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  UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA CENTRO DE CIÊNCIAS NATURAIS E EXATAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA E GEOCIÊNCIAS MESTRADO EM GEOGRAFIA RELAÇÕES ENTRE VARIÁVEIS ESPECTRAIS E LIMNOLÓGICAS NO RESERVATÓRIO DA USINA HIDRELÉTRICA DONA FRANCISCA-RS DISSERTAÇÃO DE MESTRADO Rosana Corazza Santa Maria, RS, Brasil 2010

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA CENTRO DE CINCIAS NATURAIS E EXATAS PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM GEOGRAFIA E GEOCINCIAS MESTRADO EM GEOGRAFIA

RELAES ENTRE VARIVEIS ESPECTRAIS E LIMNOLGICAS NO RESERVATRIO DA USINA HIDRELTRICA DONA FRANCISCA-RS

DISSERTAO DE MESTRADO

Rosana Corazza

Santa Maria, RS, Brasil 2010

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RELAES ENTRE VARIVEIS ESPECTRAIS E LIMNOLGICAS NO RESERVATRIO DA USINA HIDRELTRICA DONA FRANCISCA/RS

por

Rosana Corazza

Dissertao de Mestrado apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Geografia e Geocincias Mestrado em Geografia, da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM, RS), como requisito para a obteno do grau de Mestre em Geografia

Orientador: Prof. Dr. Waterloo Pereira Filho

Santa Maria, RS, Brasil 2010

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA CENTRO DE CINCIAS NATURAIS E EXATAS PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM GEOGRAFIA E GEOCINCIAS MESTRADO EM GEOGRAFIA

A Comisso Examinadora, abaixo assinada, aprova a Dissertao de Mestrado

RELAES ENTRE VARIVEIS ESPECTRAIS E LIMNOLGICAS NO RESERVATRIO DA USINA HIDRELTRICA DONA FRANCISCA/RS elaborada por Rosana Corazza

como requisito parcial para obteno do grau de Mestre em GeografiaComisso Examinadora:

__________________________________ Waterloo Pereira Filho, Dr. (UFSM) (Presidente/Orientador)

___________________________________ Albano Schwarzbold, Dr. (UFRGS)

__________________________________ Lnio Soares Galvo, Dr. (INPE)

Santa Maria, 6 de maio de 2010

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AGRADECIMENTOSAo findar mais uma importante etapa de minha vida, muitos agradecimentos se fazem necessrios. Inicialmente agradeo a toda equipe do Laboratrio de Geotecnologias. Aos alunos de graduao: Mnica Marlise Wiggers, Anderson Kobs, Patrcia Pereira Trindade, Greice Silveira, Aline Barrim, Diego de Almeida Prado e outros que trabalharam arduamente nas filtragens, pesagens, calcinagens.... Agradecimentos em especial aos colegas de mestrado Felipe Corra; Daniela Wancura Barbieri pela disponibilidade em ajudar nas interminveis determinaes de clorofila-a; Gisieli Kramer por sua inestimvel amizade, alegria e ajuda nos momentos difceis; Aline Trentin, amiga e profissional que muito admiro e que sempre esteve disposta a estender seu auxlio, e por fim agradeo Ana Cladia Carvalho Giordani, que mesmo distante sempre foi fundamental para meu crescimento profissional e pessoal. Agradeo ao doutorando Flvio Wachholz, por seus ensinamentos e companhia nos inmeros almoos no restaurante universitrio. E no comando desta valorosa equipe esteve o professor Waterloo Pereira Filho, ao qual devo os meus mais sinceros agradecimentos. Certamente sem sua orientao, amizade, confiana e conhecimentos este trabalho no teria sido realizado e as lgrimas seriam muito mais frequentes... Agradeo a todos que participaram dos trabalhos de campo e enfrentaram calor escaldante, chuva, frio, ondas fortes, temporais, motores quebrados, equipamentos perdidos. A dedicao de cada um foi fundamental. Agradeo a CAPES/REUNI pela concesso da bolsa de mestrado. Ao projeto CNPq n 484712/200-71 que financiou os trabalhos de campo, aquisio de equipamentos e materiais e ao projeto CAPES n 0258059, por meio do qual foi possvel a realizao do Mestrado Sanduche no INPE, cursos e participaes em eventos cientficos. Agradeo imensamente a toda minha famlia, especialmente aos meus pais Artemio Corazza e Loudes Corazza. Nada do que sou e do que conquistei at hoje seria imaginvel se no fosse o vosso exemplo de trabalho, o amor e a confiana em mim depositada. Vocs so meu porto-seguro. Agradeo tambm ao meu namorado Marcos Ribeiro Trindade por todo seu amor, incentivo, ateno e companhia nos momentos de alegria e de tristeza. Voc meu exemplo de carter, persistncia, minha inspirao. Agradeo tambm aos meus futuros sogros por me acolherem como filha e no medirem esforos para me ajudar quando necessrio. Por fim e acima de tudo e de todas as coisas, agradeo a Deus. Sem Tua bondade e proteo eu nada seria.

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RESUMODissertao de Mestrado Programa de Ps-Graduao em Geografia e Geocincias Universidade Federal de Santa Maria RELAES ENTRE VARIVEIS ESPECTRAIS E LIMNOLGICAS NO RESERVATRIO DA USINA HIDRELTRICA DONA FRANCISCA/RS AUTORA: ROSANA CORAZZA ORIENTADOR: WATERLOO PEREIRA FILHO Data e Local da Defesa: Santa Maria, 6 de maio de 2010 Os sistemas aquticos continentais so de fundamental importncia para diversas formas de vida. O sensoriamento remoto mostra-se eficaz para o estudo desses sistemas, pois permite o acompanhamento detalhado por meio da utilizao de espectrorradimetros de campo. Inserido neste contexto, o objetivo deste trabalho foi o de analisar as relaes entre variveis espectrais e limnolgicas no reservatrio da UHE Dona Francisca, com uso de espectrorradiometria de campo e coleta de dados limnolgicos. No que tange metodologia, a primeira fase do trabalho consistiu na coleta de dados limnolgicos nos meses de fevereiro, maro, abril, junho, julho, agosto e outubro de 2009 e na obteno de espectros de reflectncia no ms de outubro de 2009. Para tal foram utilizados 22 pontos amostrais definidos a priori. Em campo e em laboratrio determinou-se as seguintes variveis limnolgicas: Clorofila-a (Chl-a), Total de Slidos em Suspenso (TSS), Carbono Orgnico Dissolvido (COD), profundidade do Disco de Secchi (DS), temperatura da gua, Condutividade Eltrica (CE) e pH. Os espectros de reflectncia foram adquiridos com uso do espectrorradimetro porttil de campo FieldSpec HandHeld. Os espectros originais foram analisados qualitativamente e sobre eles aplicadas tcnicas de derivao de primeira ordem, mapeamento do ngulo espectral, remoo do contnuo e razo de bandas com o intuito de identificar feies de absoro devidas aos componentes opticamente ativos. Por fim, os dados limnolgicos e espectrais foram relacionados utilizando correlaes, disperses e testes de significncia. Em relao aos resultados limnolgicos constatou-se variao na distribuio espao-temporal durante o perodo da pesquisa. A varivel Chl-a apresentou correlaes estatisticamente significativas (99,9% de confiana) com o DS, TSS, COD e a temperatura. Alm disso, o DS e a CE demonstraram estar intrinsecamente relacionadas ao regime de precipitaes pluviomtricas e o consequente carreamento de material particulado e nutrientes das bacias de captao para o corpo hdrico. Nos resultados espectrais a taxa mxima de reflectncia encontrada foi de 16% na faixa espectral do verde, aproximadamente em 590 nm. Verificouse bandas de absoro em torno de 610 nm e 675 nm. Segundo a literatura, a banda de absoro em 610 nm devida absoro pela ficocianina, pigmento fotossinttico acessrio da Chl-a e presente nas cianobactrias, o que indica a presena destes organismos no estrato fitoplnctonico do reservatrio. A banda de absoro em 675 nm devida Chl-a e mostrouse mais pronunciada quanto maior a concentrao de Chl-a. As tcnicas aplicadas sobre os espectros facilitaram a interpretao e identificao de trs grupos espectrais distintos, localizados em setores diferentes no reservatrio: um no setor do rio Jacu (extremo montante), outro no setor do rio Jacuizinho (tributrio) e outro aps a confluncia destes rios (setor intermedirio at o dique). Os testes estatsticos demonstraram que no ms de outubro de 2009 a reflectncia esteve relacionada de forma estatisticamente significativa com a Chl-a, que se configurou como o principal componente opticamente ativo da gua do reservatrio Dona Francisca. Palavras-chave: Reservatrio UHE Dona Francisca, Comportamento Espectral da gua, Limnologia, Clorofila-a.

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ABSTRACTMaster Thesis Post-Graduation Program in Geography and Geosciences Federal University of Santa Maria RELATIONS BETWEEN THE VARIABLES SPECTRAL AND LIMNOLOGICAL OF DONA FRANCISCA/RSS HYDROELETRIC POWERHOUSE RESERVOIR AUTHOR: ROSANA CORAZZA ADVISER: WATERLOO PEREIRA FILHO Date and Place of Defense: Santa Maria, May the 6th of 2010. Continental water systems have main importance to a variety of living beings. The terrestrial remote sensing has been efficient for the study of such systems, since it allows their detailed monitoring by means of field spectroradiometers. Inserted in this context, the aim of this study was to analyze the relation between spectral variables and limnological of Dona Franciscas Hydroelectric Powerhouse reservoir, using spectroradiometry field data collection and limnology. Concerning methodology, the first stage of the study is constituted by limnological data collected in February, March, April, June, July, August and October of the year 2009, and in the obtaining of reflectance specters in October of 2009. For this aim one used 22 sample points that were defined a priori. In field and in laboratory, one determined the following limnological variables: chlorophyll-a, total suspended solids, dissolved organic carbon, Secchi disk depth, water temperature, electric conductivity and pH. The reflectance specters were acquired by field portable spectrometers FieldSpec HandHeld. The original specters were qualitatively analyzed and one applied first order derivation technique, mapping the spectral angle, continuum removal and band reason with the aim of identifying features of absorption due to active optical components. Finally, limnological and spectral data were related by the use of correlations, dispersions and significance tests. Concerning limnological results, one found variation in the space-time distribution during the research period. The chlorophyll-a variable presented statistically significant correlations (99.9% of trust) with Secchi disk, with the total suspended solids, dissolved organic carbon and the temperature. Besides, limnological variables evidenced relationship with pluviometric precipitation regime and the consequent carrying of particled material and nutrients from the capturing bays to the hydric body. In spectral results, the maximum reflectance tax was 16% in green spectral level, approximately in 590 nm. One verified the absorption bands around 610 nm and 675 nm. According to the literature, the absorption band in 610 nm occurs because of the absorption of ficocyanine, an auxiliary photosynthetic pigment of chlorophyll-a, that is present in cyanobacterias, which indicates the existence of such organisms in the phytoplanktonic extract of the reservoir. The absorption band in 675 nm occurs due to chlorophyll-a, and it has shown to be more prominent as the pigment concentration increased. The techniques that were applied on specters made easier the interpretation and identification of the three distinct spectral groups, which were located in different sections of the reservoir: one in Jacu River section (extreme amount), another in the Jacuizinho River section (tributary), and the other beyond the confluence of these two rivers (intermediate section until the dyke). The statistical tests evidenced that in the month of October of 2009 the reflectance was significantly statistically related to chlorophyll-a, which constituted the main optically active component that was active in Dona Franciscas reservoir water. Key-words: Dona Franciscas Reservoir, Water Spectral Behavior, Limnology, Chlorophylla.

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LISTA DE TABELASTabela 1. 1 - Dados dos municpios limtrofes ao reservatrio da UHE Dona Francisca ..........5 Tabela 2. 1 - Caractersticas dos principais filos de algas. .......................................................15 Tabela 2. 2 - Bandas de absoro dos pigmentos fotossintetizantes ........................................17 Tabela 4. 1 - Matriz de correlao entre as variveis limnolgicas .........................................50

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LISTA DE ILUSTRAESFigura 1. 1- Localizao do reservatrio da UHE Dona Francisca no contexto do RS, com destaque para as bacias hidrogrficas de contribuio direta e bacia do rio Jacuizinho. ........4 Figura 1. 2 - Mapa de uso do solo da bacia hidrogrfica do rio Jacuizinho e das bacias de contribuio direta do reservatrio da UHE Dona Francisca maro de 2009 .........................6 Figura 1. 3 - Fotografias digitais representativas do sistema aqutico e terrestre da UHE Dona Francisca.....................................................................................................................................7 Figura 2. 1 - Coeficiente de absoro (A) e de espalhamento (B) da gua pura. .....................11 Figura 2. 2 - Coeficientes de absoro da gua pura, dos componentes opticamente ativos e a absoro total resultante. ..........................................................................................................13 Figura 2. 3 - Variao da reflectncia em funo de diferentes concentraes de Chl-a.........17 Figura 2. 4 - Curvas de reflectncia com diferentes concentraes de slidos em suspenso. 22 Figura 2. 5 - Absoro da matria orgnica dissolvida. ...........................................................24 Figura 2. 6 - Fator de reflectncia bidirecional para diferentes concentraes de MOD (mg/L) medidas em laboratrio. ...........................................................................................................25 Figura 3. 1 - Fluxograma de desenvolvimento da pesquisa .....................................................33 Figura 3. 2 - Localizao dos pontos amostrais utilizados nos trabalhos de campo Imagem Landsat TM5 de 20/07/2007, composio 243RBG ................................................................35 Figura 3. 3 - Geometria de aquisio dos dados espectrorradiomtricos em superfcies aquticas. ..................................................................................................................................40 Figura 4.1 - Precipitao pluviomtrica mensal mdia na bacia hidrogrfica do reservatrio Dona Francisca. ........................................................................................................................43 Figura 4. 2 Variao da temperatura do ar e da gua para os dias dos trabalhos de campo no reservatrio Dona Francisca. ....................................................................................................44 Figura 4. 3 - Precipitao pluviomtrica nos 30 dias de antecedncia aos trabalhos de campo ..................................................................................................................................................45

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Figura 4. 4 - Mapa de profundidade do reservatrio Dona Francisca no ms de outubro de 2009 ..........................................................................................................................................46 Figura 4. 5 Valores mdios mensais e desvio padro das variveis limnolgicas e precipitao pluviomtrica acumulada nos 30 dias de antecedncia aos trabalhos de campo. 48 Figura 4. 6 - Distribuio espacial mensal da Chl-a.................................................................53 Figura 4. 7 - Distribuio espacial mensal do TSS. .................................................................55 Figura 4. 8 - Distribuio espacial mensal do COD. ................................................................57 Figura 4. 9 - Distribuio espacial mensal do DS ....................................................................59 Figura 4.10 - Distribuio espacial mensal da temperatura da gua. .......................................60 Figura 4. 11 - Distribuio espacial mensal da CE. .................................................................62 Figura 4. 12 - Distribuio espacial mensal do pH. .................................................................64 Figura 4. 13 - Fotografias representativas da cor da gua dos pontos amostrais no momento de coleta dos dados espectrais. ......................................................................................................66 Figura 4. 14 - Profundidade do DS e concentrao da Chl-a, do TSS e do COD no reservatrio Dona Francisca em 23 de outubro de 2009. .........................................................67 Figura 4. 15 - Espectros de reflectncia dos 22 pontos amostrais do reservatrio Dona Francisca em 23 de outubro de 2009 ........................................................................................67 Figura 4. 16 - Derivada de primeira ordem dos espectros de reflectncia de Dona Francisca.70 Figura 4. 17 - Classificao dos espectros de reflectncia de Dona Francisca com auxilio do algoritmo SAM .........................................................................................................................71 Figura 4. 18 - Remoo do contnuo dos espectros de reflectncia de Dona Francisca...........73 Figura 4. 19 - Remoo do contnuo na faixa entre 600 e 700 nm dos espectros de reflectncia de Dona Francisca. ...................................................................................................................74 Figura 4. 20 - Profundidades de banda dos pontos amostrais em 610 e 676 nm......................75 Figura 4. 21 - Correlograma entre reflectncia e variveis limnolgicas.................................75 Figura 4. 22 - Diagramas de disperso entre Chl-a e a reflectncia em comprimentos de onda especficos. ...............................................................................................................................76 Figura 4. 23 - Correlograma entre a primeira derivada da reflectncia e variveis limnolgicas. ............................................................................................................................77 Figura 4. 24 - Diagramas de disperso entre a Chl-a e a primeira derivada da reflectncia em comprimentos de onda especficos. ..........................................................................................78 Figura 4. 25 - Correlograma entre a reflectncia normalizada pela remoo do continuo e variveis limnolgicas. .............................................................................................................79

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Figura 4. 26 - Diagramas de disperso entre as concentraes de Chl-a dos pontos amostrais e as profundidades das bandas de absoro em 610 e 676 nm....................................................79 Figura 4. 27 - Diagrama de correlao entre as razes de bandas e os componentes opticamente ativos. ...................................................................................................................81

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SUMRIOAgradecimentos................................................................................................................... Resumo................................................................................................................................. Abstract................................................................................................................................ Lista de Tabelas................................................................................................................... iv v vi vii

Lista de Ilustraes............................................................................................................... viii

CAPTULO I.............................................................................................................................1 1 INTRODUO ................................................................................................................1 1.1 Caractersticas da rea de estudo ....................................................................4

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FUNDAMENTAO TERICA...................................................................................9 2.1 2.1.1 2.1.2 2.2 2.2.1 2.2.2 2.2.3 2.2.4 Sensoriamento remoto da gua.....................................................................10 Processos de interao da radiao eletromagntica com a gua.............10 Propriedades pticas inerentes e aparentes da gua .................................12 Componentes opticamente ativos da gua....................................................14 Efeitos da presena de clorofila na reflectncia da gua ..........................14 Material particulado em suspenso ..........................................................20 Matria orgnica dissolvida......................................................................23 Tcnicas para anlise de espectros ...........................................................25 2.2.4.1 Anlise derivativa......................................................................26 2.2.4.2 Clculo da profundidade das bandas de absoro.....................27 2.2.4.3 Razo de bandas........................................................................27 2.2.4.4 Spectral Angle Mapper (SAM)..................................................28 2.3 2.3.1 2.3.2 Limnologia ...................................................................................................29 Transparncia da gua e as variveis limnolgicas ..................................29 Medidas estatsticas ..................................................................................31

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METODOLOGIA...........................................................................................................33 3.1 3.2 3.3 3.4 Trabalhos de campo e localizao dos pontos amostrais .............................33 Medidas das variveis limnolgicas .............................................................35 Mapeamento das variveis limnolgicas......................................................38 Medidas espectrorradiomtricas ...................................................................39

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3.5

Caractersticas

do

ponto

amostral,

do

seu

entorno

e

condies

atmosfricas............... ...........................................................................................................41 3.6 Anlise e integrao de dados limnolgicos e de sensoriamento remoto.....41

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RESULTADOS E DISCUSSO ...................................................................................43 4.1 4.2 4.2.1 4.2.2 4.3 4.3.1 4.3.2 4.4 Dados de precipitao...................................................................................43 Variveis limnolgicas .................................................................................47 Correlao entre variveis limnolgicas ..................................................50 Distribuio espao-temporal das variveis limnolgicas........................51 Medidas espectrorradiomtricas da gua......................................................65 Reflectncia da gua e os componentes opticamente ativos ....................65 Tcnicas para anlise de espectros ...........................................................69 Correlao entre a resposta espectral da gua e as variveis limnolgicas ..75

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CONSIDERAES FINAIS.........................................................................................82

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REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS .........................................................................86

________________________________________________________________ CAPTULO I1 INTRODUO

Desde o reconhecimento da Geografia como Cincia no sculo XVIII, tendo como objetivo primordial a descrio da Terra (Geo: Terra e Graphos: descrio), muitas tcnicas foram desenvolvidas e/ou importadas de outras Cincias com o intuito de facilitar a descrio e compreenso das caractersticas e fenmenos que se estabelecem sobre a superfcie terrestre. Aps meados no sculo XX o sensoriamento remoto passou a ser integrado paulatinamente aos estudos geogrficos e atualmente apresenta crescente utilizao e importncia, especialmente no que se refere ao planejamento geogrfico (ambiental, rural ou urbano) e ao monitoramento e estudo do meio-ambiente. No contexto do sensoriamento remoto as pesquisas relacionadas ao comportamento espectral de alvos da superfcie terrestre como a gua, a vegetao, os solos e os minerais so de extrema importncia, pois fornecem subsdios interpretao dos produtos gerados. Atravs das respostas espectrais de corpos hdricos continentais ou marinhos possvel verificar a composio da gua, bem como identificar e acompanhar situaes problemticas como o florescimento de algas com potencial toxicolgico ou grandes descargas de material particulado inorgnico em suspenso. Novo (1998) explica que o monitoramento da qualidade da gua um campo de aplicao da tecnologia do sensoriamento remoto bastante promissor. Algumas das caractersticas da gua que podem ser detectadas por sensores remotos so: a presena de algas e macrfitas aquticas, a quantidade de slidos em suspenso, as concentraes de clorofila e a transparncia da gua, visto que tais variveis alteram a colorao da gua. So inmeros os trabalhos desenvolvidos com o emprego do sensoriamento remoto para o estudo de ambientes aquticos. Ao retomarmos somente pesquisas recentes realizadas sobre o comportamento espectral da gua em reservatrios brasileiros, os quais apresentam grande importncia principalmente para abastecimento e produo de energia eltrica, obtmse um grande nmero de trabalhos, dentre os quais: Caracterizao espectral do reservatrio de It Sul do Brasil (Pereira Filho 2003); Anlise quantitativa do comportamento espectral da Clorofila-a no reservatrio de Salto Grande (SP) (Londe, et al., 2006); Anlise de propriedades pticas da gua do reservatrio Rodolfo Costa e Silva - Itaara, RS, Brasil, usando dados espectrais de campo e imagens orbitais multiespectrais (Breunig et al., 2007) e

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Deteco de componentes opticamente ativos no reservatrio de Itupararanga a partir de imagens hiperespectrais: uma aplicao de anlise derivativa (Galo, 2008). Dentre as Dissertaes de Mestrado cita-se: Sensoriamento remoto aplicado ao estudo do comportamento espectral da gua no reservatrio Passo Real RS (Trentin, 2009) e como Tese de Doutorado tem-se: Comportamento espectral do fitoplncton de um reservatrio brasileiro eutrofizado Ibitinga (SP) (Londe, 2008). Tendo em vista o grande potencial de uso do sensoriamento remoto como aliado aos estudos de ambientes aquticos, o tema central da presente Dissertao de Mestrado refere-se identificao do comportamento espectral do reservatrio da Usina Hidreltrica (UHE) Dona Francisca, situada na regio central do Estado do Rio Grande do Sul. Para este fim, alm das respostas espectrais obtidas in situ com uso de um espectrorradiometro de campo, fez-se necessrio o estudo limnolgico do reservatrio para a compreenso de sua dinmica aqutica e posterior correlao com os dados espectrais, o que conduz ao aumento da confiabilidade na interpretao dos resultados obtidos. A construo de usinas hidreltricas no Brasil alcanou grande desenvolvimento no sculo XX, quando o volume de guas represadas para a produo de hidroeletricidade aumentou consideravelmente. Em funo do desenvolvimento industrial e scio-econmico, as principais bacias hidrogrficas brasileiras foram reguladas pela construo de reservatrios com a finalidade de gerao de energia hidreltrica, que corresponde a 85% do total da energia produzida no pas. Entretanto, os reservatrios isoladamente ou em cascata constituem um importante impacto qualitativo e quantitativo nos principais ecossistemas de gua doce (Esteves, 1998; Tundisi, 2005; Tundisi et al., 2006-a). A transformao de um ecossistema aqutico ltico (rio) em lntico (lago artificial) acarreta efeitos negativos na regio montante do dique com destaque para o aumento das taxas de sedimentao, proliferao de comunidades de macrfitas aquticas (principalmente as flutuantes) e maior possibilidade de ocorrncia do processo de eutrofizao, sobretudo se reas florestadas ou agrcolas forem submersas (Esteves, 1998). O reservatrio da UHE Dona Francisca foi construdo no rio Jacu, o qual apresenta extrema importncia para o contexto do Rio Grande do Sul devido a sua grande extenso e rea abrangida pela bacia hidrogrfica, a qual uma das principais contribuintes do Lago Guaba (COAJU, 2008). A maior parte da demanda hdrica da bacia do Jacu se d para a irrigao agrcola. Como situao de conflito destaca-se o uso para a gerao de energia em grandes barragens e o consequente alagamento de terras, alm da expanso de pivs de irrigao central (COAJU, 2008). O reservatrio Dona Francisca o mais recente de uma

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srie em cascata que apresenta os seguintes reservatrios de UHEs no sentido de montante para jusante: Ernestina, Passo Real, Jacu, Itaba e Dona Francisca. Seu funcionamento iniciou-se em 2001 e apresenta poucos estudos desenvolvidos at o presente momento. Dentre os trabalhos realizados na rea da barragem envolvendo limnologia pode-se citar: Programa de monitorizao da qualidade das guas superficiais: programas ambientais UHE Dona Francisca (Schwarzbold, 1999); Contribuio gesto ambiental da UHE Dona Francisca atravs de modelo de simulao de qualidade de gua (Prates, 2000); Alteraes espaciais e temporais de caractersticas limnolgicas resultantes da transformao rioreservatrio (Rodrigues, 2002) e Limnologia do reservatrio da UHE Dona Francisca RS (Strassburguer e Pereira Filho, 2003). Alguns dos trabalhos produzidos em relao bacia hidrogrfica do reservatrio foram: Mapeamento do uso da terra por compartimento geomorfolgico da sub-bacia da barragem Dona Francisca - RS com imagens multiespectrais TM do Landsat 5 (Friedrich, 1993) e Organizao do espao e conflitos ambientais no entorno do reservatrio da UHE Dona Francisca RS" (Farenzena, 2006). Vislumbra-se atravs da presente Dissertao de Mestrado a possibilidade de diminuir a carncia de pesquisas no reservatrio Dona Francisca, especialmente no que se refere utilizao do sensoriamento remoto como principal recurso no estudo do ambiente aqutico, associando-o espacializao e acompanhamento temporal das variveis limnolgicas. A possibilidade de realizar monitoramentos frequentes de corpos hdricos interessante para vrios setores. Para a produo de energia eltrica uma das preocupaes assoreamento dos reservatrios ocasionado pela diminuio da velocidade da gua e consequente precipitao dos sedimentos suspensos. Este fenmeno pode comprometer a gerao de energia eltrica a mdio e longo prazo, especialmente em reservatrios que apresentem bacias hidrogrficas eminentemente agrcolas, nas quais sejam utilizadas tcnicas de revolvimento do solo. Alm disso, os represamentos causam impactos diretos sobre os ecossistemas locais e que podem se intensificar quando h sucesso de barragens em um mesmo rio, caso do rio Jacu. Levando em considerao o exposto, a Dissertao de Mestrado objetiva analisar as relaes entre variveis espectrais e limnolgicas no reservatrio da UHE Dona Francisca, com uso de espectrorradiometria de campo e coleta de dados limnolgicos. No que tange aos objetivos especficos tm-se: - Avaliar a variao temporal e a distribuio espacial das variveis limnolgicas: clorofila-a, totais de slidos em suspenso, carbono orgnico dissolvido, temperatura da gua, condutividade eltrica e pH, alm da profundidade do disco de Secchi e dados de precipitao pluviomtrica;

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- Verificar a influncia relativa dos componentes opticamente ativos (COAs) sobre a resposta espectral da gua; - Correlacionar os parmetros espectrais (reflectncia, valores da primeira derivada da reflectncia, profundidade das bandas de absoro e razes de reflectncia dos espectros) e os componentes opticamente ativos da gua. importante destacar que a Dissertao de Mestrado encontrou-se inserida no contexto do projeto CNPq Caracterizao espectral e limnolgica de ambientes lnticos no Rio Grande do Sul, com abordagem espao-temporal (nmero 484712/200-71) e do projeto CAPES Desenvolvimento de estudos e mtodos para anlise das caractersticas da gua no contexto espao-temporal (nmero 0258059).

1.1

Caractersticas da rea de estudo

O reservatrio da UHE Dona Francisca est localizado na regio Central do Estado do Rio Grande do Sul (RS) Brasil, conforme pode ser verificado na Figura 1.1. Encontra-se construdo no alto curso do rio Jacu, e abrange na margem direita do rio terras do municpio de Nova Palma e Pinhal Grande e na margem esquerda, terras dos municpios de Agudo, Ibarama, Estrela Velha e Arroio do Tigre. Na Figura 1. 1 demonstrada somente a bacia hidrogrfica do rio Jacuizinho, localizada na margem esquerda do rio Jacu, e as bacias de contribuio direta ao reservatrio (margem direita), excludas as reas de captao dos reservatrios montante: Itaba, Jacu, Passo Real e Ernestina.

Figura 1. 1- Localizao do reservatrio da UHE Dona Francisca no contexto do RS, com destaque para as bacias hidrogrficas de contribuio direta e bacia do rio Jacuizinho.

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De acordo com CEEE, DFESA (2001, apud PEREIRA FILHO, 2003), a Usina Hidreltrica Dona Francisca faz parte do sistema Jacu de gerao de energia e est a jusante da UHE Itaba. montante de Itaba encontram-se ainda, as UHE de Jacu, Passo Real e Ernestina. A UHE Dona Francisca foi inaugurada em maio de 2001, com capacidade de gerao de 125 MW, capacidade que permite abastecer uma cidade de 350 mil habitantes. A rea do lago perfaz 2.316,00 hectares e a rea total 7.316,16 hectares. Foram atingidas 518 propriedades rurais com o enchimento do reservatrio. Embora os primeiros estudos para a instalao da UHE Dona Francisca tenham iniciado em 1968, as obras de construo comearam em 1998 e esta foi a primeira hidreltrica construda no RS em consonncia com a moderna legislao ambiental. A usina entrou em funcionamento parcial em fevereiro de 2001, sendo oficialmente inaugurada no dia 21 de maio do mesmo ano (CEEE, 1989, apud FARENZENA, 2006). De acordo com Bernardes (1997, apud FARENZENA, 2006) a rea atingida pelo reservatrio da Usina Hidreltrica Dona Francisca foi colonizada principalmente por imigrantes italianos e alemes, que passaram a desenvolver a agricultura em pequenas propriedades. No perodo da colonizao (com inicio no sculo XIX), o Rio Jacu ainda no era aproveitado para a gerao de energia eltrica, todavia apresentava relevante importncia, pois servia como a principal via de acesso para os colonizadores atingirem o interior do Estado e tambm como um condensador da populao s suas margens, onde encontravam reas planas para o desenvolvimento da agricultura, disponibilidade de gua e alimentos. Os municpios limtrofes os reservatrio atualmente caracterizam-se por apresentar baixa densidade demogrfica e um grande percentual de populao rural, conforme pode ser visualizado na Tabela 1.1. Tabela 1. 1 - Dados dos municpios limtrofes ao reservatrio da UHE Dona Francisca Municpios Populao total 17.455 12.216 3.691 4.454 6.312 4.725 Total: 48.853 Populao urbana 5.655 5.270 667 956 2.664 3.219 Total: 18.431 Populao rural 11.800 6.946 3.024 3.498 3.648 3.813 Total: 32.729 rea (km2) 536 319 282 193 314 477 Total: 2.121 Dens. demogrfica (hab./ km2) 32.6 38.3 13.1 23.1 20.1 9.9 Mdia: 22.8

Agudo Arroio do Tigre Estrela Velha Ibarama Nova Palma Pinhal Grande

Fonte: IBGE, Censo Demogrfico 2000. Org.: CORAZZA, R., 2009

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A populao rural est organizada, basicamente, em pequenas propriedades familiares (Pereira Filho, 2003). Esses municpios tm sua base econmica no setor primrio, onde se destaca o cultivo da soja nas reas de Planalto; do arroz nas plancies aluviais; do fumo, milho, trigo e feijo nas reas de encosta, inclusive nas encostas ngremes; e de uma pecuria pouco expressiva. Os setores secundrio e tercirio ainda so pouco desenvolvidos, e destacam-se em ambos os municpios atividades industriais ligadas ao beneficiamento da produo agrcola (Farenzena, 2006). A Figura 1.2 refere-se classificao supervisionada de uma imagem do satlite Landsat 5, sensor TM, de maro de 2009. Atravs dela possvel verificar a distribuio das reas agrcolas na bacia hidrogrfica, com predomnio da soja, milho e arroz neste perodo. Tambm possvel identificar a presena de vastas reas florestais preservadas, decorrentes principalmente das elevadas declividades que dificultam o acesso.

Figura 1. 2 - Mapa de uso do solo da bacia hidrogrfica do rio Jacuizinho e das bacias de contribuio direta do reservatrio da UHE Dona Francisca maro de 2009

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Em relao geomorfologia, o reservatrio encontra-se inserido em uma faixa de transio, situada entre o Planalto Meridional do Sul do Brasil (Planalto e Rebordo) e a Depresso Central (CEEE, 1989, apud FARENZENA, 2006). A rea da UHE Dona Francisca compreende, essencialmente, rochas vulcnicas (Formao Serra Geral) relacionadas ao final da evoluo da Bacia do Paran, no Mesozico. Estas rochas vulcnicas se sobrepem aos sedimentos arenosos e areno-siltosos das formaes Botucatu e Rosrio do Sul e so sobrepostas pelos sedimentos heterogneos da formao Tupancieret, de idade mais recente e de ocorrncia restrita poro centro-oeste do Planalto Brasileiro e incluem a rea de abrangncia (MAGNA, CEEE e SUG, 1989 apud FRIEDRICH, 1993). De acordo com Friedrich (1993), o reservatrio Dona Francisca encontra-se em um vale encaixado e profundo em forma de V. Esta caracterstica resultante da faixa de transio entre o relevo ondulado do Planalto, onde os cursos de gua se encaixam formando vales, e os relevos intensamente esculturados do Rebordo do Planalto, originados pela eroso regressiva dos corpos da gua. No Rebordo do Planalto tambm so encontradas escarpas abruptas e morros (morros testemunhos) caracterstica predominante nas reas do entorno do reservatrio, conforme pode ser visualizado na Figura 1.3.

Figura 1. 3 - Fotografias digitais representativas do sistema aqutico e terrestre da UHE Dona Francisca. De acordo com a classificao climtica de Strahler, o centro do Estado do RS, onde se localiza a UHE Dona Francisca, est totalmente includo na Zona Subtropical Sul, na qual o clima controlado por massas de ar de origem tropical martima (mT) no vero e polar martima (mP) no inverno. O outono e a primavera so perodos de transio, com a consequente entrada de massas quentes e midas (mT) e massas frias e instveis (mP) (MAGNA, CEEE e SUG, 1989, apud FRIEDRICH, 1993).

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A variedade climtica conforme o sistema taxonmico de Kppen-Geiger, Cfa, com temperaturas mdias compreendidas entre -3C e 18C no ms mais frio e superiores a 22C no ms mais quente. A precipitao bem distribuda durante o ano, com ausncia de uma poca seca (Friedrich, 1993). Matzenauer et al. (2007), realizaram o levantamento das precipitaes no RS entre os anos de 1975 e 2005 e encontraram volume de chuvas superiores a 1.900 mm na metade norte do Estado e volumes inferiores a 1.400 mm na metade sul, o que caracteriza uma variabilidade espacial significativa. A integrao das caractersticas acima descritas condicionou o tipo e a distribuio da vegetao da rea, que originalmente era constituda pela Floresta Estacional Decidual nas encostas dos vales formados pelo rio Jacu e seus tributrios. Nas reas de Planalto, predominavam os campos, com capes esparsos e matas ciliares. Atualmente a vegetao original pode ser observada em locais de difcil acesso, como nas encostas ngremes (LA SALVIA e MARODIN, 1983; CEEE, 1989, apud FARENZENA, 2006).

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________________________________________________________________ CAPTULO II2 FUNDAMENTAO TERICA

De acordo com Novo (1998) sensoriamento remoto a utilizao de sensores para a aquisio de informaes sobre objetos e fenmenos sem que haja contato direto entre eles. Os sensores so os equipamentos capazes de coletar energia proveniente do objeto, convertla em sinal passvel de ser registrado e apresent-lo em forma adequada para a extrao de informaes. O Sol a principal fonte de energia (radiao) eletromagntica para o sistema solar, bem como para o sensoriamento remoto da superfcie terrestre. A energia irradiada pela superfcie aparente do Sol em direo Terra denominada de Fluxo Radiante e o mximo de energia solar disponvel na superfcie terrestre para fins de sensoriamento remoto encontra-se na faixa de 0,4 m a 0,7 m, que conhecida como a regio visvel do Espectro Eletromagntico (Novo, 1998). Uma das tcnicas utilizadas para a deteco da energia que interage com os objetos a espectrorradiometria. O equipamento utilizado o espectrorradimetro, cuja sada em forma de nmeros ou grficos. Ele decompe a radiao incidente em diferentes comprimentos de onda, de tal forma que se possa medir a resposta do alvo quase de maneira contnua ao longo do espectro eletromagntico (Novo, 1998; Braga, 1998). Conforme Meneses (2001), a energia radiante medida por um espectrorradimetro definida como reflectncia, a qual obtida de acordo com a Equao 2.1:

= 100 L / E

(2.1)

Onde: a reflectncia em porcentagem; L = intensidade da energia que deixa a amostra (radincia da amostra) e E a intensidade da energia incidente (irradincia da fonte).

Como tanto a energia incidente quanto a que deixa a amostra tm a mesma unidade (watts/cm2.), a medida de reflectncia pode ser expressa graficamente em porcentagem na forma de curvas denominadas de espectros de reflectncia e que representam a resposta espectral do alvo (Meneses, 2001).

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Como pode-se verificar, o sensoriamento remoto vai muito alm da simples visualizao de uma imagem de satlite ou de uma curva espectral obtida em laboratrio. preciso entender, acima de tudo, como a radiao interage com os elementos que compem a superfcie terrestre. A gua, grande solvente universal, certamente um das substncias mais complexas de serem compreendidas, visto a grande variedade de materiais que podem se encontrar associados e prpria dinmica interna dos corpos da gua.

2.1

Sensoriamento remoto da gua

2.1.1

Processos de interao da radiao eletromagntica com a gua

A radiao que chega at os sensores remotos aps entrar em contato com as superfcies aquticas pode ser originada de quatro diferentes modos: 1) pela reflexo do fluxo de radiao direta do Sol que atinge a superfcie da gua; 2) pela reflexo do fluxo de radiao difusa que atinge a superfcie da gua; 3) pelo fluxo espalhado pela atmosfera e 4) pelo fluxo que espalhado no interior do volume dgua e emerge da coluna dgua aps atravessar a interface gua/ar (Esteves, 1998; Novo, 2001). De acordo com Novo (1998) apenas o fluxo emergente imediatamente abaixo da superfcie contm informaes sobre a composio do meio aqutico. Entretanto, aquele que detectado pelo sensor aps todas as correes necessrias o fluxo emergente, ou seja, aquela parte do fluxo que consegue atravessar a superfcie. A quantidade de radiao refletida pela gua depende das condies da sua superfcie, se esta se encontra plana ou ondulada em funo do vento, e principalmente do ngulo de incidncia da radiao sobre a superfcie da gua, sendo este ngulo varivel no decorrer do dia e das estaes em funo dos movimentos da Terra. Sob condies calmas de vento somente cerca de 2% a 6% da energia incidente refletida na interface gua/ar at um ngulo de incidncia da radiao de 30 (Esteves, 1998; Novo, 2001). Ao penetrar na coluna dgua, a radiao sofre alteraes tanto qualitativas quanto quantitativas. A primeira alterao a refrao que implica em mudana de direo da radiao pela reduo da velocidade ao penetrar no meio lquido. Em seguida parte da radiao absorvida e transformada em outras formas de energia, por exemplo, qumica pela fotossntese e calorfica pelo aquecimento da gua. Outra parte da radiao sofre o fenmeno

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de disperso (espalhamento), que o choque da radiao com partculas dissolvidas e/ou suspensas na gua (Esteves, 1998). A absoro e o espalhamento causados pelos componentes opticamente ativos presentes determinam a atenuao da radiao eletromagntica em cada corpo dgua. Este limiar define, portanto, a espessura da camada superficial sobre a qual podem ser extradas informaes de interesse quando se efetuam medidas da radiao emergente (Braga, 1998). No que tange ao efeito da refrao, se a velocidade de propagao da luz no ar for considerada constante (c), e se, ao passar por outro meio (gua), transformar-se na velocidade (v), ento o ndice de refrao (n) do segundo meio com relao ao ar pode ser definido como: n = c/v. O ndice de refrao varia com o comprimento de onda e d origem ao fenmeno de disperso. O ndice de refrao da gua de 1,33 (Novo, 1998). Conforme Esteves (1998) a absoro da radiao ocorre de maneira exponencial negativa com a profundidade, alm de ser um processo seletivo (varia com o comprimento de onda). Na gua destilada, por exemplo, ocorre pouca absoro da radiao em comprimentos de onda curtos e as de comprimento de onda mais longos so fortemente absorvidas. Assim, a faixa de maior coeficiente de absoro geralmente o vermelho e especialmente o infravermelho e decresce significativamente em direo ao azul, conforme pode ser visualizado na Figura 2.1.

Figura 2. 1 - Coeficiente de absoro (A) e de espalhamento (B) da gua pura. Fonte: Dekker (1993). Na coluna dgua a radiao que no prontamente absorvida dispersada uma ou mais vezes antes de ser absorvida. A disperso um fenmeno que se observa mesmo em

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guas muito puras e se deve ao desvio da trajetria original da radiao, por algum componente do meio, resultando na radiao difusa. Embora se observe disperso da radiao at pelas molculas da gua (disperso molecular), o principal fator de disperso so as substncias dissolvidas e partculas suspensas no meio lquido de diferentes tamanhos e atividade ptica. Quanto menor o tamanho das partculas maior o efeito da disperso. Assim, em guas naturais com altas concentraes de partculas de pequeno tamanho (menores que 1 m, geralmente sob a forma coloidal), observa-se os maiores ndices de disperso da radiao (Esteves, 1998). Uma das principais consequncias da disperso da radiao para o ambiente aqutico a reduo da profundidade de penetrao da energia fotossinteticamente ativa. A regio iluminada na coluna dgua denominada zona euftica e sua extenso pode variar desde alguns centmetros at dezenas de metros, de acordo com a capacidade do meio de atenuar a radiao subaqutica. O limite inferior da zona euftica geralmente assumido como aquela profundidade onde a intensidade da radiao corresponde a 1% da que atinge a superfcie (normalmente utiliza-se os valores da radiao subsuperficial) (Esteves, 1998). A soma dos coeficientes de absoro e de disperso corresponde ao coeficiente de atenuao vertical da radiao (k). O coeficiente de atenuao vertical da radiao juntamente com a intensidade da radiao na superfcie so os principais fatores que determinam a quantidade de energia em uma determinada profundidade da coluna dgua. Esta quantidade de energia fundamental para a compreenso dos processos que se estabelecem no sistema aqutico, principalmente aqueles relacionados aos organismos vivos como o fitoplncton (Esteves, 1998).

2.1.2

Propriedades pticas inerentes e aparentes da gua

De acordo com Kirk (1994) as propriedades de absoro e espalhamento da luz no meio aqutico em determinados comprimentos de onda so especficos em termos de coeficiente de absoro e espalhamento e da funo volumtrica do espalhamento. Essas propriedades tm referncia com as propriedades pticas inerentes, pois sua magnitude depende somente das substncias que compem o meio aqutico e no da geometria do campo de luz que pode difundi-las. A variao do coeficiente de absoro fortemente influenciada pela capacidade de absoro da prpria molcula dgua e pelas componentes opticamente ativos, sendo estas: os

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organismos vivos como o fitoplncton, zooplncton e bacterioplncton; as partculas orgnicas e inorgnicas em suspenso e as substncias orgnicas dissolvidas, principalmente substncias hmicas (Esteves, 1998; Novo, 2001). As curvas de absoro dos componentes opticamente ativos podem ser visualizadas na Figura 2.2.

Figura 2. 2 - Coeficientes de absoro da gua pura, dos componentes opticamente ativos e a absoro total resultante. Fonte: adaptado de Rudorff (2006) Conforme Novo (2001) as componentes opticamente ativos presentes no corpo dgua podem afetar tanto o coeficiente de absoro quanto o coeficiente de espalhamento. O coeficiente de espalhamento representa a integrao da energia espalhada por um volume unitrio de gua em todas as direes. Entretanto, para o sensoriamento remoto das propriedades da gua, o que mais interessa o coeficiente de retroespalhamento, ou seja, aquela frao do coeficiente de espalhamento que representa a integrao da energia espalhada na direo oposta de incidncia. Esta frao vai ser responsvel pela formao de um fluxo de energia emergente em direo superfcie da gua e que chegar ao sensor. Existem propriedades pticas que so afetadas tanto pela composio dgua quanto pelas caractersticas do campo de luz incidente sobre a gua. A essas propriedades d-se o nome de propriedades pticas aparentes, porque os valores das grandezas medidas podem modificar-se com as alteraes do campo de luz incidente sobre a gua. O fluxo retroespalhado, por exemplo, uma propriedade ptica aparente porque sua magnitude depender do fluxo incidente. Vale destacar que o fluxo de energia detectado por um sensor remoto diretamente proporcional ao coeficiente de retroespalhamento da gua e inversamente proporcional ao seu coeficiente de absoro (Kirk, 1994; Novo, 2001).

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2.2

Componentes opticamente ativos da gua

Em guas continentais, componentes orgnicos e inorgnicos conferem a cor apresentada pela gua, sendo algumas passveis de deteco por tcnicas de sensoriamento remoto. Dentre estas substncias e/ou partculas se destacam os pigmentos fotossintticos como a Chl-a, presente nos organismos fitoplanctnicos aquticos, as partculas inorgnicas suspensas provenientes principalmente das bacias de captao do sistema aqutico e o carbono orgnico dissolvido resultante da decomposio do material orgnico. Todos estes elementos imprimem caractersticas nicas nos dados de sensoriamento remoto, o que permite a identificao dos componentes e consequente monitoramento do ambiente aqutico.

2.2.1

Efeitos da presena de clorofila na reflectncia da gua

O fitoplncton um grupo heterogneo composto principalmente por algas fotossintetizantes que se distribui por grande parte dos ambientes marinhos e aquticos continentais do mundo. Nestes ambientes, o principal responsvel pela captao da energia eletromagntica e sua transformao em energia qumica (fotossntese) e desempenha, portanto, importante funo no sistema. As molculas que captam e transformam a energia so chamadas de pigmentos fotossintetizantes, e alguns exemplos so as clorofilas a, b e c e os carotenides (Arraut et al., 2005). Em guas interiores podem ser encontrados representantes de praticamente todos os grupos de algas. A predominncia de um ou outro grupo em determinado ecossistema funo, principalmente, das caractersticas do meio aqutico. As principais divises com representantes no plncton de gua doce so: Cyanophyta, Chlorophyta, Euglenophyta, Crhysophyta, Pyrrophyta, Phaeophyta, Rhodophyta (Amabis e Martho, 1997; Esteves, 1998). As principais caractersticas destes grupos so apresentadas na Tabela 2.1. Em relao s cianofceas (cianobactrias), Esteves (1998) explica que estas podem ser encontradas em todos os bitopos do sistema lacustre porque so capazes de sofrer adaptaes cromticas dos pigmentos quando ocorrem mudanas qualitativas e quantitativas da radiao. Alm disso, as cianofceas so adaptadas flutuao por meio de vacolos gasosos. Muitas espcies, quando em condies favorveis, crescem em altas densidades e se localizam principalmente nas camadas superficiais da gua, fenmeno este denominado

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florao das algas (em ingls denomina-se bloom), que ocorre em dias quentes e calmos principalmente em lagos com grandes quantidades de nutrientes (eutrofizados).

Tabela 2. 1 - Caractersticas dos principais filos de algas.Filo Cyanophyta (Cianobactrias: algas azuis) Chlorophyta (Clorofceas ou clorfitas: algas verdes) Phaeophyta (Feofceas ou fefitas: algas marrons o pardas) Rhodophyta (Rodofceas ou rodfitas: algas vermelhas) Crysophyta (algas douradas) Euglenophyta (euglenides) Pyrrophyta (dinoflagelados) Organizao Unicelulares e Multicelulares Unicelulares e Multicelulares Multicelulares Multicelulares (a maioria) Unicelulares Unicelulares Unicelulares Tipo de clorofila a a, b a, c a, d a, c a, b a, c Pigmentos acessrios Ficocianina Carotenos e xantofilas Carotenos e xantofilas (fucoxantina) Ficocianina, ficoeretrina, carotenides Carotenos e xantofilas Carotenos e xantofilas Carotenos e xantofilas

Fonte: Adaptado de Amabis e Martho (1997); Esteves (1998); Linhares e Gewandsznajder (2007). Org.: CORAZZA, R., 2009.

As algas desempenham um importante papel no ambiente aqutico e so responsveis pela produo de grande parte do oxignio dissolvido do meio. Entretanto, o processo de eutrofizao pode estimular o desenvolvimento de grandes quantidades de algas, que trazem consigo inconvenientes como: toxidez, sabor, odor, turbidez, cor, formao de matria orgnica, aumento da amplitude de variao do oxignio dissolvido, corroso, interferncia nos processos de tratamento da gua, aspecto esttico desagradvel (Mota, 1997). Desta forma, de extrema importncia a compreenso dos processos relacionados ao fitoplncton, bem como o desenvolvimento de sistemas capazes de monitorar a presena e dinmica deste componente do meio aqutico, dentre os quais os que utilizam o sensoriamento remoto. Tem sido crescente a demanda de informaes sobre algas indicadoras da qualidade da gua, uma vez que a quantidade destas pode ser resultado do nvel de interferncia antrpica no sistema aqutico (eutrofizao, por exemplo). Em funo disso, um dos objetivos dos profissionais que atuam em manejo de lagos e reservatrios controlar os florescimentos de espcies de algas potencialmente txicas, como as cianobactrias, que produzem toxinas consideradas um risco sade pblica (Londe et al., 2005). Rundquist et al. (1996) explicam que devido a sua quantidade, a clorofila algal um indicativo da produtividade primria e do nvel trfico de superfcies de gua. Assim, desejvel acompanhar o aumento de densidade do pigmento no espao geogrfico e em vrios momentos durante um perodo vegetativo e de um ano para o outro. Desta forma, o sensoriamento remoto visto como uma tecnologia com potencial para a avaliao da

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concentrao de clorofila, especialmente com o uso do sensoriamento remoto hiperespectral (Londe et al., 2005). A absoro da luz pelos pigmentos fotossintticos do fitoplncton clorofilas, carotenides, biliproteinas contribuem para a atenuao da radiao fotossinteticamente ativa com a profundidade. A maior parte das plantas possui clorofilas a, b, c e mais raramente d. A clorofila a (Chl-a) aquela que ocorre em maior abundncia. Entre as algas, entretanto, a concentrao de Chl-a varia amplamente (Kirk, 1994). De acordo com Rudorff (2006) o grande interesse de estudos de sensoriamento remoto usar o conhecimento das bandas de absoro especficas dos pigmentos fotossintetizantes para poder ter acesso aos provveis tipos de comunidades fitoplanctnicas. Porm, para esta tarefa necessrio paralelamente o entendimento do comportamento espectral da gua propriamente dita e dos componentes orgnicos e inorgnicos presentes na gua, tendo em vista que todos estes interferem na radiao ascendente na gua (Costa, 1992). H duas regies principais de absoro dos pigmentos fitoplanctnicos: a regio do azul (400-515 nm) e do vermelho (630-700 nm), as quais podem ser visualizadas na Figura 2.3. Na regio do verde (515-600 nm) h um aumento da reflectncia, atribudo ao espalhamento interno das clulas dos organismos fitoplanctnicos, j que as algas so partculas refratoras e que tambm aumentam o espalhamento em comprimentos de onda do infravermelho (IV) (Kirk, 1994; Mobley, 1994; Esteves, 1998; Novo, 2001). Ainda no verde, h a exceo de algumas bandas de absoro atribudas s biliproteinas (Novo, 2001). De acordo com a Figura 2.3, que representa um experimento realizado por Rundquist et al. (1996) com utilizao de diferentes concentraes de Chl-a, possvel verificar baixa reflectncia entre 400 e 500 nm devido absoro da luz azul (com um mnimo em 438 nm absoro pela Chl-a), aumento da reflectncia por volta de 520 nm (com pico de reflectncia entre 560 e 570 nm) e ponto mximo de absoro tpico da Chl-a em 675 nm. De uma forma geral, com o aumento da concentrao de clorofila as curvas espectrais passam a apresentar maior reflectncia, exceto para a regio do azul e para o mximo de absoro em 675 nm. Quanto s feies de mxima e mnima, h uma melhor definio destes, pois se tornam mais estreitos. Outro efeito que pode ocorrer com o acrscimo de clorofila o aumento da energia refletida na regio por volta de 680, 685 e 705 nm e que corresponde regio de emisso correspondente fluorescncia pela clorofila (Novo, 2001, Rudorff, 2006).

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Figura 2. 3 - Variao da reflectncia em funo de diferentes concentraes de Chl-a. Fonte: Rundquist et al. (1996). A Tabela 2.2 apresenta um resumo dos comprimentos de onda onde ocorre absoro pelos pigmentos fotossintetizantes, com destaque para a Chl-a. Aguirre-Gomez et al. (1995, apud NOBREGA, 2002), ressaltam que os pigmentos fotossintticos acessrios tambm possuem mximos de absoro caractersticos, porm so de difcil percepo pois, muitas vezes, esto localizados na mesma regio da Chl-a.

Tabela 2. 2 - Bandas de absoro dos pigmentos fotossintetizantes Pigmentos Bandas de absoro (nm) Clorofila a Clorofila b Clorofila c Carotenides Biliproteinas 435; 440; 675; 676 480; 650 440; 645 425; 450; 500 498; 553; 555; 562; 568; 585; 620; 650; 670

Fonte: Dekker, 1993; Kirk, 1994; Novo, 2001.

De acordo com Richardson (1996) a fuso do sensoriamento remoto e dos avanos nas anlises de pigmentos fitoplanctnicos tem resultado numa nova linha de investigao. Cerca de 100 pigmentos algais foram identificados e so divididos em trs categorias: clorofilas, carotenides e ficobiliprotenas (ou ficobilinas ou biliprotenas) (Kirk, 1993; Richardson,

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1996). Existem vrios tipos de clorofilas, incluindo a clorofila b, c1, c2, c3 e d, todos com espectros de absoro semelhantes ao da clorofila-a. A principal funo dos pigmentos carotenides fotoproteo. Existem mais de 60 tipos de carotenides com absoro na mesma regio do espectro eletromagntico (ultravioleta e azul), porm com formas de absoro nicas para cada tipo. Em relao s ficobilinas, tem-se que estas so hidrossolveis e altamente fluorescentes e so os tipos mais importantes para o fitoplncton so as de cor vermelha (ficoeretrina, ficoeritorcianina), presentes nas algas vermelhas, e as de cor azul (ficocianinas, aloficocianina), presentes nas cianobactrias (Kirk, 1993; Richardson, 1996). De acordo com Dekker (1993) o comprimento de onda de 624 nm tomado como correto para o mximo de absoro in vivo pela ficocianina. Entretanto, as faixas de aproximadamente 12 nm de largura centradas em 600, 624 e 648 nm so recomendadas para detectar e quantificar as concentraes de ficocianina com uso de dados de sensoriamento remoto. Complementarmente Richardson (1996) explica que a ficocianina apresenta uma banda de mxima absoro centrada em 620 nm, porm esta banda apresenta uma largura de 20 nm porque a ficocianina absorve em uma rea do espectro no coberta por outros pigmentos (entre os carotenides e as clorofilas), sendo detectvel entre 610 e 630 nm. Outro estudo realizado por Simis et al. (2007) indicaram que o sinal de absoro da maioria das modificaes da ficocianina em cianobactrias mais forte aproximadamente em 615 nm. A ficocianina um indicador da presena de cianobactrias em guas interiores eutrficas, porm a presena de outros pigmentos alm da ficocianina e Chl-a e a influncia varivel da Chl-a na absoro em 620 nm causam erros potenciais na determinao da ficocianina, conforme foi verificado por Simis et al. (2005), que obtiveram 19,7% de superestimao na concentrao com uso de medidas especficas do coeficiente de absoro em 620 nm. Alm disso, Schalles et al. (1998) verificaram que h variao sazonal da absoro por volta de 625 nm, sendo mais pronunciada nos meses vero e com deslocamento do pico de reflectncia no verde para comprimentos de onda mais curtos (540 e 550 nm). Na primavera, com menores quantidades de ficocianina o pico de reflectncia se deslocou para comprimentos de onda mais longos (560 e 570 nm). A clorofila o principal constituinte responsvel pelas variaes temporais e espaciais no espectro de reflectncia de guas ocenicas. Entretanto, as guas interiores geralmente contm quantidades de carbono orgnico dissolvido e matria particulada inorgnica que dificultam a interpretao do espectro de reflectncia. Alm disso, a combinao destes fatores varia regionalmente para guas interiores (Londe et al., 2005).

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Os mximos de absoro especficos da clorofila na luz visvel (azul e vermelho) podem ser mascarados com a presena de sedimentos em suspenso ou matria orgnica dissolvida na gua, sendo que as feies na curva espectral podem aparecer deslocadas (Braga, 1998). Em funo da presena de matria orgnica dissolvida, um corpo dgua que contenha fitoplncton passa a apresentar absoro ainda mais forte na faixa do azul, o que torna difcil a separao de cada um dos componentes. Dekker et al. (1992), sugerem que, neste caso, a deteco da clorofila deve ser feita utilizando-se as medidas de reflectncia em 680 nm e quando a concentrao de clorofila ultrapassa 100 g.l-1, este mximo de absoro se desloca para 715 nm. Em relao a corpos de gua com presena de fitoplncton e sedimentos em suspenso simultaneamente, Dekker et al. (1996, apud NOBREGA, 2002), explicam que a reflectncia alta nos comprimentos de onda maiores que 720 nm em ambientes aquticos com altas quantidades de sedimentos em suspenso e baixas concentraes de fitoplncton. J quando h grandes quantidades de fitoplncton e sedimentos, a reflectncia alta, porm apresenta os mximos de absoro devidos clorofila. Han et al. (1994) ressaltam que as caractersticas espectrais da clorofila podem ser distinguidas mesmo quando a concentrao de sedimentos em suspenso atinge 1000 mg/L. O aumento da concentrao de sedimentos resulta num aumento da reflectncia em toda faixa, mas a presena da clorofila tambm afeta a forma da curva (Barbosa, 2005). Quando a concentrao de sedimentos aumenta, o pico de reflectncia bem definido em 550 nm desloca-se em direo a comprimentos de onda maiores e torna-se um pico mais achatado e menos definido. Isso ocorre em funo da atenuao das feies de absoro da clorofila causada pelo aumento dos sedimentos em suspenso, sendo a magnitude deste deslocamento e da alterao da forma do pico dependente das concentraes de sedimentos. Outra informao importante para o sensoriamento remoto de ambientes aquticos a variao sazonal dos organismos fitoplanctnicos, pois esta pode trazer diferenas nos dados obtidos. A variao sazonal ocorre em regies temperadas e controlada principalmente pela radiao solar e pela temperatura, que iro determinar a estratificao da coluna dgua e a disponibilidade de nutrientes. Na primavera, com o aumento da luminosidade e dos nutrientes ocorre a primeira florao das algas, o que resulta num mximo de biomassa. No vero, em funo da estratificao e diminuio da quantidade de nutrientes na zona euftica h um desenvolvimento moderado do fitoplncton. No outono ocorre a retomada da circulao da gua que pode ocasionar uma segunda florao de algas, porm menor que a da primavera.

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Por fim, no inverno, poucas algas conseguem florescer devido s baixas temperaturas da estao (Esteves, 1998). Costa (1992) explica a influencia da radiao subaqutica na distribuio vertical do fitoplncton e na sua resposta fotossinttica, sendo que h aumento linear da fotossntese com o aumento da intensidade de luz at um plat de saturao da luz, que pode resultar at mesmo na inibio da fotossntese, sob intensidade de luz muito alta. Esteves (1998) complementa que embora a maior quantidade de organismos fitoplanctnicos ocorra na zona euftica, h algumas espcies como as Chlorophyta que realizam a fototaxia, que corresponde migrao conforme a variao diria da radiao. De acordo com o que foi apresentado at ento, quando o fitoplncton o objeto de estudo atravs da tcnica de sensoriamento remoto, vrios aspectos devem ser conhecidos, dentre os quais: os diferentes tipos e caractersticas de organismos fitoplanctnicos e as interaes entre as populaes fitoplanctnicas e a radiao eletromagntica, com destaque ao efeito da presena de pigmentos fotossintticos como a Chl-a nos espectros de reflectncia. Alm disso, de suma importncia o conhecimento da distribuio e variao das algas num corpo dgua no decorrer de um dia ou de um ano, principalmente quando se busca o monitoramento temporal desta varivel.

2.2.2

Material particulado em suspenso

O material particulado em suspenso constitui-se de detritos orgnicos e inorgnicos. A frao inorgnica formada por partculas minerais, principalmente silte e argila e a frao orgnica pelo fitoplncton, zooplncton e matria orgnica particulada (Esteves, 1998; Braga, 1998). Em relao Limnologia, o material particulado em suspenso pode ser tratado como Totais de Slidos em Suspenso (TSS) e representado pela equao TSS = SOS + SIS, onde SOS so os Slidos Orgnicos em Suspenso e SIS os Slidos Inorgnicos em Suspenso. De acordo com Mobley (1994) as partculas orgnicas em suspenso que possuem importncia ptica se originam do crescimento e reproduo de bactrias, fitoplncton e zooplncton. Todavia, as partculas orgnicas podem ocorrer de muitas formas: vrus, colides, bactrias, fitoplncton, detritos orgnicos, partculas grandes (zooplncton e partculas menores agregadas). A origem do material particulado inorgnico em suspenso est associada a: minerais provenientes do intemperismo e eroso de rochas ou solos (quartzo, areia, argila, xidos

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metlicos), que so carreados para os corpos dgua por ao do vento ou da chuva, resuspenso ou eroso dos sedimentos do fundo pela ao do vento, detritos inorgnicos como de conchas carbonticas de moluscos e carapaas silicosas de certas algas planctnicas. As partculas inorgnicas ocorrem na faixa de 1 m at vrias dezenas de micrmetros (Mantovani, 1993; Mobley, 1994; Nobrega, 2002). O TSS tem relao com as atividades desenvolvidas no ambiente terrestre, isso porque partculas orgnicas e inorgnicas so carreadas, atravs do escoamento superficial, das subbacias hidrogrficas at o corpo hdrico como o reservatrio (Wachholz, 2007). Entretanto, a perda de material varia em funo do solo e tipo do uso da terra. Por exemplo, reas florestais preservadas disponibilizam uma menor quantidade de partculas para o sistema aqutico que reas agrcolas, principalmente se as prticas agrcolas envolverem revolvimento da camada superficial do solo. A concentrao de slidos em suspenso interfere na turbidez da gua e pode afetar intensamente a ecologia, com a degradao do habitat aqutico e da qualidade da gua. Altas concentraes de TSS tambm podem levar ao assoreamento de rios e reservatrios (Braga, 1998; Wachholz, 2007). As caractersticas do material particulado em suspenso ligadas a sua constituio mineralgica, ao tamanho das partculas e concentrao so inter-relacionadas e desempenham papel importante na determinao do comportamento espectral resultante (Mantovani, 1993). Conforme Novo (2001) tanto medidas feitas no campo quanto em experimentos em laboratrio tm demonstrado que h aumento do coeficiente de espalhamento da gua pura com a ampliao da concentrao de slidos em suspenso (orgnicos e inorgnicos). Este aumento da concentrao de sedimentos resulta no deslocamento do pico de reflectncia em direo aos comprimentos de onda mais longos com a formao de um patamar de reflectncia entre 500 e 700 nm, alm do acrscimo expressivo da reflectncia na regio do infravermelho. Na Figura 2.4 possvel verificar que o aumento da turbidez da gua em NTU (Unidade de Turbidez Nefelomtrica) ocasiona o acrscimo geral da reflectncia devido ao aumento do coeficiente de retro-espalhamento. Na faixa entre 400 e 550 nm ocorre um crescimento rpido da reflectncia, seguido de alta reflectncia entre 550 e 650 nm em funo do espalhamento pelo material particulado e a baixa absoro da radiao eletromagntica pela gua nesta regio. Por fim ocorre um decrscimo rpido da reflectncia entre 700 e 740 nm, devido ao forte aumento da absoro pela gua e um pequeno pico de reflectncia entre 800 e 810 nm.

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Figura 2. 4 - Curvas de reflectncia com diferentes concentraes de slidos em suspenso. Fonte: Adaptado de Goodin et al. (1993). De acordo com Nbrega (2002), com o aumento da concentrao de sedimentos em suspenso e consequentemente da turbidez da gua, alm do aumento geral da reflectncia, ocorre tambm a modificao da forma do espectro de reflectncia. Porm, importante destacar que radiao que sofre espalhamento devido concentrao de sedimentos no tem um comportamento constante e varia em funo dos tamanhos das partculas e do material de origem, o que torna difcil a formulao de um algoritmo geral para os sedimentos em suspenso. Em relao ao coeficiente de absoro pelas partculas em suspenso na gua, principalmente as orgnicas, Novo (2001) afirma que estas tambm podem aumentar o coeficiente de absoro da gua. De acordo com a autora existem poucos dados sobre a absoro das partculas devido s dificuldades de isolar seu efeito do efeito de atenuao provocado pelo espalhamento. Entretanto, medidas indiretas mostraram que o mximo de coeficiente de absoro pelas partculas ocorre na faixa do azul, assemelhando-se ao comportamento espectral da matria orgnica dissolvida. A relao entre a concentrao de sedimentos em suspenso e a reflectncia da gua tem sido aplicada aos dados de sensoriamento remoto para estimar a distribuio espacial de concentrao de sedimentos em suspenso sobre guas costeiras e continentais, como reservatrios, lagos e grandes rios. Este tipo de informao oferece subsdios ao

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gerenciamento da qualidade da gua, o monitoramento da poluio e a modelagem da taxa de transporte de sedimentos (Rudorff, 2006).

2.2.3

Matria orgnica dissolvida

De acordo com Mobley (2004) ao filtrar uma amostra de gua, tudo o que passa por um filtro cujos poros so de aproximadamente 0,45 m chamado de dissolvido e tudo o que fica retido no filtro chamado de particulado. Essa linha divisria determinada mais pela capacidade do homem de analisar o material que fica no filtro do que pelas caractersticas distintivas dos produtos qumicos, biolgicos ou das propriedades pticas em questo. Notase que 0,45 m igual a 450 nm, o menor comprimento de onda da luz visvel. Desta forma, a microscopia ptica incapaz de identificar partculas menores do que a linha divisria entre o material dissolvido e particulado. Tanto as guas doces quanto as salgadas contm diferentes concentraes de compostos orgnicos dissolvidos (Mobley, 1994). As vrias denominaes existentes, como substncia amarela, compostos hmicos, substncias hmicas totais, cidos hmicos, compostos fenlicos, e "gilvin" devem-se, talvez, grande complexidade das substncias componentes da matria orgnica dissolvida, ao insuficiente conhecimento sobre elas e ao incompleto entrosamento entre os diversos ramos da pesquisa que se dedicam ao estudo destas substncias (Mobley, 1994; Esteves, 1998). A matria orgnica dissolvida (MOD) no volume dgua constitui-se de um conjunto de substncias provenientes da excreo, secreo e decomposio de organismos terrestres (vegetao da bacia de captao, por exemplo) e aquticos (fitoplncton, macrfitas aquticas, zooplncton e a comunidade bentnica, por exemplo). Inclui principalmente protenas, aminocidos, cidos graxos, resinas e compostos genericamente conhecidos como compostos hmicos, em concentraes que dependem da origem, das condies fsicas do meio aqutico, da bacia de drenagem e dos organismos decompositores conforme explica Wetzel (1975). A MOD possui colorao marrom-amarelada devido aos compostos hmicos e aos ons de ferro (Fe) e mangans (Mn) presentes na sua constituio (Wetzel, 1975). Por isso, em concentraes suficientes a matria orgnica dissolvida pode conferir a cor marrom amarelado gua (Mobley, 1994). A transformao do fitoplncton em matria orgnica dissolvida uma consequncia da fotolise, hidrolise e da decomposio bacteriana das estruturas celulares fitoplanctnicas. Numa escala de tempo de dias a semanas a matria orgnica quimicamente

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transformada em dixido de carbono, nitrognio inorgnico, sulfato e fsforo de acordo com Bukata et al. (1995 apud ALCNTARA, 2006). A cor da gua pura pode ser alterada com a introduo de substncias que aumentam o coeficiente de absoro dela nas regies espectrais diversas daquela de absoro da gua pura. Neste sentido, a matria orgnica dissolvida caracteriza-se por aumentar o coeficiente de absoro do meio aqutico, principalmente na regio do azul, que em termos de fotossntese, um dos comprimentos de onda mais importantes (Mobley, 1994; Esteves, 1998; Novo, 2001). Alm disso, a sua absoro inversamente proporcional ao comprimento de onda da radiao eletromagntica entre 400 nm e 700 nm e desprezvel a partir de 600 nm conforme Bricaud & Sathyendranath (1981, apud BRAGA, 1998) - Figura 2.5. Em relao aos efeitos da elevao da concentrao de matria orgnica dissolvida, sabe-se esta gera um aumento exponencial do coeficiente de absoro em direo aos comprimentos de onda mais longos. Tendo em vista que h um provvel aumento do coeficiente de retroespalhamento em direo aos comprimentos de onda mais longos, com o aumento da concentrao de MOD na gua, a reflectncia da regio do azul diminui at um ponto em que os picos de refletncia passam a ocorrer no verde e vermelho, o que d gua uma cor amarelada (Novo, 2001).

Figura 2. 5 - Absoro da matria orgnica dissolvida. Fonte: Adaptado por Alcntara (2006) de Kirk (1996). De acordo com Novo (2001) quando a concentrao de substncias orgnicas dissolvidas muito grande, como no caso do Rio Negro, por exemplo, a absoro suplanta o espalhamento e praticamente no h energia retroespalhada pelo volume dgua, que adquire a aparncia negra quando em grande volume.

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A Figura 2.6 demonstra os resultados do experimento realizado por Mantovani e Novo (1996), no qual foi possvel verificar uma diminuio da reflectncia principalmente do azul para o vermelho com o aumento da concentrao. Na faixa espectral situada entre 400 e 570 nm (azul e verde) as concentraes de substncias hmicas promoveram um diminuio de aproximadamente 40 a 50% da reflectncia da gua. J entre 670 e 900 nm (vermelho e infravermelho) ocorreu um aumento proporcional de amplitude da reflectncia em toda esta faixa, que pode estar ligado aos colides presentes na MOD, pois estes contribuem significativamente para com o espalhamento da radiao eletromagntica (Mobley, 1994). Enquanto na faixa do visvel o efeito da absoro encobre o espalhamento, no infravermelho com a absoro muito baixa o espalhamento se sobressai e h entre elas uma regio de inverso. Com o aumento da concentrao de matria orgnica dissolvida na gua, essa tender a uma cor primeiro amarelada, depois mais e mais vermelho escura devido aos baixos nveis de reflectncia (Novo, 2001).

Figura 2. 6 - Fator de reflectncia bidirecional para diferentes concentraes de MOD (mg/L) medidas em laboratrio. Fonte: Mantovani e Novo(1996).

2.2.4

Tcnicas para anlise de espectros

Uma das formas de identificao dos componentes opticamente ativos nos espectros de reflectncia atravs da observao direta das curvas espectrais. Todavia, quando h

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componentes com atuao simultnea, podem ocorrer obliteraes na reposta espectral resultante. Para auxiliar na resoluo deste problema algumas tcnicas foram desenvolvidas e facilitam a identificao dos componentes e aumentam a confiabilidade da interpretao. Dentre estas tcnicas se destaca a anlise derivativa, especialmente de primeira e segunda ordem, a remoo do contnuo e a razo de bandas.

2.2.4.1 Anlise derivativa

A derivao de primeira ordem ou ordem superior de espectros de reflectncia busca eliminar, a cada passo, o efeito de um dos componentes de uma amostra, considerando-se que o sinal referente a cada um deles pode ser representado por um polinmio de ordem diferente (Braga, 1998). Ao se tratar cada resposta espectral da gua como um polinmio de ordem N, em que N varia diferentemente para cada componente presente no corpo dgua, pode-se, pela diferenciao sucessiva da resposta espectral da coluna dgua remover sistematicamente os efeitos do componente de menor ordem (Barbosa, 2005). A tcnica da anlise derivativa tem sido utilizada em dados hiperespectrais para eliminar sinais de fundo, resolver feies espectrais sobrepostas e melhorar o contraste espectral, sendo que a concentrao de determinada substncia relacionada diretamente com a derivada de reflectncia em determinado comprimento de onda (Londe et al., 2005). Goodin et al. (1993) procederam com a derivao dos espectros da gua pura e encontraram curvas derivadas de 1 ordem e de 2 ordem iguais a zero, o que caracteriza os efeitos de reflectncia da gua pura como efeitos de ordem zero. Os espectros de gua contendo apenas sedimentos em suspenso apresentaram uma feio por volta de 720 nm nas curvas de 1 derivada e curvas de 2 derivada iguais a zero, o que caracteriza os efeitos dos sedimentos em suspenso como de 1 ordem. Por fim, espectros de gua com sedimentos em suspenso e clorofila apresentaram uma feio em 685 nm nas curvas de 2 derivada, caracterizando os efeitos causados pela clorofila como de 2 ordem. Em guas complexas aonde os sedimentos em suspenso se misturam com o fitoplncton, a reflectncia dos sedimentos inorgnicos em suspenso domina o comportamento espectral da gua e por isso em geral, se observa uma forte relao entre a reflectncia e a turbidez, porm fraca relao entre a reflectncia e a concentrao de Chl-a. Isso significa que, nestes casos, haver srias dificuldades em estimar a concentrao de Chl-a com o uso da reflectncia de forma direta, mesmo em comprimentos de onda especficos. Assim, uma das alternativas mais viveis para a estimativa da Chl-a a utilizao da anlise

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derivativa, pois o efeito dos sedimentos em suspenso pode ser eliminado com uma derivao de 2 ordem (Rudorff, 2006).

2.2.4.2 Clculo da profundidade das bandas de absoro

De acordo com Clark e Roush (1984), a remoo do contnuo uma funo matemtica usada para isolar uma feio de absoro especifica de particular interesse para a anlise espectral, atravs da remoo das feies especficas dos espectros. O contnuo representado por uma funo matemtica utilizada para remover o sinal causado por outras substncias presentes na amostra e para isolar bandas de absoro particulares dos espectros, acentuando feies (Breunig et al., 2007). Nesta tcnica, os pontos de mxima reflectncia de um espectro so ligados por uma reta, a qual define o continuo espectral para cada feio, sendo posteriormente dividido o espectro original pela curva do continuo, normalizando as bandas de absoro e colocando-as em uma referencia comum (Londe et al., 2005). A partir da remoo do contnuo pode ser calculada a profundidade de banda, rea e largura das bandas de absoro. Mutanga et al. (2005) aplicaram a remoo do contnuo feio de absoro mais definida na regio do visvel, entre 550 nm e 750 nm, visto que esta regio fortemente influenciada pela absoro por pigmentos tanto em estratos foliares quanto algais. Estes autores explicam que a remoo do contnuo normaliza os espectros de reflectncia, a fim de permitir a comparao de caractersticas em relao a uma base comum. O contnuo removido atravs da diviso do valor da reflectncia para cada comprimento de onda da feio de absoro pela linha contnua (reta) no comprimento de onda correspondente. O primeiro e ltimo valor espectral da feio so removidos por serem iguais a 1. As curvas produzidas tem valores entre 0 e 1.

2.2.4.3 Razo de bandas

A fim de desenvolver algoritmos para o sensoriamento remoto das concentraes de clorofila em guas mesotrficas e eutrficas Mittenzwey et al. (1992) mediram a reflectncia espectral de culturas de algas e guas continentais e obtiveram uma correlao de 0,98 entre a clorofila e a razo das bandas espectrais 705/670 nm para guas naturais com concentraes que variaram entre 5 e 350 g/L.

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Rundquist et al. (1996) explicam que o sensoriamento remoto uma importante tecnologia para a mensurao das concentraes de clorofila algal em guas superficiais. Atravs de experimentos realizados concluram que a razo infravermelho prximo (NIR)/ vermelho (RED) melhor para estimar a quantidade de pigmentos quando a concentrao de clorofila relativamente baixa, e a primeira derivada da reflectncia por volta de 690 nm mais indicada quando as concentraes so relativamente altas. Outra razo de banda indicada para a estimativa de clorofila entre os comprimentos de onda azul/verde, especificamente entre 490/510 nm, para minimizar a interferncia devida absoro pela matria orgnica dissolvida que absorve fortemente a luz azul. (OReilly et al., 1998, 2000 apud CANIZZARO e CARDER, 2006). Apesar da absoro pelo fitoplncton em 490 e 510 nm ser dominada pelos pigmentos acessrios, a concentrao de Chl-a pode ser derivada precisamente a partir destas razes de banda porque os pigmentos acessrios e as concentraes de Chl-a so altamente correlacionadas (Trees et al., 2000).

2.2.4.4 Spectral Angle Mapper (SAM)

De acordo com Kruse et al. (2003) Spectral Angle Mapper (SAM) um algoritmo de classificao supervisionada que determina a similaridade espectral entre dois espectros pelo clculo do ngulo entre os dois espectros, tratando estes como vetores no espao com dimenso equivalente ao nmero de bandas. A classificao feita a partir de uma referncia espectral com propriedades pticas previamente conhecidas e que pode ser um espectro coletado em laboratrio, campo ou extrado de imagens. A semelhana calculada em funo da proximidade geomtrica dos dois espectros com base no ngulo geomtrico do espectro em relao ao espectro de referncia, tratando-os como vetores. O tratamento computacional consiste em medir o arco-coseno dos espectros. Cada amostra pertencer classe cuja distncia em relao ao espectro de referncia for mnima. Se a distncia de uma determinada amostra exceder um certo limite (em todas as classes), a mesma no classificada (Londe, 2008). Os espectros dos diferentes materiais opticamente ativos podem ser ento armazenados em bancos de dados conhecidos como bibliotecas espectrais, a exemplo da biblioteca de minerais presente no software ENVI, e posteriormente utilizados com espectros de referncia. Para a gua esta situao dificultada, pois so poucos os trabalhos existentes, a exemplo do desenvolvido por Lobo (2009) que construiu e validou uma biblioteca espectral de tipos de gua das reas alagveis da Amaznia. Uma alternativa para este fato utilizar

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como referncia espectros do prprio conjunto de dados. Neste caso a escolha pode ser tanto subjetiva com a seleo de alguns espectros do conjunto de dados, ou objetiva, com uso de algoritmos de agrupamentos para extrair a informao do conjunto de dados.

2.3

Limnologia

De acordo com Esteves (1998) a limnologia (Limn significa lago em grego), definida como o estudo ecolgico de todas as massas de gua continentais independentemente de suas origens, dimenses ou concentraes salinas. Em um conceito mais abrangente Tundisi (2005) explica que a limnologia uma cincia interdisciplinar que integra estudos biolgicos, qumicos, fsicos e geolgicos para a compreenso cientfica dos mecanismos de funcionamento das guas continentais (lagos, rios, represas, reas alagadas, pequenos tanques, guas temporrias e lagos salinos no interior dos continentes). O desenvolvimento cientfico da limnologia nos ltimos cem anos foi muito intenso e culminou na compreenso de que os sistemas continentais esto submetidos a permanentes impactos a partir das bacias hidrogrficas. Cada sistema nico em seu funcionamento e a resposta de cada ecossistema de gua doce aos diferentes impactos depende da morfometria da bacia hidrogrfica e dos lagos, do clima, dos usos da bacia hidrogrfica, do tempo de reteno e da histria de ocupao humana da bacia (Tundisi, 2005). A limnologia, cincia que est diretamente envolvida com a utilizao racional e com a conservao dos recursos hdricos tem papel central no mundo contemporneo. Deste modo, pode-se citar as pesquisas sobre o metabolismo dos ecossistemas aquticos continentais, j que estas viabilizam a sua utilizao racional e tornam vivel o controle da qualidade da gua e recuperao de ecossistemas aquticos degradados (Esteves, 1998).

2.3.1

Transparncia da gua e as variveis limnolgicas

A transparncia da gua tem grande importncia para o sensoriamento remoto, pois esta se encontra diretamente relacionada aos componentes presentes na gua e que vo conferir a cor resultante. Alguns dos elementos que so atuantes na definio da cor da gua so os organismos fitoplanctnicos, o material particulado em suspenso e a matria orgnica dissolvida.

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De acordo com a CETESB (2009) a turbidez de uma amostra de gua o grau de atenuao de intensidade que um feixe de luz sofre ao atravess-la (e esta reduo se d por absoro e espalhamento). A atenuao ocorre devido presena de slidos em suspenso, tais como partculas inorgnicas (areia, silte, argila) e de detritos orgnicos (algas, bactrias, e em menor proporo os compostos dissolvidos). De acordo com Esteves (1998) a turbidez pode ser expressa em termos de coeficiente de disperso ou alguma unidade emprica, como a turbidez nefelomtrica ou NTU (Nephelometric Turbidity Units). O aumento da turbidez pode ser causado pela eroso das margens dos rios nas estaes chuvosas, o mau uso do solo com o impedimento da fixao da vegetao, pelo lanamento de esgotos sanitrios e diversos efluentes industriais, pelas atividades de minerao, entre outros. A alta turbidez reduz a fotossntese da vegetao enraizada submersa e algas. Esse desenvolvimento reduzido de plantas pode, por sua vez, suprimir a produtividade de peixes. Logo, a turbidez pode influenciar nas comunidades biolgicas aquticas. Alm disso, afeta adversamente os usos domstico, industrial e recreacional de uma gua (CETESB, 2009). Do ponto de vista ptico, a transparncia da gua pode ser considerada o oposto da turbidez. Sua avaliao de maneira mais simples feita atravs de um disco branco de 20 a 30 cm de dimetro, denominado disco de Secchi. A medida obtida ao mergulhar o disco branco no lado de sombra do barco, atravs de uma corda marcada. A profundidade de desaparecimento do disco de Secchi inversamente proporcional quantidade de compostos orgnicos e inorgnicos no caminho ptico. Em outras palavras, a profundidade de desaparecimento do disco de Secchi corresponde quela profundidade na qual a radiao de 400-740 nm (faixa visvel), refletida do disco no mais sensvel ao olho humano. A profundidade obtida (em metros) denominada transparncia do disco de Secchi (em ingls muito usada Secchi depht = Zsd) ou profundidade do disco de Secchi (Esteves, 1998). Poole e Atkins (1929, apud ESTEVES, 1998), explicam que embora a profundidade do disco de Secchi no fornea dados sobre a qualidade e principalmente sobre a quantidade de radiao, pode-se utilizar a profundidade do disco de Secchi para efeito do clculo indireto do coeficiente vertical de atenuao. A profundidade do disco de Secchi aproximadamente o inverso do coeficiente de atenuao vertical (k), sendo que k pode ser calculado pela Equao 2.2:

1,7 k = Zds Onde: 1,7 a constante calculada e Zds a profundidade do disco de Secchi.

(2.2)

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A profundidade do disco de Secchi, na ausncia de equipamentos adequados, pode ser tambm utilizada na avaliao da extenso da zona euftica. Para tanto, multiplica-se o valor da profundidade do disco de Secchi pelo fator 2,7, embora frequentemente muitos limnlogos brasileiros utilizem o valor 3. O valor obtido admitido como correspondente a 1% da radiao da superfcie (Esteves, 1998). Embora as variveis limnolgicas Condutividade Eltrica (CE) e potencial hidrognionico (pH) no sejam opticamente ativas, sua determinao de extrema importncia pois ajudam a caracterizar o ambiente aqutico e podem interferir nas demais variveis. De acordo com CETESB (2009), a condutividade eltrica uma expresso numrica da capacidade de uma gua conduzir a corrente eltrica. Depende das concentraes inicas e da temperatura e indica a quantidade de sais existentes na coluna dgua, e, portanto, representa uma medida indireta da concentrao de poluentes. medida que mais slidos dissolvidos so adicionados, a condutividade da gua aumenta (CETESB, 2009). J o pH influencia diversos equilbrios qumicos que ocorrem naturalmente ou em processos de tratamento de guas. Nos ecossistemas aquticos naturais possui efeitos diretos sobre a fisiologia de diversas espcies. Tambm o efeito indireto muito importante podendo, em determinadas condies, contribuir para a precipitao de elementos qumicos txicos como metais pesados ou exercer efeitos sobre as solubilidades de nutrientes. Os critrios de proteo vida aqutica fixam o pH entre 6 e 9 (Resoluo CONAMA 357/05 Brasil, 2010).

2.3.2 Medidas estatsticas

Algumas medidas estatsticas ajudam a interpretar dados das mais diversas ordens, dentre os quais os dados ambientais, com destaque para a correlao linear simples (r) e o teste de hipteses. Em relao correlao linear simples (r) Callegari-Jacques (2003) explica que esta uma medida de intensidade da associao existente entre duas variveis quantitativas, e sua frmula de clculo foi proposta por Karl Pearson em 1896, sendo chamado de coeficiente de correlao de Pearson. O coeficiente de correlao pode variar de -1 a +1. Valores negativos de r indicam uma correlao do tipo inversa, isto , quando x aumenta, y em mdia diminui (ou vice-versa). Valores positivos para r ocorrem quando a correlao direta, isto , x e y variam no mesmo sentido. O valor mximo de r, tanto positivo quanto negativo, obtido

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quando todos os pontos do diagrama esto numa linha reta inclinada. Por outro lado, quando no existe correlao os pontos se d