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Rev. Filos., Aurora, Curitiba, v. 20, n. 27, p. 433-442, jul./dez. 2008 A COERÊNCIA ESTÉTICA COMO TEORIA DE VERDADE The aesthetic coherence as a truth theory Cleverson Leite Bastos Doutor em Semiótica pela PUC-SP, Brasil. Professor do Programa de Pós Graduação da Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Curitiba, PR - Brasil, e-mail: [email protected] Resumo Dentre tantas teorias, teóricos e critérios pra determinar o que é verdadeiro, um, em especial, chama a atenção: a beleza (Pulchrum) nas teorias da física. Esse é justamente o título de um dos capítulos de Sonhos de uma teoria final, 1 livro, na verdade um relatório de pesquisa, de Steven Weinberg, prêmio Nobel de física, 1979, pelo trabalho de unificação de duas das chamadas Forças Fundamentais da Natureza. Palavras-chave: Beleza; Simetria; Simplicidade; Rigidez; Verdade; Critério. Abstract Among many theories, facts and criteria to determine what it is true, one, in special, calls attention: the beauty (Pulchrum), in the physics theories. This is actually the title of one of the chapters of Dreams of the final theory, book, a research to be more specific, of Steven Weinberg, Nobel prize winner of physics, 1979, for the work that united the two calling Fundamental Forces of Nature. Keywords: Beauty; Symmetry; Simplicity; Stiffness; Truth; Criteria. 1 WEINBERG, Steven. Sonhos de uma teoria final: a busca das leis fundamentais da natureza. Rio de Janeiro: Rocco, 1996. p. 108-132.

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  • Rev. Filos., Aurora, Curitiba, v. 20, n. 27, p. 433-442, jul./dez. 2008

    A COERNCIA ESTTICA COMOTEORIA DE VERDADE

    The aesthetic coherence as a truth theory

    Cleverson Leite Bastos

    Doutor em Semitica pela PUC-SP, Brasil. Professor do Programa de Ps Graduao daPontifcia Universidade Catlica do Paran. Curitiba, PR - Brasil, e-mail:[email protected]

    Resumo

    Dentre tantas teorias, tericos e critrios pra determinar o que verdadeiro,um, em especial, chama a ateno: a beleza (Pulchrum) nas teorias da fsica.Esse justamente o ttulo de um dos captulos de Sonhos de uma teoriafinal,1 livro, na verdade um relatrio de pesquisa, de Steven Weinberg,prmio Nobel de fsica, 1979, pelo trabalho de unificao de duas daschamadas Foras Fundamentais da Natureza.

    Palavras-chave: Beleza; Simetria; Simplicidade; Rigidez; Verdade; Critrio.

    Abstract

    Among many theories, facts and criteria to determine what it is true,one, in special, calls attention: the beauty (Pulchrum), in the physicstheories. This is actually the title of one of the chapters of Dreams ofthe final theory, book, a research to be more specific, of StevenWeinberg, Nobel prize winner of physics, 1979, for the work thatunited the two calling Fundamental Forces of Nature.

    Keywords: Beauty; Symmetry; Simplicity; Stiffness; Truth; Criteria.

    1 WEINBERG, Steven. Sonhos de uma teoria final: a busca das leis fundamentais da natureza.Rio de Janeiro: Rocco, 1996. p. 108-132.

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    Introduo

    Em uma rpida consulta a dicionrios e enciclopdiasespecializadas em filosofia, epistemologia e lgica, surpreendente o nmerode teorias sobre a verdade e seus critrios que podemos encontrar. O que faremosa seguir elencar tais teorias e alguns dos critrios de verdade para dentre elasdestacarmos a que nos interesse neste artigo.

    a) como correspondncia ou adequao: a concepo que vemde Aristteles, passando pela Idade Mdia e filosofia moderna,at ser encampada pela lgica contempornea nas teorias de:Teoria Semntica de Tarski; Teoria da Congruncia de Russell;Teoria da Correlao de Austin; Fisicalismo de Carnap; Teoriada Redundncia de Ramsey; Teoria da Redundncia deWillians, Teoria da Consistncia de Quine;

    b) como revelao, manifestao ou descoberta: comorevelao Empirista das escolas Cirenica, Epicurista e Estoica,at o conhecimento intuitivo de Ockham; como manifestaometafsica ou teolgica: de Agostinho, passando por Descartesat Hegel, e por fim, como descoberta existencial:fenomenologia analtica, em especial Heidegger;

    c) como dupla verdade: Averris, Ockham, Joo de Jandum ePompanazzi;

    d) como conformidade a uma regra ou conceito: o pensamentofundado em leis formais, de modo geral o Idealismo, desde Plato,Agostinho, passando por Kant e a Escola de Baden at Hegel;

    e) como coerncia: o significado do todo tudo, de Spinoza,Bradley e Husserl a Frege e Brgson;

    f) como utilidade: vitalista, Nietzsche; pragmtica, James,Schiller e Peirce; instrumental, Dewey;

    g) como justificao: o programa de Davidson; a Teoria doSignifica de Dummett; e a retrica de Perelman;

    h) como consenso: Agir Comunicativo de Habermas;j) como coerncia esttica: Kaku, Greene e Weinberg.

    Neste artigo, nos deteremos em Weinberg. Ele faz parte de umseleto grupo de fsicos-matemticos, pesquisadores da Teoria das Cordas. Nestateoria, as propriedades observadas de cada partcula elementar existem porque

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    sua corda interna experimenta um determinado padro vibratrio ressonante. Aperspectiva, aqui, difere daquela que os fsicos advogavam anteriormente: aspartculas fundamentais, na teoria anterior, eram explicadas ou descritas pordiferenas estruturais. Embora elementares, cada partcula entendida comofeita de um tipo diferente de material. O material do eltron tinha carganegativa, o material do neutrino, por exemplo, no possua carga eltrica.

    A teoria das cordas altera essa viso, j patrimnio do ensino emfsica, declarando que o material e todas as manifestaes da matria e dasforas o mesmo: uma corda nica e, eis aqui a dificuldade de visualizar,todas as cordas so absolutamente idnticas. Como diferenciar as partculas?Assim como em um violino, uma nica corda pode ditar notas diferentes, asdiferenas entre as partculas resultam de que suas respectivas cordas exprimempadres ressonantes diferentes. Na nova perspectiva, o que era percebido comopartculas elementares diferentes so, na verdade, notas diferentes de umamesma corda fundamental.

    Nesse caso, a intuio de Pitgoras correta. O universo assemelha-se a uma sinfonia csmica porque composto de um nmero indefinido decordas vibrantes. A intuio unificadora de Pitgoras correta porque a teoriadas cordas nos oferece uma metfora tambm unificadora:

    Todas as partculas de matria e todos os transmissores de fora consistemde uma corda cujo padro vibratrio a sua impresso digital. Comotodos os acontecimentos fsicos, processos de ocorrncias do universopodem ser descritos em seu nvel mais elementar em termos da ao deforas entre os componentes materiais e elementares, a teoria das cordasmantm a promessa de uma descrio unificada, nica e completa douniverso fsico: uma teoria sobre tudo. (GREENE, 2001, p. 166-167).

    Pesquisadores da Teoria das Cordas (GREENE, 2005), assim comoWeinberg acreditam que ela capaz de descrever e unificar todas as foras danatureza por um nico esquema e assim fechar o fosso, existente desde inciodo sculo XX, entre as leis do grande (Einstein) e as leis do pequeno(Mecnica quntica). Por isso, a teoria das cordas que busca unificar as forasfundamentais, forte, fraca, eletromagntica e gravitacional, tambm conhecidacomo Teoria do Tudo, Teoria Final, Teoria M ou, como Einstein a chamava,Teoria de Campo Unificado.

    Na descrio de estados e foras os tericos lanam mo deconceitos e princpios tais como simetria, supersimetria, riqueza, elegncia,complexidade e beleza, objeto deste artigo.

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    Algumas consequncias da teoria das cordas, no absorvidas pelosenso comum, dizem respeito a dois campos bsicos de investigao, a saber,em geometria quntica: hiperespao (espao n-dimenses), dimensesrecurvadas, superpartculas, cordas e, em cosmologia (modelo-padro dacosmologia): buracos negros, inflao, multiverso...

    A beleza como critrio de verdade

    Segundo Weinberg a beleza , de fato, um bom guia para as teoriasfsicas em direo a uma Teoria do Tudo (TT), contudo, o que significaria dizerque uma teoria bonita ou elegante em fsica ou para um fsico?

    Outras questes vo surgindo quando pretendemos entender osentido dos adjetivos bonita ou elegante atribudos s teorias fsicas. Vejamosalgumas delas: O que de fato uma teoria bonita? Que caractersticas de umateoria fsica nos do o senso de beleza? Por que e quando o senso de beleza dosfsicos funciona? Como algo, quase sobrenatural como senso de beleza, ajudano s a inventar, mas tambm a julgar a validade das teorias em fsica? O que,afinal, desejam os fsicos atingir com suas teorias?

    Para responder a essas questes no adequado partir de umadefinio a priori de beleza por duas razes. A primeira, e a mais bvia, que uma definio a priori, acadmica, rogaria as questes, isto , incorreriaem petio de principio; a segunda, no to bvia, portanto menos ou nadaconsensual, o que as pessoas esto dispostas a admitir como senso esttico,juzo esttico, e est ligado a uma expresso pessoal de prazer esttico.Justamente por essa segunda razo, a menos consensual, que relacionarconceitos como beleza e fsica pode receber um juzo condenatrio ou, nomnimo, uma advertncia.

    Em lugar disso, acompanharemos Weinberg em sua definio debeleza como critrio de verdade em fsica.

    Percepo esttica e certeza

    Para dar conta disso, j que no permitido lanar mo de umadefinio de beleza como ponto de partida, partindo de uma espcie de estticanegativa, Weinberg nos convida a entender o que a beleza no .

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    Assim, a beleza, conceito pressuposto na constituio da verdadede teorias fsicas, no pode ser entendida como: a) beleza mecnica, como simplesarranjo formal de smbolos; b) elegncia matemtica ou fsica que uma qualidadeda demonstrao, associada ao fcil e ao difcil, e no da teoria propriamente ditaque indiferente ao fcil e ao difcil: elegncia para alfaiates.2

    No entanto, a exegese da esttica negativa nos revela que h trselementos na percepo de carter esttico que so equivalentes ao termo beleza:simplicidade, inevitabilidade e simetria.

    Simplicidade: a simplicidade, no-mecnica, uma das notas doque Weinberg quer denominar com o que ele chama de beleza:

    Ambas as teorias da gravitao de Newton envolvem equaes que nosdo as foras gravitacionais produzidas por uma dada quantidade dematria. Na teoria de Newton, existem trs destas equaes(correspondendo s trs dimenses do espao) na teoria de Einsteinexistem 14 por si s isso no pode ser considerado uma vantagemesttica da teoria de Newton sobre a de Einstein. E, de fato, h muitomais beleza na teoria de Einstein, em parte por causa da simplicidadede sua idia central sobre a equivalncia de inrcia e gravitao. Esse o julgamento com o qual cientista geralmente tem concordado e, [...],foi grandemente responsvel pela rpida aceitao da teoria de Einstein.(WEINBERG, 1996, p. 110).

    Inevitabilidade

    O senso de inevitabilidade, o necessitarismo, com que umaconcluso se impe a partir dos postulados de uma teoria outro dos atributosque podem designar uma teoria como bela. O prazer esttico brota dapercepo de que em um trabalho musical ou uma pintura est completo e quenada, nenhuma nota, nenhum trao a mais, poderia ser acrescentado sem que otodo se desfizesse. Segundo Weinberg, esse critrio parcialmente verdadeiroe tambm pode ser estendido Teoria da Relatividade Geral.

    Uma vez conhecendo os princpios gerais da fsica dotados por Einstein,entende-se que no existe outra teoria da gravitao significativamentediferente qual Einstein poderia ter sido levado. Como ele disse sobre a

    2 SZILARD apud WEINBERG, Steven. Sonho de uma teoria final: a busca das leisfundamentais da natureza. Rio de Janeiro: Rocco, 1996. p. 109.

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    relatividade geral: a atrao principal da teoria est na sua completudelgica. Se uma nica das concluses concebidas a partir dela se mostrarerrada, deve-se desistir dela; modific-la sem destruir sua estrutura pareceser impossvel. [] Assim as 14 equaes de Einstein possuem umainevitabilidade, portanto, beleza ausentes nas trs equaes de Newton.Acho que era isso que Einstein queria dizer quando se referia ao lado dasequaes que envolvem o campo gravitacional em sua teoria darelatividade geral como belo como se fosse de mrmore, em contrastecom o outro lado das equaes, que se referia a matria, que lhe diziaainda ser feio como se feito de madeira. A maneira como o campogravitacional entra nas equaes de Einstein quase inevitvel mas nadana relatividade geral explica porque a matria toma a forma que tem.(WEINBERG, 1996, p. 110-111).

    Simetria

    Se simplicidade e inevitabilidade so tomados como conceitos,simetrias so tomadas como princpios. Por definio um princpio de simetrianada mais do que uma afirmao de que algo se apresenta da mesma formaquando olhado de pontos de vista diferentes (WEINBERG, 1996, p. 111). Hmuitos graus no que se pode admitir como simtrico, desde rostos, passandopor formas geomtricas at o espao tido como vazio. H simetrias no s decoisas como tambm h, e aqui reside o interesse da cincia, simetria de leis.Simetrias nas leis so princpios de invarincia. Por definio, uma simetrianas leis da natureza reside em que, ao fazermos certas modificaes a partir doponto de vista do qual os fenmenos so observados, as leis no se alteram: asleis possuem sempre a mesma formulao independente de como as coordenadasso tomadas. No faz diferena em que lugar do planeta a experincia foirealizada ou se foi realizada fora da galxia. Tambm no importa o modocomo datamos os eventos se, conforme um relgio ou o Big Bang, leis diferentesem tempos diferentes, em lugares diferentes so sempre as mesmas.

    Se essas simetrias das leis da natureza so importantes na fsica clssica,sua importncia ainda maior na mecnica quntica. Pense: o que fazum eltron diferente do outro? Somente sua energia, seu momento e seuspin; alm dessa propriedade todos os eltrons do universo so iguais.Todas essas propriedades de um eltron so apenas quantidades quecaracterizam a maneira como a funo de onda da quntica do eltronresponde a transformaes de simetrias: mudando a maneira como

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    acertamos nossos relgios ou a localizao e orientao de nossolaboratrio. A matria, portanto, perde seu papel central na fsica: tudoque resta so princpios de simetrias e as vrias maneiras que as funesde ondas podem se comportar sob transformaes de simetrias.(WEINBERB, 1996, p. 112).

    A simetria das leis um pressuposto fundamental da mecnicaclssica e quntica. As propriedades de um eltron, sua energia, seu momento eseu spin, em todos os eltrons do universo so iguais: so quantidades quecaracterizam a maneira como, por exemplo, uma funo de onda quntica doeltron responde s transformaes de simetrias, independente das coordenadasde tempo e espao. O que importa o modo como as funes de onda secomportam sob as transformaes de simetrias.

    Em velocidades constantes diferentes, tambm existem simetriasno espao-tempo. No importa se os observadores fazem suas experincias nosistema solar, no centro da galxia, ou em uma galxia distante, a milhares dequilmetros por segundo. O que fica estabelecido, menos bvio que astranslaes ou rotaes, a simetria conhecida como princpio de relatividadede Einstein, 1905.

    Na especialidade de Weinberg, a simetria subjacente teoriaeletrofraca , segundo ele, mais esotrica: as mudanas no se do segundo onosso ponto de vista no espao e no tempo. Mas sim em nosso ponto de vistasobre a identidade de diferentes tipos de partculas elementares.

    Da mesma forma que possvel para uma partcula estar num estadoquntico no qual no se encontra definitivamente nem aqui nem l ougirando sem que esteja definitivamente no sentido horrio ou anti-horrio,pelas mesmas maravilhas da mecnica quntica tambm possvel termosuma partcula em um estado no qual ela no definitivamente nem umeltron nem um neutrino, at que faamos uma medida de algumaspropriedade que possam distinguir as duas como carga eltrica. []Simetrias do tipo subjacente a teoria eletrofraca so chamadas de Simetriasinternas, porque podemos pens-las como sendo relacionadas naturezaintrnseca das partculas, em vez de ser relacionadas as suas posies oumovimentos. (WEINBERG, 1996, p. 117).

    So os princpios de simetria que do s teorias um tipo feliz derigidez. Rigidez entendida como um qu de universal que baliza os fenmenosno universo. No possvel elaborar uma teoria capaz de descrever todas asforas de todas as partculas imaginveis na natureza. O que de fato precisamos

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    de uma teoria, respeitando Ockham, que descreva de forma universal todas esomente aquelas foras que realmente existem: gravitacionais, eletrofracas efortes. a esta rigidez que deve fazer parte de uma teoria fsica que Weinbergreconhece como beleza.

    Se substituirmos feliz, em teorias de um tipo feliz, por beleza,ento poderemos entender que a beleza que Weinberg atribui s teorias fsicas semelhante pela apreenso de simplicidade, senso de inevitabilidade e simetriaa alguns trabalhos de arte.

    Assim como na arte, tambm em uma teoria podemos apreenderou sentir que no possvel trocar uma s nota, pincelada ou equao. A sensaode inevitabilidade uma questo de gosto, de experincia esttica, que nopode ser traduzida por uma forma lgica. A linha divisria entre teoria elegantee lista de informaes, se, por um lado no pode ser definida claramente, poroutro, a inevitabilidade de sua simplicidade e rigidez deve ser vislumbrantepara que a teoria possa ser levada a srio. No s a verdade e a validade que sebusca em uma explicao cientfica, mas a elegncia, a beleza da teoria, partedo que se quer dizer com ela.

    Beleza TIPO

    Os pargrafos e citaes anteriores demonstraram, ou pelo menosesta foi a nossa inteno, que, segundo Weinberg, os elementos conceituaisexigidos para aceitao de uma teoria como verdadeira em fsica so, tambm,os mesmos que entram na percepo e no juzo de prazer esttico. Embora oideal de beleza esteja no infinito, sua realizao, tanto no campo da arte comono campo da cincia, limitada. Limitada pela definio que dela possamosdar. A beleza : at onde consigo traduzir em palavras, a beleza da simplicidadee da inevitabilidade a beleza de uma estrutura perfeita de tudo se encaixando,de rigidez lgica, de nada ser altervel (WEINBERG, 1996, p. 120).

    A definio alcanada importante porque impe algumasrestries na comparao das estruturas das teorias fsicas com a arte. A primeira que as teorias so muito esotricas e devem ser assim, porque somos levadosa desenvolv-las usando uma linguagem, a da matemtica, que no se tornouparte das ferramentas usuais do pblico instrudo (WEINBERG, 1996, p. 121).A segunda que o terico no to livre quanto o artista. Os princpiosmatemticos no esto pr-ordenados e, por isso, construir ou criar uma teoriano uma pura questo de deduo mecnica. Os princpios devem ser

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    inventados durante a pesquisa e a deduo das consequncias de um conjuntode princpios, escolhidos como rgidos, podem ser muito angustiantes, difceise no podem ser ensinados.

    A terceira, e a mais intrigante, que a beleza da estrutura sobrevive morte dos princpios e da prpria teoria:

    Estranhamente, apesar da beleza das teorias fsicas estar concretizada emestruturas matemticas rgidas, baseadas em princpios subjacentessimples, as estruturas que possuem esse tipo de beleza tendem a sobrevivermesmo quando os princpios subjacentes se mostram errados.(WEINBERG, 1996, p. 121).

    Assim, como exemplo, a matemtica da teoria de Dirac sobrevivecomo uma parte essencial da teoria quntica de campos, embora o ponto deDirac esteja errado. A estrutura formal da teoria de Dirac sobreviveu. esteestranho tipo de imortalidade que estruturas matemticas e princpios fsicospossuem, migrando como fantasmas de uma ambiente conceitual para outro e,como nas adaptaes biolgicas, mutando em outros corpos. A beleza sobrevivemesmo que os princpios da teoria sejam refutados.

    Consideraes finais

    H, finalizando, trs razes pelas quais o senso de beleza considerado critrio de validade para as teorias fsicas. A primeira faz apelo aoPrincpio de Seleo Natural que, aplicado s ideias, nos indica que, atravs deuma srie de eventos acidentais, de tomos at formas primitivas, de protozoriosa peixes e pessoas, tambm o modo de olhar o universo se desenvolve porseleo natural: seleo natural de ideias atravs de falsos comeos at alcanaruma forma que pode ser admitida como bela.

    A segunda porque somos capazes de escolha, porque seesperamos que as teorias cientficas bem-sucedidas sejam bonitas simplesmente porque os cientistas tendem a escolher problemas que pareamter belas solues (WEINBERG, 1996, p. 128).

    A terceira porque acreditamos que iremos encontrar algunsprincpios de beleza inevitvel. Para ns tambm a beleza das teorias atuais uma antecipao, uma premonio, da beleza da teoria final. E de qualquermaneira no podemos aceitar qualquer teoria como final, a menos que ela sejabonita (WEINBERG, 1996, p. 131-32).

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    Referncias

    GREENE, B. O universo elegante: super-cordas, dimenses ocultas, e a buscada teoria definitiva. So Paulo: Companhia das Letras, 2001.

    ______. O tecido do cosmos: espao, tempo e a textura da realidade. So Paulo:Companhia das Letras, 2005.

    REES, M. Apenas seis nmeros: as foras profundas que controlam o universo.Rio de Janeiro: Rocco, 2000.

    WEINBERG, S. Sonho de uma teoria final: a busca das leis fundamentais danatureza. Rio de Janeiro: Rocco, 1996.

    Recebido: 28/04/2008Received: 04/28/2008

    Aprovado: 27/05/2008Approved: 05/27/2008

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