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Anais Eletrônicos do IV EHECO, Campo Grande, MS, 2017, ISSN 22374310
“SEM PRECONCEITO E DISCRIMINAÇÃO”1: o uso dos desfiles das escolas de samba em sala de aula
Christian Gonçalves Vidal da Fonseca Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC)
E-mail: [email protected]
Ana Carolina Brasil Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC)
E-mail: [email protected]
Resumo Este artigo propõe um novo olhar sobre os desfiles das escolas de samba e os sambas-enredo, vendo estes como fontes possíveis de serem trabalhadas no ensino de História. A partir da década de 1980, houve um amplo estudo acadêmico acerca do ensino de História, emergindo discussões sobre as distintas formas de ensino, as fontes, os métodos e a construção do conhecimento histórico, questionando-se os grandes vencedores, os heróis nacionais, a utilização dos livros didáticos e a relação entre professor e aluno. Nesse passo, as escolas de samba tendem a protagonizar os negros, as mulheres e os indígenas em seus desfiles de carnaval. Levar a cultura popular brasileira para dentro das instituições escolares é um recurso ainda pouco utilizado pelos docentes de história nas salas de aula, mas é uma prática que buscamos potencializar neste artigo. Os desfiles das agremiações carnavalescas e os sambas-enredos criam narrativas acerca de uma temática, podendo ser uma possibilidade de uso em sala de aula, as imagens produzidas pelas escolas de samba não devem ser vistas apenas como ilustração, mas sim, problematizadas e situadas no tempo e espaço. Para a construção do artigo, bebeu-se das contribuições historiográficas de Maria Auxiliadora Schimidt (2004), Antoni Zabala (1998), Circe Bittencourt (2007) e Leandro Karnal (2004). Palavras-chave: Ensino de história. Fontes. Samba-enredo.
I. O Carnaval e o Ensino de História
“Na sala de aula É que se forma um cidadão Na sala de aula Que se muda uma nação Na sala de aula Não há idade, nem cor” (Leci Brandão)2
O samba carrega consigo influências de vários ritmos e povos, principalmente dos
africanos escravizados que atravessaram o Atlântico rumo ao Brasil. Sua emergência no
final do século XIX permite uma disseminação que seria adaptada por diversas regiões
brasileiras, como o samba de roda, samba de enredo, samba de breque, samba de partido
alto, dentre outras formas. As escolas de samba emergem em meados da década de 1920,
porém, estabelecem uma aproximação mais acentuada com o poder público em 1935,
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quando o então prefeito do Rio de Janeiro Pedro Ernesto, legaliza a competição entre as
agremiações carnavalescas.
Em um Estado tradicionalmente autoritário como o brasileiro, cujo diálogo com os extratos sociais mais baixos, pelo menos até a década de 1930, era orientado pelas marretas das reformas urbanas e demais tentativas de impor uma nova ordem ‘civilizada’, o reconhecimento do poder público era também uma vitória contra o preconceito e a discriminação que afligiam não apenas as práticas culturais, mas também os próprios indivíduos pertencentes aos extratos inferiores (PAVÃO, 2008, p. 2).
A Importância do reconhecimento do Estado brasileiro na comemoração do
carnaval em espaço público contribuiu para a legitimação desta prática cultural das
camadas brasileiras que viviam em uma situação socioeconômica desfavorecida. Com
efeito, esse processo de compreensão pelo poder público pode ser interpretado, segundo
aponta o antropólogo Fábio Oliveira Pavão (2008), como uma série de transformações
políticas e ideológicas mais amplas que abarcavam toda a sociedade brasileira,
possibilitando entender à ascensão do samba como identidade nacional. Como resultado,
o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) reconheceu o samba
carioca (partido alto, samba de terreiro e samba-enredo), em 2007, como patrimônio
cultural imaterial do Brasil.
Vale ressaltar que o carnaval ocorre de diversas formas e modos pelo Brasil, sejam
os trios elétricos, o frevo, o maracatu, os ranchos, os blocos e os desfiles das escolas de
samba que não se limitam ao espaço do Rio de Janeiro, mas que também ocorrem em
outras cidades brasileiras, como São Paulo, Santos, Florianópolis, Porto Alegre, Vitória,
Uruguaiana e Manaus.
Os desfiles das escolas de samba procuram contar uma história através de um
enredo, uma trama literária ou fictícia que se materializa em fantasias, alegorias e no
samba-enredo. Logo, desponta como uma ferramenta que pode ser aproveitada em sala
de aula. Diante disso, propõe-se um novo olhar sobre a produção audiovisual das
agremiações carnavalescas, entendendo-as como fontes possíveis de serem trabalhadas
no ensino de História. Embora haja um terreno muito fértil a se explorar, este ainda é
pouco cultivado pelos professores, que tendem a criar uma distância ou preconceito com
elementos que estão próximos ao cotidiano dos alunos, valorizando assim, aquilo que é
tido como tradicional.
Sugerimos então, uma proposta de ensino que contribua na dinâmica e desponte
como mais um recurso que esteja à disposição do docente. Considerando os apontamentos
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da filósofa Elsa Garrido (2001, p. 45), que entende o papel do professor como o
profissional que:
aproxima, cria pontes, coloca andaimes, estabelece analogias, semelhanças ou diferenças entre cultura ‘espontânea e informal do aluno’, de um lado, e as teorias e as linguagens formalizadas da cultura elaborada, de outro favorecendo o processo interior de ressignificação e retificação conceitual.
O docente mediante a esta proposta, deve estar aberto e disposto a vencer a
resistência e a “preguiça pedagógica” que rodeiam nossa carreira profissional. Ou seja,
muitos professores “resistem a trabalhar a História sob a perspectiva das novas
abordagens ou utilizar métodos diferenciados para discutir conteúdos históricos”
(BERGAMO, 2009, p. 4). Tal reflexão endossa o pensamento de Jörn Rüsen, afirmando
que “o ensino de história em sala de aula tem tendido a se tornar uma atividade mecânica”
(2006, p. 13).
Reconhecemos aqui, que o docente, independente da instituição em que está
lecionando, está sujeito a limitações impostas pela estrutura e pelas normas estabelecidas
por esta. Em alguns casos, há um desinteresse de ambas as partes, como destaca Flávia
Eloisa Caimi (2006, p. 18):
Os professores, de um lado, reclamam de alunos passivos para o conhecimento, sem curiosidade, sem interesse, desatentos, que desafiam sua autoridade, sendo zombeteiros e irreverentes. Denunciam, também, o excesso e a complexidade dos conteúdos a ministrar nas aulas de História, os quais são abstratos e distantes do universo de significação das crianças e dos adolescentes. Os alunos, de outro lado, reivindicam um ensino mais significativo, articulado com sua experiência cotidiana, um professor ‘legal’, ‘amigo’, menos autoritário, que lhes exija menos esforço de memorização e que faça da aula um momento agradável.
Mediante esta tensão, Caimi (2006) entende que o professor deve conhecer outras
maneiras de produção e expressão do conhecimento histórico, expandindo os limites dos
livros didáticos e operacionando distintas estratégias para viabilizar a aprendizagem em
sala de aula. Assim, propomos uma abordagem alternativa no âmbito escolar,
aproximando o Ensino de História com os materiais audiovisuais produzidos pelas
escolas de samba. Desfiles estes que ocorrem, geralmente, no mês de fevereiro em
diversas cidades brasileiras e que são transmitidas por algumas emissoras de televisão
que detêm o direito de imagem.
II. Proposta Operacional
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Para a análise de uma composição musical, deve-se compreendê-la como um
artefato estético que permite evidenciar e explorar “seus múltiplos significados [que]
podem flutuar e se deslocar de acordo com as circunstâncias em que emergem e são
recepcionados por diversos ouvintes na sucessão do tempo” (AZAMBUJA, 2011, p. 232).
É valido ressaltar que o professor deve estimular no aluno um “espírito investigativo” que
permita despertar a curiosidade, aproximando o conteúdo da realidade vivida pelos
estudantes, pois segundo Azambuja (2011, p. 229), “os jovens quando vão à escola,
carregam além das suas pesadas mochilas, uma outra bagagem simbólica: um repertório
de ideias, concepções e pontos de vistas, experiências que não devem ser
menosprezadas”.
Tendo em vista que os desfiles são televisionados anualmente num mesmo
período, em rede nacional e de fácil acesso, eles estão disponíveis em plataformas digitais
durante todo o ano, de forma que, em certa medida, se faz presente na realidade de vários
alunos, independente da forma em que são recepcionados por estes, seja positiva ou
negativamente. O professor ao recorrer ao material audiovisual dos desfiles tem a
possibilidade de explorar os mais diversos temas e ainda aproximar as fontes do cotidiano
de seus alunos, seja pela identificação destes com as fontes ou até mesmo pelo acesso a
estas, diversificando tanto os materiais quanto as formas de análise.
As escolas de samba ao longo do século XX abordaram as mais variadas temáticas
que fornecem um subsídio básico com abordagens e ênfase nos campos político, social,
cultural e econômico, auxiliando o docente a explorar temas lúdicos, polêmicos,
históricos e complexos. Nesse sentido, os sambas-enredos podem ser utilizados como
uma ferramenta introdutória de alguns conteúdos, como: História do Brasil, História
regional, transformações do espaço urbano, lendas, tradições, tolerância religiosa e a
pluralidade identitária, ética, racial e sexual. Vale salientar que em alguns períodos
específicos, por exemplo, no carnaval do Rio de Janeiro, as escolas de samba produziram
desfiles que abordaram momentos históricos importantes, como o centenário da abolição
(carnaval de 1988), os 500 anos do Brasil (carnaval de 2000), os 200 anos da Chegada da
Família Real (carnaval de 2008), dentre outras temáticas.
O estudo imagético e sonoro dos desfiles das escolas de samba, considerando o
fato de que estes compõem inúmeras narrativas sobre as temáticas de História e Cultura
afro-brasileira e indígena, apresenta-se como um instrumento que possibilita o
cumprimento das leis 10.639/03 e 11.645/08, que modificam a Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional, obrigando as redes de ensino a incluírem no currículo oficial tais
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temáticas. Esta lei tem como objetivo evidenciar as contribuições políticas, econômicas,
sociais e culturais que os povos africanos e indígenas deixaram e deixam nestas terras.
Para que essa proposta possa ser levada até a sala de aula os professores devem
ter em mente algumas considerações, entre elas o fato de que as escolas de samba
produzem leituras de períodos históricos brasileiros selecionados, carregados de sentido
e intenção. Em seguida, convidamos o leitor a um exercício imagético, compreendendo o
desfile da escola de samba como uma leitura de um livro sonoro. Na capa estão
evidenciadas a logo e o título do enredo, o autor da obra seria o carnavalesco, a
composição das alas as ilustrações deste livro e as capitulações equivalem aos setores.
III. Proposta de Oficina
A proposta de aula oficina em questão pode ser aplicada para alunos do ensino
fundamental e médio, considerando alguns ajustes necessários para as determinadas
faixas etárias. Primeiramente, o docente deve aplicar um questionário investigativo aos
alunos, com o objetivo de uma observação prévia que consista em relevar questões
socioculturais em que os estudantes estão inseridos. Ou seja, “quanto mais o aluno sentir
a história como algo próximo dele, mais terá vontade de interagir com ela, não como uma
coisa externa, distante, mas como uma prática que ele se sentirá qualificado e inclinado a
exercer” (KARNAL, 2008, p. 28). Sendo assim, construímos uma tabela básica que pode
inspirar outros modelos de questionário investigativo pelo professor:
Questionário Sociocultural Investigativo
Idade
Qual o Bairro em que você reside?
Qual o seu passatempo preferido?
Qual emissora de TV você costuma assistir? ( ) Globo ( ) Record ( ) SBT ( ) Band ( ) Outro. Qual _____________
De quais redes sociais você se utiliza? ( ) Facebook ( ) Whatsapp ( ) Twitter ( ) Outro. Qual _______________
Costuma ler livros? Se sim, quais os gêneros pelo qual você mais se identifica?
( ) Comédia ( ) Ficção ( ) Ação ( ) Outro. Qual _______________
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Você costuma acompanhar desfiles das escolas de samba? Comente sobre.
Na sua Casa tem internet? ( ) Sim
( ) Não
Na sua Casa tem TV a Cabo? ( ) Sim
( ) Não
Pretende prestar vestibular ( ) Sim
( ) Não
Você sempre estudou em colégios públicos?
( ) Sim
( ) Não
Tabela 1. Questionário Sociocultural investigativo
O questionário sociocultural investigativo permite ao professor mapear o perfil
dos estudantes e utilizá-lo a favor de suas propostas educacionais em sala de aula. O
modelo aqui apresentado pode e deve ser moldado pelos docentes a fim de atender a
demanda de sua turma. É importante que após a aplicação do questionário, o professor se
atente as nuances das respostas e consiga identificar as carências e as qualificações dos
estudantes, a fim de aproximar o Ensino de História dos desfiles de carnaval.
De acordo com Isabel Barca numa aula oficina deve haver “o desenvolvimento da
competência de interpretação de fontes, em tarefas ao longo da aula” (2004, p. 140).
Amparados nisso, o professor ao montar sua oficina pode seguir alguns passos. Em
primeiro lugar, dividir a turma em grupos e disponibilizar para um debate coletivo as
letras dos sambas-enredos, isto é, o texto musical utilizado pela agremiação para compor
a trilha sonora de seu desfile carnavalesco. Logo, o professor deve instigar o aluno a
questionar a fonte: buscar os autores da obra, perceber o período abordado pela escola de
samba, apontando o contexto da narrativa e da produção escrita. Como exemplo segue o
samba-enredo da São Clemente, que no ano de 2008, desfilou com o enredo “O Clemente
João VI no Rio: a redescoberta do Brasil”.
Enredo: O Clemente João VI no Rio: a redescoberta do Brasil Compositores: Helinho 107, Ricardo Góes, Naldo, Cláudio Filé, Armandinho do Cavaco e Marcelo Santa Clara
No céu brilhou
O azul cintilante refletindo a nobreza Lisboa se enfeitou
Celebrando a união das realezas O povo festejou
Para orgulho da coroa portuguesa O reino então se mudou Meu Rio se transformou
Num grande centro de "Real" beleza Um verdadeiro paraíso tropical
Entrada régias com florais e esculturas
O ritual do beija mão é sem igual O amor impera em sublime poesia
E no palácio a alegria é geral
Com os portos abertos Surgem amigas nações
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Após se depararem com este documento em que realizarão uma primeira análise
coletiva, os alunos receberão algumas imagens selecionadas referentes ao desfile, neste
caso, da São Clemente de 2008. É nesse sentido que o conjunto texto-imagem forma um
sistema complexo, e que é fundamental para a compreensão das condições representativas
em geral (SCHØLLHAMMER, 2002, p. 20). Logo, o aluno deve se atentar a
materialidade visual da narrativa, buscando perceber os símbolos, as cores, os adereços,
possíveis estereótipos, enfim, elementos selecionados pelas escolas de samba para
representar um período histórico proposto. Pode-se observar a segunda etapa a partir das
imagens abaixo selecionadas:
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Imagem 2 – Foto aproximada da Comissão de Frente da São Clemente 2008. À frente, Maria I de Portugal. Ao fundo, seu filho, Dom João VI. Foto: Guilherme Pinto – O Globo.
Imagem 1 - Comissão de Frente da São Clemente 2008 - O Teatro de Maria, a Louca. Foto: Widger Frota.
Roteiro Analítico das Imagens 1 e 2: 1. Autor do Enredo? Nome da Escola de Samba? Nome do carnavalesco? Nome da
Comissão de Frente? 2. Qual período histórico e cenário político a Comissão de Frente da São Clemente se
propõe a apresentar? 3. Que adereços marcam presença na narrativa da escola de samba remetente a Vinda
da Família Real ao Brasil? 4. Quem são os personagens que aparecem nas imagens? 5. Que reflexão se pode extrair a partir das duas imagens? 6. Quais relações se pode estabelecer entre o samba-enredo e as duas imagens?
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Em seguida, os discentes receberão um material, em que o professor pode
selecionar e retirar do livro didático da turma, contendo imagem e texto de um mesmo
período histórico abordado pela narrativa carnavalesca. A partir disso, os alunos devem
se ater, mediante a um roteiro confeccionado pelo professor, a algumas questões: quem
produziu o livro? Quais as abordagens do livro? Qual o conteúdo histórico apresentado?
Qual a relação estabelecida entre texto e imagem? Como é construída a narrativa do livro?
Mediante os exemplos abordados, segue um modelo:
Imagem 3 – Aclamação do Rei Dom João VI. Obra de Debret.
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O livro didático, escreve José Ricardo Oriá Fernandes (2005, p. 122), “exerce um
papel preponderante no desenvolvimento do processo ensino-aprendizagem nas escolas
brasileiras, sobretudo nos estabelecimentos da rede pública de ensino caracterizados pela
Imagem 4 – COTRIM, Gilberto. História & Consciência do Brasil: Da Conquista à independência. 9º Ed. São Paulo: Saraiva, 1995.
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carência de outros materiais de ensino”. Mesmo com a distância que se deve ter com o
livro didático, problematizando-o, não podemos ignorá-lo, pois, conforme ressalta
Fernandes (2005), o livro se apresenta como um objeto multifacetado, de múltiplas
funções e que é ainda muito recorrido pelos docentes de escolas públicas. Considerando
a carência de outros recursos tecnológicos em algumas instituições públicas e visando a
acessibilidade desta proposta didática, o livro didático desponta como uma ferramenta
detentora do saber.
Contudo, os desfiles das escolas de samba demonstram outras narrativas que
enfatizam questões históricas. Dito isso, a partir do último documento entregue ao
estudante, a página do livro didático (imagens 3 e 4), o professor deve dar autonomia para
que os alunos articulem letra, imagens e o texto escrito. Esse exercício vai permitir que o
discente construa um emaranhado de ideias, fazendo uma leitura geral, dando sentidos e
significados aos elementos que compõem a oficina.
As discussões que podem sair das análises dos alunos podem ser as mais variadas.
A aula-oficina será uma introdução para que o docente possa discorrer acerca da transição
entre o período colonial e imperial. Os debates devem evidenciar perspectivas distintas,
buscando a todo o momento relacionar as três linguagens apresentadas: sonora, visual e
textual. Os temas a serem abordados podem ser: A Vinda da Família Real, o cenário da
cidade carioca, a distinção social (trajes), o período escravocrata, as relações econômicas,
políticas e sociais em que Dom João VI, príncipe regente do Brasil, estabelecia com a
Inglaterra e com seu próprio país.
IV. Processo Avaliativo
Após o processo de oficina, o professor geralmente é cobrado pelos alunos acerca
da avaliação quantitativa pelo esforço desempenhado durante a aula. Contudo, alinhado
ao pensamento de Léa Depresbiteris (1998), entendemos que as notas são frequentemente
utilizadas como classificador dos alunos, enfatizando-se comparações de desempenhos,
não se preocupando com a dimensão crítica na qual o estudante atingiu. O docente deve
voltar sua avaliação para um conjunto de processos pensados durante o planejamento da
oficina em que se definiram os objetivos, conteúdos, estratégias de ensino e os critérios
avaliativos. Para Maria Auxiliadora Schmidt e Marlene Cainelli, o docente deve estar
ciente que avaliar se configura sempre em um julgamento de valor e, que nesse sentido,
“[...] é importante que o professor esclareça ao aluno a finalidade e o porquê de sua
avaliação, além de explicar os critérios que serão utilizados para avaliá-lo” (2004, p. 147).
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Desse modo, o professor deve identificar quais foram às habilidades desenvolvidas pelos
estudantes, atentando-se pela maneira em que ele conseguiu relacionar a proposta da
oficina com a sua realidade. Além disso, perceber se o aluno desempenhou as funções
propostas, de análise e interpretação das fontes, juntamente com a percepção e construção
de um produto final pautado nos moldes sugeridos pelo professor, estabelecendo uma
relação entre o conteúdo, o livro didático e os desfiles carnavalescos.
V. Considerações Finais
Por fim, durante a narrativa proposta, buscamos teorizar questões que
possibilitassem aproximar os desfiles das escolas de samba com o Ensino de História sem
se distanciar da realidade do estudante. Entendemos que os debates das questões sociais
e políticas devem ocorrer, e as maneiras pelas quais estas serão abordadas são válidas.
Pensar o carnaval nesse ambiente é refletir acerca de um meio popular pelo qual os
estudantes têm acesso, e pelo qual, muitas vezes enxergam os problemas sociais
existentes materializados pela televisão na forma de um rico material audiovisual.
Além disso, buscamos evidenciar que toda a composição sonora e visual das
escolas de samba e seus respectivos sambas-enredos, podem ser utilizados como uma
alternativa didática ao ensino de história, e que, através de uma análise comparativa entre
o conteúdo destas fontes e o conteúdo do livro didático, a nova proposta não deixa a
desejar em termos de possibilidades e conteúdos ao livro didático, representante de um
recurso metodológico tradicional.
VI. Referências Bibliográficas
AZAMBUJA, Luciano de. “Fado Tropical”: protonarrativas de jovens alunos brasileiros e portugueses, escritas a partir das leituras e escutas de uma canção “engajada”. In: Educação história: teoria e pesquisa. CAINELLI, Marlene; SCHMIDT, Maria Auxiliadora (Org.). Ijuí: Ed. Unijuí, 2011.
BARCA, Isabel. Aula Oficina: do projecto à avaliação. In:______. (Org.). Para uma educação histórica com qualidade. Actas das IV Jornadas Internacionais de Educação Histórica. Braga: Centro de Estudos em Educação e Psicologia, Universidade do Minho, 2004. P. 131-144. BERGAMO, Mayza. O uso de metodologias diferenciadas em sala de aula: uma experiência no ensino superior. 2009. Disponível em: <http://revista.univar.edu.br/downloads/metodologiasdiferenciadas.pdf>. Acesso em: 02 out. 2017.
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