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Dr. Luiz Clemente S. P. Rolim – CRM-SP 54.415
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Revisão dos Estudos Clínicos com Ácido Tióctico: The SYDNEY 2 Trial
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO PÁG. 3 A)
B)
C)
D)
E)
ESTUDO SYDNEY 2 PÁG. 4
DADOS RECENTES DA LITERATURA PÁG. 5
EXPERT OPINION PÁG. 6
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS PÁG. 7
3
A) INTRODUÇÃO
A neuropatia diabética (ND) é a complicação crônica mais frequente do diabetes mellitus (DM), pois é fato que aproximadamente 50% dos indivíduos diabéticos apresentam neuro-patia periférica e que a causa mais comum de polineuropatia no mundo é o DM.1 Paradoxal-mente, a ND é também a complicação mais subdiagnosticada e subtratada do DM, entre outros motivos porque apresenta espectro clí-nico bastante heterogêneo e porque muitos
casos permanecem assintomáticos por anos até a ocorrência de complicações graves e tardias, como úlcera de pé diabético e disau-tonomia.2
O ácido tióctico, também conhecido como ácido alfalipoico (ALA, abreviatura do inglês alpha lipoic acid), é um ácido graxo de síntese hepática e um cofator essencial à produção de ATP na respiração aeróbia mitocondrial,
Dr. Luiz Clemente S. P. Rolim CRM-SP 54.415
Mestre em Endocrinologia pela Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp); Professor de Medicina de Família e Comunidade na Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo (FCMSCSP)
Coordenador Responsável pelo Setor de Neuropatias e Pé Diabético do Centro de Diabetes da EPM-Unifesp
Médico Pesquisador da Cochrane Collaboration e da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz)
Título de Especialista em Medicina Interna pela Sociedade Brasileira de Clínica Médica
Membro Efetivo da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM), da Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD) e da Sociedade Brasileira de Clínica Médica (SBCM)
Ex-Fellow da Yale University e Ex-Estagiário do Setor de Eletromiografia do Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo – SP (Serviço do Dr. Alonso-Nieto)
Revisão dos Estudos Clínicos com Ácido Tióctico: The SYDNEY 2 Trial
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catalizando a carboxilação oxidativa do piruva-to.3 Além disso, atua em complexas vias me-tabólicas e sinalizações celulares, exercendo importante atividade antioxidante, está en-volvido no metabolismo da glicose, na função tireoidiana e na reciclagem de outros siste-mas antioxidantes, como vitamina C, glutatio-na e vitamina E.3 Trata-se de um antioxidante lipossolúvel e hidrossolúvel que tem efeito quelante em metais oxidativos, tais como cálcio e Fe2+.3
B) ESTUDO SYDNEY 2
O estudo SYDNEY 2 foi um estudo clínico terapêutico, multicêntrico, controlado e du-plo-cego, que randomizou 181 pacientes dia-béticos com neuropatia dolorosa em quatro grupos: placebo e mais três grupos com do-ses crescentes de ALA (600 mg, 1.200 mg e 1.800 mg), administradas uma vez ao dia, du-rante cinco semanas, após uma semana de período sem tratamento da ND.4
O objetivo desse estudo foi avaliar a eficácia do ALA, por via oral e durante cinco sema-nas, nos sintomas neuropáticos positivos e na função neural global.4 Para tanto, utilizou-se, entre outras, uma escala validada que avalia a presença, a gravidade e a duração de quatro sintomas neuropáticos característicos da ND, a saber: dormência, parestesia, queimação e facada (Escore de Sintomas Totais, ou TSS).4
Conforme se pode observar na figura 1, os resultados mostraram que, em média, a dor neuropática do tipo queimação/ardência e fa-cada/pontada reduziu-se em 51% no grupo de 600 mg, 48% no grupo de 1.200 mg, 52% no grupo de 1.800 mg e 32% no grupo pla-cebo.4 Não se notou redução da dor do tipo parestesia e dormência nesse estudo.4 Os autores também observaram a melhora dos déficits neuropáticos sensitivos e motores por meio de dois escores validados e base-ados em um exame neurológico minucioso: NIS (Neuropathy Impairment Score) e NSC (Neuropathy Symptoms and Change).4
Nesse estudo, observou-se ainda que nenhum paciente do grupo que recebeu ALA na dose de 600 mg ao dia descontinuou o tratamento.4 Os efeitos adversos do ALA foram dependentes de
Figura 1. Evolução dos níveis médios do Escore de Sintomas Totais (TSS), durante o período sem nenhum tratamento e ao longo de 5 semanas, com placebo e com 3 doses crescentes de ALA
Adaptada de: Ziegler D, et al. Diabetes Care. 2006 Nov;29(11):2365-70.4
EPM: erro padrão da média; ALA: ácido alfalipoico.
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10
9
8
7
6
5
4
3
*
**
*
* *
Triagem Semana 0 (início
do estudo)
Semana 2 Semana 1
Período de run-in Tratamento
Semana 3 Semana 4 Semana 5
Média ± EPM: Placebo ALA 600 ALA 1.200 ALA 1.800
TS
S (
po
nto
s)
5
dose, com predominância de náuseas com a dose diária de 1.200 mg (ocorrência em 21% dos pacientes), um pouco maiores que os ob-servados no ALADIN I (15%) e no ALADIN II (7%) com a mesma dose de ALA.4,5
Com base nesse estudo, concluiu-se que o tratamento oral com ALA melhora os sinto-mas da ND e que uma dose única diária de 600 mg apresentou o maior benefício, pois aqueles que receberam doses maiores (1.200 e 1.800) tiveram mais sintomas dispépticos,4 que podem ser aliviados com eventual prote-ção gástrica. Finalmente, os pesquisadores concluíram que o número de pacientes neces-sário para tratar (NNT) a fim de obter melhora de 50% da dor neuropática, com a dose de 600 mg de ALA, foi de 2,7.4
C) DADOS RECENTES DA LITERATURA
Uma revisão sistemática realizada em 2014 com o objetivo de analisar a eficácia e a segu-rança do ALA no tratamento da ND constatou redução dos sintomas sensitivo-motores do tipo dormência, parestesia, pontada e paralisia.6
Garcia-Alcala et al.7 conduziram um estudo multicêntrico randomizado com 45 pacientes, por cinco meses, no qual selecionaram os in-divíduos (N=16) que responderam à dose ini-cial de ALA 600 mg/dia por quatro semanas
(fase 1).7 Na fase 2 foram randomizados para continuar a receber ALA ou suspender a medi-cação por 16 semanas.7 O TSS teve significân-cia estatística no grupo tratado com ALA, e a medicação de resgate foi mais acentuada no grupo que descontinuou o ALA.7
Um estudo recente publicado no The Jour-nal of International Medical Research mos-trou que o tratamento por via oral com 600 mg diários de ALA, durante 40 dias, re-duziu os sintomas da ND, avaliados por três questionários validados, Neuropathy Symptom Score (NSS), Subjective Peripheral Neuropathy Screen Questionnaire (SPNSQ) e Douleur Neuropathique (DN-4), conforme se pode constatar na tabela 1.8
Nesse estudo, o ALA também melhorou a qualidade de vida geral (trabalho, vida social e familiar), estimada pelas escalas Brief Pain
Tabela 1. Respostas ao questionário DN-4 antes (no início do estudo) e após o tratamento com 600 mg de ácido alfalipoico (ALA) por 40 dias em 72 pacientes com neuropatia diabética dolorosa
Adaptada de: Agathos E, et al. J Int Med Res. 2018;46(5):1779-90.8
Dados apresentados como n (%) de respostas positivas. *Diferenças estatisticamente significativas (p<0,05; teste de McNemar).
Característica da dor
Ardência/queimação
Frio doloroso
Choque elétrico
Formigamento
Pinicadas e agulhadas
Dormência
Prurido
Hipoestesia ao toque
Hipoestesia a picadas
A dor é causada ou exacerbada por atrito
Fim do tratamento
24 (33,3)
13 (18,1)
17 (23,6)
33 (45,8)
26 (36,1)
31 (43,1)
12 (16,7)
19 (26,4)
15 (20,8)
10 (13,9)
Significância estatística*
p<0,001
p=0,012
p<0,001
p<0,001
p<0,001
p<0,001
p=0,006
p=0,002
p<0,001
p<0,001
Taxa de respostas positivas
Início do estudo
57 (79,2)
22 (30,6)
43 (59,7)
61 (84,7)
62 (86,1)
62 (86,1)
22 (30,6)
31 (43,1)
29 (40,3)
22 (30,6)
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Inventory (BPI), Neuropathic Pain Symptom Inventory (NPSI) e Sheehan Disability Scale (SDS), conforme ilustra a figura 2.8 A meta-de dos pacientes relatou sentir-se melhor ou muito melhor após o tratamento. Além disso, também houve redução de triglicérides.8
D) EXPERT OPINION
Sabemos presentemente que a neuropa-tia periférica é a complicação mais precoce, mais prevalente e mais polimórfica do DM.1 Embora existam atualmente inúmeras drogas para tratamento sintomático da ND,2 a maio-ria delas tem efeitos adversos que limitam
sua utilidade,2,5 e o tratamento farmacológico da dor neuropática associada à ND continua a ser um desafio para os médicos, pois a eficá-cia e a tolerabilidade individual permanecem um fator importante em qualquer decisão te-rapêutica.
Por outro lado, há suficientes evidências que demonstram tanto a segurança quanto a efi-cácia do ALA no tratamento da ND.9 Segundo a Diretriz Brasileira de Neuropatia Diabética, o ALA tem nível de evidência A na melhora dos sintomas e dos déficits relacionados à ND.10 A Associação Latino-Americana de Diabetes (ALAD) recomenda o uso de ALA para os pa-cientes com polineuropatia diabética sensiti-vo-motora, dolorosa ou não.11
Podemos concluir, com base nos dados apre-sentados acima, que o ALA constitui uma tera-pêutica racional e bem tolerada e é mais eficaz nos estágios iniciais da ND e na dose única de 600 mg ao dia.5,8 Além disso, a associação do ALA à terapia padrão de dor neuropática da ND pode ser benéfica,3 reduzindo os efeitos colaterais das altas doses, que impactam ne-gativamente nossos pacientes e reduzem tan-to a adesão quanto a tolerabilidade.6
Figura 2. Médias dos escores da Escala de Comprometimento de Sheehan de 72 pacientes com neuropatia diabética dolorosa antes (no início do estudo) e após (na consulta do dia 40) o tratamento com ácido alfalipoico (ALA)
Adaptada de: Agathos E, et al. J Int Med Res. 2018;46(5):1779-90.8
Dados apresentados como média ± DP, p<0,001, entre o início do estudo e a consulta do dia 40 em todas as comparações (teste t de Student)
10,0 -
8,0 -
6,0 -
4,0 -
2,0 -
0,0 -
5,34,7 4,9
3,5 3,1 3,1
Consulta basal Consulta do dia 40
Pontuação de comprometimento social
Pontuação de comprometimento familiar
Pontuação de comprometimento laboral
Po
ntu
ação
méd
ia ±
des
vio
-pad
rão
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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