BOTO, Carlota - A Racionalidade Escolar e o Processo Civilizador
Resumo Nobert Elias o Processo Civilizador vol.1
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Resumo Elias
Capítulo 1
A discussão gira em torno dos conceitos de cultura e civilização (com suas
devidas variações linguísticas). Ambos foram conceitos de suma importância para a
Europa da passagem do século XVIII para o XIX. Contudo, há uma diferença crucial: o
papel que civilização desempenhou com inglês e franceses foi feito por cultura dentre
os alemães.
Em ambos os casos, as palavras atuam como conceitos ligados à identidade
nacional. Enquanto que ingleses e franceses atrelam-se à ideia de civilizados, alemães
possuem em Kultur seu mote identitário. Elias afirma que estes possuem a ideia de
Zivilisation como algo importante, porém minoritário em relação à Kultur. A razão disto
se explica pela diferenciação histórica entre Alemanha e França.
Kultur desenvolveu-se na região da Alemanha em meio aos seguimentos
burgueses de classe média. A classe aristocrática adotara o ideal de civilização francês,
mimetizando os hábitos e a fala do le monde. Mas, enquanto adotavam a língua
francesa, consideravam o alemão como algo rude e bárbaro, deixando conscientemente
de usá-lo. A classe média, por outro lado, era socialmente excluída do meio aristocrático
e, doravante, de envolvimentos políticos (grosso modo, claro, pois exceções existiam).
Esta constituição sociopolítica fez com que as produções artísticas e intelectuais
alemãs, que tiveram um crescimento significativo na segunda metade do século XVIII,
fossem originárias dos seguimentos burgueses e contivessem críticas à Zivilisation
aristocrática. Os modos e hábitos da nobreza alemã, mímesis da França, foram criticados
como fúteis e sem valor, em oposição às obras que a classe média, oriunda de meios
universitários, vinha empreendendo. Assim, foi com essa dualidade entre Kultur
valorizada e Zivilisation frívola que a burguesia alemã ascende ao poder no século XIX.
Já a Civilisation francesa surgiu em um processo diverso. Ao contrário do caso
alemão, os intelectuais franceses de classe média encontravam uma abertura maior nos
círculos aristocráticos e políticos. Assim, não apenas estavam imersos no meio dos
hábitos e costumes da corte, mas também versavam sobre temas políticos que os
burgueses alemães, alienados a tal esfera, não tratavam.
Desta forma, Civilisation surge de dentro da própria sociedade de corte.
Contudo, não consistia em uma crítica ou desligitamação deste maio, mas sim a um
desejo de reforma: civilização torna-se o emblema do desejo reformista de leis e da
educação visando uma melhora da administração. Não obstante, por ter surgido do meio
cortesão, o conceito também abarca a polidez e o modo de vida da corte francesa que se
encontra em oposição à barbárie das classes mais baixas. Isto explica por que tais
hábitos permaneceram na França do século XIX, agora com a burguesia no poder e
Civilisation como um processo finalizado e pronto a ser exportado.
Capítulo 2
A segunda parte da obra trata do desenvolvimento de hábitos concernentes a
questões corporais e comportamentos à mesa. O autor, tratando de finais da Idade
Média a meados do século XVIII, mostra como mudanças sentimentais e questões
socio-estamentais geriram muitos desses desenvolvimentos de hábitos que nos afetam
até os dias atuais.
Em fins da Idade Média, fontes escritas que versam sobre atos desejáveis e/ou
recomendados em círculos da nobreza cavalheiresca (muitas dessas regras e orientações
são oriundas de canções) atestam para a existência de hábitos que são atualmente
considerados incivilizados, como assoar o nariz à mesa, dividir a comida mastigada com
outrem, dialogar com alguém que está urinando ou defecando, dentre outros. Elias
mostra, a partir de diversos exemplos concernentes a alguns elementos (a maioria ligada
à alimentação e hábitos à mesa), como uma maior coerção social e comportamental
gerou, a partir do século XVI, regras de conduta que progressivamente alteraram o
quadro geral comportamental, criando mecanismos sócio-pisicológicos que criam
repulsa ou medo frente a padrões diferentes.
Tais mudanças passam a tomar forma na transição da nobreza cavaleiresca e
bélica para a nobreza aristocrática ligada ao rei. É esta nova classe social que regulará
seus hábitos de forma a torna-los estritos e diferenciados das classes mais baixas,
outorgando-se assim uma especialidade inata de status. É neste momento de transição
que ocorre o arrefecimento do conceito de courtoise, usado na Idade Média, e a
ascensão da civilité, ambos usados para práticas cortesãs.
Desta forma, vemos na obre de Elias como diversos hábitos anteriormente
comuns mitigam-se com o tempo, enquanto outros são progressivamente fomentados ao
ponto de, ao fim, serem vistos como naturais pelos indivíduos. Exemplo claro disto é a
diminuição da prática de se alimentar usando as mãos e o incentivo progressivo da
adoção do garfo, uma “troca” com reverberações claras em nossos dias. No mundo
aristocrático de corte dos séculos XVI, XVII e XVIII, partilhar de tais padrões de
comportamento era ser considerado civilizado.
Este novo quadro de controle de sentimentos e comportamentos logrou êxito
graças a um novo fator determinante: a coerção para incentivo e anulação de hábitos
passou a ser feita entre os indivíduos. A observação constante e a mímesis dos
comportamentos daqueles que participavam da mesma classe social foram, portanto, os
catalisadores do enrijecimento e consolidação de regras comportamentais. Não obstante,
um outro fenômeno incentivava a constante mudança de hábitos da nobreza: a
disseminação dos padrões e hábitos comportamentais para as classes e grupos
socialmente inferiores, principalmente burgueses, que acabavam por adotá-los, alterá-
los e deturpá-los. Desta forma, intensificar o controle de seus hábitos era a forma da
nobreza garantir sua civilidade.
É válido ressaltar que este processo civilizador, como o autor chama, não afetava
apenas os padrões comportamentais, mas também os sentimentos dos indivíduos. Aos
hábitos e questões que fossem considerados indesejáveis incentivava-se principalmente
nojo, repulsa e/ou vergonha. Isto afetava os adultos, logicamente, mas também era
fomentado logo cedo nas crianças, de modo que certas aversões ou ideias de
comportamentos fossem vistas como naturais e evidentes por si só. Com o passar dos
séculos, comportamentos que antes eram normais de serem vistos dentre adultos e
sofriam represálias foram aceitos em dado momento apenas pelas crianças, e alguns
mais tarde abominados mesmo entre estas.
Principal elemento do processo civilizador: naturalização dos hábitos e
esquecimento de suas alterações.