Sentença eleitoral monocrática

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Sentença em 24/10/2012 - AIJE Nº 20737 Juiz OTÁVIO MAURO NOBRE SENTENÇA Trata-se de Ação de Investigação Judicial Eleitoral proposta pela Coligação “A FORÇA DO POVO” (majoritária) e DAVID LOUREIRO COELHO em face da Coligação “SÃO FIDÉLIS MAIS FELIZ” (majoritária), LUIZ CARLOS FERNANDES FRATANI, MAGNO RANGEL ROCHA, LUIZ GUSTAVO AZEVEDO AMARAL e CARLOS HUMBERTO FERNANDES FRATANI. Aduzem os Investigantes na peça vestibular, em apertada síntese, que os Investigados praticaram, em direta afronta ao disposto nos artigos 73 e 74, ambos da Lei 9.504/97, e artigo 9º, § 4º, da Resolução do TSE n.° 23.370/2011, as seguintes condutas vedadas em ano eleitoral: 1) nos primeiros dias do mês março do corrente ano, em uma reunião ocorrida nas instalações da Auto Escola “Boa Sorte”, o 2º, 4º e 5º Investigados (LUIZ CARLOS FERNANDES FRATANI, LUIZ GUSTAVO AZEVEDO AMARAL e CARLOS HUMBERTO FERNANDES FRATANI, respectivamente) teriam coagido o Sr. PEDRO MARTINS DE ALMEIDA, em manifesto abuso de poder político, a desistir de disputar o pleito proporcional deste ano pelo Partido da República/PR; 1.1) que a coação se constituiu na “ameaça” de retaliação a RAMON, filho do Sr. PEDRO, que presta serviços de transporte de alunos na localidade de Olho D’Água, zona rural desta cidade;

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AIJE - Prefeito de São Fidélis

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Sentença em 24/10/2012 - AIJE Nº 20737 Juiz OTÁVIO MAURO NOBRE SENTENÇA

Trata-se de Ação de Investigação Judicial Eleitoral proposta pela Coligação “A FORÇA DO POVO” (majoritária) e DAVID LOUREIRO COELHO em face da Coligação “SÃO FIDÉLIS MAIS FELIZ” (majoritária), LUIZ CARLOS FERNANDES FRATANI, MAGNO RANGEL ROCHA, LUIZ GUSTAVO AZEVEDO AMARAL e CARLOS HUMBERTO FERNANDES FRATANI.

Aduzem os Investigantes na peça vestibular, em apertada síntese, que os Investigados praticaram, em direta afronta ao disposto nos artigos 73 e 74, ambos da Lei 9.504/97, e artigo 9º, § 4º, da Resolução do TSE n.° 23.370/2011, as seguintes condutas vedadas em ano eleitoral:

1) nos primeiros dias do mês março do corrente ano, em uma reunião ocorrida nas instalações da Auto Escola “Boa Sorte”, o 2º, 4º e 5º Investigados (LUIZ CARLOS FERNANDES FRATANI, LUIZ GUSTAVO AZEVEDO AMARAL e CARLOS HUMBERTO FERNANDES FRATANI, respectivamente) teriam coagido o Sr. PEDRO MARTINS DE ALMEIDA, em manifesto abuso de poder político, a desistir de disputar o pleito proporcional deste ano pelo Partido da República/PR;

1.1) que a coação se constituiu na “ameaça” de retaliação a RAMON, filho do Sr. PEDRO, que presta serviços de transporte de alunos na localidade de Olho D’Água, zona rural desta cidade;

1.2) que RAMON tem contrato de prestação dos referidos serviços com a Prefeitura Municipal de São Fidélis e com o Governo do Estado do RJ;

1.3) que nessa reunião teria sido dito ao Sr. PEDRO MARTINS DE ALMEIDA que iriam “(...) retirar o filho do declarante dos serviços de transporte de alunos da rede pública, através de atos administrativos, cuja a discricionariedade são

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dos últimos Investigados, caso a vítima Pedro Martins de Almeida não retirasse sua candidatura a vereador pelo PR, seu filho sofreria retaliações financeiras, com a perda dos contratos” (fls. 03/04, item 1.2);

1.4) que “a vítima Sr. Pedro Martins de Almeida teve que retirar sua candidatura para proteger o filho da perseguição dos Investigados, renunciado ao direito de ser candidato a vereador pelo PR e mais, talvez sepultando o seu sonho de ser útil na cidade de São Fidélis, diante da manifesta coação dos Investigados” (fls. 08, item “1.5”);

2) que nos dias 24, 25 e 26 de agosto do ano em curso, os Investigados, usando recursos públicos do Município de São Fidélis muito superiores aos anos que se passaram, contrataram shows com as bandas Edson e Hudson, Fundo de Quintal e outros, inclusive palco e iluminação, sob o argumento Festival de Inverno, evento esse realizado na praça principal da cidade onde os 2º e 3º Investigados fizeram campanha, sem qualquer restrição, violando o art. 9º, § 4º, da Res. TSE nº 23.370/2011, restando evidente o desequilíbrio e uso da máquina;

3) que no desfile cívico ocorrido no dia 07 de setembro do corrente ano, realizado na Avenida Sete de Setembro, Centro, o 2º e 3º Investigados fixaram uma barraca tipo guarda-sol, com logotipo da campanha para acomodá-los, bem como as demais pessoas que panfletaram no evento cívico, e, agindo assim, abusando do poder político;

Ao final, requerem os Investigantes a decretação de inelegibilidade dos Investigados pelo prazo de 08 anos, bem como a cassação dos registros de candidatura do 2º e 3º Investigados, e, caso a prestação jurisdicional seja entregue após o pleito, a cassação do diploma dos mesmos.

A inicial, protocolizada em 11/09/2012, sob o nº 220.781/2012 (fl. 02), veio instruída com os documentos de fls. 25/46, e veio-me conclusos nessa mesma data (fl. 47).

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Despacho determinando vista ao MPE para dizer quanto ao interesse processual à fl. 48.

Promoção ministerial pelo recebimento da inicial e estabelecimento do contraditório às fls. 50/52.

Despacho determinando a notificação dos Investigados e requisição de documentos – referentes à 1ª e 2ª condutas elencadas na inicial – à Prefeitura Municipal e ao Colégio Estadual de São Fidélis, à fl. 54.

Os Investigados foram regularmente notificados, cf. mandados de fls. 55/59 e respectivas certidões no verso.

Ofício expedido à Prefeitura Municipal de São Fidélis requisitando documentos sobre o Festival de Inverno deste ano, bem como de 2009, 2010 e 2011, e sobre contrato de transporte de alunos referente à linha de Olho D’Água, dos anos de 2011 e 2012, à fl. 60.

Ofício expedido ao Colégio Estadual de São Fidélis requisitando documentos e informações acerca de contrato de transporte de alunos referente à linha de Olho D’Água, dos anos de 2011 e 2012, à fl. 61.

Resposta dos Investigados em peça única, às fls. 62/66, ofertada, tempestivamente (cf. certidão lavrada a fls. 72, item “1”), alegando que:

a) realmente ocorrera, sim, no mês de março do corrente ano, uma reunião em que o Sr. PEDRO fora procurado, não só por uma pessoa, mas por várias ligadas aos Investigados, para que disponibilizasse seu apoio

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aos mesmos no pleito deste ano, nunca havendo arrogância alguma no sentido de retaliar qualquer direito, através do exercício arbitrário do poder;

b) que o filho do Sr. PEDRO MARTINS DE ALMEIDA nunca fora detentor de linha alguma de transporte no governo atual, até mesmo porque nem poderia, pois é policial militar em exercício, portanto, se realmente possuía essa delegação não era de responsabilidade do município destituí-lo ou não de tal ofício, o que desde já demonstra a distorção da alegação.

c) que também não houve nenhuma ilegalidade nas outras duas condutas apontadas na inicial.

Requereram, ao final da peça de bloqueio, a improcedência dos pedidos.

O MPE requereu a designação de AIJ na quota ministerial de fl. 72 in fine.

Resposta do Colégio Estadual de São Fidélis à fl. 73 enviando cópias de notas fiscais de prestação de serviços do ano de 2012 (fls. 74/157) e informando que:

1) não há entre a unidade escolar e os Senhores RAMON SILVEIRA DE ABREU, PEDRO MARTINS DE ALMEIDA ou outra pessoa física ou jurídica que os represente, contrato de transporte de alunos; e, 2) que no ano de 2011 eram 04 (quatro) linhas e em 2012 são 05 (cinco) linhas.

Resposta da Prefeitura Municipal de São Fidélis à fl. 158, enviando cópia dos documentos alusivos ao Festival de Inverno (fls. 159/255) e quanto ao contrato de prestação de serviços de transporte de alunos para Olho D’Água referente aos anos de 2009 (fls. 256/259), 2010 (fl. 260), 2011 (fls. 261/264) e 2012 (fls. 265/268).

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Despacho designando AIJ à fl. 270.

Audiência de Instrução e Julgamento às fls. 272/283, na qual foi colhido o depoimento pessoal do 2º (LUIZ CARLOS FERNANDES FRATANI, Prefeito do Município de São Fidélis), do 4° (LUIZ GUSTAVO AZEVEDO AMARAL) e do 5° Investigado (CARLOS HUMBERTO FERNANDES FRATANI), bem como ouvidas as testemunhas PEDRO MARTINS DE ALMEIDA (fls. 279/280), FÁBIO STELLET GENTIL (Chefe do Cartório Eleitoral - fls. 281/282) e MARIA APARECIDA MONTEIRO FERREIRA (Serventuária do TRE-RJ e lotada nesta 35.ª ZE - fl. 283).

Alegações Finais dos Investigados às fls. 284/288, ofertadas tempestivamente (fl. 303), requerendo a improcedência dos pedidos.

Alegações Finais dos Investigantes às fls. 289/302, ofertadas tempestivamente (fl. 303), requerendo a procedência dos pedidos inaugurais.

Quota ministerial do Parquet à fl. 303 in fine, determinando a extração de cópia dos autos e remessa à Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva do Núcleo Campos dos Goytacazes para analisar os fatos como ato de Improbidade Administrativa caso assim entenda.

Parecer Final do Ministério Público Eleitoral às fls. 304/311, com documentos que o instruíram às fls. 312/324.

É O RELATÓRIO. PASSO A DECIDIR.

Não há preliminares a serem apreciadas.

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Ao findar a instrução probatória, na qual foi assegurado às partes o direito de ampla defesa e contraditório, entendo que os fatos não foram demonstrados como narrados pela Coligação Representante, conforme passo a examinar, uma a uma, deixando à primeira, mais complexa, por último.

Da Segunda Conduta Elencada na Inicial

Os documentos apresentados nos autos demonstram que o evento ‘Festival de Inverno’ é realizado, há anos, no Município de São Fidélis/RJ.

Ao contrário do que fora apontado pelos documentos de fls. 223/231 e 236/241, após os esclarecimentos do Procurador Jurídico no sentido de que os valores indicados nos documentos supracitados retratam contratações para um ano inteiro, bem como utilização nas diversas festividades desenvolvidas pelo Município de São Fidélis/RJ.

Assim, não restou comprovado que houve abuso de poder econômico com o incremento exagerado do ‘Festival de Inverno’ deste ano eleitoral, sendo que nenhum investimento maior que em anos anteriores foi demonstrado por qualquer meio.

Diversamente do que alegado pelos investigantes, o evento supramencionado não pode ser comparado a um showmício, vez que, para tanto, mister que os artistas que lá se apresentaram, de qualquer forma, tivessem prestigiado a campanha política dos segundos e terceiros investigados ou que estes tivessem utilizado a estrutura montada para subir no palco e lá fazer campanha política, fatos esses não demonstrados pelos investigantes.

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De toda sorte, a prova oral ouvida pelos requerentes/investigantes apontam que nenhum ilícito foi ali cometido estando a citada “barraca” na via pública, pouco importando se havia ali propaganda eleitoral ou não – contudo, nenhuma prova se produziu nesse sentido - pois estávamos no período permitido.

Da Terceira Conduta Elencada na Inicial

No sistema eleitoral vigente, não há qualquer ilegalidade na realização de campanha política, ‘corpo-a-corpo’, em data comemorativa, in casu, desfile cívico da Independência do Brasil. Ao contrário, tal conduta é legal e representativa da democracia neste País.

Não restou demonstrado que os representados valeram-se da estrutura montada para pedir votos, eis que não subiram em palanques ou utilizaram-se do sistema de som para tanto, tendo apenas se valido da aglomeração de pessoas para fazer, pessoalmente, propaganda política, fato normal e corriqueiro às vésperas das eleições.

A presença de candidatos em eventos públicos não é vedada, inclusive, como destacou o investigado Luiz Carlos F Fratani, o próprio candidato David Loureiro também estaria pelo local. Nenhuma prova se fez de qualquer conduta vedada também neste episódio, nada sendo referido por qualquer prova quanto a utilização da estrutura do evento com pedido de votos ou conduta que possa ser efetivamente censurada.

Assim, também nesse ponto não merece prosperar a pretensão dos investigantes.

Da Primeira Conduta Elencada na Inicial

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Alegam os investigantes que, nos primeiros dias do mês março do corrente ano, em uma reunião ocorrida nas instalações da Auto Escola “Boa Sorte”, o 2º, 4º e 5º Investigados (LUIZ CARLOS FERNANDES FRATANI, LUIZ GUSTAVO AZEVEDO AMARAL e CARLOS HUMBERTO FERNANDES FRATANI, respectivamente) teriam coagido o Sr. PEDRO MARTINS DE ALMEIDA, em manifesto abuso de poder político, a desistir de disputar o pleito proporcional deste ano pelo Partido da República/PR.

Aduzem que a coação se constituiu na “ameaça” de retaliação a RAMON, filho do Sr. PEDRO, que presta serviços de transporte de alunos na localidade de Olho D’Água, zona rural desta cidade.

Sustentam que, nessa reunião, teria sido dito ao Sr. PEDRO MARTINS DE ALMEIDA que iriam “(...) retirar o filho do declarante dos serviços de transporte de alunos da rede pública, através de atos administrativos, cuja discricionariedade são dos últimos Investigados, caso a vítima Pedro Martins de Almeida não retirasse sua candidatura a vereador pelo PR, seu filho sofreria retaliações financeiras, com a perda dos contratos” (fls. 03/04, item 1.2) e, ainda, que, por tal motivo, “a vítima Sr. Pedro Martins de Almeida teve que retirar sua candidatura para proteger o filho da perseguição dos Investigados, renunciado ao direito de ser candidato a vereador pelo PR e mais, talvez sepultando o seu sonho de ser útil na cidade de São Fidélis, diante da manifesta coação dos Investigados” (fls. 08, item “1.5”).

Por esse motivo, sustentam que os investigados imprimiram conduta que caracteriza abuso de poder político.

Neste ponto reside a maior polêmica a ser enfrentada.

Atualmente, um dos maiores desafios da Justiça Eleitoral é o combate ao abuso de poder nas eleições.

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As modificações introduzidas pela Lei da Ficha Limpa, elevando o prazo de inelegibilidade para oito anos e impondo-a ao agente do abuso já a partir de decisão colegiada (dispensando, portanto, o trânsito em julgado), dão novo fôlego no combate ao abuso do poder nas eleições.

Inicialmente destaco que a prova para configuração do abuso econômico capaz de desequilibrar o pleito e culminar na anulação do resultado de uma eleição não é qualquer prova, mas sim aquela robusta, que não deixe dúvidas ou o flagrante que traduz a certeza visual, em tese, da ocorrência. Do contrário, a se admitir a fundada suspeita ou a “prova” por indícios que não afaste a dúvida, seria gerar grave insegurança jurídica a macular todo o processo eleitoral que é desenvolvido em nosso país.

Isto destaco, se verifica também em função das particularidades dos pleitos eleitorais, que são permeados por disputas acirradas, trocas de acusações, denúncias, na maioria anônimas e até mesmo xingamentos e “armações” por parte de alguns candidatos.

São Fidélis não fugiu à regra. A eleição majoritária foi objeto de acalorada disputa e para se ter uma ideia de até onde os candidatos chegaram e estavam dispostos a chegar, o investigado, atual prefeito, para encobrir o uso de uma máquina de propriedade do município em obra particular, foi capaz de arquitetar um abaixo assinado depois do fato, alegando ter sido feito meses antes, para tentar legitimar, em vão, tal fato. Já o candidato investigante, fez veicular no sábado que antecedeu o pleito, à noite, em 4 carros de som, a mensagem de que o seu opositor estaria inelegível, quando isto não ocorreu.

Ambos os fatos tiveram procedimentos a apurações próprias, mas que servem a ilustrar o nível dos problemas que esta Justiça Eleitoral enfrentou neste pleito municipal.

Compulsando os autos, verifico que a ‘reunião’ realizada pelo 2.°, 4.° e 5.°

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Investigados com Pedro Martins de Almeida, na Auto Escola Boa Sorte, é fato incontroverso, inclusive assumido, em Juízo, pelos investigados.

Contudo, resta apurar se, na referida ‘reunião’, houve ABUSO DE PODER POLÍTICO e, em caso positivo, para efeito de inelegibilidade, se teve o condão de comprometer a lisura e a normalidade das eleições.

Nas palavras do professor Edson de Resende Castro:

Importante ressaltar que o abuso do poder, como causa de inelegibilidade, é conduta que visa afetar a normalidade e legitimidade das eleições, bem jurídico acolhido pelo artigo 14, § 9.°, da Constituição da República Federativa do Brasil.

Destaco que essa suposta conduta vedada teve origem na declaração firmada por Pedro Martins de Almeida às fls. 33/35.

Conforme seu depoimento prestado em Juízo, sem qualquer ilação quanto a sua pessoa, de fato, o mesmo é filiado ao PR, partido do candidato às majoritárias, e também Investigante, David Loureiro, se declarou apoiador e cabo eleitoral deste nestas eleições de 2012, o que por si só, lhe retira a credibilidade de testemunha, como consta do termo de sua oitiva.

É evidente que com base apenas na palavra de um cabo eleitoral de um dos interessados – o maior interessado – não se pode alcançar a prova necessária de qualquer fato capaz de, na prática, anular o resultado de uma eleição, seja em relação ao investigado – prefeito reeleito – seja em relação ao investigado vereador eleito, pois tal depoimento não tem a devida imparcialidade necessária, ao contrário, veio de pessoa com vínculos políticos assumidos com os investigantes.

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Contudo, em seu depoimento prestado neste Juízo as fls. 279/280, especificamente as fls. 280 afirmou não usar computador e ter sido o Partido Republicano o responsável pela redação e digitação do documento, sendo certo que foi o 2.° Investigante quem lhe entregou para assinar. E mais, confirmou parcialmente o conteúdo da declaração supracitada, quando questionado pelo Ministério Público.

Não há dúvidas que Pedro Martins de Almeida é pessoa influente na comunidade de Olho D`água, Colônia, 4.° Distrito de São Fidélis/RJ, e, que mesmo após as eleições e ter apoiado a coligação investigante ainda trabalha com 05 (cinco) ‘linhas’ de transporte escolar de alunos, sendo 04 (quatro) decorrentes de contrato com o Estado e 01 (uma) com este Município, todas também de seu filho Ramon Silveira de Abreu, mas em nome de terceiros.

A seu turno, o Município de São Fidélis enviou cópias dos contratos de prestação de serviço de transporte de alunos para a localidade de ‘Olho D’Água’ referente aos anos de 2009 (fls. 256/259), 2010 (fl. 260), 2011 (fls. 261/264) e 2012 (fls. 265/268).

Frise-se que, mais uma vez, nenhuma delas encontra-se em nome de Pedro Martins de Almeida ou de seu filho Ramon Silveira de Almeida, situação que retrataria – conforme aduzido na inicial - a utilização, por parte dos dois, do nome de terceiras pessoas para o exercício da aludida atividade.

Destarte, pode-se concluir que nenhum prejuízo foi sofrido por Pedro Martins de Almeida e por Ramon Silveira de Almeida quanto à atividade empresarial (de fato) por eles desenvolvidas, o que é facilmente comprovado pelo esclarecimento prestado pelo Colégio Estadual de São Fidélis quanto à elevação do quantitativo das ‘linhas’ de transporte escolar, relativamente à localidade de Olho D’Água, de 04 (quatro) em 2011 para 05 (cinco) em 2012, fls. 73/157.

O fato mais relevante na visão do parquet foi que Ramon Silveira de Almeida,

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filho do Sr. Pedro Martins de Almeida, no ano de 2011, manifestou, perante o Chefe do Cartório Eleitoral desta 35.ª Zona – Fábio Stellet Gentil, preocupação com as aludidas linhas, conforme por este relatado em depoimento ao Juízo, de fls. 281/282, in verbis:

Que já ouviu falar de Ramon, conhece, é policial, mas não sabe sobre Pedro policial; que Ramon esteve consigo no cartório no ano passado para tratar de assuntos referentes a umas Kombis de transportes; que lembra vagamente que ele disse sobre linhas que ele ou o pai teriam na prefeitura e estariam com medo de se o pai não viesse candidato poderia ter as linha cortadas, e consultou se vindo ou não candidato se os carros poderiam trabalhar levando pessoas para comícios, pois teriam contrato com a prefeitura, salvo engano; que ele demonstrou preocupação em perder as linhas; que ele revelou que esse temor partia do pai dele vir em grupo adversário e ele perderia por causa do grupo ser da situação; que ele procurou antes do prazo da filiação partidária para trocar e desfiliar partido, pois o pai dele viria candidato em oposição ao grupo que estaria na situação; que ele não revelou de quem emanava a ordem.

Em que pese a manifestação do Ministério Público atribuindo elevado conteúdo probatório a este depoimento, principalmente advindo do chefe do cartório eleitoral, do mesmo vislumbro apenas a preocupação de Ramom em perder as linhas, por seu pai apoiar o candidato da oposição, o que não pode ser confundido com o relato de uma ameaça concreta, até porque nenhuma ameaça foi especificamente relatada pelo citado servidor no depoimento.

Há sim menção, na parte final das perguntas dos investigantes/requerentes, sobre uma ordem, sem esclarecer que ordem e de quem teria emanado, em alegações desconectadas de qualquer outra prova e da lógica.

Como demonstrado, Pedro Martins de Almeida e Ramon Silveira de Almeida seriam – por interposta pessoa - beneficiários de mais uma linha de transporte no ano de 2012, sendo certo que o procedimento licitatório municipal no qual lograram êxito, ocorreu em 03/02/2012 (fls. 265/268), ou seja, aproximadamente um mês antes da reunião declarada por Pedro Martins como ocorrida em final de fevereiro para março deste ano.

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Se o objetivo dos investigados fosse coagir e retaliar Pedro Martins de Almeida, por questões óbvias, teriam com ele se reunido antes do procedimento licitatório Municipal e não, aproximadamente, um mês depois, vez que já consumado e iniciado o contrato com a municipalidade.

Outrossim, diante da autonomia dos entes da federação, nos termos preconizados pela Constituição da República Federativa do Brasil, as linhas de transportes contratadas com o Estado são totalmente desafetadas da municipalidade, restando afastada qualquer conduta dos investigados para prejudica-lo em razão da filiação partidária com o em grupo da oposição (que ocorreu há mais de um ano antes do recente pleito eleitoral).

Necessário salientar que, em ano eleitoral, é comum e lícito, faz parte da democracia, que os pretensos candidatos busquem apoio político das lideranças das mais diversas localidades do contexto eleitoral, aliás uma das estratégias mais comuns da disputa eleitoral.

E, como afirmado por todos, Pedro Martins de Almeida apresenta-se como uma liderança principalmente na localidade de Olho D’água, neste Município.

Do conjunto probatório restou demonstrada apenas a realização de uma reunião para a obtenção de apoio político, ficando a cargo do depoimento do único informante a insustentável versão dos fatos elencados na inicial.

Também não se pode atribuir tal qualidade a uma declaração unilateral, que foi digitada por membro do primeiro investigante e entregue pelo segundo investigante para assinatura, fatos admitidos pelo próprio Pedro Martins de Almeida.

Destaca-se, ainda, que a aludida declaração não foi datada e não

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mencionou quando os fatos ‘ocorreram’, somente sendo esclarecido na Audiência ‘que a reunião foi no inicio das aulas, ‘em final de fevereiro para março’ (fl. 279) e somente em 11/09/2012, aproximadamente 01 mês antes das eleições, a presente investigação fora distribuída.

Assim, forçoso reconhecer a ausência de provas quanto à alegada coação e retaliação perpetrada pelos investigados em desfavor de Pedro Martins de Almeida que é correligionário do Partido da República (PR).

Ratificando o exposto, segue o seguinte julgado:

[...] 1. O art. 405, § 4º, do CPC, concede a faculdade ao juiz em atribuir o valor que considerar pertinente a depoimentos de testemunhas tidas como suspeitas ou impedidas. 2. A alegação de suspeição das testemunhas é matéria pertinente às instâncias ordinárias, atraindo, nesta via, a incidência das Súmulas nos 7/STJ e 279/STF. [...]” (TSE, Acórdão de 8.11.2007 no EEARESPE nº 28.013, Rel. Min. José Delgado)

Ressalta-se que, conforme informações oficiais, o 2.° investigado (LUIZ CARLOS FERNANDES FRATANI) obteve 13.229 (treze mil duzentos e vinte e nove) votos nas eleições municipais para o cargo majoritário, enquanto o 2.° investigante (DAVID LOUREIRO COELHO) obteve 9.757 (nove mil setecentos e cinquenta e sete) votos, tendo aquele vencido as eleições com diferença de 3.472 (três mil quatrocentos e setenta e dois) votos.

Não se poderia deixar de destacar que, nas sessões agregadas da localidade de Olho D’água, que receberam 184 (cento e oitenta e quatro) comparecimentos e onde reside Pedro Martins de Almeida, David Loureiro Coelho teve 24 (vinte e quatro) votos a mais que o candidato eleito Luiz Carlos Fernandes Fratani.

A outro giro, esclareço que, para caracterização do abuso de poder, é

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necessária a interferência direta na tomada de decisão pelo eleitor, a constituir contundente afronta ao Princípio Democrático, importando a existência objetiva dos fatos – abuso do poder político, do poder econômico, corrupção ou fraude – e a prova de sua influência no resultado eleitoral.

Na esteira da orientação atual da jurisprudência eleitoral, o abuso de poder, quando analisado para efeito de inelegibilidade, terá de assumir proporções que comprometam a lisura e normalidade das eleições.

Ratificando esse entendimento, seguem os seguintes julgados:

TRE-AL

RE - RECURSO ELEITORAL nº 1185 - Piacabuçu/AL

Acórdão nº 3874 de 19/12/2005

Relator(a) SÉRGIO JOSÉ WANDERLEY DE MENDONÇA

Publicação: DOEAL - Publicado no Diário Oficial do Estado, Data 20/12/2005, Página 68.

Ementa: RECURSO EM AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA AFASTADA, POR NÃO TER HAVIDO CERCEAMENTO DE DEFESA. SUPOSTA UTILIZAÇÃO DA MÁQUINA ADMINISTRATIVA. FRAGILIDADE DAS PROVAS. IMPROVIMENTO DO RECURSO.

1. Preliminar de nulidade da sentença inacolhida, porquanto o julgamanto antecipado da lide, em primeiro grau, ocorreu em virtude da constatação, pelo MM. Juiz a quo, de que havia elementos suficientes nos autos para se aferir a improcedência do pedido, daí por que não restou justificada a dilação probatória.

2. O processo eleitoral rege-se pelo pricípio segundo o qual a interferência judicial na manifestação da vontade popular somente pode ocorrer em caráter excepcionalíssimo. Vale dizer, QUANDO A AÇÃO DESTINADA À CASSAÇÃO DO REGISTRO OU DO DIPLOMA ESTIVER ACOMPANHADA DE VASTO E

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ROBUSTO ACERVO PROBATÓRIO, EVIDENCIANDO, DE MODO PATENTE E INDUBITÁVEL, O VICIAMENTO DO RESULTADO DA ELEIÇÃO, em razão de ABUSO DO PODER POLÍTICO ou econômico. AUSENTE A ROBUSTEZ PROBATÓRIA, DEVE PREVALECER A VONTADE POPULAR, EM HOMENAGEM AO REGIME DEMOCRÁTICO E À SOBERANIA DO VOTO.

TRE-PR

RE - RECURSO ELEITORAL nº 3937 - Esperança Nova/PR

Relator(a) JOECI MACHADO CAMARGO

Publicação: DJ - Diário da Justiça, Data 13/7/2005

Ementa: Recurso Eleitoral - Investigação c/c Pedido de Cassação de Registro e ou Diplomação - Compra de Votos - Inelegibilidade prevista no artigo 22, inciso XIV da Lei Complementar nº 64/90 - Insuficiência de provas - Sentença reformada.

Para configurar a infração ao artigo 41-A, da Lei nº 9504/97 exige-se prova irretorquível, NÃO SE PRENDENDO A DECLARAÇÕES DE TESTEMUNHAS LIGADAS A ADVERSÁRIO POLÍTICO E COM RESSENTIMENTO EXPRESSO.

Decisão: À unanimidade de votos, a Corte conheceu dos recursos e, no mérito: a) deu provimento ao recurso de Valdir Hidalgo Martinez e Genival Carreiro de Almeida; b) negou provimento ao recurso da Coligação por uma Esperança Nova Melhor e Claudemir Barbieri, nos termos do voto da Relatora.

RECURSO ELEITORAL. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO. CAPTAÇÃO IlÍCITA DE SUFRÁGIO. PREFEITO. VICE-PREFEITO. PRELIMINARES. PROVA TESTEMUNHAL EMPRESTADA. NULIDADE NO PROCESSO ORIGINÁRIO. DESCONSIDERAÇÃO. PRELIMINAR ACOLHIDA. PROVA TESTEMUNHAL EMPRESTADA. AFRONTA AOS PRINCíPIOS DO CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. NÃO CONFIGURAÇÃO. VALIDADE DA PROVA. PRELIMINAR REJEITADA. MÉRITO. PROVA TESTEMUNHAL. FRAGILIDADE. CONJUNTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE. NÃO COMPROVAÇÃO. PROVIMENTO DO RECURSO.

[...)

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3. A procedência de representação, com fundamento na prática de captação ilícita de sufrágio. requer, para a comprovação de sua ocorrência, prova robusta do ilícito, de modo que a existência de depoimento prestado por uma única testemunha, desacompanhado de qualquer prova que pudesse a este ser associado, impede a demonstração de certeza exigida para a configuração de ocorrência do ilícito.

4. Recurso conhecido e provido. (TRE/SE - RECURSO ELEITORAL n° 3487/ Santo Amaro das Brotas/SE; Acórdão n° 27/2012 de 30/01/2012; Relator(a) JOSÉ ALCIDES VASCONCELOS FILHO; DJE -, Tomo 021, Data 07/02/2012, Página 06)

RECURSO ESPECIAL. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL - ESPECIFICIDADE. Interposto o recurso especial a partir de alegado dissenso jurisprudencial, o aresto paradigma há de mostrar-se específico, ou seja, deve revelar adoção de entendimento diametralmente oposto ao acórdão proferido, em que pese ao enfrentamento dos mesmos fatos á luz de idêntica norma.

SUFRÁGIO - CAPTAÇÃO IlíCITA. ARTIGO 41-A DA LEI N° 9.504/97 - PROVA.

Incumbe ao autor da representação a prova do cometimento eleitoral ilícito, não cabendo concluir pela procedência quando os depoimentos são contraditórios.

CAPTAÇÃO ILíCITA- PROVA- DEPOIMENTO ÚNICO.

Depoimento isolado quanto à promessa de benefício em troca de voto, sem guardar sintonia com outro elemento ao menos indiciário, não respalda conclusão sobre a prática glosada pelo artigo 41.A da Lei nO9.504/97." (grifou-se) (TSE - AG 6385 - Relator MARCO AURÉLIO MENDES DE FARIAS MELLO - DJ - Diário de Justiça, Data 02/06/2006, Página 100).

Os investigantes não comprovaram a existência objetiva do fato e do resultado, que, caso existente, pudesse ter potencialidade de desequilíbrio da disputa política seja para o cargo de prefeito ou de vereador.

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Existem sim, como ressaltou o parquet, especificamente as fls. 307 em seu parecer, fatos circunstanciais, como a presença de Luiz Gustavo, então presidente da comissão de licitação, mas restou claro de seu depoimento que o mesmo funcionou como articulador da campanha do então candidato “Fenemê” inclusive é presidente do PMDB no município, como informado no depoimento de fls. 275, o que justifica sua presença e atuação direta na busca de apoio político.

A prova poderia sim ser realizada de maneira mais efetiva, note-se que sequer se pretendeu a oitiva de Ramom, filho do Sr. Pedro, diretamente citado como peça chave na peça inicial.

Daí que os elementos coligidos não me convenceram do alegado abuso de poder político pelos representados ou capaz de trazer a nulidade/cassação dos diplomas dos representados/investigados, pois ao final da instrução este magistrado ficou sim com muitas dúvidas, mas que não autorizam uma condenação pela insuficiente prova.

Eventual apuração da prática de improbidade administrativa ou de ilícito criminal por qualquer das pessoas mencionadas neste processo, pode ser realizada pelo órgão com atribuição correlata seja ou não do próprio Ministério Público.

Por todo exposto, JULGO IMPROCEDENTES OS PEDIDOS na forma do art. 269, I, do Código de Processo Civil.

Publique-se, para intimação das partes, por intermédio de seus patronos, cientes de que o prazo para interposição de recurso é de 03 dias, contados da publicação, nos termos do art. 31 da Resolução TSE nº 23.367/2011.

Ciência pessoal ao MPE.

Após o trânsito em julgado, dê-se baixa e arquivem-se.

São Fidélis (RJ), 24 de outubro de 2012. OTÁVIO MAURO NOBRE