Robin Jones Gunn - Série Cris 12 - Uma promessa é para sempre
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7/30/2019 Robin Jones Gunn - Srie Cris 12 - Uma promessa para sempre
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Srie CrisSrie Cris
Uma Promessa Para SempreUma Promessa Para Sempre
Editora BetaniaDigitalizao: deisemat
WWW.PORTALDETONANDO.COM.BR/FORUMNOVO/
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Uma Promessa Para Sempre
12
ROBIN
JONES
GUNN
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V em Frente, Garota!
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- Ser que vamos conseguir? perguntou Cris Miller, quase sem flego, sua melhor
amiga, Katie, enquanto o bonde do aeroporto as levava at o terminal.
- Temos de conseguir! replicou Katie, colocando a mochila nas costas. Assim que o
bonde der uma parada, samos daqui. Pegue sua mala para sermos as primeiras a descer.
Cris tirou sua sacola preta do bagageiro e aproximou-se da porta, logo atrs de sua
amiga de vontade forte e cabelos ruivos.
- Voc lembra qual o nosso porto de embarque?
- Cinquenta e quatro, disse Katie, olhando sobre os ombros no momento em que o
veculo parou com um solavanco.
Dezenas de outros passageiros se levantaram.
- Vamos! gritou Katie.
Passou pela porta em disparada, com Cris logo atrs. Caminharam pelo ptio do
Aeroporto Internacional de San Francisco e subiram a escada do terminal, dois degraus a
cada passo.
- Este porto o 87, disse Cris, olhando o quadro de informaes, assim que
entraram no prdio.
- Para que lado fica o porto 54? perguntou Katie em voz alta para quem estivesse
por perto e pudesse indicar.
- Vire esquerda, no final deste corredor, respondeu um atendente de uniforme que
estava na recepo. Atravesse o corredor "E" e continue em frente at chegar ao Terminal
Central Internacional.
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Cris estava prestes a pedir informaes mais exatas, mas Katie j ia correndo por
entre a multido.
- Espere a! gritou ela.J fora ruim o falo de que o vo do aeroporto da cidade delas tivesse se atrasado
mais de uma hora. Cris no queria tambm ficar separada da Katie e perder o vo para
Londres.
- Temos s vinte minutos! explicou Katie quando Cris chegou perto. Douglas linha
razo. Devamos ter tomado o vo que saiu mais cedo, e que a Trcia pegou. Este est uma
loucura!
- Espero que Douglas tenha conseguido vir de San Diego sem problemas
Cris ofegava e seus cabelos estavam enroscados na ala da bolsa a tiracolo. Ela
arrancou do ombro direito e alguns fios foram juntos.
- Aaai!!
- Esquerda, aqui, orientou Katie no final do setor.
Agora corria, a mochila verde saltando com suas manobras atlticas por entre a
multido, como se ela estivesse numa corrida de obstculos. Cris corria atrs, de olho na
mochila verde.
Isso impossvel. No vamos conseguir. Nem acredito que deixei a Katie me
convencer a entrar em outra de suas aventuras malucas!
Katie parou entrada de outro corredor e perguntou a um homem que usava roupa
de executivo.
- aqui a ala internacional?
Ele deu de ombros e continuou andando. Katie se aproximou de outro homem que
descia na escada rolante.
- Continue seguindo nessa direo.
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- Obrigada, replicou ela.
Agora Katie corria a todo vapor e Cris ia s seguindo. Sentiu o suor escorrendo pela
testa, e lamentava ter vestido tanta roupa, uma sobre a outra.Tinham sido instrudas pela organizao missionria da Inglaterra a se agasalharem
bem para essa viagem, j que era tempo de frio. Mas naquele momento Cris desejou que
tivesse colocado o casaco na mala, em vez de vesti-lo. A bolsa parecia pesar cem quilos, e
ela se arrependeu de no ter atendido o conselho de Katie para levar mochila. O que mais
havia ela calculado mal? Ser que essa viagem toda seria um erro?
- Ande! gritou Katie ao notar que a amiga estava ficando para trs.
Com um ltimo surto de adrenalina, Cris forou o passo para acompanhar Katie,
sabendo que entre todos os viajantes, elas eram as nicas que corriam.
- Douglas! ouviu Katie gritar. Estamos aqui!
O rapaz estava junto entrada do corredor internacional, cabea e ombros acima de
todo o resto da multido. Seu habitual sorriso de garoto fora substitudo por um ar
carrancudo, que ela raramente vira nos poucos meses em que andavam namorando. Sua
vontade era receber um abrao dele, sentir o conforto e a segurana dos seus braos, mas
no havia tempo.
- Depressa! Entrem na fila do detector de metais. Ali. Depressa! Nosso vo sai
dentro de cinco minutos.
As duas seguiram suas instrues imediatamente e passaram pelo arco. Felizmente o
alarme no disparou.
- Passagens, por favor, disse uma mulher por trs do balco de check-in, que parecia
tranquila.
As garotas pegaram as passagens e os passaportes. A atendente destacou uma parte
da passagem e continuou:
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- Porto 54 direita. J embarcaram.
- Vamos, gente!
O grito de treinador do Douglas contrastava totalmente com a atitude tranquila dafuncionria da companhia area. Cris percebeu que Trcia devia estar sozinha no avio,
esperando-os. Elas tinham de conseguir pegar esse vo. Os trs correram at o porto no
momento em que a porta comeava a fechar-se.
- Esperem! gritou Douglas, dando um pulo at l. Estamos neste vo.
O homem manteve a porta aberta com o p enquanto outro atendente pegava as
passagens e as verificava rapidamente.
- Vocs alcanaram por pouco.
Mais alguns passos e estavam dentro do avio.
- No acredito, suspirou Cris.
Entregou atendente de vo o comprovante de passagem.
- Seu lugar na fileira 34, l nos fundos.
- Naturalmente, murmurou Katie, com sua mochila frente, abrindo caminho no
estreito corredor.
Cris foi a primam a ver Trcia, no meio da ala 34. Seu rosto em forma de romeno
tomara um aspecto srio, como que a guardar o lugar delas.
- Isso no foi nada engraado, gente! disse ela, franzindo o nariz delicado e tentando
no parecer brava nem apavorada, ou ambas as coisas. Quase desci do avio! Resolvi que,
se vocs no chegassem em dois minutos, eu ia desembarcar. Sem essa de ir sozinha para
Londres!
- Conseguimos chegar. Eu diria que um pouco em cima da hora, mas estamos aqui.
Douglas abriu o guarda-volumes e enfiou nele as bagagens de mo de Cris e Katie
ao lado das suas e da bagagem de Trcia.
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- Faa o favor de sentar-se, senhor, disse o atendente de vo, num carregado sotaque
britnico.
Douglas sentou-se no lugar ao lado do corredor, perto de Cris. Katie, ao lado dela,comeou a contar a Trcia sobre a demora daquela manh. Cris fechou os olhos e respirou
fundo. Tinha vontade de chorar. Ou de rir. Ou qualquer coisa parecida. Sentiu a mo forte
do Douglas sobre a sua.
- Voc est bem? perguntou ele, baixinho.
Ela abriu os olhos e olhou o rosto compreensivo e terno do rapaz.
- Foi arriscado demais, disse.
Mas pensou: Isso demais; uma loucura. Por que estou aqui?
- Vamos Inglaterra, disse ele, limpando o suor da testa com a ponta da manga da
camisa. Com seu sorriso de garoto feliz, disse: D pra acreditar?
- No, sussurrou Cris, sentindo seu aperto de mo. Ainda no acredito. Aconteceu
to depressa!
- , mas conseguimos, disse ele enquanto os comissrios de vo comeavam a
apresentar os itens de segurana do avio. Queria que mais colegas do grupo de "Amigos
de Deus" tivessem vindo. Mas legal que ns quatro tenhamos conseguido.
- Douglas, trs semanas e meia no foram exatamente muito tempo para a gente
levantar sustento e arranjar os passaportes e tudo o mais. Se tivssemos esperado at o
vero para fazer esse estgio, tenho certeza de que muito mais gente poderia ter vindo.
Ele deu de ombros.
- Acho que, se ns quatro voltarmos com um relatrio vibrante, todo mundo vai
querer ir no vero e a poderemos repetir a dose.
- Se fizermos isso de novo, sem dvida vou pegar o primeiro vo, o que Trcia
pegou, mesmo que tenha de acordar s cinco! Voc estava certo com relao a isso.
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Cris tirou o casaco e abanou o rosto vermelho com a mo.
Douglas sorriu. Dava para perceber que lhe agradava ouvi-la dizer que ele acertara.
No era arrogncia; no havia um pingo de arrogncia no corao do Douglas. Elesimplesmente gostava quando ela o elogiava.
O avio agora ia taxiando pela pista, prestes a levantar vo.
- A misso mandou as informaes finais para voc? perguntou ela. a nica parte
que deixava meus pais preocupados. Eu lhes dei o endereo onde passaremos as duas
primeiras noites em Londres, e o do lugar onde treinaremos. Mas acho que eles estavam
preocupados por eu no saber onde estaria fazendo evangelismo nas duas ltimas semanas
da viagem.
- A nica coisa que recebi da misso no fax de ontem foi a instruo de como se
chega a Carnforth Hall para a semana de treinamento, explicou Douglas no momento em
que o avio decolava, ganhando o azul do cu. No se preocupe. Deus dirigir nossos
passos. As prximas trs semanas vo ser uma oportunidade maravilhosa para a gente
aprender a confiar nele.
Cris teve de sorrir. Conhecia Douglas desde os quatorze anos, Nesses quatro anos e
meio ele no mudara nada. Na verdade, ele j vivia qualificando tudo de maravilhoso, na
poca em que ela o conhecera. Ele ficara mais alto e musculoso, mas ainda tinha o mesmo
rosto, agia do mesmo modo e at se vestia do mesmo jeito. Mas, nesses anos, Cris mudara
muito. Ficara adulta. Agora, aos dezoito anos, estava no primeiro ano da faculdade e se
sentia como se tivesse a mesma idade do Douglas, que tinha vinte e trs. Faltava apenas
um semestre para ele se formar em Administrao de Empresas.
- Douglas, perguntou Trcia, inclinando-se na frente de Katie e Cris, voc recebeu a
confirmao do hotel onde vamos ficar em Londres?
- Recebi.
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- E comprou as passagens de trem para irmos a Carnforth Hall?
- A gente compra no aeroporto. Tenho todas as informaes.
- E o horrio? perguntou Katie. Quando temos de estar em Carnforth?- Sexta-feira tarde.
- Voc comprou aquele guia turstico de Londres? perguntou Trcia. Tem tanta coisa
para ver! Como vamos conseguir ver tudo em apenas dois dias?
- Fiquem calmas, meninas. Est tudo sob controle. Assim que apagarem o sinal de
cintos de segurana, vou pegar o livro; a a gente comea a fazer planos.
Cris sentia que a nica coisa que fizera no ltimo ms foi planejar. Ainda estava
surpresa por seus pais haverem concordado que ela passasse o intervalo do semestre com
seus trs melhores amigos no outro lado do mundo.
Mais surpreendente ainda, que os pais da Katie, que no eram cristos, tambm
tinham concordado. Mas eles viam isso mais como uma experincia cultural do que uma
viagem missionria. Trcia e Douglas eram mais velhos do que Katie e Cris, e suas
famlias lhes davam todo apoio. claro que a famlia da Cris lhe dava a maior fora, mas
seus pais tinham a tendncia de proteg-la demais.
A ltima coisa que seu pai dissera na noite de vspera tinha sido:
"Espero que essa viagem a ajude a resolver o que vai fazer de sua vida. Voc sabe
que eu e sua me vamos apoi-la no que resolver. Mas bom saber que est na hora de
decidir."
Ao falar-lhe assim, ele a deixara irritada. Tomar decises nunca fora o forte dela.
Cris havia tomado bastante decises das quais mais tarde se arrependera. A mais
importante delas ocorrera por volta de maio, quando terminara o namoro com Ted, o
melhor amigo de Douglas, para que ele pudesse entrar numa organizao missionria. Na
poca, ela sabia que estava agindo certo, mas levou vrios meses para recuperar-se do
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sentimento de perda.
Levou ainda mais tempo para Douglas convenc-la de que ela deveria namor-lo.
Ela ficara indecisa durante o perodo de frias, e s em outubro concordara em namor-lo.Engraado que nada tinha mudado nos trs meses em que namoravam. Eram bons
amigos, mas sempre tinham sido. Agora ele segurava mais a sua mo, mas nunca a
beijara. Era mais uma amizade tranquila, segura, e que inspirava aos pais dela tanta
confiana, que eram capazes de deix-la viajar com ele para a Europa.
Douglas abriu o cinto de segurana, ps-se de p e tirou da mochila os guias de
turismo. Durante a hora que se seguiu, os quatro fizeram planos sobre o que veriam em
Londres. Para Cris, tudo ainda parecia um sonho.
O jantar foi servido: carne assada fatiada com molho, ervilhas, salada de frutas e um
pedao de bolo com nozes picadas, que ela deu para o Douglas. Cris detestava castanhas.
Serviram tambm ch quente com leite e acar. Cris bebeu-o devagarinho, sentindo-se
adulta e importante. Talvez ela pudesse sair bem nessa aventura internacional.
Logo que as atendentes recolheram os utenslios do jantar, comeou o filme. Cris
no conseguia enxergar a tela por causa da cabea de um grandalho, sentado sua frente.
Ela desistiu do filme e pediu ao Douglas que lhe passasse sua sacola. Pegou seu dirio e
comeou a escrever:
Comea a aventura! Agora, estou no avio, entre Douglas e Katie, e estamos
voando para a Inglaterra. Ainda no d para acreditar. Sinto como se tudo na minha
vida estivesse correndo minha frente nesses ltimos meses, e estou sendo levada na
correnteza.
Meu pai tinha razo quando insistiu para que eu tomasse algumas decises quanto
ao futuro. Ainda no sei o que quero ser. Ainda no sei se gosto de ser adulta. E quando
foi que isso aconteceu, afinal de contas? Devo estar crescidinha, j que estou a caminho
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da Inglaterra. Nem acredito que j ingressei na faculdade. s vezes me sinto muito
independente, e outras vezes eu queria voltar aos tempos mais simples quando eu passava
o dia todo deitada na praia, no fazendo nada a no ser olhar o Ted surfar. pa! Fiz denovo. Disse a palavra "T". No ia mais fazer isso. Eu sei que...
- A palavra "T"? perguntou Katie, olhando para a pgina. Cris fechou o dirio de
supeto.
- Pensei que voc estivesse vendo o filme, cochichou Cris, zangada.
Deu uma olhada na direo de Douglas, que estava com o microfone no ouvido, os
olhos fitos na pequena tela frente.
- No acredito que voc ainda pense na palavra "T"! replicou Katie, tambm
cochichando. J se passaram meses - quase um ano desde que ele foi embora. O cara
sumiu. Escafedeu-se. histria antiga. Vocs no tm nenhum contato. Ele est em
alguma ilha tropical infestada de mosquitos, servindo a Deus e adorando tudo aquilo. Se
ele ainda quisesse voc, teria escrito alguma coisa. Mas ele nunca escreve, no mesmo,
Cris? Jamais escreveu, em toda a sua vida. Pense nisso.
- Esqueceu-se do coco que ele me mandou do Hava?
- Cris, disse Katie, pousando nela uns olhos verdes cheios de seriedade, eu no lhe
diria nada disso se voc no fosse minha grande amiga.
Cris desviou o olhar. Sabia o que Katie ia dizer. J tinham tido essa conversa antes
no final das frias, quando Katie tentou convence-la a esquecer-se do Ted e dar uma
chance ao Douglas.
- Eu sei, sussurrou Cris, uma pequena lgrima ofuscando sua viso.
- No, acho que no sabe, no. Seno ns no estaramos conversando de novo sobre
isso, falou Katie, ralhando srio.
- Podemos deixar essa conversa para outra hora, Katie? disse Cris, piscando os olhos
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azul-esverdeados. O que eu escrevo no meu dirio meu, no seu. Voc no sabe o que
estou pensando.
- Mas consigo adivinhar com boa margem de acerto.- E da? No me lembro de t-la convidado a tomar posse dos meus pensamentos!
No momento que Cris fez esse comentrio, arrependeu-se. No seria bom discutir
com ela, quando comeavam uma viagem de trs semanas, na qual estariam juntas dia e
noite. Principalmente porque, no fundo, ela sabia que Katie tinha razo. A questo sobre
amadurecer e tomar decises relativas ao futuro estava complicada, pois no conseguia se
esquecer de Ted.
- timo! exclamou Katie, colocando de novo os fones de ouvido e fixando a ateno
na tela.
Cris estendeu a mo e deu um aperto no brao da amiga para chamar sua ateno.
Katie virou-se para ela devagarinho e tirou o fone de um ouvido.
- Desculpe, pediu Cris.
- Liga no. Mais tarde a gente se fala, replicou Katie com um sorriso, apertando
tambm o brao da amiga e voltando a ateno para o filme.
Cris sabia que ela a perdoara. Sabia tambm que Katie ia tocar de novo no assunto.
Olhando para Douglas, ficou pensando se ele ouvira alguma parte da conversa. Ele
sempre fora compreensivo e paciente com ela.
A maior prova disso foi ele comprar de volta sua pulseira de chapa de ouro de uma
joalheria, dois anos atrs. Ela ganhara a pulseira do Ted. Ento, Rick, um cara que ela
namorara, roubou-a de Cris e a penhorou numa joalheria, usando o dinheiro para comprar
um bracelete de prata para ela, com o nome dele, "Rick", gravado.
Mas acabara seu relacionamento com Rick rapidamente, e em seguida comeara a
pagar prestaes para recuperar a pulseira de ouro. Um dia o joalheiro lhe entregou a
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pulseira, dizendo que "um cara" havia liquidado o dbito.
S na primavera passada, Cris descobrira que fora Douglas quem pagara. Ele fizera
isso simplesmente por amor. Para ele, no importava que a pulseira houvesse sido dado aela por outra pessoa, por outro cara, alis o melhor amigo dele, e que cativara o corao de
Cris desde o dia em que o havia conhecido na praia de Newport. Durante os anos de
amizade que se seguiram, Douglas sempre ficava em segundo plano, em relao ao Ted.
Quem os conhecesse diria, sem pestanejar, que Douglas tivera a pacincia de esperar
Cris. Nunca deixara transparecer seus sentimentos. S os revelou depois que ela
desmanchou com o Ted e lhe devolveu a pulseira. S depois que Ted j estava no avio,
rumo ao desconhecido, Douglas revelou seus sentimentos por ela. Mesmo assim, o fez aos
poucos. Ele era mesmo o rapaz mais paciente sobre a face da terra. E, como Katie dissera
nas frias passadas, j que l Corntios 13 descreve o amor tomo sendo paciente, bondoso,
no ardendo em cimes, sempre procurando os interesses do outro, Douglas certamente
linha um amor profundo pela Cris.
Cris colocou seu brao no de Douglas, que estava equilibrado sobre o brao da
poltrona, e encostou a cabea no ombro dele. Douglas era um tesouro. Um tesouro que ela
no podia menosprezar. Ela conhecia garotas que dariam tudo para ganhar uma pontinha
da ateno dele. E ela a tinha todinha. Sabia que devia apreci-lo mais.
Douglas ajustou sua posio para dar mais espao a Cris. Ela fechou os olhos e disse
mais uma vez para si mesma que estava mesmo no avio, de viagem para Londres com o
cara mais maravilhoso, no, mais incrvel, mais fabuloso do mundo, juntamente com suas
duas melhores amigas, Katie e Trcia. Essa viagem mudaria sua vida para sempre. Disso
no tinha dvidas.
Jurou que no deixaria nada estragar a viagem nem para ela nem para os amigos,
nem mesmo a lembrana de um Ted invisvel.
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O Big Ben e Outros Locais Famosos
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- Ser que troquei o dinheiro suficiente? Perguntou Katie, ajustando a ala da
mochila.
Os quatro estavam na plataforma com a bagagem aos ps. Esperavam a chegada do
prximo metr.
- , no sei no, continuou Katie. Cem dlares parece pouco quando transformado
em libras. E o dinheiro deles to esquisito! Parece dinheiro de brinquedo.
- Katie, disse Trcia baixinho, aproximando-se mais para que a multido em volta
deles no escutasse. Acho que todos j viram que somos turistas. No temos de anunciar
para toda essa gente quanto temos em dinheiro ou que achamos estranho a moeda deles.
Sacudindo seu cabelo ruivo e liso, Katie olhou em volta, verificando o auditrio
que parecia preocupar tanto Trcia. Mudando depressa de assunto e abaixando um
pouquinho a voz, perguntou:
- Tem certeza que sabe qual o trem que devemos tomar?
Douglas colocou o mapa dobrado no bolso de sua jaqueta jeans.
- Chegamos at aqui, no chegamos? Acho que consigo encontrar o hotel. Vocs
esto com os passes do metro na mo? Teremos que pass-los de novo na mquina
quando sairmos da estao.
- Isso me lembra os trens de So Francisco, disse Trcia, baixinho. S que eles so
trens de superfcie. Vocs j andaram neles?
Nenhum deles conhecia.
- Este sistema aqui um pouco mais antigo, observou Douglas. Voc no viu no
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guia turstico que antigamente, isto , h mais de cem anos, os trens que rodavam aqui
eram marias-fumaa?
Cris ergueu a vista para o teto arredondado e ficou a olhar os cartazes de propagandapelas paredes de tijolo vista do tnel subterrneo. Ela no conseguia imaginar pessoas e
trens se movendo nesses mesmos tneis h mais de cem anos.
- No estranho, gente, imaginar que existe uma cidade em cima de ns? perguntou
Katie. Ainda no sinto que estamos em Londres. Acho que s vou sentir quando vir um
daqueles nibus vermelhos de dois andares.
Naquele momento um jato de ar explodiu na passagem escura. Um instante depois o
trem chegava e parava na estao. Antes que Cris conseguisse colocar a mala de jeito a
empurr-la para dentro do trem, as pessoas comearam a empurrar-se em direo a porta
aberta. Sua mala de ala e rodinhas fora presente de Marta, a tia rica.
- Consegue levar? perguntou Douglas ao notar sua dificuldade.
- Agora consegui.
Cris foi empurrando a mala em direo porta, sentindo Douglas logo atrs,
ajudando-a a entrar no trem.
Trcia arranjou logo um lugar e colocou sua mala ao lado, para que Douglas ou Cris
se sentasse ao seu lado. Katie vinha atrs de Douglas. Cris sentou-se ao lado de Trcia, e
s percebeu que as portas estavam se fechando quando ouviu o grito estridente de Katie.
Olharam para cima. S conseguiram avistar a mochila dela, presa entre as duas portas que
se fechavam.
- Gente, me ajude aqui! gritou Katie.
Cris bem que desejou cair na gargalhada, mas engoliu o riso e correu para ajudar
Douglas a abrir a porta. Com muito esforo, abriram-na, deixando entre uma folha e outra
espao suficiente para dar passagem a Katie e sua bagagem - o que ocorreu justo no
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instante em que o trem dava partida.
- Katie, voc se machucou? perguntou Trcia. Podia ter morrido! O que foi que
aconteceu?- Estava tentando no me perder de vocs. Parece uma constante nesta viagem, no
mesmo?
Katie deixou cair no cho sua mala de lona e segurou-se numa barra de metal perto
do assento de Cris.
- Acho que precisamos bolar um plano "B" aqui, Douglas, continuou ela. Se eu no
tivesse conseguido entrar no trem, teria me perdido completamente. Nem sei onde vamos
ficar! Como eu teria me encontrado com vocs? Precisamos de um trabalho melhor de
equipe.
- Voc tem razo, disse Douglas, segurando-se atrs de Cris para se firmar, enquanto
o trem acelerava, fazendo-os balanar. Os quatro se aproximaram mais, Cris e Trcia
sentadas, Katie e Douglas de p, perto delas. Cris achou que estavam chamando ateno
dos outros passageiros.
- Ento, principiou Douglas assumindo um tom de treinador, a gente se hospeda no
hotel Miles Hampton, na Rua Seymore. Descemos no Hyde Park. Da a gente vai a p
para o hotel. Fica perto - alguns quarteires apenas. Se vocs precisarem de ajuda com as
malas, s falar. E vamos combinar de ficar juntos e cuidar um do outro, certo?
Os poucos quarteires do Douglas acabaram sendo alguns quilmetros. Ou isso, ou
estavam perdidos.
Posso ver esse mapa outra vez? perguntou Katie, parando em frente de outra fileira
de casas iguais s da ltima rua que haviam subido. Tem certeza que esse lugar um
hotel?
- Cama e caf da manh, gente, disse Douglas, pousando no cho a mala de lona e
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pegando o mapa. Meus pais ficaram l uns dois anos atrs. Disseram que era fcil de
encontrar. Olhe, aqui a Rua Seymore. Em que rua estamos agora?
Cris "estacionou" sua mala de rodinhas e desceu do ombro a pesada sacola quelevava a tiracolo. No dava para acreditar como a caminhada a deixara sem flego. Pela
primeira vez, olhou em volta, lanando a vista nas casas estreitas e altas de tijolo a vista
que ladeavam a rua. Txis pretos passavam por eles na "contramo". O local era
barulhento como uma cidade grande, cheia de carros, nibus buzinando e cachorros
latindo. Do outro lado da rua, chegava o alegre som de um sininho tocando no momento
em que uma senhora entrava muna padaria, carregando um guarda-chuva fechado.
Ah no, disse Cris, olhando para o cu cinzento e erguendo a mo. Espero que j
estejamos chegando, porque est comeando a chover.
Foi ento que notou como fazia frio. Como antes estavam andando depressa, ela no
tinha notado o frio mido a tomar conta de suas pernas. O jeans no bastava para proteg-
la do frio penetrante, e suas pernas formigavam, geladas at os ossos.
- Por aqui, disse Douglas, descendo a rua com passos largos e decididos. S mais
dois quarteires.
Dessa vez ele estava certo. Ainda bem, porque na hora em que pararam embaixo de
um toldo azul, porta do Miles Hampton, a garoa que brincava com eles nos ltimos
quarteires, virou uma respeitvel e forte chuva londrina.
A porta estava trancada; Katie tocou a campainha umas duas vezes. Uma senhora de
bochechas rosadas e cabelos brancos olhou pelas cortinas de renda da janelinha da porta.
- Quem ser essa pessoa impaciente? disse, animada, ao abrir a porta. Entrem,
entrem! No vai dar certo vocs se resfriarem logo no primeiro dia!
Minutos depois estavam todos registrados na estranha pousada como a mulher se
referia ao seu estabelecimento. Subiram com as malas quatro lances de escada em espiral,
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at o andar de cima, onde havia dois quartos preparados para eles. O das garotas tinha trs
camas de solteiro e um banheiro separado, com uma banheira enorme, a maior que Cris
vira em toda sua vida. Era uma casa antiga, mas havia sido restaurada de modo agradvel.O quarto era limpo e claro. Cris notou que as colchas floridas eram fofas e deitou-se na
cama mais prxima dela.
Trcia fez o mesmo, caindo de cara sobre a cama ao lado.
- Esse travesseiro est me chamando, disse. Est dizendo para eu ficar aqui juntinho
dele o dia todo.
Cris ouviu a chuva gotejando na janela. Concordou plenamente com Trcia. Afinal
de contas, l nos Estados Unidos eram trs da madrugada, e ningum conseguiu dormir
durante as dez horas de vo. Uma soneca agora viria a calhar.
- Pronto, gente? perguntou Katie, entrando com Douglas logo atrs. Vamos ver
Londres!
As duas soltaram um gemido preguioso.
- O quarto de vocs, meninas, realmente o melhor dos dois, disse Douglas,
lanando a vista pelo papel de parede. Meu quarto no ruim. Mas parece que estou
dormindo num sto: teto inclinado, apertado. Vocs tm at banheiro.
- E o seu no tem?
- No, tenho de usar um no final do corredor, no andar debaixo. Mas eu realmente
no me importo; pelo preo, este lugar excelente. Alm do mais, no vamos ficar muito
tempo aqui. Temos de conhecer a cidade.
- isso a, gente, disse Katie, entrando no banheiro e abrindo a torneira para lavar o
rosto. A pior coisa que poderamos fazer seria dormir agora. Temos de ficar de p o dia
todo para convencer nosso relgio biolgico que de dia, e no de noite. Ei! Como ser
que se consegue gua morna nessa geringona?
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Douglas entrou no banheiro e lhe ensinou a vedar a pia para ench-la de gua quente
e fria, da resultando gua morna.
- Quer dizer que de um lado s sai gua fervente, e do outro s gelada? Que arcaico!- Sinto muito ter de lhe dizer isso, "Tot", mas no estamos mais no Kansas, disse
Douglas, imitando a "Dorothy", de O Mgico Oz, molhando os dedos e jogando gua no
rosto de Katie. Esta cidade muito antiga, a casa muito antiga, e o encanamento tambm
um pouco.
Molhou novamente os dedos, deu trs passos at a cama de Cris e respingou gua
nela tambm.
- Acorde! Est na hora de se divertir.
- Trcia, disse Cris, est me parecendo que tem uma goteira no teto. Senti uma gota.
- , ouvi um pingo cair concordou a outra.
- Ah ! exclamou Douglas.
Antes que Cris ou Trcia pudessem perceber o que ele fazia, Douglas enfiou uma
toalha de mo na gua da pia e comeou a torc-la sobre a cabea de Trcia. Ela gritou,
deu um salto e comeou a rir.
- Isso aqui no a praia de Newport, seu surfista maluco! No pode sair por a,
respingando gua na gente, aqui em Londres. No correto!
Todos riram do "sotaque britnico" que Trcia usou em suas ltimas duas frases.
- Mas, Douglas, est chovendo l fora, e aqui dentro est to quentinho, disse Cris,
choramingando de mentirinha.
- Ento eu fao chover aqui dentro! ameaou Douglas com a toalha molhada.
- Est bem, est bem. Espere s eu pentear o cabelo.
Cris trocou de lugar com Katie no banheiro e fechou a porta. Olhou-se no espelho,
assustada. As faces estavam rosadas e o cabelo castanho-claro, que dava um pouco abaixo
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dos ombros, estava achatado contra a cabea, sem vida.
Achou o cabelo curto da Trcia uma gracinha, com o novo corte para a viagem. Era
naturalmente encorpado e bastava apenas uma rpida escovada para ficar ajeitado. Crispensou se no teria sido melhor cortar o seu tambm para a viagem. Sabia que Douglas
gostava dele comprido. Ela tambm gostava. Mas agora no estava achando a menor
graa nele. Depois de pux-lo para trs com um diadema, tentar um rabo de cavalo e
experimentar uma rpida trana, desistiu.
- Voc est viva a dentro? perguntou Katie, batendo na porta.
- Meu cabelo est me deixando maluca!
- E voc vai deixar todo mundo maluco! gritou Katie.
- Est bem, est bem.
Ela sacudiu a cabeleira, lavou o rosto e enfiou um prendedor na bolsa, caso
resolvesse prend-lo mais tarde. Abriu a porta do banheiro, pronta para sair. Uma luz forte
ofuscou lhe o rosto.
- Obrigada, Cris, disse Katie. Voc foi meu primeiro modelo fotogrfico em
Londres. Vamos ver quais as outras coisas esquisitas podemos fotografar!
- Ah! Muito obrigada! falou Cris em tom irnico.
Em seguida pegou o casaco e seguiu os amigos pela escadaria em espiral, que
parecia interminvel, e todos se dirigiram para o saguo.
- Quero tirar uma foto perto de um daqueles guardas que ficam em seu posto, o dia
inteiro sem se mexer, disse Katie. Talvez eu consiga que ele d pelo menos um sorriso.
- Primeiro, comida! disse Douglas assim que pisaram fora do hotel, todos bem
agasalhados e segurando alto as sombrinhas. Temos de seguir nossas prioridades.
A primeira coisa que acharam foi um restaurante do Frango Frito de Kentucky.
- Eu no vim Inglaterra para comer frango frito do Kentucky, disse Katie, correndo
-
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os olhos pela rua procura de outro tipo de restaurante.
- Vamos l, insistiu Trcia. s um lanche. Depois, na hora do almoo, a gente
procura uma casa tipicamente inglesa. Acho que o Douglas no agenta mais.- Obrigado, Trcia, disse Douglas, fechando o guarda-chuva.
Entraram no restaurante cuja decorao era igual de centenas do mesmo tipo nos
Estados Unidos. A nica diferena era o dinheiro.
- uma libra e quarenta e cinco p, senhorita, disse o homem que os atendeu.
Cris entregou-lhe uma nota de dez libras e recebeu de troco um punhado de moedas
e uma nota de cinco libras. Sentou se com os outros a uma mesa perto da janela.
- No esquisito esse dinheiro? disse Katie, examinando seu troco.
Trcia repreendeu-a:
- Katie, j no falamos sobre esse negcio de dizer que o dinheiro deles estranho?
Cris percebeu que um casal idoso que se achava mesa do lado os observava Notou
tambm que o lugar era silencioso, embora estivesse lotado. Todo mundo falava baixo e
era discreto, menos os quatro americanos.
Em comparao, Katie parecia extremamente barulhenta. Isso incomodou Cris, que
achou que Trcia tambm se sentia incomodada. Douglas parecia no estar nem a. Ele
tirou do bolso o mapa e o guia turstico e perguntou:
- Ento, qual ? Vamos ver primeiro o Big Ben* e depois as jias da coroa na Torre
de Londres? Acho que pegamos o nibus 16. No, talvez seja o 11.
____________________
* Big Ben: um relgio famoso. localizado no alto de uma torre do Parlamento britnico. (N. do E.)
- Deixa eu ver, disse Katie, tirando o livro da mo do Douglas. Ah, a casa de Charles
Dickens! Isso seria interessante. Vamos l depois de ir Torre de Londres.
- do outro lado da cidade, Katie, reclamou Douglas.
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- nada, olha aqui, fica do lado de... ah, tem razo. Tudo bem, ento vamos
Catedral de So Paulo. s dois passos de distncia da Torre de Londres.
- Vamos simplesmente ver o que der para ver, sugeriu Trcia, jogando suas vasilhasdescartveis na lixeira.
Cris sentia-se aliviada, porque no cabia a ela a escolha do caminho a seguir, nem da
forma como chegariam l. Contentava-se apenas em seguir os outros deixando a Katie e
Douglas o papel de "desbravadores".
Tomaram um nibus perto do arco de mrmore e foram at Picadilly Circus".
Douglas disse para descerem e procurarem o nibus n. 12 que os levaria at o Parlamento
e o Big Ben.
Era divertido viajar na parte superior do nibus de dois andares, porque dali de cima
Cris tinha uma boa vista das ruas movimentadas e das esttuas e monumentos por onde
passavam. O de que ela no gostou foi de descer dele, e depois ficar tremendo de frio
debaixo da sombrinha, ouvindo Douglas e Katie discutirem. Tambm detestava sentir-se
meio perdida e confusa. E parecia que as coisas pioraram quando desceram em frente do
imenso prdio do Parlamento, de linhas arquitetnicas muito complicadas, e perceberam
que o Big Ben estava completamente coberto pela neblina, e no valeria a pena tentar tirar
uma fotografia. Mas tirou assim mesmo. Sua mquina, presente do tio Bob no ano
passado, lhe servira bem durante seu ltimo ano do segundo grau. Ela fora fotgrafa da
equipe do anurio da escola. Sabia que quando voltasse para casa ficaria contente de haver
fotografado locais famosos, embora cinzentos e encobertos pela neblina.
- Bem, isso foi empolgante, disse Katie ironicamente, virando e bloqueando a
objetiva da Cris com sua sombrinha rosa-chocking. O que mais vamos ver?
Sem responder, Cris deu alguns passos direita e ajustou de novo o zoom e tirou
outra foto do Big Ben.
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- gente, fiquem a, ao lado da cerca, para eu tirar uma foto de vocs tendo o
Parlamento como fundo.
Os trs concordaram, esbarrando as sombrinhas umas nas outras, e esperando que ostranseuntes se afastassem da frente da cmara. Cris tirou a foto e depois, virando-se,
fotografou a rua atrs deles com um txi preto e um nibus vermelho tentando ultrapassar-
se no trnsito movimentado.
- Vamos ver o rio Tamisa? convidou Douglas. De acordo com o mapa, logo ali,
depois do parque.
- E, o que tem para ver? perguntou Katie.
- um rio famoso, respondeu Douglas. Vamos l, tenha um pouquinho de esprito
de aventura, Katie!
- J tive. Vi o Big Ben e no achei graa. Agora quero uma grande aventura. Quero
ver as jias e os guardas de chapu de pelcia.
- Estamos to prximos do rio, interveio Trcia. Talvez devssemos ir dar uma
olhada para poder dizer que pelo menos vimos o Tamisa.
- Seja l o que fizermos, podemos pegar um nibus? Minhas pernas esto
congeladas, comentou Cris. Tinha se arrependido de no ter vestido uma meia-cala
grossa no hotel. Sentia muito frio. Era um frio mido; um tormento.
- uma caminhadinha rpida at o rio, disse Douglas, tomando a mo de Cris. Se
andarmos depressa, voc se aquece. Vamos!
Foram at o rio. Como disse Katie depois, aquela corrente de gua cinzenta e
coberta de nvoa "parecia o Big Ben, s que na horizontal e sem nmeros".
Estavam correndo de volta para pegar outro nibus quando Trcia notou um prdio
velho e interessante esquerda.
- D uma olhada no guia turstico, Douglas, disse ela. Tenho certeza de que aquilo
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ali alguma coisa importante.
Cris detestou a idia de ficar parada debaixo da chuva fina. Bateu os ps para
aquecer-se e afastar o frio das pernas.- Olha a, gente! exclamou Trcia. a Abadia de Westminster!
- Legal! disse Katie, sem o mnimo de entusiasmo. E o que isso?
- uma igreja muito antiga, respondeu Trcia, lendo o livro. Diz aqui que a primeira
vez em que foi utilizada como local de culto foi no ano 604 de nossa era. Pode imaginar
como velha? E escute aqui: "Desde o sculo XI, nessa igreja que se realiza a coroao
dos reis e rainhas da Inglaterra." Precisamos v-la, gente! Tem um monte de gente famosa
enterrada aqui. Charles Dickens foi enterrado a!
Katie notou que a chuva tinha parado e fechou a sombrinha enquanto Trcia lia.
Comprimindo os olhos, aproximou-se de Trcia e perguntou:
- Est falando srio? Quer mesmo ver um monte de gente morta?
- a Abadia de Westminster. superfamosa, Katie!
- O Big Ben tambm, e acabou sendo uma chatice.
Douglas fechou seu guarda-chuva e disse:
- Posso dar um palpite? Acho que estamos todos cansados e com fome. Vamos
procurar um restaurante e, l, resolver o que faremos depois de renovar as energias.
- Excelente idia! disse Cris. Estou gelada! Acho que minhas meias esto molhadas.
Os ps esto formigando.
- E ento, gentis senhoritas? Vai a uma boa xcara de ch ingls?
Elas foram obrigadas a relaxar um pouco a tenso ao ouvirem a imitao do sotaque
de mordomo ingls do na ltima sentena. Voltando at a Praa Trafalgar, os quatro
viajantes, cansados e ensopados, saram procura de um pequeno restaurante tpico e uma
xcara de ch quente
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Uma Xcara de Ch
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- No de admirar que os ingleses gostem tanto de ch, disse Cris ao segurar com as
duas mos sua xcara de porcelana branca.
Tomou o ch devagar, como se ele a estivesse aquecendo at os ps.
- Se eu morasse aqui, prosseguiu, tambm procuraria alguma coisa que me deixasse
aquecida o dia todo.
Katie comeu um ltimo pedao de peixe e disse:
- At que o vinagre no peixe no estava mal, mas ainda prefiro o velho molho de
trtaro, americano. Quer o resto das minhas fritas, Douglas?
- Claro, aceito os seus chips, disse ele, usando o termo britnico para batatinha frita.
- Eu queria saber uma coisa, disse Trcia. Se eles chamam as batatas fritas de chips,
do que que chamam os salgadinhos chips que a gente compra empacotados nos Estados
Unidos?
- Crisps, disse o garom, estendendo a mo para tirar o prato de Katie.
Tinham encontrado por acaso aquele restaurante tpico com uma mesa e quatro
cadeiras que pareciam estar espera deles. O garom era bastante amigvel. As quatro
pores de peixe com batatinhas fritas que pediram vieram acompanhadas de ervilhas - as
mais amassadas que Cris j vira. Comeu metade do peixe, metade das fritas e s provou
da ervilha, cujo gosto era mais ou menos igual aparncia dela.
Douglas conseguia acabar com todas as sobras de comida que as garotas deixavam,
inclusive as ervilhas. Cris concluiu que ele devia ter nascido sem a capacidade de
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distinguir sabores. Ou ento seu estmago era sem fundo e "exigia" tanto que no havia
lugar para um paladar refinado.
O rapaz enfiou na boca os ltimos pedaos de batata j frios e olhou o relgio.- Passa um pouco das quatro. O que vocs acham? Devemos tentar a Torre de
Londres agora para ver as jias ou esperar at amanh?
- Amanh teramos mais tempo, sugeriu Trcia.
- Mas o dia j acabou!? Que dia hoje, afinal? perguntou Cris.
- Quarta-feira, disse Douglas. L na Califrnia so oito da manh, hora de comear o
dia.
- No esquisito? Em casa todo mundo est comeando o dia e ns estamos no fim
dele.
Dava para Cris perceber que Trcia morria de vergonha da voz alta de Katie e suas
declaraes de que isso ou aquilo era esquisito. Cris tambm no gostava, mas no estava
to irritada quanto Trcia.
- E ento, o que vocs querem fazer? J, j vai escurecer.
- Vamos ver tudo que pudermos, disse Trcia, ainda que esteja escuro. S temos hoje
e amanh. J que viemos de to longe e h tantas coisas para se ver, e ainda no vimos
nada... Vocs topam voltar Abadia de Westminster? Eu gostaria muito de v-la.
Douglas respondeu pelos quatro.
- Claro. Vamos pagar a conta e sair daqui.
Enquanto caminhavam apressados at a antiga igreja em estilo gtico, Cris notou
que Katie estava estranhamente quieta. A tenso entre ela e Trcia parecia estar crescendo
e isso a incomodava.
Ao longo dos anos, Douglas e Katie haviam experimentado diversos conflitos
amigveis, mas, apesar de tudo, a amizade deles permaneceu intacta, de p. Katie e
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Douglas estimavam-se como irmos.
Trcia e Douglas eram amigos havia mais tempo do que Cris e Trcia. Na verdade,
Douglas e Trcia anos atrs tinham at namorado durante algum tempo. Terminado onamoro, eles permaneceram bons amigos, e Cris no se lembrava de ter ouvido qualquer
um deles dizer alguma coisa negativa sobre o outro. Eles se davam bem em todas as
situaes.
Mas Katie e Trcia nunca tinham passado muito tempo juntas. Apesar de terem
personalidades muito diferentes, eram bem parecidas em certas reas. Eram ambas moas
fortes, de gnio vigoroso. Katie, de modo extrovertido, e um tanto agressivo, e Trcia, de
maneira gentil, firme e inflexvel.
Trcia tambm sentiu a crescente tenso com a Katie e, prudentemente, acercou-se
dela e disse:
- Aprecio muito sua flexibilidade. Estou ansiosa para ver a Torre de Londres
amanh. Tenho certeza que vamos ter mais tempo. Tambm estou certa de que vai ser
bem melhor assim do que tentar ver tudo agora.
A princpio, Katie nada respondeu. Porm ao atravessarem a rua na direo da
abadia, Cris ouviu-a dizer:
- Voc sempre consegue o que quer, no Trcia?
Cris queria virar-se e ralhar com Katie, mas Douglas rapidamente ps o brao em
volta do seu ombro, e sussurrou:
- Deixe que as duas se entendam, Cris. Confie em mim. Assim vai ser melhor para
ambas.
Cris teve de confiar no Douglas, pois no havia mais nada que pudesse fazer.
Esforou-se por ouvir o que Trcia, com seu jeito delicado porm firme, dizia a Katie
explicando que precisavam atuar em equipe e fazer o que fosse melhor para o grupo.
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- Certo, respondeu Katie. Mas seria bem melhor para todos se as decises fossem
tomadas pelo grupo, e no apenas por voc.
- Voc tem razo, Katie, replicou Trcia. Depois dessa, vamos todos resolver juntoso que fazer.
Estavam porta do velho prdio de pedras e Cris percebeu que nem tinha prestado
ateno aparncia do edifcio. Entrou solenemente. Um cartaz ao lado da porta indicava
uma taxa de visita de trs libras.
- Trs libras! exclamou Katie. No vou pagar o equivalente a cinco dlares para
entrar numa igreja! Espero vocs aqui fora e podem entrar sozinhos.
- Acho que s cobram quando h um guia turstico dando explicaes, Katie, disse
Douglas, baixinho. No precisamos pagar s para dar uma olhada nesta parte.
Os quatro entraram no santurio cheio de turistas; Katie ficou um pouco atrs.
Caminharam em silncio, observando as esttuas, os memoriais e as gravuras no cho de
pedra, identificando quem estava enterrado em cada ponto do lugar.
- Olhe, Cris! disse Douglas, apontando para uma inscrio grande no cho sua
frente. David Livingstone foi enterrado aqui. Era aquele missionrio famoso na frica.
Sabia que trouxeram o corpo dele de volta para a Inglaterra, mas deixaram o corao
enterrado na frica, porque era ali que estava seu corao - com o povo africano? No
uma maravilha, um negcio incrvel?
Cris no estava certa de que fosse uma maravilha. Bizarro talvez fosse um adjetivo
melhor. Parecia algo que o Ted teria feito.
Ted. De onde veio esse pensamento?
Impulsivamente, tomou a mo do Douglas e apertou-a.
- Douglas, voc tambm quer ser missionrio em alguma terra longnqua?
- Quer dizer, que nem o Ted?
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Ser que ele l meus pensamentos? Ou estaria pensando as mesmas coisas que eu
quanto ao Ted?
- No sei, disse Douglas, pensativo, olhando de novo para o cho. por isso que euquis vir nessa viagem de evangelismo. Quero ver se "dou" para a coisa. No sou como o
Ted.
- Eu sei, e nem quero que seja como ele. Quero que voc seja Douglas. E voc ...
Agora seus pensamentos estavam confusos e Cris sentiu raiva de no haver
conseguido deixar a lembrana do Ted no avio. Na Califrnia. Nas recordaes do
colgio. Ted "viera" junto com eles para a Inglaterra, e mais uma vez misturava-se com
eles.
- Eu s queria saber se voc j pensou em ser missionrio, continuou Cris, apertando
a mo do Douglas.
Queria pensar nele, e s nele.
- Na verdade, no. Como estou cursando Administrao de Empresas, o que desejo
mesmo ingressar numa grande empresa e me integrar nas foras de produo do pas, e
ser uma espcie de missionrio junto aos milhares de empresrios americanos que esto
perdidos. Acho que no conseguiria morar em outro pas.
- Nem eu, disse Trcia. Quer dizer, aqui bom para a gente visitar, mas eu me sinto
mais segura num ambiente conhecido. E voc Cris?
Cris nem tinha notado que Trcia estava do outro lado de Douglas.
- No sei. por isso que eu tambm resolvi vir nesta viagem. No sei o que quero
fazer no futuro. Ou melhor, no sei o que Deus quer fazer com a minha vida.
Dizer isso em voz alta era mais assustador do que quando pensara ou escrevera
sobre o assunto no dirio. Era como confessar que estava perdida, fazendo cursos bsicos
numa faculdade pequena e tentando apenas procurar respostas para dar aos conselheiros
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profissionais que lhe perguntavam em que tipo de carreira ela estaria interessada.
Sinceramente, no sabia.
Um senhor uniformizado perguntou gentilmente se queriam sentar-se, porque oculto vespertino estava prestes a comear. Katie j estava sentada numa das cadeiras de
dobrar, no setor onde se encontravam. Os trs foram para perto dela. Douglas tomou a
iniciativa e sentou-se ao lado da amiga.
Da a instantes, um coro de meninos, vestindo becas brancas com detalhes
vermelhos e golas de renda, desceu em fila dupla pelo corredor central, passando
exatamente por cima da pedra de David Livingstone a caminho do altar frente da capela.
Cris fechou os olhos e inspirou fundo, sentindo a grandiosidade do lugar, no
momento em que as vozes claras e altas do coro ressoavam pelo teto arredondado de
pedra desse antigo santurio. Durante a msica e a leitura da Bblia que se seguiram, Cris
baixou a cabea e adorou o mesmo Deus maravilhoso a quem outras pessoas haviam
rendido culto nesse mesmo lugar havia mais de mil anos. A idia a deixava sria, sentindo
uma reverncia que nunca sentira em sua igreja, da Califrnia.
Tentou explicar o fato aos amigos na manh seguinte, quando tomavam caf no
pequeno refeitrio do hotel. Cris estava sentada de costas para uma imensa lareira onde
crepitava uma chama alegre e acolhedora. Douglas parecia entender o que ela dizia, e
Trcia concordava entre uma mordida e outra nas deliciosas torradas. Katie comia em
silncio, estudando o guia de turismo, sem se ligar na conversa.
As coisas no estavam bem entre Katie e Trcia naquela manh. Katie tinha lavado a
cabea e pedira emprestado o secador da companheira de viagem.
- Claro, mas lembre-se de ligar o adaptador de voltagem, recomendou Trcia.
Katie instalou o adaptador de voltagem numa tomada e o secador em outra. Quando
ligou o aparelho, o som que este emitia parecia o de um triturador de capim. Em menos de
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dez segundos, o secador comeou a cuspir fascas pelo quarto e queimou.
O rosto da Trcia ficou vermelho ao olhar o fio do secador queimado e em seguida a
tomada. A ela disse:- Katie, voc tinha de ligar o secador no adaptador!
- Como que eu ia saber uma coisa dessas? Voc s disse pra ligar primeiro o
adaptador, e eu liguei.
Trcia arrancou o secador das mos dela. Ele tinha um forte cheiro de coisa
queimada. Esforando-se por controlar a voz e os nervos, ela disse:
- Tudo bem, no se preocupe mais com isso.
Na hora, Cris achou que teria sido melhor se Trcia houvesse partido para cima de
Katie. Ela saberia aguentar uns tapas. Mas desde o incidente, as duas no se falaram mais.
- Voc quer o resto dos seus ovos com lingia? perguntou Douglas a Cris, olhando
seu prato ainda quase cheio.
- No pode comer.
Ele pegou a chaleira de prata no meio da mesa e serviu-se de outra xcara de ch,
adicionando-lhe leite e acar.
Algum mais quer ch? perguntou.
- No, obrigada, disse Katie, sem tirar os olhos do livro.
- Que nibus tomamos para ir Torre de Londres? perguntou Douglas.
- Assim que chegarmos Rua Oxford teremos um monte de opes. Ainda lembra
como vai at l?
Douglas achava que sabia e meia hora depois estavam agasalhados, sombrinhas e
guarda-chuva na mo, e armados de mquinas fotogrficas. Cris estava com uma cala de
l colante por baixo do jeans, e ainda usava dois pares de meia. Deu para sentir a
diferena quando chegaram calada e caminharam at a Rua Oxford sob a chuva fina.
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Bem mais quente. Agora, mais que na vspera, ela se sentia na Inglaterra, e estava
gostando.
Novamente deliciou-se com o passeio no andar superior do nibus vermelhoenquanto desciam a movimentada Rua Oxford. Minutos depois, Douglas dirigiu-se a
Katie, indagando sobre o mapa.
- Rua Bloomsbury, isso? Estamos na direo errada.
- No estamos no, retrucou Katie. Este o nibus n. 8. Ele vai para este lugar,
disse indicando um ponto no mapa. Da mudamos para o n. 25, que nos leva exatamente
ali.
- , mas olhe, falou Douglas apontando o mapa. Esta a rua pela qual acabamos de
passar. A Torre de Londres est aqui embaixo. Viemos na direo oposta. Estamos aqui
agora. Bem aqui em cima
- No acredito! exclamou ela.
- Espere! disse o rapaz. Estamos perto da casa de Charles Dickens. Vocs queriam ir
l, no queriam? Vamos fazer uma visita rpida e depois pegamos o nibus 25.
- Excelente idia, concordou Trcia. Adoraria ver a casa do Dickens.
Acabou sendo uma tima idia, apesar de terem se perdido e caminhado muitos
quarteires, tentando encontrar o nmero 48 da Rua Doughty, que no era bem
demarcada. Quando souberam que tinham de pagar duas libras para entrar, Katie
reclamou. Imediatamente Trcia pagou a entrada de Katie. Caminharam em direes
opostas para explorar a casa do autor que deu vida Inglaterra com suas obras Cntico de
Natal, Oliver Twist, Grandes Esperanas e muitas outras mais.
Cris achou bastante interessante, sobretudo a caneta de pena de ganso exposta no
mostrurio que Dickens usava para escrever. No dava para imaginar como seria escrever
com uma caneta de pena de ganso, principalmente um livro inteiro. E ele escreveu
-
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dezenas de livros. Escrever, naquela poca, era um trabalho rduo.
Trcia e Douglas olhavam absortos tudo que estava exposto, lendo as informaes
com muito mais tempo do que permitia a pacincia de Cris. Ela deixou os dois no terceiroandar, examinando o imenso quadro de um farol, e desceu a escadaria procura de Katie.
Encontrou-a sentada num banco de madeira perto da porta.
- Voc est com vontade de ir embora?
Katie no ergueu o rosto quando Cris sentou-se ao seu lado. Esperou que passasse
um grupo de turistas e depois respondeu.
- Por que eu estou sendo to chata assim?
- Ns todos estamos cansados, Katie.
- Eu sei, mas isso no devia ser desculpa. Gosto da Trcia. Verdade. S que ela ...
sei l. Ela me enche a pacincia.
- Acho que porque vocs duas so muito parecidas.
- No somos, no!
- Cada uma mostra isso a seu jeito, mas vocs duas so duronas; quando querem
uma coisa, querem mesmo. No que isso seja ruim. Acho que uma grande qualidade.
Katie ficou pensativa. Deu um suspiro.
- As coisas no esto acontecendo do jeito que eu esperava.
- Como voc esperava que fossem?
- Empolgantes e interessantes e, bem... muito mais divertido do que isto. Estamos
andando demais, nos perdendo, ficando frustrados, e tudo estranho. Eu me sinto
deslocada. No estou por dentro desse negcio de museu. E isso me faz sentir inculta,
ignorante mesmo. Nunca ouvi falar dessas pessoas famosas, cujas esttuas a gente anda
vendo. E quando o Douglas explicava as batalhas e esttuas na Praa Trafalgar ou sei l
onde, para mim era como se ele estivesse falando sobre vida em outro planeta. Detesto
-
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estar assim por fora de tudo!
Cris sempre apreciara a sinceridade de Katie e sua capacidade de expressar
claramente seus sentimentos.- Sei o que est querendo dizer, disse Cris, procurando consol-la.
- Ento por que voc no fica perturbada com isso? Quando vi voc segurando
aquela xcara de ch no caf da manh, parecia fazer parte disso aqui. Era como se tudo
isso lhe fosse natural. Como que consegue?
- No sei. Acho que ainda no deu para eu me irritar. Gosto de experimentar todas
essas novidades.
Naquele instante, Douglas e Trcia desceram a escada, conversando animadamente
sobre uma fotografia de Hans Christian Anderson que viera da Dinamarca visitar Dickens,
cuja obra Anderson admirava. A conversa continuou animada mesmo depois que
deixaram a casa e voltaram ao nibus. Pelo menos eles estavam se dando bem.
Katie pareceu um pouco menos tensa depois que tomaram o nibus e foram Torre
de Londres. Claro que ela estava melhor depois de haver desabafado um pouco.
Em dado momento, o nibus deu um solavanco para parar num cruzamento, e Cris
viu seu prprio reflexo na vidraa. Estava diferente. Tinha um ar de intelectual, com o
cabelo para trs, numa trana, quase nada de pintura e a blusa de gola rul. Agora s
faltavam uns culos de aro dourado. Parecia uma pessoa que sabia o que queria da vida. A
idia fez com que sorrisse. Pelo menos podia parecer assim. Quem sabe antes dessa
viagem acabar, ela talvez pudesse tambm sentir-se assim.
Ao bater os ps para aquec-los, Cris pensou como seria agradvel tomar mais uma
xcara de ch.
-
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O Castelo de Carnforth Hall
4
- Onde foi o nosso sol? perguntou Cris, olhando pela janela do trem que saa de
Londres em alta velocidade, seguindo para o norte.
Uma hora antes, tinham se dirigido com toda a bagagem para a estao de Euston.
Sentiram um breve carinho dos raios de sol nas costas. Mas agora o cu se cobrira com
um espesso cobertor cinzento de inverno e mandara o sol de volta para a cama.
Corno ningum lhe respondesse, Cris relanceou a vista em derredor e viu que todo
mundo dormia. Douglas, sentado ao seu lado, dormia com a cabea para trs e a boca
entreaberta. Parecia prestes a roncar. Cris ficou pensando se deveria acord-lo, caso ele
comeasse a roncar.
Katie e Trcia, sentadas do outro lado da mesa, frente dos dois, tinham encontrado,
cada uma, seu pequeno espao. Trcia tinha a cabea sobre uma blusa de l enrolada
contra o vidro frio e Katie, na frente de Douglas, enterrara a cabea nos braos dobrados
sobre a mesa.
Cris no sabia como ainda estava acordada. A correria matinal para pegar o trem a
tempo, tinha sido muito cansativa. Agora o balanar constante, pra l e para c, devia ser
bastante para ninar qualquer pessoa, principalmente quem descansara to pouco nos
ltimos trs dias.
Mas ela estava ansiosa demais. Estava na Inglaterra! No queria fechar os olhos, no
queria perder nada. A paisagem mudava. Em lugar das casas de tijolo vermelho e cercas
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de ferro fundido preto, apareciam longas extenses de campo aberto, cercadas de arbustos
bem podados. Os arbustos estavam escuros e sem folhas, aguardando o beijo da
primavera, que viria dar lhes uma nova roupagem. E os campos pareciam quase prateados,com apenas uma promessa de verde-escuro da relva escondida sob a geada que agora
cobria a terra.
Tenho de escrever sobre isso, pensou, procurando seu dirio. Lembrou da caneta de pena
de ganso de Charles Dickens quando deu um clique na esferogrfica para aparecer a
ponta. Ainda bem que no tinha de escrever com pena e tinteiro nesse trem em
movimento.
Estamos no trem que vai para Lancashire, que fica no noroeste da Inglaterra,
escreveu. Todos dormem, a no ser eu. Adoro a paisagem do campo, embora esteja
coberta pela geada do inverno. Estou quentinha e sinto-me bem neste trem confortvel.
Se conseguirmos fazer a conexo em Manchester, deveremos chegar em Carnforth Hall
antes do jantar, a tempo de assistir abertura do treinamento de evangelismo.
Como descrever Londres? Que cidade imensa, antiga, moderna, ativa, polida,
estranha, abarrotada, exaustiva! Dois dias no bastam para conhec-la, nem mesmo por
alto. Finalmente, vimos as jias da coroa na Torre de Londres, como queria Katie, e foi
bastante interessante. Mas o de que mais gostei foi subir at o topo da Catedral de So
Paulo e olhar a cidade embaixo. uma igreja incrvel. Nunca estive numa igreja to
grande assim. Fiquei pasma de reverncia.
Douglas remexeu -se, pondo a perna esquerda no corredor e pendendo a cabea
oscilante sobre Cris.
- Se quiser, pode deit-la no meu ombro, cochichou ela.
Ele estava apagado demais, porque nem se mexeu. Cris continuou escrevendo:
Gostei tambm das palavras gravadas na pedra em frente da catedral. Cris havia
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copiado as palavras no verso do seu bilhete de ingresso, que agora procurava na bolsa.
"Que Deus conceda aos vivos, graa; aos que partiram, descanso; igreja e ao
mundo, paz e concrdia; e a ns, pecadores, vida eterna."Quando Cris copiava as palavras, Douglas lhe dissera que "concrdia" queria dizer
"harmonia e concordncia". No sabia ao certo por que ficara to impressionada com
essas palavras, a no ser que falava de graa, paz e concrdia. No eram exatamente as
qualidades que sua turma de quatro amigos estava experimentando at agora nessa
viagem. Mas ela esperava que isso mudasse, assim que comeassem o treinamento em
Carnforth Hall.
Naquele instante a cabea de Douglas caiu sobre o ombro de Cris, acordando-o de
imediato.
- Ah, desculpe. Devo ter cado no sono.
No faz mal. Dorme mais um pouco. Pode fazer meu ombro de travesseiro.
O sorriso de "garoto" do Douglas surgiu em seu rosto sonolento.
- Como que voc ainda est acordada? Aquelas duas parecem ter desmaiado como
eu.
Tem muita coisa para ver, disse Cris, retribuindo o sorriso de Douglas. Isso tudo
to fascinante! No quero perder nada.
Procurando no chamar ateno para o que fazia, Cris fechou o dirio e o colocou de
volta na bolsa. No que tivesse alguma coisa a esconder do Douglas. S no tinha nada
que quisesse mostrar a ele. Seu dirio era sua coleo de pensamentos particulares e
embora gostasse do Douglas, no queria que ele partilhasse deles.
- Est com fome? indagou o rapaz.
Cris riu com ternura. Sabia que ele estava com fome. Estava sempre com fome.
- Eu tomaria uma boa xcara de ch, replicou.
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Voc est se tornando uma inglesinha de s tomar ch, no mesmo? disse ele,
bocejando e esticando as pernas no corredor. Acho que vou procurar uma lanchonete ou
sei l o que eles chamam aqui, e ver se descolo uns sanduches. Quer um tablete dechocolate ou alguma outra coisa alm do ch?
Ela encolheu os ombros e depois disse em tom de amigvel brincadeira:
- Qualquer coisa. Tambm tenho certeza de que se eu no conseguir comer, voc
come por mim.
- Ento vou comprar dois chocolates. Talvez trs, disse, pondo-se de p e remexendo
na mochila debaixo da poltrona.
- Precisa de dinheiro? indagou Cris. O meu est aqui.
- No, eu tenho. Parece que esta nossa viagem o que h de mais prximo de um
encontro romntico que teremos ainda dentro de algumas semanas. Deixa que eu pago.
Ele foi se equilibrando pelo corredor estreito e pelas portas at o vago seguinte.
Que amor de pessoa! Ele mesmo um cara incrvel, pensou Cris, suspirando, e olhou pela
janela.
O trem ia lento, porque estava prestes a parar na estaozinha de um vilarejo. Na
plataforma de madeira havia um menino com um bon preto, meias trs-quartos, short e
um blazer escuro, segurando um guarda-chuva fechado e uma pasta de couro. Estava
completamente parado, olhando o trem que arrancava. Cris observou-o por sua janela
larga e sorriu. Na sua imaginao, era "Pedro", o irmo de "Susana", "Edmundo" e
"Lcia", da srie Contos de Nrnia, de C. S. Lewis.* Cris estava certa de que "Pedro"
estava prestes a passar por uma porta invisvel para entrar na fantasiosa terra de Nrnia.
___________________
*Essa srie foi traduzida para o portugus por Paulo Mendes Campos, e atualmente pode ser encontrada
em edio da Livraria Martins Fontes Editora. (N. da T.)
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O seu ch, senhorita, disse Douglas, assustando-a ao cham-la de volta ao mundo
real.
Ele colocou um grande copo de papel com tampinha de plstico sua frente e lheentregou vrios minsculos copos de creme e pacotes de acar. Em sua mo havia uma
sacola de papel com alas de tamanho mdio.
Ele estava urna graa. Tinha sado com o jeito seguro de homem feito, e voltava
como um menino tmido, com uma cesta de piquenique na mo. Sentou-se ao lado dela e
enfiou a mo na sacola.
- Misto frio, disse ele, tirando dois sanduches embrulhados. E Toblerones.
Cris reconheceu a caixa longa de forma triangular que continha o tablete de
chocolate. J a tinha visto em Londres.
- Aqui eles chamam esses chocolates de "docinhos", informou ele. Pelo menos foi o
que disse o cara da lanchonete. meio difcil a gente no rir quando um homem j
crescido olha no olho da gente e pergunta: "Quer um docinho?"
Cris riu e colocou leite e acar no ch quente.
- Eu devia ter dito a ele que j tenho o meu "docinho": voc!
Seus olhos se encontraram. Cris sorriu e depois desviou os seus.
Por que me sinto to acanhada? o Douglas. Meu namorado. Por que ainda fico
sem jeito quando ele me diz coisas agradveis?
No teve tempo de chegar a uma concluso, porque naquele instante Trcia acordou
e perguntou se j estavam se aproximando de Manchester. Era como se tivesse invadido a
privacidade dos dois; no entanto Cris sentiu-se aliviada.
- Dentro de uma hora, mais ou menos, chegaremos l, disse Douglas entre bocados
do sanduche. Quer um pedao, Trcia?
Bocejando, ela disse que no, mas precisava ir ao banheiro.
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- para l, disse Douglas, apontando a direo de onde viera. S que eles chamam
de "W.C.". Quer dizer: "water closet".*
____________________*Water closet: literalmente significa "quarto de gua", ou "de banho" (N. do E.)
- Katie, disse Trcia, sacudindo de leve a ruiva dorminhoca, desculpe, mas preciso
me levantar.
Katie murmurou alguma coisa e ergueu a cabea com m vontade. Foi para o
corredor, para deixar que Trcia passasse.
- Obrigada.
- Por que voc no senta perto da janela, para no precisar levantar de novo quando
ela voltar? perguntou Cris.
- As coisas delas esto todas ali.- Ento mude-as. Ela no vai se importar.
Com gestos bruscos e exagerados, Katie colocou as coisas de Trcia sobre a mesa,
sacudindo e quase derramando o ch de Cris. Em seguida entrou e encostou a cabea na
janela, fechando os olhos e desligando-se do mundo ao seu redor.
Douglas e Cris se entreolharam sem nada dizer. Cris odiava essa atmosfera,. Queria
que todos se dessem bem e no ficassem irritados com os outros. Mas parecia que a vida
no era assim.
Ela mesma no era to inocente. J tivera sua prpria carga de conflitos com amigos
e fizera comentrios rabugentos dos quais mais tarde se arrependera. Era melhor deixar
que Katie resolvesse sozinha seus problemas. A melhor coisa que Cris podia fazer era orar
pedindo a Deus graa, paz e concrdia durante o resto da viagem. Seria timo se Katie e
Trcia pudessem reconhecer suas semelhanas e us-las para trabalhar em equipe, em vez
de se voltarem uma contra a outra.
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- E o ch, est gostoso?
Estava na cara que Douglas queria mudar de assunto.
- Bom. Bom demais. Muito obrigada.Ele olhou o relgio.
- Devemos chegar dentro do horrio, o que quer dizer que teremos cerca de uma
hora para nos acomodarmos nos quartos do castelo antes do jantar.
- um castelo de verdade? Pensei que fosse s o nome, mas a Trcia disse que um
cara o comprou depois da Segunda Guerra Mundial e o transformou num centro cristo de
retiro para jovens.
- Isso mesmo. Ele comprou um castelo antigo e cerca de quarenta e dois alqueires de
terreno circundante. Queria que os jovens da Europa se unissem depois da guerra e achava
que o melhor jeito era reuni-los em acampamentos bblicos de vero. Eles se converteriam
e voltariam aos seus pases prontos para levar o evangelho a outros.
- Impressionante! Esse programa de evangelismo em diversas partes da Europa
incrvel, no mesmo?
- . Estou ansioso por conhecer o resto do grupo hoje noite, disse Douglas entre
uma mordida e outra em seu segundo sanduche. A ltima informao que tive que vo
ser uns quarenta estudantes de todo o mundo. Vo nos dividir em equipes de oito pessoas.
- Ser que ns quatro vamos ficar juntos?
- Foi o que eu pedi. Tenho a impresso que sim.
Talvez fosse melhor se Trcia e Katie se separassem, pensou ela. No revelou o que
passou por sua cabea, embora, pela cara do Douglas, sentisse que ele pensava o mesmo.
Naquela noite, na reunio de abertura no castelo de Carnforth Hall, foi confirmada a
previso de Douglas. Quando o diretor leu a lista das equipes, os quatro ficaram juntos
com mais trs rapazes e uma garota. Sua equipe foi designada para ir a Belfast, Irlanda.
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- No acredito, disse Katie a Cris. Exatamente onde eu queria ir. Perfeito! como se
eu j conhecesse Belfast por tudo que o Michael me contou ano passado.
Cris ficou calada ouvindo-os anunciarem o resto das equipes. Era bvio que Katiehavia ficado feliz com o local que foi designado para eles, pois tinha namorado um cara
de Belfast. Para Cris, porm, isso foi uma decepo. Ou ser que estava um pouco
assustada? No era para Belfast que ela esperava ir. No sabia para onde queria ir. Talvez
a Sucia. Ou Espanha. Mas a Irlanda no lhe parecia o lugar certo.
- Procurem os outros membros de sua equipe, disse Charles Benson, o diretor.
Dentro de uma hora estaremos de volta aqui no salo.
Douglas foi apontado como lder de sua equipe, e passou imediatamente a organizar
seu grupo, convocando os membros da equipe de Belfast para que se aproximassem dele.
Outros lderes faziam o mesmo, gritando o nome de sua cidade.
Pessoal de Barcelona, por aqui."
Oslo, aqui."
Amsterd."
Edimburgo."
Parecia uma estao ferroviria internacional; cadeiras eram mudadas de lugar, e
todos comearam a se entrosar.
Pela primeira vez, na viagem, Cris sentiu-se meio exausta. Talvez fosse a diferena
de fuso horrio que, finalmente, a estivesse afetando, ou talvez fosse a prpria realidade
que a assustava. Estava num salo antigo, cheio de enfeites em estilo rococ, num velho
castelo ingls. Depois de um treinamento estaria a caminho de Belfast. Era como se uma
rajada de vento estivesse atingindo-a em cheio, deixando-a sem flego.
- Excelente. O pessoal de Belfast j est todo junto. Vamos para aqueles assentos l
perto das janelas, disse Douglas.
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No eram apenas janelas. Eram janelas de castelo, seis longas colunas que chegavam
at o teto cheio de enfeites de madeira rendilhada. As grossas cortinas estampadas com
motivos florais desciam at o piso. Ainda bem que o sof e as poltronas azuis em frente asjanelas eram comuns. Cris estava comeando a sentir-se como Katie na casa de Charles
Dickens: sobrecarregada com tantas experincias novas.
- Meu nome Douglas, e estas jovens aqui so Cris, Katie e Trcia. Viemos todos da
Califrnia, disse ele, assim que os oito estavam reunidos. Agora, que tal vocs tambm se
apresentarem?
- Meu nome Selena, disse uma moa americana sentada ao lado de Trcia.
Cris gostou dela logo de cara. Tinha o cabelo ondulado, despenteado, da cor de
caramelo, e sardas no nariz. Tinha um jeito natural, acolhedor. Havia nela alguma coisa de
sinceridade, de simplicidade, que se mostrava no seu jeans, nas suas botas de caubi, e no
seu casaco de couro marrom que ficavam muito bem nela. At mesmo o nome diferente
lhe cabia perfeitamente.
- Meu nome Gernot, disse um rapaz alto e magro com sotaque. Sou da ustria.
Moro perto de Salzburgo.
- Meu nome Ian, disse outro jovem, e sou da Inglaterra, mas agora moro na
Alemanha.
Ian parecia um professor, com nariz fino, culos de aro de metal, e um grosso casaco
de l verde-escuro.
- Meu nome Stephen. Tambm estudo na Alemanha e sou colega do Ian. Acho que
nossa equipe deve ser a melhor, j que todas as garotas so americanas.
Ele sorriu, e o rosto antes srio se tornou radiante. Seu cabelo escuro era penteado
para trs e ele tinha barba - algo que Cris no estava acostumada a ver nos rapazes de sua
turma. Fazia com que se parecesse mais velho que o resto do grupo.
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Cada um apresentou as razes por que viera participar daquele trabalho missionrio.
Katie pareceu ganhar vida ao falar animada dos seus motivos e explicar por que Belfast
parecia o lugar perfeito para eles evangelizarem. Os dois alemes pareciam estar sedivertindo bastante.
Cris gaguejou um pouco quando chegou sua vez. Disse que queria descobrir o plano
de Deus para sua vida e saber se ele a queria na obra missionria. No podia dar mais
explicaes alm dessas. Douglas lhe sugerira fazer essa viagem e ela achara uma
excelente idia. Depois o dinheiro chegou a tempo. Assim concluiu que deveria vir.
- Minha razo mais ou menos a mesma, disse Selena. Deu tudo certo. Eu precisava
encarar esse mundo que eu no conhecia. No sei o que quero ser no futuro, mas espero
que esta viagem me ajude a decidir.
Agora Cris tinha certeza de que gostava de Selena. Acabara de descobrir uma alma
gmea, algum que pensava igual a ela. Sorriu para ela. Selena retribuiu-lhe o sorriso. A
amizade estava selada.
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Cavaleiros Montados em Cavalos
Brancos!
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Cris s sentiu o impacto na manh seguinte. Acordou antes do despertador soar e
com os olhos turvos correu a vista em volta do dormitrio do segundo andar. As outras
sete garotas do quarto ainda dormiam.
Estou na Inglaterra, num castelo, e no estou sonhando.
Lembrou-se de um desejo que formulara dois anos atrs, num acampamento de
vero, quando estava numa canoa, no meio de uma lagoa. Ela dissera que desejava ir
Inglaterra e visitar um castelo. E agora, aqui estava! Na Inglaterra. Durante uma semana
esse castelo seria o seu lar.
Saiu da cama e andou de meia at a janela. Fizera frio na noite de vspera. Mesmo
de moletom e meia, sentira um frio mido enquanto tentava dormir. Agora, chegando at
o vidro com camada de geada, teve a primeira vista diurna do terreno em volta do
Carnforth Hall.
A manh estava linda, apesar do gelo. Parecia um conto de fadas. Hectares e mais
hectares de campos verdes, cobertos de geada, rvores retorcidas erguendo galhos
desfolhados ao cu acinzentado, e o espesso musgo agarrado aos troncos e postes, e at
mesmo s baixas divisrias de pedra. Uma neblina fina envolvia todo o cenrio, dando
paisagem tons de uma pintura impressionista. Era tudo to diferente do clima de praia de
sua casa. Ela estava adorando tudo.
- Lindo, no mesmo? sussurrou Selena por cima do um ombro de Cris, que deu um
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salto.
No tinha percebido a outra se aproximar. Cris concordou e deu um sorriso.
Selena estava bem prxima a ela, o cobertor enrolado nos ombros como uma jovemndia, olhando l para fora, o rosto revelando seu contentamento.
- Estou to contente por estar aqui! falou Selena.
- Eu tambm, concordou Cris. Fico alegre por voc ter vindo.
- Vai ser uma experincia e tanto, no vai?
Naquele instante, o alarme de algum disparou e um brao saiu de baixo do
cobertor, tateando a mesinha do lado vrias vezes, para, afinal, conseguir desligar.
- Que horas so? gritou Trcia do seu casulo debaixo dos cobertores quentes.
- Seis e meia, veio a resposta abafada da dona do despertador. O caf daqui a uma
hora.
- No seria bom se eles servissem ch quente aqui no quarto? perguntou Selena com
uma risadinha.
- mesmo, disse Cris. Amenizaria um pouco o frio da manh. No suporto a idia
de ter de tirar essas roupas para me vestir! Minha vontade era vestir mais alguma roupa
por cima e calar as botas.
- E por que no? comentou Selena franzindo o nariz sardento. Voc podia lanar
uma nova moda. Parece muito prtico. capaz de "pegar".
Cris decidiu que no lanaria moda nenhuma e conseguiu se trocar rapidamente,
vestindo a cala colante de l, uma cala preta mais quente que tinha, vrias blusas, umas
sobre as ou e mais dois pares de meia esporte de l. Os castelos podem parecer
encantadores, mas ficam gelados!
O grupo se reuniu para o desjejum, todos os quarenta, num pequeno refeitrio com
um lustre alto e trs janelas at o teto a iluminar o ambiente. Cris se alegrou de ver um
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bule de ch quente no meio de cada mesa, juntamente com um aucareiro e uma jarra de
leite.
Douglas sentou-se ao lado dela, usando uma camisa verde e azul de rgbi e umablusa branca de gola rul por baixo. Trcia se juntou a eles, sentando-se do lado oposto, o
cabelo curto perfeitamente penteado, as bochechas rosadas. Depois da orao e um
cntico, Douglas perguntou a opinio de Trcia sobre a organizao da equipe, e ela
respondeu, feliz, com seu modo ponderado e doce.
Cris se inquietou por no ter ele perguntado a opinio dela. Mas se o tivesse feito,
ela no teria sabido o que dizer. Nem pensara no assunto. Mas ficava claro que Trcia
tinha pensado bastante.
Douglas utilizou as idias de Trcia quando sua equipe se reuniu aps o caf da
manh.
- Antes de mais nada, gostaria que cada um desse seu testemunho. Sabe, dizer um
pouco sobre como veio a ser cristo, o que Deus tem feito em sua vida deste ento, e quais
os seus dons espirituais, se souber. Quem quer comear?
Cada membro da equipe contou sua histria. Todas eram diferentes e interessantes.
Cris foi a ltima.
- Minha famlia sempre foi da igreja e meus pais so cristos. Acho que eu sabia
sobre Deus, mas era como se ele estivesse fora de mim, e no dentro de mim. No sei se
entendem o que quero dizer.
Ela contou como conhecera Ted, Douglas e Trcia na praia, nas frias quando fizera
quinze anos. Explicou que Trcia e Ted lhe deram uma Bblia como presente de
aniversrio. Foi legal ter a Trcia l como exemplo vivo do seu testemunho.
- No dia seguinte ao meu aniversrio... bem, algumas coisas aconteceram que me
fizeram reconhecer que eu precisava conhecer melhor a Deus e no apenas v-lo como um
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ser que me vigiava distncia. Entreguei minha vida a ele. Acho que o melhor jeito de
descrever. Simplesmente entreguei tudo a Deus e pedi perdo pelos meus pecados.
Prometi a Deus meu corao. Meu corao inteiroCris no esperava chorar, mas as lgrimas estavam porta, enchendo-lhe os olhos de
repente. Douglas estendeu o brao e deu-lhe um abrao confortante. Buscava agora na
lembrana a que se seguiu entrega de sua vida a Jesus. Douglas tambm estava ao seu
lado junto fogueira da praia naquela noite. Foi o primeiro do grupo a parabeniz-la por
ter se tornado crist, e seu abrao aquela noite foi to caloroso e confortante quanto o
dessa manh.
Mas havia alguma coisa que incomodava Cris. Algo l no fundo. Sabia que suas
lgrimas no eram de alegria. Eram lgrimas que ela havia engolido antes, talvez no de
uma s vez, mas devagar. Deliberadamente. Estavam enfiadas no fundo do Corao.
Teve vontade de sair da sala, correr para fora, fazer uma longa caminhada e remexer
o ba dos seus ntimos tesouros at descobrir de onde vinham essas lgrimas.
Aparentemente, o resto do grupo achou que ela estava emocionada com o milagre da
salvao, porque todos passaram a dizer-lhe palavras de consolo e segurana. Todos,
menos Selena.
O testemunho de Selena tinha sido bastante simples. Fora criada em lar cristo.
Aceitara Jesus aos cinco anos de idade com sua me, e desde ento ela tinha sido uma boa
menina. Ser que havia alguma coisa no corao de Selena que a fazia entender o de Cris?
Cris ficou quieta no seu lugar e, com o resto da equipe, participou do planejamento
do primeiro estgio de treinamento. A sondagem da alma que esperasse. A primeira tarefa
era para da a uma semana, no sbado seguinte. Tinham de planejar um trabalho de
evangelismo de um dia inteiro numa pequena cidade ali perto. Junto com a igreja que
recebia a equipe, deveriam apresentar uma dramatizao, msica, programa para as
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crianas e uma mensagem noite. Era uma verso em miniatura do tipo de trabalho que
estariam fazendo em Belfast com uma igreja local.
Katie se ofereceu imediatamente para dirigir o teatro e Selena e Stephen se juntarama ela, dizendo que a dramatizao tambm era sua rea de interesse. Como Douglas era o
nico que tocava violo, aceitou a responsabilidade da msica, e Trcia ofereceu-se para
ajud-lo. Ian, que parecia professor, queria dar a mensagem da noite. Gernot se ofereceu
para dirigir um jogo de futebol com os meninos da cidade, para atra-los ao culto noturno.
Para Cris s sobrou o programa das crianas, o que para ela estava timo. Ela havia
trabalhado muitas horas no departamento infantil de sua igreja e gostava dos pequeninos.
- Foi fcil, disse Douglas, verificando o relgio. Temos que estar na capela dentro de
quinze minutos. Vou procurar um violo por aqui. Nossa equipe tem de cuidar do almoo;
por isso, quando terminar o culto na capela, vamos todos direto para a cozinha.
Cris estava feliz porque a capela era em outro prdio. verdade que teria de se
agasalhar e carregar uma sombrinha, mas a caminhada ajudaria a desanuviar a cabea.
Apesar da geada, o jardim parecia lindo. Fileiras de roseiras limpas, podadas,
ladeavam a calada. Cris tinha certeza de que na primavera e no vero ali seria seu lugar
predileto. Passou por baixo de uma trelia em arco com uma trepadeira sem folhas
entremeando a grade. Pensou no jasmim perfumado da sua casa, na varanda da frente, e
pela primeira vez, sentiu saudades de sua me, seu pai e seu irmozinho. Tinha lhes
mandado um carto-postal de Londres. Hoje seria um bom dia para escrever uma carta de
verdade.
A capela ficava no fim da calada do jardim. O velho prdio de pedras tinha sido a
igreja dos antigos moradores do castelo. Passando pelas grossas portas de madeira
entalhada da capela, Cris sentiu a mesma reverente maravilha que experimentara na
Abadia de Westminster. Havia centenas de anos que esse local era um lugar de orao e
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adorao. Agora ela era uma das muitas pessoas que adentravam o templo em busca da
presena do Senhor.
Sentou-se sozinha num banco de madeira macia, mais ou menos no meio. Nafrente, em vez de um plpito, havia um palco, um teclado e vrios microfones. De relance,
pareciam fora de lugar. Mas da a pouco chegaram os outros estudantes, a capela comeou
a ficar cheia e diversos msicos subiram ao palco e se puseram a afinar seus instrumentos.
- Est guardando o lugar para algum? perguntou uma garota com um largo sorriso e
cabelo loiro curto.
Sua camiseta trazia a inscrio Aika on kala. Cris no conseguia imaginar que lngua
seria aquela.
- No, pode sentar-se, disse automaticamente, nem se lembrando de que talvez o
Douglas estivesse esperando que ela lhe guardasse o lugar.
- Meu nome Cris.
- Meu nome Merja. Sou da Finlndia. E voc, de onde ?
- Califrnia.
- Verdade? Voc pratica surfe e dirige um carro conversvel? perguntou a garota
com um sorriso brincalho.
- Voc anda vendo televiso demais, disse Cris.
- Mora em Beverly Hills? perguntou Merja, ainda importunando.
- No exatamente. Mas conheo vrios rapazes que praticam surfe e meus tios
tinham um conversvel. Vale alguma coisa?
- J serve. Agora podemos ser amigas. Estou na equipe que vai a Barcelona. Para
onde que vocs vo?
As duas novas amigas ficaram conversando por algum tempo. Cris estava gostando
da oportunidade de fazer novas amizades com gente do mundo inteiro.
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Quando olhou para o palco, viu Douglas, o violo na mo, afinando o instrumento
com o resto da turma. Acharam um violo para ele.
- Vamos comear entoando alguns cnticos de louvor, disse O dirigente. O primeiro o Salmo 5.
Os cnticos soavam majestosos na pequena capela. Foi a primeira vez que Cris
sentiu que todo mundo era parte de um s grupo, enquanto cantavam esses corinhos
conhecidos, todos em ingls, mas com sotaques diversos. Douglas tocou com o conjunto.
Sabia os acordes de todos os cnticos. Houve um momento em que ele ergueu os olhos e
lanou seu sorriso de garoto para a multido. Cris achou que estivesse sorrindo para ela,
mas o olhar dele pareceu ir mais longe. Ao final de um corinho, ela virou-se devagarinho
e olhou para trs e viu Trcia sentada duas fileiras atrs.
Ah! a Trcia.
Perguntou a si onde estaria Katie e se as duas j haviam resolvido suas diferenas.
Certamente, isso ficaria evidente durante o resto da semana.
No precisou esperar. Depois da capela a equipe se reuniu na cozinha. To logo se
juntaram de novo, Katie e Trcia comearam a discutir sobre como deveriam estender a
mesa. D. Joanna,