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15 Poemas+ VOLUME III: ISABELA ESCHER HELENA FRENZEL ED. S É R I E

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15 Poemas+

VOLUME I I I : ISABEL A ESCHERHELENA FRENZEL ED.

S É R I E

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Série 15 Poemas+, Coletânea, Volume III: Isabela Escher, 1a. Edição, Helena Frenzel Ed., Dezembro 2013.

Este volume é parte integrante do Projeto Quintextos e não pode ser comercializado.

Copyright © 2013 Todos os direitos sobre os poemas neste volume estão reservados à autora: Isabela Escher, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

(tessitum.wordpress.com)

Isabela Escher declara-se autora original dos poemas e textos específicos aqui reproduzidos. Assim sendo, detém todos os direitos autorais sobre os mesmos e assume as responsabilidades por tal declaração, bem como gentilmente autorizou seu uso neste volume. Os textos foram mantidos exatamente como nos originais recebidos e não emitem ou representam, necessariamente, juízo ou opinião da editora.

Edição: Helena FrenzelAs imagens utilizadas neste volume fazem parte do arquivo pessoal da autora, são da

autoria de Pedro Souza e foram reproduzidas com gentil permissão.

Copyright © 2013 Todos os direitos sobre esta edição eletrônica estão reservados à editora: Helena Frenzel, St. Ingbert, Alemanha

([email protected])

Esta edição pode ser livremente distribuída sob uma Licença Creative Commons - Atribuição - SemDerivações - SemDerivados 2.5 Brasil (CC BY-NC-ND 2.5 BR), desde que na íntegra e com o devido crédito de autoria. Não é permitido de modo algum comercializá-la, alterá-la e/ou usá-la no todo ou em parte para gerar obras derivadas.

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CRÉDITOS

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Série

15 Poemas+

Coletânea

Volume III, 1a Edição

Textos de

Isabela Escher

Edição: Helena Frenzel

Dezembro de 2013

Esta publicação é parte do site Quintextos

(quintextos.blogspot.com)

Venda proibida

SOBRE O VOLUME

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CRÉDITOS (i)

SOBRE O VOLUME (ii)

TESSITUM (4)

MÁGOAS BRANCAS (5)

ROSA DE PEDRA (6)

SONETO DA ROSA (7)

CANÇÃO DE NINAR (8)

A MINHA PASÁRGADA (9)

PALIMPSESTO (10)

CEGUEIRA (11)

MORTE (12)

LÁGRIMA SUSPENSA (13)

PRESENÇA (14)

SENTENÇA (15)

NATAL (16)

O VETERANO (17)

A MÁSCARA DE MARGOT (18)

NOTA DA EDITORA (20)

SOBRE A AUTORA (27)

SUMÁRIO

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O teu olhar desfia fibra a fibra o meu coraçãoe tuas mãos brincam com a trama desfeita,deixando-me alegre, triste, plena, insatisfeita,sem, entretanto, me tirar, de controle, a ilusão.

E então pelo papel voa a minha mãobuscando o verso perfeito para cada instante, mas,no meio da estrofe, parando, e palavras riscando,tentando alcançar os pomos inebriantes da Inspiração.

Por que é tão difícil te cantar? Porque sei que, por maisque em teu poder esteja eu, ainda és homeme não deus.

E em cada palavra minha quero te ter inteiro,colocar em todo verso tuas virtudes e defeitos,que assim tu serás ainda mais só meu.

TESSITUM

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Essas contas pequenas e alvasque encontrei em meio à vidaenvolvem a mim mesmacomo uma roda dentada e inofensiva.

Essas contas mordem pungentes.Parecem desvanecidas,mas aguilhoam não só a minha almacomo também quem dela se aproxima.

Escondo-as de mim própria,e sempre as reencontro,eu as revivo na realidade e no sonho.

Hoje essas mágoas brancasestão na pulseira da mão que escreveentre mil outras contas encontradas e perdidas.

MÁGOAS BRANCAS

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Nesse estranho jardim cinza,de pedras, anjos e santos,entramos.Tu dormias imperturbável.Como a uma criança, te levávamospara a cama lentamente,temendo despertá-la.Aqueles inúmeros nomese todas aquelas saudadesque se prometiam eternasgravaram-se em mimdo mesmo modo como feriram fundoas rochas virgens.

Um véu bordado te cobre,e tu te perdes, livre e vazia,entre as flores.Estas notas, que sussurram no papele riscam o ar,são a dolorida composição do nosso caos.Tu és embalada na voz silentedas coisas ditas e não ditas.Apenas um breve palíndromomarca o teu leito de concreto.

ROSA DE PEDRA

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Com carinho, Amor, aceitaessa rosa de papel, tinta e brancura,essa rosa musical, de suave ternurae de tímida volúpia, que te oferto eu.

É uma rosa imortal, Amor, como a que me deste.Sentes cada pétala perfumar tua mão?Quero que o toque macio dessa dádiva de Orfeuafague intensamente o teu coração...

Meu Amigo, Meu Amor... deixemos todas as rosasabrirem suas rubras e puras corolasem nós no devido tempo.

E que nossas mãos juntas possamdedilhar cada corda dessa atemporal cítara,cujas canções hão de romper o próprio firmamento.

SONETO DA ROSA

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Meus olhos tropeçam nas palavras,e confundem-lhes os sentidosrepetidamente...Por favor, só mais um pouquinho...Mas a Musa sorri e me leva, como a uma criança,para a cama. E adormeço,sonhando com surreais Pasárgadas...

CANÇÃO DE NINAR

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Desejo um lugar, fora do espaço e do tempo,onde possa compor não só versoscomo a mim mesmasem a violação dos gritos intrusos.Um lugar só meu, no qual escute novamente o passoda menina que fui.Dela herdei os olhos, que tocam almassem pedir licença.Porém a boca de um império simples,à deriva no passado,se afogou em silêncio.

A MINHA PASÁRGADA

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Minha mão já verteu tanta tristeza,gravada no mesmo velho papiro...Não há acidez que eu desconheça,nem desamor que não me tenha sido íntimo.

Mas o Tempo possui maior destreza;e, de repente, todo aquele vocabulário malditose desfez na branca tinta puraque engoliu o antigo pergaminho.

De quando em vez, uma tempestade de verãoarrasta à praia palavra velhaque, no leito do mar, dormia;mas logo o oceano a recolhede volta para o olvido.

E tua poetisa, teu peito a acolhepara dormir contigo...

PALIMPSESTO

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Musa, por que se oferece aos pedaços a mim?Eu, que tanto tenho visto,e sentido até as coisas mais pequenas?Nesses versos ainda mergulhadosno sofrido sangue do parto,vejo-a mutilada.Minha alma, incansável,se rasga entre os cacosno anseio de encontrá-la...

CEGUEIRA

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A cortina filtra a luz ferinadesse Sol que muda almasem asfalto cru efervescente,barato e nu, dos subúrbios.

Pessoas, desconexas, vão e vêm.Centrífugas de si mesmas.Andam depressa até a próxima esquina.

Sobressaltam-se com a Lua repentina.Em suas camas implacáveis, se afogame seguem sem sonhos pelo dia.

MORTE

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A lágrima brilhante de pedrasuspensa por uma fina cobra luzidiaoscila no começo do meu colo,marcando, poética, o ritmo do amor.

Ela acompanha o meu corpo inteiro,tão envolvido, tão mais bonito,nessa dança natural, antiga e nova...

Os meus olhos ficam sempre abertosaté mesmo no momento do êxtase,que vai chegando com mais e mais furor...

E, após a dança, descanso sem pudornos braços do meu amado,tendo a cumplicidade do meu quarto.

LÁGRIMA SUSPENSA

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As lágrimas imprevistas,tristes, quentes e instintivas,ainda estão em mim.Elas são mais líricasdo que os versos que te escrevi.Arderam nas minhas pálpebrasno ligeiro desvio do meu olhar.Tua respiração dolorida e contidasussurrou que a tua almatambém as sentia queimar.

Nossos lábios estavam brancos de espuma,quando, depois do beijo salgado,te sopraram ventos de bruma...

Teias de amar estendisobre o vasto e impotente oceano.Nelas, o suave canto das sereiase todas as areias pelas quais caminhamos.Em velas azuis de sonhos em desalinho,nos amamos sem mapasem um audaz desafio.

PRESENÇA

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Quem é aquela que passa?É a juíza.De certo ela nunca chora,e jamais erra o Português.Ela desconhece o medo,e em tempo algum hesita.Ela não tem pai nem mãe.Jamais se desnuda, jamais se entrega.Não se enganem; ela atravessa a rua como uma mulher,mas é juíza.E sempre passa em linha reta.

SENTENÇA

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A árvore jaz enfeitada a um canto.As únicas estrelas pequeninasluzem elétricas e friasnas pontas do plástico pinheiro.

A ceia estende-se pela mesa;e, através do ar, se disseminauma dor silente,uma raiva crescente,que mal se sustenta sobre aquelafina teia de olhares corrosiva...

O fardo de Atlas era mais simples;o firmamento não pode pesar mais que essas agulhas incandescentes de gelo eterno.E o gigante elevava sobre si sua trágica glória,enquanto todos nós tombamos por dentrosob nossa implacável memória.

NATAL

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Quando ele saiu do carrocom sua impecável farda,no sorriso dela brilhavauma ignorância infantil.

Nunca despiu o uniforme.Esperava, em guarda,entre as palavras dos seus filhos,repentinos estilhaços de balas.Até nos beijos mais ternos de sua esposa,por vezes se escondiam terríveis granadas.Exibia um orgulho ferozde seu infalível instinto.

O funeral teve pompas de herói,mas sua família depositou sobre o esquifesomente um punhado de olhares murchos.

Recebidos os solenes pêsames,deixaram enfim o cemitério.Em casa, não mais encontraramparedes de silêncio.

Hoje não resta sequer um leitorpara a placa de letras douradasonde o nome do morto jaz escrito.

O VETERANO

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A real prostituta,nas ruas da Paris velha e escura, se insinuavaaos escolhidos por ela. Seu nome e sua alma se guardavamatrás da máscara de sedaobscura e bela.

Dentro de si, um frêmito sem títuloque se furtava até a ser descritoimperava na sequiosa escrava,que, sob o Sol, à França dominava.Sequer sem o saber, ela buscavamais do que a pequena mortepela qual todo o seu corpo ansiava.

Pelas vielas sujas de seu tempo,a misteriosa dama errante,em uma noite vulgar,entregou aquilo que sempre negaraa um andarilho que prendeu seu olhar.

Sem conhecer por que, sem ao menos se importar,em meio àquela pura adoração,deixou cair, esquecida, ao chãoa confortável máscara que a preservava.

A MÁSCARA DE MARGOT

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Como foi longa a noite que presenciou a minha versão do ato da rainha;quando os nós que eu atara tão firmes,pouco a pouco, se soltavam,à medida que o medo se desfazia...

Meus dedos, sem hesitação, despirama minha antiga e infame companheira.Minha alma estava toda nua,e agora era minha e sua.

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Poesia é um negativo do filme que espelha a alma, com multi-interpretação.

Por vezes parece mais fácil reconhecer poetas por seu comportamento artístico do que pela aplicação de um conjunto de critérios quaisquer, finito e limitador. E como Poesia combina com muitas vias mas não casa nada bem com limitações, escolho o caminho torto da prosa do verso livre, liberto de quaisquer rótulos ou grilhões.

Assim como a palavra “fotografia”, em sua raiz grega, significa “desenhar com luz”, Poesia, para mim, é algo muito parecido, uma forma especial de iluminar o que está obscurecido; ter da alma um negativo com multi-interpretação, aquele detalhe que a maioria não consegue ver, uma tentativa de prender aura e sentido entre dedos, pegar um momento com a mão moldando contrastes, prendendo-o ao papel para sempre na forma de imagens ou caracteres. E a Poesia, como a Arte, a meu ver, ganha sentido(s) na(s) experiência(s) de cada receptor, nas particulares visões de mundo, tornando improdutivo, maioria das vezes, o tentar explica-la. Poesia existe onde o verso funciona e este pouco, a muitos, vem a bastar.

E por falar em comportamento, o que dizer de uma jovem que, em seu aniversário de quinze anos, “em vez de dar uma bugiganga qualquer de lembrança”, resolve presentear seus convidados com um exemplar de seu primeiro livro, um livro de poemas de própria publicação?

NOTA DA EDITORA

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Isso foi o que Isabela Escher fez: procurou uma gráfica e pagou do próprio bolso uma pequena tiragem, e não o fez por exibição, mas para atender a um chamado autêntico literário que a perseguia desde a infância e cedo a fez perceber, em suas palavras, que:

“Escrever é transfigurar a realidade, buscar a imortalidade, libertar os próprios anseios e desejos (...) Em um mundo em que muitos acham que Arte é o mesmo que entretenimento, é necessário muita luta para propagar o verdadeiro sentido do Artístico. É preciso que todos possam entrar em contato com a Arte genuína, que induz à catarse e à reflexão.”

Esta parte de sua História encontrei em seu antigo blog: O livro está na mesa, quando topei com seus poemas pela primeira vez. Suas publicações seguem agora no Tessitum, seu novo blog, pois o ciclo de O livro, segundo ela, se fechou.

E com o poema Tessitum, Isabela abre tanto o seu novo blog quanto esta seleção particular, feita e organizada de próprio punho com peças que lhe são caras e especiais. O leitor atento por certo percebe nestes versos o fio que os tira do simples “tecido” das relações humanas para transformá-los num elo maior, com o divino, fio invisível que Michelângelo genialmente retratou em sua famosa Criação de Adão.

“Por que é tão difícil te cantar? Porque sei que, por maisque em teu poder esteja eu, ainda és homem e não deus”.

Daí a dar-se conta das contas de mágoas brancas e da dor do “até breve” em Rosa de Pedra, destino de todo mortal, mas que pode tardar a depender dos desejos, do tempo de cada Rosa e soneto desabrochar...

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“E que nossas mãos juntas possamdedilhar cada corda dessa atemporal cítara”.

E numa canção de ninar ser conduzido a Pasárgadas, campos de persas surreais, arados por Bandeira, joaquins, Manuel, gerador de poemas e outras belezas; ou a verter tristezas num concreto palimpsesto “que engoliu o antigo pergaminho”, na cegueira da morte, tirania do dia a dia sem tinta, sal e olhar. Ou numa lágrima suspensa “sobre o vasto e impotente oceano”, capaz de trazer à presença, sentença de quem “Jamais se desnuda, jamais se entrega (...) E sempre passa em linha reta” mas sempre está por lá: novato ou veterano, o amor, estranho amor. E passado mais um Natal, “nas pontas do plástico pinheiro”, conselho é mudar a máscara, vestida o ano inteiro, e que aparta da vida, de tudo o que é real. Assim sinto a Poesia: mostra-me como ‘poetas’ e ‘senti(di)rei’ quem és.

E para que tenhas uma idéia, caro leitor, da primeira impressão que a poesia de Isabela Escher me causou, reproduzo aqui uma ‘fotografia’ do nosso primeiro encontro, no simples desejo de que consigas ver o que nela enxerguei.

* * *

Postagem de O livro está na mesa (1)

sábado, 23 de abril de 2011

O maravilhoso cotidiano

O movimento surrealista surgiu na década de 1920, e introduziu o fantástico mundo onírico sobretudo na pintura. Os adeptos dessa

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vanguarda adoravam o “maravilhoso cotidiano”, que era a revelação de elementos comuns do dia a dia em coisas belíssimas e irreais na Arte.

Sei que minha Poesia está longe de ser surrealista, pois a loucura do onírico não está nela. Mas também amo a idéia do maravilhoso cotidiano em sentido amplo, ou seja, ver a Musa em cada coisa, em cada canto, naquilo que é mais simples e tem sua magia descoberta através da Arte.

Muitos estão cegos para a beleza do cotidiano. Uma vez, um violinista talentoso estava em frente a um shopping, tocando, e poucos eram os que paravam, mesmo por alguns momentos, e escutavam. Não quero condenar aqui os que correm, apenas não acho que na correria se deva ficar sem sentidos para o que há de bonito em volta.

Mas eu vou lhes dar um exemplo melhor: a feirinha de antiguidades da Praça XV, que acontece todo sábado de manhã.

O que um observador puramente técnico vê é um monte de coisas velhas, em bom estado ou não, necessárias ou supérfluas, sendo comercializadas por muitas pessoas. O que eu vi quando fui há algumas semanas lá foi a Poesia presente na História, em fotos antigas, missais e pratarias, entre outros, de gente que viveu numa realidade anterior e de onde saiu a nossa. Câmeras, algumas do tipo lambe-lambe, estavam lá também e fico imaginando o que fotografaram... Que versos e linhas em prosa aquelas antigas canetas escreveram? Que notícias, concretas ou abstratas, levaram? E como levaram — com ou sem subjetividade? E aqueles livros de capa desbotada, redigidos em português arcaico, que mundos carregam em suas páginas? Nunca saberemos ao certo, e desse mistério, surgem sonhos extraordinários...

Meus amigos, nessa feirinha, o maravilhoso cotidiano existe não só em sentido amplo, como em estrito. Afinal, todo esse universo esquecido volta à tona; é um sonho que retorna, enriquecido pela imaginação atual de muitos, à consciência. O surrealismo está lá...

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E por que há ainda aqueles que não percebem a beleza disso? Estão claramente enredados demais nos mecanismos de sua subsistência — em trabalhar sem prazer, em comer, dormir, administrar seus bens, manter uma boa reputação — para perceber qualquer aparição da Musa. Esses não vivem; sobrevivem. Esquecem-se dessa diferença, a mais básica e importante de todas, ao acordar (se é que em algum momento tiveram conhecimento dela) e se a lembram, o fazem apenas na hora de dormir, quando o dia já se foi com sua beleza... E fazem isso dia após dia, desperdiçando o maravilhoso cotidiano — em outras palavras, a própria vida.

Deixo aqui alguns versos meus, que retornaram ao meu espírito como todo aquele cosmo evocado pela feirinha voltou à minha memória, ainda que nunca o tenha vivido.

SOMBRA LIBERTINA

Ao longe, na rua desertauma sombra no chão se firmao Sol, o Céu e a Terrasorriem para a tal libertinaque dança no asfalto, sem preocupaçãoos movimentos são poesiaa mais pura do coraçãoe seu dono, que viu que o Solpara sua sombra sorriapôs em movimento novamentea querida sombra libertinae a Manhã suspirava, e consigo dizia:

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A libertinagem é o raiar de um novo dia.Deus abençoe essa sombra libertina!

Mas os homens que eram conservadores e não viam a beleza da vida(pois em suas vidas não havia amores) censuravam a dançarina.Achavam que a sombrasó por ter alegriaafrontava o universo róseoque alguém um dia construíraE o Sol, o Céu e a Terra com a Manhãconcordavam, que dizia:Deus abençoe essa sombra libertina!

E a sombra e o seu dononão pararam de dançarnos asfaltos das ruas, às doces melodias.E as Árvores, os Campos, o Verde concordavam com a Manhã, que dizia: A sociedade precisade mais sombras libertinas!

Isabela Escher.

Comentários para esta postagem:

Como escapar da armadilha do tanto que temos de fazer a cada dia? Fazendo o que se pode ou só o que se deve poderia ser um caminho, não existissem as formigas condenando as sombras libertinas, cigarras de

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coração. “Enquanto trabalhamos, tu cantas a vida! E quando o inverno chegar, não terás abrigo, muito menos comida. Quando não mais cantares, descobriremos talvez o alto valor de teu cantar, pois só se dá valor quando já não há...” Na vida, todos têm uma função: as formiguinhas que só, sós e sempre trabalham, e também aqueles que encontram tempo para observá-las.

Helena Frenzel

Helena, as sombras libertinas sempre vão existir. Não importa que as formigas e seus chefes nos marginalizem. Continuemos a cantar!

Isabela Escher

* * *

Sim, continuemos!

Helena Frenzel.

(1) olivroestanamesa.blogspot.de/2011/04/o-maravilhoso-cotidiano.html

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Isabela Escher tem 22 anos, estuda Direito na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e vive na capital fluminense. Escreve no blog Tessitum. Este ebook é seu mais recente trabalho, sua primeira publicação em parceria sob a forma de livro.

A vida do poeta se encontra em seus versos e é inútil qualquer descrição consciente.

Estes quinze poemas carregam inevitavelmente um pouco de mim, pois, nas palavras

de Mário Quintana: “(...) Minha vida está nos meus poemas, meus poemas são eu

mesmo, nunca escrevi uma vírgula que não fosse uma confissão”. Tampouco escrevi

nada que não fosse uma confissão. Entretanto, buscar, em sua obra, a alma daquele

que escreve é tarefa frequentemente frustrante. A Arte possui muitos sentidos; como

encontrar precisamente o significado que denuncia a confissão do artista? Portanto,

não se comprometam a desvendar a alma do escritor. É suficiente que o leiam.

Sempre procurem interpretações diferentes para o texto, mas que essa busca tenha

como propósito não o encontro daquele que escreve, e sim de nós mesmos. (Isabela

Escher)

SOBRE A AUTORA

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