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Publicação mensal dos Sinepes, Anaceu, Consed, ABMES, Abrafi, ABM, IMDC e Fundação Universa Entrevista Marketing: uma questão de estratégia ISSN 2176-4417 Educação O repensar da gestão escolar Enem Uma nova realidade social no Brasil EDIÇÃO 140 ANO 13 - NOVEMBRO 2009 Desvendando o universo Unesco lidera comemorações do Ano Internacional da Astronomia. O ensino desta ciência volta a ganhar espaço em algumas escolas

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Publicação mensal dos Sinepes, Anaceu, Consed, ABMES, Abrafi , ABM, IMDC e Fundação Universa

EntrevistaMarketing: uma questão de estratégia

ISSN

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6-44

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EducaçãoO repensar da gestão escolar

EnemUma nova realidade social no Brasil

EDIÇÃO 140ANO 13 - NOVEMBRO 2009

Desvendando o universoUnesco lidera comemorações do Ano Internacionalda Astronomia. O ensino desta ciência volta aganhar espaço em algumas escolas

entrevista

Desenvolvimento: umdesafi o político e social

Juan Carlos Tedesco, ex-ministro da Educação da Argentina,avalia estratégias para o desenvolvimento da sociedadea partir do investimento na educação

Ninguém está satisfeito com a educação que tem. Hoje,

temos novas demandas e neces-sidades. Mas, primeiro, temos que discutir qual a educação que queremos. Desejamos uma sociedade mais justa, com di-reitos iguais para todos e com inclusão social?”, questionou o professor Juan Carlos Tedesco, em entrevista à Revista Linha Direta. Tedesco também é dire-tor executivo de Planejamento Estratégico e Avaliação da Edu-cação, vinculado à Presidência da Argentina, e ex-ministro da Educação desse país.

Ele ressalta a necessidade de as políticas públicas serem contínu-as, para que não mudem de um governo para outro, pois as me-tas educativas são estabelecidas a longo prazo, por se tratar de questões de ordem econômica, política e social. Tedesco tam-bém fala de estratégias para o desenvolvimento da sociedade, a partir do investimento na qua-lidade da educação básica, na formação docente, na coopera-ção internacional, na divulga-ção científi ca e na criação de ambientes propícios à inovação.

Veja, na íntegra, a entrevista com o professor argentino. Como o senhor avalia o investi-mento dos países latino-ameri-canos na educação?

Nos últimos cinco ou 10 anos, o investimento na educação tem evoluído. Mas o importante é mostrar se está trazendo bons resultados. Acho que estamos to-dos conscientes da necessidade de introduzirmos políticas que melhorem a qualidade educacio-nal e os resultados dos países no Pisa [Programa Internacional de Avaliação de Estudantes]. Esses resultados correspondem ao que

é investido na educação e às con-dições sociais da população, às condições de vida da família. Os que têm bons resultados na ava-liação não apresentam nem po-breza nem exclusão. Temos que

ver a educação de forma integra-da, pois temos problemas dentro e fora da escola. São processos que levam tempo. Por isso, é ne-cessário que as políticas sejam contínuas e não mudem a cada novo governo. Para que haja continuidade, todos têm que es-tar de acordo e se comprometer com as metas.

As metas educativas devem, então, ser pensadas a longo prazo?

Uma sociedade que condena o pas-sado e não sabe para onde ir, no fu-turo, concentra tudo no presente, no aqui e agora. Mas precisamos

pensar a longo prazo para estabe-lecer estratégias para o desenvol-vimento da sociedade. Temos que tomar decisões que atraiam os jo-vens à docência. Caso contrário, teremos problemas no futuro. Os

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... é necessário que as políticas sejam contínuas e não mudem a cada

novo governo.

jovens de hoje serão os professo-res, pelo menos, até a metade do século 21. Estamos formando o ci-dadão que vai intervir na política daqui a 15 ou 20 anos.

Ninguém está satisfeito com a educação que tem. Hoje, temos novas demandas e necessidades. Mas, primeiro, temos que discu-tir qual a educação que quere-mos. Queremos uma sociedade mais justa, com direitos iguais para todos e com inclusão social? Podemos começar a defi nir pla-nos educativos para os próximos 10 anos se quisermos, nesse pe-ríodo, que as crianças cumpram a educação obrigatória ou que pelo menos não haja analfabetos científi cos.

Podemos estabelecer o mesmo prazo também para cumprir a meta da formação docente. Digo isso porque, em um mundo que se transforma tão rapidamente, é necessário manter prazos me-dianos para que as metas sejam cumpridas, e os resultados pos-sam ser avaliados constantemen-te. Estamos diante de um desafi o além do educativo, de uma so-ciedade mais justa e igualitária. É um desafi o político e social.

Qual a estratégia para o desen-volvimento da educação?

Primeiro, temos que dar priori-dade ao ensino básico, que é o período de alfabetização, que vai nos permitir seguir aprenden-do durante toda a vida. Segundo, investir na formação docente. As universidades têm que assu-mir um papel muito mais prota-gonista, vinculando a formação à realidade. Na Argentina, por exemplo, o acesso à escola é garantido, mas não há sucesso

escolar. É preciso, também, que haja cooperação internacional, para que possamos conhecer as boas experiências e não ter que “inventar a roda”. Outro ponto-chave é investir na divulgação científi ca e nas inovações, fazen-do da realidade um laboratório.

Como as ciências podem contri-buir?

A formação em ciências forma parte da estratégia para o desen-volvimento da sociedade. Uma educação de boa qualidade tem que ter o ensino de ciências como um dos pilares fundamentais, porque a alfabetização científi -ca é uma formação cidadã. Hoje, o tema interessa a todos e não apenas aos que ensinam ciências. Em uma sociedade cada vez mais dominada pela informação e pelo conhecimento, exige-se que o ensino de ciências seja uma das chaves para a educação, como é a língua. Tudo isso rodeado por uma formação em valores éticos e solidários.

E por que uma boa formação científi ca exige, também, uma formação ética?

Porque hoje o conhecimento científi co não está dissociado da sociedade. Veja o exemplo da manipulação genética. Pode-se manipular o capital genético de uma pessoa. Fazer ou não é uma decisão ética. As tecnolo-gias podem ser desenvolvidas, visando suprimir postos de tra-balho ou não. Depende da nos-sa orientação. Todas essas são decisões éticas. Portanto, assim como necessitamos formar os ci-dadãos cientifi camente, é impe-rativo formar os cientistas com valores cidadãos.

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Juan Carlos Tedesco,ex-ministro da Educaçãoda Argentina

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Desvendando o universo

Lideradas pela Unesco, comemorações celebramAno Internacional da Astronomia. A ciência volta afazer parte do ensino em algumas escolas

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Já houve um tempo no Brasil, por volta dos anos 1930, em

que os alunos do Ensino Funda-mental aprendiam astronomia. Banida do currículo escolar, so-mente agora a disciplina come-ça a voltar a algumas escolas de ponta, que estão reinserindo a matéria, especialmente no En-sino Médio. A informação é do

professor e pesquisador do De-partamento de Astronomia do Instituto de Astronomia, Geofí-sica e Ciências Atmosféricas da USP (IAG), Amaury Augusto de Almeida.

Mais um conteúdo a ser estuda-do pelos alunos? O professor de-fende: “O ensino de astronomia

nas escolas do Brasil é impor-tante porque, por meio dela, o estudante dá sentido a conheci-mentos adquiridos em matérias como geometria, física e mate-mática”. Almeida não fala em um “renascimento” do interesse pela astronomia no Brasil, pois, segundo ele, esse interesse nun-ca deixou de existir. O Instituto

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da USP lançou este ano, em São Paulo, o bacharelado em astro-nomia. E a procura, conforme ele mesmo afi rmou, foi maior do que em cursos tradicionais, como física ou matemática.

E para quem não sabe como co-meça a carreira de um astrô-nomo, o professor explica: “A pessoa precisa de um longo per-curso educacional. São quatro anos de bacharelado, mais dois de mestrado e outros quatro de doutorado”. Entretanto, ele destaca que, em muitos casos, o astrônomo só estará totalmente pronto depois de um pós-douto-rado, que acontece, na maioria dos casos, fora do Brasil. “Mas a relevância da astronomia para a sociedade está no fato de que a ciência não apenas torna pal-páveis conhecimentos em físi-ca e matemática. Ela permite desenvolver vários campos da tecnologia, como a robótica e a mecatrônica, nos quais se si-tuam pesquisas em equipamen-tos como telescópios terrestres e espaciais”, reitera.

A crescente importância da as-tronomia para a sociedade brasi-leira explica, inclusive, o fato de que, em 2009, Ano Internacional da Astronomia, o Brasil sediou a

XXVII Assembleia Geral da União Astronômica Internacional, que aconteceu na cidade do Rio de Janeiro, em agosto. “Por duas semanas, tivemos mais de 2 mil

astrônomos de todas as partes do mundo reunidos aqui, no Brasil, debatendo temas relacionados à astronomia”, conta Almeida. Para ele, foi uma oportunida-de única, pois os participantes puderam compartilhar os resul-tados de milhares de pesquisas – algumas fi nalizadas, outras em andamento – sobre o universo da astronomia global.

O ensino

Apesar de muitos associarem o ensino da astronomia à universi-dade, ele pode e deve começar bem antes, já que é uma ciên-cia essencial para a educação e a formação do cidadão. Mas como ensinar uma disciplina que envolve conceitos de física, geo-metria e matemática para crian-ças do Ensino Fundamental?

Segundo Vinicius Signorelli, coor-denador-geral de Pesquisa e De-senvolvimento da Sangari Brasil, os temas relacionados à astro-nomia despertam a curiosidade dos alunos. Porém, ele ressalta que é necessária uma didática interessante, capaz de transfor-mar essa curiosidade dos jovens em aprendizagem dos conteú-dos envolvidos. “Para propor-cionar aprendizagens realmente

signifi cativas, utilizamos a me-todologia da investigação, que faz do aluno o ponto central do processo de aprendizagem, por meio de problematizações”, ex-

plica Signorelli. Isso ocorre com a utilização do Programa Ciência e Tecnologia com Criatividade (CTC), da Sangari Brasil.

Ele afi rma que todas as aulas co-meçam com questionamentos: “Como medir a distância até uma estrela?” ou “Como é a nos-sa galáxia, a Via Láctea?”. Te-mas como esses são trabalhados com o apoio de materiais mon-tados pelos estudantes, como o que simula o movimento de es-trelas ao longo do ano no céu, o relógio solar, o planisfério, etc. Signorelli acredita que, em uma sociedade como a atual, na qual as crianças têm, à sua disposi-ção, a informática e a tecnolo-gia, o ensino de ciências, para ser efetivo, precisa ser cons-truído de modo interativo entre professor e aluno.

“Galileu Galilei é um exemplo extraordinário, pois ele era o tipo de cientista que subia ao alto de uma torre para arremes-sar materiais ao solo e medir o tempo que eles levavam para cair. Pai da física experimental, ele é um exemplo signifi cativo para os jovens, pois criava ram-pas, fazia rolar bolinhas, media o tempo, experimentava e tes-tava tudo, exibindo uma curio-sidade normalmente associada aos jovens”, comenta.

Ano Internacional da Astronomia

Durante todo o ano, a astrono-mia vem ganhando destaque na mídia e conquistando ainda mais o interesse das pessoas. O as-sunto é de tão grande relevân-cia que uma rede mundial de 93 países aderiram às comemora-ções do Ano Internacional da As-tronomia, promovido pela União

“O ensino de astronomia nas escolas do Brasil é importante porque, por meio dela, o estudante

dá sentido a conhecimentos adquiridos...”

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Astronômica Internacional (IAU) e pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciên-cia e a Cultura (Unesco).

Lideradas pela Unesco, as co-memorações têm celebrado a astronomia e suas contribuições para a sociedade e a cultura glo-bal, a partir do tema O Univer-so a ser descoberto por você. Entre muitos outros eventos realizados no Brasil, aconteceu a Maratona da Via Láctea, que englobou uma campanha con-tra a poluição luminosa no país, nos meses de julho, agosto e setembro. Em outubro, ocorreu a Olimpíada Latino-americana de Astronomia e Aeronáutica e as Noites Galileanas, uma cam-panha mundial pela observação de Júpiter e seus satélites. Para o início de 2010, está previsto o primeiro Congresso Brasileiro de Ensino de Astronomia, que

tem como objetivo consolidar o avanço do interesse pela astro-nomia junto a estudantes bra-sileiros.

A celebração do Ano Internacio-nal da Astronomia busca marcar as conquistas dessa ciência para o conhecimento humano, po-pularizando as descobertas. As atividades vêm acontecendo em todo o mundo, buscando dar ên-fase à educação, ao envolvimen-to do público e ao engajamento dos jovens na ciência, em níveis local, nacional e global. A data foi escolhida para comemorar os 400 anos da decisão de Galileu Galilei de apontar uma luneta para o céu, em suas investiga-ções astronômicas.

Segundo o astrônomo da USP e colaborador científi co do pro-grama CTC, da Sangari Brasil, Augusto Daminelli, este evento está criando canais de comuni-cação e programas educacionais de longo prazo, o que é impor-tante quando se tem como ob-jetivo o engajamento de jovens na carreira científi ca.

Autor de diversos estudos astro-nômicos, Daminelli é interna-cionalmente conhecido por ter previsto que a estrela Eta Cari-nae é, na verdade, uma estrela dupla e que ela vai explodir em alguns anos, o que pode signi-fi car um mês inteiro sem noite para quem vive no hemisfério sul do planeta Terra.

Há 400 anos, Galileu Galilei en-controu um novo uso para uma descoberta, na época, recen-te: a luneta. Ao invés de olhar para a paisagem distante, ele a apontou para a Lua e desco-briu algo espantoso: crateras, montanhas, vales e planícies, assim como na Terra, por onde a luz do Sol se movia, proje-tando sombras. Como o fenô-meno era semelhante ao que ele constatava na Terra, a con-clusão óbvia era a de que tanto a Lua quanto a Terra eram re-dondas e giravam ao redor do Sol. Pressionado a mudar essa

constatação sob a ameaça da Inquisição, Galilei escapou da morte ao assinar um termo em que negava essa verdade, mas, ainda assim, sentenciou: “Eppur si muove”, uma expres-são em Latim que signifi ca: “E, no entanto, ela se move”.

O Ano Internacional da Astro-nomia relembra justamente esse feito: a determinação de um pesquisador extraordiná-rio, que fundamentava suas descobertas em um processo contínuo de pesquisa, obser-vação, teste e validação, que

são os parâmetros essenciais de toda Ciência moderna. Vi-nicius Signorelli, da Sangari Brasil, ressalta que a cultura científi ca nasceu com Galilei. “Mais do que isso, o astrônomo italiano pôs a Ciência na praça, popularizando-a e mostrando a amplas camadas da sociedade que era possível aprofundar a compreensão do mundo, da natureza e dos fenômenos na-turais por meio de elaboração teórica e de uma experimenta-ção detalhista, que confi rmas-se ou negasse hipóteses pré-estabelecidas”, explica.

“O universo a serdescoberto por você”

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gestão

O repensar da gestão escolar

A educação brasileira vem so-frendo problemas de estrutura

e de má gestão, sem que os res-ponsáveis pela política educacio-nal se deem conta das causas e procurem meios para solucioná-las. Sabidamente, as difi culdades não estão na falta de verbas, pois elas existem e em quantidade sufi ciente. O maior entrave está na gestão dos recursos e na im-plementação dos programas de melhoria do ensino.

Pesquisa recente elaborada pelo Ibope, por solicitação da Fun-dação Victor Civita, apresenta resultados de estarrecer. Mostra que a grande maioria dos dire-tores das escolas públicas estão despreparados para a função e distantes das práticas que fun-cionam em todo o mundo.

O fato é mais grave quando se sabe que 98% deles não se acham responsáveis pelas notas baixas e pelo fraco desempenho dos seus alunos e da sua escola. Eles gas-tam muito mais tempo com ativi-dades administrativas, como, por exemplo, conferindo a merenda escolar, do que com trabalho em sala de aula.

E o pior, segundo a pesquisa: mais de 60% dos diretores não se jul-gam sufi cientemente preparados para a sua função e nem têm ideia da situação de sua escola peran-te as outras. Faltam-lhes todos os

pré-requisitos que os especialistas defi nem como básicos para o de-sempenho da função, ou seja, eles têm que se dedicar muito mais a administrar a sala de aula e os conteúdos a serem passados para seus alunos do que cuidar da me-renda escolar e de outras tarefas que deveriam ser desempenhadas por outras pessoas especialmente contratadas para esse fi m.

A educação brasileira precisa ser repensada, com o envolvimen-to de toda a sociedade e, prin-cipalmente, dos pais dos alunos das escolas públicas. É imperioso que qualifi quemos e capacite-mos nossos mestres, a começar pelos diretores das escolas, os responsáveis pelas unidades es-colares e, em cadeia, preparan-do professores, coordenadores e pes soal administrativo. A julgar pelos resultados da pesquisa, es-tamos no fundo do poço.

É necessário traçar um plano para melhorar o desempenho e conse-guir motivar os professores para que todos trabalhem na mesma direção. Nesse sentido, uma boa avaliação é importante para que possamos atualizar e qualifi car os comandantes das salas de aula.

É necessário que os diretores, que são os gestores das escolas públi-cas, passem por uma reciclagem para verifi car se realmente têm condições de comandar esse pro-

cesso. Antes de dar um cargo de direção a eles, os responsáveis pelo setor educacional brasileiro deveriam testá-los e submetê-los a treinamentos adequados para exercer tal função.

Por diversas vezes, tive a opor-tunidade de manifestar minha opinião de que o verdadeiro pro-blema da escola pública não é a falta de verbas. Elas existem e em quantidade sufi ciente. Falta, na verdade, uma política austera, pensada e elaborada, para colo-car a serviço do jovem brasileiro.

Caso contrário, continuaremos a frequentar os últimos lugares em todas as pesquisas que se fi zerem com os outros países do mundo. Não é disso que precisamos, nem é isso o que queremos. É hora de arregaçar as mangas e pensar a nova educação brasileira.

*Presidente do Sindicato dos Es-tabelecimentos de Ensino no Es-tado de São Paulo (Sieeesp) [email protected]

Benjamin Ribeiro*

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O Enem e uma novarealidade social no Brasil

A enorme demanda de alunos que concluem o Ensino Médio

para as poucas vagas em univer-sidades públicas justifi ca o cres-cimento de 148% de instituições privadas, ante os 31% de institui-ções públicas entre 1999 e 2009. Os dados são do Instituto Nacio-nal de Estudos e Pesquisas Edu-cacionais Anísio Teixeira (Inep) e do Sindicato das Entidades Man-tenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior no Estado de São Paulo (Semesp). Em 2007, por exemplo, 22 milhões de jovens fi caram fora do Ensino Superior. Vale destacar que, segundo o Instituto Brasileiro de Geografi a e Estatística (IBGE), do total de 1.148 municípios com presença de instituição de educação supe-rior, 81% são cobertos por organi-zações privadas.

“O Ministério da Educação tem tomado medidas para assuntos de inclusão social, diversidade, cotas raciais e sociais, reserva de vagas para minorias, além de diminuir os privilégios das castas docentes universitárias, com avaliação de desempenho, exigências de qualidade para os cursos superiores em geral”, ava-lia Antonio Carbonari, presiden-

Educador do setor privado acredita que novo Enemvai democratizar o acesso a universidades públicas

Antonio Carbonari, presidenteda Anhanguera Educacional e diretorde relações institucionais do Semesp

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te da Anhanguera Educacional e diretor de relações institucionais do Semesp.

Perante os desafi os, inicia-se um processo de democratização do acesso às universidades públicas com o novo Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). A reformu-lação proposta pelo ministro da Educação, Fernando Haddad, tem estimulado milhares de estudan-tes em todo o Brasil a renovar suas esperanças de ingresso no Ensino Superior público. O novo exame, inspirado no modelo americano Scholastic Aptitude & Reasoning Test (teste de aptidão e raciocínio acadêmicos, em tradução livre), pretende ser uma forma de se-leção unifi cada para ingresso nas tão concorridas universidades pú-blicas federais e nas demais que aderirem aos resultados do novo sistema.

As provas deveriam ter sido apli-cadas nos dias 3 e 4 de outubro deste ano, mas foram cancela-das após uma fraude, que já foi esclarecida pela Polícia Federal. Agora, serão realizadas nos dias 5 e 6 de dezembro, fi m de sema-na que coincide com a realização de muitos processos seletivos no país. Por falta de tempo hábil, a Unicamp (Campinas) e a USP (São Paulo) desistiram de usar a nota do Enem no vestibular. Já a Me-todista (São Bernardo do Campo) e a UnB (Brasília) mudarão seus processos seletivos para não coin-cidir com a data do exame. Outras instituições estão decidindo qual procedimento seguir. Segundo o MEC, a nova prova já está pronta e guardada em cofre.

No modelo da prova clássica do Enem, criado em 1998, havia 63 questões interdisciplinares, as

quais testavam habilidades ge-rais de raciocínio, como a capa-cidade de interpretar textos e de solucionar problemas da vida real, sem articulação direta com os conteúdos ministrados no En-sino Médio. O objetivo do exame era apenas avaliar o desempenho do aluno ao fi m da escolaridade básica, além de classifi car estu-dantes para concorrer a bolsas de estudo do Programa Universi-dade para Todos (ProUni).

“Este programa de bolsas, que troca vagas por impostos, sai mui-to mais barato que custear vagas públicas. É preciso, ainda, aumen-tar a oferta de vagas nas institui-ções públicas de nível superior, pois estão aquém da capacidade quantitativa das universidades de outros países da América Latina”, afi rma Carbonari.

Reformulado, o Enem agora pos-sibilita comparar as notas dos candidatos de um ano para ou-tro e, principalmente, avaliar o currículo do Ensino Médio. “A nota obtida será resultado de uma prova bem elaborada por docentes experientes, contendo assuntos ministrados nas escolas de Ensino Médio do país”, escla-rece o professor. A nova prova manterá a contextualização das questões, como ocorria na fór-mula antiga, mas agora elas se-rão integralmente calcadas em disciplinas do Ensino Médio. Pelo novo procedimento, em dois dias serão aplicadas 200 questões de múltipla escolha, divididas em quatro áreas do conhecimento: ciências humanas, ciências da natureza, linguagens e matemá-tica, além de uma redação.

O aluno poderá se candidatar a vagas em diferentes universida-

des, públicas ou privadas, com o mesmo exame, cabendo a cada instituição decidir utilizar os re-sultados como fase única, como primeira fase, combinado com o processo seletivo da instituição, ou como fase única para as vagas remanescentes do vestibular. O aluno saberá sua nota antes de se inscrever nos concursos das faculdades almejadas e poderá consultar as médias dos demais candidatos à vaga que ele de-seja através de um sistema on--line de inscrições. Assim, ele poderá avaliar suas chances no processo seletivo.

Carbonari defende o Enem 2009 como uma nova realidade so-cial: “Com a novidade, visualizo candidatos com boas notas en-trando em instituições de Ensi-no Superior de qualidade, cujas classifi cações se darão pela sua nota em nível nacional, e não por suas condições sociais e posses”.

O MEC tem por meta realizar sete aplicações do exame por ano e não há limite de tentati-vas para o aluno buscar sempre melhorar suas notas. O presiden-te da Anhanguera Educacional acredita ser grande a coragem do atual ministro da Educação em enfrentar os antigos funda-mentos dos processos seletivos em busca de melhor qualidade de ensino para os estudantes. “Já temos oportunidades para uma discussão nacional sobre a importância do Ensino Superior no desenvolvimento sustentável do Brasil, em sua condição de país que quer e merece ter pre-sença na liderança mundial”, conclui Carbonari. www.unianhanguera.edu.br