RTC452 casasolar1 final - SEEDS · que uma casa nos moldes da Ekó House facilita o desenvolvimento...

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RTC/PIRnaUSP nº 452 RELATÓRIO TÉCNICO-CIENTÍFICO Análise energética e ambiental da contribuição de uma casa-solar para o desenvolvimento sustentável com base na redução de emissões de Gases de Efeito Estufa Coordenação: Cláudia Terezinha de Andrade Oliveira Miguel Edgar Morales Udaeta Pesquisadora responsável: Fernanda Antônio Equipe: Cláudia Terezinha de Andrade Oliveira Fernanda Antônio Lucas Sabino Dias Luiz Claudio Ribeiro Galvão Miguel Edgar Morales Udaeta Pascoal Henrique da Costa Rigolin Paulo Hélio Kanayama Régis Davy Lindório de Faria Rodrigo Antonio Carneiro Yuri Endo Kokubun Revisão: Cristiane Garcia SÃO PAULO, ABRIL DE 2013

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RTC/PIRnaUSP nº 452

RELATÓRIO TÉCNICO-CIENTÍFICO

Análise energética e ambiental da contribuição de uma casa-solar para o desenvolvimento sustentável com base na redução de

emissões de Gases de Efeito Estufa

Coordenação: Cláudia Terezinha de Andrade Oliveira Miguel Edgar Morales Udaeta

Pesquisadora responsável: Fernanda Antônio

Equipe: Cláudia Terezinha de Andrade Oliveira Fernanda Antônio Lucas Sabino Dias Luiz Claudio Ribeiro Galvão Miguel Edgar Morales Udaeta Pascoal Henrique da Costa Rigolin Paulo Hélio Kanayama Régis Davy Lindório de Faria Rodrigo Antonio Carneiro Yuri Endo Kokubun

Revisão: Cristiane Garcia

SÃO PAULO, ABRIL DE 2013

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Sumário

RESUMO ..................................................................................................................... 3

ABSTRACT.................................................................................................................. 4

1. Introdução ................................................................................................................ 5

2. Unidades habitacionais para o desenvolvimento sustentável ................................... 8

2.1 Arquitetura e soluções no modelo casa-solar sustentável.............................. 8

2.1.1. Geometria, orientação solar e envoltória ................................................ 9

2.1.2. Materiais e meios nos sistemas construtivos .......................................... 9

2.1.3. Provisão de energia completa .............................................................. 10

2.1.4. Operação e uso de ocupação............................................................... 10

2.2 Protótipo de verificação: Ekó House ............................................................ 11

2.3 Indicadores de sustentabilidade orientados a uma habitação sustentável.... 18

3. Geração de energia elétrica no Brasil e o consumo pelo setor residencial ............. 19

4. Disponibilidade da fonte solar no Brasil.................................................................. 25

5. Emissões de gases de efeito estufa no Brasil ........................................................ 27

6. Análise da contribuição de uma casa-solar para a eficiência energética, a redução de

emissões de GEE e o desenvolvimento sustentável .................................................. 31

6.1 O contexto brasileiro e a aplicação do modelo de casa-solar sustentável...... 42

7. Conclusões ............................................................................................................ 43

8. Agradecimentos ..................................................................................................... 45

9. Referências Bibliográficas ...................................................................................... 46

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RESUMO

Este trabalho tem por objetivo determinar a contribuição de uma unidade habitacional orientada ao desenvolvimento sustentável para a mitigação do fenômeno do aquecimento global através de um modelo de habitação que se propõe a ser energeticamente eficiente e ambientalmente sustentável, permitindo conseguintemente a redução das emissões de gases de efeito estufa (GEE) provenientes da geração de energia no Brasil. Metodologicamente assume-se como referencial de verificação relativo ao sistema residencial sustentável um protótipo, intitulado de Ekó House, uma unidade habitacional projetada para operar de forma eficiente e capaz de gerar anualmente, através de painéis fotovoltaicos, toda a energia que consome. O estudo passa pela caracterização de uma unidade habitacional sustentável e pela contabilização unitária da economia de energia relativa à sua operação ao longo do tempo e no espaço geográfico do sistema elétrico interconectado do Brasil; a compreensão quantitativa e qualitativa da geração de energia no Sistema Interligado Nacional (SIN) brasileiro (fontes e emissões de GEE); e uma avaliação inter-relacionada do uso de energia e as emissões de GEE referentes ao setor residencial. Nesse sentido, para os resultados considera-se a substituição de residências unifamiliares convencionais por unidades nos moldes do protótipo de referência, dado que ele por definição adota estratégias e sistemas que garantem a eficiência e racionalidade em sua operação, incluindo a geração de sua energia através de fonte renovável. O protótipo de referência atende a padrões de conforto de países desenvolvidos e mostra-se mais eficiente quando se compara o seu consumo mensal ao consumo médio (em torno de 735 kWh/mês) ao de uma residência norte-americana (958 kWh/mês) ou espanhola (876 kWh/mês). Comparando as residências brasileiras, é possível observar que soluções adotadas no protótipo permitem aumentar as condições de conforto sem aumentar a demanda por energia. Com relação à redução de emissões de GEE, a geração de energia por fonte fotovoltaica permite uma redução de emissões de 276 gramas de CO2/kWh gerado quando comparado às emissões provenientes da geração de energia elétrica pelo SIN. Conclui-se que uma casa nos moldes da Ekó House facilita o desenvolvimento sustentável, garantindo o uso da energia de forma eficiente e racional ao longo do tempo, sem restringir as atividades ou a satisfação das necessidades dos habitantes; contribui para a mitigação do aquecimento global pela redução das emissões de GEE, já que utiliza geração local através de fonte renovável, se comparada a uma habitação convencional. Com isso, evidencia-se que sistemas e estratégias habitacionais sustentáveis com as do protótipo aqui modelado poderiam ser aplicados se aproveitando das facilidades do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo – MDL, viabilizando economicamente sua replicação em larga escala com os créditos de carbono gerados; e possibilitando um desenvolvimento do país de forma mais responsável do ponto de vista social e ambiental.

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ABSTRACT

This study aims to determine the contribution of a housing unit geared towards sustainable development to mitigate the global warming phenomenon, taking as a case study a dwelling that is proposed to be energy efficient and environmentally sustainable, allowing the reduction of emissions of greenhouse gases (GHG) emissions from power generation in Brazil. Methodologically, the prototype Eko House is taken as a reference to verify the sustainable housing system. This prototype is a housing unit designed to operate efficiently and which is capable of generating all the energy consumed in a year by photovoltaic panels. The study goes through the characterization of a sustainable housing unit and accounting unit of energy savings relative to their operation over time in geographical area of the interconnected electric system in Brazil; quantitative and qualitative understanding of power generation in the Brazilian National Interconnected System – SIN, considering sources and GHG emissions, and an assessment of inter-related energy use and GHG emissions for the residential sector. In order to obtain results, is considered a replacement for conventional single-family homes in for others in the mold of the prototype, since this prototype adopts strategies and systems that ensure the efficiency and rationality in its operation, including the generation of energy through renewable source; The reference prototype meets comfort standards of developed countries, an still it demonstrates to be more efficient when its average energy monthly consumption (around 735 kWh/month) is compared to a U.S. residence (958 kWh/month) or Spanish residence (876 kWh/month); Comparing the prototype to Brazilian homes, it is observed that the solutions adopted in the prototype help increase the comfort conditions without increasing energy demand; Regarding the reduction of GHG emissions, energy generation by renewable sources such as photovoltaic allows emissions reductions of 276 grams of CO2 per kWh generated when compared to emissions from electricity generation by SIN. It is concluded that a house along the lines of Eko House facilitates sustainable development, ensuring the use of energy efficiently and rationally over time without restricting the activities and meeting the needs of the inhabitants; contributes to the mitigation of global warming by reducing GHG emissions since it uses local generation through renewable sources, when compared to a conventional dwelling. Thus, it is evident that sustainable housing systems and strategies as applied in Eko House prototype could be applied taking advantage of the facilities of the Clean Development Mechanism – CDM, economically enabling its implementation on a large scale with the carbon credits generated, enabling the country to develop in a more responsible manner considering social and environmental aspects.

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1. Introdução

O tradicional modelo de desenvolvimento econômico considera o meio ambiente fonte inesgotável de recursos naturais e destino final, com capacidade ilimitada para receber os resíduos gerados pela atividade humana. Soma-se a isso a ineficiência e o desperdício no uso dos recursos naturais, notadamente da energia, que é um dos insumos essenciais para a provisão das condições básicas da vida humana. Desse modelo e da forma desequilibrada de exploração e uso desses recursos decorrem os atuais problemas ambientais.

Dentre os problemas ambientais associados ao setor de energia destaca-se a crescente emissão de gases associados ao efeito estufa (GEE) com significativos impactos no aquecimento global e nas mudanças climáticas. Inúmeras pesquisas evidenciam a influência antrópica no aquecimento global e nas mudanças climáticas. O IPCC (Intergovernmental Panel on Climate Changes), por meio de modelos de estudo do clima, mostra que a temperatura média anual do planeta pode aumentar de 2°C a 6°C para um cenário de referência (business-as-usual), considerando um horizonte de cem anos. De acordo com dados disponibilizados pelo The Scripps CO2 Program, os níveis de CO2 na atmosfera podem atingir marcas significativamente mais altas do que os registros, considerando-se um histórico de aproximadamente 400 mil anos, conforme indicado no gráfico da Figura 1.

Figura 1: Níveis de concentração de CO2 em partes por milhão para o passado e futuro.

Fonte: The Scripps CO2Program, 2012.

O Brasil é um país em desenvolvimento, e a tendência é de que a demanda por energia cresça junto com o país. A matriz de energia elétrica brasileira é considerada limpa.

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No Sistema Interligado Nacional (SIN), que possui aproximadamente 96% da capacidade de produção de eletricidade do país, 73% da energia elétrica é gerada a partir de hidrelétricas, e outros 9,5% são gerados em pequenas centrais hidrelétricas (PCHs), usinas movidas a biomassa e eólicas. No entanto, cada vez mais se tem dado atenção aos impactos ambientais e sociais causados pela implantação de novas usinas hidrelétricas. Áreas imensas são alagadas, ocasionando perda de biodiversidade, de áreas cultiváveis e necessidade de deslocamento de populações inteiras. Além disso, o equilíbrio ecológico e o microclima dessas áreas são alterados, e o processo de decomposição da vegetação das áreas alagadas gera gases tóxicos que contribuem para o efeito estufa. No SIN, 15,4% da energia elétrica é gerada por usinas térmicas convencionais, que também causam grandes impactos no entorno de onde estão implantadas por conta da liberação do calor rejeitado no processo de geração, emissões de GEE, entre outros.

Para atender à crescente demanda por eletricidade, conforme previsão do Plano Decenal de Expansão de Energia para 2020 (PDE), será necessário contar com a instalação de novas usinas hidrelétricas, termelétricas e com a nuclear Angra III, o que acarretará em significativos impactos ambientais, sociais e econômicos. Por outro lado, estudos demonstram que a adoção de medidas de eficiência energética pode contribuir para uma redução significativa nessa demanda, sendo de 6,8% a economia prevista em um cenário de referência, que é um cenário tendencial baseado em dados da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), e podendo chegar a 26% no cenário Revolução Energética, elaborado de acordo com projeções do Greenpeace e do Conselho Europeu de Energias Renováveis (Erec). A relevância de se adotar medidas de eficiência energética fica mais evidente quando se considera que o desenvolvimento econômico do país acompanha o aumento do poder aquisitivo por parte da população, atrelado a medidas do governo para minimizar os efeitos da crise econômica mundial. Um exemplo disso é a redução do IPI e de juros, que tem estimulado a aquisição de eletrodomésticos pela população e contribui para o aumento do consumo energético no setor residencial, atualmente responsável por 25% do consumo de energia elétrica no país conforme demonstra o gráfico da Figura 2.

Figura 2: Consumo de eletricidade na rede por classe no Brasil.

Fonte: EPE, 2011.

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Em edificações residenciais, a eficiência energética também pode ser alcançada por meio de soluções de projeto e construção e por meio de ações que reduzem o consumo energético no condicionamento térmico, aquecimento de água e iluminação artificial. Projetos que prevejam um adequado isolamento térmico, estratégias para ventilação natural, uma orientação solar adequada e um aproveitamento otimizado da iluminação natural, podem contribuir para a eficiência energética de edificações residenciais. Sistemas de aquecimento de água e geração distribuída de energia, por exemplo, através de painéis fotovoltaicos instalados na própria edificação, também podem ser de grande contribuição para a eficiência energética e no auxílio de suprimento da demanda de energia como alternativa à necessidade de implantação de novas usinas, o que acarreta em significativos impactos ao meio ambiente e aumento nas emissões de GEE.

Diante dessa percepção, o presente trabalho tem por objetivo determinar a contribuição que uma unidade habitacional orientada ao desenvolvimento sustentável pode representar para a mitigação do fenômeno do aquecimento global. Para tanto, assume-se como referencial de verificação ao sistema residencial sustentável um modelo de unidade habitacional projetado para operar de forma eficiente e capaz de gerar anualmente toda a energia que consome através de painéis fotovoltaicos.

Por se tratar de um modelo de habitação que atende a padrões de conforto de países desenvolvidos, o custo de muitas soluções é ainda elevado para os padrões do público brasileiro. O sistema fotovoltaico também não apresenta ainda expressiva penetração no mercado nacional em função de seu alto custo. Diante dessas particularidades, o estudo investiga também a possibilidade de que esse protótipo, ou sistemas presentes nele, possa ser aplicado como projeto de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), de modo a viabilizar economicamente uma implantação em larga escala através dos créditos de carbono gerados.

O MDL foi estabelecido pelo Protocolo de Quito. Trata-se de um mecanismo que possibilita que os países industrializados que precisam cumprir metas quantificadas de redução de emissões de gases de efeito estufa (Partes no Anexo-1 do Protocolo) possam adquirir Reduções Certificadas de Emissões (RCEs) geradas por projetos implementados em países em desenvolvimento (Partes não-Anexo-1 do Protocolo). Isso possibilita aos países industrializados o alcance de parte de suas metas de redução de GEE e contribui para o desenvolvimento sustentável dos países anfitriões. Os projetos de MDL são ações locais, mas que proporcionam um efeito global no sentido de contribuir para a mitigação das mudanças climáticas.

Para estimar a redução de emissões de GEE e outros benefícios do ponto de vista energético e ambiental considera-se a implantação de casas nos moldes do modelo adotado como referência, no que diz respeito à eficiência energética e geração de energia como forma de substituição de unidades habitacionais unifamiliares comuns e atendidas pelo SIN. A redução de emissões pode ser obtida através de dados de outros projetos de MDL para o Brasil, como de Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) propostas como alternativa ao uso da energia do SIN. Devido às estratégias para eficiência energética e pela geração de energia através de uma fonte limpa e renovável, a hipótese é de que a implantação de casas nesses moldes, em larga escala, possa permitir uma melhora no padrão de conforto das edificações residenciais e de forma relevante no desenvolvimento sustentável do país.

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2. Unidades habitacionais para o desenvolvimento sustentável

Segundo o Relatório de Brundtland, de 1987, o uso sustentável dos recursos naturais deve suprir as necessidades da geração presente sem afetar a possibilidade das gerações futuras de suprir as suas próprias necessidades. Uma residência que responda a essa definição e que se proponha a ser mais sustentável deve ser projetada visando atender às condições bioclimáticas locais, observando materiais disponíveis na região onde será construída, adotando estratégias que a tornem mais eficiente no uso dos recursos naturais e de energia e que visem minimizar seus impactos sobre o meio ambiente, nas fases de construção, operação e demolição.

Para este estudo, toma-se como referência de uma unidade habitacional sustentável um modelo de casa que tem por premissa otimizar o aproveitamento do sol, recurso renovável, tanto na geração da energia necessária para sua operação como também para prover condições de conforto aos moradores através de uma adequada iluminação natural e de estratégias para o conforto térmico. Gerando a sua própria energia, essa casa-solar sustentável evita o uso da energia disponibilizada pelo SIN, em que, devido a distância entre as usinas de geração e o consumidor, são necessários gastos de energia para a sua transmissão, além de parte dessa energia ser perdida ao longo dos sistemas de transmissão. Esse modelo adotado gera localmente a energia necessária para sua operação, utilizando uma fonte renovável, e tem a preocupação de atender a requisitos de conforto através de estratégias passivas, que tendem a reduzir o consumo de energia.

No modelo adotado, as estratégias de sustentabilidade estão direcionadas para a geração e o consumo de energia e para a gestão dos resíduos oriundos de uso e operação desse modelo. Com esse enfoque, são apontadas soluções de arquitetura, técnica e uso que visam contribuir para uma maior eficiência energética e ambiental por parte desse modelo.

2.1 Arquitetura e soluções no modelo casa-solar sustentável

A modelagem de habitação sustentável assumida toma o sol, fonte ilimitada de energia, como referência. Dessa maneira, a ideia é justamente aproveitar esse recurso de forma global na arquitetura proposta para o modelo, considerando desde os materiais utilizados, as formas e arranjos de aplicação, a ocupação funcional do espaço, até o uso e a operação da habitação por seus usuários. Além disso, a modelagem deve trazer soluções eficientes do ponto de vista energético e ambiental, considerando montagem, operação e desmontagem ou desconstrução.

Uma unidade habitacional orientada ao desenvolvimento sustentável deve ser projetada de modo a racionalizar o uso de materiais, energia e demais recursos naturais e também prever uma destinação adequada aos resíduos gerados devido a sua construção, operação e manutenção, bem como prever uma correta disposição final de seus componentes e materiais quando terminada a sua vida útil.

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2.1.1. Geometria, orientação solar e envoltória

Levando em conta o aproveitamento global do sol, que é um recurso disponível abundantemente no território brasileiro, é importante conceber o projeto arquitetônico considerando melhor geometria, orientação solar e dimensionamento de aberturas, de modo a permitir uma adequada iluminação natural e o uso da radiação solar para o aquecimento passivo nos períodos de frio, bem como dispositivos de sombreamento para evitar que o interior da habitação receba excessiva radiação nos períodos de calor. A partir dessas variáveis e propondo soluções apropriadas, é possível melhorar as condições de conforto para os moradores utilizando de forma racional e eficiente esse recurso. Uma geometria que tenha planos mais alongados na direção Sul-Norte tem uma exposição ao sol mais adequada ao longo do ano, pois nos meses de calor, quando o sol está mais alto, incide com menor intensidade em planos orientados para o Norte (considerando a localização no Hemisfério Sul), já nos meses de inverno, quando o sol está mais baixo, incide com maior intensidade nas fachadas orientadas a Norte, contribuindo para que a edificação tenha um maior ganho solar passivo, ao passo que os planos orientados a Leste e Oeste recebem sol com maior intensidade ao longo de todo o ano.

O adequado dimensionamento das aberturas é fundamental para o melhor aproveitamento da iluminação natural, e elementos de proteção se fazem essenciais para evitar uma radiação excessiva nessas áreas. O uso de diferentes camadas de elementos de sombreamento, tanto externos quanto internos, permitindo diferentes níveis de iluminação, provém uma gama maior de opções de adequação às necessidades e ao conforto dos usuários. Sobre as aberturas ainda é importante atentar para o desempenho quanto à estanqueidade e isolamento. O uso de esquadrias eficientes, com vidros duplos ou triplos, contribui para a redução de ganhos térmicos nos períodos de calor e perdas térmicas nos períodos frios.

Além de esquadrias estanques, os demais elementos de vedação, como piso, paredes e teto, tenham um bom desempenho térmico e que se valham de estratégias, como isolamento, massa térmica, e que suas aberturas favoreçam uma ventilação natural no espaço interior, de acordo com as necessidades específicas de cada bioclima.

2.1.2. Materiais e meios nos sistemas construtivos

Os materiais para uma casa sustentável devem atentar a diferentes aspectos. Na arquitetura vernácula geralmente são utilizados materiais autóctones como pedra, madeira e barro. O uso de materiais disponíveis na natureza, próximos ao local da construção e que não exigem processos industriais apresentam baixos níveis de energia incorporada e se reintegram facilmente à natureza, sem causar grandes impactos ao ambiente. São materiais de baixa tecnologia e muitas vezes não atendem a todos os requisitos técnicos de uma construção. Torna-se então necessário o uso de materiais industrializados, como cimento, aço, alumínio, vidro. Neste caso deve-se atentar para materiais e sistemas que possibilitem um uso mais racional de recursos. Sistemas pré-fabricados tendem a gerar menos desperdício e agilizar a etapa de construção. Antever a etapa de demolição ou desmontagem prevendo soluções que facilitem a separação de diferentes matérias também contribui para que estes possam ser devidamente descartados, reutilizados ou reciclados ao final da vida útil da edificação.

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É importante atentar para as condições da indústria local. No Brasil, por exemplo, a reciclagem do alumínio está bastante integrada à indústria, sendo assim este material pode ser reintegrado à cadeia produtiva, reduzindo a necessidade de extração de matéria-prima para produção. A madeira é um material bastante sustentável, pois fixa carbono, no entanto, a indústria nacional ainda apresenta problemas relativos à extração ilegal desse material e de falta de padrão de qualidade na comercialização do produto para a construção civil. É necessário incentivar o seu uso através do manejo de forma sustentável e também melhorando padrões de corte e controle de umidade, para que a madeira possa atender aos requisitos técnicos e ganhar mais espaço no mercado, sendo aplicada, por exemplo, no lugar do cimento, que emite gases causadores do efeito estufa durante seu processo de fabricação.

Os componentes de uma casa-solar sustentável devem ser pensados de modo a facilitar o processo de montagem, que pode substituir a tradicional construção, contribuindo para menores perdas de materiais e obras mais limpas e rápidas. Durante o processo de manutenção, podem-se prever os sistemas que permitam fácil acesso a instalações e a substituição de partes danificadas. A desmontagem pode substituir a demolição e a partir dela podem ser previstas maneiras de se separar os diferentes materiais e componentes, facilitando sua reutilização, reciclagem ou seu adequado descarte.

2.1.3. Provisão de energia completa

Para a geração de energia, uma casa-solar sustentável prioriza o uso de fontes renováveis. Considerando a disponibilidade destas no Brasil, o sol é um excelente recurso tanto para geração de energia elétrica, através de sistemas fotovoltaicos, quanto para aquecimento de água, através de coletores solares. No Brasil, o recurso é disponível em maior abrangência do que, por exemplo, a água, necessária para geração de energia através de usinas hidrelétricas. Além disso, esses sistemas podem ser instalados localmente, gerando energia de forma distribuída e reduzindo a demanda do SIN, que apresenta perdas devido à transmissão de energia e emissões de GEE. Caso haja necessidade de complementação da fonte solar, outras fontes alternativas e renováveis podem ser utilizadas, como a eólica para eletricidade e força mecânica e o biogás, gerado pela decomposição dos rejeitos orgânicos da própria casa.

Com relação à energia comercializada, essa casa pode ser capaz de gerar toda a energia necessária para sua operação, considerando o balanço energético anual. Caso gere energia excedente, esta pode ser vendida para a rede.

2.1.4. Operação e uso de ocupação

Para o modelo de casa-solar sustentável desenvolvido para este estudo, a sustentabilidade é enfocada do ponto de vista do consumo de energia e da geração de resíduos. Nesse contexto, o comportamento do usuário é essencial para garantir um uso mais racional dos recursos e uma adequada destinação dos resíduos gerados. Para isso, é importante que o espaço físico facilite ações por parte dos usuários para que estes possam viver de um modo mais eficiente e responsável.

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A previsão de espaços para armazenamento de resíduos contribui para que os moradores possam facilmente separar o lixo gerado pelas atividades domésticas, facilitando a reciclagem do lixo seco. Um projeto que integre em seu desenho uma composteira ou minhocário também contribui para que o lixo orgânico gerado possa ser tratado no próprio local, evitando seu descarte de forma irregular em aterros inapropriados. São utilizados sistemas de vaso seco, que não utiliza água e comporta os dejetos humanos, e um sistema de tratamento de águas residuais por zonas de raízes, que configuram soluções já disponíveis no mercado e alternativas à necessidade de conectar a casa a uma rede de coleta de esgoto e a estações de tratamento.

O modelo inclui equipamentos eficientes para uma redução no consumo de eletricidade, com etiquetagem de eficiência. Se um sistema de automação for integrado ao uso desses equipamentos e ao funcionamento geral da casa, ele pode ter um papel fundamental na contribuição para uma operação mais eficiente. Este sistema pode ser programado para orientar o usuário sobre níveis de consumo de energia elétrica e água, por exemplo. Além disso, esse sistema pode atuar integrado a elementos de controle de iluminação e temperatura, acionando ou desligando elementos de proteção solar ou o sistema de condicionamento e iluminação artificial segundo faixas de conforto pré-estabelecidas e presença de usuários ou não nos ambientes da casa.

Através de medidas como as mencionadas acima, o usuário é estimulado a ter mais atenção na operação de sua casa e nos seus hábitos, e encontra maior facilidade para pôr em prática ações que podem contribuir para a redução do consumo energético e da geração de resíduos sem que seu conforto seja comprometido. Dessa forma, o usuário vai sendo reeducado e aprendendo a operar a casa de maneira mais eficiente pela mudança de seus hábitos.

Com esses preceitos para essa modelagem de habitação orientada ao desenvolvimento sustentável, toma-se como estudo de caso ou modelo de verificação para este projeto o protótipo Ekó House, que foi desenvolvido visando atingir esses requisitos. Os dados a serem utilizados para comparação entre uma habitação orientada ao desenvolvimento sustentável e um modelo ordinário de habitação, necessários para os resultados do presente estudo, serão obtidos com base nesse protótipo de verificação e são dados provenientes de algumas medições e também de simulações computacionais realizadas para a Ekó House.

2.2 Protótipo de verificação: Ekó House

Como objeto de verificação dessa casa-solar sustentável, a fim de se obter dados que permitam comparar esse tipo de habitação a modelos ordinários, é adotado o protótipo Ekó House, que vai ao encontro dos objetivos desse modelo de residência sustentável adotado para este estudo. A Ekó House foi concebida visando o conceito de Residência Energia Zero (REZ) e projetada para utilizar o sol, recurso renovável, como principal fonte de energia. A REZ é definida como uma edificação que produz, por meio de fontes locais, a energia que consome, considerando um balanço anual. A REZ pode ser conectada à rede pública e integrar um sistema de geração distribuída de eletricidade. Preferencialmente, a energia provém de fontes renováveis e é produzida, por exemplo, por meio de painéis fotovoltaicos integrados à edificação, aquecedores de água por irradiação solar, instalações

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de pequena escala para produção de energia eólica, entre outros. O projeto da Ekó House utiliza o sol como principal fonte de energia, além de outros recursos renováveis, como a madeira, e adota estratégias para viabilizar sua construção, uso e operação de forma mais eficiente do ponto de vista energético e ambiental (TORCELLINI et al., 2006).

Esse protótipo representou o Brasil no evento Solar Decathlon Europe 2012 (SDE), realizado em Madri. Nesse evento o protótipo foi montado, operado e avaliado segundo requisitos específicos como eficiência energética, sustentabilidade, condições de conforto, arquitetura, engenharia e construção, inovação, entre outros.

Figura 3: Protótipo Ekó House durante a participação no evento Solar Decathlon Europe 2012.

Fonte: Própria, 2012.

O protótipo possui funções básicas de uma unidade habitacional convencional: cozinha, banheiro, dormitório, salas de estar e jantar, conforme ilustrado na Figura 4. O ambiente interno é composto de forma integrada, sendo o banheiro a única área compartimentada da casa. Externamente há uma área de varandas, que funciona de forma complementar à área social do protótipo. Somando as áreas de cobertura do núcleo isolado e das varandas são totalizados 120m² de área de projeção. Na cobertura do protótipo estão instalados 48 painéis fotovoltaicos para geração de energia e quatro coletores solares para aquecimento de água. O sistema fotovoltaico é capaz de suprir até três vezes a demanda da casa considerando o balanço energético anual. Trata-se de uma casa projetada para proporcionar ao morador uma vida confortável, não apenas a sua subsistência.

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Figura 4: Planta baixa do protótipo Ekó House.

Fonte: Projeto Ekó House, 2012

O protótipo Ekó House incorpora soluções de alta e baixa tecnologia. Algumas estratégias e materiais são já bastante conhecidos e aplicados em modelos vernáculos de residência no Brasil, como o uso de varandas, e materiais como o bambu e a madeira. Outras soluções e sistemas são de alta tecnologia e ainda pouco presentes nas casas brasileiras como, por exemplo, o sistema fotovoltaico para geração de energia e o sistema de automação residencial. A integração dessas soluções visa assegurar a operação do protótipo mais forma mais eficaz possível. Além disso, há uma preocupação em um consumo eficiente dos recursos naturais e com a destinação adequada dos resíduos gerados pela operação do protótipo e pelas atividades dos usuários.

Com relação à orientação solar, foi adotado um maior eixo no sentido leste/oeste, de modo que as maiores fachadas tivessem orientação norte e sul. Na fachada norte há uma grande área de aberturas, contribuindo para uma iluminação uniformemente distribuída em grande parte do protótipo. O uso de persianas externas e cortinas internas na fachada permite um controle preciso dos níveis de iluminação no interior do protótipo. Além disso, a projeção da cobertura na fachada norte funciona como um elemento que sombreia as aberturas no período do verão e permite a entrada do sol durante o inverno, auxiliando

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também no condicionamento térmico do protótipo. As aberturas localizadas nas fachadas leste e oeste estão voltadas para áreas de varandas, que funcionam como zonas de amortecimento térmico e possuem elementos de sombreamento, que também auxiliam no controle da entrada de luz e calor através dessas esquadrias. Na fachada sul, as aberturas são menores para evitar perdas térmicas e complementam a iluminação do espaço interno do protótipo. De acordo com simulações computacionais realizadas, a autonomia de luz do dia é de cerca de 60% e, mesmo com os dispositivos de sombreamento fechados, é possível atingir níveis adequados de iluminação para as atividades dos usuários apenas utilizando iluminação natural durante a maior parte do ano. Essas diferentes soluções e camadas que o protótipo recebe para se adequar às diferentes situações estão demonstradas na Figura 5.

Figura 5: Perspectiva explodida do protótipo Ekó House, com os diferentes sistemas utilizados. Fonte: Projeto Ekó House, 2012.

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O protótipo Ekó House possui altos níveis de isolamento térmico a fim de garantir níveis de conforto adequados com um baixo consumo energético. Como materiais de isolamento, são utilizadas lãs de vidro, presentes nos painéis de parede, piso e cobertura. O isolamento das fachadas é complementado com isolante de alto desempenho à base de sílica amorfa sintética, fibra de vidro de filamento contínuo e hidróxido de magnésio, produto de uso ainda não convencional em edificações residenciais e predominante empregado em instalações industriais. Além do isolamento, a disposição de aberturas em todas as fachadas assegura uma ventilação natural para o interior do protótipo, propiciando conforto e melhores condições ambiental e de qualidade do ar interno, sem gasto adicional de energia. As esquadrias (portas e janelas) apresentam bom isolamento devido ao uso de vidros com propriedades de baixa emissividade (low E), ao sistema de vidro duplo com câmara de gás inerte e aos acabamentos e detalhes construtivos que garantem a estanqueidade do conjunto. Tais características contribuem para o melhor desempenho do ponto de vista térmico e também acústico. Comparando os níveis de transmitância térmica dos materiais utilizados no protótipo Ekó House aos de materiais utilizados convencionalmente na construção civil brasileira, é possível perceber o quão ineficientes são os materiais aplicados em larga escala no país, o que geralmente acarreta em altos custos de manutenção de conforto na maior parte das edificações do país. O gráfico da Figura 6 mostra essa diferença nas propriedades dos diferentes materiais.

Figura 6: Valores de transmitância térmica para diferentes materiais de vedação largamente utilizados em unidades habitacionais brasileiras e no protótipo Ekó House.

Fonte: elaboração própria com base em projeto Ekó House 2012 e LAMBERTS, et. al., 1997.

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Como sistema passivo para resfriamento, foi adotado no protótipo Ekó House um sistema evaporativo, combinando ventilação mecânica e pulverização de água. Através de uma tubulação específica para esse sistema, é realizada uma tomada de ar a partir do exterior, abaixo do protótipo, onde o ar encontra-se sombreado e mais fresco. Esse ar é direcionado para o interior do protótipo com o auxílio de um ventilador de baixo consumo, e com um aspersor de água esse ar é umidificado antes de ser insuflado no interior. Já para aquecimento passivo, foram instalados radiadores que utilizam a água aquecida pelos coletores solares, auxiliando no aquecimento interno nos períodos frios com baixo consumo energético. Além desse sistema, o protótipo pode se beneficiar de ganho solar passivo para aquecer o interior, sem qualquer consumo de energia.

Para a operação da casa, foi priorizado o uso de eletrodomésticos e equipamentos de alta eficiência energética disponíveis no mercado nacional. Os eletrodomésticos possuem selo do PROCEL, que orienta e conscientiza o consumidor, indicando o nível de eficiência energética desses produtos. O uso de eletrodomésticos com o nível A do PROCEL garante maior eficiência energética na operação do protótipo e alerta para a importância e os benefícios de se investir em equipamentos mais eficientes. Já a iluminação artificial foi projetada de modo a complementar a iluminação natural no interior do protótipo. O sistema é todo em LED, que garante maior economia de energia, menos manutenção e maior vida. Conforme ilustra o gráfico da Figura 7, de acordo com simulações computacionais realizadas, o balanço energético anual da Ekó House demonstra que a energia gerada pelos painéis fotovoltaicos é suficiente para suprir a demanda de consumo ao longo do ano.

Figura 7: Resultado de simulação computacional do balanço energético anual para o protótipo Ekó House. Fonte: Projeto Ekó House, 2012

A Ekó House conta com sistema para captação de água da chuva, monitoramento do consumo de água pelo sistema de automação, tanques específicos para armazenamento de esgoto e sistemas de tratamento para águas cinza e negra, além de um vaso seco, que

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composta os dejetos humanos, transformando-os em adubo e evitando a necessidade de água. Estratégias como as mencionadas referentes ao uso e à destinação de água, se adotadas em residências brasileiras que não possuem acesso à rede de esgoto, podem contribuir significativamente em um país onde apenas 55,2% das cidades possuem sistemas de esgoto, dos quais apenas 28,5% são tratados (PNSB/IBGE, 2008).

A inovação mais relevante no protótipo, no contexto brasileiro, é a adoção de processo de projeto que inclui a prototipagem virtual, a produção digital de componentes padronizados, a pré-fabricação de elementos e a montagem, em vez da prática projetual e das técnicas construtivas tradicionais largamente utilizadas no país. Com isso, é possível o maior controle do uso de materiais, de forma mais racional e com menor desperdício e menor geração de resíduos. Devido ao sistema de montagem e desmontagem projetado para o protótipo, a operação e manutenção necessária ao longo do tempo de utilização são facilitadas, e ao final da vida útil os diferentes materiais podem ser separados, o que facilita sua reutilização, reciclagem ou adequada destinação final. O projeto Ekó House quebra paradigmas ao propor um modelo mais eficiente e racional de construção e novas soluções para manutenção, que contribuem para prolongar a vida útil e o gerenciamento de resíduos na produção da edificação.

Com relação aos resíduos domésticos, o protótipo Ekó House incorpora soluções como a integração ao desenho do mobiliário da cozinha de espaço específico para a separação do lixo seco e área destinada à compostagem do lixo orgânico integrada ao projeto paisagístico. Essas estratégias facilitam ao usuário uma destinação mais adequada dos resíduos. No Brasil, onde 50,8% dos resíduos ainda são destinados a aterros irregulares (PNSB/IBGE, 2008) e apenas 8% das cidades possuem coleta seletiva de lixo (CEMPRE, 2010), essas estratégias que podem partir da própria população apresentam grande potencial para contribuir significativamente na solução de um problema de saneamento que é crítico em todo o território nacional.

A escolha de materiais para o protótipo Ekó House foi realizada visando atender a requisitos técnicos e ambientais. O protótipo utiliza aproximadamente 5,4m³ de Cumaru, madeira maciça e nativa brasileira. Essa madeira foi escolhida por sua alta resistência estrutural e também a ataques biológicos, o que a torna bastante durável sem que seja necessário impregná-la com substâncias tóxicas para protegê-la contra ataques de fungos e cupins. Além disso, a madeira é um recurso renovável, desde que extraída de forma responsável do meio ambiente. Uma tonelada de madeira seca consome mais de 1,7t de CO2, incorpora 0,48t de Carbono e devolve 1,22t de oxigênio para a atmosfera (CBCS, 2009). É importante salientar ainda que a madeira utilizada na estrutura do protótipo Ekó House possui Documento de Origem Florestal – DOF, o que assegura a legitimidade da madeira. A madeira utilizada para o deck externo é a Teca termotratada (Thermoteak®). São utilizados aproximadamente 2,2m³ dessa madeira, que passa por um tratamento térmico que aumenta sua resistência contra ataques de fungos e, por ser livre de substâncias químicas, assim como a madeira da estrutura, pode ser facilmente reutilizada ou descartada como resíduo orgânico, livre de substâncias tóxicas.

A Ekó House ainda utiliza na estrutura da cobertura, telhas e estrutura das varandas perfis de alumínio, totalizando cerca de 2.000 kg. O material é leve e, se comparado com o aço, é mais resistente à corrosão atmosférica e às intempéries. O alumínio é um material

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que pode ser reciclado, o que facilita, ao final da vida útil da edificação, a sua reincorporação à cadeia produtiva. No Brasil o setor de reciclagem de alumínio é bem organizado e pungente. No ano de 2010 a participação do alumínio reciclado representou 36% do abastecimento da matriz doméstica do metal no Brasil, enquanto a média mundial é de 28% (ABAL, 2012).

Pelas estratégias adotadas e descritas acima, observa-se que o protótipo Ekó House responde às premissas do modelo de casa-solar sustentável adotado para este estudo. Com isso, dados de projeto e dados obtidos a partir de simulações para o protótipo serão aplicados como forma de verificação desse modelo de casa-solar sustentável, comparados a modelos ordinários de habitação presentes no Brasil e em alguns países desenvolvidos.

2.3 Indicadores de Sustentabilidade orientados a uma habitação sustentável

Para contextualizar o modelo de casa-solar sustentável, as estratégias e os sistemas adotados por esse modelo são relacionados a Indicadores de Sustentabilidade do IBGE, de modo a elucidar o potencial de contribuição do modelo nessa direção. Esses indicadores constituem um sistema de informações voltado ao acompanhamento da sustentabilidade do padrão de desenvolvimento do país, sendo instrumentos essenciais para guiar ações e subsidiar o acompanhamento e a avaliação do progresso alcançado rumo ao desenvolvimento sustentável.

O primeiro dos indicadores definidos pelo IBGE é referente a emissões de origem antrópica dos gases associados ao efeito estufa. Uma casa-solar sustentável apresenta potencial para contribuir com a redução de emissões de GEE devido ao uso do sol, recurso renovável, para a geração de energia, substituindo o uso da energia disponibilizada pelo SIN, que além das emissões de GEE pela geração em usinas apresenta perdas durante o processo de transmissão de energia.

As estratégias de eficiência energética também estão relacionadas a esse IDS, uma vez que a previsão de aumento da demanda energética, associada ao desenvolvimento do país, implicará em construção de novas usinas para geração de energia, o que acarretará em impactos ao meio ambiente, anteriormente mencionados, e aumento nas emissões de GEE.

Alguns indicadores definidos pelo IBGE estão relacionados às questões de saneamento básico e se referem especificamente a serviço de coleta de lixo doméstico, reciclagem, acesso a abastecimento de água e esgotamento sanitário e problemas de doenças relacionadas ao saneamento ambiental inadequado. Estratégias presentes no modelo adotado descritas anteriormente vão ao encontro desses indicadores pela preocupação com o manejo e adequada destinação dos resíduos gerados pelos moradores. O modelo se relaciona ainda a outros indicadores por suas estratégias para atingir maior eficiência energética e pela geração de energia utilizando o sol, que é um recurso renovável, são os de consumo de energia per capita, intensidade energética e participação de fontes renováveis da oferta de energia.

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3. Geração de energia elétrica no Brasil e o consumo pelo Setor Residencial

A Matriz Energética do Brasil sempre se distinguiu internacionalmente pela alta participação de fontes renováveis de energia, inicialmente somente fruto dos empreendimentos hidrelétricos na produção de eletricidade e mais tarde pela introdução do álcool de cana-de-açúcar como carburante nos automóveis. Isso proporcionou ao país uma matriz mais limpa em termos de poluição ambiental para benefício de toda sociedade brasileira (EPE, Matriz Energética Nacional 2030).

O Sistema Interligado Nacional (SIN) é o sistema brasileiro de produção e transmissão de energia elétrica do Brasil. É um sistema hidrotérmico de grande porte, com forte predominância de usinas hidrelétricas. Apenas 3,4% da capacidade de produção de eletricidade do país encontra-se fora do SIN, em pequenos sistemas isolados, localizados principalmente na região amazônica (ONS, 2012).

No SIN, as hidrelétricas correspondem a quase 75% da geração de energia para o sistema, essa participação garante que a matriz de energia elétrica do país possa ser considerada limpa. No entanto, tem-se acompanhado a pressão por parte da sociedade e de ONGs em função dos impactos ambientais e sociais gerados pela implantação de novas usinas, como no caso da Usina de Belo Monte. Além disso, a Matriz Energética Nacional, documento elaborado pela EPE, aponta para a expansão da geração térmica no país, a partir da conclusão da Nuclear de Angra III e de usinas térmicas a carvão, como uma alternativa ao esgotamento do potencial hidrelétrico aproveitável após 2020. Esse mesmo documento também chama a atenção para a necessidade de se corrigir ao longo do tempo problemas de deficiências no sistema que geram níveis de perdas inaceitáveis em alguns pontos do país. O gráfico da Figura 8 demonstra a capacidade instalada por fonte de energia para o SIN.

Figura 8: Capacidade instalada por fonte de geração no Sistema Interligado Nacional.

Fonte: MME/EPE, 2012.

O consumo de eletricidade apresenta perda de participação ao longo do decênio, passando de 16,3% para 15,9% do total de consumo de energéticos no país. Essa redução

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prevista é atribuída à implementação de ações de eficiência energética previstas, o que contribui para uma redução do total de consumo em 2020 equivalente a, aproximadamente, 34 TWh, sendo o setor industrial o principal contribuinte para a eletricidade conservada, seguido pelos setores residencial (MME, 2011). Essa redução no consumo de eletricidade e a diferença quando considerada a adoção de medidas de eficiência energética estão indicadas nos gráficos das Figuras 9 e 10.

Brasil: Consumo de Energia Elétrica e Eficiência Energética

0

200000

400000

600000

800000

1000000

GW

h

Consumo potencial(sem conservação)

481752 596200 764200

Consumo final(considerandoconservação)

479030 581160 730073

2011 2015 2020

Figura 9: Cenários para consumo de energia elétrica e eficiência energética no Brasil.

Fonte: EPE/MME, 2011.

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Brasil: Consume de Energia Elétrica e Eficiência Energética

0

5000

10000

15000

20000

25000

30000

35000

40000G

Wh

Energia conservada 2715 15042 34120

Energia conservadano Setor Residencial

500 2890 6790

2011 2015 2020

Figura 10: Previsão de energia conservada pela adoção de medidas de eficiência em todos os setores e no setor

residencial brasileiro. Fonte: EPE/MME, 2011.

As hidrelétricas continuarão sendo a principal fonte para a geração de energia elétrica no Brasil. No entanto, a maior parte, senão todo o recurso hídrico presente nas regiões sul e sudeste, já está sendo explorada, e a maior parte das reservas restantes encontram-se na Amazônia, longe dos centros industriais e populacionais do país (OECD, 2001). Essas condições apontam para a necessidade de exploração de fontes alternativas de energia, e a opção por fontes renováveis pode ser uma alternativa a uma tendência que aponta para a construção de novas usinas termelétricas e nucleares para atender a crescente demanda por eletricidade.

No Brasil, o setor residencial é responsável por cerca de 25% do total do consumo de eletricidade na rede do país, e a previsão é de que essa média se mantenha pelos próximos 10 anos, com um aumento estimado em 4,5% ao ano, passando de 112,690GWh no ano de 2011 para 166,888GWh em 2020 (MME/EPE, 2011).

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Figura 11: Consumo de eletricidade do Sistema Interligado Nacional por setor.

Fonte: EPE/MME, 2011.

Medidas de eficiência energética adotadas pelo setor residencial podem contribuir para uma economia no consumo que parte de 500GWh para o ano de 2011, podendo chegar a 6.790GWh no ano de 2020 (MME/EPE, 2011). Além da energia elétrica, a lenha e o gás liquefeito de petróleo são importantes fontes energéticas utilizadas nos domicílios brasileiros. No setor residencial, o uso da energia se destina basicamente a cocção de alimentos, aquecimento de água, iluminação, condicionamento ambiental, conservação de alimentos, lazer e serviços gerais. O gráfico a seguir ilustra a participação de cada fonte no setor residencial brasileiro, com dados dos anos de 2005 e 2010 e projeções dessa participação para 2020 e 2030, sendo que a eletricidade apresenta uma crescente participação nesse setor, conforme indicado no gráfico da Figura 12.

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Figura 12: Participação de diferentes fontes no consumo energético final do setor residencial brasileiro.

Fonte: MME/EPE, 2007.

No Brasil, 80% do consumo do GLP se verifica no setor residencial, sendo o uso do gás natural limitado a áreas urbanas onde há infraestrutura de canalização de gás, que no país são em pequeno número. Com isso, a demanda pelo uso do GLP deve seguir crescente, acompanhando o aumento demográfico e o número de domicílios. Já o consumo da lenha está bastante associado ao percentual de domicílios com fogão a lenha, ao consumo específico de lenha por domicílio e à estimativa para evolução do número de domicílios rurais, considerando o horizonte de estudo da Matriz Energética Nacional. Nesse contexto, observa-se uma previsão no aumento da participação do GLP até 2020, sendo que esta decai até 2030, e o consumo de lenha pelo setor residencial apresenta decréscimo na participação ao longo de todo o horizonte de estudo. Já a participação da eletricidade no consumo energético do setor residencial praticamente dobra entre 2005 e 2030. No gráfico da Figura 13 é possível observar o cenário de energia para o setor residencial ao longo das próximas décadas.

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Figura 13: Situação atual e cenário futuro para o consumo final energético pelo setor residencial brasileiro.

Fonte: MME/EPE, 2007.

Com relação ao consumo específico por eletrodomésticos e equipamentos nas residências brasileiras, o PROCEL realizou a Pesquisa de Posse de Equipamentos e Hábitos de Usos no país, ano-base 2005. Essa pesquisa está inserida em um projeto global de “Avaliação do Mercado de Eficiência Energética no Brasil” e tem como escopo de pesquisa o setor residencial. O gráfico da Figura 14 indica a participação por eletrodoméstico no consumo energético residencial brasileiro. Segundo dados do PROCEL, o chuveiro, a geladeira, o ar-condicionado e a iluminação artificial são responsáveis pela maior parcela do consumo de energia elétrica no setor residencial.

Figura 14: Participação dos eletrodomésticos no consumo de energia de residências brasileiras.

Fonte: PROCEL, 2007.

De acordo com o gráfico acima, é possível observar a significativa participação do chuveiro elétrico no consumo de energia das residências brasileiras. O uso de coletores solares para aquecimento de água é uma alternativa que pode reduzir consideravelmente o

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consumo de energia em um país como o Brasil, que possui condições e níveis favoráveis de irradiação solar ao longo do ano. Com relação ao consumo do ar-condicionado, estratégias aplicadas no protótipo Ekó House já descritas, como adequada orientação solar, isolamento térmico, otimização do aproveitamento de ventilação natural e sistemas de controle de radiação solar podem contribuir para que se obtenha conforto térmico sem o uso de condicionadores de ar ou reduzindo o consumo desses aparelhos. Da mesma forma, a energia empregada para iluminação artificial pode ser reduzida consideravelmente se o projeto arquitetônico previr dimensionamento e orientação adequados das aberturas para otimizar o aproveitamento da luz natural, e se for utilizado o sistema LED, que possui alta eficiência e vida útil, reduzindo custos de consumo de eletricidade e manutenção do sistema.

Figura 15: Distribuição da amostra de domicílios por faixa de consumo de energia.

Fonte: PROCEL, 2007.

A Pesquisa de Posse de Equipamentos e Hábitos de Usos indica ainda que a maior parte dos domicílios, cerca de dois terços do total, consome até 200kWh/mês, conforme indicado na Figura 15. Essa característica indica, segundo o documento, a existência de espaço para aumento no consumo de energia elétrica, que deve ser impulsionado pela incorporação de eletrodomésticos e aparelhos eletroeletrônicos no dia a dia dos brasileiros. É importante ainda atentar para a demanda reprimida que contribui para que a maior parte dos domicílios pesquisados se encontre na faixa de consumo mais baixa. Com a maior parte da população tendo acesso à energia elétrica, através de programas como o “Luz para Todos”, além do aumento do poder aquisitivo, esse quadro será alterado e o consumo médio dessa população deverá aumentar.

4. Disponibilidade da fonte solar no Brasil

Com relação à geração solar de energia, o Brasil já apresenta alguns avanços. A EPE elaborou uma nota técnica destinada à análise da inserção da geração solar na matriz elétrica brasileira. Nesse documento a EPE demonstra enorme potencial para a exploração da energia solar no país. A irradiação média anual varia entre 1.200 e 2.400kWh/m²/ano, valores que são significativamente superiores à maioria dos países europeus. Como ordem

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de grandeza do potencial energético solar pode-se estimar que o consumo do sistema interligado – SIN verificado em 2011 seria totalmente atendido com o recobrimento de uma área de 2.400 km², pouco mais que a metade da área do município de Salvador, BA, com painéis fotovoltaicos numa região com insolação média da ordem de 1.400 kWh/m²/ano (EPE, 2012). O mapa da Figura 16 indica as áreas com maior irradiação disponível ao longo do ano.

Figura 16: Irradiação solar do Brasil para o plano inclinado.

Fonte: EPE, 2012.

Figura 17: Tabela complementar à Figura 16.

Fonte: EPE, 2012.

Esse estudo da EPE aponta que, no caso da geração distribuída, por ter seu patamar de competitividade definido a partir das tarifas de distribuição de energia ao consumidor

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final, a comparação de valores já permite dizer que está próxima à condição de viabilidade econômica para alguns pontos da rede elétrica. O mesmo não ocorre com a geração centralizada, de maior porte, cujos preços não são competitivos com os de outras fontes renováveis no presente. É salientado que, para viabilizar uma redução mais significativa dos custos de produção dentro da cadeia fotovoltaica no país, através de ganhos de escala, é necessário estimular um maior desenvolvimento do mercado para a energia solar. Isto permitiria também ao país participar em alguma etapa da cadeia de uma indústria de alto valor agregado no âmbito mundial (EPE, 2012).

A Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL aprovou, em abril de 2012, uma resolução que estabelece regras para a microgeração e a minigeração de energia no país. A ideia é viabilizar a instalação, pelos consumidores, de painéis solares ou microturbinas eólicas em residências, comércios ou indústrias, e que a produção proveniente desses equipamentos gere créditos, que serão descontados das faturas de energia.

Esses estudos e medidas demonstram que, embora a geração solar ainda não seja considerada de forma expressiva pelo PDE 2020 ou pela Matriz Energética Nacional, o país já apresenta esforços no sentido de incentivar a participação da geração solar na matriz energética e que o país apresenta potencial para exploração de sistemas solares de geração de energia elétrica.

O presente trabalho parte justamente desse potencial identificado e dos avanços nessa direção para estudar se, do ponto de vista econômico, a inserção de painéis fotovoltaicos em larga escala poderia ser viabilizada, também, pela inserção desses sistemas solares como um projeto de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo no país. O intuito é contribuir para atender o aumento da demanda por energia elétrica através de uma fonte renovável, reduzindo ou evitando a necessidade de instalações de usinas térmicas a carvão ou gás natural por exemplo, o que pode apresentar contribuições significativas para reduzir emissões de Gases de Efeito Estufa relacionadas à geração de eletricidade.

O uso do sol como recurso na arquitetura é também um aspecto importante observável neste trabalho, pois, como demonstrado no protótipo de referência, uma adequada orientação solar e um projeto que permita o controle da radiação solar no interior da edificação pode contribuir significativamente na eficiência energética pelo aproveitamento apropriado da iluminação natural e também para o uso passivo do sol no condicionamento térmico da edificação.

5. Emissões de Gases de Efeito Estufa no Brasil

O Brasil é signatário da UNFCCC (United Nation Framework Convention on Climate Change), mas, por ser um país em desenvolvimento, não possuía metas de redução de emissões de GEE para o primeiro período de comprometimento estabelecido pelo Protocolo de Quioto, que se encerrou no final de 2012. Mesmo sem ter metas de redução, o país vem empenhando esforços para contribuir na mitigação do aquecimento global através da redução de suas emissões de GEE, anunciando na 15ª Conferência das Partes (COP-15), realizada em dezembro de 2009, uma meta voluntária para reduzir, em 2020, entre 36,1 e 38,9% das suas emissões totais projetadas para aquele ano.

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Neste contexto, destaca-se a importância dos planos decenais de energia como importantes ferramentas para projeção do cenário de mitigação de emissões antrópicas de GEE. Esses planos são elaborados tendo entre seus objetivos atingir uma meta de redução previamente fixada. Neles são considerados políticas e iniciativas de mitigação ou controle de emissões no setor de geração de energia elétrica, expansão hidrelétrica e de outras fontes renováveis de energia e estímulo à eficiência no consumo de energia elétrica.

Conforme já apontado no estudo do SIN, é previsto que o consumo de energia pelo Setor Residencial se mantenha com uma parcela importante do consumo total do país. Além disso, as previsões de aumento do consumo de energia pelo setor indicam que medidas de eficiência energética e redução das emissões de gases de efeito estufa provenientes da geração de energia para abastecer esse setor podem contribuir significativamente com o cenário nacional. O gráfico da Figura 17 ilustra a estimativa de aumento de emissões de GEE por diversos setores do país.

Figura 17: Cenário de evolução de emissões de GEE do setor energético brasileiro.

Fonte: MME/EPE, 2011.

Há uma estimativa de que as emissões por unidade de energia consumida cresçam no início do período de estudo em função dos fatores inerciais que condicionam o comportamento econômico e da demanda de energia, e passem a apresentar uma tendência declinante, conforme indicado no gráfico da Figura 18. Essa tendência é atribuída principalmente pelo aumento da participação de fontes renováveis, de modo que o Brasil segue com uma matriz energética ainda mais limpa que a atual, e com índice de emissões de CO2 bastante inferior à média mundial (MME/EPE, 2007).

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Figura 18: Evolução das Emissões de CO2 (em t CO2/tep) com redução ao longo do tempo atribuída a maior

participação de fontes renováveis no setor energético brasileiro. Fonte: MME/EPE, 2007.

Além da maior penetração de fontes renováveis de energia, são consideradas também para essas estimativas de emissões medidas de consumo eficiente de energia. Essas premissas refletem políticas e medidas já definidas pelo governo e outras ações complementares, como, por exemplo, o PROINFA, os programas de conservação (PROCEL e CONPET), o Programa Brasileiro de Etiquetagem, a Lei de Eficiência Energética, entre outros.

No Brasil, dados referentes a emissões de GEE pelas diferentes plantas de geração de energia ainda são limitados ou insuficientes. No entanto, considerando as emissões provenientes pela geração de energia no SIN, são disponibilizados dados de emissões de GEE pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e também em projetos de MDL aprovados no país.

Observando as emissões de GEE pelo SIN dos últimos seis anos, nota-se que no ano de 2010, no período entre os meses de agosto e novembro, as emissões atingiram níveis bastante superiores aos dos demais meses do ano. O aumento nas emissões ocorreram em parte pela necessidade de aumentar a geração de energia por termelétricas devido aos baixos níveis nos reservatórios das hidrelétricas brasileiras (BEN, 2012). Esse fato evidencia a importância de que o país invista em fontes alternativas e renováveis de energia para a redução das emissões dos gases causadores do efeito estufa, pois com o aumento da demanda apontado pelo PDE 2020, e com a saturação do potencial hidrelétrico do país, a tendência é a implantação de novas usinas termelétricas para suprir essa crescente demanda.

O presente estudo se baseia em fatores de emissões calculados para projetos de MDL aprovados pela UNFCCC para serem implantados no território nacional. No projeto Garganta da Jararaca Small Hydroelectric Power Plant, o valor obtido a partir de monitoramentos do sistema foi de 0,3273 tCO2/MWh para o Fator de Emissões do SIN, para o ano de 2008. No projeto Malagone SHP CDM, o valor obtido para o Fator de Emissões da rede nacional de energia elétrica é de 0.3111 tCO2/MWh, que encontra-se próximo ao do

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projeto da PCH Garganta da Jararaca. Para o presente trabalho, será adotado como Fator de Emissões um valor médio dos valores calculados para esses projetos já aprivados pela UNFCCC. O valor corresponde a 0.3192 tCO2/MWh.

Para o valor de emissões de GEE por sistema fotovoltaico, o presente estudo utiliza o relatório especial do IPCC de Fontes Renováveis de Energia e Mitigação das Mudanças Climáticas (Renewable Energy Sources and Climate Change Mitigation – Special Reporto f

the IPCC), segundo o qual as emissões médias de GEE pela geração solar fotovoltaica de energia são da ordem de 0,043 tCO2-eq/MWh, sendo que este pode oscilar em função da rápida evolução desses sistemas ou dos diferentes tipos de células fotovoltaicas aplicadas, conforme apresentado no gráfico da Figura 19. Esses dados foram obtidos a partir de análises de ciclo de vidas de sistemas solares fotovoltaicos para geração de energia.

Figura 19: Estimativa de Emissões de GEE do Ciclo de Vida para diferentes categorias de tecnologias para

geração de energia. Fonte: IPCC, 2012.

As emissões atribuídas à geração solar fotovoltaica não são provenientes da geração de energia elétrica, mas sim da produção dos sistemas fotovoltaicos. Neste caso, o estudo assume duas possibilidades distintas, uma primeira em que se assume que a empresa fabricante do sistema fotovoltaico será responsável por compensar as emissões, considerando assim como zero as emissões pelo uso desse sistema; e uma segunda em que o consumidor final se responsabiliza em compensar as emissões atribuídas ao processo de produção desses componentes, e então se assume o valor médio indicado pelo IPCC para emissões de GEE por geração solar fotovoltaica.

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Associando os dados obtidos a partir dos projeto para a PCH aprovados como MDL no Brasil aos dados dispobinilizados no referido relatório do IPCC, é possível estimar a contribuição, para mitigação do aquecimento global, que medidas de eficiência energética como as adotadas no protótipo de referência e a geração de enrgia por fonte limpa e renovável podem representar quando aplicadas em larga escala, alcançando assim um dos objetivos deste estudo.

6. Análise da contribuição de uma casa-solar para a eficiência energética, a redução de emissões de GEE e o desenvolvimento sustentável

A partir dos dados referentes ao funcionamento do Sistema Interligado Nacional, das emissões de Gases de Efeito Estufa pelo mesmo, de emissões de sistemas fotovoltaicos e de um panorama do consumo de energia e emissões de GEE por parte do setor residencial brasileiro, é possível discutir e analisar a contribuição para o desenvolvimento sustentável de uma casa que se propõe a utilizar ao máximo os benefícios do sol como fonte de energia e como recurso natural para iluminação e condicionamento térmico, que apresenta estratégias para ser eficiente do ponto de vista energético e ambiental e propõe soluções para uma adequada destinação dos resíduos. Neste estudo, para a verificação do modelo de casa-solar sustentável é utilizado o protótipo Ekó House.

Os dados para o protótipo são acadêmicos, oriundos de simulações computacionais para estimar valores de geração e consumo de energia desse protótipo ao longo de um ano de operação. Essas simulações foram realizadas por equipe de pesquisadores do LabEEE e Labcon da UFSC. Para tanto foi definido um calendário de ocupação e um cronograma de operação residência, considerando quantas pessoas estariam no protótipo, a frequência de uso dos equipamentos, a necessidade de condicionamento térmico artificial e o uso de iluminação artificial.

Esse protótipo foi projetado visando atender a padrões de conforto de países desenvolvidos. As simulações realizadas foram feitas considerando a operação da casa em Madri, devido à sua participação no evento SDE 2012, portando considerando parâmetros exigidos pelo evento para a operação do protótipo. Entretanto, o consumo por parte dos usuários no que diz respeito a eletrodomésticos se mantém, o que pode variar é o consumo relativo à manutenção das condições de conforto, mas considerando que uma casa-solar sustentável deve estar adaptada de maneira ao bioclima do seu local de implantação, os sistemas de iluminação e condicionamento artificial tenderão sempre operar de forma econômica.

Com relação aos equipamentos, o protótipo utiliza um cooktop elétrico em vez do tradicional fogão a gás, forno elétrico, máquina de secar roupas, condicionador de ar e máquina de lavar louças, que são equipamentos ainda pouco presentes nos domicílios do país e que apresentam uma participação significante no consumo de energia da Ekó House. No entanto, devido ao desenvolvimento econômico brasileiro, aos incentivos fiscais para aquisição de eletrodomésticos e à emergência da Classe C, esses equipamentos devem estar cada vez mais presentes nos lares brasileiros, contribuindo para o incremento do consumo de energia pelo setor residencial.

Devido a esses aspectos, a verificação da eficiência energética do protótipo é feita não apenas comparando o seu consumo ao de uma unidade habitacional ordinária

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brasileira, mas também com o consumo de unidades de habitação de países desenvolvidos e com a própria projeção do aumento do consumo de energia pelo setor residencial brasileiro apontado pelo PDE 2020.

Outro aspecto a ser considerado é que, até o presente momento, os dados relativos a consumo para uma média mensal são dados obtidos a partir de simulações computacionais, pois ainda não foram realizadas medições in loco para obter dados reais de operação do protótipo.

Se por um lado o protótipo está equipado com fogão elétrico, forno elétrico e máquina de lavar louças, que aumentam o consumo de energia em sua operação quando comparado aos lares brasileiros, por outro lado não é utilizado chuveiro elétrico, apenas coletores solares para aquecimento de água, e a iluminação artificial é toda em LED. Além disso, foram realizados estudos para garantir o máximo aproveitamento da luz natural, e as estratégias bioclimáticas associadas ao isolamento térmico garantem condições de conforto com um consumo reduzido de energia por sistemas ativos de condicionamento térmico. Os gráficos abaixo demonstram a participação de cada equipamento no consumo de energia do protótipo de verificação.

Figura 20: Participação de equipamentos no consumo médio mensal do protótipo Ekó House. Dados obtidos a

partir de simulação computacional para o protótipo. Fonte: Projeto Ekó House, 2012.

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Figura 21: Consumo médio mensal para cada equipamento do protótipo Ekó House. Dados obtidos a partir de

simulações computacionais para o protótipo. Fonte: Projeto Ekó House, 2012.

Desconsiderando o uso do fogão e forno elétrico, máquina de lavar louças e secadora de roupas, o consumo de energia elétrica do protótipo apresentaria uma média mensal de 350kWh/mês, o que aproximaria mais o consumo do protótipo ao consumo da maior parcela dos domicílios brasileiros, que está definida entre 0 e 200kWh/mês.

Com relação ao condicionamento térmico do protótipo, os dados de simulação estão programados para que a casa se mantenha na faixa de 23 a 25 ºC durante todo o ano, o que atende às regras do evento, mas em uma situação cotidiana não se aplicaria, sendo que essa tolerância poderia ser mais flexível, reduzindo o consumo do ar-condicionado. Além disso, a operação do protótipo durante o evento ficou por dois dias utilizando somente os sistemas passivos, e as condições de conforto se mantiveram toleráveis durante esse período. Suprimindo também o uso do condicionador de ar e demais sistemas passivos, o consumo mensal do protótipo passaria a 268kWh.

O gráfico abaixo mostra as temperaturas registradas durante todo o período de exposição da casa, que foi de 14 a 30 de setembro de 2012. É importante observar que os períodos em que as temperaturas internas beiram os 30 ºC acontecem nos horários em que a casa estava aberta à visitação pública, períodos em que havia grande quantidade de pessoas no interior do protótipo, o que ocasionava aumento da temperatura interna. Fora do período de visitação as temperaturas se mantiveram a maior parte do tempo entre 22 e 25 °C, que é uma faixa considerada confortável, inclusive no período entre os dias 24 e 28 de setembro em que não estava permitido o uso de sistemas ativos de condicionamento. Isso indica que os métodos passivos de condicionamento mostraram-se efetivos no período em que a casa foi avaliada, o que evidencia que a necessidade de condicionamento artificial do ar é baixa, o que garante o conforto dos moradores a um consumo de energia baixo ou nulo.

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Figura 22: Dados a partir de monitoramento da temperatura interna do protótipo em Madri, durante o evento SDE

2012, entre os dias 18 e 28 de setembro de 2012. Fonte: SDE, 2012.

Considerando as limitações e particularidades expostas anteriormente referentes aos dados de consumo energético do protótipo e as características dos dados relativos a consumo energético no setor residencial brasileiro, tomados como referência para este estudo, é possível observar o potencial de uma casa-solar sustentável na contribuição para uma melhora na qualidade de vida e no padrão de conforto dos moradores sem necessariamente aumentar o consumo de energia.

Ao comparar o consumo médio mensal simulado para o protótipo com os dados de consumo médio mensal de residências de países desenvolvidos – como Estados Unidos, que consome em média 958kWh/mês (EIA, 2011) por unidade, e Espanha, onde o consumo médio mensal é de 876kWh (IDAE, 2011) –, percebemos que mesmo mantendo níveis de comodidade e conforto que atendem a padrões desses países, o protótipo mostra-se mais eficiente no consumo energético. Considerando que o padrão de conforto dos brasileiros chegue ao dos norte-americanos nos próximos 20 anos, aplicando estratégias de uma casa-solar sustentável, isso seria possível com um menor consumo energético.

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Consumo médio de energia elétrica para diferentes domicílios

0

200

400

600

800

1000

1200

kWh

/mês

Protótipo Ekó House

Estados Unidos

Espanha

Brasil (2007)

Brasil (2030)

Figura 23: Comparação entre o consumo médio mensal de unidades habitacionais de diferentes localidades e do

protótipo Ekó House. Fonte: elaboração própria com base em dados de Projeto Ekó House, 2012; EPE, 2011; EIA, 2009; IDEA, 2011.

As casas norte-americanas construídas a partir dos anos 2000 são, em média, 30% maiores que as casas construídas antes de 2000, no entanto o nível de consumo de energia se manteve igual ou até reduziu, mesmo com maior número de eletrodomésticos, ar-condicionado e maior área a ser condicionada. Essa economia no consumo de energia é atribuída a uma preocupação maior com o isolamento térmico das novas casas, incluindo aberturas com vidros duplos e melhor vedadas, aos novos equipamentos mais eficientes e à iluminação por lâmpadas fluorescentes ou LED (EIA, 2009). No Brasil ainda se investe muito pouco no isolamento térmico e outros sistemas passivos para melhorar o conforto térmico de edificações, o que aumenta a necessidade do consumo de energia para o condicionamento ambiental nos domicílios do país. Além disso, o melhor aproveitamento da iluminação natural e o uso de uma iluminação artificial mais eficiente também podem contribuir para uma redução no consumo de energia e melhores condições de conforto, a exemplo do que se passou nos Estados Unidos nas últimas décadas.

Fazendo uma comparação entre o protótipo de referência e os dados disponibilizados pelo PROCEL, referentes ao consumo de energia em residências, considerando apenas a substituição do chuveiro elétrico por aquecimento solar, a economia no consumo de energia poderia chegar a aproximadamente 20% do total.

Com relação à iluminação artificial, o uso de LED poderia reduzir consideravelmente o gasto de energia para esse fim. Segundo a pesquisa do PROCEL, no ano de 2005, 62,3% dos municípios possuíam ao menos uma lâmpada fluorescente em uso. Mesmo considerando que todos os domicílios possuíssem apenas lâmpadas fluorescentes, o consumo de energia para iluminação poderia ser reduzido em cinco vezes caso fosse utilizado somente LED. A economia devido a essas soluções está indicada nos gráficos da Figura 24.

36

37

Figura 24: Possibilidade de redução no consumo mensal de energia pelo uso de sistemas mais eficientes e

econômicos para aquecimento de água e iluminação artificial. Fonte: elaboração própria com base em dados de Projeto Ekó House, 2012; PROCEL, 2007.

Fazendo uma estimativa aproximada, tomando por base os dados da pesquisa do PROCEL apresentados na Figura 14, apenas a substituição do chuveiro elétrico por aquecimento solar e adotando o uso de LED para iluminação artificial poderia representar uma redução de cerca de 30% no consumo de energia elétrica, de modo que a eficiência energética aumenta sem prejuízo no conforto dos usuários e sem considerar mudanças em seus hábitos.

Com relação às emissões de GEE, tomando-se como exemplo de espaço geográfico a região Sudeste do país, que, de acordo com o Censo do IBGE de 2010, possui 25.197.305 domicílios, dos quais aproximadamente 80% são casas. Considerando que metade dos domicílios passaria a gerar a própria energia através de painéis fotovoltaicos em vez de utilizar a energia distribuída através do SIN, as emissões evitadas poderiam variar entre 273g/kWh e 320g/kWh de energia gerada. Essa diferença se dá considerando duas situações distintas, uma em que o consumidor final se responsabilizaria em compensar as emissões geradas pelo processo de fabricação do sistema fotovoltaico e outra em que a empresa fabricante assumiria essa responsabilidade. Se cada economia consome cerca de 200kWh/mês, a redução de emissões de GEE seria da ordem de 54,6kg a 64kg de CO2 ao mês por economia. Multiplicando esse valor por aproximadamente 10 milhões de unidades habitacionais, que seria equivalente a aproximadamente metade das residências unifamiliares da região Sudeste, o resultado seria de 546 a 640 tCO2 por mês.

38

(a)

(b)

(c)

39

(d)

Figura 25: Cenários para redução de emissões de GEE devido à adoção de medidas de eficiência energética e de geração solar fotovoltaica para parte do setor residencial da região Sudeste do Brasil. (a) Mapa de localização da região Sudeste. (b) Porcentagem de domicílios a adotar a geração fotovoltaica. (c) Fator de emissões para o SIN e para a geração solar fotovoltaica. (d) Emissões evitadas pela adoção de medidas de eficiência energética

e pelo uso da geração solar fotovoltaica de energia elétrica.

Sem considerar o uso de sistema fotovoltaico para geração de energia, mas considerando apenas a substituição de lâmpadas comuns por econômicas e a troca do chuveiro elétrico por coletores solares para o aquecimento de água, cerca de 60kWh/mês seriam economizados em cada domicílio. Com isso, as emissões evitadas devido à economia de energia ficariam entre 16,3 e 19,2kg e de CO2 /mês para cada residência. Se essa medida fosse adotada por 50% das unidades habitacionais unifamiliares da região Sudeste, as emissões evitadas a cada mês seriam entre 163 e 192 t de CO2 ao mês para a região tomada como exemplo de delimitação geográfica para implantação das soluções em questão.

Além das emissões reduzidas por medidas de eficiência energética e pela geração de energia para o consumo do protótipo, podem ser estimadas as emissões evitadas pela energia excedente gerada e que é devolvida à rede para suprir a demanda de outros usuários conectados. Dessa forma, outras residências conectadas à rede terão acesso à energia limpa e de fonte renovável. Para tanto, é necessário analisar o balanço energético anual da casa e verificar quanto de energia produzida seria disponibilizada para a rede. A tabela na Figura 26 mostra esses dados, onde se observa que a energia excedente produzida mensalmente pelo protótipo é de 801,3kWh.

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Mês

/ C

onsu

mo

por

Sist

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(kW

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kWh)

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(kW

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l (kW

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(kW

k)

Janeiro 59,81 461,55 39,92 127,6 127,6 61,24 48,77 114,81 1041,3 1264,79 223,49Fevereiro 54,02 461,55 36,05 115,3 115,3 40,48 52,58 82,57 957,85 1321,22 363,37Março 59,81 461,55 39,92 127,6 127,6 13,36 84,17 37,81 951,82 1994,19 1042,37Abril 54,81 461,55 38,63 123,5 123,5 7,55 79,64 27,24 916,42 1927,3 1010,88Maio 56,64 461,55 39,92 127,6 127,6 0 133,45 16,96 963,72 2121,56 1157,84Junho 54,81 461,55 38,63 123,5 123,5 0 178,46 1,39 981,84 2339,56 1357,72Julho 56,64 461,55 39,92 127,6 127,6 0 255,05 0 1068,36 2537,37 1469,01Agosto 56,64 461,55 39,92 127,6 127,6 0 236,83 0 1050,14 2275,52 1225,38Setembro 54,81 461,55 38,63 123,5 123,5 0 161,48 10,29 973,76 1656,78 683,02Outubro 59,81 461,55 39,92 127,6 127,6 1,75 114,31 29,47 962,01 1517,11 555,1Novembro 57,88 461,55 38,63 123,5 123,5 23,74 73,84 70,33 972,97 1305,26 332,29Dezembro 59,81 461,55 39,92 127,6 127,6 72,22 33,11 147,06 1068,87 1264,79 195,92Total ao Ano 685,49 5538,6 470,01 1502,5 1502,5 220,34 1451,69 537,93 11909,06 21525,45 9616,39Média Mensal 57,12417 461,55 39,1675 125,2083 125,2083 18,36167 120,9742 44,8275 992,4217 1793,788 801,3658 Figura 26: Contabilização do consumo e geração de energia anual pelo protótipo Ekó House, a partir de

simulação computacional para operação do protótipo e seus sistemas. Fonte: Projeto de Ekó House, 2012.

Com essa quantidade de energia excedente gerada, as emissões evitadas por unidade nos moldes da Ekó House estaria entre 218,7 e 256,4kg de CO2 ao mês. Essa energia excedente gerada por 10 milhões de unidades habitacionais poderia evitar emissões entre 2187 e 5264t CO2 ao mês na região Sudeste do país, trazendo benefícios para o meio ambiente e para a saúde e o bem-estar da população.

A tabela da Figura 26 indica a produção de energia para a localidade de Madri. Se a casa estivesse em São Paulo, fazendo uma comparação da radiação média diária entre uma e outra cidade, pode-se estimar que a geração de energia ficaria em torno de 1593,18 kWh/mês. O gráfico da Figura 27 mostra a diferença de radiação entre Madri e São Paulo, sendo que Madri apresenta menor radiação entre os meses de outubro e março e maior radiação nos demais meses do ano, enquanto São Paulo apresenta condições de radiação mais constantes ao longo do ano. Com protótipo de referência localizado em São Paulo, a produção de energia seria também suficiente para sua operação e continuaria sendo gerada energia excedente que poderia ser vendida à rede.

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Figura 27: Radiação média anual para as cidades de São Paulo e Madri.

Fonte: elaboração própria com base em dados de CRESESB, 2013; AEMET, 2013.

Sendo assim, uma unidade habitacional que invista em um sistema fotovoltaico para geração de energia, ao produzir energia excedente, pode obter retorno financeiro não apenas pela energia vendida para a rede, mas também pela obtenção de Créditos de Carbono Certificados devido às emissões de GEE evitadas pela geração limpa da energia a ser vendida para a rede.

6.1 O contexto brasileiro e a aplicação do modelo de casa-solar sustentável

Se o modelo de casa-solar sustentável fosse assumido no Brasil, poderia contribuir para que o país se desenvolvesse de forma mais responsável do ponto de vista social, econômico e ambiental. Como demonstrado através das projeções de consumo de energia pelo setor residencial para as próximas décadas, e também pela necessidade de novas usinas termelétricas para suprir essa demanda crescente, o uso de geração distribuída por sistemas fotovoltaicos apresenta vantagens pela redução de emissões de GEE e pela redução de perdas, como ocorre no SIN durante a transmissão de energia.

No território brasileiro também existem muitas comunidades vivendo isoladamente. Em locais que não são atendidos pelo SIN, uma casa poderia ter um sistema isolado de geração fotovoltaica, um sistema de baterias e um gerador a diesel como backup, reduzindo as emissões que ocorrem normalmente, já que nessas localidades geralmente o gerador a diesel é a única alternativa para gerar eletricidade. Poderiam ainda ser aproveitados outros recursos renováveis, como a energia eólica ou biogás, que podem complementar a geração de energia em locais remotos, reduzindo ainda mais a necessidade do diesel como energético.

Além disso, estimando que num horizonte de 20 anos os brasileiros terão atingido um padrão europeu de conforto, ou mais provavelmente norte-americano, tendo assumido o modelo de casa-solar sustentável, seria possível chegar ao padrão de países desenvolvidos sem chegar a seus níveis de consumo. Atingindo esses padrões de conforto de uma maneira mais eficiente e gerando a energia de forma distribuída por fonte limpa e renovável, o país poderia seguir se desenvolvendo e ao mesmo tempo evitar ou reduzir a necessidade

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de construção de novas usinas para geração de energia, evitando impactos ambientais e sociais de grande proporção.

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7. Conclusões

O presente estudo demonstra que uma unidade habitacional, se projetada de forma responsável, visando a eficiência no consumo de energia e recursos naturais, com uma preocupação em aperfeiçoar o uso desses e reduzir ao máximo a geração de resíduos, pode contribuir de maneira determinante para o desenvolvimento sustentável. Isso tanto pelo uso racional e eficiente dos recursos naturais em geral e através da mitigação do aquecimento global, em particular, pela redução de emissões dos gases causadores do efeito estufa. Essa afirmação evidencia-se em diversos aspectos do modelo de casa-solar analisado, seja nas estratégias de eficiência energética e no uso de fonte limpa e renovável para gerar sua energia; ou pelo aproveitamento integral de uma fonte renovável e sem custo, como é o sol.

A intensidade energética economizada expressa justamente a eficiência no consumo final da energia, que contribui também para a redução de emissão de GEE para a atmosfera. A participação de fontes renováveis de energia é importante, pois, no longo prazo, a dependência de fontes não renováveis pode ser considerada insustentável do ponto de vista econômico ou ambiental. O uso da energia solar não implica impactos socioambientais, ao contrário da instalação de usinas hidrelétricas ou termelétricas.

Considerando especificamente o potencial para redução de emissões de GEE desse projeto, pode-se afirmar que, do ponto de vista do MDL, um protótipo nos moldes de uma casa-solar, ou seus sistemas aplicados isoladamente, poderia apresentar adicionalidade, o que viabilizaria sua aplicação como MDL. Isso auxiliaria sua implantação em larga escala do ponto de vista econômico através dos créditos de carbono gerados pelas emissões reduzidas e evitadas conforme apresentado no item 6. No entanto, para comprovar a adicionalidade e verificar se esse projeto atenderia a todos os requisitos necessários para o MDL, são necessários estudos específicos e aprofundados na área.

A implantação em larga escala de casas nos moldes de uma casa-solar contribuiria, portanto, para o desenvolvimento sustentável através da redução de emissões de GEE, considerando que a energia disponibilizada pelo SIN poderia ser substituída pela geração fotovoltaica, ou o seu uso poderia ser reduzido pela substituição de equipamentos específicos ou pela adoção de outras medidas que garantam a eficiência energética na operação de cada unidade habitacional.

Além da contribuição por reduzir ou evitar emissões de GEE, o presente estudo conclui que uma unidade habitacional nos moldes da casa-solar aqui referenciada também contribui para o desenvolvimento sustentável, pois suas soluções vão ao encontro de indicadores estabelecidos pelo IBGE para verificar se o país está se desenvolvendo de uma maneira mais sustentável. No protótipo de referência, as propostas para coleta de água da chuva, tratamento de efluentes, o uso do sistema vaso seco, previsão de espaço para separação do lixo seco e compostagem do lixo orgânico compõem soluções que podem ter uma contribuição relevante na questão da destinação adequada dos resíduos e esgoto domésticos, solucionando algumas delas nas próprias unidades habitacionais, evitando ou reduzindo a necessidade de instalação de grandes redes e infraestrutura e a destinação inadequada de resíduos sólidos e de esgoto.

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O IBGE indica também que para um desenvolvimento sustentável deve-se atender às demandas energéticas com o aumento da eficiência energética e do uso de fontes renováveis, de modo a compatibilizar a oferta de energia com a proteção ambiental. A intensidade energética, um dos indicadores estabelecidos, expressa justamente a eficiência no consumo final da energia, e essa eficiência contribui também para a redução de emissão de GEE para a atmosfera. Já a participação de fontes renováveis de energia é importante, pois, no longo prazo, a dependência de fontes não renováveis pode ser considerada insustentável do ponto de vista econômico e/ou ambiental. O uso da energia solar não implica em impactos socioambientais, como acontece com instalações de usinas hidrelétricas ou queima de lenha e carvão vegetal para geração de eletricidade.

As medidas de eficiência energética apresentadas no protótipo de referência, desde as soluções adotadas no partido arquitetônico, passando pelas soluções técnicas e escolha de equipamentos mais eficientes também contribuem para que os usuários possam manter ou melhorar os níveis de conforto, sem necessariamente consumir mais energia. Com relação aos equipamentos é importante destacar que os domicílios brasileiros utilizam em maior quantidade fogões e fornos a GLP em vez de elétricos. Com uma possível redução da oferta de combustíveis derivados do petróleo e o consequente aumento do custo, é provável que os brasileiros passem a dar preferência a fornos e fogões elétricos, o que também pode contribuir na redução de emissões de GEE; e se a energia elétrica para alimentar esses equipamentos for proveniente de uma fonte limpa, essa redução será ainda mais significativa.

Estudos futuros poderiam ser desenvolvidos a fim de mensurar a contribuição de estratégias para o condicionamento passivo e iluminação natural na eficiência energética dessas edificações, o que levaria a uma contribuição também na redução das emissões de GEE. A aplicação de outras fontes alternativas e renováveis, como geração eólica distribuída ou mesmo o uso de biogás gerado a partir da compostagem de resíduos, também podem constituir um tema para futuras investigações. Da mesma forma, a contabilização das reduções de emissões de GEE pelo uso de materiais como a madeira pode ser tema para outro estudo direcionado à obtenção de créditos de carbono a partir do MDL.

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8. Agradecimentos

Às instituições que também facilitaram a realização do protótipo Ekó House, tais como: Centrais Elétricas Brasileiras S. A. – Eletrobras; Instituto de Eletrotécnica e Energia da Universidade de São Paulo – IEE/USP; Laboratório de Eficiência Energética em Edificações da Universidade Federal de Santa Catarina – LabEEE/UFSC; e equipe Team Brasil para o Solar Decathlon 2012.

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