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CAP II As Civilizações na História e na Atualidade A História da humanidade é a História das civilizações. É impossível pensar-se no desenvolvimento da Humanidade em quaisquer outros termos. Através da História, as civilizações proporcionaram as identificações mais amplas para os povos. As causas, o aparecimento, o crescimento, as interações, as realizações, o declínio e a queda das civilizações foram extensamente explorados por destacados historiadores, sociólogos e antropólogo, incluindo dentro outros, Max Weber, Emile Durkheim, Dawson, ,Carroll Quigley. Esses e outros escritores produziram uma literatura vasta e sofisticada dedicada à análise comparativa das civilizações. Uma civilização é uma entidade cultural, com exceção do que se pensa na Alemanha. Os pensadores alemães do século XIX traçaram uma nítida distinção entre civilização, que envolvia mecânica, tecnologia e fatores materiais, e cultura, que envolvia valores, idéias e as qualidades intelectuais, artísticas e morais de uma sociedade. Entretanto, essas tentativas para distinguir entre cultura e civilização não tiveram aceitação e, fora da Alemanha, produziram uma concordância generalizada com a colocação de Braudel de que é “ilusório desejar, à maneira alemã, separar a cultura de seus alicerces, a civilização” Civilização e cultura se referem, ambas, ao estilo de vida em geral de um povo, e uma civilização é uma cultura em escrita maior. As duas envolvem “os valores, as normas, as instituições e os modos de pensar aos quais sucessivas gerações numa determinada sociedade atribuíram uma importância fundamental”. Todos os elementos objetivos que definem as civilizações, o mais importante geralmente é a religião. Em larga medida, as principais civilizações

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CAP IIAs Civilizações na História e na Atualidade

A História da humanidade é a História das civilizações. É impossível pensar-se no desenvolvimento da Humanidade em quaisquer outros termos. Através da História, as civilizações proporcionaram as identificações mais amplas para os povos. As causas, o aparecimento, o crescimento, as interações, as realizações, o declínio e a queda das civilizações foram extensamente explorados por destacados historiadores, sociólogos e antropólogo, incluindo dentro outros, Max Weber, Emile Durkheim, Dawson, ,Carroll Quigley. Esses e outros escritores produziram uma literatura vasta e sofisticada dedicada à análise comparativa das civilizações.

Uma civilização é uma entidade cultural, com exceção do que se pensa na Alemanha. Os pensadores alemães do século XIX traçaram uma nítida distinção entre civilização, que envolvia mecânica, tecnologia e fatores materiais, e cultura, que envolvia valores, idéias e as qualidades intelectuais, artísticas e morais de uma sociedade. Entretanto, essas tentativas para distinguir entre cultura e civilização não tiveram aceitação e, fora da Alemanha, produziram uma concordância generalizada com a colocação de Braudel de que é “ilusório desejar, à maneira alemã, separar a cultura de seus alicerces, a civilização”

Civilização e cultura se referem, ambas, ao estilo de vida em geral de um povo, e uma civilização é uma cultura em escrita maior. As duas envolvem “os valores, as normas, as instituições e os modos de pensar aos quais sucessivas gerações numa determinada sociedade atribuíram uma importância fundamental”.

Todos os elementos objetivos que definem as civilizações, o mais importante geralmente é a religião. Em larga medida, as principais civilizações na História da Humanidade se identificaram intimamente com as grandes religiões do mundo, e povos que compartilham etnia e idioma podem como no Líbano, na antiga Iugoslávia e nos Subcontinente indiano, massacrarem-se uns aos outros porque acreditam em deuses diferentes.

Existe uma correspondência significativa entre a divisão dos povos por características culturais em civilizações e sua divisão por características físicas em raças. No entanto, civilização e raça não são a mesma coisa. Povos da mesma raça podem estar profundamente divididos pela civilização e povos de raças diferentes podem estar unidos pela civilização. Em especial as grandes religiões missionárias, o Cristianismo e o Islã, abrangem sociedades com variedade de raças. As distinções cruciais entre os grupos humanos se referem a seus valores, crenças, instituições e estruturas sociais, não a seu tamanho físico, formato de cabeça e cor da pele.

As civilizações são, ainda, abrangentes, isto é, nenhuma de suas unidades constituintes pode ser plenamente compreendida sem alguma referência à civilização que a abrange. Toynbee argumenta que as civilizações “compreendem

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ser serem compreendidas por outras”. Uma civilização é uma “totalidade”. Pode envolver um grande número de pessoas, tal como a civilização chinesa, ou um número muito pequeno de pessoas, tal como os caribenhos anglófonos.

As civilizações não têm fronteiras nitidamente definidas nem começos e fins precisos. Os povos podem redefinir suas identidades e, em conseqüência, a composição e as formas das civilizações mudam com o tempo.

As civilizações são, também, mortais, porém duram muito tempo. Elas evoluem, se adaptam e são as mais duradouras dentre as associações humanas.a civilização é, na verdade, a história mais comprida de todas. Os impérios ascendem e caem, os governos vêm e vão, as civilizações perduram e sobrevivem às convulsões políticas, sociais, econômicas, até mesmo ideológicas. Mas ao mesmo tem pó em que as civilizações perduram, elas também evoluem. Elas são dinâmicas, ascendem e caem, se fundem e se dividem e também desaparecem. As fases de sua evolução podem ser especificadas de diversas maneiras. Quigley vê as civilizações passando por sete estágios: mescla, gestação, expansão, era de conflito, império universal, decadência e invasão. Toynbee vê uma civilização surgindo como uma resposta a desafios e passando então por um período de crescimento que envolve um crescente controle sobre seu ambiente produzido por uma minoria criativa, seguido por um tempo de dificuldades, a ascensão de um Estado universal e depois a desintegração. Todas essas teorias vêem as civilizações evoluindo através de um tempo de dificuldades ou conflito para um Estado universal e daí para a decadência e a desintegração.

Como as civilizações são entidades culturais e não políticas, ela, como tal, não mantêm a ordem, não estabelecem a justiça, não arrecadam impostos, não travam guerras,não negociam tratados nem fazer quaisquer das coisas que fazem os governos. Uma civilização pode assim conter uma ou mais unidades políticas. À medida que uma civilização evolui, normalmente ocorrem mudanças na quantidade e na natureza das unidades políticas que a constituem. Num extremo, pode haver coincidência entre uma civilização e uma entidade política. Lucian Pye comentou que a China é “uma civilização que pretende ser um Estado. O Japão é uma civilização que é um Estado. Entretanto, a maioria das civilizações contém mais de um Estado ou outra entidade política.

De forma geras, os estudiosos estão de acordo quanto à identificação que fazem das principais civilizações da História e quanto às que existem no mundo moderno. Assim, as principais civilizações contemporâneas são as seguintes:

• Sínica: todos os estudiosos reconhecem a exitência ou de uma única e distinta civilização chinesa que vem pelo menos de 1500ª.C., e talvez de mil anos antes, ou de duas civilizações chinesas, uma sucedendo à outra nos primeiros séculos da era cristã.

• Japonesa: alguns estudiosos combinam as culturas japonesa e chinesa sob o título de uma única civilização extrermo-oriental. A maioria, porém não o

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faz e, ao contrário, reconhece o Japão como uma civilização distinta que foi fruto da civilização chinesa, emergindo durante o período entre 100 e 400 d. C.

• Hindu: reconhece-se de forma universal que existiram uma ou mais civilizações sucessivas no Subcontinente desde pelo menos 1500 a. C. de modo geral, elas são chamadas de indiana, índica ou hindu, sendo este último termo preferido para se referir à civilização mais recente. O Hinduísmo foi fundamental para a cultura do Subcontinente desde o segundo milênio antes da era Cristã. Mais do que uma religião ou um sistema social, ele é o núcleo da civilização indiana.

• Islâmica: todos os principais estudiosos reconhecer a existência de uma civilização islâmica distinta. Originando-se na Península Arábica no século VII d. C., o Islã se espalhou rapidamente através do norte da África e da Península Ibérica, bem como na direção do leste, pela Ásia Central, pelo Subcontinente e pelo Sudeste Asiático. Em conseqüência, existem dentro do Islã muitas culturas distintas, inclusive árabe, turca, persa e malaia.

• Ortodoxa: Alguns estudiosos distinguem uma civilização Ortodoxa, centrada na Rússia e separada da Cristandade Ocidental, como resultado de sua ascendência Bizantina, religião distinta, 200 anos de leis Tártaras, despotismo burocrático e exposição limitada ao Renascimento, Iluminismo e outras experiências fundamentais do Ocidente.

• Ocidental: A civilização ocidental é geralmente dada como tendo surgido por volta de 700 ou 800 d. C. de forma geral, ela é vista pelos estudiosos como tendo três componentes principais na Europa, América do Norte e América Latina.

• Latino-americana: a América Latina evoluiu por um caminho bastante diferente dos da Europa e da América do Norte. Um produto da civilização européia, ela também incorpora, em graus variados, elementos de civilizações indígenas americanas que não se encontraram n América do Norte e na Europa. Ela teve uma cultura corporativista, autoritária, que existiu em muito menor grau na Europa e não existiu em absoluto na América do Norte. Historicamente, embora isso possa estar mudando, a América Latina sempre foi católica. A evolução política e o desenvolvimento econômico latino-americanos se diferenciaram muito dos padrões que prevaleceram nos países do Atlântico Norte. Do ponto de vista subjetivo, os próprios latino-americanos se encontram divididos no que se refere à sua auto-identificação. Uma vasta literatura de autores latino-americanos e norte-americanos desenvolve suas diferenças culturais. A América Latina poderia ser considerada ou uma subcivilização dentro da civilização ocidental ou uma civilização separada, intimamente afiliada ao Ocidente e dividida quanto a se seu lugar é ou não no Ocidente.

• Africana (possivelmente): os principais estudiosos de civilização, com exceção de Braudel, não reconhecem uma civilização africana distinta. O norte

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do continente africano e sua costa leste pertencem à civilização islâmica. Historicamente, a Etiópia, com suas instituições distintas, igreja monofisista e língua escrita, constitui uma civilização própria. Na África do Sul, colonizadores holandeses, franceses e, depois, ingleses, criaram uma cultura européia multifragmentada. Mais importante ainda, o imperialismo europeu levou o Cristianismo para a maior parte do continente ao sul do Saara. Contudo, as identidade tribais são profundas e intensas pela África, embora os africanos estejam também desenvolvendo cada vez mais uma noção de identidade africana, sendo possível que a África subsaárica se junte numa civilização distinta, sendo possivelmente a áfrica do Sul seu Estado-núcleo.

A religião é uma característica central definidora das civilizações. As grandes religiões são os alicerces sobre os quais repousam as civilizações. Das cinco “religiões mundiais” citadas por Weber, quatro – Cristianismo, Islamismo, Hinduísmo e Confucionismo – estão associadas com civilizações principais. A quanto, o Budismo não está. Por quê? Tal como o Islamismo e o Cristianismo, o Budismo cedo se separou em duas subdivisões principais e, como o Cristianismo, não sobreviveu na sua terra natal. A partir do século i D.c., O Budismo maaiano foi exportado para a China e pra a Coréia, Vietnã e Japão. Nessas Sociedades, o Budismo foi adaptado de formas diversas, assimilado às culturas indígena, e eliminado.

De forma geral, a virtual extinção do budismo na Índia e sua adaptação e incorporação às culturas existentes na China e no Japão significam que o Budismo, embora sendo uma religião importante, não foi a base de uma civilização importante.

AS RELAÇÕES ENTRE AS CIVILIZAÇÕES

Encontros: as relações entre as civilizações evoluíram através de duas fases e estão agora numa terceira. Durante mais de três mil anos depois que as civilizações emergiram pela primeira vez, com algumas exceções, não houve contatos entre elas ou os contatos foram limitados ou intermitentes e intensos. As civilizações estiveram separadas pelo tempo e pelo espaço. Apenas um pequeno número delas existiu a um mesmo tempo determinado e há uma distinção significativa entre as civilizações da Era Axial e da Era Pré-axial em termos de se elas reconheciam ou não uma distinção entre as “ordens mundanas e transcendentais”.

As civilizações também estavam separadas geograficamente. Até 1500 d. C., as civilizações andina e mesoamericana não tinham contato algum com outras civilizações ou uma com a outra. As primeiras civilizações nos vales dos rios Nilo, Tigre-Eufrates, Indus e Amarelo também não interagiram. Os contatos acabaram de fato por se multiplicar no Mediterrâneo oriental, no Sudoeste Asiático e na Índia setentrional. Entretanto as comunicações e as relações comerciais eram restringidas pelas distâncias que separavam as civilizações e pelos limitados meios de transporte disponíveis para superar as distâncias.

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As idéias e a tecnologia passaram de civilização para civilização, mas isso freqüentemente demandou séculos. Talvez a difusão cultural mais importante que não resultou de conquista tenha sido a disseminação do Budismo para a China, que ocorreu cerca de 600 anos após sua origem na Índia setentrional. A imprensa foi inventada na China no século VIII d.C. e os tipos móveis no século XI, porém essa tecnologia só chegou à Europa no Século XV. Outra invenção chinesa, a pólvora, que ocorreu no século IX, disseminou-se para os árabes algumas centenas de anos depois e atingiu a Europa no século XIV. Os contatos mais espetaculares e significativos entre as civilizações se deram quando povos de uma civilização conquistaram e eliminaram ou subjugaram os povos de outra. A maioria das interações comerciais, culturais e militares se deram dentro de uma mesma civilização.

Impacto: a Ascensão do Ocidente. A Cristandade européia começou a emergir como uma civilização distinta nos séculos VIII E IX. Entretanto, por várias centenas de anos, ela ficou atrás de muitas outras civilizações no que se refere ao seu nível de civilização. A China sob as dinastias Tang, Sung e Ming, o mundo islâmico do século VOOO ao XII e Bizânico do século VIII ao XI ultrapassavam de muito a Europa em riqueza, território, poder militar e realizações artísticas, literárias e científicas.

Entre os séculos XI e XIII, a cultura européia começou a se desenvolver, num processo facilitado pela “apropriação sequiosa e sistemática dos elementos adequados de civilizações mais elevadas do Islã e de Bizâncio, junto com a adaptação dessa herança às condições e interesses especiais do Ocidente”. Durante os Séculos XII e XIII, os ocidentais porfiaram por expandir seu controle na Espanha e lograram estabelecer o efetivo domínio do Mediterrâneo. Posteriormente, porém, a ascensão do poder turco causou o colapso do “primeiro império ultramarino ocidental”.

Encontros intermitentes ou limitados entre as civilizações cederam lugar ao impacto continuado, avassalador e unidirecional do Ocidente sobre todas as outras civilizações. O final do século XV testemunhou a reconquista final da Península Ibérica aos mouros, os primórdios da penetração portuguesa na sia e a penetração espanhola nas Américas. Durante os 250 anos subseqüentes, todo o Hemisfério Ocidental e porções significativas da Ásia foram postas sob o governo ou a dominação européia. O fim do século XVIII viu uma retração do controle direto europeu, quando primeiro os Estados Unidos, logo o Haiti e depois a maior parte da América Latina se rebelaram contra o domínio europeu e conseguiram a independência. Contudo, na última parte do século XIX, um renovado imperialismo ocidental estendeu o domínio ocidental por quase toda a África, consolidou o controle ocidental no Subcontinente e em outras partes da Ásia e, no início do século XX, submeteu virtualmente todo o Oriente Médio, com exceção da Turquia, ao controle ocidental direto ou indireto.

As causas desse desdobramento único e espetacular abrangeram a estrutura social e as relações de classes do Ocidente; a ascensão das cidades e do

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comércio, a relativa dispersão do poder nas sociedades e o desenvolvimento de burocracias de Estado. Entretanto, a fonte de navegação oceânica para atingir povos distantes e o desenvolvimento da capacidade militar para conquistar esses povos. Como Geoffrey Parker assinalou, “numa larga medida a ascensão do Ocidente dependeu do uso da força, do fato de que o equilíbrio militar entre os europeus e seus adversários no ultramar estava se inclinando de forma constante em favor dos europeus; (...) a chave para o êxito dos ocidentais para criarem, entre 155 e 1750, os primeiros impérios verdadeiramente globais dependeu precisamente daqueles avanços na capacidade de empreender a guerra que foram denominados ‘a revolução militar’”.

Ao se chegar a 1910, o mundo era mais integrado política e economicamente do que em qualquer outro momento da História da Humanidade. O comercia internacional correspondia a 33% do produto mundial bruto, mais do que jamais fora ou veio a ser desde então, não se chegando sequer perto desse nível até as décadas de 70 e 80. civilização queria dizer civilização ocidental, e o Ocidente controlava ou dominava a maior parte do mundo. O Direito Internacional era o Direito Internacional ocidental, oriundo da tradição de Grotius. O sistema internacional era o sistema ocidental westfaliano de Estados-nações soberanos porém “civilizados” e dos territórios coloniais por eles controlados.

O surgimento desse sistema internacional definido pelo Ocidente foi o segundo desdobramento principal na política mundial nos séculos a contar de 1500. Além de interagirem numa modalidade de dominação-subordinação com as sociedades não-ocidentais, as sociedade ocidentais também interagiam entre si numa base mais eqüitativa. Essas interações entre entidade políticas dentro de uma única civilização se pareciam muito com as que ocorreram no seio das civilizações chinesa, indiana e grega. Elas estavam baseadas numa homogeneidade cultural que envolvia “idioma, leis, religião, práticas administrativas, agricultora, propriedade da terra, bem como, talvez, relacionamento familiar. Os povos europeus partilhavam de uma cultura comum e mantinham amplos contatos através de uma rede de comércio, um movimento constante de pessoas e um notável entrelaçamento das famílias dominantes”. Entre os Estados europeus, a paz era a exceção, não a regra. Embora durante grande parte desse período o Império Otomano controlasse até um quarto do que freqüentemente se considerava como sendo a Europa, ele não era considerado um membro do sistema internacional europeu.

CAP III

Uma civilização Ocidental? Modernização ou Ocidentalização

Civilização Universal: significados

Civilização Universal definida como um conjunto cultural da Humanidade e aceitação de valores, práticas, crenças comuns por povos pelo mundo afora.

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Essa idéia pode significar (e o autor rejeita todas):- possibilidade de empregar civilização universal como o que é comum a Humanidade (o que representaria uma confusão semântica);- o que a atual sociedade tem em comum e que difere dos povos primitivos;- cultura de Davos – aqueles que detém o poder econômico-político, têm as mesmas características entre si e disseminariam seus princípios para o restante do mundo;- pressupõe que a disseminação dos padrões de consumo e da cultura popular ocidentais pelo mundo afora estaria criando uma civilização universal.

Esse último seria reduzir a cultura ocidental à bebidas gasosas (Coca-cola), calças desbotadas (jeans) e comidas gordurosas (McDonald). Mais correto seria retirar o foco dos bens de consumo para a mídia. Mas com esse refinamento conceitual, “entretenimento não equivale a conversão cultural” e as pessoas absorvem a comunicação embebidas de seus valores locais. Qualquer informação recebida antes passa por um filtro próprio de cada cultura. As comunicações globais são uma das mais importantes manifestações contemporâneas do poderio ocidental.

Idioma. Se uma civilização universal está emergindo, então deveriam estar surgindo um idioma e uma religião universal (que são características básicas de uma civilização). Primeiramente, tendemos em acreditar que seria o inglês, mas isso é um engano. Para se ter uma idéia, caiu de 9,8% para 7,6% o total de pessoas que falam inglês no mundo. Um idioma que é estranho a 92% do mundo não pode ser o oficial. Podemos sim, afirmar que o inglês é o meio mundial de comunicação intercultural (e isso já pressupõe outras culturas), o que faz do inglês seria uma língua franca. Língua franca é uma forma de lidar com culturas, não eliminá-las. (Apesar da inegável influência da língua na configuração cultural de uma região.)

Uma língua para ser franca carece de ser “desetnicizada”. O inglês passou por esse processo. Fala-se diferentes “ingleses” ao redor do mundo. Pode-se pensar até que os “ingleses” serão distintos. A distribuição de idiomas segue a distribuição de poder e isso aconteceu ao longo de toda nossa história. Nas sociedades não-ocidentais têm ocorrido uma tendência ao inglês no nível universitário e por outro lado, pressões para o uso dos idiomas locais.

Religião. Parte final do século XX: ressurgimento de religiões. Aumento nos que seguem cristianismo e islamismo. Nas sociedades que se modernizam, tende-se a aceitação ao cristianismo, já que esse condiz mais com as exigências (sociais, econômicas e culturais) da modernização. O islamismo ganha em longo prazo, pois prega não só a conversão, mas a reprodução (estima-se que 30% da população em 2025, quando os cristãos serão não mais que 25%). Com essa pluralidade, seria impossível pensar no surgimento de uma religião universal.

Civilização Universal: Fontes

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O conceito de uma civilização universal é nítido produto da civilização ocidental. Esse conceito ajuda a justificar (como na época imperial) o suposto predomínio cultural do Ocidente. O universalismo é a ideologia do Ocidente para confrontação com culturas não ocidentais. Os não-ocidentais vêem como ocidental, o que os ocidentais vêem como universal.

Argumentos para confirmar que estaria ocorrendo a civilização universal:

1º - O fracasso do comunismo representa a universalidade da democracia liberal. Na verdade, ainda há comunismo de mercado (na China), autoritarismo (no Iraque) etc. É arrogância pensar que, porque o comunismo fracassou, muçulmanos, chineses, indianos vão abraçar totalmente (e sem restrições) o liberalismo ocidental.

2° - Maior interação entre os povos e nações está gerando uma cultura mundial comum. Os avanços na tecnologia promoveram maior movimentação de bens, pessoas, idéias, dinheiro, sem dúvida. Mas e o impacto? O comércio exterior aumenta ou diminui a possibilidade de guerra? Em 1913 o comércio exterior representava 33% do Produto Bruto Internacional e nos subseqüentes houve as duas grandes guerras. O comércio exterior e as comunicações não foram capazes de produzir a paz. Além disso, a sociologia afirma: “num mundo crescentemente globalizado há uma exacerbação de auto-consciência civilizacional, societária e étnica”, isso porque as pessoas definem sua identidade pelo que não são. Quanto maior a interação mundial, maior a necessidade de identificação regional. Isso faz cair ao chão a idéia de uma cultura mundial comum.

O Ocidente e a Modernização

3° - Civilização Universal emergindo como resultado dos amplos processos de modernização (industrialização, urbanização, alfabetização, educação, riqueza e mobilidade social e estrutural mais complexas e diversificadas).

Modernização – processo revolucionário comparável em importância ao surgimento da civilização (no singular). Diferenças imensas de valores, atitudes, conhecimento e cultura entre sociedades modernas e tradicionais. Mas isso não pressupõe diretamente que as sociedades todas modernizadas serão mais homogêneas que na época em que todas as sociedades eram tradicionais. De qualquer forma, as sociedades modernas se parecem mais umas com as outras de que as tradicionais entre si por duas razões: a) com a modernização o grau de intercâmbio atinge uma velocidade e grau incomparavelmente maiores que as sociedades tradicionais; b) sociedades tradicionais – agricultura; sociedades modernas – indústrias. A estrutura social da agricultura é moldada pela geografia e a indústria depende somente das diferenças de cultura e de estrutura social.

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Há os que apóiam que a civilização moderna é a civilização ocidental e vice-versa. Mas o Ocidente era Ocidente antes mesmo de ser moderno. Mas o que diferencia a civilização ocidental do resto do mundo antes de ser moderno?

• Legado clássico – filosofia e racionalismo gregos, o Direito Romano, o latim, cristianismo;

• Catolicismo e Protestantismo – mais importante característica;

• Idiomas europeus – multiplicidade;

• Separação da autoridade temporal e espiritual – Igreja separada do Estado; essa divisão contribuiu para o desenvolvimento da liberdade no Ocidente;

• Império da lei: lei, elemento essencial para a civilização ocidental. Isso levou ao constitucionalismo, direitos humanos, contra o exercício do poder arbitrário;

• Pluralismo social: aristocracia forte e autônoma, campesinato substancioso e importante classe de comerciantes;

• Corpos representativos – assembléias, parlamentos e outras instituições de representação. Evoluíram para a democracia;

• Individualismo – tradição de direitos e liberdades individuais;

A combinação desses fatores foi determinante.

Reações do Ocidente à Modernização

A expansão do Ocidente promoveu a modernização e a ocidentalização dos não-ocidentais. As elites não-ocidentais agiram: rejeitando ambas, rejeitando a ocidentalização ou abraçando ambas.

Rejeicionismo: Japão (no início) e China. A rejeição à modernização se torna praticamente impossível num mundo interligado e essencialmente moderno.

Kemalismo: abraçar ambas. A idéia presente no kemalismo é ocidentalizar para que a modernização seja mais eficiente. A idéia é que para reformular o modelo econômico e tecnológico tem que se reformular o pensamento e a cultura.

Reformismo: combinar a modernização com a preservação de valores, práticas e instituições. Japão: “espírito japonês, técnica ocidental”.

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Rejeicionismo: modernização e ocidentalização são indesejáveis e é possível rejeitar ambas; Kemalismo: modernização e ocidentalização são desejáveis e ocidentalização indispensável para se ter modernização; Reformismo: modernização desejável e possível sem uma ocidentalização total, que é indesejável.

Em alguns lugares à medida que a modernização aumenta, a ocidentalização diminui e a cultura original passa por renascimento. O esquema seria o seguinte:

Ocidentalização ? modernização

Modernização ? desocidentalização

Emprestam elementos de forma seletiva para melhorar suas condições de sobrevivência. Um exemplo religioso que comprova essa tese é o Budismo que foi da Índia para a China e nem por isso “indianizou” a China.

O kemalismo ainda não foi provado com um exemplo prático completo.

As sociedades islâmicas têm tido dificuldade com a modernização. Porém não há nada que prove que a religião muçulmana emperre o capitalismo moderno.

Modernização não quer dizer ocidentalização. A modernização reforça as culturas autóctones e reduz o poder relativo do Ocidente.

CAP IV

O Desvanecimento do Ocidente: Poder, Cultura e Indigenização

O PODER OCIDENTAL: PREDOMÍNIO E DECLÍNIO

Há duas imagens contemporâneas sobre o Ocidente (em relação a outras civilizações):

— a de um “predomínio avassalador” sobre as outras civilizações, hegemonia, e a tendência à formação de uma Civilização “Universal”

— e a do “declínio”, da exaustão pós-Guerra Fria, problemas internos, perda de poder econômico, em diminuição quantitativa (população, território) e qualitativa (produção, influência cultural) em relação às demais.

Como única superpotência após a Guerra Fria, os Estados Unidos dividem o poder político-militar mundial com o Reino Unido e a França e o poder econômico mundial com a Alemanha e o Japão. “O Ocidente é a única civilização que tem interesses substanciais em todas as outras civilizações ou

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regiões e tem a capacidade de afetar a política, a economia e a segurança de todas as outras civilizações ou regiões”. Ítens que comprovam esse poder são os fatos de que as nações ocidentais:

• São donas e operadoras do sistema bancário internacional

• Controlam todas as moedas fortes

• São o principal cliente do mundo

• Fornecem a maioria dos bens acabados do mundo

• Dominam os mercados internacionais de capitais

• Exercem considerável liderança moral dentro de muitas sociedades

• São capazes de maciça intervenção militar

• Controlam as rotas marítimas

• Realizam a maior parte da pesquisa e desenvolvimento de tecnologia de ponta

• Controlam o ensino técnico de ponta

• Dominam o acesso ao espaço

• Dominam a indústria aeroespacial

• Dominam as comunicações internacionais

• Dominam a indústria de armamentos de alta tecnologia

A segunda imagem, o declínio do Ocidente, é de um processo originado da exaustão pós-Guerra Fria. Está caracterizada por três aspectos:

— é um processo lento (se ascensão do Ocidente levou cerca de 400 anos, o declínio também levará o mesmo ou mais). O auge do poder ocidental ocorreu por volta de 1900 e o declínio se estendeu ao longo de todo o século XX.

— não é regular nem estável (o declínio pode sofrer pausas, inversões e reversões). As sociedades abertas do Ocidente têm uma alta capacidade de renovação, além de estaram polarizadas em dois núcleos principais de poder: Europa e EUA.

— diminuição do poder de mudar o comportamento alheio (por indução,

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coerção, exortação)

São indícios dessa decadência a ascensão econômica e militar acelerada da China; a iminência da decolagem econômica da Índia; a hostilidade crescente do mundo islâmico para com o Ocidente; e a diminuição da disposição de outras sociedades em aceitar os ditames políticos e econômicos ocidentais.

Há também as causas internas nos países ocidentais, como o lento crescimento econômico; o desemprego, enormes déficits públicos; uma ética de trabalho em declínio; baixas taxas de poupança; desintegração social; drogas e criminalidade.

Aspectos Quantitativos do Declínio do Ocidente

Território e população: de ocupando 48,5% da superfície planetária, passou para para 24,2%, em 73 anos (outras civilizações aumentaram, com exceção da América Latina); de 48% da população mundial para 13%, no mesmo período (outras civilizações aumentaram, exceto Ortodoxa e Sínica)

Produto econômico: da Revolução Industrial, que aumentou a produção de 18% para 31% entre 1750 e 1830, chegou ao ápice em 1928 (véspera crise) com 84%, e caiu pra 57% em 1980; China e Japão aumentaram a produção em números absolutos (ainda que a porcentagem tenha despencado)

Capacidade militar: quatro dimensões (qualitativa, tecnológica, organizacional, societária); o Ocidente estava muito à frente das outras civilizações em 1920, mas estas aceleraram em muito sua modernização e ampliação da força bélica e militar; ao mesmo tempo, o Ocidente reduziu drasticamente gastos com material de defesa após a Guerra Fria.

Aspectos Qualitativos do Declínio do Ocidente

De forma geral, os anos pós-Guerra Fria foram dominados por cinco tendências principais na evolução da capacidade militar no mundo:

— fim das Forças Armadas da URSS, como potência integrada e espalhada (reduziu e reconcentrou o poder bélico)

— fim da “ameaça vermelha” fez cair também os gastos com defesa no Ocidente, já que diminuía a justificativa para o armamentismo

— nações da Ásia Oriental (mesmo países mais pobres) compraram a sucata militar da URSS e do Ocidente

— o desenvolvimento econômico e tecnológico de Terceiro Mundo, ainda que lento, possibilita maior armamento, inclusive não-convencionais (compensam: mais baratas e ameaçadoras)

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— regionalização: não há mais capacidade militar global (além dos EUA); poderes militares são concentrados em áreas estratégicas das civilizações.

“Em resumo, de forma geral, o Ocidente considerará sendo a civilização mais poderosa até bem adiante nas primeiras décadas do século XXI.” Até lá, é provável que continue à frente das demais civilizações em aspecto científico, tecnológico civil e militar. Mas o controle de outros meios de poder está se difundindo em outros núcleos civilizacionais não-ocidentais. O Ocidente tinha poder absoluto global em 1919/1928, mas hoje é forçado a dividir esse poder com outros Estados e outras civilizações. Assim reascendem culturas não-ocidentais.

INDIGENIZAÇÃO: O RESSURGIMENTO DAS CULTURAS NÃO-OCIDENTAIS

“A distribuição das culturas pelo mundo reflete a distribuição do Poder. (...) Uma civilização universal requer um poder universal.” O crescente poder das sociedades não-ocidentais produzido pela modernização está gerando um renascimento das culturas não-ocidentais pelo mundo afora.

A “Indigenização” seria um processo que identificado como retorno dos valores nativos de um país descolonizado, contra os Ocidentais, geralmente promovido por camadas médias urbanas, as “segundas gerações” de cidadãos nacionalistas pós-independência.

O cenário atual não é o de estabelecimento de uma cultura/civilização universal liderada pelo Ocidente, mas sim do ressurgimento de valores “nativos” que se oponham aos valores ocidentais.

Distinção “poder duro” x “poder suave” (cultura & ideologia atraentes): poder duro seria o poder exercido à força, baseado no domínio militar e político-econômico de uma sociedade sobre outra, com uso de coerção, chantagem etc.. O poder suave seria o poder atraente, bem-vindo pela sociedade dominada por admirar a cultura e/ou a ideologia da sociedade dominadora. Mas a cultura e a ideologia são atraentes quando fundamentadas no sucesso material e na influência. “O poder suave só é poder quando se apóia numa base de poder duro.” Decréscimos de poder econômico e militar conduzem à dúvida sobre si mesmo e diminuem a capacidade de influenciar os outros.

A União Soviética atraiu muita gente enquanto a economia e o poder militar soviéticos eram crescentes, mas essa atração se evaporou quando a economia soviética estagnou e se tornou incapaz de sustentar o poderio militar soviético.

Diminuiu o poder do Ocidente para impor seus valores e atrair pessoas

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para eles. Antes, o Ocidente era objeto de admiração e imitação por aqueles que queriam modernizar seus países (por exemplo, a reforma de Mustafá Kemal/Atatürk na Turquia). Os não-ocidentais mudaram o discurso: antes usavam democracia e valores ocidentais pra legitimar seus interesses, e agora “cospem no prato que comeram”, usando seus próprios valores nativos pra se afirmar.

Há exemplos de reformadores “indigenistas” no Paquistão (Mohammed Ali Jinnah/Quaid-i-Azam), Singapura (Lee Kuan Yew) e Sri Lanka (Solomon Bandanaraike). Em cada caso, são filhos da segunda geração a partir da independência do país, de origem nas classes médias urbanas que, graças à modernização pró-ocidental na época da independência, tiveram oportunidade de se educar nos sistemas ocidentais e, mais tarde, renegaram-no.

“A indigenização passou a ser a ordem do dia em todo o mundo não-ocidental das décadas de 1980 e 1990.” Ressurgimento do Islã nos países muçulmanos, hinduização da política e da sociedade na Índia, promoção do Confucionismo na Ásia Oriental, a Nihonjinron no Japão, ameaça de Jironovsky na Rússia. “A indigenização é beneficiada pelo paradoxo da democracia: a adoção pelas sociedades não-ocidentais das instituições democráticas incentiva e dá acesso ao poder a movimentos nativistas antiocidentais.”

O resultado desse processo é uma mobilização popular contra as elites de formação ou orientação ocidentais. Na Argélia, na Índia, no Sri Lanka e na África do Sul, por exemplo, os movimentos políticos indigenistas alcançaram poder por via eleitoral.

Durante muito tempo até o século XIX, outras civilizações do mundo sentiam auto-confiança em seus próprios valores e realizações e desprezo pela inferioridade cultural, institucional e moral do Ocidente. Na medida em que os êxitos do Ocidente se desvanecerem, essas atitudes tenderão a reaparecer.

LA REVANCHE DE DIEU

Até meados do século XX, as elites intelectuais pressupunham que a modernização econômica e social levaria à diminuição da importância da religião nas sociedades. Concordavam com isso tanto os que viam esse fato como positivo quanto os que o viam como negativo. Os secularistas modernizadores aplaudiam o racionalismo/ciência/pragmatismo tomando lugar ao irracionalismo/mito/superstição das religiões. Por outro lado, os conservadores alertavam para as conseqüências morais do desaparecimento das religiões. “O resultado final seria a anarquia, a depravação e o solapamento da vida civilizada.”

A segunda metade do século XX provou que tanto essas esperanças otimistas quanto os receios pessimistas não tinham fundamento. A modernização

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econômica e social foi paralela à revitalização da religião — chamada por Gilles Kepel de la revanche de Dieu. Em meados da década de 1970, a tendência à secularização se reverteu. O novo enfoque pregava não mais adaptar a religião aos valores seculares, e sim recompor alicerces sagrados para a organização da sociedade (“não mais modernizar o Islã, mas islamizar a modernidade”), advogando o afastamento de um modernismo que tinha fracassado e atribuindo os problemas contemporâneos da sociedade ao distanciamento de Deus.

Parte dessa revitalização religiosa deveu-se à expansão de religiões novas; porém a maior parte do fenômeno foi causada pelo retorno das comunidades às suas religiões tradicionais, revigorando e dando novo significado a elas (Cristianismo, Islamismo, Judaísmo, Hinduísmo e Budismo). Houve surtos de engajamento por fiéis que antes eram apenas praticantes ocasionais.

Em todas essas religiões, houve nascimento de movimentos fundamentalistas, que podem até ter impacto político significativo e espetacular, mas são apenas ondas da maré religiosa, mais ampla e fundamental, que está dando um formato diferente à vida humana no final do século XX.

A relevância da religião pôde ser notada de forma mais evidente nos países ex-comunistas, pois foram varridos por uma revitalização religiosa que preencheu o vácuo deixado pelo desmoronamento da ideologia. Na Rússia e na Ásia Central, igrejas foram reabertas e passaram a ser locais muito freqüentados — um movimento cultural de maiorias, com uma base extremamente ampla.

Duas “clientelas” são origens da nova massa de seguidores do ressurgimento religioso: as populações recém-urbanizadas provindas de migração (êxodo rural) ou industrialização acelerada, que buscam reafirmação de identidade e orientação emocional/social/material; e as camadas médias urbanas, mesmos protagonistas da indigenização, predominantemente jovens com bom nível de instrução.

Causas que podem explicar o ressurgimento religioso mundial são:

— justamente os processos de modernização social, que deslocaram pessoas para centros cosmopolitas e puseram em xeque suas identidades, demandando por isso novos laços de estabilidade comunitária, aos quais a religião responde.

— o fato de religiões tradicionalmente dominantes não satisfazerem as necessidades emocionais e sociais de determinadas realidades, sendo substituídas por outras que atendessem melhor aos novos questionamentos (ascensão do Cristianismo na Coréia do Sul e do Protestantismo na América Latina, bem como as correntes fundamentalistas entre os islâmicos).

— o recuo do Ocidente e o fim da Guerra Fria, que tinham exportado o

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liberalismo e o socialismo como ideologias para o resto do mundo, mas que após suas respectivas decadências, deixaram um vácuo ideológico. “Na ausência de novas divindades seculares atraentes, voltam-se com alívio e paixão para o que é religião de verdade.”

De modo mais amplo, o ressurgimento religioso em todo o mundo é uma reação contra o secularismo, o relativismo moral e a auto-indulgência. De forma geral, constata-se que, sempre que houve um conflito, la revanche de Dieu ganhou da indigenização: caso das necessidades religiosas da modernização não possam ser satisfeitas por suas crenças tradicionais, as pessoas se voltam para importações religiosas que proporcionem satisfação emocional. Os movimentos de revitalização religiosa são anti-seculares, anti-universais e, com exceção de suas manifestações cristãs, antiocidentais. Além disso, se opõem ao relativismo, ao egoísmo e ao consumismo, associados com o “modernismo”.