Revista de Criminalística - Valoração de danos ambientais

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REVISTA BRASILEIRA DE CRIMINALÍSTICA, V. 1, N.1, 2011

A Revista Brasileira de Criminalística (RBC) surgiu do antigo anseio da comunidade de Peritos Criminais em ver a produção científica divulgada em revista especializada genuinamente brasileira.

Mais recentemente, um grande grupo de Peritos Criminais tem se reunido virtualmente em um grupo de discussões on-line. Nesse fórum, reacendeu a chama desse antigo desejo e Peritos de todos os recantos do Brasil se dispuseram a tirar a revista do campo das idéias e a materializar a Revista Brasileira de Criminalística.

A Associação Brasileira de Criminalística – ABC, cumprindo o seu papel de instituição de nível nacional, colheu a idéia e patrocinou toda a estrutura.

MISSÃOA Revista Brasileira de Criminalística destina-se a publicação de artigos originais que contribuam para a

promoção, a divulgação e o desenvolvimento científico e tecnológico das ciências forenses, referentes aos resultados de pesquisas, avanços, projetos técnico-científicos e relatos de caso relacionados à criminalística, incluindo as interfaces com outros ramos da ciência, como Física, Química, Biologia, Odontologia, Farmacologia, Informática, Contabilidade, Engenharias, entre outras.

Associação Brasileira de Criminalística Revista Brasileira de Criminalística. Vol. 1, n. 1 (2011) / Associação Brasileira de

Criminalística, Brasília: ABC, 2011-

Iv, 46p.:il..; 29,7cm. Editores: Ângela Tonietto; Bruno Telles; Charles Albert Andrade;

Claudemir Rodrigues Dias Filho; Elvis Medeiros de Aquino; Juliano de Andrade Gomes; Maria Paula O. Valadares

Periódico Científico, Associação Brasileira de Criminalística, 2011

1. Criminalística. 2. Medicina Legal. 3. Ciências Forenses. I. Tonietto, Ângela. II. Telles, Bruno. III. Andrade, Charles Albert. IV. Dias Filho, Claudemir Rodrigues. V. Aquino, Elvis Medeiros de. VI. Gomes, Juliano de Andrade. VII. Valadares, Maria Paula O.. VIII. ABC

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE CRIMINALÍSTICACentro Comercial Sudoeste, CLSW 504, Bl. B, Sl. 155Setor Sudoeste, Brasília - Distrito FederalCEP. 70.673-000

PRESIDENTEIremar Paulino da Silva (IC/DF)

CORPO EDITORIALÂngela Tonietto (IC/GO)Bruno Telles (IC/DF)Charles Albert Andrade (IC/DF)Claudemir Rodrigues Dias Filho (IC/SP)Elvis Medeiros de Aquino (IC/SP)Juliano de Andrade Gomes (IC/DF)Maria Paula O. Valadares (IC/SP)

PROJETO GRÁFICOCorpo editorial da RBC

EDITORAÇÃO E DIAGRAMAÇÃOCorpo editorial da RBC

A Revista Brasileira de Criminalística é uma publicação da ABC.• Os artigos publicados na Revista são de inteira responsabilidade dos autores.• Proibida a utilização para fins comerciais de matéria publicada.• Início de circulação: novembro de 2011.• Periodicidade: semestral.• Endereço eletrônico: http://www.rbc.org.br/ojs/• Revista Brasileira de Criminalística, v. 1, n. 1, 2011.

SuMáRIO

Editorial ........................................................................................................................................................................ 4

O nascimento da Revista Brasileira de Criminalística ..................................................................................... 5

Artigos Científicos ....................................................................................................................................................... 7

Incorporando graus de liberdade de rotação em modelo padrão de acidente de trânsito – modelo de espalhamento entre dois veículos

F.H.S.O. Vieira ...................................................................................................................................... 8

Avaliação comparativa de teste imunocromatográfico para identificação forense de sangue humanoP. Longo; C.R. Dias Filho; M.P.O. Valadares; E.C. Alonso; S.P.S. Gonçalves; E. Auler-Bittencourt ........................................................................................................................... 16

Espectroscopia Raman: um novo método analítico para investigação forense em cruzamento de traçosJ.A. Gomes; M.S. Sercheli ................................................................................................................... 22

Valoração de danos nos casos de mineração de ferro no BrasilA. Tonietto; J.J.M.C. Silva ................................................................................................................... 31

Efeito da escopolamina sobre o desenvolvimento de Chrysomya putoria (Diptera: Calliphoridae) e sua importância para a estimativa do intervalo pós-morte

P.J. Thyssen, M.D. Grella .................................................................................................................... 39

Resenhas .................................................................................................................................................................... 43

Perícias em locais de morte violentaE. Cunico ............................................................................................................................................. 44

Medicina legal e criminalísticaP.E.G. da Costa Filho .......................................................................................................................... 45

REVISTA BRASILEIRA DE CRIMINALÍSTICA, V. 1, N.1, 2011

EDITORIAL

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CORPO EDITORIAL DA RBC / REVISTA BRASILEIRA DE CRIMINALÍSTICA, V. 1, N.1, 5-6 (2011)

O nascimento da Revista Brasileira de CriminalísticaO argumento de que toda teoria científica é conjectural e provisória coloca em xeque a

idéia de que a indução observacionista e o empirismo clássico explicitam uma verdade científica absoluta e imutável. Esse pensamento, difundido na sociedade do século XX, alerta aqueles que lidam na interface entre as leis naturais e as leis dos homens, as leis jurídicas. Perito é o nome dado a este profissional que, etimologicamente, equivale a “aquele que sabe” e, por este motivo, ocupa um nicho importante no meio judicial: o de auxiliar o julgador, observando, reportando e analisando a materialidade à luz das ciências naturais. Em sendo a ciência dotada de verdades provisórias, que dizer do perito que não faz ciência? Do perito que permanece com aplicação de conceitos e teorias retrogradas? Que ainda usa da falácia do argumento de autoridade para justificar a aplicação de um conhecimento empírico às questões judiciais?

Quando exposto da forma supra, projetamos, por ânsia, tratar-se de um passado remoto, sem qualquer ligação concreta com o momento “CSI” do qual colhemos os frutos. Mas isso não é verdade nem na pátria-mãe do “CSI”. um relatório do National Academy of Sciences (academia nacional de ciências norte-americana) de 2009 reconheceu que muito das chamadas ciências forenses não é lastreado em ciência sólida, sem referências à minúcia de uma experimentação rigorosa. As conseqüências são evidentes: um serviço judicial prestado à sociedade eivado de vícios e baseado em provas materiais cujas análises são, no mínimo, questionáveis sob a óptica científica.

No Brasil, cada vez mais Peritos Criminais são importados das carreiras acadêmicas. Acostumados a buscar informações em periódicos científicos, o cientista, quando se veste de Perito Criminal procede da mesma maneira. Afinal, o problema é distinto, mas a ciência é a mesma. Tal procedimento se justifica não apenas pela lógica em racionalizar um problema, mas também pela aplicação de um dos Princípios da Criminalística Brasileira, o chamado Princípio da Análise, enunciado de maneira que “a análise pericial deve sempre seguir o método científico”. Carente de um repositório científico nacional, o perito brasileiro recorre a periódicos internacionais para dar suporte aos seus exames e as suas conclusões. O problema é que as particularidades nacionais, ou mesmo regionais, nem sempre convergem, e a aplicação de certos métodos descritos em outros países se torna controversa.

Deste contexto, nasce a Revista Brasileira de Criminalística (RBC): uma publicação periódica de um antigo anseio da comunidade de Peritos Criminais em ver a produção científica divulgada em revista especializada genuinamente brasileira. A RBC destina-se à publicação de artigos que contribuam para a promoção, a divulgação e o desenvolvimento científico e tecnológico das ciências forenses, referentes aos resultados de pesquisas, avanços, projetos técnico-científicos e relatos de caso relacionados à criminalística, incluindo as interfaces com outros ramos da ciência, como Física, Química, Biologia, Odontologia, Farmacologia, Informática, Contabilidade, Engenharias, entre outras.

A iniciativa, entretanto, explicita a dualidade da atividade pericial criminal nacional. Na prática, o perito ora é policial, ora é cientista, mas muitas vezes está mais próximo da polícia que da academia. Talvez por isso são pouco freqüentes as trocas de experiências e a difusão de métodos cientificamente validados na comunidade de Peritos Criminais brasileiros. A RBC também almeja mudar esse quadro. Não pode o perito deixar de lado a sua face científica, sem a qual perde robustez a prova material decorrente dos apontamentos periciais. Seus trabalhos científicos devem ser publicados e divulgados a uma comunidade científica que se empenhará em discuti-los tecnicamente. A RBC é a matriz nacional para tal.

Outra conseqüência dessa argumentação é que a publicação neste neonato periódico não deve se restringir a estudos de Perito Criminais. Acadêmicos interessados em questões relacionadas às ciências forenses também contribuem para o desenvolvimento científico da perícia brasileira e, portanto, são bem-vindos a submeter seus trabalhos.

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CORPO EDITORIAL DA RBC / REVISTA BRASILEIRA DE CRIMINALÍSTICA, V. 1, N.1, 5-6 (2011)

Com o apoio dos Peritos Criminais e da comunidade científica que orbita a criminalística, a RBC se consolidará como um repositório científico, de acesso gratuito a todos os interessados em ciências forenses no sítio da revista: www.rbc.org.br/ojs. Como tal, fomentará o fortalecimento da perícia brasileira, livre do empirismo clássico e independente de influências falaciosas.

Corpo Editorial da RBCÂngela Tonietto (IC/GO)Bruno Telles (IC/DF)Charles Albert Andrade (IC/DF)Claudemir Rodrigues Dias Filho (IC/SP)Elvis Medeiros (IC/SP)Juliano de Andrade Gomes (IC/DF)Maria Paula Oliveira Valadares (IC/SP)

ARTIGOS CIENTíFICOS

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F.H.S.O. VIEIRA / REVISTA BRASILEIRA DE CRIMINALÍSTICA, V. 1, N.1, 8-15 (2011)

Incorporando graus de liberdade de rotação em modelo padrão de acidente de trânsito – modelo de espalhamento entre dois veículos

F.H.S.O. Vieira *

Instituto de Criminalística, Superintendência da Polícia Técnico Científica do Estado de São Paulo, São Paulo (SP), Brasil*Endereço de e-mail para correspondência: [email protected].

Recebido em 16/04/2011; Revisado em 31/07/2011; Aceito em 19/08/2011

RESuMO

Neste trabalho é apresentado de modo detalhado um modelo simples onde é introduzido o grau de liberdade de rotação no espalhamento entre dois veículos, sendo o modelo padrão apresentado em detalhes na referência [3]. São adotadas aqui as mesmas aproximações não rigorosas quanto a dissipação de energia e de momento no vértice de interação entre os veículos, sendo este efeito desconsiderado. O objetivo principal é o estabelecimento de um modelo teórico com a incorporação de graus de liberdade de rotação, sem haver a pretensão da aplicação imediata dele em decorrência das limitações quanto à informação de parâmetros como o momento de inércia, por exemplo. É mostrado que a simples introdução da rotação acrescenta termos de contribuição nas velocidades iniciais dos veículos, porém uma discussão detalhada sobre este ganho é deixada para trabalho futuro. Tal modelo aqui apresentado encontra-se em monografia de formação de curso da ACADEPOL / São Paulo do ano de 2006 de autoria do presente.

Palavras-Chave: acidente, trânsito, rotações, física, modelo.

ABSTRACT

This paper presents in detail a simple model where rotational degree of freedom is introduced in the scattering of two vehicles, being the classical model presented in detail in reference [3]. It is adopted here the same non rigorous approximations in relation to energy dissipation and momentum in the vertex of interaction among two vehicles, being disregarded this effect. The main objective is to establish a theoretical model with rotational degrees of freedom incorporation, without having the intention of its immediately application due to limitations regardless to parameters information, such as inertia momentum, for example. It is shown that the simple introduction of rotation add terms of contribution on vehicles initial speeds, but a detailed discussion of this gain is left for a future work. The model presented here is part of author’s monograph in ACADEPOL Professional Course, São Paulo in 2006.

Keywords: accident, traffic, rotational, physics, model.

1. INTRODuÇÃO

Seria oportuno questionarmos se os modelos de pontos materiais usualmente empregados em cálculos de acidentes de trânsito corresponderiam ao caso geral da realidade. A resposta é negativa, pois tudo é feito idealizando os veículos como pontos materiais, sendo eles descritos apenas pelas suas coordenadas no plano cartesiano (x, y), e suas interações se resumindo a trocas de energia e momento linear entre si e o pavimento, o que acaba por esquecer que ambos os veículos são corpos materiais extensos e que, por isso, podem apresentar, além do movimento de translação no plano, os movimentos intrínsecos de rotações.

Tecnicamente, diz-se que a dinâmica completa do evento em duas dimensões requer dois graus de liberdade para descreverem a dinâmica do centro de massa de um dos veículos – coordenadas x e y – e um grau de liberdade para descrever as rotações em torno do centro de massa e do eixo perpendicular ao plano, passando por este ponto.

Cada grau de liberdade novo que é acrescido a um modelo representa uma liberdade a mais para o sistema trocar energia e momento com os demais graus de liberdade. Na situação colocada – de haver a possibilidade dos veículos girarem – por exemplo, existirá tanto o efeito de troca de parte da energia cinética translacional para energia cinética rotacional como também da transferência de parte do momento linear para o momento angular.

A desconsideração deste simples fato acarreta uma estimativa de velocidade inicial de colisão subestimada, privilegiando desnecessariamente os condutores, uma vez que o efeito pode ser acrescido – isso será mostrado paulatinamente.

2. CONSTRuINDO O MODELO

Assumindo que os dois veículos envolvidos no fenômeno sejam, em boa aproximação, corpos rígidos, ou seja, não sofrem deformações aparentes de grande monta com a colisão; a aproximação dos corpos leva ao contato físico entre eles, onde ocorre uma transferência

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F.H.S.O. VIEIRA / REVISTA BRASILEIRA DE CRIMINALÍSTICA, V. 1, N.1, 8-15 (2011)

de embates.Do modelo clássico [3], o cálculo do momento

linear de saída dos veículos da zona de interação é conhecido e pode ser a alternativa procurada. Pois caso seja possível a realização de um cálculo da fração absorvida do momento linear, pode-se reconstruir a soma vetorial e, assim, obter o momento linear total resultante na interação, recuperando a conservação do momento linear novamente.

De fato, algo do tipo pode ser feito; basta notar a íntima relação existente entre toda a energia dissipada na rotação do corpo através do atrito dos pneus com o pavimento e a energia de rotação presente no corpo.

A energia de rotação de um corpo é conhecida e dada por:

com I representando o momento de inércia. O momento angular escrito em função de é expresso como:

.

Sendo tão somente a porção absorvida para provocar rotação, o módulo do momento angular é, então, escrito como . Desse modo, assumindo que toda a energia de rotação adquirida pelo veículo no instante do embate tenha sido comunicada instantaneamente a ele, a expressão da energia será:

IsrE

2

22

=.

E dissipará completamente através do trabalho feito pela força de atrito do pavimento com os pneus.

O cálculo desta dissipação deve ser feito com certo cuidado e atenção, pois o movimento giratório é feito em torno do centro de massa e, no geral, este não se

de energia e momento linear. Contudo, como são corpos extensos, os momentos lineares comunicados num específico braço de alavanca, em relação ao centro de massa, é parcialmente “absorvido” em momento angular através da relação:

em que r representa o braço de alavanca e s a porção de momento linear absorvida durante a interação. Esta sistemática está ilustrada na Fig.(1).

Por conseqüência da transferência de parte do momento linear para o momento angular, a lei da conservação do momento linear não é mais verdadeira, ou seja, a soma dos momentos lineares do canal de saída não é igual à soma dos momentos lineares do canal de entrada, como mostra a equação:

um reflexo dessa diminuição de momento linear no sistema é a diminuição da abertura do ângulo do canal de saída, como está esquematizado na Fig.(1). Outro reflexo marcante é que, como os veículos adquirem momento angular e, portanto, rotação, eles estão com seu eixo antero-posterior desalinhado em relação à trajetória retilínea descrita pelo seu centro de massa, conforme ilustrado também pela Fig.(1).

Este último efeito torna-se bastante delicado do ponto de vista da perícia de acidente de trânsito, pois o perito, desconhecendo, no local, a zona de interação, se extrapolar a direção dos eixos antero-posteriores dos veículos buscando o sítio da colisão para aplicar aquele modelo clássico [3], incorrerá numa falsa determinação dele e, com isso, em vários erros, acarretando um trabalho final digno de questionamentos e análises de erros.

uma alternativa deve ser buscada para resolver o problema de transferência de momento linear, nascido na zona de interação, para a construção de um novo modelo

p

q

Figura 1. Zona de interação entre dois veículos; o primeiro contato entre os corpos provoca uma transferência de energia e momento, sendo uma fração desse momento absorvida pelos corpos na forma de momento angular. Caso não houvesse esta absorção, a conservação do momento linear seria válida, dada pela expressão:

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encontra eqüidistante dos eixos das rodas. Isso está bem ilustrado na Fig.(2).

Da estática do veículo, a soma das componentes nos eixos é igual ao peso total e a resultante dos torques é nula, ou seja,

Tal sistema fornece como resultado para cada eixo as seguintes relações:

Com elas resta, finalmente, efetuar o cálculo da energia dissipada pela força de atrito em cada eixo quando o veículo é girado de um ângulo ζ , assim

onde corresponde à força de atrito sobre o eixo i e Tµ é o coeficiente de atrito transversal entre o pavimento e o pneu, o qual não corresponde, a priori, ao coeficiente de atrito longitudinal comumente empregado nos cálculos usuais em acidentes de trânsito, uma vez que este valor é dependente das características do pneu usado sobre um específico pavimento – estando nisto os parâmetros geométricos do tamanho do pneu, superfície de contato e os desenhos dos sulcos nesta, elementos que diferem com a alteração do eixo de deslocamento –, por esse motivo a diferença será mantida no desenvolvimento do modelo, já que a igualdade não pode ser assegurada de antemão.

Igualando a energia total de rotação dissipada com esta última expressão, obtém-se o valor procurado do momento linear absorvido na zona de interação, sendo ele:

uma vez encontrado o módulo do vetor , devem ser analisados também qual sua direção e sentido para que seja posteriormente decomposto de forma correta no sistema de coordenadas.

Isto é bastante simples, pois a direção do vetor não pode ser outra senão aquela perpendicular à direção de incidência do veículo na zona de interação, uma vez que ele é o responsável pela mudança desta direção. Já o sentido corresponde àquele compatível com o movimento giratório executado pelo corpo. Como o esquema apresentado pela Fig.(3) deixa claro.

Recuperada a conservação do momento linear no exato instante da interação entre os dois veículos, pelo conhecimento de , pode-se proceder à mesma sistemática realizada na referência [3], realizando a conexão entre as velocidades de entrada com as velocidades de saída da zona de interação, ou seja, desenvolver a expressão:

.

3. INSERINDO ROTAÇÕES NA COLISÃO

Antes do desenvolvimento do modelo físico de embate com efeitos de rotação, seria oportuna a dedicação ao entendimento do fenômeno.

Conforme apresentado na Fig.(4), o fenômeno está dividido em três regiões bem distintas, sendo a primeira aquela onde os veículos com as rodas travadas convergem ao sítio de colisão, imprimindo marcas retilíneas de frenagem de comprimento l no pavimento, que possibilitam estimar a velocidade inicial antes do travamento das rodas através da relação:

.

Figura 2. O centro de massa dos veículos não se encontra eqüidistante dos eixos das rodas, acarretando uma distribuição de peso diferente para cada eixo.

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F.H.S.O. VIEIRA / REVISTA BRASILEIRA DE CRIMINALÍSTICA, V. 1, N.1, 8-15 (2011)

sângulo deincidênc ia

Figura 3. Esquema da direção e sentido do vetor s em relação ao ângulo de incidência do veículo na zona de interação.

Marcas de frenagem das bandas traseiras;Marcas de frenagem das bandas dianteiras;Trajetória do centro de massa do veículo;

Y

Xα α′

β β′

ζ1

ζ2

Veículo 1

Veículo 2

Figura 4. Ilustração do embate entre dois veículos considerando-se os efeitos de rotação. A maior diferenciação em relação ao modelo clássico sem rotação são as marcas curvas de frenagem encontradas na terceira região. Nos extremos superior e inferior é mostrada a variação angular sofrida pelo eixo antero-posterior entre o fim e o início do fenômeno.

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Em seguida, na segunda região, os dois veículos adentram no sítio onde ambos trocam entre si energia e momentos de acordo com tudo aquilo discutido na seção 2. Por fim, ambos seguem para a terceira e última região, com uma composição de dois tipos de movimento: um sendo a translação retilínea do centro de massa, e, o outro, a rotação em torno do centro de massa.

Tal composição de movimentos promoverá impressões não retilíneas de marcas de frenagem no pavimento, havendo inclusive um entrelaçamento entre elas ou mesmo marcas de derrapagem, cabendo ao perito prestar muita atenção a este fato. Isto porque não será mais o comprimento destas marcas pneumáticas usado nos cálculos, mas sim o comprimento retilíneo entre o

A discussão do novo modelo se inicia pela zona de interação com a aplicação da equação de conservação do momento linear, ou seja,

;

que escrita no sistema de coordenadas imposto na Fig.(4), leva ao par de equações:

que, devidamente solucionadas, encaminha ao seguinte resultado:

centro de massa do veículo e o sítio de colisão; sendo este último comprimento bem menor do que aquele outro, uma vez ser somente considerada a frenagem da translação do centro de massa do corpo.

uma observação muito importante a se fazer entre este novo modelo e o clássico, onde se olha para os veículos como pontos materiais, é que mesmo nas situações onde não haja marcas de frenagem curvilíneas na região III, ou canal de saída, ainda assim terá ocorrido uma rotação do corpo uma vez que a direção de incidência do eixo antero-posterior é diferente da direção encontrada no canal de saída; havendo ai uma clara rotação do corpo. Enfim, em qualquer embate real haverá necessariamente um efeito de rotação.

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Assim, as duas equações podem ser escritas em apenas uma, desde que os ângulos de incidência e escape sejam reescritos segundo a nomenclatura

0iθ e iθ , respectivamente, para 2,1=i . Desse modo tem-se:

para i,j=1,2.

O valor da velocidade iu pode ser determinado conhecendo o deslocamento retilíneo iδ ′ efetuado pelo centro de massa do veículo i do centro do sítio da colisão até o ponto de imobilização. Vale frisar novamente que este deslocamento não corresponde ao comprimento da marca de frenagem do canal de saída. Isto tão somente acontece se a marca de frenagem for uma reta e só. A equação que fornece o resultado é então:

iii gu δµ ′= 2 .

De modo semelhante, procede-se para a obtenção da velocidade inicial 0

iV a partir da velocidade fiV e do

deslocamento do centro de massa iδ no canal de entrada do veículo i, que coincide com as marcas de frenagem; sendo o resultado apresentado igual a

iif

ii gVV δµ220 += .

A reunião destas três últimas equações fornece o resultado procurado para a descrição de uma colisão entre dois veículos num plano levando em consideração o efeito de rotação, sendo ele:

para i,j=1,2.

Existindo – como comentado no início – uma contribuição positiva para as velocidades inicias com os termos que carregam o momento de inércia dos veículos, o resultado clássico [3] é obtido fazendo os momentos de inércia iguais a zero.

4. MÉTODOS DE AFERIÇÃO DE PARÂMETROS

um conjunto para ser discutido é aquele assim chamado de conjunto estrutural, uma vez que ele envolve parâmetros da estrutura do veículo, quais sejam: distância do eixo do embate até o centro de massa – ir – e distância do eixo de rolamento frontal e posterior ao centro de massa do veículo – a e b , respectivamente –, conforme ilustra a Fig.(5).

A determinação das variáveis do conjunto estrutural está associada à determinação de uma grandeza não tateável ou visível no corpo do veículo, chamada de centro de massa, e, por isso, não pode ser feita no local da ocorrência, pois requer uso de instrumental não disponível ao perito no local.

O procedimento mais simples para esta determinação envolve a necessidade de uma balança para que a força em cada um dos eixos de rolamento seja determinada – 1F e 2F –, conforme mostrado na Fig.(2), considerando nesta medição não só a massa do

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F.H.S.O. VIEIRA / REVISTA BRASILEIRA DE CRIMINALÍSTICA, V. 1, N.1, 8-15 (2011)

veículo como também as massas distribuídas em seu interior na devida posição onde se encontravam quando da colisão, seja massa humana – condutor e passageiros – ou não – bagagens diversas –, uma vez que tudo isso influi na posição do centro de massa do corpo.

Desse modo, 1F e 2F são as forças aplicadas sobre o eixo de rolamento anterior e posterior, respectivamente, de acordo com a Fig.(2), assim como a e b são as distâncias de ambos os eixos ao centro de massa e, por fim, e é a distância entre os dois eixos de rolamento, ou seja, bae += .

Como as expressões numéricas para as forças nos eixos são conhecidas, facilmente derivam-se os resultados para a e b em função delas e o parâmetro e , sendo eles:

Determinada a posição do centro de massa, a diferença encontrada do eixo de embate até ele representa o valor da variável ir . Encerrando, com isso, as variáveis do conjunto estrutural.

A importância da distribuição real de massas no veículo quando da colisão para o problema deve ser salientada, pois, sem esta consideração, tem-se uma determinação com margem de erro significativa do centro de massa e, assim, por consequência, de todas as variáveis do conjunto estrutural.

Resta a discussão a respeito dos momentos de inércia iI dos veículos.

Infelizmente a indústria automobilística, brasileira e internacional, não dispõe de tabelas informativas sobre o valor numérico desta grandeza para os seus modelos, pelo menos para o conhecimento do presente autor.

Os projetistas de veículos atêm-se somente à

preocupação de manter seus projetos estáveis quando em situações extremas de testes – como aderência e equilíbrio dos veículos em curvas a velocidades limites para deslizamento e a segurança dos passageiros em acidentes de colisão frontal –, esquecendo-se quase por completo da dinâmica desenvolvida pelo corpo quando num acidente face aos seus vários graus de liberdade rotacionais e vibracionais.

Em inúmeros tratamentos que sejam realizados visando a incorporação de graus de liberdade de rotações, a necessidade do conhecimento do momento de inércia se fará presente; isto porque ele está para as rotações assim como a massa está para as translações. Portanto, embora neste trabalho não seja apresentada uma discussão a respeito da sua relevância dentro da dinâmica de rotações, nem estratégias de estimativas específicas apresentadas para burlarem o seu desconhecimento, tudo isso não implica na impossibilidade de fazê-lo, apenas que o papel do momento de inércia necessita ser mais discutido e modelos serem propostos, inclusive despertando atenção da indústria automobilística para a aferição deste parâmetro físico de seus veículos.

5. CONCLuSÕES

Neste trabalho foi apresentado um modelo com a introdução de graus de liberdade de rotação a um clássico modelo de cálculo em acidentes de trânsito, não sendo levado em consideração efeitos dissipativos no vértice de interação, como comumente considerado; ilustrando o aparecimento de termos adicionais no valor das velocidades iniciais dos veículos, estando eles relacionados com o acréscimo de um grau a mais de liberdade para o armazenamento e troca de momento e energia.

Fica assim ilustrado como o procedimento de se conceber estrutura aos objetos envolvidos no cálculo também concebe aumento nos valores e padrões de energia cinética inicial dos processos.

Figura 5. Disposição das grandezas do conjunto estrutural, medidas em relação ao centro de massa do veículo.

2

11FF

ea+

=

e 1

21FF

eb+

=

.

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F.H.S.O. VIEIRA / REVISTA BRASILEIRA DE CRIMINALÍSTICA, V. 1, N.1, 8-15 (2011)

Em trabalho futuro será apresentada discussão detalhada a respeito do ganho conferido pela introdução da rotação e o papel das variáveis envolvidas com base na expressão final obtida, tratando de um estudo matemático.

Por hora, as questões relativas ao desconhecimento dos parâmetros momento de inércia e do coeficiente de atrito transversal são deixadas em aberto pelo presente autor e sugeridas como matérias para outros trabalhos.

AGRADECIMENTOS

Sinceros agradecimentos às pessoas do Dr. Adilson Pereira e do Dr. Oswaldo Negrine, pelas revisões realizadas no trabalho inicial no ano de 2006; bem como

ao referee, pelas sugestões apresentadas, possibilitando uma orientação mais objetiva do conteúdo aqui exposto e explicitando mais temas para motivação de trabalhos futuros.

REFERêNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

[1] R.F. Aragão. Acidentes de Trânsito, aspectos técnicos e jurídicos. 3ª Edição. Millennium, Brasil (2003) 408p.[2], J.B. Marion; S.T Thornton. Classical Dynamics of particles and systems. 5ª Edição. Brooks Cole – Thomson Learning, Estados unidos (2004) 672p.[3] O. Negrine Neto; R. Kleinübing. Dinâmica dos acidentes de trânsito, análises, reconstruções e prevenção. 2ª Edição. Millennium, Brasil (2006) 264p.

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P. LONgO / REVISTA BRASILEIRA DE CRIMINALÍSTICA, V. 1, N.1, 16-21 (2011)

1. INTRODuÇÃO

A identificação de sangue e de sua origem humana em amostras provindas de investigações criminais no Estado de São Paulo tem sido realizada nos laboratórios do Núcleo de Biologia e Bioquímica (NBB) do Instituto de Criminalística (IC) através dos métodos baseados no reagente Kastle-Meyer (para ensaios presuntivos) e no teste indireto de Coombs (para determinação de especificidade humana).

Alguns laboratórios policiais da Alemanha e da Suíça utilizam o teste imunocromatográfico para identificação de sangue humano. Esses testes se utilizam de anticorpo anti-hemoglobina humana que aplicados em amostras de material biológico obtidas em investigação criminal podem indicar a presença de sangue humano, mesmo em amostras antigas, contaminadas ou em estado de putrefação [1]. Assim, esses testes têm se mostrado eficazes e robustos, com grande aplicação à perícia criminal.

Avaliação comparativa de teste imunocromatográfico para identificação forense de sangue humano

P. Longo a; C.R. Dias Filho b; M.P.O. Valadares c; E.C. Alonso d; S.P.S. Gonçalves e; E. Auler-Bittencourt e,*

a Perito Criminal – Núcleo de Perícias Criminalísticas de Araraquara (Instituto de Criminalística de São Paulo), Brasilb Perito Criminal – Equipe de Perícias Criminalísticas de Americana (Instituto de Criminalística de São Paulo , Brasil

c Perito Criminal – Núcleo de Perícias em Crimes Contra a Pessoa (Instituto de Criminalística de São Paulo), Brasild Graduando em Ciências Biológicas do Instituto de Biociências (Universidade de São Paulo), Brasil

e Perito Criminal – Núcleo de Biologia e Bioquímica (Instituto de Criminalística de São Paulo), BrasilEndereço de e-mail para correspondência: [email protected]

Recebido em 20/04/2011; Revisado em 23/08/2011; Aceito em 08/09/2011

RESuMO

A determinação de especificidade humana pode indicar a presença de sangue humano, mesmo em amostras antigas provindas de investigações criminais, contaminadas ou em estado de putrefação. O presente estudo visa analisar se há concordância entre os resultados obtidos pelos testes de orientação e específico para sangue humano utilizados rotineiramente na análise forense em comparação com o teste imunocromatográfico para detecção da hemoglobina humana. O resultado alcançado por meio do anticorpo anti-hemoglobina humana mostrou-se eficiente na detecção qualitativa de hemoglobina humana em amostras de sangue depositadas em peças e locais de crime.

Palavras-chave: identificação de sangue; teste imunocromatográfico; amostras biologicas; identificações criminais; biologia forense.

ABSTRACT

The determination of human specificity may indicate the presence of human blood, even in ancient samples originated from criminal investigations, contaminated or in a state of putrefaction. This study aims to examine whether there is consistency between the results obtained by guidance and specific human blood tests used routinely in forensic analysis in comparison with the immuno-chromatographic test for human hemoglobin detection. The diagnosis using antibody anti-human hemoglobin has been shown to be effective in the qualitative detection of human hemoglobin in blood stains in crime related objects and at crime scenes.

Keywords: blood identification; immuno-chromatographic test; biological samples; criminal investigations; forensic biology.

Baseado no diagnóstico por meio do anticorpo anti-hemoglobina humana, o Feca-Cult One Step Teste [2] é um teste imunocromatográfico em forma de tira ou dispositivo (Fig.(1)), originalmente desenvolvido para a detecção de hemoglobina humana em fezes. A interpretação do resultado é rápida, por meio da presença de cor em regiões específicas da tira. Sua utilização forense foi posteriormente adaptada por Hochmeister et al. [1].

O presente estudo visa analisar se há concordância entre os resultados obtidos pelos testes Kastle-Meyer, Coombs e o Feca-Cult para constatação da presença de sangue humano em peças criminais. Busca também comparar a sensibilidade da determinação de sangue humano em amostras diluídas empregando-se os testes Coombs e Feca-Cult; e avaliar se há influência da oxidação de materiais que constituem as peças de exames sobre o resultado destes testes.

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Figura 1. À esquerda, formas de apresentação do Kit Feca-Cult, tira (superior) ou dispositivo (inferior). À direita, tubo coletor contendo suspensão de proteína e conservantes.

2. MATERIAL E MÉTODO

2.1. Material

Os testes foram realizados com o kit Feca-Cult One Step Teste, na forma de tira, produzido por Alamar Tecno Científica Ltda. O kit fornecido (Fig.(1)) contém tiras de teste com reagentes imobilizados em uma membrana em uma proteína matriz com azida sódica e tubos coletores contendo uma suspensão de proteína e conservantes [2].

2.2. Princípio do teste imunocromatográfico

A tira do teste contém uma membrana pré-impregnada com anticorpo monoclonal anti-hemoglobina humana, na área da linha teste, e anticorpo de cabra anti-camundongo, na área da linha controle. uma almofada com anticorpo policlonal anti-hemoglobina humana-conjugado de ouro coloidal é colocado no final da membrana, na área de aplicação da amostra. Quando a hemoglobina humana estiver presente na amostra dissolvida na suspensão de proteínas e conservantes, a mistura do conjugado ouro coloidal e a amostra extraída movem-se ao longo da membrana cromatograficamente por ação de capilaridade. Esta mistura, então, migra para a área da linha teste e forma uma linha visível com o complexo de anticorpos com a hemoglobina humana. Na ausência da hemoglobina humana na amostra extraída, não há formação de nenhuma faixa de cor visível na área da linha teste. Portanto, a presença de uma faixa de cor na área da linha teste indica um resultado positivo (Fig.(2)). uma faixa colorida deverá sempre aparecer na área da linha controle para validação do teste [2], [3].

Figura 2. Interpretação do teste. A presença da linha controle (C) indica a validade do teste; a reação colorimétrica na linha teste (T) revela resultado positivo para sangue humano.

2.3. Procedimento de coleta de amostras

As amostras para teste com o Feca-Cult foram obtidas utilizando-se três procedimentos, denominados A, B e C, de acordo com os parâmetros estabelecidos, concentração e quantidade da amostra. O procedimento “A” foi utilizado com amostras mais concentradas e em maior quantidade e consistiu em esfregar a parte estriada da haste do aplicador (Fig.(3)) sobre a mancha (Fig.(4)) e introduzir no tubo coletor, agitando o tubo vigorosamente, de maneira a assegurar uma boa difusão e homogeneização da solução. Os procedimentos “B” e “C” foram utilizados com amostras menos concentradas e em menor quantidade. “B” consistiu em recortar um fragmento da amostra e introduzir no orifício do tubo coletor para a extração do material com a solução (Fig.(5)). Em “C”, um pedaço da amostra é colocado em um tubo de ensaio junto com o conteúdo de solução de 1 tubo coletor (Fig.(6)). O tubo é agitado e deixa-se extraindo por alguns segundos.

Figura 3. Ilustração do tubo coletor do Feca-Cult, contendo uma haste aplicadora imersa em suspensão de proteínas e conservantes [2].

Após a extração das amostras em “A” e “B”, a extremidade do tubo coletor foi rompida e foram dispensadas 3 gotas na extremidade absorvente da tira (Fig.(7)). No procedimento “C”, a solução da amostra extraída no tubo de ensaio foi gotejada 3 vezes sobre a extremidade absorvente da tira com o auxílio de uma pipeta. O resultado foi lido em 5 minutos.

Figura 4. Procedimento “A”: esfrega-se a parte estriada da haste do aplicador sobre a mancha

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Figura 5. Procedimento “B”: introduz-se um fragmento da amostra pelo orifício do tubo coletor

Figura 6. Procedimento “C”: um pedaço da amostra é colocado em um tubo de ensaio junto com o conteúdo de solução de 1 tubo coletor.

Figura 7. Após macerada a amostra nos procedimentos, dispensam-se 3 gotas na extremidade absorvente da tira.

2.4. Testes de identificação de sangue e de especificidade humana

A hemoglobina é uma proteína conjugada que está presente nos glóbulos vermelhos do sangue e tem papel fundamental nesses testes. É constituída pela proteína globina e pelo grupo heme [3].

O reagente de Kastle-Meyer funciona como indicador após a adição de peróxido de hidrogênio à amostra em solução fisiológica. O teste é baseado na atividade catalítica do heme da hemoglobina que atua sobre o peróxido e libera oxigênio que oxida o indicador do reagente, fenolftaleína, dando coloração rosa à solução. O teste pode fornecer resultados falso-positivos com outras substâncias, mas reações negativas são prova da ausência ou de quantidades não detectáveis de heme [3]. Os trabalhos consultados apresentaram diferentes sensibilidades para o reagente: 1:1.000 e 1:1.000.000 [3], [4]. No presente trabalho, apenas as amostras positivas

com o teste de Kastle-Meyer, foram também analisadas pelo teste de Coombs [3].

O teste sorológico de Coombs ou Teste da Antiglobulina Humana identifica a presença de uma proteína presente no soro do sangue humano na superfície dos glóbulos vermelhos, a globulina. Esse teste detecta anticorpos incompletos de grupos sanguíneos no soro (teste indireto da antiglobulina). Anticorpos incompletos são aqueles que falham em aglutinar glóbulos vermelhos suspensos em salina. Na reação da antiglobulina, glóbulos vermelhos envolvidos com anticorpos incompletos, como anti-Rh IgG, são aglutinados por anti-IgG, o qual liga as moléculas de IgG através de pontes aos glóbulos vermelhos vizinhos. O fundamento do método é que a globulina humana inibe a atividade do soro antiglobulina humano, o qual perde a capacidade de aglutinar glóbulos vermelhos sensibilizados por anticorpos incompletos. Se uma mancha de sangue contém globulinas do soro humano e é incubada com anti-soro globulina humano, essas globulinas neutralizam o anti-soro e quando são adicionadas células ‘O’ Rho(D) (fornecidas no kit do teste sorológico de Coombs) sensibilizadas com anticorpos incompletos, nenhuma aglutinação ocorre, sendo a mancha de sangue, portanto, de origem humana. A formação de aglutinação significa que a mancha de sangue não contém globulina humana e que o anti-soro globulina humano ficou livre para formar pontes, aglutinando os glóbulos vermelhos sensibilizados. A sensibilidade do teste é da ordem de 1:50.000 [3].

2.5 Avaliação da sensibilidade dos testes para detecção de sangue humano

2.5.1 Coleta do material para determinação de sensibi-lidade dos testes

Foram coletados 5 mL de sangue humano por punção venosa para serem empregados nas diluições, com especial atenção para a medição dos volumes empregados nos procedimentos antes da coagulação

2.5.2 Diluentes empregados

As seqüências de diluição foram efetuadas distintamente com água destilada, solução fisiológica (NaCl 0,9 %) e solução salina tamponada do tubo coletor do Feca-Cult.

2.5.3 Método empregado

Foi transferido 1 mL de sangue humano in natura para cada um dos três recipientes contendo os diluentes especificados à temperatura ambiente, a partir dos quais foram efetuadas as diluições de 1:1.000, 1:2.000, 1:3.000, 1:4.000, 1:5.000, 1:6.000, 1:7.000, 1:14.000, 1:28.000, 1:56.000, 1:112.000, 1:224.000, 1:448.000, 1:500.000, 1:896.000 e 1:1.000.000. O teste de Coombs foi aplicado para as diluições de 1:1.000 a 1:7.000, enquanto o Feca-

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Cult foi aplicado em todas as diluições.2.6 Avaliação da influência de oxidação de peças sobre o resultado dos testes de Coombs e Feca-Cult

Foram analisadas lâminas de aço oxidadas e não oxidadas encaminhadas ao Núcleo de Perícias Criminalísticas (NPC) de Araraquara para pesquisa de sangue humano, comparando-se os resultados dos testes de Coombs e Feca-Cult.

3. RESuLTADOS E DISCuSSÃO

3.1. Procedimento de coleta de amostras

um total de 130 amostras foram analisadas através dos procedimentos A, B e C. O procedimento “A” mostrou-se prático, porém bastante limitado. Pôde ser usado quando houve manchas hematóides concentradas em objetos rígidos, tais como faca, de modo que a substância hemática se aderia facilmente às estrias da haste do tubo coletor. Foi utilizado em 12 amostras (9,23%) dos testes. Já o procedimento “B” se mostrou pouco prático, devido ao orifício do tubo coletor possuir diâmetro de cerca de 2 mm, o que dificulta a inserção de um fragmento de amostra maior; sendo utilizado em apenas 15 amostras (11,54%) dos testes. O procedimento “C” apresentou-se relativamente prático e serviu para qualquer concentração de amostra. Foi o mais utilizado, sendo empregado em 103 amostras (79,23%). 3.2. Comparação entre os testes de Kastle-Meyer, de Coombs e Feca-Cult

A Tabela (1) expressa os resultados dos testes de Coombs e Feca-Cult. Os resultados para Coombs/Feca-Cult +/+, NR/- e -/-, que equivalem a 95,4% dos resultados, indicaram concordância entre os testes.

Tabela 1. Resultado dos testes de Kastle-Meyer, de Coombs e Feca-Cult das amostras analisadas (n=130).

Kastle-Meyer Coombs Feca-Cult No de amostra

+ + + 86 (66,2%)

- NR - 30 (32,1%)

+ - - 8 (6,2%)

+ - + 5 (3,8%)

- - * + 1 (0,8%)(+) positivo; (-) negativo; (NR) não realizado* realizado na tentativa de se esclarecer o resultado divergente.

Apenas 6 (4,6%) amostras indicaram divergência entre Coombs e o Feca-Cult. Testes imunocromatográficos para especificidade humana, como o Feca-Cult, apresentam resultado positivo para sangue total diluído até 1:1.000.000. No teste de Coombs, resultados positivos são obtidos com sangue total diluído até 1:50.000 [3]. Logo, o Feca-Cult é vinte vezes mais sensível que o teste de Coombs na identificação de sangue humano. Todas

as amostras que tiveram resultados divergentes entre o Feca-Cult e o Coombs foram obtidas de peças com substância hematóide em baixa quantidade, o que pode ter sido detectado pelos testes de Kastle-Meyer e Feca-Cult, mas não pelo teste de Coombs, devido a sua menor sensibilidade.

O resultado negativo para o método de Kastle-Meyer foi obtido em apenas uma amostra de uma faca que particularmente se encontrava em estado avançado de oxidação. O resultado positivo para o Feca-Cult indicou presença de hemoglobina humana [2]. No entanto, o método de Kastle-Meyer, que resulta positivo quando da presença de hemoglobina [4], não constatou a presença de sangue. Essa divergência pode ser explicada pela sensibilidade variável do reagente de Kastle-Meyer. Diferentes sensibilidades para o método foram citadas por diferentes autores, diferindo em até mil vezes [3], [4]. Assim, o reagente de Kastle-Meyer pode ter sensibilidade inferior àquela atribuída ao Feca-Cult. Outra possibilidade seria de que o elevado grau de oxidação da peça pode ter suprimido a capacidade da hemoglobina de reduzir o peróxido de hidrogênio no método de Kastle-Meyer. O teste de Coombs foi excepcionalmente realizado nessa amostra negativa para sangue genérico, mas resultou negativo, o que era esperado devido sua menor sensibilidade quando comparado ao Kastle-Meyer.

3.3. Comparação da sensibilidade dos testes de detecção de sangue humano

Os resultados obtidos, conforme cada concentração e os diluentes empregados encontram-se nas Tab.(2) e (3).

Os resultados expostos na Tab.(2), ilustrados da Fig.(8), apontaram a detecção de sangue humano nas soluções de concentração até 1/4.000 empregando-se o teste de Coombs, tendo-se como solvente a solução fisiológica e a solução salina tamponada. Para as concentrações de sangue de 1/5.000 a 1/7.000, os resultados foram negativos, observando-se no microscópio óptico as aglutinações características destes resultados negativos.

Para as amostras diluídas em água destilada, todos os tubos apresentaram aglutinações, caracterizando os resultados negativos para o método sorológico empregado. Assim, para as concentrações diluídas de sangue humano, a hemólise das hemácias, ocasionada pela água destilada, impossibilitou sua aglutinação, gerando resultados falso-negativos em concentrações que deveriam ser detectadas pelo método sorológico. Portanto, para que haja a preservação do sangue, a coleta das amostras em locais de crime deve ser efetuada com solução fisiológica ou salina tamponada.

O teste Feca-Cult apontou resultados positivos nas concentrações de 1/5.000 a 1/7.000, não detectadas pelo método sorológico, evidenciando sua maior sensibilidade (Fig.(8)).

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Figura 8. Ilustração dos resultados positivos apontados na Tab.(2) obtidos pelo método de membrana reativa Feca-Cult. Da esquerda para a direita, os resultados referem-se às concentrações de 1/1.000 a 1/7.000.

Na Tabela (3), foram apontados os resultados provenientes do método Feca-Cult para concentrações acima de 7.000 vezes de diluição. Os resultados obtidos apontaram para a detecção de sangue humano em concentrações extremamente reduzidas quando comparados aos resultados obtidos pelo método sorológico atualmente empregado pelos Núcleos de Perícias Criminalísticas.

Tabela 3. Resultados da detecção de sangue humano em diferentes diluentes e concentrações: água destilada, solução fisiológica e salina

tamponada, empregando-se o Feca-Cult.

Concent.Feca- Cult

Água destiladaSolução

fisiológicaSalina

tamponada1/14.000 + + +1/28.000 + + +1/56.000 + + +1/112.000 + + +1/224.000 + + +1/448.000 + + +1/500.000 + + +1/896.000 + - -

1/1.000.000 + - -(+) positivo; (-) negativo.

As amostras que continham o sangue humano diluído em solução fisiológica revelaram resultados positivos até a concentração de 1/500.000. Estes

resultados também foram observados nas amostras diluídas com solução salina tamponada fornecida com o kit. Ressalta-se que a faixa positiva da membrana revelou-se mais intensa na diluição empregando-se a salina em comparação à solução fisiológica (Fig.(9)).

Figura 9. Membranas reativas Feca-Cult resultantes da análise de soluções de sangue humano com concentração de 1/500.000, diluídas em água destilada (1), solução fisiológica (2) e solução salina tamponada (3).

Os melhores resultados foram obtidos nas leituras das membranas reativas efetuadas com as amostras diluídas em água destilada, onde se obteve resultado positivo para sangue humano na concentração de 1/1.000.000.

A lise das hemácias pela água destilada pode ter auxiliado na detecção de sangue humano em concentrações abaixo de 1:500.000, disponibilizando mais hemoglobina na solução devido à ruptura dos eritrócitos, quando comparada com as soluções contendo hemoglobinas íntegras das diluições efetuadas com as outras duas soluções testadas.

Conforme Fig.(10), nota-se que a intensidade das colorações da fita teste é muito semelhante para todos os solventes utilizados na diluição, ainda que a concentração da solução com água destilada seja a metade (1/1.000.000) das demais (1:500.000).

3.4 Avaliação da influência de oxidação de peças sobre o resultado dos testes de Coombs e Feca-Cult

Os resultados dos testes de Coombs e Feca-Cult da análise de influência de oxidação sobre o resultado destes testes estão expressos na Tab.(4).

ConcentraçãoÁgua destilada Solução Fisiológica Salina Tamponada

Coombs Feca- Cult Coombs Feca- Cult Coombs Feca- Cult1/1000 - + + + + +1/2000 - + + + + +1/3000 - + + + + +1/4000 - + + + + +1/5000 - + - + - +1/6000 - + - + - +1/7000 - + - + - +

Tabela 2. Resultados da detecção de sangue humano empregando-se como diluente água destilada, solução fisiológica e salina tamponada, comparando-se os testes de Coombs e Feca-Cult.

(+) positivo; (-) negativo.

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Tabela 4. Resultados da detecção de sangue humano em amostras oxidadas e não oxidadas

Peça Coombs Feca-Cult

Lâmina de aço oxidada 1 + +

Lâmina de aço oxidada 2 + +

Lâmina de aço oxidada 3 - +

Lâmina de aço oxidada 4 + +

Lâmina de aço oxidada 5 - -

Lâmina de aço não oxidada 1 + +

Lâmina de aço não oxidada 2 + +

Lâmina de aço não oxidada 3 - -

Lâmina de aço não oxidada 4 - -

(+) positivo; (-) negativo.

Observa-se concordância de 88,9% (n=9) entre os testes de Coombs e Feca-Cult. A exceção se dá na lâmina oxidada 3, cujo resultado do Feca-Cult se revelou em três minutos, mesmo tempo de revelação das amostras de sangue humano diluído entre 1:500.000 e 1:1.000.000. Isso pode explicar o resultado negativo do teste de Coombs para esta lâmina, considerando a diferença de sensibilidade deste método quando comparado com o Feca-Cult: é provável que a concentração de sangue fosse inferior à detectável por Coombs, mas acima do limite de detecção pelo Feca-Cult.

4. CONCLuSÕES

O Feca-Cult apresentou concordância de 95,4% com os resultados obtidos com a método para detecção de sangue utilizado rotineiramente em análises forenses. Pode-se ainda sugerir que foi mais eficaz, identificando aparentemente sangue humano em concentrações não detectáveis pelos outros métodos.

Deve-se analisar a concentração da substância hemática para se estabelecer qual o solvente mais adequado para cada situação. Em concentrações e

quantidades muito baixas de substância, o uso da água destilada fornece resultados mais sensíveis com o uso do Kit Feca-Cult, apesar de apresentar resultado falso-negativo no exame sorológico através do método de Coombs. Já a solução fisiológica e a salina tamponada podem ser utilizadas para as demais concentrações em ambos os testes.

O aço oxidado parece não afetar o resultado do Feca-Cult, o que nos sugere que o resultado negativo para Kastle-Meyer e positivo para Feca-Cult observado na comparação entre os três testes deve ser explicado pela hipótese mais parcimoniosa levantada, baseada na possível diferença de sensibilidade existente entre estes testes.

Deste modo, a análise em amostras suspeitas de sangue depositadas em peças criminais por meio do anticorpo anti-hemoglobina humana mostrou-se eficiente na detecção qualitativa de hemoglobina humana. Vale apontar como vantagem em relação aos demais testes específicos para sangue humano a rapidez do resultado e a facilidade de aplicação do teste imunocromatográfico.

AGRADECIMENTOS

Agradecemos a colaboração técnica dos seguintes Peritos criminais do Núcleo de Biologia e Bioquímica, Helena Maria Ferreira Castro, Ione de Freitas Araujo, Ricardo Lopes Ortega, Rosely Galo Soares; Sonia Regina Eugênio Mazzoni, Maria Aparecida Avelino, Maria Luisa Almeida Prado Oliveira e Sousa, Roberta Hirschfeld Campolongo e, em especial, à técnica de laboratório, Sueli Felix dos Santos Oliveira.

REFERêNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

[1] M.N. Hochmeister; B. Budowle; R. Sparkes; O. Rudin; C. Gehrig; M. Thali; L. Schmidt; A. Cordier; R. Dirnhofer. Validation studies of an immunochromatographic 1-step test for the forensic identification of human blood. J Forensic Sci 44: 597–602 (1999).[2] Feca-Cult One Step Teste: Membrana reativa para determinação de sangue oculto. Diadema: Alamar Tecno Científica Ltda. Bula do teste. (abr. 2008).[3] M.C.T. Sawaya; M.R.S. Rolim. Manual prático de medicina legal no laboratório. Juruá, Brasil (2009). 230p.[4] D.B. Dupré. Blood or Taco Sauce? J Chem Educ 73: 60-64 (1996).

P. LONgO / REVISTA BRASILEIRA DE CRIMINALÍSTICA, V. 1, N.1, 16-21 (2011)

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J.A. gOMES / REVISTA BRASILEIRA DE CRIMINALÍSTICA, V. 1, N.1, 22-30 (2011)

Espectroscopia Raman: um novo método analítico para investigação forense em cruzamento de traços

J.A. Gomes, M.S. Sercheli* Seção de Delitos de Trânsito, Instituto de Criminalística, Polícia Civil do Distrito Federal, Brasília (DF), Brasil

*Endereço de e-mail para correspondência: [email protected]. Tel.: +55-61-3362-5954.Recebido em 17/05/2011; Revisado em 15/09/2011; Aceito em 21/09/2011

RESuMO

Em Documentoscopia, o exame de tinta in-situ, sobre a superfície de um determinado suporte, é um desafio para a ciência forense. Hoje em dia, a Cromatografia Gasosa acoplada ao Espectrômetro de Massa (GC-MS) e a Cromatografia Líquida de Alta Eficiência (HPLC) são as principais técnicas utilizadas para tal análise, apesar de que tais técnicas micro-deterioram o documento analisado. Nesse contexto, a Espectroscopia Raman tem se mostrado uma técnica promissora e bastante adequada, pois propicia a direta identificação e caracterização das tintas encontradas na própria superfície do papel, de modo não destrutivo. Assim sendo, este trabalho utiliza-se da Espectroscopia Raman, através de medidas experimentais, para inicialmente identificar e diferenciar tintas de caneta, sendo que uma atenção especial foi dada às tintas de tonalidade preta, as quais são difíceis de serem distinguidas pelas técnicas atuais. Posteriormente, foram selecionados e analisados alguns cruzamentos entre as tintas que apresentaram espectros distintos, ou seja, aquelas tintas que possuem diferentes composições químicas, com o objetivo de identificar a sequência cronológica dos lançamentos. O método baseia-se num tratamento matemático simples dos espectros Raman, obtidos em diferentes profundidades na região do cruzamento. Salienta-se a obtenção de sucesso na utilização desse procedimento, bem como de outro processo empregado para o mesmo propósito: o mapeamento bidimensional na superfície da região de intersecção entre as tintas, seguido da análise de correlação (programa Wire3.2, Renishaw, uK) com os espectros coletados individualmente nas tintas envolvidas no cruzamento.

Palavras-chave: Espectroscopia Raman; Tintas de caneta; Cruzamento de traços.

ABSTRACT

In the field of Questioned Document Examination, in-situ pen´s ink investigation, on the surface of a particular medium, is a challenge to Forensic Science. Nowadays, Gas Chromatography-Mass Spectrometer (GC-MS) and High Performance Liquid Chromatography (HPLC) are the main techniques used for such analysis, despite their questioned document micro destructive potential. In this context, Raman spectroscopy became the new promising technique in this area, since it performs the direct identification and characterization of inks on the surface of the paper, in a nondestructive way. Therefore, this study utilizes the Raman spectroscopy to, firstly, identify and differentiate ink pen through experimental measurements, and special attention was given to black tone, which are difficult to be distinguished by current techniques. Secondly, some intersecting lines constituted by inks that had different spectra, i.e., those inks that have different chemical compositions, were selected and analyzed, with the main purpose of identifying the tracing chronological sequence. The method is based on a simple mathematical treatment of Raman spectra obtained at different depths in the region of intersection lines. The success in using this procedure is related as well as other process employed for the same objective: the two-dimensional surface mapping of the intersection region, followed by statistical correlation analysis (Wire3.2 software, Renishaw, uK) of spectra individually collected in the intersection involved inks.

Keywords: Raman spectroscopy; Ink pen; Intersecting lines.

1. INTRODuÇÃO

Com o surgimento de diversos tipos de canetas no mercado mundial, para atender determinadas especificações, com base em suas aplicações e usos comerciais, as tintas de canetas são fabricadas de acordo com suas propriedades físicas, como densidade, cor, viscosidade, tensão superficial e resistência à água. Esses critérios são alcançados controlando a composição química das tintas, que pode variar consideravelmente ao ser modificada a concentração de componentes como corantes, solventes e realçadores de viscosidade. Na maioria das vezes, é preciso, no exame documentoscópico, métodos para identificação e classificação destas tintas,

para a elaboração de um laudo pericial conclusivo.É notório que cada documento tem uma maneira

peculiar de ser produzido. Em regra, no ocidente, os textos são redigidos de cima para baixo e da esquerda para a direita. Desta forma, acréscimos de traços, normalmente, podem contrariar esta sequência natural de direção. Desse modo, ao adicionar escritos em documentos já elaborados, os novos traços poderão cruzar com os do texto primitivo e, assim, muitas vezes, se for demonstrado que este traço está por cima do outro, quando deveria estar por baixo, o acréscimo se tornará evidente. Portanto, surge a necessidade de se verificar a prioridade de lançamentos, largamente discutida em Documentoscopia [1].

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Atualmente, as identificações de tintas, bem como a análise destas em cruzamento de traços, ainda são um desafio para a ciência forense. Dentre as principais técnicas utilizadas [2],[3] para elucidar tais questões, temos: (i) a inspeção ocular, o uso de lupas ou até mesmo de microscópios – técnicas que, muitas vezes, nos dão a nítida idéia de um traço sobre o outro quando na realidade temos o oposto, desta forma, é preciso tomar o devido cuidado, pois matrizes mais fortes parecem estar sobre as matrizes mais fracas e nem sempre temos os estreitamentos, as descontinuidades, os arrastes, etc; (ii) o exame da luz filtrada – técnica que requer a necessidade das tintas apresentarem diferentes propriedades óticas, sendo quase inviável a utilização para tintas de tonalidade preta; (iii) a cromatografia gasosa acoplada ao espectrômetro de massa, a cromatografia líquida de alta eficiência, a espectroscopia no infravermelho e a fluorescência de raios-x – tais técnicas apresentam como desvantagem a micro-deterioração da amostra analisada [4].

É nesse contexto que surge a espectroscopia Raman, uma técnica que tem se mostrado bastante promissora [4], devido a diversos fatores: (i) alta capacidade de identificar compostos químicos; (ii) preparação da amostra desnecessária, conseguindo realizar medidas diretamente sobre o material ou até mesmo em material acondicionado em sacos plásticos ou vidros; (iii) exame rápido, não invasivo e não destrutivo, permitindo a direta identificação e caracterização das tintas encontradas na própria superfície do papel. Assim, essa importante característica de preservação do vestígio material, após o exame pericial ter sido realizado, está em acordo com o Código de Processo Penal Brasileiro [5], o qual dispõe sobre a possível conservação do material probatório para a realização, caso seja necessário, de um novo exame. Tal método utiliza-se de um laser específico de baixa potência, centrado num ponto particular da amostra através de um microscópio. O feixe laser interage com os compostos químicos presentes na amostra, de tal forma que a luz é retroespalhada em diferentes frequências, dependendo tanto dos elementos químicos quanto de suas ligações moleculares. Portanto, em princípio, podem-se distinguir todas as composições químicas de diferentes tintas. No entanto, se as tintas possuírem a mesma composição química, evidentemente, seus espectros Raman serão idênticos.

Dessa maneira, a espectroscopia Raman, em análise de tintas, fornecerá uma resposta baseada nas características inerentes de cada tinta, distinguindo-as quimicamente. Assim, devido à possibilidade de distinção de cada composição, a ordem cronológica da sobreposição de camadas de tintas será determinada, solucionando a questão do cruzamento de traços.

Os objetivos deste trabalho são essencialmente dois: (i) realizar um estudo através da espectroscopia Raman com o intuito de distinguir diferentes tintas

de caneta, principalmente as de cor preta, difíceis de serem analisadas por outras técnicas; (ii) e, em especial, também através da espectroscopia Raman, propor um método de análise que resolva o problema da sequência cronológica de linhas em cruzamento de traços, ou seja, um método analítico e objetivo que determine qual traço foi escrito primeiro.

2. PROCEDIMENTO ExPERIMENTAL

2.1. Preparação da Amostra

Neste trabalho, foram estudadas 17 canetas diferentes. No total, essas canetas possuíam 23 tipos de tintas, nas quatro principais cores utilizadas: sendo cinco na cor preta, nove na cor azul, sete na cor vermelha e duas na cor verde (veja a Tab.(1)). As amostras estudadas consistiam em traços aplicados diretamente sobre papel sulfite branco, de tamanho A4, de modo a simular a escrita. Os padrões de traços coletados foram: horizontais, verticais e inclinados (ângulo de 45o). Além disso, uma série de amostras de traços cruzados, ortogonais entre si, foi preparada usando diferentes canetas, sendo que atenção especial foi dada ao estudo de tinta na tonalidade preta. O tempo de coleta entre todos os traços foi da ordem de 45 minutos, o que resulta em uma maior probabilidade de mistura de tintas no cruzamento e também maior dificuldade na solução da ordem cronológica. A prioridade de lançamentos era conhecida.

2.2. Espectroscopia Raman

O espectrômetro Raman utilizado neste experimento foi o “Renishaw inVia Raman microscope”, fabricado pela Renishaw, uK.

Na aquisição dos espectros foram utilizados lasers com excitação em comprimentos de onda de 514 nm e 785 nm e o intervalo máximo de medida do deslocamento Raman ficou compreendido entre 100 e 3200 cm-1. O feixe de laser foi focado num ponto específico da amostra utilizando-se um microscópio com quatro objetivas (5x, 20x, 50x e 100x). Três tipos de medidas foram efetuadas: (i) pontual, em região fora do cruzamento, para a identificação e classificação da tinta de caneta; (ii) em profundidade, fora e dentro da região do cruzamento entre dois traços (variação de 20 µm entre medidas consecutivas) e (iii) mapeamento bidimensional em região que abrangesse, além dos traços isolados, o próprio cruzamento (da ordem de 20.000 espectros coletados na região analisada). Os dois últimos métodos foram utilizados com o objetivo de se determinar qual dos traços foi lançado primeiro.

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3. RESuLTADOS E DISCuSSÃO

3.1. Identificação das tintas

Figura 1. Exemplo de uma das regiões selecionadas, apontada pela seta, para se coletar os dados para a amostra preta-1a, utilizando-se uma objetiva de 50x.

Para o estudo de identificação das tintas, foram coletadas medidas Raman, utilizando objetiva de 50x (veja um exemplo de uma das regiões selecionadas, apontada por uma seta, para a amostra preta-1a, na Fig.(1)). Através do uso do laser de 514 nm obtiveram-se os melhores resultados para as cores de tonalidade preta, azul e verde. Entretanto, para as tintas na cor vermelha, o laser de Hélio e Neônio (He-Ne), cujo o comprimento de onda é de 785 nm, gerou os melhores resultados.

Para uma mesma tinta foram coletados espectros Raman em diversas posições, bem como em diferentes orientações dos traços, a saber: verticais, horizontais e inclinados (ângulo de 45°). Os demais resultados, não apresentados neste trabalho, mostram que os espectros Raman, para uma determinada tinta, são idênticos,

independentemente da orientação dos traços e da região escolhida.

Figura 2. Espectros Raman coletados, com laser de 514 nm e objetiva de 50x, para um exemplo de cada cor de tinta estudada, aleatoriamente selecionada.

A Figura (2) mostra um espectro Raman, aleatoriamente selecionado, para cada uma das tonalidades de tinta estudadas aqui. Os espectros são facilmente distinguíveis, devido à diferença em suas composições químicas. Além disso, para tintas de mesma tonalidade (veja as Figs.(3) a (6)), em especial na cor preta, na maioria dos casos, é possível distinguir características espectrais, como posição do pico e intensidade relativa entre os picos, que são exclusivas de cada tinta individualmente, mesmo que grande percentual do espectro seja idêntico. Contudo, existem padrões emergentes dos dados coletados revelando que algumas tintas examinadas possuem “assinaturas” semelhantes, o que evidencia uma relativa concordância entre suas fórmulas, a qual pode ser atribuída a um determinado fornecedor de tinta.

Cor preta Cor azul Cor vermelha Cor verde

1 Preta-1a, CIS 4 cores Azul-1a, CIS 4 cores Vermelha-1a, CIS 4 cores Verde-1a, CIS 4 cores

2 Preta-2b, BIC 4 cores Azul-2b, BIC 4 cores Vermelha-2b, BIC 4 cores Verde-2b, BIC 4 cores

3 Preta-5c, Mega Star Azul-3c, Crown Vermelha-4c, Pilot BP-S -

4 Preta-8d, Uni pin Azul-6d, Congresso de analítica Vermelha-11d, Slim basic -

5 Preta-14e, BIC Azul-7e, uni-ball Vermelha-12e, BIC -

6 - Azul-9f, Seguros BRB Vermelha-13f, Mega Star -

7 - Azul-10g, BIC Vermelha-15g, Pilot ball -

8 - Azul-16h, Pilot - -

9 - Azul-17i, caneta tinteira - -

Tabela 1. Especificação das diversas canetas examinadas, separadas por cores, códigos e marcas.

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Das nove diferentes canetas analisadas na cor azul (Fig.(3)), cinco foram possíveis de se distinguir. Das cinco diferentes canetas na cor preta (Fig.(4)), três foram possíveis de se distinguir. Das sete diferentes canetas na cor vermelha (Fig.(5)), seis foram possíveis de se distinguir. As duas diferentes canetas na cor verde foram possíveis de se distinguir (Fig.(6)). As tintas de canetas da mesma cor que não foram possíveis de serem diferenciadas, ou seja, que possuem espectros Raman idênticos em ambos os comprimentos de onda utilizados, como por exemplo, a caneta BIC e a caneta BIC 4 cores, bem como as canetas de propaganda (Congresso de Analítica, Seguros BRB, Mega Star, etc.), permitem inferir que as tintas podem ter sido provenientes de um mesmo fornecedor/lote.

3.2. Cruzamento de traços – mapeamento da profundidade

Dependendo da especificidade de cada tinta utilizada, pode-se identificar a ordem cronológica dos traços. Vale salientar que, na intersecção de dois traços, diferentes, organizações nas camadas de tintas podem

acontecer: as tintas podem formar camadas discretas, pode ocorrer difusão parcial na interface das camadas ou, até mesmo, as tintas podem se misturar completamente, tornando-as indistinguíveis [6].

Nesse sentido, foram efetuadas medidas experimentais em pontos próximos ao cruzamento de traços (com o intuito de se coletar espectros de cada tinta separadamente) e no próprio cruzamento, em três ou seis profundidades diferentes (com o objetivo de se verificar qual tinta foi escrita primeiro). Os dados foram coletados entre duas tintas na tonalidade azul e entre duas tintas na tonalidade preta. Para tanto, utilizou-se o laser com comprimento de onda de 514 nm. Salienta-se que, no cruzamento, os traços eram ortogonais entre si e também foi utilizada a objetiva de 50x.

Primeiramente, o resultado das medidas no cruzamento de traços entre tintas de cor azul (azul-1a e azul-17i) pode ser visualizado na Fig.(7). Os espectros Raman foram coletados com laser de 514 nm, sobre os traços isolados de cada tinta (espectros superior e inferior) e em profundidade sobre o cruzamento dos traços entre essas tintas, sendo que o traço da “caneta 17i” estava localizado abaixo do traço da “caneta 1a”.

Figura 3. Espectros Raman coletados, com laser de 514 nm e objetiva de 50x, para todas as nove canetas de tinta na cor azul estudadas.

Figura 4. Espectros Raman coletados, com laser de 514 nm e objetiva de 50x, para todas as cinco canetas de tinta na cor preta estudadas.

Figura 5. Espectros Raman coletados, com laser de 785 nm e objetiva de 50x, para todas as sete canetas de tinta na cor vermelha estudadas.

Figura 6. Espectros Raman coletados, com laser de 514 nm e objetiva de 50x, para as duas canetas de tinta na cor verde estudadas.

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As profundidades de cada medida estão diferenciadas por cores, sendo que foram realizadas três medidas a partir da superfície do papel com cerca de 20 μm de distância entre cada medida. As linhas verticais mostram os picos Raman analisados para definição da ordem dos lançamentos.

Figura 7. Espectros Raman coletados, com laser de 514 nm, sobre os traços isolados de cada tinta (azul-1a na cor verde e azul-17i na cor vermelha) e em três diferentes profundidades sobre o cruzamento entre essas tintas, sendo que o traço da “caneta 17i” estava localizado abaixo do traço da “caneta 1a”. As profundidades de cada medida estão diferenciadas por cores (rosa, azul e azul claro), de modo que “Alto” significa na superfície do papel, “Meio” significa cerca de 20 μm abaixo da superfície e “Baixo” da ordem de 40 μm abaixo da mesma superfície. As linhas verticais mostram os picos Raman analisados para definição da ordem dos lançamentos.

Analisando os três espectros centrais da Fig.(7) pode se notar que eles são uma mistura dos espectros individuais de cada tinta isoladamente. Essa análise é bem ilustrativa, já que se consegue visualizar o surgimento do pico situado próximo de 1575 cm-1 (linha vertical à direita), característico do espectro Raman da tinta azul-17i, a partir da superfície, onde praticamente não existia, até a região mais profunda. Note que o espectro da superfície do papel (“Alto”), assemelha-se ao espectro do azul-1a, enquanto que o espectro a uma profundidade de 40 μm da superfície (“Baixo”), assemelha-se ao espectro do azul-17i. Dessa forma, fica evidente que a tinta azul-1a está lançada sobre a 17i, ou seja, a azul- 1a foi lançada em momento posterior. No entanto, na maior parte dos casos, não é possível fazer esse tipo de identificação apenas visualmente.

Assim, este trabalho científico sugere, além dessa nova análise por profundidade, um tratamento matemático prático e objetivo para elucidar os problemas mais difíceis. Nesse contexto, para explicar o novo método, uma análise sobre o cruzamento de tintas de cor preta será apresentada a seguir. Trata-se do cruzamento entre duas tintas de canetas concorrentes no mercado brasileiro, das quais as tonalidades e composições químicas são muito semelhantes. Além disso, para dificultar o problema, os espectros Raman também são

muito parecidos, com diversos picos iguais. Nessa análise, foi realizado um maior detalhamento das medidas, que envolveu seis profundidades distintas, conforme ilustra a Fig.(8). Note que os espectros aparecem no gráfico na ordem inversa da profundidade, ou seja, o espectro superior corresponde à medida Raman mais profunda, decrescendo a profundidade de cima para baixo.

À primeira vista, os espectros são extremamente semelhantes. Mas, um olhar com maior atenção revela sutis diferenças. Para saber onde atacar o problema deve-se estudar atentamente os espectros individuais de cada tinta utilizada no cruzamento e fazer uma subtração, de um pelo outro, para verificar quais principais picos os diferenciam. Na Figura (9), os espectros individuais de cada tinta isolada são apresentados, ampliados na região de interesse. Note que o pico de 1141 cm-1 (linha vertical à esquerda) somente está presente no espectro da tinta 2b (linha pontilhada vertical esquerda). Assim, esse foi o ponto espectral escolhido para abordar o problema da ordem cronológica no cruzamento.

Figura 8. Espectros Raman coletados, com laser de 514 nm, sobre o cruzamento de traços de tintas de cor preta, com o traço da “caneta 1a” localizado abaixo do traço da “caneta 2b”. As profundidades de cada medida estão diferenciadas por cores, sendo que o zero é a superfície do papel. A região pontilhada mostra os picos Raman que foram analisados através de um tratamento matemático simples.

A Figura (10) mostra a região de análise ampliada (área pontilhada da Fig.(8)). Agora é mais fácil visualizar que esse pico (1141 cm-1) fica cada vez mais evidente conforme as medidas aproximam-se da superfície.

No entanto, para ter certeza de que não se trata de um provável decréscimo da intensidade da medida com a profundidade, o que induziria a um falso positivo, propõe-se um tratamento matemático. O tratamento matemático consiste na comparação entre as intensidades relativas dos picos localizados em 1141 cm-1 e de 1177 cm-1, conforme ilustrado nas Figs.(11) e (12).

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Figura 9. Detalhe das regiões de interesse dos espectros Raman coletados, com laser de 514 nm, para os traços de tintas de cor preta, isoladamente. O espectro de cor vermelha é referente à tinta da “caneta 2b” e o de cor preta à tinta da “caneta 1a”. As linhas verticais pontilhadas mostram a principal diferença entre os espectros, ou seja, a ausência do pico localizado em 1141 cm-1 para a tinta da “caneta 1a”.

Figura 10. Detalhe dos espectros Raman realizados sobre o cruzamento de traços de tintas de cor preta, com o traço da “caneta 1a” localizado abaixo do traço da “caneta 2b”, correspondente aos picos da região pontilhada da Fig.(2).

As intensidades dos picos normalmente são adquiridas através do cálculo da integral (área abaixo) da curva pretendida. Como existe uma sobreposição de picos, essa maneira de obtenção da intensidade absoluta de cada pico seria complexa, já que a identificação dos picos isolados seria necessária. O modelo proposto é mais simples, pois usa intensidades relativas. Como os picos não sofrem alargamento, pois não se trabalha com variações de temperatura ou variações magnéticas nas amostras, as intensidades relativas são proporcionais às alturas dos picos. Sendo assim, em um processo automático, calcula-se as alturas médias de cada pico a partir da linha de base, calculada e ilustrada por uma reta vermelha nos gráficos acima. Essas alturas médias, em torno dos picos, serão obtidas e em seguida normalizadas pela intensidade de cada pico. Note que se obtém a altura média do pico por uma questão de otimização, pois o modelo é alimentado com os deslocamentos Raman

(faixa de pontos no eixo X) em torno dos quais estão localizados todos os picos em diferentes profundidades. A escolha de uma faixa de pontos ao invés do ponto exato do pico se deve ao fato de haver pequena variação da posição do pico (cerca de 1-3 cm ¯¹), em função da profundidade, devido a pequenas mudanças em propriedades físicas locais. Futuramente, o ideal é montar um sistema de detecção do pico através da derivada nula. Assim, tomaríamos sempre o valor máximo dos picos.

Dessa maneira, depois de se calcular as intensidades relativas de cada pico, ou seja, a altura normalizada do pico em 1177 cm-1 e do pico em 1141 cm-1, divide-se uma pela outra. Assim, pode-se obter a proporção entre os picos. Nas Figuras (11) e (12), visualmente, pode-se notar que a proporção entre as alturas destes picos na tinta 2b é acentuadamente menor do que a proporção na tinta 1a – que tende ao infinito, já que o pico não existe nessa tinta. Assim, ao calcular as proporções entre os picos para as diferentes profundidades, haverá a possibilidade de identificação da ordem cronológica do lançamento dos traços. Como se conhece a proporção entre os picos da tinta 2b, a tendência dos valores encontrados em função da profundidade ao se aproximar desse valor conhecido, resultaria na maior proporção de tinta 2b naquela localização de profundidade.

Nesse sentido, a Fig.(13) abaixo mostra os resultados obtidos nesse caso de cruzamento de tintas de cor preta.

No cruzamento em que o traço da “caneta 1a” está abaixo do traço da “caneta 2b”, a variação das proporções entre as intensidades dos picos, em função da profundidade, está representada no gráfico pela linha entre as figuras quadradas. Pode-se verificar que em regiões mais profundas o valor está em torno de 3,3±0,1, enquanto que logo acima da superfície do papel o valor tende a 2,4±0,1. Mesmo considerando o erro nas

Figura 11. Detalhe dos picos de interesse, com o tratamento matemático, do espectro Raman coletados para o traço de tinta da “caneta 2b” de cor preta, isoladamente. A reta de cor vermelha é a linha de base calculada para ambos os picos. As linhas pontilhadas mostram a região de pontos do espectro que entraram no cálculo da média da altura dos picos.

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medidas, encontrou-se uma função decrescente do valor da proporção, aproximando-se do valor da proporção entre os picos da tinta 2b. O valor médio da proporção na tinta 2b é de 2,3±0,1, encontrado através do mesmo estudo de profundidade, realizado fora do cruzamento, somente onde havia a tinta 2b (círculos preenchidos da Fig.(13)), em região próxima do cruzamento. Dessa forma, pode-se concluir que em regiões mais profundas encontra-se uma mistura com maior quantidade de tinta 1a, enquanto que na superfície encontra-se maior quantidade de tinta 2b.

O mesmo exame foi replicado no cruzamento inverso, ou seja, naquele em que o traço da “caneta 2b” está abaixo do traço da “caneta 1a”. Daí, o resultado deve ser ao contrário do exposto acima, como pode se notar no gráfico dos triângulos da Fig.(13). Neste caso, apesar da medida mais profunda ter sido feita a apenas 40 μm abaixo da superfície, nota-se claramente que em regiões mais profundas o valor é mais próximo do valor conhecido da proporção da tinta 2b, enquanto que ao se aproximar da superfície esse valor cresce, prevalecendo uma maior concentração da tinta 1a. Dessa maneira, a ordem cronológica de lançamento dos traços foi mais uma vez identificada com sucesso. 3.3. Cruzamento de traços – mapeamento bidimensional

No sentido de empregar outro método para a determinação da sequência cronológica de lançamentos em cruzamento de traços, novas medidas foram efetuadas nas proximidades e na própria região do cruzamento de traços entre duas tintas na tonalidade azul (“azul-2b/BIC-4cores” na vertical e “azul-7e/uni-ball” na horizontal). O objetivo era mapear toda a região e verificar qual tinta foi lançada posteriormente (veja na Fig.(14) a região mapeada). Assim, aproximadamente 20.000 espectros foram coletados com o foco, dado por uma objetiva de 20x, na superfície do papel. Salienta-se que, no cruzamento, como pode ser verificado na Fig.(14), os traços eram ortogonais entre si e as medidas foram feitas utilizando-se o laser de comprimento de onda de 514 nm.

Os espectros foram analisados utilizando-se o programa Wire3.2 (Renishaw, uK). Dessa forma, foi selecionado o modo “mapa através de componentes” (DCLS), o qual permite, através de uma superposição linear dos componentes do espectro, mostrar como resultado a identificação de qual espectro melhor representa os espectros selecionados. Nesse caso, selecionaram-se três espectros como padrões de comparação: um espectro individual da tinta azul-2b, um espectro individual da tinta azul-7e e um espectro das fibras da folha de papel, todos coletados na região próxima do cruzamento.

Figura 13. Proporções entre as intensidades normalizadas dos picos de interesse dos espectros Raman da Fig.(10), realizados nos cruzamentos de traços, em função das profundidades das medidas. Enquanto as figuras quadradas vazadas (�) representam as medidas no cruzamento em que o traço da “caneta 1a” está abaixo do traço da “caneta 2b”, as figuras triangulares vazadas (Δ) representam as medidas no cruzamento em que o traço da “caneta 2b” está abaixo do traço da “caneta 1a”. As figuras circulares preenchidas (·) representam as medidas no traço da “caneta 2b” isoladamente.

As Figuras (15), (16) e (17) mostram, nas cores azul e amarelo, o principal componente da análise da correlação dos espectros Raman do mapeamento 2D com, respectivamente, o espectro Raman da tinta da “caneta 7e” (Fig.(15)), das fibras do papel (Fig.(16)) e da tinta da “caneta 2b” (Fig.(17)). Ainda, a Figura (18) mostra graficamente o resultado final da análise de correlação dos espectros Raman dos três padrões selecionados com os 20.000 espectros Raman do mapeamento 2D. Podemos inferir dessa figura que a tinta 2b (em amarelo) está sobre a tinta da “caneta 7e” (em azul), corroborando, assim, o novo método de análise proposto para determinar a sequência cronológica de linhas em cruzamentos de traços, ou seja, qual traço foi escrito primeiro.

Figura 12. Detalhe dos picos de interesse, com o tratamento matemático, do espectro Raman coletados para o traço de tinta da “caneta 1a” de cor preta, isoladamente. A reta de cor vermelha é a linha de base calculada para ambos os picos. As linhas pontilhadas mostram a região de pontos do espectro que entraram no cálculo da média da altura dos picos.

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Figura 18. Composição das principais componentes da análise da correlação dos espectros Raman do mapeamento 2D com os espectros Raman isolados das fibras do papel (agora na cor verde) e das tintas azuis das canetas 7e (azul) e 2b (amarelo).

4. CONCLuSÕES E PERSPECTIvAS

Os espectros Raman coletados para uma mesma tinta de caneta apresentam excelente reprodutibilidade quando medidos nos traços produzidos em três direções

(horizontal, vertical e inclinado), bem como em diversas posições.

Os resultados apresentados mostram que a espectroscopia Raman pode ser usada para identificar e distinguir tintas com pequenas variações na composição química, com especial destaque para a tonalidade preta, cuja análise é difícil e delicada por outras técnicas de análise.

No que concerne ao estudo do cruzamento de traços de tintas, dois tipos de análise foram apresentados e discutidos, mostrando-se que essa técnica pode ser usada para se determinar uma sequência cronológica de traços. Entretanto, é necessário que as tintas possuam composições químicas diferentes. Contudo, é evidente que ainda há muitas questões a serem abordadas para uma completa investigação, tais como o efeito de diferentes papéis como substratos e da pressão da caneta utilizada na escrita, por exemplo.

A análise forense de tintas em documentos requer uma série de características que vão ao encontro daquelas inerentes ao instrumento Raman, tais como: microscópio para visualização e medição da amostra; baixa potência do laser que evita danos ao material analisado; variados comprimentos de onda de laseres para ampliar o leque de

Figura 14. Região próxima ao cruzamento de traços das tintas de cor azul das canetas 7e (horizontal) e 2b (vertical), ampliada através da objetiva de 20x, onde foi realizado o mapeamento 2D de espectros Raman.

Figura 15. Principal componente da análise da correlação dos espectros Raman do mapeamento 2D com o espectro Raman da tinta da “caneta 7e” (horizontal), em azul claro.

Figura 16. Principal componente da análise da correlação dos espectros Raman do mapeamento 2D com o espectro Raman da fibra do papel, em azul claro.

Figura 17. Principal componente da análise da correlação dos espectros Raman do mapeamento 2D com o espectro Raman da tinta da “caneta 2b” (vertical), em amarelo.

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aplicações; e extensa biblioteca de resultados de espectros para comparação e identificação direta de materiais. Dessa forma, a Espectroscopia Raman apresenta-se como uma técnica promissora para o desenvolvimento da análise forense em documentoscopia.

No futuro, espera-se utilizar a espectroscopia Raman para criar uma extensa biblioteca de tintas de canetas, de impressoras, de carimbos, etc. Ainda, pretende-se elaborar protocolos para exames documentoscópicos, tanto na identificação e classificação de diversos tipos de tintas, bem como na determinação da sequência cronológica de traços em cruzamentos de tintas.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem aos seguintes colegas de trabalho, peritos criminais do Instituto de Criminalística da Polícia Civil do Distrito Federal – IC/PCDF, pelo apoio e incentivo à realização deste trabalho: Sr. Celso Nenevê (Diretor), Sra. Ivete Shimabuko (Diretora da Divisão de Perícias Internas), Sra. Fátima Soraggi (Chefe da Seção de Perícias Documentoscópicas) e Sr.Clemilton Cavalcante.

REFERêNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

[1] J. Del Picchia Filho; C.M.R. Del Picchia and A.M.G. Del Picchia. Tratado de Documentoscopia: da falsidade documental. 2ª edição, Editora Pillares (2006) 400-401.[2] J. Zieba-Palus; M. Kunicki. Application of the micro-FTIR spectroscopy, Raman spectroscopy and XRF method examination of inks. Forensic Sci Int, 158: 164-172 (2006).[3] F.A. Morsy; S.I. El-sherbiny; M. Awadalla. A systematic approach to Egyptian ballpoint ink analysis for forensic science application. Forensic Sci Int, 4: 1-13 (2005).[4] 15th International Forensic Science Symposium – Interpol – Lyon, 2007.[5] Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941. Código de Processo Penal, Artigos 170 e 181, Brasil (2009).[6] M. Claybourn; M. Ansell; using Raman Spectroscopy to solve crime: inks, questioned documents and fraud. Sci Justice, 40: 261-271 (2000).

J.A. gOMES / REVISTA BRASILEIRA DE CRIMINALÍSTICA, V. 1, N.1, 22-30 (2011)

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A. TONIETTO / REVISTA BRASILEIRA DE CRIMINALÍSTICA, V. 1, N.1, 31-38 (2011)

Valoração de danos nos casos de mineração de ferro no Brasil

A. Tonietto a*, J.J.M.C. Silva b

a Seção de Meio Ambiente, Instituto de Criminalística, Superintendência de Polícia Técnico-Científica, Goiânia (GO), Brasil.b Área de Licenciamento Ambiental, IBAMA, Brasilia (DF), Brasil.

*Endereço de e-mail para correspondência: [email protected].: +55-62-32019574; fax: +55-62-32011289.Recebido em 24/05/2011; Revisado em 24/08/2011; Aceito em 08/09/2011.

RESuMO

No Brasil, a mineração de ferro representa mais de 60% do valor total da produção mineral. Este setor da economia gera grandes impactos ambientais na região do Quadrilátro Ferrífero-MG, onde ocorre grande parte da extração de ferro. Trata-se de uma região de Bioma Mata Atlântica, o qual é considerado Patrimônio Nacional e sua vegetação tem lei específica de proteção e uso. O problema associado às mineradoras de ferro está na realização de atividades em desrespeito às licenças emitidas e/ou o não cumprimento do Plano de Recuperação de áreas Degradadas. Conforme a Lei de Crimes Ambientais, essa prática configura crime ambiental, com pena de detenção e multa. Para a edição da multa citada na referida lei, é necessário que se proceda à valoração dos danos ambientais causados. Vários são os métodos de valoração de danos disponíveis na literatura. Entretanto, muitos são de difícil aplicabilidade por implicarem em altos custos e longo tempo de execução. Para efeitos de perícia ambiental criminal, é necessário que o método aplicado seja de rápida execução, simples, barato e que obedeça ao princípio da proporcionalidade. Assim, este trabalho teve por objetivo propor um método de valoração de danos nos casos de não cumprimento das exigências da licença ambiental concedida às mineradoras de ferro com lavra em região de Mata Atlântica. O método proposto apresenta uma parcela objetiva, uma parcela subjetiva, e uma parcela de lucro cessante, e, por ser simples, visa à imediata aplicabilidade em perícias ambientais criminais.

Palavras-chave: mineração de ferro, Mata Atlântica, valoração de danos ambientais, perícia, multa.

ABSTRACT

In Brazil, iron mining represents more than 60% of mineral production total value. This economy section generates large environmental impacts in Quadrilátro Ferrífero region, Minas Gerais state, where much of iron extraction occurs. This is an Atlantic Forest Biome region, which is considered National Patrimony and its vegetation has a specific law regarding protection and use. The problem associated with iron mining is related to activities performed in disagreement to provided Licenses and/or Degraded Areas Rehabilitation Plan nonfulfillment. According Brazilian Environmental Crimes Law, this practice sets environmental crime, penalized with detention and fine. For the fine edition cited in that law, it is necessary to proceed to an environmental damage valuation. Even though the availability of several environmental damage valuation methods described in the literature, many of them are complex, implying high costs and long execution time. For environmental crime purposes, it is necessary a faster, simpler and cheaper method that is also in accordance with the proportionality principle. This study aimed to propose a damage valuation method for those cases in which License requirements are not accomplished by iron mining companies in Atlantic forest exploitation region. The proposed method presents three parts: an objective, a subjective, and an outgoing profit, and, for being simple, intends to its immediate applicability in forensic environmental crime.

Keywords: iron minig, Atlantic Forest, environmental damage valuation, expertise, penalty.

1. INTRODuÇÃO

Valorar para valorizar os recursos ambientais brasileiros tem sido uma das missões do desenvolvimento em bases sustentáveis que o Brasil elegeu após o retorno à democracia em 1988. O conceito de desenvolvimento sustentável está legalmente contemplado desde 1981, com a Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938, de 1981). Segundo a referida lei, a Política Nacional do Meio Ambiente visa à compatibilização do desenvolvimento econômico-social com a preservação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico. Em outras palavras, é a satisfação das necessidades do presente sem comprometer a capacidade das futuras gerações.

Dentre os recursos ambientais, no Brasil, os

recursos minerais têm um lugar de destaque. O ferro, por exemplo, é um importante produto de exportação na balança comercial brasileira [1]. Considerando que o desenvolvimento sustentável deve levar em conta os impactos na sociedade, na economia e no ambiente, qualquer explotação tem que ter todos esses efeitos valorados.

O ferro é um dos elementos mais abundantes da crosta terrestre e também o mais explotado entre todos os metais. Os principais minerais que contêm ferro são: hematita (Fe2O3), magnetita (Fe3O4), goethita (FeO/OH) e siderita (FeCO3). As formações ferríferas compostas de hematita e sílica, denominadas itabiritos, constituem os maiores depósitos de ferro. Do total de minério de ferro produzido, 99% são utilizados na fabricação de aço e

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ferro fundido [1].As reservas medidas e indicadas no Brasil

totalizam 28,9 bilhões de toneladas de minério, distribuídas nos estados de Minas Gerais, Pará, Mato Grosso do Sul, Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Goiás, Pernambuco, Rio Grande do Norte e São Paulo. Entretanto, a maior parte está concentrada nos três primeiros estados mencionados, correspondendo a 67%, 16% e 15,5%, respectivamente. Por deter 7,2% das reservas mundiais, o Brasil ocupa o quinto lugar entre os países detentores de maiores quantidades de minério. Além da grande quantidade, os minérios brasileiros também são considerados de alta qualidade, devido aos altos teores de ferro [1].

No Brasil, a mineração é uma das atividades econômicas mais importantes [2]. Em 2000, o país era o segundo maior produtor mundial de minério de ferro [2]. Em 2008, a produção brasileira de minério de ferro totalizou 351,2 milhões de toneladas. Nesse ano, o valor da produção atingiu 27,7 bilhões de reais, representando 61,2% do valor total da produção mineral brasileira [1]. Mas, ainda que economicamente importante, ela causa impactos negativos nas esferas social (como as condições subumanas dos seus trabalhadores, a prostituição de menores, a questão da destruição das terras indígenas, a agressão à saúde humana) e ambiental (poluição dos recursos hídricos, assoreamento, destruição da fauna e da flora) [2].

A produção de minério de ferro no Brasil se desenvolve em minas a céu aberto [1]. A metade dessas minas de grande porte situa-se nos estados de Minas Gerais – na região denominada como Quadrilátero Ferrífero (Itabira, Mariana, Rio Piracicaba, Itabirito, Barão de Cocais) –, do Pará (na Serra de Carajás) e do Mato Grosso do Sul (nos municípios de Corumbá e Ladário) [3] - [5], sendo o Quadrilátero Ferrífero uma das principais regiões produtoras de minério de ferro do mundo [6]. Apesar de as minas de ferro e manganês da Serra de Carajás-PA serem consideradas modelo mundial de equilíbrio entre a atividade de mineração e a preservação ambiental [6], é o setor da mineração de ferro que tem o maior potencial de geração de impactos ambientais na região do Quadrilátero Ferrífero [7].

Considera-se impacto ambiental toda reação que provoque um desequilíbrio das relações constitutivas do ambiente. uma ação pode causar danos diretos ao meio ambiente e destes, surgirem impactos que, em geral, resultam em novos danos. Neste último caso, danos indiretos. Assim o dano ambiental caracteriza-se por prejuízos diretos e indiretos ao meio ambiente [8].

As atividades mineradoras causam danos diretos ao meio ambiente que se refletem em impactos e danos indiretos. Antes de se proceder à valoração destes danos ambientais, é necessário graduar ou qualificar os impactos ambientais causados, ou seja, é preciso identificar as alterações que provocaram o desequilíbrio das relações constitutivas do meio ambiente – aquelas alterações

que ultrapassaram a resiliência e a resistência daquele ecossistema afetado. Os impactos podem ser diretos ou indiretos, curtos ou de longo prazo, reversíveis ou irreversíveis. Determinado ecossistema pode apresentar maior ou menor resistência ao impacto em questão. A resistência apresentada por determinado ecossistema é função da sua capacidade de resiliência [8].

Após a qualificação do impacto ambiental, passa-se à valoração do dano decorrente. A valoração de danos nos locais de extração mineral possui desafios. Cada mina é única na sua essência, pois está inserida em um ecossistema específico, com clima, geologia, geomorfologia, solo, cobertura vegetal e fauna específicos da localidade afetada [9]. Portanto, em se tratando de valoração de danos nos casos de mineração, cada área deve ser valorada de forma única, conforme suas características particulares.

A literatura oferece vários métodos de valoração de danos. O método mais adequado será função do tipo, magnitude e localização do dano em questão, ou seja, a adoção do método dependerá do objetivo da valoração [10]. Cada método de valoração possui suas vantagens e desvantagens cabendo ao avaliador entender todas elas antes de fazer a sua escolha.

Os métodos de valoração de danos baseiam-se na tentativa de fornecer um valor econômico relacionado aos recursos e serviços ambientais perdidos ou danificados. Esse valor pode ser desagregado em valor de uso – que pode ser direto, indireto e de opção – e valor de não uso, ou seja, o valor de existência, um conceito muito próximo ao conceito do valor de estimação. Eles podem ser métodos diretos de valoração ou métodos indiretos de valoração. Entre os frequentemente citados estão os métodos de Produtividade Marginal, de Custos Evitados, de Custos de Controle, de Custos de Reposição e de Custos de Oportunidade – correspondendo aos métodos indiretos de valoração – e os métodos de Avaliação Contingente, de Preços Hedônicos e de Custo de Viagem – métodos diretos de valoração [10]-[12].

Em geral, os métodos diretos de valoração (Avaliação Contingente, Preços Hedônicos e Custo de Viagem) são dispendiosos e demorados e nem sempre se justificam. Principalmente nos casos de perícia ambiental criminal ou para efeito de aplicação de multas, onde devem ser preferidos métodos que permitam o atendimento de prazos legais e administrativos e que estejam dentro do orçamento das instituições de perícia e fiscalização. Em geral, os danos podem ser avaliados utilizando métodos simplificados e de baixo custo [13]. Contudo, estes métodos devem obedecer aos critérios de simplicidade, reconhecimento legal, transparência e proporcionalidade [14].

No processo de licenciamento de uma jazida podem ocorrer irregularidades que vão desde a não execução de medidas mitigadoras apontadas no Estudo de Impacto Ambiental (EIA) até a execução de atividades em desrespeito às licenças emitidas (Licença

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Prévia, Licença de Instalação e Licença de Operação). De acordo com o artigo 55 da Lei 9.605, de 1998, configura crime ambiental “executar pesquisa, lavra ou extração de recursos minerais sem a competente autorização, permissão, concessão ou licença, ou em desacordo com a obtida” e aqueles que deixam de recuperar a área pesquisada ou explorada, nos termos da autorização, permissão, concessão ou licença, também podem incorrer na mesma pena (detenção, de seis meses a um ano, e multa).

Como mostrado, as intervenções ambientais, hoje, devem ser parte integrante dos projetos de extração mineral. Entretanto, as empresas de mineração continuam com práticas de recuperação de curto prazo, mesmo após o advento da exigência do PRAD (Plano de Recuperação de Áreas Degradadas) nos processos de licenciamento ambiental [15]. Essas práticas de curto prazo consistem, geralmente, na transposição de solo, plantio de espécies pioneiras e um curto período de avaliação. O PRAD tende a apresentar técnicas que demandariam acompanhamento a longo prazo. Contudo, recuperação, no Brasil, não necessita de um retorno ao status quo ante, ou seja, não é, necessariamente, uma restauração do ambiente, podendo, inclusive, o uso de espécies exóticas, conforme entendimentos contidos no art. 2° da Lei 9.985, de 2000. O PRAD, por ser exigência do Licenciamento Ambiental, é incorporado ao procedimento na fase prévia (fase de Licença Prévia). Contudo, depende de monitoramento do empreendedor – cobrado pelo orgão ambiental competente – para que seja cumprido conforme as exigências. Portanto, a empresa que desrespeita estas diretrizes, ou seja, que não faz a intervenção ambiental como previsto, pode ser multada e responder civil e criminalmente por danos ao meio ambiente.

As áreas degradadas em desacordo com a licença obtida pela empresa devem ser periciadas com a conseqüente fixação do montante do prejuízo causado, conforme o artigo 19 da Lei 9.605, de 1998 (perícia de constatação do dano ambiental), para que seja possível calcular valores de fiança e multa. Assim, é fundamental que a valoração de danos ambientais causados pelo não cumprimento das exigências da licença ambiental concedida às mineradoras de ferro seja feita com base em metodologias funcionais, que resultem em fixação de multa coerente com o crime ambiental causado, a fim de cumprir sua função educativa. Contudo, a destinação desta multa será para o fundo penitenciário.

Considerando que a maioria das minas de extração de ferro situa-se em Minas Gerais, o objetivo deste artigo é propor um método de valoração de danos para os casos de não cumprimento das exigências da licença ambiental concedida às mineradoras de ferro com lavra em região de Mata Atlântica. Método este que possa ser aplicado em perícias ambientais criminais. O método aqui apresentado baseia-se no método Custo de Restauração, praticado atualmente pela perícia da Polícia

Civil do Distrito Federal [13], [16].

2. METODOLOGIA

Para a elaboração deste trabalho, foram consultados artigos científicos publicados em revistas brasileiras, bem como dissertações de Mestrado e teses de Doutorado depositadas em bibliotecas digitais de universidades brasileiras e livros relacionados ao tema. Foram consultados cerca de 150 trabalhos para inicialmente entender a problemática relacionada ao tema e, então, viabilizar a proposição de uma metodologia de valoração de danos nos casos de mineração de ferro em regiões de Mata Atlântica.

Os valores monetários aqui apresentados foram baseados em sítios disponíveis na internet. O método de avaliação pelo Custo de Restauração leva em conta três parcelas: uma objetiva, uma subjetiva e uma relacionada ao lucro cessante (que considera o fator tempo). A parcela objetiva corresponde ao custo de restauração imediato, e é de fácil identificação. Nesta parcela estão a recomposição da topografia, a reposição da camada fértil do solo e o replantio da cobertura vegetal. Para o cálculo da parcela objetiva do dano, foi estabelecido como valor o preço de mercado de mudas de espécies nativas do Bioma Mata Atlântica, considerando espécies pioneiras e não pioneiras, e o preço de mercado relativo à aquisição de terra, regularização da morfologia do solo e outros serviços, baseados em tabela utilizada pelo Departamento de Estradas de Rodagem, bem como o preço de mercado de fertilizantes e corretivos químicos. Os preços das mudas de espécies nativas da Mata Atlântica foram consultados em sítios de viveiros do estado de Minas Gerais, e os preços relacionados à recomposição topográfica e da camada fértil do solo foram obtidos no portal do Governo da Paraíba (tabela de valores com vigência de abril a junho de 2010).

A parcela subjetiva é representada por fatores de correção específicos para determinada fitofisionomia e determinado tipo de vegetação de Mata Atlântica, conforme for o caso em questão. Esses fatores de correção foram estipulados com base na Lei 11.428, de 2006 (Lei da Mata Atlântica).

O índice de correção relacionado à variável tempo (correspondente ao lucro cessante) foi estabelecido com base na taxa atual de juros de flutuação do mercado, que varia de 6% a 12% anuais. O método não tem a função punitiva; apenas considera o custo de restauração da área. Para fins de punição, o Ministério Público pode propor a multiplicação do valor obtido por um fator qualquer, a critério dele.

3. RESuLTADOS E DISCuSSÃO

3.1. Mineração de ferro

O estado de Minas Gerais possui um grande potencial minerário. Em função disso, os problemas ambientais decorrentes das atividades de extração mineral são relevantes, especialmente na região do Quadrilátero

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Ferrífero, onde se concentra grande parte das atividades de mineração no estado [17]. O Quadrilátero Ferrífero é uma região montanhosa, localizada entre os Biomas Mata Atlântica e Cerrado – ambos considerados hotspots [18], [19] – e que apresenta potencial minerário para ferro, ouro, manganês, alumínio e topázio [20].

A mineração de ferro no Brasil, sozinha, representa mais de 50% do valor total da produção mineral brasileira, em Reais. Devido ao potencial da região do Quadrilátero Ferrífero para extração de minério, grande parte das terras e dos remanescentes de Mata Atlântica pertence a empresas mineradoras [21]. Considerando o alto grau de ameaça que existe em relação a esse Bioma, especificamente na região do Quadrilátero Ferrífero, é fundamental a aplicação de multas proporcionais ao dano ambiental causado, visando garantir uma proporcionalidade entre a multa aplicada e o dano ambiental.

A Constituição Federal de 1988 diz que é competência comum da união, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios fiscalizar as concessões de direitos de pesquisa e exploração de recursos minerais (art. 23, XI, CF/88) e complementa, de forma explícita, com a obrigação de recuperar o meio ambiente degradado (art. 225, § 2º, CF/88). Tratam-se dos princípios do poluidor-pagador e usuário-pagador. Na esfera cível, também existe a obrigação de reparar o dano ambiental causado, que pode ser cobrada do usuário do recurso mineral ou do poluidor, independentemente de culpa ou dolo.

Quanto às sanções em matéria ambiental, a Lei 9.605, de 1998, nos artigos 54, § 3º, e 55, prevê penas para aqueles que deixarem de cumprir exigências da autoridade competente nos casos de risco ou dano ambiental grave ou irreversível. Portanto, os projetos desenvolvimentistas da mineração de ferro também estão sujeitos ao cumprimento da legislação ambiental brasileira.

No caso de atividades de mineração, é necessário o prévio licenciamento pelo órgão ambiental competente (art. 10 da Lei 6.938, de 1981). O pedido de licenciamento ambiental deve apresentar todas as informações técnicas a respeito do empreendimento, bem como o Estudo de Impacto Ambiental e seu respectivo Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) (art. 225, §§ 1º e 2º, inciso IV, da Constituição Federal e Resolução CONAMA nº 01, de 1986). Além do EIA/RIMA, deve ser apresentado um Plano de Recuperação de Área Degradada (PRAD), considerando o impacto da atividade de mineração. Este deve ser implementado ao final da exploração, visando o retorno a uma forma de uso do solo e estabilidade do meio ambiente (art. 2º, VII, da Lei 6.938/81, regulamentado pelo Decreto 97.632/89). Como a atividade mineradora é extremamente impactante, o meio ambiente é raramente preservado. Assim, a reparação ao status quo ante, ou seja, a restauração, é bastante difícil. Por este motivo, as exigências do licenciamento ambiental são, em sua

maioria, de natureza compensatória [22].

3.2. Mineração em região Mata Atlântica

O Bioma Mata Atlântica, considerado Patrimônio Nacional pela Constituição Federal de 1988 (art. 225, § 4º), é o único Bioma brasileiro que possui legislação específica e tem mais de três quartos de sua flora degradados. A lei 11.428, de 2006, dispõe sobre a conservação, proteção, regeneração e utilização da vegetação nativa desse Bioma. De acordo com seu artigo 2º, as formações florestais nativas e ecossistemas associados são Floresta Ombrófila Densa, Floresta Ombrófila Mista (ou Mata de Araucárias), Floresta Ombrófila Aberta, Floresta Estacional Semidecidual, Floresta Estacional Decidual, os manguezais, as vegetações de restingas, os campos de altitude, os brejos interioranos e os encraves florestais do Nordeste.

A referida lei, em seu artigo 6º, parágrafo único, deixa explícito que a utilização da Mata Atlântica deve observar, dentre outros princípios, o princípio do usuário-pagador. As mineradoras, portanto, devem possuir mecanismos de compensação social, econômica e ambiental em função da atividade que exercem. Neste caso, esses mecanismos devem constar no Estudo de Impacto Ambiental, no Relatório de Impacto Ambiental e no Plano de Recuperação de áreas Degradadas. Assim, de acordo com de Almeida [13], a valoração dos danos ambientais baseia-se no licenciamento ambiental, pois este é o instrumento que define restrições e condições para a proteção do meio ambiente. Ao deixarem de cumprir com o acordado, portanto, as mineradoras incorrem em crime ambiental, e os danos causados devem, consequentemente, ser valorados pela perícia criminal ambiental.

Ressalte-se que a avaliação dos danos limita-se às alterações causadas no meio ambiente que direta ou indiretamente causaram uma degradação ambiental, não considerando a avaliação do meio ambiente em si. Ou seja, não é o meio ambiente que é avaliado, mas o custo das ações necessárias para retornar o ambiente alterado à condição mais próxima à anterior [13]. 3.3. Valoração de danos decorrentes da mineração de ferro

Vários são os métodos de valoração de danos. Entretanto, para efeito de perícia oficial, o método a ser adotado deve ser prático, de rápida execução, de fácil compreensão e baixo custo, considerando o volume de demanda e os reduzidos recursos dos órgãos responsáveis pelos laudos ambientais [14]. E, acima de tudo, o método adotado deve valer-se do princípio da proporcionalidade, o qual dita que quanto maior for a degradação, maior o valor final do custo total para restauração do dano apurado [23].

O método aqui proposto, assim como os métodos já descritos na literatura, apresenta uma parcela objetiva,

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uma parcela subjetiva e uma parcela que é função do tempo. Esta última sempre decorre dos impactos da primeira, e, portanto, é de mais difícil mensuração. A parcela objetiva do método compreende o custo mínimo de reparação do dano, que compreende a devolução da terra retirada com vistas à recomposição topográfica e da camada fértil do solo, seguido pelo plantio de mudas em número e espécie compatível com o cenário anterior [13]. A parcela subjetiva, por ser de difícil mensuração, sujeita-se ao critério de subjetividade admitido pelo avaliador. Essa parcela subjetiva compreende, por exemplo, a complexidade do ecossistema degradado. Por fim, considera-se o tempo durante o qual a área ficou sob o efeito da degradação [13]. um critério para considerar o efeito dos danos diretos e indiretos no tempo seria a correção dos valores apurados utilizando-se a taxa bancária de juros. Este valor ainda é passível de alteração em juízo, por acordo entre as partes. Por exemplo, ao invés de ser considerada a taxa de juros de um empréstimo, sugerida em laudo pericial, pode ser admitida a taxa de juros da poupança, se determinado pelo juiz.

A Tabela (1) apresenta algumas espécies nativas da Mata Atlântica com a respectiva densidade de ocorrência. Todas as mudas das espécies consideradas são vendidas a dois reais cada, podendo esse valor ser inferior se forem adquiridas mais de 5000 mudas na mesma compra. A densidade de cada uma dessas espécies se faz importante para efeitos de cálculo do dano ambiental. Quanto maior a ocorrência daquela espécie por metro quadrado, maior será a quantidade de mudas a serem compradas para a restauração da área degrada.

A variável regularização da morfologia do solo, ou recomposição topográfica, é incorporada no cálculo por ser fundamental para a estabilização da paisagem. Nos casos de recuperação da área degradada, a recomposição topográfica seria a primeira e mais importante etapa, pois é sobre ela que as etapas seguintes ocorrem, incluindo o desenvolvimento da comunidade vegetal. Após essa etapa, a reposição de macro e micronutrientes se daria logo em seguida, pois a extração de minério de ferro representa a retirada dos minerais do solo, que, portanto, devem ser reintroduzidos artificialmente [30]. Segundo Furtini Neto et al. [31], a demanda das plantas por nutrientes é mais intensa nos estágios iniciais de desenvolvimento.

Tanto a Tab.(1) quanto a Tab.(2) apresentam os valores relacionados ao Custo de Reparação Objetivo (CRO). O valor final do CRO, portanto, é dado por:

CRO = (quantidade de mudas em função da densidade de sua ocorrência na natureza) + regularização da morfologia do solo + (fertilizantes x quantidade) + (corretivos químicos para o solo x quantidade).

Os fatores relacionados ao Custo de Restauração Subjetivo (CRS) levam em consideração a fitofisionomia de Mata Atlântica afetada (Tab.(3)) e o tipo de vegetação de Mata Atlântica que sofreu o dano ambiental (Tab.(4)), de forma que, como aqui proposto, aquele que degradou uma área de maior importância ecológica, raridade ou grau de preservação, tenha causado um prejuízo maior do que aquele que desmatou uma área já degradada ou de menor impacto ecológico indireto.

Para a parcela subjetiva, a escolha dos respectivos fatores de correção (Tab.(4)) foi baseada no artigo 8º da lei

Nome científico Nome popular Família Densidade / 2.500 m2

Cariniana estrellensis Jequitibá-branco Lecythidaceae 10

Cedrela fissilis Cedro rosa Meliaceae 20

Copaifera langsdorffii Copaíba Caesalpiniaceae 10

Croton urucurana* Sangra D’água Euphorbiaceae 5

Genipa americana Genipapo Rubiaceae 22

Hymenaea courbaril Jatobá Caesalpiniaceae 20

Peltophorum dubium** Canafístula Caesalpiniaceae 20,75

Pterogyne nitens* Amendoim bravo Caesalpiniaceae 28

Enterolobium contortisiliquum** Timboril/Timbaúva Mimosaceae 19,5

As espécies com (*) representam as espécies pioneiras. As espécies com (**) são consideradas espécies secundárias iniciais (Fonte: Ianelli-Sérvin, [24]; Nogueira Júnior, [25]; Campos & Landgraff [26]; Oliveira et al. [27], Veiga et al. [28], Longhi et al. [29]).

Tabela 1. Valores adotados na avaliação de danos ambientais em região de Mata Atlântica para espécies arbóreas nativas.

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11.428, de 2006, no qual consta que o corte e a supressão da vegetação do Bioma Mata Atlântica devem ser feitos de maneira diferenciada para vegetação primária ou secundária e ainda considerar o estágio de regeneração da vegetação secundária. Nesse caso, o CRS (custo de restauração subjetivo) é obtido a partir da multiplicação entre o fator de correção para a fitofisionomia e o fator de correção em função da vegetação nativa.

A variável tempo – correspondente ao tempo decorrido entre o dano ambiental e a data em que a área começa a ser restaurada e ao tempo necessário para que as mudas atinjam altura e densidade próximas à condição anterior ao dano – baseia-se no tempo mínimo para restabelecimento da altura florestal próxima à altura da mata antes da ocorrência do dano e com densidade de indivíduos semelhante. De acordo com Thoen [32], esse tempo corresponde a 10 anos. Essa variável é incorporada na forma de lucro cessante, ou seja, o tempo em que os serviços ambientais deixam de ser fornecidos – entre a data em que ocorreu o dano e a data em que

a área começa a ser restaurada – somado ao tempo necessário para o restabelecimento de uma condição mínima semelhante à condição original (neste caso, 10 anos).

VT = CRO x CRS x tempo decorrido entre o dano e a restauração x 1.06n (taxa atual de juros anual de flutuação do mercado elevado ao número de meses).

CRS = fator de correção para a fitofisionomia x fator de correção em função da vegetação nativa.

VT = valor total.

Se a exploração ilegal do minério de ferro ocorrer nas hipóteses listadas no artigo 11 da lei 11.428, de 2006, o valor total do dano ambiental deve considerar mais um fator de correção, sugerido aqui que seja proporcional à quantidade de minério retirada ilegalmente (Custo de Restauração Objetivo 2, CRO2). Nesse contexto, o cálculo deve incluir os custos para a reposição de todo o

Descrição Custo (R$)

Regularização da morfologia do solo

Transporte de solo/areia em caminhão basculante (t.Km) 0,74

Material adicional (solo) para terraplenagem (m3) 4,44

Recomposição de camada fértil do solo (m3) 2,54

Plantio de arvore/arbustos nativos (m2) 8,53

FertilizantesFertilizante de liberação controlada (NPK*)

(22,5 Kg)349,90

Corretivos químicos Calcário dolomítico (t) 16,00* (N) nitrogênio, (P) fósforo e (K) potássio (macronutrientes).Fonte: http://www.der.pb.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=32&Itemid=86; http://www.mfrural.com.br/;http://comprar-vender.mfrural.com.br/detalhe.aspx?cdp=43286&nmoca=corretivos-calcario-dolomitico;

Tabela 2. Valores adotados para a parcela objetiva relacionada à regularização da morfologia do solo e sua correção química.

Tabela 3. Fatores de correção para cada fitofisionomia de Mata Atlântica degradada.

Fitofisionomia Fator de correçãoFloresta Ombrófila Densa 1,5

Floresta Ombrófila Mista (ou Mata de Araucárias) e Floresta Ombrófila Aberta 2,0Estacional Semidecidual e Floresta Estacional Decidual 2,5

Campos de Altitude 3,0Brejos interioranos 3,5

Encraves 4,0Manguezal e Restinga 4,5

vegetação Fator de CorreçãoSecundária no estágio inicial de recuperação 1,0Secundária no estágio médio de recuperação 2,0

Secundária no estágio avançado de recuperação 3,0Primária 4,0

Tabela 4. Fatores de correção para o tipo de vegetação de Mata Atlântica que sofreu o dano ambiental

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volume retirado de forma ilegal, como mostrado abaixo:

CRO2 = [CRO + reposição do minério de ferro retirado em excesso (m3)] x o custo de movimentação.

VT = CRO2 x CRS x (1+6%) (taxa atual de juros anual de flutuação do mercado).

Assim, empresas que não atendem à compensação ambiental, prevista no licenciamento, e/ou que não realizam o PRAD após o esgotamento da mina ferem diretamente o artigo 32, II, da Lei 11.428, de 2006, que prevê recuperação de área equivalente à área do empreendimento, com as mesmas características ecológicas, na mesma bacia hidrográfica como medida compensatória, obrigação esta que deve ocorrer juntamente com a obrigação do disposto no artigo 36 da Lei no 9.985, de 2000, “apoiar a implantação e manutenção de unidade de conservação”.

É importante deixar claro que o objetivo da valoração do dano ambiental atém-se, apenas, ao fornecimento de um valor de referência para a definição de multa e penas. A valoração do dano não propõe ações de recuperação da área degradada. Essa proposição é função do órgão ambiental competente. A valoração deve considerar os preços de mercado de mudas cujas famílias são representativas em número de espécies e em abundância de indivíduos no Bioma Mata Atlântica. Também pode ser considerado o preço das mudas de espécies que sejam tolerantes a altas concentrações de metais pesados no substrato. Assim, o valor usado pode se basear no preço das mudas de espécies facilitadoras, tolerantes a altas concentrações de metais pesados no substrato e com crescimento clonal, espécies normalmente priorizadas na definição de programas de recuperação de áreas degradadas por mineração de ferro [33].

4. CONCLuSÕES

As sugestões de cálculo aqui apresentadas certamente não representam uma compensação ideal para o dano total causado por uma mineradora que deixa de cumprir parte do acordado na Licença Ambiental ou não cumpre o constante no Plano de Recuperação de Áreas Degradadas. A degradação de áreas nativas de Mata Atlântica, além do dano ambiental, também representa um dano social e econômico a partir do momento em que se considera o potencial biotecnológico de inúmeras espécies desconhecidas e ainda não pesquisadas e o valor econômico associado a esse potencial, como potencial biotecnológico relacionado à produção de novos fármacos, à redução de aditivos químicos na indústria alimentícia, à promoção do crescimento vegetal para realização de agricultura sustentável e tantos outros ainda desconhecidos. Entretanto, os cálculos apresentados são sugestões práticas e objetivas, de fácil aplicação na área pericial criminal, requisitos freqüentemente

exigidos pelos profissionais da área em virtude da grande demanda de trabalho e do tempo escasso para emissão dos laudos (prazo de 10 dias, conforme Decreto-Lei nº 3.689, de 1941).

Apesar de todo modelo proposto ser uma simplificação da realidade, o valor total calculado a partir das fórmulas propostas representa uma quantia expressiva a ser paga pela empresa causadora do dano. No caso, a responsabilidade civil pelo dano ambiental é objetiva, conforme artigo 14, § 1º, da Lei 6.938, de 1981. Assim, além da multa criminal, é possível que seja editada, também, a multa de cunho administrativo. Em se tratando de grandes empresas, as despesas com controle ambiental na atividade de mineração, incluindo a revegetação de áreas degradadas, são inferiores a 1% do custo de investimentos de uma grande lavra [34]. Informação esta que chama à responsabilidade a perícia ambiental oficial no sentido de incorporar variáveis tantas quantas forem possíveis – sempre levando em consideração a praticidade, objetividade e simplicidade – a fim de edição de multa em valor que mostre ao minerador pelo menos parte do valor que o meio ambiente possui, e sua função seja, de fato, educativa.

Há alguns anos, os órgãos responsáveis pela regulamentação das minas de superfície têm priorizado metas de longo prazo, incluindo o uso futuro da terra [15]. Esse tipo de ação representa a integração, aos ecossistemas, de áreas com suas funções ecológicas recuperadas, permitindo o desenvolvimento econômico com menor passivo ambiental [33]. Para a incorporação do desenvolvimento sustentável nas grandes empresas de mineração, seria interessante emitir uma certificação para os minerais produzidos em consonância com as normas de controle ambiental.

REFERêNCIAS

[1] C.A.G. Jesus. Ferro/Aço. In: Economia mineral do Brasil - 2009. Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), 2009. Disponível em: <http://www.dnpm.gov.br/conteudo.asp?IDSecao=68&IDPagina=1461> Acesso em: 09 jul. 2010.[2] M.L. Barreto. Mineração e desenvolvimento sustentável: desafios para o Brasil, CETEM/MCT, Brasil (2001) 215p.[3] J.C.F. Pinheiro. A mineração brasileira de ferro e a reestruturação do setor siderurgico. Tese de Doutorado, Instituto de Gociências, universidade Estadual de Campinas (2000). [4] L.P. Lamoso. A exploração do minério de ferro no Brasil e no Mato Grosso do Sul. Tese de Doutorado, Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, universidade de São Paulo (2001).[5] D.J. Germani. A Mineração no Brasil: relatório Final. Centro de Gestão e Estudos Estratégicos: Rio de Janeiro (2002) 79p.[6] E.R. Cabral; Institucionalização da questão ambiental e exploração mineral no Pará e Minas Gerais: valorização

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Efeito da escopolamina sobre o desenvolvimento de Chrysomya putoria (Diptera: Calliphoridae) e sua importância para a estimativa

do intervalo pós-morte

P.J. Thyssen*, M.D. GrellaDepartamento de Biologia Animal, Instituto de Biologia, UNICAMP, Campinas (SP), Brasil

* E-mail para correspondência: [email protected]. Tel.: +55-19-35216299.Recebido em 28/06/2011; Aceito em 01/09/2011

RESuMO

A presença de drogas nos tecidos de um corpo pode afetar o desenvolvimento de larvas de moscas necrófagas que são encontradas alimentando-se neste substrato. Essa observação já foi constatada para várias drogas tais como heroína, cocaína, certos analgésicos, e compostos anfetamínicos e benzodiazepínicos, entre outras. Assim, neste estudo investigamos o efeito da escopolamina – uma droga amplamente usada como analgésico – sobre a taxa de desenvolvimento de larvas de Chrysomya putoria (Diptera: Calliphoridae), visando também avaliar e quantificar as conseqüências de tal interferência para a estimativa do intervalo pós-morte (IPM). Os resultados aqui obtidos mostram claramente que a escopolamina afetou significativamente a taxa de desenvolvimento de imaturos de C. putoria, quando presente em seu substrato alimentar. Tendo em vista que o IPM em muitos casos é calculado levando em consideração o peso ou a idade dos imaturos coletados em um corpo, a não consideração deste fator de interferência negativa pode conseqüentemente levar a uma subestimativa do tempo de morte em até 48 horas, em certos casos.

Palavras-chave: Mosca varejeira; Entomologia Forense; Toxicologia; Brasil.

ABSTRACT

The presence of drugs in the tissues of a corpse may affect the development of the necrophagous fly larvae feeding on the body. This observation has already been reported for several drugs such as heroine, cocaine, several analgesics, and amphetamines and benzodiazepines compounds, among others. In this study we investigated the effect of scopolamine - a drug widely used as analgesic - on the rate of development of larvae of Chrysomya putoria (Diptera: Calliphoridae), to also evaluate and quantifying the consequences of this interference for estimating the postmortem interval (PMI). The results obtained here clearly show that scopolamine has significantly affected the developmental rate of the immatures of C. putoria, when present in their substrate. Since the PMI in many cases is calculated taking into account the weight or age of the immatures collected in a body, the failure to consider this factor of negative interference may therefore lead to an underestimation of the time of death up to 48 hours in certain cases.

Keywords: Blowfly; Forensic Entomology; Toxicology; Brazil.

1. INTRODuÇÃO

Corpos de animais em decomposição são fontes alimentares temporárias para diversos organismos tais como fungos, bactérias, artrópodes e até mesmo vertebrados [1]. Neste micro-habitat formado, os imaturos de dípteros e coleópteros (Insecta) são as Ordens predominantes durante quase toda a colonização [2].

Dentro do contexto forense, o estudo de insetos e outros artrópodes associado aos demais procedimentos periciais tem como principal propósito levantar informações e vestígios que possam ter valia para o andamento ou conclusão de um processo investigativo [3]. Desse modo, os dados entomológicos podem ser transformados em provas contundentes para a condenação ou refutação do álibi de um suspeito de crime ao demonstrar se houve, por exemplo, movimentação de um cadáver de um local para outro ou quando usados para estimar o intervalo pós-morte (IPM), ou seja, o

tempo decorrido desde a morte até a descoberta do corpo [4]-[5].

Atualmente, um ramo mais recente da entomologia forense – a Entomotoxicologia – tem revelado novas abordagens e alternativas para detecção de drogas ou toxinas em cadáveres, em especial àqueles que se apresentam em avançado estágio de decomposição e com suspeita de envenenamento, dada a não disponibilidade dos líquidos corporais como, por exemplo, sangue e urina, ou de tecidos moles, que constituem órgãos internos primariamente pesquisados para este fim [6]. Nesse caso, a identificação de uma substância que tenha sido consumida pela vítima antes do óbito pode ser obtida por meio do exame das larvas de insetos que são encontradas alimentando-se dos tecidos cadavéricos, uma vez que elas incorporam a substância em seus tecidos larvais por meio do processo metabólico pós-digestão. Entre as técnicas usualmente empregadas na identificação de substâncias, estão a cromatografia [7]

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e a imunohistoquímica [8]. Pelo fato de certas substâncias poderem afetar

o desenvolvimento das larvas ditas necrófagas, tal como fora registrado para heroína [9], cocaína [10], escopolamina [11], alguns analgésicos e compostos anfetamínicos e benzodiazepínicos [12]-[14], estudos que investigam e quantificam este grau de interferência sobre os aspectos biológicos de diferentes espécies ganham elevada importância. Isto porque o IPM estimado pelos métodos entomológicos na maioria das vezes usa como parâmetro o tempo de vida ou a idade do inseto, levando em conta as possíveis influências que pairam sobre este ciclo.

A escopolamina, comercialmente mais conhecida como Buscopan® (Boehringer Ingelheim), está entre os primeiros analgésicos de ampla utilização no Brasil atuando como depressor do sistema nervoso central [15]. Registros de intoxicação por esse alcalóide não são raros, tanto por ingestão deliberada quanto acidental, uma vez

que também se encontra incluído em demais preparações comerciais [16].

Neste estudo, investigamos o efeito da escopolamina sobre a taxa de desenvolvimento larval de Chrysomya putoria (Wiedemann) (Diptera: Calliphoridae), uma mosca assinalada como de importância forense na região Sudeste do Brasil [17], objetivando avaliar e quantificar as conseqüências de tal interferência para a estimativa do IPM.

2. METODOLOGIA

Os espécimes usados neste estudo foram obtidos de colônias de moscas adultas de C. putoria estabelecidas em laboratório, a partir de coletas em campo realizadas na área urbana do município de Campinas (22o54’02”S, 47o 03’39”O), Estado de São Paulo, Brasil. Para tanto foram usadas armadilhas adaptadas para este fim contendo iscas como peixe e vísceras de frango, as quais permaneceram expostas por um período de 24 h.

Após a coleta, os espécimes foram submetidos a baixas temperaturas (-20ºC durante 90 segundos) para permitir a correta triagem e identificação do organismo foco deste estudo [18], sendo então transferidos para gaiolas plásticas transparentes (30x30x50 cm), mantidas em sala climatizada (27±1ºC, 12 h de fotofase e 70±10% de uR), onde os adultos foram alimentados com solução açucarada e água ad libitum. uma porção de 50 g de carne bovina moída crua foi oferecida para as fêmeas para estimular a oviposição. Os ovos depositados pelas fêmeas foram mantidos sobre esse substrato até que as

Tabela 2. Intervalo de emergência (h) e taxa de viabilidade (%) de Chrysomya putoria em relação aos diferentes grupos experimen-tais. *No grupo 2 x DL a mortalidade de 100% dos indivíduos foi registrada no segundo estádio larval, assim os mesmos parâmetros

relatados para os demais grupos não puderam ser observados.

Grupos experimentais*

Intervalo de emergência (h)

Taxa de viabilidade (%)

Controle 254 95.60,25 x DL 252 93.20,5 x DL 288 76.21 x DL 312 69.2

Idade (h)Grupos experimentais

Controle 0,25 x DL 0,5 x DL 1 x DL 2 x DL

12 0,2±0,01 0,2±0,01 0,1±0,01 0,1±0,01 0,1±0,01

24 0,7±0,01 0,7±0,01 0,4±0,01 0,3±0,01 0,2±0,01

36 2,1±0,45 1,7±0,39 0,9±0,01 0,5±0,01 0,2±0,01

48 6,2±1,30 4,2±0,77 3,1±0,53 1,0±0,01 0,3±0,01

60 15,4±2,51 (a) 10,2±1,31 (a) 6,6±1,52 (a) 2,5±0,58 0,5±0,01 (d)

72 25,9±5,12 21,0±2,23 10,1±2,11 4,0±0,91 -

84 37,6±4,14 33,4±4,31 19,4±3,16 6,7±1,43 (a) -

96 41,1±5,87 39,8±2,17 28,7±3,71 10,9±3,02 -

108 49,0±1,93 45,6±2,76 35,6±3,94 16,7±4,92 -

120 46,2±2,60 (b) 44,5±3,50 (b) 38,6±3,53 20,6±8,10 -

132 46,1±4,95 44,5±2,51 43,4±2,45 24,0±6,76 -

144 42,1±2,64 39,3±2,05 39,9±3,28 (b) 24,6±5,47 -

156 35,6±3,83 (c) 35,5±1,14 (c) 42,7±2,89 23,1±5,56 -

168 - - 37,1±2,17 26,8±2,82 -

180 - - 32,9±2,50 (c) 28,9±1,60 (b) -

192 - - - 28,6±2,96 -

204 - - - 24,9±4,29 (c) -

Tabela 1. Médias para o peso registrado (mg) (x±SD) a cada 12 h durante o desenvolvimento larval de Chrysomya putoria exposta às diferentes concentrações de escopolamina e em relação ao grupo controle, onde (a) representa o fim do segundo estádio larval; (b) marca o fim do terceiro estádio larval; (c) início da fase de pupa; e (d) 100% de mortalidade dos indivíduos no segundo estádio.

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larvas eclodissem, permitindo assim iniciar a montagem dos grupos experimentais.

Considerando que a dose letal (DL) de escopolamina para o homem é de 1270 mg/kg, quatro grupos experimentais foram montados com as seguintes concentrações: 0,25 x DL; 0,5 x DL; 1 x DL e 2 x DL. Paralelamente um grupo controle, sem adição da droga, foi mantido sob as mesmas condições para avaliar o efeito do tratamento. Para cada grupo foram feitas três réplicas, das quais eram retiradas amostras aleatoriamente para registro da massa corporal das larvas (10 espécimes a cada 12 h, desde a eclosão da larva até a pupariação ou enquanto era possível encontrar imaturos vivos) e do tempo de desenvolvimento (considerando cada estádio e o estágio imaturo total) frente cada tratamento, além do cálculo da taxa de viabilidade (percentagem de sobrevivência até atingir o estágio adulto).

Cada réplica era representada por um grupo de 150 larvas acondicionadas em potes plásticos, devidamente identificados e contendo dieta artificial própria para o desenvolvimento de insetos necrófagos [19]. Nos grupos experimentais, cujo objetivo era observar o efeito da droga sobre o desenvolvimento, foram acrescidas diferentes concentrações de escopolamina na e durante o preparo da dieta.

Para comparar o efeito dos tratamentos sobre a taxa de desenvolvimento larval considerando a variação do peso como variável resposta foi feita uma ANOVA de um fator com auxílio do programa estatístico S.A.S. [20].

3. RESuLTADOS E DISCuSSÃO

A taxa de desenvolvimento de C. putoria, mensurada pelo ganho de massa corpórea, foi significativamente influenciada pela presença de escopolamina (F= 3,383; p= 0,0141) no substrato alimentar utilizado por esta espécie, como mostrado na Fig. 1. A mesma observação é válida com relação ao tempo total de vida do inseto em seu estágio imaturo, ou seja, desde a eclosão até a pupariação Tab.(1) incluindo o intervalo de emergência (que antecede o nascimento dos adultos) Tab.(2), principalmente quando em exposição às altas concentrações da droga.

Se fosse levada em conta apenas a fase larval para estimar o IPM, por exemplo, imaturos provenientes dos grupos 0,5 x DL (= 635 mg/kg) e 1 x DL (= 1270 mg/kg) atingiriam a fase de pupa somente 24 e 48 h depois do grupo controle, respectivamente, sendo que os intervalos são ainda maiores quando adicionados os limites de tempo até o nascimento dos adultos, de 58 e 106 h, respectivamente, ou 2,4 e 4,4 dias. Essa observação, em conjunto com a publicada por Oliveira e colaboradores [21] que registraram um efeito similar da escopolamina sobre o desenvolvimento da espécie Chrysomya megacephala (Fabricius) (Diptera: Calliphoridae), justifica a relevância na investigação da presença de tal substância nos tecidos/órgãos de um cadáver, assim

como nas larvas de insetos que são recolhidas do corpo, quer seja na busca da causa da morte [22] ou para estimar o tempo de óbito.

um dos primeiros trabalhos que corrobora a possibilidade do uso de insetos para aferir um caso de morte causado por overdose de barbitúricos foi feito por Beyer e colaboradores [23], o qual denota a aplicação prática da entomotoxicologia tal como presumido acima. Neste, os autores registram como foi feita a detecção de fenobarbital em tecidos larvais de Cochliomyia macellaria (Fabricius, 1805) (Diptera: Calliphoridae) a partir de cromatografia gasosa (CG) e cromatografia de camada fina (em inglês TLC).

É possível salientar ainda que apenas concentrações a partir de 0,5 x DL exerçam um efeito inibidor no crescimento de C. putoria, visto que as larvas submetidas à concentração de 0,25 x DL (= 317,5 mg/kg) apresentaram ganho de massa corpórea e tempo de desenvolvimento próximos ao controle.

A taxa de viabilidade registrada para C. putoria decresceu à medida que as concentrações de escopolamina na qual cada grupo tratado foi exposto aumentavam, exceto para 0,25 x DL Tab.(2). Para os imaturos expostos a 2 x DL (= 2540 mg/kg) as conseqüências passam a ser negativas ou deletérias, visto que 100% dos indivíduos morreram decorridas apenas 60 h de eclosão, com um ganho de peso bem inferior ao que fora observado no grupo controle até as 24 h de vida. Assim, em casos que envolvam o encontro de larvas que apresentem este tipo de padrão de desenvolvimento – eclosão dos ovos, porém retardo no crescimento ou alta mortalidade –, a exposição a uma substância tóxica, não se restringindo somente a escopolamina, deve ser prioritariamente considerada.

Demais estudos que vem sendo conduzidos com várias espécies de moscas das famílias Calliphoridae e Sarcophagidae (Diptera), por serem estas as pioneiras na colonização de cadáveres, expostas à diversas classes de substâncias sugerem que o desenvolvimento larval responde diferentemente tanto em relação ao tipo e concentração da droga quanto a espécie considerada

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idade (horas)

peso

(mg)

controle 0,25 x DL0,5 x DL 1 x DL2 x DL

Figura 1. Curvas de desenvolvimento de Chrysomya putoria na fase larval criada sob diferentes concentrações de escopolamina em relação ao grupo controle.

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para o estudo. Embora as observações aqui feitas estejam restritas a apenas poucas espécies de moscas, não se pode descartar que variações similares sobre o desenvolvimento larval possam ocorrer com outras espécies de varejeiras que eventualmente se alimentem em tecidos contendo escopolamina ou seus metabólitos.

4. CONCLuSÕES

Os resultados aqui obtidos mostram claramente que a escopolamina afeta significativamente a taxa de desenvolvimento de imaturos de Chrysomya putoria, quando presente em seu substrato alimentar. Tendo em vista que o IPM em muitos casos é calculado levando em consideração o peso ou a idade dos imaturos coletados em um corpo, a não consideração deste fator de interferência negativa pode conseqüentemente levar a uma subestimativa do tempo de morte.

AGRADECIMENTOS

Este estudo contou com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) na forma de concessão de bolsa e auxílio à pesquisa, modalidade Projeto Temático (processos nº 06/55206-9, 05/54480-7 e 04/08544-0).

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RESENHAS

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1. RESENHA

Esta obra foi publicada em dezembro de 2010 como resultado 15 anos de atuação como Perito Criminal no Estado do Paraná, e está focada nas necessidades do Perito Criminal que atende os Locais de Morte Violenta contemplados no capítulo dos Crimes Contra a Vida do Código Penal Brasileiro: homicídio, induzimento, auxílio e instigação ao suicídio, infanticídio e aborto.

Na sua essência, a obra está dividida em três partes:

a. Conhecimentos básicos para o atendimento aos locais de morte;

b. Procedimentos essenciais para o atendimento aos locais de morte;

c. Elaboração do laudo de exame pericial.São 388 páginas com mais de 300 fotografias

coloridas mostrando todos os tipos de feridas e os detalhes dos locais de morte, trazendo a realidade dos locais de morte violenta e sua importância como “o crime número um da humanidade”.

Essencial para o Perito Criminal, para os profissionais da segurança pública, dos órgãos Policiais, do Ministério Público, do Judiciário e das áreas do Direito Penal e Processual.

Os títulos desenvolvidos nesta obra são os seguintes:

• A Morte e a Legislação Brasileira• Ações Mecânicas, Armas e Instrumentos• Armas de Fogo• Traumatologia Forense• Processos Asfíxicos• Energia Termoquímica, Elétrica e Explosiva• Abortamento e Infanticídio• Toxicologia Forense (Co-autora: Dra. Miriam

Machado Cunico)• Tanatologia Forense• Identificação Forense• Levantamento de Local de Morte• Corpo de DelitoPapiloscopia Forense• Atendimento aos Locais de Morte• Locais de Morte Típicos• Documentos Técnicos• Laudo Genérico.

E. CuNICO / REVISTA BRASILEIRA DE CRIMINALÍSTICA, V. 1, N.1, 44 (2011)

Perícias em locais de morte violenta

E. Cunico a

a Seção de Crimes Contra a Pessoa, Instituto de Criminalística do Paraná,Curitiba (PR), Brasil*Endereço de e-mail para correspondência:[email protected].

Recebido em 29/07/2011; Aceito em 12/09/2011

Perícias em Locais de Morte violenta / Edimar Cunico. – 1. Ed. – Curitiba: Edição do Autor, 2010.Número de páginas: 388Formato: 15 cm por 21 cmBrochuraISBN 978-85-910554-0-1

45

P.E.g. DA COSTA FILHO / REVISTA BRASILEIRA DE CRIMINALÍSTICA, V. 1, N.1, 45 (2011)

Medicina legal e criminalística

P.E.G. da Costa Filho a

a Instituto de Criminalística, Polícia Civil do Distrito Federal, Brasília (DF), Brasil*Endereço de e-mail para correspondência: [email protected]. Tel.: +55-61-33625655; fax: +55-61-33625658.

Recebido em 31/08/2011; Aceito em 15/09/2011

1. RESENHA DESCRITIvA

Medicina Legal e Criminalística aborda, de forma geral, os conceitos e assuntos mais importantes relacionados a essas duas áreas do conhecimento. É indicado para profissionais dos cargos de Delegado das Polícias Civil e Federal, Perito Médico-legista, Perito Odontolegista, Perito Criminal e Papiloscopista Policial, entre outros, mas também para interessados em concursos para provimento de vagas nas áreas policial e pericial, para curiosos e amantes do assunto.

Nessa obra, o leitor encontrará assuntos como Medicina Legal e direitos humanos, perícias e peritos, documentos médico-legais, Antropologia Forense, Traumatologia Forense, Toxicologia Forense, Tanatologia Forense, Psicopatologia Forense, Sexologia Forense, Genética Forense, local de crime, corpo de delito, além de vestígios, indícios e provas no processo penal.

Os tópicos mais importantes encontram-se ilustrados com figuras e comentados por meio de citações de outros autores e da legislação brasileira vigente. Como curiosidade e forma de contribuição ao leitor, os epônimos (aqueles que emprestam seu nome a alguma coisa) aparecem ao longo do texto, com definições sucintas e explicações de sua importância. Como se não bastasse, a obra está estruturada com base nos temas mais cobrados nas provas de concursos recentes.

Além disso, o leitor também conta com a possibilidade de verificar o conhecimento próprio mediante 77 testes, com questões de provas passadas, apresentados nesta edição. Todas as proposições são comentadas e justificadas conforme sua correção ou incorreção, trazendo explicações e reflexões de maneira simples e detalhada.

Assim, essa obra, que de forma alguma objetiva exaurir todos os temas relacionados à Medicina Legal e à Criminalística, proporciona ao leitor uma ferramenta importante no preparo necessário para atingir seus objetivos profissionais e estudantis, além de configurar como peça importante para pesquisa e auxílio ao profissional durante o exercício do trabalho policial e pericial.

Medicina Legal e Criminalística / Paulo Enio Garcia da Costa Filho. – 1. Ed. – Brasília: Vestcon, 2010.Número de páginas: 234Formato: 21 cm por 15,1 cmISBN 978-85-381-0392-9

46

F.H.S.O. VIEIRA / REVISTA BRASILEIRA DE CRIMINALÍSTICA 1(1), 8-16 (2011)

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE CRIMINALÍSTICACentro Comercial Sudoeste, CLSW 504, Bl. B, Sl. 155

Setor Sudoeste, Brasília Distrito FederalCEP. 70.673-000

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