Rev Patio - Amalia e Equipe 26.03.12

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“De avó pra neto”: vida escolar e mercado profissional para famílias egressos do Ensino Médio Maria Amália de Almeida Cunha Universidade Federal de Minas Gerais (U Rosa Maria da Exaltação Coutri Universidade Federal de Ouro Preto (U Cristina Ferreira Assis Universidade Federal de Ouro Preto (U !tor Corr"a Aleixo Universidade Federal de Minas Gerais (U Em#ora os meios de $omuni$ação ou mesmo al%uns &ro'issionais da uventude en'ati*em +ue a instituição 'amiliar en$ontra,se em &ro$e $rise (-osa$$o. /001). 2 &re$iso lem#rar +ue as 'am!lias não inalteradas no de$orrer da hist3ria. mas sim se re$on'i%uram. $om &er $on'orme as trans'ormaç4es internas 5 vida so$ial6 A&esar das variaç4 d2$adas. as 'am!lias ainda re&resentam um &orto se%uro &ara os oven renovar $onstantemente suas re&resentaç4es ou +ue tenham +ue ameni*ar valores tradi$ionais e demandas morais $ontem&or neas6 8essa 'orma. e re$on'i%uraç4es de inst n$ias so$iais. $omo a &ol!ti$a. a $i"n$ia ou o mer$ado +ue se des$entrali*am e se des&rendem de seus ali$er$es tradi$ionais. a 'am! instituição &ermeável 5s mudanças da so$iedade. tam#2m se am&lia e se rela$ional e valorativo. esta#ele$endo novos es+uemas de interação $o Em um $ontexto 'amiliar $ontem&or neo 2 &oss!vel o#servar a rela %eraç4es num mesmo domi$!lio e. ainda +ue este am em resid"n$ias dis %era$ional se mant"m so# 'orma de diálo%o ou &or $on'litos entre &ais res&eito 5 'ormação dos ovens &ara o mer$ado de tra#alho e ao &a&el (9o%ueira. :a%o. Romanelli. /001)6 Os &a&2is outor%ados tradi$ionalme maternas se rare'a*em $om as novas demandas do mer$ado de tra#alho. $ $a&ital e$on;mi$o e $om uma din mi$a $on u%al mais 'lex!vel6 O &a&el modi'i$a6 <e no in!$io do s2$ulo == ela era a res&onsável &ela #oa ed marido e &elo lar. ho e ela $ontri#ui 'inan$eiramente $om tra#alhos 1

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artigo acadêmico

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XXVIII CONGRESSO INTERNACIONAL DA ALAS

De av pra neto: vida escolar e mercado profissional para famlias de egressos do Ensino Mdio

Maria Amlia de Almeida Cunha Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)Rosa Maria da Exaltao CoutrimUniversidade Federal de Ouro Preto (UFOP)Cristina Ferreira Assis Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP)Vtor Corra Aleixo Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)

Embora os meios de comunicao ou mesmo alguns profissionais da rea de infncia e juventude enfatizem que a instituio familiar encontra-se em processo de desagregao ou de crise (Losacco, 2003), preciso lembrar que as famlias no acabam, nem permanecem inalteradas no decorrer da histria, mas sim se reconfiguram, com permanncias e mudanas, conforme as transformaes internas vida social. Apesar das variaes sofridas nas ltimas dcadas, as famlias ainda representam um porto seguro para os jovens, mesmo que precisem renovar constantemente suas representaes ou que tenham que amenizar a contradio entre valores tradicionais e demandas morais contemporneas. Dessa forma, em consonncia com as reconfiguraes de instncias sociais, como a poltica, a cincia ou o mercado que se descentralizam e se desprendem de seus alicerces tradicionais, a famlia nuclear, enquanto instituio permevel s mudanas da sociedade, tambm se amplia e se diversifica no mbito relacional e valorativo, estabelecendo novos esquemas de interao com a escola.Em um contexto familiar contemporneo possvel observar a relao entre mais de duas geraes num mesmo domiclio e, ainda que estejam em residncias distintas, o intercmbio geracional se mantm sob forma de dilogo ou por conflitos entre pais, avs e netos no que diz respeito formao dos jovens para o mercado de trabalho e ao papel da escola nesse processo (Nogueira, Zago, Romanelli, 2003). Os papis outorgados tradicionalmente s figuras paternas e maternas se rarefazem com as novas demandas do mercado de trabalho, com as restries de capital econmico e com uma dinmica conjugal mais flexvel. O papel da mulher tambm se modifica. Se no incio do sculo XX ela era a responsvel pela boa educao dos filhos, pelo marido e pelo lar, hoje ela contribui financeiramente com trabalhos extra domiciliares ou cria os filhos sozinha em casos de divrcio e nem sempre depende do cnjuge. Dessa forma, a famlia extensa constituda por avs, tios e primos acaba dividindo a mesma casa, o mesmo lote da residncia e a atuao no processo formativo do jovem. Com nossa pesquisa[footnoteRef:1] realizada em quatro escolas mineiras dos municpios de Mariana e Belo Horizonte, observou-se que os pais contribuem mais para os estudos dos jovens que os avs, enquanto 44,3% dos pais auxiliam, de alguma maneira, os estudos dos filhos, apenas 9,4% dos avs prestam algum tipo de ajuda vida escolar dos netos. Esse dado comprova que o capital escolar dos avs se mostra insuficiente ou anacrnico para dar uma orientao satisfatria nas lies de casa ou nos estudos para avaliaes. Porm no indica a ausncia completa deles na vida escolar do neto, sua atuao se d nos costumes escolares como festas, reunies, entregas de boletins e eventos comunitrios dentro do espao escolar (Lahire, 2004, p.336) , substituindo pais e mes que, por causa da vida profissional, no podem participar desses eventos. Nesse caso, seriam as avs que tenderiam a participar dos costumes escolares, enquanto os avs, tambm presentes na formao dos netos, exerceriam um papel mais pragmtico, como na contribuio na renda domiciliar e na convivncia cotidiana (Coutrim, 2010). [1: O papel da famlia e da escola na transmisso de disposies entre as geraes: expectativas de futuro para jovens egressos do Ensino Mdio, desenvolvida pela UFOP e pela UFMG, com o apoio da FAPEMIG.]

Essa tendncia que confere s famlias uma centralidade da me/av no processo formativo das crianas pode ser explicada pelo conceito de maternidade intensiva (Hays, 1996; Duarte, 2009) que compreende o quanto que o cuidado com a educao escolar um papel eminentemente feminino. Portanto, no foi por mero acaso que a totalidade da amostra de entrevistados, relativa gerao dos avs, foi feminina, isso ocorreu devido ao fato das avs participarem mais do que os avs na vida escolar dos netos. A efetividade da maternidade intensiva nas famlias entrevistadas tambm confirmada ao se tratar da gerao dos pais, cuja maioria das entrevistas se deu com as mes por se apresentarem mais afinadas ao processo educativo dos filhos e ainda por acompanharem o desenvolvimento dos filhos mais de perto, tendo em vista o trabalho extra domiciliar dos maridos. Em suas falas, os depoentes demonstram que acreditam na melhora na qualidade da escola nas ltimas dcadas, principalmente no que diz respeito sua infraestrutura. interessante notar como as polticas de distribuio gratuita de livros didticos so vistas como facilitadores para o bom desempenho escolar. Alm disso, o fornecimento de merenda escolar apontado por avs, tanto do interior quanto da capital, como um ponto positivo na escola de hoje. Na grande maioria dos depoimentos h a percepo de que est mais democrtico o acesso educao bsica, bem como ao ensino superior, seja por meio do PROUNI ou do incremento do nmero de vagas nas universidades pblicas. Contudo, possvel notar que pouco se fala estritamente da qualidade do ensino, j que a merenda, o transporte escolar e o acesso s escolas, por exemplo, foram mais citados enquanto melhoria nas escolas dos ltimos anos.A grande maioria dos depoimentos transparece uma nostalgia de um tempo em que os filhos se submetiam autoridade dos mais velhos, utilizam-se do discurso dos exemplos e, por que no, dos castigos e palmadas, para persuadir os mais jovens a se manterem na escola e perseguirem seus sonhos de ascenso social. No entanto, essa lgica disciplinar que recorre violncia, ao autoritarismo e vigilncia estrita na formao da criana, apesar de ser caracterstica das famlias de renda mais baixa, no seria uma regra nem inviabilizaria a coexistncia com elementos disciplinares que valoram a autonomia (Lahire, 2004, p.25). Sendo assim, observa-se nos discursos dos entrevistados certa tenso conciliadora entre heteronomia e autonomia na formao dos filhos e netos. Se por um lado prezam pela autoridade e pela disciplinarizao, por outro, propem-se a serem modernos, buscando estabelecer um dilogo aberto e respeitoso diante das escolhas profissionais da nova gerao. Longe de quererem impor-lhes algum caminho a ser seguido, eles procuram apoiar e garantir oportunidades para que os jovens atinjam seus prprios objetivos. Ao serem indagados se gostariam que os filhos e netos seguissem suas profisses, todos os pais e avs entrevistados manifestaram-se negativamente, sem o menor grau de hesitao. Resposta que parece estar relacionada ao desejo dos familiares de que os jovens possam ir mais longe tambm expresso nas entrevistas, atravs, por exemplo, da conquista de uma boa profisso, embora nem sempre consigam descrever ou caracterizar o que possa representar esse ir mais longe.Nessa pesquisa ficou evidente a importncia dada famlia pelos jovens na escolha profissional, embora amigos(as), colegas de sala, namorados(as), professores e vizinhos tambm apaream como personagens importantes em suas vidas quando se trata de escolhas para o futuro. Conforme os dados analisados nos 149 questionrios, 64% dos jovens afirmaram que os pais eram as pessoas mais influentes em sua escolha profissional, enquanto 38% informaram que eram os amigos. Por outro lado, nos surpreende a pequena participao dos professores nestas escolhas, com apenas 15% das respostas, menor at mesmo que a participao de tios, primos e demais familiares com 17%. A participao dos avs tambm pouco representativa, mas isso pode ser explicado pelo insuficiente capital cultural decorrente da baixa escolaridade predominante nessa faixa etria. Alm disso, a preocupao dos pais quanto ao futuro profissional dos filhos tambm ficou clara quando os jovens foram questionados se eles conversam com os pais sobre tal assunto. 81,2% afirmaram que mantm dilogo com os pais sobre tais questes, porm, em se tratando do dilogo sobre a escola e a vida escolar, o percentual cai para 68,5. Essa queda pode ser compreendida pelo sentido mais pragmtico que a pergunta referente a futuro profissional traz em sua elaborao, permitindo aos depoentes respostas que enfatizam o ingresso imediato no mercado de trabalho e que no necessariamente esto associadas escolarizao.Em sntese, enquanto no passado a formao profissional estava relacionada prtica do trabalho, ao saber fazer e no tanto ao nvel de escolaridade, os avs possuam um papel fundamental, tanto em aconselharem sobre o futuro quanto em ensinarem sua profisso aos filhos e netos. Aparentemente, as novas geraes por estarem sujeitas a novas exigncias culturais, pressionados pelas demandas atuais de formao escolar, qualificao profissional e insero no mercado de trabalho, poderiam se desvincular das geraes de seus pais e avs, mas o que se observa bem diferente. Os jovens continuam a recorrer s geraes anteriores e mesmo que essas no tragam um elevado capital cultural, o ponto de encontro entre avs-pais-netos estaria nos valores pragmticos, na razo instrumental e na tica do trabalho intimamente associada a suas histrias de vida. Tais elementos ajudariam os jovens a construrem uma nova leitura do presente, dando condies mnimas para as tomadas de decises frente ao futuro. Portanto, essa herana de av pra neto combinada com o suporte assegurado por membros do mesmo grupo geracional, representados pelos amigos (virtuais ou no), namorados(as), colegas de turma, etc. constituem-se na grande rede informacional que subsidiar suas decises, sempre to difceis de serem tomadas quando se tem 18 anos.

Referncias COUTRIM, Rosa M.E. Entre Gnero e Geraes: a fala de crianas educadas por avs e avs. In: SOUZA, Mrcio F. (Org.). Desigualdade de Gneros no Brasil: novas idias e prticas antigas. Desigualdade de Gneros no Brasil: novas idias e prticas antigas. 1 ed.Belo Horizonte: Editora Argumentvm, 2010, v. 1, p. 287-299.DUARTE, Ana F. Ensaiar a Maternidade: Estudos sobre o processo de construo dialgica de uma identidade maternal. Tese de Doutoramento -Escola de Psicologia,Universidade do Minho, Braga-Pt, 2009. Disponvel em: acesso em 12 de junho de 2012.HAYS, Sharon. The Cultural Contradictions of Motherhood. New Haven: Yale University Press, 1996.LAHIRE, Bernard. Sucesso Escolar nos Meios Populares:as razes do improvvel. So Paulo: tica, 2004.LOSACCO, Silvia. O Jovem e o Contexto Familiar. In: Famlia: Redes, laos e polticas pblicas. (org.) Ana Rojas Acosta, Maria Amlia FallerVitale. So Paulo: IEE/PUCSP, 2003. pgs 63-76.NOGUEIRA, Maria A.; ROMANELLI, Geraldo; ZAGO, Nadir (org.). Famlia e Escola: trajetrias de escolarizao em camadas mdias e populares. Petrpolis: Vozes, 2003.SETTON, Maria da G. J. Processos de Socializao, Prticas de Cultura e Legitimidade Cultural. In: Estudos de Sociologia, Araraquara, vol.15, n28, 2010, pp. 19-35. Disponvel em: acesso em 12 de junho de 2012.

Maria Amlia de Almeida Cunha Profa. Adjunta da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)[email protected] Maria da Exaltao Coutrim Profa. Adjunta da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP). [email protected] Ferreira Assis Mestranda do Programa de Ps Graduao em Educao da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP)[email protected] Corra Aleixo Mestrando do Programa de Ps Graduao em Sociologia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)[email protected]

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