Seminário- A Clínica Com as Psicoses

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FUNDAO EDSON QUEIROZUNIVERSIDADE DE FORTALEZACentro de Cincias da SadeCurso de PsicologiaDisciplina: T.T.P Psicanaltica / M35EFProfessor: Leonardo Jos B. DanziatoAlunos: Francisco Bergson Paulino; Ligia Lcia; Lyse Fortes; Raquel Barbosa

Seminrio: A Clnica com as Psicoses

I. A Etiopatogenia das Psicoses:Lacan avanou as teorias psicanalticas no sentido de dar um norte em relao s Psicoses, pois Freud ainda no tinha noo de como se dava o processo de incio da psicose no sujeito. Freud ainda no tinha essa noo, alis, no tinha ideias concretas de como os sujeitos se organizavam nas estruturas (neurose, perverso, psicose), pois no chegou a elaborar uma teoria que abarcasse a teoria do significante do Nome-do-pai, e Lacan que elabora a teoria dos Significantes e d concretude terica formao estrutural dos sujeitos. Mas podemos observar em Freud, sob a tica da Verwerfung, uma tentativa de explicar como se d a gnese das Psicoses, que diz que a representao pura e simplesmente rejeitada com seu afeto pelo eu (...) (DOR, 2011, p. 89)Para falar sobre psicose, necessrio falar um pouco das outras estruturas. Na neurose e na perverso, o sujeito sabe que castrado, onde fora posto na cultura e na Lei atravs do significante do Nome-do-pai, apesar de a problemtica perversa ser a negao dessa castrao; por isso que o perverso est a desafiar a Lei constantemente. Na psicose, o Nome-do-pai no consegue inserir o sujeito nessa Lei, pois foracludo, ou seja, desviado de seu caminho natural. H uma rejeio do sujeito castrao, ou seja, ele faz de conta que no est sendo castrado, pois existe a ameaa de castrao (j no Autismo no existe esta iminncia de castrao). O Nome-do-pai o significante flico que se apresenta na Metfora Paterna, ou seja, a funo paterna deve balizar essa funo simblica deste significante, para que este possa substituir o significante primordial, que o significante originrio do desejo da me (S1 S2). funo deste significante fazer com que a criana se dirija ao Pai simblico. Nas Psicoses, o significante do Nome-do-pai se apresenta diretamente no Real, j que na neurose se apresenta no Simblico e na perverso no Imaginrio. Da vm as idias delirantes e alucinaes, que so reflexo da incapacidade do sujeito de simbolizar os discursos da cultura.No podemos tomar que a causa primordial da psicose seja a foracluso do Nome-do-pai, pois isto tomado num sentido muito vago. A psicose se d, realmente, na incapacidade de outros significantes fazerem suplncia ao significante do desejo materno, ou seja, o sujeito fica preso s pocas de sua infncia onde estava num gozo completo. O sujeito ainda o Falo da me. A psicose se d no sujeito por uma falha edpica, por um fracasso da funo paterna.

II. Delrios e Alucinaes:Quando o significante da castrao inserido no simblico, o sujeito v o Outro de uma maneira inconsciente. como se o Outro se calasse para o sujeito. Na psicose no, o Outro est presente no Real, ele vive no sujeito de uma forma terrvel e gozadora. O sujeito objeto do Outro, ou seja, o seu fantasma perpassa pelo Outro. Na neurose, o Outro barrado, tornando-se uma falta. J na psicose, no, o sujeito consistente. Podemos ver, principalmente na Parania, a presena deste Grande Outro gozador um exemplo claro o do caso do Deus de Schreber. Da pode tirar a concluso de que o sujeito ainda est preso ao desejo materno, pois que a castrao arranca-lhe desta posio. Este Grande Outro uma reminiscncia do desejo materno, que se reflete nas aes e relaes do sujeito com a cultura. O Outro no est em falta, est presente e Real. No adianta dizer ao psictico que as vozes que ele est ouvindo so coisas de sua cabea, pois de fato ele ouve estas vozes imperativas que vm de algum ponto do universo.Para entender-se bem sobre esta questo, podemos fazer uma diferenciao entre fala e voz. A fala tem um endereamento ao outro, e a voz pode ser ouvida livremente. Segundo Quinet (2011), a fala inicia um circuito de comunicao, onde se fala, se escutado e, portanto, compreendido. A fala articula os significantes em uma significao. A voz aquilo que escapa significao, a derrapada do discurso e no est ligada a um registro sensorial. A voz o real do significante, ou seja, digamos que a voz seja impossvel de ser simbolizada. Da pode dizer que a fala indagada ao sujeito pelo Simblico e a voz atravs do Real, j que o Real o no-senso, o no simbolizvel, o pulsional. Diz-nos Quinet que: essa voz que aparece na alucinao com um objeto do Outro a voz do Outro. A voz alucinada mostra bem a caracterstica do objeto a de ser amboceptor, segundo uma expresso de Lacan, pois se encontra em um lugar topolgico situado entre o sujeito e o Outro sem pertencer a nenhum deles. (2011, p. 68)As alucinaes visuais tm a mesma gnese que as alucinaes auditivas, posto que os significantes so elaborados pelos sistemas de percepo da viso. A voz aparece em forma de imagem, toma torno e formas. Pelo fato de o significante paterno ter sido foracludo, o retorno pulsional do psictico se d no Real (delrios e alucinaes), j que no neurtico o retorno se d no Simblico (sintoma) e no perverso no Imaginrio (fetiche).As ideias delirantes eclodem de forma paranica no Real porque o sujeito no tem acesso ao Simblico. Vemos novamente o aparecimento do Grande Outro, que comanda as aes do psictico. Existem alguns tipos de delrios que so catalogados pela psiquiatria, como delrios persecutrios, delrios de grandeza, delrios de cime patolgico, delrios amorosos, delrios somatoformes, entre outros. O psictico no duvida de seu delrio, aquilo real. No adianta dizer que aquilo uma fico, pois o psictico no titubeia, diferente do neurtico, que duvida, muitas vezes, da sua condio fantasstica. Muitas vezes o delrio um fato ilgico e no possui consistncia discursiva. Se for perguntado ao psictico por que aquela voz est lhe clamando, ele no sabe dizer por que, apenas diz que aquilo est acontecendo e lhe invadindo.

III. A Clnica das Psicoses?O tratamento das Psicoses no impossvel. Freud, em sua obra, fala que seria difcil prometer uma cura aos pacientes psicticos atravs de uma anlise, j que, para ele, pacientes psicticos no tinham capacidade de elaborar a transferncia. Jacques Lacan vem complementar esta posio freudiana no sentido de dar um suporte analisabilidade do psictico. Lacan diz que se um analista pegar um pr-psictico em anlise, este se tornar um psictico, mas reitera que os psicanalistas no devem recuar diante de um psictico. Mas sabemos que dever do analista conduzir a anlise e no de conduzir o paciente. Portanto cabe ao analista decidir se aceita ou no o paciente.Lacan diz que a prtica da anlise com psicticos est pautada nas manobras transferenciais e na precauo na utilizao da tcnica analtica. O psicanalista francs, em seu seminrio O eu na teoria de Freud e na tcnica da Psicanlise (1954-1955), elabora o Esquema L:

Jacques Lacan diz que a compreenso qual o sujeito pode chegar sobre sua condio (neurose ou psicose) e que no grfico est indicada pela letra S depende do que acontece no Outro indicado no grfico pela letra A. (CABAS, 1988, p. 168)Quando o sujeito se encontra com seus objetos (a) ele pode perceber se se organiza na via da neurose quando estes objetos tm a capacidade de serem reflexo do Eu (a) enquanto instncia. Do contrrio, seria um possvel caso de psicose.Diante destas afirmaes, podemos usar a fala de Quinet:H psicticos que procuram os analistas, ainda que seja por orientao mdica, ou seja, sua demanda de anlise vem de um outro, mas se o psictico vem uma vez, volta uma segunda e continua vindo, cabe ao analista detectar a demanda que ele lhe dirige como efeito de sua oferta. O analista oferece-lhe a oportunidade de falar e de falar do que quiser sem pressuposto algum. (2011, p. 132) Vemos na fala deste autor que mesmo com uma demanda dirigida por um outro, o sujeito psictico se dirige a uma anlise com suas prprias demandas, mesmo que essas demandas sejam barradas pelo silncio. A demanda do psictico pode vir de duas instncias: da instncia do Simblico ou da instncia do Real. Quando a demanda vem do Simblico, podemos constatar que o psictico sente a falta da castrao, da Lei. Quando a demanda vem do Real, o psictico sofre com seus delrios e alucinaes. Podemos notar um discurso objetalizado: doutor, cure-me, faa com que as vozes e as vises desapaream. Percebemos que o psictico pode se pautar numa demanda de cura.Na Manobra da Transferncia, o analista deve usar de artifcios que balizem a falta simblica que o sujeito psictico apresenta, pois este pode por muitas vezes desviar-se do caminho da anlise, onde o analista precisa exercer uma postura, digamos, castradora. O analista deve dizer no ao gozo do psictico (gozo que aparece constantemente na clnica dos psicticos). Esta postura de dizer no ao gozo do psictico uma tentativa de fazer suplncia ao significante faltoso neste. Em linhas gerais, o analista toma uma postura que visa inserir o sujeito na cultura, ou seja, uma postura de castrao edpica, aquela que deveria ter sido exercida pela funo paterna.Lacan diz que o analista o secretrio do psictico, pois confessa a impotncia do alienista diante do gozo e dos discursos do alienado. Este secretariado baseia-se no fato de o analista saber escutar aquilo que os psicticos manifestam de sua relao com o significante e de ser testemunha da relao do sujeito com o Outro. (QUINET, 2011, p. 136) Mas, o analista pode se tornar objeto da erotomania do psictico, assim como aconteceu com Flechsig e Schreber. Existe uma linha tnue entre estas posies, pois o psicanalista torna-se o Outro absoluto da relao analtica. O analista deve orientar seu paciente na direo da cura, fazendo com que o Outro no barrado se transmute para o Outro barrado: A A. Para Quinet:(...) Isto significa promover o esvaziamento do Outro, provocar a falta no Outro, criando condies para fazer advir o significante e barrar o gozo proibido quele que fala. Se a nica maneira de cingir o Real por intermdio do Simblico, pela fala que algo de esvaziamento do gozo pode vir a se produzir. (2011, p.138)Diante deste excerto vemos que se o Outro se esvaziar, o gozo se esvazia consequentemente, posto que o Outro absoluto e goza do psictico constantemente.Pode-se dizer que a anlise obteve sucesso quando o sujeito psictico percebe que o Outro diferente do Outro materno, que est inserido em seu prprio corpo. O analista deve tomar cuidado para no tomar a postura deste Outro materno, que goza de seu corpo e de um saber absoluto. Se o psicanalista toma esta posio pode vir a fabricar uma fantasia com o paciente, ou seja, constituir um delrio a dois; ou pior, de ser morto por ele (...). (QUINET, 2011, p. 139)A tarefa analtica deve intervir no sentido de manter o sujeito psictico na linguagem e balizar o seu Real como o Simblico do neurtico.

IV. Curvel e IncurvelA questo da cura em psicanlise um tema de grande relevncia a ser discutido, visto que, o sujeito em sofrimento psquico que procura o analista, o faz com uma demanda de cura. Segundo Nasio (1999), tal demanda , inclusive, imprescindvel ao incio do processo analtico e responsvel pela emergncia do sujeito suposto saber, piv da transferncia. Entretanto, tambm, sabido que o analista no deve pretender a cura como o objetivo principal da anlise, mas, apenas como um efeito secundrio a ser esperado do processo.Nesse sentido, vlido questionar a respeito de qual cura a psicanlise trata e com qual incurvel o analista deve lidar. Estes questionamentos, para Quinet (2011), so fundamentais para sabermos aquilo que impossvel de se esperar como cura na psicose e aquilo que se pode esperar de seu tratamento, atravs do discurso analtico. Pois, a clnica com as psicoses nos mostra particularidades que as diferenciam em diversos aspectos da clnica com as neuroses. Dentre tais particularidades pode-se citar a dimenso de ciframento do sintoma na neurose e do delrio na psicose; o lugar do significante do Nome-do-pai, alm da forma como o processo transferencial se d. Segundo Quinet (2011), a psicanlise no pode prometer a cura no caso de psicose, pois, o deciframento do delrio no possibilita a sua suspenso, mas, permite, apenas, o seu esclarecimento. A formao delirante, ao contrrio do que se imagina ser um produto patolgico, uma tentativa de reestabelecimento. Portanto, pretender a cura do delrio no possvel, pois, ele mesmo j uma tentativa de cura da foracluso do Nome-do-pai. Enquanto que no processo analtico com a neurose o sintoma decifrado como uma mensagem cifrada de um gozo sexual inconsciente sendo mensagem por ser sempre dirigida ao Outro , na psicose o contedo do delrio no cifrado. Isto ocorre porque o delrio desvelado. Segundo Quinet (2011), o deciframento no pode ser conjugado ao delrio, pois, como afirma Lacan, na psicose o inconsciente est a cu aberto. Quinet (2011) afirma que o incurvel para o neurtico a falta, que equivalente prpria diviso do sujeito, enquanto que para o sujeito psictico o incurvel a foracluso do Nome-do-Pai. Portanto, o analista no pode prometer inserir este sujeito na norma flica, ou seja, no se pode transformar um sujeito psictico em um sujeito neurtico. Porm, isto no inviabiliza os efeitos teraputicos na anlise com psicticos:Se o delrio o que corresponde ao sintoma na psicose, sua funo de suplncia na estrutura nos indica que a direo de cura com o sujeito psictico no est na suspenso do sintoma. Pois este traz um apaziguamento patente do gozo ao qual o sujeito est submetido. Contrariamente, em muitos casos, trata-se de dar a oportunidade ao sujeito de reconstruir uma realidade que forosamente ser distinta de uma realidade comandada pelo Nome-do-pai, da ser denominada delirante. (QUINET, 2011, p. 105) possvel, portanto, perceber que na clnica com as psicoses, o psicanalista deve considerar que o delrio uma tentativa de cura. Ento, o curvel na psicose relaciona-se tentativa de barrar, delimitar o gozo que invade o sujeito. No se trata de o analista delirar com o paciente. Trata-se, antes, de usar o recurso da linguagem na direo de cifrar o gozo, significantizar o real (QUINET, 2011, p.105)

Referncias bibliogrficasCABAS, Antonio Godino. A funo do falo na loucura. Campinas, SP: Papirus, 1988.DOR, Jol. O pai e sua funo em psicanlise. Rio de Janeiro: Zahar, 2011.NASIO, Juan-David. Os grandes casos de psicose. Rio de Janeiro: Zahar, 2001.NASIO, Juan-David. Como trabalha um psicanalista? Rio de Janeiro, Jorge Zahar, 1999. QUINET, Antonio. Teoria e clnica da psicose. Rio de Janeiro: Forense Universitria, 2011.