SacerdoteS 19

32

description

O Templo dos Cavaleiros

Transcript of SacerdoteS 19

Page 1: SacerdoteS 19
Page 2: SacerdoteS 19

2

Capítulo 19 – O Templo dos Cavaleiros Elkens, Meithel e Laserin ficaram surpresos com o que viram. Final-mente chegaram ao centro dos Domínios da Magia, centro da grande plataforma que flutua no vazio, onde estão todas as construções, templos, entre outras coisas, e é também onde deveria estar a grande Torre Espiral. De certa forma a torre estava ali, mas estava no chão. Ela havia desabado com o impacto do ataque de Rashuno, o mesmo ataque que quase matou os Sacerdotes. Destroços da torre se espalha-vam por todo lado e vários templos menores também estavam em ruí-nas, pois foram atingidos por partes da torre. Eles caminharam por um bom tempo, passando entre os destroços da torre, até que finalmente Meithel disse: — Aquele é o Templo dos Cavaleiros – Elkens e Laserin imediata-mente olharam para o templo que, milagrosamente, não foi destruído como os demais. O templo era grande, construído em mármore branco. Em sua entrada havia nove estátuas, representando cada um dos nove Cavaleiros da Magia atuais. A representação era perfeita, quase como se as próprias estátuas fossem vivas, só faltava se moverem. Mas enquanto andavam, Elkens puxou Laserin e Meithel para detrás de um dos destroços. Eles estavam sendo esperados na entrada do templo pelos mesmos Guerreiros que tentaram matá-los assim que en-traram nos Domínios da Magia, mas além deles havia também um General da Magia, obviamente o líder daquele batalhão. — Não precisamos nos esconder – sussurrou Meithel agachado atrás do destroço da torre. – O colar de Morton nos protegerá. — Este não é o problema, Meithel. Aqueles Guerreiros já sabem disso, então aposto como não estão ali para nos atacarem. Eles querem nos

Page 3: SacerdoteS 19

O T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o s

3

deter, nos impedir de entrar no Templo dos Cavaleiros. Não consegui-remos passar por eles… Elkens tinha razão. Eles não podiam ser feridos, mas ainda assim po-deriam ser impedidos de seguir adiante. Meithel logo pensou em en-frentá-los, mas uma batalha desnecessária apenas serviria para acabar com as reservas de energia que dispunham, energia que precisariam usar para enfrentar os Cavaleiros. Elkens e ele não seriam páreos para derrotar os dez Guerreiros e o General. Talvez Laserin pudesse derro-tá-los com o seu cristal, mas isso seria pedir muito. Não podiam exigir tanto da garota. Ela foi capaz de enfrentar Rashuno porque conse-guiu liberar o poder que se acumulou em seu corpo durante dezessete anos, mas esse poder não existia mais; nem mesmo Laserin poderia en-frentá-los agora. — Precisamos de um plano – concluiu Elkens. – Até pensarmos em um, ficaremos escondidos aqui. Mas Meithel já tinha um plano em mente. — Se conseguirmos entrar no templo, estaremos livres para enfrentar os Cavaleiros. Elkens olhou intrigado para ele: — Por que diz isso? O sorriso foi imediato. — Porque ninguém tem autorização para entrar no Templo dos Cava-leiros, a não ser eles próprios, o Guardião e os quatro Sábios. Se conse-guirmos entrar lá, nem mesmo os Guerreiros e o General poderão ir atrás de nós. Elkens pensou no que Meithel disse por algum tempo, mas ainda as-sim não conseguiu pensar num modo de passar pelos Guerreiros. — Como você quer fazer isso? – Elkens perguntou.

Page 4: SacerdoteS 19

4

Meithel sorria enquanto explicava o seu plano. Elkens e Laserin ou-viam com atenção. — É arriscado – disse Elkens quando terminou de ouvir. — Mas é o único jeito. Nós nos separamos, então você e Laserin en-tram no templo. Eu encontro vocês depois. Elkens não gostou do plano. Havia muitas falhas, mas era tudo o que tinham no momento.

Com muita calma, os três saíram do esconderijo e caminharam a pas-sos leves em direção ao Templo dos Cavaleiros. Os Guerreiros aguar-davam com sorrisos nos rostos. Quando os dois grupos finalmente se encontraram, a conversa começou: — Deixe-nos passar, Adeigos – disse Meithel reconhecendo o Gene-ral. – Queremos ver os Cavaleiros. O General sorriu. — Eles se encontram muito ocupados no momento. — Mas nós temos algo aqui que é do interesse deles – disse Elkens desafiando-o, então Laserin abriu sua bolsa propositalmente, mos-trando o cristal dentro dele. Já estava tudo combinado. Os olhos de Adeigos brilharam, o mesmo brilho que eles haviam visto nos olhos do Feiticeiro Ego. Aquele que conseguisse o cristal que os Cavaleiros tanto desejavam com toda certeza seria muito bem recom-pensado, era por isso que todos tinham tanta vontade de pôr as mãos na terceira face do Cristal de quatro Faces. — O importante é que agora vocês estão aqui dentro e não podem es-capar. Assim que o cristal se tornar essencial nos planos dos Cavalei-ros, eles mesmos virão até vocês e levarão o cristal. Não pensem que o colar ancestral que vocês carregam irá protegê-los contra o poder dos Cavaleiros.

Page 5: SacerdoteS 19

O T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o s

5

Ao ouvir isso, Elkens percebeu o quanto Adeigos e seus Cavaleiros es-tavam ignorantes em respeito ao portal. Adeigos disse que eles não poderiam fugir, e isso era verdade até algum tempo atrás. Depois que Gauton os abandonou, eles só poderiam fugir se outro Mensageiro os tirasse dali, mas agora isso já não era verdade. Agora Elkens, Meithel e Laserin sabiam que o portal paralelo do deserto Arkver estava se transformando no portal principal, por onde eles poderiam sair sem a ajuda de ninguém. Mas isso não importava para eles, pois fugir não fazia parte dos planos. Meithel olhou para Elkens e Laserin, então deu uma discreta piscada para ambos. Estava na hora de pôr os planos em ação. Tocando seu colar, Meithel conjurou uma luz tão forte que cegou a todos por um momento. Essa foi a distração. Quando a luz enfraqueceu e todos pu-deram enxergar novamente, os Guerreiros viram apenas Laserin e El-kens diante deles. A primeira parte do plano foi posta em ação: Meithel distraiu os Guerreiros para conseguir fugir, deixando Elkens e Laserin sozinhos. — ELE NÃO ESTÁ MAIS PROTEGIDO PELO COLAR ANCESTRAL! – gritou Adeigos surpreso com a atitude suicida de Meithel. – MATEM-NO! EU CUIDO DESSES DOIS… Os dez Guerreiros de Adeigos saíram correndo atrás de Meithel, dei-xando Elkens e Laserin a sós com o General. — O seu plano idiota não vai funcionar – disse Adeigos rindo. – Não importa se estou sozinho, vocês não tem a menor chance de passar por mim. E quanto ao seu amigo, ele será capturado e morto. Mas Elkens riu quando Adeigos terminou de falar. O riso servia para demonstrar a sua confiança, e isso era importante para que o plano funcionasse. Adeigos teria que acreditar que eles estavam muito con-fiantes.

Page 6: SacerdoteS 19

6

— Sinto te decepcionar, Adeigos – disse Elkens recuando um passo para o lado, permitindo que Laserin pudesse ficar à sua frente – mas o meu plano vai funcionar! Laserin passou a se concentrar no cristal, que imediatamente passou a brilhar. Estava acumulando energia. O sorriso desapareceu do rosto de Adeigos por apenas um segundo, mas logo o General recuperou sua postura. — Não serei derrotado pela garota e o cristal. — É o que vamos ver – disse Elkens ainda sorrindo, tentando passar a confiança que não tinha. Ele sabia que Laserin não teria poder sufi-ciente para derrotar o General, não depois da batalha que tiveram contra Rashuno. A besta havia recuperado suas forças, curado suas feridas, mas ainda continuavam sem energia para realizar magia. Pre-cisariam de concentração para se recuperaram por completo, mas para isso precisariam de tempo, o que não tinham. Laserin estava fazendo apenas um teatro, não estava realmente con-seguindo acumular magia para um ataque eficaz. Tudo dependia do quão confiantes estavam para surpreender Adeigos e deixá-lo com me-do, mas o plano de Meithel não parecia estar dando resultados, pois o General aparentava muita calma. Tocando seu colar levemente, Adeigos conjurou uma barreira de luz branca à sua frente, mas logo se concentrou mais ainda, transforman-do-a numa muralha. A muralha é a barreira aprimorada, um feitiço normalmente aprendido pelos Guerreiros. Ainda havia mais um feitiço acima da muralha, a fortaleza, mas apenas os Generais mais podero-sos são capazes de usar esta magia de defesa aprimorada. — Pode se preparar o quanto quiser – disse Adeigos enfrentando La-serin – mas qualquer ataque que você use não passará pela minha mu-ralha.

Page 7: SacerdoteS 19

O T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o s

7

Mas foi então que Adeigos cometeu o seu erro. Estava dando tanta atenção para Laserin que mal percebia que Elkens também estava se concentrando em seu colar, executando um outro feitiço. Elkens esta-va se concentrando num feitiço de congelar alma, mas Adeigos não havia percebido, e quando o ataque finalmente estava pronto, Elkens atacou. Esse era o plano de Meithel: enquanto ele fugia sem proteção, atrain-do o maior número de Guerreiros atrás dele, Laserin distrairia os que ficassem para trás para dar tempo à Elkens de congelar a alma deles. E até agora o plano havia funcionado sem nenhum imprevisto. Elkens disparou seu feitiço e o conduziu pelas costas de Adeigos, con-tornando sua muralha e atacando por onde não havia proteção. O fei-tiço voou lentamente, dando voltas graciosas pelo ar, então finalmen-te atingiu o seu alvo. Elkens comemorou com um grito o sucesso que tiveram, e Laserin dei-xou seu teatro de lado, voltando a guardar o cristal em sua bolsa. Animados com mais uma vitória, os dois correram para os degraus que os levariam para dentro do templo, mas assim que passaram por Adei-gos, ele desapareceu… Elkens nem precisou ouvir a gargalhada de Adeigos para entender o que havia acontecido. Foram enganados. Estupidamente enganados. O que Elkens atacou não passou de uma ilusão, enquanto o verdadei-ro Adeigos estava escondido. Normalmente Guerreiros eram focados na luta com a força física, enquanto Feiticeiros eram treinados para criarem ilusões no meio da batalha. Mas infelizmente Adeigos conhe-cia técnicas de ilusão e Elkens foi enganado por ele. O verdadeiro Adeigos apareceu descendo pelas escadas, rindo como um louco.

Page 8: SacerdoteS 19

8

— Eu disse que o plano de vocês não iria funcionar. Vejo que Meithel se sacrificou por nada. O plano de Meithel falhou! Quais chances tinham agora? Como fari-am para passar por Adeigos e entrar no Templo dos Cavaleiros? El-kens não tinha nada em mente, muito menos Laserin. Adeigos se mos-trou um adversário difícil de se enganar; Elkens precisava pensar em outra coisa o quanto antes, pois tudo dependia de passar por Adeigos e enfrentar os Cavaleiros da Magia. Eles não tinham tempo a perder. Mas enquanto pensava em um novo plano, Elkens foi distraído por uma voz que veio de dentro do templo. A voz era aguda e forte, e eco-ou dentro do Templo dos Cavaleiros como um trovão. A voz disse: — Deixe-os passar, Adeigos. Vamos acabar com isso logo e pegar o cristal de uma vez por todas. Adeigos assentiu, recuando um passo para permitir que Elkens e La-serin subissem pelos degraus de mármore branco do templo. As coisas estavam começando a dar certo.

1° Cavaleiro da Magia – Káfka Arma Branca – Escudo Miragem

Gotas de suor escorriam pelo rosto de Káfka. Um dia sem missões sig-nificava, para ele, um dia de árduo treinamento. E hoje era um desses dias sem missões. Mas já fazia algumas horas que a noite havia che-gado, por isso guardou sua espada na bainha e voltou para dentro dos Domínios da Magia. Káfka adentrou a Torre Espiral e seguiu para a escada. Mas nem che-gou aos seus aposentos quando foi alcançado por um Mensageiro que

Page 9: SacerdoteS 19

O T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o s

9

ele não conhecia. O Mensageiro trazia uma mensagem de Zander, o Guardião da Magia, que dizia que queria vê-lo. Sem imaginar por que estava sendo chamado, Káfka subiu direto para o ápice da torre, onde Zander esperava por ele, sentado numa grande cadeira diante de sua mesa cheia de relatórios. — Estou aqui, senhor – disse Káfka ao entrar na sala e fechar a pe-sada porta de mármore às suas costas. Isso foi há dezoito anos. Zander tirou os olhos dos vários relatórios que analisava e encarou Káfka com um brilho nos olhos, mas com a expressão séria. Ele indi-cou uma cadeira estofada que estava à frente da mesa, mas Káfka não se sentou. Zander não insistiu, voltando para a análise de seus relató-rios. Enquanto estudava cada um com a devida atenção, o Guardião disse: — Eu mandei chamá-lo há cinco horas, mas ninguém te encontrou… — Eu estava treinando fora dos Domínios. — É, eu soube que você costuma treinar quando não está em missão. Não leva seus discípulos com você? — Sempre que tenho oportunidade. Mas hoje estão todos em missão, por isso estive treinando sozinho. — Um de seus alunos se tornou um General na semana passada, é o que diz este relatório. Káfka assentiu, sem dizer nada, mantendo sua postura de General. Zander ficou alguns minutos sem dizer nada, enquanto folheava meia dúzia de relatórios. — Absolutamente impecável – disse Zander por fim, colocando um relatório de lado e começando a ler outro. ‒ Todas as missões realiza-das com sucesso. Nenhuma falha. Absolutamente impecável. Káfka de repente enxergou uma ficha que estava acima de uma pilha de relatórios de missões. A ficha continha a sua imagem a um canto, e

Page 10: SacerdoteS 19

10

as sete folhas continham todos os seus dados pessoais. E foi assim que Káfka compreendeu: todos os relatórios que estavam sobre a mesa, cada um dos relatórios que Zander lia tão atentamente, dizia respeito a ele apenas. Eram os relatórios das missões que executou nos últimos meses. Ao perceber isso, Káfka irritou-se: — Por que me chamou aqui, senhor? Zander deu um longo suspiro ao ouvir a pergunta do (até aquele mo-mento) General da Magia, mas ignorou o tom impaciente em sua voz. Ele juntou os relatórios que estavam espalhados sobre a mesa e fez duas pilhas a um canto. Então levantou os olhos para o General que continuava em pé, rejeitando a cadeira, e respondeu: — Porque estou de olhou em você há meses. Porque acho que não pre-ciso esperar mais. — Esperar para quê? Zander estudou Káfka por um longo minuto. Káfka sentiu que aque-les olhos não olhavam apenas para ele, olhavam para dentro dele; en-carou Zander e viu em seus olhos toda a habilidade que o Guardião tinha para decifrar a pessoa; sentiu quando a consciência de Zander tocou a sua, sentiu quando o Guardião viajou por suas lembranças, sentiu quando seu caráter foi testado, e teve emoções distintas quando Zander mexeu com sua mente, terminando seu teste. Zander colocou uma mão sobre as pilhas de relatórios e deu uma bati-da sobre elas. — Para mim, esses relatórios não significam nada. Significam gran-des feitos, isso sim, significam que você tem uma habilidade de lide-rança surpreendente, assim como sabe tomar as decisões com respon-sabilidade e sabedoria. Esses relatórios me dizem o quanto você é for-te, uma pessoa centrada nos seus objetivos, que sabe como atacar e quando recuar. Um exímio protetor. Mas, como eu disse, isso não sig-

Page 11: SacerdoteS 19

O T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o s

11

nifica nada para mim, pois esta é apenas sua obrigação como um protetor da Magia. Káfka estava impaciente. Não gostava de se gabar e tampouco gosta-va de receber elogios. Se Zander o chamou até ali para elogiá-lo, para parabenizá-lo pelas missões que realizou com sucesso, significava que não o conhecia como deveria. Aquilo o estava irritando. — Continuo sem entender por que me chamou… — Tenha paciência, Káfka – Zander o interrompeu com seu tom de voz suave. Uma voz que transbordava confiança e sabedoria. ‒ Dei-xe-me terminar de falar. Como eu disse, seus feitos que estão descritos nestes relatórios não me importam; suas missões, todas realizadas com sucesso absoluto, também não me importam. O que me importa são as entrelinhas destes relatórios, as informações que estão ocultas aqui, mas que ainda assim podem ser visíveis se olhar com a devida atenção. Káfka abriu a boca para dizer algo, mas Zander o interrompeu antes que tivesse tempo de dizer palavra alguma: — É o seu caráter, Káfka! É isso a única coisa que me importa. São os seus princípios, a sua bondade, o seu senso de justiça, seus atos, não como protetor, mas como um ser humano; são essas coisas que me importam. Você é forte, assim como estes relatórios me dizem, mas o que eles não dizem é que você não se gaba de sua força, não dizem que você não deseja poder para si. E são para estas coisas ocultas nas en-trelinhas que eu dou importância. Me responda Káfka, embora eu já saiba a resposta: alguma vez já desejou ser um dos nove Cavaleiros da Magia? — Não senhor – ele assentiu. — E é exatamente esta sua qualidade que me chamou atenção para você. E é por isso que te chamei até aqui. ‒ Zander fez uma breve

Page 12: SacerdoteS 19

12

pausa para Káfka refletir antes de fazer sua proposta: ‒ Aceita ser um dos meus Cavaleiros? Káfka não soube o que dizer. Zander enxergou em seu rosto o quanto ele ficou surpreso com a proposta que lhe fez, mas não enxergou ali qualquer traço de entusiasmo. Ao ver que o General estava buscando desesperadamente uma justificativa para recusar a oferta, Zander de-cidiu prosseguir: — Mas depois de tudo o que falei sobre você, sabe qual foi a sua principal qualidade que me fez te escolher? Káfka estava sem reação alguma. Isso foi há dezoito anos. Elkens e Laserin passaram pelas enormes estátuas dos nove Cavalei-ros, então finalmente entraram no templo. O chão do templo era com-pletamente feito de vidro, de modo que Laserin teve a impressão de que estava andando sobre o vazio. O templo parecia muito maior por dentro que por fora; dezenas de pilares gigantescos acompanhavam Elkens dos dois lados, por todo o caminho que parecia se estender por quilômetros. Entre cada um dos pilares havia uma estátua esculpida em mármore branco, assim como todo o templo; as estátuas deviam re-presentar todos os que já foram Cavaleiros da Magia, ou pelo menos os mais importantes deles. Entre eles era possível identificar muitas estátuas femininas, o que significava que ao lado de Cavaleiros, sem-pre houve Amazonas também. Assim que deu o seu primeiro passo dentro do templo, Elkens elevou sua concentração para o terceiro nível, o Roe-gan, acumulando ener-gia para uma luta que ele sabia ser inevitável. Andaram pelo o que pareceu ser muitos minutos, até que finalmente chegaram ao outro ex-tremo do templo. Lá havia um altar e, sobre ele, um enorme arco de pedra. Elkens ignorou o significado do arco de pedra, mas pôde reco-

Page 13: SacerdoteS 19

O T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o s

13

nhecer algumas runas nele que diziam respeito à língua ancestral. Mas ele estava tenso demais para tentar traduzir o que elas queriam dizer. Havia alguma coisa muito estranha acontecendo ali. Onde es-tava o primeiro Cavaleiro da Magia? Elkens mantinha-se sempre aler-ta, preparado para um possível ataque surpresa. — O que isso quer dizer? – perguntou Laserin apontando para as ru-nas gravadas no arco de pedra. Elkens olhou mais uma vez para o arco de pedra e passou a traduzir as runas mentalmente. — Está dizendo que é um portal. — Para onde? Elkens não respondeu. Não sabia a resposta. Para onde aquele portal levaria? Elkens tentou decifrar mais algumas runas, mas não encon-trou a resposta, apenas dizia que o portal precisava de uma chave pa-ra ser aberto. — O portal leva para a segunda parte do templo, onde vocês encon-trarão o segundo Cavaleiro, mas garanto que vocês não chegarão a passar por ele. A chave para abrir este portal é o meu colar. Elkens e Laserin se viraram imediatamente para encarar quem falava com eles. Era a mesma voz forte e aguda que ouviram do lado de fora do templo e, assim como antes, ela ecoou pelas paredes, parecendo ainda mais assustadora. — Sou Káfka, o primeiro Cavaleiro da Magia – disse o homem. Era uma pessoa completamente diferente do que Elkens esperava. Káfka parecia não sentir orgulho em ser um dos Cavaleiros, pois nem ao me-nos usava as vestes ou armaduras adequadas para tal. Káfka usava apenas uma calça branca, nada mais, uma calça comum. Estava sem camisa, além de andar descalço sobre o chão de vidro. Seus cabelos fo-ram recentemente cortados pela lâmina cega de alguma espada e esta-

Page 14: SacerdoteS 19

14

va suado, como se tivesse acabado de sair de um treinamento. A úni-ca coisa que o identificava como um Cavaleiro da Magia era o colar sobre o peito nu, pendurado ao pescoço. Káfka era alto e forte e El-kens pôde sentir sua alma imediatamente. Era uma pessoa boa. – Quem são vocês? Elkens não hesitou em responder: — Sou Elkens, Sacerdote da Alma, e esta é Laserin. Estamos aqui para salvar o Guardião da Magia. Káfka não disse nada. Não sorriu nem fez qualquer outra expressão esperada. Permaneceu indiferente diante do que Elkens falou. Conti-nuou apenas analisando os dois estranhos, até que finalmente enxer-gou o cristal nas mãos de Laserin. A garota vinha preparada para lu-tar. — Peço que vão embora e não se metam com os Cavaleiros da Magia, mas antes de irem deixem o cristal. — Não vamos embora! – disse Laserin irritada – Não podemos ir embora agora… — O portal paralelo que fica no deserto Arkver se tornou o portal principal – disse Káfka calmamente, ignorando o fato de Elkens já ter conhecimento disso. – Deixem o cristal comigo e vão embora… — Você não entende? – perguntou Elkens irritando-se. – Passamos por muitas coisas para chegar aqui. Não iremos simplesmente lhe en-tregar o cristal e ir embora. Leve-me até onde vocês mantém o Guar-dião aprisionado imediatamente. — Vou dizer mais uma vez: vão embora e deixem o cristal. Não quero ter que matá-los. Káfka continuava muito calmo e indiferente ao que Elkens dizia. O Sacerdote da Alma se surpreendeu com o que ele disse: matar? Isso re-

Page 15: SacerdoteS 19

O T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o s

15

almente foi dito por aquele que Elkens teve certeza de ser uma pes-soa bondosa assim que o viu? Mas Elkens não tinha mais o que pensar. Estas palavras confirma-ram o que ele sempre soube: os Cavaleiros eram seus inimigos e ele te-ria que derrotá-los! E se a batalha era inevitável, não havia por que adiá-la mais. Tocando seu colar, Elkens conjurou uma esfera e atirou-a contra o Cavaleiro. Káfka não se surpreendeu, como se nem ao menos tivesse percebido que estava sendo atacado. Não fez movimento algum indi-cando que se defenderia ou que se esquivaria do ataque, apenas ficou parado, esperando para que a esfera de Elkens chegasse até ele. Logo isso aconteceu, e houve uma explosão que ecoou pelas paredes do tem-plo. Laserin sorriu, achando que tinham derrotado o Cavaleiro, mas no segundo seguinte viu que isso não era verdade. Laserin olhou para Káfka, mas não o viu. O que viu foi um grande e reluzente escudo branco. O escudo se materializou do nada no braço do Cavaleiro e Káfka estava agachado atrás dele, protegido de qual-quer ataque de Elkens. A um olhar mais atento, Elkens reparou que não era um escudo conjurado, era uma arma própria. Um escudo for-jado sabe-se lá por quem, e carregado de magia. Mas Elkens não estava convencido. Aquele escudo não poderia ser tão forte, ele provaria isso. Iria mostrar para o Cavaleiro que Sacerdotes também sabem lutar. Tocando mais uma vez seu colar, ele utilizou um feitiço aprimorado, o turbilhão de esferas. Dezenas de esferas rubras voaram contra Káfka, mas novamente ele se protegeu atrás de seu es-cudo branco. O barulho das explosões foi amplificado dentro do tem-plo, um barulho assustador, mas novamente Káfka não sofrera nada. O escudo continuava tão belo e reluzente como antes, sem um único arranhão.

Page 16: SacerdoteS 19

16

Káfka logo se levantou detrás do escudo, mostrando sua costumeira expressão de indiferença, o que não agradou Elkens. — Você pode me atacar o quanto quiser – ele disse – mas lhe digo que isso é perca de tempo. Por mais poderoso que o seu ataque seja, ele não pode fazer nada contra a arma branca mais poderosa em se tratando de proteção. Seus ataques são inúteis. Pela primeira vez um leve sorriso surgiu no canto do lábio do Cavalei-ro, mas logo desapareceu. — Arma branca? – Elkens perguntou. – Que quer dizer? Desta vez Káfka chegou a sorriu. — Cada um dos Nove Cavaleiros da Magia possui uma arma branca. Essas armas são como relíquias da Magia, passadas de geração em ge-ração de Cavaleiros. Logicamente que elas não são tão poderosas quanto às relíquias verdadeiras, mas ainda assim o poder das armas brancas é devastador. Um mero Sacerdote como você não tem a menor chance de me vencer. “O meu escudo me protegerá de qualquer ataque que você utilize, não importa o quanto seja forte. A minha arma branca é o escudo mais re-sistente que se tem notícia, em toda a história dos protetores. Você não tem a menor chance contra ele”. Elkens ficou perplexo. Agora se lembrava de já ter ouvido falar das armas brancas, só não se lembrava onde; talvez Meithel tivesse co-mentado com ele durante a jornada que fizeram até ali, mas isso não importava. O fato é que as armas brancas eram reais e, o escudo mais poderoso de toda Gardwen, estava no braço do inimigo neste momen-to. Com uma arma tão poderosa quanto aquela Káfka nem precisava usar o seu colar para enfrentar Elkens. O escudo bastava para garan-tir que nenhum feitiço de Elkens funcionasse contra ele. Mas o que

Page 17: SacerdoteS 19

O T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o s

17

Elkens faria? Para derrotar Káfka, precisaria primeiro descobrir um modo de passar pelo escudo. — Agora que você já sabe que não pode me atacar – disse o Cavaleiro – que tal tentar se defender? O Cavaleiro deixou seu escudo de frente para Elkens, então o segurou com as duas mãos. O escudo brilhou por alguns segundos e uma gran-de quantidade de energia foi expelida dele, indo de encontro a Elkens. O Sacerdote da Alma rapidamente levantou uma barreira rubra para se proteger, mas ela se despedaçou em mil pedaços assim que foi atin-gida. O ataque do escudo atingiu Elkens em cheio, jogando-o de cos-tas. Seu corpo todo doía enquanto o impacto do ataque o empurrava pelo chão de vidro. Elkens se levantou e encarou seu inimigo. Como Káfka fez aquilo? Como foi capaz de acumular tanta energia em tão pouco tempo, sem nem ao menos ter tocado o seu colar? Seria esse o terrível poder dos Cavaleiros da Magia? Mas Káfka era apenas o primeiro deles, o que significava que os outros oito Cavaleiros eram ainda mais fortes. El-kens começou a perder as esperanças; não teria a menor chance de che-gar ao Guardião da Magia para salvá-lo, não sozinho. Precisaria de reforços. Káfka continuava indiferente. Olhava para Elkens sem nenhuma preocupação no rosto, como se estivesse apenas passando o seu tempo. — Vamos, Sacerdote Elkens – disse Káfka tentando provocá-lo. – É a sua vez de atacar. Vamos ver do que é capaz. Se quiser me derrotar, precisará me mostrar toda a força que tem. Elkens sentiu seu ódio por Káfka aumentar. O ódio era uma ótima forma de acumular magia mais rapidamente, canalizando-a num ata-que muito mais poderoso. “Controle sua raiva ou ela o controlará”, is-so lhe foi dito na Floresta de Pedra, mas Elkens sequer se lembrou

Page 18: SacerdoteS 19

18

disso. Só pensava em atender ao pedido de Káfka, dando-lhe o ata-que mais forte que tinha em seu acervo. Elkens fechou os olhos e se concentrou. Em alguns segundos foi capaz de elevar sua concentração para o quarto nível, o Ginden-gan. Agora estava preparado. Sabendo que suas forças não seriam o suficiente pa-ra derrotar Káfka, Elkens chamou Laserin para perto e disse: — Por favor, Laserin – a garota se aproximou dele e ouviu atenta-mente. – Eu precisarei de toda a força que você puder me dar agora. Você me ajuda? A garota concordou com a cabeça sem pensar duas vezes. Então El-kens fechou os olhos e se concentrou. Estava disposto a atacar com todas as suas forças, mas não iria utilizar a Mundus Solven. Iria uti-lizar um ataque ainda mais forte, um ataque que Elkens jamais se imaginou usando. A Mundus Solven é realizada no terceiro nível de concentração, o Roe-gan, mas agora Elkens já estava em Ginden-gan, o quarto nível. Iria utilizar a Mundus Solven aprimorada: Nai-Kolumbar, Explosão da Alma! Na essência os dois ataques são os mesmos, sendo que a única diferen-ça é o número de almas de onde se pode tirar energia para atacar. Com a Nai-Kolumbar, Elkens poderia combinar a energia da sua alma com a energia da alma de Laserin, criando um ataque muito mais potente. Os efeitos colaterais, é claro, também passariam a afetar a garota: se Elkens não tomasse cuidado com a quantidade de energia que retirasse da alma de Laserin, ela também poderia morrer, assim como ele. Tudo era uma questão de saber quando parar; Elkens tomaria cuidado para não passar do ponto. Laserin ficou ao seu lado e ele aumentou o seu campo de concentração para envolver a alma da garota também. Káfka observava os dois com certo desprezo no olhar. Não importa qual ataque Elkens use, Káfka sabe que não pode ser derrotado. Seu

Page 19: SacerdoteS 19

O T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o s

19

escudo é indestrutível, o mais poderoso dos escudos que já existiu so-bre Gardwen. Elkens concentrava-se o máximo que podia, pois sabia que só teria es-sa chance. A raiva que sentia por Káfka limitava sua concentração, mas em compensação contribuía por um acúmulo maior de energia e conseqüentemente na criação de um ataque mais poderoso. Claro que se a raiva não estivesse limitando sua concentração, Elkens seria ca-paz de criar um ataque igualmente poderoso sem gastar tanta energia, mas isso exigiria mais tempo, coisa que ele não tinha. Ele sabia que se falhasse não teria outra chance, por isso tomava o maior cuidado para que nada saísse errado. Elkens se surpreendia com a quantidade de energia cedida pela alma de Laserin. O ataque estava ganhando força rapidamente, tanta força que logo ele começou a ter dificuldades para segurá-lo. Káfka também se surpreendeu, pois, usando seu sexto sentido de pro-tetor da Magia, ele percebeu a quantidade de energia que estava sendo acumulada num único ataque. Enquanto ele olhava para os dois in-trusos, viu que energia rubra estava sendo expelida pelos corpos dos dois, uma energia que, ele não sabia, vinha diretamente da alma de cada um deles. Essa energia rubra foi se acumulando rapidamente à volta de Elkens e logo passou a tomar forma. Káfka assistiu enquan-to a energia rubra tomava a forma de um grande pássaro: a forma de uma alma! A alma formada por energia bateu suas asas uma vez. Elkens quase não pôde deter o ataque, mas ainda não era o suficiente. Concentrou-se alguns segundos mais, até que se tornou insuportável manter a al-ma de energia parada; ele não agüentaria mais deter tamanho poder. Finalmente abrindo os olhos, Elkens mandou Laserin se afastar. A garota obedeceu imediatamente.

Page 20: SacerdoteS 19

20

— Preparado Káfka? – perguntou Elkens forçando um sorriso. Káfka não disse nada, apenas ajoelhou-se atrás de seu escudo e aguardou pelo ataque. – Desta vez o seu escudo será despedaçado! Elkens não estava mais agüentando deter o ataque. Toda a energia da Nai-Kolumbar estava vibrando demais, numa ansiedade incontrolável por atacar, uma vontade de atacar que foi implantada nela pela raiva que Elkens estava sentindo enquanto se concentrava; queria desespe-radamente atacar o inimigo. Elkens então liberou o ataque, disparan-do-o contra Káfka: — NAI-KOLUMBAR! Toda a energia rubra, que agora tinha a forma de uma grande alma, bateu asas e voou com a velocidade de um raio contra o Cavaleiro da Magia. O chão de vidro se estilhaçava por onde Nai-Kolumbar passa-va voando e, cada vez que ela batia suas asas, meia dúzia das está-tuas de Cavaleiros que havia acompanhando as paredes explodiam. Mas o mais terrível era o som que o ataque produzia; impossível de se descrever. Quando o ataque atingiu o escudo, houve uma grande ex-plosão, que novamente foi ecoada por todo o templo. Elkens ainda es-tava surpreso com o poder do ataque, pois a maioria da energia veio da alma de Laserin e não da sua própria. Káfka se surpreendeu mais ainda quando sentiu a potência do ataque contra o seu escudo, pois mal conseguia segurá-lo. Laserin estava esperançosa. Aquele poder certamente derrotaria Káf-ka, não havia dúvidas. Poucos segundos se passaram até que toda a energia do ataque desapareceu, enchendo todo o Templo dos Cavalei-ros de flocos de luz de cor rubra, então Elkens e Laserin finalmente puderam ver o resultado da Nai-Kolumbar. Káfka foi arrastado por dezenas de metros pelo templo, mas ainda es-tava protegido e ileso atrás de seu reluzente escudo branco. O escudo,

Page 21: SacerdoteS 19

O T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o s

21

como Elkens logo constatou, continuava intacto, sem um único ar-ranhão. Káfka se levantou, encarou Elkens e sorriu. — Muito bom. Seu ataque foi realmente muito forte, mas eu o preve-ni de que não conseguiria me derrotar. Agora é a minha vez de atacar e desta vez você vai morrer. As pernas de Elkens tremiam. Se todo aquele poder não foi suficiente para derrotar Káfka, então o que seria? O primeiro ataque de Káfka já foi muito forte, Elkens não agüentaria mais um. Desta vez seria derrotado. — Deviam ter me escutado e ido embora – disse Káfka como se fosse uma despedida. Mais uma vez ele apontou seu escudo para Elkens e o segurou com as duas mãos. A arma branca brilhou por alguns segun-dos, mas então todo o seu poder foi disparado contra Elkens. Desta vez ele nem tentou se proteger atrás de uma barreira; sabia que era inútil. Agora não havia nada que pudesse proteger Elkens, nem mes-mo o colar de Morton. Quando o ataque atingiu Elkens, ele sentiu seu corpo ser jogado pelo ar; passou por debaixo do grande arco de pedra sobre o altar e se cho-cou violentamente contra a dura parede nos fundos do templo. Elkens caiu de bruços no chão do altar, de onde não conseguiu mais se levan-tar. Estava derrotado. Káfka era o grande vencedor da batalha. Re-almente ele não devia ter se metido com os Cavaleiros da Magia, afi-nal de contas, era uma guerra perdida.

Meithel ainda corria dos dez Guerreiros que foram atrás dele. Sabia que não teria chances de lutar contra tantos inimigos de uma única vez, por isso a única coisa que podia fazer era fugir. Ele corria entre os destroços da grande Torre Espiral, que fora sua casa durante toda a parte da sua vida que ele se recordava. Não tinha lembranças dos seus

Page 22: SacerdoteS 19

22

primeiros dez anos de vida que viveu com sua família, pois esse perí-odo da vida era arrancado da memória da pessoa quando ela se torna um protetor, mas ele não se importava. Os Domínios da Magia eram a sua casa e Lakar, seu tutor, fora seu pai e sua mãe. Mas Lakar estava morto agora. Ao lembrar-se disso os olhos de Meithel se encheram de lágrimas, então ele decidiu que estava na hora de parar de fugir. No momento não estava se preocupando consigo mesmo, preocupava-se com Elkens e Laserin. Torcia para que o plano deles tivesse dado certo e que Elkens tivesse conseguido entrar no Templo dos Cavaleiros. Mas sabia também que se isso tivesse acontecido, eles estariam correndo grande perigo agora, pois estariam enfrentando o terrível poder de Káfka, o primeiro Cavaleiro da Magia. Meithel já estava correndo por muito tempo; estava na hora de voltar e ajudar Elkens. Foi então que parou de correr, deixando os Guerrei-ros confusos com a sua atitude. Seus inimigos o alcançaram e fizeram um círculo em torno dele, cercando-o por todos os lados. Porém, ao contrário do que esperavam, Meithel abriu um grande sorriso. — O que foi, Meithel? – perguntou um dos Guerreiros. – Por que esse sorriso no rosto? Acha que pode nos derrotar? — Vocês são um monte de lixo! – disse Meithel ainda sorrindo. – To-dos vocês são traidores. Preferiram trair o Guardião e ficar do lado dos Cavaleiros, por isso é que serão punidos. — E quem irá nos punir? – perguntou um dos Guerreiros rindo. – Você? — Não pretendo sujar minhas mãos com vermes como vocês – não havia um pingo de medo no rosto de Meithel, tampouco em sua voz. – Seus próprios colares é que irão puni-los quando perceberem o que es-tão fazendo. A própria Magia irá se vingar de vocês. Mas, se tiverem

Page 23: SacerdoteS 19

O T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o s

23

sorte, meus amigos e eu poderemos libertar o Guardião antes disso, então ele mesmo se encarregará de vocês… — Morra, seu desgraçado! Todos os dez Guerreiros prepararam seus arcos de dispararam flechas contra Meithel. Este não fez nada para se defender, mas inexplica-velmente nenhuma das flechas chegou a atingi-lo. Meithel, ainda sor-rindo, tirou um colar anil que estava escondido debaixo de suas vestes. Era o colar ancestral de Morton! — Fomos enganados! – sussurrou o Guerreiro perplexo. Só agora compreendiam o plano dos Sacerdotes: Meithel fugiria para atrair os Guerreiros enquanto Elkens e Laserin continuavam com a proteção do colar de Morton; isso era o óbvio, mas ninguém esperava que Meithel levaria o colar consigo, deixando Elkens e Laserin desprotegidos. Fe-lizmente não foram descobertos antes.

— Mas depois de tudo o que falei sobre você, sabe qual foi a sua principal qualidade que me fez te escolher? Quando fez esta pergunta pela primeira vez, dezoito anos atrás, Zander ficou sem resposta. Káfka não demonstrava reação alguma. O Guardião percebeu a falta de entusiasmo do General, percebeu sua re-lutância em aceitar a proposta, mas percebeu também que algo dentro dele o impedia de negar. Káfka sequer ouviu a pergunta de Zander, pois estava pensando em tudo o que significava realmente ser um Ca-valeiro. Pensou na responsabilidade que teria, em suas obrigações co-mo membro da guarda de Zander, um dos nove responsáveis por sua segurança. Pensou na burocracia e em todas as coisas chatas que isso significaria, pensou nos relatórios extras, na autoridade que teria so-

Page 24: SacerdoteS 19

24

bre qualquer Guerreiro e General da Magia, pensou em todas as suas novas obrigações que teria de realizar; pensou em absolutamente tudo. Mas o que quer que o tenha feito não recusar a proposta de imediato não era forte o bastante para fazê-lo mudar de opinião, pois não le-vou mais que alguns minutos para tomar uma decisão. Limpando a garganta, Káfka abriu a boca para dizer “Não”, mas Zander percebeu isso um segundo antes e o interrompeu: — Olhe para lá – disse o Guardião apontando para a parede à sua esquerda. Lá havia um escudo sobre um pequeno altar de madeira, um grande e belo escudo alvo que Zander mandara colocar ali proposital-mente para que Káfka o visse. Era o Escudo Miragem, uma das nove armas brancas. ‒ Quem dá a palavra final da escolha de um novo Ca-valeiro não sou eu, e sim as armas brancas. São elas que decidem se aceitam o Cavaleiro para empunhá-las ou não, mas não tenho nenhu-ma dúvida de que o escudo o aceitará. Baseado no histórico dos Cava-leiros e Amazonas que já portaram esta arma, você tem as caracterís-ticas ideais… Káfka novamente não ouvia nada do que Zander dizia. Ele caminhou até onde estava o belo escudo e o tocou com as mãos, admirado com todos os seus detalhes, toda a sua beleza, e todo o poder que era capaz de sentir nele. A beleza do escudo era inegável, assim como seu poder; as histórias já falavam por si só e Káfka conhecia todas elas. Mas ver o escudo, poder tocar nele, fez Káfka mudar completamente de opini-ão. Como poderia não aceitar aquela preciosa arma, aquele escudo úni-co? Como poderia dizer “Não”? Quando sua mão tocou o escudo, ele brilhou momentaneamente e Káfka sentiu seu poder fluindo para seu corpo; foi aceito! — Me dê o seu colar – Zander pediu.

Page 25: SacerdoteS 19

O T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o s

25

Sem pensar duas vezes, Káfka tirou o seu colar do pescoço, com to-dos os seus nove pingentes, então o colocou sobre a mesa de Zander. O Guardião pegou o colar e o afastou para um canto da mesa, então abriu uma gaveta ao lado e de lá tirou uma caixa. Káfka sabia o que tinha lá dentro e ficou assombrado. Estava tudo preparado. Ele me conhece melhor que ninguém. Nem mesmo eu imaginei que fosse acei-tar, mas ele já sabia… Foi por isso que mandou trazerem o escudo pa-ra cá e também o… — Este é o seu novo colar! – disse Zander abrindo a caixa cuidado-samente e tirando de dentro um dos nove colares de Cavaleiro, tão be-lo quanto Káfka jamais reparara que eram. Um colar alvo, sem pin-gente algum, pronto para ele começar sua nova etapa de treinamento e conquistar novos pingentes à medida que suas habilidades progredis-sem. Káfka estendeu e pegou o colar, ficando tão admirado quanto fi-cara com o escudo, e, ao colocá-lo no pescoço, foi como dizer “Sim” à proposta do Guardião. — Como eu ia dizendo – continuou Zander abrindo um largo sorriso ao encarar seu mais novo Cavaleiro ‒ Sabe por que eu te escolhi? Káfka não disse nada, apenas balançou sua cabeça de um lado para o outro e esperou pela resposta: — Por causa de sua lealdade inabalável – Zander finalmente respon-deu. – Eu te escolhi porque sei que você jamais me trairia, jamais trai-ria a Magia, pois isso iria contra todos os seus princípios. Seria como trair a si mesmo. É de alguém como você que eu preciso do meu lado: alguém leal!

A dor se espalhava por todo o corpo de Elkens. Ele foi derrotado por Káfka e não havia mais nada o que ele pudesse fazer, mal conseguia se levantar. Elkens sentia um terrível aperto em seu coração, um va-

Page 26: SacerdoteS 19

26

zio, uma mágoa reprimida. Depois de passar por tanta coisa, por tantos perigos e sofrimento, iria ser derrotado ali? Não poderia morrer agora, não sem antes ter derrotado todos os Cavaleiros da Magia, mas ele sabia que era impossível derrotar Káfka. A diferença de poder en-tre eles era evidente. Quando começava a perder os sentidos, Elkens ouviu vozes, vozes que pareciam vir de muito longe: — Você não vai encostar nele… — Saia da frente, garota! Só quero acabar com o sofrimento dele. — Não vou deixar você matar o Elkens! — Não se preocupe. Depois de matá-lo, eu matarei você também… — EU NÃO VOU DEIXAR VOCÊ MATAR O ELKENS! Elkens abriu os olhos com esforço. Viu um homem alto e forte se aproximando com um grande escudo. Era Káfka. À sua frente, entre ele e Elkens, estava Laserin, tentando impedi-lo de se aproximar do Sacerdote. Káfka se irritou, então atacou Laserin e a jogou para fora do altar apenas com os braços. O grito da garota ficou ecoando nos ouvidos de Elkens, enfurecendo-o. Káfka se aproximou de Elkens e pisou em suas costas. Ele sentiu o peso Cavaleiro quase quebrando suas costelas, e ele forçava cada vez mais para que isso realmente acontecesse. — Eu te avisei! Eu disse para você ir embora e me deixar o cristal. Mas foi você quem preferiu assim, você escolheu a morte para você e para a garota. Uma lágrima solitária escorreu pelo rosto de Elkens. Aquele não po-dia ser o fim. Traiu a confiança de todos os que creditaram nele. Iria morrer antes de salvar Zander, o Guardião da Magia, e não consegui-ria salvar Laserin também. Káfka os mataria sem piedade.

Page 27: SacerdoteS 19

O T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o s

27

Mas ele não podia deixar isso acontecer. Precisava ao menos salvar Laserin. Era impossível, mas ele queria acreditar que podia, mesmo com todo o peso de Káfka pressionando-o contra o chão. Ele apoiou as duas mãos no chão e tentou se levantar, mas não conseguiu erguer-se um centímetro sequer. — Você ainda quer lutar? – perguntou Káfka. – Não sabe reconhecer a derrota? Káfka forçou ainda mais o pé contra as costas de Elkens, e este sentiu sua dor aumentar. Mas não iria morrer. Estava determinado a não morrer, pois precisava derrotar Káfka e salvar Laserin… Por um segundo seu coração deixou de bater, apenas um único segun-do, então voltou a bater com força total. Elkens foi envolvido miste-riosamente por uma luz verde ao invés de rubra, uma energia que emanava diretamente da sua alma. O Cavaleiro assustou-se com o que viu e saiu de cima de Elkens, recuando alguns passos. A energia verde que ele via envolvendo o corpo de Elkens não era magia de seu colar. Aquilo que Káfka via estava longe de ser considerado magia, era algo muito mais puro e poderoso e que, no momento, apenas duas pessoas em toda Gardwen sabiam reconhecer o que era. Ambas estão nos Do-mínios do Tempo neste momento, sendo que uma delas já está morta há quinze anos. Kalimuns e Morton são os únicos que sabem o que aquela energia verde significa. Definitivamente aquilo não era magia, era algo mais poderoso. Algo até então sem nome, algo que Morton definiria como milagre ou esperança. Definitivamente aquilo não era magia, não ainda, mas será a principal arma de quem puder usá-la. E, neste momento, Elkens pode. A esperança ou milagre, fosse o que fos-se, estava em suas mãos. Esta energia deu forças para Elkens se reerguer, então ficou em pé, de frente para o Káfka. Logo a energia desapareceu, mas Elkens perma-

Page 28: SacerdoteS 19

28

neceu em pé, frente a frente com seu inimigo. Suas energias foram completamente recuperadas, mas isso não era tudo; a esperança voltou ao coração de Elkens e isso é a melhor coisa que pode acontecer no meio de uma batalha. Esperança é o que tem o poder de fazer o vento mudar de direção, fazer com que ele sopre a seu favor; é o que tem o poder de virar o tabuleiro do jogo… — Você ainda pensa em lutar? – perguntou o Cavaleiro rindo. Seu ri-so foi aumentando cada vez mais, ecoando por todo o Templo dos Ca-valeiros. Riu cada vez mais alto, riu como um completo insano. – Vo-cê ainda não entendeu, não é mesmo? Então vou lhe explicar: não adianta você me atacar, pois o meu escudo defende qualquer ataque, por mais potente que ele seja; mas ele não acaba com a magia do ata-que, ele a absorve. É por isso que eu tenho deixado sempre você me atacar primeiro, porque é o poder do seu ataque que o meu escudo ab-sorve e o devolve contra você. Não importa o quão forte o seu ataque seja, ele sempre irá se voltar contra você quando eu quiser. Não fui eu quem te deixou neste estado lastimável, foi você mesmo, com o seu in-crível ataque. Entendeu agora? Agora Elkens compreendia. Era assim que Káfka conseguia reunir tanta magia em tão pouco tempo. Na verdade ele apenas deixava o poder do ataque de Elkens reservado, preparado para lançá-lo de vol-ta. Agora fazia sentido; era por isso também que Káfka nem chegava a usar o seu colar de Cavaleiro, porque ele não precisava. Lutava ape-nas com a sua arma branca e isso já era o suficiente. Mas logo a atenção de Elkens foi desviada. Ele olhou para trás de Káfka, para algo que o Cavaleiro ainda não havia se dado conta: La-serin estava em pé. Um filete de sangue escorria de um pequeno corte na testa, decorrente do último ataque do Cavaleiro. Sua respiração es-tava rápida e em seu rosto estava a pior expressão de raiva que Elkens

Page 29: SacerdoteS 19

O T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o s

29

já vira nele. Então Elkens sorriu ao compreender: a raiva de Laserin fez com que ela adquirisse muito poder em pouco tempo, assim como acontecia com os protetores. Ela estava segurando o cristal com as duas mãos, e dele emanava uma energia branca que a envolvia. Ela estava se preparando para atacar Káfka com o cristal. E por algum motivo medíocre, por algum abençoado descuido de Káfka, ele não chegou a sentir a magia se acumulando logo atrás dele. Talvez fosse sua confiança inabalável de que não poderia ser derrotado, ou talvez fosse obra do poder do próprio cristal, mas o fato é que Káfka real-mente não percebeu, não sentiu a magia atrás dele se acumular de mo-do assustador. — Por que você sorri, Sacerdote da Alma? Será que à beira da morte você perdeu a sanidade? Por acaso não percebeu que não poderá me derrotar? — Não – concordou Elkens sorrindo. – Você está certo: eu não posso te derrotar. Mas há alguém que pode! — Do que você está falando? A confiança desapareceu do rosto do Cavaleiro, sendo substituída por uma expressão de medo. Finalmente percebeu a grande quantidade de magia que se acumulava atrás dele, então virou-se para trás e se depa-rou com Laserin e o cristal. — Você disse que o escudo não é tão poderoso quanto uma relíquia verdadeira – disse Elkens confiante. – Pois agora você será derrotado por uma relíquia verdadeira, uma relíquia da Magia: o Cristal de Quatro Faces! Lentamente Elkens caminhou para o lado, saindo do caminho do ata-que que logo viria. Laserin soltou um grito e liberou toda a energia acumulada, que disparou velozmente contra Káfka. Este teve tempo apenas para se esconder atrás de seu escudo.

Page 30: SacerdoteS 19

30

Por um segundo o escudo de Káfka segurou o ataque, o que fez o co-ração de Elkens gelar, mas no segundo seguinte o escudo foi partido ao meio e Káfka foi atingido em cheio. Houve uma grande explosão, que abalou toda a estrutura do templo, então Káfka foi arremessado contra a parede dos fundos. Elkens se surpreendeu com o que viu: Káfka estava caído de bruços no chão, finalmente derrotado. Ainda estava consciente, mas não agüentaria nem mesmo se levantar. O escudo foi partido em dois pe-daços, e cada um deles estava caído a um lado de Káfka. Laserin der-rotou o primeiro Cavaleiro da Magia! Elkens caminhou lentamente até o Cavaleiro e ajoelhou-se ao seu la-do. — Você foi derrotado, Káfka. Agora me empreste o seu colar para que eu possa abrir o portal e ir atrás do segundo Cavaleiro da Magia. Elkens pegou o colar de Káfka sobre o seu peito, que agora estava to-do machucado. Com o colar em mãos, Elkens caminhou até ficar de frente para o grande arco de pedra, então o colar brilhou e reagiu ao portal, e algo aconteceu. Elkens olhou através do arco de pedra e viu um lugar muito escuro, que não dava acesso ao fim do templo, era ou-tro lugar. O portal foi aberto. Elkens então jogou o colar ao lado de Káfka e chamou por Laserin: — Vamos Laserin, o portal está aberto. Podemos seguir até o segundo Cavaleiro. Mas Laserin não se moveu. Sequer parecia ter ouvido o que Elkens disse. Estava muito preocupada, olhando para o cristal em suas mãos. — Qual é o problema, Laserin? Então a garota lhe mostrou o cristal e Elkens ficou perplexo. O cristal não era mais belo e brilhante como sempre, estava opaco e sem vida. Parecia ter se transformado em pedra.

Page 31: SacerdoteS 19

O T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o sO T e m p l o d o s C a v a l e i r o s

31

— O cristal morreu, Elkens! – disse ela preocupada. Elkens não sa-bia o que dizer. Káfka, mesmo todo machucado e sem forças, soltou uma enorme gargalhada que mais uma vez ecoou por todo o Templo dos Cavaleiros. — Seus tolos – disse ele em meio à gargalhada. – Vocês utilizaram uma relíquia da Magia para atacar uma arma branca. Isso é proibido para evitar que haja lutas entre o mesmo Elemento, portanto a relí-quia deve ser destruída. O cristal de vocês acaba de ser inutilizado, não passa de uma pedra, sem vida e sem poder. Terão de derrotar o se-gundo Cavaleiro da Magia sem ele. As coisas estavam piorando…

Page 32: SacerdoteS 19

32