descrever outra religião que não a

Católica. Macunaíma ainda acaba indo para o Rio de Janeiro, lá fala com Vei, a Sol

que lhe propõem que ele se casa com uma de suas três filhas. O herói aceita, porém,

mulherengo como é acaba achando outra mulher e depois tem que enfrentar a fúria da

Sol e de suas filhas. É neste capítulo que ele cria outro bordão: "Pouca saúde e Muita

saúva, os males do Brasil são!"

Macunaíma retorna à São Paulo e descobre que o gigante está doente depois da

sova que o herói lhe deu. Ele então tenta se distrair com outras coisas e vai a um

parque. Neste capítulo está presente outro diferencial do livro, a explicação para a

formação de certas palavras. É o que acontece com a palavra "puíto", Macunaíma ao

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não saber como denominar "botoeira", utilizou a palavra "puíto" que acabou virando

moda. Uma das passagens mais engraçadas do livro acontece quando Macunaíma

querendo se vingar de seus irmãos diz haver rastro de tapir no centro da cidade de

São Paulo. Ocorre que vários transeuntes que passavam pelo local começam a

procurar também. Quando o povo descobre estar sendo enganado querem agredir o

herói e seus irmãos. No meio da confusão Macunaíma acaba sendo preso. O povo

com pena se junta para que soltem o herói. No meio da confusão ele foge e volta para

casa de Venceslau, onde acaba por ser caçado por sua mulher, Ceuci pelo Brasil a

fora. Esta é outra característica importante do livro, Mario de Andrade não parece se

preocupar com as distâncias geográficas ou com fronteiras territoriais. Ele sempre

descreve as confusões de Macunaíma por todos os cantos do Brasil. Creio que para

falar de todas as regiões do país e suas peculiaridades. O desfeixo da história quando

depois de muitas outras situações inusitadas Macunaíma consegue o Muiraquitã,

ocorre quando Venceslau que havia viajado para a Europa retorna de viagem. O herói

vai até a casa dele e esperto não cai em sua arapuca para fazer dele molho de

macarrão. Pelo contrário é Macunaíma quem engana o gigante e faz com que ele caia

no molho de macarrão e morra, deixando o Muiraquitã finalmente para o herói.

Após esta vitória Macunaíma e os irmãos retornam a sua tribo, Uraricoera, onde tudo

começou. O herói ainda encontra uma princesa no caminho a quem faz sua mulher. O

resto são histórias e mais lendas. No final da história Jiguê acaba contraindo uma

doença que lhe torna uma sombra. Ele acaba por matar Manaape e a princesa.

Macunaíma acaba fugindo. No entanto, sozinho acaba por ficar triste relembrando

suas glórias do passado. Ao ir se banhar em um rio quase é comido pela Iara, no

entanto, consegue escapar. Cansado da vida, machucado pelo ataque da Iara e sem

uma perna o herói decide ir morar no céu e se torna a constelação da Ursa Maior.

A história toda parece ser um conjunto de lendas e mitos onde Macunaíma é o

grande herói. Mas é um herói estranho, pois é ora bom, ora mau, ora mentiroso, ora

contraditório, ora ingênuo. Ele parece estar em fase de aprendizado onde ao longo do

livro, a cada aventura por qual ele passa Macunaíma aprende algo de novo. É um

herói individualista que faz o que bem entende, não tem preocupações sociais ou

politicas e é inconsequente. Na história também há muitos nomes estranhos e de

contos nacionais como o curupira, a cobra preta, Ci-mãe do mato e gigante Piaimã.

Junto com os nomes das constelações mencionados, a história parece ser uma

grande lenda composta de muitos acontecimentos. Ele também conversa com

pessoas antigas de várias épocas como Delmiro Gouveia, Hércules Florence e João

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Ramalho. Apesar de Mário de Andrade ter considerado o livro uma rapsódia, eu diria

que é um conjunto de mitos e lendas fictícios unidos para formar uma história.

A história é, assim, simples. Há um objetivo maior: a busca de Macunaíma pela

pedra. No entanto, toda a história é permeada por pequenas aventuras do herói que

tornam tudo mais interessante. Estas histórias não fazem sentido separadas apenas

podem ser analisadas em um contexto geral. Elas visam desconstruir a visão clássica

de herói criada no romantismo. Pedem atenção ao fato de que os brasileiros não são

perfeitos, mas que são cheios de defeitos e malandragens. Devido à dificuldade

linguística não considerei um bom livro. É difícil se adaptar aos regionalismos e

neologismos. E até a história em si é confusa. Há que se fazer uma séria abstração

para compreendê-la. Mas é válida sua leitura pela critica feita e pelo contexto histórico

em que foi criada. Finalizando, é uma obra riquíssima em linguagem, onde podem

existir centenas de interpretações diferentes de acordo com o leitor.

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REFERÊNCIAS:

ANDRADE, Mário de. Macunaíma 2ª ed. Belo Horizonte, Editora Itatiaia, 1985.

Lopes, Telê Porto Ancona. Macunaíma: a margem e o texto. São Paulo, Hucitec,

Secretaria de Cultura, Esportes e Turismo, 1974.