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Português e bilinguismo: Projeto Brasileirinhos Marina Simone DIAS Doutoranda em Arquitetura UPC- Universitat Politècnica de Catalunya Programa de Doutorado em Teoría e Historia de la Arquitectura Espanha [email protected] Resumo As vantagens de uma educação bilíngüe (ou multilíngue) desde a primeira infância são muitas. Este trabalho resume vários estudos e teorias sobre a educação infantil bilíngue e multilíngüe, sobre o ensino-aprendizado de língua materna e segundas línguas, cotejando-os com a observação própria, de amigos e conhecidos, com o intercâmbio de informações com outros grupos e projetos em várias partes do mundo e com a experiência do “Projeto Brasileirinhos”. Levando em consideração que estas crianças estão inseridas no contexto educacional local, o projeto “Brasileirinhos” visa possibilitar a esta segunda geração de brasileirinhos/as o acesso à aprendizagem da língua portuguesa e o vínculo com a identidade e cultura brasileiras, além de propiciar outras atividades de integração e intercâmbio cultural Brasil-Espanha. O objetivo deste estudo é contribuir com o debate sobre o ensino da língua portuguesa e da cultura brasileira a crianças de origem brasileira que moram na Catalunha. Palavras-chave: educação infantil, português, bilinguismo, Projeto Brasileirinhos. Abstract The advantages of an education bilíngüe (or multilingual) from the first infancy are many. This work summarizes several studies and theories on the childlike education bilingual and multilingual, on the teaching-learning process of mother tongue and second languages, comparing them with the own observation, of friends and acquaintances, with the exchange of informations with other groups and projects in various parts of the world and with the experience of the “Project Brasileirinhos”. The objective of this study is to contribute with the discussion on the teaching of the portuguese language and of the brazilian culture the children of brazilian origin who live in Catalonia. Taking into account that these boys are inserted in the context educacional venue, the project “Brasileirinhos” visa make possible to this second generation of brasileirinhos/the the access to the learning of the Portuguese tongue and the bond with the identity and Brazilian culture, in addition to propiciar other activities of integration and cultural exchange Brazil-Spain. The aim of this study is to contribute with the debate on the education of the Portuguese tongue and of the Brazilian culture to the boys of Brazilian origin that live in Catalonia. Keywords: childrens’ education, portuguese, bilingual, Project Brasileirinhos.

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Resumo Abstract Keywords: childrens’ education, portuguese, bilingual, Project Brasileirinhos. Palavras-chave: educação infantil, português, bilinguismo, Projeto Brasileirinhos.

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Português e bilinguismo: Projeto Brasileirinhos

Marina Simone DIAS Doutoranda em Arquitetura

UPC- Universitat Politècnica de Catalunya Programa de Doutorado em Teoría e Historia de la Arquitectura

Espanha [email protected]

Resumo

As vantagens de uma educação bilíngüe (ou multilíngue) desde a primeira infância são muitas. Este trabalho resume vários estudos e teorias sobre a educação infantil bilíngue e multilíngüe, sobre o ensino-aprendizado de língua materna e segundas línguas, cotejando-os com a observação própria, de amigos e conhecidos, com o intercâmbio de informações com outros grupos e projetos em várias partes do mundo e com a experiência do “Projeto Brasileirinhos”. Levando em consideração que estas crianças estão inseridas no contexto educacional local, o projeto “Brasileirinhos” visa possibilitar a esta segunda geração de brasileirinhos/as o acesso à aprendizagem da língua portuguesa e o vínculo com a identidade e cultura brasileiras, além de propiciar outras atividades de integração e intercâmbio cultural Brasil-Espanha. O objetivo deste estudo é contribuir com o debate sobre o ensino da língua portuguesa e da cultura brasileira a crianças de origem brasileira que moram na Catalunha.

Palavras-chave: educação infantil, português, bilinguismo, Projeto Brasileirinhos. Abstract The advantages of an education bilíngüe (or multilingual) from the first infancy are many. This work summarizes several studies and theories on the childlike education bilingual and multilingual, on the teaching-learning process of mother tongue and second languages, comparing them with the own observation, of friends and acquaintances, with the exchange of informations with other groups and projects in various parts of the world and with the experience of the “Project Brasileirinhos”. The objective of this study is to contribute with the discussion on the teaching of the portuguese language and of the brazilian culture the children of brazilian origin who live in Catalonia. Taking into account that these boys are inserted in the context educacional venue, the project “Brasileirinhos” visa make possible to this second generation of brasileirinhos/the the access to the learning of the Portuguese tongue and the bond with the identity and Brazilian culture, in addition to propiciar other activities of integration and cultural exchange Brazil-Spain. The aim of this study is to contribute with the debate on the education of the Portuguese tongue and of the Brazilian culture to the boys of Brazilian origin that live in Catalonia. Keywords: childrens’ education, portuguese, bilingual, Project Brasileirinhos.

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Introdução

e num piscar de olhos pudéssemos transformar nossos filhos em perfeitos bilíngues, fluentes tanto em português quanto em espanhol, inglês ou qualquer outra língua, quem não o faria?1 As vantagens de uma educação bilíngue (ou multilíngue) desde a

primeira infância são muitas. Segundo neurologistas, psiquiatras e psicopedagogos, o bilinguismo infantil promove o desenvolvimento intelectual da criança de várias maneiras, proporcionando uma série de capacidades especiais: - maior capacidade comunicativa e metalingüística, ou seja, maior consciência sobre a linguagem, com benefícios ao vocabulário, fonologia, sintaxe e compreensão de texto; - aprender mais de uma língua, principalmente desde a infância, facilita também o aprendizado futuro de outros idiomas, pois desenvolve a consciência da estrutura e do funcionamento das línguas; - maior habilidade lógico-matemática; - melhor atenção seletiva, maior capacidade de abstração, de criar novos conceitos e maior capacidade multitarefa; - maior flexibilidade mental ou capacidad para encontrar distintas soluções a um mesmo problema, ou seja, maior criatividade. Além do mais, ao aprender idiomas, aprende-se também sobre suas culturas. Isso é ainda mais significativo se de uma forma natural a criança puder conhecer a(s) cultura(s) dos seus pais, da sua família e, consequentemente, sua identidade cultural. A língua é apenas um dos elementos constitutivos da cultura de um povo, mas é também uma importante ferramenta de acesso a ela. A criança deve perceber que o mundo é um lugar onde existem muitos países e que em cada um desses países as pessoas têm línguas, tradições e costumes próprios, e o que parece ser “diferente” para uma pessoa na Espanha pode ser completamente normal para alguém em outro país. No mundo globalizado em que vivemos, existe uma enorme vantagem em conhecer e entender essas diferenças culturais. No entanto, a tarefa de ensinar duas ou mais línguas a um filho costuma ser bastante complexa. Nossa experiência com o Projeto Brasileirinhos indica que, mesmo entendendo ou falando português com o/a pai/mãe brasileiro/a em casa, as crianças que não aprendem de forma mais sistematizada o nosso idioma geralmente adquirem um vocabulário reduzido e não possuem o domínio da língua escrita. Pouco a pouco, as crianças perdem o contato com essa língua materna, a identidade nacional e a cultura brasileira. Levando em consideração que estas crianças estão inseridas no contexto educacional local – Catalunha, Espanha – o projeto “Brasileirinhos” visa possibilitar a esta segunda geração de brasileiros/as o acesso à aprendizagem da língua portuguesa e o vínculo com a identidade e cultura brasileiras, além de propiciar outras atividades de integração e intercâmbio cultural Brasil-Espanha. 1 Cf. http://filhos-bilingues.blogspot.com/ Consultado em Março de 2011.

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A experiência pessoal Desde que vivo em Barcelona (há seis anos) e sou mãe (há três anos e meio), conheci diversas famílias de origem brasileira que, por convicção ou por insegurança, desperdiçam a oportunidade de ensinar português aos seus filhos. A grande maioria é composta por mãe brasileira, pai catalão e crianças nascidas na Catalunha. Algumas dizem ter medo que a criança fique “confusa” com duas/três línguas, ou que não consiga se comunicar com o pai (em catalão) ou que a criança chegue à idade escolar sem dominar a língua do país de residência (espanhol). A maioria acredita que falar de vez em quando com os filhos em português é suficiente para que aprendam o idioma. Também conheci algumas mães que tentaram e falharam parcial ou totalmente na missão de ensinar o português a seus filhos. Muitas se contentavam com o fato do filho entender “algo” de português, apesar de não dominar a língua escrita. Mesmo sabendo expressar-se oralmente, essas crianças serão analfabetas em português e essa limitação poderá restringir suas opções futuras. Infelizmente só uma minoria está conseguindo que seus filhos/as aprendam português, juntamente com as demais línguas familiares e de residência. É preciso desmitificar temas como “bilinguismo retarda a fala” ou “bilinguismo confunde a criança”. Muitos acreditam que crianças expostas a duas ou mais línguas tendem a ter um atraso no desenvolvimento da linguagem. No entanto, pesquisas recentes apontam que crianças bilíngues começam a falar na mesma época que as monolíngues e que algumas começam a falar antes ou depois da média, independentemente do número de línguas a que estão expostas. Deste modo, o atraso na aquisição da fala em geral é simplesmente uma característica do desenvolvimento de cada criança ou consequência da falta de estímulo. Também é importante esclarecer que a idéia que muitos de nós - bilingues tardios - temos de que vários idiomas pode gerar confusão em uma criança é devida a que nós mesmos não desenvolvemos essas estruturas naturalmente durante a primeira infância. Por ter estudado Letras e falar algumas línguas, conheço bem as enormes vantagens do multilinguismo. Também vivi a experiência de ter sido criada no Brasil por mãe italiana e nunca ter aprendido dela uma só palavra de italiano. Fui aprender italiano já adulta, em um curso de idiomas. Quando meu primeiro filho nasceu em Barcelona, eu já não tinha dúvida nenhuma de que ele seria criado em três línguas: português, espanhol e catalão. Estava convicta de que o melhor para ele era estar em contato desde o nascimento com as línguas da sua vida na Catalunha. Quando meu filho tinha dois anos, ajudei a fundar a Associação de Pais de Brasileirinhos na Catalunha juntamente com outros pais e mães brasileiros. Criei e passei a coordenador o Projeto Brasileirinhos, que oferece atividades educativas e culturais em português. Criando crianças bilíngues Como tantas outras escolhas que os pais têm que fazer em relação a seus filhos, dar-lhes ou não uma educação bilíngue é uma decisão importantíssima, que tem que ser considerada, discutida e apoiada por toda a família. A atitude de cada um dos pais em relação à sua própria língua, à língua do outro e à educação bilíngue em si é essencial para o sucesso dessa empreitada. Segundo o relato de várias mães do Projeto Brasileirinhos, a valorização e o

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apoio do pai (não brasileiro) são fundamentais para a constância na rotina linguística escolhida e até por uma questão “logística”. Para muitos pais, falar sua língua materna com os filhos é um elemento importante de seu relacionamento com eles. Quando pai e mãe têm línguas maternas diferentes, a definição de que idiomas serão falados em casa é um fator importante na educação bilíngue dos filhos – o que também pode ser um grande desafio para os pais. Diferentes circunstâncias se aplicam a brasileiros morando no exterior e que estão tentando criar filhos bilíngues. No caso da Catalunha, de acordo com os idiomas a que a criança está exposta na rotina familiar, podemos dividir essas famílias em três grupos principais: 1. Tanto o pai quanto a mãe são brasileiros (ou falam português fluentemente) e português é a única língua falada em casa. 2. Somente um dos pais fala português (geralmente a mãe), enquanto que o outro fala a língua do país de residência e da escolarização (espanhol ou catalão). 3. Um dos pais fala português e o outro fala um terceiro idioma (espanhol ou inglês, por exemplo), que não é o do local de residência e da escolarização (catalão, por exemplo). Das três, a primeira situação é a mais favorável do ponto de vista do aprendizado da língua portuguesa, pois apesar da criança estar exposta a outra(s) língua(s) fora de casa, dentro de casa a imersão na língua portuguesa é total. Fora, na escola, a criança vai aprender o idioma local também por imersão, geralmente sem nenhum problema. No entanto, o fato de ambos serem brasileiros por si só não é garantia de que a criança queira seguir falando português depois de formar um círculo social composto apenas de pessoas que falam a língua do país de residência. Quando atingem certa idade, algumas crianças se recusam a continuar falando a língua usada em casa porque percebem que isso as torna diferentes dos outros à sua volta. Isso geralmente ocorre quando a língua não é suficientemente valorizada. Nas outras duas situações descritas, diferentes cenários podem existir, dependendo dos hábitos desenvolvidos por cada família. No segundo caso, a língua de residência e escolarização tende a ser a mais desenvolvida na criança. Assim, o falante de português vai ter que se esforçar ainda mais na transmissão da língua para seus filhos. No terceiro caso, quando um dos pais fala português e o outro fala um terceiro idioma, as três línguas competem em pé de igualdade e cada um tem que reforçar o aprendizado de sua língua materna. Mesmo assim, em todos os casos multilinguismo é possível. Para isso, é muito importante que as famílias encontrem uma maneira de definir como as várias línguas serão usadas no dia a dia. Quando um casal multilíngue se acostuma a falar entre si em determinada língua antes de ter filhos, eles geralmente encontram grande dificuldade para mudar este costume caso decidam que há maiores benefícios para os filhos se eles falarem entre si em outro idioma. Segundo E. Harding e P. Riley em seu livro “The Bilingual Family”2, essa dificuldade em mudar

2 Cf. HARDING, Edith; RILEY, Philip. The Bilingual Family. Cambridge: Cambridge University Press, 2002.

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o idioma de um relacionamento é a razão que leva ao fracasso esse tipo de tentativa de criar filhos bilíngües. Na maioria dos casos, o casal multilíngue organiza sua rotina linguística de forma que, entre eles, um usa sua língua materna e o outro não, adotando a do companheiro. Devido a que geralmente o falante não-nativo não tem total domínio da língua que está sendo usada (espanhol, por exemplo), o casal se acostumará e já não notará erros gramaticais, de pronúncia, de uso de expressões, etc. - além dos erros da língua escrita. Se o falante não-nativo não tiver motivação para melhorar seu domínio do idioma, por achá-lo adequado a suas necessidades, provavelmente permanecerá sempre no mesmo nível, salvo algumas adições ao vocabulário. Esse “ponto” do aprendizado de um novo idioma – interlíngua – pode cristalizar-se, muitas vezes formando uma terceira língua, que não é nem o português, nem o espanhol. Isso se chama fossilização da língua. O problema maior está em que, se o progenitor não usa sua língua materna (língua de total domínio) para comunicar-se com o filho, este aprenderá do não-nativo uma linguagem incorreta (“portunhol”), pois ainda não tem a capacidade de distinguir a língua corretamente falada desta outra. Um adulto só pode ensinar uma criança a falar bem uma língua se ele mesmo a falar corretamente. Ou seja, se o adulto mistura as línguas, a criança também vai misturar. Quando estão aprendendo a falar mais de um idioma, é normal que no princípio os pequenos misturem as línguas (vocabulário e estruturas gramaticais), mas se os adultos falam suas línguas corretamente, em pouco tempo as crianças aprendem a separá-las. Até os quatro anos, é normal que as crianças misturem as línguas, incluindo palavras em um idioma ou outro porque estão mais familiarizados com elas, porque são mais fáceis ou simplemente porque gostam mais de como soam (exemplos: “vull brincar”, “hay un buraco”). Outras vezes, as crianças utilizam estruturas gramaticais de um idioma no outro (exemplos: “he subit”, “yo también no puedo”). Nestes casos, recomenda-se a correção através de modelos, reforçando a linguagem correta com instrumentos como historinhas e desenhos animados que a utilizem bem. Certo grau de transferência de vocabulário de uma língua para outra é às vezes inevitável (no caso de palavras que não têm uma tradução fácil para o outro idioma, por exemplo), mas na medida do possível isso deve ser evitado, para não confundir a criança. Por exemplo, é normal não traduzir ao português “ensaimada”, “panellets”, etc., mas, deve-se evitar misturar os idiomas como em “bocadillo de queijo” ou “limpar a habitação”. Para que a criança seja bilíngue, é fundamental falar em bom português com ela. Exemplos: evitar falar “dedera” (mamadeira), “papar” (comer), “nanar” (dormir), “au-au” (cachorro), etc. Sistemas linguísticos domésticos Ao definir o sistema linguístico que os pais utilizarão com os filhos em casa, devem levar em consideração o domínio e a familiaridade que têm com o idioma. Geralmente estes se sentiriam estranhos falando com um bebezinho, brincando, tentando transmitir carinho ou até mesmo dando bronca numa língua que não seja o seu idioma materno.

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A maioria das famílias que educa filhos bilíngues tem um sistema linguístico consistente em casa, o que diminui muito a tendência das crianças de misturar as línguas ou se recusar a falar uma delas. Em geral esses sistemas linguísticos domésticos são baseados em um dos dois métodos que Colin Baker chama de “estratégias de separação das línguas”: - Língua minoritária em casa (“Minority language at home”, MLH), ou - Cada pessoa, uma língua (“One parent, one language”, OPOL) Língua minoritária em casa Quando tanto o pai quanto a mãe falam uma língua que não é a falada no país de residência, podem optar por usar apenas essa língua na sua rotina doméstica, inclusive na comunicação com os filhos. A língua minoritária é usada por toda a família, mesmo que não seja a língua materna de um dos (ou ambos) pais. A criança aprende a língua usada pelos pais em casa e a(s) língua(s) do país de residência na escola e outros lugares de interação social. Este é o sistema que tem maior chance de sucesso, pois a criança tem contato constante com a língua minoritária desde o nascimento até o momento em que ela se muda da casa dos pais. Cada pessoa, uma língua Neste sistema, geralmente cada um dos pais tem uma língua materna diferente e se comunica com a criança exclusivamente naquela língua, mesmo que utilize um idioma diferente com seu cônjuge. Para algumas famílias este é o único método viável, especialmente quando os pais não querem abrir mão do privilégio de se comunicar com os filhos em suas respectivas línguas maternas. O método também pode ser usado quando um dos pais é fluente em duas línguas e escolhe falar com a criança naquela que não é sua língua materna. No Brasil tem se tornado mais comum o chamado “OPOL artificial”, sistema em que um dos pais, apesar de ser brasileiro e ter português como língua materna, se comunica com o filho exclusivamente em inglês, para que a criança desenvolva esta língua desde a infância. É interessante observar que especialistas afirmam que a língua usada entre o pai e a mãe não tem influência no desenvolvimento linguístico da criança, a menos que seja também usada na comunicação direta com ela. Do mesmo modo, programas de TV não são eficazes no ensino de idiomas, pois não promovem a comunicação por interação humana. Segundo Orlanda Varela, psiquiatra e coordenadora de formação sobre bilinguismo de Sinew3, um centro de psicopedagogia de Madri, “os idiomas são aprendidos à base de diálogo, de perguntas e respostas, de tentativa e erro e de autocorreção”. Assim, a melhor maneira de garantir o êxito é adotar um sistema que possa ser usado de forma natural pela família, de modo constante e de preferência desde o nascimento da criança. Segundo estudos na área, o aprendizado deve ser iniciado desde o nascimento, aproveitando a “plasticidade” do cérebro. “Até os dois anos, a criança tem muita facilidade para guardar sons e fonemas”, explica o neurologista Paulo Breinis, do Hospital Infantil 3 Cf. http://www.bilingualreaders.es/ Consultado em Março de 2011.

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Sabará4. Isso ocorre porque o sistema nervoso central se especializa com o tempo: pouco a pouco, o bebê aprende, a pegar objetos, engatinhar, andar, comer. “São especialidades que se adquire. No começo da vida não temos especializações, por isso, se a criança for ensinada sobre os diferentes fonemas, armazenará isso em sua memória para o resto da vida”, completa o especialista. Conforme explica Varela, para que uma língua se desenvolva a nível nativo, é necesario que ao menos 20% da atividade comunicativa real da criança seja nesse idioma. Por tanto, das cerca de doze horas que a criança está acordada, duas horas e meia devem ser de estímulos nessa língua, que serão muito maiores quanto mais pessoais e interativos. Crianças bilíngues Existem dois ingredientes essenciais no sucesso da transmissão de uma língua a uma criança: o interesse e a necessidade. Para que a criança queira e realmente aprenda um novo idioma, deve perceber naturalmente – nunca como uma imposição – o valor daquela língua, ou seja, os benefícios que ela traz, as portas que abre, as pessoas e culturas a que dá acesso. Não há que subestimar as crianças. Quando expostas a mais de uma língua, desde cedo elas já percebem o “valor” de cada uma dessas línguas e decidem se o esforço de falá-las vale a pena ou não. A criança vai fazer o que for mais fácil. Se o espanhol cobrir todas as situações que lhe interessam, não haverá necessidade nem interesse de falar outra língua. Do mesmo modo, se a criança sabe que o pai/mãe entende e atende o que ela fala, no idioma que ela prefere utilizar, já não tentará utilizar outro. No entanto, se a criança quiser brincar com outra criança brasileira que não entende seu idioma (espanhol, por exemplo), terá que utilizar ela também o português. Bilinguismo passivo No caso de crianças brasileiras residentes no exterior, o bilinguismo passivo infantil normalmente ocorre quando a criança domina o idioma do local de residência, utilizando-o no seu cotidiano, e entende a outra língua familiar (português, por exemplo), mas não a usa ativamente. Como comentado anteriormente, o bilinguismo passivo infantil é muito frequente e pode ter diversas causas. A falta de vocabulário em português, a falta de valorização ou de interesse pela língua são algumas delas. Também a falta de coerência no uso dos idiomas em casa (quando um dos pai fala às vezes na língua do país de residência e outras vezes em português) leva ao bilinguismo passivo, pois as crianças necessitam previsibilidade e segurança. Há alguns períodos da vida das crianças e jovens que são especialmente críticos: quando entram na escola (três ou seis anos) e na pre-adolescência e adolescência. O outro lado da moeda é que um bilingue passivo recebeu suficiente estímulo (in-put) para entender o idioma, portanto, quando se encontrar em uma situação na qual houver

4 Disponível em: http://www.diariosp.com.br/_conteudo/2010/10/10402-alfabetizacao+em+outra+lingua+e+indicada+para+bebes.html. Consultado em Março de 2011.

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necessidade de utilizá-lo, poderá fazê-lo sem grandes dificuldades. Neste sentido, ser um bilíngue passivo é melhor do que ser monolíngue. Valorização da linguagem e da língua portuguesa Para que a criança aprenda a língua portuguesa morando no exterior e em um contexto bilíngue (ou multilíngue), o primeiro passo é motivá-la nesse sentido. Pesquisas demonstram que um ambiente linguisticamente rico facilita o aprendizado de idiomas. Também é importante que as crianças vejam que os pais leem, escutam música, veem programas culturais, etc., pois elas aprendem principalmente pelo exemplo. O ideal é que em casa (e também na escolinha ou grupo de atividades) haja um ambiente linguisticamente rico, incluindo boa música infantil, historinhas, gibis, jogos didáticos e muitas oportunidades para conversar e brincar com a criança, desenvolvendo assim sua compreensão e seu vocabulário. Apesar de que a televisão (dvd´s) não é suficiente para ensinar um idioma, os vídeos e desenhos animados são uma ferramenta útil para a motivação e valorização da língua. Em alguns casos, também são uma forma de transmissão da cultura brasileira, como por exemplo, as histórias de Monteiro Lobato ou de Ziraldo (Menino Maluquinho), as poesias de Cecília Meireles ou de Mário Quintana, ou os desenhos de Maurício de Souza. O contato frequente com familiares e amigos no Brasil desde a mais tenra idade é absolutamente essencial. A língua deve ser associada a pessoas queridas pela criança e a comunicação a distância pode ser feita por telefone, vídeo-conferência, email, vídeo (via youtube, por exemplo), carta, etc. No entanto, nada substitui a experiência de uma viagem e estadia no Brasil: nesse “outro mundo”, onde absolutamente tudo acontece em português. O estímulo é muito mais eficaz quando a comunicação produzida serve para desenvolver habilidades úteis ao nível real. No caso das crianças, o melhor estímulo são as oportunidades de brincar com outras crianças em português. As “escolinhas” e atividades de português no exterior As escolinhas ou atividades infantis desenvolvidas em português possuem um papel importante no apoio do ensino-aprendizagem da língua portuguesa. Elas também tiram proveito do interesse e da necessidade para motivar a criança a aprender português - em um processo que deve ser conjunto com a família. Sua função principal é de apoio, no sentido de motivar a criança e ensinar-lhe vocabulário, expressões e estruturas gramaticais, além de oferecer contato com a cultura brasileira. Mas, as escolinhas sozinhas – sem a presença do português no ambiente familiar – dificilmente conseguirão ensinar uma criança a falar nossa língua. O formato da maioria desses grupos – no caso do Projeto Brasileirinhos, com uma hora e meia de aula semanal – não constitui uma imersão suficiente na língua para ser realmente eficiente.

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A vantagem das escolinhas e grupos de atividades infantis é que ali a criança vai conhecer outras pessoas – e, principalmente, outras crianças – que se comunicam naquela língua, além de aspectos culturais do país de origem, ajudando-a a entender melhor sua identidade como brasileira. De forma mais estruturada e com mais recursos do que uma única familia, essas atividades proporcionam à criança uma aproximação com o Brasil que de outra maneira talvez só fosse possível se ela pudesse efetivamente estar lá. Alfabetização bilíngue (e multilíngue) Um tema que preocupa especialmente os pais de crianças de 5-6 anos em contextos bilíngues é a alfabetização. Os especialistas são unânimes em afirmar que a alfabetização deve ocorrer primeiramente em um único idioma, de preferência naquele em que a criança tem maior fluência. Segundo a psiquiatra Vera Zimmermann, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp)5, se a criança não tiver o domínio do idioma no qual se quer alfabetizá-la, poderá apresentar insegurança e maior dificuldade em assimilar a língua. No entanto, se a criança já possuir fluência oral nos vários idiomas e as circunstâncias forem favoráveis, a alfabetização bilíngue será um processo quase natural. Quantas vezes as crianças – ou nós mesmos o fizemos – não dizem “fazido”, “abrido” ou “mais bom” quando estão aprendendo a falar? Elas simplesmente estão usando as “regras” que instintivamente entenderam que se aplicam à língua - de acordo com o especialista Noam Chomsky e sua teoria da gramática universal, quem domina uma língua internalizou um conjunto de regras que ajuda as crianças a adquirirem sua língua materna. As exceções são aprendidas com o uso contínuo do idioma. A partir daí a criança necessita de motivação, estímulo e contato suficiente com o português escrito para, com a prática, aprender as exceções. Uma vez que a criança aprende a ler e escrever na primeira língua, ela está alfabetizada. A partir daí ela tem capacidade de transferir conhecimentos e aplicar as técnicas em questão para ler e escrever em outras línguas. O processo de ‘alfabetização’ não tem que ser repetido cada vez que a criança tenta aplicar as técnicas a um novo idioma: só se alfabetiza uma única vez. O que precisa ocorrer é a prática constante no idioma que se deseja fluente. Após a alfabetização na primeira língua (no caso da Catalunha, em catalão ou espanhol), o contato com o português escrito deve ser feito sempre de forma lúdica, ou seja, através de atividades descontraídas e desobrigadas de intencionalidade, livres de pressões e avaliações. Pouco a pouco, este aprendizado acaba sendo feito de forma também intuitiva, semelhante ao aprendizado da fala. O segredo do sucesso parece residir numa boa alfabetização na primeira língua, combinada com uma grande fluência no português falado e muita motivação para decodificar o português escrito. De maneira análoga ao aprendizado da linguagem oral, também é

5 Disponível em: http://www.diariosp.com.br/_conteudo/2010/10/10402-alfabetizacao+em+outra+lingua+e+indicada+para+bebes.html. Consultado em Março de 2011.

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necessário que a criança queira ler e escrever em português e que veja o valor da literácia6 em português, para que a mesma se dê de modo mais espontâneo. Ao contrário das escolas de idiomas que ensinam uma língua estrangeira a crianças, jovens e adultos, as escolinhas ou grupos de atividades infantis no exterior não têm que ensinar às crianças as quatro destrezas da língua (habla, compreensão auditiva, escrita, compreensão leitora). Parte-se do princípio de que as crianças a partir de seis anos já estão alfabetizadas (em algum idioma) e que dominam o português oral. Portanto, o objetivo destes grupos é aprimorar a língua falada e proporcionar às crianças materiais e oportunidades lúdicas e motivadoras para a transferência dos conhecimentos de leitura e escrita já adquiridos. Pouco a pouco, as crianças podem ir familiarizando-se com novas regras ortográficas e gramaticais. Projeto Brasileirinhos O Projeto Educativo Cultural Brasileirinhos foi criado através da Associação de Pais de Brasileirinhos na Catalunha, uma organização não-governamental, sem fins lucrativos, formada por pais/mães brasileiros que residem com crianças na Catalunha, Espanha. O projeto “Brasileirinhos” nasceu como uma prioridade da Associação de Pais de Brasileirinhos na Catalunha, em janeiro de 2010, quando vários destes pais e mães perceberam a necessidade de incentivar a aprendizagem da nossa língua materna aos seus filhos.7

A partir desse interesse, o projeto “Brasileirinhos” vem sendo desenvolvido como uma iniciativa particular, sem fins lucrativos, divulgada através do “boca-a-boca”, e que funciona atualmente no espaço particular da BiblioMusiCineteca8, em Barcelona, cedido pelo Sr. Ferran Baile. A iniciativa é única no país e tem como proposta o ensino da língua portuguesa e a divulgação da cultura brasileira na Catalunha, desenvolvendo paralelamente a interculturalidade. Toda essa movimentação voluntária se justifica visando o futuro das crianças. Apesar de ainda funcionar de forma voluntária e com possibilidades didáticas restritas, aos poucos o projeto tem conseguido novos participantes e reconhecimento entre a comunidade brasileira em Barcelona. Atualmente, desenvolvem-se atividades com um grupo de aproximadamente seis crianças de 2 a 5 anos. As crianças que participam do projeto descobrem, de forma divertida, que há outras como elas que também falam português em casa. A proposta da Associação de Pais de Brasileirinhos na Catalunha conta também com o apoio e a participação de outras associações, grupos e pessoas ligados à cultura brasileira em Barcelona, como por exemplo, grupos de maracatu, capoeira, música brasileira, etc. Ademais

6 Literácia é a capacidade de identificar, compreender e utilizar adequadamente as informações quando necessárias. Literácia significa “saber como aprender" e é um processo para toda a vida. 7 Cabe destacar que a educação das crianças é um tema que preocupa os brasileiros pelo mundo e recentemente tem sido debatido pelas comunidades de brasileiros que vivem no exterior, como foi visto na III Conferência Brasileiros no Mundo, organizada pelo MRE, no Rio de Janeiro, em Novembro de 2010. 8 Cf. http://www.labibliomusicineteca.entitatsbcn.net/ Consultado em Março de 2011.

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de promover a integração das famílias brasileiras através de festas e reuniões (feijoada, churrasco, festa junina, confraternização de Natal, etc), em outros locais definidos para cada evento. Contexto: o português no contexto de Barcelona e da Catalunha Segundo o Ministério das Relações Exteriores e seu Portal Consular, desde meados dos anos 80, registra-se um fenômeno novo na sociedade brasileira: a emigração em grandes fluxos de cidadãos brasileiros para o exterior, sendo que hoje há cerca de 1,5 milhões de brasileiros residentes no exterior.9 Na Espanha, o número de brasileiros cresceu significativamente na última década. Um dos destinos de residência preferidos dos brasileiros é a Catalunha, e principalmente a província de Barcelona. Segundo a publicação "Brasileiros no Mundo: Estimativas 2009"10, do Ministério das Relações Exteriores, há 125.000 brasileiros na Espanha. Segundo dados do Instituto de Estadística de Cataluña (IDESCAT)11, também de 2009, há 27.948 brasileiros na Catalunha, dos quais a grande maioria reside na província de Barcelona. Dentre estes milhares de brasileiros, muitos são famílias com crianças. Infelizmente não existe nenhuma estatística do número de crianças brasileiras que vivem na Espanha, na Catalunha ou em Barcelona. No entanto, ainda segundo o IDESCAT, dez por cento (10%) da população estrangeira na Catalunha está constituída por crianças de 0 a 9 anos de idade. Por tanto, a partir deste dado, pode-se estimar que nesta mesma faixa etária existam mais de 2.000 crianças brasileiras. Quanto ao número de crianças na Espanha, também se deve levar em consideração o recente fenômeno do “baby-boom” espanhol. O Instituto Nacional de Estadística de España (INE)12 avalia que, depois dos últimos anos de alto crescimento no índice de natalidade, no ano de 2009 os nascimentos alcançaram uma cifra recorde, devido à significativa participação de mães estrangeiras na natalidade nacional. Quanto ao sistema de educação, é importante ressaltar que essas crianças brasileiras - nascidas no Brasil ou na Espanha - estão inseridas no contexto educacional local, catalão. Deste modo, estão submetidas a um sistema que prioriza o idioma catalão desde as escolas-berçário (0-3 anos) e que se perpetua ao longo de todo o sistema educativo: educação infantil (3-5 anos), educação primária (6-11 anos), etc. Após a alfabetização, em catalão, as crianças passam a ter aulas de castelhano (espanhol), como “segunda língua”. Em geral, a partir da educação primária são introduzidas as aulas de idiomas estrangeiros, sendo o inglês o mais frequente. Apenas nas escolas internacionais há outras opções de idiomas desde a educação infantil (colégio americano, colégio alemão, colégio francês, colégio italiano, etc). No entanto, para as crianças brasileiras - e mesmo lusófonas - não existe a opção de um colégio brasileiro (ou português). 9 Cf. http://www.itamaraty.gov.br/ Consultado em Novembro de 2010. 10 Os dados se baseiam no resultado de consultas feitas em 2009 a Embaixadas e Consulados sobre os números mínimos e máximos de brasileiros no exterior, segundo dados oficiais locais, pesquisas acadêmicas, publicações da mídia, movimento consular e estimativas dos postos. http://www.brasileirosnomundo.mre.gov.br/pt-br/estimativas_populacionais_das_comunidades.xml/ Consultado em Novembro de 2010. 11 http://www.idescat.cat/poblacioestrangera/?b=12&lang=es/ Consultado em Novembro de 2010. 12 http://www.ine.es/ Consultado em Novembro de 2010.

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Este contexto de falta de opções para o ensino/aprendizagem da língua portuguesa não ocorre só na Espanha. Em vários outros países da Europa e do mundo ocorre a mesma situação. Por isso, estão sendo desenvolvidos projetos similares – alguns já com o apoio do Ministério das Relações Exteriores do Brasil –, como por exemplo: Grupo Contadores de Estórias, em São Francisco (Estados Unidos); Brasileirinhos em Nova York (Estados Unidos); Iniciativa de Mulheres Brasileiras contra Discriminação e Violência (Imbradiva) com o Grupo Pirlimpimpim, em Frankfurt (Alemanha); Associação Brasileira de Educação e Cultura, na Suíça; Projeto Papagaio, em Viena (Áustria), Escola Brasileira de Bromley (Reino Unido), etc. No entanto, uma conjunção de fatores faz da Catalunha um caso peculiar quanto à necessidade de projetos de incentivo à língua portuguesa e à cultura brasileira para as crianças: - alto número de brasileiros vivendo na Catalunha: cerca de 28.000; - alto número de crianças vivendo na Catalunha, devido ao “baby-boom” ocorrido na Espanha nos últimos anos: estima-se cerca de 2.000 crianças brasileiras de 2-9 anos; - contexto linguístico e educacional “bilíngue” que prioriza o idioma catalão e que introduz o castelhano como segunda língua, deixando pouco espaço às línguas estrangeiras e, entre estas, priorizando o inglês e o francês; - e, por último, a inexistência de escolas infantis e de ensino fundamental (brasileira ou portuguesa), ou ainda de escolas de idiomas, com ensino de português para crianças. Objetivo O objetivo principal do projeto “Brasileirinhos” é possibilitar a esta segunda geração de brasileirinhos e brasileirinhas, nascidas principalmente no Brasil ou na Espanha e residentes na Catalunha, o acesso ao ensino e o vínculo com a língua portuguesa, a identidade e a cultura brasileiras, além de oferecer outras atividades que visam a extensão cultural e a integração e intercâmbio cultural Brasil-Espanha. Os nossos valores mais destacados são de paz, direitos humanos, cidadania, solidariedade, igualdade, educação não sexista, e interculturalidade. O projeto consiste em proporcionar às crianças, através de atividades dirigidas, um espaço de encontro semanal e interação em português com outros brasileirinhos, onde elas brincam e conhecem mais da cultura e da identidade brasileira: povos, natureza, música, dança, festas populares, folclore, comida típica, etc, além de noções de história e geografia do Brasil. A proposta pedagógica trabalha a língua portuguesa e a cultura brasileira sempre de maneira lúdica e a partir do contexto social e familiar específico das crianças. A metodologia utilizada é construtivista, pois busca a construção do conhecimento através da experiência de cada um. As principais habilidades e competências desenvolvidas são as lingüísticas e expressivas (linguagem oral e escrita), além de outras como a lógica e o relacionamento interpessoal, por exemplo.

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Público alvo O público alvo principal do projeto são as crianças de origem brasileira, nascidas no Brasil, na Espanha ou em outra parte do mundo, e residentes na Catalunha. O projeto também pode atender a crianças espanholas com alguma relação familiar com o Brasil, ou ainda a crianças de origem portuguesa. * Brincadeiras do Brasil: crianças entre 2-5 anos (brincadeiras e pré-alfabetização). * Português para Brasileirinhos: crianças entre 6-9 anos (já alfabetizadas em algum idioma). Descrição dos Grupos de Atividades Grupo Brincadeiras do Brasil (2-5 anos): Para os pequenos, a proposta é que possam brincar como se brinca no Brasil: brincar, jogar, cantar, dançar, desenhar, pintar, ouvir historinhas, ver desenhos animados, etc, tudo em português. Também são trabalhados conteúdos básicos como: partes do corpo, cores, animais, frutas e verduras, números, formas, localização espacial, estações do ano, letras, nomes das crianças, etc. Grupo Português para Brasileirinhos (6-9 anos): Para o grupo formado pelas crianças maiores e já alfabetizadas em algum idioma (seja catalão, castelhano ou mesmo português) e que falam e entendem português, o objetivo é proporcionar-lhes também a oportunidade de ler e escrever em nosso idioma materno, além de aprofundar seus conhecimentos sobre a cultura brasileira através de atividades lúdicas. Para a prática e aprofundamento da linguagem oral, utilizam-se pequenas apresentações temáticas, representações teatrais, jogos e dinâmicas. Para a prática da compreensão oral, incluindo gírias e expressões populares, utilizam-se músicas infantis e desenhos animados. Para o aprendizado da leitura, utilizam-se materiais autênticos e apropriados para as idades, como contos infantis e revistinhas em quadrinhos, por exemplo. Para o treinamento da escrita, a proposta pedagógica é trabalhar a partir do contexto real de uso da língua pela criança. A partir das suas necessidades e interesses, propõem-se a escritura de palavras e frases em português e atividades como redação de cartas e emails para familiares no Brasil, etc. Busca-se sempre a ampliação de conhecimentos (vocabulário, ortografia, gramática), com fluência e correção. Metodologia e Atividades As atividades educativas e culturais são desenvolvidas de maneira lúdica e específica para cada faixa etária, a partir de jogos e brincadeiras, onde as crianças podem cantar, dançar, brincar de roda, assistir desenhos animados, ouvir ou ler contos infantis em português e revistas em quadrinhos, fazer atividades manuais (plástica), representações teatrais, e experimentar pratos típicos do Brasil, por exemplo. As atividades se baseiam em temas brasileiros que despertam a curiosidade das crianças. Por exemplo, muitos trabalhos são desenvolvidos a partir das principais datas

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comemorativas do Brasil: Janeiro: Ano Novo; Fevereiro: Carnaval; Março: mudança de estação; Abril: Páscoa (“coelhinho da Páscoa”) e Dia do Índio; Maio: Dia das Mães; Junho: Festas Juninas, mudança de estação; Julho: férias; Agosto (recesso das atividades); Setembro: 7 Setembro (“dia do Brasil”); mudança de estação; Outubro: Dia das Crianças; Novembro: Dia Nacional da Consciência Negra; Dezembro: mudança de estação, Natal. As aulas se desenvolvem a partir de situações cotidianas, dinâmicas e lúdicas, através de brincadeiras, jogos, incluindo também as celebrações de fatos importantes nas suas vidas diárias (aniversários das crianças ou nascimento de irmãozinho/a) e no entorno em que vivem (mudanças de estações, etc). Conclusões e resultados Após estar voltada nos últimos anos a estudos sobre educação infantil, sobre aquisição da linguagem, bilinguismo e multilinguismo, com a experiência empírica familiar e com o Projeto Brasileirinhos, além da prática como professora de português para estrangeiros, tem sido possível constatar que os benefícios da educação bilíngue (ou multilíngue) para a vida da criança são muito significativos e valem o esforço de pais e educadores. A modo de conclusão, destacaria que pais e educadores devem fazer um trabalho consciente, constante e sistemático – apesar de natural – para dar às crianças uma educação bilíngue, de preferência desde o nascimento. Cada pai e cada mãe têm a oportunidade de transmitir ao seu filho a sua língua, sua cultura e sua identidade, mesmo morando no exterior. Todos os idiomas e culturas são igualmente importantes e devem ser valorizados. A criança deve perceber o valor das línguas para ter a motivação para aprendê-las. Em um ambiente linguística e culturalmente rico, onde o interesse e a necessidade – ingredientes fundamentais desse processo – estejam presentes, o aprendizado será significativamente facilitado. Cabe destacar o valor – como apoio às famílias – de grupos de atividades infantis voltados para a educação das crianças brasileiras no exterior, como o Projeto Brasileirinhos, em Barcelona. Ao longo de seu primeiro ano de funcionamento, pudemos perceber o desenvolvimento que as crianças do projeto tiveram quanto à fluência em português, com ampliação de vocabulário, expressões, estruturas gramaticais, etc. Outro aspecto relevante é o interesse por conhecer elementos da cultura (infantil) brasileira, como personagens da Turma da Mônica, do Sítio do Pica-pau Amarelo, cantigas de roda, canções infantis, datas comemorativas como o Carnaval, dia do índio, etc. O prazer que as crianças manifestam em estar juntas nesse momento lúdico de contato com a nossa língua e cultura brasileira é também corroborado pelo depoimento dos pais e mães participantes do projeto. Confirmando a teoria com a prática: as crianças aprendem brincando! Marina Simone Dias é brasileira, filha de mãe italiana, estudou Letras-Espanhol e Arquitetura e Urbanismo na UFMG. Mora em Barcelona há seis anos, é mãe de Artur (3 anos) e de Júlia (1 mês). É doutoranda de Arquitetura pela UPC, é membro fundadora da Associação de Pais de Brasileirinhos na Catalunha e coordenadora do Projeto Brasileirinhos..

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Projeto Brasileirinhos, criado pela Associação de Pais de Brasileirinhos na Catalunha: Email: [email protected] Facebook: grupo Associação de Pais de Brasileirinhos na Catalunha. Referências HARDING, Edith; RILEY, Philip (2002) The Bilingual Family. Cambridge: Cambridge University Press. www.bilingualreaders.es/ www.brasileirosnomundo.mre.gov.br/pt-br/estimativas_populacionais_das_comunidades.xml www.diariosp.com.br/_conteudo/2010/10/10402-alfabetizacao+em+outra+lingua+e+indicada+para+bebes.html www.filhos-bilingues.blogspot.com www.idescat.cat/poblacioestrangera/?b=12&lang=es www.ine.es www.itamaraty.gov.br www.labibliomusicineteca.entitatsbcn.net