Semiologia 12 nefrologia - diagnóstico sindrômico em nefrologia pdf

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Arlindo Ugulino Netto; Luiz Gustavo Barros; Yuri Leite Eloy – NEFROLOGIA – MEDICINA P8 – 2011.1 1 MED RESUMOS 2011 NETTO, Arlindo Ugulino. SEMIOLOGIA DIAGNÓSTICO SINDRÔMICO EM NEFROLOGIA (Professora Cecília Neta Alves) A nefrologia uma a especialidade mdica que se ocupa do diagnstico e tratamento clnico das doenas do sistema urinrio, em especial o rim (a urologia se ocupa, principalmente, do tratamento das doenas do trato urinrio). A origem etimolgica da palavra vem do grego (nephros, rim + logos, tratado ou estudo), sendo nefrologia o estudo dos rins, de sua fisiologia e enfermidades do nfron, a unidade morfolgica e funcional do rim. A nefrologia se ocupa no apenas ao estudo das afeces dos rins, mas tambm analisa uma abordagem geral de todos os outros sistemas. Isso porque, como se sabe, as principais patologias nefrolgicas repercutem no funcionamento dos demais rgos. De fato, o diagnstico de algumas patologias exige no s uma abordagem clnica, como necessita da associao de outros exames complementares, o que inclui desde anlises laboratoriais at bipsias renais. Por esta razo, necessrio ao estudante de medicina a capacidade bsica de estabelecer um diagnóstico sindrômico em nefrologia, unindo as mais variveis caractersticas clnicas de um paciente com suspeita de uma determinada afeco renal e, em seguida, estabelecer um ou mais provveis diagnsticos e excluir outros. CONSIDERAES GERAIS O termo síndrome, por definio, diz respeito ao conjunto de sinais e sintomas que caracterizam uma determinada doena. Partindo deste pressuposto, devemos revisar o conceito de sinais e sintomas: Sinais: manifestaes clnicas que podem ser verificadas de uma maneira objetiva, avaliada diretamente pelo mdico. Sintomas: manifestaes clnicas que so notificadas de maneira subjetiva, a depender da descrio do paciente. Portanto, a propedutica diagnstica em nefrologia deve seguir alguns passos para alcanar os seus objetivos teraputicos e curativos: (1) Coleta do exame clnico minucioso do paciente (2) Anlise dos sinais e sintomas apresentados (3) Diagnstico sindrmico (4) Diagnstico etiolgico (5) Anlise do grau do dano (acometimento anatmico e/ou funcional) (6) Traar plano teraputico adequado. SINAIS E SINTOMAS NEFROLGICOS De uma maneira geral, os sinais e sintomas que compem a maioria das sndromes nefrolgicas so inespecíficos, isto , podem estar presentes em diversas doenas, o que dificulta o diagnstico clnico quando eles so analisados de forma isolada. Contudo, quando analisados em conjunto e associados a outros dados complementares (laboratoriais ou de imagem), podem estabelecer diagnsticos sindrmicos exatos. Os principais sinais e sintomas em nefrologia – e seus respectivos conceitos – so: Anúria: diurese inferior a 100 mL/dia. Ocorre na obstruo bilateral das artrias renais ou dos ureteres e na necrose cortical bilateral. Polaciúria: consiste no aumento da necessidade de urinar e, com isso, da frequncia urinria diurna, com o intervalo entre as mices inferior a 2 horas, sem que haja concomitante aumento do volume urinrio. As principais causas de polaciria so: Urina residual (obstruo infravesical por HPB) Processos infecciosos/corpo estranho Tenso nervosa Fibrose vesical Queda da complacncia vesical. Poliria Poliúria: consiste no aumento do volume urinrio (volume urinrio superior a 2500 mL por dia). Como o volume de cada mico est limitado pela capacidade vesical, verifica-se um maior nmero de mices, inclusive noite. Os dois mecanismos bsicos de poliria so por diurese osmótica (decorrente da excreo de um volume aumentado de solutos, determinando maior excreo de gua, como na diabetes mellitus) ou por incapacidade de concentração urinária (diabetes insipidus, hipopotassemia).

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MED RESUMOS 2011NETTO, Arlindo Ugulino.SEMIOLOGIA

DIAGNÓSTICO SINDRÔMICO EM NEFROLOGIA(Professora Cecília Neta Alves)

A nefrologia � uma a especialidade m�dica que se ocupa do diagn�stico e tratamento cl�nico das doen�as do sistema urin�rio, em especial o rim (a urologia se ocupa, principalmente, do tratamento das doen�as do trato urin�rio). A origem etimol�gica da palavra vem do grego (nephros, rim + logos, tratado ou estudo), sendo nefrologia o estudo dos rins, de sua fisiologia e enfermidades do n�fron, a unidade morfol�gica e funcional do rim.

A nefrologia se ocupa n�o apenas ao estudo das afec��es dos rins, mas tamb�m analisa uma abordagem geral de todos os outros sistemas. Isso porque, como se sabe, as principais patologias nefrol�gicas repercutem no funcionamento dos demais �rg�os.

De fato, o diagn�stico de algumas patologias exige n�o s� uma abordagem cl�nica, como necessita da associa��o de outros exames complementares, o que inclui desde an�lises laboratoriais at� bi�psias renais. Por esta raz�o, � necess�rio ao estudante de medicina a capacidade b�sica de estabelecer um diagnóstico sindrômico em nefrologia, unindo as mais vari�veis caracter�sticas cl�nicas de um paciente com suspeita de uma determinada afec��o renal e, em seguida, estabelecer um ou mais prov�veis diagn�sticos e excluir outros.

CONSIDERA��ES GERAISO termo síndrome, por defini��o, diz respeito ao conjunto de sinais e sintomas que caracterizam uma

determinada doen�a. Partindo deste pressuposto, devemos revisar o conceito de sinais e sintomas: Sinais: manifesta��es cl�nicas que podem ser verificadas de uma maneira objetiva, avaliada diretamente pelo

m�dico. Sintomas: manifesta��es cl�nicas que s�o notificadas de maneira subjetiva, a depender da descri��o do

paciente.

Portanto, a proped�utica diagn�stica em nefrologia deve seguir alguns passos para alcan�ar os seus objetivos terap�uticos e curativos: (1) Coleta do exame cl�nico minucioso do paciente (2) An�lise dos sinais e sintomas apresentados (3) Diagn�stico sindr�mico (4) Diagn�stico etiol�gico (5) An�lise do grau do dano (acometimento anat�mico e/ou funcional) (6) Tra�ar plano terap�utico adequado.

SINAIS E SINTOMAS NEFROL�GICOSDe uma maneira geral, os sinais e sintomas que comp�em a maioria das s�ndromes nefrol�gicas s�o

inespecíficos, isto �, podem estar presentes em diversas doen�as, o que dificulta o diagn�stico cl�nico quando eles s�o analisados de forma isolada. Contudo, quando analisados em conjunto e associados a outros dados complementares (laboratoriais ou de imagem), podem estabelecer diagn�sticos sindr�micos exatos.

Os principais sinais e sintomas em nefrologia – e seus respectivos conceitos – s�o: Anúria: diurese inferior a 100 mL/dia. Ocorre na obstru��o bilateral das art�rias renais ou dos ureteres e na

necrose cortical bilateral.

Polaciúria: consiste no aumento da necessidade de urinar e, com isso, da frequ�ncia urin�ria diurna, com o intervalo entre as mic��es inferior a 2 horas, sem que haja concomitante aumento do volume urin�rio. As principais causas de polaci�ria s�o:

Urina residual (obstru��o infravesical por HPB) Processos infecciosos/corpo estranho Tens�o nervosa

Fibrose vesical Queda da complac�ncia vesical. Poli�ria

Poliúria: consiste no aumento do volume urin�rio (volume urin�rio superior a 2500 mL por dia). Como o volume de cada mic��o est� limitado pela capacidade vesical, verifica-se um maior n�mero de mic��es, inclusive � noite. Os dois mecanismos b�sicos de poli�ria s�o por diurese osmótica (decorrente da excre��o de um volume aumentado de solutos, determinando maior excre��o de �gua, como na diabetes mellitus) ou por incapacidade de concentração urinária (diabetes insipidus, hipopotassemia).

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Noctúria/nictúria: embora sejam termos sinônimos para a maioria das literaturas, alguns autores defendem que a noctúria define o aumento da frequência miccional durante a noite, enquanto que a nictúria define apenas a presença de micção noturna além do normal (mais de duas micções por noite). Pode ocorrer na fase inicial da insuficiência renal, insuficiência cardíaca ou em hepatopatias. A presença de noctúria sem polaciúria é bastante sugestivo de falência do ventrículo esquerdo (devido ao retorno do líquido do terceiro espaço para o intravascular, que ocorre quando o paciente se deita para dormir, o que aumenta a taxa de filtração glomerular e a produção de urina). As principais causas são:

Lesão renal grave Ingestão de irritantes vesicais próximo ao período

de dormir

ICC Obstrução infravesical Diabetes Mellitus

Disúria: micção associada à sensação de dor, queimor ou desconforto. Ocorre na cistite, prostatite, uretrite, traumatismo geniturinário, irritantes uretrais, reações alérgicas. Consiste no primeiro sintoma de infecção do trato urinário (ITU); a disúria terminal é característica da cistite.

Urgência miccional: a urgência urinária significa a necessidade súbita e imperiosa de urinar, podendo, mesmo, haver esvaziamento involuntário da bexiga. As principais causas são:

Hiperatividade neurogênica Hiperatividade idiopática

Obstrução infra-vesical (50% dos pacientes) Processos inflamatórios vesicais

Hematúria: A hematúria é um achado que, independente da manifestação associada, sempre deve ser valorizada. Significa a presença de sangue na urina, podendo ser micro ou macroscópica. A hematúria pode ser maciça, inclusive com o aparecimento de coágulos. É importante determinar se a hematúria é total (lesões renais ou ureterais), inicial (lesões da uretra distal ou cólon vesical) ou terminal (lesões do trígono vesical). As causas mais importantes são:

ITU Cálculo Hematúria silenciosa (até que se prove o contrário,

é câncer)

Doenças hemolíticas HPB Pós-esforço

Edema: o relato de edema (inchaço) constitui uma manifestação marcante nas doenças renais agudas e crônicas. O edema que surge nas doenças renais resulta de diferentes mecanismos patogênicos e tem características semiológicas próprias.

O edema da glomerulonefrite é generalizado, sendo mais intenso na região periorbitária pela manhã. No final do dia, acomete os membros inferiores. Em crianças, o aparecimento de edema costuma ser súbito, podendo ser acompanhado de manifestações de ICC.

Na glomerulonefrite crônica, a presença e a intensidade do edema são muito variáveis, podendo estar ausente ou manifestar-se apenas como edema periorbitário pela manha.

O edema da síndrome nefrótica é generalizado, mais intenso que na glomerulonefrite, podendo chegar à anasarca, com intenso edema facial. Devido à glomerulopatia, ocorre um aumento da permeabilidade glomerular na síndrome nefrótica, gerando quadros de hipoalbuminemia. Isso reduz a pressão coloidosmótica do plasma, reduzindo o volume plasmático (o que faz, por meio do sistema renina angiotensina, uma maior retenção de H2O, reduzindo ainda mais a pressão coloidosmótica) e aumentando o líquido intersticial (gerando o edema).

O edema da insuficiência renal crônica é muito variável, na dependência da causa determinante. Na insuficiência renal aguda, o edema decorre geralmente da hiper-hidratação.

Dor lombar: comum em várias afecções renais (principalmente quando elas atingem a cápsula renal), mas que deve ser diferenciada de outras patologias osteomusculares e neurológicas.

EXAMES COMPLEMENTARES INICIAISComo forma de enriquecer ainda mais os dados coletados durante o exame clínico, devemos lançar mão de alguns exames

complementares iniciais básicos, seja de urina ou de sangue. Há quem diga que somente através destes dados é que podemos afirmar, com propriedade, que o paciente apresenta uma afecção renal (até porque os sinais e sintomas que constituem as síndromes são, como vimos, muito inespecíficos). Contudo, nunca podemos desvencilhar a clínica dos exames laboratoriais.

Os principais exames complementares em nefrologia são:• Exame de urina• Hemograma• Bioquímica:

Uréia, creatinina Cálcio, fósforo, ácido úrico Na, K, Cl, CO2

• Ultrassonografia renal: descreve apenas alterações anatômicas que podem reportar algum dado clínico; nunca pode estabelecer um diagnóstico de alteração funcional do rim.

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S�NDROMES NEFROL�GICASPodemos destacar, pelo menos, 10 s�ndromes nefrol�gicas cujos sinais e sintomas devem estar sempre

associados e encaixados para o estabelecimento de suspeitas diagn�sticas e, mediante o aux�lio de exames complementares, a institui��o do diagn�stico sindr�mico.

Insufici�ncia Renal Aguda Insufici�ncia Renal Cr�nica S�ndrome Nefr�tica Aguda S�ndrome Nefr�tica Anormalidades Urin�rias Assintom�ticas

Infec��o Urin�ria Obstru��o do Trato Urin�rio S�ndromes Tubulares Renais Hipertens�o Arterial Nefrolit�ase

INSUFICIÊNCIA RENAL AGUDAA insufici�ncia renal aguda (IRA) � caracterizada pela redu��o aguda ou abrupta da filtra��o glomerular, sendo

definida pela perda r�pida de fun��o renal devido ao dano renal, resultando em reten��o de produtos de degrada��o nitrogenados (ur�ia e creatinina) e n�o-nitrogenados, que seriam normalmente excretados pelo rim. � uma doen�a grave e tratada como uma emerg�ncia m�dica.

Seus sinais e sintomas cl�nicos s�o: An�ria ou olig�ria Sinais de sobrecarga de volume Aumento de ur�ia, creatinina, pot�ssio Acidose metab�lica Diminui��o da DCE (depura��o de creatinina end�gena) ou clearence de creatinina, analisado na urina de 24h Presen�a de cilindros granulares escuros (quando o problema � no pr�prio rim)

A insufici�ncia renal, de acordo com a sua causa, pode ser classificada em: pr�-renal (causas relacionadas ao suprimento ou fluxo sangu�neo), renal (dano ao rim propriamente dito, sendo a necrose tubular aguda uma das causas mais comuns) e p�s-renal (causas no trato urin�rio).

A IRA � usualmente revers�vel, se tratada pronta e adequadamente. As principais interven��es s�o a monitoriza��o do balan�o h�drico (ingesta e elimina��o), o mais estritamente poss�vel; a inser��o de um cateter urin�rio � �til para a monitoriza��o do d�bito urin�rio, bem como para aliviar a poss�vel obstru��o � via de sa�da da bexiga urin�ria, tal como em um aumento da pr�stata; dentro outros, incluindo o tratamento da causa.

INSUFICIÊNCIA RENAL CRÔNICAA insufici�ncia renal cr�nica (IRC) � caracterizada pela redu��o lenta da filtra��o glomerular, sendo definida

como uma s�ndrome metab�lica decorrente da perda progressiva, irrevers�vel e geralmente lenta da fun��o dos rins (glomerular, tubular e end�crina).

Seu quadro cl�nico � caracterizado por duas vertentes: Assintom�ticos: a doen�a pode se manifestar de maneira silenciosa. Sintom�ticos:

Uremia: anorexia, n�useas, v�mitos Palidez amarelada (devido a uma anemia importante por defici�ncia de eritropoetina) Volume urin�rio vari�vel Diminui��o da DCE e/ou volume renal ao US (e perda da diferencia��o c�rtico-medular) Hipervolemia: consequ�ncia da expans�o do volume extracelular devido a maior reten��o de s�dio e

�gua, levando a repercuss�es c�rdio-pulmonares, al�m de contribuir para o aparecimento de HAS. Edema: causado pela reten��o de sal e �gua, insufici�ncia card�aca e hipoalbuminemia.

Os pacientes pertencentes ao grupo de risco para o desenvolvimento de insufici�ncia renal cr�nica devem ser submetidos anualmente a exames para avaliar a presen�a de les�o renal. Os exames utilizados para tal finalidade s�o: ur�ia, creatinina, pot�ssio, urina I, clearance de creatinina e protein�rias (ver OBS1).

De acordo com dados publicados pelo Registro Latino-americano de Di�lise e Transplante em 1997, as principais causas de IRC no Brasil eram: glomerulonefrite cr�nica, hipertens�o arterial e diabetes mellitus. Outras causas incluem a nefrite t�bulo-intersticial, necrose cortical, processos obstrutivos, amiloidose, lupus, rins polic�sticos, s�ndrome de Alport, etc.

A partir de 2002, com o intuito de diminuir a incid�ncia da IRC (que cresce em torno de 8%/ano no mundo), a doen�a renal cr�nica (DRC) foi dividida em 5 grupos, sendo o est�gio DRC-5 considerado a “ponta do iceberg”, quando a maioria dos diagn�sticos s�o feitos. Contudo, nesta etapa, por ser um grau de DRC incompat�vel com a vida, o paciente j� necessita de uma terapia renal substitutiva, que pode ser representada por tr�s procedimentos: hemodi�lise, di�lise peritoneal e transplante de rim (sendo esta a melhor op��o).

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OBS1: Uma boa maneira para avaliar a função renal é através da estimativa da filtração glomerular (FG) pela medida da depuração de creatinina, a qual constitui um bom índice da função renal e deve ser utilizada para o diagnóstico de insuficiência renal crônica. A mensuração da filtração glomerular através da coleta de urina de 24 horas tem se mostrado útil na avaliação da função renal, no entanto, esse método não é superior às estimativas provenientes de equações. Isso pode ser explicado por erros durante a coleta de urina de 24 horas e variações diárias na excreção de creatinina. Uma das principais fórmulas para estimar a filtração glomerular é a equação de Cockcroft-Gault:

SÍNDROME NEFRÍTICA AGUDAA síndrome nefrítica é uma afecção renal definida como o aparecimento de edema discreto, hipertensão arterial

e hematúria (geralmente macroscópica). Característicamente, a proteinúria é discreta, sendo menor que 3,0 gramas ao dia. Pode ser causada por vários tipos de glomerulonefrites. A principal causa de todas as anormalidades da síndrome nefrítica é a glomerulonefrite aguda pós-infecciosa (estreptocócica). A síndrome nefrítica envolve apenas a região cortical do rim, isto é, a região onde existem, em maior concentração, as estruturas mais nobres e morfofuncionais deste órgão: os néfrons e os glomérulos.

Etimologicamente, a síndrome nefrítica significa uma resposta inflamatória aguda por deposição de imunocomplexos na membrana basal dos glomérulos renais. Ocorre um aumento da permeabilidade vascular glomerular em resposta ao estímulo inflamatório, gerando a principal característica sintomatológica da síndrome nefrítica: a hematúria macroscópica.

O quadro clínico clássico caracteriza-se por: Hematúria macroscópica (com dismorfismo eritrocitário e/ou cilindros hemáticos) Edema HAS Moderada retenção nitrogenada

OBS2: A presença de dismorfismo eritrocitário é um achado de importante avaliação. Esse dismorfismo diz respeito a uma alteração estrutural da hemácia, e isso ocorre quando a hemácia é proveniente de afecções glomerulares (devido à maior resistência à passagem da célula através do glomérulo, promovendo esta lesão na estrutura do eritrócito). Quando o sangue é proveniente de outra região do trato urinário ou por qualquer outra alteração (lesões por cálculos, tumores, cistites hemorrágicas, etc.), é comum que a hemácia esteja íntegra quando vista ao microscópio.

SÍNDROME NEFRÓTICAA síndrome nefrótica é um conjunto de sinais,

sintomas e achados laboratoriais que se desenvolvem quando ocorre uma elevação exagerada da permeabilidade dos glomérulos renais às proteínas, ocasionando proteinúria.

Na verdade, a síndrome nefrótica não é uma doença; mas sim um grupo de sinais e sintomas comumente observados em pacientes com doenças glomerulares caracterizadas por um aumento significativo da permeabilidade capilar para proteínas séricas, mais do que alterações inflamatórias glomerulares. A principal causa é a nefropatia diabética.

O quadro clássico é caracterizado por: Edema intenso (desequilíbrio entre pressão hidrostática

e pressão oncótica) Proteinúria maciça >3,5g/24h/1,73m2 (albumina) Hipoabuminemia (queda dos níveis séricos de

albumina) Derrames cavitários: ascite, hidrotórax, edema escrotal,

etc. Hiperlipidemia (que poderia ser considerada falsa

quando se parte do pressuposto que os lipídios estão elevados devido a menor concentração de proteínas no sangue; contudo, hoje já se sabe que, no fígado, ocorre um estímulo na produção de lipídios na decorrência de uma síndrome nefrótica).

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OBS3: Podemos diferenciar a s�ndrome nefr�tica e a s�ndrome nefr�tica por alguns par�metros cl�nico-laboratoriais que podem, de certa forma, auxiliar o estudante de medicina a compreender melhor as diferen�as semiol�gicas de cada uma das afec��es:

Síndrome Nefrítica Síndrome Nefrótica↑ Hemat�ria ↓ Hemat�ria

↑ Hipertens�o ↓ Hipertens�o↓ Protein�ria ↑ Protein�ria

Edema pouco intenso (+/4) e localizado Edema intenso (+++/4) e generalizado (anasarca)Fun��o renal diminu�da Fun��o renal normal

↓ Insufici�ncia renal ↑ Efeitos tromboemb�licos e insufici�ncia renal (rara)

ANORMALIDADES URINÁRIAS ASSINTOMÁTICASProtein�ria, hemat�ria ou pi�ria podem ser consideradas anormalidades assintom�ticas, desde que n�o estejam

associadas a uma s�ndrome nefr�tica, nefr�tica, infec��o urin�ria etc. Portanto, as anormalidades urin�rias assintom�ticas caracterizam-se por:

Protein�ria n�o-nefr�tica Hemat�ria Leucocit�ria (pi�ria) Exig�ncia: aus�ncia das outras s�ndromes

INFECÇÃO URINÁRIA� uma das s�ndromes mais comuns encontradas na pr�tica nefrol�gica. A presen�a de dor lombar, febre, dis�ria e

polaci�ria � indicativa de uma infec��o renal. A presen�a apenas de sintomas de irrita��o vesical (dis�ria, polaci�ria) e a aus�ncia de febre e dor lombar refletem geralmente uma infec��o baixa (vesical) do trato urin�rio.

Os crit�rios para diagn�stico de uma infec��o urin�ria j� est�o atualmente bem estabelecidos: presen�a de mais de 100.000 col�nias de bact�rias por ml de urina. Em mulheres com dis�ria, mesmo 100 col�nias/ml podem indicar infec��o. O sedimento urin�rio usualmente apresenta numerosos leuc�citos ou pi�citos e bacteri�ria, sendo este diagn�stico facilitado com os dados obtidos pelas tiras reagentes.

Em resumo, temos: Dor lombar Febre Dis�ria Polaci�ria >100.000 col/ml

OBSTRUÇÃO DO TRATO URINÁRIOA obstru��o do trato urin�rio pode ser causada pela migra��o de um c�lculo at� um local de estenose fisiol�gica,

estenoses patol�gicas de ureter, tumores, etc. O aparecimento abrupto de an�ria requer

sempre a exclus�o de uma obstru��o do trato urin�rio. � uma das considera��es no diagn�stico diferencial de insufici�ncia renal aguda. As obstru��es unilaterais do trato urin�rio, frequentemente por c�lculos, costumam apresentar-se de uma maneira dram�tica, com dor lombar tipo c�lica, bastante intensa, mas de progn�stico bom na maioria das vezes. As obstru��es de aparecimento mais insidioso podem comprometer a parte alta ou baixa do trato urin�rio.• Supravesical: hidronefrose.• Infravesical: reten��o urin�ria e, com o tempo, uretero-hidronefrose bilateral.

Na obstru��o alta, o aparecimento de insufici�ncia renal cr�nica implica um comprometimento bilateral do trato urin�rio, como se verifica numa fibrose retroperitoneal ou por tumores retroperitoneais. O diagn�stico � estabelecido atrav�s de ultra-som e urografia excretora, demonstrando dilata��o do sistema coletor acima da obstru��o, ou atrav�s de pielografia retr�grada. Uma obstru��o baixa do trato urin�rio � habitualmente secund�ria a hipertrofia prost�tica, manifesta atrav�s de res�duo p�s-miccional, diminui��o do jato urin�rio etc.

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SÍNDROMES RENAIS TUBULARESAs anormalidades dos túbulos renais são classicamente divididas em

anatômicas e funcionais. Anormalidades anatômicas referem-se às doenças císticas: rins policísticos, doença medular cística e rim espongiomedular. As nefropatias císticas talvez sejam uma das principais causas de doença renal crônica, pois os cistos múltiplos promovem uma compressão e morte dascélulas renais. Geralmente, o diagnóstico é estabelecido através de urografia excretora, pielografia retrógrada ou arteriografia renal.

As tubulopatias funcionais referem-se a alterações seletivas nos mecanismos na função tubular renal (função de secreção ou reabsorção tubular) ou a um comprometimento na concentração ou diluição urinária.Por exemplo, uma anormalidade na secreção de H+ pelo nefro distal. Distúrbios no mecanismo de reabsorção podem causar hipouricemia, hipofosfatemia, aminoacidúria ou glicosúria. São estas manifestações, como acidose, glicosúria, poliúria ou anormalidades bioquímicas, que permitem o diagnóstico.

OBS4: A síndrome de Fanconi caracteriza-se por uma alteração tubular completa, causando glicosúria, proteinúria, aminoacidúria, etc.

HIPERTENSÃO ARTERIAL SISTÊMICA (HAS)O diagnóstico baseia-se na observação, pelo menos por três vezes

consecutivas, de uma pressão sistólica superior a 140 mm Hg e/ou de uma pressão diastólica acima de 90 mm Hg.

Quanto a sua etiologia, a hipertensão arterial pode ser classificada em essencial ou primária (quando é decorrente de causas não-identificáveis, correspondendo a 90% dos casos) e secundária (quando é possível identificar uma etiologia, como na obstrução da artéria renal ou nos tumores da glândula supra-renal). Afecções renais são as principais causas de HAS secundária, uma vez que o rim é um dos principais centros de controle da pressão arterial: através do balanço hidroeletrolítico e ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona.

Contudo, no que diz respeito à função renal, a hipertensão arterial pode ser tanto decorrente de uma nefropatia primária, como pode causar uma nefropatia secundária. A investigação inicial procura encontrar causas potencialmente curáveis: estenose de artéria renal, feocromocitoma, ou excesso de mineralocorticóide.

Quando uma causa curável não é encontrada (hipertensão arterial essencial), o que ocorre em 90 - 95% dos casos, institui-se uma terapêutica médica farmacológica e não-farmacológica a longo prazo.

NEFROLITÍASEÉ bastante frequente o quadro de cólica nefrética secundária a um cálculo que obstrui o sistema coletor de urina.

As causas de urolitíase são múltiplas e vão desde estados hipercalcêmicos (como hiperparatireoidismo primário), estados hipercalciúricos (como hipercalciúria idiopática), hiperuricosúria, cistinúria, até processos inflamatórios do intestino.

O diagnóstico é obtido a partir da notificação da eliminação do cálculo, visualização do mesmo por exame de imagem (US, radiografia simples ou tomografia) ou por sua remoção cirúrgica. Uma vez reconhecida a síndrome, procede-se à avaliação funcional e identificação específica da enfermidade.

Hidronefrose (dilatação do sistema coletor) por cálculo evidenciada pela US: na junção uretero-piélica, há uma imagem muito ecogênica, o que seria, provavelmente, um cálculo. A espessura doparênquima está conservada.