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DEFENSORIA REGIONAL DE DIREITOS HUMANOS NO ESPÍRITO SANTO Avenida César Hilal, nº 1293 Bairro Santa Lúcia, CEP: 29.056-083 - Vitória / ES. Telefone: (27) 3145-5600/5615/5616. Plantão: (27) 98125-0036 1 de 19 SENHOR(A) JUIZ(ÍZA) FEDERAL DA ___ VARA FEDERAL DE VITÓRIA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO (PAJ/DPU n. 2017/017-00732) DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO, por seu órgão de execução, no exercício das suas funções constitucionais (CF/88, art. 134, caput) e legais (LC 80/94 e LC 132/09), na figura do Defensor Regional de Direitos Humanos, vem, perante Vossa Excelência, com base no art. 1º, IV e art. 5º, II da Lei 7.347/1985; art. 4º, VII da LC 80/94; art. 7º, XVIII e art. 201, II da CF/88; art. 71 e seguintes da Lei 8.213/1991 c/c art. 93 e seguintes do Decreto 3.048/1999, propor a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA c/c Pedido de Tutela Provisória de Urgência em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS), autarquia previdenciária federal, situada na Rua Pedro Fonece, s/nº, Bairro Ilha de Monte Belo, Vitória/ES, CEP: 29.040-570, devidamente representada pela Advocacia- Geral da União, via Procuradoria Federal, pelos motivos de fato e de direito a seguir expostos.

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DEFENSORIA REGIONAL DE DIREITOS HUMANOS NO ESPÍRITO SANTO

Avenida César Hilal, nº 1293 – Bairro Santa Lúcia, CEP: 29.056-083 - Vitória / ES. Telefone: (27) 3145-5600/5615/5616. Plantão:

(27) 98125-0036

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SENHOR(A) JUIZ(ÍZA) FEDERAL DA ___ VARA FEDERAL DE VITÓRIA –

SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO

(PAJ/DPU n. 2017/017-00732)

DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO, por seu órgão de execução, no exercício

das suas funções constitucionais (CF/88, art. 134, caput) e legais (LC 80/94 e

LC 132/09), na figura do Defensor Regional de Direitos Humanos, vem, perante

Vossa Excelência, com base no art. 1º, IV e art. 5º, II da Lei 7.347/1985; art. 4º,

VII da LC 80/94; art. 7º, XVIII e art. 201, II da CF/88; art. 71 e seguintes da Lei

8.213/1991 c/c art. 93 e seguintes do Decreto 3.048/1999, propor a presente

AÇÃO CIVIL PÚBLICA

c/c Pedido de Tutela Provisória de Urgência

em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS), autarquia

previdenciária federal, situada na Rua Pedro Fonece, s/nº, Bairro Ilha de Monte

Belo, Vitória/ES, CEP: 29.040-570, devidamente representada pela Advocacia-

Geral da União, via Procuradoria Federal, pelos motivos de fato e de direito a

seguir expostos.

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I. RESUMO DOS FATOS

A Defensoria Pública da União, no desempenho de suas funções

institucionais, se deparou com diversos casos em que o INSS tem negado,

administrativamente, pedidos de pagamento retroativo de verbas de salário

maternidade a mulheres demitidas durante a gravidez com violação à

estabilidade do art. 10, II, “b”, do Ato das Disposições Constitucionais

Transitórias.

Para a autarquia previdenciária, na medida em que o empregador

indevidamente violou a estabilidade da gestante, deve ele e não a Previdência

Social arcar com os custos diretos do pagamento do benefício, nos termos do

art. 72, § 1º, da Lei 8.213/1991 e art. 94 do Decreto n. 3.048/1999, in verbis:

Art. 72 [...] § 1o Cabe à empresa pagar o salário-maternidade devido

à respectiva empregada gestante, efetivando-se a compensação,

observado o disposto no art. 248 da Constituição Federal, quando do

recolhimento das contribuições incidentes sobre a folha de salários e

demais rendimentos pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa

física que lhe preste serviço. [...]

Art. 94. O salário-maternidade para a segurada empregada consiste

numa renda mensal igual à sua remuneração integral e será pago

pela empresa, efetivando-se a compensação, observado o disposto

no art. 248 da Constituição, quando do recolhimento das

contribuições incidentes sobre a folha de salários e demais

rendimentos pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física

que lhe preste serviço, devendo aplicar-se à renda mensal do

benefício o disposto no art. 198.

Todavia, a argumentação da referida autarquia não encontra amparo

no Ordenamento Jurídico, como ficará claro em seguida.

Tanto é assim que o Ministério Público Federal em Niterói ingressou

com Ação Civil Pública sobre a mesma temática – processo n. 0001662-

85.2004.4.02.5102 (2004.51.02.001662-4) –, no qual logrou procedência para

alterar a exigência em questão, com efeitos que foram limitados, quando do

julgamento da apelação autárquica, ao Estado do Rio de Janeiro.

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Nesse contexto, a presente ação civil pública pretende estender, por

apreço à isonomia, a mesma proteção previdenciária às grávidas do restante do

país, independentemente do ingresso de processo individual.

II. FUNDAMENTAÇÃO

1. ESPÉCIES DE PROTEÇÃO À TRABALHADORA GRÁVIDA

Antes de adentrar verdadeiramente no tema desta ACP, é necessário

ressaltar os diferentes tipos de proteção previstos na legislação às gestantes.

A primeira é a licença maternidade, prevista no art. 392 e seguintes

da CLT, que garante às grávidas o direito de se licenciarem por 120 dias, sem

prejuízo do emprego e do salário. Garantia que encontra amparo no art. 7º, XVIII

da CF/88. Aqui se fala em proteção trabalhista, um meio que garante à

empregada o seu trabalho entre o 28º dia antes do parto até a ocorrência do

mesmo. Tal licença pode, ainda, sofrer ampliação de mais 60 dias de duração,

caso o empregador enquadre-se no Programa Empresa Cidadã, previsto no art.

1º, I da Lei 11.770/2008.

A segunda é a estabilidade gravídica, estabelecida no art. 10, II, “b”

do ADCT, que veda a demissão da trabalhadora grávida, desde a confirmação

da gravidez até 05 meses após o parto. Esta é mais uma espécie de proteção

trabalhista que o legislador decidiu conferir às gestantes. Tanto é assim que a

gestante não pode renunciar ou transacionar, em seu próprio “prejuízo” tal

garantia constitucional, como afirmou o TST na OJ 30 da SDC:

OJ-SDC-30. ESTABILIDADE DA GESTANTE. RENÚNCIA OU TRANSAÇÃO DE DIREITOS CONSTITUCIONAIS. IMPOSSIBILIDADE (republicada em decorrência de erro material) – DEJT divulgado em 19, 20 e 21.09.2011 Nos termos do art. 10, II, "b", do ADCT, a proteção à maternidade foi erigida à hierarquia constitucional, pois retirou do âmbito do direito potestativo do empregador a possibilidade de despedir arbitrariamente a empregada em estado gravídico. Portanto, a teor do artigo 9º da CLT, torna-se nula de pleno direito a cláusula que estabelece a possibilidade de renúncia ou transação, pela gestante, das garantias referentes à manutenção do emprego e salário.

A terceira forma de proteção é o salário maternidade, objeto da

presente demanda judicial, que, diferentemente das duas anteriores, possui

natureza previdenciária. Sua positivação advém do art. 71 da Lei 8.213/1991 c/c

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art. 93 do Decreto 3.048/1999. Assim, é devido à segurada da Previdência Social

o benefício em questão, durante 120 dias, com início entre 28 dias antes do parto

e a data de ocorrência do mesmo. Vale lembrar que cabe prorrogação, nas

hipóteses previstas na legislação.

Apesar de os períodos protetivos acima poderem coincidir, seus

fundamentos jurídicos não se confundem: no campo previdenciário, a Lei busca

a proteção frente a um risco social constitucionalmente previsto no art. 201, II,

da CF/88, segundo o qual a Previdência Social atenderá a proteção à

maternidade, com especial atenção à gestante.

É justamente tal benefício previdenciário que tem sido indevidamente

negado pelo INSS apenas pelo fato da trabalhadora ter sido demitida durante a

estabilidade gravídica constitucional, sob a escusa de que essa proteção deveria

ser buscada, na seara trabalhista, perante a empregadora em mora.

2. PROTEÇÃO INTERNACIONAL À MATERNIDADE

Há muitos anos a comunidade internacional tem se preocupado com

as condições de trabalho das mulheres, em especial, a desigualdade existente

entre os gêneros quanto à remuneração e entre outros aspectos. Para tanto,

foram criados alguns instrumentos de proteção e promoção de igualdade.

Entre esses mecanismos, é possível destacar: (a) a Convenção 89

da OIT (promulgada pelo Decreto 41.721/1957), que proíbe o trabalho noturno

das mulheres na indústria; e (b) a Convenção 103 da OIT (promulgada pelo

Decreto 58.820/1966), que trata do amparo à maternidade, em que é prevista a

licença de maternidade (art. III, “1”), com duração mínima de 12 semanas (art.

III, “2”), sendo que a licença após o parto não será inferior a 06 semanas (art. III,

“3”).

Essa última Convenção vai além, prevendo em seu art. IV, minudente

proteção à maternidade que:

1. Quando uma mulher se ausentar de seu trabalho em virtude dos dispositivos do artigo três acima, ela tem direito a prestações em espécie e a assistência médica. 2. A percentagem das prestações em espécie será estipulada pela legislação nacional de maneira a serem suficientes para assegurar plenamente a subsistência da mulher e de seu filho em boas condições de higiene e segundo um padrão de vida apropriada.

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3. A assistência médica abrangerá assistência pré-natal, assistência durante o parto e assistência após o parto prestado por parteira diplomada ou por médico, e bem assim a hospitalização quando fôr necessária; a livre escôlha do médico e livre escôlha entre um estabelecimento público ou privado serão respeitadas. 4. As prestações em espécie e a assistência médica serão concedidas quer nos moldes de um sistema de seguro obrigatório quer mediante pagamento efetuados por fundos públicos, em ambos os casos serão concedidos de pleno direito a tôdas as mulheres que preencham as condições estipuladas. 5. As mulheres que não podem pretender, de direito, a quaisquer prestações, receberão apropriadas prestações pagas dos fundos de assistência pública, sob ressalva das condições relativas aos meios de existência prescritas pela referida assistência. 6. Quando as prestações em espécie fornecidas nos moldes de um sistema de seguro social obrigatório são estipuladas com base nos proventos anteriores, elas não poderão ser interiores a dois têrços dos proventos anteriores tomadas em consideração. 7. Tôda contribuição devida nos moldes de um sistema de seguro social obrigatório que prevê a assistência à maternidade e tôda taxa calculada na base dos salários pagos, que seria cobrada tendo em vista fornecer tais prestações, devem ser pagas de acôrdo com o número de homens e mulheres empregados nas emprêsas em apreço, sem distinção de sexo, sejam pagas pelos empregadores ou, conjuntamente, pelos empregadores e empregados. 8. Em hipótese alguma, deve o empregador ser tido como pessoalmente responsável pelo custo das prestações devidas às mulheres que êle emprega.

Destaque-se que, segundo o parágrafo oitavo, acima mencionado

“Em hipótese alguma, deve o empregador ser tido como pessoalmente

responsável pelo custo das prestações devidas às mulheres que êle emprega”.

Assim porque não pode a proteção em comento depender de contingências

econômicas de particulares, mas deve ser garantida por toda a sociedade da

maneira mais eficiente possível. É certo que a mesma Convenção 103 da OIT

protege a empregada de ser demitida enquanto durar a licença à maternidade

(art. VI), mas isso não implica qualquer redução na proteção previdenciária, caso

haja violação dessa norma pelo empregador.

No âmbito internacional, tem-se também que a Declaração Universal

dos Direitos Humanos da ONU, em seu art. 25º, parágrafo 2º, estatui que “A

maternidade e a infância têm direito a ajuda e a assistência especiais. Todas as

crianças, nascidas dentro ou fora do matrimônio, gozam da mesma proteção

social”.

E como não poderia deixar de ser diferente, no sistema regional de

proteção dos direitos humanos, a Declaração Americana dos Direito e Deveres

do Homem, no art. VII, prevê que toda mulher grávida, bem como toda a criança,

tem direito à proteção, cuidados e auxílios especiais. Semelhante previsão

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consta do Protocolo Adicional à Convenção Americana sobre Direitos Humanos

em Matéria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (“Protocolo de San

Salvador”), promulgado pelo Decreto n 3.321/1999; nesse diploma se prevê que

os Estados Partes comprometem‑se a proporcionar adequada proteção ao

grupo familiar e, especialmente, a “Dispensar atenção e assistência especiais à

mãe, por um período razoável, antes e depois do parto”.

Embasado nessa Declaração e no Pacto de São José da Costa Rica,

a Corte Interamericana de Direitos Humanos decidiu (Caso Gelman Vs. Uruguai.

Mérito e Reparações. Sentença de 24 de fevereiro de 2011. Série C N° 221, par.

97) que a proteção à maternidade faz parte essencial do livre desenvolvimento

da personalidade das mulheres. É um pressuposto lógico da proteção dada à

maternidade e, consequentemente, mais um elemento que justifica a concessão

de garantias às trabalhadoras gestantes, como a manutenção de renda para

sustentar a si mesmas e à criança que está por vir.

Como se pode perceber, o arcabouço internacional vigente prega a

proteção à maternidade e a todos os desdobramentos desse acontecimento,

com a garantia de emprego e de assistência médica e financeira durante o

período de gravidez, estendendo-se após o parto.

Dito isto, imperioso lembrar que as normas de direitos fundamentais

têm aplicabilidade imediata (art. 5º, §1º, CF/88), de modo que deve haver a

compatibilização entre os direitos humanos previstos em instrumentos

internacionais e os direitos contidos na legislação interna (art. 5º, §2º, CF/88).

Como visto, em ambas as searas, impõe-se à toda a sociedade, e em especial

ao Estado, o dever de fornecer a proteção digna às gestantes e facilitar os

mecanismos de acesso à essa proteção. É justamente esse comando que tem

sido negado pelo INSS.

3. PREVISÃO LEGISLATIVA DO SALÁRIO MATERNIDADE.

AMPARO CONSTITUCIONAL

A Constituição Federal de 1988 elencou no art. 7º, XVIII, como direito

social, a licença à gestante, com garantia de emprego e da remuneração, pelo

prazo de 120 dias. Em soma a isto, o Constituinte ainda previu a estabilidade

provisória da gestante desde a confirmação da gravidez até 05 meses após o

parto (art. 10, II, b, ADCT). Isso para proteger tanto a gestante quanto a criança,

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durante os primeiros momentos de vida, cruciais para o sadio desenvolvimento

do menor e para a preservação dos vínculos entre mãe e filho.

Aliás, a proteção à maternidade, como já referido, é um dos pilares a

ser atendido pela Previdência Social, conforme positiva o art. 201, II da CF/1988.

Neste contexto, o Supremo Tribunal Federal tem se utilizado de

interpretação extensiva e sistemática da Carta Maior com a finalidade de ampliar

a proteção direcionada à família, em especial à mãe e às crianças, como se pode

perceber nos julgados a seguir transcritos:

A estabilidade provisória advinda de licença-maternidade decorre de proteção constitucional às trabalhadoras em geral. O direito amparado pelo art. 7º, XVIII, da CF, nos termos do art. 142, VIII, da CF/1988, alcança as militares. (RE 523.572 AgR, rel. min. Ellen Gracie, j. 6-10-2009, 2ª T, DJE de 29-10-2009) O STF fixou entendimento no sentido de que as servidoras públicas e empregadas gestantes, inclusive as contratadas a título precário, independentemente do regime jurídico de trabalho, têm direito à licença-maternidade de 120 dias e à estabilidade provisória desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, nos termos do art. 7º, XVIII, da CB e do art. 10, II, b, do ADCT. (RE 600.057 AgR, rel. min. Eros Grau, j. 29-9-2009, 2ª T, DJE de 23-10-2009) A licença maternidade prevista no artigo 7º, XVIII, da Constituição abrange tanto a licença gestante quanto a licença adotante, ambas asseguradas pelo prazo mínimo de 120 dias. Interpretação sistemática da Constituição à luz da dignidade da pessoa humana, da igualdade entre filhos biológicos e adotados, da doutrina da proteção integral, do princípio da prioridade e do interesse superior do menor. (RE 778.889, rel. min. Roberto Barroso, j. 10-3-2016, P, DJE de 1º-8-2016, com repercussão geral)

Neste sentido, fica garantido a gestante segurada da Previdência

Social um benefício a ser pago durante 120 dias, com início 28 dias antes do

parto e a data da ocorrência deste, com término 91 dias após o nascimento,

cabendo prorrogação. É o que dispõe o art. 93 do Decreto 3.048/1999 e também

o art. 71 da Lei 8.213/1991:

Art. 93, Decreto 3048/99. O salário-maternidade é devido à segurada da previdência social, durante cento e vinte dias, com início vinte e oito dias antes e término noventa e um dias depois do parto, podendo ser prorrogado na forma prevista no § 3o. Art. 71, Lei 8213/91. O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade.

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Assim, atendidas tais disposições legais, há direito subjetivo à

percepção do benefício do salário maternidade. Para tanto, a mulher deve

comprovar apenas que o parto ocorreu em momento em que possuía qualidade

de segurada e estavam preenchidos os requisitos de carência legais. Os

Tribunais são unânimes nesse sentido, a exemplo do que demonstra o decidido

pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região, consoante ementa abaixo:

PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO MATERNIDADE. COMPROVAÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS À CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. SENTENÇA MANTIDA. I - O salário maternidade é assegurado pela Constituição da República, no art. 201, II, e pelo art. 71 da Lei nº 8.213/91, sendo certo que tais preceitos não estabelecem qualquer distinção em relação às seguradas (sejam elas empregada, trabalhadora avulsa, empregada doméstica, contribuinte individual, facultativa ou segurada especial), garantido, assim, a proteção à maternidade, de forma ampla e indistinta, que se estende, por óbvio, aos cuidados com o recém-nascido. II - Ressalte-se que, sendo um benefício previdenciário, o salário maternidade pressupõe a qualidade de segurado, que decorre da filiação (vínculo capaz de gerar direito a prestações quando ocorridos certos fatos determinantes previstos em lei), a que se soma a carência, se for o caso, e a ocorrência do evento determinante (nascimento). Com a materialização deste, surge a pretensão à prestação. Desta forma, para fazer jus ao benefício de salário maternidade, deve a autora comprovar os seguintes requisitos: 1) o nascimento de seu filho; 2) a qualidade de segurada. Destaque-se, ainda, que o referido benefício é devido à segurada gestante durante o período de 120 (cento e vinte) dias, tendo como termo a quo o período de 28 dias antes do parto e a data da ocorrência deste. (...) (Processo AC 00020303020164029999. Relator ABEL GOMES. TRF2. 1ª TURMA ESPECIALIZADA. Data da Decisão 25/11/2016. Data da Publicação 09/12/2016)

Assim, preenchidos os requisitos legais, inexiste justificativa para o

INSS negar o pagamento retroativo do salário maternidade, uma vez que cabe

a essa autarquia pagar, em última instância, tal benefício. Escusas operacionais

não são suficientes, conforme se demonstrará no tópico adiante, para afastar

esse direito.

4. RELAÇÃO TRIBUTÁRIA ENTRE EMPREGADOR E

PREVIDÊNCIA SOCIAL.

De acordo com o art. 72, §1º, da Lei 8.213/1991 c/c art. 94 do Decreto

3.048/1999, deve a empresa pagar o salário maternidade às suas empregadas

gestantes, mediante a compensação quando do recolhimento das contribuições

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incidentes sobre a folha de pagamento de salários e demais rendimentos pagos

ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço.

A compensação tributária é agasalhada pelo art. 170 do CTN, que diz:

Art. 170. A lei pode, nas condições e sob as garantias que estipular, ou cuja estipulação em cada caso atribuir à autoridade administrativa, autorizar a compensação de créditos tributários com créditos líquidos e certos, vencidos ou vincendos, do sujeito passivo contra a Fazenda pública.

Sendo assim, o empregador, num primeiro momento, desembolsa

uma quantia para pagar o salário maternidade. Todavia, num segundo tempo,

pode descontar o valor do benefício pago nas contribuições devidas sobre o

pagamento dos salários. Em outras palavras, no final de tudo, é sempre o Estado

que provê o salário maternidade; o empregador apenas cumpre a obrigação

acessória de adiantar esse numerário.

Com isto, ao demitir empregada durante a estabilidade gravídica, sem

justa causa, por óbvio, o empregador fere o seu dever social de contribuir com a

proteção constitucional à gestante. O fato possui diversas consequências, tanto

no campo trabalhista como no campo fiscal. No entanto, caso a segurada opte

por recorrer diretamente à Previdência Social para obter o benefício em questão,

a autarquia gestora não pode invocar a violação a esses deveres de terceiro

como escudo para afastar o cumprimento da obrigação.

5. RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO DO SALÁRIO

MATERNIDADE. PROTEÇÃO ÀS SEGURADAS. SITUAÇÃO DE

DESEMPREGO QUE NÃO SE ENQUADRA NO ART. 71 DA LEI 8.213/1991.

ILEGALIDADE DA INSTRUÇÃO NORMATIVA

Como visto anteriormente, o salário maternidade é um benefício de

amparo constitucional, criado para proteger a maternidade e garantir uma

relação saudável entre a mãe e sua criança. E a quem caberia o pagamento

desse benefício?

A Instrução Normativa INSS/PRES n. 77/2015, que estabelece rotinas

para agilizar e uniformizar o reconhecimento de direitos dos segurados e

beneficiários da Previdência Social, prevê, em seu art. 352, em inovação ao

arcabouço legislativo incidente, que:

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Art. 352. O salário-maternidade será pago diretamente pelo INSS ou pela empresa contratante, devidamente legalizada, observando as seguintes situações: I - para requerimentos efetivados a partir de 1º de setembro de 2003, o salário-maternidade devido à segurada empregada, independentemente da data do afastamento ou do parto, será pago diretamente pela empresa, conforme a Lei nº 10.710, de 5 de agosto de 2003, exceto no caso de adoção ou de guarda judicial para fins de adoção, quando será pago diretamente pelo INSS; [...] IV - quando da extinção de contrato de trabalho sem justa causa ou em razão do encerramento do prazo de vigência inicialmente firmado entre empregador e empregado na situação prevista no art. 341, o benefício será pago diretamente pela empresa, quando a segurada estiver grávida na data do encerramento do contrato de trabalho com prazo determinado; e

A solução é flagrantemente ilegal e afronta não só a Constituição

Federal, como os tratados internacionais de proteção dos direitos humanos

firmados pelo Brasil.

A gestante desempregada não pode receber o mesmo tratamento da

segurada que mantém seu vínculo de emprego durante a gestão. Ora, se deixou

de existir o vínculo de emprego, não há mais porque aplicar as normas do art.

72, § 2º, da lei 8.213/1991 e do art. 94 do Decreto 3.048/1999: a razão é lógica,

não há (ao menos até que a demissão ilegal seja revertida pela Justiça

Trabalhista) empresa que possa ser cobrada pelo salário-maternidade devido.

Exigir que a segurada ingresse com a ação trabalhista para obter um

direito previdenciário é solução descabida, visto que, analisada adequadamente

a questão, chega-se à conclusão de que o salário-maternidade, apesar de

primeiramente ser pago pelo empregador, redundará sempre em uma obrigação

do erário público (visto que há compensação para a empresa).

A legislação não faz nenhuma ressalva quanto a situação

empregatícia da segurada no momento da gravidez (quem faz essa ressalva é a

Instrução Normativa acima citada). Desse modo, para lei esse fato é irrelevante;

até porque a relação previdenciária se forma entre gestante e autarquia federal,

segundo requisitos próprios e diversos da relação trabalhista. Essas conclusões

não se desvirtuam pelo simples fato de o empregador, em algumas situações,

ser responsável, enquanto longa manus do Estado, pelo pagamento.

No mais, imperioso destacar que a segurada está em estado

vulnerável, necessitando de amparo financeiro para custear as inúmeras

despesas inerentes a maternidade. Sem o benefício previdenciário em questão,

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haverá grave comprometimento ao desenvolvimento do nascituro e da própria

segurada.

Previsto o direito, a escolha da maneira pela qual deverá ser exercido

cabe ao seu titular (mormente quando este se trata de pessoa que goza de

especial proteção jurídica). O ordenamento jurídico não pode impor formalismos

desnecessários a sua adequada tutela jurídica. Sendo assim, a negativa do INSS

em pagar o salário-maternidade não só afronta à legislação pertinente, mas

também coloca a segurada em situação de clara fragilidade e carência,

justamente quando ela precisa fazer frente aos excepcionais custos financeiros

que podem decorrer do estado gravídico.

A melhor doutrina entende no mesmo sentido, a exemplo de Fábio

Zambitte Ibrahim (2012, p. 659), que muito bem pontua tal situação:

Ademais, ainda persiste, como já exposto, o problema da segurada empregada que tem seu contrato rescindido durante a gravidez. Como se sabe, a rescisão imotivada em tal situação é ilegal, cabendo indenização ou mesmo reintegração. Em tais situações, o INSS recusa-se a pagar o benefício, com base no art. 97 do RP, alegando que tal encargo passa a ser do empregador, que deve arcar com todo o período de estabilidade, que é mais abrangente que o interregno do salário maternidade. No entanto, me parece que tal concepção é equivocada, pois a rescisão indevida não tem o condão de transmutar o benefício previdenciário em indenização trabalhista. Assim, como o empregador poderia deduzir de sua guia de recolhimento o salário-maternidade da empregada gestante, o adequado seria, em caso de rescisão indevida, ter o empregador a responsabilidade pelo período de estabilidade, mas excluindo o prazo do salário maternidade, que neste caso, seria pago diretamente pelo INSS.

Em consonância, Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista

Lazzari (2012, p. 701-702) também doutrinam no mesmo sentido:

Quanto à natureza jurídica do salário-maternidade, não há que se confundir com a noção de salário stricto sensu, pois é benefício cujo ônus é integral da Previdência Social. Ainda que o empregador urbano ou rural tenha por obrigação adiantá-lo à trabalhadora em licença, o reembolso do valor adiantado é total, de modo que o INSS é o único responsável pelo efetivo pagamento do benefício.

E como não poderia deixar de ser, os Tribunais pátrios seguem a tese

aqui defendida e responsabilizam o INSS pelo pagamento do benefício

maternidade, mesmo em hipóteses de demissão sem justa causa, violando o

disposto no art. 10, II, b do ADCT.

O Superior Tribunal de Justiça tem firme no seu entendimento:

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(...) 8. A responsabilidade final pelo pagamento do benefício é do INSS, na medida que a empresa empregadora tem direito a efetuar compensação com as contribuições incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos. (...) (STJ REsp 1309251/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/05/2013, DJe 28/05/2013) (...) 2. A observância da literalidade do dispositivo da Lei de Benefícios, a fim de imputar à empresa a legitimidade passiva ad causam, indica inicialmente tratamento desigual a iguais, máxime porque em eventual lide as demais seguradas poderão acionar diretamente a autarquia previdenciária federal. De outro lado, impor à segurada empregada o ajuizamento de ação contra o empregador, para, só então, lhe garantir a via judicial contra o INSS denotaria estabelecer responsabilidade subsidiária deste não prevista em lei, nulificando por completo a efetividade do benefício. 3. A interpretação sistemática e teleológica do comando legal inserto no § 1º do artigo 72 da Lei n. 8.213/91 impõe reconhecer a legitimidade passiva ad causam do INSS, notadamente porque o fato de a empresa pagar o valor do salário-maternidade não desnatura a relação jurídico-previdenciária. O ônus é da autarquia federal e a empresa age em nome desta, em nítida posição de longa manus do Estado a fim de facilitar o recebimento do benefício por quem de direito, nada mais. Tanto é assim que o dispositivo prevê a compensação dos valores pagos à segurada na via tributária. (...) (STJ, REsp 1346901/PR, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 01/10/2013, DJe 09/10/2013) CONFLITO DE COMPETÊNCIA. ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA ATO DO PREFEITO DE LAJEADO/RS. LICENÇA MATERNIDADE. SENTENÇA CONCESSIVA PROFERIDA POR JUIZ DE DIREITO. REEXAME NECESSÁRIO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. INSS. LITISCONSORTE NECESSÁRIO. DESLOCAMENTO DA COMPETÊNCIA PARA JUSTIÇA FEDERAL. ART. 109, VIII DA CF. REMESSA PELO TRIBUNAL DE JUSTIÇA AO TRF/4ª REGIÃO. PRINCÍPIO DA INSTRUMENTALIDADE E RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO. CONFLITO CONHECIDO PARA RECONHECER A COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL, E REMETER OS AUTOS AO JUIZ FEDERAL DA VARA FEDERAL DO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL CÍVEL DE LAJEADO/RS. 1. Nas ações de Mandado de Segurança em que se pleiteia a concessão de salário-maternidade, espécie de benefício previdenciário, figura como litisconsorte passivo necessário o INSS, por ser a entidade responsável pela sua concessão e pagamento; assim, a teor do art. 109, VIII da CF, a competência para processar e julgar a demanda é da Justiça Federal. [...] (CC 90642/RS, Terceira Seção, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 12/6/2008)

A Turma Nacional de Unificação, em pedido de unificação de

interpretação de lei federal que trata do salário maternidade também decidiu que

compete ao INSS pagar tal verba:

PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO. SALÁRIO-MATERNIDADE. DEMISSÃO SEM JUSTA CAUSA. DEMONSTRADO O DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. RESPONDE DIRETAMENTE O INSS PELO PAGAMENTO DO SALÁRIO MATERNIDADE NOS CASOS DE DEMISSÃO SEM JUSTA CAUSA, AINDA QUE SE TRATE DE

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TRABALHADOR TEMPORÁRIO. INTERPRETAÇÃO MAIS BENÉFICA DA NORMA PROTETIVA DO TRABALHO À GESTANTE NO PERÍODO DE ESTABILIDADE. PRECEDENTES DA TNU, STJ E STF. INCIDENTE CONHECIDO E PROVIDO. (...) 9. O salário-maternidade, nos termos do art. 71 da Lei 8.213/91, é devido à segurada da Previdência Social, observada as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade, não fazendo a lei ressalva alguma quanto a situação empregatícia da segurada no momento da gravidez, razão pela qual há de se entender que a sua concessão é devida mesmo nos casos de desemprego da gestante. 10. O fato de o art. 72, § 1º, da Lei, estabelecer o dever de pagamento do benefício ao empregador no caso de segurada empregada, possibilitando a compensação tributária, não ilide o dever do INSS de efetuar o pagamento do benefício. Isso porque, como bem fundamentado no acórdão recorrido, a relação previdenciária é estabelecida entre o segurado e a autarquia e não entre aquela e o empregador. Este nada mais é do que um obrigado pela legislação a efetuar o pagamento do benefício como forma de facilitar a sua operacionalização. 11. Considerar que a demissão imotivada no período de estabilidade da empregada importa no dever do empregador de pagar o salário maternidade no lugar da previdência social seria transmudar um benefício previdenciário em indenização trabalhista (Ibrahim, Fábio Zambitte, Curso de Direito Previdenciário, 2011, p. 646), o que é absolutamente inadmissível. Eventual obrigação imposta ao empregador de reintegrar a segurada ao emprego por força de demissão ilegal no período de estabilidade, com conseqüente dever de pagar o benefício (mediante a devida compensação), bem como os salários correspondentes ao período de graça, não podem induzir a conclusão de que, mesmo na despedida arbitrária, caberia ao empregador o pagamento do benefício. 12. Retirar da autarquia o dever de arcar com o salário-maternidade em prol de suposta obrigação do empregador é deixar a segurada em situação de desamparo, que se agrava em situação de notória fragilidade e de necessidade material decorrente da gravidez. (...) (Processo PEDILEF 00028670720114013818. Relator JUIZ FEDERAL RONALDO JOSÉ DA SILVA. TNU. Fonte DOU 18/03/2016) (grifo nosso).

Os Tribunais Regionais Federais da 3ª, 4ª e 5ª Regiões acompanham

a tesa ora defendida:

PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. VALOR DA CONDENAÇÃO INFERIOR A 1000 SALÁRIOS MÍNIMOS. REMESSA OFICIAL NÃO CONHECIDA. SEGURADA DEMITIDA SEM JUSTA CAUSA DURANTE O PERÍODO DE ESTABILIDADE. RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO. BENEFÍCIO DE NATUREZA PREVIDENCIÁRIA. COMPENSAÇÃO PELO EMPREGADOR. DEVIDO O PAGAMENTO PELO INSS DE FORMA DIRETA. 1. Na hipótese dos autos, o valor da condenação não excede 1.000 (mil) salários mínimos, pois sendo o benefício de salário-maternidade devido por apenas 4 (quatro) meses, o montante devido não superará esse limite, razão pela qual incabível a remessa oficial. 2. O fato de ser atribuição do empregador efetuar o pagamento do salário-maternidade no caso das seguradas empregadas não retira a natureza de benefício previdenciário. 3. Ademais, embora a prestação relativa ao benefício seja paga pelo empregador, este tem o direito à compensação quando do recolhimento das

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contribuições incidentes sobre a folha de salários da empregada (art. 72, § 1º, da Lei nº 8.213/91), de modo que o encargo proveniente do salário-maternidade é suportado pela própria Autarquia. 4. Dessarte, nessas condições, o benefício de salário-maternidade deve ser pago diretamente pelo INSS. (Processo 00329445020164039999. Relator DESEMBARGADOR FEDERAL NELSON PORFIRIO.TRF3. DÉCIMA TURMA. Fonte e-DJF3 Judicial 1 DATA:30/11/2016) (grifo nosso). PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. DISPENSA ARBITRÁRIA. MANUTENÇÃO DA CONDIÇÃO DE SEGURADA. DIREITO AO BENEFÍCIO. 1. O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 dias, com início no período entre 28 dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção da maternidade, sendo pago diretamente pela Previdência Social. 2. A legislação previdenciária garante a manutenção da qualidade de segurado, até 12 meses após a cessação das contribuições, àquele que deixar de exercer atividade remunerada. 3. A segurada tem direito ao salário-maternidade enquanto mantiver esta condição, pouco importando eventual situação de desemprego. 4. O fato de ser atribuição da empresa pagar o salário-maternidade no caso da segurada empregada não afasta a natureza de benefício previdenciário da prestação em discussão. Ademais, a teor do disposto no artigo 72, § 2º, da Lei 8.213/91, na redação dada pela Lei nº 10.710, de 5/8/2003, a responsabilidade final pelo pagamento do benefício é do INSS, na medida em que a empresa tem direito a efetuar compensação com as contribuições incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos. Se assim é, não há razão para eximir o INSS de pagar o que, em última análise, é de sua responsabilidade. 5. A segurada não pode ser penalizada com a negativa do benefício previdenciário, que lhe é devido, pelo fato de ter sido indevidamente dispensada do trabalho. Eventuais pendências de ordem trabalhista, ou eventual necessidade de acerto entre a empresa e o INSS, não constituem óbice ao reconhecimento do direito da segurada, se ela optou por acionar diretamente a autarquia. (Processo AC 200970990008702. Relator RÔMULO PIZZOLATTI. TRF4. QUINTA TURMA. Fonte D.E. 10/05/2010) (grifo nosso). PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO MATERNIDADE. EMPREGADA URBANA. DISPENSA SEM JUSTA CAUSA. MANUTENÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADA DO RGPS COMPROVADA. RESPONSABILIDADE DO INSS PELO PAGAMENTO. 1. Empregada urbana dispensada sem justa causa. Direito ao salário-maternidade que não se questiona, devido ao período de graça - em que o segurado não mais contribui para Previdência, mas, mantém a qualidade de segurado. 2. Atribuição da empresa de pagar o salário-maternidade, que não afasta a natureza de benefício previdenciário da prestação em discussão. 3. Responsabilidade final do INSS pelo pagamento do benefício, na medida em que a empresa tem direito a efetuar compensação com as contribuições incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos. 4. Segurada que não pode ser penalizada com a negativa do benefício previdenciário, que lhe é devido. Eventual necessidade de acerto entre a empresa e o INSS, não pode obstar o reconhecimento do direito da segurada. Apelação improvida. (Processo AC 00008921520144059999. Relator Desembargador Federal Geraldo

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Apoliano. TRF5. Terceira Turma. Fonte DJE - Data: 11/02/2015) (grifo nosso).

Por fim, as Turmas Recursais da 3ª Região confirmam ser o INSS

responsável pelo pagamento, mesmo no caso de demissão da segurada durante

o período de gravidez:

A exigência da legislação para concessão do benefício é que o postulante ostente a condição de segurado, não importando se está empregado ou não. Da leitura do referido dispositivo, é possível inferir que, caso a demissão se desse sem justa causa, a responsabilidade pelo pagamento persistiria sendo da ex-empregadora. Todavia, cumpre observar que a natureza do salário-maternidade é de benefício previdenciário, de forma que a responsabilidade final pelo pagamento do benefício pertence ao INSS, motivo pelo qual não pode a autarquia se eximir da responsabilidade pelo pagamento. (Processo 27 00021024720164039301. Relator JUIZ FEDERAL RICARDO GERALDO REZENDE SILVEIRA. 8ª TURMA RECURSAL DE SÃO PAULO. Fonte e-DJF3 Judicial DATA: 12/08/2016) (grifo nosso). Assim, nos casos de pagamento de salário-maternidade à segurada empregada, a empresa apenas adianta o valor do benefício que será, posteriormente, descontado dos seus recolhimentos previdenciários, nos termos do § 1º do art. 72 da Lei nº 8.213/91. Patente, portanto, a responsabilidade do INSS no que tange a esta prestação. (Processo 16 00494212420154036301.Relatora JUIZA FEDERAL LIN PEI JENG. 10ª TURMA RECURSAL DE SÃO PAULO. Fonte e-DJF3 Judicial DATA: 30/05/2016) (grifo nosso). É cediço que quando não há mais vínculo trabalhista, o salário maternidade se torna responsabilidade direta do INSS, que deverá efetuar a compensação posterior com a referida empresa, quando do recolhimento das contribuições incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço. Nessas condições, cabe à Autarquia previdenciária o ônus do pagamento do benefício, ainda que o desemprego seja involuntário ou sem justa causa, notadamente em razão de seu nítido caráter previdenciário. Isto porque a empresa, na hipótese do § 1º do artigo 72 da Lei de Benefícios, age em nome do INSS, em nítida posição de longa manus do Estado a fim de facilitar o recebimento do benefício por quem de direito, sem que isto descaracterize a relação jurídica previdenciária. Tanto é assim, que há previsão de compensação dos valores pagos à segurada na via tributária. (Processo 16 00017398720124036201. Relatora JUIZA FEDERAL RAQUEL DOMINGUES DO AMARAL. 1ª TURMA RECURSAL DE CAMPO GRANDE. Fonte e-DJF3 Judicial DATA: 16/03/2016) (grifo nosso).

Ademais, a regra é que, sempre que não há a figura de um

empregador a ser invocado, o legislador atribuiu diretamente à autarquia

previdenciária a responsabilidade pelo pagamento do salário maternidade,

senão vejamos:

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i. segurado/segurada que adotar ou obtiver a guarda judicial de

criança (art. 71-A, §1º, Lei 8213/91 c/c art. 93-A, §6º, Decreto

3048/99);

ii. caso de falecimento da segurada/segurado que fizer jus ao

benefício (art. 71-B, §2º, Lei 8213/91);

iii. trabalhadora avulsa e empregada do microempreendedor

individual (art. 72, §3º, Lei 8213/91 c/c art. 100, Decreto

3048/99);

Visto isso, inegável o dever do INSS em arcar com o pagamento do

salário maternidade às gestantes que atenderem aos requisitos legais e lhe

dirigirem diretamente seus requerimentos administrativos.

Neste contexto, sábias foram as considerações do Min. Benedito

Gonçalves no julgamento do REsp 1.346.901/PR, que derruba por terra a

argumentação da autarquia previdenciária de se criar uma espécie de

responsabilidade subsidiária da mesma. Vejamos:

Impor à segurada empregada o ajuizamento de ação contra o empregador, para, só então, lhe garantir a via judicial contra o INSS denotaria estabelecer responsabilidade subsidiária deste não prevista em lei, nulificando por completo a efetividade do benefício que tem por escopo principal assegurar prestação econômica que auxilie na manutenção da integridade física e psíquica da mulher e do nascituro no momento adequado, ou seja, no período pré e pós-parto.

Além disto, entender o contrário seria colocar as empregadas numa

condição de manifesta desigualdade com as demais seguradas, que têm seu

benefício pago diretamente pelo INSS.

Portanto, percebe-se que a jurisprudência é pacífica ao atribuir ao

INSS a responsabilidade pelo pagamento do salário maternidade às

empregadas gestantes. Todavia, inexiste no sistema pátrio comando erga

omnes em face da autarquia previdenciária, até mesmo pela ausência de

alteração legislativa nesse sentido, o que impõe às seguradas a necessidade de

recorrerem ao Judiciário caso a caso para ver seu direito reconhecido.

A solução se afigura completamente acorde com os sistemas

internacionais de proteção da mulher e com o arcabouço legislativo brasileiro:

ora, se a mulher foi desligada do emprego, não há razão alguma que justifique o

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afastamento da proteção previdenciária; a resolução lógica seria exatamente o

oposto disso.

De mais a mais, deve o réu arcar com os pagamentos das parcelas

retroativas devidas, que englobam as prestações no prazo de 05 anos da data

em que deveriam ser pagas (art. 103, parágrafo único, Lei 8.213/1991), incidindo

correção monetária desde a época do parco, independentemente da data do

requerimento administrativo (Súmula 45 da TNU).

III. TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA. OBRIGAR INSS A

PROCESSAR OS PEDIDOS ADMINISTRATIVOS.

Nos termos do art. 300 do Código de Processo Civil, a tutela de

urgência será concedida quando existirem elementos da probabilidade do direito

alegado e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo. Pois bem.

Como visto anteriormente, o INSS tem negado de forma equivocada,

administrativamente, com base na literalidade da Instrução Normativa n.

77/2015, o direito das seguradas ao salário maternidade quando elas foram

demitidas, sem justa causa, durante o período de estabilidade garantido pela

Constituição Federal.

Assim, a probabilidade do direito aqui alegado encontra-se

suficientemente demonstrada por todo arcabouço legislativo já mencionado e

conforme a jurisprudência pacífica formada no STJ e nos Tribunais Regionais

Federais.

Por outro lado, a falta de uniformização da matéria por meio de

comando judicial que obrigue ao INSS a processar os pedidos de requerimento

de salário-maternidade formulados por essas seguradas desempregadas, tem

feito com que o posicionamento administrativo ilegal e inconstitucional, conforme

visto, resulte na multiplicação de ofensas a direitos de diversas mulheres em

situação de vulnerabilidade; situações que desaguam muitas vezes no

Judiciário.

Portanto, requer-se que conceda tutela antecipada de urgência a fim

de obrigar o INSS a pagar o salário maternidade às seguradas que atenderem

as exigências legais e fizerem tal pedido pela via administrativa.

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IV. PEDIDOS E REQUERIMENTOS

Ante todo o exposto, a Defensoria Pública da União requer:

i. a citação do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL,

na figura da Procuradoria Federal Especializada para, querendo,

responder a presente Ação Civil Pública (art. 242, §3º, CPC);

ii. a concessão de efeitos nacionais à presente ação civil

pública;

iii. a intimação do Ministério Público Federal (art. 5º, §1º, Lei

7347/1985);

iv. a condenação do instituto réu a revisar administrativamente

os indeferimentos de pedido de salário-maternidade dos últimos 5

(cinco) anos que foram recusados unicamente com fundamento no

art. 352, IV, da Instrução Normativa INSS/PRES 77/2015, bem como

pagar retroativamente os valores de salário-maternidade devidos às

seguradas, descontados aquilo que já foi eventualmente pago sob a

mesma razão;

v. a condenação do INSS a processar até a decisão final os

pedidos administrativos de salário-maternidade formulados por

seguradas gestantes demitidas, decidindo-os a partir dos requisitos

legais do benefício e abstendo-se de indeferi-los unicamente com

base na alegação de que a obrigação caberia unicamente à empresa

por violação da estabilidade constitucional do art. 10, II, “b”, do ADCT;

vi. a imposição de multa diária de R$ 500,00 (quinhentos reais)

por dia por cada indeferimento indevido (art. 11 da Lei 7.347/1985)

com fundamento na regra ora atacada, a qual deve incidir a partir da

intimação no presente processo e cujo valor que deverá reverter para

a segurada lesada ou, subsidiariamente, para o Fundo de Defesa dos

Direitos Difusos de que trata a lei 7.347/1985;

vii. a condenação do INSS ao pagamento de todas as custas e

despesas processuais e de honorários para a DEFENSORIA

PÚBLICA DA UNIÃO (CNPJ 00.375.114/0001-16), na Caixa

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Econômica Federal (Conta Governo 10.0000-5, Agência 002,

Operação 006);

Outrossim, protesta-se por todos os meios de provas admitidos em

Direito.

Dá-se a causa o valor simbólico de R$ 1.000,00, sem prejuízo do

quantum a ser avaliado concretamente nos autos.

Nestes termos, pede e espera deferimento.

Vitória, 9 de maio de 2017.

JOÃO MARCOS MATTOS MARIANO

Defensor Público Federal

RICARDO FIGUEIREDO GIORI

Defensor Público Federal

MATHEUS BIASUTTI CUPERTINO DE CASTRO

Advogado Colaborador

OAB/ES nº 23.387