Revista Ação - Esporte Sem Limites

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Primeira edição da revista produzida em 2012 por alunos do curso de Jornalismo do Centro Universitário Barão de Mauá

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REVISTA AÇÃOEdição 01 – Dezembro de 2012

Produção Experimental dos alunos do 1º ano do Curso de Comunicação Social comhabilitação em Jornalismo do Centro Universitário Barão de Mauá – Ribeirão Preto/SP

Coordenação do curso: Nahara Cristine Makovics FuscoCoordenação do projeto: Igor José Siquieri Savenhago

Reportagens e Fotos: Fausto Daniel, Daniel Zanetti, Vinícius Alves, Marcela Garrido, Fernanda Laurenti, Leonardo Santos, Susana Santos e Pamela Mendes.

Editoração Eletrônica: Je� erson Ricardo Orlandi (Je� n)

É fato: muita gente acha que os skatistas são pessoas à margem da sociedade. É uma concepção formada na mente dos que não entendem esta tribo. Seja por causa das roupas, músicas que essa galera ouve ou as manobras radicais e arriscadas que realizam.

Assim também acontece com o jiu-jitsu e o MMA. Afinal, era comum, no início dos anos 2000, confundir os atletas que praticam essas artes marciais com troglo-ditas que causavam confusão nas baladas.

E esta lista segue. Um exemplo é chamar os jogadores de rúgbi de brutos, por praticarem um esporte com extremo contato físico. Já disseram, também, que o rúgbi é um esporte de selvagens praticado por cavalheiros. A capoeira, que foi proibida no Brasil no período imperial, também já escutou algo do tipo.

Na contramão dessa onda de críticas, esta publicação pretende mostrar o que se passa nas ruas, quadras e campos da região de Ribeirão Preto, descre-vendo as dificuldades que atletas desses e de outros esportes enfrentam, como falta de patrocínio ou de um espaço decente para a prática da atividade.

Além das modalidades mal vistas, a primeira edição da Revista Ação conta histórias daquelas que não têm espaço na mídia tradicional – e não é diferente na imprensa regional, dominada pelo futebol de campo masculino. Exemplos são o basquete sobre cadeira de rodas, vôlei para a terceira idade, ginástica

olímpica, esta última com destaque apenas em épocas de grandes eventos. Mesmo o Bra-sil tendo um atual campeão olímpico, anda sumida das telas, jornais, revistas e rádios.

Os estudantes de jornalismo que produziram esse material desejam uma grande lei-tura.

Editorial

EXPEDIENTE

GOLPE NO PRECONCEITO

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o Skate: A onda durapág 10

Ginástica Artística: Em busca de equilíbrio pág 20

Jiu-Jitsu: O oponente é forte

pág 42

Outro olhar: Ensaio fotográfico

Fábio Melopág 31

Lembranças de um tempo de glórias.

Entrevista com Wilson Bombarda

pág 6

Hóquei in line: Charme sobre patins

pág 16

Capoeira regional: O legado de Bimba

pág 24

Rúgbi: As aparências enganam

pág 28

Basquete sobre rodas: Sonhando alto

pág 44

FALA AÍ!

Raul Bianchi: Esporte amador e

música independente o fator

“amigo do amigo” pág 5

Wolfgang Pistori: Há muito o

que fazer pág 15

Leonardo Santos: Jornalismo

esportivo não é palhaçada pág 27

Charge – Marcos Antônio Silva dos

Santos: No país das Olimpíadas

pág 46

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Quando os editores desta publicação me pediram para fazer uma analogia

entre música independente e esportes amadores, me senti como se minha men-te voltasse mais de 30 anos no tempo!

Entre 1979 e 1981, joguei nas divi-sões de base da Portuguesa, aqui de São Paulo. Fui campeão dois anos seguidos, goleiro menos vazado dos campeonatos e cogitado a ser convocado para a Seleção Brasileira de base, que, naquele tempo, praticamente inexistia. Quando existia, só os cariocas eram chamados, num bair-rismo irritante da época na CBF.

Em 1981, abandonei a carreira por causa de uma contusão na mão e, tam-bém, da burocracia e favorecimento que existiam – e ainda existem – nos clubes de futebol.

Isso não vem mais ao caso, já que abrir alguns arquivos “mortos” da minha mente não é uma boa ideia, até porque a terapia ainda não me fez aceitar tudo aquilo. Enfim, que eles fiquem por lá.

Em 1983, comecei a tocar bateria e encontrei minha paixão, mais até que jo-gar no gol, que é a música. E isso nos leva ao nosso texto, que trata exatamente das dificuldades que esportes amadores (sim, o futebol de base ainda é amador) e a mú-sica independente enfrentam nesse país.

Com os diversos incentivos culturais e esportivos que os governos dos últimos anos se gabaram de oficializar, a coisa pare-cia que ia melhorar e se democratizar. Ledo engano! Só grandes empresas, no caso do esporte, e famosos e globais, no caso da cultura, conseguiram lastro para tocar seus projetos. Desde a criação da tal Lei Roua-net, nos anos 90, eu tento emplacar um projeto e nada acontece. Incompetência de minha parte? Talvez. Mas já vi vários projetos muito piores que os meus serem aprovados, principalmente quando vêm acompanhados com as pessoas certas...

Oras, se isso só funciona na base do amigo indicador, então não há motivos para me estressar gastando tempo e neurô-nios para criar algo que jamais será apro-vado, se não vier com uma recomendação!

Raul Bianchi, músico paulistano

FALA AÍ!

Esporte amador e música independente:o fator “amigo do amigo”

Mas há um alento: a música indepen-dente nunca esteve tão em alta, pasmem os senhores! Sim, porque, com o advento das mídias sociais, tudo melhorou para a divulgação do trabalho, além do que, com a tecnologia, qualquer um grava e faz um vídeo para colocar no Youtube. E o me-lhor, a ditadura das rádios e gravadoras praticamente acabou! Só que outro pro-blema apareceu: muito material e muita informação geram menos interesse por parte das pessoas! Sim, isso mesmo! Com tanta coisa acontecendo, o público sim-plesmente não consegue mais absorver tanta novidade e isso gera uma demanda maior que a procura,

Você, caro leitor, que está lendo estas mal traçadas linhas, deve estar pensando: “Esse cara é maluco! Fala uma coisa boa e na sequência detona tudo!”. Sim, pode parecer isso, mas a verdade para quem vive de música é essa. Chegamos a um ponto em que tudo está saturado e há a necessidade urgente de criar novas opções de divulgação para não cair no ostracismo.

O mesmo vale para esportes ama-dores. As empresas gastam tubos de di-nheiro em determinados projetos que, simplesmente, não vingam, porque têm a sua frente pessoas incompetentes. Clu-bes aparecem com empresas dizendo que são o novo eldorado do esporte amador e, dali há um ano, já estão devendo para os atletas e desistindo do projeto. E isso com o apoio do governo e das leis. Daí, você percebe que tudo isso foi só para descon-tarem o Imposto de Renda, que, conve-nhamos, é um abuso neste país, de seus faturamentos anuais.

Uma pena que ainda não exista no Brasil um mecanismo justo, honesto e inteligente de incentivar realmente a cultura e os esportes. Porque, enquanto dependermos de ter pessoas famosas, ou então alguém que conhece alguém que trabalha lá no Ministério da Cultura ou dos Esportes, estaremos presos a este círculo vicioso e triste da roda que gira, gira e para sempre no mesmo lugar: dos “amiguinhos dos amigos!”

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Lembrançasde um tempo de glórias

Destaque nas décadas de 50 e 60 com a camisa da Seleção Brasileira de Basquete, o professor de Educação Física e produtor de café Wilson Bombarba recorda as dis-putas em quadra, as conquistas e os moti-vos que o levaram a Altinópolis

Entrevista

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FAUSTO DANIEL

Pouca gente sabe, mas o professor de Educação Física Wilson Bombarda,

de 82 anos e morando em Altinópolis, a 60 quilômetros de Ribeirão Preto, foi um dos maiores vencedores atuando pela Seleção Brasileira de Basquete. As lembranças de um passado de glórias o fazem ver com tristeza a falta de es-tímulo à prática esportiva hoje. Para ele, é fundamental incentivar o espor-te nas escolas, não só para a formação de atletas, mas de cidadãos. A reporta-gem da Revista Ação foi até a casa dele. Acompanhe os principais momentos da conversa, que teve como cenário uma plantação de café, atual investimento de Bombarba e um dos símbolos de Altinó-polis.

Revista Ação: Para começar, pro-fessor, conte sobre os clubes que de-fendeu.

Bombarda: Eu joguei em Marília, pela cidade, na Central de Esportes. De lá, fui para São José dos Campos, joguei pelo Tênis Clube, graças à indi-cação do Alberto Marson e a orientação do professor Moacir Dayuto, que, por sinal, é altinopolense. Hoje, é falecido e muito querido... Foi, com certeza, um pai profissional que tive. Nós tínhamos um grupo que, para onde fosse o Moacir Dayuto, íamos juntos. E, de lá, fomos para o Pinheiros. Há uma curiosidade em São José dos Campos, porque a ci-dade respirava basquete. Havia o Tênis Clube e, também, um esforço no Centro Técnico Aeroespacial. Nós trabalháva-mos lá. Marson também era jogador de Seleção Brasileira, medalha de bronze em Londres-1948. Nós jogávamos no Tênis Clube, mas o Alberto era uma pessoa de personalidade forte e de opi-nião forte também, sabia o que queria. E ele se desentendeu com os diretores do Tênis. Como ele trabalhava lá no ITA [Instituto Tecnológico de Aeronáutica], achou que poderiam fazer uma equipe. Como eu trabalhava lá também, ele fa-lou: “Olha, Bombarda, eu vou fazer uma equipe aqui, se você quiser jogar”. E eu falei: “Vou sim, Marson. Como não? Eu trabalho aí. Deixa só eu terminar o cam-peonato aqui pelo Tênis para não ficar ruim”. Aí, formou-se uma equipe forte lá. Na ocasião, a Secretaria de Esportes fazia um torneio chamado Troféu Ban-

deirantes, que era um campeonato além dos Jogos Abertos do Interior, e esse troféu era a força de cada cidade, com nomes de clubes, mas era cada cidade. Em São José dos Campos, tinha duas equipes e uma delas tinha que represen-tar a cidade. Era o jogo mais importante do ano: o Centro Técnico Aeroespacial, CTA, contra o Tênis Clube. Qualquer um que ganhasse iria representar muito bem a cidade, porque eram muito fortes. Temos uma recordação muito grata des-ses jogos porque, durante alguns anos, fizemos essa disputa. Quando a partida era no Tênis Clube, era cobrado ingresso e lotava. No CTA, não tinha como você cercar para cobrar ingresso, a quadra era no meio dos eucaliptos, na praça es-portiva do ITA. Então, ficava uma mesa com o vendedor de bilhetes e um portei-ro ali no meio dos eucaliptos com tudo aberto. E o pessoal passava e comprava o ingresso. Tinha os meninos que va-zavam, conseguiam entrar sem pagar, mas isso aí ninguém segura (risos). Mas o pessoal mais dado à intenção de ajudar passava e comprava o ingresso.

Revista Ação: Somente depois de tudo isso o senhor veio para Altinó-polis?

Bombarda: Altinópolis aconteceu graças a minha esposa, a Dirce, que está aqui conosco, porque, através do esporte, nos conhecemos, surgiu um sentimento mais forte e o casamento em consequência. Após o casamento, a Dirce foi comigo, porque eu trabalhava lá em São José dos Campos. Terminado meu tempo de trabalho, veio a aposen-tadoria e eu vim para cá, porque já tinha interesses aqui. Eu tinha uma socie-dade com o Fayez Felippe, que é meu concunhado, um amigo muito querido. Começamos com um pedacinho de terra plantando café, que até hoje temos gra-ças a essa sociedade.

Revista Ação: O senhor tem no currículo duas medalhas em Pan-a-mericanos (Cidade do México-1955 e Chicago-1959), um vice-campeonato Mundial (1954 no Brasil) e um sexto lugar nos Jogos Olímpicos de 1956, em Melbourne na Austrália, onde foi porta-bandeira da delegação brasi-leira. Como é o reconhecimento de um atleta do seu nível?

Bombarda: Eu recebi do Comitê

Olímpico Brasileiro esse ano uma carta e veio junto uma foto, que saiu no Jor-nal do Comércio, com a relação de todos os porta-bandeiras através dos tempos. O Galvão Bueno também disse na aber-tura dos jogos de Londres, ano passado. Ele anunciou todos os porta-bandeiras e nessa relação surgiu: “1956, Wilson Bombarda”. É uma honra muito grande que pouca gente sabe, mas é uma honra que pertence à gente. Se alguém souber, bem! Se não souber, não tem importân-cia... A gente carrega isso.

Revista Ação: E aqui em Altinó-polis?

Bombarda: Pelas pessoas que gos-tam de esporte, os amigos mais próxi-mos, sim. Uma vez, houve uma exposi-ção na Casa da Cultura sobre esportes. Pediram que levássemos fotografias, mas o pessoal passa, olha e isso passa esquecido. Mas tem sim, especialmen-te depois dessa Olimpíada, em que foi muito anunciado que o Brasil seria sede em 2016. Isso despertou um interes-se maior, digamos, pelo esporte, pela Olimpíada. Então, o pessoal que viu e que ouviu começou a telefonar aqui para minha casa... Foi um pouquinho mais, mas pouca gente sabe desse fato e eu não vou ficar na rua dizendo. (Dona Dirce interrompe com os olhos mareja-dos e diz: “sou eu que conto”).

Revista Ação: Como professor de Educação Física, que importância o senhor acha que teve a prática de es-portes na época da escola para ter se tornado um atleta depois?

Bombarda: Você fez uma pergunta que acho de extrema importância pela situação da Educação Física aqui no Brasil. Professor de Educação Física era muito respeitado, tinha muita importân-cia e havia esse interesse. Na medida em que o tempo passou, as escolas foram se ampliando e ocupando áreas destinadas ao lazer, a recreação e à prática despor-tiva. Há um conceito que ainda persiste especialmente nos meios políticos, onde surgem os recursos para qualquer ativi-dade, de que o esporte deve ser feito para formar campeões. Formar campeões é um aspecto da Educação Física. Eu pen-so que ela deve ser levada a toda criança, todo jovem. Se de lá surgir um talento com características e biotipo para algu-ma modalidade, ele pode fazer carreira e

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até ser um profissional. Naquele tempo, não havia essa possibilidade, mas havia uma seleção. Tinha campeonato cole-gial que era muito bem organizado, ha-via uma porção de coisas. Eu vejo aqui, por exemplo, que Altinópolis teve a sua melhor época de desporto. Existe uma diferença entre esporte e desporto. O desporto é competitivo, o esporte é feito por todo mundo, sem a responsabilida-de de vitória. Em Altinópolis, a melhor época do desporto foi quando não tinha ginásio, havia uma quadra cimentada lá embaixo e a equipe foi campeã dos Jo-gos Abertos femininos. A Dirce fez parte dessa equipe jogando vôlei. O masculi-no também era muito bom, futebol de salão era muito bom, futebol de campo disputou a final do amador e perdeu para Elvira de Jacareí, isso em 1949, se não me engano. Fazer esporte era uma moda por aqui. Eu vejo hoje com muita tristeza. Altinópolis tem cinco ginásios cobertos e não tem praticamente nada. Tem um esforço do professor Huelder, um professor com letra maiúscula, mui-to dedicado, mas sem o necessário apoio nem interesse da comunidade daqui.

Revista Ação: Até pouco tempo atrás, tinha a Miniolimpíada da es-cola Barreiros, inclusive.

Bombarda: Você tocou num assun-to que me diz muito respeito. A Minio-limpíada surgiu e eu fui convidado para ajudar a orientar. Então, fizemos um regulamento segundo o qual o principal era realmente a competição, mas com mesma importância havia uma cláusula que falava em formação de lideranças. Eu pensei muito e disse: “Eu vou ensi-nar a fazer, não vou levar o peixe para ninguém”. Era muito bom por causa disso. A Miniolimpíada fazia com que o ginásio ficasse lotado e gente do lado de fora, havia interesse. Nós tínhamos que ensinar a fazer súmula, a apitar jogos, varrer a quadra, limpar o banheiro, ar-ranjar recursos para fazer camisetas. No auge da Miniolimpíada, a diretora era a professora Vilaiba e até hoje, quando en-contro com ela, eu digo: “Minha querida diretora!”. Foi uma lástima ter acabado. E isso aconteceu justamente pela falta de interesse e apoio político também. De lá, surgiram realmente grandes lideran-ças, em outras áreas, não só no esporte. Inúmeros vereadores passaram por isso

aí, alunos que se formaram e hoje ocu-pam cargos.

Revista Ação: Depois daquele vice em casa no Mundial de 1954, em que o senhor esteve, a seleção con-seguiu um bicampeonato: em 59, no Chile, e 63, quando o torneio voltou ao Brasil. Mas o senhor não fez parte daquelas conquistas. Como foi ficar de fora?

Bombarda: Tínhamos um campe-onato brasileiro que era disputado pelos estados. Vinham os cariocas, os mineiros, paulistas, gaúchos, enfim, todo Brasil. E foi no Rio Grande do Sul esse campeona-to. De lá, saiu a seleção que iria disputar no Chile o Mundial que o Brasil foi cam-peão. Nessa ocasião, o Augusto [filho de Bombarda] estava próximo do nascimen-to e a gente preocupado com isso, porque a comunicação era mais difícil naquele tempo. Nós, paulistas, ganhamos aquele campeonato e estava tudo pronto, meu passaporte, minha inscrição, meu uni-forme, terno para desfile, tudo isso esta-va pronto pra ir. Eu estava num dilema muito grande: ou ia para o Mundial no Chile ou vinha embora dar uma assistên-cia aqui. Eu optei por vir e foi no meu lugar o Jathyr Schall, que também era muito amigo e que o uniforme servia (ri-sos). Ele tinha condição técnica também, não era nem muito baixo ou alto, era um pouco mais forte até, mas o uniforme servia. Eu não fui. O Brasil ganhou e eu me considero campeão Mundial também. Porque eu teria ido, né?

Revista Ação: Taticamente, quais foram as mudanças que o basquete de hoje teve em relação a sua época?

Bombarda: Antigamente, o jogo era mais tático, digamos, não havia ne-cessidade de você tentar a cesta dentro dos 24 segundos. Já havia na NBA, isso foi copiado de lá. Então, o jogo era um pouco mais pausado, havia contra-ata-que rápido, mas as contagens eram mais baixas. Com o advento da obrigação de você tentar a cesta, o jogo passou a ser muito mais dinâmico, porque, quanto mais depressa, você fica livre dos 24 se-gundos, que não deixam de ser um fan-tasma em cima de você. Hoje, além de ser profissionalizado, como o futebol e outros esportes, como o voleibol, se trei-na todos os dias. Naquele tempo não era,

você treinava todos os dias nas concen-trações e, fora disso, nos clubes, a gen-te treinava duas, três vezes por semana e jogava. Agora é muito mais rápido, muito mais vigoroso, muito mais pre-paração física e treino técnico também, porque hoje se treina até duas vezes por dia e, naquela época, cada um tinha que defender sua vida.

Revista Ação: O senhor ainda acompanha as competições pela TV e vai a ginásios para ver jogos?

Bombarda: Acompanho, mas estou achando que você sabe mais que eu de basquete depois disso (risos), mas eu acompanho sim, porque gosto, e gosto de assistir o feminino também. Eu tive a felicidade de assistir aos jogos da Sele-ção Brasileira quando jogavam Hortên-cia e Paula e, especialmente a Hortência, eu costumo dizer que nesses próximos cem anos não vai aparecer outra no Bra-sil. Ela era uma jogadora especial por ter 1,74m e fazer o que ela fazia. A Hortên-cia, se fosse para o atletismo, seria uma campeã. Se fosse para o vôlei, seria uma campeã. Porque ela é superdotada, um talento inato.

Revista Ação: Depois de parar de jogar, o senhor continuou ligado ao esporte de alguma forma?

Bombarda: Trabalhando, sempre trabalhei. Exerci minha profissão, tra-balhei para o estado trinta e seis anos e meio, o que corresponde a um ano e meio de lambuja para o governo. Não precisava ter trabalhado, mas como eu gostava tanto... Comecei dando aula e terminei como dirigente esportivo da secretaria. Fui delegado regional da Se-cretaria de Esportes no Vale do Paraíba durante 30 anos. Lá, aprendi como lidar com direção de jogos, formação de sis-temas, construção de instalações e essa coisa toda.

Revista Ação: Os investimentos em infraestrutura para os jogos de 2016 têm sido bastante grandes. Não seria preciso ter investido mais na formação de atletas para representar o país?

Bombarda: Vou aqui usar uma ex-pressão caipira que se coaduna muito com a sua pergunta: “embornal gran-de, milho pouco” (risos). Estou dando

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risada porque acho este termo caipira extraordinário. O Brasil é o embornal grande, milho pouco. Está fazendo muito, muitas instalações, gastando muito dinheiro. E outra coisa: Mundial e Olimpíada próximos um do outro é uma despesa que o Brasil não tem esse dinheiro para gastar. Olimpíada é muito caro. Já gastou mais que o dobro do or-çamento previsto para o Pan-americano em 2007. Eu acho difícil, não porque o Brasil não vai trabalhar em cima. Está trabalhando, mandando verba. Eu vejo as verbas todas aumentarem. A Inglater-ra, por exemplo, foi oitava na Olimpíada passada e o governo aumentou a verba para melhorar a participação. Aumentou a verba e abandonou outros esportes que achou que não devia, inclusive o basquete. Investiu no que sentiu a apti-dão do inglês: atletismo, natação... Uma porção de esportes próprios. O basque-

te, apesar de ter apresentado uma bela equipe, foi formado só para disputar a Olimpíada. Tomara que o Brasil consiga para justificar essa despesa toda.

Revista Ação: Carlos Arthur Nuz-man, presidente do Comitê Olímpico Brasileiro, disse que o Brasil estará entre os dez melhores no quadro de medalhas do Rio. O senhor acha pos-sível?

Bombarda: Aqui veio mais uma reportagem outro dia e perguntou se eu achava que o Brasil iria se sair bem na Olimpíada. Também demorei um pouquinho porque não sabia o que res-ponder e disse: “olha, nós temos muita esperança”. O Nuzman pensou assim, com esperança e com uma maneira de se expressar em que trazia um forta-lecimento para a causa da Olimpíada. Acho muito difícil o Brasil ficar entre

os dez. O Brasil teve tempo de iniciar o trabalho de formação de atletas de nível olímpico e demorou muito. Não se faz um atleta em quatro anos, pre-cisa muito mais. Se nós começarmos a pensar em China, Estados Unidos, In-glaterra, Alemanha, França, Austrália... Esse pessoal tem várias modalidades que carregam muitos pontos. Ginásti-ca olímpica ganha muitas medalhas... Alias, acho que o regulamento que rege a contagem de pontos deveria merecer certa modificação. Por exemplo: o fute-bol se joga com onze jogadores e ganha uma medalha. Talvez fosse o caso de premiar modalidades como o basquete, o vôlei e outras modalidades esportivas que envolvem vários participantes com mais medalhas. Não posso dizer quan-tas. Com uma boa ginástica olímpica e uma boa natação, se vai lá pra cima na classificação.

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Bombarda (primeiro em pé, da es-querda para a direita) com equipe de basquete da década de 60

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A ondadura

Influenciados por ídolos mundiais, ribeirãopretanos dizem ser adeptos do skate por amor ao esporte e reclamam da falta de estrutura para a prática; enquanto a pista não vem, eles treinam em cidades vizinhas ou improvisam caixotes

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DANIEL ZANETTI

Eles não estão preocupados em apare-cer mais que qualquer outro esporte.

Não buscam exposição exagerada. Que-rem apenas reconhecimento. Que te-nham, ao menos, um espaço para treinar e divulgar sua ideologia. Jovens de Ribei-rão Preto, adeptos do skate, reclamam da falta de estrutura para a modalidade.

A prática foi criada no início da déca-da de 60 na Califórnia, onde já predomi-nava a curtição sobre uma prancha, a de surf. Na época, surfistas frustrados com ondas pequenas e maré baixa resolveram tomar uma atitude quando o mar estava calmo demais. Foi aí que surgiu o surf no asfalto. Os jovens montaram uma madei-ra com rodas de patins e chamaram de skate, que, em inglês, significa “patinar”. Uma legião começou a praticar o novo esporte. As empresas passaram a inves-tir na fabricação industrial do skate. Não demorou para que várias competições fossem organizadas.

A década de 80 foi importante para este esporte no mundo. Foi nesse perío-do que surgiram dois dos maiores nomes

da modalidade: Hodney Mullen, consi-derado um revolucionário, que criou a maioria das manobras, e Tony Hawks, que ganhou o título de maior skatista de todos os tempos, pelo grau de dificuldade demonstrado em suas exibições. Os dois são, até hoje, influências aos skatistas também no Brasil, onde as capitais pau-lista e carioca são pioneiras em território nacional. Tony, inclusive, é quem dá nome a uma série de jogos de videogame sobre esse esporte.

A onda no BrasilO esporte se espalhou no Brasil a par-

tir de 1985, com o surgimento de revistas especializadas. Estados como Rio de Ja-neiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul ganharam pistas. Campeonatos passaram a ser realizados com maior frequência. A maioria dos skatistas vinha da influência punk e praticava a categoria Street, na qual os esportistas interagiam com diversos ele-mentos da arquitetura urbana, como esca-das, corrimões e paredes, o que passou a incomodar as pessoas que não conheciam o esporte. Os skatistas foram chamados de vândalos, drogados e baderneiros.

“Skate não é crime”Em 1988, o prefeito de São Paulo,

Jânio Quadros, decidiu proibir a prática do esporte na cidade, o que gerou passea-tas e protestos, realizados por jovens que consideravam o ato do político como re-pressor, conservador e que impedia o di-reito de ir e vir. A mídia publicava o abu-so de autoridades contra os skatistas e a repressão a esta prática esportiva. Carta-zes com a inscrição “Skate não é crime” eram espalhados pela capital paulista.

Na contramão desta medida, Luiza Erundina, sucessora de Quadros, prome-teu legalizar novamente a atividade. Ela chegou a posar para fotos em cima de um skate. Apesar da liberação, a política municipal pouco mudou em relação ao antecessor. Não foram construídos espa-ços para o esporte.

Exposição, crise, reestruturação e os ídolos

Nos anos 90, com o surgimento de um grande número de marcas, revistas, produtos e campeonatos fixos, o skate atingiu seu ápice. Mas o início desta dé-cada não foi nada fácil para o esporte no

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Amigos se reúnem no fundo de quintal para a prática do skate

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Brasil, pelo fato de o então “Plano Collor” afetar o mercado e os fabricantes.

Revistas e patrocinadores que paga-vam os atletas para disputar campeona-tos faliram. Muitos dos skatistas deixa-ram o esporte e foram sobreviver de outra forma. Alguns, porém, não abandonaram o sonho. Com o tempo, o mercado se re-organizou e surgiu, então, a Abesk (As-sociação Brasileira dos Empresários de Skate).

A chegada de TVs a cabo, com canais de esporte, e a qualidade dos skatistas fi-zeram com que o esporte voltasse à cena. Com campeonatos mais frequentes sen-do transmitidos ao vivo pela televisão, os skatistas profissionais passaram a ser mais vistos e admirados pelos fãs brasilei-ros, o que consagrou internacionalmen-te nomes como Bob Burnquist, Lincoln Ueda e Sandro Dias, o “Mineirinho”. Ído-los que inspiraram a nova geração, nos anos 2000. Hoje, segundo o Datafolha, cerca de quatro milhões de brasileiros praticam skate.

Manobrando para o interiorEm Ribeirão Preto, interior paulista,

existem muitos jovens que começaram a praticar o esporte depois de terem visto es-ses atletas aparecendo na TV. A maioria de-les não ganha a vida no skate como os ído-los. Praticam apenas por amor ao esporte.

Poder público não dá esperanças

A reportagem da Revista Ação tentou falar sobre o as-sunto com o secretário de esportes de Ribeirão Preto, Mar-celo Palinkas, e com o da Cultura, Alessandro Maraca, por várias vezes. Funcionárias de ambos sempre informavam que eles estavam em reunião.

Carlos Guerra, chefe da divisão do desporto de Ribeirão Preto, afirmou que a cidade tem pista localizada no Parque Maurilio Biagi. Mas o local, segundo os skatistas, não é apropriado, devido ao tamanho da pista e à forma como ela foi construída. Guerra desconhece projetos de pistas para o futuro.

O secretário de esportes que ocupou o cargo antes de Palinkas, Edmilson Desordo, não soube falar sobre o assun-to e pediu para que a reportagem entrasse em contato com Centro Social Urbano (CSU) da Vila Tibério, que também desconhece qualquer projeto e nada informou sobre o tema.

Um deles é Daniel Massa, skatista há 10 anos. Por influência de vizinhos, que já andavam de skate, e por assistir aos campeonatos na TV, aos domingos, pegou gosto e foi se superando nas ma-nobras.

Ao invés de escolher o futebol, espor-te mais praticado no Brasil, Daniel sem-pre preferiu o skate, por ser mais voltado para a rua. “Cada um se veste como quer,

uns no estilo hip hop, outros no estilo roqueiro, ou seja, cada um faz seu estilo. Não é como no futebol, que todos têm um uniforme”.

Liberdade também na escolha da música, que sempre andou junto com o skate. Segundo os praticantes, ela aju-da na hora de fazer a manobra ou na concentração para realizá-la. Massa, por exemplo, gosta de ouvir um pouco de

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hip hop, rock e hardcore enquanto anda de skate, mas, na turma dele, cada um coloca seu fone de ouvido e ouve o que quer.

Sem espaçoFabricio Vieira, mais conhecido

como Cebola, também morador de Ribei-rão Preto e adepto da modalidade há 13 anos, conta que existem muitos skatistas na cidade. O que falta mesmo é uma pista para a prática do esporte.

Segundo ele, os skatistas da cidade costumam praticar o esporte nas ruas, praças ou casa de amigos. Em cidades vi-zinhas, como Barrinha, com um número bem menor de habitantes, existe uma pista adequada, segundo os praticantes. Por falta de espaço em Ribeirão, os ska-tistas se deslocar ou, então, improvisar caixotes e obstáculos na rua para treinar.

Sem apoio dos órgãos públicos, os próprios skatistas vão atrás de montar as pistas e organizar campeonatos. “Nós tiramos dinheiro do próprio bolso para poder fazer um evento, sendo que isso deveria ser uma função do poder público. Do mesmo jeito que investem dinheiro em campeonatos de futebol, por exem-plo, deveriam também investir no skate”, completa Cebola.

Assim como Daniel e Cebola, David Daniel, o Deivão, skatista há 20 anos, também reclama da falta de pista em Ribeirão e de apoio da prefeitura. Ele diz que “todo ano de eleição, existe promes-sa que vão construir parques na cidade e que terá pista, mas sempre arrumam desculpas quando não dá certo”.

Para Deivão, deveria haver uma gran-de mobilização dos skatistas da cidade para protestar e cobrar as promessas fei-tas. “Eu já perdi vários dias de serviço, pra falar com o secretário de esportes,

com vários políticos, mas, infelizmente, eles sempre têm uma desculpa para dar”.

Pouco apoio e muitos skatistas ta-lentosos, acostumados com desafios e

preconceitos. Essa é a realidade de Ribei-rão Preto. Obstáculos que, segundo os praticantes, não serão capazes de fazê-los parar de amar o esporte.

Mineirinho fala coma Revista Ação

Um dos grandes nomes do skate nacional esteve recen-temente em Sertãozinho, 20 km de Ribeirão Preto, para fa-zer uma tarde de autógrafos e “rolês” de skate com os fãs da cidade. A equipe de reportagem da Revista Ação marcou presença e registrou uma breve entrevista com Sandro Dias, o Mineirinho.

O skatista é hexacampeão mundial na modalidade e medalha de ouro nos X Games de Los Angeles, em 2006. É conhecido no mundo do esporte como o “rei dos 540°”, por executar com perfeição a manobra, que dá uma volta e meia no ar.

Como se não bastasse essas características, Sandro Dias foi o primeiro skatista do mundo a executar o 900° em uma competição. A manobra consiste em dar duas voltas e meias no ar, antes das rodinhas tocarem a rampa de volta.

Confira a conversa em que Mineirinho fala de alguns títulos, dificuldades do esporte no interior de São Paulo e a relação do skate com a música.

Ação: Você é hexacampeão mundial de skate. En-quanto isso, no país do futebol, a seleção está estacio-nada no penta. Como você enxerga essa situação?

Sandro Dias: Bom, eu me sinto bem menos valorizado do que os jogadores de futebol (risos). Eu sou feliz por aqui-lo que conquistei sozinho. São 27 anos no skate e 18 como profissional. Estou realizado por tudo que fiz até hoje, mes-mo não sendo valorizado como eles [jogadores]. Vou con-tinuar fazendo o que gosto, porque realmente amo skate. Vou fazer o melhor possível para animar essa nova geração do esporte e que eles motivem outras pessoas também. Os resultados estão surgindo.

Ação: Como você vê a situação do skate no interior de São Paulo?

Sandro Dias: O skate tem crescido hoje. Ele é o segun-do esporte mais praticado do país. Em todo lugar, tem skate. O que falta é um pouco mais de estrutura pra galera poder praticar. Às vezes, até tem pistas, mas construídas de qual-quer maneira, o que atrapalha o desenvolvimento da nova geração. Vejo muito isso no interior de São Paulo. Se vier um apoio extra dos governantes, a estrutura pode melhorar e o nível dos atletas também.

Ação: Dá pra perceber uma relação entre o skate e a música. Quando você anda, o que costuma ouvir?

Sandro Dias: O skate é totalmente ligado com música. Dificilmente, você vê um cara andando sem estar escutando um som. Aí, são gêneros variados, desde o hip hop ao heavy metal. Eu, particularmente, curto algo mais pesado. Vou de hardcore, rock e heavy metal.

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Mineirinho faz apresentações pelas ruas de Sertãozinho

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aqui: um exercício de criatividade. É ro-mântico e, não há como dizer outra coi-sa, inspirador. O caixote vira obstáculo, a parede vira adversário, o pacote de arroz vira peso para treinar os músculos para o que vier amanhã.

Viver de esporte por essas terras não é lá tarefa muito grata. Ninguém quer ver, muito menos investir, no que chamamos de esportes amadores. E por isso é louvá-vel a iniciativa a que se propõe essa revis-ta. Para que o resultado chegue, alguém precisa dar o primeiro toque na bola e a ideia dessa publicação é certamente aquele passe que visa o gol, a cesta, o Field gol, o try.

Mas é ali, onde está o maior encan-to da coisa. Experimente a atmosfera de um torneio de futebol amador de fim de semana em algum bairro de periferia e você vai saber. Vale arriscar o espeti-nho do lado do alambrado ou prestar atenção nos apelidos dos jogadores. É uma terapia para o dia a dia de estresse, tecnologia exacerbada e compromissos inadiáveis.

Escondidos atrás do futebol profis-sional, temos times uma infinidade de opções para se mexer, se divertir. Expe-rimente reunir uma turma e vá praticar seu esporte preferido em uma das escolas estaduais abertas aos finais de semana. A estrutura é precária, eu sei, mas é um começo. Sem a ocupação dos locais pú-blicos destinados à prática esportiva, não há necessidade de traves novas, tabela decente ou rede de vôlei.

Há algumas poucas ciclovias por aí.E se precisar de alguém para comple-

tar o time, pode contar comigo.Esqueça as academias, onde o prazer

se limita as curvas do corpo. Prazer não pode ser isso ou apenas isso.

Aos que sonham e vivem da supera-ção, do prazer, da angústia, da vitória, fica uma adaptação de uma frase do escritor argelino Albert Camus: “O que finalmente eu mais sei sobre a moral e as obrigações do homem devo ao esporte...”

Os campos de várzea já foram, em al-gum momento, o que de mais char-

moso havia em uma cidade. Ainda são, mas pouca gente sabe disso. O bétis, que une a técnica do basebol com uma noção de boliche, ainda sobrevive em uma ou outra rua. E ainda há gente colocando um banco a alguns metros da linha do aro, nas quadras que alguma prefeitura algum dia ousou colocar na cidade, para tentar uma enterrada.

O futebol jogado no asfalto, com tra-ves feitas de chinelo, é cada dia mais raro. As ruas esburacadas são um desafio para quem anda de skate, patins ou o velho carrinho de rolimã.

Tudo isso caminha para o fim. Cul-pem os políticos por isso. Tudo bem. Mas nós somos os principais culpados pela mudança no conceito da vida, para não falar de sentido.

É verdade que se as ruas não têm condições para receber os verdadeiros atletas da nossa sociedade. Ao menos uma lista de locais adequados para a prá-tica de uma dezena de esportes deveria estar facilmente na cabeça. Não está.

As ruas deveriam estar seguras, lisas, calmas. Os espaços esportivos teriam que existir em grande escala, bem cuidados, igualmente seguros. A culpa é nossa tam-bém.

Alguns podem falar de Cuba, China ou Estados Unidos, onde a cartela de es-portes praticados com excelência é gigan-

Wolfgang Pistori, jornalista

Há muito o que fazer

te. Onde há quadras esportivas públicas com mais qualidade do que nosso prin-cipal complexo esportivo. Mas podemos nos questionar: onde foi parar o prazer? Adultos não podem mais ter prazer. É a conclusão que chego.

Esqueço-me da minoria – seria mes-mo minoria? – que encontra no limite o principal inimigo. E isso significa prazer. Derrotar o inimigo. Sejam os números no cronômetro enquanto se acelera as passadas no sentido de uma linha traça-da com giz, provavelmente em local dito inadequado para a prática de tal esporte, seja no sopro de superação após o toque da mão na borda da piscina. Tudo isso é prazer.

Não só de prazer é feita a vida – ou deveria ser? Precisamos viver. E para vi-ver, investimento. Quando se fala de Chi-na, Cuba, Estados Unidos ou excelência, fala-se de resultado, de vitória, de conse-quência. De investimentos.

Contamos nos dedos as empresas que apostam em esportes amadores. E onde está a culpa? Volto a dizer, na maio-ria. Não damos o devido valor para os valores que insistem em viver de prazer. Esses sim são vitoriosos, mesmo que não fiquem com o ouro no fim.

Quando foi que você viu pela última vez uma competição de atletismo? Quan-do você foi prestigiar um jogo de futebol do time da cidade, com entrada franca? Quando você perdeu uma tarde para ver uma competição de judô ou de handebol?

A falta de investimento em esportes amadores no Brasil é uma roda com vá-rios compartimentos, que juntos formam o que há de mais bonito e mais sujo quando falamos de esporte. Seriam ne-cessárias algumas dúzias de edições desta revista para entrar a fundo no problema. Superação ao lado de indiferença. Até preconceito está engrenado na realidade que se diz olímpica.

Em Ribeirão Preto, os muitos prati-cantes do skate resumem o que é ser ou tentar praticar esporte com qualidade por

FALA AÍ!

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HÓQUEI IN LINE

Charmesobre patins

Terra da cana e do hóquei tradicional busca o seu espaço no in line, modalidade em que catorze meninas se destacam nos cenários estadual e nacional. Mas o começo foi difícil: faltavam equipamentos e reconhecimento

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VINÍCIUS ALVES

Sertãozinho, interior de São Paulo, 20 quilômetros de Ribeirão Preto. Co-

nhecida pelo forte aparato industrial no setor sucroenergético. Ganhou o apelido de “capital mundial da cana-de-açúcar e do etanol” devido ao fornecimento desses produtos para o Brasil e exterior. São 111 mil habitantes, com a maioria vivendo na classe média. Mesmo com a crise que, em 2008, afetou a base de sua economia, o ritmo é de correria e muito trabalho. Não só nas ruas, praças e avenidas. Também nas quadras esportivas.

Foi nesse cenário que um grupo de quatro meninas resolveu inovar e criar um time de um esporte ainda pouco co-nhecido e divulgado no país: o hóquei in line. Inspiradas no sucesso de Sertãozi-nho nos anos 80 no hóquei sobre patins e num Campeonato Internacional de hóquei in line masculino realizado na ci-dade em 2011, elas se juntaram e foram ao patinódramo municipal fazer girar as primeiras rodinhas das Lady’s Spiders, a única equipe feminina federada no Brasil.

O nome surgiu em alusão ao time masculino já existente na cidade, os Spi-ders. Para dar charme e requinte, acres-centaram Lady – título dado às senhoras da nobreza na Inglaterra.

DificuldadesMas não foi fácil para as meninas do

“sertão”. A falta de equipamentos e co-nhecimento da população sobre o espor-te atrapalhou o início da modalidade. “No Brasil, ainda não tem nenhuma mulher que faz do hóquei in line a sua profissão. Os recursos e investimentos são mui-to pequenos, não compensa. A maioria estuda ou trabalha e faz do hóquei um comprometimento em segundo plano”, conta Tamiris Dinamarco, 23 anos, jor-nalista e fundadora da equipe. Hoje, ela não joga mais, por motivos profissionais e pessoais, mas procura incentivar as co-legas.

Segundo Tamiris, o fato de o hóquei ser um esporte de contato forte entre os atletas faz com que as mulheres que não praticam se refiram às jogadoras de forma preconceituosa. “Os homens nem tanto. Os que jogam sempre estão nos apoiando”.

ConquistasApesar de todas essas dificuldades, os

resultados estão aparecendo para o time

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sertanezino. Em 2012, as Lady’s, com um ano de formação, foram campeãs da Copa São Paulo, vice-campeãs da Copa e do Campeonato Paulistas e conquis-taram a terceira colocação na Copa do Brasil da modalidade, esta realizada em Sertãozinho.

E não foram só em títulos coletivos que as Spiders conseguiram se desta-car. Em julho de 2012, as jogadoras de Sertãozinho estiveram representadas no Campeonato Mundial de hóquei in line realizado na Colômbia. A atleta Marcela Maria foi convocada e vestiu a camisa da Seleção Brasileira nessa competição.

PERFIL DAS ATLETAS

Tá no sangueA atacante Patrícia Sponchiado, 16

anos, está treinando com as Lady’s des-de 2011 e disse que começou com muito medo de subir nos patins. Hoje, já tem o hóquei correndo nas veias. Em conta-to com a reportagem da Revista Ação, a atleta mostra uma grande marca roxa no antebraço direito. Sinal da força e dispu-ta do esporte. “Isso já é normal pra mim. Antes, achava que não ia conseguir e hoje jogo como se sempre tivesse jogado. Não sofri preconceito e meus pais sempre me apoiaram”. A jogadora ainda conta que, no início dos treinos, as companheiras de time tinham que ajudá-la no equilíbrio. “Era en-graçado”.

Bode expiatório

Sim, esse é o termo usado por Laví-nia Alves de Freitas, 13 anos, para definir qual a sensação de ser a atleta mais nova da equipe. “Elas pegam muito no meu pé. Tudo que precisa ser feito, elas vêm falar comigo”, reclama, em tom descontraído, a atacante. “Mas é gostoso. Me sinto em fa-mília com o time. Meus amigos me acham louca, mas meus pais sempre me apoiam. Estou feliz e isso é o que importa”.

Mamãe da defesaCom 28 anos de idade e sendo uma

das fundadoras das Lady’s Spiders, Adria-na Mara é a mais velha das atletas do time de hóquei feminino de Sertãozinho. Ou melhor, a mais experiente, como a pró-pria Adriana sugere, em tom de brinca-deira, para a reportagem.

Além de treinar três dias por sema-na, ela tem dois empregos e uma casa pra cuidar, já que também é casada. “Meu

Hóquei tradicionaltrouxe reconhecimento mundial a Sertãozinho

Sertãozinho já tem uma fama no hóquei tradi-cional. Pelo grande sucesso na década de 1980, a terra da cana-de-açúcar também passou a ser cha-mada de “Capital Nacional do Hóquei”.

O esporte começou a ser praticado na cidade graças à insistência de Haroldo Pérsio Requena, um apaixonado pelo hóquei tradicional. Com essa novidade na cidade, surgiu o ginásio de esportes Pedro Ferreira dos Reis, o Docão.

Atualmente, a equipe do Sertãozinho Hóquei Clube conta com 20 conquistas nacionais, 21 es-taduais, três sul-americanos e um mundialito de clubes. É o quarto time mais vitorioso do mundo e o primeiro das Américas.

Diferenças com o in line

O hóquei tradicional utiliza os patins com dois pares de rodinhas paralelas, luvas e joelheiras. Já no in line, são quatro rodinhas em linha, além de caneleira e joelheira, “fraldão”, cotoveleira, peitoral, luvas e capacete. Enquanto o tradicional é jogado com um stick e uma bolinha, o in line usa um stick maior e um disco, conhecido por puck.

Confira todas as conquistas do Sertãozinho Hóquei Clube:

Mundial Interclubes: 1985Campeonato Sul-Americano: 3 vezes (1982, 1985 e 1991)Campeonato Brasileiro: 20 vezes (1985, 1986, 1987, 1989, 1990, 1991, 1992, 1995, 1996, 1999, 2001, 2003, 2004, 2005, 2006, 2007, 2008, 2009 e 2012)Campeonato Paulista: 21 vezes (1980, 1984, 1985, 1986, 1987, 1989, 1990, 1991, 1992, 1993, 1997, 1998, 1999, 2000, 2001, 2002, 2003, 2007, 2008, 2010 e 2011)Taça São Paulo: 12 vezes (1982, 1983, 1985, 1986, 1988, 1989, 1990, 1991, 1992, 1993, 1995 e 2001)

Outros Torneios:

Torneio Rio-São Paulo: 1996Torneio Início: 4 vezes (1980, 1983, 1984 e 1994)Torneio de Catanduva: 1981Torneio de Recife: 2 vezes (1982 e 1989)Torneio de Santos: 5 vezes (1982, 1985, 2000, 2006 e 2007)Troféu Nilson Costa: 1985Torneio em Portugal: 1985Torneio na Suíça: 1985Troféu Imprensa: 1987Troféu Nilson Costa: 1992Torneio da Portuguesa: 2002 Torneio de São Paulo: 2008

O jogador Emmenrich Souza, que também é treinador da equipe feminina de in line

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marido me apoia. Aos sábados, eu trei-no e ele vai jogar bola, sem crise. Sem-pre que dá, ele viaja para acompanhar os campeonatos comigo. Isso me dá muita força pra continuar. Amo o hóquei e esse amor não me deixa cansar”.

Adriana lembra que ganhou um ape-lido das outras jogadoras: mãe. “Mãe?”, questiono. “Sim, mãe”, sorri com brilho nos olhos. A defensora fica emocionada com esse carinho das atletas. “Sou mãe mesmo. Cobro, converso, reclamo e brin-co com elas. Convivo bastante com mi-nhas ‘filhinhas’. Muitas vezes, já conversei com as mães das atletas para saber como elas estavam na escola e em casa. É um ambiente agradável, que reflete em qua-dra. Ensino e aprendo muito com elas”.

Fala aí, professor!E se imagine agora, caro leitor, um

homem para cuidar de catorze garotas com média de idade de 20 anos. Ima-ginou? Cada uma com seus problemas pessoais, amorosos, sentimentais, pro-fissionais e, ainda se não bastasse, tem-

peramentos diferentes. Isso sem contar que as meninas ainda sofrem da temida e odiada TPM (tensão pré-menstrual).

Colocá-las para jogar, então, é uma missão e tanto. Não é? O técnico das Lady’s Spiders sentiu isso na pele desde o começo do time. “Nos primeiros me-ses, foi difícil. Hoje, já conheço todas e, pelo olhar, sei como está o dia de cada uma”, diz o sertanezino Emmenrich Souza.

O treinador é jogador, capitão e téc-nico dos Spiders, o time masculino de Sertãozinho. Também atua na Seleção Brasileira. Segundo ele, foi uma experi-ência nova assumir a equipe feminina. “O hóquei é um esporte diferente. Ele é dinâmico e exige um pensamento rápido, além do forte contato entre os atletas. As meninas me surpreendem cada dia. Dei-xam o sentimento de lado e em quadra jogam com a razão”.

VaidadeE como a reportagem aborda as mu-

lheres, não poderia ficar de lado o assun-

to vaidade. Algumas chegam meia hora antes dos treinos para começar a arruma-ção. Prendem o cabelo, passam maquia-gem, olham no espelho. Desprendem o cabelo, repassam a maquiagem e voltam a olhar no espelho. “Era muito vaidosa quando jogava. Fazia a unha antes dos jogos e prendia o cabelo com tranças”, revela Tamiris Dinamarco. “Não jogo sem passar uma maquiagem básica”, afirma Adriana Mara, a mãe da turma.

Mas Emmenrich, às vezes, dá umas broncas por isso. “Sempre falo pra elas que, fora das quadras, antes de serem atle-tas, elas são mulheres e não podem per-der isso. Mas, na quadra, precisam ser só atletas. A maquiagem escorre com o suor, pode entrar no olho e comprometer o re-sultado. Hoje, elas entendem mais isso”.

É dessa maneira, às vezes mulheres, às vezes atletas, que as Lady’s vão su-perando as dificuldades, como falta de patrocínio e reconhecimento. Mostram que na terra da cana e do outro hóquei, o sobre patins, também há lugar para o charme do in line.

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Em quadra, as charmosas mulhe-res se transformam em atletas. A vaidade, nesse momento, fica fora das quatro linhas

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Ginástica Olímpica

Em busca de equilíbrio

O Centro Esportivo da Cava do Bosque, que já for-mou atletas olímpicos, como Laís Souza, perdeu o foco e, devido às condições do local, terá que fazer muita ginástica para conseguir montar novamente equipes competitivas

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Em quadra, as charmosas mulheres se transformam em atletas. A vaidade, nesse momento, fica fora das quatro linhas

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MARCELA GARRIDO

A Cava do Bosque de Ribeirão Preto existe desde 1952. O poliesportivo foi

construído no mandato do prefeito Alfre-do Condeixa Filho, com o objetivo de se-diar a 17ª edição dos Jogos Abertos do In-terior, que, naquele ano, foi realizada na cidade. Em 1988, passou por reformas e ampliações e recebeu o nome do jornalis-ta esportivo Gavinos Virdes, falecido em 1965. Depois dessas obras, o conjunto poliesportivo e suas instalações passaram a ser utilizadas para a iniciação profissio-nal de atletas, vindos de escolinhas e de equipes de treinamento de alto nível.

Hoje em dia, no entanto, não é mais um centro de formação. A Cava ganhou cara de área de lazer. A população utiliza o espaço para diversão, o que contribui para o desgaste e quebra de equipamen-tos, deixando os atletas com cada vez me-nos condições de treino.

Nicéia Regina Fernandes da Silva, professora de Ginástica Olímpica, que treina as meninas da Cava, afirma com-preender os motivos que levaram o giná-sio a acolher quem busca apenas lazer, já que a prefeitura não consegue investir para profissionalizar todas as modalida-des praticadas no local. Ela acredita que, se a busca de apoio financeiro fosse feita pela Secretaria de Esportes e não pelos professores, como ocorre atualmente, as empresas se interessariam mais em pa-trocinar. Além de correr atrás de recur-sos, os professores precisam se desdobrar para dar conta das aulas e dos problemas de estrutura.

Observando o espaço físico dedicado à Ginástica Olímpica, percebe-se que tem potencial, mas que precisa de uma refor-ma com urgência. As meninas treinam num solo inadequado, o mesmo utiliza-do pelos atletas do judô e que não auxilia no impulso, prejudicando os saltos e aca-bando com as chances de caprichar nos treinos. Na preparação para as competi-ções, as séries de exercícios precisam ser separadas em duas: primeiro, coreografia no solo; depois, saltos no colchão. Isso compromete o resultado. Como nunca treinaram a sequência completa e têm pouco tempo, durante os campeonatos, para reconhecer os aparelhos, as ginastas ficam inseguras e, em alguns casos, che-gam a esquecer a série.

A cama elástica também oferece ris-

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Com ajuda de professora, aluna aprende técnicas de equilíbrio

Alunas treinam nas passarelas orientadas pela professora Nicéia (à esq.)

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cos. Não possui o fosso, um buraco re-vestido de carpete e cheio de espuma, o que daria segurança em caso de queda e permitiria às atletas fazerem saltos mais altos, com um nível de dificuldade maior.

O ginásio carece, também, de au-mentar o número de trampolins e man-ter a qualidade dos aparelhos. Muitos são até novos, mas com aparência de velhos e

inferiores aos antigos. Conversar com as atletas é ouvir uma repetição de queixas. Nem bem começam o treino e reclamam de dores, devido às condições estruturais. E confessam que só estão na Cava por amor ao esporte e falta de outras opções.

TalentosA professora Nicéia deseja que o es-

paço retome seu foco e passe a ser, de fato, um centro de formação, capaz de acolher e treinar com excelência futuros atletas olímpicos. Ela sugere a criação de polos esportivos nos bairros, onde os que se destaquem sejam encaminha-dos à Cava, para que possam aperfeiçoar suas habilidades. A iniciativa estimularia crianças e jovens a se tornarem atletas

Vista panorâmica mostra problemas na estrutura da Cava do Bosque, como no solo do ginásio

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Laís começou em Ribeirão

Foi no ginásio da Cava do Bosque que Laís Souza, hoje com 24 anos, começou sua carreira, no início da década de 90. Quando completou 16 anos, passou a treinar em Curitiba, no mais mo-derno centro de treinamento olímpico de ginástica do país. Chegou à Seleção Brasileira e integrou os grupos que participaram das Olimpíadas de 2004 e 2008. Só ficou fora dos Jogos de Londres-2012 por causa de uma fratura sofrida numa das mãos, du-rante um treino. Em toda a carreira, foram várias lesões, que resultaram em dez cirurgias.

Laís é uma inspiração para as meninas da nova geração de ginastas de Ribeirão Preto, que sonham se tornar atletas de alto nível técnico. Para que isso seja possível, esperam que as melhorias prometidas para a Cava do Bosque sejam cumpridas logo.

profissionais, como Laís Sousa, a jovem ribeirãopretana que começou no esporte aos quatro anos e chegou à equipe brasi-leira que disputou os Jogos Olímpicos de 2004, em Atenas, na Grécia, e os de 2008, em Pequim, na China.

Uma promessa da Ginástica Olímpica de Ribeirão Preto é, segundo Nicéia, Tha-ís Fidélis dos Santos, hoje com 15 anos e que está sendo preparada para se destacar nos Jogos Olímpicos de 2020. A adoles-cente foi revelada na Cava e levada por Roger Medina, ex-treinador da Seleção Brasileira Infantil, para treinar na equipe do Grêmio, em Barueri, Grande São Pau-lo. O talento da menina foi descoberto e desenvolvido pela própria Nicéia, que, por reconhecer os problemas em Ribeirão Preto, indicou a jovem ao ex-treinador da seleção.

A professora e as ginastas têm espe-rança de que, com a saída do judô e de ou-tras lutas para um novo centro esportivo próprio, o Centro de Excelência de Judô, que está em obras, o espaço da Cava seja direcionado à Ginástica Olímpica.

A reportagem da Revista Ação procu-rou o secretário municipal de esportes, Marcelo Palinkas, que, em entrevista por telefone, não descartou as reformas. Ele disse que está buscando em Brasília apoio para a instalação de Centro de Ini-ciação Esportiva (CIE), que atenderia as modalidades olímpicas e paraolímpicas na cidade. Afirmou, também, que solici-tou uma lista com pedidos de melhorias para as modalidades disponíveis na Cava, pois existe uma verba destinada a isso.

Segundo ele, faz parte dos planos criar polos nos bairros, conforme solici-tado pela professora Nicéia, para que as crianças que despontem sejam encami-nhadas à Cava. Quanto aos patrocínios, entende que não é obrigação do secre-tário, nem da Secretaria de Esportes, buscá-los. Para ele, as empresas estão abertas para apoiar, mas é necessário que os professores de cada modalidade façam um projeto esportivo e protocolem no Ministério dos Esportes, para que os empresários avaliem a possibilidade de investimento.

Sobre a situação estrutural da Cava do Bosque, ele disse ter notado que o local realmente virou área de lazer, mas que as providências tomadas irão trans-formá-la novamente em centro de inicia-ção esportiva.

Laís Souza participou de duas Olímpiadas com a Seleção Brasileira

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Capoeira Regional

O legado de Bimba

Núcleo cultural fundado pelo filho do criador da capoeira regional, e que tem uma unidade em Ri-beirão Preto, busca acolher jovens da periferia e preservar uma prática que mistura esporte tradi-cional com raízes baianas

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FERNANDA LAURENTI

Quem chega ao Núcleo Filhos de Bim-ba, no bairro Dom Mielle, Zona Nor-

te de Ribeirão Preto, buscando a prática da capoeira, talvez não imagine que a instituição nasceu de uma história que atravessou o século XX. Bimba é o nome de um mestre do folclore brasileiro que deixou uma herança rica. A começar pelo filho dele, Nenel, fundador do nú-cleo, que tem unidades espalhadas por várias cidades brasileiras e no exterior e que busca manter viva a memória do pai. Para essa missão, ele conta, em Ribeirão, com a ajuda de dois professores, um es-pecializado e um estagiário, além de uma coordenadora.

Por tradição, todos os participantes do grupo recebem apelidos. Nenel é um exemplo. Já o professor especializado é conhecido como Mascote. O estagiário é Testa. E a coordenadora, mulher de Tes-ta, é carinhosamente chamada de Preta.

Até isso foi legado de Mestre Bimba, cujo nome era Manoel dos Reis Machado. Mas foi o apelido que deu a esse respei-tado personagem o poder de mudar va-lores culturais e criar um novo estilo de luta, baseada em movimentos de ataque e defesa e com acompanhamento musi-cal. A criatividade e o talento dele, que até hoje é visto como um exímio lutador e educador, fez com a capoeira deixasse de ser encarada apenas como uma prática marginal.

Não que a capoeira não existisse an-tes. Mas, pelas mãos de Bimba, que nas-ceu em 23 de novembro de 1900 em Sal-vador, Bahia, e morreu em Goiânia, em 5 de fevereiro de 1974, foi reinventada. O Mestre uniu a versão tradicional com golpes de artes marciais, como o batu-que, uma antiga luta praticada por seu pai. Essa mistura resultou na capoeira regional – ou Luta Regional Baiana, em referência ao estado em que nasceu –, o legado deixado aos frequentadores dos Filhos de Bimba.

O esporte praticado no núcleo é um processo dinâmico coreográfico, desen-volvido com a participação de dois par-ceiros. Caracteriza-se pela associação de movimentos rituais, executados em sintonia com um ritmo denominado de ijexá, regido pelo toque do berim-bau. Simula intenções de ataque, defesa e esquiva, ao mesmo tempo em que os

participantes exibem habilidade, força e autoconfiança.

Fábio Zanon, o professor estagiário Testa, é supervisionado por Mascote, que, por sua vez, responde ao fundador, Nenel. Testa é responsável pelo núcleo há cinco anos e diz que o importante é desenvolver caráter, cidadania, disciplina dos alunos, buscando “formar cidadãos de bem. A intenção é fazer da capoeira uma ferramenta de educação”. Ele afir-ma, ainda, que o esforço da esposa, Ro-nilda, a Preta, é fundamental para que as atividades ocorram. “Sem a ajuda dela, nada disso seria possível”.

Explica, ainda, que outro objetivo da

instituição é voltado para o resgate, a ma-nutenção e a perpetuação do legado de Mestre Bimba. O grupo não participa de campeonatos, nos quais, segundo seus responsáveis, existe um sistema contro-lador de pontuação que não está de acor-do com os fundamentos do núcleo. No entanto, existem avaliações internas do desenvolvimento de cada aluno.

Para se inscrever nas aulas, é cobrada uma taxa de contribuição, no valor men-sal de R$ 25,00. Os interessados apren-dem desde os princípios da capoeira, passando pelas origens africanas, signifi-cados religiosos e possíveis benefícios do esporte para a saúde.

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O professor estagiário Testa (Fábio Zanon) com a esposa Preta (Ronilda), que é a coordenadora do núcleo

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Participação é frequente

O núcleo faz parte do IMEC (Instituição Mas-cote de Educação e Cultura), que visa à preserva-ção de manifestações culturais de raízes africanas e brasileiras. Preta afirma que os alunos que frequen-tam as atividades são assíduos. “Tem 20 pessoas participando das aulas. A grande maioria é de classe média baixa. Por isso, o núcleo oferece bolsas para integrantes que não têm condição de colaborar com a taxa mensal”. Ela reforça a ideia de que a instituição tem como prioridade a integração social de jovens da periferia, tirando-os da rua para apren-der com o esporte.

Marcos, capoeirista há 15 anos, conta que par-ticipou de vários projetos de capoeira, mas se sen-tiu acolhido nos Filhos de Bimba. “O fato de não disputar campeonatos fora não é um problema. As crianças se sentem motivadas a participar das aulas pelo bem-estar, energia envolvida, saúde que a prá-tica oferece, exercício mental e educacional”.tica oferece, exercício mental e educacional”.

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Mestre Bimba, o criador da capoeira regional, que mistura o esporte tradicional com outras modalidades

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o Grêmio, na época, só aceitar alemães. Não é à toa que o mascote do Inter é o saci, esse personagem tão brasileiro, pra mostrar que qualquer um poderia ser aceito. O escritor Luís Fernando Verís-simo é colorado porque cresceu durante a Segunda Guerra Mundial. E, como o Grêmio era o clube dos alemães, preferiu o Inter.

Quem assistiu ao filme “Boleiros”, de Ugo Giorgetti, sentiu o gostinho do que o futebol significa para os paulista-nos. Aliás, um dos motivos de eu querer ser jornalista é a cena da repórter no hall do hotel em que o Palmeiras estaria hos-pedado, na manhã do clássico como o Corinthians, para conseguir entrevistas com os atletas.

É emocionante descer do Ônibus na rua Clélia, com o tráfego parado, e ir caminhando até a Rua Turiassu. Isso parando antes em uma barraca de per-nil, entrar no Palestra Itália e passear por suas alamedas antes dos jogos. Imagino que um corintiano sente o mesmo se reunindo com outros torcedores na Pra-ça Charles Muller, um santista saindo da praia e indo pra Vila Belmiro e um são-paulino na Avenida Giovane Gronchi, pertinho do Palácio dos Bandeirantes, sede do Governo do Estado de São Paulo. Quantas histórias não têm aí?

Futebol entretenimento foi algo in-ventado pelos europeus para vender a marca de seus clubes na Ásia, principal-mente na China, Coreia do Sul e Japão, onde seus adolescentes reverenciam ho-logramas como artistas.

As emissora de televisão da nossa região, EPTV, TV Clube, Record...

desrespeitam o povo, principalmente os amantes do futebol, quando tratam esse esporte como entretenimento, quando falam apenas o resultado das partidas. Futebol é expressão cultural, não é briga, não é qualquer brincadeira.

Copiar o estilo de apresentação do Globo Esporte SP, feita por Tiago Leifert, é um tapa no rosto de botafoguenses, co-mercialinos, sertanezinos, jaboticabalen-ses... Tal apresentador teve sua visão de jornalismo moldada nos Estados Unidos, onde tudo é motivo para show e ganhar dinheiro. Quem conhece nossas praças esportivas sabe que nossa realidade é di-ferente.

Então, vão falar: “Ah, mas no resto do mundo é igual!”. Não, não é igual. Na argentina, o Boca Juniors represen-ta os habitantes de um bairro portuário de Buenos Aires. Tanto que suas cores são amarelo e azul, pois seus fundadores falaram que iam adotar as cores da ban-deira do primeiro navio que atracasse no cais, no caso uma embarcação sueca. Seus torcedores são conhecidos como “Los Bosteros”, porque seu estádio, La Bombonera, foi construído sobre um

Leonardo Santos, estudante de jornalismo

Jornalismo esportivo não é palhaçada

lugar onde era costume jogar os excre-mentos dos animais. O maior rival do Boca, o River Plate, é conhecido como “Millionarios”, porque, na época de sua fundação, representava a elite da capital argentina.

Um dos mais acirrados clássicos do planeta, Celtic contra Rangers, ambos escoceses, não representa apenas dois times, mas duas ideologias. Quem torce pelo Celtic é católico e defende a indepen-dência de seu país ante o Reino Unido. Já torcedores do Rangers são protestan-tes anglicanos e preferem permanecer na Commonwealth.

Na Espanha, é de praxe dizer que o Barcelona é a cara da Catalunha. Isso porque durante o período da ditadura de Franco, entre as décadas de 1930 a 1970, o clube traduziu no esporte a sua oposição ao regime, ao contrário do Espanyol, que, durante o período, chamava-se Espanhol, em apoio ao ditador. Essa época foi a mes-ma em que o Real Madrid cresceu, pois era a equipe preferida do general. Ainda na Península Ibérica, há o Athletic Bilbao, o clube identidade do País Basco, onde fica a cidade de Guernica, destruída pela dita-dura franquista e que depois foi retratada por Pablo Picasso em uma de suas obras mais célebres. A instituição só aceita atle-tas bascos, pois acredita representar a re-gião. Pode parecer xenofobia, mas não é. É expressão cultural.

No Brasil, temos também um exem-plo grandioso, Grêmio e Internacional. O colorado foi fundado por italianos, que não eram aceitos no Tricolor, pelo fato de

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Rúgbi

As aparênciasenganam

O rúgbi é considerado irmão do futebol, mas, bem diferente do esporte das multidões, sofre com falta de apoio e só sobrevive graças a al-guns apaixonados pela modalidade, como um grupo de Sertãozinho

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Artur Reis, o Tuti (à esq.), aquecendo para o treino

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Embora o rúgbi seja um dos esportes mais difundidos no planeta, ainda é

pouco praticado no Brasil. Mas tenta se desenvolver. A seleção nacional, chamada de Tupis, integra o sul-americano “Con-sur A”, que acolhe os principais times da região, entre eles argentinos, chilenos e uruguaios. Quem vence essa competição tem direito de disputar a vaga do con-tinente americano na Copa do Mundo, que terá sua próxima edição em 2015, na Inglaterra. A Argentina, conhecida como Pumas, já está classificada pelo desempe-nho no último torneio, em 2011, quando chegou às quartas-de-final, perdendo ape-nas para a Nova Zelândia, a equipe mais forte do mundo na modalidade.

Em Sertãozinho, interior de São Paulo, um grupo de 25 pessoas se reú-ne, nas tardes de domingo, para treinar na Escola Municipal Aparecida Ortolan Bellini. São os Gargula’s Rugby Union. O presidente, que também é técnico e jogador, é Fernando Pugliesi, conheci-do como Macaco. Ele começou a jogar rúgbi por influência de um irmão, que conheceu o esporte quando estudava na Universidade Estadual Paulista (Unesp), em Bauru.

No começo, em Ribeirão Preto, Ma-caco treinava com a equipe da Faculdade de Medicina da USP (FMRP). A disputa de competições, porém, era restrita aos estu-dantes e ele não podia participar. Depois, quando iniciou o curso de Educação Físi-ca numa faculdade privada, formou uma equipe com alguns colegas de curso, que não durou muito tempo. Foram proibidos de treinar no campo da instituição, com a justificativa de que estragavam o gramado.

Foi então que, em 2007, chegou a Sertãozinho o neozelandês Joseph Harris, o Joey, que veio por meio de intercâmbio estudantil e reuniu alguns adolescentes para apresentar o esporte. “Originalmen-te, eu apitava as partidas para meus ami-gos. Depois, quando vi que já conheciam bem as regras, comecei a jogar com eles”, afirma Harris.

Entre os garotos que ele treinava es-tava Artur Reis, o Tuti, que já acompa-nhava o esporte pela televisão, mas não entendia muito as regras. Só foi com-preender quando Harris o chamou para jogar e aprender os fundamentos básicos.

Por meio desses amigos para o qual

apitava as partidas, Harris também foi apresentado a Pugliesi, que vivia comen-tando com as pessoas sobre qual era seu esporte favorito. Neste momento e a par-tir desse encontro, surgiram os Gárgu-la’s, pois Macaco se ofereceu para ajudar a treinar a equipe.

Mas para conseguir um campo foi muito difícil. E ainda é: “Até hoje, treina-mos às 14 horas, um horário ruim, já que durante o dia tem vários jogos de futebol amador. Só sobra este horário para nós”, diz Pugliesi. De início, tiveram apoio da

prefeitura, que acabou quando mudou a gestão. Foram treinar em terrenos bal-dios e no Parque Ecológico Gustavo Si-mioni, antes de chegarem ao local atual.

Os pais de Fernando e de Tuti co-brem os gastos da equipe, comprando uniformes, fornecendo alimentação e transporte para os campeonatos, já que alguns atletas não têm condições financeiras para adquirir equipamentos e pagar a inscrição nas competições. O pai de Artur, Sheldon Reis, comercian-te na cidade, se define como patrocina-

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De pé, o presidente, Fernando Pugliesi, conhecido como Macaco

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dor do time e do filho: “’Paitrocínio’, como dizem. Ajudo no que posso. Você sabe como são os esportes amadores no Brasil? Se não ajudarmos, a coisa não anda”.

Três modalidades se destacamO rúgbi é considerado um esporte ir-

mão do futebol, afinal, até 1863, não havia separação entre os dois e as partidas eram jogadas com regras escolhidas antes de cada disputa. Hoje, o rúgbi é o segundo es-porte mais praticado no planeta, perdendo justamente para o irmão. E seu Mundial é o terceiro evento mais acompanhado pela televisão, atrás dos Jogos Olímpicos de Ve-rão e da Copa do Mundo Fifa.

O rúgbi tem três modalidades princi-pais. O Union, a mais antiga, necessita de 15 atletas em cada equipe e se manteve amador até 1995. O Mundial mais famo-

so do esporte é dessa modalidade. Em 2011, a audiência da final da competição foi de mais de quatro bilhões de especta-dores. Seu atual campeão é a Nova Ze-lândia, equipe conhecida por All Blacks, que venceu a França por 8 a 7 na decisão.

O League é outra modalidade, a mais praticada na Austrália. Para jogar, cada equi-pe deve ter 13 atletas. Originou-se em 1895, com o rompimento com a International Rugby Board. Foi quem primeiro adotou o profissionalismo, no ano de fundação.

E, por fim, o Rugby Seven, que tem sete participantes por time e estará pre-sente nas Olimpíadas de 2016. Será a volta do esporte aos jogos, que está fora desde 1924, ano em que a equipe dos Estados Unidos foi campeã. A disputa olímpica será nesta modalidade por ser uma prática que permite aos atletas uma recuperação física mais rápida, já que as

competições têm de acontecer em um período curto, de apenas duas semanas.

O Gargula’s é um time da modalidade Union, com 15 jogadores por time, mas que tem jogado o Rugby Sevens. Macaco prefere o tradicional, o Union, que, pelo fato de ter sido amador por muito tempo, preservou a essência e seus valores. Mas ele diz gostar muito também do formato compacto.

Acredita que, com a volta do esporte às Olimpíadas, as coisas já começaram a mudar para melhor, mas, para o esporte crescer no Brasil, necessita, também, de uma maior conscientização das pessoas e dos professores de Educação Física, para que não sejam ensinados nas escolas so-mente os tradicionais futsal e vôlei. Ape-sar dos obstáculos, ele planeja iniciar, em breve, um projeto social para crianças e adolescentes, entre nove e 16 anos.

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Os Gargula’s se aquecem para o treino puxado do domingo

Um gárgula aguarda a execução do hino nacional antes de um jogo

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Com a proximidade da Copa do Mun-do no Brasil, o futebol, esporte que

domina as coberturas esportivas no país, ganha ainda mais força. Existe, no en-tanto, uma faceta do mundo da bola que é pouco explorada, apesar de espalhada pelos campos: o futebol das peladas de periferia. Aquelas em que a bola é qua-se oval, desgastada pelos chutes e pelo tempo, em que as traves são de bambus, a rede, rasgada, só recobre uma parte do fundo do gol, e praticamente não há pú-blico. Quando ele aparece, é composto pela vizinhança. Gente que compartilha dos sonhos de muitos desses meninos que, ao correr atrás da bola, correm tam-

bém atrás do sonho de uma vida melhor para a família.

Foi esse universo esquecido pela grande mídia que chamou a atenção do fotógrafo Fábio Melo, de Ribeirão Preto. Desde 1999 trabalhando em jor-nais, ele decidiu tocar, como projeto paralelo, algo que não vinha para as páginas dos periódicos: o futebol dos campinhos surrados da periferia. Per-correu vários bairros da cidade onde mora para registrar a simplicidade do jogo em meio ao barro, praticado por jovens descalços. O trabalho de pes-quisa e campo, que você nessas pági-nas, durou três meses.

OutroOlhar

Ensaio fotográficoFábio Melo

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Jiu-Jitsu

O oponente é forte

Mas, na maioria das vezes, a luta mais difícil não está no tatame. A expansão do jiu-jitsu como sinônimo de disciplina, respeito e autoconhecimento bate de frente com a falta de divulgação, incentivo e oportunidade.

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Bem longe do berço do jiu-jitsu, Ri-beirão Preto abriga 20 escolas que

ensinam artes marciais. A cidade recebe, todo mês, vários campeonatos pequenos. Sem cobertura da mídia tradicional, as competições são realizadas, normalmen-te, nos próprios locais de treinamento, fi-nanciadas pelos próprios alunos e acade-mias. Quando há algum evento de maior expressão, um ginásio do poliesportivo Cava do Bosque é liberado pela prefeitu-ra. A divulgação é feita apenas entre os praticantes, por meio de panfletos ou pela internet.

O único patrocínio de iniciativa pri-vada que chega a Ribeirão é da empresa de artigos esportivos Kamikaze Sports, promotora de campeonatos que têm re-velado grandes talentos em todo o país. Em junho de 2012, Ribeirão sediou a Copa Enaf Kamikaze Sports de Jiu-Jitsu, realizada no Centro de Eventos Pereira Alvim e que contou com a participação de atletas de todo o Brasil.

Em outras artes marciais, eventos importantes têm sido realizados em Ri-beirão. A falta de apoio ainda é, como na maioria dos esportes, um entrave para a expansão. Atualmente, apenas escolas particulares incluem modalidades do tipo em seu currículo. Para a maioria dos in-teressados, é preciso se matricular em academias especializadas.

Essa dificuldade de acesso impede o desenvolvimento de habilidades. Grandes mestres do jiu-jitsu, como Helio Gracie e

Flavio Behring, afirmam que a prática do esporte não se limita ao aprendizado de de-fesa pessoal. Proporciona, também, auto-confiança para enfrentar as adversidades do cotidiano. A disciplina e o respeito aprendi-dos são capazes de transformar consciên-cias, atitudes e, portanto, a realidade.

Eder Calixto pratica jiu-jitsu há seis anos e, há dois, virou professor. Segun-do ele, o esporte é indicado para todas as idades, pois faz bem, não só para o corpo, mas também para a mente. “Pratiquei outras lutas antes, mas foi no jiu-jitsu que me encontrei”.

O calor tropical da cidade não impe-de o treinamento. A determinação, tipi-camente oriental, é um dos fundamen-tos que os alunos de jiu-jitsu precisam aprender. Além dela, calma, honestidade e respeito ao adversário são requisitos básicos quando se está lutando. Mas, segundo os alunos do professor Calixto, é impossível não levar isso para a vida. Todos concordam que não há como agir diferente dentro e fora do tatame.

O aluno Cícero Alves conta o que mais surpreendeu nas aulas: “O professor pediu que eu tentasse imobilizá-lo en-quanto ele usava apenas uma das mãos. Achei que seria fácil, mas me enganei. Com apenas uma mão, ele conseguiu me vencer, porque no jiu-jitsu o que conta não é a força, mas a inteligência e a habi-lidade. Você tem que usar a força do seu adversário contra ele.”

Jiu-Jitsu e Brasil, inseparáveisA história do surgimento do jiu-jit-

su, ou “arte suave”, é rodeada por mi-tos. A versão mais aceita é que a arte marcial tenha surgido na Índia por volta do século IV a.C., nos mosteiros budistas. Os monges afastados da civili-zação precisavam aprender técnicas de autodefesa.

Movidos pela necessidade, criaram essa arte marcial que utiliza a força e o peso do adversário contra ele mesmo. Golpes e palavras ofensivas não são per-mitidos. É uma luta muito técnica. Os competidores ficam em contato constan-te com o tatame, o que elimina a vanta-gem da altura. Daí a razão de o esporte ter se popularizado no Japão e, de lá, para o mundo.

Devido à eficácia da luta, pessoas do mundo todo se interessaram em apren-dê-la. O governo japonês, temendo que o segredo do jiu-jitsu fosse espalhado, ordenou a criação de uma versão falsa da modalidade, que chamamos hoje de judô, para ser ensinado aos estrangeiros.

O Brasil tem importância fundamen-tal na existência e renovação do jiu-jit-su. Não fosse pelo encontro, no ano de 1917, em Belém do Pará, do professor e campeão mundial de jiu-jitsu, Konsei Maeda, com o jovem Carlos Gracie, essa arte marcial estaria, provavelmente, ex-tinta. Maeda passou a ensinar o verda-deiro jiu-jitsu naquela cidade, enquanto Gracie não apenas aprendeu a luta, mas aperfeiçoou, renovou e ensinou a seus ir-mãos. Assim, surgiu o respeitado jiu-jitsu brasileiro, que atrai admiradores de várias partes do mundo.

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Os alunos fazem pausas durante o treinamento... ...Mas a luta não para. Revezar o adversário é testar a si mesmo.

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BASQUETE SOBRE RODAS

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Prática começou como lazer em associação de Ribei-rão Preto, mas os resultados estimularam os atletas a montar uma equipe, que disputa o Campeonato Paulista, e levar os benefícios do esporte para hospi-tais e instituições de ensino

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Os basquetes são parecidos

As regras do basquete em cadeira de rodas são muito parecidas com as do jogo tradicional. Exis-tem pequenas alterações por causa da adaptação do atleta às cadeiras, da mecânica de locomoção e da necessidade de se jogar sentado.

Violações de percurso: As violações de per-curso acontecem quando o atleta excede a regra que permite impulsionar a cadeira duas vezes antes de driblar ou se livrar da bola, para passá-la ou arremessá-la. É similar ao “andar” no basquete tradicional.

Pé no chão: Se o jogador apoiar-se com os pés no chão, o ato é considerado infração.

Extensão do corpo: A cadeira de rodas é uma extensão do corpo do atleta. Se ela tocar a linha ou algum objeto que esteja fora da quadra, considera-se que o jogador saiu com a bola.

Cavar posse de bola: Ao contrário do basque-te tradicional, é proibido atirar a bola num oponen-te para que ela saia da quadra. Caso isso ocorra, o lateral será cobrado pela equipe adversária.

Faltas: O contato não acidental entre duas ca-deiras de rodas caracteriza falta pessoal. E a falta técnica é marcada quando o jogador eleva-se do assento, quando remove os pés do descanso ou quando usa qualquer outra parte do corpo que não seja as mãos para obter alguma vantagem.

PÂMELA MENDES

Marta Neves Dias tem 25 anos. Par-ticipa da Associação de Amigos

Deficientes de Ribeirão Preto (ADAD) há quatro meses. Cadeirante desde bebê, de-vido a uma paralisia infantil, trabalhava em casa e não praticava esportes. Esta-va entrando em depressão quando duas clientes a aconselharam a procurar na in-ternet alguma atividade para cadeirantes. Foi quando Marta descobriu a associação e uma modalidade diferente, que permite a inclusão: o basquete sobre cadeira de rodas. “Me sinto muito bem fazendo par-te desse projeto. A gente começa a gostar tanto do esporte quanto dos amigos que conhece.”

O basquete sobre rodas da ADAD co-meçou em 2010, a partir de portadores de necessidades especiais que praticavam o esporte apenas como lazer. Aos pou-cos, ganhou força a ideia de formar uma equipe, que representa Ribeirão Preto em várias competições. Atualmente, partici-pa da Segunda Divisão do Campeonato Paulista, da qual é vice-campeã da Série Bronze 2012.

Além de participar de torneios, o time também realiza visitas e apresentações em escolas, hospitais e universidades, para conscientizar a população das difi-culdades de viver como cadeirante, ensi-ná-la s a lidar com pessoas deficien-tes, falar sobre a história de cada um dos atletas e fazer demonstrações da habilida-de adquirida com o esporte adaptado.

A equipe coleciona diversas conquis-tas, mas não só de troféus e medalhas. Cada obstáculo ultrapassado no dia a dia, como o preconceito, é contabilizado como uma vitória. Ricardo dos Santos Custodio, de 37 anos, é um exemplo. Está na cadeira de rodas há 13 anos. Co-nheceu o basquete por meio de amigos. “A associação e o basquete me ajudaram muito, porque eu não tinha objetivos. Hoje, penso diferente e tenho como meta melhorar nosso basquete e poder dar mais apoio aos deficientes.”

O coordenador técnico da equipe, desde o início das atividades, é Jonathan Fernandes Carvalho. “Eu tenho muita alegria de fazer parte deste projeto. Estou apoiando uma causa que poucas pessoas desempenham. Por isso, sou voluntário de algo que precisa ter muito compro-misso”.

BenefíciosA prática de atividades físicas, tanto

para competições quanto para diversão, pode trazer benefícios motores para os portadores de necessidades especiais, como agilidade, equilíbrio, força muscu-lar, coordenação motora, resistência físi-ca, além de contribuir com os aparelhos circulatório, respiratório, digestor, repro-dutor e excretor. Também desenvolve,

segundo Carvalho, velocidade e ritmo, ajudando na reabilitação e nas atividades da vida diária.

Ele destaca, também, que ocorre uma melhora da autoestima, aumento da integração social e redução da agressivi-dade, além de estimular a autonomia e a capacidade de resolução de problemas e superar limitações e situações de frus-tração.

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Prática pode significar benefícios motores aos jogadores

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