SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de...

162
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ UNIVERSIDADE DO ESTADO DO AMAZONAS REDE AMAZÔNICA DE EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA POLO ACADÊMICO UFMT SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO EXPRESSOS POR PROFESSORES EGRESSOS DO PROGRAMA DE BOLSA DE INICIAÇÃO À DOCÊNCIA EM QUÍMICA DA UFMT MARCEL THIAGO DAMASCENO RIBEIRO BELÉMPA 2016

Transcript of SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de...

Page 1: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ

UNIVERSIDADE DO ESTADO DO AMAZONAS

REDE AMAZÔNICA DE EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA

POLO ACADÊMICO UFMT

SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO

EXPRESSOS POR PROFESSORES EGRESSOS DO PROGRAMA DE

BOLSA DE INICIAÇÃO À DOCÊNCIA EM QUÍMICA DA UFMT

MARCEL THIAGO DAMASCENO RIBEIRO

BELÉM–PA

2016

Page 2: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

MARCEL THIAGO DAMASCENO RIBEIRO

SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO

EXPRESSOS POR PROFESSORES EGRESSOS DO PROGRAMA DE

BOLSA DE INICIAÇÃO À DOCÊNCIA EM QUÍMICA DA UFMT

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação

em Ciências e Matemática, do Programa de Doutorado da Rede

Amazônica de Educação em Ciências e Matemática, Área de

Concentração Educação em Ciências, Linha de Pesquisa:

Formação de Professores, do Polo Acadêmico da Universidade

Federal do Mato Grosso, sob orientação da Prof.ª Dr.ª Terezinha

Valim Oliver Gonçalves (UFPA), como exigência para a

obtenção do título de Doutor em Educação em Ciências e

Matemática.

BELÉM–PA

2016

Page 3: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

Dados Internacionais de Catalogação na Fonte.

D155s Ribeiro, Marcel Thiago Damasceno.

Saberes Científicos e Pedagógicos de Conteúdo Expressos por Professores

Egressos do Programa de Bolsa de Iniciação à Docência em Química da UFMT / Marcel

Thiago Damasceno Ribeiro. - 2016

161f.: il. color; 30 cm.

Orientadora: Terezinha Valim Oliver Gonçalves.

Tese (doutorado) - Universidade Federal de Mato Grosso, Rede Amazônica de

Educação em Ciências e Matemática, Programa de Pós-Graduação em Ensino de

Ciências e Matemática, Cuiabá, 2016. Inclui bibliografia.

1. Pesquisa Narrativa. 2. Formação de Professores de Química.

3. Iniciação à Docência. 4. Saberes Docentes. I. Título.

Ficha catalográfica elaborada automaticamente de acordo com os dados fornecidos pelo (a) autor (a).

Permitida a reprodução parcial ou total, desde que citada à fonte.

Page 4: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ

UNIVERSIDADE DO ESTADO DO AMAZONAS

REDE AMAZÔNICA DE EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA

POLO ACADÊMICO UFMT

TESE DE DOUTORADO

SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO

EXPRESSOS POR PROFESSORES EGRESSOS DO PROGRAMA DE

BOLSA DE INICIAÇÃO À DOCÊNCIA EM QUÍMICA DA UFMT

Autor: Marcel Thiago Damasceno Ribeiro

Orientadora: Prof.ª Dra. Terezinha Valim Oliver Gonçalves

Este exemplar corresponde à redação final da tese a ser defendida por

Marcel Thiago Damasceno Ribeiro sob aprovação da Comissão

Julgadora.

Data: 13 de dezembro de 2016.

Banca Examinadora:

BELÉM–PA

2016

Page 5: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

À minha mãe Antônia Rosangela Damasceno Ribeiro, que

sempre viveu sua vida em função de seus filhos. Registro agora,

mais uma vez, minha gratidão pelo carinho e amor que sempre

me ofertou.

Page 6: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

É preciso que o formando, desde o princípio mesmo da sua

experiência formadora, assumindo-se como sujeito também da

produção do saber, se convença definitivamente de que ensinar

não é transferir conhecimento, mas criar possibilidades para

sua produção ou a sua construção.

Paulo Freire

Page 7: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

AGRADECIMENTOS

A Deus, pelo o dom da minha vida, por me presentear com pessoas especiais nesta

jornada, pelas oportunidades que me deu e pelos desafios que me lançam ao crescimento.

À Professora Doutora Terezinha Valim Oliver Gonçalves, pelo seu acolhimento

sensível e carinhoso, pelo respeito dispensado em minha travessia, e por sua mediação

científica no desenvolvimento de meu trabalho de doutoramento. A minha gratidão!

À minha mãe, Antônia Rosangela Damasceno Ribeiro e minhas irmãs Katiúscia

Paula D. Ribeiro e Mayara Mayra D. Ribeiro que, apesar de todas as dificuldades impostas

pela vida, sempre estivemos unidos.

Aos meus sobrinhos-filhos (Joseany, Victor Hugo e Maria Antônia) e minhas

filhinhas (Branquinha, Belinha e Charlotte) por deixarem meus dias mais alegres e suaves

nessa travessia do doutorado.

À minha querida avó, Lenir de Oliveira Ribeiro (in memoriam), pelas doces

lembranças da minha infância.

Ao meu pai, Joadirson de Oliveira Ribeiro que, apesar da ausência, sempre vibra e

se orgulha de minhas conquistas.

Ao meu grande amigo e companheiro, Claudiney Pereira de Souza, sempre presente

me auxiliando e ajudando nos momentos mais difíceis.

Ao Laboratório de Pesquisa e Ensino de Química – LabPEQ/UFMT, na pessoa da

Prof.ª Dra. Irene Cristina de Mello, agradeço pela amizade, acolhida e pela oportunidade de

desenvolvimento pessoal e profissional.

Aos professores do Departamento de Química da UFMT, pela amizade e partilha de

experiências profissionais.

Aos examinadores internos, Professora Doutora Elizabeth Antonia Leonel de

Moraes Martines – UNIR/REAMEC, e Professor Doutor Tadeu Oliver Gonçalves –

UFPA/REAMEC, e examinadores externos, Professora Doutora Andrela Garibaldi Loureiro

Parente– UFPA, Professora Doutora France Fraiha-Martins – UFPA por terem aceito o

convite e por enriquecerem este trabalho com suas brilhantes e certeiras contribuições.

Aos professores do Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e

Matemática da Rede Amazônica de Educação em Ciências e Matemática, que contribuíram

nas disciplinas para meu crescimento intelectual.

À FAPEMAT, pelo auxílio das bolsas trimestrais.

Page 8: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

Aos meus amigos de doutorado, Glauce Viana, Eliane, Kátia, Nídia, Anderson,

Eberson, Edilberto, Felício, Nério, Evanil, Sandra Neves, pessoas especiais que me apoiam,

acompanham e com quem compartilhei as conquistas e as preocupações desta caminhada.

Às professoras colaboradoras dessa pesquisa, Curie, Mayer, Franklin e Meitner,

pelos momentos de reflexão e (auto) formação proporcionados.

Agradeço, enfim, a todos que contribuíram para a construção desta tese e da minha

história. Muito obrigado!

Page 9: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

RESUMO

Este trabalho de doutorado se insere no âmbito das pesquisas que buscam aprofundar a

compreensão dos Saberes Docentes e Formação de Professores de Química e Iniciação à

Docência em Química para a Educação Básica. Nesse sentido, apresento o problema da

pesquisa: Como se configuram e se expressam saberes científicos e pedagógicos de conteúdos

químicos subjacentes à docência de professores egressos do Programa de Bolsa de Iniciação

à Docência em Química da UFMT, ao relatarem o ensino de Química que realizam na

Educação Básica? Assumo a Pesquisa Narrativa como método de pesquisa, pois os

pressupostos da pesquisa narrativa possibilitam ao pesquisador a sistematização das

experiências vividas pelos professores no contexto educacional e o estabelecimento de

relações entre os conhecimentos dos professores sobre o processo de produção de seus saberes

e de como trabalham com o saber produzido. Esta pesquisa tem como sujeitos quatro

pibidianos egressos do curso de Licenciatura em Química da UFMT, campus Cuiabá-MT, que

estão atuando como professores de Química na Educação Básica. Concernente ao problema

de pesquisa, optei pelos seguintes instrumentos investigativos: questionário, tendo em vista a

caracterização dos sujeitos; depoimentos dos sujeitos envolvidos na pesquisa sob a forma de

entrevista semiestruturada, registros em áudio do grupo focal realizado com os professores

egressos e análises de documentos (como PPC da Licenciatura em Química, campus Cuiabá,

da estrutura curricular de 1997/1 e 2010/1 e dos Subprojetos de Química do PIBID dos editais

de 2007 e 2011). Para analisar os textos de campo e produzir os textos de pesquisa, adotei a

Análise Textual Discursiva, que corresponde a uma metodologia de análise de dados e

informações de natureza qualitativa com o propósito de produzir novas compreensões sobre

as narrativas investigadas. Assumo a tese de que a base de saberes científicos e pedagógicos

de conteúdo necessários ao ensino de Química pode ser catalizada na formação inicial pela

participação em projetos de iniciação à docência no ambiente escolar desde o início do curso,

o que potencializa a produção de saberes sobre a docência e práticas pedagógicas

diferenciadas com vistas à educação para a cidadania. Dessa forma, pretendo, portanto, com

os resultados obtidos com a presente tese, que estes possam suscitar ideias para o

desenvolvimento de políticas públicas e curriculares para a formação de professores de

Química para a Educação Básica, pois os resultados evidenciam que os saberes científicos e

pedagógicos de conteúdo considerados como necessários à formação do professor são um

exemplo do esforço intelectual que o docente tem de fazer na compreensão de um corpo de

conhecimentos necessários à prática pedagógica. Entendo que esses conhecimentos têm de ser

abordados na formação inicial. Por isso, o rompimento com o modelo de formação que

prioriza a teoria em detrimento da prática não pode significar um currículo de

supervalorização da prática em detrimento a formação teórica, mas sim uma abordagem

dialética desses modelos na formação do profissional.

PALAVRAS-CHAVE: Pesquisa Narrativa - Formação de Professores de Química –

Iniciação à Docência - Saberes Docentes.

Page 10: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

ABSTRACT

This doctoral work is part of the research that seeks to deepen the understanding of Teaching

Knowledge and Teacher Training in Chemistry and Initiation to Teaching in Chemistry for

Basic Education. In this sense, I present the research problem: How are scientific knowledge

and pedagogical knowledge of chemical contents underlying the teaching of professors who

are graduates of the Bolsa de Iniciação da Educação em Química da UFMT Program, when

they relate the teaching of Chemistry that they carry out in the Basic education? I assume

Narrative Research as a research method because the presuppositions of narrative research

enable the researcher to systematize the experiences lived by the teachers in the educational

context and the establishment of relationships between the teachers' knowledge about the

production process of their knowledge and how they work With the knowledge produced.

This research has as subjects four pibidians graduates of the degree in Chemistry of the

UFMT, campus Cuiabá-MT, who are acting as teachers of Chemistry in Basic Education.

Concerning the research problem, I opted for the following investigative instruments:

questionnaire, in view of the characterization of the subjects; Interviews of the subjects

involved in the research in the form of a semi-structured interview, audio recordings of the

focal group performed with the egressed teachers and document analyzes (such as PPC of the

Chemistry Degree, Cuiabá campus, of the curriculum structure of 1997/1 and 2010/1 And of

the Chemical Subprojects of PIBID of the 2007 and 2011 calls for proposals). In order to

analyze the field texts and produce the research texts, I adopted Discursive Textual Analysis,

which corresponds to a methodology of data analysis and information of a qualitative nature

with the purpose of producing new understandings about the narratives investigated. I assume

that the base of scientific knowledge and pedagogical content necessary for the teaching of

Chemistry can be catalyzed in the initial formation by the participation in projects of initiation

to teaching in the school environment since the beginning of the course, which potentiates the

production of knowledge about Teaching and differentiated pedagogical practices with a view

to education for citizenship. Thus, I intend, therefore, with the results obtained with the

present thesis, that they may elicit ideas for the development of public and curricular policies

for the training of Chemistry teachers for Basic Education, since the results show that the

scientific and Pedagogical content considered necessary for teacher training are an example of

the intellectual effort that the teacher has to make in the understanding of a body of

knowledge necessary for pedagogical practice. I understand that such knowledge has to be

addressed in initial training. Therefore, the break with the training model that prioritizes

theory to the detriment of practice can not mean a curriculum of overvaluation of practice

over theoretical training, but rather a dialectical approach of these models in professional

training.

KEYWORDS: Narrative Research - Training of Teachers of Chemistry - Introduction to

Teaching - Teaching Knowledge.

Page 11: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 01 - Desenho estratégico/interacionista do Programa PIBID........................ 56

Figura 02 - O Reservatório de Saberes em Gauthier et al. ...................................... 70

Figura 03 - Saberes da Docência em Pimenta.......................................................... 73

Figura 04 - Base de Conhecimentos na Perspectiva de Shulman............................. 74

Figura 05 - Fios Condutores dos Saberes Docentes em Tardif................................ 84

Figura 06 - Tipologia dos Saberes Docentes............................................................ 92

Figura 07 - Focos de Interesse da Química............................................................... 107

Figura 08 - Aspectos do conhecimento químico...................................................... 108

Figura 09 - O tubo de raios catódicos simples, usado por J. J. Thomson................. 117

Figura 10 - Modelo atômico proposto por J. J. Thomson......................................... 118

Figura 11 - Experimento de Rutherford sobre espalhamento de partículas (α)........ 119

Figura 12 - Modelo Atômico proposto por Rutherford............................................ 120

Figura 13 - Transferência de energia para os elétrons, segundo Bohr...................... 122

Page 12: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Quantitativo de Egressos do Curso de Licenciatura em Química da

UFMT de 2009/1 a 2014/1.......................................................................

36

Tabela 2 - Distribuição da Carga Horária do Curso de Licenciatura em Química

2010/1......................................................................................................

53

Tabela 3 - Distribuição da Carga Horária do PCC do Curso de Licenciatura em

Química 2010/1........................................................................................

54

Page 13: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Classificação e Particularidades das Pesquisas sobre Saberes

Docentes...................................................................................................

92

Quadro 2- Características dos Modelos Didáticos.................................................... 96

Quadro 3 - Organização dos Modelos Didáticos das Professoras Colaboradoras…. 97

Page 14: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas

CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

CBQ – Congresso Brasileiro de Química

CCET – Centro de Ciências Exatas e Tecnológica

CCT – Centro de Ciências e Tecnologia

CNE – Conselho Nacional de Educação

CNPQ – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

COMFOR – Comitê de Formação Continuada dos Professores da Educação Básica

CONSEPE – Conselho Superior de Ensino, Pesquisa e Extensão

CRQ – Conselho Regional de Química

CTSA – Ciência, Tecnologia, Sociedade e Ambiente

DCN – Diretrizes Curriculares Nacionais

DEB - Diretoria de Educação Básica Presencial

DESUP – Diretoria de Supervisão

ECODEQC - Encontro Centro-Oeste de Debates sobre Ensino de Química e Ciências

EDEQ - Encontro de Debates sobre Ensino de Química

ETFMT – Escola Técnica Federal de Mato Grosso

ENADE – Exame Nacional de Desempenho de Estudantes

ENEM – Exame Nacional do Ensino Médio

ENEQ – Encontro Nacional de Ensino de Química

ENNEQ - Encontro Norte-Nordeste de Ensino de Química

ESEQ - Encontro Sudeste de Ensino de Química

FE – Faculdade de Educação

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IES – Instituições de Ensino Superior

IFMT – Instituto Federal de Mato Grosso

INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira

IQ – Instituto de Química

LabPEQ – Laboratório de Pesquisa e Ensino de Química

LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

MEB – Movimento de Educação de Base

Page 15: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

MEC – Ministério da Educação

MEC – Ministério da Educação e Cultura

OCNEM – Orientações Curriculares Nacionais para o Ensino Médio

PARFOR - Plano Nacional de Formação para o Magistério da Educação Básica

PCC – Prática como Componente Curricular

PCK – Pedagogical Content Knowledge

PCKC – Pedagogical Content Knowledge Chemicals

PCNEM - Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio

PDE - Plano de Desenvolvimento da Educação

PDI - Programa de Desenvolvimento Institucional

PEQ – Prática de Ensino de Química

PIBID – Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência

PNE – Plano Nacional de Educação

PPC – Projeto Pedagógico de Curso

PPGECEM – Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemática

PPP – Projeto Político Pedagógico

PROEG – Pró-Reitoria de Ensino de Graduação

PROUNI – Programa Universidade para Todos

PUC/SP - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

REAMEC – Rede Amazônica de Educação em Ciências e Matemática

REUNI – Reestruturação e Expansão das Universidades Federais

SBQ – Sociedade Brasileira de Química

SECADI – Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão

SEDUC/MT – Secretaria do Estado de Educação de Mato Grosso

SEMIPEQ – Semana de Minicursos das Práticas de Ensino de Química da UFMT

SESu – Secretaria de Educação Superior

SIGA – Sistema de Informação e Gestão Acadêmica

TCC – Trabalho de Conclusão de Curso

UFMT – Universidade Federal de Mato Grosso

USP – Universidade de São Paulo

Page 16: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO................................................................................................................ 16

I - PERCURSOS VIVIDOS: OPÇÕES DE UM CAMINHAR................................... 18

Reflexões Sobre o Movimento de Construção do Objeto de

Investigação.......................................................................................................................

23

II - O CAMINHAR DA INVESTIGAÇÃO: DA DEFINIÇÃO

METODOLÓGICA AO CENÁRIO E SUJEITOS DO PROCESSO........................

30

Instrumentos de Registro de Informações e a Composição dos Textos de

Campo................................................................................................................................

33

Cenário da Pesquisa e Seleção dos Sujeitos...................................................................... 35

Caracterização dos Sujeitos............................................................................................... 37

Análise de Resultados: Análise Textual Discursiva.......................................................... 39

III - FORMAÇÃO INICIAL E INICIAÇÃO À DOCÊNCIA EM QUÍMICA NA

UFMT: UMA ANÁLISE DOCUMENTAL...................................................................

42

O Curso de Licenciatura em Química da UFMT campus Cuiabá: Situando o Contexto

da Formação dos Sujeitos Investigados.............................................................................

45

O Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência na UFMT............................ 55

Itinerário do Subprojeto Química – PIBID em Cuiabá na UFMT..................................... 59

IV - EDUCADORES QUÍMICOS INICIANTES E SABERES NECESSÁRIOS À

ATUAÇÃO PROFISSIONAL: DAS NARRATIVAS DE SI A MODELOS

DIDÁTICOS ADOTADOS.............................................................................................

65

A Base de Conhecimentos dos Professores em Questão: Tipologias e Concepções......... 66

Trajetórias da Formação Inicial e Continuada dos Educadores Químicos egressos do

PIBID.................................................................................................................................

77

Iniciação à Docência e os Saberes Necessários à Atuação Profissional na Perspectiva

de Tardif ...........................................................................................................................

82

Modelos Didáticos e Aproximação da Realidade Educativa............................................ 93

V - SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDOS

QUÍMICOS: EPISÓDIOS DE AULAS DO ENSINO MÉDIO...................................

103

Saberes Científicos na Educação Básica: O Ensino de Química em Foco........................ 104

Aspectos Epistemológicos do Conhecimento Científico em Gaston Bachelard............... 109

Modelos Atômicos em Destaque: O que a literatura Química atual aponta? ................... 114

Episódios de Aula sobre Modelos Atômicos..................................................................... 125

Ácidos e Bases em Questão: O que a literatura Química atual apresenta? ...................... 134

Episódios de Aula sobre Ácidos e Bases........................................................................... 137

CONSIDERAÇÕES PROVISÓRIAS............................................................................ 145

REFERÊNCIAS............................................................................................................... 154

Page 17: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

16

INTRODUÇÃO

A arte de lembrar remete ao sujeito a observar-se numa dimensão genealógica, como

um processo de recuperação do eu, e a memória narrativa marca um olhar sobre si

em diferentes tempos e espaços, os quais se articulam com as lembranças e as

possibilidades de narrar às experiências (Elizeu Clementino de Souza).

Este trabalho foi organizado de forma a viabilizar a identificação dos caminhos

construídos e percorridos, dos aportes teóricos adotados assumidos e dos significados

construídos/reconstruídos ao longo do percurso formativo e investigativo.

Em minha trajetória, como professor formador, algumas reflexões têm estado

presentes no meu dia a dia, na perspectiva de responder perguntas seminais que norteiam este

trabalho, tais como: O que os professores precisam saber para poder ensinar e para que seu

ensino possa conduzir as aprendizagens dos seus educandos? Como os professores constroem

conhecimentos sobre o ensino? O que deveria saber todo aquele que planeja exercer esse

ofício? Qual a base de conhecimento indispensável para a atuação profissional dos

profissionais em Educação Química? Levanto essas questões reflexivas com o desejo de

aprender e continuar progredindo na carreira, de contribuir para a melhoria da formação de

professores de Ciências e Química, motivos que me conduziram a este trabalho de tese.

Considero que a tessitura desta tese corresponde a alinhavos feitos sobre o chão de

onde pisa quem fez a tessitura. Novas tramas poderiam ser explicitadas, sob outros olhares,

outros chãos. Assim, sigo com a pretensão em narrar as experiências das trajetórias formativas

e as práticas pedagógicas de professores egressos do Programa de Bolsa de Iniciação à

Docência em Química e do curso de Licenciatura em Química da UFMT.

Neste trabalho, além das questões explicitamente abordadas, podem-se encontrar

muitas outras questões fundamentais que convidam a prolongar a reflexão, a questionar os

modelos, os dispositivos, as práticas e, fundamentalmente, a relação com o saber e a maneira

de abordar o estudo do processo de ensino-aprendizagem em Química, convidando,

constantemente, a voltar ao essencial.

Na primeira seção, focalizo a trajetória de minha narrativa pessoal e as reflexões

sobre o movimento de busca pelo objeto desta investigação.

Na segunda seção, apresento a opção metodológica da pesquisa, o cenário e a seleção

dos sujeitos, os instrumentos de registros de informações, a composição dos textos de campo,

a caracterização dos sujeitos e a proposta das análises dos resultados.

Page 18: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

17

Na terceira seção, narro a eclosão de um novo ramo da Química na área de Educação

Química e construo o histórico da constituição da formação inicial de professores de Química

da UFMT do Campus Cuiabá e a política de valorização e incentivo à docência por meio do

PIBID na UFMT dos sujeitos de pesquisa envolvidos.

Na quarta seção, faço uma revisão sistemática sobre os saberes necessários à atuação

profissional com o objetivo de buscar fundamentos teóricos conceituais norteadores desta

investigação sobre saberes e busco trazer as análises das trajetórias de formação inicial e

continuada obtidas dos diálogos com os sujeitos dessa pesquisa, durante a entrevista

semiestruturada, bem como narrativas expressas nas dinâmicas do tempo de sua formação e

de sua história, buscando evidenciar como esses professores constroem, trabalham e

expressam os saberes necessários à docência e apresento o modelo didático de cada professor

colaborador da pesquisa.

Na quinta seção, focalizo os Saberes Científicos no contexto do ensino de Química e

os aspectos epistemológicos na perspectiva de Bachelard (1996) e busco a compreensão de

como se configuram os Saberes Científicos e Saberes Pedagógicos dos Conteúdos Químicos,

na perspectiva de Shulman (1986), subjacentes à docência dos sujeitos investigados, por meio

dos relatos de episódios de aulas com conceitos químicos do Ensino Médio, sendo que para

cada conceito trago o que a literatura Química atual discorre sobre esses assuntos.

Dessa forma, encerro o texto desta tese, evidenciando a provisoriedade e a

continuidade dos processos formativos, pois a realidade de formação e desenvolvimento

profissional que foi analisada pode se modificar, uma vez que a formação, tanto inicial quanto

continuada está em constante transformação, em perpétuo movimento, tal como uma sinfonia

sempre inacabada.

Page 19: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

18

I - PERCURSOS VIVIDOS: OPÇÕES DE UM CAMINHAR

Compreender/viver a formação do conhecimento e o conhecimento da formação

significa instrumentalizar-se com uma condição ímpar para definir situações e

decidir sobre a vida em qualificações (Roberto Sidnei Macedo).

Inicio esse texto narrando experiências vivenciadas ao longo da minha vida e

formação, inspirando-me em Josso (2004), quando discute o processo de reflexão de um

caminhar para si. Faço isto ao revisitar o passado, olhando meu percurso de formação com o

olhar do presente, evidenciando as minhas práticas formativas inerentes aos percursos

acadêmicos e profissionais e outras experiências de aprendizagens significativas, que me

permitem um movimento de (auto) formação e (auto) conhecimento que, de acordo com Josso

(2004, p. 60): “poderá inaugurar a emergência de um eu mais consciente e perspicaz para

orientar o futuro da sua realização e reexaminar, na sua caminhada, os pressupostos das suas

opções”.

Nesse sentido, a reflexão sobre aquilo que foi formador na minha vida me permite

situar o que hoje eu penso e faço dessas experiências e como elas me levaram ao encontro do

objeto e objetivo desta proposta investigativa. E é com essa ambiência experiencial que

conduzo a produção desta tese, trazendo como aporte teórico especialmente as ideias de

Gonçalves (2000), Josso (2004), Nóvoa (2007), Fraiha-Martins (2014).

Sobrinho de professora, desde a infância a docência me sondava, pois quando eu

tinha doze anos de idade, em virtude do divórcio dos meus pais, fui morar com uma tia que

era professora de Ciências e Matemática de ensino supletivo em escola pública em Cuiabá-

MT. Cursei o final do Ensino Fundamental em escola pública, residindo com essa tia, e todas

as noites eu a acompanhava em suas aulas para a 1ª e 2ª séries do Ensino Fundamental para

jovens e adultos. Assim, ainda criança, cursando a 2ª etapa do Ensino Fundamental, eu

auxiliava os alunos de minha tia, tirando dúvidas de Matemática, nascendo daí minha paixão

pela docência. A partir da experiência de viver com minha tia e pelo incentivo aos estudos que

ela me dispensava, sempre tive a convicção de que seria ser professor.

No ano de 1996, voltei a morar com minha mãe e minhas duas irmãs, e tive que

começar a trabalhar desde jovem para ajudar na subsistência da família. Meu primeiro

Page 20: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

19

emprego foi em uma escola de informática como office-boy1, e nesse mesmo ano comecei a

fazer o Ensino Médio na então Escola Técnica Federal de Mato Grosso (ETF/MT), nos dias

atuais denominada Instituto Federal de Mato Grosso (IFMT), fazendo o Ensino Médio

integrado com o Curso Técnico em Telecomunicações. Nesse período, tive excelentes

professores de Química, que me despertaram o fascínio por essa ciência e, como estudante de

Ensino Médio, sempre me destacava nas aulas e avaliações de Química, bem como atuando

como monitor dessa disciplina, auxiliando colegas que tinham dificuldades de aprendizagem.

A partir daí, comecei a ter em mente que o ramo profissional que eu realmente pretendia

seguir não era a Engenharia Elétrica para dar continuidade ao meu curso técnico da área

eletroeletrônica e, sim, o ramo da Química.

No ano de 2000, prestei vestibular para o curso de Licenciatura em Química e passei

em 5º lugar na seleção da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT). A escolha pelo

curso de licenciatura desde o início foi consciente, uma vez que queria fazer um curso que me

habilitasse a ser professor, pois a partir das experiências de docência, em minha infância, com

minha tia, como disse anteriormente, eu já tinha essa pretensão.

No segundo ano de graduação, eu comecei a lecionar na Educação Básica como

professor interino em escola pública e, de carteira assinada, em escola particular, ensinando as

disciplinas de Química e Matemática, devido à falta de profissionais habilitados nessa área

para o Ensino Médio e para poder me manter e ajudar financeiramente minha família. No meu

período de graduação, eu lecionava no período matutino para a Educação Básica e no período

vespertino e noturno cursava as disciplinas do curso de Química na UFMT.

O início de minha carreira docente, portanto, ocorreu em concomitância a minha

formação inicial, como narrei anteriormente, quando vivi as fases de exploração e de

estabilização como proposto por Huberman (2007). De acordo com esse autor, na fase de

exploração o professor escolhe, provisoriamente, a sua profissão, mas no meu caso a escolha

se deu, sobretudo pela necessidade imediata de trabalho, e iniciei meu trabalho por meio de

tentativas e erros, pois não tinha o amálgama dos saberes disciplinares, curriculares e

pedagógicos inerentes à profissão docente, que pudessem subsidiar a minha prática

pedagógica. Contudo, eu era sempre muito cuidadoso com as minhas aulas e estudioso, pois

como eu sentia a necessidade de ser aceito no meu círculo profissional, eu planejava as

minhas aulas e pegava orientações com professores mais experientes para que tudo pudesse

1 Lançarei mão do uso da fonte do texto em negrito quando intenciono chamar a atenção do leitor para algum

termo ou expressão.

Page 21: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

20

dar certo, pois eu já tinha a preocupação de transformar os conhecimentos científicos em

conhecimentos escolares, mesmo sem conhecer o conceito de mediação didática2.

Ainda na fase de exploração, experimentei o que Simon Veenman (1984) chama de

(reality shock) choque da realidade, pois o meu primeiro ano de docência foi de intenso

processo de aprendizagem, sobretudo no contexto da prática. Ensinar Química na Educação

Básica, naquele contexto, se apresentava muito complexo para mim, pois essa ciência tem, de

modo equivocado no meu entender, parte de seu objeto de estudo muito distante do educando,

por exemplo, átomos, moléculas, íons, elétrons, mol..., são conceitos que não existem no

senso comum das pessoas, como ocorre com os principais assuntos da Física, tais como:

corpo, massa, tempo e velocidade, que fazem parte do cotidiano da maioria da população.

Mais tarde, passei a compreender, com Chassot (1993), o quanto a situação da

Química é complexa. Nos dias atuais, considero que o meu choque da realidade se deu em

virtude, também, da fase sincrética de saberes dos conteúdos específicos, curriculares e

pedagógicos em que eu me encontrava em minha formação, pois só fui começar a atingir a

síntese destes saberes ao concluir a minha formação inicial (SHULMAN, 1986;

VASCONCELLOS, 2005).

No decorrer dessa fase de exploração como docente, em paralelo a minha formação

inicial na graduação, passei para a fase de estabilização, pois comecei a ter destaque nas

instituições onde eu lecionava. Nessa fase, eu já conseguia recontextualizar ou ressignificar os

meus saberes experienciais com os saberes que eram aprendidos na academia no contexto de

minha prática docente (TARDIF, 2012).

Ainda na minha formação inicial em Licenciatura em Química na UFMT, da qual

hoje eu integro o quadro docente e, ao mesmo tempo, me desenvolvo profissionalmente,

apesar de ter sido formado em uma estrutura curricular no formato 3+1, como apresento na

seção III desta pesquisa, tive excelentes professores que me ajudaram e incentivaram ainda

mais minha paixão pela Química, pela Educação e, consequentemente, pela Docência, e hoje

tenho o privilégio de tê-los como meus colegas de trabalho.

Desde o ano de 2001, atuando com as disciplinas de Química e Matemática na

Educação Básica em escolas públicas e privadas em Cuiabá-MT, a modalidade com que mais

2 Utilizo a expressão mediação didática, pois defendo que o termo transposição didática não representa o

processo de reconstrução de saberes na instituição escolar. O termo de transposição didática tende a estar

associado à ideia de reprodução, movimento de transportar de um lugar para outro, sem alterações. Dessa forma,

assumo a expressão mediação didática na mesma perspectiva que Lopes (1997, p. 564): “não no sentido

genérico, ação de relacionar duas ou mais coisas, de servir de intermediário ou “ponte”, de permitir uma

passagem de uma coisa a outra. Mas no sentido dialético: processo de constituição de uma realidade através de

mediações contraditórias, de relações complexas, não imediatas, com um profundo sentido de dialogia”.

Page 22: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

21

me identificava a trabalhar era a Educação de Jovens e Adultos (EJA) e, anos mais tarde ao

ser aprovado em concurso público para professor da Rede Pública Estadual de Mato Grosso,

tomei posse e tive a experiência de atuar como coordenador pedagógico por dois anos no

maior Centro de Educação de Jovens e Adultos (CEJA3) de Mato Grosso, o CEJA Cesário

Neto. Ser professor da EJA na Educação Básica era um grande desafio, pois eu tinha

necessidade de aprender com novos contextos, desconstruindo barreiras veiculadas pelo

pensamento conservador, respeitando os saberes dessa parcela da população mantida à

margem do processo educativo, como maneira de enfrentamento da exclusão social. Percebia

também que eu possuía marca identitária semelhante e, ao mesmo tempo, singular, com meus

educandos, como se nós compartilhássemos o encontro de diversas experiências: o encontro

da desigualdade de oportunidades; da negação do direito à educação e à formação; o encontro

das jornadas duplas ou triplas de trabalho; o encontro do desemprego ou do subemprego; e,

consequentemente, o encontro da luta pela afirmação do direito na busca de construção de um

projeto apropriado aos diferentes segmentos marginalizados a quem a EJA se destina

(RIBEIRO, 2009).

Após o término da minha formação inicial na graduação e atuando como docente na

Educação Básica, eu compreendia que necessitava de mais ferramentas teóricas para a minha

prática educativa e, consequentemente, eu buscava concretizar o meu projeto pessoal de ser

um bom professor. Nesse sentido, no ano de 2005 fiz um curso de Pós-Graduação lato sensu

em Didática e Docência no Ensino Superior no Centro Universitário de Várzea-Grande

(UNIVAG). A partir daí, começou o meu despertar para a compreensão do fenômeno da

educação por meio da pesquisa. A opção por essa formação continuada ocorreu em virtude de

ser a única disponível à época voltada para educação na região de Cuiabá e Várzea-Grande, -

MT.

Movido pelo desejo de ampliar a minha base de conhecimentos e progredir na

carreira, conciliando interesses pessoais com profissionais, no mês de novembro de 2006 fiz a

seleção de Mestrado em Educação na Universidade Federal de Mato Grosso e ingressei na

linha de Movimentos Sociais no Grupo de Pesquisa Educação, Jovens e Democracia sob a

3 No ano de 2008, o Estado de Mato Grosso através da SEDUC/MT, destacou-se no cenário nacional como um

dos Estados que em sua ação de governo priorizou a Educação de Jovens e Adultos. Com o decreto nº 1.123, de

28 de janeiro de 2008, regulamenta a criação de Centros de Educação de Jovens e Adultos – CEJAS, que tem por

objetivo constituir identidade própria para a modalidade Educação de Jovens e Adultos e oferecer formas

diferenciadas de atendimento que compreendam a educação formal e não-formal integradas ao mundo do

trabalho, reconhecendo as especificidades dos sujeitos participantes e dos diferentes tempos e espaços

formativos.

Page 23: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

22

orientação inicial da professora Dra. Maria Aparecida Morgado, doutora em Psicologia Social

pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUCSP).

Minha intenção de pesquisa no curso de mestrado nasceu de uma variedade de

situações, observações e questionamentos ocorridos durante minha vida profissional como

professor de Química da rede estadual de Educação Básica em Mato Grosso, na modalidade

de ensino Educação de Jovens e Adultos. Essas situações foram relacionadas ao meu desejo

de entender a causa do número expressivo de jovens participantes nessa modalidade e poder

contribuir e melhorar o ensino de Química nessa mesma modalidade de ensino.

Como minha intenção inicial na pesquisa era compreender o fenômeno da Juventude

na EJA, fiz a opção de seleção de Mestrado na linha de Movimentos Sociais para um Grupo

de Pesquisa que investigava o fenômeno juvenil brasileiro e mato-grossense. No entanto, ao

final do primeiro ano, minha orientadora, Maria Aparecida Morgado, teve problemas de

saúde, não podendo assim seguir com a orientação de minha dissertação, sendo substituída

pela professora Dra. Irene Cristina de Mello, doutora em Educação na linha de Ensino de

Ciências pela Universidade de São Paulo (USP).

No meu segundo ano de Mestrado, com a nova orientação, migrei da linha de

Movimentos Sociais para a de Teorias e Práticas Pedagógicas do Grupo de Pesquisa Ensino

em Ciências e me integrei, também, ao Laboratório de Pesquisa e Ensino de Química

(LabPEQ). A partir da contribuição e orientação da nova orientadora, minha pesquisa

continuou no enfoque do fenômeno da juventude na EJA, mas também passou a ter a

preocupação de contribuir para a formação de professores de Química que atuam nessa

modalidade da Educação Básica. Em abril de 2009, defendi minha dissertação intitulada:

Jovens na Educação de Jovens e Adultos e sua Interação com o Ensino de Química.

Em maio de 2009, já terminado o mestrado e ainda atuando como professor de

Química na Educação Básica, ingressei na carreira docente no Ensino Superior como

professor substituto e, no mesmo ano, no mês de outubro via concurso público como

professor efetivo para atuar com as disciplinas de Práticas de Ensino no curso de Licenciatura

em Química do campus Cuiabá na UFMT.

Minha trajetória como docente do Ensino Superior inclui, entre os vários percursos

formativos, a docência em curso de Licenciatura em Ciências Naturais e Matemática a

distância nos polos da Universidade Aberta do Brasil (UAB/UFMT) de Pontes e Lacerda e

Diamantino e Licenciatura em Química e Bacharelado em Química presencial no campus de

Cuiabá; a coordenação de curso de graduação (Licenciatura em Química/Departamento de

Química/ICET/UFMT) e de curso de pós-graduação lato sensu (Educação de Jovens e

Page 24: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

23

Adultos para a Juventude) da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade

e Inclusão (SECADI) do Ministério da Educação (MEC) ofertada pelo Comitê de Formação

Continuada dos Professores da Educação Básica (COMFOR/UFMT); a participação e

coordenação de projetos de extensão como a Semana de Minicursos das Práticas de Ensino de

Química (SEMIPEQ); a participação e coordenação do Programa de Tutoria em Química da

UFMT; a participação e coordenação do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à

Docência em Química (PIBID).

Com o desejo de aprender e continuar progredindo na carreira, de contribuir para a

melhoria da formação de professores de Ciências e Química, motivos que me conduziram ao

ingresso no doutorado em Educação em Ciências e Matemática da Rede Amazônica de

Educação em Ciências e Matemática (PPGECEM/REAMEC) na linha de pesquisa Formação

de Professores.

No doutorado, passei a integrar o Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Formação de

Professores (TRANS) FORMAÇÃO. Esse grupo de pesquisa situa-se no Programa de Pós-

Graduação em Educação em Ciências e Matemática da UFPA, e tem por finalidade investigar,

por meio da pesquisa qualitativa, tendo a abordagem narrativa e (auto) biográfica como uma

das práticas investigativas consolidadas, inovações e processos de formação de professores,

saberes construídos durante a prática docente, práticas e experiências de formação e

desenvolvimento profissional de professores em processos de formação inicial e continuada,

em processos de formação reflexiva e pesquisas sobre a prática docente na área de Educação

em Ciências (GONÇALVES, 2011).

Com o meu ingresso no grupo de pesquisa (Trans) formação e da realização de uma

disciplina eletiva de doutorado, que eu cursei no mês de março de 2014, em Belém-PA na

UFPA, pela REAMEC, intitulada Pesquisa Narrativa em Educação em Ciências e

Matemática, comecei a fazer a reflexão da busca do meu objeto de investigação, bem como a

definir meu método de pesquisa que apresento nos tópicos a seguir.

Reflexões Sobre o Movimento de Construção do Objeto de Investigação

A formação inicial de professores tem levantado discussões e ocupado um espaço

significativo no cenário nacional brasileiro a partir dos anos de 1990, sobretudo no âmbito dos

debates sobre a educação, em virtude das relações de interdependência que se estabelecem

entre formação e Educação Básica, chegando-se a afirmar que, em certa medida, essa

formação inicial dos professores tem impacto direto na qualidade da Educação Básica.

Page 25: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

24

No âmbito dos cursos de graduação para formação inicial de professores ou nas

pesquisas científicas produzidas, essa formação se apresenta complexa diante dos inúmeros

desafios inerentes à profissão docente. A complexidade na formação vai além do ensino que

pretende uma mera atualização científica, pedagógica e didática, transformando-se na

possibilidade de criar espaços de participação, reflexão e formação para que as pessoas

aprendam e se adaptem para conviver com a mudança e com a incerteza (IMBERNÓN,

2011).

Se aceitar que a docência é uma profissão, de acordo com Imbernón (2011, p. 28)

“não será para assumir privilégios contra ou à frente dos outros, mas para que, mediante seu

exercício, o conhecimento específico do professor se ponha a serviço da mudança da

significação da pessoa”. Para Imbernón (2011), o conceito de “profissão” não é neutro e nem

científico,

Mas é produto de um determinado conteúdo ideológico e contextual; uma ideologia

que influencia a prática profissional, já que as profissões são legitimadas pelo

contexto e pelo conceito popular, uma parte do aparelho da sociedade que

analisamos e que deve ser estudado observando a utilização que se faz dele e a

função que desempenha nas atividades de tal sociedade (p. 28).

Nesta perspectiva, ser um profissional da educação significa participar na

emancipação das pessoas, ajudando-as a tornarem-se mais livres e menos dependentes do

poder econômico, político e social. Ao reconhecer a importância política e social da profissão

docente na emancipação das pessoas e suas complexidades inerentes à formação desses

profissionais, evidencia-se também que essa profissão docente em outros países e,

principalmente, no Brasil, tem pouco prestígio social e financeiro e, como consequência, os

cursos de licenciaturas são os menos atrativos aos jovens estudantes da Educação Básica, que

almejam cursar uma graduação. Imbernón (2006, p. 46), “analisando questões europeias em

relação aos professores, destaca a escassez deste profissional que é indicada por vários países

como resultado de uma profissão pouco atrativa, portanto, pouco valorizada na visão social”

(GATTI, 2013).

Sobre a desvalorização da profissão docente, de acordo com Gatti (2013, p. 153):

Múltiplos fatores associados ao movimento histórico-social são apontados como

levando à construção de uma representação social e dos seus profissionais, em geral

ancorada na ideia de desvalorização por sua formação rápida e fácil, na expressão de

vários agentes sociais, por seus salários, tipo de carreira, condição socioeconômica

ou de seu exercício como vocação ou missão, por amor e doação.

Page 26: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

25

Discursos como o exercício da docência como vocação ou missão, por amor e

doação retiram o caráter de profissionalismo como central ao exercício da docência,

carregando dessa forma para a identidade dos professores apenas a marca de doação,

escurecendo o caráter fundamental de agente social da preservação e recriação da cultura

(GATTI, 2013).

Muitos problemas relacionados à qualidade da educação pública podem ser

explicados, fundamentalmente, por falta de professores habilitados e qualificados, em

especial, na área das Ciências da Natureza e Matemática. No Estado de Mato Grosso não é

muito diferente de outros estados federativos do Brasil. Há grande falta de professores com

formação acadêmica específica em Química, Física e Matemática, e os aspectos que

contribuem para isso, de acordo com Mello (2012), são as baixas remunerações do corpo

docente, insuficiência de formação inicial e continuada de professores, problemas de gestão

escolar, condições de trabalhos escolares precários, violência, desvalorização da escola e do

professor perante os educandos e a sociedade, o baixo nível de aprendizagem, dentre outros.

A falta de demanda de professores habilitados nessas áreas, além de ser algo preocupante,

demonstra um sinal de urgência e alerta aos gestores da educação brasileira.

Pesquisas, como a de Gatti (2013), enfocando o tema da valorização da docência,

revelam que tal aspecto está na dependência e relevância de valorizar a Educação Básica

como um todo. A esse respeito, diz a autora:

Essa valorização está centrada na construção de uma nova realidade no interior das

escolas públicas, um valor que só virá quando nessas escolas houver outras

condições de ambiência e trabalho. Imagem da educação pública vincula-se à

imagem da docência e vice-versa. Mais ainda, está na dependência, também, de se

atribuir à docência na Educação Básica uma condição profissional clara em seus

contornos e características, e nas formas de agir dentro das escolas, há que se gerar

uma conjunção dialética entre ações políticas em educação e movimentos

pedagógicos nas escolas. É essa conjunção que pode vir a criar novas representações

sociais sobre o valor da escola pública e o valor de seus professores (p. 156).

É nesse contexto, que surge como uma das atuais ações de políticas federais para a

formação de professores, no cenário nacional brasileiro, no ano de 2007, o Programa

Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID), com a finalidade de apoiar a

formação de estudantes de licenciatura, visando aprimorar a formação inicial dos docentes,

valorizar o magistério e contribuir para a elevação da qualidade da Educação Básica. Sobre

esse Programa de Iniciação à Docência, em especial, no curso de Licenciatura em Química do

campus de Cuiabá da Universidade Federal de Mato Grosso, dou maiores detalhes na seção

III.

Page 27: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

26

Ainda, na pauta das discussões sobre a profissionalização docente, várias

perspectivas se apresentam tendo em vista os muitos aspectos que incidem sobre o processo

da formação docente. Algumas perspectivas apontam para a necessidade de um Código de

Ética para o Magistério, para a atomização dessa formação e suas implicações para a

profissionalização da docência, os fundamentos da formação no processo inicial e continuado,

a importância da relação entre teoria e prática, e a base de conhecimento4 que constitui o

amálgama dessa formação, conforme discutem autores, tais como Shulman (1986; 1987),

Gonçalves e Gonçalves (1998), Gonçalves (2000; 2012), Tardif e Lessard (2009), Mizukami

(2011), Pimenta (2012); Tardif (2012); Gauthier et al. (2013), dentre outros.

Na contribuição desses debates, Gonçalves5 (2012) explicita que nas últimas décadas

tem havido interesse crescente pela problemática ligada à formação e ao desenvolvimento

profissional de professores e de formadores de professores, no âmbito da Educação

Matemática e Científica. Expressa sua relevância como temática desafiadora no contexto da

educação brasileira, sobretudo na realidade da população amazônica. Gonçalves (2012, p. 5)

afirma que: “Esta tem sido uma realidade em que os problemas e desafios pedagógicos usuais,

traduzidos no predomínio da lógica memorística e instrumental de ensino e aprendizagem,

potencializam-se por meio de processos de exclusão sócio-educacional”.

Nesta perspectiva, para Contreras (2002, apud GONÇALVES, 2012, p. 09):

O professor, sua formação, seu desenvolvimento profissional e os saberes que

servem de base para a sua prática educativa, importantes na constituição da própria

identidade docente, precisam ser investigados, analisados, comunicados e vistos

como processos não desvinculados das outras dimensões da ação, da

profissionalidade e da autonomia docente [grifo nosso].

De acordo com Therrien (2010), o professor funda o seu trabalho em uma dupla

competência oriunda e objeto de sua formação; a competência em um determinado campo

4 “Knowledge base” (base de conhecimento) expressão em inglês empregada, frequentemente, em um sentido

amplo, podendo englobar todos os saberes do docente necessários e indispensáveis à atuação profissional:

conhecimento do conteúdo, saber experiencial, conhecimento das crianças, conhecimento de si mesmo, cultural

entre outros (GAUTHIER et al., 2013, p. 18). 5 No dia 02/07/2012 para potencializar os estudos e pesquisas ligadas à formação e ao desenvolvimento

profissional de professores de Ciências e Matemática no âmbito da Amazônia Legal, a professora e pesquisadora

Dra. Terezinha Valim Oliver Gonçalves da Universidade Federal do Pará – UFPA do Instituto de Educação

Matemática e Científica – IEMCI, cadastrou um projeto de pesquisa junto ao Conselho Nacional de

Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) do edital universal/CNPq – nº 14/2012 intitulado “Saberes

Matemáticos e Científicos e Pedagógicos do Conteúdo expressos por professores que ensinam nos anos iniciais

do Ensino Fundamental na Amazônia Legal”. Este projeto interage com pesquisadores da UFMT e da UEA, por

meio da Rede Amazônica de Educação em Ciências e Matemática – REAMEC, na qual se situa o Programa de

Doutorado em Educação em Ciências e Matemática, programa esse em associação de IES em REDE da

Amazônia Legal.

Page 28: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

27

disciplinar e a competência no campo pedagógico, ou seja, o saber dos conteúdos e o saber

ensinar. Esses conhecimentos são múltiplos e heterogêneos, moldados na relação dialética do

saber e do fazer, da teoria e da prática que na ecologia da sala de aula são confrontados com a

complexidade da vida da atual sociedade.

Para Gonçalves (2000), uma questão de suma importância na formação dos futuros

professores de Ciências e Matemática, tanto para o Ensino Fundamental quanto para o Ensino

Médio, diz respeito a quais conteúdos (saberes) profissionais são fundamentais para essa

formação. O autor complementa que:

Sabe-se que o conteúdo de Ciências e/ou Matemática isoladamente não basta e que

os conhecimentos pedagógicos “neutros” e dissociados dos conceitos de nada ou

muito pouco ajudam na tarefa docente. Que conhecimentos, então, são fundamentais

à prática profissional? Como desenvolvê-los durante a licenciatura? Que

estratégias/atitudes de formação seriam necessárias, tanto por parte do formador,

quanto do estudante universitário? Como os saberes da ação pedagógica podem ser

construídos? (2000, p. 25).

Defendo, com Maldaner (2006), que a atividade docente não deve se restringir

somente à aplicação de teorias, métodos, procedimentos e regras ensinadas no curso de

licenciatura, porque a prática profissional caracteriza-se pela incerteza, pela singularidade,

pelo conflito de valores, pela complexidade, para a qual nenhuma teoria pedagógica pode dar

conta de resolver os problemas, constituindo-se, portanto, em práticas que precisam ser

investigadas para serem melhoradas.

Diante desses pressupostos e com o objetivo de compreender melhor a base de

conhecimento indispensável para a atuação docente dos profissionais em Educação Química,

me proponho, nesta pesquisa a investigar os Saberes Científicos e Pedagógicos de

Conteúdos Químicos expressos por professores egressos do Programa de Bolsa de

Iniciação à Docência em Química da UFMT. Esses professores egressos tiveram a

oportunidade de participar de uma política pública do governo com vistas à iniciação e

valorização do magistério. Portanto, parto da premissa de que os sentidos que cada professor

egresso do curso de Licenciatura em Química do campus Cuiabá participante do Subprojeto

Química do PIBID da UFMT atribui às experiências vividas na sua formação inicial e com a

participação nesse programa é subjetivo e vinculado a outras experiências, com outros

sentidos (JOSSO, 2009). Nesses termos, almejo encontrar respostas às indagações que

expresso do seguinte modo:

Page 29: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

28

Que movimentos – teóricos, metodológicos e epistemológicos – de formação e

docência contribuem para a constituição dos professores egressos do Programa de Bolsa

de Iniciação à Docência da UFMT que ensinam Química na Educação Básica?

Quais conteúdos de Química esses professores egressos ensinam na Educação

Básica (Ensino Fundamental e/ou Médio)?

Pretendo encontrar respostas às perguntas acima propostas, em busca de elucidar e

tecer significados às experiências de formação, e construir compreensão mais aprofundada a

respeito dos saberes científicos e pedagógicos de conteúdo (SHULMAN, 1986) expressos

pelos sujeitos participantes desta investigação. Diante do exposto, ao debruçar-me sobre essas

questões norteadoras apresento o problema de pesquisa: Como se configuram e se

expressam saberes científicos e pedagógicos de conteúdos químicos subjacentes à

docência de professores egressos do Programa de Bolsa de Iniciação à Docência em

Química da UFMT, ao relatarem o ensino de Química que realizam na Educação

Básica?

Ao buscar respostas às indagações norteadoras e ao problema de pesquisa, partirei

das experiências vividas6 desses professores egressos, pois compreendo, com Clandinin e

Connelly (2011), que as experiências são expressas pelas histórias que as pessoas vivem e

narram, quando falam de si. As pessoas vivem histórias e, ao contar essas histórias se

reafirmam, modificam-se e criam novas histórias. As histórias vividas e contadas educam a

nós mesmos e aos outros, incluindo-se os jovens e os recém-pesquisadores em suas

comunidades.

As memórias evocadas dessas histórias revelam como o passado e o presente estão

intimamente relacionados com a constituição de nossa identidade como profissionais

professores, revelando-se um caminho fecundo para a formação docente à medida que as

reminiscências desses sujeitos, a partir das narrativas, possam ensinar-lhes a compreender e

transformar suas maneiras de ser e estar na docência (CHAVES, 2005).

Nessa perspectiva, Cunha afirma que as “[...] narrativas provocam mudanças na

forma como as pessoas compreendem a si próprias e aos outros e, por este motivo, são

também importantes estratégias formadoras de consciência numa perspectiva emancipadora”.

(1997, p. 185).

6 O conceito de experiência de acordo com Josso (2004, p. 27) “apresenta-se como um conceito aglutinador dos

projetos de conhecimento da formação no decurso da vida”. A autora cita que um autor de referência quanto ao

conceito de experiência é John Dewey.

Page 30: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

29

De acordo com Marques (2003), formar um professor não é simplesmente dotá-lo de

uma bagagem de conhecimentos e habilidades, mas é desenvolver nele a competência de aliar

a sensibilidade para os fatos empíricos à reflexão sobre os sentidos, que assumem no conjunto

das determinações amplas, que os fazem reais e historicamente situados. Essas são tarefas de

aprendizado longo, que exigem tempo contínuo de maturação, em que se encadeiam os

pequenos passos, tanto na história pessoal de cada educando e professor quanto na história

institucional dos cursos, pelos quais não podem apenas transitar as gerações condenadas a

começar tudo de novo e sair sem deixar vestígios. “As pessoas e as instituições que não

documentam suas próprias experiências e o que delas aprenderam têm vida fugaz e pobre”

(MARQUES, 2003, p. 96).

Nesses termos, com o problema de investigação posto nesta pesquisa, defendo a tese

de que a base de saberes científicos e pedagógicos de conteúdo necessários ao ensino de

Química pode ser catalizada na formação inicial pela participação em projetos de

iniciação à docência no ambiente escolar desde o início do curso, o que potencializa a

produção de saberes sobre a docência e práticas pedagógicas diferenciadas com vistas à

educação para a cidadania.

Diante do exposto, almejo produzir ideias e interpretações em torno dos debates

sobre saberes docentes e formação de professores de Química, colaborando possivelmente,

em termos mais amplos com o desenvolvimento de políticas públicas e curriculares para a

formação de professores de Ciências e Química.

Page 31: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

30

II - O CAMINHAR DA INVESTIGAÇÃO: DA DEFINIÇÃO

METODOLÓGICA AO CENÁRIO E SUJEITOS DO PROCESSO

O grupo

Quatro mulheres iniciantes na docência.

E eu, iniciante na pesquisa narrativa.

Quanta riqueza, singularidades e heterogeneidade!

Experiências anteriores contrastantes,

Que remetem ao campo, à cidade,

Quase todos, pau rodados, ou seja, que não são de Cuiabá.

Mas, quando meninos, meu bom Jesus mandou buscar.

Idas e Vindas.

Alguns escolheram a docência por profissão,

E outros escolheram a licenciatura para alcançar o bacharelado.

Mas na docência todos ficaram porque pelo PIBID passaram.

Alguns levam à escola, à turma da educação básica regular,

À escola ciclada, à Educação de Jovens e Adultos.

Em escola pública e particular.

Conflitos com a evasão, repetência, abandonos temporários e recomeços.

Em meio a problemas familiares, econômicos e de saúde...

Perdas de entes queridos, lutas, conquistas, amores correspondidos e seus frutos,

Outros em busca do amor, na universidade se graduaram.

Cada um com sua singularidade, e na bagagem esperanças, conhecimentos,

Valores e crenças.

Todos trabalham uma carga horária superior a trinta horas semanais,

Para conseguir sobreviver com salários de professores,

E conquistar seus ideais.

Tem gente que até a Pós-Graduação alcançou...

E muitos que não alcançaram almejam alcançar,

Na esperança de uma educação pública de qualidade poder melhorar.

No vai e vem da vida escolhemos,

E ao escolher também somos escolhidos.

Na trilha dessa poesia com os traços dos sujeitos da pesquisa e do investigador, cuja

escolha metodológica assumida apresento a seguir, explicito o caminho percorrido para

construção dos textos de campo e os eixos de análise escolhidos para a compreensão do

fenômeno estudado.

Ao me aproximar da pesquisa narrativa, na perspectiva difundida por pesquisadores

como Clandinin e Connelly (2011), Gonçalves (2011) e Aragão (2011), privilegio a

experiência vivida pelos participantes da pesquisa que realizo, tanto como estudantes, em

processo de formação, quanto como docentes, em sua prática de professores de Química.

Nessa perspectiva, formulo o problema de investigação nos seguintes termos: Como se

configuram e se expressam saberes científicos e pedagógicos de conteúdos químicos

Page 32: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

31

subjacentes à docência de professores egressos do Programa de Bolsa de Iniciação à

Docência em Química da UFMT, ao relatarem o ensino de Química que realizam na

Educação Básica?

Os pressupostos da pesquisa narrativa possibilitam ao pesquisador a sistematização

das experiências vividas pelos professores no contexto educacional relacionando os

conhecimentos sobre o que os professores sabem, como produzem seus saberes, como

trabalham com o saber produzido. Estes pressupostos proporcionam identificar os

conhecimentos utilizados pelos professores no desenvolvimento de suas práticas pedagógicas,

e a forma como constroem esses conhecimentos. Além disso, oportunizam ao pesquisador

compreender o processo de formação do sujeito, colocando-o em lugar de destaque, como ator

principal e autônomo, nas questões relacionadas às suas aprendizagens.

Em face da pesquisa narrativa e segundo as considerações de Connelly e Clandinin:

[...] La razón principal para el uso de la narrativa en la investigación educativa es

que los seres humanos somos organismos contadores de historias, organismos que

individual y socialmente, vivimos vidas relatadas (2008, p. 11).

Clandinin e Connelly complementam a ideia de que a narrativa pode ser estudada

tanto como fenômeno, quanto como método:

[...] Vemos o ensino e o conhecimento do professor como expressos em histórias

sociais e individuais corporificadas, e pensamos narrativamente à medida que

entramos na relação da pesquisa com os professores, à medida que criamos textos de

campo e escrevemos histórias sobre vidas educacionais (2011, p. 32).

Ao fazer uma proposta de pesquisa que pretende estudar saberes docentes e formação

de professores, a pesquisa narrativa se faz pertinente, pois de acordo com Ribeiro (2000, apud

ARAGÃO 2011, p.15) “ Na vida não há fatos, o que há são histórias...” [grifo do autor].

Aragão (2011), afirma que, tanto professores como discentes são contadores de histórias e

personagens, não só das histórias de todos os envolvidos, mas, também, das suas próprias

histórias.

Aragão, complementa que:

[...] tendemos a chamar de história ou relato ao fenômeno, e de narrativa à

investigação e à feição final do texto resultante. Assim, quando dizemos que nós

vivemos vidas relatáveis e contamos histórias dessas vidas, precisamos dizer – para

explicitar – que os pesquisadores que são investigadores narrativos buscam recolher

essas vidas, descrevê-las e, por sua vez, contar histórias sobre elas, escrevendo seus

relatos de tais experiências em uma narrativa (2011, p. 15) [grifo do autor].

Page 33: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

32

A base epistemológica que subjaz à pesquisa narrativa como método de pesquisa

tende à globalidade, com uma base multirreferencial7, situando-se no paradigma da

complexidade8 (MORIN, 1995). As explicações e os detalhes estão presentes em uma boa

narrativa, criando a trama e o contexto, que lhe conferem autenticidade.

De acordo com Clandinin e Connelly (2011), as narrativas se deslocam do passado e

surgem em um espaço “3D” tridimensional específico, que se pode chamar de campo de

pesquisa. Nesta perspectiva, Gonçalves, afirma que:

[...] quem escreve uma pesquisa narrativa vai, em um só documento, do presente ao

passado e ao futuro, enquanto vai dando corpo e consistência à história, tecendo a

trama da pesquisa narrativa, o que produz um movimento importante nesse tipo de

pesquisa, baseada em histórias relatadas, a partir de memórias orais ou escritas

(2011, p. 69).

Gonçalves corrobora que:

[...] uma boa narrativa deve convidar o leitor a refletir sobre as suas próprias

experiências de vida, fazendo pensar sobre a sua vivência profissional ou pessoal.

Isso parece acontecer quando o leitor de uma história se entrosa de tal maneira com

ela que produz significados seus, reconhecendo-se de algum modo naquelas

circunstâncias, naqueles contextos, evocando as suas próprias lembranças sobre

situações vividas, ressignificando-as (2011, p. 69).

Na concepção de Galvão (2005), a narrativa como metodologia de investigação

implica uma negociação de poder, representando, assim, a entrada pessoal na vida de outra

pessoa. A autora complementa que: “Não se trata de uma batalha pessoal, mas é um processo

ontológico, porque nós somos, pelo menos parcialmente, constituídos pelas histórias que

contamos aos outros e a nós mesmos acerca das experiências que vamos tendo” (p. 330). Por

isto mesmo, concordo com Clandinin e Connelly (2011), quando dizem que a pesquisa

narrativa tem uma dimensão pessoal e social.

Por fim, levando em consideração as características básicas explicitadas acima acerca

da pesquisa narrativa, assumo a pesquisa narrativa como abordagem metodológica, pois

reconheço que ela me possibilita reconstruir e analisar histórias de vida, formação e

desenvolvimento profissional de professores, sem recortes reducionistas, sem simplificar a

7 A multirreferencialidade é um termo utilizado por Ardoino, professor da Universidade de Paris VIII, cujo

conceito vem se desenvolvendo em seus trabalhos desde a década de 1960. De acordo com Gonçalves (2011), a

multirreferencialidade dá luzes e abre caminhos possibilitando buscar aportes teóricos em diversas áreas do

conhecimento. Lida com a complexidade do objeto, evitando o seu reducionismo e permitindo vê-lo de

diferentes ângulos sem pretender esgotá-lo, fazendo em função dele as leituras possíveis. 8 De acordo com Japiassú e Marcondes (2006), a complexidade é a noção desenvolvida por Edgar Morin para

responder aos principais desafios do pensamento contemporâneo. Gonçalves, (2011) complementa que a

complexidade busca dar uma visão global, sem querer encontrar a completude; procura-se olhar de modo plural

para o objeto de pesquisa, sem pretender esgotar as possibilidades de outros olhares.

Page 34: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

33

complexidade presente na formação de professores e na sua prática docente. A pesquisa

narrativa constitui-se uma abordagem importante para/na construção de conhecimentos sobre

processos de formação e desenvolvimento profissional de professores, bem como para a

formação de professores reflexivos e pesquisadores da sua própria prática (GONÇALVES,

2011).

Passo, a seguir, a informar sobre a produção dos textos de campo.

Instrumentos de Registro de Informações e a Composição dos Textos de Campo

Os textos de campo são criados, não são encontrados e nem descobertos, pelos

participantes e pesquisadores e têm o objetivo de representar/registrar aspectos da experiência

de campo (CLANDININ e CONNELLY, 2011).

De acordo com Aragão (2011), vários procedimentos de registro de informações são

passíveis de adoção conjunta, na abordagem da pesquisa narrativa, visto que o investigador e

o sujeito investigado trabalham juntos em uma relação de colaboração.

As informações de interesse da pesquisa narrativa podem ser registradas de várias

formas, tais como:

[...] na forma de registros de campo, anotações em diários, entrevistas semi ou não-

estruturadas, histórias de vida (orais ou escritas), observações diretas, em situações

de contar histórias, por meio de cartas, autobiografias, documentos diversos e, além

disso, por meio do projetos, relatórios, boletins de rendimento escolar, programações

de aula, regulamentos e normas escritas, como também analisando metáforas,

princípios, imagens e filosofias pessoais de vida e de profissão (GONÇALVES,

2011, p. 65).

Ao adotar a Pesquisa Narrativa como método de pesquisa na presente tese, faço a

opção por não analisar a prática pedagógica no chão da escola, mas o pensamento desses

professores de Química, ao relatarem suas práticas, pressupondo que as concepções expressas,

em suas narrativas, se fazem presentes na configuração de suas práticas.

Concernente às questões norteadoras da pesquisa, faço a opção pelos seguintes

instrumentos investigativos: i) questionário I, cujas respostas me auxiliam a construir a

caracterização dos sujeitos; ii) depoimentos dos sujeitos envolvidos na pesquisa sob a forma

de entrevista semiestruturada; iii) registro em áudio e transcrito do grupo focal realizado

com os professores egressos; iv) análises de documentos como (PPC da Licenciatura em

Química, campus Cuiabá, da estrutura curricular de 1997/1 e 2010/1 e dos Subprojetos de

Química do PIBID dos editais de 2007 e 2011); v) questionário II, tendo em vista a

Page 35: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

34

apreensão do modelo didático dos professores egressos com base no instrumento de Santos Jr

e Marcondes (2010).

Para Gonçalves (2011), as idas e vindas do material empírico ao teórico e vice-versa

são procedimentos usuais e desejáveis na pesquisa narrativa, pois:

Enquanto o pesquisador não se tornar impregnado das falas dos sujeitos

investigados, não consegue organizar os dados e fazer opções estruturais de análise

como, por exemplo, o estabelecimento de categorias, episódios ou princípios

(p.67) [grifo nosso].

A entrevista semiestruturada teve como finalidade colher relatos de experiências

concernentes às duas primeiras indagações orientadoras dessa pesquisa, que foram

organizadas em três blocos, a saber: I) Depoimento sobre a história de vida; II) Trajetórias de

formação inicial e continuada dos egressos e III) Saberes que subjazem à docência dos

egressos. A orientação dessa entrevista foi apoiada em Nóvoa (2010), pois no processo de

formação profissional a formação é sempre da própria pessoa que se forma, o que ocorre na

medida em que elabora compreensão sobre o seu percurso de vida e formação. Nesses termos,

por meio desses três blocos orientadores, considero o sujeito investigado como autor do seu

processo de formação, por meio da reflexão retrospectiva sobre seu percurso de formação.

Com a finalidade de identificar e compreender saberes científicos e saberes

pedagógicos de conteúdos químicos desses professores, propus a realização de dois momentos

de grupo focal9, centrado nos conceitos declarados pelos professores na entrevista

semiestruturada, como prioritários em sua prática docente na Educação Básica10, tais como:

modelos atômicos e ácidos e bases, com a implicação e a discussão de critérios

epistemológicos e teórico-metodológicos relativos aos seguintes aspectos: como ocorreu o

planejamento, a introdução, o desenvolvimento e a avaliação desses conceitos, e relacionando

seu ensino com assuntos ou temas da vivência dos educandos.

9 Os dois momentos do grupo focal foram realizados na mesma manhã do terceiro sábado do mês de agosto de

2015 na sala de estudos do Laboratório de Ensino e Pesquisa em Química – LabPEQ/UFMT. A opção da

realização do grupo focal no dia de sábado foi em virtude de ser o único dia e período em que todas as

participantes tiveram disponibilidade de se encontrar e as mesmas na realização do grupo fizeram a opção do

momento ser registrado apenas em áudio e não em vídeo. Dessa forma, se sentiriam mais confortáveis em

participar não sendo filmadas. 10 A opção de trabalhar no grupo focal com os conceitos que mais gostam de lecionar em detrimento dos

conceitos que sentem mais dificuldades está pautada em poder serem mais significativos os relatos de

experiências sobre os Saberes Científicos e Pedagógicos de Conteúdos Químicos desses conceitos ensinados,

podendo assim atingir o objetivo proposto da pesquisa.

Page 36: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

35

Posteriormente, após as transcrições das narrativas sobre ácidos e bases, foi aplicado

um questionário11 sobre os aspectos da temática que foi trabalhada, visando suplementar a

interação grupal.

Cenário da Pesquisa e Seleção dos Sujeitos

Em relação ao cenário da pesquisa, este diz respeito ao contexto do Curso de

Licenciatura em Química do campus Cuiabá da Universidade Federal de Mato Grosso, no

qual se inclui o Programa de Bolsa de Iniciação à Docência em Química da mesma

universidade. A justificativa pela escolha desse curso de licenciatura e do subprojeto

Química-PIBID está calcada na minha participação efetiva na formação inicial dos

licenciados participantes do curso, como professor das disciplinas de Práticas de Ensino de

Química (PEQ) e como coordenador do subprojeto Química – PIBID, no período de agosto de

2009 a fevereiro de 2013, participando, assim, das experiências de formação dos sujeitos

pesquisados.

Considerando que o meu ingresso como professor no curso de Licenciatura em

Química da UFMT ocorreu como substituto, em maio de 2009, e no mês de outubro do

mesmo ano tomei posse como professor de carreira na instituição, por meio de concurso

público, inicialmente tinha feito a opção de pesquisar as experiências de todos os licenciados

em Química formados nos períodos de 2009/1 a 2014/1, pois entendia, de forma primária, que

tinha participado das experiências formativas de todos os professores egressos nesse período.

A escolha por esse recorte temporal se deu em virtude de o primeiro semestre de

2009 corresponder a minha entrada como docente na universidade e o primeiro semestre de

2014 para fechamento do período, por eu ter me afastado das minhas atividades acadêmicas

para conclusão do doutorado, que vinha sendo cursado em serviço, com acúmulo de funções

acadêmicas e administrativas, tanto na graduação como na pós-graduação lato sensu. Tendo

esse período em mente, fui à busca do quantitativo de professores egressos no Sistema de

Informações de Gestão Acadêmica (SIGA) da UFMT e obtive um total de oitenta e oito

egressos nesse período, sendo que desse total, vinte e três egressos haviam participado do

PIBID em Química da UFMT, dos editais da DEB/CAPES 2007 e 2011, ano em que atuei

como coordenador do subprojeto.

11 A necessidade do questionário para complementar o grupo focal se deu em virtude das narrativas dos

episódios de aulas sobre a temática de ácidos e bases ter ficado muito no âmbito pragmático.

Page 37: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

36

Por compartilhar da mesma compreensão de Fraiha-Martins (2014) de que a pesquisa

de cunho qualitativo não traz, em primeiro plano, a quantidade analisada em sua

superficialidade, mas sim a análise verticalizada, rigorosa e minuciosa dos sujeitos da

pesquisa, compreendendo-os como organismos complexos imersos em um sistema igualmente

complexo, dos oitenta e oito professores egressos, decidi investigar os vinte e três professores

que participaram do PIBID, no período de 2009 a 2014. Na Tabela 1 são expressos os

quantitativos de egressos levantados no SIGA/UFMT.

Tabela 1: Quantitativo de Egressos do Curso de Licenciatura em Química da UFMT de 2009/1 a 2014/1.

FORMANDOS EM

LICENCIATURA EM QUÍMICA E

TAMBÉM EGRESSOS DO PIBID

FORMANDOS EM

LICENCIATURA EM QUÍMICA

NÃO PARTICIPANTES DO PIBID

TOTAL DE

EGRESSOS POR

SEMESTRE

2009/1 2 7 9

2009/2 3 5 8

2010/1 1 6 7

2010/2 6 9 15

2011/1 2 9 11

2011/2 1 2 3

2012/1 *** 3 3

2012/2 1 9 10

2013/1 5 8 13

2013/2 1 5 6

2014/1 1 2 3

Total de

Formandos

23 65 88

Fonte: Elaboração do autor, baseado nos dados do SIGA/UFMT (2014)

Ao delimitar a participação dos vinte e três professores egressos, e levando em

consideração o problema de pesquisa suscitado, a escolha desses professores não poderia ser

aleatória ou se justificar somente no fato de terem participado do PIBID. Quero dizer com

isso que há o critério da intencionalidade, pois determinados sujeitos podem ser capazes de

propiciar informações relevantes ao problema de pesquisa e aos objetivos propostos

(FRAIHA-MARTINS, 2014).

Essa intencionalidade investigativa me fez estabelecer outros critérios de seleção

definidos, quais sejam: i) professores/egressos que responderam ao questionário de

caracterização; ii) que atuaram e/ou estejam atuando com a disciplina de Química no

Ensino Fundamental e/ou Médio; iii) que estejam residindo em Cuiabá-MT ou Várzea-

Grande-MT; iv) que se propuserem a participar da presente pesquisa e assinarem o

termo de livre consentimento esclarecido.

Page 38: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

37

Tendo delimitado o perfil dos sujeitos que eu pretendia obter na presente pesquisa, o

passo seguinte foi começar a construir os textos de campo. A primeira tarefa foi de aplicar o

questionário para caracterizar os sujeitos, e ao catalogar o número de egressos do curso de

Licenciatura em Química pelo SIGA/UFMT, obtive acesso aos dados pessoais desses

licenciados como os endereços eletrônicos. De posse do endereço virtual dos vinte e três

egressos, enviei carta de apresentação da pesquisa, junto com o questionário por e-mail,

dando prazo de cerca de 20 dias para que retornassem o questionário respondido.

Nesse intervalo de tempo, a fim de fomentar a maior participação de todos, criei um

grupo fechado intitulado Pesquisa do Professor Marcel, na rede social Facebook, pelo qual

foram adicionados os vinte e três sujeitos. No grupo da rede social, coloquei a logomarca do

subprojeto Química – PIBID, explicando a finalidade e o objetivo da pesquisa que eu estava

realizando e manifestando o desejo de contar com a participação de todos. Chegado o dia da

entrega do questionário, recebi o retorno de sete professores egressos que haviam devolvido o

questionário respondido por e-mail. Fiz uma dilatação de prazo de mais dez dias e obtive mais

quatro questionários respondidos, totalizando onze participantes.

Caracterização dos Sujeitos

Dos onze egressos que responderam ao questionário de caracterização, oito são do

gênero feminino e três do gênero masculino; sete estão atuando como docentes de Química na

Educação Básica, sendo seis do gênero feminino e um do gênero masculino; uma está fazendo

Mestrado em Recursos Hídricos na UFMT; uma está fazendo curso de direito em uma

universidade privada de Cuiabá e, por isso, ambas não estão lecionando; dois estão atuando

como Químicos no mercado de trabalho, pois a estrutura curricular em Licenciatura em

Química, em que foram formados na UFMT propicia com que recebam as mesmas atribuições

de um bacharel junto ao Conselho Regional de Química (CRQ) de Mato Grosso, permitindo

assim exercerem atividades, como químicos.

Depois de feito esse levantamento de quem está atuando como professor, o passo

subsequente foi fazer contato por telefone com os sete professores/egressos, que atendiam os

critérios estabelecidos para participar da pesquisa, explicando novamente a finalidade e o

objetivo da investigação, e convidando-os para a realização da entrevista semiestruturada. Dos

sete professores/egressos habilitados a participar da pesquisa somente quatro

professores/egressos, sendo todas do gênero feminino, se propuseram a participar. Uma vez

aceito o convite, foi feito o agendamento de cada entrevista. Cada uma aconteceu no local de

Page 39: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

38

maior conveniência para as entrevistadas, como na escola em que trabalham, bem como na

própria residência ou na UFMT.

Apresento, a seguir, os quatro sujeitos12 participantes desta investigação e algumas

informações a respeito desses sujeitos, as quais foram registradas por elas mesmas, por meio

do questionário de caracterização entregue via correio eletrônico e obtidas, também, por meio

da entrevista semiestruturada. Nesse sentido, alguns termos estão descritos abaixo, tal qual

estavam no questionário e entrevista. O nome, que é fictício, para resguardar a identidade de

cada uma, e foi de escolha do pesquisador.

CURIE – 28 anos; Solteira; Egressa de escola pública Ensino Médio; Concluiu o curso de

Licenciatura em Química em 2011; Participou do PIBID-Química na UFMT por 02 anos;

Mestre em Educação pela UFMT, na linha de pesquisa de Educação em Ciências; Trabalhava

como professora no Ensino Médio em escola particular no município de Cuiabá-MT. Para

Curie, ensinar Química no Ensino Médio é: Formar o aluno para ser cidadão crítico,

preparando-o tanto para um curso superior se ele o desejar, quanto para outras atividades

da vida.

MAYER – 30 anos; Solteira; Egressa de escola pública Ensino Médio; Concluiu o curso de

Licenciatura em Química em 2010; Participou do PIBID-Química na UFMT por 01 ano; Era

Mestranda em Ensino de Ciências na linha de pesquisa em Ensino de Química do Mestrado

Profissional em Ensino de Ciências da UFMT; Trabalhava como professora no 9º ano do

Ensino Fundamental e Ensino Médio em escolas pública e particular no município de Cuiabá

- MT. Para Mayer, ensinar Química nas séries finais do Ensino Fundamental ou Ensino

Médio: Ensinar Química é desenvolver no aluno a capacidade de participar da sociedade,

pois esta é uma ciência que está presente no nosso cotidiano. Logo, há necessidade que o

cidadão tenha o mínimo de conhecimento químico para participar ativamente e criticamente

da concepção de construção científico-tecnológica.

12 Os nomes fictícios femininos foram dados às professoras referenciando mulheres que definiram novos

paradigmas e trouxeram significativas contribuições à ciência. Marie Curie (1867-1934) foi vencedora do

prêmio Nobel de Química, descobrindo os elementos tório, rádio e polônio, sendo a primeira mulher a ser

laureada com o prêmio. Maria Mayer (1906-1972) venceu o prêmio Nobel de Física por sua pesquisa sobre a

estrutura atômica. Rosalind Franklin (1920-1958) considerada uma das maiores biofísicas de todos os tempos

com a descoberta do formato helicoidal do DNA, base para as principais descobertas genéticas nos anos que se

seguiram. Lise Meitner (1878-1968) é considerada a descobridora da fissão nuclear. (CHASSOT, Áttico Inácio.

Nomes que fizeram a Química e quase nunca lembrados. Química Nova na Escola, n.5, Maio, p.21-23, 1997

&http://blogs.ne10.uol.com.br/mundobit/2015/03/07/10-cientistas-mulheres-que-fizeram-historia/).

Page 40: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

39

FRANKLIN – 29 anos; Casada; Egressa de escola pública Ensino Médio; Concluiu o curso

de Licenciatura em Química em 2010; Participou do PIBID-Química na UFMT por 02 anos;

Trabalhava como professora no 9º ano do Ensino Fundamental e Ensino Médio em escola

pública no município de Várzea-Grande - MT. Para Franklin, ensinar Química nas séries

finais do Ensino Fundamental ou Ensino Médio: É ensinar saberes científicos para que os

estudantes possam ter uma melhor leitura de mundo.

MEITNER – 28 anos; Solteira; Egressa de escola pública Ensino Médio; Concluiu o curso de

Licenciatura em Química em 2010; Participou do PIBID-Química na UFMT por 02 anos;

Trabalhava como professora no 9º ano do Ensino Fundamental e Ensino Médio em escola

pública no município de Cuiabá-MT. Para Meitner, ensinar Química nas séries finais do

Ensino Fundamental ou Ensino Médio: É trabalhar tudo aquilo que nós vivenciamos, como as

transformações que ocorrem nos materiais, pois tudo em nosso dia a dia como: alimentação,

vestimentas, as tecnologias, tudo tem a ver com a Química. Então, ensinar Química é ensinar

para a vida, ensinar para o futuro.

A seguir, apresento a metodologia de análise de resultados, pela impregnação nos

textos de campo e produção dos textos de pesquisa.

Análise de Resultados: Análise Textual Discursiva

Para analisar os textos de campo e produzir os textos de pesquisa por meio de

interpretações, em diálogo com a literatura (CLANDININ e CONNELLY, 2011), assumo a

Análise Textual Discursiva (MORAES e GALIAZZI, 2007), que corresponde a uma

metodologia de análise de informações de natureza qualitativa com o propósito de produzir

novas compreensões sobre os fenômenos e discursos, com um movimento interpretativo de

caráter hermenêutico, possibilitando novas compreensões sobre as narrativas investigadas.

A análise textual discursiva tem se mostrado especialmente útil nos estudos em que

as abordagens de análise solicitam encaminhamentos, que se localizam entre soluções

propostas pela análise de conteúdo e a análise de discurso (MORAES, 2003).

Moraes afirma que:

A análise textual parte de um conjunto de pressupostos em relação à leitura dos

textos que examinamos. Os materiais analisados constituem um conjunto de

significantes. O pesquisador atribui a eles significados sobre seus conhecimentos e

teorias. A emergência e comunicação desses novos sentidos e significados é o

objetivo da análise (2003, p. 193) [grifo nosso].

Page 41: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

40

De acordo com Moraes e Galiazzi (2007), a Análise Textual Discursiva expressa o

caminho do pensamento do pesquisador, portanto, trata-se de um processo singular e

dinâmico que cada pesquisador constrói, sem ponto delimitado de partida ou chegada. Nesse

sentido, o caminho do pensamento é construído no processo, pelo próprio pesquisador,

conferindo ampla liberdade de criar e de se expressar.

Ao me impregnar do material empírico em um processo de desconstrução, seguido

de construção do corpus13 da pesquisa, busquei identificar e isolar enunciados e produzir

textos, integrando nestes, descrição e interpretação, utilizando como base de construção o

sistema de categorias construído. Para Moraes e Galiazzi (2007), ao identificar enunciados

significativos nos textos e ao categorizar esses elementos unitários, o pesquisador está

encaminhando a produção de metatextos, destinados a construir os produtos de suas análises.

Em cada leitura feita dos elementos que constituíam o material, nessa fase analítica,

emergiam três sensores interpretativos de forma caótica, concernentes às perguntas

norteadoras e ao problema de pesquisa: formação inicial, desenvolvimento profissional e

saberes docentes (FRAIHA-MARTINS, 2014). Ao ser envolvido nessa explosão de ideias em

diferentes tempos, retoma-se o processo, periodicamente, no sentido de o pesquisador ser

desafiado a explicitar novas ideias a partir das anteriormente produzidas.

O momento da unitarização da análise do corpus da presente pesquisa se revelou ao

mesmo tempo, desconstrutivo e construtivo e propiciou a sensação de que tudo estava

desorganizado, tornando caótico o que estava ordenado. É a fase denominada pelos autores de

caldeirão caótico. No entanto, essa desorganização é o caminho para a organização do novo.

Dessa forma, na busca da organização do novo, os corpus de pesquisa, imersos inicialmente

em um caldeirão caótico no tratamento analítico feito pelo pesquisador, deram forma a três

grandes eixos temáticos que apresento neste trabalho de forma horizontal, sem níveis

hierárquicos, com o objetivo de não apresentar apenas somas ou agrupamentos de itens, mas a

organização das estruturas conceituais de teorização sobre os temas trabalhados que

contemplam o objeto de estudo exposto. A seguir, descrevo cada um dos eixos temáticos

emersos do material empírico.

Formação Inicial e Iniciação à Docência em Química na UFMT: Uma análise

documental: Este eixo narra a eclosão de um novo ramo da Química, a área de Educação

Química, e traz o histórico da constituição da formação inicial de professores de Química da

13 Conjunto de textos submetidos à análise. Esse conjunto de textos representa uma multiplicidade de vozes que

se manifestam nos discursos investigados. “O pesquisador precisa estar consciente de que, ao examinar e analisar

seu corpus, é influenciado por todo esse conjunto de vozes, ainda que sempre fazendo suas leituras a partir de

seus próprios referenciais” (MORAES e GALIAZZI, 2007, p. 113).

Page 42: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

41

UFMT do Campus Cuiabá e a política de valorização e incentivo à docência por meio do

PIBID na UFMT e, especificamente, do subprojeto da Licenciatura em Química, do qual

participaram os sujeitos de pesquisa envolvidos. Para construir esse movimento de formação

inicial, recorro à análise documental de registros do curso, tais como: o Projeto Pedagógico do

Curso de Química da estrutura curricular de 1997/1 e 2010/1, bem como o contexto do PIBID

na UFMT e do Subprojeto Química – PIBID/UFMT na formação inicial dos sujeitos

investigados.

Educadores Químicos Iniciantes e os Saberes Necessários à Atuação Profissional:

Das Narrativas de Si a Modelos Didáticos Adotados: Contextualizo este eixo temático de

análise, fazendo revisão sistemática sobre os saberes necessários à docência, com o objetivo

de fundamentar teórico-conceitualmente um foco norteador desta investigação sobre saberes.

Busco, também, trazer análises das trajetórias de formação inicial e continuada dos sujeitos

dessa pesquisa, relatadas por eles durante a entrevista semiestruturada, bem como narrativas

expressas nas dinâmicas do tempo de formação e de história, buscando evidenciar como essas

professoras constroem, trabalham e expressam os saberes necessários à docência, buscando

construir, à guisa de síntese, o modelo didático de cada professora colaboradora da pesquisa.

Saberes Científicos e Pedagógicos de Conteúdos Químicos: Episódios de Aulas do

Ensino Médio: Neste eixo temático de análise, contextualizo os saberes científicos no

contexto do ensino de Química, os aspectos epistemológicos na perspectiva de Bachelard

(1996) e busco a compreensão, na perspectiva de Shulman (1986), de como se configuram os

Saberes Científicos e Saberes Pedagógicos dos Conteúdos Químicos, subjacentes à docência

dos sujeitos investigados, por meio dos relatos de episódios de aulas com conceitos químicos

do Ensino Médio. Para cada conceito, trago a literatura Química atual pertinente. Para a

construção deste eixo de análise, o material empírico analisado encontra-se, especialmente,

nos diálogos mantidos com os sujeitos durante o último bloco da entrevista semiestruturada e

o grupo focal.

Ao buscar organizar um conjunto de ideias na intenção de construir uma teia de

significação por meio da pesquisa, esta representa apenas mais uma interpretação do

fenômeno investigado, capaz de produzir nova significação a quem esta atingir (FRAIHA-

MARTINS, 2014).

Apresento, na próxima seção, o primeiro eixo temático de análise.

Page 43: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

42

III - FORMAÇÃO INICIAL E INICIAÇÃO À DOCÊNCIA EM

QUÍMICA NA UFMT: UMA ANÁLISE DOCUMENTAL

A apropriação que cada pessoa faz do seu patrimônio existencial através de uma

dinâmica de compreensão retrospectiva é um fator de formação (António Nóvoa).

Nesta seção, apresento a eclosão de um novo ramo da Química, a Educação Química,

em termos nacionais e locais. Para tanto, consulto a legislação vigente, em termos brasileiros

e institucionais, considerando aspectos evolutivos do curso de Licenciatura em Química da

UFMT, em diálogo com a literatura pertinente, desde sua criação até o contexto de formação

dos sujeitos investigados, participantes do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à

Docência na UFMT e o seu Subprojeto Química.

Um dos caminhos por mim escolhidos para a minha formação inicial de pesquisador,

como educador químico, foi a escolha consciente pela área de Educação Química. Consoante

com isto, faço um breve histórico da constituição da área de Educação Química no Brasil,

considerando-o pertinente neste trabalho de tese, pois nessa área a que pertenço, mais que em

outras áreas da Química, é preciso lutar pelo seu reconhecimento externo (principalmente dos

agentes financiadores de pesquisas) e interno (junto à comunidade epistêmica dos químicos),

como afirma Chassot (2014, p. 55): “em nosso meio pode-se afirmar que o reconhecimento

dos que nos são próximos tem sido mais árduo de conquistar que dos externos”. A afirmação

desse educador químico foi feita pela dura experiência pessoal pela qual passou em ver

diferentes oportunidades e iniciativas nessa área sendo bloqueadas. Essa triste experiência faz

parte da vida do pesquisador e de muitos educadores químicos no Brasil ao ter sempre que

lutar dentro da própria comunidade por reconhecimento.

Um maior reconhecimento da área de Educação Química, nas palavras de Schnetzler

e Aragão (1995), depende fundamentalmente da divulgação da sua capacidade de resolver

problemas que não podem ser resolvidos pelas outras áreas da Química, já que o domínio do

conhecimento químico é uma condição necessária, mas não suficiente para se alcançar um

bom processo de ensino-aprendizagem nessa ciência.

Pertencer à área de Educação Química é diferente de situar-se em outras áreas da

Química, que se preocupam com interações de átomos e moléculas, com a dinâmica e

mecanismos de transformações químicas, o que, sem dúvida, é relevante. Contudo, como

integrante da área em Educação Química, além de todas essas preocupações inerentes ao ramo

da Química, há o envolvimento com interações entre pessoas (estudantes e professores) e

Page 44: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

43

destas com o conhecimento na dinâmica de construir uma educação de qualidade e educar

para a cidadania, por meio do ensino e da aprendizagem da Química.

A identidade da área de Educação Química como campo de investigação é marcada

pela especificidade do conhecimento científico, que está na raiz dos problemas de ensino e

aprendizagem investigados. Schnetzler (2002) argumenta que:

Esse campo de investigação não tem o propósito de se buscar métodos didáticos

mais adequados ao ensino daquele conhecimento, mas sim, de investigar processos

que melhor deem conta de reelaborações conceituais ou transposições didáticas

necessárias ao seu ensino em contextos escolares determinados. Isso significa que o

ensino de ciências/química implica a transformação do conhecimento

científico/químico em conhecimento escolar, configurando a necessidade de criação

de um novo campo de estudo e investigação, no qual questões centrais sobre o que,

como e porque ensinar ciências/química configura o cerne das pesquisas (p. 15).

Diante desse contexto, constato que a área de Educação Química no Brasil, em

termos de pesquisas é muito jovem, tendo mais de cinquenta anos em termos internacionais e

cerca de trinta e oito anos em termos brasileiros, já que as primeiras pesquisas em ensino de

Química no Brasil datam de 1978. Devido ao pouco tempo como área de investigação, é

natural que a Educação Química, tanto em termos internacionais como nacionais, não mereça

ainda, por parte da comunidade Química, como um todo, a mesma credibilidade dos outros

ramos da Química, como química orgânica, físico-química, analítica, dentre outros.

De acordo com Schnetzler (2002), os pesquisadores precursores da área de Educação

Química se sentem orgulhosos de terem dado os primeiros passos nesse novo campo de

pesquisa no Brasil. A autora revela que sem Áttico Chassot, Letícia Parente, Luiz Otávio

Amaral, Luiz Roberto Pitombo, Mansur Lufti, Maria Eunice Ribeiro Marcondes, Otávio

Maldaner, Roberto Ribeiro da Silva, Romeu Rocha-Filho, Roque Moraes, a própria Roseli

Pacheco Schnetzler, dentre outros, certamente a área de Educação Química no país não teria

ido tão longe como foi, formando e lançando novas gerações para a meta de constituir a área

de pesquisa em ensino de Química no Brasil. Segundo esta autora, o que unia esses

pesquisadores e educadores pioneiros era a necessidade, a condição e a sensação de

ostracismo que julgavam injustas e a crença na educação em Química para um país melhor.

Nesse sentido, Schnetzler (2010) revela que no espaço de apenas três décadas houve

a constituição de uma comunidade de educadores químicos brasileiros, que vêm

desenvolvendo pesquisas em uma nova área da Química, a Educação Química. E essas

pesquisas trazem os seguintes temas: identificação de concepções alternativas dos alunos e

propostas de modelos de ensino que levem em conta, resolução de problemas, experimentação

Page 45: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

44

e práticas de laboratório, análise de materiais didáticos, relações entre ciência, tecnologia,

sociedade e ambiente em processos de ensino-aprendizagem, linguagem e comunicação, a

problemática e o emprego de modelos e analogias, concepções epistemológicas de

professores, proposta para uma formação docente mais adequada, questões curriculares e de

avaliação, e o papel das novas tecnologias de comunicação.

Um dado de grande relevância que evidencia o crescente desenvolvimento da

Educação Química, em nosso país, diz respeito às realizações sistemáticas de vários encontros

nacionais e regionais sobre o ensino de Química. Schnetzler e Aragão (1995) relatam o

histórico da realização desses encontros como a realização anual dos EDEQ (Encontro de

Debates sobre Ensino de Química), desde 1980, e dos ECODEQC (Encontro Centro-Oeste de

Debates sobre Ensino de Química e Ciências), a partir de 1989; dos ENNEQ (Encontro Norte-

Nordeste de Ensino de Química) a partir de 1990, e dos ESEQS (Encontro Sudeste de Ensino

de Química) desde 1992, que ocorrem à semelhança dos ENEQ (Encontro Nacional de Ensino

de Química), bianualmente, sendo que este último começou a fazer história em 1982.

Com o desenvolvimento da área de Educação Química no Brasil, é de se esperar que

as pesquisas tenham gerado avanços significativos no conhecimento e que possam contribuir

de forma potencial, para a melhoria do trabalho docente em Química no país (SCHNETZLER

e ARAGÃO, 1995).

De acordo com Chassot (2001), Educação Química é uma área de fronteira entre a

Educação e a Química, que se preocupa prioritariamente com o significado do ensino de

Química nos currículos dos diferentes graus de ensino. O educador químico é o profissional

que possui formação acadêmica em Química e que usa essa ciência para fazer Educação. O

autor ainda exemplifica que o professor ou a professora de Química, mesmo que não

vinculado a um grupo de pesquisa, mas que utiliza a sua sala de aula e faz dela um laboratório

para aprimorar sua ação docente, é educador químico.

Nessa perspectiva, Maldaner (2008) complementa que em uma visão ampliada,

educadores químicos são sujeitos sociais ou pessoas que lidam e trabalham com as coisas da

Química e sua atenção volta-se mais a aspectos como:

Processos de ensino e aprendizagem em Química; compreensão da Química como

ciência; responsabilidade social no uso dos conhecimentos da Química; currículos

de formação em Química; evolução/revolução química na história humana; Química

e qualidade de vida; ética na pesquisa química; conhecimentos profissionais dos

professores de Química (p. 271).

Page 46: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

45

O objetivo central de trabalhar com os conhecimentos químicos e fazer Educação

com esses conhecimentos, segundo pesquisa realizada por Santos (1992), envolvendo vários

educadores químicos brasileiros, é de contribuir para a formação do cidadão, o que implica a

necessidade de vincular o conteúdo químico com o contexto social em que o estudante está

inserido. Essa concepção de ensino de Química, de acordo com Schnetzler (2008), traz ecos

de um movimento iniciado em educação em Ciências, no âmbito internacional, desde o final

da década de 1970, que defende a inclusão do ensino de CTSA – Ciência, Tecnologia

Sociedade e Ambiente nos cursos de Ciências.

A Licenciatura em Química é o locus privilegiado para a formação de educadoras e

educadores químicos no Brasil. Adiante, apresento um breve histórico da criação do curso de

Licenciatura em Química na UFMT do campus Cuiabá até a implantação da estrutura

curricular do curso que ficou vigente de 1997/1 a 2009/2, por meio da qual tanto eu como os

sujeitos investigados da presente pesquisa fomos formados como licenciados em Química.

Apresento, também a atual configuração do curso de Licenciatura em Química, com a nova

estrutura curricular, que entrou em vigência em 2010/1, bem como o contexto do PIBID na

UFMT e na formação inicial dos sujeitos investigados.

O Curso de Licenciatura em Química da UFMT campus Cuiabá: Situando o Contexto

da Formação dos Sujeitos Investigados

O primeiro curso de Química da UFMT foi criado no ano de 1972 com atribuição de

bacharelado, juntamente com o Centro de Ciências Exatas e Tecnológicas (CCET), com a

finalidade de proporcionar qualificação profissional com conhecimentos técnicos profundos

aos alunos do curso de Química e de outros cursos que demandassem conhecimentos

químicos. O CCET, em sua criação, foi composto pelos Departamentos de Engenharia Civil,

História Natural, Matemática, Física e Química, este acoplando os dois ramos da ciência em

um único Departamento (UFMT, 1997).

No ano de 1974, os cursos de Química, Física, Matemática e História Natural foram

transformados em cursos de Licenciatura em Ciências de curta duração com habilitação em

Química, Física, Matemática ou História Natural. Após a conclusão da Licenciatura em

Ciências de curta duração o estudante, para obter a habilitação em Química de duração plena,

devia cursar mais oitenta créditos equivalentes a 1200 horas, e de acordo com a estrutura

curricular do curso de Ciências com habilitação em Química, lhe era conferido o direito de

exercer o magistério na Educação Básica (na época, o 1° e 2° graus).

Page 47: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

46

Passados onze anos, no ano de 1985, o curso de Licenciatura em Ciências de curta

duração, com suas respectivas habilitações específicas passou a ser Licenciatura Plena em

Matemática, em Biologia, em Física e em Química. E foram instituídos os cursos de

Licenciatura Plena em Química e o Bacharelado em Química. Porém, o estudante só poderia

cursar o bacharelado após a conclusão do curso de Licenciatura Plena em Química. Tal

condição gerou questionamentos, à época, quanto à especificidade de cada profissional,

atribuindo malfazeja fama de trampolim ao curso de licenciatura (UFMT, 1997).

No ano de 1990, a modalidade Bacharelado em Química ficava desvinculada da

licenciatura plena e, após a conclusão das disciplinas do 1º e 2º semestres, o estudante deveria

optar por uma das duas modalidades. Após essas mudanças, o curso de Licenciatura Plena em

Química e o curso de Bacharelado em Química da UFMT foram reconhecidos pelo Ministério

da Educação e do Desporto (MEC), por meio da Portaria n° 1.521, de 21 de outubro de 1993

(UFMT, 1997).

Finalmente, em 1997, os dois cursos foram totalmente separados e apresentados

dessa forma no edital do vestibular da Universidade Federal de Mato Grosso, constituindo-se,

a partir desse momento, em dois cursos distintos, ficando a escolha a critério do estudante, no

momento de sua inscrição no processo seletivo de ingresso à UFMT.

No que concerne à matriz curricular do curso de Licenciatura em Química, a

Resolução CONSEPE n° 65, de 1985, estabelecia uma carga horária de 3.315 h/aula que foi

alterada pela Resolução CONSEPE nº 24, de 1990, passando para carga horária de 3.375

h/aula, o que foi alterado novamente para 3.405 h/aula que deviam ser concluídas em um

período máximo de seis anos, pela Resolução CONSEPE nº 11, de 05 de fevereiro de 2001.

As disciplinas foram agrupadas em cinco blocos para o curso de Licenciatura em

Química, a saber:

Bloco I) Disciplinas de Formação Geral (Cálculo Diferencial e Integral I, II e II,

Introdução à Ciência da Computação, Probabilidade e Estatística, Vetores e

Geometria Analítica, Física Experimental I, II e III, Biologia, Filosofia da Ciência,

Mineralogia, Legislação e Ética Profissional), Bloco II) Disciplinas de Formação

Profissional ( Química Geral I e II, Química Orgânica I, II, III e IV, Química

Inorgânica I, II e III, Química Analítica I, II, III e IV, Físico-Química I, II, III e IV,

Bioquímica Geral, Química Bromatológica, Química do Ambiente), Bloco III)

Disciplinas Pedagógicas (Psicologia da Educação V e VI, Didática III, Organização

e Funcionamento da Educação Básica, Bioquímica Educacional e Práticas de Ensino

de Química I, II e III), Bloco IV) Disciplinas Optativas (Bioquímica Avançada,

Físico-Química IV, Inglês Técnico, Língua Portuguesa, Química Analítica V,

Cálculo Numérico), e Bloco V) Disciplinas de Legislação Específica (Educação

Física I e II). (UFMT, 1997, p.26, grifo nosso).

Page 48: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

47

Pode-se perceber que essa estrutura curricular, vigente de 1997/1 a 2009/2, adotava o

esquema 3+1 de formação14, ou seja, havia polarização entre bacharelado e a licenciatura.

Sobre esse modelo de formação, Schnetzler (2008) tece severas críticas, pois de acordo com

essa educadora e pesquisadora em Educação Química, a formação propiciada na maioria dos

cursos de Licenciatura em Química do Brasil, por muitos anos, parecia estar pautada em uma

visão simplista, qual seja, a de que ensinar é fácil, bastando saber o conteúdo químico e

dominar algumas técnicas pedagógicas. Essa visão, de acordo com a pesquisadora:

É reforçada nas aulas de disciplinas de conteúdos químicos pela adoção do modelo

de ensino-aprendizagem centrado na transmissão-recepção, pela ausência e

despreocupação dos formadores (professores universitários) com reelaborações

conceituais dos conteúdos que ministram para que estes pudessem se tornar

disponíveis para serem ensinados pelos futuros professores nas escolas média e

fundamental, livrando-os de serem adotados por livros didáticos de Química

tradicionais (p.25-26).

Para Schenetzler (2008), esse modelo de formação não integra as disciplinas de

conteúdos químicos com as disciplinas pedagógicas, concebe e constrói a formação do

professor como técnico, por ser pautada na racionalidade técnica15 e entende a atividade

profissional como essencialmente instrumental, sendo esta dirigida para a solução de

problemas mediante a aplicação de teorias e técnicas, conforme expresso por Schön (1992).

Pérez Gómez (1992) explicita que a racionalidade técnica é uma concepção

epistemológica da prática que foi herdada do positivismo e que prevaleceu durante todo o

século XX, servindo de referência para a educação e socialização dos profissionais, de um

modo geral, e dos docentes em particular. O autor complementa que “segundo a racionalidade

técnica, a atividade profissional é, sobretudo, instrumental, dirigida para a solução de

problemas mediante a aplicação rigorosa de teorias e técnicas científicas” (p.96).

De acordo com Schnetzler (2004), os únicos momentos da formação que procuram

fazer a ligação entre os conhecimentos do conteúdo específico e o conhecimento pedagógico

para a realização do processo de ensino e aprendizagem, implicando transformações dos

conhecimentos científicos apreendidos nas disciplinas específicas em conhecimentos

escolares são as Práticas de Ensino e similares. Nesta disciplina, o professor formador,

normalmente, apresenta formação na disciplina específica em questão e pós-graduação na

14 Saviani (2006) explícita que o “esquema 3+1” foi adotado nas organizações dos cursos de licenciaturas e

Pedagogia (três anos para o estudo das disciplinas específicas e um ano para a formação didática) foi

estabelecido em todo o país por meio do Decreto-Lei n. l.190, de 04 de abril de 1939. 15 Para Fiorentini et al. (1998), a “racionalidade técnica” pressupõe que o professor deve ter primeiro uma

formação teórica-técnica para, posteriormente, fazer da prática uma instância de aplicação da teoria ou das

prescrições técnicas.

Page 49: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

48

área de educação, sendo tal aspecto o que tenta fazer a ponte de ligação entre os dois eixos da

formação, que permaneceram caminhando em paralelo durante toda a licenciatura.

No que tange à Licenciatura em Química, cabe registrar o seu desprestígio, quando

comparada com dois outros cursos de graduação da UFMT nos dias atuais: Bacharelado em

Química com Atribuições Tecnológicas e Engenharia Química. Chassot (2014) expressa que

por muito tempo a licenciatura era apresentada como alternativa a estudantes que não

conseguiam fazer disciplinas avançadas de Química Inorgânica, de Química Orgânica ou de

Físico-Química, “para os quais se oferecia, como prêmio de consolação, a possibilidade de

fazer umas Didáticas” [grifo do autor] (p. 60). Defendo com o autor supracitado, que o

licenciado, mesmo que não vá operar com aparelhagem tão sofisticada quanto engenheiro

químico, nem trabalhar com produtos químicos tão puros quanto o bacharel em Química,

merece uma maior preparação e com melhor excelência, pois vai mexer na cabeça dos jovens

e adultos, ensinando-lhes uma nova maneira de ler o mundo com a linguagem química.

Na estrutura curricular de 1997/1 do curso de Química da UFMT16, as disciplinas de

Prática de Ensino de Química (PEQ) constituíram-se como componentes curriculares

principais na construção da identidade do educador químico, sendo exclusivas da área de

ensino de Química, também responsável pelo estágio supervisionado. Essas disciplinas, além

do estágio, são responsáveis por desenvolver, de maneira geral, atividades relacionadas com

estudos e práticas sobre: a reforma do Ensino Médio, segundo a LDB e as Diretrizes

Curriculares para o Ensino Médio; a reforma do Ensino Superior – apresentação e discussão

da proposta da reforma de ensino do Curso de Licenciatura em Química – habilidades

esperadas do (a) professor (a) de Química; elaboração e planejamento de curso; planejamento

de aulas e minicursos; Prática de Ensino e estágio supervisionado; regência (UFMT, 1997).

Com a finalidade de superar a racionalidade técnica da estrutura 3+1 da formação

dos licenciandos em Química dessa estrutura curricular de 1997/1, o grupo de docentes do

Laboratório de Pesquisa em Ensino de Química (LabPEQ) criou no ano de 2003, o projeto de

extensão com a realização da Semana de Minicursos das Práticas de Ensino de Química

(SEMIPEQ), que se encontra na XXVIII edição. Este evento tem por objetivo trazer os

estudantes do Ensino Médio de escolas públicas e privadas para o ambiente acadêmico da

16 No Departamento de Química do Instituto de Ciências Exatas e da Terra (ICET) da UFMT existem sete áreas

para atender os cursos que demandam as disciplinas de Química, em seus currículos, e os cursos de Licenciatura

em Química e Bacharelado em Química, sendo estas: Área de Química Analítica, Inorgânica, Orgânica, Físico-

Química, Bioquímica, Tecnológica e Ensino de Química. A área de Ensino de Química é responsável pelas

disciplinas pedagógicas que trabalham com os conhecimentos químicos e, atualmente, é composta por cinco

professores.

Page 50: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

49

UFMT, favorecendo, assim, maior interação entre universidade e escola. Nesses eventos, os

estudantes do Ensino Médio participam de minicursos ministrados pelos estudantes das

Práticas de Ensino. Ressalta-se que a partir do ano de 2009, com a implantação do Programa

Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID) Química no curso de Licenciatura em

Química da UFMT, os bolsistas do PIBID, além das atividades inerentes ao programa,

também ministravam minicursos na SEMIPEQ.

Na realização dos minicursos da SEMIPEQ, os temas abordados são variados e os

licenciandos, estudantes das Práticas de Ensino e/ou bolsistas PIBID em Química, procuram

títulos para os minicursos de modo a atrair os estudantes do Ensino Médio, como por

exemplo: Conhecendo homeopatia, Estudando os plásticos; Biodiesel; Drogas lúdicas e

viciantes; Água: o que você sabe além da fórmula; A Química dos produtos de beleza; Os

saberes populares e a Química; Fabricação de produtos de limpeza, A Química do Vagalume,

A Química do Chocolate, entre outros.

A avaliação dessa experiência da SEMIPEQ revelou importantes contribuições para

todos os envolvidos no processo. Contudo, é importante enfatizar a contribuição deste

formato de supervisão para a articulação entre teoria e prática a partir da experiência da

construção e aplicação dos minicursos. Inicialmente, os estudantes das Práticas de Ensino e

bolsistas PIBID apresentavam grandes dificuldades em articular os conhecimentos teóricos

desenvolvidos nas diferentes disciplinas do curso com as experiências vividas durante a

elaboração e execução desse tipo de extensão. As orientações periódicas por parte dos

docentes da área de ensino de Química são fundamentais para ajudá-los a superarem tal

fragmentação. Por isso, durante o processo da SEMIPEQ, os docentes da área de ensino de

Química esclareciam as dúvidas, debatiam as questões e pontos de vistas divergentes,

chamando à luz o acúmulo teórico que o curso lhes proporcionava. Ao mesmo tempo, os

estudantes das Práticas de Ensino e bolsistas PIBID, nesse contexto, sentiam-se mais à

vontade para expressar suas ideias e, também, liberdade para a construção de materiais

didáticos alternativos em temáticas que mais lhes agradavam no conhecimento químico.

A experiência narrada da SEMIPEQ tem proporcionado aos discentes licenciandos e

bolsistas do subprojeto Química-PIBID condições para reorganizar, integrar e aplicar os

conhecimentos adquiridos por meio da elaboração de material didático próprio e, muitas

vezes, inédito; da análise dos problemas e das dificuldades especiais do ensino de Química, da

inserção na comunidade por meio da regência de classe, realizadas em condições materiais e

físicas nem sempre necessárias e adequadas. No decorrer dessa atividade, o crescimento

intelectual é mútuo: os estudantes de licenciatura colocam em prática os métodos e técnicas

Page 51: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

50

de ensino abordados em sala de aula, com a supervisão do professor-orientador da disciplina,

sendo esta, uma forma de introduzir o futuro docente, de maneira confiante, no meio

educacional.

Após esse breve histórico da implantação da formação do educador químico na

UFMT do campus Cuiabá, em que descrevi a estrutura curricular do curso de Licenciatura em

Química vigente de 1997/1 a 2009/2, apresento, a partir de agora, a atual configuração do

curso de Licenciatura em Química com sua nova estrutura curricular, que entrou em vigência

em 2010/1 e que obteve no ano letivo de 2014 o conceito de excelência com a nota cinco (5,0)

no indicador de qualidade, que avalia os cursos superiores via o Conceito Preliminar de Curso

(CPC) proposto pelo INEP.

Consta no histórico do PPC da Licenciatura em Química, de 2009, que desde a

aprovação da nova LDB, nº. 9394/96, a Educação Brasileira vivenciou um enorme

movimento de reflexão, dirigido, especialmente, ao estabelecimento de novas diretrizes

curriculares em seus diversos níveis. Contudo, muito antes da implementação dessas

diretrizes, o curso de Química da Universidade Federal de Mato Grosso iniciou, precisamente

em 1994, um processo de avaliação do seu curso de formação de professores de Química para

Educação Básica, que culminou no trabalho intitulado: Avaliação Emancipatória do Curso

de Licenciatura em Química da UFMT, publicado em 2006 (SANTOS, 1996)17.

Essa avaliação emancipatória do curso, realizada por Santos (1996), evidenciou a

necessidade de reestruturação curricular baseada em vários aspectos, tais como: identidade do

curso de Licenciatura em Química como um curso que prepara o discente para o exercício do

magistério; simultaneidade da formação profissional docente; redução da carga horária total

do curso; mudança do regime acadêmico do curso; funcionamento do curso em um único

turno; oferecimento da disciplina Fundamentos Matemáticos, na primeira série, anterior à

disciplina de Física, oferecida na segunda série; oferecimento da disciplina; Projeto de Ensino

de Química, que deveria acontecer ao longo de todo o curso com apresentação final de

monografia; oferecimento de disciplinas de Prática de Ensino de Química e Estágio

Supervisionado em um total de 360 horas; oferecimento da disciplina Evolução dos Conceitos

e o resgate da história da construção dos conceitos científicos ao longo das disciplinas

(UFMT, 2009).

Mediante essa avaliação emancipatória foi constituída uma comissão de

reestruturação curricular, composta por representantes de diferentes áreas da Química e por

17 SANTOS, Lydia Maria Parente Lemos dos. Avaliação Emancipatória do Curso de Licenciatura Plena em

Química da UFMT. Dissertação de Mestrado em Educação Pública. Cuiabá: UFMT, 1996.

Page 52: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

51

três professoras da área de Ensino de Química na época composta pela professora aposentada

emérita do Departamento de Química Ms. Lydia Maria Parente Lemos dos Santos e as

professoras Dra. Irene Cristina de Mello e a Dra. Elane Chaveiro Soares. As discussões se

iniciaram a partir da seguinte questão: qual o perfil profissional que se deseja formar? Esse

debate ocorreu no interior das áreas (Físico-Química, Analítica, Orgânica, Inorgânica,

Bioquímica e Ensino de Química) e, posteriormente, entre estas.

Nesse mesmo período, em maio de 1998, o MEC solicitou à UFMT sugestões para a

elaboração das Diretrizes Curriculares dos cursos de Licenciatura em Química. A comissão,

então constituída pelo Colegiado do Departamento de Química da UFMT, elaborou um

documento que foi enviado ao MEC em dezembro de 1998 e que recebeu o seguinte título:

Pressupostos para a definição das Diretrizes Curriculares do Curso de Licenciatura em

Química. Esse documento apresentava algumas sugestões para as diretrizes curriculares

baseadas, essencialmente, no processo de avaliação realizado por Santos (1996).

No ano de 1999, durante o XXXIX Congresso Brasileiro de Química (CBQ) em

Goiânia, como reconhecimento do documento elaborado, o curso de Licenciatura em Química

da UFMT foi citado pelo representante do MEC participante do evento como o melhor curso

de Licenciatura em Química do Brasil. Na sequência, a comissão reorganizou o currículo do

curso de forma a inserir as disciplinas de Práticas de Ensino de Química, I, II e III, com carga

horária total de 300 horas para estrutura curricular antiga do curso de 1997/1 a 2009/2 como

já citado anteriormente (UFMT, 2009).

Com a instituição pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) das Diretrizes

Curriculares Nacionais (DCNs) para a Formação de Professores da Educação Básica, em nível

superior, curso de licenciatura, de graduação plena, mediante Resolução CNE/CP1, de 18 de

fevereiro de 2002, a comissão de reestruturação interrompeu o trabalho que estava em curso e

decidiu participar de um processo de entendimento e debate local e nacional dessas Diretrizes.

O PPC da Licenciatura em Química de 2009 revela que depois de um longo silêncio

e pouco consenso sobre as Práticas como Componente Curricular (PCC), bem como um

desencontro de opiniões sobre as 400 horas de estágio supervisionado, o curso retoma as

discussões em 2005, com a constituição de um novo grupo, mas com a manutenção de alguns

membros da comissão anterior. Essa comissão organizou imediatamente um Seminário de três

dias, intitulado: Reestruturação Curricular do Curso de Licenciatura em Química da

UFMT, para que os docentes, os discentes e os técnicos pudessem discutir os novos rumos do

curso, na perspectiva dessas novas diretrizes.

Page 53: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

52

Contudo, o rompimento com as estruturas curriculares anteriores, por parte da

comunidade acadêmica, apresentou-se como um dos prováveis aspectos para o não avanço

dos trabalhos da comissão e, à medida que a discussão sobre a atuação na formação dos

professores para Educação Básica não encontrou ressonância, mas, sobretudo, resistências

inclusive, entre membros da própria comissão. A negação da carga horária de práticas como

componentes curriculares e do estágio supervisionado provocou discussões ao longo de

alguns anos dentro do Departamento de Química da UFMT (UFMT, 2009).

No que tange ao quantitativo de carga horária destinada às práticas como

componentes curriculares e estágio supervisionado, Maldaner e Zanon (2010) complementam

que há espaços e tempos adequados para desenvolver a Educação Química na organização

curricular das licenciaturas atuais. Os autores corroboram que:

Para isso, competências e habilidades básicas de pesquisa educacional precisam ser

desenvolvidas. Se isso acontecer, as atuais 400 horas de Práticas de Ensino e 400 de

Estágio Supervisionado passam adquirir novos significados na formação de

professores. Há quem considere exagerado esse número de horas na atual estrutura

curricular das Licenciaturas. De fato, se não soubermos o que fazer na boa

distribuição dessas horas, elas parecem muitas. [...] Se não tivermos convicção sobre

a importância dessas horas, distribuídas ao longo do curso pelos contatos variados

com os conhecimentos próprios de professor, corremos o risco do retorno à antiga

fórmula 3 + 1 na organização das Licenciaturas (p. 359).

Diante desse contexto, e em um processo lento de reestruturação curricular, mas

considerado pela comissão de reestruturação necessária para o amadurecimento da forma de

entendimento da formação do licenciado em Química, o curso de Licenciatura em Química do

campus de Cuiabá foi, de 2005 até 2008, se reorganizando e teve o currículo discutido, em

uma constante troca dos membros da comissão de reestruturação.

Em janeiro de 2009, o curso de Licenciatura em Química do Campus Cuiabá recebeu

diligência do MEC instaurada no processo de “Renovação de Reconhecimento”. Nessa

diligência, o Ministério da Educação, mediante a sua Secretaria de Educação Superior (SESu)

e Diretoria de Supervisão (DESUP), solicitou a adequação da estrutura curricular, atividades

do curso, perfil do egresso e estágio curricular, em conformidade com as Diretrizes

Curriculares Nacionais. Essas solicitações foram atendidas e encaminhadas à Pró-Reitoria de

Ensino de Graduação (PROEG), que procedeu aos encaminhamentos necessários (UFMT,

2009).

Somente em sequência à resposta da diligência, que a comissão de reestruturação do

curso finalizou os trabalhos de reestruturação, sendo os documentos que balizaram o PPC da

Licenciatura em Química do campus Cuiabá de 2009 os seguintes:

Page 54: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

53

1-Resolução CNE/CP 1, de 18 de fevereiro de 2002, que institui as diretrizes

curriculares nacionais para a formação de professores da educação básica, em nível

superior, curso de licenciatura, de graduação plena; 2-Resolução CNE/CP 2, de 19

de fevereiro de 2002, que institui a duração e a carga horária dos cursos de

licenciatura, de graduação plena, de formação de professores da educação básica em

nível superior; 3-Resolução CNE/CES 8, de 11 de março de 2002, que estabelece as

diretrizes curriculares para os cursos de bacharelado e licenciatura em Química; 4-

Resolução 001/2003/CONAC/UFSJ, de 15 de janeiro de 2003, que determina a

obrigatoriedade do projeto pedagógico por curso e fixa diretrizes para elaboração de

tal projeto; 5-Legislação vigente sobre formação do profissional da Química

(Conselho Federal e Conselho Regional de Química), em especial a resolução

normativa no. 60 de 05 de fevereiro de 1982; 6-As normatizações dos conselhos

superiores da UFMT; 7- Lei no. 10.436 de 24 de abril de 2002, que dispõe sobre a

Língua Brasileira de Sinais – Libras; 8- Lei no. 10.861, de 14 de abril de 2004, que

institui o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior – SINAES; 9-

Portaria Normativa no. 40, de 12 de dezembro de 2007, que institui o e-MEC,

sistema eletrônico de fluxo de trabalho e gerenciamento de informações relativas aos

processos de regulação da educação superior no sistema federal de educação; 10-Lei

no. 11.788/2008, de 25 de setembro de 2008, que dispõe sobre o estágio (UFMT,

2009).

A atual estrutura curricular do curso de Licenciatura em Química do Campus Cuiabá

entrou em vigência no semestre de 2010/1, com uma carga horária total de 3.620 horas,

distribuídas da seguinte maneira:

Tabela 2: Distribuição da Carga Horária do Curso de Licenciatura em Química 2010/1

DISTRIBUIÇÃO CARGA HORÁRIA

Disciplina Obrigatória 2460 horas

Disciplinas Optativas Obrigatórias 120 horas

Práticas Pedagógicas como Componente Curricular 420 horas

Estágio Curricular Obrigatório 420 horas

Atividades Complementares 200 horas

Total 3620 horas

Fonte: UFMT (2009)

O PPC de Licenciatura em Química, campus Cuiabá (aprovado pela Resolução

CONSEPE nº 183 de 30 de novembro de 2009, e pela Portaria de Reconhecimento do MEC

nº 615 de 30 de outubro de 2014) apresenta proposta curricular procurando romper o modelo

3+1 de formação, revelando um esquema em que a prática é entendida como eixo dessa

preparação. Neste sentido, o contato com a prática docente no PPC aparece desde os

primeiros momentos do curso de formação e tem o entendimento de que no novo currículo da

Licenciatura em Química é importante que todas as disciplinas tenham vínculo com a

educação, de modo que, ao mesmo tempo em que contribuem para a formação relativa ao

conhecimento químico, terão como foco em como esse conhecimento químico entra, interage

e funciona na escola fundamental e média e em situações de educação não escolar.

Page 55: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

54

Nesse sentido, o exercício da Mediação Didática não deve ficar só a cargo dos

professores da área de ensino, mas sim de todos os professores das outras áreas que trabalham

no curso de formação de professor licenciatura. A prática como componente curricular - PCC,

em cada uma das disciplinas que abrigará, será uma reflexão sobre o conteúdo químico que

está sendo aprendido pelo graduando e que será ensinado por este, quando de sua atuação

profissional como professor. A PCC deve, pois, articular o conhecimento químico ensinado na

universidade com condicionantes, particularidades e objetivos deste conhecimento na

educação básica formal e em outros espaços não escolares de educação.

Segue a Tabela 3, para uma melhor visualização de como a carga horária da PCC foi

distribuída no currículo do curso de Licenciatura em Química.

Tabela 3: Distribuição da Carga Horária do PCC do Curso de Licenciatura em Química 2010/1

SEMESTRE DISCIPLINA CARGA HORÁRIA - PCC

PRIMEIRO Química Geral I 30 horas

SEGUNDO Instrumentação para o Ensino de Química I 60 horas

TERCEIRO Instrumentação para o Ensino de Química II 60 horas

Química Inorgânica I 30 horas

Química Orgânica I 30 horas

QUARTO Projeto de Ensino de Química 60 horas

Química Analítica Qualitativa 30 horas

SEXTO Bioquímica I 30 horas

SÉTIMO Toxicologia 30 horas

Tecnologias Educacionais para o Ensino de

Química

30 horas

Físico-Química IV 30 horas

CARGA HORÁRIA TOTAL DE PCC 420 horas

Fonte: UFMT (2009)

Por fim, o curso de Licenciatura em Química da UFMT campus Cuiabá com a sua

atual estrutura curricular tem a finalidade básica de formar profissionais reflexivos e aptos a

integrar o processo da Educação Básica, de maneira responsável, com participação ativa no

desenvolvimento de processos pedagógicos, principalmente, aqueles relacionados com o

conhecimento químico (UFMT, 2009).

Após esse breve histórico do contexto do universo de minha formação inicial e

profissional e, também, da formação inicial dos sujeitos desta pesquisa, dou a conhecer a

inserção do PIBID no contexto da UFMT e, mais especificamente, no curso de Licenciatura

em Química do campus Cuiabá com suas atividades iniciadas a partir do ano de 2009.

Page 56: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

55

O Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência na UFMT

A Universidade Federal de Mato Grosso participa do PIBID desde o lançamento do

primeiro edital18, cujo programa institucional está ancorado na Coordenação de Programas de

Formação Docente da Pró-Reitoria de Ensino de Graduação (PROEG). Para o

desenvolvimento do programa nos cursos de licenciatura, a UFMT dá a contrapartida da

instituição em espaços físicos, materiais permanentes e outros recursos que não são

financiáveis pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)19.

No Estado de Mato Grosso existe um grande déficit de professores habilitados para

atuar na Educação Básica e a UFMT é a IES responsável por parte considerável da formação

inicial de professores para trabalhar nas áreas de Códigos e Linguagens, Pedagogia, Ciências

Sociais, Matemática e Ciências Naturais20. A dificuldade na formação inicial dos professores

soma-se aos aspectos regionais do Estado por possuir grandes extensões territoriais, o que lhe

confere, em âmbito educacional, maiores desafios em todos os aspectos, sobretudo na

formação inicial. Associam-se a esses aspectos outros que contribuem para tornar o ensino

mais deficitário, tais como: baixa remuneração do corpo docente; insuficiência na formação

continuada dos professores; condições escolares desfavoráveis; problemas de gestão escolar,

dentre outros. Esse quadro, de acordo com Mello (2012), tem desencadeado muitos males, tais

como: violência, desvalorização da escola e do professor perante os educandos e suas

famílias, evasão escolar e, sobretudo, baixo nível de aprendizagem. Diante desse panorama,

inerente à formação inicial no Estado de Mato Grosso, o incentivo à docência por parte do

PIBID, ao menos em sua formação inicial, nas áreas supracitadas, torna-se altamente

relevante para o Estado de Mato Grosso.

O PIBID da UFMT envolve os campi de Cuiabá, Barra do Garças, Rondonópolis e

Sinop em todas as licenciaturas presenciais e a licenciatura em Pedagogia a distância. O

projeto institucional do PIBID/UFMT está alicerçado por alguns eixos norteadores que

formam uma espécie de engrenagem, que orienta e articula as atividades dos subprojetos,

sendo estes: Programa de Desenvolvimento Institucional (PDI), Diretrizes Curriculares

Nacionais para o Ensino Médio (DCNEM), Avaliação Emancipátória, Interdisciplinaridade,

18 Edital nº 01/2007 – Diretoria de Educação Básica Presencial (DEB)/CAPES. 19 A CAPES foi criada por Anísio Teixeira em 11 de julho de 1951, pelo Decreto nº 29.741 com a finalidade de

garantir a existência de pessoal qualificado em quantidade suficiente para suprir as necessidades e demandas dos

empreendimentos públicos e privados, visando o desenvolvimento do Brasil e concentrou-se durante décadas, na

Educação Superior, em especial a pós-graduação stricto-sensu, desempenhando papel fundamental na expansão

e consolidação dos programas de pós-graduação em todos os estados da federação. 20 Os cursos de Licenciatura em Química e Física são ofertados somente por IES da rede federal de ensino,

UFMT e IFMT.

Page 57: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

56

Seminários Integradores e a pesquisa como princípio formativo. Observando os eixos

norteadores do projeto institucional do PIBID/UFMT, nota-se que está em consonância com a

concepção de formação que Nóvoa propõe: “A formação passa pela experimentação, pela

inovação, pelo ensaio de novos modos de trabalho pedagógico, a formação passa por

processos de investigação, diretamente articulados com a prática”(1992, p. 28).

A Figura 1, esboça o desenho metodológico do programa:

Figura 1: Desenho estratégico/interacionista do Programa PIBID

Fonte: Elaboração do autor, baseado em DEB/CAPES (2013a)

A reconstrução de uma nova cultura educacional que o PIBID pretende alcançar está

pautada em pressupostos teórico-metodológicos que articulam teoria-prática, universidade-

escola e formadores-formandos. Nesse sentido, e pautado no terceiro princípio pedagógico do

PIBID, que trata de criar inovações na educação, defendo, com Imbernón (2011), que o

professor não deve ser um técnico para desenvolver ou implementar inovações prescritas, mas

deve converter-se em um profissional, que participe de forma crítica e ativamente no

verdadeiro processo de inovação e mudança, sempre partindo do seu próprio contexto em um

processo dinâmico e flexível. O autor defende que se deve considerar o profissional da

educação:

Como um agente dinâmico cultural, social e curricular, que deve ter a permissão de

tomar decisões educativas, éticas e morais, desenvolver o currículo em um contexto

determinado e elaborar projetos e materiais curriculares em colaboração com os

colegas, situando o processo em um contexto específico controlado pelo o próprio

coletivo (IMBERNÓN, 2011, p. 24).

Saberes Prévios sobre a Docência e

Representações sociais

Contexto e Vivência Conhecimentos

Teórico-Práticos

Saberes da Pesquisa e Experiência Acadêmica

da Formação de Professores

Colabora para a Construção de

uma Nova Cultura

Educacional

Page 58: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

57

Os subprojetos das licenciaturas específicas da UFMT devem apresentar como ponto

de partida a dimensão interdisciplinar e transdisciplinar, instituindo os necessários coletivos

organizados, como propostos nos PCNEM, PCN+, OCNEM e Orientações Curriculares do

Estado de Mato Grosso. Essa orientação à constituição das propostas dos subprojetos a serem

desenvolvidos está subsidiado pela experiência inovadora do curso de Licenciatura em

Ciências Naturais e Matemática da UFMT que é a de promover, por meio de um trabalho

interdisciplinar e transdisciplinar, ações curriculares que proporcionem o diálogo entre

professores das disciplinas das áreas envolvidas no PIBID, na perspectiva de construirem

propostas pedagógicas, que busquem a contextualização interdisciplinar, social e cultural.

Nessa perspectiva, o objetivo dos subprojetos em cada área específica é de incrementar

experiências inovadoras, com o objetivo de consolidar práticas diferenciadas na formação dos

licenciandos (NÓVOA, 1992).

O projeto institucional PIBID/UFMT estabelece relações com a identidade da

política institucional e encontra-se orientado por alguns objetivos como: ampliar a oferta e

melhorar a qualidade do ensino de graduação e de pós-graduação; fortalecer o processo de

inclusão social; ampliar a articulação com a sociedade e contribuir da ambiência universitária.

Em decisão coletiva, institui-se no PIBID/UFMT, um conselho deliberativo, composto por

representantes dos membros participantes, com o objetivo de deliberar sobre as mais variadas

questões, sobretudo as relacionadas à aplicabilidade dos recursos disponíveis, tendo o mesmo

intuito à figura do pibidiano voluntário, que embora não receba bolsa, possui atribuições

claramente definidas nos subprojetos, participam também, como colaboradores eventuais ou

voluntários, os professores das escolas da Educação Básica e docentes da UFMT (MELLO,

2012).

De acordo com Mello (2012), as ações do PIBID na UFMT são variadas como:

Definição da política de execução do PIBID/UFMT com os coordenadores dos

subprojetos; seleção dos bolsistas e professores supervisores; constituição de grupos

de apoio, nas escolas e na universidade; socialização do projeto institucional nas

escolas envolvidas; organização e execução dos Seminários Integradores, de forma a

realizar integração entre os participantes, com a pós-graduação e com os

supervisores de estágio supervisionado das licenciaturas envolvidas, na UFMT;

levantamento de pesquisas e diagnósticos educacionais relativas às áreas específicas

em Mato Grosso; realização do diagnóstico educacional nas escolas; organização e

execução dos Ciclos de debates (envolvendo, inclusive, a pós-graduação) e definição

das ações coletivas; publicação das atividades do PIBID/UFMT no Portal do

Professor do MEC, dentre outros (p. 17-18).

Page 59: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

58

Nessa perspectiva, Nóvoa contribui dizendo que: “a troca de experiências e a partilha

de saberes consolidam espaços de formação mútua, nos quais cada professor é chamado a

desempenhar, simultaneamente, o papel de formador e de formando” (1992, p. 26).

Nas atividades dos seminários integradores do PIBID foram expressas também

algumas dificuldades na execução e desenvolvimento dos subprojetos, tais como: articulação

dos horários dos bolsistas, supervisores e coordenadores de área, haja vista, que alguns cursos

de licenciatura ocorrem em período integral, atrasos eventuais nos pagamentos das bolsas e

liberação da verba de custeio para o desenvolvimento dos subprojetos, a alta rotatividade dos

bolsistas, as dificuldades dos coordenadores de área em articularem projetos e atividades inter

e transdisciplinares, dentre outros.

Diante dos apontamentos significativos já vivenciados pelo programa, reconhece-se

este como uma iniciativa, por parte do governo federal, em valorização no ingresso e

permanência na docência aos estudantes de licenciatura, pois se sabe que essa valorização

perpassa outros fatores.

Na pesquisa empreendida por Gatti (2013) sobre Valorização da docência e

avaliação do trabalho docente, a pesquisadora revela que a atividade docente, de modo mais

abrangente, é representada como carregada socialmente por sinalizações contraditórias e que

têm se mantido ao longo de décadas. Por exemplo, pesquisas empíricas recentes mostram

como os jovens têm uma representação contraditória em relação à figura dos professores. Essa

representação é composta, de um lado por uma imagem positiva do papel do professor para a

sociedade e para sua própria educação, e de outro, a imagem de seu baixo reconhecimento

como profissional, em função de sua carreira ser pouco promissora, em termos financeiros, e

pelas dificuldades visualizadas em seu exercício profissional, dadas as condições inóspitas de

trabalho que lhes são oferecidas e o comportamento e motivações das crianças e jovens na

atualidade.

A valorização social dos professores, nesse sentido, passa por uma reconstrução

sociocultural dessas representações, em forma menos ambígua ou contraditória, e esse

movimento depende de condições concretas relacionadas ao contexto de formação e trabalho

dos docentes na Educação Básica. A mudança em representações sociais é um processo sócio-

histórico-cultural complexo e lento, especialmente, quando uma representação perdura por

longo tempo sem ser abalada por fatos de impacto efetivo e duradouro. Gatti explicita que:

Page 60: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

59

A representação de não valorização da docência na Educação Básica vem

perdurando uma vez que a constituição sócio-histórica e política de elementos para a

superação e reconstrução dessas representações sociais não tem alcançado

efetividade real. A gestão pública da educação tem faltado, em seus vários níveis,

um projeto articulado de formação docente e de trabalho nas escolas, com política

bem estruturada, organizada e planejada. A educação escolar pública, pela forma

que é realizada nas diferentes comunidades, favorece a construção de uma imagem

fragmentada de educação, empobrecida pela condição oferecida a seus professores e

alunos (2013, p. 155).

Neste sentido, a pesquisadora revela que valorizar o magistério com políticas

coerentes e convergentes, com apoio efetivo aos docentes que estão atuando e futuros

professores é o mote, e se apresenta como um dos vários caminhos rumo a essa valorização.

Sendo assim, o PIBID se revela como uma política de fundamental importância no cenário

nacional na trajetória dessa valorização à docência.

Tive a intencionalidade, com esta breve descrição do Programa Institucional de

Bolsa de Iniciação à Docência, como parte de uma política nacional de formação de

profissionais do magistério da Educação Básica na UFMT, contextualizar um dos contextos

formativos dos sujeitos pesquisados. Este esclarecimento se justifica pelo fato de não estar

estudando a proposta política, em si, mas por ter convicção de que a proposta não garante que

as melhorias pretendidas na formação e no ensino da Educação Básica se efetivarão, pois há

muitas interferências nos locais de trabalho dos professores, ou seja, as condições de trabalho

docente, via de regra, são adversas na escola pública.

Exatamente por não poder generalizar o contexto formativo do PIBID, em que pese,

na minha opinião, a importância desse programa no cenário nacional no âmbito da formação

inicial de professores, como uma das políticas de valorização à docência, apresento, na

próxima seção, a constituição do subprojeto Química/PIBID na UFMT, com o intuito de

caracterizar o contexto formativo sobre o qual se realiza a pesquisa.

Itinerário do Subprojeto Química – PIBID em Cuiabá na UFMT

O Subprojeto Química/PIBID21 foi implantado na UFMT campus Cuiabá,

envolvendo discentes e docentes dos cursos de Licenciatura em Química e professores do

Ensino Médio da rede pública, desde o lançamento do primeiro edital nº 01 da DEB/CAPES,

de 2007. Na participação do edital 2007, a coordenadora inicial do subprojeto foi a educadora

química Dra. Elane Chaveiro Soares, que escreveu o subprojeto da Química para submissão

21 Os projetos de cada área de conhecimento em específico vinculados ao projeto institucional da UFMT do

PIBID são denominados de subprojetos, por isso a denominação do projeto de Química-PIBID ser chamado de

subprojeto Química-PIBID.

Page 61: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

60

ao edital, tendo sido aprovado pela DEB/CAPES. A professora fez a seleção das escolas

participantes, professores supervisores e estudantes, tendo sido esta equipe composta por onze

bolsistas estudantes da licenciatura, um voluntário, dois supervisores, um por escola, um

coordenador do subprojeto, uma coordenadora institucional e pelo grupo de apoio do

Laboratório de Pesquisa e Ensino de Química - LabPEQ/UFMT.

Esse subprojeto, aprovado no edital 2007, apenas teve início de suas atividades a

partir do primeiro semestre do ano de 2009 por problemas logísticos da CAPES. O período de

início das atividades do subprojeto coincidiu com o afastamento para qualificação docente em

nível doutoral da coordenadora que elaborou o subprojeto de Química e quem assumiu a

coordenação foi a professora aposentada Ms. Lydia Maria Parente Lemos dos Santos, durante

todo o primeiro semestre do ano de 2009. Nesse mesmo ano, ocorreu o meu ingresso na

UFMT, como educador químico para a área de ensino de Química do curso de Licenciatura

em Química do campus Cuiabá.

Na oportunidade, ao ingressar como docente no curso de licenciatura, trabalhando

com as disciplinas de Práticas de Ensino de Química (PEQ) da estrutura curricular de 1997/1,

assumi também a coordenação e condução do subprojeto Química-PIBID do campus Cuiabá,

estando na coordenação desse projeto a partir do segundo semestre de 2009 até o seu término,

em dezembro de 2010, e depois nos anos de 2011 a janeiro de 2013, com a participação do

subprojeto no novo edital da DEB/CAPES de 2011.

A experiência de conduzir os trabalhos do PIBID se revelou à época muito

desafiadora para minha própria formação profissional, pois ao mesmo tempo em que estava

me constituindo como formador de professores, pois eu acabara de ingressar na carreira do

magistério superior, me via na situação de programar atividades diferenciadas no subprojeto

para a formação desses licenciandos, de forma imediata, para atuarem na Educação Básica.

Portanto, considero essa experiência da minha passagem pelo PIBID muito significativa na

minha constituição como formador de professores de Química no contexto real de trabalho,

ou em outros termos, no chão da escola. Ao fazer essa breve reflexão de minha passagem pelo

PIBID e me apoiando em um dos teóricos que dão subsídios à minha pesquisa, pude

compreender o que Tardif (2012) chamou de temporalidade do saber, uma vez que o

amálgama de saberes para ir me constituindo e consolidando como profissional da educação é

adquirido no contexto de minha história de vida, e que para eu formar um professor foi

preciso eu aprender a formar este professor e isso aconteceu e está acontecendo com o tempo,

progressivamente, em relação ao meu trabalho docente.

Page 62: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

61

O subprojeto Química/PIBID (edital 2007) foi desenvolvido nas Escolas Estaduais

com as quais a universidade possuía convênio estabelecido com a Secretaria de Estado de

Educação de Mato Grosso (SEDUC/MT), localizadas no município de Cuiabá, fazendo parte

a Escola Estadual Dona Maria de Arruda Muller – Liceu Cuiabano, situada na região central

da cidade e que recebe estudantes de todos os bairros da capital. Destaca-se, também, o fato

da escola possuir um amplo espaço físico e dispor de laboratório de Química. E a outra foi a

Escola Estadual André Avelino Ribeiro, situada na periferia de Cuiabá. As duas escolas de

Educação Básica participantes do PIBID possuíam reconhecidamente problemas de ensino-

aprendizagem na área de Ensino de Química, identificados nas atividades de estágio

supervisionado das disciplinas de Práticas de Ensino de Química (PEQ) I, II e III do curso de

Licenciatura em Química da UFMT e baixa média na avaliação no Exame Nacional de Ensino

Médio (ENEM).

Após o término das atividades do subprojeto Química-PIBID, do edital 2007, no ano

de 2011 foi lançado um novo edital como citado anteriormente, do qual o curso de

Licenciatura em Química da UFMT do campus Cuiabá participou da seleção e teve a proposta

aprovada pela DEB/CAPES. As atividades desse projeto foram realizadas somente em uma

escola que já havia participado do PIBID no edital anterior, que foi a Escola Estadual Dona

Maria de Arruda Muller – Liceu Cuiabano, com cinco bolsistas estudantes de licenciatura, um

estudante voluntário, uma professora supervisora da escola e eu, como coordenador do

subprojeto.

É imperioso destacar que no primeiro edital (de 2007) havia onze bolsas para os

estudantes e no segundo (edital de 2011) havia cinco bolsas, e conforme os estudantes

concluíam o curso de graduação na vigência do subprojeto eram feitas outras/novas seleções

para novos estudantes da Licenciatura em Química para ocupar a bolsa e para participar das

atividades do subprojeto nas escolas. Das edições de 2007 e 2011, do subprojeto Química-

PIBID, tiveram a oportunidade de vivenciar as atividades de iniciação à docência em

Química, vinte e três estudantes da licenciatura, todos oriundos da estrutura curricular de

1997/1 do curso de Licenciatura em Química da UFMT e como essa estrutura tinha a

característica de formação nos moldes do currículo 3+1 a participação no PIBID se revelou de

fundamental importância na formação inicial desses licenciados.

O subprojeto Química-PIBID participou novamente do edital de seleção dos

subprojetos 2013 da DEB/CAPES que nessa edição passou a ser de fluxo contínuo, agora com

a coordenação da professora Dra. Elane Chaveiro Soares, e nessa versão atual do subprojeto,

este está sendo desenvolvido em duas escolas de Educação Básica de Cuiabá: a Escola

Page 63: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

62

Estadual Dona Maria de Arruda Muller – Liceu Cuiabano, situada região central da cidade e

que participa pela terceira vez do subprojeto e a Escola Estadual Pascoal Ramos situada na

periferia de Cuiabá. Essa versão do subprojeto conta com quinze bolsistas estudantes da

licenciatura, todos da nova estrutura curricular do curso implantado em 2010/1, dois

professores supervisores, um por escola, e um coordenador de subprojeto.

O Subprojeto Química-PIBID tem por finalidade o incentivo à docência em Química,

pois se entende que a melhora na atuação profissional passa pelo conhecimento e pelo

controle das variáveis que intervém no exercício da profissão. Em função dos processos de

ensino-aprendizagem serem extremamente complexos, torna-se necessário que se disponha e

se utilizem referenciais que ajudem a interpretar o que acontece nos processos formativos.

Tais referenciais puderam ser utilizados no planejamento e no próprio processo formativo

(ZABALA, 1998).

Neste sentido, o subprojeto Química-PIBID desenvolveu e desenvolve seu trabalho

junto com os bolsistas estudantes por meios de trabalhos e ações que estimulam a construção

de propostas pedagógicas, por meio de ações curriculares que incentivem a contextualização

interdisciplinar, social e cultural como propostos nos Parâmetros Curriculares Nacionais para

o Ensino Médio (PCNEM), e Orientações Curriculares Nacionais para o Ensino Médio

(OCNEM), pois é mister que a abordagem dos conceitos e dos conteúdos de Química seja

coerente com a visão atualizada, em termos científicos e pedagógicos, contemplando avanços

tanto do conhecimento químico quanto das concepções da Química como ciência, a

historicidade e as implicações sociais desta área, sendo essencial a busca sistemática de novas

referências e de novas e diversificadas fontes de informação (BRASIL, 2008).

Diante desse contexto, para incentivar e auxiliar a formação dos futuros professores

de Química da Educação Básica, o subprojeto Química-PIBID realizou e realiza atividades,

tais como:

Ciclo de Estudos – Apresentação de seminários com temas relacionados à

Educação, Formação de Professores e Ensino de Ciências/Química;

Realização de Pesquisas na área de ensino de Ciências/Química;

Participação em eventos (encontros, seminários, congressos entre outros)

relacionada ao ensino de Ciências/Química;

Acompanhamento dos bolsistas nas unidades escolares conveniada com a

UFMT para o processo de Estágios tais como: Observação, Monitoria e Regência;

Participação dos bolsistas na Semana de Minicursos das Práticas de Ensino

de Química da UFMT;

Participação dos bolsistas na semana pedagógica das unidades escolares bem

como no planejamento anual da disciplina de Química;

Page 64: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

63

Participação dos bolsistas no projeto “Sala do Educador22” momento em que

os docentes das unidades escolares passam por “Formação Continuada”;

Participação dos bolsistas da Química em atividades interdisciplinares com

outros bolsistas PIBID dos subprojetos de Biologia, Física e Matemática (UFMT,

2010).

Das ações do subprojeto Química-PIBID, com a intenção de acompanhar as OCNEM

de Química para o Ensino Médio e realizar a Avaliação Emancipatória das escolas

parceiras, o subprojeto orientou e orienta os licenciandos bolsistas que a dinâmica da vida do

professor na escola pode e precisa voltar-se mais para o favorecimento da (re) organização da

prática curricular, da (re) construção do processo ensino-aprendizagem, das decisões do que

ensinar, de como ensinar, de como avaliar o significativamente aprendido, da consolidação de

espaços efetivamente transformados da dinâmica social, por meio da instrumentalização

intelecto-cultural dos cidadãos potencialmente ocupantes de posições decisivas no cenário

coletivo da sociedade.

É importante destacar que a definição dos conteúdos de Química a serem trabalhados

nas escolas parceiras do subprojeto é um dos temas principais na capacitação dos bolsistas e

dos professores supervisores (o que se deve ensinar de Química? Por quê? Como? E para

quê?). Esses conteúdos só são definidos após o diagnóstico do contexto escolar, da leitura do

Projeto Político Pedagógico (PPP) da escola e do estudo sistemático das Orientações

Curriculares Nacionais para o Ensino de Química.

Ao fazer esses relatos, revivo experiências de participação/coordenação no

subprojeto de Química-PIBID para o incentivo à iniciação à docência em Química. Destaco

que a atuação dos bolsistas do PIBID no ambiente real de ensino vem sendo realizada

mediante diagnóstico do contexto escolar, por meio da inserção dos bolsistas e observação do

dia a dia escolar do sistema público de ensino. Os bolsistas, durante toda a execução,

planejamento de atividades de ensino, elaboração de materiais didáticos, tiveram o apoio dos

integrantes do Laboratório de Pesquisa e Ensino de Química (LabPEQ), dos professores

supervisores e coordenador do subprojeto. E cabe destacar que outra atividade, de grande

relevância, desenvolvida no subprojeto pelos bolsistas envolve a realização de atividades

experimentais na perspectiva de levar aos estudantes da Educação Básica os conhecimentos

químicos contextualizados, com base nos fenômenos diários.

Ao finalizar esse breve contexto do programa PIBID no curso de Licenciatura em

Química da UFMT, não poderia deixar de evidenciar a crise que esse programa passa junto ao

22 A Sala do Educador trata-se de uma proposta política de formação continuada implementada nas unidades

escolares da rede estadual de Mato Grosso, acompanhadas pelo Centro de Formação de Professores – CEFAPRO

da Secretária Estadual de Educação de Mato Grosso – SEDUC/MT.

Page 65: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

64

DEB, no âmbito da estrutura organizacional da CAPES, devido à atual conjuntura política

financeira do Brasil nos anos de 2015 e 2016.

As perspectivas negativas de sua continuidade têm levantado um clamor pela

continuidade do programa PIBID organizados pelos coordenadores e supervisores dos

subprojetos PIBID das IES de todo o Brasil, juntamente com os pibidianos, apoiadas

justamente nas inúmeras conquistas para uma formação docente mais qualificada. Os bolsistas

não são meros expectadores ou executores no programa, nem tampouco estão no programa só

pela bolsa que recebem. No entanto, de acordo com Soares (2016), é viável perguntar se esta

última questão também pode ser feita ao programa de iniciação cientifica, o PIBIC. A

campanha para a permanência do PIBID ganhou eco nas redes sociais no final do ano de 2015

e todo o ano de 2016 com a chamada #FicaPIBID.

Nesta perspectiva, Soares (2016) corrobora que:

Aqueles que aquecem os bastidores políticos do nosso país precisam compreender

que a educação é processual e dinâmica e que a incorporação de transformações é

urgente e necessária, mas que isso precisa ser feito de forma gradativa e seriamente

assistida. Isso quer dizer que os investimentos na formação docente devem vir

acompanhados de políticas de valorização da profissão docente, sem a qual,

qualquer programa ou projeto se inviabiliza pela própria evasão (p. 9).

A seguir, apresento o próximo eixo de análise, no qual faço contextualização por

meio de revisão sistemática sobre os saberes necessários ao trabalho docente com o propósito

de buscar subsídios teórico-conceituais para análise de mais um eixo norteador desta

investigação sobre saberes docentes. Neste sentido, analiso, à luz da literatura pertinente, as

trajetórias de formação inicial e continuada dos participantes da pesquisa, obtidas por meio

dos relatos sobre si e dos diálogos entre pesquisador e sujeitos dessa pesquisa, durante a

entrevista semiestruturada e grupos focais. Analiso, portanto, narrativas expressas nas

dinâmicas do tempo de sua formação e de sua história, evidenciando como essas professoras

constroem, trabalham e expressam os saberes necessários à docência. A partir das

manifestações docentes, faço análises buscando responder às questões investigativas

propostas e, ao final, busco fazer síntese, construindo um modelo didático de cada professora

colaboradora da pesquisa.

Page 66: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

65

IV - EDUCADORES QUÍMICOS INICIANTES E SABERES

NECESSÁRIOS À ATUAÇÃO PROFISSIONAL: DAS NARRATIVAS DE

SI A MODELOS DIDÁTICOS ADOTADOS

O saber é estruturado porque é organizado conceitualmente através de uma rede de

interconexões (cada pessoa cria sua própria rede associando tudo o que sabe ou sente

em relação a uma ideia) e possui uma linguagem própria que garante sua

comunicação e organiza o discurso do professor (Britt- Mari Barth).

A principal função da atividade docente é o ensino, que consiste em um processo

intencional e interpessoal, que desenvolve, essencialmente, a comunicação verbal e o discurso

dialógico utilizado como meios para favorecer, provocar e levar a aprendizagem em uma dada

situação ou contexto (ALTET, 2001). Ensinar é fazer aprender e, sem a sua finalidade de

aprendizagem, o ensino não existe. Este fazer aprender ocorre pela mediação e comunicação

do professor, que é um profissional da aprendizagem, da regulação interativa da sala de aula e

da gestão de condições de aprendizagem. Nesse sentido, “o professor profissional é antes de

tudo, um profissional da articulação do processo ensino-aprendizagem em uma determinada

situação, um profissional da interação das significações partilhadas” (ALTET, 2001, p. 26).

Na busca de compreender o movimento pela profissionalização do ensino e, da

profissionalização docente, diversos pesquisadores no âmbito internacional e nacional, tais

como: Shulman (1986, 1987), Nóvoa (1992), Schön (1992), Gonçalves e Gonçalves (1998),

Gonçalves (2000), Mizukami (2004), Tardif e Lessard (2009), Pimenta (2012), Tardif (2012),

Gauthier et al. (2013), dentre outros, dedicaram ou dedicam suas pesquisas à formação de

professores, abordando os diversos saberes que compõem a vida profissional na busca de

renovar os fundamentos epistemológicos do ofício de professor23, discutindo a prática

educativa, e focalizando o professor investigativo, reflexivo, político, dialógico, intelectual.

Nesta seção, analiso os relatos dos participantes da pesquisa, buscando identificar os

movimentos de formação e docência que contribuíram para sua constituição docente,

buscando compreender como esses professores constroem, trabalham e expressam saberes

necessários à docência. Este tipo de pesquisa que vem sendo desenvolvido por Nóvoa (1992),

Gonçalves (2000), Josso (2004), Huberman (2007), Goodson (2007), Clandinin e Connelly

23Para Gauthier et al. (2013) essas preocupações não são recentes se considerarmos que desde o início do século

XIX, muitos pesquisadores desenvolveram projetos em busca de um ensino mais eficiente. Todavia, foi somente

nos últimos vinte anos que na América e na Europa foram realizadas importantes pesquisas diretamente nas salas

de aula com vistas a descrever a prática docente.

Page 67: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

66

(2011), dentre outros, considera as experiências vividas, quando tais professores realizam uma

reflexão sobre sua trajetória de vida profissional, evidenciando seus saberes.

Na formação de professores, Mizukami (2011) revela que a base de conhecimento

para o ensino consiste de um corpo de habilidades, compreensões, conhecimentos e

disposições que são necessários para que o professor possa propiciar processos de ensino e de

aprendizagem em diferentes níveis, áreas de conhecimento e modalidades de ensino.

Mizukami (2011) afirma que essa base envolve conhecimentos de diferentes naturezas, todos

necessários e indispensáveis para a atuação profissional. Todavia, a base de conhecimento é

mais limitada na formação inicial e se torna mais aprofundada, flexível e diversificada a partir

da experiência profissional.

Apoiados na premissa de que existe uma base de conhecimento para o ensino, vários

pesquisadores dedicaram-se a sistematizar e investigar saberes docentes. No âmbito

internacional, as pesquisas sobre saberes docentes se iniciaram na década de 1980 e no Brasil

essas pesquisas surgiram a partir da década de 1990. Os saberes docentes são tratados, nas

pesquisas, sob expressões, tais como: knowledge, em inglês, savoir ou connaissance, em

francês, saberes ou conhecimentos em português. Diversos estudos abordando a mesma

temática exploram-na a partir de outras categorias como crenças, concepções, competências,

pensamentos, representações e metáforas (CUNHA, 2003).

Existe, atualmente, um número significativo de produções a respeito da base do

conhecimento, a partir de orientações e concepções diversas, com uma diversidade conceitual

e metodológica das pesquisas. De acordo com Cunha (2007, p. 32), “o campo de pesquisa dos

saberes docentes é imenso e, nos últimos vinte anos, vem se desenvolvendo de maneira

exponencial”.

Neste sentido, a seguir construo uma revisão sistemática sobre os saberes necessários

à atuação profissional que, neste trabalho de tese, não tem como objetivo resumir o

conhecimento acumulado que já foi publicado, mas, sobretudo, fundamentar esta investigação

sobre saberes, que servirão de pano de fundo para responder o problema central da pesquisa.

A Base de Conhecimentos dos Professores em Questão: Tipologias e Concepções

Dado número expressivo de produções a respeito da base de conhecimento, abordo

as principais contribuições teóricas sobre os saberes docentes na perspectiva de quatro

Page 68: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

67

autores: Gauthier et al. (2013), Pimenta (2012), Shulman (1986, 1987), e Tardif (2012)24, pois

considero as ideias desses teóricos fios condutores para a reflexão e análise acerca dos saberes

docentes dos sujeitos desta pesquisa.

Primeiro, fui à busca da definição da palavra saber e pude verificar que consiste em

uma noção polissêmica e pode ser usada em diversos modos e diversos contextos. A definição

geral de saber para Beillerot (1994) “é aquilo que, para um determinado sujeito, é adquirido,

construído, elaborado através do estudo ou da experiência” apud Altet (2001, p. 28). Para

diferenciar saber de conhecimento, Altet (2001) distingue informação, saber e

conhecimento:

A informação é “exterior ao sujeito e de ordem social”; - O conhecimento é

“integrado ao sujeito e de ordem pessoal”. O saber situa-se “entre dois polos” em um

intermédio interfacial entre o conhecimento e a informação. O saber constrói-se na

interação entre conhecimento e informação, entre sujeito e ambiente, na mediação e

através dela (p. 28).

Diversos textos sobre educação, normalmente, usam os termos conhecimento e

saber sem distinção de significado. Ao reconhecer que nem os filósofos possuem uma

posição clara sobre a diferenciação de significado destes termos, neste trabalho de tese,

concebo ambas as denominações sem uma diferenciação rígida.

Ao definir o saber, Tardif “dá uma noção em um sentido amplo, que engloba os

conhecimentos, as competências, as habilidades (ou aptidões), isto é, aquilo que muitas vezes

foi chamado de saber, saber-fazer e saber-ser” (2012, p. 255). E por comungar da mesma

definição de saber de Tardif justifico o título deste trabalho de tese, no qual optei pelo termo

saber em lugar de conhecimento.

Os Saberes docentes, na concepção de Gauthier et al.

Ao partir da afirmação de que o ensino é um ofício universal, que possui uma longa

história que remonta à Grécia antiga, Gauthier et al. (2013) sustentam que, atualmente, este

ofício ainda se mantém desempenhando um papel fundamental para as sociedades

contemporâneas. Os autores usam a sentença “conhece-te a ti mesmo”, do oráculo de Delfos,

para dizer que apesar desta longevidade do ofício, sabe-se muito pouco a respeito dos

fenômenos que lhe são inerentes.

24 Justifico a escolha por esses autores também, pois suas obras nas últimas décadas influenciaram tanto

pesquisas quanto políticas de formação e desenvolvimento profissional de professores no Brasil.

Page 69: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

68

Segundo Gauthier et al. (2013), de fato, mal consegue-se identificar os atos do

professor que, na sala de aula, têm influência concreta sobre a aprendizagem dos alunos, e se

está apenas começando a compreender como ocorre a interação entre eles e o educador. Nesse

contexto, avançar na pesquisa de um repertório de conhecimentos sobre o ensino possibilita a

enfrentar dois obstáculos que, historicamente, se interpuseram à pedagogia: de um ofício sem

saberes e de saberes sem ofício.

O ofício sem saberes diz respeito à atividade docente que é exercida sem revelar os

saberes que lhe são inerentes. Explicam que “na verdade, mesmo que o ensino já venha sendo

realizado há séculos, é muito difícil definir os saberes envolvidos nesse ofício” (GAUTHIER

et al, 2013, p. 20). Enfatizo, também, que se faz necessário retomar certas ideias

preconcebidas que contribuem para o enorme erro de manter o ensino em uma cegueira

conceitual, ideias que, por exemplo, para ensinar basta apenas transmitir o conteúdo, sendo

suficiente, portanto, conhecer o conteúdo, ou apenas ter talento, ter bom senso, seguir a

intuição, ou ainda basta ter experiência e cultura.

Já os saberes sem ofício têm sua origem nos conhecimentos produzidos nos centros

acadêmicos, e muitos desses conhecimentos, segundo os autores, foram produzidos sem levar

em conta as condições concretas do magistério. Buscou-se formalizar o ensino, mas reduzindo

de tal modo a sua complexidade que ele não mais encontra correspondente com a realidade.

Esses saberes, que não se dirigiam ao professor real, cuja atuação ocorre em uma verdadeira

sala de aula, em que estão presentes muitas variáveis, que interferem no processo de ensino-

aprendizagem e exigem tomadas de decisões. Esse obstáculo contribuiu para

desprofissionalizar a atividade docente:

[...] ao reforçar nos professores a ideia de que a pesquisa universitária não lhes podia

fornecer nada de realmente útil, e que, era muito mais pertinente que uns

continuassem se apoiando na experiência pessoal, outros na intuição, outros no bom

senso, etc. (GAUTHIER et al., 2013, p. 27).

O grande desafio da profissionalização docente é evitar esses dois erros: ofício sem

saberes e saberes sem ofício. Esses autores admitem que as pesquisas já revelem a presença

de um repertório de conhecimentos próprios ao ensino e propõem um ofício feito de saberes.

Neste sentido, o conhecimento do repertório próprio ao ensino contribui para acabar com

ideias negativas preconcebidas sobre o ofício de ensinar, as quais “prejudicam o processo de

profissionalização do ensino, impedindo o desabrochar de um saber desse ofício sobre si

mesmo” (GAUTHIER et al., 2013, p. 25).

Page 70: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

69

Gauthier et al. (2013) realizaram estudos e pesquisas sobre o ensino com o objetivo

de identificar as convergências em relação aos saberes mobilizados na ação pedagógica, com

o objetivo de formular problemáticas, de examinar as implicações, de avaliar resultados e de

esboçar uma teoria geral da pedagogia.

Nesta perspectiva, os autores concebem o ensino como a mobilização de vários

saberes que formam uma espécie de reservatório, no qual o professor se abasteceria para

responder a exigências específicas de sua situação concreta de ensino. E categorizam os

saberes de duas formas: o saber privado e os saberes públicos.

O saber privado é o saber experiencial, o qual:

É construído na prática pelos docentes no exercício profissional e que não chega a

ser socializado e validado pelo coletivo de professores. É um saber que, por se

originar do convívio diário na sala de aula, sofre restrições, principalmente nos

meios acadêmicos (GONÇALVES, 2000, p. 27).

Para Gauthier et al. (2013), mesmo que o professor viva várias experiências das

quais tira proveito, tais experiências, infelizmente, permanecem confinadas ao segredo da sala

de aula. Os autores complementam que cada professor sozinho, em seu próprio universo,

elabora uma espécie de jurisprudência particular, feita de mil e um truque que “funcionam” ou

que ele acredita que funcionam. Neste sentido, o que limita o saber experiencial “é

exatamente o fato de que ele é feito de pressupostos e de argumentos que não são verificáveis

por meio de métodos científicos” (p.33).

Já os saberes públicos, de acordo com Gauthier et al. (2013), são saberes oriundos

dos saberes disciplinares, curriculares, das ciências da educação, da tradição pedagógica e da

ação pedagógica. Para os autores, é muito mais interessante conceber o ensino como a

mobilização de vários saberes que formam uma espécie de reservatório, de acordo com a

Figura 2, no qual o professor se abastece para responder às exigências específicas de sua

situação concreta de ensino em sala de aula.

Page 71: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

70

Figura 2: O Reservatório de Saberes em Gauthier et al.

Fonte: Elaboração do autor, baseado em Gauthier et al. (2013)

Os saberes disciplinares se referem aos “saberes produzidos pelos pesquisadores e

cientistas nas diversas disciplinas científicas, aos conhecimentos por eles produzidos a

respeito do mundo” (GAUTHIER et al., 2013, p. 29).

Os conhecimentos produzidos na sociedade são organizados em forma de disciplinas

e utilizados nas instituições de ensino. O professor, que atua em sala de aula, não produz o

saber disciplinar, todavia, ao ensinar, utiliza-se de conhecimentos produzidos por outros

pesquisadores. Para ensinar determinada disciplina, o professor precisa ter conhecimento

sobre o conteúdo trabalhado e, nesse processo, são utilizados inúmeros exemplos ou analogias

para facilitar a compreensão dos saberes disciplinares. Sabe-se que as analogias não são frutos

dos saberes disciplinares, mas produzidos pelo professor no contexto específico do ensino de

sua disciplina em sala de aula. Nesta perspectiva, cada professor adapta o saber disciplinar

conforme o seu próprio conhecimento ou de acordo com a realidade dos seus educandos.

Os saberes curriculares, na perspectiva de Gauthier et al. (2013), são os saberes que a

escola, como instituição, seleciona e organiza certos saberes produzidos pelas ciências e os

transformam em um corpus que será ensinado nos programas escolares. De acordo com os

autores:

Saberes Disciplinares

(A matéria)

Saberes Curriculares

(O programa)

Saberes das Ciências da Educação

Saberes da Tradição

Pedagógica

(O uso)

Saberes Experenciais

(A jurisprudência particular)

Saberes da Ação Pedagógica

Page 72: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

71

No Brasil, eles também são transformados pelas diversas editoras em manuais e

cadernos de exercícios que, uma vez aprovados pelo Estado, são utilizados pelos

professores. O professor deve, evidentemente, “conhecer o programa”, que constitui

outro saber de seu reservatório de conhecimentos. É de fato, o programa que lhe

serve de guia para planejar, para avaliar (2013, p. 31).

Os saberes das ciências da educação, para Gauthier et al. (2013), são determinados

conhecimentos profissionais que todos os professores adquiriram, durante a sua formação ou

em seu trabalho que, embora não os ajudem diretamente a ensinar, informa-os a respeito de

várias facetas da educação de um modo geral e do seu ofício. Para os autores, esse tipo de

saber permeia a maneira do professor existir profissionalmente e exemplificam que:

O professor possui noções relativas ao sistema escolar, sabe o que é um conselho

escolar, um sindicato, uma carga horária. Talvez tenha também uma ideia da

evolução de sua profissão, e dominam determinadas noções sobre o

desenvolvimento da criança, as classes sociais, os estereótipos, a violência dos

jovens, a diversidade cultural, etc. Em suma, possui um conjunto de saberes a

respeito da escola que é desconhecido pela maioria dos cidadãos comuns e pelos

membros das outras profissões. (2013, p. 31).

Sobre os saberes da tradição pedagógica, Gauthier et al. (2013) afirmam que estes

passaram a ser considerados a partir do século XVII, quando se estrutura uma nova maneira

de fazer a escola, e dizem que:

(...) Essa maneira de dar aulas terminou se cristalizando naquilo que poderíamos

chamar de “a tradição pedagógica”. Ela chegou até nós e povoa não somente as

nossas recordações de infância, mas também boa parte das escolas atuais (...) é o

saber dar aulas que transparece numa espécie de intervalo da consciência. Nessa

perspectiva, cada um tem uma representação de escola que o determina antes mesmo

de ter feito um curso de formação de professores, na universidade (2013, p. 32).

Por fim, os saberes da ação pedagógica são os saberes experienciais dos professores

a partir do momento em que se torna público e que é testado por meio das pesquisas

realizadas em sala de aula. Para os autores, “os julgamentos dos professores e os motivos que

lhes servem de apoio podem ser comparados, avaliados, pesados, a fim de estabelecer regras

de ação que serão conhecidas e aprendidas por outros professores” (GAUTHIER et al., 2013,

p. 33).

Gonçalves (2000) explicita que, como formadores de professores, percebe-se que a

dicotomia entre os saberes públicos e privados parece ser uma prática usual nas universidades

e nos demais níveis de ensino. O autor afirma que:

Page 73: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

72

Na verdade, a relação entre o saber público e saber privado não tem sido trabalhado

ou explorado em nenhum programa do qual o docente participa, desde o programa

de formação inicial aos programas de pós-graduação (especialização, mestrado

doutorado). E o fato de não ser trabalhada em nenhum dos níveis de ensino vem

sendo apontado como uma das prováveis causas da crise e do fracasso do Ensino

Fundamental e Médio, e dos cursos universitários, em especial, dos cursos de

licenciatura (GONÇALVES, 2000, p. 28).

Neste sentido, Gonçalves (2000) complementa que a pesquisa tem sido apontada por

D’Ambrosio (1998) e Fiorentini et al. (1998) e aqui complementa-se por Maldaner (2006)

como aquela que permite a construção de um elo de ligação entre a teoria (saber público) e a

prática (saber privado).

Os Saberes docentes, segundo Pimenta

Ao tratar sobre os saberes dos professores, Pimenta (2012) faz referência à

construção da identidade profissional, afirmando que essa identidade não é um dado imutável,

mas um processo de construção do sujeito historicamente situado, e essa identidade se

constrói, a partir da significação social da profissão, da revisão permanente desses

significados sociais, da revisão das tradições e da reafirmação de práticas consagradas

culturalmente e que sempre permanecem significativas.

A mobilização dos saberes docentes, referidos por Pimenta (2012), como saberes da

docência é um passo importante para mediar o processo de construção da identidade

profissional dos professores. Nessa perspectiva, a autora indica que esses saberes são

constituídos por três categorias, como mostra a figura 3, e essas categorias identificam o que é

necessário saber para ensinar:

Page 74: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

73

Figura 3: Saberes da Docência em Pimenta

Fonte: Elaboração do autor, baseado em Pimenta (2012)

Ao que denomina saberes do conhecimento a autora incorpora os saberes

disciplinares e curriculares identificados por Tardif (2012), e dá um destaque aos saberes da

experiência, destacando-o em dois níveis: os saberes da experiência dos estudantes em curso

de formação inicial para professores, construídos durante a vida escolar e os saberes dos

professores, que são produzidos no trabalho pedagógico cotidiano. Pimenta (2012) destaca

que há um reconhecimento de que para saber ensinar não bastam a experiência e os

conhecimentos específicos, mas se fazem necessários os saberes pedagógicos e didáticos e

enfatiza que há necessidade de considerar a prática como ponto de partida e de chegada e de

se reinventarem os saberes pedagógicos, a partir da prática social, para superar a tradicional

fragmentação dos saberes da docência.

Os conhecimentos docentes, de acordo com Shulman

Um dos autores mais citados, internacionalmente, sempre que se discutem os

conhecimentos dos professores, é o norte-americano Lee Shulman25. Na linha de pesquisa de

Shulman (1986, 1987), sobre conhecimento de professores, ganha destaque entre os

conhecimentos docentes o Conhecimento Pedagógico do Conteúdo (PCK, da expressão em

inglês, Pedagogical Content Knowledge) que, segundo o autor representaria o conhecimento

profissional dos professores. O uso da sigla em inglês se justifica pelo fato dela já ser

25 O leitor interessado poderá obter informações complementares, acerca deste autor e do paradigma perdido, no

artigo de: GONÇALVES, Tadeu Oliver; GONÇALVES, Terezinha Valim Oliver. Reflexões Sobre uma Prática

Docente Situada: Buscando Novas Perspectivas Para a Formação de Professores. In: FIORENTINI, Dario et al.

Cartografias do Trabalho Docente. 1.ed. São Paulo: Mercado das Letras, 1998, p. 105-133.

Saberes da

Docência

Saberes da experiência

Saberes Pedagógicos

Saberes do Conhecimento

Page 75: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

74

conhecida na literatura e que é tratada como sinônimo do próprio conceito. Nesse sentido, ao

tratar sobre os Conhecimentos/Saberes Pedagógicos de Conteúdos Químicos na presente tese,

adoto a sigla (PCKC, da expressão em inglês, Pedagogical Content Knowledge Chemicals).

Shulman (1986) chama a atenção que dentre os conhecimentos que o professor deve

possuir, se verifica a vigilância para a importância do Conhecimento do Conteúdo Específico.

O autor, como pesquisador do programa Knowledge Base, dedicou-se a investigar o que

sabem os professores sobre os conteúdos que ensinam, quais são as fontes desses

conhecimentos, como formam uma base de conhecimentos para a atuação profissional e

reflete sobre a prática pedagógica do professor em uma perspectiva entre os

conhecimentos/saberes relacionados ao conteúdo e conhecimentos/saberes relacionados ao

processo de ensinar.

Fernandez (2015) defende, com base em Shulman (1986, 1987), que a maior

competência do professor é a disciplina, pois o professor é sempre professor de alguma

disciplina e essa especificidade transparece, principalmente, no conceito de PCK. Ao utilizar-

se da terminologia de conhecimentos necessários aos docentes, Shulman (1986) os distingue

em três categorias, de acordo com a Figura 4: de conteúdo específico, pedagógico de

conteúdo e curricular.

Figura 4: Base de Conhecimentos na Perspectiva de Shulman

Fonte: Elaboração do autor, baseado em Shulman (1986)

O conhecimento de conteúdo específico refere-se a conteúdos específicos da matéria

que o professor leciona. Está pautado nas compreensões de fatos, conceitos, processos, entre

outros, de uma área específica. Trata-se, pois de um conhecimento, próprio da área do

conhecimento de que é especialista o professor, por exemplo, a Química. A diferença, para

Base de Conhecimentos

Conhecimento do Conteúdo

Específico

Conhecimento Curricular

Conhecimento Pedagógico de

Conteúdo (PCK)

Page 76: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

75

Shulman, entre um químico pesquisador e um químico professor de Química, é que o

professor precisa transformar o conhecimento próprio do químico em conhecimento

compreensível para o educando, dentro do nível de escolaridade em que este se encontra. Esta

diferença é que distingue o professor de seu homólogo na área de conhecimento

(GONÇALVES e GONÇALVES, 1998).

Já o conhecimento curricular é o conhecimento sobre o currículo, isto é, o conjunto

de programas elaborados para o ensino de assuntos específicos e tópicos em um dado nível.

Este tipo de conhecimento:

Diz respeito ao conjunto de conteúdos a ser ensinado nos diferentes níveis e séries

de escolaridade e os respectivos materiais didáticos a serem utilizados para a

obtenção da aprendizagem pretendida. Por exemplo, os diferentes modos de

trabalhar o assunto átomo com alunos da 5ª série ou com estudantes de 1ª colegial: a

complexidade, a profundidade e a própria linguagem empregada em cada uma

dessas situações certamente serão diferentes (GONÇALVES e GONÇALVES,

1998, p. 110).

O conhecimento pedagógico de conteúdo - PCK é um tipo de conhecimento, em que

o professor transforma o conteúdo específico em situações de ensino-aprendizagem. Utiliza-se

de analogias, demonstrações, experimentações, ilustrações, exemplos e representações,

inclusive a sequenciação, que implica expor os conteúdos de um mesmo assunto em

diferentes tópicos. Nesse contexto, a competência pedagógica está atrelada a um conteúdo

específico, que é transformado, levando em consideração as dificuldades dos educandos com

esse conteúdo, o contexto, os objetivos, os modos de avaliação, as estratégias instrucionais, o

currículo, entre outros.

Neste sentido, Gonçalves e Gonçalves (1998) evidenciam que:

[...] este é o tipo de conhecimento que permite ao professor perceber quando um

tópico é “mais fácil ou difícil”, quais experiências anteriores os alunos possuem e as

relações possíveis a serem estabelecidas. Não se trata de um conhecimento

pedagógico geral, mas um conhecimento pedagógico do conteúdo a ser ensinado (p.

109).

De acordo com Mizukami26 (2011), o PCK é o único conhecimento pelo qual o

professor pode estabelecer uma relação de protagonismo, sendo de sua autoria e aprendido no

exercício profissional. Concordo com a autora, mas complemento que o PCK deve ser

estimulado e trabalhado nos cursos de formação inicial, nas disciplinas de estágio

26 Mizukami (2011) salienta que embora Shulman não coloque em forma destacada o conhecimento da

experiência como categoria de base de conhecimento, a experiência está presente em todo o processo de

raciocínio pedagógico, a ser considerado a seguir, e é condição necessária (embora não suficiente) para a

construção de conhecimento pedagógico do conteúdo por parte do professor.

Page 77: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

76

supervisionado, nas regências de Ensino Fundamental ou Médio, por exemplo, ou disciplinas

como práticas de ensino em atividades de aulas simuladas, minicursos, atividades

experimentais, entre outros. Dessa forma, o licenciando poderá se instrumentalizar para fazer

a mediação didática do saber científico (conhecimento químico) para o saber pedagógico de

conteúdo químico - PCKC (conhecimento escolar) com o acompanhamento e orientação do

professor formador desses licenciandos. Compreendo, também, que existe certo “macete

pedagógico” para se ensinar determinados conceitos de Química, por exemplo, só no contexto

da experiência profissional o professor vai se aperfeiçoar.

A forma como Shulman (1986) se refere ao saber da experiência, embora não

trabalhe com este conceito, é proposta pela classificação que ele faz dos conhecimentos

necessários para os professores, e que ele chama de teacher knowledge (saber dos

professores? Saber docente?). O autor coloca três categorias de apresentação do

conhecimento: proposicional, de caso e estratégico.

O conhecimento proposicional expresso por Shulman ocorre pela apresentação de

princípios, máximas e normas. Segundo Monteiro (2001):

Os princípios são oriundos das pesquisas empíricas; as máximas são oriundas da

prática, não possuem confirmação científica (ex.: quebre um pedaço de giz antes de

escrever para evitar que ele provoque ruídos no quadro); as normas referem-se aos

valores, compromissos ideológicos e éticos de justiça, equidade etc.; eles não são

teóricos nem práticos, mas sim normativos. Ocupam a essência do que o autor

chama de saber dos professores. Eles guiam o trabalho do professor porque são

eticamente ou moralmente corretos (p. 136) [grifo da autora].

Para Shulman (1986), a forma útil de apresentar o conhecimento é o que ele chama

de conhecimento de caso. Neste contexto, quando o professor apresenta o conteúdo na forma

de casos, o mesmo favorece a articulação entre teoria e a prática, pois ambas estão fortemente

entrelaçadas em um relato de caso. Nessa mesma linha, Gonçalves e Gonçalves (1998)

corroboram que:

O conhecimento de caso é o conhecimento específico de um evento muito bem

documentado e ricamente descrito. Enquanto casos em si são relatos de eventos ou

sequências de eventos, o conhecimento que eles representam é que fazem deles

casos. Os casos podem ser exemplos de instâncias específicas da prática – descrições

detalhadas de como um evento instrucional ocorreu – completados com contextos

particulares, pensamentos e sentimentos. Por outro lado, eles podem ser exemplos de

princípios, exemplificando em seus detalhes, uma proposição mais abstrata ou uma

reivindicação mais teórica (p. 112).

A terceira categoria é o conhecimento estratégico que se refere ao modo como o

professor age em situações dramáticas e contraditórias. Esse conhecimento, de modo geral, se

manifesta em situações práticas reais de sala de aula, em que o professor tem que tomar uma

Page 78: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

77

decisão no momento da sua ação docente entre princípios contraditórios que possam aflorar.

Esse conhecimento não é ensinado na universidade, mas é aprendido no contexto da prática

profissional. Para essa aprendizagem, parece evidente a concorrência, até mesmo de modo

não consciente, de casos e exemplos previamente vividos/conhecidos (GONÇALVES e

GONÇALVES, 1998).

Ao sintetizar as concepções de Shulman (1986, 1987) sobre os

conhecimentos/saberes necessários à atuação docente pode inferir que o referido autor

valoriza o conhecimento de conteúdo específico, mas enfatiza que o professor precisa

pedagogizar esse conteúdo específico de modo a fazer com o que os seus educandos consigam

entendê-lo. Para tanto, o professor precisa dominar e transformar muito bem os

conhecimentos da base em PCK.

Trajetórias da Formação Inicial e Continuada dos Educadores Químicos egressos do

PIBID

Tornar-se um educador químico, de fato, trabalhando na docência da Educação

Básica, supõe um determinado grau de formação correspondente ao nível de ensino pleiteado,

cuja exigência no Brasil é o curso de Licenciatura em Química como visto na seção anterior.

Ao tratar de trajetórias de formação docente, importante ter em conta que a formação

do professor como pessoa e profissional são inseparáveis e que se formar supõe troca,

experiência, aprendizagens, interações sociais, continuidades, um sem fim de relações e,

acima de tudo, processos intrínsecos de (auto) formação. Nesta perspectiva, ter acesso ao

modo como cada pessoa se forma é ter em conta a singularidade da sua história e, sobretudo o

modo singular como age, reage e interage em seus contextos. Com isso, parto do pressuposto

de que o processo de formação é um processo dinâmico, em que se vai construindo a

identidade pessoal e profissional de uma pessoa, processo esse, em que cada pessoa,

permanecendo ela própria e reconhecendo-se a mesma, ao longo da sua história, se forma e se

transforma sempre em interação (MOITA, 2007).

A escolha pela carreira profissional docente, ao contrário do que revela o senso

comum, não está pautada somente nas características próprias de sua personalidade, tais

como: a disposição, a inteligência, o caráter, a vocação, a aptidão, os dons e os méritos

pessoais, que podem ser cultivados de maneiras diversas, mas depende fundamentalmente de

ter nascido em um determinado momento histórico e em um certo momento sociocultural,

definido por elementos estruturais bem precisos como os de ordem econômica, política e

Page 79: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

78

educacional. Esses elementos pesam sobre as opções na vida de cada um e acabam por

prescrever o futuro, orientando a escolha pessoal e exercendo forte influência sobre o

itinerário profissional (VALLE, 2006).

A origem social das professoras colaboradoras Curie, Mayer, Franklin e Meitner é

consideravelmente modesta, pois a maioria descende da população que reside em pequenas

cidades do interior e periferia da capital de Cuiabá-MT, provém das camadas sociais em

ascensão, passando das ocupações manuais às profissões intelectuais, fazendo parte dos

setores menos escolarizados, portadores de baixo capital cultural. Eis algumas falas das

colaboradoras:

Curie: Sou de família humilde, eu meus pais morávamos em Cacoal-RO e nos

mudamos para Cuiabá-MT para fazer tratamento de saúde de minha irmã que tinha

anemia falciforme. Em Cuiabá-MT para ajudar meus pais eu trabalhava de babá na

parte da manhã e estudava na parte da tarde e noite.

Mayer: Sou natural de Poconé-MT e meus pais residem lá até hoje e vim para

Cuiabá-MT para estudar o curso de Licenciatura em Química na UFMT.

Meitner: Sou de família tradicional de Cuiabá de origem simples. Eu e meus pais

moramos no bairro Nova Esperança na periferia da cidade.

Valle (2006) ressalta que em muitos estudos, a escolha de uma profissão é o

resultado de uma combinação entre a representação que o indivíduo tem de si e a experiência

vivida. A autora desenvolveu, em sua pesquisa, três conceitos para a compreensão da escolha

dos professores para o ingresso na carreira docente: a lógica de integração, a lógica da

profissionalização e a lógica da transformação.

O conceito de lógica de integração consiste no esforço contínuo de integração em um

determinado universo social ou profissional relativamente constante e esse esforço é

engendrado no seio da família (socialização primária), em que são nutridas as motivações

intrínsecas, incorporadas por meio de orientações coerentes e homogêneas.

Para Valle (2006), “estas visam adaptar as singularidades e expectativas pessoais e

delimitam as ambições profissionais, procurando engendrar em cada bifurcação (passagem de

um nível de ensino para o outro) as escolhas individuais” (p. 183).

Nesse sentido, as motivações para o ingresso no magistério de algumas professoras

investigadas permanecem no campo dos valores altruístas e da realização pessoal como é

possível constatar na narrativa de Curie:

Page 80: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

79

Na escola, no Ensino Médio, eu tinha facilidade nas disciplinas e eu ajudava meus

colegas nas aulas, quem tinha o livro era eu, e eu passava a matéria para o

professor no quadro, e ajudava os meus colegas nas resoluções de exercícios

também. Por isso, me despertou a vontade de ser professora.

De acordo com Cunha (1994), a questão da vocação para a escolha do magistério é

um assunto complexo, pois não há dados suficientes que permitam generalizações. “Parece,

todavia, que há mais influência do ambiente social e das relações do que dos pendores

naturais” (p.83). Podem estes pesares, mas são os primeiros que mais apareceram no

depoimento das professoras. Veja-se a fala da Meitner: Para me tornar professora, digamos

que foi uma vocação que eu tinha e fui procurar em fazer algo em licenciatura no Ensino

Superior.

Para Goodson (2007), as experiências de vida e o ambiente sociocultural são

ingredientes-chave da pessoa que fazem sentido para si e do próprio eu. Uma característica

comum do ambiente sociocultural, colhida nas narrativas dos professores, no que diz respeito

à escolha da profissão docente é o que Goodson aponta, isto é, “aparecimento de um

professor preferido que o influenciasse, de modo significativo, a pessoa enquanto jovem

aluno” (p.72). Nas narrativas das professoras colaboradoras, nesta pesquisa, todas

expressaram a passagem da influência de um determinado professor, seja na Educação Básica

ou no Ensino Superior, que as influenciaram sobre a escolha e até mesmo a permanência na

profissão que, na perspectiva de Valle (2006), está centrada na lógica da transformação. Eis

alguns depoimentos:

Mayer: Do primeiro ao terceiro ano, eu tive um professor de Química que marcou

muito, achava que ele era o cara! (rsrsr) Foi ele que me despertou a vontade em

fazer licenciatura em Química e até hoje, eu em sala de aula com meus alunos me

vejo fazendo com eles algumas práticas que esse professor fazia com a minha sala,

quando eu era estudante do Ensino Médio.

Franklin: Eu tive uma professora muito boa de Química no primeiro e segundo ano

do Ensino Médio e desde então foi despertando o meu desejo em fazer Química, mas

eu não sabia se era para bacharelado ou licenciatura. Daí eu tive outro professor

de Química, também no terceiro ano, e eu falei: não! É isso! É Química que eu vou

fazer e sempre quando eu assistia às aulas dele eu dizia: um dia quero ser igual a

esse professor...

A opção por fazer o curso de Licenciatura em Química se evidenciou também nas

narrativas das professoras, no sentido de vislumbrarem melhores possibilidades profissionais

no curso. Essa escolha está centrada na lógica da profissionalização, como afirma Valle

(2006), pois o estudante que cursasse a Licenciatura em Química na estrutura curricular de

1997/1 da UFMT tinha as mesmas atribuições que o Bacharel em Química junto ao CRQ/MT

e para que o estudante se graduasse também em bacharelado para obter a dupla diplomação,

Page 81: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

80

em licenciatura e bacharelado, o estudante da licenciatura complementava seus estudos para o

bacharelado em apenas um semestre a mais, já para o estudante do Bacharelado em Química

para obter o diploma de licenciatura ficava quatro semestres a mais por conta das disciplinas

da área de ensino que eram todas com pré-requisitos.

Deve-se levar em consideração, também, que a ampla concorrência para o ingresso

no curso de Bacharelado em Química, visto que este sempre foi o mais concorrido tanto na

época do ingresso à universidade por meio de vestibulares como na nova forma de ingresso

adotada pela UFMT, a partir de 2008, pela classificação do candidato no Exame Nacional do

Ensino Médio (ENEM). Dessa forma, o curso de licenciatura, por ter sempre uma

concorrência de ingresso menor, em comparação com a do bacharelado, devido a pouca

atratividade do magistério, assim, para muitos estudantes a entrada na Química pela

licenciatura servia de trampolim para o curso de Bacharelado em Química, uma vez que no

decorrer do curso de licenciatura se transferiam, por editais de transferência interna da

universidade, para o curso de bacharelado.

Meitner: Escolhi a licenciatura e já entrei consciente [de] que seria professora,

mas durante o curso me surgiu a oportunidade de fazer o bacharelado, mas me

convenci que queria apenas a licenciatura.

Franklin: A minha intenção no início em fazer o curso de licenciatura era obter o

título de bacharelado também, porque a licenciatura se diferenciava muito pouco do

bacharelado, complementando meus estudos mais seis meses eu teria os dois cursos,

podendo trabalhar tanto nas indústrias quanto a dar aulas.

Outro fator que influencia a escolha para ingresso no magistério, de acordo com

Goodson (2007), é o fato de o licenciado ter sido educado em um ambiente sociocultural

próprio da classe trabalhadora. Essa experiência de ter sido educado em um ambiente que

influenciasse a escolha pela profissão docente foi evidenciada na narrativa de Mayer: Em

minha família, há vários profissionais da educação, estive sempre envolvida nesse meio e, a

partir de então despertei o interesse em lecionar.

De forma geral, a escolha pela profissão professor ou ser educador químico, de

acordo com as narrativas dessas professoras, levando em conta cada singularidade, ocorreu

pela afinidade com a docência e o gosto de ensinar pautados na lógica da integração, a

possibilidade de melhores possibilidades de atuação no mercado de trabalho, pela lógica da

profissionalização, da influência do ambiente sociocultural próprio da classe trabalhadora com

a lógica da transformação. Estas lógicas não são autônomas, mas interdependentes, como

afirma Valle (2006).

Page 82: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

81

Valle (2006) enfatiza que as lógicas de integração, de profissionalização e de

transformação estão articuladas e se concretizam a partir de outras lógicas: a lógica

institucional pautada nas políticas educacionais e os programas de formação inicial e

contínuo, que visam viabilizar os objetivos educacionais do Estado; a lógica de proximidade

que contempla a oferta de habilitações profissionais, fazendo com que essas escolhas sejam

feitas pela proximidade e disponibilidade nos estabelecimentos de ensino, e a lógica

corporativa que evidencia a mobilização de associações e sindicatos, que se dispõem a

consolidar a carreira docente, para (re) conquistar direitos que são considerados fundamentais

para a identidade profissional.

Em relação à formação profissional continuada, a principal constatação evidenciada

nas narrativas é a consciência que a formação é contínua, por parte de todas as professoras

entrevistadas, demonstrando consciência de que a formação docente é contínua e que

precisam sempre ir à busca de novos conhecimentos para se atualizarem. Segundo essas

professoras, dos cursos de formação continuada que realizam, alguns se encontram na

universidade, tais como congresso e seminário de educação, pós-graduação Scrito Sensu, e

outros se situam em momentos de estudos e reflexões sobre a ação pedagógica em cursos e

projetos ofertados no âmbito da própria escola em que lecionam, como a Sala do Educador,

Pacto pelo Fortalecimento do Ensino Médio entre outros.

Curie: Eu ainda me vejo hoje muito longe do que eu gostaria, por isso dei

continuidade em meus estudos na Pós-Graduação e estou no curso de Mestrado em

Educação na UFMT, e faço cursos que possam ser interdisciplinares com a minha

área também.

Mayer: Desde a minha formação inicial e até os dias de hoje, percebo que estou

cada vez mais empenhada e curiosa em aprender novas ferramentas para a sala de

aula, buscando sempre uma melhoria na qualidade do ensino, sempre tentando

adaptar as diversas problemáticas do cotidiano. Procuro também sempre participar

de cursos, seminários e congressos na área de educação.

Pesquisadores como Nóvoa (1992), Zabalza (2004) e Alarcão (2005) reforçam a

ideia de que a formação transcende a etapa escolar e os conteúdos convencionais da formação

acadêmica, vinculando-se a todo ciclo vital, constituindo, assim, um processo intimamente

ligado à realização pessoal e profissional dos indivíduos, ou seja, os sujeitos se formam ao

longo da vida.

Page 83: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

82

Iniciação à Docência e os Saberes Necessários à Atuação Profissional na Perspectiva de

Tardif

No que tange à inserção profissional na Educação Básica, todas as professoras

investigadas estão em início de carreira com, no mínimo, dois anos e no máximo seis anos de

docência, e começaram a trabalhar, de fato, como educadoras químicas na Educação Básica,

somente após a conclusão do curso de Licenciatura em Química.

Todavia, algumas dessas professoras, antes da conclusão do curso de graduação,

tiveram experiências com a docência como monitora de disciplina no Ensino Superior:

(Meitner), e substituição temporária de professores de Química na Educação Básica: (Curie,

Mayer e Franklin). A experiência mais marcante relatada por elas foi a passagem pelo

PIBID, pois esse programa lhes proporcionou uma prática antecipada de docência, que

significou momento de entusiasmo, de descoberta e de encantamento pela docência, embora

marcado por dificuldades e insegurança (GONÇALVES, 2000).

As narrativas revelam também que o Programa contribuiu para a compreensão dos

fenômenos educativos, tais como: o trabalho coletivo, o planejamento de aulas, o

desenvolvimento de materiais didáticos alternativos, entre outros, tornando-as profissionais

compromissadas e engajadas com a educação. Eis alguns depoimentos das colaboradoras:

Curie: O PIBID me ajudou muito no desenvolvimento das disciplinas de Práticas de

Ensino de Química I, II e III, principalmente a III que era regência em sala de aula

do Ensino Médio, e eu não faria essa regência com tanta tranquilidade como eu fiz,

se eu não tivesse tido já a experiência de estar dois anos antes direto dentro da sala

de aula do Ensino Médio por conta do PIBID.

Mayer: Minhas experiências profissionais iniciaram-se durante a graduação

quando eu fui bolsista do PIBID. Considero excepcional a oportunidade de ter

participado do PIBID, pois permite a inclusão do licenciando no contexto escolar,

para que a iniciação à docência ocorra antes mesmo de chegar o estágio. O que me

marcou na participação desse programa foram os planejamentos de aulas, oficinas

e projetos. Nos dias atuais, essas experiências me ajudam e muito no

desenvolvimento e preparação das minhas aulas, atividades experimentais e até

mesmo nos projetos que temos que desenvolver na escola.

Franklin: Até antes de eu entrar no PIBID, eu não via relação do curso de

licenciatura da UFMT com a escola, os estágios que nós fizemos eu achei muito

vago e o PIBID me encorajou, tipo: “agora você vai!”. Só que era um “você vai

com auxílio do supervisor e orientador”, não era um “você vai com a cara e a

coragem” e isso me tranquilizou muito no meu início da docência.

Page 84: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

83

Meitner: O PIBID me proporcionou experiência com a prática em sala de aula e a

vivência com os alunos. Quando eu apresentava as microaulas nas Práticas de

Ensino, o público era os colegas graduandos, diferença incomparável com os

alunos do Ensino Médio. Com o PIBID, eu ministrei aulas diretamente para os

alunos do Ensino Médio, verifiquei as dificuldades, as facilidades e, principalmente,

as experiências de elaborar aulas experimentais e de trabalhar com materiais

alternativos...

Pelas narrativas acima expressas, compreendo que a experiência inicial da docência

vivida no contexto do PIBID, pelas professoras colaboradoras possibilitou uma formação

inicial constituída pelo seu envolvimento, com processo de construção da sua prática escolar

caracterizada pela interação e parceria diretamente com os estudantes do Ensino Médio, de

modo prolongado com a escola e o não aligeiramento da formação do professor. Um dos

aspectos positivos sinalizados pelas participantes da pesquisa foi a partilha da formação

inicial com o docente da IES e o professor-supervisor da Educação Básica com orientações

dos planejamentos de aulas, oficinas e projetos junto ao bolsista licenciando. Com isto, é

possível inferir que a interação do PIBID favoreceu tanto a formação inicial do estudante,

quanto a formação continuada do professor-supervisor.

A construção de saberes docentes, na perspectiva de Tardif27 (2012), diz respeito a

uma realidade social materializada por meio da formação, de programas, de práticas coletivas,

de disciplinas escolares, dentre outros, e são, ao mesmo tempo, os saberes próprios do

professor. Nesse sentido, o autor propõe seis fios condutores que procuram situar os saberes

docentes entre a perspectiva individual e o social, entre o professor e o sistema em que atua, o

que caracteriza uma forte dimensão da pesquisa narrativa, que diz respeito ao social e

individual. Esses fios estão apresentados na Figura 5.

27 Para pesquisar os saberes profissionais docentes, Tardif (2012) propõe o conceito de Epistemologia da

Prática Profissional que de acordo com o autor é o estudo dos conjuntos dos saberes utilizados realmente pelos

profissionais, em seu espaço de trabalho cotidiano, para desempenhar todas as suas tarefas.

Page 85: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

84

Figura 5: Fios Condutores dos Saberes Docentes em Tardif

Fonte: Elaboração do autor, baseado em Tardif (2012)

O primeiro fio condutor, que diz respeito ao saber e trabalho, compreende o saber do

professor em seu ambiente profissional e se refere às relações mediadas pelo trabalho, a partir

das quais constrói saberes para enfrentar e solucionar situações cotidianas em sala de aula.

O segundo fio condutor é a diversidade do saber, pelo qual é reconhecida a

pluralidade do saber do professor. Segundo o autor, esse pluralismo de saberes provém de

diversas fontes como, por exemplo:

[...] alguns deles provém da família do professor, da escola que o formou e de sua

cultura pessoal; outros vêm das universidades ou das escolas normais; outros estão

ligados às instituições (programas, regras, princípios pedagógicos, objetivos,

finalidades e etc.); outros ainda provêm dos pares, dos cursos de aperfeiçoamento,

etc. (p. 19).

O terceiro fio condutor é a temporalidade do saber, pois entende que o saber do

professor é temporal, uma vez que é adquirido no contexto de uma história de vida. O autor

argumenta que para ensinar é preciso aprender a ensinar e isso acontece com o tempo,

progressivamente, à medida que vai acontecendo a realização do trabalho docente.

A experiência do trabalho como fundamento do saber é o quarto fio condutor, que é

constituído pelos saberes advindos da experiência do trabalho e que constituem o alicerce da

prática e das competências profissionais. Ao ensinar, o professor mobiliza uma ampla

variedade de saberes, reutilizando-os no trabalho para transformá-los e adaptá-los para e pelo

trabalho.

1º - Saber e Trabalho

2º - Diversidade do saber

3º - Temporalidade do saber 4º - A experiência de trabalho enquanto

fundamento do saber

5º - Saberes humanos a respeito de seres humanos

6º - Saberes e formação de professores

Page 86: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

85

O quinto fio condutor, saberes humanos a respeito de seres humanos, enfoca a ideia

do trabalho docente como interativo, ou seja, um trabalho em que o professor se relaciona

com o seu objeto de trabalho, fundamentalmente, por meio da interação humana.

O sexto e último fio condutor, saberes e formação profissional, reúne saberes

decorrentes dos saberes anteriores e expõe a necessidade de repensar a formação docente, em

que se devem levar em conta os saberes dos professores e as realidades específicas de seu

trabalho cotidiano.

Apresento a seguir, esses saberes para auxiliar na compreensão das relações que as

professoras colaboradoras estabelecem com esses saberes.

Os saberes da formação profissional dizem respeito ao conjunto de saberes

transmitidos, pelas instituições de formação de professores, como as escolas normais,

faculdades e institutos de educação ou construídos em processos autoformativos (JOSSO,

2004).

Tardif afirma que “o saber profissional está na confluência de vários saberes

oriundos da sociedade, da instituição escolar, de outros atores educacionais, das

universidades, etc (2012, p. 19)” [grifo nosso].

Os saberes disciplinares são os saberes que correspondem aos diversos campos do

conhecimento, saberes esses de que dispõe a sociedade, tais como se encontra hoje nas

universidades, no interior de faculdades e de cursos distintos sob forma de disciplinas. Nas

palavras do autor:

Os saberes disciplinares (por exemplo, matemática, história, literatura e etc.) são

transmitidos nos cursos e departamentos universitários independentemente das

faculdades de educação e dos cursos de formação de professores. Os saberes das

disciplinas emergem da tradição cultural e dos grupos sociais produtores de saberes.

(TARDIF, 2012, p. 38).

Nas entrevistas com as professoras colaboradoras, fiz a seguinte indagação: quais

conteúdos da disciplina de Química você mais gosta de trabalhar no Ensino Médio? Curie e

Franklin expressaram que gostam de trabalhar com modelos atômicos, Mayer e Meitner

gostam de trabalhar com ácidos e bases.

No que tange aos saberes curriculares, estes são os saberes que correspondem aos

discursos, objetivos, conteúdos e métodos a partir dos quais a instituição escolar categoriza e

apresenta os saberes sociais por ela definidos e selecionados como modelo de cultura erudita.

“Apresentam-se concretamente sob a forma de programas escolares (objetivos, conteúdos,

métodos) que os professores devem aprender e aplicar” (TARDIF, 2012, p. 38).

Page 87: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

86

Sobre os saberes curriculares, na perspectiva de Tardif (2012) e Gauthier et al.

(2013), no momento da entrevista com as professoras, ao serem indagadas como estavam

organizado o currículo de Química no ano em que elas atuavam, todas as colaboradoras

Curie, Mayer, Franklin, Meitner expressaram que trabalham com o currículo de Química

como está apresentado na sequência dos livros didáticos: no nono ano do Ensino Fundamental

e quando trabalham com a disciplina de Ciências e essa é subdividida em um semestre com

conhecimentos de Química e um semestre com conhecimentos de Física; no primeiro ano do

Ensino Médio trabalham com química geral e inorgânica; já no segundo ano do Ensino Médio

com físico-química e no terceiro ano, com química orgânica.

Depreendo, com Sacristán (2000), que para que seja possível compreender o que é o

ensino, as práticas pedagógicas, o conhecimento dos docentes e o próprio currículo, em si,

têm que levar em consideração a elaboração curricular e a forma com que este se desenvolve

em uma determinada disciplina.

Todas as professoras colaboradoras da pesquisa Curie, Mayer, Franklin e Meitner

revelaram que utilizam somente o livro didático em seus planejamentos e desenvolvimento

curricular em Química. Elas se expressam nos seguintes termos:

Curie: Para o meu planejamento, eu sigo somente a apostila que a escola adota,

pois tenho que cumprir todo o conteúdo programático que vem nela.

Mayer: O planejamento da disciplina de Química é realizado junto com os

professores das outras áreas na semana pedagógica com os professores no início do

ano, mas sigo sempre o livro didático.

Franklin: Para desenvolver as minhas aulas de Química no Ensino Médio, eu

utilizo somente o livro didático adotado na escola pelo PNLD.

Meitner: Eu acabo ficando refém do livro didático, por ter muitas atividades a ser

feitas no dia a dia. É um instrumento mais prático, para desenvolver as minhas

aulas.

Os professores na Educação Básica, ao utilizar somente o livro didático no processo

de ensino-aprendizagem, justificam-se por falta de tempo, pelas múltiplas atribuições

cotidianas, em última análise das condições reais de trabalho docente. Contudo, é comum se

ouvir dizer que as mazelas educacionais se devem à incompetência dos professores que,

muitas vezes, acabam sendo adotados por livros-texto.

Nesse sentido, para eliminar essa visão simplista e distorcida do senso comum em

relação aos professores e com o intuito de não culpabilizar essas colaboradoras pelas mazelas

do processo de ensino-aprendizagem de Química na Educação Básica, para esse dado de

pesquisa, busco compreensão em Sacristán (2000), quando afirma que as condições nas quais

Page 88: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

87

os professores realizam o seu trabalho não são, em geral, as mais adequadas para desenvolver

a iniciativa profissional, pois o número de educandos a serem atendidos, ao lado das diversas

facetas que o professor deve assumir, tais como, a atenção aos educandos, a correção de

trabalhos, a burocracia que origina sua própria atividade, as condições físicas precárias de

muitas escolas públicas, entre outros, são atividades que se somam à estrita tarefa de planejar,

ensinar e de avaliar o ensino. Essa debilidade da profissionalização dos professores e as

condições nas quais desenvolvem seu trabalho fazem que os meios elaboradores do currículo

sejam dispositivos intermediários, essenciais e indispensáveis no atual sistema escolar.

De acordo com o autor: “esta é a função capital que os meios didáticos cumprem,

mas, sobretudo os guias didáticos e os livros-texto, que são autênticos responsáveis pela

aproximação das prescrições curriculares aos professores” (2000, p. 149).

Dessa forma, Sacristán (2000) afirma, ainda, que os materiais didáticos desenvolvem

todo o currículo, pois:

1) São os tradutores das prescrições curriculares gerais e, nessa mesma medida,

construtores de seu verdadeiro significado para alunos e professores; 2) São os

divulgadores de códigos pedagógicos que levam a prática, isto é, elaboram os

conteúdos ao mesmo tempo que planejam para o professor sua própria prática; são

depositários de competências profissionais; e 3) Voltados à utilização do professor,

são recursos muito seguros para manter a atividade durante um tempo prolongado, o

que dá uma grande confiança e segurança profissional. Facilitam-lhe a direção da

atividade nas aulas (2000, p. 157).

Diante do exposto, os livros didáticos não são apenas recursos para serem usados

pelos professores e educandos, mas passam a ser os verdadeiros sustentadores da prática

pedagógica dessas professoras colaboradoras.

No que concerne à disposição do currículo de Química na Educação Básica, as

Orientações Curriculares Nacionais de Química para o Ensino Médio fazem sérias críticas aos

procedimentos usuais nas escolas, dizendo que:

De forma geral, nos programas escolares é que persiste a ideia de um número

enorme de conteúdos a desenvolver, com detalhamentos desnecessários e

anacrônicos. Dessa forma, os professores obrigam-se a “correr com a matéria”,

amontoando um item após outro na cabeça do aluno, impedindo-o de participar na

construção de um entendimento fecundo sobre o mundo natural. São visivelmente

divergentes o ensino de Química no currículo praticado e aquele que a comunidade

de pesquisadores em Educação Química do país vem propondo. (2008, p. 108).

Neste sentido, a inexistência de uma seleção de temas e o progressivo crescimento

do conhecimento na área de Química acaba impondo propostas de ensino de Química com

conteúdos exagerados em relação ao tempo disponível. As tentativas para solução desse

problema sempre se resumiram ao corte linear aplicado sobre o conjunto, obrigando dessa

Page 89: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

88

forma os textos didáticos a discorrer sobre tudo um pouco, sem se aprofundar em nenhum

assunto. Essa redução do tempo dedicado à discussão dos temas, feita de maneira não seletiva,

torna os conteúdos fragmentados e difíceis de serem compreendidos pelos estudantes,

induzindo também à valorização dos conteúdos de simples memorização em detrimento da

reflexão e uso do raciocínio (RIBEIRO, 2009).

Ainda, em relação à metodologia do ensino de Química para a Educação Básica, as

Orientações Curriculares Nacionais de Química para o Ensino Médio afirmam que:

Em que pesem as abordagens consensuais na educação em Ciências, nos últimos 40

anos, dirigidas à superação de metodologias e conteúdos marcados pelo “modelo

bancário” (FREIRE, 1987) de ensino-aprendizagem, conclui-se que, no país, as

práticas curriculares de ensino de Ciências Naturais são ainda marcadas pela

tendência de manutenção do “conteudismo” típico de uma relação de ensino tipo

“transmissão – recepção”, limitada à reprodução restrita do “saber de posse do

professor”, que “repassa” os conteúdos enciclopédicos ao aluno. Esse, tantas vezes

considerado tábula rasa ou detentor de concepções que precisam ser substituídas

pelas “verdades” químico-científicas (2008, p. 105).

Nesta perspectiva, o tratamento metodológico referido confirma a crítica de Chassot

(2014), quando diz que a Química, da forma como é trabalhada no Ensino Médio, é

considerada uma ciência esotérica, concorrendo para o desestímulo do educando, que cria a

falsa ideia de que a Química é, em si, de difícil compreensão, portanto, para ser entendida por

poucos especialmente qualificados.

Mesmo trabalhando a sequência dos conteúdos de Química de forma tradicional, as

professoras investigadas expressaram sempre trabalhar os conteúdos de forma contextualizada

e na perspectiva de formar cidadãos críticos para atuar na sociedade em que vivem, tentando

dessa forma romper com a lógica tradicional de ensino. Nesta perspectiva, Curie destaca a

importância de trabalhar o conhecimento de Química, de forma contextualizada, ao lado do

desenvolvimento de valores éticos:

Eu sempre trabalho com meus alunos na perspectiva interdisciplinar e de forma

contextualizada. Hoje, quando um aluno fala que ele não vai usar Química, que ele

vai ser médico, ou porque ele vai ser advogado, eu falo: não! Você vai usar

Química, sim! Você já parou para pensar se uma indústria polui o rio e você como

advogado pega a causa dessa indústria para defender e não entende nada de

Química, como você vai garantir que essa indústria não poluiu esse rio ou poluiu

esse rio? Então você como advogado precisa conhecer Química.

Entendo que Curie, ao oferecer um ensino de Química para formar cidadão, tem

como intencionalidade pedagógica a de preparar seus educandos para que eles compreendam

questões locais e globais do mundo contemporâneo e façam uso das informações químicas

Page 90: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

89

básicas necessárias para a participação efetiva na sociedade e no trabalho, em que os

conhecimentos e os avanços tecnológicos se modificam constantemente. De acordo com

Santos e Schnetzler (2003), o ensino de Química para formar cidadão:

Levaria o aluno a compreender os fenômenos químicos mais diretamente ligados a

sua vida cotidiana; a saber, manipular as substâncias com as devidas precauções; a

interpretar as informações químicas transmitidas pelos meios de comunicação; a

compreender e avaliar as aplicações e implicações tecnológicas; a tomar decisões

frente aos problemas sociais relativos à Química (p.94).

Ainda sobre o ensino de Química para formar cidadão, Santos e Schnetzler (2003)

alertam que esse ensino não consiste em ensinar a Química dos polímeros, das poliamidas,

dos policarbonatos, dos neoprenos, dos hidrocarbonetos, das sulfamidas, dos organoclorados,

dos sais de ácidos carboxílicos e de ácidos benzenossulfônicos substituídos, como pretendem

alguns livros, maquiados com o cotidiano. O conhecimento químico que se deve trabalhar

com os estudantes da Educação Básica precisa implicar também no desenvolvimento de

valores éticos (RIBEIRO, 2009).

No tocante aos saberes da experiência, de acordo com Tardif (2012) são saberes

constituídos no exercício da prática cotidiana da profissão, fundada no trabalho e no

conhecimento do meio. Estes incorporam-se à experiência individual e coletiva sob a forma

de habitus (isto é, certas disposições adquiridas na e pela prática real) que lhe permitirão

enfrentar os condicionantes indispensáveis da profissão.

Por este ângulo:

Os habitus “podem transformar-se num estilo de ensino, em “macetes” da profissão

e até mesmo em traços da “personalidade profissional”: eles se manifestam então,

através de um saber-ser e de um saber-fazer pessoais e profissionais validados pelo

trabalho cotidiano (TARDIF, 2012, p. 49)”.

No decorrer da entrevista, ao serem indagadas sobre como se veem como professores

que ensinam Química, desde a formação inicial até os dias atuais, Meitner expressou que a

experiência do dia-a-dia da sala de aula fez com ela ganhasse confiança em sua prática

pedagógica por se considerar uma pessoa tímida:

No meu desenvolvimento profissional eu me sinto sempre em constante evolução,

pois a cada ano eu sou surpreendida com dificuldades diferentes e eu consigo

superá-las. Eu me considero um pouco tímida, porém quando eu entro na sala de

aula eu me transformo e me surpreendo com uma sala com 35 alunos todos

prestando atenção no que eu estou explicando, mas essa confiança em sala de aula

eu só fui conquistando com o passar do tempo em sala de aula.

Page 91: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

90

Meitner expressa, no excerto acima, a sua percepção de desenvolvimento

profissional, ao dizer: eu me sinto sempre em constante evolução, pois a cada ano eu sou

surpreendida com dificuldades diferentes e eu consigo superá-las. Ao reconhecer dificuldades

em sua prática docente e procurar superá-las, sente o êxito profissional e o próprio

crescimento na docência. Sente-se mais confiante, no exercício da docência, destacando que

essa confiança em sala de aula eu só fui conquistando com o passar do tempo, em sala de

aula. Ela não expressa, mas certamente, desenvolveu um jeito de ser e estar na profissão, um

habitus profissional, que conquista a atenção dos estudantes e a faz sentir-se confiante em sala

de aula. Evidencia, contudo, uma certeza, Tornou-se assim, com o passar do tempo, em sala

de aula, ou seja, aprendeu com a experiência, conforme ensina Tardif (2012).

Já Curie percebeu no contexto da prática que, embora ela trabalhe com os mesmos

conteúdos todos os anos, cada turma é diferente, então sempre há necessidade de fazer novos

planejamentos:

Eu me vejo ainda muito longe do que eu gostaria, porque eu tenho as minhas

limitações, minhas aulas são sempre planejadas antes e por mais que eu trabalhe

com turmas de primeiro ano já há três anos, todas as minhas aulas são preparadas

de novo, meus planos de aulas são escritos novamente porque cada turma de cada

ano são diferentes, então todo ano eu mudo as atividades e o que deu certo eu

sempre tento aproveitar e o que não deu certo então eu já mudo o método.

No excerto acima, Curie percebe a sua própria incompletude, ao dizer: Eu me vejo

ainda muito longe do que eu gostaria, porque eu tenho as minhas limitações. Ao reconhecer

sua incompletude, reflete e planeja novamente a cada turma, examina a sua prática e o que foi

bem sucedido, aproveita e muda o modo de ensinar para aspectos nos quais não houve

sucesso (FREIRE, 2013).

As professoras investigadas expressaram, em suas narrativas, que o PIBID ajudou de

forma positiva as práticas em sala de aula, colaborando de forma significativa para os seus

saberes pedagógicos de conteúdo - PCK, em Shulman (1986), os saberes da ação pedagógica

na perspectiva de Gauthier et al. (2013), os saberes pedagógicos e saberes da experiência na

perspectiva de Pimenta (2012) e Tardif (2012). Tendo em vista, que as relações da mediação

didática dos saberes científicos para os saberes pedagógicos de conteúdos químicos para

atuarem na educação básica foram realizados somente nas disciplinas de Práticas de Ensino na

graduação e as demais disciplinas do curso não lhe possibilitaram essa construção. Veja-se os

seguintes registros:

Page 92: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

91

Curie: O PIBID contribuiu tanto para a minha escrita, na elaboração de texto, nas

leituras, nas interpretações dessas leituras que hoje eu sento e consigo ler um artigo

acadêmico e dizer: Não! Esse artigo está dizendo isso, onde e como eu posso

aplicar a contribuição desse teórico em minha sala de aula ...

Mayer: Hoje em dia eu não tenho dificuldades de preparar minhas aulas e eu não

só utilizo o livro didático adotado na escola, eu utilizo outros materiais para

complementar o conteúdo que irei trabalhar. Na escola onde eu trabalho tem

laboratório de Ciências, então eu sempre preparo atividades experimentais e levo

meus alunos para o laboratório para que eles possam associar o que estão

estudando na teoria com alguma aplicação prática. E nas minhas aulas

experimentais eu não tenho nenhuma dificuldade ou medo de prepará-las, porque

na escola estadual apesar de ter o laboratório não possui recursos para comprar

reagentes que nós necessitamos. Então, eu procuro trabalhar com materiais

alternativos e coisas do dia a dia dos alunos que eles possuem em casa. Nos roteiros

das aulas, os alunos usam a reflexão para resolver os problemas propostos nas

atividades experimentais. Dessa forma, com os conhecimentos químicos

trabalhados, os mesmo têm a possibilidade de se tornarem cidadãos mais críticos

na sociedade em que vivem.

No excerto acima, Curie expressa que, ao participar do PIBID, ela viveu várias

experiências formativas, mas o que mais lhe marcou foi a dedicação às leituras dos artigos no

âmbito da educação, pois no início e até a metade do curso de Química eles não tinham o

hábito de ler, só de fazer cálculos e, nos dias atuais, por meio de leituras de artigos teóricos,

tenta aplicar e contextualizar os conteúdos em sua sala de aula. Já Mayer expressa, que sua

experiência no PIBID contribuiu para que ela não ficasse refém de um único livro didático,

em sala de aula, e não tivesse medo de trabalhar com atividades experimentais na Educação

Básica. A experiência de trabalhar com atividades experimentais com materiais alternativos

proporcionados pelo PIBID na formação inicial, como expressou Mayer, evidencia o

consenso que há entre pesquisadores e professores de ciências naturais de que as atividades

experimentais devem permear as relações de ensino-aprendizagem, uma vez que estimulam o

interesse dos estudantes em sala de aula na Educação Básica e o engajamento em atividades

subsequentes de ensino (GIORDAN, 1999; LABURÚ, 2006).

Nessa mesma linha, pesquisas como de Galiazzi et al. (2004), dentre outras, acenam

para as múltiplas funções da experimentação na educação científica, entre elas: motivar e

estimular os estudantes, melhorar a aprendizagem de ciências, introduzir os estudantes ao

método científico e desenvolver habilidades científicas tais quais: observação, reflexão,

formulação de hipóteses e ensinar técnicas de laboratório.

Ao sintetizar a revisão sistemática sobre saberes docentes que foi apresentada nessa

subseção, identifiquei que embora Shulman (1986), Gauthier et al. (2013), Tardif (2012) e

Pimenta (2012) possam realizar abordagens teóricas distintas, é possível reconhecer que há

pontos de aproximação quando, por exemplo, Tardif (2012) trabalha com o conceito de saber

da experiência, Shulman (1986) com o conceito de conhecimento pedagógico de conteúdo

Page 93: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

92

- PCK, e Gauthier et al. (2013) com o conceito do saber da ação pedagógica, e Pimenta

(2012) com o saber pedagógico, ou seja, o conteúdo específico reelaborado, por professores,

para ser ensinado aos educandos.

A seguir apresento a classificação e particularidades das pesquisas sobre saberes

docentes dos autores apresentados no Quadro 1, e construo uma síntese das tipologias dos

saberes por meio da figura 6.

Quadro 1: Classificação e Particularidades das Pesquisas sobre Saberes Docentes

Fonte: Elaboração do autor, baseado em de Shulman, Gauthier, Tardif e Pimenta

Figura 6: Tipologia dos Saberes Docentes

Fonte: Elaboração do autor, baseado em de Shulman, Gauthier, Tardif e Pimenta

•Conhecimento que os professores têm do conteúdos de ensino e o modo como estes se transformam em ensino.

Shulman

•Ofício feito de Saberes.

• Constituir Teoria Geral da Pedagogia.Gauthier et al.

•Epistemologia da Prática Profissional dos Professores.

•Ênfase no Trabalho Docente.Tardif

PimentaMobilização dos saberes da docência.

Construção da Identidade Profissional dos Professores.

• Shulman (1986)

- Conhecimento do Conteúdo específico

- Conhecimento Pedagógico de Conteúdo (PCK)

- Conhecimento Curricular

• Gauthier et al. (2013)

- Saberes Disciplinares

- Saberes Curriculares

- Saberes das Ciências da Educação

- Saberes da Tradição Pedagógica

- Saberes Experenciais

- Saberes da Ação Pedagógica

• Tardif (2012) - Saberes da Formação Profissional - Saberes Disciplinares - Saberes Curriculares - Saberes da Experiência

• Pimenta (2012)

• - Saberes da Experiência

• - Saberes do Conhecimento

• - Saberes Pedagógicos

Saberes Docentes

Page 94: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

93

Após percorrer a exposição sobre as histórias de formação inicial e continuada e

iniciação à docência das colaboradoras de pesquisa, apresento, a seguir, o modelo didático

dessas colaboradoras, pois se trata de um instrumento de análise que pode ser acessado de

forma aproximativa com a realidade educativa dessas professoras.

Modelos Didáticos e Aproximação da Realidade Educativa

Várias pesquisas educacionais revelam que os professores, de forma geral, da

Educação Básica e do Ensino Superior, geralmente, manifestam suas ideias sobre a matéria, o

ensino, a aprendizagem, o aluno, a metodologia de trabalho, a avaliação, entre outros, de uma

forma muito simples, próprias do senso comum, e distantes do que propõem os

conhecimentos pedagógicos hoje aceitos pela comunidade científica. Segundo Porlán (1998),

Maldaner (2006), Carvalho; Gil-Pérez (2011), esse pensamento do senso comum está

impregnado por crenças e saberes tácitos, muitas vezes, não explicitados por estarem

configurados por um forte componente ambiental, desde as experiências como estudantes nos

graus iniciais de escolarização até a formação universitária de professor.

Nesta perspectiva, a maneira como o professor desempenha a docência e a relação

com o seu pensamento é objeto de investigação de várias pesquisas educacionais, como já

mencionado em pesquisas de Nóvoa (1992), Gonçalves (2000), Josso (2007), Huberman

(2007), Goodson (2007), Clandinin e Connelly (2011), dentre outros, e em ensino de Ciências

especificamente, e esses estudos apontam a relação intrínseca entre a prática pedagógica, o

comportamento e ações docentes e as suas crenças e concepções. Nesse sentido, estudos sobre

modelos didáticos de professores atestam que esses podem fornecer subsídios para explicação

de aspectos imbricados no ato docente e no seu desenvolvimento profissional (PORLÁN et

al., 1996, 1997, 1998; GARCÍA PÉREZ, 2000; GUIMARÃES, ECHEVERRÍA e MORAES,

2006; SANTOS JR e MARCONDES, 2010).

O conceito de modelo didático é um poderoso mecanismo intelectual para abordar os

problemas de ensino, em sala de aula, ajudando a estabelecer o necessário vínculo entre a

análise teórica com a mediação de sua prática docente. Trata-se de um esquema para estar

entre a realidade e o pensamento do professor, uma estrutura na qual se organiza o

conhecimento e terá sempre um caráter provisório e de aproximação da realidade, além de ser

um recurso para o desenvolvimento e fundamentação do professor (CHROBAK, 2006).

Nas pesquisas sobre conhecimentos profissionais desenvolvidas por Porlán et al.

(1997), os autores utilizam o termo concepções epistemológicas do professor, como sendo

Page 95: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

94

um conjunto de ideias e formas de desempenho que se relacionam com o conhecimento

escolar, o seu processo de construção, sendo essas ideias possíveis de se manifestarem de

maneira implícita ou não. Nesse sentido, o termo “concepções epistemológicas” se coaduna

com o termo de modelo didático.

Partindo do pressuposto de que as crenças didáticas associadas a conhecimentos e a

valores influenciam nas escolhas e atuação de professores, García Pérez (2000) evidencia que

o conceito de modelo didático permite abordar (de maneira simplificada como qualquer

modelo) a complexidade da realidade escolar, ao mesmo tempo em que ajuda a propor

procedimentos de intervenção nesta instituição e a fundamentar, portanto, linhas de

investigação educativa e de formação de professores. Nessa perspectiva, o modelo didático

facilita as análises da realidade escolar com vistas a sua transformação.

Para fomentar as reflexões sobre as colaboradoras dessa pesquisa de tese, acerca de

que movimentos teóricos, metodológicos e epistemológicos de formação e docência

contribuem para a constituição e atuação dessas professoras, dentre vários instrumentos de

registros de informações que foram utilizados, como entrevista semiestruturada, grupo focal,

entre outros, apliquei um instrumento para identificar o modelo didático dessas educadoras

químicas com base em Santos Jr e Marcondes (2010) e nos pressupostos de García Perez

(2000).

Diante do exposto, entendo que partir de perspectivas particulares de aprendizagem,

nem sempre resulta em práticas pedagógicas específicas. Dessa forma, estou ciente, de que

não existe uma relação linear entre concepções e práticas, pois as condições de trabalho

docente podem interferir fortemente no que é possível fazer pelo professor na escola em que

trabalha. Parto do pressuposto de que qualquer tentativa de conformar os processos

educacionais em modelos é artificial, uma vez que a sua complexidade não nos permite

enquadramentos estáticos. Todavia, modelos são construções teóricas que possibilitam uma

aproximação mais sistemática da compreensão do objeto de estudo. Nesse sentido, acredito

que a análise das concepções das professoras de Química, colaboradoras da pesquisa, e a

caracterização do modelo didático predominante, em seus discursos, permite levantar

questionamentos sobre o seu desenvolvimento profissional e as possíveis práticas pedagógicas

(GUIMARÃES, ECHEVERRÍA e MORAES, 2006).

Page 96: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

95

Detectando os Modelos Didáticos nos Discursos das Professoras Colaboradoras

Conforme García Pérez (2000), um modelo didático para um professor é constituído

pelas crenças, pela cultura, pelas relações sociais que permeiam o processo de ensino e

aprendizagem e a intencionalidade do professor em ensinar seus educandos na relação

pedagógica. E a construção desses modelos baseia-se em cinco dimensões didáticas, a saber:

(I) Por que ensinar? Qual o objetivo do ensino? (II) Que conteúdo deve ser ensinado ao

educando? (III) Como ensinar? (IV) Qual a relevância das ideias e interesses do educando?

(V) Como avaliar? Com base nessas dimensões, o referido autor propõe quatro modelos

didáticos: o tradicional, o tecnológico, o espontaneísta e o alternativo.

O modelo didático tradicional traz como pressupostos as concepções advindas da

transmissão cultural vigente, em uma perspectiva enciclopédica, de caráter fragmentado e

cumulativo, o educando é considerado um quadro branco, em que o conhecimento será

desenhado pela ação educativa do professor, o conhecimento, particularmente o concernente

às ciências naturais e exatas, é tido como algo pronto e passível de ser transmitido a esse

educando, sem que o mesmo tenha participação no planejamento das atividades que lhe são

ensinadas e ao professor cabe, além do planejamento, controlar a disciplina da sala de aula e a

avaliação centra-se no que foi memorizado no processo transmissão/recepção.

O modelo didático tecnológico surge da necessidade de adaptação da escola

tradicional a novos contextos socioeconômicos influenciados pelo desenvolvimento técnico-

científico. Nesse sentido, aos saberes disciplinares são agregados pela incorporação de

conteúdos ditos mais modernos vinculados a temáticas ambientais e sociais e à aquisição de

habilidades e competências, sem levar em consideração as concepções e os interesses dos

educandos. As concepções dos educandos, quando consideradas no processo, procuram ser

substituídas por conhecimentos científicos já elaborados, e a eles cabe executar todas as

atividades programadas pelo professor nesse processo que, nesse modelo, tem a função de

controlar o andamento das atividades propostas.

O modelo espontaneísta é percebido como um contraponto ao modelo tradicional,

pressupondo “uma crítica de caráter ideológico-político à cultura racionalista e academicista”

(GARCÍA PÉREZ, 2000, p. 8). Nesse modelo, o interesse do educando é um componente

fundamental, pois é a partir dele, juntamente com a realidade na qual está inserido, que o

professor elabora seu planejamento. O professor não tem um papel gerencial do processo, e é

visto como uma liderança que coordena o trabalho dos educandos, e estes possuem um papel

Page 97: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

96

ativo, sendo esperado que eles sejam capazes de aprender determinados conteúdos por

descoberta e compreender o contexto social em que vivem.

E, por fim, o modelo alternativo tem como finalidade o enriquecimento do

conhecimento dos educandos, em uma direção que conduza uma visão mais complexa e

crítica da realidade. As ideias e os interesses dos educandos são considerados nesse modelo

didático, e tanto professor quanto os próprios educandos exercem papel ativo, sendo os

professores como investigadores de suas práticas pedagógicas e os educandos como

construtores e reconstrutores de suas aprendizagens, que são alcançadas pela implantação de

situações problemas, que exigem dos alunos posturas investigativas para a sua resolução.

Nas pesquisas sobre modelos didáticos de professores, empreendidas por Guimarães;

Echeverría; Moraes (2006) e Santos Jr; Marcondes (2010), os autores evidenciaram que o

professor, ao pensar sobre o seu próprio ato docente, se apropria de determinadas

características desses quatro modelos didáticos, construindo assim um modelo pessoal

divergente dos pressupostos delineados.

Adiante segue uma síntese das características de cada modelo, de acordo com o

Quadro 2:

DIMENSÃO

DIDÁTICA

TRADICIONAL TECNOLÓGICO ESPONTANEÍSTA ALTERNATIVO

1 – Por que

ensinar?

(Objetivos do

ensino)

Transmitir ao aluno

conteúdos

consagrados na

cultura vigente.

Proporcionar ao aluno

uma formação

moderna e eficiente.

Capacitar o aluno para

que possa compreender

a realidade.

Proporcionar ao aluno

uma compreensão cada

vez mais complexa do

mundo e de como atuar

nesse.

2- Que conteúdo

deve ser ensinado

ao aluno?

Conteúdos

disciplinares,

conceitos

específicos.

Conteúdos que

propiciem uma

formação cultural

atual, conhecimentos

não somente

disciplinares.

Conteúdos presentes na

realidade imediata do

aluno.

Conhecimentos

interdisciplinares, o

enfoque está no contexto

social.

3 – Como ensinar? As atividades

enfatizam a

memorização de

informações,

nomes, fórmulas e

conhecimentos

fragmentados da

realidade do aluno.

As atividades e

conteúdos privilegiam

o desenvolvimento

das habilidades e

competências.

Metodologia baseada no

protagonismo do aluno,

que vai descobrindo o

conhecimento.

Baseada na ideia da

investigação escolar, o

aluno constrói e

reconstrói o

conhecimento.

4 - Qual a

relevância das

ideias e interesses

do aluno?

Não considera. Quando considera as

concepções, essas são

vistas como erros

conceituais.

Considera apenas os

interesses imediatos do

aluno.

Considera os interesses e

as concepções do aluno.

5 - Como avaliar? Valoriza a

memorização dos

conteúdos

transmitidos,

realizadas por

provas formais.

Avaliação centrada na

quantificação da

aprendizagem e

verificar a eficiência

da sistemática do

ensino.

A avaliação é centrada

na observação e na

análise de trabalhos e

no desenvolvimento

pessoal do aluno.

A avaliação assume um

caráter formativo,

identificando as

dificuldades dos alunos e

promovendo uma reflexão

sobre a sua evolução.

Quadro 2: Características dos Modelos Didáticos

Fonte: GARCÍA PÉREZ (2000)

Page 98: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

97

Com base nos modelos didáticos, propostos por García Pérez (2000), Santos Jr e

Marcondes (2010), apliquei um instrumento para identificar os modelos didáticos de

professores de Química que atuam na Educação Básica, o qual concebo que pode ser

estendido também para verificar modelos didáticos de professores que atuam no Ensino

Superior, e que na presente tese foi aplicado às professoras colaboradoras para triangular com

as narrativas expressas nos outros instrumentos de registros de informações por mim

utilizados, de modo a apreender na relação pedagógica suas crenças, cultura, e relações

sociais que permeiam o processo de ensino-aprendizagem e a intencionalidade ao ensinar

Química na Educação Básica a seus educandos.

O instrumento aplicado às colaboradoras consiste de uma pergunta fechada,

correspondente às cinco dimensões didáticas, a saber, (1- objetivos do ensino; 2 – conteúdos;

3 - papel das ideias e interesses dos estudantes; 4 – metodologia e 5 – avaliação), e para cada

dimensão existem quatro proposições características de cada um dos modelos didáticos, sendo

estes: tradicional, tecnicista, espontaneísta e alternativo respectivamente, propostos por

Garcia Pérez (2000). A professora colaboradora devia atribuir para cada proposição um valor

seguindo o critério (0, completa rejeição; 3 completa aceitação; e os valores 1 e 2 são

intermediários entre a rejeição e a aceitação).

Nas análises do instrumento foi arbitrado que, sempre que a professora colaboradora

atribuísse os valores 2 ou 3 para cada uma proposição do instrumento, ela estaria aceitando

essa característica na composição de seu modelo didático pessoal. Nesta perspectiva, foi

elaborada uma representação em que as áreas coloridas correspondem às características

aceitas por essas colaboradoras, ou seja, aquelas que as docentes atribuíram os valores 2 ou 3

(SANTOS Jr e MARCONDES, 2010).

Segue abaixo, no Quadro 3, a organização dos modelos didáticos das professoras

colaboradoras de acordo, com suas respostas no instrumento:

Dimensão 1

Objetivos

do Ensino

Dimensão 2

Conteúdos

Dimensão 3

Papel das ideias

e interesses dos

estudantes

Dimensão 4

Metodologia

Dimensão 5

Avaliação

Professoras T C E A T C E A T C E A T C E A T C E A

Curie

Mayer

Franklin

Meitner

Quadro 3: Organização dos Modelos Didáticos das Professoras Colaboradoras

Legenda: T tradicional, C tecnicista, E espontaneísta, A alternativo.

Page 99: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

98

Os resultados corroboram as reflexões de Guimarães, Echeverría e Moraes (2006)

sobre o fato dos professores se apropriarem de características de diferentes modelos didáticos

propostos por Garcia Pérez (2000), para compor o seu modelo didático pessoal, chamado por

esses pesquisadores por modelo eclético.

De acordo com Santos Jr e Marcondes (2010), os modelos didáticos tradicional e

tecnicista possuem em comum a tendência para a transmissão cultural dos conteúdos, já os

modelos espontaneísta e alternativo estão alinhados à visão construtivista do processo de

ensino e à aprendizagem do conhecimento científico. As aceitações, anteriormente

declaradas pelas professoras, por meio do instrumento com as perguntas fechadas, foram tidas

como consistentes, sempre que agregassem características de modelos didáticos de mesma

orientação pedagógica.

Neste sentido, um modelo didático eclético formado pelas características dos

modelos tradicional e tecnicista TC ou pelas características dos modelos espontaneísta e

alternativo EA são considerados coerentes. Já o modelo eclético formado pelas características

dos modelos tecnicista e alternativo do tipo CA, dos modelos tradicional, espontaneísta e

alternativo do tipo TEA, e dos modelos tecnicista, espontaneísta e alternativo do tipo CEA

foram considerados incoerentes.

Na mesma linha de raciocínio, o modelo eclético do tipo TCEA é mais incoerente

que os dos tipos CA, TEA e CEA, porque o primeiro é composto pelas características dos

quatro modelos, o segundo é formado por duas características antagônicas, e o terceiro e o

quarto são formados pelas características de três modelos didáticos.

Ao realizar a análise da visão das professoras colaboradoras do processo de ensino-

aprendizagem em Química pela metodologia indicada por pesquisadores como García Pérez

(2000), Guimarães, Echeverría e Moraes (2006) e Santos Jr e Marcondes (2010) pode-se

inferir que, se a professora tem visão coesa do processo de ensino-aprendizagem apresentará

modelos ecléticos parecidos em todas as dimensões analisadas, porque todas estão

relacionadas. Entretanto, se possuir modelos ecléticos muito diferentes em cada uma das

cinco dimensões didáticas, deduz-se que a mesma possui uma visão fragmentada do processo

de ensino-aprendizagem em Química.

A natureza eclética desses modelos didáticos apresentados pelas colaboradoras pode

ser um indicativo de que essas professoras precisam aprofundar a reflexão sobre a sua visão

do processo de ensino-aprendizagem em Química, bem como suas crenças e suas concepções.

Essa observação se deve ao fato de que algumas características dos modelos didáticos

Page 100: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

99

propostos por García Pérez (2000) terem se mostrado antagônicas dentro da mesma dimensão

didática.

Contudo, deve-se considerar também, que os saberes profissionais que as professoras

colaboradoras apresentam são formulados em uma dimensão evolutiva e progressiva,

mediante um processo aberto de reorganização contínua de seus sistemas de ideias, sendo

assim, os modelos didáticos pessoais, que foram apresentados, representam momentos de

suas reflexões e suas práticas (GARCÍA e PORLÁN, 2000).

Ao analisar o modelo didático pessoal para a colaboradora Curie, identifico que ela

apresenta coerência na dimensão didática, o que ocorre na dimensão 4 (metodologia) com o

modelo eclético do tipo EA e incoerências nas dimensões 1 (objetivos do ensino), modelo

eclético do tipo CEA; 2 (conteúdos), modelo eclético CA; 3 (papel das ideias e interesses dos

estudantes), modelo eclético TEA e 5 (avaliação), modelo eclético CEA, revelando, dessa

forma, visão fragmentada sobre o processo de ensino-aprendizagem em Química. Como as

características do tipo tradicional foram apontadas uma vez e do tipo tecnicista três vezes por

Curie, contata-se que a colaboradora tem a tendência pedagógica no enfoque da transmissão

cultural dos conteúdos e, esse fato se reforça em uma passagem de sua entrevista, em que ela

expressa que suas aulas são sempre teóricas de forma bem tradicional, segundo exposição a

seguir:

[...] Durante o desenvolvimento da minha aula, inicialmente, ela é teórica, os

primeiros contatos é sempre com a teoria, porque meus alunos não costumam vir

com o material lido, nem com a apostila lida, então as minhas aulas costumam ser

bem tradicional.

Já o modelo didático pessoal da colaboradora Mayer apresenta coerências em três

dimensões didáticas 2 (conteúdos) com o modelo didático do tipo alternativo A; 3 (papel das

ideias e interesses dos estudantes), modelo didático do tipo alternativo A; 4 (metodologia),

modelo didático do tipo alternativo A, e incoerências em duas dimensões, sendo 1 (objetivos

do ensino), modelo eclético do tipo TCEA; 5 (avaliação), modelo eclético do tipo CEA,

apesar da colaboradora Mayer ter apresentado incoerência em duas dimensões, e por ter

apresentado consistência em três dimensões, infere-se que a mesma possui uma visão coesa

do processo de ensino-aprendizagem em Química, coerente com as concepções do tipo

alternativo, sendo assim, com base em suas concepções pedagógicas a intencionalidade de sua

prática pedagógica encontra-se no contexto do construtivismo, levando em consideração a

construção e os conhecimentos prévios do estudante nesse processo. O instrumento

Page 101: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

100

respondido pela colaboradora tem consonância com uma das passagens de sua entrevista, em

que ela narra que relaciona os conceitos químicos estudados com o cotidiano de seus

educandos e que tenta trabalhar esses conceitos na perspectiva da interdisciplinaridade:

Inicialmente, na primeira semana de aula, eu sempre realizo atividades de

sondagem, gosto de conhecer bem a turma, quanto à escola de onde os alunos novos

vieram, o bairro em que vive, para em seguida elaborar um plano de trabalho que

deve ser voltado para o que fazer e como fazer; deixar claro os objetivos,

estabelecendo o que se quer ensinar; além de relacionar os conceitos químicos

estudados com o cotidiano dos alunos, tentar estabelecer relação dos conceitos

químicos com outras disciplinas [...]

No que tange ao modelo didático pessoal da colaboradora Franklin, este apresenta

coerência em três dimensões didáticas 2 (conteúdos), com o modelo didático do tipo

alternativo A; 3 (papel das ideias e interesses dos estudantes), modelo eclético do tipo

espontaneísta e alternativo EA; 5 (avaliação), modelo eclético do tipo espontaneísta e

alternativo EA, e incoerências em duas dimensões, sendo 1(bjetivos do ensino), modelo

eclético do tipo TCEA; 4 (metodologia), modelo eclético do tipo TCEA, apesar da

colaboradora Franklin ter apresentado incoerência em duas dimensões, e por ter apresentado

coerência em três dimensões, infere-se que a mesma possui uma visão coesa do processo de

ensino-aprendizagem em Química, apresentando-se coerente com as concepções do tipo

alternativo e eclético do tipo espontaneísta e alternativo, sendo assim, com base em suas

concepções pedagógicas, bem como a intencionalidade de sua prática pedagógica encontra-se

também no contexto do construtivismo, levando em consideração a construção e os

conhecimentos prévios do estudante nesse processo.

Por fim, no que concerne ao modelo didático pessoal da colaboradora Meitner, este

apresenta incoerências em todas as dimensões com modelo eclético do tipo TCEA, revelando,

portanto, uma indefinição em sua visão do processo de ensino-aprendizagem em Química. O

que chamou a atenção também foi a característica do modelo tradicional T ter sido aceita em

todas as dimensões por essa colaboradora, o que representa a tendência pedagógica no

enfoque da transmissão cultural dos conteúdos. Ao buscar uma reflexão sobre esse

ecletismo no modelo didático apresentado por essa colaboradora, Maldaner (2006) ajuda a

refletir sobre essa situação, quando afirma que o modelo psicopedagógico da aprendizagem

por transmissão está, ainda, muito presente nas salas de aula de Química na Educação Básica

e até mesmo na educação superior nos dias atuais, constituindo-se em prática hegemônica na

maior parte das escolas, embora no meio da pesquisa educacional ele seja sempre condenado.

Page 102: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

101

Santos Jr e Marcondes (2010) expressam que, ao idealizarem esse instrumento de

possível identificação de modelo didático que, por sua natureza, apresentam-se imbricados

elementos como as concepções e crenças pedagógicas do docente, o contexto em que exerce a

docência e a sua visão do processo de ensino-aprendizagem. Esse instrumento pode ser capaz

de explicitar esses elementos e torná-los objeto de reflexão e análise e que poderia ser

utilizado no curso de formação inicial, com o intuito de fazer com que os futuros docentes

explicitem esses elementos e possam refletir a respeito. “Essa prática poderia, ao menos em

tese, dificultar a perpetuação de ideias e procedimentos tidos como tradicionais e que são

incorporados pelos licenciandos” (p. 113).

Diferenças e Proximidades nos Modelos Didáticos das Professoras Colaboradoras

Tendo em consideração as diferenças e as proximidades dos modelos didáticos das

colaboradoras é possível constatar proximidades de modelos entre Curie e Meitner, pois

possuem tendências pedagógicas situadas no enfoque da transmissão cultural dos

conteúdos. E entre Mayer e Franklin, por possuírem tendências pedagógicas situadas no

contexto do construtivismo, levando em consideração a construção e os conhecimentos

prévios do estudante nesse processo.

Delinear as diferenças se torna difícil, pois todas em algum contexto das dimensões

analisadas não apresentaram uma visão totalmente coesa do processo de ensino-aprendizagem

em Química. Na análise geral, dos modelos didáticos das colaboradoras, fica evidente a

presença de divergentes orientações didáticas resultantes de diferentes concepções de

educação escolar, que permeiam o pensamento dessas professoras. Diante dessas informações,

permite-se afirmar que não existe um modelo didático predominante que se enquadre nos

modelos identificados pela literatura, entre as colaboradoras investigadas. Nesse contexto,

percebo que os modelos didáticos propostos por García Pérez (2000) não foram capazes de

representar as quatro colaboradoras pesquisadas. Tal fato pode estar relacionado a uma

possível limitação do instrumento, mas também pode ser um indicativo de que essas

colaboradoras precisam aprofundar suas reflexões sobre a visão do processo de ensino-

aprendizagem em Química, bem como suas crenças e suas concepções.

Ao refletir sobre a primeira questão norteadora da pesquisa que consiste em

identificar que movimentos teóricos, metodológicos e epistemológicos de formação e

docência, que contribuíram para a constituição inicial das professoras colaboradoras,

considero importante entender sobre as histórias do contexto do curso de Licenciatura em

Page 103: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

102

Química da UFMT e do Subprojeto Química – PIBID, como dois espaços que fizeram parte

da formação inicial e desenvolvimento profissional das colaboradoras dessa pesquisa, uma

vez que por meio desses contextos de formação e de suas narrativas expressas, e o apoio das

interlocuções feitas à luz dos referenciais teóricos assumidos, no desenvolvimento desta tese,

desenvolvo a compreensão que em termos epistemológicos a racionalidade técnica está

subjacente à formação e à docência dessas professoras. Em relação aos aspectos teórico-

metodológicos de formação e, por conseguinte, de desenvolvimento profissional, este está

pautado no enfoque que se pode denominar como híbrido de caráter da transmissão cultural

dos conteúdos ao construtivismo.

Adiante, apresento o último eixo temático de análise, em que faço a contextualização

dos Saberes Científicos no contexto do ensino de Química e os aspectos epistemológicos na

perspectiva de Bachelard (1996) e em que busco a compreensão de como se configuram os

Saberes Científicos e Saberes Pedagógicos dos Conteúdos Químicos, na perspectiva de

Shulman (1986), subjacentes à docência das professoras colaboradoras investigadas, por meio

dos relatos de episódios de aulas com conceitos químicos do Ensino Médio, sendo que para

cada conceito trago o que a literatura Química atual discorre sobre os conceitos em foco. Para

a construção deste eixo de análise, o material empírico analisado encontra-se, especialmente,

nos diálogos mantidos com as professoras colaboradoras durante o último bloco da entrevista

semiestruturada e o grupo focal.

Page 104: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

103

V - SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDOS

QUÍMICOS: EPISÓDIOS DE AULAS DO ENSINO MÉDIO

Fazer Educação por meio da Química é criar alternativas e possibilidades de

contribuir tanto para alfabetização científica quanto para o letramento científico do

estudante e de fazer a migração do esoterismo ao exoterismo28 e assim facilitar a sua

leitura do mundo (Áttico Inácio Chassot).

Ao chegar neste último eixo de análise, tenho o propósito de ir à busca de possíveis

respostas ao problema de investigação expresso da seguinte maneira: Como se configuram e

se expressam saberes científicos e pedagógicos de conteúdos químicos subjacentes à

docência de professores egressos do Programa de Bolsa de Iniciação à Docência em

Química da UFMT, ao relatarem o ensino de Química que realizam na Educação

Básica?

Tenho a perspectiva de demonstrar o entrelaçamento entre os saberes científicos,

praticados/produzidos pela academia que, na perspectiva de Shulman (1986), podem ser

tratados de conhecimento do conteúdo específico, e no contexto desta pesquisa compreendido

como o saber disciplinar químico, e os saberes que emergem da prática de ensino e, portanto,

saberes que se manifestam na prática docente e, por meio da reflexão dessa prática, que na

obra do autor supracitado, corresponde ao conhecimento pedagógico de conteúdo – PCK, e

aqui assume-se a terminologia de saberes pedagógicos de conteúdos químicos – PCKC.

O PCKC se refere a um conteúdo específico de um conteúdo da disciplina de

Química reelaborado pedagogicamente para os estudantes. Nesta investigação foram eleitos

os conteúdos de modelos atômicos e ácidos e bases de Arrhenius como mote para investigar

o entrelaçamento dos Saberes Científicos e PCKC das colaboradoras. Acessar essa relação

entre esses dois saberes foi algo que se realizou por via de dois instrumentos de registros de

informações: uma parte do segmento da entrevista semiestruturada, que versava sobre esses

dois conceitos e o grupo focal, que foi dividido, em dois momentos com as colaboradoras, que

foram denominados de episódios de aula do Ensino Médio.

Neste ponto, as lentes da pesquisa já estão impregnadas de ideias e provocações

construídas no percurso teórico e metodológico. Contudo, ao me debruçar nos textos de

campo sobre os episódios de aulas, para a produção dos textos de pesquisa, foi necessária a

28 O termo esotérico antônimo de exotérico, apesar de ter a mesma pronúncia, se refere ao ensinamento que era

reservado aos discípulos completamente instruídos nas escolas filosóficas da Grécia antiga. Por extensão,

esotérico se refere a todo ensinamento ministrado a círculo restrito e fechado de ouvintes. Em filosofia, diz-se

dos ensinamentos ligados ao ocultismo. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Exoterismo> Acesso em:

16 julho 2015).

Page 105: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

104

compreensão da relação dos saberes científicos ao PCKC pelas professoras colaboradoras

também do ponto de vista epistemológico.

Diante do exposto, examino o contexto do ensino de Química na Educação Básica, e

para ser possível entender os aspectos epistemológicos relacionados aos conceitos de modelos

atômicos e ácidos e bases de Arrhenius, recorro ao referencial teórico dos obstáculos

epistemológicos propostos pelo filósofo francês Gaston Bachelard (1996). Antes do início de

cada um dos episódios de aula, trato da conjuntura de cada conceito, primeiramente no âmbito

da literatura Química atual29.

Saberes Científicos na Educação Básica: O Ensino de Química em Foco

Uma das possíveis lentes para enxergar e compreender o mundo é a ciência Química,

pois cada área do saber tem a sua estrutura, o seu modo de perceber e interpretar o real. Barth

(1993) destaca que o pintor, o geógrafo ou o biólogo têm um olhar diferente sobre um lugar; o

político, o poeta ou historiador não interpretam os acontecimentos da atualidade da mesma

forma. Dessa forma, o conteúdo influencia o modo como o processo de abstração se realiza.

Nessa perspectiva, intenciono discutir as possíveis interfaces dos saberes científicos na

perspectiva dos saberes químicos para uma educação científica e leitura de mundo por meio

da Química no Ensino Fundamental e Médio.

Pesquisadores da área de Educação Química como Machado e Mortimer (2007)

destacam que dentre os aspectos fundamentais do processo de ensino-aprendizagem de

Química para a Educação Básica está a valorização do pensamento dos estudantes na

perspectiva das contribuições do construtivismo. Nesse sentido, o construtivismo como uma

teoria da aprendizagem tem sido um marco importante na forma de conceber o ensino de

Ciências. Segundo esses autores, apesar da diversidade de concepções que pode abarcar o

conceito de construtivismo, pelo menos dois pressupostos são conhecidos como gerais: “o

29

Para fazer a sinopse desses conceitos recorri a três livros textos que são referências de química geral em

cursos de graduação no Brasil: - ATKINS, Peter; JONES, Loretta. Princípios de Química: Questionando a Vida

Moderna e o Meio Ambiente.Tradutor: Ricardo Bicca de Alencastro. 3.ed. Porto Alegre: Bookman, 2006; -

BROWN, Theodore L., et al. Química a Ciência Central. Tradutor: Robson Matos. 9.ed. São Paulo: Pearson

Prentice Hall, 2005; - RUSSEL, John B. Química Geral. Tradutor: Márcia Guekezian et al. V.1, 2.ed. São Paulo:

Pearson Makron Books, 1994. Entretanto, fiz a opção de situar o leitor sobre os conceitos de modelos atômicos

apoiados em Brown et al. (2005) e Russel (1994), e ácidos e bases de Arrhenius baseado em Brown et al. (2005),

pois ao fazer um estudo e uma análise minuciosa dos três livros identifiquei-os como os que trabalham de uma

melhor forma os pressupostos epistemológicos desses conceitos, embora no contexto histórico, os três livros

façam abordagens de forma muito semelhante.

Page 106: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

105

conhecimento não é transmitido, mas construído ativamente pelos indivíduos; aquilo que o

sujeito já sabe influencia na sua aprendizagem” (p.22).

A partir dessa concepção, uma ideia que se revela importante é que as concepções

que os estudantes trazem para as salas de aulas de ciência são muito diferentes daquelas

cientificamente aceitas e isso interfere na aprendizagem dos conceitos científicos. Nessa

perspectiva, Driver et al. (1999) corroboram que:

Aprender ciências não é uma questão de simplesmente ampliar o conhecimento dos

jovens sobre os fenômenos – uma prática talvez denominada mais apropriadamente

como estudo da natureza – nem de desenvolver ou organizar o raciocínio do senso

comum dos jovens. Aprender ciências requer mais do que desafiar ideias anteriores

dos alunos, através de eventos discrepantes. Aprender ciências requer que crianças e

adolescentes sejam introduzidos numa forma diferente de pensar sobre o mundo

natural e de explicá-lo (apud MACHADO e MORTIMER, 2007, p. 23).

Ao entender a ciência como discurso, Machado (2004) expressa que é possível

considerar a linguagem científica e a linguagem química, em específico, por poderem

possibilitar aos sujeitos uma nova maneira de pensar e falar sobre o mundo. A linguagem

científica possui características próprias, diferentes da linguagem comum, que foram

historicamente estabelecidas ao longo do desenvolvimento da ciência como forma de ampliar

e registrar o conhecimento científico.

Para a construção do conhecimento científico na Educação Básica se tem como

relevante considerar os vários discursos que circulam nas salas de aulas, tais como, do livro

didático, do professor, dos colegas, dos fatos experimentais, do senso comum, da mídia, entre

outros. E todos esses discursos são fundamentais para a elaboração de certa forma de pensar e

falar sobre o mundo, empregando a Química.

Defendo com Machado e Mortimer (2007), que toda compreensão é ativa e que ao

tentar atribuir sentido, ao que está aprendendo, o estudante formulará suas próprias respostas,

suas próprias maneiras de articular aquilo que está sendo ensinado com aquilo que ele já

sabia. Sendo assim, os estudantes vão incorporar os discursos e as visões de mundo que

circulam durante as atividades propostas em uma aula de Química no Ensino Fundamental ou

Médio, as aulas do professor, a discussão com os colegas, as leituras, entre outros.

Como professores, os sentidos que circulam durante as aulas não são uma

transposição direta dos conhecimentos/saberes científicos produzidos pelos químicos. Em

outros termos, o conhecimento que se considera nas aulas de Química é mediado por uma

série de instâncias que vão constituindo um discurso, que transforma o conteúdo específico

químico em aprendizagem PCKC.

Page 107: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

106

Nessa mesma linha, Maldaner (2006) complementa que é importante considerar que

para que uma pessoa seja iniciada em Química não é suficiente que seja capaz de identificar

ou saber decifrar a simbologia Química. É fundamental que se compreenda o tipo de

pensamento próprio desse campo de conhecimento e as especificidades metodológicas

próprias da produção do conhecimento químico. Nas pesquisas desenvolvidas por esse autor,

ele considera a necessária superação das propostas tradicionais de ensino de Química que

centram sua abordagem em torno de conteúdos descontextualizados, a partir de uma lógica do

conhecimento sistematizado.

Em relação à superação das propostas tradicionais de ensino de Química, Chassot

(2014) tece críticas sobre o que ele denomina de a (re) produção do conhecimento químico,

e considera que os discursos de muitos professores de Química parecem distinguir-se pela

natureza hermética de seu conteúdo. Por exemplo, quando se fala com certa naturalidade para

os educandos sobre o colesterol, e se diz que este é um composto que tem o anel do

ciclopentanoperidrofenantreno, ou quando se diz aos educandos que quando dois orbitais

atômicos ligantes se unem e formam dois orbitais moleculares, um dos quais é ligante e

outro é antiligante, provavelmente, para eles, a sensação não é muito diferente daquela que

ocorre, quando se está diante de alguém que fala uma língua estrangeira, da qual não se tem

conhecimento.

Diante do exposto, uma grande importância para a formação do pensamento químico

seria a tensão entre o conceitual e o contextual. O trabalho nessa tensão, porém, não pode

perder de vista alguns aspectos importantes, relacionados com especificidades dos modos de

compreender, possibilitados e elaborados pelo conhecimento químico (MACHADO, 2004).

Dentre a seleção e organização de conteúdos químicos, é necessário levar em

consideração os focos de interesse da Química. Entre os principais objetos de investigação

nesse campo de conhecimento se encontram os materiais, as substâncias, suas

propriedades, sua constituição e suas transformações. O triângulo apresentado a seguir

representa esses objetos de interesse da Química, colocando no centro os materiais e as

substâncias e, em cada um dos seus vértices, aspectos diferentes do conhecimento químico

com eles relacionados.

Page 108: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

107

Figura 7: Focos de Interesse da Química

Fonte: Machado, Mortimer (2007).

O conhecimento das substâncias e dos materiais passa, necessariamente, pelo

conhecimento de suas propriedades e para explicar o comportamento dos materiais e mesmo

das suas propriedades, é necessário lançar mão de alguns conhecimentos químicos

relacionados à constituição desses materiais e substâncias como os diversos modelos para o

átomo e como esses átomos interagem para formar moléculas e íons e, ainda, como essas

moléculas, átomos e íons se agrupam para formar as substâncias e materiais que são

conhecidos; em outros termos, como ocorrem as transformações nessas substâncias e

materiais. Esses conhecimentos oferecem subsídios importantes para a compreensão, o

planejamento, a execução das transformações dos materiais. Ademais, as inter-relações entre

propriedades, constituição e transformações dos materiais são fundamentais para que se

possam ter ferramentas conceituais para compreender fenômenos químicos (MACHADO e

MORTIMER, 2007).

A Química como campo de conhecimento se estrutura mediante relações complexas

e dinâmicas, que envolvem um tripé bastante específico, em seus três eixos constitutivos

fundamentais, que compõem seu foco de interesse: os materiais e suas propriedades e

modelos explicativos e suas transformações químicas. Aprender Química pressupõe

comunicar-se por meio do uso da linguagem dessa ciência e para elaborar e comunicar

conceitos e teorias, a Química utiliza representações semióticas, que compõem um sistema de

instrumentos e signos como: equações, símbolos, enunciados, dentre outros (VYGOTSKY,

1998).

Do ponto de vista didático, para trabalhar com os conceitos em química é útil

distinguir três aspectos do conhecimento químico: fenomenológico, teórico e

representacional. A figura 8, ilustra o tripé da abordagem:

Propriedades

Constituição Transformações

Substâncias

e Materiais

Page 109: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

108

Figura 8: Aspectos do conhecimento químico

Fonte: Machado, Mortimer (2007).

Os aspectos fenomenológicos do conhecimento químico incluem a dimensão

macroscópica. Quando são observadas as reações químicas no laboratório ou no mundo ao

redor, se observa a matéria no nível macroscópio.

A abordagem dos conceitos químicos do ponto de vista fenomenológico pode

contribuir para promover habilidades específicas, tais como: controlar variáveis, medir,

analisar resultados, elaborar gráficos, entre outros. Os fenômenos também podem estar

materializados nas atividades sociais, pois são as relações sociais que cada estudante

estabelece, por meio dessa ciência, que dão significado à Química do seu ponto de vista, pois

mostram que a Química está na sociedade e no ambiente (MACHADO e MORTIMER, 2007).

Já os aspectos teóricos do conhecimento químico pautam-se na dimensão

microscópica. Esse aspecto relaciona-se com informações de natureza atômico-molecular,

envolvendo explicações baseadas em modelos abstratos e que incluem entidades não

diretamente observáveis, como átomos, moléculas, íons, elétrons, prótons, entre outros.

O aspecto representacional encontra os conteúdos químicos de natureza simbólica e

compreende informações inerentes à linguagem química, como fórmulas e equações

químicas, representações dos modelos e equações matemáticas. A famosa molécula (H dois

O) que se observa nunca é representada como feito aqui entre parênteses. Em vez disso, a

representação simbólica da água é H2O.

Após se observar o foco de interesse da Química e de como serem trabalhados os

conceitos químicos, do ponto de vista didático, é necessário levar em consideração também

que a produção do conhecimento na Química resulta sempre de uma dialética entre teoria e

experimento, pensamento e realidade, mesmo porque não existe atividade experimental que

não ofereça mais de uma possibilidade de interpretação, pois ainda que o educando não

conheça a teoria científica necessária para interpretar determinado fenômeno ou resultado

experimental, ele o fará com suas próprias teorias implícitas, suas ideias do senso comum,

pois todo o processo de compreensão é ativo. Dessa forma, a inexistência dos fenômenos nas

Page 110: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

109

salas de aulas pode fazer com que os educandos tomem por reais as fórmulas das substâncias,

as equações químicas e os modelos para a matéria. É imprescendível que os três aspectos:

fenomenológico, teórico e representacional compareçam igualmente (MACHADO e

MORTIMER, 2007).

Sobre o ensino de Química em foco, Chassot (2014) busca discutir há mais de duas

décadas nos mais diferentes fóruns, com professores de Química, três interrogações que ele

entende como capitais em relação à Química: Por que ensinar? Como ensinar? O que

ensinar?30 O referido autor tem usado essas mesmas três perguntas de uma maneira mais

ampla, quando se dirige aos docentes da área de Ciências do Ensino Fundamental. Considero

essas três perguntas capitais, como uma bússula educacional, para que o professor faça um

ensino de Química consciente, mantendo o foco na aprendizagem de seus alunos.

Finalmente, as diferentes análises que têm sido feitas sobre o ensino de Química

revelam que não basta fazer transmissão de conhecimentos químicos (alguns de discutível

valor para a formação científica do cidadão), mas é importante que esses conhecimentos

sejam instrumentos para melhor fazer educação. Nesse contexto, exige-se, cada vez mais, um

ensino em que a Química seja um suporte para se fazer educação. Essa é síntese de um fazer

educação por meio da Química (CHASSOT, 2014).

Aspectos Epistemológicos do Conhecimento Científico em Gaston Bachelard

Ao fazer uma relação da epistemologia com o ensino de Ciências e o ensino de

Química percebo que a epistemologia da ciência pode contribuir para o estabelecimento de

estratégias para o ensino e para a compreensão do processo ensino-aprendizagem. Em alguns

aspectos, os epistemólogos divergem entre si, em outros, eles concordam. Assim, apesar de

não ser possível constituir um arcabouço coerente pela simples junção das obras dos

epistemólogos, é possível, por exemplo, o destaque de alguns elementos importantes para a

fundamentação de metodologias para o ensino de Ciências e Química. Destarte, para analisar

as narrativas dos episódios de aulas das colaboradoras sobre os aspectos epistemológicos

relacionados aos conceitos químicos de modelos atômicos e ácidos e bases de Arrhenius,

30 Para compreender melhor as discussões e respostas a essas perguntas capitais que Chassot propõe, sugiro a

leitura de: CHASSOT, Attico Inácio. Nossos Três Interrogantes Capitais. In: CHASSOT, Attico

Inácio.Catalisando Transformações na Educação. Ijuí: Ed. UNIJUÍ, 1993, p. 37-55.

Page 111: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

110

desenvolvidos nesta investigação, apoio-me no referencial teórico dos obstáculos

epistemológicos proposto por Bachelard31 (1996).

A ciência do século XX consolida-se como a estreita relação dialética da razão e

empiria, não há experiência sem racionalização, não há razão sem aplicação. Nesse sentido, a

ciência deixa de ser a descrição da natureza, o pleonasmo experiência. O conhecimento não

se desenvolve por acúmulo de informações, nem o ser humano busca, simplesmente, a

verdade maior na natureza. O desenvolvimento da ciência é um processo descontínuo32, no

qual constantemente se faz necessário romper com os conhecimentos anteriores, desconstruí-

los para construir novos conhecimentos. Nesse processo, é preciso procurar superar os

obstáculos epistemológicos (BACHELARD, 1977).

Bachelard é considerado o pai da epistemologia contemporânea e a escolha por

este epistemólogo se deve, em grande parte, às possibilidades de questionamento da ciência

oferecidas por sua obra. À luz da ciência contemporânea, notadamente as Geometrias Não-

Euclidianas, a Física Relativista, a Mecânica Quântica, a Mecânica ondulatória de Louis de

Broglie, a Física das matrizes de Heinserberg, as Mecânicas abstratas e, em breve, as Físicas

abstratas, que ordenarão todas as possibilidades de experiência, Bachelard (1996) procede a

crítica ao realismo ingênuo, ao empirismo e ao racionalismo cartesiano que permeiam os

discursos e as práticas científicas. Nessa acepção, o discurso de Bachelard não se faz para o

cientista, mas para o filósofo. Nesse sentido, este epistemólogo francês não se debruça sobre a

pesquisa científica para definir as normas do bem-fazer ciência, mas para interpretar o que o

cientista faz e dialogar com os filósofos sobre a ciência de ponta. Dessa forma, ele questiona

as concepções dos filósofos a partir de novas interpretações científicas (LOPES, 2007).

31

Oriundo de uma província muito rústica e de uma família humilde, Gaston Bachelard sempre trabalhou,

enquanto estudava. Nasceu no século XIX, no dia 27 de junho de 1884 em Bar-sur-Aube, Champagne, França.

Em 1913 conclui a Licenciatura em Matemática e, em 1919, entra para o ensino secundário, dando início à

carreira de professor de Ciências (Química e Física), embora a sua ambição fosse ser engenheiro. Nessa época,

nos colégios, um professor dedicava-se a diversas disciplinas: para os poucos alunos das “turmas superiores” ele

foi, ocasionalmente, o encarregado pela filosofia. Teve que intensificar suas leituras e aos 35 anos empreende

novos estudos. Seus ensaios começam a aparecer a partir de 1928, tais como: ensaio sobre o conhecimento

aproximado; estudo sobre a evolução de um problema em Física: a propagação térmica dos sólidos. Em 1930 é

convidado para lecionar na faculdade de letras de Dijon e em 1940 entrou para a Sorbonne. Em 1961, obteve o

Grande Prêmio Nacional de Letras e, em 1962, morre em Paris, no dia 16 de outubro (MELLO, 2009). 32 A epistemologia de Bachelard contribuiu para elaborar perspectivas historiográficas descontinuístas, na

medida em que rompera com a visão linear do desenvolvimento da ciência, tão cara aos positivistas e

neopositivistas. Com as noções de racionalismos setoriais e ruptura epistemológica, Bachelard introduziu a

concepção de descontinuidade na cultura científica: há rupturas entre o conhecimento comum e o conhecimento

científico e no decorrer do próprio desenvolvimento científico. Para maiores discussões sobre a noção de

descontinuidade na epistemologia de Bachelard, ver: BACHELARD, Gaston. O racionalismo aplicado. Rio de

Janeiro: Zahar, 1977.

Page 112: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

111

Bachelard aborda os obstáculos epistemológicos, particularmente em A Formação

do Espírito Científico, publicado pela primeira vez em 1938 e já traduzido no Brasil em sua

primeira edição em 1996 e, atualmente, em 2013 atingiu a décima edição. Nessa obra, o autor

afirma a necessidade de valorização do pensamento científico abstrato, apontando a

experiência imediata como um obstáculo ao desenvolvimento dessa abstração.

Nossa proposta, neste livro, é mostrar o grandioso destino do pensamento científico

abstrato. Para isso, temos de provar que pensamento abstrato não é sinônimo de má

consciência científica, como parece sugerir a acusação habitual. Será preciso provar

que a abstração desobstrui o espírito, que ela o torna mais leve e dinâmico.

Forneceremos essas provas ao estudar mais de perto as dificuldades das abstrações

corretas, ao assinalar a insuficiência dos primeiros esboços, o peso dos primeiros

esquemas, ao sublinhar também o caráter discursivo da coerência abstrata e

essencial, que nunca alcança seu objetivo de um só golpe. E, para mostrar que o

processo abstrato não é uniforme, chegaremos até a usar um tom polêmico ao insistir

sobre o caráter de obstáculo que tem toda experiência que se pretende concreta e

real, natural e imediata (BACHELARD, 1996, p. 8-9).

Tendo em vista que sempre se conhece contra um conhecimento anterior, retificando

erros da experiência comum e construindo a experiência científica em diálogo constante com

a razão, é preciso superar os obstáculos epistemológicos.

[...] E não se trata de considerar obstáculos externos, como a complexidade e a

fugacidade dos fenômenos, nem de incriminar a fragilidade dos sentidos e do

espírito humano: é no âmago do próprio ato de conhecer que aparecem, por uma

espécie de imperativo funcional, lentidões e conflitos. É ai que mostraremos causas

de estagnação e até de regressão, detectaremos causas de inércia às quais daremos o

nome de obstáculos epistemológicos (BACHELARD, 1996, p. 17).

Conforme Bachelard (1996), o processo de ensino-aprendizagem de um conceito

científico requer que se afronte, constantemente, um conhecimento anterior em um processo

de desconstrução daquilo que ficou mal estabelecido. Por esse motivo, não se pode considerar

os educandos do Ensino Fundamental e Médio como tábula rasa. Eles possuem

conhecimentos já construídos do senso comum e esse conhecimento, quando não criticado e

confrontado, pode se constituir em obstáculo para a construção do conhecimento

científico.

O conceito de obstáculo epistemológico não deve ser igualado à noção de erro como

contraposição à verdade, o que implicaria em uma posição filosófica racionalista, isto é, não

científica. “Ao contrário, obstáculos epistemológicos são formas de conhecimento que

resistem às mudanças devido o seu poder explicativo ou, em outras palavras, devido à sua

posição conceitual em um dado sistema de conhecimentos, permitindo avançar até certo ponto

Page 113: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

112

na produção de conhecimentos para, a partir daí, gerar estagnação ou mesmo retrocesso”

(SILVA et al., 2014, p. 263).

Na concepção de Santos (1989), quando se está aprendendo conceitos científicos, o

abandono do senso comum é um sacrifício muito difícil, e essa dificuldade está na pertinácia

dos obstáculos epistemológicos e só uma constante vigilância epistemológica consegue

superar e, para que a aprendizagem seja significativa, deve haver uma dupla ruptura

epistemológica, sendo que a primeira ruptura visa responder à pergunta: como se faz

ciência?, ou seja, a indagação sobre os procedimentos concretos, que permitem o saber

científico constituir-se contra o senso comum. Já a segunda ruptura visa responder à pergunta:

para que queremos a ciência?, ou seja, a indagação sobre os procedimentos concretos de

aplicação ou contextualização desses saberes científicos, que podem conduzir à superação da

distinção entre ciência e senso comum.

Para Santos (1989), se o saber científico e o senso comum fossem totalmente

distintos, a ciência não podia aspirar a transformar-se em senso comum, e se fossem idênticas,

não podia pretender transformar o senso comum, portanto, a segunda ruptura é que dá sentido

à primeira, pois “a ciência só pode saber como se faz (contra o senso comum) se souber o que

pode fazer (transformar o senso comum, transformando-se em senso comum)” (p.50).

Diante do exposto, pode-se inferir que o obstáculo epistemológico tende a se

manifestar mascarando o processo de ruptura entre o conhecimento comum e o saber

científico, quando o pensamento procura prender o conhecimento real aparente, assim, o

obstáculo tende a se constituir como uma anti-ruptura. A razão, ao se acomodar ao que já

conhece, procurando manter a continuidade do conhecimento, opõe-se à retificação dos erros

introduzindo um número excessivo de analogias, metáforas e imagens33 no próprio ato de

conhecer, com o fim de tornar familiar todo conhecimento abstrato, constituindo, assim, os

obstáculos epistemológicos (BACHELARD, 1996).

Dessa forma, Bachelard (1996) delineia diferentes obstáculos exemplificando as

ações, principalmente, na Química e na Física, ciências consideradas por ele como mais

matematizadas e evoluídas. Assim, ele lista oito possíveis obstáculos epistemológicos34: 1) a

experiência primeira, 2) o conhecimento geral, 3) verbal, 4) do conhecimento unitário e

pragmático, 5) substancialista, 6) realista, 7) animista, 8) conhecimento quantitativo.

33 Cabe esclarecer que Bachelard (1996) não é contrário à utilização de analogias, de metáforas e de imagens,

contudo, sua posição é de que a razão não pode se acomodar às imagens devendo, portanto, estar sempre pronta

a desconstruí-las toda vez que o processo de construção do conhecimento científico assim o exigir. 34 Na subseção dos Episódios de Aulas darei a definição de alguns desses obstáculos, em conformidade com o

referido autor e exemplificarei com os resultados dos textos de campo da presente pesquisa.

Page 114: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

113

A maioria dos filósofos da ciência entre os séculos XIX e XX trabalhavam com um

foco na Física, já Bachelard trabalhou com questões epistemológicas tanto na Física, quanto

na Matemática e, sobretudo, na Química35. Os educadores de Química e Física têm à

disposição, até mesmo, livros de Bachelard dedicados à Química (O pluralismo coerente da

Química moderna e O materialismo racional) e à Física (A atividade racionalista da Física

contemporânea).

A pertinência de Bachelard para o campo de ensino de Ciências, sobretudo para o

ensino de Química, de acordo com Lopes (2007), torna-se maior se for considerada sua

trajetória como professor, pela escola secundária, que fez dele um filósofo constantemente

preocupado com o ensino. Todavia, é preciso esclarecer que não há em sua obra textos

exclusivamente voltados para a questão educacional, mas frequentemente ele pontua análises

filosóficas com interpretações a respeito da transmissão do conhecimento científico na escola.

Na obra supracitada, A Formação do Espírito Científico, ele ressalta a necessidade dos

professores conhecerem as concepções prévias de seus educandos, por intermédio da

problemática do obstáculo pedagógico, que são os obstáculos que impedem o professor de

entender o porquê do educando não compreender.

Outro aspecto singular da epistemologia bachelardiana, em relação aos demais

filósofos das ciências, é o caráter até certo ponto ímpar de sua linha de trabalho, pois não

existe uma continuidade em seus trabalhos e os de seus seguidores. Esses, contudo, têm a obra

de Bachelard36 como inspiração, mas produziram teorizações próprias, nos mais diversos

campos, tais como: Althusser, Bourdieu, Caguilhen, Foucault, Morin, dentre outros

(SANTOS, 1989).

A seguir, apresento e analiso episódios de aulas de Química no Ensino Médio com a

breve descrição da literatura Química atual sobre os conceitos de Modelos Atômicos e

Ácidos e Bases de Arrhenius. Cabe assinalar que para a construção do texto de pesquisa dos

episódios de aulas do Ensino Médio, foram levadas em consideração três pontos que serviram

35 Lopes (2007, p. 32) afirma que “Quanto à Biologia, Bachelard não viveu o suficiente para assistir às rupturas

empreendidas nessa área a partir do advento do enfoque molecular. Sua ideia do campo biológico era de um

campo mais limitado do que a Física e a Química, justamente por ser o campo da reprodução, e não da criação. É

em Caguilhem, discípulo de Bachelard, que os biólogos encontram interpretações mais pertinentes sobre as

ciências da vida contemporânea”. 36

As obras de Bachelard possuem duas vertentes: a científica e a poética. Outra forma conhecida de classificar as

obras desse epistemólogo da ciência seria a seguinte: Bachelard Diurno e Bachelard Noturno. As obras

classificadas em Diurno e Noturno são: Bachelard diurno – O Novo Espírito Científico (1934), A Formação do

Espírito Científico (1938), A Filosofia do Não (1940), O Racionalismo Aplicado (1949) e O Materialismo

Racional (1952); e Bachelard noturno – A Psicanálise do Fogo (1938), A Água e os Sonhos (1942), O Ar e os

Sonhos (1943), A Terra e os Devaneios da Vontade (1948), A Poética do Espaço (1957), (MELLO, 2009).

Page 115: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

114

de lentes para a análise: 1) o conceito químico trabalhado nos episódios de aulas destinado a

estudantes do primeiro ano do Ensino Médio; 2) o conceito de saberes científicos e

pedagógicos de conteúdos tomado como apoio à compreensão de Shulman (1986); 3) A

perspectiva epistemológica desses conceitos tomada como base a concepção de Bachelard

(1996).

Esses episódios de aulas se revelam importantes, diante de todo o referencial teórico-

metodológico por meio do qual fui tecendo esta tese para a compreensão de como as

professoras colaboradoras configuram e expressam saberes científicos e pedagógicos de

conteúdos químicos subjacentes a sua docência, a partir dos enunciados de suas narrativas.

Modelos Atômicos em Destaque: O que a literatura Química atual aponta?

Como narrado na subseção Saberes Científicos na Educação Básica: O Ensino de

Química em Foco, a Química trata das propriedades das substâncias. No mundo, as

substâncias apresentam uma variedade de propriedades surpreendentes e, aparentemente,

infinitas. Além do mais, a matéria muda de uma forma química para outra. E o universo ao

redor é constituído por diferentes substâncias, algumas inanimadas e outras com vidas. Dessa

forma, com o objetivo de explicar essas observações, desde a antiguidade os filósofos já

exploravam sobre a natureza da matéria fundamental da qual o mundo era feito.

Nas palavras de Chassot (1993), nunca é demais insistir, que quando se fala em

átomos, em moléculas, em reações químicas, entre outros, estamos nos referindo a realidades

sobre as quais não conhecemos mais do que o resultado de algumas interações. Por isso,

foram construídos modelos dessas estruturas, que são mais ou menos aproximados, em função

do que se conhece do modelado. Desse modo, os modelos se apresentam importantes

ferramentas de que se dispõe, para tentar compreender um mundo, cujo acesso real é muito

difícil.

A primeira definição de átomo surgiu na Grécia antiga, quando Demócrito (460-370

a.C) e outros filósofos gregos da época pensavam que o material deveria ser constituído de

partículas indivisíveis muito pequenas denominadas de átomos, o que denotava indivisíveis.

Como essa ideia, de Demócrito e seus contemporâneos, não pôde ser comprovada, ela ficou

conhecida como o primeiro modelo atômico, mas puramente filosófico. Mais tarde, Platão e

Aristóteles formularam a hipótese de que não poderia haver partículas indivisíveis. Nesse

sentido, a visão atômica da matéria enfraqueceu-se por vários séculos, durante os quais a

filosofia aristotélica dominou a cultura ocidental (BROWN et al., 2005).

Page 116: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

115

O átomo de John Dalton

A concepção sobre átomos37, de acordo com Brown et al. (2005), ressurgiu na

Europa durante o século XVII, quando os cientistas empenharam-se em explicar as

propriedades dos gases. Quando os químicos aprenderam a medir a quantidade de matéria que

reagia com a outra para formar nova substância, a base para a teoria atômica estava proposta.

Essa teoria surgiu durante o período de 1803-1807 no trabalho do professor inglês,

John Dalton. Argumentando a partir de um grande número de observações, Dalton enunciou

os seguintes postulados em sua teoria atômica:

1. Toda matéria é composta de partículas fundamentais, os átomos;

2. Os átomos são permanentes e indivisíveis, eles não podem ser criados nem

destruídos;

3. Os elementos são caracterizados por seus átomos. Todos os átomos de um dado

elemento são idênticos em todos os aspectos. Átomos de diferentes elementos

têm diferentes propriedades;

4. As transformações químicas consistem em uma combinação, separação ou

rearranjo de átomos;

5. Compostos químicos são formados de átomos de dois ou mais elementos em

uma razão fixa (RUSSEL, 1994, p. 207).

Dalton, ao usar essas ideias simples de seu postulado, fez com que as observações

químicas da sua época parecessem razoáveis. Sua teoria explica várias leis simples de

combinação química, uma delas é a lei química fundamental chamada de lei da conservação

da massa, também conhecida, como lei da conservação da matéria. Essa lei da conservação

da massa define que se cada átomo tem sua própria característica e se os átomos são

rearranjados, permanecendo inalterados durante uma reação química, então, a massa total dos

átomos dos reagentes deve ser a mesma que a dos átomos dos produtos. Outra lei é a da

composição constante, em que se expressa que se cada composto é caracterizado por

proporções fixas entre os números de átomos dos seus elementos componentes e se cada

átomo de um dado elemento tem a mesma massa, então a composição de cada composto deve

ser sempre a mesma (RUSSEL, 1994).

De acordo com Russel (1994) muitas ideias básicas que fazem parte da teoria

atômica de Dalton ainda são aceitas hoje em dia, embora saibamos que “átomos são formados

37 Farei referência somente aos modelos atômicos de Dalton, Thomson, Rutherford e Bohr, por serem esses os

modelos usualmente trabalhados no Ensino Médio.

Page 117: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

116

de pequenas partículas e que, devido à existência de isótopos38, todos os átomos de um dado

elemento não têm a mesma massa” (p. 207).

Dalton chegou a sua conclusão sobre átomos com base nas observações químicas no

universo macroscópico do laboratório. Todavia, nem ele e nem quem o seguiu durante séculos

depois da publicação de seu trabalho teve evidências diretas da existência dos átomos. Hoje,

entretanto, “podemos usar novos instrumentos poderosos para medir as propriedades dos

átomos individuais e até fornecer imagens deles” (BROWN et al., 2005, p. 33). Contudo, a

teoria atômica de Dalton deixou dúvidas e lacunas em vários pontos, por exemplo, na

distinção entre um átomo e uma molécula, isso levou a propor fórmulas incorretas para certos

compostos em sua época.

Dessa forma, mesmo que a teoria atômica de Dalton apresentasse limitações, ainda

assim, sua contribuição para o entendimento químico foi de grande valor, não somente foi

capaz de fornecer respostas satisfatórias para alguns problemas químicos complexos, mas

também proporcionou estímulo ao mundo científico para começar a pensar seriamente sobre a

existência dos átomos. À medida que os cientistas começaram a desenvolver métodos para

uma investigação mais detalhada da matéria, o átomo, que se supunha indivisível, começou a

mostrar sinais de ser uma estrutura mais complexa.

O átomo de Joseph John Thomson

Por volta do século XVII, os cientistas iniciaram os estudos sobre a descarga elétrica

por meio de tubos parcialmente evacuados, que consiste em tubos bombeados até quase

esgotar-se o ar, como ilustrado na Figura 9. Uma alta voltagem produzia radiação dentro do

tubo e essa radiação tornou-se conhecida como raios catódicos, porque se originava no

eletrodo negativo, ou catodo. Brown et al. (2005) afirmam que, embora os raios em si não

pudessem ser vistos, seus movimentos podiam ser detectados, porque os raios faziam com que

certos materiais, inclusive o vidro, proporcionassem fluorescência ou emitissem luz39.

Nesse período, os cientistas defendiam opiniões divergentes sobre a natureza dos

raios catódicos, pois não era muito claro se os raios eram uma nova forma de radiação ou

mais propriamente consistiam de um jato de partículas. Experimentos mostraram que os raios

38 Isótopos são átomos de um elemento químico cujos núcleos possuem o mesmo número atômico, designado

por Z, ou seja, o mesmo número de prótons (+), partículas positivas, mas diferente número de massa. A massa

atômica é frequentemente designada por A. 39 Tubos de imagem de televisão são tubos de raios catódicos; uma imagem de televisão é o resultado da

fluorescência da tela do aparelho (BROWN et al., 2005, p. 33).

Page 118: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

117

catódicos eram desviados por campos elétricos ou magnéticos, sugerindo que continham certa

carga elétrica [Figura 9(c)].

Figura 9: O tubo de raios catódicos simples, usado por J. J. Thomson40.

Fonte: Página de blogue com adaptação de Brown et al. (2005)41

O cientista britânico Joseph John Thomson (1856-1940) observou muitas

propriedades dos raios, inclusive o fato de a sua natureza ser a mesma, independentemente, da

identidade do material do catodo, e que uma lâmina metálica exposta a raios catódicos adquire

carga elétrica negativa. Em um artigo publicado em 1897, ele apresentou suas observações e

concluiu que os raios catódicos são jatos de partículas com massa, carregadas negativamente.

Esse artigo foi conhecido como a descoberta daquilo que hoje se denomina de elétron

(BROWN et al., 2005).

Nessa época, ficou evidente para a maioria dos cientistas que os átomos consistem

em uma parte carregada positivamente e alguns elétrons, mas isto não estava totalmente claro.

De que os átomos são constituídos? (RUSSEL, 1994). Foi quando Thomson argumentou que

já que os elétrons compreendiam apenas uma pequena fração de massa do átomo, eles

provavelmente seriam responsáveis por uma fração igualmente pequena do tamanho do

átomo. Dessa forma, ele propôs que o átomo consistia em uma esfera positiva uniforme na

matéria, na qual os elétrons estavam incrustados, como demonstrado na Figura 10. Esse

40 (a) Em um tubo de raios catódicos, os elétrons movem-se do eletrodo negativo (catodo) para o eletrodo

positivo (anodo). (b) Uma foto do tubo de raios catódicos contendo uma tela fluorescente para mostrar o

caminho dos raios catódicos. (c) A rota dos raios catódicos é desviada pela presença de um magneto (BROWN,

2005). 41 Disponível em: < https://yuriso.wordpress.com/tag/tubo-de-crookes/ > Acesso em jun. 2016.

Page 119: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

118

modelo, chamado de modelo atômico de pudim de ameixa, foi assim denominado em

homenagem a uma tradicional sobremesa inglesa.

Figura 10: Modelo atômico proposto por J. J. Thomson.

Fonte: Página da Espetacular Química42

Vale destacar que o modelo atômico de Thomson foi bem aceito por muitos anos, e

somente pouco depois do início do século XX, experimentos realizados na Inglaterra pelo

físico Rutherford e seus colaboradores levaram à substituição do modelo de Thomson.

O átomo de Ernest Rutherford

No ano de 1890, segundo Russel (1994) descobriu-se que certos elementos são

radioativos, e isso significa que eles emitem radiação de alta energia, da qual há três tipos,

partículas alfa (α), partículas beta (β) e raios gama (γ). Uma partícula alfa carrega uma carga

positiva e tem massa que é muito maior do que um elétron.

No ano de 1910, Ernest Rutherford (1871-1937) e seus colaboradores realizaram um

experimento que contestava o modelo atômico de Thomson. Naquele tempo, Rutherford

estava estudando os ângulos em que as partículas α eram dispersas à medida que elas

passavam por uma folha de ouro com poucos milhares de camadas atômicas de espessura, de

acordo com a Figura 11.

42 Disponível em: < http://espetacularquimica.blogspot.com.br/2013/02/o-modelo-atomico-de-thomson.html>

Acesso em jun. 2016.

Page 120: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

119

Figura 11: Experimento de Rutherford sobre espalhamento de partículas (α)43.

Fonte: Página da Espetacular Química44

Rutherford e seus colaboradores descobriram que quase todas as partículas α

passavam direto através da folha sem dispersão. Descobriu-se que uma pequena porcentagem

dispersava-se na ordem de um grau, o que era coerente com o modelo atômico de Thomson.

No entanto, de acordo com Brown et al. (2005), Rutherford, apenas por preciosismo, sugeriu

que Ernest Marsden, um estudante de graduação que trabalhava em seu laboratório,

procurasse com afinco por evidências de dispersão com ângulos grandes. E para a surpresa de

todos, observou-se uma pequena quantidade de partículas que se dispersavam em ângulos

grandes, sendo que algumas partículas foram refletidas até para trás, na direção de onde

provinha. Neste ponto, como, então os maiores desvios experimentados por algumas

partículas α poderiam ser explicados? A explicação para esses resultados não foi

imediatamente óbvia, mas eles eram claramente incoerentes com o modelo de pudim de

ameixa de Thomson.

Por volta de 1911, Rutherford conseguiu explicar essas observações, postulando que

a maioria da massa do átomo e toda a sua carga positiva residiam em uma região muito

pequena e extremamente densa, que ele denominou de núcleo, sendo que a maior parte total

do volume do átomo é espaço vazio, em que os elétrons movem-se ao redor do núcleo.

Nessa perspectiva, Brown et al. (2005) afirmam que estudos experimentais

subsequentes levaram à descoberta de ambas as partículas no núcleo, sendo as partículas

positivas (prótons) e as partículas neutras (nêutrons). Os prótons45foram descobertos em 1919

por Rutherford, sendo que os elétrons foram descobertos por Thomson em 1897, e os nêutrons

foram descobertos em 1923 pelo cientista britânico James Chadwick (1891-1972).

43 Nessa Figura 11, o elemento Polônio (Po) trata-se de um elemento radioativo, sendo fonte de partículas α. 44 Disponível em: < http://espetacularquimica.blogspot.com.br/search?q=Rutherford > Acesso em jun. 2016. 45 De acordo com Chassot (1996, p. 3), “Há modelos confirmados experimentalmente em abril de 1994 que

consideram os quarks e léptons como partículas formadoras dos prótons. Cientistas cogitam segundo anúncio

feito em fevereiro de 1996 à possibilidade dos quarks serem divisíveis. Se isto for confirmado, teremos uma

reedição do feito de Rutherford (1871-1937) quando anunciou que átomos tinham núcleo”.

Page 121: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

120

Em síntese, Russel (1994) expressa que o modelo de Rutherford representa o átomo,

consistindo este em pequeno núcleo rodeado por um grande volume, no qual os elétrons estão

distribuídos. No núcleo são encontrados prótons e nêutrons na proporção correta com o

diâmetro do átomo, e este é extremamente pequeno. A maior parte do volume atômico é o

espaço no qual o elétron é encontrado, que foi denominado de eletrosfera. E os elétrons são

atraídos pelos prótons no núcleo pela força que existe entre as partículas de cargas elétricas

opostas. E devido o fato do modelo atômico de Thomson não ter sido usado para interpretar

os resultados dos experimentos de Rutherford e seus colaboradores, o modelo de Rutherford

logo o substituiu, como mostrado na Figura 12.

Figura 12: Modelo Atômico proposto por Rutherford46. Fonte: Página de Blogue

47

O modelo atômico de Rutherford48 consiste em uma ferramenta básica para o estudo

da Química no Ensino Médio, pois de forma clara e simples, ele permite explicar uma série de

processos químicos, contudo cabe salientar que esse modelo constitui uma representação e

não um átomo como ele é de fato (CHASSOT, 1993; SANTOS e MÓL, 2010).

Santos e Mól (2010) evidenciam, também, que esse modelo atômico de Rutherfod foi

comparado com o Sistema Solar, pelo fato de o seu modelo considerar que os elétrons giram

ao redor do núcleo do átomo em órbitas (trajetórias fechadas), assim como no Sistema Solar,

46 No núcleo do átomo, além dos prótons (esferas vermelhas) estão os nêutrons (esferas azuis). E as (esferas

pretas) ao redor do núcleo caracteriza os elétrons na região que foi denominado de eletrosfera. Essa

representação explica o desvio da partícula α, sendo que a carga positiva concentrada em uma região central no

átomo repele a radiação. 47 Disponível em: < http://alunosonline.uol.com.br/quimica/o-atomo-rutherford.html > Acesso em jun. 2016. 48 Compete destacar que a carga de um elétron é -1,602 x 10-19C, e a do próton é + 1,602 x 10 -10C. A quantidade

1,602 x 10-19C é chamada de carga eletrônica. Por conveniência, as cargas atômicas e subatômicas são,

normalmente, expressas em múltiplos desta carga, em vez de em coulombs. Assim, a carga do elétron é 1-, e a do

próton, 1+. Nêutrons não têm carga e, por consequência, são eletricamente neutros (daí seu nome). Os átomos

têm um número igual de elétrons e prótons, logo, possuem uma carga elétrica líquida neutra. O coulomb (C) é a

unidade de carga elétrica no SI (BROWN et al., 2005).

Page 122: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

121

em que os planetas giram em órbitas ao redor do Sol. Embora essas comparações (analogias)

sejam muito frequentes nas Ciências, sempre se deve ter cuidado, ao comparar coisas

diferentes, pois o sistema idealizado por Rutherford não é exatamente como o Sistema Solar.

Afinal as dimensões, formatos e trajetórias das órbitas dos planetas no Sistema Solar são

completamente diferentes das dos elétrons.

O modelo atômico proposto por Rutherford permitia a compreensão de uma série de

fenômenos que não eram explicados por modelos anteriores, e o seu modelo constitui a base

para se entender os modelos atômicos mais modernos.

No entanto, esse modelo não era capaz de elucidar uma questão de grande

importância, a de como os elétrons, dotados de carga negativa, podiam movimentar-se em

torno do núcleo positivo sem perder energia e colidir uns com os outros e com o núcleo?

Nessa época, já se sabia que cargas de sinais opostos se atraem. A possibilidade de o elétron

atingir o núcleo do átomo apenas indicava aos cientistas uma discrepância entre o modelo de

Rutherford e a teoria da Física, que previa a atração de sinais opostos, ou se sugeria um

modelo compatível com a reflexão de uma pequena porcentagem das partículas α na lâmina

de ouro, ou se desenvolvia uma teoria, que sustentasse a presença de elétrons na eletrosfera.

Nessa perspectiva, o estudo da luz49 forneceu alguns subsídios para o início de uma

nova teoria da Física e para o aperfeiçoamento do modelo atômico.

O átomo de Niels Bohr

Este último modelo atômico complementa o de Rutherford e constitui o modelo

atômico atualmente aceito, por isso em alguns livros textos do Ensino Médio se pode

encontrar com a denominação de modelo atômico de Rutherford-Bohr, dando menção a uma

complementação. Nele são propostas maneiras dos elétrons se movimentarem em torno do

núcleo e a energia associada a esse movimento.

Com dados experimentais em relação ao espectro dos átomos de hidrogênios, Niels

Bohr (1885-1962) propôs, em 1913, um modelo de comportamento de elétrons no átomo, que

procurou estabelecer por que estes se mantêm na eletrosfera sem se dirigir para o núcleo e

49

Uma propriedade dos átomos conhecida desde o século XIX é a emissão de luz, que acontece quando eles são

aquecidos em uma chama e além de emitir luz, os átomos também emitem outros tipos de radiação, o que só é

permitido por instrumentos ópticos. A festa de Réveillon no Rio de Janeiro, embelezada quimicamente é um

exemplo. Nos tradicionais fogos de artifício são adicionadas substâncias, cujos átomos emitem radiações de

luminosidades diferentes (SANTOS e MÓL, 2010).

Page 123: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

122

colidir com ele. Bohr sugeriu que uma teoria sobre a luz, proposta por Max Plank50 (1958-

1947) poderia ser aplicada ao átomo e com base nesse pressuposto, Bohr baseou seu modelo

em três postulados, a saber:

1. Somente órbitas de certos raios, correspondendo a certas energias definidas, são

permitidas para os elétrons de um átomo;

2. Um elétron em certa órbita permitida tem certa energia específica e está em um

estado de energia permitido. Um elétron em estado de energia permitido não

irradiará energia e, portanto, não se moverá em forma de espiral em direção ao

núcleo;

3. A energia só é emitida ou absorvida por um elétron quando ele muda de um

estado de energia permitido para outro. Essa energia é emitida ou absorvida

como fóton (BROWN et al., 2005, p. 190).

Com base nesses postulados, o modelo atômico de Bohr aprimorou o de Rutherford e

ficou expresso da seguinte maneira: que os elétrons giram em torno do núcleo, em órbitas

fixas circulares chamadas níveis de energia. Para mudarem de órbita, os elétrons emitem ou

absorvem energia. Na Figura 13 (a), ao receber energia, os elétrons saltam para os níveis mais

energéticos, e na Figura 13 (b) ao retornar aos níveis energéticos de origem há liberação de

energia. Átomos de elementos distintos emitem diferentes luminosidades, porque seus

elétrons ocupam diferentes níveis de energia. Em outros termos, os saltos quânticos que

realizam são diferentes.

(a) (b)

Figura 13: Transferência de energia para os elétrons, segundo Bohr.

Fonte: Página de Blogue51

De acordo com Russel (1994), embora o modelo atômico proposto por Bohr seja

atrativo em muitos aspectos, sua teoria é inadequada para explicar satisfatoriamente o

espectro de alguns elementos além do hidrogênio. O conceito de quantização de energia

50 De acordo com a tese de Planck, a radiação é emitida de forma descontínua e toda energia do elétron é

quantizada, de modo que os elétrons absorvem ou emitem quantidades fixas de energia e em minúsculas

quantidades fixas denominadas quanta (BROWN et al., 2005). 51 Disponível em: < http://www.mundoweb.com.br/quimica/teoria/modelo-atomico.asp> Acesso em jun. 2016.

Page 124: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

123

eletrônica de Bohr é ainda considerado essencialmente correto, embora suas ideias sobre

órbitas não o sejam.

No ano de 1905, a teoria dos quanta, plural de quantum, foi usada pelo físico alemão

Albert Einstein (1879-1955) para explicar o fenômeno do efeito fotoelétrico, depois por Bohr,

em 1913 para formular o seu modelo atômico e, posteriormente, por diversos outros físicos,

que desenvolveram um novo ramo da Física: a Mecânica Quântica. E a partir da Mecânica

Quântica foi estabelecido um conjunto de leis e princípios para explicar o comportamento

energético dos elétrons no átomo. Daí surgiu o modelo pós-moderno para o átomo: o modelo

quântico52.

Ao fazer uma análise na perspectiva de Bachelard (1977, 1978) e Kuhn (1987) da

evolução dos diferentes modelos atômicos desde a antiguidade até os dias atuais, pois esses

dois epistemólogos apresentaram ideias que apontavam para algum tipo de evolução da

ciência em direção ao progresso, suplantando conhecimentos anteriores, superando obstáculos

ou através de rupturas, propondo que o conhecimento de hoje seria diferente do conhecimento

de ontem.

Compreende-se que, para Bachelard a História da Ciência deveria ser contada a partir

do presente, pois é o presente que ilumina o passado, isto é, a partir de verdades que a ciência

atual se tornou mais clara e melhor coordenada, que o passado de verdade surge mais

claramente na própria qualidade do passado.

A perspectiva epistemológica de Bachelard (1977) reforçava a ideia de que o

conhecimento científico avançaria e se aprimoraria de modo natural, superando os obstáculos

epistemológicos. Nessa perspectiva, a ciência no seu processo histórico de desenvolvimento

elaboraria teorias mais amplas que superariam as anteriores. Com essa compreensão, o

modelo de Thomson superou o de Dalton, o modelo de Rutherford superou o de Thomson, e o

modelo de Bohr superou/complementou o de Rutherford.

Já Kuhn (1987) procurou apresentar um modelo de desenvolvimento da ciência com

base nos momentos de grandes mudanças conceituais, ou seja, nas revoluções científicas.

Tomas Kuhn procurou estabelecer estreito contato com a História da Ciência, propondo a

existência de momentos de rupturas no processo do conhecimento científico. Dessa forma,

procurando suplantar as teses que defendiam o continuísmo, ele buscou justificar a

descontinuidade na ciência por meio da noção de paradigma.

52 O atual modelo quântico recorre a cálculos matemáticos bastante avançados que não têm como ser

demonstrados com base nos conhecimentos matemáticos do Ensino Médio. Para saber mais sobre o modelo

quântico sugiro a leitura nas obras de Russel (1994) e Brown et al. (2005).

Page 125: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

124

A perspectiva epistemológica de Kuhn que o novo paradigma não explicaria, nem

mais e nem melhor, os fenômenos antes explicados pelo paradigma anterior. O que significa

que os conceitos e as teorias existentes no velho paradigma e aqueles formulados dentro do

novo seriam incomensuráveis (KUHN, 1987). Com base nessa noção de paradigma de Kuhn

pode-se inferir que foi havendo rupturas de paradigmas de Dalton, Thomson, Rutherford e

Bohr para a compreensão do comportamento e constituição do átomo nos dias atuais.

Com esses modelos atômicos de Dalton, Thomson, Rutherford e Bohr, os professores

da Educação Básica podem lançar a pergunta crucial, quando trabalham com esse conceito no

Ensino Médio, que consiste em: Qual o modelo de átomo que devo ensinar? A essa indagação

pode-se responder com o apoio em Chassot (1996) que pode ser: “Depende para que os

átomos modelados vão ser usados depois” (p. 3).

Os modelos de Dalton e Bohr, por exemplo, ainda hoje podem ser usados, quando

não se precisa de um tratamento mais sofisticado. Nesses termos, quer-se expressar que se o

professor no Ensino Médio for explicar balanceamento de reações químicas, o modelo de

Dalton se mostra eficaz para essa compreensão. E com o modelo de Bohr pode-se explicar,

com bastante adequação, as ligações químicas que ocorrem nos compostos iônicos, mas esse

mesmo modelo não é válido para explicar, consistentemente, os compostos covalentes.

Chassot (1993) afirma que Niels Bohr, por exemplo, recebeu o Prêmio Nobel de

Física, em 1922 por seu modelo atômico, e esse modelo seguiu em continuação a proposta de

modelo nuclear de Rutherford, que ganhou o Prêmio Nobel de Química em 1911, que foi

muito importante dentro das diferentes propostas de modelos atômicos. Com isso, o autor

predito sublinha duas situações:

Se Bohr, por este modelo, ganhou o Prêmio Nobel, significa que sua teoria recebeu o

referendo da Academia. Para os conhecimentos de então, sua proposta era

considerada adequada, pois explicava convenientemente as indagações sobre a

estrutura da matéria. O próprio Rutherford, que modificara o átomo de J. J.

Thomson, não aceitou logo a proposta de Bohr. Mas depois a aplaudiu, pois

verificou que a nova proposta, envolvendo limitações para os valores possíveis de

energia, era mais adequada. A segunda situação, às vezes não muito presente, é a

seguinte: mudam os modelos, mas não a realidade (p. 106).

Com essa passagem de Chassot (1993), ele evidencia que hoje em dia se tem uma

nova ideia de átomo, ou seja, um novo átomo para explicar uma realidade que não mudou. A

mudança que ocorre é no conhecimento sobre essa realidade. Esse alerta é feito, em vista de

comentários de estudantes que, quando veem a mudança de um paradigma na perspectiva de

Kuhn (1987), pensam que a natureza modificou-se.

Page 126: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

125

Finalizo essa sinopse sobre os modelos atômicos afirmando que um modelo simples

pode ser até mais correto e mais útil de ser utilizado. É importante recordar, que a

simplificação de um modelo traz facilidades e adequações que, muitas vezes, um modelo mais

elaborado não apresenta. Recorde-se que foi afirmado poder-se explicar, com adequação, a

ligação da molécula de cloreto de sódio, NaCl que é um composto iônico, usando o modelo de

Bohr, e já uma molécula, aparentemente simples, como a do hidrogênio, H2 que é um

composto molecular para ser explicada, precisa de um modelo mais elaborado do que o

proposto por Bohr.

Assim, usam-se modelos de átomos para fazer representação de uma molécula, e se

tem um modelo de molécula; e com modelos de moléculas se faz, por exemplo, modelos de

reações. Portanto, ao se estudar Química, é importante recordar, sempre, que se tratam de

realidades com as quais se tem dificuldades de interagir e, por isso, precisa-se imaginar (fazer

imagens), ou fazer modelo (CHASSOT, 1993).

Episódios de Aula sobre Modelos Atômicos

Os episódios de aula do Ensino Médio ocorreram com a dinâmica da realização do

grupo focal53. Inicialmente, lembrei ao grupo que a conversa era entre as professoras

colaboradoras Curie, Mayer, Franklin e Meitner, e que elas não precisavam atuar como se

estivessem respondendo ao moderador todo tempo, pois o propósito não era uma entrevista

coletiva, mas sim, uma troca efetiva de saberes entre os participantes. Dessa forma, fiz a

introdução do assunto, contextualizando às colaboradoras quais eram os focos de interesse da

Química para abrir e aquecer o diálogo e foi lançada a seguinte indagação: Conte-me

episódios ou situações de uma aula que você tenha vivido sobre Modelos Atômicos na

Educação Básica, como ocorreu o planejamento, a introdução, a definição de cada modelo, o

desenvolvimento e a avaliação desses conceitos, e a partir daí o diálogo começou a fluir.

53

É necessário destacar que no momento dos relatos dos episódios de aulas eu não podia tecer nenhum

comentário para que não influenciasse as narrativas das colaboradoras, mas como professor formador no

andamento desses relatos não me faltou vontade de fazer algum tipo de intervenção. Contudo, após a transcrição

desses episódios de aulas com as narrativas orais das colaboradoras, duas semanas depois da realização do grupo

focal, eu enviei um e-mail para as colaboradoras com a transcrição dessas narrativas para que elas pudessem ler e

verificar se estavam de acordo e que elas poderiam, também, por meio de uma narrativa escrita expressar como

elas desenvolviam a aula daquele conceito no Ensino Médio. Minha intencionalidade foi ter uma postura ética

com as minhas colaboradoras nas narrativas que serão expostas e para que eu pudesse triangular as narrativas

orais com as narrativas escritas, pois eu parti do pressuposto de que muitas vezes no relato oral podemos ficar

nervosos e não expressar de forma satisfatória o que pensamos. Tive retorno de todas as colaboradoras com

narrativas escritas sobre os episódios de aulas e para minha surpresa a narrativa escrita retratava as mesmas

concepções das narrativas orais.

Page 127: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

126

Em seguida, são apresentados os textos de pesquisa concernente às narrativas do

desenvolvimento da aula de cada colaboradora:

- A aula sobre Modelos Atômicos de acordo com a Professora Curie

O que expõe Curie?

No episódio de aula da professora Curie sobre modelos atômicos, ela revela que

gosta de trabalhar com esse conteúdo em virtude da possibilidade de poder trabalhar diversos

exercícios como atividades. Dessa forma, reforça que a tendência pedagógica de sua prática

profissional está pautada no enfoque da transmissão cultural dos conteúdos como observado

no instrumento de acesso ao seu modelo didático. Curie se expressa nos seguintes termos:

Como eu tenho trabalhado muito com turmas de primeiro ano, eu gosto muito dos conteúdos

de modelos atômicos, Linus Pauling, distribuição eletrônica, porque eu tenho “n” exercícios

para trabalhar com eles.

A professora Curie relata que faz o seu planejamento da temática e faz a introdução

desses conceitos a partir da História da Química. Entretanto, quando narra como faz com seus

educandos, Curie não problematiza os diferentes modelos e apesar de mencionar que trabalha

a partir da História da Química, ela não põe em evidência a história, como os diferentes

modelos foram sofrendo rupturas ou complementações e passa a impressão de que suas aulas

pautam-se em uma visão aproblemática e ahistórica (GIL-PÉREZ et al., 2005). Veja-se a

seguir o registro:

Por se tratar da primeira aula sobre o tema, ela foi planejada para iniciar a partir

da História da Química, onde além de contar sobre a descoberta da estrutura

atômica, falei também de quem foi cada um dos mentores das teorias. Na

introdução, discutimos os aspectos históricos para poder iniciar as discussões sobre

o modelo atômico de John Dalton. A partir do momento em que passamos a

dialogar sobre os modelos atômicos e os conceitos que são apresentados para cada

teoria, passamos a relacioná-los com o cotidiano.

Curie revela na passagem anterior, que relaciona a temática com o cotidiano.

Todavia, introduz sua aula sem contextualizar a origem da definição do átomo, e sem

problematizar as razões pelas quais, desde a antiguidade, os filósofos já buscarem, por

exemplo, uma explicação para a constituição da matéria. Ainda sobre o seu desenvolvimento

da aula com a temática, expressa:

Page 128: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

127

Na definição de cada modelo defino assim, o modelo de Dalton os átomos são os

componentes principais da matéria, é a menor parte de um elemento. Com o passar

dos anos, novas descobertas indicavam que os átomos eram compostos por

partículas menores ainda. Assim para Thomson, o átomo consistia em uma esfera

positiva e uniforme da matéria, onde os elétrons estavam incrustados. Já o modelo

de Rutherford foi a partir de suas pesquisas realizadas com partículas α e a folha de

ouro. Rutherford conseguiu explicar que a maior parte da massa do átomo e toda a

sua carga positiva estavam localizados em uma região muito pequena e densa, a

qual ele chamou de núcleo. O restante do átomo era apenas espaço vazio, com o

movimento dos elétrons ao redor do núcleo. Bohr em suas pesquisas, conhecendo a

descoberta de Rutherford, chegou à conclusão de que os elétrons não se moviam ao

redor do núcleo de maneira aleatório, mas sim em órbitas circulares. Porém, esse

movimento circular os faria perder energia, o que explicaria o movimento dos

elétrons.

Pode-se observar no excerto acima, no que tange aos saberes científicos (Shulman,

1986), Curie mostra que possui domínio dos conceitos de cada modelo, quando expressa os

modelos de Dalton, Thomson, Rutherford, porém apresenta um erro conceitual na definição

no modelo de Bohr na passagem esse movimento circular os faria perder energia, o que

explicaria o movimento dos elétrons. O erro conceitual consiste em que não é o movimento

circular dos elétrons que os fazem perder energia, mas sim quando os elétrons mudam de uma

órbita para outra que eles emitem ou absorvem energia, veja-se a proposição de Bohr (1885-

1962): os elétrons giram em torno do núcleo, em órbitas fixas circulares chamadas níveis de

energia. Para mudarem de órbita, os elétrons emitem ou absorvem energia.

A mediação didática do saber científico ao saber pedagógico de conteúdo químico é

expresso do seguinte modo:

Para que os alunos possam associar os conceitos e as informações teóricas durante

as aulas, trabalho com ilustrações no quadro, demonstrando com uma linha do

tempo as descobertas e as mudanças que o modelo atômico passou até que se

chegasse ao modelo de Bohr. Em uma aula de revisão trabalho animação virtual,

onde é possível ver cada um dos modelos discutidos. Por trabalhar em uma escola

particular, utilizo a apostila dos alunos e o caderno de exercícios que são

adquiridos por eles e a produção em grupo de material didático que represente os

modelos discutidos na sala. Além disso, utilizo como material pessoal, livros

didáticos do PNLD para o primeiro ano do Ensino Médio e um livro de química

geral, de uso no Ensino Superior.

O PCKC de Curie para essa temática se configura por meio de ilustrações, de

recursos de multimídia, de linha do tempo dos modelos, e a mesma se apoia em vários livros

didáticos da Educação Básica ao Ensino Superior para planejar suas aulas.

Page 129: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

128

- A aula sobre Modelos Atômicos segundo a Professora Mayer

O que diz Mayer?

No episódio de aula da professora Mayer sobre modelos atômicos, a mesma revela

logo de início como configura o seu PCKC ao trabalhar com esses conceitos, mostrando que

utiliza cartazes com ilustrações de cada modelo, bolinhas de isopor para fazer a representação

dos átomos e simuladores de cada modelo atômico na internet. Mayer se expressa do seguinte

modo:

As minhas aulas sobre modelos atômicos eu começo daquele princípio da evolução

de Dalton, Thomson e vai indo... De forma bem tradicional mesmo, e os alunos

gostam de cartazes. Daí eu faço cartazes para trabalhar com os modelos atômicos.

Além dos cartazes, eu utilizo bolinhas de isopor para representar os átomos e uso

simuladores dos modelos atômicos de forma on-line para os alunos visualizarem.

Pode-se observar, também, no relato da professora Mayer, que ela trabalha de uma

forma aproblemática, ahistórica e acumulativa como aponta Gil-Pérez et al. (2005), e que o

faz também de uma maneira “bem tradicional”. No acesso ao modelo didático de Mayer,

mesmo apontando que a intencionalidade de sua prática pedagógica encontra-se no contexto

do construtivismo se observa que a mesma possui uma visão eclética de vários modelos

didáticos, que justifica nesse contexto quando a professora anuncia que trabalha sob o

enfoque tradicional. Mayer diz: No final de toda a explicação eu faço exercícios específicos

de cada modelo como forma de fixação.

Em relação aos saberes científicos dessa temática, a professora apresenta uma visão

acumulativa de crescimento linear, não evidencia claramente as rupturas que aconteceram em

cada modelo, mas implicitamente mostra a complementação do modelo atômico de

Rutherford-Bohr e, também, não faz menção ao modelo atômico quântico ao trabalhar a

definição de cada conceito. Continuando, Mayer assim se manifesta:

O modelo de Dalton, apresento os postulados propostos por Dalton e defino como a

bola de bilhar. Quando eu explico o modelo de Thomson e aponto as diferenças não

apresentadas pelo modelo atômico de Dalton. E apresento o modelo atômico de

Thomson como pudim de passas. No modelo atômico de Rutherford, eu explico os

desvios das partículas alfas e no de Bohr os níveis de energia, quando eu falo do

átomo de Bohr eu explico como funciona os fogos de artifícios que são soltos nas

festas de Santos em Poconé, e ai eles vão entendendo. Passo a definição do modelo

atômico de Rutherford-Bohr como o modelo atômico planetário.

No excerto acima, levo em consideração que não observei aulas da professora. Estou

considerando os relatos que cada uma faz de sua prática. Essa condição me dá possibilidade

Page 130: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

129

de levantar indícios sobre possíveis obstáculos epistemológicos no desenvolvimento de sua

aula, caso a realize tal qual relatou no excerto anterior, uma vez que o emprego

indiscriminado de termos científicos, sem distinguir seus significados em relação aos termos

da linguagem comum, pode não apenas impedir o domínio do conhecimento científico, como

também cristalizar conceitos errados, o que Bachelard (1996) chama de verdadeiros

obstáculos à abstração, denominando de obstáculo verbal.

O obstáculo verbal é a falsa explicação obtida com a ajuda de uma palavra

explicativa, nessa estranha inversão que pretende desenvolver e analisar um conceito, em vez

de inserir um conceito particular em uma síntese racional. Observam-se possíveis obstáculos

verbais na passagem da narrativa da professora Mayer, quando define apenas o modelo

atômico de Dalton como a bola de bilhar, como se a bola de bilhar, por si só, fosse o

suficiente para explicar que se trata de uma esfera maciça e indivisível e quando a professora

define também o modelo atômico de Thomson, apenas pela palavra pudim de passas.

Para Bachelard (1996), o realismo é a única filosofia inata que norteia o pensamento

do senso comum, sendo capaz de instituir a ciência do geral, do superficial. Na concepção

realista, conhecer um objeto ou um conceito é poder descrevê-lo, apresentar suas prioridades,

encaradas como fundamentalmente intrínsecas a ele. A razão do realista não encontra espaço

para se aplicar, pois todo seu ser resiste à abstração. Com isso, pode-se expressar que também

se pode identificar possíveis obstáculos realistas na narrativa da professora Mayer, quando a

professora define o modelo atômico de Rutherford-Bohr com a metáfora de modelo atômico

planetário. Dessa forma, a força da metáfora se sobrepõe à discussão racional desse modelo

atômico proposto.

- A aula sobre Modelos Atômicos na perspectiva da Professora Franklin

O que conta Franklin?

No episódio de aula da professora Franklin sobre modelos atômicos, ela propõe uma

atividade com seus educandos para mostrar que trabalha com modelos para explicar a

realidade. Essa atividade, ela denomina de “caixinha misteriosa” e o seu objetivo com os

educandos é que com um objeto dentro da caixa os estudantes possam tocar com as mãos e,

por meio disso, eles possam elaborar, com desenhos, uma possível explicação para o que eles

acham e o que possa ser um suposto objeto. Percebo a sua intencionalidade de trabalhar com o

abstrato perpassa de algo concreto e que podem no final trazer possíveis detalhamentos sobre

o objeto por meio de modelos. Dessa forma, a professora explica que, da mesma maneira,

Page 131: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

130

foram propostos modelos para a explicação dos átomos, mas que são possíveis explicações

para uma determinada realidade. Assim relata Franklin:

Na aula de introdução ao conteúdo, faço a prática da caixinha misteriosa. Nessa

caixa, coloco um objeto (geralmente um brinquedo já usado, que não tenha

problemas de ser apalpado para que não machuque o aluno), aviso com

antecedência de que o objeto não pode ser retirado da caixa. O objetivo é que eles

“sintam” o objeto com as mãos e através disso, eles criam um desenho do que eles

imaginam estar dentro da caixa e escrevam suas características. Feito isso, peço

que eles exponham seus desenhos e expliquem por que acreditam ser “aquilo”.

Pergunto-lhes se é possível afirmar com certeza a respeito do objeto desenhado. A

partir daí começamos a falar sobre modelos e as possíveis formas para melhorá-lo.

Prosseguindo a narrativa de sua aula, a professora expressa que dias antes da

explicação sobre modelos atômicos ela solicita como “tarefa” uma pesquisa sobre os modelos

atômicos de Dalton, Thomson e Rutherford-Bohr, mas não menciona se orienta seus

educandos a como fazerem essa pesquisa e em quais fontes podem buscar o que está sendo

solicitado. Franklin diz: Uma aula antes da introdução do conteúdo deixei como “tarefa”

uma pesquisa sobre os modelos atômicos de Dalton, Thomson e Rutherfor-Bohr, para ser

entregue no caderno, destacando a característica de cada modelo atômico.

Nas suas aulas, a professora em seus PCKC utiliza-se de analogias e bolinhas de

isopor para representar os átomos para explicar os diferentes modelos atômicos, mas também

recai nos obstáculos epistemológicos verbais e realistas na perspectiva de Bachelard (1996),

quando define que o modelo atômico de Dalton é semelhante a uma bola de bilhar, que o

modelo de Thomson foi proposto por ele, quando ele estava com fome e ficou conhecido

como pudim de passas e que o modelo atômico de Bohr é comparado ao Sistema Solar.

Na explicação dos saberes científicos, a professora possui domínio dos conceitos em

que está trabalhando, contudo, ela os expressa de uma forma aproblemática, ahistórica e

acumulativa (Gil-Pérez et al.,2005), não evidenciando em que momento se deu a ruptura do

modelo de Dalton com o de Thomson, bem como a complementação dos modelos de

Rutherford e Bohr. Veja-se a exposição:

Na aula seguinte verifico a pesquisa que foi feita no caderno e explico sobre cada

modelo atômico destacando cada cientista. Para explicar o modelo atômico de

Dalton utilizo umas bolinhas (que é utilizado na aula do terceiro ano para trabalhar

ligações dos compostos orgânicos), no modelo atômico de Dalton os átomos são

esferas maciças, rígidas e indivisíveis. Átomos com as mesmas propriedades

constituem um elemento químico e elementos diferentes são constituídos por átomos

com propriedades diferentes. Depois de muitas aulas sobre o assunto percebi que

com essas bolinhas fica mais fácil para eles assimilarem o conceito de átomo e o de

elemento químico. Ai eu defino que o átomo de Dalton é semelhante a uma bolinha

de bilhar.

Page 132: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

131

Destaco que o modelo de Dalton não leva em consideração que os átomos são

constituídos de cargas elétricas, sendo necessário um novo modelo que atenta a

essa necessidade. Thomson na hora que criou o seu modelo estava como fome e o

seu modelo atômico ficou conhecido como pudim de passas. O modelo atômico

de Thomson consiste em uma esfera carregada positivamente e que elétrons de

carga negativa ficam incrustados nela.

Para explicar o Modelo atômico de Rutherford-Borh eu digo que o átomo não era

como se pensava até então uma esfera rígida ou um pudim, mas que ele tem espaços

vazios semelhante ao Sistema Solar. Aí faço a definição que o átomo é composto por

um pequeno núcleo carregado positivamente e rodeado por uma grande eletrosfera,

que é uma região envolta do núcleo que contém elétrons. No núcleo está

concentrada a carga positiva e a maior parte da massa do átomo. Como eles

fizeram a pesquisa, comento de forma geral como foi feito o experimento. Faço o

desenho no quadro do modelo atômico para explicar o núcleo e suas partículas

(prótons e nêutrons) e a eletrosfera com os elétrons. Bohr representa os níveis de

energia, cada elétron possui a sua energia. É comparado às orbitas dos planetas do

Sistema Solar, onde cada elétron possui a sua própria órbita. Cada órbita

representa uma camada eletrônica. Na aula seguinte trabalhamos exercícios sobre

o assunto.

Ao acessar a intencionalidade da prática pedagógica da professora Franklin, através

do instrumento do modelo didático como demonstrado na seção anterior, compreendo que ela

se situa no contexto do construtivismo. Contudo, a professora em vários aspectos apresentou

visão eclética sobre diferentes modelos didáticos. A proposta de trabalhar com construção de

modelos com a prática da caixinha misteriosa indica a iniciativa da perspectiva construtivista

ao trabalhar com saberes científicos, mas, ao final, a professora expressa que finaliza sua aula

com resoluções de exercícios sobre os modelos atômicos como uma forma de memorizar os

conhecimentos que foram transmitidos. Franklin diz: Na aula seguinte trabalhamos

exercícios sobre o assunto.

- A aula sobre Modelos Atômicos conforme a Professora Meitner

O que narra Meitner?

No episódio de aula da professora Meitner sobre modelos atômicos, ela, de início,

me deixa perceber que o que conduz a sua prática pedagógica é o livro didático. A professora,

para acessar o saber científico aos seus estudantes em seu PCKC utiliza-se de histórias,

figuras, imagens, analogias e pesquisas em internet. Meitner se expressa nos seguintes

termos:

Eu trabalho com o livro didático, justamente pelo fato de contar histórias dos

modelos atômicos, e eu gosto de trabalhar com a visualização dos alunos, também.

e então, eu vou para a internet com eles para fazer pesquisa, daí eu encontro na

internet vários vídeos que trabalham os diferentes modelos atômicos com as figuras,

imagens e vidas de cada cientista.

Page 133: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

132

A professora Meitner tenta trabalhar os modelos atômicos em uma perspectiva

problemática e histórica, mas não explica com detalhes como se originou e em qual

perspectiva atua em cada modelo, quais sofreram rupturas ou complementações. Meitner diz:

Nas aulas sobre modelos atômicos eu explico a evolução de cada modelo de modo que os

alunos percebam através da História da Química, como esses modelos são aprimorados ou

até mesmo substituídos para explicar melhor um fenômeno.

No que tange os saberes científicos dessa temática, Meitner manifesta apresentar

domínio dos conceitos, mas também recai em obstáculos epistemológicos verbais e realistas

como proposto por Bachelard (1996), quando expressa que o modelo de Thomson ficou

conhecido como pudim de passas e o modelo de atômico de Bohr ficou conhecido como o

modelo atômico do Sistema Solar, ficando só no nível da metáfora e não fazendo a devida

ruptura do senso comum com o saber científico. Eis sua narrativa:

Na teoria atômica de Dalton eu explico que Dalton considera o átomo maciço,

indivisível, e explico o conceito de elemento químico. No modelo atômico de

Thomson ele foi responsável pela descoberta dos elétrons e da radiotividade e o seu

modelo atômico ficou conhecido como pudim de passas. Para o modelo atômico de

Rutherford eu explico o experimento que ele fez a partir do bombeamento de

finíssimas placas de ouro com partículas alfa para a descoberta do núcleo do

átomo. E o modelo de Bohr, como ele compreende a natureza da luz nos espectros

de emissão e absorção da luz e que o seu modelo ficou conhecido como o modelo

atômico do Sistema Solar.

No acesso à intencionalidade da prática pedagógica da professora Meitner

compreendo que ela assume um enfoque de transmissão cultural dos conteúdos, o que reforça

com a passagem da finalização de sua aula somente com resolução de exercícios. A este

respeito, Meitner diz: Como atividade final, eu faço exercícios de cada modelo.

Diferenças e Proximidades nos episódios de aulas sobre modelos atômicos das

Professoras colaboradoras

Nos episódios de aula sobre modelos atômicos, posso constatar mais proximidades

que diferenças. Em relação à diferença, a única professora que não expressou em sua aula

possíveis obstáculos epistemológicos foi a professora Curie, mas isso não significa que a

referida professora não precise estar vigilante epistemologicamente. Outra diferença foi a

tarefa preparatória para a introdução do assunto pela professora Franklin, que pediu aos

estudantes para pesquisar a respeito na aula anterior. E entre as aproximações, posso destacar

os seguintes aspectos:

Page 134: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

133

- Todas as professoras expressaram certo domínio do saber científico sobre a

temática trabalhada, ao relatar os episódios de aula;

- O PCKC se configura de diferentes maneiras, tais como analogias, ilustrações,

cartazes, vídeos, entre outros;

- Todas apresentaram indícios de uma prática docente em perspectiva aproblemática

e ahistória, mesmo quando, em seu relato, diziam considerar aspectos históricos da Ciência.

Gil-Pérez et al. (2005) mostram que o fato de transmitirmos conhecimentos já elaborados

conduz a ignorar quais foram os problemas que se pretendiam resolver, qual tem sido a

evolução de ditos conhecimentos, as dificuldades encontradas entre outros;

- Nenhuma professora levou em consideração os conhecimentos prévios de seus

educandos; talvez a professora Franklin tenha intencionado a constituição de tais

conhecimentos em seus alunos, ao solicitar pesquisa prévia sobre modelos atômicos em aula

anterior à sua explicação;

- Nenhuma professora fez a introdução da aula fornecendo justificativas para

estudarmos os modelos atômicos e para qual finalidade;

- Todas demonstraram necessidade de uma reflexão epistemológica na construção e

trabalho desses conceitos;

- Em certo ponto, todas narraram suas aulas em uma visão acumulativa do

conhecimento que, no ponto de vista de Gil-Pérez et al. (2005), trata-se de uma visão

simplista à qual o ensino costuma contribuir, ao apresentar as teorias hoje aceitas sem mostrar

o processo de seu estabelecimento e sem se referir às frequentes confrontações entre teorias

rivais;

- As explicações de suas aulas narradas não dão indícios de uma possível e

necessária ruptura epistemológica do senso comum com o saber científico;

- Do ponto de vista didático, para trabalhar com os conceitos em química seria útil

distinguir três aspectos do conhecimento químico: fenomenológico, teórico e

representacional, conforme Machado e Mortimer (2007). Observa-se que nas narrativas desse

episódio de aula, o aspecto teórico prevaleceu, e o fenomenológico e representacional não

foram destacados.

A seguir, apresento o que a literatura Química atual versa sobre os modelos de ácidos

e bases e os textos de pesquisa sobre os episódios de aula sobre essa temática das professoras

colaboradoras.

Page 135: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

134

Ácidos e Bases em Questão: O que a literatura Química atual apresenta?

Está subseção trata dos episódios de aulas sobre os conceitos de ácidos e bases de

Arrhenius para o Ensino Médio, para tanto, assim como nos episódios de modelos atômicos,

traz-se uma sinopse de ácidos e bases para situar o leitor teoricamente nos episódios de aulas

sobre as concepções desse tema. Essa temática é ensinada a partir da diferenciação das

substâncias químicas que podem ser classificadas em dois tipos: orgânicas e inorgânicas.

As orgânicas são constituídas por moléculas formadas pela união consecutiva de

átomos de carbono, C, também chamadas por cadeias carbônicas, e são exemplos dessas

substâncias: a sacarose (açúcar branco), o ácido acético (presente no vinagre), o etanol (álcool

etílico), entre outros. As substâncias inorgânicas, em geral, são de origem mineral, como: o

nitrato de sódio, NaNO3, também conhecido como (salitre do Chile), sulfato de cálcio, CaSO4,

ácido clorídrico, HCl, hidróxido de sódio, NaOH (presente na soda cáustica), entre outros.

Algumas das substâncias inorgânicas constam, também, de átomos de carbono, como é o caso

do dióxido de carbono, CO2 e do carbonato de cálcio, CaCO3 (presente no calcário).

E dentre os vários tipos de substâncias inorgânicas existem alguns que comumente

são mencionados, quer por suas propriedades químicas, ou por seu largo emprego em

processos químicos. E desses grupos destacam-se os ácidos, as bases, os sais e os óxidos.

Na literatura Química contemporânea, os paradigmas para a compreensão do

conceito de ácidos e bases, Chagas (1999) aponta para oito modelos, sendo estes: as teorias de

Arrhenius (1887), dos sistemas solventes (1905), protônica (1923), eletrônica (1923), de Lux

(1939), de Usanovich (1939), ionotrópica (1954) e as críticas de Werner (1895 a 1911),

contudo, no Ensino Superior esses conceitos são trabalhados em três perspectivas a de

Arrhenius, de Brɵnsted-Lowry e a de Lewis. E na Educação Básica para a compreensão

desses conceitos comumentemente se ensina somente a partir do modelo de Arrhenius,

destarte, os episódios de aulas sobre essa temática foram propostos junto às colaboradoras

tendo como apoio essa teoria.

Desde os primeiros tempos da química experimental, os cientistas identificam os

ácidos e as bases por suas propriedades características. De acordo com Chagas (1999), os

termos ácidos e sal datam da Antiguidade, álcali, da Idade Média e base do século XVIII. Os

ácidos possuem sabor azedo (por exemplo, o ácido cítrico no suco de limão) e fazem com que

determinados corantes mudem de cor, por exemplo, o tornassol fica vermelho no contato de

ácidos, e no uso de indicador natural de extrato de repolho roxo a solução em contato com

Page 136: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

135

ácidos ficam de vermelho a violeta dependendo do pH54. A palavra ácido vem do latim acidus

e significa azedo ou picante. As bases possuem sabor amargo e, geralmente, a sensação

escorregadia ao tato55 (o sabão é um bom exemplo), e fazem com que determinados corantes

também mudem de cor, por exemplo, o tornassol fica azul no contato de bases, e no uso de

indicador natural de extrato de repolho roxo a solução em contato com bases ficam de

amarelo a verde escuro dependendo do pH. A palavra base vem do inglês arcaico rebaixar

(BROWN et al., 2005).

Ácidos e Bases de Arrhenius

No ano de 1884, o químico sueco Svante Arrhenius propôs uma teoria para explicar a

condutibilidade elétrica de algumas soluções. Essa teoria ficou conhecida como Teoria da

Dissociação Iônica e a mesma viabilizou o estabelecimento de critérios para classificar as

substâncias em função dos seus íons presentes em solução. De acordo com esse químico, as

soluções capazes de conduzirem corrente elétrica eram as que apresentavam partículas

carregadas eletricamente com liberdade de movimento. Nesse sentido, ele realizou vários

testes de condutibilidade elétrica para tirar suas conclusões (LISBOA, 2010).

A partir daí, ficou estabelecido que as substâncias que conduzem corrente elétrica,

quando dissolvidas em água, são chamadas de eletrólitos. As misturas formadas são

denominadas de soluções iônicas ou eletrolíticas. Todos os compostos iônicos solúveis em

água são eletrólitos, porque sofrem dissociação iônica em água, e as soluções aquosas

resultantes apresentam íons livres. Assim, o cloreto de potássio, KCl (composto iônico) é um

eletrólito, e sua solução aquosa é eletrolítica.

Alguns compostos moleculares também são eletrólitos, porque sofrem ionização em

água, por exemplo, o ácido clorídrico, HCl (composto molecular), que origina íons livres

quando dissolvido em solução aquosa.

Por volta de 1830, era notório que todos os ácidos continham hidrogênio, mas nem

todas as substâncias que continha hidrogênio eram ácidos. Dessa forma, o conceito de ácido e

base de Arrhenius veio a ser expresso da seguinte forma: os ácidos são substâncias que,

quando dissolvidas em água, aumentam a concentração de íons H+, portanto, são

considerados eletrólitos, pois sofrem ionização em água, gerando uma solução condutora de

54 pH = potencial hidrogeniônico que compreende uma escala de 0 a 14 para medir a acidez ou basicidade de

uma solução. Trata-se da concentração molar de [H+] (aq) em solução. De modo geral, materiais que apresentam

pH abaixo de 7 são ácidos, acima de 7 são básicos e pH igual a 7 são neutros. 55 Muito cuidado com as bases, pois são substâncias altamente corrosivas.

Page 137: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

136

corrente elétrica. Da mesma forma, as bases são substâncias que, quando dissolvidas em

água, sofrem dissociação iônica e aumentam a concentração de íons OH- (hidróxido).

A neutralização seria a reação dessas duas espécies iônicas, produzindo água:

H+ (aq) + OH- (aq) = H2O (l)

Para Chagas (1999), a teoria de Arrhenius foi muito importante, pois deu conta de

explicar um grande número de fenômenos já conhecidos e provocou o desenvolvimento de

várias linhas de pesquisa, contribuindo em termos expressivos para estabelecer as bases

científicas da química analítica. Alguns exemplos:

[...] aplicação de lei de ação das massas a equilíbrios iônicos e obtenção da lei de

Ostwald (Ostwald, 1887); a equação de Nernst (Nernst, 1888-1889), que relaciona a

força eletromotriz das pilhas com a concentração de íons; o efeito tampão (Fernback,

1900), o primeiro estudo quantitativo de um indicador (Friedenthal, 1904); o

conceito de pH (Sɵrensen, 1909), etc (p.28).

Santos e Mól (2010) expressam que a teoria de Arrhenius para o comportamento de

ácidos e bases foi muito criticada como é comum nas Ciências, sendo que uma das críticas foi

sobre a natureza do próton em solução aquosa, pois não é correto imaginar ionização de

ácidos produzindo prótons livres. Então, se propôs que esses prótons se ligariam a molécula

de água, por meio de ligação coordenada, formando o cátion hidrônio (H3O+). Outra crítica

está relacionada com substâncias que não contêm hidroxila e são bases, por exemplo, a

substância amônia, que age como base de Arrhenius, mas suas moléculas não têm hidroxila.

Nesse caso, é possível entender a razão se imaginar que a reação ocorra em etapas da seguinte

forma:

NH3(aq) + H2O (l) NH4OH(aq)

O hidróxido de amônio NH4OH(aq), por sua vez irá se ionizar:

NH4OH (aq) NH4+(aq) + OH-(aq)

Assim, pode-se representar a reação global da seguinte maneira:

NH3(aq) + H2O (l) NH4+(aq) + OH-(aq)

A despeito de todos os avanços proporcionados pela teoria de Arrhenius, desde o

início a sua teoria mostrou-se restrita à água, sendo que alguns casos foram possíveis estendê-

la a outros solventes, mas em sistemas sólidos não havia possibilidade de aplicá-la. Nesse

sentido, nos dias atuais existem outras teorias que definem ácidos e bases, considerando

outros fatores, como as teorias de Brɵnsted-Lowry e a de Lewis já referenciadas.

Page 138: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

137

Episódios de Aula sobre Ácidos e Bases

Os episódios de aula do Ensino Médio sobre ácidos e bases também se deram com a

dinâmica da realização do grupo focal entre as professoras colaboradoras: Curie, Mayer,

Franklin e Meitner e, posteriormente, foi aplicado um questionário com perguntas

específicas sobre a temática, com objetivo de suplementar as narrativas do grupo focal. Após

os episódios de aulas sobre modelos atômicos, foi dada continuidade ao diálogo e lançada a

seguinte indagação: Conte-me episódios ou situações de uma aula que você tenha vivido

sobre Ácidos e Bases de Arrhenius na Educação Básica, como ocorreu o planejamento, a

introdução, a definição de cada modelo, o desenvolvimento e a avaliação desses conceitos e, a

partir daí, o diálogo continuou a fluir.

Nesta subseção apresento o texto de pesquisa com as narrativas de todas as

colaboradoras, pois em suas narrativas há muitas convergências de como desempenham no

contexto da prática as suas aulas sobre ácidos e bases de Arrhenius. As professoras Mayer,

Franklin e Meitner expressaram que iniciam suas aulas com a temática de ácidos e bases na

perspectiva empírica, através de atividades experimentais que possam identificar diversas

substâncias como sendo ácidas ou básicas.

A seguir os registros:

Mayer: Eu apresento as funções inorgânicas: ácidos, bases, sais e óxidos. Daí eu

começo pelo sabor, quando eu falo em ácido o que te lembra? Ai eles respondem:

Ah! Professora é muito azedo. Ai eu vou listando no quadro a laranja, o limão. E a

base? Eu falo para os alunos: alguém já comeu banana verde? Como fica a boca?

Aí, eu falo que a base tem sabor adstringente que amarra a boca e cito o exemplo

do leite de magnésio. Eu faço a identificação de substâncias ácidas e básicas com o

extrato de repolho roxo, eu preparo a solução, mostro a escala de pH para os

alunos e com copinhos plásticos de cafezinho. Eu coloco a solução de extrato de

repolho roxo e vamos testando pela coloração quais substâncias são ácidas ou

básicas. A gente testa shampoo, água sanitária, detergente, vinagre, o sumo da

laranja e do limão e pela coloração vamos identificando qual substância é ácida e

qual substância é básica.

Franklin: Quando a gente chega a ácidos e bases a gente já está lá no final do

terceiro bimestre, iniciando o quarto bimestre, então quando eu trabalho com

ácidos e bases eu falo dos sabores, ácido tem o sabor azedo, base é adstringente, ai

você vai falar do caju, da banana verde, do limão. Eu sempre faço aquela aulinha

prática do repolho roxo, que você consegue identificar uma substância ácida e uma

substância básica porque nem toda substância você não pode colocar na boca,

então você precisa de outros métodos, de outros meios para conseguir identificar.

Eu sempre faço a aulinha do repolho roxo, a gente pega sabonete, detergente, e

outros materiais para identificar.

Page 139: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

138

Meitner: A aula sobre ácidos e bases eu fiz foi no laboratório utilizando o repolho

roxo, mas eu já tinha preparado em casa e então, eu levei esse preparo do repolho

roxo em tubos de ensaio. Eles foram adicionando coisas do dia a dia, shampoos,

sucos, então de acordo com a visualização da coloração eles puderam identificar

uma substância ácida ou uma substância básica. Eu coloquei no quadro a

construção de uma tabela identificando as substâncias e as suas colorações,

identificando se ela era ácida ou básica. Mas a princípio foi uma aula experimental,

porque eu acredito que às vezes a gente pode trabalhar com o experimento antes

mesmo de trabalhar com os conceitos teóricos.

É importante destacar que a identificação de substâncias com caráter ácido ou básico,

na época do PIBID, era atividade comum em realizar a atividade da extração da solução do

repolho roxo como indicador ácido-base, e com a solução era misturada uma determinada

substância que se queria identificar e, de acordo com a coloração da mistura, se podia

identificar como ácido ou básico pela a escala de coloração e pH do indicador do extrato do

repolho roxo. Pode-se identificar que essa prática, que era feita no PIBID, hoje em dia no

contexto profissional tem sido executada da mesma forma, mas sem problematizar como foi

possível perceber em suas narrativas. Dessa forma, como afirma Bachelard (1996), o

empirismo que não é racionalizado, não se constitui em conhecimento científico.

Já a professora Curie expressa que inicia suas aulas com a definição do que são

eletrólitos, para depois entrar com as definições de ácidos e bases de Arrhenius, reforçando

que sua aula com essa temática é bem teórica, e a mesma utiliza em seu PCKC exercícios,

simulações, pesquisas e a mesma experimentação com o indicador ácido-base do extrato de

repolho roxo.

Curie: A aula sobre ácidos e bases eu começo trabalhando com a diferenciação de

eletrólitos e não eletrólitos, depois com a definição do ácido e base de Arrhenius.

No início ela é bem teórica mesmo. Para essas aulas eu utilizo exercícios,

simulados, pesquisas e experimentação ilustrativa com a mudança de cor de um

indicador.

As professoras Mayer, Franklin e Meitner, ao narrarem suas aulas com essa

temática, ficaram somente no campo fenomenológico e as mesmas tentaram partir dos

conhecimentos prévios de seus educandos, ao tentar diferenciar com materiais do dia a dia

quais substâncias são ácidas ou básicas. Curie ficou somente no campo teórico e

fenomenológico, mas em nenhuma narrativa pude encontrar evidências de que suas aulas

levassem seus educandos a fazer a ruptura necessária do senso comum com o saber científico.

No grupo focal, ao trabalhar com esse tema, como as professoras ficaram muito no

campo empírico sem trazer as definições teóricas dos modelos de ácidos e bases de Arrhenius

Page 140: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

139

comecei a indagar: Como você define para seus estudantes o que é um ácido ou uma base de

Arrhenius?

Feita essa indagação, pois um dos assuntos que os obstáculos substancialistas mais

encontram abrigo é a teoria de ácido-base ou, como se referem os livros didáticos, o

desenvolvimento das funções inorgânicas. Para Bachelard (1996), o obstáculo substancialista

ocorre quando:

A substancialização de uma qualidade imediata percebida numa intuição direta pode

entravar os futuros progressos do pensamento científico tanto quanto a afirmação de

uma qualidade oculta ou íntima, pois tal substancialização permite uma explicação

breve e peremptória. Falta-lhe o percurso teórico que obriga o espírito científico a

criticar a sensação. [...] O espírito científico não pode satisfazer-se apenas com ligar

os elementos descritivos de um fenômeno a uma respectiva substância, sem nenhum

esforço de hierarquia, sem determinação precisa e detalhada das relações com outros

objetos (p. 127).

De acordo com Lopes (2007), a presença do substancialismo se expressa na

racionalização mal feita, capaz de considerar as propriedades ácidas e básicas como

intrínsecas ao próton H+ e à hidroxila OH-, encerrados na molécula ou no agregado iônico. Eis

algumas falas das colaboradoras:

Curie: Ácidos eu defino que são substâncias que quando dissolvidas em água

aumentam a concentração dos íons H+ em água e mostro as suas representações

químicas. Bases eu defino que são substâncias que quando dissolvidas em água

aumentam a concentração de íons OH-.

Mayer: Ácidos são substâncias que liberam íons H+ quando dissolvidas em água e

base são substâncias que liberam íons OH- quando dissolvidas em água.

Franklin: Ácidos são substâncias que produzem íons H+ quando dissolvidas em

água e base são substâncias que produzem íons OH- quando dissolvidas em água.

Meitner: Ácidos são substâncias que liberam íons H+ quando dissolvidas em água e

base são substâncias que liberam íons OH- quando dissolvidas em água.

A professora Curie faz a definição de ácidos e bases de Arrhenius de forma correta,

e as professoras Mayer, Franklin e Meitner expressam em suas narrativas erros muitos

comuns que são encontrados em livros didáticos do Ensino Médio com o termo liberar e

produzir, indicando um obstáculo substancialista. A definição de Arrhenius não traz os termos

liberar e produzir determinados íons, mas sim aumentar a concentração do determinado íon

em questão.

Page 141: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

140

Com a passagem pelo grupo focal foi possível perceber que se poderia explorar mais

essa temática com as colaboradoras. Assim, foi aplicado um questionário posteriormente,

visando suplementar as discussões que foram feitas no grupo focal.

As duas primeiras indagações são bastante objetivas e as respostas pretendidas eram

sim ou não e essas duas indagações foram pensadas na intenção de garantir que as professoras

colaboradoras que as respondessem corretamente saberiam em que se basear. Dessa forma,

elas poderiam se preocupar apenas com os fenômenos e não ter que lembrar o que diz a

definição. Contudo, abaixo das questões havia espaço para as devidas justificativas se elas

achassem necessário.

Alerto que a definição de Arrhenius não menciona a necessidade de ácidos terem

hidrogênio e bases terem hidroxila, como explicitado na subseção de ácidos e bases de

Arrhenius. Considero, novamente, a definição: os ácidos são substâncias que, quando

dissolvidas em água, aumentam a concentração de íons H+, portanto, são considerados

eletrólitos, pois sofrem ionização em água, gerando uma solução condutora de corrente

elétrica. Da mesma forma, as bases são substâncias que quando dissolvidas em água, sofrem

dissociação iônica e aumentam a concentração de íons OH- (hidróxido).

Na sequência, segue a primeira indagação: A) Ao reagir com a água, uma

determinada substância causa o aumento da concentração de íons H3O+ no meio (ácido

de Arrhenius). Essa substância deve ter hidrogênio (H) em sua fórmula?

Curie: Sim, é necessária a presença do Hidrogênio.

Mayer: Não, o aumento na concentração de H+ se dá devido à constante de

dissociação.

Franklin: Não, a teoria fala que libera, mas, não necessariamente a substancia

tenha hidrogênio.

Meitner: Não.

A segunda indagação foi expressa da seguinte maneira: B) Ao reagir com a água,

uma determinada substância causa o aumento da concentração de íons OH-no meio

(base de Arrhenius). Essa substância deve ter hidroxila (OH) em sua fórmula?

Curie: Sim, é necessária a presença da hidroxila.

Mayer: Não, o aumento na concentração de OH- se dá devido à constante de

dissociação.

Franklin: Não, pelo mesmo motivo, porém agora voltado para hidroxila.

Meitner: Não.

Dessas duas primeiras indagações, entendo que as professoras Mayer, Franklin e

Meitner expressam ter clareza sobre a definição do modelo de ácidos e bases de Arrhenius e

Page 142: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

141

o erro demonstrado pela professora Curie expressa um erro clássico frequente em salas de

aula e em livros didáticos do Ensino Médio e Ensino Superior, ao expressar a ideia de que o

hidrogênio deva fazer parte da própria substância causadora do aumento de concentração de

H+ para os ácidos e a hidroxila fazer parte da própria substância causadora do aumento de

concentração de OH-. Nessa situação, vejo que a amônia, por exemplo, não possui hidroxila

na constituição de sua molécula e comporta-se como base. Alerto que:

NH3(aq) + H2O(l) NH4OH(aq)

O hidróxido de amônio NH4OH(aq), por sua vez irá se ionizar:

NH4OH(aq) NH4+(aq) + OH-(aq)

Assim, pode-se representar a reação global da seguinte maneira:

NH3(aq) + H2O(l) NH4+(aq) + OH-(aq)

A terceira indagação trata de outro erro muito comum, em salas de aula do Ensino

Médio e diz respeito à ideia de que o sal é o produto de neutralização da reação de um ácido

com uma base, mesmo se tratando de reações em soluções aquosas. Essa indagação foi

expressa da seguinte forma: C) Qual o produto da neutralização entre soluções aquosas de

mesma molaridade de ácido clorídrico, HCl e de hidróxido de sódio, NaOH?

Curie: Água e Sal.

Mayer: Duas substâncias fortes apresentarão como produto da reação a água.

Franklin: H+ (aq) + Cl- (aq) + Na+ (aq) + HO- (aq)↔ H2O (l).

Meitner: NaCl e H2O.

Pude constatar que as professoras Curie e Meitner reproduzem o erro comum

encontrados nos livros didáticos e as professoras Mayer e Franklin demonstram domínio do

conceito nessa situação. Para essa indagação, de acordo com o formalismo das equações

químicas, em se tratando de dois eletrólitos fortes como HCl(aq) e NaOH(aq), pode-se

cancelar o que há de igual nos dois lados da equação, dessa forma, o professor no Ensino

Médio pode chamar a atenção para a dissociação do HCl(aq) e NaOH(aq), quando as soluções

forem diluídas, sendo assim a reação de neutralização desses eletrólitos pode ser expressa do

seguinte modo:

H+ (aq) + Cl- (aq) + Na+ (aq) + HO- (aq) ↔ Na+ (aq) + Cl- (aq) + H2O (l)

Page 143: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

142

Nessa equação é possível cancelar os íons de sódio e cloreto, o que leva a concluir

que o único produto da reação de neutralização como definiu Arrhenius de um ácido forte

com uma base forte é a água. E o sal? Se removermos a água, serão obtidos cristais de cloreto

de sódio, que não é produto de nenhuma reação química, mas de um processo de evaporação

do solvente, uma vez que os íons de sódio e cloreto já estavam presentes na solução.

A última indagação sobre essa temática também foi realizada de forma direta e o

ideal é que todas as professoras colaboradoras respondessem que NH4Cl(S) e Al2(SO4)3(S), são

ácidos de Arrhenius, pois aumentam a concentração de H+ em solução aquosa e KCN(S) e

CaO(S), são bases de Arrhenius, pois aumentam a concentração de HO- em solução aquosa.

Segue como a indagação foi expressa e as respostas das professoras colaboradoras: D)

Considere as seguintes reações abaixo, e dentre as substâncias NH4Cl(S), KCN(S), CaO(S),

Al2(SO4)3(S), alguma delas pode ser considerada um ácido ou uma base de Arrhenius? Quais?

Justifique.

NH4Cl(S) + H2O(l) NH3(aq) + H3O+

(aq) + Cl-(aq)

KCN(S) + H2O(l) K+

(aq) + HCN(aq) + OH-(aq)

CaO(S) + H2O(l) Ca+2(aq) + 2OH-

(aq)

Al2(SO4)3(S) + 12H2O(l) 2Al(OH)3(S) + 6H3O+

(aq) + 3SO4-2

(aq)

Curie: Bases de Arrhenius: KCN(s) e CaO(s); Ácidos de Arrhenius: NH4Cl(s) e

Al2(SO4)3(S).

Mayer: Sim, o NH4Cl(S), apresenta característica ácida. Já o Al2(SO4)3(S), apresenta

característica básica.

Franklin: NH4Cl(S) ácido, as demais acredito que não se aplica pois se trata de sais

e óxidos.

Meitner: NH4Cl(S) e Al2(SO4)3(S), são ácidos, porque aumentam a concentração de

H+. KCN(S) e CaO(S), são bases porque aumentam a concentração de OH-.

Para essa última indagação, Curie respondeu de forma exata. Entretanto, não

justificou a sua resposta. Já a professora Mayer respondeu de forma correta que o NH4Cl(S) é

ácido, mas não justificou o porquê e respondeu de forma equivocada que Al2(SO4)3(S)

apresenta características básicas, pois em sua reação com água se viu que essa substância

aumenta a concentração de íons H3O+

(aq), portanto, se comporta como ácido. A professora

Franklin respondeu que o NH4Cl(S) é ácido, mas também não justificou o porquê e as demais

Page 144: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

143

substâncias que KCN(S) e Al2(SO4)3(S) ela justifica que são sais e, realmente, estas são, mas

que ao serem dissolvidos em água aumentam as concentrações dos íons OH- e H3O+

(aq) se

comportando como base e ácido respectivamente. A substância CaO(S) a professora diz ser

óxido e trata-se de um óxido, sim, que ao reagir com água aumenta a concentração dos íons

OH- e se comporta com uma base. E a professora Meitner respondeu com exatidão à

indagação com a devida justificativa.

A temática de ácidos e bases aparentemente parece ser a mais fácil de ser trabalhada

no Ensino Médio, tanto é que foi expresso pelas colaboradoras como um dos conceitos, com o

qual elas mais gostam de trabalhar. Todavia, observei que, em certas situações, as professoras

têm o pleno domínio de como aplicar o conceito de ácido e base de Arrhenius e, em outras

situações, acabam se confundindo. Esta realidade evidencia que, para além de uma atenção

maior ao trabalhar com esses conceitos no Ensino Médio, temos que ter uma constante

vigilância epistemológica para analisar muito bem os livros didáticos com os quais

trabalhamos, para evitar que sejam reproduzidos possíveis erros conceituais e obstáculos

epistemológicos que esses livros geralmente trazem.

Ao responder a indagação propulsora dessa pesquisa em: Como se configuram e se

expressam saberes científicos e pedagógicos de conteúdos químicos subjacentes à

docência de professores egressos do Programa de Bolsa de Iniciação à Docência em

Química da UFMT, ao relatarem o ensino de Química que realizam na Educação

Básica? Compreendo que os saberes científicos foram expressos com uma carência de

reflexão epistemológica dos conceitos químicos trabalhados e os saberes pedagógicos de

conteúdos químicos se configuraram, muitas vezes, em possíveis obstáculos epistemológicos

para o processo de ensino-aprendizagem em Química na Educação Básica. Sendo assim,

finalizo esta seção acerca de episódios de aula do Ensino Médio com o ensinamento de Morin

(2011) de que o conhecimento científico foi durante muito tempo e, com frequência, ainda

continua sendo concebido como tendo por obrigação dissipar a aparente complexidade dos

fenômenos, a fim de revelar a ordem simples a que elas obedecem. A complexidade em se

trabalhar com o conhecimento científico suporta uma pesada carga semântica, pois traz em

seu seio confusão, incerteza, desordem. Para Morin (2011, p. 5):

É complexo o que não pode se resumir numa palavra-chave, o que não pode ser

reduzido a uma lei nem a uma ideia simples. Em outros termos, o complexo não

pode resumir à palavra complexidade, referir-se a uma lei da complexidade, reduzir-

se à ideia de complexidade.

Page 145: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

144

O pensamento complexo para trabalhar o conhecimento científico aspira ao

conhecimento multidimensional e implica o reconhecimento de um princípio de incompletude

e de incerteza. Dessa forma, conclui-se que os desafios de ensinar não se referem apenas a

Química, esses desafios são sociais e culturais associados ao currículo como um todo.

Especificamente, no que se refere à ciência Química, por exemplo, há uma acentuada marca

empírico-positivista, as inúmeras dificuldades de trabalho com a abstração, a permanência de

uma visão cientificista e a mitificação da prática real da produção do conhecimento científico.

Essas questões, contudo, não se desvinculam da problemática mais ampla referente ao saber

pedagógico de conteúdo químico. Por isso, entendo com Lopes (2007), serem necessários

processos de transformação que atinjam não apenas o conhecimento escolar químico na forma

do saber pedagógico de conteúdo químico, mas também as práticas curriculares e científicas.

Pode-se observar com os episódios de aulas das professoras colaboradoras que a

linguagem se torna fundamental, pois tanto ela pode ser instrumento para a discussão racional

de conceitos altamente matematizados, como pode veicular metáforas realistas, pretensamente

didáticas, que obstaculizam o conhecimento científico.

Compreendo que não será mantendo o educando preso ao conhecimento aparente do

cotidiano, ao realismo das primeiras interpretações, que será possível ensinar Química.

Defendo ser importante o duplo e desafiador trabalho de valorizar os conhecimentos prévios

do estudante e questioná-los, desconstruindo, dessa forma, os obstáculos epistemológicos, que

impedem o aprendizado.

Chegando ao final e, ao mesmo tempo, ao início de uma nova jornada acadêmica,

apresento a seguir o fechamento deste texto de tese, expressando considerações provisórias

acerca da pesquisa realizada.

Page 146: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

145

CONSIDERAÇÕES PROVISÓRIAS

É pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem é que se pode melhorar a

próxima prática (Paulo Freire).

Nesta última parte da tese, ao invés de chamar de considerações ou apontamentos

finais e/ou conclusivos, chamo de considerações provisórias, pois compreendo com Barth

(1993) que o saber é sempre provisório, não tem fim. O saber não é linear, não se constrói

como um prédio, em que se deve, necessariamente, começar pela base e acabar pelo teto. O

saber elabora-se segundo uma ordem pessoal e segundo a experiência de cada um. Nesses

termos é que compreendo a realidade investigada de saberes químicos das professoras

colaboradoras e sentida nos vários momentos de interação pessoal e social estabelecidos no

percurso investigativo. Quero, com isso, expressar, que a realidade que aqui foi observada

existe no tempo, como uma paragem, uma etapa e que as considerações tecidas são para esse

determinado tempo. Todavia, essa realidade de formação e desenvolvimento profissional pode

se modificar, pois a formação, seja inicial ou continuada, está em constante transformação, em

perpétuo movimento, tal como uma sinfonia inacabada.

Na tessitura do enredo desta tese eu fui fazendo reflexões do processo formativo

inicial de professores de Química na UFMT, sobre as bases de conhecimentos necessários

para a atuação profissional, das trajetórias de formação inicial e continuada das professoras

colaboradoras desta pesquisa, até chegar ao contexto da prática dessas professoras. Já para

essas considerações, farei o inverso. Começarei com as reflexões do contexto da prática aos

processos formativos.

Os momentos das entrevistas e da realização do grupo focal foram momentos de

grande importância, pois juntamente com as professoras colaboradoras tive boas interações e

paramos em um momento para nos (auto) avaliar e refletir sobre o que estamos fazendo em

nossas práticas no dia a dia. No primeiro momento, podíamos até não ter dado conta das

visões pedagógicas distorcidas, dos obstáculos epistemológicos ao trabalhar com os conceitos

químicos, mas tínhamos a sensação de que algo não estava bem.

A necessária renovação do Ensino de Ciências, documentada por pesquisadores, em

trabalhos de mestrados e doutorados, serve como um emblema de alerta de que algo não está

no caminho correto, e o ensino de Química não é uma exceção, fortalecendo a grande

necessidade de transformar a educação que está posta. Dessa forma, de acordo com Soares

(2012), leituras negativas são inevitáveis, uma vez que elas, geralmente, servem para (auto)

Page 147: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

146

justificar e para tirar de nossos ombros a culpabilidade. Mesmo que inconscientemente,

estamos, uma vez ou outra, lançando mão de uma leitura negativa, seja da falta, da carência,

da ausência, da inexistência, ou da impossibilidade.

Dentre as várias possibilidades de leituras da realidade, justifico e sou até capaz de

manifestar desejo de continuar na chamada zona de conforto, lendo e discursando sobre o

cotidiano, sem nenhuma perspectiva de consciência crítica. Nesta perspectiva, que pode se

reproduzir no coletivo, somos frutos do conformismo e do condicionamento muito distante do

que diz Freire (2013) com a pedagogia da autonomia.

Autores como Lopes (2007) dedicaram estudos sobre os obstáculos epistemológicos

em livros didáticos de Química, baseados na epistemologia de Bachelard, que são entendidos

como entraves à aprendizagem dos estudantes. Essa pesquisadora procurou identificar a

existência desses obstáculos nos livros didáticos de Química. Contudo, no desenvolvimento

desse trabalho de tese identifico nas narrativas das colaboradoras, obstáculos epistemológicos

subjacentes em seus discursos na mediação didática dos conceitos de modelos atômicos e

ácidos e bases de Arrhenius. Como se trata de uma análise complexa, as professoras talvez

possam estar reproduzindo obstáculos epistemológicos expressos nos livros didáticos, tendo

em vista, que o livro didático é um instrumento configurador da prática pedagógica dessas

professoras, evidenciando, assim, a necessidade de uma reflexão e vigilância epistemológica

ao se trabalhar com os conceitos químicos.

Pesquisas na área de Educação Química já apontam que não se trata somente em

modernizar o livro didático, mas de promover uma reforma criteriosa em seu conteúdo e nas

ementas dos cursos, do nível médio ao Ensino Superior. Dessa forma, vigilância

epistemológica por parte dos professores de Química se faz urgente e necessária ao selecionar

livros didáticos e trabalhar com os conceitos de Química para evitar supostos obstáculos

epistemológicos no processo de ensino-aprendizagem de Química.

Nos episódios de aulas do Ensino Médio de nossas colaboradoras, a falta de reflexão

epistemológica ao trabalhar com os conceitos que foram propostos evidencia o retrato de um

ensino com as seguintes dimensões: descontextualizado, aproblemático, ahistórico,

acumulativo, que para Gil-Pérez et al. (2005) são concepções docentes sobre a natureza da

ciência e construção do conhecimento científico, fruto do senso comum devido à falta de

reflexão crítica e a uma educação científica que se limita, a uma simples transmissão de

conhecimentos já elaborados.

No contexto da prática profissional das colaboradoras ficou evidente, também, a

presença de divergentes orientações didáticas resultantes de diferentes concepções de

Page 148: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

147

educação escolar, que permeiam o pensamento dessas professoras. Tal fato mostra um

indicativo de que essas colaboradoras precisam aprofundar suas reflexões sobre a visão do

processo de ensino-aprendizagem em Química, bem como suas crenças e suas concepções.

Assim, compreendo que a racionalidade técnica está subjacente à formação e à docência

dessas professoras, em relação aos aspectos teórico-metodológicos de formação e, por

conseguinte de desenvolvimento profissional pautado no enfoque que se pode denominar

como híbrido, de caráter da transmissão cultural dos conteúdos ao construtivismo.

Parto da premissa de que a prática pedagógica das professoras colaboradoras, por elas

relatadas no processo investigativo desta pesquisa, proporcionada por uma pesquisa

formalizada é capaz de revelar não apenas as necessidades formativas, relacionais e

profissionais, mas também e, principalmente, os limites e desafios que a universidade enfrenta

para formar e capacitar professores para lidarem com o cotidiano escolar.

As professoras colaboradoras desta pesquisa, assim como eu, que tive oportunidade de

trabalhar com elas, como professor formador e pesquisador, passamos por uma época de

formação docente de transição entre o paradigma da ciência moderna marcada fortemente

pelo positivismo para uma época, em que Santos (1989) denomina de paradigma da ciência

pós-moderna. Essa transição paradigmática para o referido autor, com a qual concordo,

consiste em um ambiente de incerteza, de complexidade e de caos, repercutindo nas estruturas

e nas práticas sociais, nas ideologias, nas instituições, na vida vivida e na personalidade.

Quero com isso expressar que compreendo não haver vítimas e culpados nesse

processo de formação, mas frutos de uma formação marcada pela racionalidade técnica, em

que é valorizado o conhecimento teórico da área específica, sem levar em consideração as

reflexões filosóficas e epistemológicas do processo de formação e da construção do

conhecimento científico, aqui nesse caso, o conhecimento químico.

E o PIBID? No que contribuiu na formação das professoras colaboradoras e está

contribuindo na formação de novos licenciandos? Vários benefícios podem ser observados a

partir da implementação do PIBID na UFMT, dentre os quais expresso a inserção dos

egressos do PIBID em programas de pós-graduação e no exercício da profissão docente e a

visível melhora na autoestima dos licenciandos da UFMT como futuros professores do Ensino

Médio, o que demonstra o potencial de tal iniciativa para o desenvolvimento das licenciaturas,

pois foi criado um clima de valorização dos estudantes de licenciatura e, muitas vezes, são

considerados como o PIBIC das licenciaturas.

No caso específico de nossas colaboradoras terem participado do PIBID foi

essencial, pois as professoras narram que esse programa lhes proporcionou pertencimento

Page 149: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

148

como professoras, uma vez que na época, em que elas entravam em sala de aula como

pibidianas eram chamadas de “professoras” por estudantes do Ensino Médio e ficavam todas

felizes. E por meio das atividades desse programa, duas professoras, Curie e Mayer tiveram

possibilidades de ingressar na Pós-Graduação na UFMT em Educação em Ciências sendo

Curie no Mestrado acadêmico e Mayer no Mestrado Profissional.

E o que se pode fazer para mudar esse quadro de formação inicial e continuada de

professores de Química na UFMT? Com o trabalho que foi desenvolvido é possível tecer

alguns indicativos de possibilidades para mudança dessa realidade de formação, e eu terei o

compromisso político e ético de fazer esses indicativos ecoarem no colegiado de curso de

Licenciatura em Química e Departamento de Química da UFMT para juntos, no coletivo de

professores, as forças serem reunidas para mudar essa realidade. Pois o trabalho em equipe na

educação se revela importante, porque quando as decisões são tomadas em conjunto,

desfavorece, de certa forma, as resistências às mudanças e todos passam a ser corresponsáveis

e copartícipes no processo de formação.

Ao tecer considerações sobre a formação de professores de Química não só da UFMT,

mas em nível nacional, é fundamental não esquecer as reais condições da educação brasileira,

pois são vários os fatores externos ao processo pedagógico, que vem prejudicando a formação

inicial e continuada de professores do país, a exemplo do aviltamento salarial dos professores

e precariedade da infraestrutura escolar em várias escolas (MALDANER, 2006).

No que se refere aos modelos de formação docente, a grande maioria dos cursos de

Licenciatura em Química do Brasil não superaram o modelo chamado 3+1, portanto, percebe-

se que esse problema não é somente local da UFMT, mas um problema de âmbito nacional.

Pois vários pesquisadores da área de Educação Química como (ZUCCO, 1999; MALDANER,

2006; CHASSOT, 2014) apontavam a relevância da prática pedagógica na formação inicial de

professores de Química mostrando que uma das principais críticas ao currículo dos cursos de

Licenciatura em Química era frouxa articulação entre conhecimentos específicos e os

conhecimentos pedagógicos, bem como a universidade e escola da Educação Básica.

Na seção III da presente tese, apresentei o contexto de formação do curso de

Licenciatura em Química56 da estrutura curricular que ficou vigente de 1997/1 a 2009/2, do

qual eu e as colaboradoras desta pesquisa fomos licenciados, e foi mencionado que a

racionalidade técnica está subjacente à formação das colaboradoras dessa pesquisa, e uma

56 Atualmente a UFMT oferta o curso de Licenciatura em Química em três campi, a saber: Barra do Garças,

Cuiabá e Sinop. Toda a consideração mencionada do curso de Licenciatura em Química nesta seção trata-se do

campus de Cuiabá.

Page 150: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

149

primeira proposta como professor formador e pesquisador da área de Educação em Ciências e

Química que eu poderia delinear é o rompimento com essa estrutura curricular de formação,

contudo, isso já se efetivou no ano de 2009 com a reestruturação curricular do curso, que

entrou em vigência em 2010/1. Efetivou-se no contexto curricular, pois no contexto da prática

a formação do curso continua nos moldes do formato 3+1.

Vale destacar que desde a instituição pelo Conselho Nacional de Educação (CNE)

das Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) para a Formação de Professores da Educação

Básica, em nível superior, curso de licenciatura, de graduação plena, promulgado em

fevereiro de 2002, que o curso de Licenciatura em Química da UFMT discutia com a

comunidade acadêmica (professores, técnicos e alunos) a reestruturação curricular do curso,

mas nunca entravam em um consenso na reestruturação em virtude das Práticas como

Componente Curricular (PCC), bem como, em desencontro de opiniões sobre as 400 horas de

estágio supervisionado. E romper com o modelo de formação 3+1, não foi (e posso afirmar

como professor formador desse curso que até nos dias atuais não está sendo) fácil.

Um fato que ilustra bem isso foi a reestruturação curricular do curso ter sido

adequada às novas DCN somente após sete anos de sua promulgação, quando em janeiro de

2009 o curso de Licenciatura em Química recebeu diligência do MEC instaurada no processo

de “Renovação de Reconhecimento”. Contudo, no ano de 2015 o curso de Licenciatura em

Química foi laureado com o conceito de excelência com a nota cinco (5,0) no indicador de

qualidade que avalia os cursos superiores via o Conceito Preliminar de Curso (CPC) proposto

pelo INEP, pela participação dos nossos egressos no Exame Nacional de Desempenho de

Estudantes (ENADE) no ano letivo de 2014. Esse indicativo evidencia que o saber científico

está bem consolidado, mas eu me pergunto: e o saber pedagógico de conteúdo? E as reflexões

epistemológicas da construção dos conceitos químicos?

Na nova estrutura curricular do curso de Licenciatura em Química foi idealizado o

contato com a prática docente desde os primeiros momentos do curso de formação, pois

partiram da compreensão da importância de todas as disciplinas terem vínculo com a

educação, pois ao mesmo tempo, em que contribuem para a formação relativa ao

conhecimento químico, terão seu foco em como esse conhecimento químico entra, interage e

funciona na escola fundamental e média e em situações de educação não escolar. Em outros

termos, as disciplinas de Instrumentação para o Ensino de Química (Prática de Ensino) e

Estágio Supervisionado, assim como a Didática, não podem ser isoladamente

responsabilizadas pela qualificação profissional do licenciando em Química. Dessa forma,

viu-se que certa quantidade de horas de PCC é destinada às disciplinas de Química Inorgânica

Page 151: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

150

I, Química Orgânica I, Química Analítica Qualitativa, Bioquímica I, Toxicologia e Físico-

Química IV.

No entanto, no período dos anos de novembro de 2012 a novembro de 2014 tive a

oportunidade de exercer a função de coordenador de ensino de graduação e foi possível

constatar, com base nos planejamentos de ensinos dessas disciplinas e relatos dos estudantes

de licenciatura, que as horas destinadas as PCC dentro das disciplinas de Química Inorgânica

I, Orgânica I, Analítica Qualitativa, Toxocologia e Físico-Química IV são ocupadas com

atividades experimentais de laboratório ou complementação do componente teórico da

disciplina e não se efetivavam da forma que eram para serem trabalhadas, sendo a mediação

dos saberes científicos aos saberes pedagógicos de conteúdo, com uma devida reflexão

epistemológica da construção dos conhecimentos químicos, pois os professores dessas

disciplinas de referência da Química não possuem nenhuma formação pedagógica e conhecem

a realidade da Educação Básica só de forma ambiental.

Neste viés, parece-me urgente a necessidade de serem desenvolvidas ações e

programas de formação continuada de formadores, com a presença conjunta de professores

universitários de Química e que atuam em cursos de licenciatura e a de pesquisadores da área

de Educação Química. Uma formação continuada de professores das disciplinas de Química

de referência, que atuam no curso de licenciatura, com interação direta com os professores da

área de ensino se faz necessário e urgente para introduzir os nossos colegas químicos na

investigação do/no Ensino de Química e auxiliando-os em proposições de melhorias à

formação e atuação docente.

Na UFMT, por exemplo, no campus de Cuiabá nos anos de 2012 a 2016 entraram via

concurso público cerca de quinze novos doutores em Química nas mais diferentes áreas

(Analítica, Bioquímica, Inorgânica, Físico-Química e Orgânica), para atuarem diretamente em

cursos de Licenciatura e Bacharelado em Química. São professores jovens, cheios de vida e,

principalmente, ansiosos por desenvolver carreira acadêmica. Esses professores realizaram

seus Mestrados e Doutorados em grandes universidades brasileiras, tornaram-se grandes

estudiosos em investigações químicas tão específicas que se distanciaram, sobremaneira, após

seus anos na Pós-Graduação, de preocupações com questões epistemológicas e pedagógicas

relacionadas à formação de professores de Química, quando não, nunca tiveram experiências

como professores de Química na Educação Básica e hoje estão assumindo disciplinas para

trabalhar em curso de formação de professores de Química para a Educação Básica.

Esses professores doutores novos que ingressaram na UFMT e os professores

doutores que já faziam parte do quadro docente do curso de Licenciatura em Química

Page 152: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

151

precisam se constituir como formadores, devido à própria função social para qual foram

aprovados em concurso público na universidade. A necessidade de ações e programas de

formação continuada de formadores de Química, na visão de Schnetzler (2010) precisa ser

uma tarefa política assumida pela Sociedade Brasileira de Química, com a participação e

contribuição dos membros da sua Divisão de Ensino.

Reforço que é importante que a discussão sobre formação docente não fique restrita

aos pequenos círculos dos professores da área de Educação Química, mas que sejam

incorporadas as discussões mais amplas que acontecem em todas as áreas da Química dentro

do Departamento de Química da UFMT.

No ano de 2016, o curso de Licenciatura em Química está em um processo de novas

discussões para o que estão chamando de “Adequações Curriculares” que prevê adequação na

estrutura curricular do curso para atender as novas DCN57 para a formação inicial em nível

superior (cursos de licenciatura, cursos de formação pedagógica para graduados e cursos de

segunda licenciatura) que foi promulgada em julho de 2015, e para atender a Base Nacional

Comum Curricular, e as divergências das horas de PCC que não são trabalhadas no curso.

O resultado do trabalho desta pesquisa de doutoramento chega em uma hora

oportuna, em que discussões e reflexões estão fazendo parte do contexto de formação de

professores de Química da UFMT, pois este trabalho de tese faz refletir que discutir formação

de professores é uma tarefa que vai além da modificação da organização curricular no

esquema 3+1, com a introdução de disciplinas pedagógicas logo no começo do curso de

formação, porque isso, por si só, não romperá com a visão simplista do ato de ensinar e com o

racionalismo técnico que caracteriza grande parte da formação dos docentes. Compreende-se

que é preciso discutir e modificar, também, o conteúdo dos conhecimentos químicos

incorporando nesse currículo, estudos sobre a profissionalização do trabalho docente, a

natureza do conhecimento científico, o papel da experimentação no ensino de Ciências, o

papel da ciência e da educação científica na sociedade, em ter a pesquisa como eixo

articulador da formação e da prática, os fundamentos da elaboração curricular, uma

reorientação epistemológica da Educação em Química. Maldaner (2006) diz que essas

questões já fazem parte das pesquisas acadêmicas há mais de vinte anos, entretanto, não

foram até hoje incorporadas ao cotidiano da formação docente.

57 Resolução CNE/CP nº 2/2015. O artigo 22 da referida Resolução expressa que “os cursos de formação de

professores que se encontram em funcionamento deverão se adaptar a esta Resolução no prazo de dois anos, a

contar da data de sua publicação”. Essa Resolução considera que deve constar a articulação entre a graduação e

pós-graduação e entre pesquisa e extensão como princípio pedagógico essencial ao exercício e aprimoramento

do profissional do magistério e da sua prática educativa.

Page 153: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

152

Vários outros aspectos podem e necessitam ser considerados na formação do

professor de Química. Os conhecimentos apontados por Shulman (1986) como necessários à

formação do professor são um exemplo do esforço intelectual que o docente tem de fazer na

compreensão de um corpo de conhecimentos necessários à prática pedagógica. Entendo que

esses conhecimentos têm de ser abordados na formação inicial. Por isso, o rompimento com o

modelo de formação que prioriza a teoria em detrimento da prática não pode significar um

currículo de supervalorização da prática em detrimento da formação teórica, mas sim uma

abordagem dialética desses modelos na formação do profissional.

Essa dialética entre os modelos se faz necessário, pois concordo com Maldaner

(2006) que a prática atual de formação inicial mais frequente de professores é a separação da

formação profissional específica da formação em conteúdo, que cria uma sensação de vazio

na mente do professor, pois é diferente saber conteúdos de Química, por exemplo, em um

contexto de Química, de sabê-los, em um contexto de mediação pedagógica dentro do

conhecimento químico.

Outro indicativo que este trabalho de pesquisa deixa é a possibilidade de criação de

um Núcleo de Pesquisa unindo Formação Inicial e Continuada de Professores de Química

junto ao LabPEQ/UFMT. A proposta de formação desse Núcleo até quatro anos atrás em

2012, por exemplo, era impossível, pois só havia um docente com nível de doutor no quadro

de professores da área de Educação Química e nos dias atuais já temos quatro professores

com nível doutoral. A ideia que fundamenta o Núcleo é a de promover interações

comunicativas tendo a prática pedagógica como objeto de estudo. Fomentar uma nova cultura

escolar com base na problematização da prática educativa será um grande desafio necessário

para a formação inicial e continuada dos professores de Química que atuam na Educação

Básica, pois concorre com o peso da mesmice cotidiana das escolas pobres em discussões

teóricas, e com a visão da racionalidade técnica que formou a todos nós, estudantes,

professores formadores e licenciados, e que está impregnada no tecido das instituições

escolares em todos os níveis.

Diante das narrativas das professoras colaboradoras expressas nos textos de pesquisa,

e o contexto de formação e construção do conhecimento científico expressos nesta pesquisa,

que defendo a tese de que a base de saberes científicos e pedagógicos de conteúdo

necessários ao ensino de Química pode ser catalizada na formação inicial, pela

participação em projetos de iniciação à docência no ambiente escolar desde o início do

curso, o que potencializa a produção de saberes sobre a docência e práticas pedagógicas

diferenciadas com vistas à educação para a cidadania.

Page 154: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

153

Tratam-se de saberes que são elaborados pelo educador químico na escola média, que

possibilitam a compreensão de seus educandos do real significado da Química no cotidiano da

sociedade contemporânea. Para tanto, se faz necessária uma vigilância epistemológica para

tratar os saberes científicos na Educação Básica e na Educação Superior, tanto no contexto da

formação inicial, quanto no contexto da prática profissional, para constituir o entrelaçamento

necessário entre os saberes científicos e pedagógicos de conteúdo, proporcionando a ruptura

necessária entre o saber comum e o saber científico.

Nessa perspectiva, um dos principais pilares para a formação inicial e continuada de

professores, de acordo com Delors (1998), é aprender a conhecer, que é o prazer de

compreender, descobrir, construir e reconstruir o conhecimento, curiosidade, autonomia,

atenção. Delors diz que é inútil tentar conhecer tudo e isso supõe uma cultura geral, o que não

prejudica o domínio de certos assuntos especializados. Aprender a conhecer é mais do que

aprender a aprender. Aprender mais linguagens e metodologias do que conteúdos, pois estes

envelhecem rapidamente. Não basta aprender a conhecer. É preciso aprender a pensar, a

pensar a realidade e não apenas pensar pensamentos, pensar o já dito, o já feito, reproduzir o

pensamento. É preciso pensar também o novo, reinventar o pensar, pensar e reinventar o

futuro analisando e explorando possibilidades.

Percebe-se que a complexidade de ser professor não está somente em ser professor

de Química, mas sim em ser profissional-pessoa e ter a sensibilidade de perceber que o ser

humano está inserido em um mundo complexo, em que a cultura, a razão, o afeto e a vida em

sociedade podem conduzir os diversos caminhos da existência.

Dessa forma, percebo-me no mundo em processo ou no processo. Esta foi, talvez, a

maior recompensa teórica, afetiva, pessoal e profissional adquirida na realização desta minha

passagem na pós-graduação.

Concluo evidenciando a provisoriedade e a continuidade dos processos formativos,

uma vez que a nossa história e formação prossegue, e o crescimento é constante no contínuo

experiencial. Tenho, por otimismo e confiança, que minha história nesta caminhada

acadêmica ainda está longe do fim, pois as opções do meu caminhar acontecem em plenos

processos dialéticos que trarão e levarão pessoas, acrescentando e transformando as

certezas/incertezas que hoje carrego comigo.

Page 155: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

154

REFERÊNCIAS

ALARCÃO, Isabel de (org.). Formação reflexiva de professores: estratégias de supervisão.

Porto, Portugal: Porto Editora, 2005.

ALTET, Marguerite. As Competências do Professor Profissional: entre Conhecimentos,

Esquemas de Ação e Adaptação, Saber Analisar. In: PERRENOUD, Philippe et al. (Orgs).

Formando Professores Profissionais. 2.ed. ver. Porto Alegre: Artmed, 2001, p. 23-35.

________. Memórias de Formação e Docência: Bases para a Pesquisa Narrativa e Biográfica.

In: CHAVES, Sílvia; BRITO, Maria dos Remédios de (Org). Formação e Docência:

Perspectivas da Pesquisa Narrativa e Autobiográfica. 1.ed. Belém: CEJUP, 2011, p. 13-35.

ATKINS, Peter. Princípios de Química: questionando a vida moderna e o meio ambiente.

Tradução: Ricardo Bicca de Alencastro. 3. ed. Porto Alegre: Bookman, 2006.

BACHELARD, Gaston. O Racionalismo Aplicado. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1977.

________. A Filosofia do Não; O Novo Espírito Científico; A Poética do Espaço. Tradução:

Joaquim José Moura Ramos et al. São Paulo: Abril Cultural, 1978.

________. A Formação do Espírito Científico. Tradução: Estela dos Santos Abreu. 1. ed. 10.

reimpressão. Rio de Janeiro: Contraponto, 1996.

BARTH, Britt-Mari. O Saber em Construção para uma Pedagogia da Compreensão.

Portugal: Instituto Piaget, 1993.

BRASIL, Ministério da Educação e Cultura. Orientações Curriculares para o Ensino Médio;

volume 2. Brasília: MEC/SEB, 2008.

BROWN, Theodore L. et al. Química a ciência central. Tradutor: Robson Matos. 9. ed. São

Paulo: Pearson Prentice Hall, 2005.

BROWN, Lawrence S; HOLME, Thomas A. Química Geral Aplicada à Engenharia.

Tradutor: Maria Lúcia Godinho de Oliveira. São Paulo: Cengage Learning, 2009.

CARVALHO, Ana Maria Pessoa; PÉREZ, Daniel Gil-. Formação de Professores de

Ciências. 10. ed. São Paulo: Cortez, 2011.

CHAGAS, Aécio Pereira Chagas. Teorias ácido-base do século XX. Revista Química Nova na

Escola. n.9, p. 28-30, maio 1999.

CHASSOT, Áttico Inácio. Catalisando Transformações na Educação. Ijuí: Ed. UNIJUÍ,

1993.

________. Sobre Prováveis modelos de átomos. Revista Química Nova na Escola. n.3, p. 3,

maio 1996.

________. Para que(m) é útil o ensino?. 3.ed. Ijuí: Ed. Unijuí, 2014.

Page 156: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

155

CHAVES, Sílvia Nogueira. Memórias de formação: Reminiscências de formadores de

professores sobre suas maneiras de ver e ser na docência Revista Amazônia (Banco da

Amazônia). v. 01, p. 87, 2005.

CHROBAK, R. Mapas conceituales y modelos didacticos de profesores de química. In:

Conference on Concept Mapping, 2, Congreso Internacional sobre Mapas Conceptuales, 2,

2006, San José, Costa Rica. Anais eletrônicos. San José: CMC, 2006, Sept. 5 – 8, 2006.

Disponível em: <http://cmc.ihmc.us/cmc2006Papers/cmc2006-p215.pdf> Acesso em:

12/01/2016.

CLANDININ, D. Jean; CONNELLY, F. Michael. Pesquisa Narrativa: experiência e história

em pesquisa qualitativa. Tradução: Grupo de Pesquisa Narrativa e Educação de Professores

IEEL/UFU. Uberlândia: EDUFU, 2011, 250 p.

CONNELLY, F. Michael; CLANDININ, D. Jean. Relatos de experiência e Investigação

Narrativa In: LARROSA, J. (Org). Déjame que te cuente. Ensayos sobre narrativa y

educación. Barcelona: Editorial Laertes, 2008, 238 p.

CUNHA, Emmanuel Ribeiro. Práticas avaliativas bem sucedidas de professoras dos ciclos

de formação da Escola Cabana de Belém. 2003. 257 f. Tese (Doutorado em Educação),

Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2003.

________. Os Saberes Docentes ou Saberes dos Professores. Revista Cocar, Belém, v.1, p.

31-39, 2007.

CUNHA, Maria Isabel da. O Bom Professor e sua Prática. 4.ed. Campinas-SP: Papirus, 1994.

________. CONTE-ME AGORA! As narrativas como alternativas pedagógicas na pesquisa e

no ensino. Revista Faculdade de Educação. n.1/2, v. 23, p. 185-195, 1997.

DELORS, Jacques. Educação: um tesouro a descobrir. São Paulo: Cortez, 1998.

FERNANDEZ, Carmen. Revisitando a Base de Conhecimentos e o Conhecimento

Pedagógico do Conteúdo (PCK) de Professores de Ciências. Revista Ensaio, v. 17, n. 2, 2015,

p. 500-528.

FIORENTINI, Dario et al. Saberes Docentes: Um Desafio para Acadêmicos e Práticos. In:

FIORENTINI, Dario et al. (orgs.). Cartografias do Trabalho Docente. 1.ed. Campinas,SP:

Mercado das Letras, 1998, p. 307-335.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. Saberes Necessários à Prática Educativa. 46.ed.

Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2013.

FRAIA-MARTINS, France. Significação do Ensino de Ciências e Matemática em Processos

de Letramento Científico-Digital. 2014. 189 f. Tese (Doutorado em Educação), Instituto de

Educação Matemática e Científica, Universidade Federal do Pará. Belém, 2014.

FURASTÉ, Pedro Augusto. Normas Técnicas para o Trabalho Científico: Elaboração e

Formatação. Explicitação das Normas da ABNT.15.ed. Porto Alegre: s.n., 2011.

Page 157: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

156

GALIAZZI, Maria do Carmo et al. Objetivos das atividades experimentais no ensino médio: a

pesquisa coletiva como modo de formação de professores de Ciências. Ciência & Educação,

v. 7, n. 2, p. 249-263, 2001.

GALVÃO, Cecília. Narrativas em Educação. Revista Ciência & Educação. n.02, v. 11, p.

327-345, 2005.

GARCÍA PÉREZ, F.F. Los modelos didácticos como instrumento de análisis y de

intervención em la realidad educativa. Revista Electrónica de la Universidad de Barcelona,

Barcelona, n. 207, 2000. Disponível em: <http://www.ub.es/geocrit/b3w-207.htm> Acesso

em: 12/01/2016.

GARCÍA, J. E; PORLÁN, R. Ensino de ciências e prática docente: uma teoria do

conhecimento profissional. Caderno Pedagógico, Lajeado, n. 3, 2000, p. 7-42. Disponível em:

<http://www.univates.br/files/files//univates_novo//editora/arquivos_pdf/caderno_pedagogico

/caderno_pedagogico3/Ensinodecienciasepraticadocente.pdf> Acesso em: 12/01/2016.

GATTI, Bernardete Angelina. Valorização da Docência e Avaliação do Trabalho Docente. In:

GATTI, Bernardete Angelina (Org). O Trabalho Docente, Avaliação, Valorização,

Controvérsias. Campinas-SP: Autores Associados, São Paulo: Fundação Carlos Chagas,

2013.

GAUTHIER, Clermont et al. Por uma teoria da Pedagogia. Pesquisas contemporâneas sobre

o saber docente. 3.ed. Ijuí, RS: Editora Unijuí, 2013.

GIL-PÉREZ, Daniel et al. Superação das visões deformadas da ciência e da tecnologia: Um

requisito essencial para a renovação da educação científica. In: CACHAPUZ, António et al.

(orgs.). A Necessária Renovação do Ensino das Ciências. São Paulo: Cortez, 2005, p. 37-70.

GIORDAN, Marcelo. O papel da experimentação no ensino de ciências. Química Nova na

Escola, n.10, p. 43-49, 1999.

GONÇALVES, Terezinha Valim Oliver. Ensino de Ciências e Matemática e Formação de

Professores: marcas da diferença. 2000. 273 f. Tese (Doutorado em Educação), Faculdade de

Educação, Universidade Estadual de Campinas. Campinas, 2000.

________. A Pesquisa Narrativa e a Formação de Professores: Reflexões sobre uma Prática

Formadora. In: CHAVES, Sílvia; BRITO, Maria dos Remédios de (Org). Formação e

Docência: Perspectivas da Pesquisa Narrativa e Autobiográfica. 1.ed. Belém: CEJUP, 2011,

p. 53-76.

________. Estudos Memorialísticos e Narrativos – 10 anos de pesquisas sobre a formação de

professores de Ciências no Grupo de Estudos e Pesquisas (Trans) Formação. Revista Exitus,

n.01, v. 01, p. 71-80, jul/dez. 2011.

GONÇALVES, Tadeu Oliver. Formação e Desenvolvimento Profissional de Formadores de

Professores: O Caso dos Professores de Matemática da UFPa. 2000. 206 f. Tese (Doutorado

em Educação), Faculdade de Educação, Universidade Estadual de Campinas. Campinas,

2000.

Page 158: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

157

GONÇALVES, Tadeu Oliver; GONÇALVES, Terezinha Valim Oliver. Reflexões Sobre uma

Prática Docente Situada: Buscando Novas Perspectivas Para a Formação de Professores. In:

FIORENTINI, Dario et al. (orgs.). Cartografias do Trabalho Docente. 1.ed. Campinas,SP:

Mercado das Letras, 1998, p. 105-133.

GOODSON, Ivo F. Dar Voz ao Professor: As Histórias de Vida dos Professores e o seu

Desenvolvimento Profissional. In: NÓVOA, Antonio (Org). Vida de Professores. Porto: Porto

Editora, 2007, p. 63-78.

GUIMARÃES, M. A. G.; ECHEVERRÍA A. R. & MORAES J. I. Modelos didáticos no

discurso de professores de Ciencias. Revista Eletrônica de Investigação em Ensino de

Ciências, Porto Alegre, v. 11, n. 3,2006. Disponível em:

http://www.if.ufrgs.br/ienci/artigos/Artigo_ID155/v11_n3_a2006.pdf Acesso em 12/01/2016.

HUBERMAN, Michäel. O Ciclo de Vida Profissional dos Professores. In: NÓVOA, Antonio

(Org). Vida de Professores. Porto: Porto Editora, 2007, p. 31-61.

IMBERNÓN, Francisco. Formação Docente e Profissional. 9. ed. São Paulo: Cortez, 2011.

JAPIASSÚ, Hilton; MARCONDES, Danilo. Dicionário Básico de Filosofia. 4.ed. Rio de

Janeiro: Jorge Zahar, 2006.

JOSSO, Marie-Christine. Experiências de Vida e Formação. São Paulo: Cortez, 2004.

________. A transformação de si a partir da narração de histórias de vida. Revista Educação.

Porto Alegre/RS, ano XXX, n. 3 (63), p. 413-438, dezembro 2007.

________. O caminhar para si: Uma perspectiva de formação de adultos e de professores.

Revista @mbienteeducação. São Paulo, v. 2, n. 2, p. 136-139, ago/dez 2009.

KUHN, Thomas S. A estrutura das revoluções científicas. 2. ed. Tradução: Beatriz Vianna

Boeira e Nelson Boeira. São Paulo: Perspectiva, 1987.

LABURÚ, Carlos Eduardo. Fundamentos para um Experimento Cativante. Caderno

Brasileiro de Ensino de Física. V. 3, Nº. 3, p.382-404, dezembro 2006.

LISBOA, Julio Cezar Foschini. Química, 1º ano Coleção Ser Protagonista. 1. ed. São Paulo:

Edições SM, 2010.

LOPES, Alice Casimiro. Conhecimento Escolar em Química – Processo de Mediação

Didática da Ciência. Química Nova, São Paulo: SBQ, v.20, n.5, p. 563-568, 1997.

________. Currículo e Epistemologia. Ijuí, RS: Editora Unijuí, 2007.

MACHADO, Andréa Horta. Aula de Química: discurso e conhecimento. 2.ed. Ijuí: Ed.

Unijuí, 2004.

MACHADO, Andréa Horta, MORTIMER, Eduardo Fleury. Química para o Ensino Médio:

fundamentos, pressupostos e o fazer cotidiano. In: ZANON, L.B., MALDANER, O. A.(Orgs.)

Page 159: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

158

Fundamentos e propostas de ensino de Química para a educação básica no Brasil. Ijuí: Ed.

Unijuí, 2007, p. 22-41.

MALDANER, Otávio Aloísio. A Formação Inicial e Continuada de Professores de Química.

3. ed. Ijuí: Ed. Unijuí, 2006.

________. A Pós-Graduação e a Formação do Educador Químico. In: ROSA, Maria Inês

Petrucci; ROSSI, Adriana Vitorino. Educação Química no Brasil – Memórias, Políticas e

Tendências. 1.ed. Campinas, SP: Editora Átomo, 2008, p. 269-288.

MALDANER, Otávio Aloísio; ZANON, Lenir Basso. Pesquisa Educacional e Produção de

Conhecimento do Professor de Química. In: SANTOS, Wildson Luiz P. dos; MALDANER,

Otávio Aloísio. Ensino de Química em Foco. 1.ed. Ijuí: Ed. Unijuí, 2010, p. 331-365.

MARQUES, Mario Osorio. Formação do Profissional da Educação. 4.ed. Ijuí: Ed. Unijuí,

2003.

MELLO, Irene Cristina et al. Fundamentos epistemológicos da contemporaneidade: Thomas

Kuhn e Gaston Bachelard. Cuiabá: UAB/UFMT, 2009.

________. Iniciação à Docência na UFMT. Cuiabá: EdUFMT, 2012.

MORIN, Edgar. Introdução ao Pensamento Complexo. 4. ed. Porto Alegre: Sulina, 2011.

MIZUKAMI, Maria da Graça Nicoletti. Aprendizagem da Docência: Algumas Contribuições

de L. S. Shulman. Revista Educação, ano XXII, nº 74, abril/2011.p. 121-142.

MIZUKAMI, Maria da Graça Nicoletti; Corradini, Suely Nercessian. Formação Docente O

Profissional da Sociedade Contemporânea. Revista Exitus, n.01, v. 01, p. 53-62, jul/dez. 2011.

MOITA, Maria da Conceição. Percursos de Formação e de Trans-Formação. In: NÓVOA,

Antonio (Org). Vida de Professores. Porto: Porto Editora, 2007, p. 111-140.

MONTEIRO, Ana Maria Ferreira da Costa. Professores: Entre Saberes e Práticas. Revista

Educação e Sociedade, Santa Maria. n.02, v. 29, p. 33-149, 2001.

MORAES, Roque. Uma Tempestade de Luz: A Compreensão Possibilitada pela Análise

Textual Discursiva. Revista Ciência & Educação. n.02, v. 09, p. 191-211, 2003.

MORAES, Roque; GALIAZZI, Maria do Carmo. Análise Textual Discursiva. Ijuí: Ed. Unijuí,

2007.

MORIN, Edgar. Introdução ao Pensamento Complexo. Lisboa: Instituto Piaget, 1995.

________. A Cabeça Bem-Feita. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2011.

NÓVOA, Antonio. Formação de Professores e Profissão Docente. In: ________. Os

Professores e a Sua Formação. Lisboa: Dom Quixote, 1992, p. 77-92.

Page 160: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

159

________. Os Professores e as Histórias da sua Vida. In: NÓVOA, Antonio (Org). Vida de

Professores. Porto: Porto Editora, 2007, p. 11-30.

PIMENTA, Selma Garrido. Formação de Professores: Identidade e Saberes da Docência. In:

PIMENTA, Selma Garrido (Org.). Saberes Pedagógicos e Atividade Docente. 8ª. Ed. São

Paulo: Cortez, 2012, p. 15-38.

PÉREZ GÓMEZ, Angel. O Pensamento Prático do Professor: A Formação do Professor como

Profissional Reflexivo. In: NÓVOA, Antonio. Os Professores e a Sua Formação. Lisboa:

Dom Quixote, 1992, p. 77-92.

PORLÁN, R.; A. RIVERO Y. & MARTÍN, R. Conocimiento profesional deseable y

professores inovadores: fundamentos y princípios formativos. Investigación em la Escuela, v.

29, 1996, p. 23-38.

________. Conocimiento profesional y epistemología de los profesores I: teoría, métodos e

instrumentos. Enseñanza de las Ciencias, v. 15, n. 2, 1997, p. 155-171.

________. Conocimiento profesional y epistemología de los profesores, II: Estudios

empíricos y conclusiones. Enseñanza de las Ciencias, Córdoba, v. 16, n. 2, 1998, p. 271-288.

RIBEIRO, Marcel Thiago Damasceno. Jovens na Educação de Jovens e Adultos e sua

Interação com o Ensino de Química. 2009. 152f. Dissertação (Mestrado em Educação),

Instituto de Educação, Universidade Federal de Mato Grosso. Cuiabá, 2009.

RUSSEL, John B. Química Geral. Tradução: Márcia Guekezian et al. 2. ed. São Paulo:

Makron Books, 1994.

SACRISTÁN, Gimeno J. O Currículo Uma Reflexão sobre a Prática. 3.ed. Porto Alegre:

ArtMed, 2000.

SANTOS, Boaventura Souza. Introdução a uma Ciência Pós Moderna. Rio de Janeiro: Graal,

1989.

SANTOS, Wildson Luiz Pereira dos; MÓL, Gerson. Química cidadã. 1.ed. São Paulo: Ed.

Nova Geração, 2010.

SANTOS, Wildson Luiz Pereira dos; SCHNETZLER, Roseli Pacheco. Educação em

Química: compromisso com a cidadania. 3.ed. Ijuí: Ed. UNIJUÍ, 2003.

SANTOS, Wildson Luiz Pereira dos. O Ensino de Química para Formar Cidadão: Principais

Características e Condições para a sua implantação na escola secundária brasileira. 1992.

Dissertação (Mestrado em Educação), Faculdade de Educação, Universidade Estadual de

Campinas. Campinas, 1992.

SANTOS Jr, João Batista; MARCONDES, Maria Eunice Ribeiro. Identificando os Modelos

Didáticos de um Grupo de Professores de Química. Revista Ensaio, v. 12, n. 3, 2010, p. 101-

116.

Page 161: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

160

SAVIANI, Dermeval. Pedagogia e Formação de Professores no Brasil: vicissitudes dos dois

últimos séculos. In: IV Congresso Brasileiro de História da Educação, UCG, Goiânia, 2006.

Disponível em: http://www.sbhe.org.br/novo/congressos/cbhe4/coordenada-eixo01-DS.htm.

Acesso em: 05/02/2015.

SILVA, Leonardo A. et al. Obstáculos Epistemológicos no Ensino-Aprendizagem de Química

Geral e Inorgânica no Ensino Superior: Resgate da Definição Ácido-Base de Arrhenius e

Crítica das Funções Inorgânicas. Revista Química Nova na Escola. Vol. 36. n.4, p. 261-268,

novembro 2014.

SCHNETZLER, Roseli Pacheco; ARAGÃO, Rosália Maria Ribeiro de. Importância, Sentido

e Contribuições de Pesquisas para o Ensino de Química. Revista Química Nova na Escola.

n.1, p. 27-31, maio 1995.

SCHNETZLER, Roseli Pacheco. A Pesquisa no Ensino de Química e a Importância da

Química Nova na Escola. Química Nova, São Paulo: SBQ, supl. 1, p. 14-24, 2002.

________. A Pesquisa no Ensino de Química no Brasil: conquistas e perspectiva. Revista

Química Nova na Escola. n.20, p. 49-54, novembro 2004.

________. Educação Química no Brasil – 25 anos de ENEQ – Encontro Nacional de Ensino

de Química. In: ROSA, Maria Inês Petrucci; ROSSI, Adriana Vitorino. Educação Química no

Brasil – Memórias, Políticas e Tendências. 1.ed. Campinas, SP: Editora Átomo, 2008, p. 17-

38.

________. Apontamentos Sobre a História do Ensino de Química. In: SANTOS, Wildson

Luiz P. dos; MALDANER, Otávio Aloísio. Ensino de Química em Foco. 1.ed. Ijuí: Ed.

Unijuí, 2010, p. 51-75.

SOARES, Elane Chaveiro. O Professor de Química e a Epistemologia da Prática

Pedagógica: Limites e Desafios para a Inovação. 2012. 169 f. Tese (Doutorado em

Educação), Faculdade de Educação, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.

Porto Alegre, 2012.

________. PIBID/QUÍMICA/UFMT e a Ideia de Autoconceito Profissional Docente:

Perspectivas e Conquistas. Anais do XVIII ENDIPE. 2016, p. 1-10.

SHÖN, Donald A. Formar Professores como Profissionais Reflexivos. In: NÓVOA, Antonio.

Os Professores e a Sua Formação. Lisboa: Dom Quixote, 1992, p. 77-92.

SHULMAN, Lee S. Those Who Understand: Knowledge Growth in Teaching. Educational

Researcher, n.02, v. 15, p. 4-14, fev. 1986.

________. Knowledge and teaching: foundations of a new reform. Havard Educational

Review, n.01, v. 57, p. 1-22, 1987.

TARDIF, Maurice; LESSARD, Claude (Org). O Ofício de Professor História, Perspectivas e

Desafios Internacionais. 3.ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2009.

Page 162: SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO … · BELÉM –PA 2016 . Dados Internacionais de Catalogação na Fonte. ... relações entre os conhecimentos dos professores sobre

161

TARDIF, Maurice. Saberes Docentes e Formação Profissional. 13.ed. Petrópolis, RJ: Vozes,

2012.

TAVARES, Maria Tereza Goudard; ALVARENGA, Marcia Soares. Cadernos de Formação:

A Experiência de Currículo praticado em um Curso de Formação de Professores. Revista

Teias, Rio de Janeiro: ProPED/UERJ, n.27, v. 13, p. 89-101, jan/abr. 2012 – Currículos:

problematização em práticas e políticas.

THERRIEN, Jacques. Da Epistemologia da Prática à Gestão dos Saberes no Trabalho

Docente: Convergências e Tensões nas Pesquisas. In: DALBEN, A; DINIZ J.; SANTOS, L.

(Org). Convergências e Tensões no Campo da Formação e do Trabalho Docente. XV

ENDIPE. Belo Horizonte: Autêntica, 2010, p. 307-323.

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO. Projeto Pedagógico do Curso de

Licenciatura Plena em Química. Cuiabá: UFMT/ICET, 1997.

________. Projeto Institucional do PIBID. Cuiabá: UFMT/PROEG, 2007.

________. Resolução CONSEPE nº 183 de 30 de novembro de 2009. Projeto Pedagógico do

Curso de Licenciatura Plena em Química. Cuiabá: UFMT/ICET, 2009.

________. Relatório Final de Atividades do subprojeto Licenciatura Plena em Química,

campus Cuiabá, do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência – PIBID, Edital

DEB/CAPES, 2007. Cuiabá: UFMT/PROEG, 2010.

VALLE, Ione Ribeiro. Carreira do Magistério: uma escola profissional deliberada? Revista

Brasileira de Estudos Pedagógicos. Brasília v.87, n. 216, p. 178-187, ago. 2006.

VASCONCELLOS, Celso dos S. Construção do Conhecimento em Sala de Aula. 16.ed. São

Paulo: Libertad, 2005.

VEENMAN, Simon. Perceived Problems of Beginning Teachers. Review of Educational

Research, v.54, n.2, p. 143-178, 1984.

VYGOTSKY, L.S. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

ZABALA, Antoni. A Prática Educativa Como Ensinar. Porto Alegre: ArtMed, 1998.

ZABALZA, Miguel A. O ensino universitário: seu cenário e seus protagonistas. Tradução

Ernani Rosa. Porto Alegre: ArtMed, 2004.

ZUCCO, C. Diretrizes Curriculares para os cursos de Química. Revista Química Nova, n.22,

p. 454-461, 1999.