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Sobre desaos teóricos de modelos

de energia e matéria escuras

Miguel Boavista Quartin

Orientador: Ioav Waga

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SOBRE DESAFIOS TEÓRICOS DE MODELOS

DE ENERGIA E MATÉRIA ESCURAS

Miguel Boavista Quartin

Tese de Doutorado submetida ao Programa de Pós-

graduação em Física, do Instituto de Física, da Univer-

sidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, como parte

dos requisitos necessários à obtenção do título de Doutor

em Ciências (Física).

Orientador: Ioav Waga

Rio de Janeiro

Abril de 2008

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Quartin, Miguel Boavista.R375 Sobre Desaos Teóricos de Modelos de Energia e Matéria Es-

curas/ Miguel Boavista Quartin.-Rio de Janeiro: UFRJ/IF, 2008.xviii, 124f.: il. ; 29,7cm.Orientador: Ioav WagaTese (doutorado) - UFRJ/ Instituto de Física/ Programa de

pós-graduação em Física , 2008.Referências Bibliográcas: f. 131-140.1. Cosmologia. 2. Energia Escura. 3. Matéria Escura. 4.

Interações Escuras. 5. Aceleração Cósmica. 6. Dinâmica Newtoni-ana Modicada. 7. TeVeS. I. Waga, Ioav. II. Universidade Federaldo Rio de Janeiro, Instituto de Física, Programa de pós-graduaçãoem Física. III. Título.

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Resumo

SOBRE DESAFIOS TEÓRICOS DE MODELOS DE ENERGIA E MATÉRIA

ESCURAS

Miguel Boavista Quartin

Orientador:

Ioav Waga

Resumo da Tese de Doutorado submetida ao Programa de Pós-graduação em

Física, do Instituto de Física, da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ,

como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Doutor em Ciências

(Física).

Ainda que o antigo abismo que separava a cosmologia do seleto grupo das ciên-

cias de alta precisão seja atualmente melhor descrito metaforicamente por um vale,

através do qual um bandeirante já possa conceber uma trilha, alguns problemas de

cunho teórico permanecem sem solução. O atual melhor modelo do Universo lança

mão de duas componentes exóticas que constituiriam 95% da sua densidade de

energia: matéria escura e energia escura. Neste trabalho investigamos alguns destes

problemas.

Na arena da matéria escura, sabe-se que uma modicação da dinâmica newtoni-

ana pode emular os efeitos da matéria escura sem necessidade de novas partículas

materiais. Tal abordagem foi, entretanto, muito criticada no passado por não apre-

sentar uma teoria relativística consistente. Há poucos anos, no entanto, uma teoria

relativística consistente foi construída e um grande esforço tem sido empregado

para determinar a sua validade observacional. Mostramos uma análise preliminar

de como tal teoria poderia explicar as observações do efeito de lentes gravitacionais

do Aglomerado da Bala, aclamado como uma das melhores evidências de matéria

escura da atualidade.

No palco da energia escura, diversos problemas relacionados a ajustes nos de

modelos persistem, em particular o problema da coincidência cósmica: por que ape-

nas recentemente a densidade de energia da energia escura tornou-se comparável

àquela da matéria, uma vez que ambas componentes são usualmente supostas in-

dependentes e portanto se diluem à medida que o universo expande de maneiras

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distintas? Modelos que tentam solucionar este problema sem recorrer a ajuste no

devem apresentar um regime para o qual energia escura e matéria não mais se diluam

de modo distinto, pelo menos no presente momento. Este regime é denominado es-

calável. Porém, possuir um regime escalável acelerado no presente é só metade

das obrigações básicas de qualquer modelo. É preciso haver também uma época

dominada pela matéria de modo a permitir a formação de estruturas.

Neste trabalho analisamos a viabilidade de se obter uma cosmologia com estes

dois regimes através de modelos com interações entre energia e matéria escuras.

Estudamos primeiramente a energia escura tanto como um campo escalar acoplado

quanto como um uido fenomenológico acoplado ao uido de matéria escura. No

primeiro caso, demonstramos que para uma vasta classe de lagrangianas o problema

da coincidência não possui solução. No segundo, mostramos que tal solução é per-

mitida, mas apenas ao custo de introduzir diculdades em se ajustar o espectro de

potência da matéria.

Palavras-chave: Cosmologia, Energia Escura, Matéria Escura, Interações Escuras,

Aceleração Cósmica, Problema da Coincidência, Dinâmica Newtoniana Modicada,

TeVeS.

Rio de Janeiro

Abril de 2008

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Abstract

ON THEORETICAL CHALLENGES OF DARK ENERGY AND DARK

MATTER MODELS

Miguel Boavista Quartin

Advisor:

Ioav Waga

Abstract da Tese de Doutorado submetida ao Programa de Pós-graduação em

Física, do Instituto de Física, da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ,

como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Doutor em Ciências

(Física).

While the eternal abyss that historically separated cosmology and the prestigious

group of high precision sciences would now be better described metaphorically as

a valley through which a ranger could already envision a route, some theoretical

problems remain unsolved. The current best model of our Universe makes use of

two exotic components which make up for 95% of its the energy: dark energy and

dark matter. In this work, we investigate some of these problems.

In the dark matter arena, it is known that a modication of newtonian dynamics

might emulate the eects of dark matter without the need for new matter particles.

Such an approach, however, has been heavily criticized in the past for not estab-

lishing a consistent relativistic theory. A few years ago such a consistent relativistic

theory was constructed and a great deal of eort has been put forth to determine

its observational validity. We show a preliminary analysis of how this theory might

explain the observations of gravitational lensing of the Bullet Cluster, heralded as

one of the best evidence of dark matter at present.

At the dark energy stage, many problems ultimately related to ne-tuning still

persist, in particular the cosmic coincidence problem: why only recently has the

energy density of dark energy become comparable to that of matter, since both

components are usually assumed to be independent and therefore dilute in dierent

ways as the universe expands. Models which try to solve this problem without the

need for ne-tunings should allow for a regime in which dark energy and dark matter

no longer dilute in dierent ways, at least at present. Such a regime is dubbed a

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scaling solution. Moreover, a present accelerated scaling solution is only half the

requirements of any model. It is also necessary for a matter dominated epoch to

exist in order to allow the observed structure formation.

In this work we analyze the feasibility of obtaining a cosmology with these two

regimes through the use of interactions between dark energy and dark matter. We

study at rst dark energy as a coupled scalar eld and afterwards, as a phenomeno-

logical uid coupled to the dark matter uid. In the rst case we demonstrate that

for a vast class of Lagrangians the coincidence problem remains unsolved. In the

second case, we show that such a solution is allowed, but not without introducing

diculties in a t to the matter power spectrum.

Key-words: Cosmology, Dark Energy, Dark Matter, Dark Interactions, Cosmic Ac-

celeration, Coincidence Problem, Modied Newtonian Dynamics, TeVeS.

Rio de Janeiro

April, 2008

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Agradecimentos

Os quatro anos empreendidos na elaboração de uma tese de doutorado não só

propiciam como demandam a formação de diversas linhas de colaboração prossio-

nais e pessoais. Através destas, eu cresci muito como pessoa e como físico, de

maneiras às vezes indissociáveis. Por motivos de brevidade pretendo mencionar aqui

apenas algumas das pessoas mais marcantes nesta minha jornada, porém sempre com

o pressentimento de estar omitindo alguém que me foi muito importante. Se de fato

o zer, peço perdão.

Em primeiro lugar, de maneira nenhuma por questão hierárquica, me sinto na

obrigação de exaltar o meu orientador Ioav. Desde o ano 2000, quando o conheci

pela primeira vez (para o que viria a ser uma frutífera iniciação cientíca de um

ano e meio) tive a certeza de que Ioav seria mais do que um professor. Dito e feito:

considero-o hoje um grande amigo, e alguém por quem tenho muita admiração.

Com sua sensibilidade, bom senso e bom humor, além de amplo conhecimento da

sua (agora nossa) área, você se mostrou um orientador ímpar.

Minha mãe também foi exemplar no seu eterno apoio irrestrito às minhas escolhas

prossionais e no carinho, cuidado e amor distribuídos ao longo da minha vida.

Agradeço também ao meu pai, que infelizmente não sobreviveu a este meu projeto.

Meus irmãos Cris e Francisco também sabem bem o quanto foram e são importantes

pra mim.

Os mestres Farina, Maurício e Marcus Venícius foram especialmente relevantes

na minha formação acadêmica. O primeiro me contagiou com seu entusiasmo e

com ele aprendi muita física e, espero, um pouco da arte da didática. O segundo

me ensinou muito sobre Relatividade e melhorou minha percepção sobre o que um

antigo professor da engenharia deniu como o conjunto das coisas que eu não sabia

que não sabia. O último, por sua vez, é outro gênio da didática do qual espero ter

aprendido um pouco e com o qual travei diversas discussões interessantes.

Meus colegas de sala e co-sala (quem já esteve lá sabe do que digo) ajudaram

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muito, cada um à sua maneira. Ribamar é uma biblioteca de cosmologia e compa-

nheiro de todos os astro-eventos; Émille e Bia se tornaram grandes amigas; a sim-

patia do André sempre disputando com sua inteligência como seu destaque pessoal;

Taketani sempre capaz de conversas descontraídas; Ana Julia pela concorrência no-

turna (quem seria o último a sair?); Letícia, que entrou no m mas ainda as-

sim proporcionou papos interessantes; Fernando, o artista do grupo; Mintz, sempre

prestativo. Os papos (e cervejas) de m de tarde com o amigo do m do corredor

Kazu, foram freqüentemente os mais cabeças e revigorantes de todos. Assim como

as conversas e desabafos com o Martin (seja na Urca, seja em Chicago), que foram

sensacionais e zeram dele um grande amigo. Um pouco além, no Fermilab, Murilo

foi muito companheiro e facilitou consideravelmente minha adaptação ao local.

Por m, todos meus outros amigos de fora da física me ajudaram a refrescar a

cabeça e esquecer temporariamente a matemática. Em especial o camarada Alexan-

dre, meu grande parceiro do tênis, e os amigos de longa data Beauty, Bernardo, o

outro Bernardo, Beto, Cacello, Christiano, Fabiano, Isabela, Leo, Marcelo, Marcello,

Mauricio, Nathan, Vilaça e Taty.

Agradeço também ao CNPq pela bolsa de doutorado a mim concedida, à CAPES

pela bolsa PDEE que me permitiu estagiar em um dos maiores centros de física do

mundo, o Fermilab, nos Estados Unidos e ao Casé, que sempre ajudou com muito

bom humor a mastigar toda a burocracia envolvida em ambos casos. Tanto ao

professor Scott Dodelson e aos demais membros do Fermilab quanto ao professor

e amigo Luca Amendola e ao Osservatorio Astronomico di Roma, meus sinceros

agradecimentos pela oportunidade e acolhimento.

Por m, e mais importante, a companhia e o amor incondicional ao longo de

toda minha pós-graduação (e além) da minha namorada Ana foram cruciais para

mim. Sou realmente muito afortunado de tê-la como companheira. Nunca poderia

pedir mais.

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Notações Adotadas no Texto

Siglas Signicado

AQUAL teoria com lagrangiana não-quadrática no termo

cinético;

CDM cold dark matter, sigla em inglês correspondente à

MEF;

EDM era dominada pela matéria;

EDMϕ era dominada pela matéria e pelo campo ϕ

EE energia escura;

FLRW métrica de Friedmann-Lemaître-Robertson-Walker;

ME matéria escura;

MEF matéria escura fria;

MoND teoria com dinâmica newtoniana modicada;

PC problema da coincidência;

PCC problema da constante cosmológica;

PCIEE problema da condição inicial da EE;

RAQUAL teoria relativística de AQUAL;

RCF radiação cósmica de fundo em microondas;

RG (teoria da) Relatividade Geral;

SCI sensibilidade às condições iniciais;

SDSS Sloan Digital Sky Survey;

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TeVeS teoria gravitacional Tensorial-Vetorial-Escalar;

WMAP3 resultados de 3 anos da sonda-satélite Wilkinson

Microwave Anisotropy Probe.

Símbolos Signicado

≡ igual, por denição;

a = 1/(1 + z) fator de escala da métrica de FLRW;

a0 escala de aceleração de MoND;

Aµ campo vetorial dual (ou 1-forma) do tipo tempo de

TeVeS;

Aµ ≡ gµνAν campo vetorial do tipo tempo de TeVeS;

gµν métrica na moldura de Einstein-Hilbert;

gµν métrica na moldura da matéria;

G constante gravitacional de Newton;

H ≡ a/a parâmetro de Hubble;

pj pressão relativística da componente j;

Rz ≡ ρx/ρc grandeza para estimar o PC, avaliada em um desvio

para o vermelho z;

wj ≡ pj/ρj parâmetro da equação de estado da componente j;

X ≡ −gµν∂µϕ ∂νϕ/2 termo cinético do campo escalar ϕ;

Y ≡ Xeλϕ argumento da função g, associada a soluções es-

caláveis para campos escalares;

z ora desvio para o vermelho, ora variável do espaço

de fase(≡√

Ωr

), dependendo do contexto;

χ ≡ (gµν − AµAν)φ,µφ,ν termo pseudo-cinético do campo escalar de TeVeS;

∆ ≡ρmaxxi −ρ

minxi

|ρmaxxi |

grandeza para estimar a SCI;

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ζ ≡ ρmaxEEi /ρri grandeza para estimar o PCIEE;

Λ constante cosmológica;

ρj densidade de energia da componente j;

ρcrit ≡3H2

8πG densidade de energia crítica;

ΦN potencial gravitacional newtoniano;

Φ potencial gravitacional MoNDiano;

ψ, φ, ϕ campos escalares;

Ωj ≡ρjρcrit

parâmetro de densidade da componente j;

j0 valor atual (z = 0) da componente j;

ji valor inicial (z = 1026) da componente j;

b quantidade referente aos bárions;

c quantidade referente à matéria escura fria;

r quantidade referente à radiação;

EE quantidade referente à EE quando esta é descrita por

um campo;

x quantidade referente à EE em um contexto geral.

Miscelânea Signicado

Universo o conjunto de tudo o que é físico;

universo um modelo de descrição do Universo.

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Sumário

1 Introdução 9

1.1 Problemas dos Modelos de Energia Escura . . . . . . . . . . . . . . . 10

1.2 Plano Geral da Tese . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14

2 Princípios de Cosmologia 17

2.1 O Modelo Padrão da Cosmologia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19

2.1.1 Equações de Friedmann . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19

2.1.2 Componentes básicas do universo . . . . . . . . . . . . . . . . 23

2.2 Alguns Testes Observacionais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27

2.2.1 Supernovas Tipo Ia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28

2.2.2 Radiação Cósmica de Fundo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30

2.3 Vícios e Virtudes da Matéria Escura . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35

2.3.1 Virtudes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35

2.3.2 Vícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39

3 A Teoria TeVeS de Bekenstein e Sanders 43

3.1 Precursores de TeVeS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 44

3.1.1 MoND . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 44

3.1.2 Uma lagrangiana para MoND . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48

3.1.3 Primeiras teorias relativísticas de MoND . . . . . . . . . . . . 51

3.2 Princípios de TeVeS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 55

3.2.1 As ações e equações da teoria . . . . . . . . . . . . . . . . . . 55

3.2.2 Limite não-relativístico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 59

3.2.3 Efeito de lentes gravitacionais . . . . . . . . . . . . . . . . . . 62

3.2.4 Outros resultados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 63

3.3 O Limite Axissimétrico de Campo Fraco no Vácuo . . . . . . . . . . . 64

3.3.1 Equações de campo no vácuo para Gµν , Aµ e φ . . . . . . . . 68

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SUMÁRIO 2

3.3.2 Comentários gerais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 70

4 Interações Escuras por Campo Escalar 71

4.1 A Lagrangiana Geral para Soluções Escaláveis com Acoplamento Ar-

bitrário . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 74

4.2 Equações do Espaço de Fase . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 78

4.3 Pontos Fixos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 80

4.3.1 Ponto A: Soluções dominadas pelo campo escalar . . . . . . . 81

4.3.2 Ponto B: Soluções escaláveis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 82

4.3.3 Pontos C e D: Soluções cinéticas . . . . . . . . . . . . . . . 84

4.3.4 Resumo dos pontos xos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 86

4.3.5 Pontos xos para z 6= 0 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 88

4.4 É Possível Haver dois Regimes Escaláveis? . . . . . . . . . . . . . . . 89

4.4.1 Caso em que c0 > 0 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 90

4.4.2 Caso em que c0 < 0 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 96

4.4.3 Caso em que c0 = 0 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 96

5 Interações Escuras Fenomenológicas 97

5.1 O Modelo de Interações Escuras . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 98

5.2 Pontos Fixos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 101

5.2.1 Estabilidade dos pontos xos . . . . . . . . . . . . . . . . . . 104

5.2.2 Resumo dos pontos xos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 105

5.3 Possibilidade de duas Épocas Escaláveis . . . . . . . . . . . . . . . . 106

5.4 Vínculos Observacionais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 108

5.5 Ajuste Fino e Problemas de Condições Iniciais . . . . . . . . . . . . . 112

5.6 Um Modelo de Brinquedo de duas Variáveis . . . . . . . . . . . . . . 115

6 Conclusões e Perspectivas 121

6.1 Matéria Escura . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 121

6.2 Energia Escura . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 122

A Derivação da solução para acoplamento arbitrário 125

B Fundo cosmológico mais geral 127

Referências Bibliográcas 129

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Lista de Figuras

2.1 Diagrama de distribuição espacial de galáxias obtido pelo levanta-

mento 2dF [Coll03]. A Terra está localizada no vértice. Cada um dos

aproximadamente 80 mil pontos representa uma galáxia, em distân-

cias de até ∼ 600 Mpc. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18

2.2 Contornos de nível de conança de 1σ e 2σ para os atuais valores dos

parâmetros de densidade de energia da matéria (bariônica e escura) e

da energia escura no modelo ΛCDM, conforme resultados dos exper-

imentos WMAP3 e SDSS. Os contornos claros representam níveis de

conança obtidos apenas com o WMAP3. A reta escura representa

um universo com tri-curvatura nula (isto é, Ωm + ΩΛ = 1). Figura

retirada de [Sper07]. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25

2.3 Evolução das densidades de energia da radiação, matéria (bariônica

e escura) e constante cosmológica como função do desvio para o ver-

melho para o modelo ΛCDM. A linha tracejada vertical denota a

época de igualdade entre matéria e radiação, em z ' 3300. . . . . . . 26

2.4 Evolução de todas as quatro densidades de energia como função do

desvio para o vermelho para o modelo ΛCDM. Da esquerda para a

direita, a componente dominante é, em ordem: radiação, matéria

escura e energia escura. Bárions são sempre sub-dominantes. A linha

preta vertical denota o instante atual, z = 0. . . . . . . . . . . . . . . 27

2.5 Esquema básico de classicação das supernovas, baseado na análise de

seus espectros de emissão, e a descrição dos seus prováveis processos

físicos de formação. Figura retirada de [Quin07]. . . . . . . . . . . . . 29

3

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LISTA DE FIGURAS 4

2.6 Curvas de luz na banda (de freqüência) B de supernovas do tipo Ia

obtidas no levantamento Calán-Tololo realizado no início da década

de 90. O eixo horizontal representa o tempo medido em dias. (Em

cima) Curvas de luz medidas, sem correções. (Em baixo) Curvas de

luz após aplicação do fator de correção de alongamento da duração-

magnitude, conforme proposto em [Perl97]. Figura retirada de [Miqu07]. 31

2.7 Mapa de temperatura da RCF em coordenadas celestes, na banda Q

(41 GHz), obtido pelo WMAP3. O zero da temperatura está ajustado

à temperatura média da RCF, 2, 725 K. A mancha vermelha horizon-

tal é a contaminação devida à nossa própria galáxia. As maiores

variações de temperatura são da ordem de 0,01%. Figura retirada

de [Hins07]. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32

2.8 Espectro angular de potência obtido pelo WMAP3. A curva ver-

melha é o melhor ajuste considerando-se o modelo ΛCDM. A faixa

cinza representa a variância cósmica (vide (2.25)). Figura retirada

de [Hins07]. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34

2.9 Esquema típico de curvas de rotação de galáxias espirais. A curva

tracejada A representa a forma calculada com base apenas na massa

bariônica. A curva sólida B representa o melhor ajuste aos dados

observacionais. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37

2.10 Coleção de curvas de rotação de galáxias espirais. Os dados foram

obtidos: nas regiões centrais por uma combinação de linhas molec-

ulares de CO; nos discos por linhas na faixa ótica; na parte externa

dos discos (gás) pelas linhas de 21cm de HI. Os discos se estendem no

ótico até R ∼ 10 kpc, mas as curvas de rotação permanecem planas

muito além desta distância. Figura retirada de [Sofu01]. . . . . . . . . 38

2.11 O Aglomerado da Bala em duas diferentes bandas de freqüência. O

gráco da direita é sensível às emissões de raios-X do gás intergalático

(manchas cinzas e pretas), o da esquerda não. Em ambos grácos

foi sobreposto as curvas de nível da distribuição de massa, conforme

inferido pelo efeito de lentes gravitacionais. Nota-se claramente a

existência de dois picos distintos. Figura retirada de [Clow06b]. . . . 39

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LISTA DE FIGURAS 5

2.12 Relação de Tully-Fisher obtida pelo levantamento 2MASS [Skru97]

para 360 galáxias espirais retiradas do catálogo [Dale99]. A linha

preta sólida representa o melhor ajuste dos dados e corresponde a

uma relação LK′ ∝ v3,7rot (ou, equivalentemente, a vrot ∝ L0,27

K′ ). As

linhas pontilhadas demarcam a dispersão em 2σ. Figura retirada

de [Cour07]. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41

3.1 Razão massa-luminosidade (na banda K') para galáxias espirais em

Ursa Maior representadas em função do raio no ponto mais distante

na respectiva curva de rotação (esquerda) e da aceleração centrípeta

neste mesmo ponto (direita). Note a ausência de correlação entre

M/L e o raio da galáxia e a aparente relação M/L ∝ 1/a. Figura

retirada de [Sand02]. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45

3.2 Curvas de rotação para uma amostra de 15 galáxias espirais. As

curvas sólidas representam a previsão de MoND. Para efeito de com-

paração, estão dese-nhadas também as curvas previstas pela gravi-

tação newtoniana levando-se em conta a matéria visível estelar (curva

pontilhada), gasosa (curva tracejada) e (quando disponível) do bojo

(curvas com tracejado longo). As distâncias (abscissas) estão em kpc

e as velocidades em km/s. Figura retirada de [Sand02]. . . . . . . . . 47

3.3 Gráco da massa ausente por aceleração típica de diversos sistemas

astrofísicos. A curva azul, na maior parte diagonal, representa a

previsão de MoND. As elipses demarcam a localização neste plano

e variação aproximada dos diversos sistemas. Apenas os núcleos de

aglomerados de galáxia não são explicados por MoND. Figura retirada

de [Milg98]. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48

3.4 (Esquerda) Gráco da massa dinâmica newtoniana dos aglomerados

de galáxias dentro de um raio de corte observado (rout) contra a massa

total observável para 93 aglomerados emissores de raios-X [Whit97].

A linha sólida diagonal corresponde à Mdyn = Mobs (nenhuma dis-

crepância). (Direita) Idem para a massa dinâmica de MoND. Figura

retirada de [Sand02]. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49

3.5 A função V (µ) e a correspondente D(χ), calculadas para os parâmet-

ros µ0 = 200 e lB = 100 Mpc. A descontinuidade de V (µ) em µ = µ0

se traduz na descontinuidade da derivada de D(χ) em χ = 0. . . . . . 58

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LISTA DE FIGURAS 6

3.6 A função µ(χ) obtida invertendo-se −dV (µ)dµ

= χ. A existência de

um limite newtoniano impõe µ(χ) ' µ0 para χ 1. Um limite

MoNDiano, por sua vez, requer µ(χ) ' µ0√χ para 0 < χ 1. . . . 60

3.7 O espectro angular de potência da RCF (em cima) e o espectro de

potência da matéria bariônica (em baixo) para: (i) um universo do

tipo MoND com ΩΛ = 0, 78 ,Ωneutr = 0, 17 e Ωb = 0, 05 (curva

sólida); (ii) um universo do tipo MoND com ΩΛ = 0, 95 e Ωb =

0, 05 (curva tracejada); (iii) o modelo ΛCDM (curva pontilhada).

Adicionou-se também uma coleção de pontos de experimentos de RCF

e do SDSS. Figura retirada de [Skor06a]. . . . . . . . . . . . . . . . . 65

4.1 Espaço de fase para o modelo (4.67) com u = 2, c = c0 = 1, λ = 4

e Q = 0, 7 em conjunto com os pontos xos A, B, C e D. Aqui e

nas guras seguintes a área cinza representa a região em que Ωϕ > 1.

A linha pontilhada corresponde à singularidade dada por (4.71), na

qual a velocidade do som diverge. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 92

4.2 Espaço de fase para o modelo (4.67) com u = 1, 1, c = c0 = 1, λ = 2

e Q = 2 em conjunto com os pontos xos A, B e D (o ponto C jaz

na região Ωϕ > 1). A linha pontilhada corresponde à singularidade

dada por (4.71), na qual a velocidade do som diverge. . . . . . . . . . 93

4.3 Espaço de fase para o modelo (4.67) com u = 1, c = c0 = 1, λ = 1, 54

e Q = 1, 02 em conjunto com os pontos xos A, B, C e D. . . . . . . 94

5.1 Trajetórias no espaço de fase em conjunto com os pontos xos A, B,

C e D. De cima para baixo tem-se λx = λc = 0 , λx = λc = 0, 04

e λx = −λc = −0, 15, enquanto wx = −1 para todos os três grácos.

Note que algumas trajetórias cruzam as superfícies X = 0 e Y = 0 .

O volume cinza representa a região em que o vínculo (5.10) é violado.

A curva preta tracejada corresponde à trajetória que atravessa as

densidades de energia (observacionais) atuais, as quais por sua vez

estão representadas pela estrela vermelha. . . . . . . . . . . . . . . . 107

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LISTA DE FIGURAS 7

5.2 Resultados combinados dos testes de supernovas e parâmetro de deslo-

camento. Os volumes representam níveis de conança de 1 e 2σ,

marginalizados sobre Ωc0 com uma a priori gaussiana baseada nos re-

sultados de WMAP3+SDSS. Os contornos verticais estão desenhados

em λx = 0 (branco) e λc = 0 (preto). O corte horizontal amarelo é

feito em wx = −1 (vide gura 5.3), e outros cortes pontilhados foram

feitos como guias visuais em wx = −1, 5, wx = −2, 0 e wx = −2, 5. . . 109

5.3 Contornos em níveis de conança de 1, 2 e 3σ para wx xo em −1. A

linha marrom tracejada representa o caso particular em que λx = λc ,

conforme considerado em [Chim03], e o ponto amarelo aponta o caso

ΛCDM. A área cinza no topo é a região para a qual o sistema entra

no abismo catastróco caracterizado pelo ponto xo F , o que na

prática signica que H(z∗) = 0 para algum z∗ < zrecombinação. . . . . 110

5.4 Contornos de 1, 2 e 3σ marginalizados em cada um dos três parâmet-

ros do modelo, e as funções de verossimilhança unidimensionais. To-

das as prioris foram tomadas planas. As linhas pretas verticais nos

grácos unidimensionais e os pontos amarelos nos contornos repre-

sentam wx = −1, λc = 0 e λx = 0 respectivamente. A curva marrom

tracejada no gráco inferior central representa o caso λx = λc . . . . . 112

5.5 Intersecção dos contornos de 1 e 2σ com as regiões do espaço de

parâmetros que permitem o regime duo-escalável. No interior da

região verde transparente temos uma solução escalável tipo A1 −B2,

enquanto no interior da região cinza opaca quadriculada temos um

regime duo-escalável do tipo A2 − B2. As fronteiras cinzas foram

delineadas de modo a garantir que XA2 < 0, 1, de modo a não se

comprometer a formação de estruturas durante a EDM. Os contornos

2D são os mesmos da gura 5.2. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 113

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LISTA DE FIGURAS 8

5.6 A variável ζ do PCIEE (acima) e a variável ∆ da SCI (abaixo), calcu-

ladas como função das constantes de acoplamento λx e λc. Fixou-se

aqui wx = −1 . As melhorias em ζ variam entre 55 e 75 ordens de

magnitude (ζΛCDM ∼ 10−100), enquanto ∆ se situa entre 1 e 30 vezes o

valor em ΛCDM. A queda abrupta de ζ próximo a λc = 0 é esperada

(vide seção 5.6). A largura do vale em λc = 0 no gráco de ∆ está

grosseiramente exagerada por motivo de claridade de exposição. De

fato, a queda tem início apenas para |λc| . 10−60. Para λc < 0, ζ é

negativo, e portanto nesta seção ζ perde a sua importância uma vez

que o PCIEE não é mais aplicável. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 115

5.7 Evolução de todas as quatro densidades de energia como função do

desvio para o vermelho. Da esquerda para a direita, a componente

dominante é, em ordem: radiação, matéria escura e energia escura.

Bárions são sempre sub-dominantes. As curvas tracejadas correspon-

dem ao modelo ΛCDM e as linhas sólidas ao caso λx = 0, 18,

λc = −0, 08, wx = −1, 18. Note que a igualdade matéria-radiação

é arrastada para z ' 20000, e que a EE possui densidade de energia

negativa para z > 2. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 117

5.8 Idem à gura 5.7 para o caso em que λx = λc = 0, 014 e wx =

−1, 014. Aqui a evolução é mais parecida com o de ΛCDM, e em

particular a densidade de energia da EE é sempre positiva. . . . . . . 118

5.9 Idem à gura 5.7 para o caso em que λx = 0, 23, λc = −0, 14,

wx = −0, 85. Uma vez mais, a igualdade matéria-radiação é arrastada

para z ' 20000. Note que por um não tão curto intervalo de desvio

para o vermelho os bárions se tornam a componente (marginalmente)

dominante. Neste cenário, já teríamos alcançado o atrator acelerado

(R−1 esta a menos de 4% de R0) e portanto, pela nossa denição,

solucionado o PC. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 119

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Capítulo 1

Introdução

A atual melhor descrição do Universo tem como alicerces duas componentes não

constituídas por nenhuma forma de matéria até o momento conhecidas. Maior gravi-

dade possui o fato de se estimar que ambas juntas representem algo como 95% de

toda a energia do cosmo. Inferidas exclusivamente por métodos gravitacionais, estas

duas componentes possuem entretanto propriedades que nos permitem distingui-las.

Uma é caracterizada por se comportar de maneira semelhante à matéria conven-

cional, bariônica (pressão desprezível frente à sua densidade de energia), porém sem

interagir diretamente com esta ou tampouco com fótons, sendo efetivamente invisível

aos nossos telescópios em quaisquer freqüências. Por tanto a denominamos Matéria

Escura (ME). A outra se diferencia por apresentar pressão negativa, de valor não

distante do negativo de sua densidade de energia, e recebe o rótulo (igualmente

criativo) de Energia Escura (EE).

Grandes esforços teóricos e experimentais foram e continuam sendo empregados

na tentativa de se determinar a constituição de ambas e conseqüentemente sua re-

lação com as demais leis da física já estabelecidas. No caso da ME, acredita-se que

a mesma possa ser constituída de partículas exóticas não-relativísticas provenientes

de alguma extensão do Modelo Padrão da física de partículas. A esta descrição

intitula-se genericamente Matéria Escura Fria (doravante MEF), a ser analisada na

seção 2.3. Entretanto, algumas teorias alternativas propõem uma origem puramente

gravitacional para a ME. Em particular, Bekenstein propôs em 2004 uma teoria

tensorial-vetorial-escalar (TeVeS) com o intuito de descrever os efeitos observados

de ME abrindo mão de novas partículas fundamentais. Voltaremos mais adiante a

este problema; no momento concentrar-nos-emos em descrições da EE, por enquanto

muito menos estabelecidas.

9

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CAPÍTULO 1. INTRODUÇÃO 10

1.1 Problemas dos Modelos de Energia Escura

Diversos conjuntos de dados observacionais tais como supernovas do tipo Ia, a

Radiação Cósmica de Fundo em Microondas (doravante RCF) e levantamentos de

estrutura em larga escala, quando combinados, atualmente indicam que vivemos

em um universo aproximadamente chato, de baixa densidade de matéria e cuja ex-

pansão está ganhando velocidade. A fonte geradora de tal aceleração cósmica é

no entanto ainda mal compreendida e diversas questões que se seguem se postam

sobre sua natureza e seu papel dentro dos modelos de física de partículas. Ape-

nas o nome, Energia Escura, desfruta de consenso. O candidato mais simples é

a constante cosmológica de Einstein, Λ, supostamente representativa da densidade

de energia do vácuo (ρΛ = Λ/8πG). Seu minúsculo valor inferido por observações,

entretanto, encontra-se 50 (120) ordens de magnitude aquém de estimativas con-

servadoras (agressivas) dadas pela teoria quântica de campos e explicar esta dis-

crepância é um dos maiores desaos da física teórica. Isto constitui o que às vezes se

denomina o problema da constante cosmológica (PCC), cuja solução provavelmente

requer a descoberta de uma simetria subjacente até o momento desconhecida, ca-

paz de induzir um cancelamento quase perfeito do valor da densidade de energia

do vácuo ou pelo menos de sua contribuição à gravidade. Candidatos renomados

tais como a supersimetria não resolvem este problema, pois são quebrados em altas

escalas de energia. Acredita-se que tal cancelamento namente ajustado seja muito

improvável e o problema é abordado por o que se considera uma hipótese mais ra-

zoável: uma completa supressão da contribuição da densidade de energia do vácuo

ao setor gravitacional. Isto por sua vez exige uma explicação alternativa para as

observações cosmológicas supracitadas.

Possíveis candidatos normalmente discutidos na literatura costumam cair em

duas categorias: componentes exóticas com pressão negativa ou modicações à Rela-

tividade Geral que se tornam relevantes em escalas cosmológicas. Em ambos os

casos, distintos problemas teóricos e observacionais se apresentam, o que tornou o

solo fértil para uma enormidade de modelos orirem. Do ponto de vista teórico nós

podemos identicar três questões às quais vamos rotular: problema da coincidên-

cia (PC), o problema da condição inicial da densidade de energia da EE (PCIEE)

e a sensibilidade às condições iniciais (SCI). Estes podem estar fortemente ligados

(como no caso de modelos de EE do tipo Λ, descritos abaixo) ou ser dependentes

da interpretação física subjacente a um modelo particular (em oposição a ser um

problema do modelo em si), como tornaremos mais claro a seguir. Outro aspecto

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1.1. PROBLEMAS DOS MODELOS DE ENERGIA ESCURA 11

importante é que todos os três problemas freqüentemente impõem um ajuste no

aos modelos observacionalmente viáveis.

O PC pode ser colocado assim: por que apenas recentemente (em termos do

desvio para o vermelho) a densidade de energia da EE tornou-se comparável àquela

da matéria, uma vez que ambas componentes são usualmente supostas independentes

e portanto escalam de maneiras distintas? O PCIEE aparece ao se interpretar a

energia escura como um campo, mas não ao se trabalhar com teorias de gravidade

modicada. Em outras palavras: por que o valor inicial (pelo que nos referimos ao

instante seguinte ao m da inação, z ∼ 1026) da densidade de energia da EE é tão

menor do que se esperaria por argumentos de equipartição? Considera-se razoável

que após a inação os diferentes campos da natureza tivessem densidades de energia

com a mesma ordem de magnitude. Portanto um valor razoável para a razão entre

as densidades de energia da EE e da radiação, ρEE/ρr, seria algo como ∼ 10−2 ou

10−3. A SCI é uma medida da robustez do modelo frente a diferentes condições

iniciais. Modelos com uma maior SCI necessitam um maior ajuste no para sua

condição inicial do que aqueles com uma SCI menor. A quantidade de SCI não é

sempre considerada um problema. Não obstante, modelos que permitem uma faixa

mais larga de condições iniciais são comumente preferidos frente àqueles que impõem

vínculos estreitos a esta faixa. A relevância destas três questões (PC, PCIEE e SCI)

pode ser discutida, mas nossa principal intenção aqui é claricar a sua distinção,

uma vez que não é raro encontrar na literatura uma ambigüidade entre elas (e até

mesmo com o PCC).

Antes de prosseguirmos, um comentário a respeito de notação é necessário. Para

tornar explícita nossa abordagem fenomenológica (que inclui por exemplo modelos

de gravidade modicada) em nossas discussões, vamos denotar pelos índices x e

EE todas as quantidades físicas relacionadas à EE, mas iremos reservar o último

exclusivamente para os casos onde a interpretação de campos zer sentido. Além

disso, lançaremos mão dos índices-suxo 0 e i para descrever quantidades avali-

adas hoje e ao nal da inação, respectivamente. Em uma questão completamente

distinta, vamos nos referir a 1σ, 2σ e 3σ como uma notação curta respectivamente

para os níveis de conança de 68, 3%, 95, 4% e 99, 73%, embora tal só seja rigorosa-

mente o caso para funções de verossimilhança gaussianas.

É possível que quando saibamos qual a natureza fundamental da EE o problema

da coincidência (e também o PCIEE) seja automática e naturalmente explicado. Por

outro lado, o inverso também pode ser verdade: entender a origem da coincidência

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CAPÍTULO 1. INTRODUÇÃO 12

pode lançar uma luz na natureza da EE e sua relação com o resto do mundo. Este

é o caminho que iremos trilhar (capítulos 4 e 5) neste trabalho.

Os capítulos 4 e 5 apóiam-se numa hipótese fundamental: uma solução completa

do PC exige que tanto a matéria como a EE sigam a mesma evolução temporal,

pelo menos a partir de algum instante. De outra forma ca claro que a ocorrên-

cia da coincidência sempre dependerá das condições iniciais do sistema, e trocar a

razão EE/matéria em algum instante inicial implicará um deslocamento da época

de coincidência. Em outras palavras, nós podemos explicar a coincidência somente

se mostrarmos que não se trata mesmo de uma coincidência e sim que ambas EE e

matéria estavam fadadas a compartilhar uma fração semelhante do orçamento en-

ergético total a partir de algum instante. Sob uma perspectiva de espaço de fase,

explicar o PC requer a demonstração que nosso presente universo já atingiu sua

solução atratora nal. Uma solução na qual as densidades de energia da EE e da

matéria são ambas nitas e possuem uma razão constante é denotada na literatura

como uma solução escalável (scaling, em inglês) [Ferr97, Cope98] ou, se estável e

acelerada, como solução estacionária [Tocc02].

Uma vez que se aceita esta hipótese, segue-se a primeira conseqüência imediata:

se exigirmos que a densidade de energia da EE seja proporcional àquela da matéria

(ou seja, ρEE/ρm = const) e ao mesmo tempo requerermos que o parâmetro da

equação de estado seja inferior a −1/3 de modo a obter uma expansão acelerada,

então é necessário supor que a matéria possua um igualmente negativo parâmetro da

equação de estado ou que exista uma interação entre as duas componentes, de modo

que ρm não diminua com a−3. A primeira possibilidade está claramente descar-

tada pois tal modicação à equação de estado da matéria afetaria profundamente

o crescimento das perturbações de densidade. De fato, para qualquer bom modelo

não basta exigir-se uma presente aceleração; também é necessário que o universo

passe por uma fase desacelerada dominada pela matéria no passado de maneira a

possuir uma época de formação de estruturas bem comportada. Um modelo cos-

mológico bem sucedido deve portanto permitir uma seqüência de épocas: uma era

da radiação, uma era dominada pela matéria sucientemente longa e uma solução

escalável acelerada nal estável. Almejaremos aqui tal boa cosmologia escalável.

A suposição de uma solução escalável acelerada e estável exige portanto uma in-

teração entre matéria e EE [Amen00]. Se a EE for modelada como um campo escalar,

então a interação com a matéria deve ser uma força escalar adicional à gravidade.

Isto é, tal modelo deve ser uma teoria gravitacional do tipo escalar-tensorial [Fara04]

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1.1. PROBLEMAS DOS MODELOS DE ENERGIA ESCURA 13

ou, equivalentemente, uma teoria Einsteiniana com acoplamento explícito entre a

matéria e o campo. Tais modelos já foram estudados diversas vezes no passado e

várias propriedades importantes igualmente discutidas [Gumj05, Tsuj06]. Sabe-se,

por exemplo, que um modelo escalar tensorial padrão com potencial exponencial

possui uma solução escalável estável e que tal solução pode ser acelerada [Wett95].

No entanto neste caso é possível mostrar que nenhuma época dominada pela matéria

precede a aceleração. Em outras palavras, após a era da radiação o sistema entra

diretamente no regime acelerado. Isto está em forte contraste com as observações,

como foi mostrado em [Amen00].

Em ΛCDM (doravante ΛCDM irá denotar qualquer modelo que se comporte

como MEF CDM em inglês mais uma constante cosmológica, mas o qual não é

descrito pela densidade de energia do vácuo) ou em qualquer outro modelo de MEF

com wx constante, o PC e PCIEE não podem ser juntamente abordados, e ambos

implicam em ajustes nos de algum parâmetro (por exemplo ρEEi). Para se ter um

universo dominado por Λ hoje, a densidade de energia inicial da EE precisa ser ajus-

tada dezenas de ordens de magnitude abaixo da densidade de energia da matéria.

No entanto isto não precisa ser o caso, por exemplo, para modelos de quintessên-

cia rastreadores (em inglês, tracker) com campo escalar [Stei98]. Soluções que se

comportam como atratoras aparecem neste caso tais que, para uma larga faixa de

condições iniciais, o campo cedo ou tarde alcança uma trilha evolucionária cósmica

na qual Ωm0 ∼ ΩEE0. Ajustar o início do rastreamento é uma das diculdades destes

modelos. Por exemplo, começando-se de condições de equipartição pós-inacionárias

foi mostrado em [Stei98] que, em modelos rastreadores do tipo lei-de-potência in-

versa (V (φ) ∝ φ−α), apenas para α > 5 iria o campo começar o rastreamento

antes da igualdade matéria-radiação. Entretanto, vínculos observacionais recentes

impõem α . 1 [Wils06, Waga00], e neste caso o campo só começaria a rastrear

em épocas recentes. Como a EE precisa exercer forte pressão negativa em torno de

z ∼ 1 para alavancar a aceleração, isto exige um ajuste no do potencial do campo.

Portanto, embora o PCIEE possa ser abordado por estes modelos, eles não fornecem

vantagem alguma no que concerne o PC, uma vez que este último poderia ser refor-

mulado como: por que vivemos numa época especial onde o campo acaba de iniciar

o rastreamento? Para contornar esta diculdade, modelos com um termo cinético

não canônico (k-Essência) [Chib00, Arme00] foram propostos como uma alternativa.

Em k-Essência, o campo atinge uma solução escalável durante a era dominada pela

radiação, mas é a dinâmica (e não um ajuste de parâmetros) que serve de gatilho

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CAPÍTULO 1. INTRODUÇÃO 14

para uma transição quando matéria não-relativística começa a dominar, após a qual

a k-Essência segue outro atrator, este acelerado. No entanto, um bom candidato

gozando de grande bacia de atração ainda não foi proposto [Malq03].

Conforme mencionado anteriormente, é comum encontrar ambigüidade na lite-

ratura entre o PC, PCIEE e SCI sob o rótulo genérico de ajuste no. Porém,

mesmo quando é feita a distinção entre estes, uma análise quantitativa de cada um

destes problemas não costuma ser feita. Visando corrigir esta deciência, vamos pro-

por três grandezas. Para quanticar o PCIEE e a SCI, vamos denir as quantidades

ζ ≡ ρmaxDEi/ρri e ∆ ≡ (ρmax

xi −ρminxi )/ |ρmax

xi | , em que ρr representa a densidade de ener-

gia da radiação e ρmax/minxi/DEi denota os valores máximo e mínimo de ρxi/DEi que evoluem

para os valores atualmente observados na faixa de 1σ. Modelos com pequena SCI

são caracterizados por grandes valores de ∆ e vice-versa. Note que nossa escolha de

variável para a medida da SCI é uma razão entre o tamanho da região permitida

e o valor máximo desta faixa e, portanto, não está diretamente relacionado com o

verdadeiro tamanho da região de condições iniciais permitida. Em outras palavras,

∆ é uma medida relativa e não absoluta. Em alguns casos pode ser mais interessante

medir-se a largura absoluta da faixa de condições iniciais e neste caso pode-se usar

(ρmaxxi − ρmin

xi ) em vez de ∆. É importante ter-se em mente que novas e aprimoradas

observações irão provavelmente afunilar nossas atuais incertezas em ρx, e isto pode

reetir na faixa inicial ∆, que deveria depender apenas do modelo e não na qualidade

das nossas observações. Isto é evitado computando-se a razão ∆/∆ΛCDM. Ademais,

nossa denição de ∆ não é boa nos casos em que ρmaxxi é muito próximo a zero mas

ρminxi não. Já para o PC utilizaremos a razão Rz entre as densidades de energia da

EE e a ME, em que z corresponde ao desvio para o vermelho, como medida de o

quão perto estamos do atrator acelerado. Mais especicamente, uma solução para

o PC exige R−1 ' R0.

1.2 Plano Geral da Tese

Esta tese almeja esclarecer alguns dos problemas encontrados em teorias para

estas duas componentes escuras do universo. Ao que concerne a ME, analisamos

uma teoria alternativa: TeVeS. Esta teoria enfrenta algumas diculdades observa-

cionais, mas possui algumas virtudes interessantes. No quesito EE, estudamos como

diferentes modelagens podem tentar solucionar os problemas teóricos anteriormente

descritos: PC, PCIEE e a SCI.

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1.2. PLANO GERAL DA TESE 15

No capítulo 2 exporemos alguns rudimentos da cosmologia. Descreveremos o

seu modelo padrão, discorreremos sobre dois dos principais testes observacionais (a

saber, supernovas e RCF) e por m listaremos os sucessos e desaos da descrição da

ME como uma componente fria e fracamente interagente. O capítulo 3 é reservado

à teoria TeVeS proposta como explicação para a ME. Fazemos um breve relato de

sua origem histórica e motivação. Também analisaremos como ela poderia explicar

algumas coincidências do modelo mais aceito de ME, conforme descrito no capítulo 2.

Mostramos ainda resultados preliminares para um confronto com um importante

sucesso observacional do modelo de MEF: o Aglomerado da Bala.

Tentamos, no capítulo 4, obter o regime duo-escalável mencionado utilizando

uma um campo escalar para descrever a EE, devidamente acoplado à ME. Para

tal, utilizamos uma lagrangiana geral para este campo (permitindo inclusive termos

cinéticos não-canônicos, à la k-Essência) e buscamos vínculos sobre a sua forma

funcional. No capítulo 5, vamos abrir mão do uso de campos escalares a tentar atacar

o problema de um modo puramente fenomenológico através de uma descrição da EE

como um uido efetivo, novamente acoplado à ME. A rigor, este último método

é mais geral pois engloba também algumas teorias de gravitação alternativas, em

particular as teorias conhecidas como f(R). Por outro lado, camos ainda mais

distantes da física fundamental por trás desta componente exótica.

Encontra-se no capítulo 6 nossas conclusões e ponderações nais. Finalmente, os

apêndices A e B contém alguns desenvolvimentos adicionais relativos ao capítulo 4.

Os resultados preliminares do capítulo 3 são frutos de uma colaboração com

Thomas Zlosnik e Scott Dodelson. Os capítulos 4 e 5 estão fortemente relacionados

aos trabalhos [Amen06a] e [Quar08], respectivamente. O primeiro, fruto de uma

colaboração com Luca Amendola e Shinji Tsujikawa. O segundo foi realizado em

colaboração com Maurício Calvão, Sergio Jorás e Ribamar Reis. Ambos gozaram

de decisiva participação do meu orientador Ioav Waga.

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CAPÍTULO 1. INTRODUÇÃO 16

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Capítulo 2

Princípios de Cosmologia

Um dos alicerces mais importantes da Cosmologia é uma hipótese que, se não

inequivocamente comprovada pelas observações astronômicas, descreve um quadro

consistente em altíssimo grau com as mesmas. Esta conjectura arma que o universo

é em larga-escala espacialmente homogêneo e isotrópico, e a ela dá-se o nome de

Princípio Cosmológico. Tal princípio goza de enorme aceitação na comunidade em

parte devido ao seu grande sucesso observacional e em parte devido à sua base

teórico-losóca, pois possui como implicação o fato de que nós humanos, seres vivos

de brevíssima história e ainda mais curta duração, isolados em um canto remoto e

banal do cosmos, não estaríamos de fato ocupando nenhuma posição privilegiada no

espaço.

De todos modos, enquanto teoria física o Princípio Cosmológico não desfruta de

privilégios em decorrência de inclinações losócas, e necessita ser corroborado por

dados experimentais como as demais teorias. Nesse quesito, conforme mencionado

acima, não há contradições entre o mesmo e as observações. De fato, levantamentos

observacionais recentes apresentam fortes indícios da existência de homogeneidade

espacial1 e isotropia, e isto está ilustrado na gura 2.1. A homogeneidade, entre-

tanto, só se observa em largas escalas, superiores a 100 Mpc. Em menores escalas,

a instabilidade gravitacional cria estruturas inomogêneas. Porém, uma das conse-

qüências da teoria da Relatividade Geral é que o conceito de distância2 perde além

do seu caráter absoluto (decorrente da Relatividade Restrita) também seu aspecto

1A rigor, a homogeneidade observada não está diretamente relacionada com a homogeneidadeespacial do modelo. A primeira está associada ao nosso cone-de-luz passado, enquanto a segunda,a fatias de tempo constante do espaço-tempo [Ribe95].

2Um ótimo resumo das diferentes denições de distância úteis em cosmologia pode ser encon-trado em [Hogg99].

17

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CAPÍTULO 2. PRINCÍPIOS DE COSMOLOGIA 18

Figura 2.1: Diagrama de distribuição espacial de galáxias obtido pelo levantamento2dF [Coll03]. A Terra está localizada no vértice. Cada um dos aproximadamente80 mil pontos representa uma galáxia, em distâncias de até ∼ 600 Mpc.

unívoco. Igualmente o fazem os conceitos de energia-momento total de um sistema

(e de fato boa parte dos conceitos físicos advindo de integrais espaço-temporais)3 e

isto acarreta em um certo nível de ambigüidade nas interpretação das medidas ob-

servacionais. De maneira mais explícita, a maior parte dos vínculos observacionais

a parâmetros cosmológicos é dependente de modelo, e refazer por completo uma

análise de todas as observações para modelos distintos é uma tarefa inviável dada a

enormidade de dados observacionais e a complexidade matemática envolvida.

Talvez a maior virtude da dupla Princípio Cosmológico / Relatividade Geral seja

o fato da mesma possibilitar a construção de um modelo relativamente simples e em

ótima concordância com a fantástica diversidade de dados observacionais. Uma vez

disposto de um modelo de tal sucesso experimental torna-se muito mais simples a

tarefa de se testar e comparar distintos modelos. A experiência matemática e intu-

ição física que acompanham este modelo nos auxilia a traçar atalhos matemáticos e a

engendrar ferramentas observacionais capazes de impulsionar o nosso conhecimento

da física.

3Uma exceção existe em caráter aproximativo para sistemas cuja métrica possui um comporta-mento assintótico, o que permite denir um conceito análogo ao de energia-momento. Tal fato éexplorado, por exemplo, no cálculo da energia gravitacional dissipada por ondas gravitacionais emum dado sistema.

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2.1. O MODELO PADRÃO DA COSMOLOGIA 19

Neste capítulo listar-se-ão de modo conciso alguns princípios da cosmologia con-

temporânea. Não será feita aqui uma recapitulação abrangente nem tampouco

histórica. Outrossim, focar-se-á nos aspectos relevantes para os capítulos subse-

qüentes. Na seção 2.1 o modelo padrão da cosmologia será descrito, abordando-se

sua relação com o Princípio Cosmológico e com a teoria da Relatividade Geral, as-

sim como o surgimento da matéria e energia escuras. Em seqüência, na seção 2.2

examinar-se-á alguns dos mais importantes testes observacionais, com ênfase na me-

dida de distâncias através de supernovas e na estimativa de parâmetros cosmológicos

através da Radiação Cósmica de Fundo. Encerrar-se-á este capítulo (seção 2.3) com

uma lista de alguns dos maiores sucessos e diculdades do atual modelo da ME: o

modelo de Matéria Escura Fria (MEF).

2.1 O Modelo Padrão da Cosmologia

2.1.1 Equações de Friedmann

A hipótese de homogeneidade e isotropia espaciais do universo, em conjunto com

o Princípio de Weyl, nos permite escrever a métrica que governa a evolução de fundo

dos diversos constituintes do mesmo por

ds2 = −dt2 + a2(t)

[dr2

1−Kr2+ r2(dθ2 + sen2θdφ2),

](2.1)

em que K ∈ −1, 0,+1, e t, r, θ, φ são as 4 coordenadas espaço-temporais.

Esta forma para a métrica recebe o nome de Friedmann-Lemaître-Robertson-Walker

(FLRW), e é a única que satisfaz a exigência de homogeneidade (espacial) e isotropia.

Comprimentos espaciais dependem do fator de escala a(t), que conforme indicado

em princípio depende do tempo cósmico t. O fator K descreve a tri-curvatura (ou

curvatura espacial) do universo. K = +1 descreve um universo de tri-curvatura

positiva, ou esférico; K = 0 representa um universo plano (ou chato); K = −1

denota universos de tri-curvatura negativa, ou hiperbólicos. Observações atuais

armam que o universo é espacialmente plano (ou algo muito próximo a isto) e a

partir do nal desta subseção, vamos considerar apenas o caso K = 0.

Embora (2.1) dependa apenas das simetrias impostas, a evolução do fator de

escala a(t) depende da teoria gravitacional subjacente. A teoria mais simples e bem

aceita na atualidade (sem mencionar, elegante) é a teoria da Relatividade Geral de

Einstein (RG). Esta teoria equaciona a métrica do espaço-tempo com a distribuição

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CAPÍTULO 2. PRINCÍPIOS DE COSMOLOGIA 20

espaço-temporal de energia-momento dos diferentes campos da natureza. A equação

fundamental da teoria é a Equação de Einstein

Gµν − gµν Λ = 8πGTµν , (2.2)

em que Gµν são as componentes do tensor de Einstein G, gµν as componentes da

métrica g, Λ a constante cosmológica, G a constante gravitacional de Newton e Tµνas componentes do tensor energia-momento conjunto de todos os campos T. No que

sucede, iremos nos permitir um abuso de notação e omitir o termo componentes,

isto é, iremos nos referir por exemplo à gµν como a métrica. A equação acima pode

ser obtida variando-se com respeito à métrica a ação de Einstein-Hilbert

SEH =

∫d4x√−g[

1

16πGR− 2Λ + Lr + Lm

], (2.3)

em que R é o escalar de Ricci, g o determinante da métrica gµν e Lr e Lm deno-

tam as densidades lagrangianas da radiação e da matéria não-relativística, denidas

abaixo. O tensor G e o escalar R são funções da métrica4 g. O conteúdo com-

pleto da teoria da Relatividade Geral pode ser resumido em uma frase [Wald84]:

O espaço-tempo é uma variedade M na qual está denida uma métrica lorentziana

g cuja curvatura está relacionada à distribuição de matéria no espaço-tempo con-

forme a equação (2.2). Duas excelentes referências sobre esta teoria são [Schu85]

(introdutória) e [Wald84] (avançada).

Uma característica fundamental da gravidade de Einstein é que a mesma se reduz

à gravidade de Newton quando três condições são satisfeitas [Wald84]:

1. Os campos gravitacionais são fracos5;

2. As velocidades envolvidas são não-relativísticas;

3. As tensões materiais são muito menos importantes que as densidades de ener-

gia (e portanto p ρ).

As considerações de homogeneidade e isotropia também limitam a forma de Tµν

4Em RG, pode-se também supor que a variável fundamental não é apenas a métrica mas tambéma conexão. As equações de campo obtidas são as mesmas, e tal procedimento é conhecido comoformalismo de Palatini. É importante notar que tal equivalência não se estende a generalizaçõesde (2.3) tais como as teorias chamadas teorias f(R), denidas a seguir.

5Em RG isto corresponde a uma métrica aproximadamente chata (ou plana), isto é, a umamétrica próxima à métrica de Minkowski.

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2.1. O MODELO PADRÃO DA COSMOLOGIA 21

à de um uido perfeito

T µν = (ρ+ p)uµuν − pgµν , (2.4)

em que ρ é a densidade de energia, p a pressão e uµ a quadri-velocidade de um

observador comóvel ao uido e a qual satisfaz o vínculo uαuα = 1. A conservação

do tensor energia momento (∇νTµν = 0) implica a seguinte equação adiabática (às

vezes chamada de equação de conservação):

ρtot + 3a

a(ρtot + ptot) = 0. (2.5)

O termo ρtot (ptot) representa a quantidade total, isto é, a soma de todas as densi-

dades de energia (pressão) das diversas componentes do universo. Acima como no

restante da tese, utilizar-se-á um ponto para designar derivadas em relação ao tempo

cósmico t. As equações (2.1), (2.2) e (2.4) nos fornecem as equações de Friedmann,

que governam a evolução do fator de escala a(t):(a

a

)2

≡ H(t)2 =8πG

3ρtot −

K

a2+

Λ

3, (2.6)

a

a= −4πG

3(ρtot + 3ptot) +

Λ

3. (2.7)

Denota-se o termoH(t) por parâmetro de Hubble, e este exerce um importante papel

na cosmologia. Ele dene a taxa de expansão do universo em um dado instante de

tempo. É conveniente denir o valor H0 de H hoje como

H0 ≡ 100hkm

s Mpc, (2.8)

em que h é denominado parâmetro de Hubble reduzido. O seu valor observado,

conforme a sonda-satélite WMAP3 em conjunto com o SDSS (vide abaixo), é

h = 0, 72± 0, 03. (2.9)

Conforme adiantado no capítulo 1, o PCC motivou o estudo de modelos de ener-

gia escura através de campos escalares ou de modicações à densidade lagrangiana de

Einstein-Hilbert. No primeiro caso, substitui-se a constante cosmológica Λ em (2.3)

por uma lagrangiana para o campo escalar. No segundo, modica-se todo o termo

R− 2Λ. Diversas propostas de gravitação modicada têm sido propostas recente-

mente, buscando abrir mão de pelo menos uma das componentes exóticas de outra

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CAPÍTULO 2. PRINCÍPIOS DE COSMOLOGIA 22

forma necessárias: matéria e energia escura. Dentre as teorias propostas, duas das

mais estudadas são TeVeS (vide capítulo 3), que busca eliminar a necessidade de ME,

e as chamadas teorias f(R) [Capo03, Carr04, Amen07c, Amen07a], que buscam ex-

plicar a aceleração atual sem precisar de EE. Esta última classe de teorias substitui

a Lagrangiana de Einstein-Hilbert (2.3) por uma função mais geral do escalar de

Ricci:

Sf(R) =

∫d4x√−g[

1

16πGf(R) + Lr + Lm

]. (2.10)

É possível escrever as equações de movimento desta teoria no formato das da Rela-

tividade Geral ((2.6) e (2.7)) fazendo-se a substituição G→ G ≡ G/F0 e a identi-

cação [Amen07a]

8πG ρx =1

2(FR− f)− 3HF + 3H2(F0 − F ) , (2.11)

8πG px = F + 2HF − 1

2(FR− f)− (2H + 3H2)(F0 − F ) , (2.12)

em que F ≡ df(R)/dR e F0 representa o presente valor desta derivada.

Um conceito imprescindível à cosmologia é o de desvio para o vermelho z, carac-

terizado por

1 + z ≡ λ0

λemis

=a0

aemis

, (2.13)

em que λ representa o comprimento de onda dos fótons e os sub-índices 0/emis

denotam os instantes atual e de emissão. O desvio para o vermelho é determinado

diretamente do espectro dos diferentes corpos celestes, ou seja, não é dependente

de modelo. Serve também como uma muito útil variável temporal: z →∞ corres-

ponde à singularidade inicial (palavra usada de forma latu-senso, pois em alguns

modelos z → ∞ implica t → −∞) do universo, z = 0 ao instante atual e z = −1

ao futuro innito. Tal mapeamento unívoco t→ z tem como alicerce o fato de que

a expansão do universo não cessou em nenhum momento da história, o que é pre-

visto pelo modelo padrão da cosmologia e corroborado pelas observações. Modelos

mais exóticos em que o universo tenha sido submetido a uma etapa de contração

em algum instante impossibilitam a bijeção entre z e t, o que introduz grandes com-

plicações. No decorrer deste texto, entretanto, isto não será um problema pois não

serão considerados modelos tão estranhos.

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2.1. O MODELO PADRÃO DA COSMOLOGIA 23

2.1.2 Componentes básicas do universo

O nosso universo é muito bem descrito por 3 classes de componentes não-intera-

gentes que abrangem, mas não se limitam a, todas as formas de matéria conhecida.

Reiteramos que daqui em diante será ignorada, por simplicidade, a tri-curvatura do

universo. Isto é, será imposto K = 0.

A primeira destas é a radiação. Esta inclui todas as partículas relativísticas da

natureza, em especial fótons e neutrinos. Invertendo o sentido temporal, a medida

que regredimos ao universo primordial a temperatura aumenta e uma a uma as

diferentes partículas bariônicas e leptônicas hoje observadas tornam-se relativísticas

e nalmente entram em banho térmico com os fótons e neutrinos. Ou seja, passam

a integrar a componente de radiação do universo. Radiação é descrita por uma

pressão relativística pr = ρr/3, e sua densidade de energia evolui conforme

ρr = ρr0

(a0

a

)4

. (2.14)

Aqui e no restante deste texto, um sub-índice 0 denota uma quantidade avaliada

hoje, isto é, em desvio para o vermelho igual a zero.

Outro importante constituinte do cosmo é denominada simplesmente de matéria

não-relativística, ou simplesmente matéria. Matéria não relativística é caracterizada

por possuir pressão relativística nula, o que acarreta a equação de evolução

ρm = ρm0

(a0

a

)3

. (2.15)

A matéria é subdividida em dois grupos: matéria bariônica e matéria escura fria

(MEF). O primeiro abrange todas as partículas conhecidas da natureza (inclusive

léptons!) que em dado instante possuem velocidades típicas muito inferiores à da

luz. A nomenclatura se justica pelo fato de serem os bárions as sub-componentes

dominantes (em termos de densidade de energia) da poeira. O segundo grupo con-

stitui uma das grandes incógnitas da física contemporânea. O modelo mais aceito

lança mão de uma nova classe de partículas, massivas e fracamente interagentes,

não-descritas pelo modelo padrão da física de partículas. As apostas são altas que

novos experimentos tais como o Grande Colisor de Hádrons (Large Hadron Collider,

ou LHC, em inglês) e outros baseados em interações destas partículas com gases

nobres possam determinar a origem da ME em um futuro próximo. Todavia, há

modelos rivais que abdicam de novas partículas fundamentais, e voltaremos a esta

discussão na seção 2.3 e no capítulo 3.

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CAPÍTULO 2. PRINCÍPIOS DE COSMOLOGIA 24

A terceira e última componente é a energia escura (EE), cuja forma mais simples

é a constante cosmológica Λ, caracterizada por

ρΛ = ρΛ0 = constante. (2.16)

Muito pouco se sabe sobre esta componente, exceto que ela domina o universo atual

(z . 1) e que possui pressão negativa de forma que −1, 2ρΛ < pΛ < −0, 7ρΛ [Sper07].

É conveniente denir os parâmetros de densidade Ωi respectivos às distintas

componentes i

Ωi ≡8πG

3H2ρi, (2.17)

e reescrever (2.6):

Ωr + Ωc + Ωb + Ωx = 1, (2.18)

em que separamos explicitamente a matéria em matéria escura fria c (do inglês

cold dark matter) e matéria bariônica b . Frisamos ainda que a componente de

EE pode ser ou não descrita pela constante cosmológica Λ e, portanto, eligimos

o índice genérico x em detrimento do índice Λ (conforme adiantado no capítulo

anterior). A gura 2.2 ilustra os vínculos observacionais impostos ao par Ωm,ΩΛpela combinação de resultados dos experimentos Wilkinson Microwave Anisotropy

Probe (WMAP3) e Sloan Digital Sky Survey (SDSS). O índice m será usado

sempre que denotarmos a matéria não-relativística total; isto é, bariônica e escura.

Conforme adiantado no capítulo 1, a EE é a atual componente dominante do universo

(Ωx ' 0, 7). Ademais, bárions constituem apenas uma fração da energia restante. De

fato, diversas observações tais como o espectro de potência da matéria, o espectro de

potência angular da RCF e a abundância atual de elementos leves (a saber: deutério,

hélio-3, hélio-4 e lítio), estimadas através da nucleossíntese primordial, limitam a

componente bariônica a [Dode03] Ωb ' 0, 04 com precisão de aproximadamente

10%. Ou seja, matéria escura é responsável por uma grande parcela da energia do

universo (Ωc ' 0, 25).

As equações (2.6) e (2.7) não denem completamente o sistema composto pelas

incógnitas ρ(t), p(t) e a(t). Uma terceira equação é necessária: uma equação de

estado que relacione a pressão e a densidade de energia de cada componente. No

caso de radiação e matéria, ρ é diretamente proporcional a p. Parece razoável supor

que a EE satisfaça uma equação de estado análoga, de modo que px ≡ wx(ρx)ρx.

Ademais, é comum se impor, por simplicidade, que wx, o parâmetro da equação de

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2.1. O MODELO PADRÃO DA COSMOLOGIA 25

Figura 2.2: Contornos de nível de conança de 1σ e 2σ para os atuais valores dosparâmetros de densidade de energia da matéria (bariônica e escura) e da energiaescura no modelo ΛCDM, conforme resultados dos experimentos WMAP3 e SDSS.Os contornos claros representam níveis de conança obtidos apenas com o WMAP3.A reta escura representa um universo com tri-curvatura nula (isto é, Ωm + ΩΛ = 1).Figura retirada de [Sper07].

estado, seja uma constante. Ao fazê-lo, obtém-se

ρx = ρx0

(a0

a

)3(1+wx)

. (2.19)

É imediato perceber-se que radiação, matéria e constante cosmológica são descritas

por wr = 1/3, wm = 0 e wΛ = −1. Modelos que permitem ser wx < −1 são

chamados de fantasmas (em inglês, phantom).

A hipótese px = f(ρx) possui algumas conseqüências importantes. Do ponto de

vista teórico, a densidade de energia da EE depende apenas da sua pressão e o faz

em caráter local, isto é, a equação de estado dessa componente não depende da sua

evolução. Do ponto de vista prático, para uidos não-interagentes a equação (2.5)

deve ser satisfeita independentemente por cada componente do universo. Nestes

casos, pela (2.5) nota-se que a energia escura não pode cruzar a faixa ρx + px = 0,

às vezes denominada divisória fantasma. Ou seja, se px = f(ρx) para qualquer

função f bem comportada, ρ(t) tende a zero quando f(ρx) → −ρ, e o parâmetro

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CAPÍTULO 2. PRINCÍPIOS DE COSMOLOGIA 26

Ρr

Ρm

ΡLNuc

leos

sínt

ese

01021041061081010

1

1010

1020

1030

01021041061081010

1

1010

1020

1030

z

ΡΡ

m0

Figura 2.3: Evolução das densidades de energia da radiação, matéria (bariônicae escura) e constante cosmológica como função do desvio para o vermelho para omodelo ΛCDM. A linha tracejada vertical denota a época de igualdade entre matériae radiação, em z ' 3300.

da equação de estado da EE, wx, ca congelado em −1. É importante frisar

que esta divisória não existe nos casos onde EE está acoplada a uma das demais

componentes nem tampouco em muitos modelos em que a EE advém de teorias do

tipo f(R) [Amen07c, Amen07a].

É útil denir-se também um parâmetro efetivo da equação de estado descrito

por wef ≡ ptot/ρtot, em que novamente o sub-índice tot se refere à soma sobre os

diversos constituintes cósmicos. Obtém-se então que

wef = wrΩr + wcΩc + wxΩx = wrΩr + wxΩx, (2.20)

pois estamos considerando apenas matéria escura fria, caracterizada (assim como os

bárions) por wc = 0. Conclui-se portanto, a partir de (2.7), que a atual aceleração

do universo requer que seja wef < −1/3.

A diferença na dependência das densidades de energia da matéria e da EE no fator

de escala a(t), conforme (2.15) e (2.16), é o principal culpado pelo forte Problema

da Coincidência (PC) no modelo ΛCDM. De fato, como podemos ver na gura 2.3,

a densidade de energia da EE na época da nucleossíntese (1, 1 × 108 . z . 1, 8 ×109) [Mukh05] é mais de 25 ordens de magnitude inferior à da matéria. Para desvio

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2.2. ALGUNS TESTES OBSERVACIONAIS 27

Wr Wc

Wb

Wx

-0.71101021031041050

0.25

0.5

0.75

1-0.7110102103104105

0

0.25

0.5

0.75

1

z

W

Figura 2.4: Evolução de todas as quatro densidades de energia como função do desviopara o vermelho para o modelo ΛCDM. Da esquerda para a direita, a componentedominante é, em ordem: radiação, matéria escura e energia escura. Bárions sãosempre sub-dominantes. A linha preta vertical denota o instante atual, z = 0.

para o vermelho ainda mais altos (temperaturas mais elevadas), a disparidade é

ainda maior: ρm/ρΛ ∼ 1044 para temperaturas equivalentes à escala de energia

da unicação eletrofraca6 (' 100 GeV). Esta gura mostra de forma explícita a

coincidência (ou, visto de outro modo, o ajuste no) de se ter ρΛ ∼ ρm justamente

no presente, em z = 0.

A gura 2.4 é mais ilustrativa que a gura 2.3 no que concerne a comparação

das diferentes densidades de energia ao longo da história do universo. Nesta gura

separamos bárions de matéria escura.

2.2 Alguns Testes Observacionais

Dentre os vários experimentos e observações realizados em cosmologia, dois dos

mais importantes são as medidas de distância por uso de supernovas e a análise da

Radiação Cósmica de Fundo em Microondas (RCF). A ênfase a estas duas classes de

6A rigor, esta discrepância de 44 ordens de magnitude é um limite inferior, pois a densidade deenergia das partículas não-relativísticas muda gradativamente sua taxa de diluição de a3 para a4

conforme a temperatura do universo ultrapassa a temperatura correspondente à massa de repousoda partícula em questão.

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CAPÍTULO 2. PRINCÍPIOS DE COSMOLOGIA 28

observações deve-se ao fato que no capítulo 5 empregar-se-ão ambas para restringir

o espaço de parâmetros de modelos com interação entre ME e EE. Nesta seção será

feito um breve resumo da física envolvida nas supernovas e na RCF.

2.2.1 Supernovas Tipo Ia

Supernovas são eventos raros (prevê-se uma a cada 50 anos em uma galáxia hos-

pedeira típica) e muito violentos. Não é raro que a luminosidade de uma supernova

supere à da galáxia na qual se encontra. São frutos de uma explosão estelar como

conseqüência de um lento decaimento da produção de energia via fusão ou pelo

súbito aumento desta produção devido a um acúmulo de material de uma estrela

vizinha. São também classicadas em diferentes tipos, conforme sua composição

(vide gura 2.5).

Do ponto de vista da cosmologia, a classe mais interessante de supernovas são

as do tipo Ia (SNIa). Tal classe advém de um processo de aumento de massa de

uma anã branca, normalmente devido à acreção (raramente devido a uma fusão

de estrelas). À medida que a anã branca adquire massa, se aproxima do limite de

Chandrasekhar, de 1,38 massas solares [Mazz07]. À partir deste limite, a estrela

entraria em colapso por não mais possuir pressão (que neste ponto basicamente

advém da pressão de degenerescência dos elétrons) suciente para suportar o seu

peso. Na prática, a estrela chega próxima a este limite sem atingi-lo. O importante

é o fato desta classe de explosões ter início com uma massa muito bem estabelecida,

o que permite modelar de modo preciso a física envolvida e padronizar7 as curvas

de luz obtidas.

Curvas de luz relacionam a magnitude aparente com o tempo; no caso de SNIa,

ela apresenta um formato de corcova cuja ascensão dura tipicamente de 15 a 20 dias

e cujo decaimento se prolonga por um tempo da ordem de 1 ou 2 meses (tempos

medidos no referencial de repouso da supernova) [Miqu07]. Foi descoberto que existe

uma correlação empírica entre a luminosidade intrínseca no ponto máximo da curva

de luz e a duração da mesma [Phil93]. Isto é, SNIa mais luminosas possuem curvas

de luz de maior duração. A partir deste fato, diversas técnicas empíricas foram esta-

belecidas que permitiram a extração da luminosidade intrínseca destas supernovas.

A gura 2.6 ilustra uma destas técnicas [Perl97] aplicadas a um levantamento de

7É comum mencionar-se incorretamente que as supernovas do tipo Ia constituem velas-padrão.A rigor, são velas padronizáveis, e esta padronização é dependente de modelo. Acredita-se, en-tretanto, que a física destes eventos seja bem compreendida o suciente para que as incertezassistemáticas desta análise sejam pequenas.

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2.2. ALGUNS TESTES OBSERVACIONAIS 29

Figura 2.5: Esquema básico de classicação das supernovas, baseado na análisede seus espectros de emissão, e a descrição dos seus prováveis processos físicos deformação. Figura retirada de [Quin07].

SNIa conduzido no início da década de 90. Após aplicar-se o fator de correção, as

curvas de luz são padronizadas com boa precisão.

Por conseqüência, consegue-se uma medida direta do módulo de distância µ até

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CAPÍTULO 2. PRINCÍPIOS DE COSMOLOGIA 30

estas supernovas, denido por

µ ≡ m−M = −5 + 5 log10

(dL

1 pc

), (2.21)

em quem eM são as magnitudes bolométricas aparente e absoluta, respectivamente,

e dL é a distância de luminosidade (denida a seguir). Em resumo, SNIa fornecem

pares µ, z, o que permite a obtenção da evasiva relação dL(z), pelo menos na faixa

0 < z < 2 .

A relação entre desvio para o vermelho e distância de luminosidade depende

de parâmetros cosmológicos, a saber: H0, os diferentes Ωi, e a função wx(z). Tal

dependência é descrita por

dL(z) =1 + z

H0

∫ z

0

dz′√(Ωc0 + Ωb0)(1 + z′)3 + Ωr0(1 + z′)4 + Ωx0(1 + z′)3[1+wx(z′)]

.

(2.22)

Há aproximadamente uma década, observações de supernovas por dois grupos inde-

pendentes [Ries98, Perl99] apresentaram, ajustando a equação acima aos dados, a

primeira evidência que o universo encontra-se atualmente em um regime de expansão

acelerada; conseqüentemente também a primeira evidência contundente da existên-

cia da energia escura.

2.2.2 Radiação Cósmica de Fundo

A RCF é o sinal mais antigo do universo a que temos acesso em condições

observacionais práticas. Ela é constituída de fótons com espectro de corpo negro

planckiano e temperatura de 2, 725±0, 002 K [Math99, Math94, Wrig94], que se de-

sacoplaram da matéria num valor de desvio para o vermelho de 1089, o que equivale

a aproximadamente 300 mil anos após o Big Bang.8 Naquela época a temperatura do

universo, que diminui ao longo do tempo,9 passou a car abaixo do necessário para

manter os elétrons e prótons separados (13,6 eV); esses se combinaram e formaram

os primeiros átomos de hidrogênio.10 À partir de então, os fótons deixaram de inter-

8É importante frisar que o termo Big Bang signica simplesmente a época em que o universo eratão denso (e quente) que a densidade de energia média atingiu a escala de Planck. A singularidadeinicial prevista no modelo não possui interesse prático, pois para entender a física nessas escalas énecessário uma teoria de gravitação quântica.

9Uma aproximação muito útil é considerar o produto a(t)T (t) uma constante ao longo daevolução do universo para z . 3000.

10A rigor, como a densidade numérica de fótons nesta época era muito superior à dos bárions,somente quando o universo resfriou abaixo de 1 eV a quantidade de átomos de hidrogênio começou

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2.2. ALGUNS TESTES OBSERVACIONAIS 31

Figura 2.6: Curvas de luz na banda (de freqüência) B de supernovas do tipo Iaobtidas no levantamento Calán-Tololo realizado no início da década de 90. O eixohorizontal representa o tempo medido em dias. (Em cima) Curvas de luz medi-das, sem correções. (Em baixo) Curvas de luz após aplicação do fator de correçãode alongamento da duração-magnitude, conforme proposto em [Perl97]. Figuraretirada de [Miqu07].

a tornar-se apreciável.

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CAPÍTULO 2. PRINCÍPIOS DE COSMOLOGIA 32

Figura 2.7: Mapa de temperatura da RCF em coordenadas celestes, na banda Q (41GHz), obtido pelo WMAP3. O zero da temperatura está ajustado à temperaturamédia da RCF, 2, 725 K. A mancha vermelha horizontal é a contaminação devida ànossa própria galáxia. As maiores variações de temperatura são da ordem de 0,01%.Figura retirada de [Hins07].

agir intimamente com a matéria e se propagaram livremente pelo cosmos. A RCF

é altamente isotrópica, com utuações de temperatura ∆T/T . 10−5. A gura 2.7

ilustra o mapa de temperaturas da RCF conforme obtido pelo WMAP3 [Hins07].

É útil expandir o chamado contraste de temperatura ∆T/T da RCF em har-

mônicos esféricos:

∆T

T(t,x, θ, φ) ≡

∞∑l=1

l∑m=−1

alm(t,x)Y lm(θ, φ), (2.23)

em que t e x são o instante de tempo e a posição no espaço, respectivamente, e

θ e φ são os ângulos de visada, correspondentes à direção no céu de onde provêem

os fótons. Claramente, temos acesso apenas ao contraste de temperatura em t = t0

e x = x0, o instante de tempo atual e a posição da Terra. Os coecientes alm nos

fornecem o tamanho das irregularidades em diferentes escalas. Entretanto, de modo

a confrontar com teoria e experimento, é necessário se trabalhar com propriedades

estatísticas destes coecientes. Tais propriedades são quanticadas pelo espectro

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2.2. ALGUNS TESTES OBSERVACIONAIS 33

angular de potência Cl, denido por

Cl ≡ 〈|alm|2〉, (2.24)

em que os colchetes angulados representam, em princípio, uma média sobre difer-

entes ensembles. Na prática isto é impossível, e postular uma ergodicidade do sis-

tema tampouco nos ajudaria, pois nesse caso precisaríamos medir a RCF em outros

pontos do espaço. Aproxima-se então esta média em ensembles por uma média nos

diferentes valores do índice m.11 Como conseqüência, em grandes escalas (pequenos

valores de l) essa aproximação perde qualidade, pois conforme (2.23) o número de

possíveis m é proporcional a l. Esta incerteza impõe um limite fundamental sobre

a precisão com a qual podemos determinar os diferentes Cl, que é conhecida como

variância cósmica. A rigor, tem-se

∆ClCl

=1√

2l + 1. (2.25)

O espectro angular de potência da RCF é atualmente conhecido com alta pre-

cisão, em grande parte devido às medidas do WMAP3 [Hins07], e sua expansão

multipolar é ilustrada na gura 2.8. Note que o WMAP3 possui boa precisão até

multipólos l próximos a 800. Quando combinado a outros experimentos, a qualidade

dos dados pode ser estendida até l ' 1500. Os picos deste gráco são chamados pi-

cos acústicos, e tanto suas posições (multipolares) como suas alturas relativas estão

relacionadas de modo bem conhecido aos diferentes parâmetros cosmológicos.

O ajuste de parâmetros cosmológicos através do espectro angular de potência da

RCF é feito a partir das equações de perturbação lineares (1a ordem) do modelo em

questão. No caso de ΛCDM, por exemplo, a posição do primeiro pico fornece uma

boa estimativa da tri-curvatura do universo (no caso, que ela é muito pequena, se

não nula), enquanto a altura relativa entre o segundo e terceiro picos é muito sen-

sível ao parâmetro de densidade dos bárions. A dependência em outros parâmetros

tais como o parâmetro de densidade da matéria, a época de reionização, os modos

de perturbação tensoriais, o parâmetro de Hubble hoje, as massas dos neutrinos,

tilt primordial e o parâmetro da equação de estado da energia escura, é bem mais

complexa. Para maiores detalhes, vide por exemplo [Dode03]. Para grácos e ani-

mações, vide as ótimas páginas na internet [Tegm, Hu]. Na prática, uma vez de posse

das equações de perturbação lineares, emprega-se um dos códigos disponíveis na lit-

11Aqui, o índice m é um índice angular e não possui nenhuma relação com matéria.

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CAPÍTULO 2. PRINCÍPIOS DE COSMOLOGIA 34

Figura 2.8: Espectro angular de potência obtido pelo WMAP3. A curva vermelhaé o melhor ajuste considerando-se o modelo ΛCDM. A faixa cinza representa avariância cósmica (vide (2.25)). Figura retirada de [Hins07].

eratura tais como o CMBFAST [Selj96], CMBEASY [Dora05] ou CAMB [Lewi00],

calcula-se o espectro angular de potência e compara-se com dados tais como o do

WMAP3.

A obtenção das equações de perturbação lineares pode ser não-trivial para muitos

modelos de energia e matéria escura. Ademais, para os modelos com interação entre

matéria e energia escuras, que serão o foco dos capítulos 4 e 5, os códigos acima

precisariam ser adaptados. Entretanto, duas quantidades relacionadas a RCF em

nível de fundo (isto é, não-perturbado) podem ser utilizadas como primeiras apro-

ximações da forma do espectro. Elas são o parâmetro de deslocamento e a posição do

primeiro pico [Wang07]. Acredita-se que tais quantidades sejam razoavelmente in-

dependentes de modelo, podendo ser utilizadas como sondas do universo primordial.

Para qualquer modelo, é crucial confrontá-lo de alguma forma com dados da RCF,

pois esta completa de forma excepcional testes como os envolvendo supernovas ou

oscilações acústicas de bárions, limitados a z < 2.

O parâmetro de deslocamento é proporcional à distância comóvel12 até a recom-

12A distância comóvel dC está relacionada à distância de luminosidade dL pela relaçãodC(z) = dL(z)/(1 + z) [Hogg99].

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2.3. VÍCIOS E VIRTUDES DA MATÉRIA ESCURA 35

binação [Elga07]:

R =√

Ωc0 + Ωb0H0dL(zrecomb)

1 + zrecomb

. (2.26)

O desvio para o vermelho na época da recombinação, por sua vez, é ajustado pela

fórmula13 [Hu96]:

zrecomb = 1048[1 + 0, 00124(Ωb0h

2)−0,738] [

1 + g1([Ωb0 + Ωc0]h2)g2], (2.27)

em que

g1 = 0, 0783(Ωb0h2)−0,238

/ [1 + 39, 5(Ωb0h

2)0,763],

g2 = 0, 560/ [

1 + 21, 1(Ωb0h2)1,81

].

Do ponto de vista prático, a dependência de zrecomb nos parâmetros cosmológicos

é fraca. O valor observacional do parâmetro de deslocamento, para o caso de cos-

mologias sem tri-curvatura, é dado por [Wang07]:

R = 1, 70± 0, 03 . (2.28)

Uma fórmula de ajuste análoga existe para a posição do primeiro pico, que é propor-

cional à razão entre dL e o horizonte sonoro em zrecomb. Neste trabalho, entretanto,

faremos uso apenas do parâmetro de deslocamento e não da posição do pico para

vincular modelos cosmológicos (capítulo 5).

2.3 Vícios e Virtudes da Matéria Escura

2.3.1 Virtudes

Conforme adiantou-se no capítulo 1 e na seção 2.1.2, a matéria escura é atual-

mente responsável por uma grande parcela da densidade de energia do universo. A

primeira proposta de ME foi realizada ainda na década de 30 por Zwicky [Zwic33].

Ao analisar os movimentos aleatórios de galáxias no aglomerado de Coma, Zwicky

percebeu que a dispersão de velocidades era muito superior ao que se obtinha do

teorema do virial levando-se em conta a soma das massas das galáxias. Isto o levou

13Em ΛCDM o ajuste possui erros inferiores a 1% em toda a faixa 0, 0025 . Ωbh2 . 0, 25.

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CAPÍTULO 2. PRINCÍPIOS DE COSMOLOGIA 36

a postular que a diferença entre a massa observada e a prevista14 era devido a uma

forma de matéria da qual não provinham fótons. Desde então, diversas observações

indicaram que matéria escura deve estar presente em uma grande diversidade de

sistemas astronômicos, de galáxias esferoidais anãs (M ∼ 107M) à grandes aglom-

erados de galáxias (M ∼ 1014M) [Beke07].

Outra virtude da ME está relacionada à ausência de barras em cerca de um terço

das galáxias espirais. Instabilidades formadoras de barras aparecem ao aplicar-se a

gravitação newtoniana15 a sistemas com baixa dispersão de velocidades. Um halo

massivo envolvendo o disco suprime esta tendência, permitindo explicar a fração

observada de galáxias espirais não-barradas. Este fato foi notado pela primeira vez

ainda na década de 70 por Ostriker e Peebles [Ostr73].

Em galáxias espirais, a existência de um halo de ME é necessário para explicar

as curvas de rotação das estrelas no disco. Curvas de rotação são grácos que

relacionam distância radial ao centro da galáxia (R) com a velocidade média de

rotação (vrot) de estrelas.16 Tais curvas possuem uma tendência universal a exi-

bir um perl de velocidades quase constante a distâncias além de ambos disco e

halo de matéria bariônica [Bosm81, Rubi82, Sofu01]. Nestas regiões, entretanto, a

dinâmica newtoniana prevê uma queda das velocidades de rotação proporcional à

raiz quadrada da distância ao centro (ou seja, vrot ∝ R−1/2). Estas curvas podem

ser ajustadas pela existência de halos de ME nestas galáxias. A gura 2.9 ilustra

uma curva de rotação típica, enquanto a gura 2.10 mostra uma coleção de curvas

de rotação. Note que as curvas são aproximadamente planas em regiões muito além

do disco ótico (∼ 10 kpc).

Assim como Zwicky o fez de modo pioneiro, diversos grupos estudaram nas últi-

mas duas décadas a dinâmica de aglomerados de galáxias, e conrmou-se o resultado

original: aglomerados de galáxias são permeados por ME. A descoberta de grandes

quantidades de gás quente emitindo raios-X dentro de aglomerados aliviou um pouco

a discrepância entre as massas inferidas e previstas, mas ainda persiste uma diferença

de um fator ∼ 5 [Sand02].

O modelo mais aceito para essa forma de matéria é o modelo de Matéria Es-

14Esta discrepância é às vezes denominada problema da massa ausente. Note que este termo(em inglês, missing mass) foi empregado com outro sentido na década de 80, quando o parâmetrode densidade total do universo aparentava estar muito aquém da unidade. Este problema por suavez desapareceu com a descoberta da energia escura.

15Neste regime o limite newtoniano da RG se justica com ótima precisão.16Na prática, as observações usualmente envolvem a medição da velocidade de rotação de nuvens

de hidrogênio, e não de estrelas.

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2.3. VÍCIOS E VIRTUDES DA MATÉRIA ESCURA 37

Figura 2.9: Esquema típico de curvas de rotação de galáxias espirais. A curvatracejada A representa a forma calculada com base apenas na massa bariônica. Acurva sólida B representa o melhor ajuste aos dados observacionais.

cura Fria (MEF). Tal modelo postula a ME como composta de partículas massivas

fracamente interagentes e cuja velocidade típica é muito inferior à da luz. Como con-

seqüência, MEF é um auxiliar ao processo de formação de estruturas. Neste cenário,

MEF acarreta em um processo de formação de estruturas hierárquico, onde peque-

nas estruturas são formadas primeiro e estruturas mais massivas, depois. Modelos

com matéria escura quente, por outro lado, apresentam diculdades em explicar a

formação de galáxias e demais estruturas em pequena escala; altas velocidades não

permitem a aglomeração da ME na escala necessária.

A grande conrmação do modelo de MEF foi fruto das subseqüentes medidas

de massa de aglomerados através dos efeitos de lentes gravitacionais. De fato, a

distorção ótica exercida por lentes gravitacionais independe da composição interna

dos objetos-lente; a dependência é apenas na distribuição de massa dos mesmos. A

massa total inferida por este efeito é bastante próxima à massa total inferida por

considerações dinâmicas (dispersões de velocidade e curvas de rotação), em princípio

totalmente independentes.

Alguns sistemas, como o notório Aglomerado da Bala (1E 0657-56), fornecem

ainda maior corroboração à idéia de que a matéria ausente é de fato composta de

partículas de fraca interação, assim como MEF. Acredita-se que o aglomerado em

questão seja fruto da colisão frontal de dois outros iniciada há aproximadamente

um bilhão de anos e cujo ápice (ou seja, o cruzamento dos respectivos centros de

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CAPÍTULO 2. PRINCÍPIOS DE COSMOLOGIA 38

Figura 2.10: Coleção de curvas de rotação de galáxias espirais. Os dados foramobtidos: nas regiões centrais por uma combinação de linhas moleculares de CO; nosdiscos por linhas na faixa ótica; na parte externa dos discos (gás) pelas linhas de21cm de HI. Os discos se estendem no ótico até R ∼ 10 kpc, mas as curvas de rotaçãopermanecem planas muito além desta distância. Figura retirada de [Sofu01].

massa) tenha se dado há apenas 150 milhões de anos. A importância deste sistema

advém de dois aspectos: (i) a raridade deste tipo de colisão frontal e (ii) o ângulo

subentendido entre o vetor posição do aglomerado e o vetor velocidade relativa dos

centros de massa, próximo a 90 graus. Ou seja, a colisão se deu aproximadamente

perpendicular à linha de visada, o que será importante no argumento abaixo.

Uma colisão deste tipo entre dois aglomerados é percebida de forma distinta

pelas matérias escuras e bariônica. Tanto as galáxias quanto a ME possuem seções

de choque para todos efeitos desprezíveis. O gás intergalático que permeia os dois

aglomerados originais, por outro lado, interage durante a colisão. Como resultado,

no referencial do centro de massa total, enquanto os halos de ME (e também as

galáxias) se atravessam, o gás intergalático é freiado durante a colisão e tem sua

velocidade (em módulo) reduzida. Espera-se, portanto, que logo após a (primeira)

colisão, o gás seja extirpado dos respectivos halos de matéria escura. Como em

aglomerados a maior parte da matéria bariônica encontra-se na forma de gás, e

não galáxias, obtém-se uma separação espacial efetiva entre ME e bárions. Tal

separação é de enorme raridade, pois a atração gravitacional mantém os bárions

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2.3. VÍCIOS E VIRTUDES DA MATÉRIA ESCURA 39

Figura 2.11: O Aglomerado da Bala em duas diferentes bandas de freqüência. Ográco da direita é sensível às emissões de raios-X do gás intergalático (manchascinzas e pretas), o da esquerda não. Em ambos grácos foi sobreposto as curvas denível da distribuição de massa, conforme inferido pelo efeito de lentes gravitacionais.Nota-se claramente a existência de dois picos distintos. Figura retirada de [Clow06b].

constantemente imersos em halos de ME.

Tal separação de componentes materiais fornece um novo pátio de testes para

a física. Em particular, levantamentos da distribuição de massa do Aglomerado

da Bala por lentes gravitacionais foram ao encontro do modelo de MEF. O que se

observou [Clow06b] foi de fato uma distribuição com dois picos, o que corresponde

a separação entre os halos de ME. Esta observação foi considerada um marco no

modelo de MEF. Acredita-se que modelos alternativos prevejam um excesso efetivo

de massa de certa forma centrado na distribuição de matéria bariônica, e não deslo-

cado espacialmente. A gura 2.11 ilustra o Aglomerado da Bala em duas dife-rentes

bandas de freqüência. O gráco da direita é sensível às emissões de raios-X do gás

intergalático (manchas cinzas e pretas). Em ambos grácos foram sobrepostos as

curvas de nível da distribuição de massa, conforme inferido pelo efeito de lentes

gravitacionais. Nota-se claramente a existência de dois picos distintos.

2.3.2 Vícios

Os modelos de matéria escura não estão desprovidos de defeitos. O primeiro e

mais importante é que a ME ainda não foi medida diretamente em laboratório, en-

quanto diversos modelos (agora descartados) previam a sua detecção. Tal evasão per-

siste apesar do grande esforço e quantidade de recursos dedicados [Muno04, Bert05,

Taos07]. A não-detecção direta não é, entretanto, a única diculdade destes modelos.

Simulações numéricas de sistemas de N-corpos no contexto newtoniano apresen-

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CAPÍTULO 2. PRINCÍPIOS DE COSMOLOGIA 40

tam uma forte tendência a formação de cúspides na distribuição de ME nos centros

das galáxias. De fato, tais simulações prevêem um perl de densidade com compor-

tamento duplo-assintótico: proporcional a 1/R para R pequenos e gradativamente

mais íngreme até se tornar proporcional a 1/R3. Tal cúspide no centro, no entanto,

não está em boa concordância com as observações [Bert05]. Em particular, não é

observada em curvas de rotação de galáxias de baixo brilho supercial; estas indicam

pers de densidade muito menos íngremes próximos ao centro. Na prática, um bom

acordo entre os dados e este perl duplo-assintótico exige um ajuste no (e a rigor,

a posteriori) dos parâmetros do halo escuro [Beke07].

Recentemente foram obtidos indícios de que galáxias elípticas não possuiriam

halos de matéria escura [Roma03], ou pelo menos não com a massa prevista pela

teoria e simulações. Tal fato, se conrmado, seria um duro golpe na atual compreen-

são da ME, pois é normalmente aceito que galáxias elípticas são formadas a partir

de fusão de galáxias espirais, estas sim envoltas em halos de MEF.

Menos controverso é o fato de que a Relação (ou Lei) de Tully-Fisher [Tull77]

ser puramente empírica nos modelos de MEF. Tal relação arma que a luminosi-

dade L é proporcional à vαrot na parte plana das curvas de rotação [Sand02]. Mais

importante, a constante de proporcionalidade é universal. Duas observações são

importantes. Primeiro, esta relação pode ser convertida em uma entre a massa total

M da galáxia e sua vrot. Para tal utiliza-se a luminosidade LK′ na banda de freqüên-

cias no infravermelho próximo, a qual é tida como a que mais el representante da

massa estelar.17 Segundo, nesta banda observa-se α ' 4 o que implica M ' v4rot.

Estes dois fatos serão explorados no próximo capítulo. A gura 2.12 ilustra esta

correlação para uma amostra de 360 galáxias espirais. O melhor ajuste é dado por

α = 3, 7. Outro ponto importante é o fato desta correlação ser muito nítida (ou seja,

admitindo pouca dispersão). Modelos de MEF tentam explicar o fenômeno como um

reexo da gênese galática, mas enfrentam problemas em esclarecer como tal processo

inerentemente conturbado possa resultar em uma correlação tão precisa [Sand90].

17Estrelas antigas de baixa massa também emitem no infravermelho próximo, e esta banda émenos obscurecida por poeira [Sand02].

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2.3. VÍCIOS E VIRTUDES DA MATÉRIA ESCURA 41

Figura 2.12: Relação de Tully-Fisher obtida pelo levantamento 2MASS [Skru97]para 360 galáxias espirais retiradas do catálogo [Dale99]. A linha preta sólida rep-resenta o melhor ajuste dos dados e corresponde a uma relação LK′ ∝ v3,7

rot (ou,equivalentemente, a vrot ∝ L0,27

K′ ). As linhas pontilhadas demarcam a dispersão em2σ. Figura retirada de [Cour07].

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CAPÍTULO 2. PRINCÍPIOS DE COSMOLOGIA 42

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Capítulo 3

A Teoria TeVeS de Bekenstein e

Sanders

As diculdades enfrentadas pelos modelos de MEF descritas na seção 2.3 su-

gerem a possibilidade do papel de matéria escura ser representado por um outro

ator no palco cósmico. A não-detecção direta de algum dos candidatos à partícula

escura até o presente momento implica que todas as evidências da existência de

ME (e igualmente de EE) são essencialmente gravitacionais. Isto é, são inferidas a

partir de equações que supõem ser a RG a teoria correta de gravitação ou ao menos

ser a gravitação newtoniana a teoria de campo fraco não-relativística efetiva. Em

princípio, uma nova teoria de gravitação que suplantasse a RG poderia explicar as

diversas facetas do problema da discrepância de massa.

Neste capítulo expor-se-á uma das mais recentemente estudadas propostas de

modicação da gravidade, a teoria de gravitação Tensorial-Vetorial-Escalar (TeVeS)

proposta por Bekenstein em 2004 [Beke04]. Esta teoria é o mais recente desenvolvi-

mento da perspicaz idéia de Milgrom [Milg83] de que uma dinâmica newtoniana

modicada (em inglês, Modied Newtoniana Dynamics MoND) com base em uma

escala de aceleração1 pudesse reproduzir tanto as curvas de rotação observadas como

a Relação de Tully-Fisher. Na seção 3.1 revisar-se-ão algumas teorias baseadas em

MoND que precederam e motivaram TeVeS. Em seguida (seção 3.2) expor-se-ão os

princípios de TeVeS e algumas de suas conseqüências. Buscando obter uma menor

complexidade das equações de campo, propor-se-á uma redenição conveniente da

lagrangiana do campo escalar [Dode]. Finalmente na seção 3.3 apresentar-se-á al-

1Um erro comum é considerar-se MoND como uma modicação da gravidade em grandes escalasde distância. Isto não somente é incorreto, mas foi precisamente buscar uma nova fórmula que nãocontivesse uma escala de distância o que motivou Milgrom originalmente (vide seção 3.1).

43

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CAPÍTULO 3. A TEORIA TEVES DE BEKENSTEIN E SANDERS 44

guns resultados preliminares [Dode] de um modo de se confrontar previsões da teoria

com as observações do efeito de lentes gravitacionais do Aglomerado da Bala (vide

seção 2.3).

3.1 Precursores de TeVeS

3.1.1 MoND

A modicação mais simples da gravitação newtoniana que prevê curvas de ro-

tação assintoticamente planas é uma modicação da dependência do campo gravita-

cional de 1/r2 para 1/r a partir de alguma escala de distância r0 comparável ao raio

médio de galáxias espirais. Diversas propostas com esta característica existem na

literatura (vide [Sand02]), e todas possuem em comum o fato de que equacionar a

aceleração centrípeta com a gravitacional na região r > r0 implica uma relação entre

massa e velocidade de rotação assintótica na forma v2 = GM/r0. Conforme Mil-

grom percebeu [Milg83] isto é incompatível com a Relação de Tully-Fisher, v4 ∝M .

Ademais, uma escala de distância acarretaria no fato da discrepância entre as massas

observada e prevista ser maior em galáxias maiores; e isto não está de acordo com as

observações. Há galáxias muito pequenas, normalmente de baixo brilho supercial,

que exibem grande discrepância e galáxias espirais muito grandes, de alto brilho

supercial, cuja discrepância é pequena [McGa98].

A gura 3.1 ilustra este fato. À esquerda está um gráco tipo loglog que mostra

a relação entre a razão massa dinâmica por luminosidade M/LK e o raio do último

ponto medido da curva de rotação para uma amostra uniforme de galáxias espirais

no aglomerado da Ursa Maior [Tull96, Verh01]. À direita, um gráco análogo mas

em função da aceleração centrípeta do mesmo último ponto. Estudos de síntese

populacional sugerem que a razão M/L seja próximo à unidade [Sand02], de modo

que valores superiores a este indicam uma discrepância de massa. É evidente que não

há nenhuma forte correlação entre M/L e tamanho da galáxia. Em contrapartida

há uma correlação entre discrepância de massa e aceleração, no sentido de que

M/L ∝ 1/a para a < 10−8cm/s2.

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3.1. PRECURSORES DE TEVES 45

Figura 3.1: Razão massa-luminosidade (na banda K') para galáxias espirais emUrsa Maior representadas em função do raio no ponto mais distante na respectivacurva de rotação (esquerda) e da aceleração centrípeta neste mesmo ponto (direita).Note a ausência de correlação entre M/L e o raio da galáxia e a aparente relaçãoM/L ∝ 1/a. Figura retirada de [Sand02].

Milgrom propôs uma modicação da gravitação newtoniana segundo a fórmula2

µ(|a|/a0)a = −∇ΦN, em que

µ(x) ≈ x para x 1

µ(x)→ 1 para x 1(3.1)

e em que ΦN é o potencial newtoniano usual da matéria visível e a, a aceleração

a qual uma partícula neste campo é submetida. Milgrom estimou originalmente o

valor da constante a0 ≈ 1 × 10−8 cm/s2 a partir de dados envolvendo Relação de

Tully-Fisher. O valor mais aceito hoje é mais próximo de 1, 2 × 10−8 cm/s2. Em

laboratório e no sistema solar, onde as acelerações são fortes comparadas à a0, a

fórmula (3.1) reduz-se à lei de Newton a = −∇ΦN. É muito importante frisar que

em MoND a0 é uma constante universal, isto é, cujo valor é o mesmo em qualquer

sistema astrofísico.

Nas escalas nas quais as curvas de rotação de galáxias espirais são planas, o poten-

cial newtoniano é aproximadamente esférico e também se observa que

|∇ΦN| ≈ GMr−2 a0. Desta forma, nesta região µ(x) ≈ x, o que implica em

|a| ≈ (GMa0)1/2r−1 e, portanto, em M = (Ga0)−1vc4. Isto é precisamente o que

se espera para explicar a Relação de Tully-Fisher. Ademais a dependência em r é

idêntica a da aceleração centrípeta v2c/r, ou seja, é a correta para se obter curvas de

2Outra alternativa proposta, que não será considerada neste trabalho, é considerar (3.1) comouma modicação da lei de inércia [Milg83, Milg94b].

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CAPÍTULO 3. A TEORIA TEVES DE BEKENSTEIN E SANDERS 46

rotação planas.

O ajuste das curvas de rotação de diferentes galáxias em MoND depende apenas

de um parâmetro (lembre-se que a0 é uma constante universal): a razão M/L.

Modelos padrão para halo de ME exigem dois parâmetros adicionais, mas a qualidade

dos ajustes não é melhor. De fato, alguns autores armam que os casos em que o

ajuste de MoND é pior que o obtido com halos de ME advém de galáxias cuja

natureza está envolta em um maior nível de incerteza [Barn07]. De todos modos,

no que concerne ajuste de curvas de rotação, a fórmula uni-paramétrica de MoND é

mais econômica (e portanto mais facilmente refutável) que modelos de halos de ME.

É também signicativo que os valores de a0 conforme previsto pelo ajuste de curvas

de rotação e pelo ajuste do coeciente da Relação de Tully-Fisher estejam em tão

boa concordância, uma vez que os papeis de a0 nestes dois quesitos são diferentes.

Apenas em MoND esses dois papéis estão amarrados.

De fato, MoND não explica apenas o comportamento assintótico das curvas de

rotação mas também os seus formatos. A gura 3.2 mostra todo o poder de previsão

da fórmula (3.1). Para uma amostra de 15 galáxias espirais, estão ilustrados os

dados observacionais das curvas de rotação em conjunto com as curvas previstas por

MoND. Para efeito de comparação, estão desenhadas também as curvas previstas

pela gravitação newtoniana levando-se em conta apenas contribuições da matéria

visível: estrelas (curvas pontilhadas), gás (curvas tracejadas) e, quando disponível,

também as contribuições do bojo (curvas com tracejado longo). Os eixos horizontais

representam a distância ao centro galático (em kpc) e os verticais, a velocidade de

rotação (em km/s).

Existem outras previsões interessantes de MoND [Sand02], dentre as quais vamos

mencionar apenas uma. Decorre da constante universal a0 que deve existir uma

escala de densidade supercial de massa Σm = a0G−1 que igualmente caracterize os

sistemas nos quais a discrepância de massa é grande. Ou seja, sistemas com Σ Σm

devem apresentar efeitos que mimetizem a presença de uma grande proporção de

ME. Isto foi uma previsão de MoND e somente com posterior descoberta de galáxias

de baixo brilho supercial tal previsão foi conrmada [McGa98, deBl98]: de fato

estes sistemas apresentam uma grande discrepância de massa. A gura 3.3, por sua

vez, mostra a extensão de validade da fórmula (3.1). Inicialmente proposta para

explicar a relação de Tully-Fisher e as curvas de rotação de galáxias espirais, MoND

mostrou-se válida em uma vasta classe de sistemas.

Dentre as diculdades empíricas provenientes da fórmula (3.1), a mais grave

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3.1. PRECURSORES DE TEVES 47

Figura 3.2: Curvas de rotação para uma amostra de 15 galáxias espirais. As curvassólidas representam a previsão de MoND. Para efeito de comparação, estão dese-nhadas também as curvas previstas pela gravitação newtoniana levando-se em contaa matéria visível estelar (curva pontilhada), gasosa (curva tracejada) e (quandodisponível) do bojo (curvas com tracejado longo). As distâncias (abscissas) estãoem kpc e as velocidades em km/s. Figura retirada de [Sand02].

provavelmente diz respeito a aglomerados de galáxias. Estes sistemas são compos-

tos por centenas de galáxias de vários tipos que se movem em um campo gravita-

cional conjunto com velocidades de até 1000 km/s. Estimativas de massa através

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CAPÍTULO 3. A TEORIA TEVES DE BEKENSTEIN E SANDERS 48

Figura 3.3: Gráco da massa ausente por aceleração típica de diversos sistemasastrofísicos. A curva azul, na maior parte diagonal, representa a previsão de MoND.As elipses demarcam a localização neste plano e variação aproximada dos diversossistemas. Apenas os núcleos de aglomerados de galáxia não são explicados porMoND. Figura retirada de [Milg98].

do Teorema do Virial resultam em valores de 5 a 10 vezes superiores aos inferidos

através das galáxias e das emissões de raios-X do gás quente. Discrepâncias pareci-

das aparecem ao analisar a hidrostática do gás e confrontar com a sua temperatura

medida. Com o emprego de (3.1), ou melhor, do análogo ao Teorema do Virial para

a mesma [Milg94a], encontra-se uma melhora, mas não uma solução: a discrepância

cai apenas para um fator ∼ 2 ou maior. A gura 3.4 ilustra este fato para uma

amostra de 93 aglomerados emissores de raios-X.

3.1.2 Uma lagrangiana para MoND

Embora goze de um grande (e surpreendente) sucesso, MoND é apenas uma

receita e não uma teoria. Por exemplo, (3.1) implica a violação da conservação

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3.1. PRECURSORES DE TEVES 49

Figura 3.4: (Esquerda) Gráco da massa dinâmica newtoniana dos aglomerados degaláxias dentro de um raio de corte observado (rout) contra a massa total observávelpara 93 aglomerados emissores de raios-X [Whit97]. A linha sólida diagonal cor-responde à Mdyn = Mobs (nenhuma discrepância). (Direita) Idem para a massadinâmica de MoND. Figura retirada de [Sand02].

de energia e momento [Felt84]. Ademais, a fórmula de MoND é ambígua: estrelas

situadas a grandes distâncias do centro de sua galáxia estão sujeitas a acelerações

pequenas quando comparadas à a0, mas as moléculas que as constituem são sub-

metidas a acelerações várias ordens de grandeza superiores. Assim, não é claro por

que MoND deva ser válida para os centros de massa e não para as partículas que

compõem estas massas.

Em busca de uma solução para estes problemas, propôs-se uma teoria não-

relativística baseada em uma lagrangiana de campo escalar cujo protagonista é o

potencial gravitacional Φ [Beke84]:

L = −∫ [

a02

8πGF

(|∇Φ|2

a02

)+ ρΦ

]d3x. (3.2)

Aqui, F é uma função positiva, ρ é a densidade de massa da matéria e Φ foi elevado

a categoria de campo escalar independente. O termo cinético desta lagrangiana

é o mais geral dentre os que dependem apenas na primeira derivada do campo e

é consistente com a isotropia do espaço, pois ∇Φ só aparece em módulo. Como

o termo cinético desta é não-canônico, ela foi chamada de lagrangiana (ou teoria)

aquadrática, ou simplesmente AQUAL (do inglês, AQUAdratic Lagrangian).

A equação de movimento generaliza a equação de Poisson (∇ ·∇ΦN = 4πGρ) e

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CAPÍTULO 3. A TEORIA TEVES DE BEKENSTEIN E SANDERS 50

é dada por:

∇ · [µ (|∇Φ|/a0) ∇Φ] = 4πGρ, (3.3)

µ(√

y)≡ dF (y)/dy. (3.4)

Para reobter MoND, é preciso identicar-se µ acima com µ em (3.1), o que acarreta

o comportamento assintótico

F (y) −→

y y 1;23y3/2 y 1.

(3.5)

Uma comparação de (3.3) com a equação de Poisson newtoniana para o mesmo ρ

fornece o resultado

µ (|∇Φ|/a0) ∇Φ = ∇ΦN +∇× h, (3.6)

em que h é um campo vetorial calculável a partir de (3.2). Em sistemas altamente

simétricos (com simetria esférica, cilíndrica ou plana), o uso do Teorema de Gauss na

equação de AQUAL mostra que o termo ∇×h deve se anular, e a equação de MoND

é identicamente satisfeita. Nos casos de menor simetria, ∇×h é em geral não-nulo, e

a fórmula de MoND é apenas uma aproximação de (3.6). De fato, este termo extra

é precisamente o responsável pela recuperação das leis de conservação de energia

e momento. Estas, por sua vez, são automaticamente satisfeitas em AQUAL por

ser esta uma lagrangiana que não depende explicitamente das coordenadas espaço-

temporais.

Além de gozar de consistência e de satisfação das leis de conservação, esta gene-

ralização da equação de Poisson possui uma propriedade de simetria interessante. É

sabido que a equação de Poisson usual é invariante conforme em duas dimensões es-

paciais. Transformações conformes são compostas de transformações de coordenadas

que preservam ângulos e que, na prática, representam uma modicação das unidades

de comprimento dependente da posição. Muitas das equações da física tais como

as equações de Maxwell são invariantes conformes. Milgrom descobriu [Milg97] que

existe uma generalização não-linear da equação de Poisson que é invariante conforme

em D dimensões espaciais na presença de uma fonte ρ:

∇ ·[

(∇Φ)2]D/2−1∇Φ

= αDGρ. (3.7)

Quando D = 2 a equação acima se reduz à de Poisson usual, mas em D = 3

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3.1. PRECURSORES DE TEVES 51

essa assume precisamente a forma exigida pela fenomenologia de MoND. Em outras

palavras, no limite MoNDiano (3.3) é invariante conforme em 3 dimensões espaciais.

O signicado deste resultado não está claro, mas em contrapartida boa parte da

física moderna se baseia exatamente neste tipo de princípios de simetria.

A aproximação de (3.6) por (3.1) é em geral bem razoável, representando uma

correção típica de apenas 510% [Brad95, Milg86]. Isto explica como MoND pode

ser tão bem-sucedida mesmo não sendo uma teoria física consistente. De fato, é de

se esperar que ajustes de curvas de rotação através da fórmula original de MoND

apresentem pequenos desvios frente aos dados em sistemas de menor simetria; tais

desvios não representam evidência em contrário ao paradigma de MoND.

Ao contrário de MoND, AQUAL satisfaz o princípio de equivalência na sua forma

fraca, a saber: todos os corpos, independente de sua constituição interna, partindo

das mesmas condições iniciais seguem as mesmas trajetórias sob um campo grav-

itacional. Ou seja, o centro de massa de um conjunto de partículas em AQUAL se

desloca (independentemente da intensidade do seu campo gravitacional interno) se-

gundo a equação a = −∇Φ, com Φ determinado pela equação de AQUAL [Beke84].

Conforme mencionado na seção 2.3, um dos méritos da ME é explicar a rela-

tiva estabilidade dos discos de galáxias espirais, suprimindo a formação de barras e

permitindo uma boa concordância com a observação de que um terço das espirais

não possuem barras signicativas. Como se sai a dupla AQUAL / MoND neste

quesito? Simulações de N-corpos utilizando a fórmula de MoND [Milg89, Brad99]

e a equação completa de AQUAL [Chri91, Griv95] mostraram que a estabilidade

frente à perturbações nos dois casos é maior que no regime newtoniano, mas atinge

uma saturação no regime MoNDiano profundo. Ou seja, nenhum disco em MoND é

absolutamente estável. Recentemente, simulações numéricas da evolução das barras

também têm sido realizados [Tire07], e descobriu-se que na verdade as barras se

formam mais rapidamente em MoND que em modelos de halos de ME, mas que as

barras em MoND se tornam subseqüentemente mais fracas que em modelos newto-

nianos. Desta forma, a distribuição a longo prazo das intensidades das barras em

MoND está em igual ou melhor concordância com as observações do que os modelos

newtonianos de halos de ME [Beke07].

3.1.3 Primeiras teorias relativísticas de MoND

Embora a maioria dos sistemas astronômicos nos quais existe signicativa dis-

crepância de massa encontrem-se no regime não-relativístico, freqüentemente ao

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CAPÍTULO 3. A TEORIA TEVES DE BEKENSTEIN E SANDERS 52

extremo, uma generalização relativística de AQUAL / MoND é muito importante.

A razão é dupla: primeiro, qualquer candidato a suplantar ME precisa explicar

também seus efeitos cosmológicos, e cosmologia requer um tratamento relativístico;

segundo, o efeito de lentes gravitacionais é uma ferramenta cuja importância tem

aumentado bastante nas últimas duas décadas e reproduz elmente as previsões

dos modelos de ME. Devido ao seu caráter não-relativístico, AQUAL não pode ser

utilizada para prever trajetórias de fótons, as partículas mais relativísticas dentre

todas as conhecidas.

Tal teoria relativística, por exemplo, não pode advir de teorias do tipo f(R) (vide

subseção 2.1.1). Um jeito de perceber isto vem do fato de que embora R dependa

de forma quadrática nas derivadas dos potenciais gravitacionais (componentes da

métrica), e embora a substituição R → f(R) seja sugestiva de um limite não-

relativístico do tipo (3.2), R contém também um termo proporcional à derivada

segunda de componentes da métrica. Na ação de Einstein-Hilbert da Relatividade

Geral, este termo se reduz a um termo de superfície e é irrelevante. Mas em f(R)

isto não ocorre, e de fato este termo dominaria o primeiro. De modo mais geral,

o teorema de Soussa-Woodard [Sous04] arma que uma teoria gravitacional cons-

truída apenas com a métrica, seja com uma densidade lagrangiana local ou global,

não pode simultaneamente possuir um limite MoNDiano e reproduzir os fortes efeitos

de lente gravitacional vistos em aglomerados de galáxias.

De fato, a primeira teoria relativística de MoND não era puramente métrica,

e foi construída como uma generalização quase imediata de AQUAL. Na teoria

relativística de AQUAL, denominada RAQUAL, as equações de Einstein da RG

são preservadas e continuam responsáveis pela obtenção da métrica gαβ a partir

do tensor energia momento da matéria. Em RAQUAL, entretanto, a dinâmica da

matéria e radiação é governada não na arena de gαβ e sim na de

gαβ = e2ψ/c2 gαβ, (3.8)

em que ψ é um campo escalar. Uma vez que toda a matéria é tratada igualmente, o

muito bem testado princípio de equivalência fraco é preservado; mas uma vez que a

métrica que governa a dinâmica do campo gravitacional é distinta da métrica à qual

a matéria é sensível, o princípio de equivalência forte é quebrado. Isto é essencial,

pois do contrário recairíamos em RG, e RG possui a dinâmica newtoniana, e não a

MoNDiana, como limite.

Por sua vez, ψ é determinado através da versão covariante da lagrangiana (3.2)

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3.1. PRECURSORES DE TEVES 53

para o potencial gravitacional Φ. Isto signica substituir |∇Φ|2 → gαβ∂αψ ∂βψ

assim como d3x → (−g)1/2 d4x, em que g é o determinante de gαβ. No entanto em

RAQUAL não se inclui um termo proporcional a ρΦ; o acoplamento entre ψ e a

matéria, que será a equação de fonte para ψ, é automaticamente providenciado pelo

fator eψ/c2na métrica gαβ com a qual construiu-se a lagrangiana da matéria. Assim

temos (c será doravante igualado à unidade)

Lψ = − a02

8πGF

(gαβψ,α ψ,β

a02

). (3.9)

No regime estacionário e com fontes não-relativísticas, a equação para ψ se reduz

à (3.3) com Φ → ψ. Seria entretanto um equívoco concluir que em RAQUAL ψ

é o potencial gravitacional. Efetuando a variação da ação total (matéria mais ψ),

obtém-se a equação de campo (novamente com µ(√y) ≡ dF (y)/dy)

∇λ

(gαβψ,α ψ,β

a02

)gλσψ,σ

]= −4πGgαβTαβ, (3.10)

em que Tαβ é o tensor energia-momento obtido ao variar a ação da matéria com

respeito à gαβ.

No limite não-relativístico de campo fraco da RG, o potencial sob o qual se

move a matéria está relacionado com a métrica através de ΦN = −(gtt + 1)/2. Em

RAQUAL, a matéria se movimenta de acordo com gαβ, e portanto o potencial Φ

que governa o movimento da matéria se relaciona com esta métrica da mesma forma

Φ = −(gtt + 1)/2. No regime linear, gtt = (1 + 2ψ) gtt, e portanto Φ = ΦN − gttψ.Logo, em primeira ordem tem-se que

Φ = ΦN + ψ. (3.11)

Conseqüentemente, em RAQUAL o potencial gravitacional traçado pelo movimento

da matéria é a soma do potencial newtoniano e o campo escalar ψ, ambos gerados

pela mesma matéria bariônica. O campo ψ desempenha portanto o papel de ME

em uma abordagem newtoniana convencional.

Não é difícil mostrar que o limite não-relativístico de campo fraco de RAQUAL é

de fato AQUAL [Beke07]. No front relativístico, por outro lado, RAQUAL enfrenta

dois sérios problemas. O primeiro é que o campo ψ pode se propagar sob certas

circunstâncias (satisfeitas por exemplo nos conns de uma galáxia) com velocidades

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CAPÍTULO 3. A TEORIA TEVES DE BEKENSTEIN E SANDERS 54

superluminais,3 o que poderia em princípio rachar um dos grandes monumentos da

física, a causalidade. Segundo, RAQUAL não fornece um lenteamento gravitacional

mais forte, como exigem as observações. De fato, RAQUAL produz os mesmos

desvios nas geodésica dos fótons que a RG sem ME. É instrutivo entender o motivo

por trás deste fato. A origem está na relação entre as duas métricas ser uma relação

conforme. Devido a supracitada invariância conforme das equações de Maxwell,

métricas conformes possuem o mesmo cone de luz e, portanto, os mesmos efeitos de

lente gravitacional.

Uma conclusão imediata é que uma teoria de campo escalar que possua um

limite MoNDiano deve possuir uma relação não-conforme entre as duas métricas. A

primeira tentativa [Beke92] postulou a relação

gαβ = e2ψ(A gαβ +B ψ,α ψ,β), (3.12)

em que A e B são funções do invariante gαβφ,α φ,β. Entretanto, ao restringir propa-

gações superluminais, este modelo gera um desvio da luz inferior ao da RG, e

portanto foi descartado. Para evitar este grave problema, seria necessário que ψ,αfosse um quadri-vetor do tipo tempo, mas isso vai de encontro ao que se espera da

maioria dos sistemas astrofísicos relevantes para o efeito de lentes, onde uma apro-

ximação quase-estacionária é bem justicada. Sanders propôs então uma relação do

tipo [Sand97]

gαβ = e−2φ gαβ − 2 senh(2φ)AαAβ, (3.13)

em que Aα e Aβ são vetores do tipo tempo não-dinâmicos e φ um campo escalar

análogo ao ψ de RAQUAL. Na prática, este é apenas um modelo de brinquedo:

tal vetor dene uma direção privilegiada e, portanto, um referencial preferencial.

Ademais, como Aα é suposto constante, a teoria não é covariante. De todos modos,

como desejado o efeito de lentes gravitacionais é acentuado.

As características discutidas acima foram muito importantes para nortear Beken-

stein na construção de um modelo relativístico de MoND, TeVeS, o qual será exposto

agora.

3Uma outra teoria relativística de AQUAL, envolvendo um campo escalar complexo e denomi-nada gravidade acoplada à fase ou simplesmente PCG (do inglês phase-coupled gravity) [Beke88],foi construída de modo a eliminar propagações superluminais. PCG, no entanto, assim comoRAQUAL não reproduz o efeito de lentes gravitacionais associado à ME.

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3.2. PRINCÍPIOS DE TEVES 55

3.2 Princípios de TeVeS

3.2.1 As ações e equações da teoria

TeVeS é uma teoria bimétrica4 na qual a gravidade é intermediada por um campo

tensorial gµν associado a uma conexão compatível com a métrica ∇µ e com uma

inversa bem-denida gµν tal que gµρgρν = δµν ; um campo vetorial (dual) do tipo

tempo Aµ tal que gµνAµAν = −1; e um campo escalar φ. Exige-se que a matéria

obedeça ao princípio de equivalência fraco, o que signica que existe uma métrica gµνassociado a uma conexão compatível com a métrica ∇µ, universal a todos os campos

de matéria, tal que partículas-teste sigam suas geodésicas. O campo tensorial gµνserá denotado a métrica na moldura de Einstein-Hilbert enquanto gµν será rotulado

de métrica na moldura da matéria.

Quando as equações de movimento são satisfeitas, os quatro campos acima estão

relacionados pela equação

gµν = e−2φgµν − 2 senh(2φ)AµAν , (3.14)

cuja inversa é dada por

gµν = e2φgµν + 2 senh(2φ)AµAν , (3.15)

em que Aµ ≡ gµνAν . Note que (3.14) é idêntica à (3.13), mas aqui Aµ é um campo

dinâmico com uma lagrangiana associada, descrita abaixo. Ou seja, não há quebra

da simetria de Lorentz.

A teoria TeVeS é baseada em uma ação total S decomposta como S = Sg +SA +

Sφ, em que Sg, SA e Sφ são as ações para gµν , o campo vetorial Aµ e o campo escalar

φ, respectivamente.

É mais simples escrever as ações para gµν , Aµ e φ na moldura de Einstein-Hilbert.

Deste modo Sg assume a forma da ação de Einstein-Hilbert (2.3)

Sg =1

16πG

∫d4x

√−g R , (3.16)

em que g e R são, respectivamente, o determinante e escalar de curvatura de gµν e

4A rigor, TeVeS não é uma teoria fundamentalmente bimétrica, pois existe uma relação devínculo entre a segunda métrica e o trio primeira métrica, campo escalar e campo vetorial, dadapor (3.14).

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CAPÍTULO 3. A TEORIA TEVES DE BEKENSTEIN E SANDERS 56

G é uma vez mais a constante gravitacional de Newton.

A ação para o campo vetorial Aµ, por sua vez, é dada por

SA = − 1

32πG

∫d4x

√−g [ KB FµνF

µν − 2λ(AµAµ + 1)] , (3.17)

em que Fµν ≡ 2 ∇[µAν] , F µν ≡ gµαgνβFαβ , λ é um multiplicador de Lagrange

que impõe o vínculo de Aµ ser do tipo tempo5 e KB é uma constante adimensional

positiva. Mostrou-se em [Beke04] que no limite KB → 0 TeVeS se transforma em

RG, e portanto é comum considerar-se KB . 0, 1 [Skor06a]. O termo cinético da

ação acima é quadrático nas primeiras derivadas de Aµ, de modo análogo ao de

campos de calibre. Esta não é a única forma quadrática possível, mas é a única

para a qual as equações de Einstein para gµν não contém derivadas segundas de Aµatuando como fonte.

Finalmente, a ação para o campo escalar φ é estabelecida por

Sφ =1

8πG

∫d4x√−g D(χ) , (3.18)

em que

χ ≡ (gµν − AµAν) ∇µφ ∇νφ . (3.19)

D é uma função arbitrária, incorporando assim a maior parte da exibilidade da

teoria e deve ser denida de modo a gerar um limite MoNDiano apropriado. A

escala de aceleração a0, por exemplo, está codicada implicitamente nesta função.

D(χ) está relacionada a µ(χ) e a V (µ) denidas em [Skor06b] pelas relações de

vínculo D(χ) = 1

2

[µ(χ) dV

dµ− V

(µ(χ)

)];

µ(χ) = −2 dD(χ)/dχ .(3.20)

A função µ acima é a análoga da função µ de (R)AQUAL e conseqüentemente da

função µ de MoND, denida em (3.1).

O mérito em se usar esta formulação para a ação do campo escalar ca mais

aparente ao se olhar para as equações de campo; o vínculo

−dV (µ)

dµ= χ , (3.21)

5Conforme visto na subseção 3.1.3, Aµ deve ser do tipo tempo para acentuar o efeito de lentesgravitacionais.

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3.2. PRINCÍPIOS DE TEVES 57

usado nas primeiras versões de TeVeS e o qual necessitava ser invertido para obter-se

µ(χ), não está mais presente. A nova formulação é portanto muito mais simples6

(e mais próxima ao espírito de seus precursores AQUAL e RAQUAL) porém com-

pletamente equivalente à formulação original de TeVeS. De fato, este procedimento

é semelhante ao de impor-se o vínculo de λ na própria ação (e portanto armar

que (3.14) é a inversa de (3.15) antes mesmo de se variar a ação com respeito à

λ). A rigor, ambos vínculos deveriam ser impostos apenas nas equações de campo,

mas não obstante após aplicar-se estes vínculos, os dois procedimentos fornecem as

mesmas equações de campo.

O leitor deve notar que embora a formulação proposta aqui se desfaça do vín-

culo (3.21), de modo a reescrever uma ação expressa como função de µ (na for-

mulação antiga) em termos de χ (na nova), tal vínculo ainda precisa ser imposto.

De fato, ao discutir o limite não-relativístico da teoria, vamos nos ater à formu-

lação original, utilizando V (µ) em vez de D(χ). O motivo para tal não representa

qualquer mérito da formulação antiga; é fruto da escolha original para a função

V [Beke04, Skor06a]

V (µ) =3µ2

0

128π`2B

[µ(4 + 2µ− 4µ2 + µ3) + 2 ln(µ− 1)2

], (3.22)

em que µ ≡ µ/µ0 e lB é uma constante com dimensão de distância. Esta escolha

induz uma função D cuja forma analítica não é simples, dicultando os cálculos. A

gura 3.5 ilustra as formas da função V determinada em (3.22) e da função D cor-

respondente. Tal função V , no entanto, constitui apenas uma primeira tentativa que

apresentava os limites newtoniano e MoNDiano adequados. Acreditamos, portanto,

que uma função D(χ) relativamente simples possa reproduzir todos os resultados

que listaremos abaixo, e um estudo nessa direção está em andamento [Dode].

A aplicação do método variacional na ação com respeito aos três campos gra-

vitacionais fornece as equações de campo na moldura de Einstein-Hilbert, enquanto

a variação com respeito a λ impõe as condições para que Aµ seja do tipo tempo e

com norma unitária.

As equações de campo para gµν são dadas por

Gµν ≡ Yµν + 8πGSµν , (3.23)

6A formulação apresentada em [Skor06b], por sua vez, era mais enxuta e conveniente que aoriginal [Beke04].

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CAPÍTULO 3. A TEORIA TEVES DE BEKENSTEIN E SANDERS 58

-1 1 2 3

Μ

Μ0

-0.4

-0.2

0.2

0.4

0.6VHΜΜ0L Mpc-2

-0.002 0.002 0.004 0.006Χ

-0.4

-0.2

0.2

0.4

DH ΧL Mpc-2

Figura 3.5: A função V (µ) e a correspondente D(χ), calculadas para os parâmetrosµ0 = 200 e lB = 100 Mpc. A descontinuidade de V (µ) em µ = µ0 se traduz nadescontinuidade da derivada de D(χ) em χ = 0.

em que Gµν é o tensor de Einstein relativo à gµν , e em que o tensor Yµν é dado por

Yµν = −2dD

[∇µφ∇νφ− 2Aα∇αφA(µ∇ν)φ

]+D(χ) gµν − λAµAν +

+KB

[Fα

µFαν −1

4FαβF

αβ gµν

](3.24)

e o tensor Sµν por

Sµν = Tµν + 2(1− e−4φ)AλTλ(µAν) . (3.25)

Observe que, conforme adiantado, as fontes Yµν e Sµν não possuem dependência em

derivadas de Aµ de ordem superior a um.

As equações de campo para a 1-forma Aµ são:

KB∇µFµν = −λAν + 2

dD

dχAµ∇µφ∇νφ + 8πGjν , (3.26)

em que a corrente jν é dada por

jν = (1− e−4φ)AλTλν . (3.27)

O multiplicador de Lagrange não é arbitrário e pode ser calculado ao contrair-

se (3.26) com Aν , o que resulta em

λ = KBAν∇µFµν − 2

dD

dχAµAν∇µφ∇νφ− 8πGAνjν . (3.28)

Inserindo-se esta última em (3.26), obtém se uma equação de campo alternativa

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3.2. PRINCÍPIOS DE TEVES 59

para o campo vetorial:

[δαν + AαAν ]

[KB∇µF

µα − 2

dD

dχAµ∇µφ∇αφ− 8πG jα

]= 0 , (3.29)

a qual não inclui explicitamente do multiplicador de Lagrange λ.

A última equação de campo, para o campo escalar φ, é fornecida por

∇µΓµ ≡ 8πGJ , (3.30)

em que

Γµ = −2dD

dχ(gµν − AµAν) ∇νφ (3.31)

e em que a fonte escalar J é dada por

J = e−2φ(gµν + 2e−2φAµAν)Tµν . (3.32)

A equação (3.30) é a generalização em TeVeS de (3.3) e (3.10).

3.2.2 Limite não-relativístico

Procuramos agora obter o limite não-relativístico de TeVeS e mostrar que condições

determinam se o mesmo se desdobra em uma teoria newtoniana ou em MoND. Para

tal, vamos supor um regime quase-estático e de campo fraco. Na prática, vamos:

• desprezar derivadas temporais frente a espaciais;

• supor ser |φ| 1;7

• impor Aµ = δµt /√−gtt;

• supor que a métrica (em ambas as molduras) seja aproximadamente plana.

Será necessário ainda estipular a função D para a lagrangiana do campo escalar.

Conforme adiantamos, por motivos práticos vamos utilizar nesta subseção a formu-

lação original, baseada em V (µ), e a função V (µ) denida em (3.22). Porém outras

escolhas poderiam ser feitas.

7Em princípio o campo φ poderia tender assintoticamente para um valor φassint 6= 0. Foicontudo mostrado em [Beke04] que φassint = 0 gera um comportamento da teoria consistente, eneste trabalho vamos estudar apenas neste caso.

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CAPÍTULO 3. A TEORIA TEVES DE BEKENSTEIN E SANDERS 60

-0.004 -0.002 0.002 0.004 0.006Χ

0.5

1.0

1.5

2.0

2.5

3.0

ΜΜ0

Figura 3.6: A função µ(χ) obtida invertendo-se −dV (µ)dµ

= χ. A existência de umlimite newtoniano impõe µ(χ) ' µ0 para χ 1. Um limite MoNDiano, por suavez, requer µ(χ) ' µ0

√χ para 0 < χ 1.

Para entender a motivação por trás da forma da função V (µ) proposta é necessário

obter-se a função µ(χ) a qual esta escolha implica. Para tal, é necessário inverter a

relação −dV (µ)dµ

= χ. Tal inversa pode não ser única, e de fato não o é no caso em

questão, como pode ser visto através da gura 3.5. Isto nos obriga a escolher quais

ramos da inversa são físicos e quais não, o que deixa claro a vantagem neste quesito

da formulação proposta neste trabalho. Como desejamos obter um comportamento

do tipo MoND, precisamos impor os mesmos limites assintóticos à função µ impostos

à função correspondente em AQUAL. Conforme (3.4) e (3.5), devemos ter:

µ(χ) −→

µ0 χ 1;

µ0√χ 0 < χ 1.

(3.33)

A gura 3.6 ilustra a função µ(χ) correspondente à (3.22) com os ramos físicos

escolhidos de modo a resultar nos limites não-relativísticos acima.

No regime quase-estático de campo fraco, a linearização de (3.23) em termos do

potencial newtoniano VN gerado pelas fontes Sµν e Yµν fornece gtt = −(1+2VN)+

O(V2N). Logo, o campo vetorial é dado por Aµ = −(1 + VN) + O(V2

N)δµt. Segue

imediatamente de (3.14) que, em primeira ordem em φ e VN , gtt = −(1+2VN +2φ).

Logo, em TeVeS o potencial que governa movimentos relativísticos é dado por

Φ = VN + φ . (3.34)

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3.2. PRINCÍPIOS DE TEVES 61

Note que em TeVeS não se pode identicar diretamente VN com o potencial new-

toniano ΦN gerado por uma densidade de massa ρ segundo a equação de Poisson.

Para relacionar VN com ΦN , precisamos utilizar a equação para Gtt.

Desprezando agora derivadas temporais em (3.30), obtemos

∇β

[µ (gµνφ,µφ,ν) g

αβφ,α]

= 8πG(ρ+ 3p) e−2φ. (3.35)

Prosseguimos substituindo gαβ → ηαβ e e−2φ → 1. Esta é a aproximação não-

relativística. Ademais, para ser consistentes precisamos desprezar p frente a ρ, do

contrário estaríamos aceitando que VN não é pequeno. Assim,

∇ ·[µ(

(∇φ)2)∇φ]

= 8πGρ. (3.36)

Esta é precisamente a equação de AQUAL (3.3) após uma redenição conveniente

da função µ. Comparando a equação (3.36) acima com a de Poisson, vemos que

2µ|∇φ| = O(|∇ΦN |). (3.37)

Levando adiante o argumento descartamos todos os termos de ordem quadrática

ou superior nas quantidades pequenas VN , ∇VN , ΦN , ∇ΦN , φ, φ,α e Aα,β. Desta

forma, a equação para Gtt assume a forma

Gtt = D(χ)gtt − λAt2 + 8πG(1 + 8φAtAt

)ρ . (3.38)

O termo Gtt pode ser escrito em função de VN seguindo o mesmo procedimento feito

em RG. O termo proporcional a D(χ) pode ser descartado, como iremos mostrar.

Fazendo uso de (3.20) e (3.21), obtemos

D(χ) ∼ V (µ)dV

eq.(3.21)= −χµ(χ) ' −|∇φ|2µ(χ)

eq.(3.37)= O

(|∇ΦN |2

µ(χ)

). (3.39)

A menos que µ ' 0 (regime ultra-MoNDiano), o termo acima é desprezível (no

regime newtoniano, µ ' µ0 ∼ 100). Mostrou-se [Beke04] que o termo em λ, por

outro lado, não é desprezível e implica VN = (1−KB/2)−1ΦN , a qual, em conjunto

com (3.34), fornece

Φ =ΦN

1−KB/2+ φ . (3.40)

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CAPÍTULO 3. A TEORIA TEVES DE BEKENSTEIN E SANDERS 62

Esta equação descreve o potencial gravitacional efetivo ao qual a matéria é sensível.

Percebe-se que em TeVeS o campo escalar φ se adiciona à ΦN desempenhando um

papel análogo ao da ME. Conforme adiantamos, é usual em TeVeS considerar-se

KB . 0, 1 e a equação acima é uma das razões. Para KB 1, (3.40) assume a

forma da equação para o potencial gravitacional efetivo de RAQUAL, (3.11). Uma

escolha adequada de D(χ) (ou equivalentemente V (µ)) introduz em (3.36) a escala

de aceleração a0 e, através de (3.40), recupera-se a fenomenologia de MoND.

3.2.3 Efeito de lentes gravitacionais

De maneira análoga à subseção anterior, vamos trabalhar aqui com o regime

linear da gravidade:

gαβ = ηαβ + hαβ −1

2ηαβ η

γδhγδ (3.41)

em que |hαβ| 1. Impondo-se o calibre8 ηβδhγδ,β = 0, obtém-se, em primeira ordem

em h:

Gαβ = −1

2ηγδ∂γ∂δ hαβ, (3.42)

de modo que as equações de Einstein assumem a forma de equações de onda no

espaço-tempo plano com o lado direito de (3.23) atuando como fonte. Os movimentos

de galáxias e de aglomerados são todos lentos o suciente para justicar o descarte de

derivadas temporais (mas não das componentes gti, pois galáxias exibem rotação).

Com isso, temos (vide (3.38))

Gtt = −1

2∇2 htt = D(χ)gtt − λAt2 + 8πG

[Tµν + 2(1− e−4φ)AλTλ(tAt)

]. (3.43)

As diversas contribuições das fontes foram discutidas na subseção anterior; segue-se

que

htt = −4VN = − 4ΦN

1−K/2. (3.44)

Argumentos análogos permitem ver que tanto as componentes espaciais-temporais

hti como as espaciais-espaciais hij são desprezíveis frente a htt. Substituindo estes

resultados em (3.41), obtemos

gαβ = (1− 2VN) ηαβ − 4VNδαtδβt. (3.45)

8A RG exibe, no regime linear, uma liberdade escolha do sistemas de coordenadas que resultaem uma liberdade na denição da perturbação da métrica, hαβ , análoga à do potencial vetor noeletromagnetismo [Schu85, Wald84].

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3.2. PRINCÍPIOS DE TEVES 63

A ausência de gti nesta aproximação torna o sistema estático (em oposição a apenas

estacionário). Logo, conclui-se que Aα = δαt . Calculando a métrica na moldura da

matéria a partir de (3.14) com e±2φ ' 1± 2φ, chega-se a

gαβ = (1− 2VN − 2φ) ηαβ − 4(VN + φ)δαtδβt , (3.46)

o que é equivalente a

gαβdxαdxβ = −(1 + 2Φ)dt2 + (1− 2Φ)δijdxidxj , (3.47)

com Φ = VN + φ, assim como na subseção anterior.

O resultado acima é de suma importância. De fato, (3.47) possui a mesma forma

que a métrica da RG no limite de campo fraco [Schu85]. Ou seja, assim como em

RG, em TeVeS o mesmo potencial governa tanto a dinâmica como o efeito de lentes

gravitacionais. Um corolário imediato é que uma prescrição de TeVeS (isto é, uma

escolha da função D e do parâmetro KB), que emule os limites MoNDiano e newto-

niano de maneira análoga à fórmula original de MoND, fornecerá uma concordância

para as observações de lenteamento gravitacional com a mesma qualidade que o

ajuste de curvas de rotação de MoND. Podemos armar isto pois esta equivalên-

cia dos potenciais newtonianos dinâmico e geodésico é inteiramente análogo ao que

acontece em RG ao se adicionar ME, e modelos de ME ajustam curvas de rotação e

efeito de lentes gravitacionais com aproximadamente a mesma precisão. Entretanto,

ambas teorias podem ser distinguidas observacionalmente, pois a dependência de Φ

com a distância é distinta nas duas teorias. Por exemplo, com a escolha de D(χ)

correspondente à (3.22), para uma galáxia isolada Φ cresce logaritmicamente com a

distância ao centro galático [Beke04].

Para sistemas com simetria esférica, mostrou-se que o resultado acima estende-se

além do regime de campo fraco [Beke04].

3.2.4 Outros resultados

Nesta seção, vamos listar sucintamente algumas outras características de TeVeS:

• Os parâmetros pós-newtonianos (PPN) β e γ possuem o mesmo valor que em

RG [Beke04], a saber: β = γ = 1;

• Se φ > 0, as perturbações nos campos tensorial, vetorial, e escalar se propagam

subluminalmente em relação à métrica na moldura da matéria, pelo menos

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CAPÍTULO 3. A TEORIA TEVES DE BEKENSTEIN E SANDERS 64

quando considerados uma a uma independentemente e quando a propagação

se dá em um fundo cosmológico ou quiescente [Beke04];

• A condição φ > 0 é consistente, isto é, sob certas condições iniciais ela se

preserva durante toda a evolução do universo [Beke04];

• O campo vetorial Aµ, introduzido na teoria para gerar um lenteamento gravita-

cional acentuado, gera instabilidades nas perturbações da matéria e pode au-

mentar a taxa de formação de estruturas na mesma proporção que

ΛCDM [Dode06];

• Os dados do espectro de potência da matéria e do espectro angular de potência

da RCF podem ser satisfeitos, mas no caso da V (µ) dada por (3.22) isto

implica a necessidade de neutrinos com massas próximas a 2 eV [Skor06a]

(vide gura 3.7);

• TeVeS pode ser reescrita como caso particular da teoria vetorial-tensorial ro-

tulada de Einstein-Éter [Jaco01] ao se abrir mão da unitariedade do campo

vetorial e se impor que gµνAµAν = −e−2φ [Zlos06].

3.3 O Limite Axissimétrico de Campo Fraco no Vácuo

Nesta seção apresentaremos alguns resultados muito preliminares de um estudo

em andamento sobre o efeito de lentes gravitacionais provenientes de sistemas com

distribuição de matéria com simetria axial. Uma ênfase especial será dada ao Aglom-

erado da Bala (1E 0657-56), já mencionado na Introdução. Este sistema não possui

simetria esférica, mas acredita-se que um modelo axissimétrico possa fornecer uma

boa aproximação.

O Aglomerado da Bala é ocasionalmente aclamado como uma evidência direta

de matéria escura e como prova em contrário das teorias do tipo MoND [Clow06a,

Clow06b]. O argumento é, no entanto, vago, e pode ser transcrito na forma a seguir:

1. A maior parte da matéria bariônica deste sistema encontra-se em uma dis-

tribuição concentrada, enquanto os mapas de isodensidade provenientes do

efeito de lentes gravitacionais demonstram a existência de dois picos de densi-

dade deslocados do centro onde estão os bárions;

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3.3. O LIMITE AXISSIMÉTRICO DE CAMPO FRACO NO VÁCUO 65

Figura 3.7: O espectro angular de potência da RCF (em cima) e o espectro depotência da matéria bariônica (em baixo) para: (i) um universo do tipo MoND comΩΛ = 0, 78 ,Ωneutr = 0, 17 e Ωb = 0, 05 (curva sólida); (ii) um universo do tipoMoND com ΩΛ = 0, 95 e Ωb = 0, 05 (curva tracejada); (iii) o modelo ΛCDM (curvapontilhada). Adicionou-se também uma coleção de pontos de experimentos de RCFe do SDSS. Figura retirada de [Skor06a].

2. Teorias relativísticas de MoND assumem como única fonte para os campos

gravitacionais os bárions;

3. Logo, é de se esperar que os desvios de geodésicas mais signicativos aconteçam

próximos à matéria bariônica;

4. A observação de picos de densidade no ângulo de desvio dos fótons separa-

dos espacialmente do pico de densidade de matéria bariônica descarta estes

modelos.

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CAPÍTULO 3. A TEORIA TEVES DE BEKENSTEIN E SANDERS 66

De fato, o Aglomerado da Bala está em ótimo acordo com a teoria de halos de

ME. Entretanto, teorias como TeVeS introduzem graus de liberdade adicionais aos

campos gravitacionais e, portanto, a modicação em relação à RG não se dá apenas

pela presença de fontes gravitacionais adicionais. Um estudo mais detalhado da

inuência dos campos escalar e vetorial é necessária.

Efetuaremos uma análise perturbativa até primeira ordem em um parâmetro

de pequenez arbitrário ε, e suporemos que a métrica seja estática e axissimétrica,

portanto assumindo a seguinte forma:

gµνdxµdxν = −[1 + 2εPt(ρ, z)]dt

2 + [1 + 2εPρ(ρ, z)]dρ2+

+ [1 + 2εPz(ρ, z)]dz2 + [1− 2εPt(ρ, z)] ρ

2 dφ2 + O(ε2).(3.48)

Observe que é necessário escrever o termo em dφ2 não apenas como ρ2 mas como

ρ2[1− 2εPt(ρ, z)], conforme feito para a métrica de Weyl (ou, em particular, para a

chamada métrica-γ). Além do mais, termos cruzados em dtdφ devem apenas apare-

cer na presença de um momento angular signicativo do sistema (vide [Wald84],

p.165), o que não é o caso. Em outras palavras, se desprezarmos a dependência

temporal, teremos uma métrica estática e não o caso mais geral, estacionário.

O vínculo de unitariedade determina a componente temporal de Aµ (a menos de

um sinal), e podemos escrever as componentes do campo vetorial na forma

Aµdxµ = [1 + εPt(ρ, z)]dt+ [εVρ(ρ, z)]dρ+ [εVz(ρ, z)]dz +O(ε2). (3.49)

Finalmente, vamos supor também que φ seja uma quantidade em primeira ordem

em ε, isto é

φ = εQ+O(ε2). (3.50)

Com o Aglomerado da Bala em mente, algumas perguntas são pertinentes:

1. As regiões responsáveis pelo efeito de lenteamento fraco medido em [Brad06]

são em parte exteriores e em parte interiores aos aglomerados. Desta forma,

o quão apropriado é utilizar as equações de vácuo neste caso?

2. Quão distante estamos de uma métrica de Minkowski nas regiões de interesse?

3. Os campos escalar e vetorial, assim como Pt, Pρ e Pz, são pequenos em

mesma ordem em ε?

4. Quais as possíveis explicações para o separação espacial entre os picos de

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3.3. O LIMITE AXISSIMÉTRICO DE CAMPO FRACO NO VÁCUO 67

isodensidade, inferidos por lenteamento, e o pico de densidade da distribuição

de gás, inferido por medidas em raios-X?

A primeira pergunta não possui resposta simples, anal uma parcela consi-

derável dos fótons cujas geodésicas são apreciavelmente desviadas atravessa as regiões

de maior densidade do gás. O segundo item, por outro lado, é bem menos capcioso.

Como uma primeira estimativa, calcula-se o termo de Schwarzschild, 2GM/r, com

base no modelo de concordância de ΛCDM. Um limite superior pode ser obtido,

neste caso, válido inclusive dentro dos aglomerados (vide a gura 5 em [Brad06]):

2GM(r)/r . 1, 3 × 10−4, pequeno o suciente para justicar a aproximação de

campo fraco. A terceira questão será tratada como uma mera hipótese de trabalho.

A última questão, por sua vez, permite duas especulações distintas:

• Uma possibilidade seria que a conexão, possivelmente devido à inuência

das componentes espaciais de Aµ, imporia algum comportamento estranho

ao efeito de lentes gravitacionais, mimetizando uma separação espacial entre

os picos;

• Outra possibilidade é que a maior parte da densidade de energia do campo

escalar e vetorial estejam situadas ao redor das galáxias e não do gás. Esta

abordagem seria provavelmente apenas justicável se permitíssemos alguma

dependência temporal nas equações, pois isto poderia justicar tal congu-

ração. Por exemplo, uma distribuição dos campos que possuísse originalmente

simetria esférica poderia ser perturbada pela colisão e se defasar em relação

ao gás (ou seja, seguir as galáxias).

Com a primeira hipótese, aparentemente mais simples, supomos uma métrica es-

tática e tentamos resolver as equações de campo no vácuo. Se preciso, poderíamos

inicialmente desprezar contribuições MoNDianas (termos em KB) e resolver itera-

tivamente: resolver primeiro para Pt, Pρ, Pz em RG e colocar esta solução nas

equações para o campo escalar e vetorial.

Entretanto, para levar a cabo esta abordagem é preciso determinar condições

de contorno internas para a métrica, o que não é uma tarefa trivial. Supor que

a métrica seja assintoticamente plana não é suciente, pois neste caso estaríamos

supondo tacitamente que as equações de vácuo são válidas em todo o espaço, o que

não é verdade. Tal condição de contorno poderia ter um formato arbitrário (esfera,

elipse, etc.), mas seria difícil de ser justicada sem se obter a solução interna, onde

há matéria. Ainda assim, mesmo que se resolvam estas questões, este caminho não

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CAPÍTULO 3. A TEORIA TEVES DE BEKENSTEIN E SANDERS 68

é muito promissor como correção ao lenteamento; a equação de campo de φ não

depende de Pt, Pρ ou Pz e todas componentes da conexão que dependem do campo

vetorial o fazem apenas em O(ε3).

De todos modos, é interessante deduzir as equações de campo no vácuo neste

limite de campo fraco, mesmo que apenas para obter uma melhor intuição física da

teoria.

3.3.1 Equações de campo no vácuo para Gµν, Aµ e φ

componente Gtt

2

ρ∂ρPt + ∂2

ρPt + ∂2zPt +

1

ρ∂ρPρ − ∂2

zPρ −1

ρ∂ρPz − ∂2

ρPz = KB

[1

ρ∂ρPt + ∂2

ρPt + ∂2zPtz

](3.51)

componente Gρρ

∂ρ(Pt + Pz) = 0 +O(ε) (3.52)

componente Gzz

∂ρ(Pt + Pρ) = 0 +O(ε) (3.53)

componente Gφφ

∂2ρ(Pt + Pz) + ∂2

z (Pt + Pρ) = 0 +O(ε) (3.54)

componente Gρz

∂z(Pt + Pz) = 0 +O(ε) (3.55)

Manipulando as equações (3.52-3.54) e combinando os resultados com (3.51),

chegamos a um resultado notável: as equações desacoplam e a relação entre as

diferentes funções da métrica se torna trivial. Ademais, concluímos que a única

equação que precisa ser resolvida é(1− KB

2

)[1

ρ∂ρPρ + ∂2

zPρ + ∂2ρPρ

]= 0, (3.56)

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3.3. O LIMITE AXISSIMÉTRICO DE CAMPO FRACO NO VÁCUO 69

a qual é completamente independente de KB. Nos deparamos então com o seguinte

sistema de equações que precisamos resolver:ρ−1∂ρPρ + ∂2

ρPρ + ∂2zPρ = 0 ,

Pt = −Pρ + C2 z ,

Pz = Pρ + C1 − C2 z .

(3.57)

Note que a primeira equação é simplesmente a equação de Laplace em duas di-

mensões (que possui solução muito bem conhecida), enquanto as últimas duas são

meras relações triviais entre Pt, Pρ e Pz. Finalmente, C1 e C2 são denidos pelas

condições de contorno, e isto implica C2 = 0. De fato, é possível mostrar que o uso

de argumentos análogos aos utilizados em RG [Wald84] nos permite impor também

C1 = 0.

Demonstramos portanto que no vácuo e no limite de campo fraco em TeVeS,

a métrica gravitacional satisfaz as mesmas equações que em RG. Isto nos auxilia

a esclarecer a questão do caso particular de simetria esférica. Ingenuamente, da

solução de Schwarzschild escrita em coordenadas cilíndricas, esperaríamos encontrar

termos em dρdz, o qual não incluímos em nossa expansão da métrica. O fato é

que nestas coordenadas, assim como em RG, não podemos associar as simetrias na

métrica diretamente às simetrias na distribuição de matéria. Em particular, para se

obter simetria esférica, é necessário escolher Pρ para ser o potencial de um bastão

nito alinhado ao eixo-z e centrado na origem (vide [Wald84], p. 170-1).

Uma interpretação mais profunda deste resultado está em andamento. Por com-

pletude, vamos listar abaixo as demais equações de TeVeS no limite em questão.

componente Aρ

−∂2zVρ + ∂zρVz = 0 +O(ε) (3.58)

componente Az

∂zρVρ − ∂2ρVz +

1

ρ∂zVρ −

1

ρ∂ρVz = 0 +O(ε) (3.59)

Computando (3.30) e descartando termos de ordem superior, obtemos

χ = ε2 [ (∂ρQ)2 + (∂zQ)2 ] +O(ε3) (3.60)

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CAPÍTULO 3. A TEORIA TEVES DE BEKENSTEIN E SANDERS 70

e

µ′(χ)

[∂ρX∂ρQ+ ∂zX∂zQ

]+ µ(χ)

[∂2ρQ+

1

ρ∂ρQ+ ∂2

zQ

]= 0 +O

(µ(χ) ε

), (3.61)

em que usamos apóstrofes para designar derivadas com respeito a χ. Usando a

relação de vínculo (3.20), as equações acima podem ser reescritas como

∂ρ [(lnF )′] ∂ρQ+ ∂z [(lnF )′] ∂zQ+ ∂2ρQ+

1

ρ∂ρQ+ ∂2

zQ = 0 +O(F ′(χ) ε

). (3.62)

Note que sempre que F (χ) for tal que não tenhamos F ′/F ′′ = O(χ) = O(ε2), (3.62)

pode ser simplicada ainda mais

∂2ρQ+

1

ρ∂ρQ+ ∂2

zQ = 0 +O(F ′(χ) ε

), (3.63)

uma vez mais, a equação de Laplace. A equação acima é, entretanto, inválida no

regime MoNDiano profundo, onde espera-se µ(χ) ∼ µ0√χ. De fato, a sugestão

original para a função V (µ), dada por (3.22), não resulta em F ′/F ′′ = O(χ), o que

nos obriga a usarmos (3.62).

3.3.2 Comentários gerais

Embora o estudo aqui apresentado esteja incompleto, alguns resultados interes-

santes foram obtidos. Em primeiro lugar, as equações de campo fraco no vácuo se

mostraram muito mais simples do que se podia supor partindo das equações comple-

tas. A equação de Laplace é uma das mais estudadas na física, e possui propriedades

muito bem conhecidas. Em segundo lugar, uma métrica axissimétrica no limite de

campo fraco em TeVeS fornece uma conexão Γαµν que depende muito fracamente no

campo φ e nas componentes espaciais de Aµ, o que gera uma grande diculdade em

se explicar o desvio espacial observado entre os picos de densidade provenientes de

lentes gravitacionais e de emissões em raios-X sem o uso de matéria escura.

Nos capítulos seguintes, as questões da origem física da matéria escura e da

pertinência de um regime MoNDiano serão deixadas em segundo plano e abordar-se-

ão os problemas teóricos envolvendo a energia escura, assim como possíveis soluções

provenientes de uma interação entre estas duas componentes escuras do universo.

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Capítulo 4

Interações Escuras por Campo

Escalar

Conforme mencionamos no capítulo 1, modelos com campo escalar e potencial

exponencial possuem soluções escaláveis aceleradas, mas não estão de acordo com as

observações por não possuir uma fase dominada pela matéria. O fato de o modelo

mais simples não funcionar é motivação para se olhar mais a fundo. Uma gener-

alização da lagrangiana do campo escalar é a lagrangiana de k-essência que é uma

função p(X,ϕ) do campo ϕ e de seu termo cinético X = −(1/2)gµν∂µϕ ∂νϕ. Esta

forma é relativamente simples, resulta ainda em equações de segunda ordem no

campo e já foi estudada diversas vezes [Chib00, Arme00]. É importante notar, no

entanto, que uma lagrangiana com termo cinético não-canônico pode resultar em

alguns problemas sérios, como propagação superluminal de perturbações ou insta-

bilidades quânticas. Nosso estudo aqui é todavia mais geral e deve ser entendido

como um levantamento preliminar de classes de lagrangianas que possuem o compor-

tamento desejado. Uma vez estabelecida as condições necessárias para a ocorrência

de um regime escalável, uma segunda investigação seria necessária para analisar

potenciais complicações como as listadas acima. Contudo, como concluiremos, a

exigência de dois regimes escaláveis já será suciente para descartar uma grande

classe de lagrangianas.

Note ainda que lagrangianas escritas na forma acima abrangem uma gama di-

versa de modelos de EE tais como quintessência, táquions [Gibb02, Padm02], fan-

tasmas (em inglês, phantoms) [Cald02] e condensados (dilatônicos) fantasmas (em

inglês, ghost condensates) [Hame04, Piaz04]. Quando ∂p/∂X < 0, foi mostrado que

um comportamento fantasma (wEE < −1) ocorre [Gumj05, Tsuj05, Amen06b] e a

71

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CAPÍTULO 4. INTERAÇÕES ESCURAS POR CAMPO ESCALAR 72

matéria sente uma força repulsiva escalar [Amen04a]. Ademais, mostrou-se que se

o sistema contiver uma solução escalável então p pode ser escrito na forma [Piaz04,

Tsuj04]

p(X,ϕ) = Xg(Y ) , (4.1)

em que g(Y ) é uma função qualquer do argumento Y = Xeλϕ, em que λ é uma

constante. Por exemplo, g(Y ) = 1 − c/Y é de fato a lagrangiana padrão com

potencial exponencial (p = X − ce−λϕ). Mostrou-se que a forma acima para p é

válida para EE dasacoplada e para o caso no qual o acoplamento com MEF

Q ≡ −1

ρc√−gM

δSmδϕ

, (4.2)

é uma constante (aqui Sm é a ação da matéria e gM o determinante da métrica).

Neste capítulo vamos realizar a busca por uma boa cosmologia escalável em três

passos. Primeiro, será mostrado na seção 4.1 que a lagrangiana (4.1) se estende

também para o caso de acoplamento variável Q(ϕ) a menos de uma redenição

do campo. Isto é um resultado interessante em si pois unica alguns resultados

esporádicos na literatura (por exemplo, [Wei05]). Em seguida, nas seções 4.2 e 4.3,

supondo como um modelo para g o polinômio

g =∑n

cnY−n , (4.3)

com potências tanto negativas como positivas de n, encontrar-se-ão os pontos críti-

cos (igualmente denominados pontos xos) do sistema. Finalmente, na seção 4.4

mostrar-se-á que dentro desta classe de modelos não há maneira de se obter uma

seqüência de fase dominada pela matéria seguida por uma solução acelerada estável.

Quando uma EDM escalável cinética (denida abaixo) existe, este estágio é de modo

geral seguido por uma solução dominada pelo campo escalar (Ωϕ = 1) ao invés de

um atrator acelerado escalável. Embora nossa prova de ausência de dois regimes

escaláveis não se estenda para quaisquer possíveis g, acreditamos que isto solapa

fortemente a possibilidade de se realizar tal cosmologia ideal. Este resultado ne-

gativo lança um desao: há algum caso em que uma seqüência bem sucedida pode

se realizar? Na seção nal comentaremos sobre a possibilidade de se obter essa boa

cosmologia escalável com uma lagrangiana de potência fracionária g = c0 − c Y −u,na qual 0 < u < 1. Em todo caso, deixamos um estudo completo deste (quiçá assaz

exótico) caso para um trabalho futuro.

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73

Antes de passarmos ao cálculos propriamente ditos, devemos escrever uma nota

sobre os vínculos gravitacionais locais em forças escalares. Em princípio, o acopla-

mento que introduzimos é severamente vinculado por experimentos locais de gravi-

dade em teorias escalar-tensoriais. Entretanto, estes podem ser evadidos em pelo

menos três maneiras. Primeiro, engendrando-se um potencial com grande massa e,

conseqüentemente, uma interação de curto alcance [Mota04, Khou04]. Segundo,

construindo-se um modelo que satisfaz os vínculos agora, mas não no passado.

Terceiro, supondo-se que os bárions estão de fato desacoplados do campo

escalar [Amen00]. As duas primeiras soluções mudam a forma do potencial e afe-

tam a evolução global e em geral não satisfarão os requisitos para uma cosmologia

que solucione o PC. O terceiro caso, em contrapartida, pode ser implementado sem

afetar o potencial do campo escalar.

De forma geral, uma componente de bárions pode dominar no passado, mesmo

que sua abundância agora seja muito pequena [Tocc02]. Neste caso, por denição

uma fase dominada pela matéria existe, mas é uma EDM bariônica ao invés de uma

dominada pela ME. Isto em si suscita vários problemas. Por exemplo, as pertur-

bações bariônicas são quase apagadas em pequenas escalas devido ao acoplamento

com a radiação e portanto, sem o apoio da ME, dicilmente cresceriam até as am-

plitudes observadas. Ademais a era bariônica acabaria cedo no passado, em desvios

para o vermelho superiores a 1 e o subseqüente regime acelerado seria longo de-

mais para estar em boa concordância com as observações de supernovas (embora

a discrepância aqui seja marginal, cf. [Amen04b]) e com o efeito Sachs-Wolfe inte-

grado [Tocc02]. Em todo o caso, se uma fase padrão dominada pela matéria (escura)

existe, os bárions nunca dominariam, como argumentaremos adiante (entretanto vide

a seção 5.6). Assim a busca por uma boa cosmologia escalável permite negligen-

ciar a pequena componente bariônica, e isto é o que será feito no presente capítulo

(no capítulo 5, no entanto, seremos mais gerais e resgataremos esta componente).

Finalmente, uma vez que as duas componentes materiais possuem diferentes acopla-

mentos, é necessário escolher a moldura física na qual os bárions são conservados

(do contrário as massas das partículas variariam com o tempo) mas na qual a ME

não o é. Trabalharemos portanto nesta moldura, chamada moldura de Einstein (em

inglês, Einstein Frame).

Como mencionamos anteriormente, vamos abordar o PC exigindo uma cosmolo-

gia duo-escalável. Procuramos modelos cujo espaço de fase exiba (ao menos) dois

pontos xos. Um responsável pela era dominada pela matéria (doravante EDM)

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CAPÍTULO 4. INTERAÇÕES ESCURAS POR CAMPO ESCALAR 74

e outro responsável pela presente aceleração dominada pela EE. O primeiro deles

precisa ser um ponto de sela e o segundo (preferencialmente) um atrator. O PC

poderia ser solucionado por um modelo no qual o presente universo alcançou (pelo

que queremos dizer que está perto o suciente para um dado critério) tal atrator

acelerado, uma vez que isto signicaria que a atual distribuição cósmica de energia

não seria uma fase transiente e sim um inevitável regime permanente.

Além de ser um método para se atacar o PC, cosmologias escaláveis também nos

fornecem uma alternativa útil aos cenários padrão de EE. O comportamento da cos-

mologia de fundo e de suas perturbações lineares são de fato substancialmente dife-

rentes nestes modelos escaláveis com respeito à maioria dos outros modelos. Vamos

mencionar três diferenças básicas (veja por exemplo [Tocc02, Amen04b, Amen07b]).

Primeiro, em uma cosmologia escalável a aceleração poderia começar em uma época

distinta no passado. Segundo, as perturbações podem continuar a crescer mesmo

durante o regime acelerado. Terceiro, a quantidade de EE não necessariamente

torna-se desprezível em altos desvios para o vermelho. Todas três características

distinguem radicalmente cosmologias escaláveis de modelos usuais de EE que focam

apenas na própria EE e não na sua relação com a matéria. Desta forma, modelos

escaláveis podem ser um campo de testes útil para observações.

Este capítulo está em sua essência contido no artigo [Amen06a].

4.1 A Lagrangiana Geral para Soluções Escaláveis

com Acoplamento Arbitrário

Nós iremos encontrar aqui a forma geral de uma lagrangiana que admite soluções

escaláveis para o caso em que o acoplamento entre energia escura e matéria escura

depende do campo ϕ. Isto é a generalização dos trabalhos [Piaz04, Tsuj04]. Vamos

começar por considerar a seguinte ação, escrita na moldura de Einstein:

S =

∫d4x√−gM

[M2

P

2R + p(X,ϕ)

]+ Sm[ϕ, ψi, gµν ], (4.4)

em que MP é a massa de Planck reduzida, R é o escalar de Ricci, ϕ um campo

escalar com termo cinético dado por X = −(1/2)gµν∂µϕ ∂νϕ e ψi são os vários

campos de matéria. O valor p(X,ϕ) da função arbitrária p corresponde à pressão

associada ao campo escalar, o que motiva o uso da letra p em detrimento de L para

designar a lagrangiana do campo. Note que permitimos um acoplamento arbitrário

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4.1. A LAGRANGIANAGERAL PARA SOLUÇÕES ESCALÁVEIS COMACOPLAMENTOARBITRÁRIO 75

entre os campos de matéria e o campo escalar ϕ. Conforme mencionado acima, de

modo a dar conta das observações atuais, nós supusemos que o campo ϕ só se acopla

à matéria escura. Neste capítulo, nós iremos igualmente supor que a componente

de ME domina sobre todas as demais formas de matéria. De modo a aumentar a

generalidade dos resultados, nesta seção vamos permitir que seja wc 6= 0. Nas seções

subseqüentes, retomaremos à convenção wc = 0.

Nosso interesse reside em soluções escaláveis em uma métrica de fundo Friedmann-

Lemaître-Robertson-Walker (FLRW) chata (isto é, sem tri-curvatura) com fator de

escala a(t) (conforme (2.1)):

ds2 = −dt2 + a2(t)dx2. (4.5)

A equação de Friedmann na gravidade de Einstein, equação (2.6), ca escrita como

3H2 = M−2P ρtot , (4.6)

em que M−2P = 8πG com G representando a constante gravitacional e ρtot a densi-

dade de energia total do universo. No que se segue iremos xar MP = 1.

Nosso foco será em soluções cujo parâmetro da equação de estado

wϕ ≡ p(X,ϕ)/ρϕ seja uma constante no regime escalável e para as quais o uni-

verso está preenchido por apenas duas componentes: um uido barotrópico (tal

que wc ≡ pc/ρc) e um campo escalar ϕ. Reescrevendo a equação de Klein-Gordon

para o campo ϕ na métrica (4.5) acima em termos de sua densidade de energia,

ρϕ = 2X∂p/∂X − p, chega-se a [Piaz04]

dρϕdN

+ 3(1 + wϕ)ρϕ = −QρcdϕdN

, (4.7)

em que N ≡ ln a e Q são denidos pela equação (4.2).

Por outro lado, se usássemos como ponto de partida teorias escalar-tensoriais

[Fara04] ou um cenário onde os neutrinos variam sua massa, em vez da equação acima

teríamosdρϕdN

+ 3(1 + wϕ)ρϕ = −Q(1− 3wc)ρcdϕdN

. (4.8)

Este caso se reduz à equação (4.7) ao se relacionar o acoplamento Q ao acoplamento

Q por Q(1− 3wc) = Q. No que se segue iremos obter as condições para a existência

de soluções escaláveis utilizando a equação (4.7). Note que a densidade de energia

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CAPÍTULO 4. INTERAÇÕES ESCURAS POR CAMPO ESCALAR 76

de um uido barotrópico satisfaz

dρcdN

+ 3(1 + wc)ρc = QρcdϕdN

. (4.9)

Denir-se-ão os parâmetros de densidade de ρϕ e ρc como

Ωϕ ≡ρϕ

3H2, Ωc ≡

ρc3H2

. (4.10)

Estas satisfazem Ωϕ + Ωc = 1 devido à equação (4.6). Soluções escaláveis são

caracterizadas pela condição ρϕ/ρc = const, para a qual se tem que Ωϕ é constante.

Usando estas relações, junto com as equações (4.7) e (4.9), e seguindo o procedimento

das referências [Piaz04, Tsuj04] mas descartando a hipótese do acoplamento Q(ϕ)

ser uma constante, encontram-se as relações

d ln pϕdN

=d ln ρϕdN

=d ln ρcdN

= −3(1 + wef) , (4.11)

edϕdN

=3Ωϕ

Q(ϕ)(wc − wϕ) ∝ 1

Q(ϕ), (4.12)

em que a quantidade efetiva wef , denida em (2.20), é dada neste caso por:

wef = wcΩc + wϕΩϕ. (4.13)

Destas equações e da denição de X, chega-se a

2X = H2

(dϕdN

)2

∝ ρϕQ2

∝ p(X,ϕ)

Q2, (4.14)

e logod lnX

dN= −3(1 + wef)− 2

d lnQ

dN. (4.15)

Fazendo uso das equações (4.11), (4.12) e (4.15) chega-se à seguinte equação mestra

generalizada para a forma funcional da lagrangiana p(X,ϕ):[1 +

2

λQ2

dQ(ϕ)

]∂ ln p

∂ lnX− 1

λQ

∂ ln p

∂ϕ= 1, (4.16)

em que

λ ≡ 1 + wc − Ωϕ(wc − wϕ)

Ωϕ(wc − wϕ). (4.17)

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4.1. A LAGRANGIANAGERAL PARA SOLUÇÕES ESCALÁVEIS COMACOPLAMENTOARBITRÁRIO 77

A equação (4.16) se reduz à encontrada em [Piaz04] quando Q(ϕ) é uma constante.

Solucionando-se (4.16) obtém-se:

p(X,ϕ) = XQ2(ϕ) g(XQ2(ϕ) eλψ(ϕ)

), (4.18)

em que g é uma função arbitrária e

ψ(ϕ) ≡∫ ϕ

Q(ξ)dξ. (4.19)

Os cálculos para a obtenção da equação (4.18) encontram-se no apêndice A. No

caso de um acoplamento constante ambos termos Q2 na (4.18) podem ser absorvi-

dos na denição de g, de modo que nossa solução reduz-se à obtida em [Piaz04].

Trocando em miúdos, o que a equação (4.18) signica é que qualquer lagrangiana

que permita soluções escaláveis com wϕ constante pode sempre ser posta na forma

acima por uma conveniente redenição do campo. O caso cinético padrão corres-

ponde portanto a p = XQ2 − e−λψ. Outro exemplo é dado pelo acoplamento

Q = 1/ϕ, conforme [Wei05]; pelo uso de (4.19) encontra-se que o termo eλψ na

equação (4.18) é dado por eλψ = ϕλ. Neste caso, a lagrangiana (4.18) assume a

forma p = Xg(Xϕλ−2)/ϕ2. Quando λ = 2 isto se simplica para p = g(X)/ϕ2, em

que g(X) ≡ Xg(X) é uma função arbitrária de X. Esta forma de p corresponde à

escolha feita em [Wei05].

Façamos agora a seguinte redenição de campo: ϕ→ ψ(ϕ), com ψ(ϕ) conforme

denido em (4.19). Isto por sua vez implica X → Xψ = X Q2(ϕ), e a equação (4.18)

ca escrita como

p(Xψ, ψ) = Xψ g(Xψ e

λψ), (4.20)

a qual possui a mesma forma funcional no cenário de acoplamento constante [Piaz04].

Ao mesmo tempo, a relação entre a ação Sc e o acoplamento assume a forma

1 =−1

ρc√−gM

δScδψ

. (4.21)

Mostramos portanto que o caso de um acoplamento constante (Q = 1) é de fato o

mais geral. Em outras palavras, se estivermos interessados em soluções escaláveis,

não importa qual o tipo de interação escura se postule inicialmente; podemos sempre

trabalhar com a lagrangiana na forma acima.

Visando seguir a notação corrente na literatura (por exemplo [Piaz04, Tsuj04])

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CAPÍTULO 4. INTERAÇÕES ESCURAS POR CAMPO ESCALAR 78

utilizar-se-á, em vez de ψ, o campo ϕ(ψ) denido por ϕ(ψ) ≡ ψ/Q, em que Q é

uma constante. Neste caso, pode-se absorver o termo Q que aparece na exponencial

do argumento de g na denição de λ. Assim, no que sucede considerar-se-á sempre

a densidade lagrangiana (descartando as barras em Q e ϕ)

p = X g(Xeλϕ) , (4.22)

em que agora λ é dado por

λ ≡ Q1 + wc − Ωϕ(wc − wϕ)

Ωϕ(wc − wϕ). (4.23)

É importante neste ponto dar-se conta que o sistema é invariante sob mudanças

simultâneas do sinal de Q e λ. Pode-se portanto, sem perda de generalidade,

considerar-se apenas o caso λ > 0.

No apêndice B generalizamos os resultados acima para um fundo cosmológico

mais geral, no qual (4.6) é substituída por H2 ∝ ρqT. Nas seções subseqüentes,

entretanto, nos limitaremos a uma análise no contexto da Relatividade Geral (q = 1).

4.2 Equações do Espaço de Fase

Até o momento obtivemos a lagrangiana mais geral que possui soluções es-

caláveis. Mas em adição a este tipo de solução existem outros pontos xos para

o sistema (4.22) caracterizados por Ωϕ = 1. No que se segue, iremos encontrar as

equações autônomas levando-se em consideração a radiação de modo a encontrar o

comportamento geral das soluções. Conforme mencionado no capítulo 1, visando

resolver o PC estamos interessados na busca por uma boa cosmologia escalável, a

saber uma seqüência composta por uma era da radiação, uma era dominada pela

matéria e uma solução acelerada atratora.

Diversos resultados a serem obtidos serão válidos para quaisquer g. Entretanto,

conduziremos nossa busca supondo como modelo de referência uma expansão poli-

nomial1 em potências inteiras positivas e negativas:

g(Y ) = c0 +∑n>0

cnY−n +

∑n′<0

cn′Y −n′, (4.24)

1Um polinômio, por denição, não admite potências negativas.

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4.2. EQUAÇÕES DO ESPAÇO DE FASE 79

em que c0, cn e cn′ são constantes. Note que caso tenhamos c0 = 1 e todos os demais

cn, exceto c1, iguais a zero, nosso caso se reduz ao de um campo escalar ordinário

com um potencial exponencial [Cope98].

Para a densidade lagrangiana (4.22) na presença de poeira (pressão nula) e ra-

diação obtém-se as seguintes equações (lembrando que desta seção em diante re-

tomamos a convenção wc = 0)

3H2 = X(g + 2g1) + ρc + ρrad , (4.25)

2H = −[2X(g + g1) + ρc +

4

3ρrad

], (4.26)

ϕ+ 3AH(g + g1)ϕ+ λX[1− A(g + 2g1)] + AQρc = 0, (4.27)

em que A ≡ (g + 5g1 + 2g2)−1 e

gn ≡ Y n ∂ng/∂Y n. (4.28)

A velocidade do som, cs, é relacionada à quantidade A por [Piaz04, Tsuj06]

c2s = A (g + g1) . (4.29)

Quando A−1 = 0 a velocidade do som diverge. Logo, nenhuma evolução sicamente

aceitável pode cruzar a barreira A−1 = 0.

Para estudar-se a dinâmica do sistema acima é conveniente introduzir as seguintes

quantidades adimensionais:

x =ϕ√6H

, y =e−λϕ/2√

3H, z =

√ρrad√3H

. (4.30)

Assim Y é escrito como Y = x2/y2. A equação (4.25) implica o seguinte vínculo:

Ωc ≡ρc

3H2= 1− Ωϕ − z2 , (4.31)

em que

Ωϕ = x2(g + 2g1) . (4.32)

É importante notar que, em princípio, Ωϕ poderia muito bem ser negativo. De (4.26)

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CAPÍTULO 4. INTERAÇÕES ESCURAS POR CAMPO ESCALAR 80

encontra-se que

1

H

dHdN

= −1

2(3 + 3gx2 + z2) . (4.33)

Usando (4.27), (4.31) e (4.33), obtém-se o sistema autônomo

dxdN

=3

2x

[1 + gx2 − 2A (g + g1) +

1

3z2

]+

+

√6

2

[A (Q+ λ)(g + 2g1)x2 − λx2 +QA (z2 − 1)

], (4.34)

dydN

=y

2

(3−√

6λx+ 3gx2 + z2), (4.35)

dzdN

=z

2

(−1 + 3gx2 + z2

). (4.36)

É útil explicitar as relações

ρϕ = X(g + 2g1), wϕ =g

g + 2g1

, (4.37)

e também

wϕ = −1 +2x2

Ωϕ

(g + g1) , Ωϕwϕ = gx2 . (4.38)

Isto signica que wϕ > −1 para g+ g1 > 0 e wϕ < −1 para g+ g1 < 0. De (4.33),

o parâmetro da equação de estado efetiva do sistema é dado por

wef = −1− 2

3

H

H2= gx2 +

1

3z2 . (4.39)

Logo, na ausência de radiação (z = 0), tem-se wef = Ωϕwϕ [ver equação (4.38)].

4.3 Pontos Fixos

Nesta seção iremos obter os pontos críticos do sistema autônomo acima na ausên-

cia de radiação (z = 0). Os pontos xos para z 6= 0 são irrelevantes para o nosso

estudo neste capítulo. Eles estão listados, por completeza, na subseção 4.3.5. Os

pontos críticos para z = 0 são calculados fazendo-se dx/dN = 0 e dy/dN = 0

na (4.34) e (4.35). De (4.35) encontram-se duas classes distintas de soluções, tanto

para 3−√

6λx+3gx2 = 0 como para y = 0. O primeiro caso fornece tanto soluções

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4.3. PONTOS FIXOS 81

dominadas pelo campo escalar como soluções escaláveis [Tsuj06]. De fato, neste caso

tem-se

x =

√6(1 + wϕΩϕ)

2λ, (4.40)

e, inserindo esta última na (4.34), encontram-se dois casos:

• Ponto A: uma solução dominada pelo campo escalar com

Ωϕ = 1 . (4.41)

• Ponto B: uma solução escalável com

Ωϕ = − Q

wϕ(Q+ λ). (4.42)

Lembramos ao leitor que, por denição, uma solução escalável corresponde a uma

situação para a qual Ωϕ não é igual a 1 nem 0.

Discutir-se-ão as propriedades dos pontos A e B nas subseções 4.3.1 e 4.3.2,

respectivamente. Na subseção 4.3.3 tratar-se-á da segunda classe de soluções, na

qual y = 0. Uma vez que estas soluções correspondem ao limite de um potencial

nulo2, nós as rotularemos soluções cinéticas.

4.3.1 Ponto A: Soluções dominadas pelo campo escalar

Quando Ωϕ = 1, temos as seguintes relações

g(YA) =

√6λxA − 3

3x2A

, g1(YA) =6−√

6λxA6x2

A

. (4.43)

Especicando o modelo g(Y ) obtém-se YA e o ponto xo (xA, yA) pelo uso de (4.43)

e da relação Y = x2/y2. De (4.38) encontra-se

wef = wϕ = −1 +

√6λ

3xA . (4.44)

A lagrangiana geral poderia ter em princípio diversos pontos nesta classe A. O

número de tais pontos críticos é encontrado resolvendo-se a equação (4.43).

2Por (4.22), vê-se que neste caso p ∝ X.

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CAPÍTULO 4. INTERAÇÕES ESCURAS POR CAMPO ESCALAR 82

A estabilidade dos pontos xos pode ser analisada considerando-se perturbações

lineares ao seu redor. Tal procedimento foi efetuado em [Tsuj06] para uma g(Y )

geral para valores positivos de Q e λ. Os autovalores da matriz de perturbações são

dados por

µ+ = −3 +√

6(Q+ λ)xA , µ− = −3 +

√6

2λxA . (4.45)

O ponto xo será um nó estável quando µ+ < 0 e µ− < 0. Permitindo também

valores negativos de Q, o ponto xo A é estável paraxA <

√6

2(Q+λ), se Q > −λ/2 ,

xA <√

6λ, se − λ < Q ≤ −λ/2 ,

√6

2(Q+λ)< xA <

√6λ, se Q < −λ .

(4.46)

Para xA negativos, o que corresponde (por (4.44)) a uma equação de estado

fantasma (wϕ < −1), as primeiras duas condições na equação (4.46) são auto-

maticamente satisfeitas. Portanto quando Q > −λ, o ponto xo do tipo fan-

tasma é sempre classicamente estável. Por outro lado, a estabilidade dos pontos

não-fantasma (xA > 0) depende dos valores de Q e λ. Uma vez que xA é dado por

xA = λ/[√

6(g+g1)], a condição de estabilidade (4.46) para os pontos não-fantasmas

é expressa como g + g1 > λ(Q+ λ)/3 , se Q > −λ/2 ,g + g1 > λ2/6 , se Q ≤ −λ/2 .

(4.47)

4.3.2 Ponto B: Soluções escaláveis

A solução escalável satisfaz a relação (4.42). Assim, (4.40) fornece

xB =

√6

2(Q+ λ). (4.48)

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4.3. PONTOS FIXOS 83

Obtém-se também as seguintes relações, válidas para todas g(Y )

g(YB) = −2Q(Q+ λ)

3, (4.49)

wef = − Q

Q+ λ, (4.50)

wϕ = − Q(Q+ λ)

Q(Q+ λ) + 3(g + g1), (4.51)

Ωϕ =Q(Q+ λ) + 3(g + g1)

(Q+ λ)2. (4.52)

Novamente, uma vez que a função g é especicada, obtém-se YB e yB = |xB|/√YB

como funções de Q, λ. A condição para uma expansão acelerada corresponde a

wef < −1/3 o que acarreta

Q > λ/2 ou Q < −λ , (4.53)

que uma vez mais é independente da forma de g. Note que o segundo caso corres-

ponde a um modelo do tipo fantasma efetivo (wef < −1) como se conclui de (4.50).

Os autovalores da matriz de perturbação ao redor do ponto xo B são dados por

µ± = ξ1

[1±

√1− ξ2

], (4.54)

em que

ξ1 = −3(2Q+ λ)

4(Q+ λ), ξ2 =

8(1− Ωϕ)(Q+ λ)3[Ωϕ(Q+ λ) +Q]

3(2Q+ λ)2A . (4.55)

Este ponto é estável se ξ1 < 0 e ξ2 > 0. Note que ξ1 negativos correspondem à

Q > −λ/2 ou Q < −λ. Portanto quando a condição para uma aceleração (4.53) é

satisfeita, ξ1 é automaticamente negativo. No que sucede, iremos considerar apenas

a situação realista para a qual a condição de aceleração (4.53) é imposta. Neste

caso, o ponto B é estável se

− Q

Q+ λ≤ Ωϕ < 1 e A > 0 . (4.56)

Pode se mostrar que a segunda condição é sempre satisfeita ao evitarmos as instabil-

idades ultravioletas das utuações quânticas [Piaz04], que de fato não ocorrem em

campos escalares não-fantasmas. De (4.52) a condição −Q/(Q + λ) ≤ Ωϕ corres-

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CAPÍTULO 4. INTERAÇÕES ESCURAS POR CAMPO ESCALAR 84

ponde à −2Q(Q+ λ) ≤ 3(g + g1). Isto é automaticamente satisfeito por um ponto

xo não-fantasma (g + g1 > 0) sob a condição (4.53). A condição crucial para a

estabilidade do ponto B é Ωϕ < 1, ou seja,

g + g1 < λ(Q+ λ)/3 . (4.57)

Para um ponto xo não-fantasma isto não é satisfeito para Q < −λ mas pode

sê-lo para Q > λ/2. Logo, quando Q > λ/2 existem pontos B estáveis, acelerados

e não-fantasmas caso Ωϕ < 1 (cuja condição é um pré-requisito para soluções es-

caláveis viáveis). Note que se Q > λ/2 a condição de estabilidade dada em (4.47)

tem uma desigualdade oposta àquela da equação (4.57). Logo, a estabilidade dos

pontos A e B é dividida pela fronteira g + g1 = λ(Q + λ)/3, o que signica que o

atrator nal é um dos pontos A ou B dependendo dos valores de Q e λ. Quando

uma solução escalável não-fantasma com Q positivo existe na região (4.56), ela será o

único ponto atrator para quaisquer g(Y ), 3 de modo que soluções escaláveis possuem

a propriedade crucial de serem atratores globais.

Como última observação, note que a forma geral de g poderia em princípio exibir

diversas soluções escaláveis, todas com o mesmo xB, g(YB) e wef , mas diferentes yB.

4.3.3 Pontos C e D: Soluções cinéticas

Estudar-se-á agora a segunda classe de soluções de (4.35), isto é, o caso y = 0.

Estes pontos existem apenas se g = g(x2/y2) for não-singular, ou seja, somente se

g puder ser expandida em potências positivas de y2/x2,

g = c0 +∑n>0

cn

(y2

x2

)n, (4.58)

em cujo caso tem-se

gn(y → 0) = 0 (n > 0) . (4.59)

Neste caso a equação (4.34) é dada simplesmente por

dxdN

=1

2

(3c0x+

√6Q)(

x2 − 1

c0

)= 0 . (4.60)

3Uma exceção a esta regra existe no caso de lagrangianas do tipo lei-de-potência fra-cionária (4.67) com 0 < u < 1, para as quais um atrator do tipo fantasma pode co-existir.

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4.3. PONTOS FIXOS 85

Se c0 = 0 esta equação não fornece soluções reais. Por outro lado para c0 6= 0

obtém-se os seguintes pontos xos:

• Ponto C: uma era dominada pela matéria e por ϕ ou EDMϕ (vide [Amen00])

(xC , yC) =

(−√

6Q

3c0

, 0

). (4.61)

Neste caso as equações (4.32) e (4.37) resultam em

Ωϕ =2Q2

3c0

, wef =2Q2

3c0

, wϕ = 1 . (4.62)

Ωϕ e c0 têm, portanto, sempre o mesmo sinal. Quando c0 > 0 a solução é

desacelerada, e o requisito Ωϕ < 1 fornece

|Q| <√

3

2c0 . (4.63)

Note que a EDMϕ também corresponde à mesma classe de soluções escaláveis

que o ponto B. De fato, fazendo-se g(YC) = c0 = −2Q(Q+ λ)/3 em (4.49) e

eliminando λ nas equações (4.50)-(4.52), obtém-se os resultados (4.62). Ade-

mais, observe que para c0 > 0, wef > 0 e, portanto, a densidade de energia da

ME dilui com a−3(1+wef), ou seja, mais rápido que os bárions. Isto garante que

estes últimos nunca dominam no passado. Uma vez que durante a aceleração

os bárions diluem mais rápido que a EE, pode-se tranqüilamente supor que os

bárions nunca contribuíram com uma porção signicativa da energia cósmica.

Para c0 < 0 tal não é necessariamente verdade, mas este caso será descartado

por outros motivos, apresentados mais abaixo.

• Ponto D: soluções puramente cinéticas

(xD, yD) = (±1/√c0, 0) , (4.64)

que existe somente para c0 positivo. Neste caso, tem-se que a matéria está

ausente e

Ωϕ = 1 , wef = 1 , wϕ = 1 . (4.65)

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CAPÍTULO 4. INTERAÇÕES ESCURAS POR CAMPO ESCALAR 86

Consideremos agora perturbações lineares δx e δy em torno do ponto xo cinético

genérico (x, y) = (xk, 0). Neste caso a matriz M2×2 de perturbações [Cope98] é

diagonal e seus autovalores são dados por

µ1 = −3

2+

9

2c0x

2k +√

6Qxk , µ2 =3

2

(1 + c0x

2k −√

6

3λxk

). (4.66)

Logo, para as soluções EDMϕ os autovalores são µ1 = (Q2/c0) − 3/2 e

µ2 = 3/2 + Q(Q + λ)/c0. Se c0 > 0, µ1 é negativo perante a condição (4.63)

enquanto µ2 > 0 para os valores de Q que satisfazem (4.53). Isto mostra que

a EDMϕ corresponde a um ponto de sela para todos os casos relevantes quando

c0 > 0. Se c0 for negativo, ele pode ser um ponto estável se Q(Q+ λ) > 3|c0|/2.No caso de soluções puramente cinéticas (que existem apenas para c0 > 0), tem-

se µ1 = 3 ±√

6/c0Q e µ2 = 3 ∓√

6/c0 λ/2 para xk = ±1/√c0. Assim, para

Q > 0, em ambos os casos ao menos um dos autovalores é positivo, o que signica

que as soluções são ou nós instáveis ou pontos de sela, dependendo dos valores de Q

ou λ. Quando Q < 0, o ponto xk = 1/√c0 é estável se Q < −

√3c0/2 e λ >

√6 c0,

enquanto o ponto xk = −1/√c0 constitui um nó instável.

4.3.4 Resumo dos pontos xos

Na tabela 4.1 encontram-se resumidas as propriedades dos pontos xos para

a densidade lagrangiana (4.20). O ponto xo A, dominado pelo campo escalar,

e a solução escalável B existem para qualquer forma de g contanto que a mesma

satisfaça às condições de existência fornecidas na tabela. Ambos pontos xos podem

ser usados para se obter uma aceleração tardia, uma vez que o parâmetro da equação

de estado efetiva wef pode ser inferior a −1/3 dependendo dos valores de Q e λ. Para

o caso não-fantasma o atrator nal é ou A ou B, novamente dependendo de Q e

λ. A solução escalável B será um atrator global sempre que a condição (4.56) for

satisfeita.

A existência dos pontos cinéticos C e D depende da forma da lagrangiana do

campo escalar. Eles aparecem quando g é expandido em potências positivas de y2/x2,

isto é, conforme (4.58). Um campo escalar ordinário com potencial exponencial

(g = 1−c/Y ) pertence a esta classe, enquanto por exemplo o modelo de condensado

fantasma dilatônico [Piaz04] (g = −1 + c Y ) não. O ponto xo C corresponde a um

ponto de sela para c0 > 0 com Ωϕ = wef = 2Q2/3c0. Logo, é possível haver uma

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4.3. PONTOS FIXOS 87

Ponto

xy

Existência

Estabilidade

Ωϕ

wef

AxA

√ x2 A/YA

y A6=

0e

Ωϕ

=1

Nóestávelsob

ascond

ições(4.46)

1−

1+√ 2 3

λxA

B√

62(Q

)

√ x2 B/YB

3(g

+g 1

)<

(Q+λ

)λNóestávelpara

−Q

Q+λ≤

Ωϕ<

1e

A>

0Q

(Q+λ

)+3(g+g 1

)(Q

)2−

QQ

C−√

6Q 3c0

0|Q|<

√ (3c 0/2

)ou

c 0<

0

Ponto

desela

para

c 0>

0Nóestávelpara

c 0<

0e

Q(Q

)>

3|c 0|/

2

2Q2

3c0

2Q2

3c0

1 √c 0

0c 0>

0

Nóinstávelou

ponto

desela

paraQ>

0Nóestávelpara

Q<−√ 3c

0/2

11

Tabela4.1:

Propriedadesdospontoscríticos

para

adensidadelagrangiana(4.22)

napresença

depoeirasem

pressão(w

c=

0).

Especicand

oafunção

g,xAeYAsãodeterm

inados

solucionando-se(4.43)

enquantoYBédado

por

(4.49).Ospontosxos

cinéticosC

eD

existem

quando

gédada

por

(4.58).

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CAPÍTULO 4. INTERAÇÕES ESCURAS POR CAMPO ESCALAR 88

EDMϕ temporária na presença de uma interação Q. Note que Ωϕ < 0 sempre que

c0 for negativo. O ponto xo D aparece apenas para c0 positivos e corresponde a

Ωϕ = 1 sem aceleração (wef = 1). Ele não é portanto viável nem para uma EDM

nem para uma era dominada pela EE e, desta forma, não será mais considerado no

que se segue.

4.3.5 Pontos xos para z 6= 0

Obter-se-ão agora os pontos xos para z 6= 0. Neste caso tem-se z2 = 1− 3gx2

da equação (4.36). Assim, de (4.39) a equação de estado efetiva corresponde sempre

à wef = 1/3, o que signica que o fator de escala evolui como a ∝ t1/2. Logo, não

se pode usar os pontos xos com z 6= 0 para se obter uma EDM ou uma expansão

acelerada. Substituindo-se a relação z2 = 1 − 3gx2 na equação (4.35), encontra-se

os seguintes casos: (i) y = 0 and (ii) x = 4/(√

6λ).

O caso (i) é semelhante às soluções cinéticas discutidas na seção 4.3. Assim,

considerando-se a função g dada em (4.58), obtém-se dx/dN = −x(1 +√

6Qx) = 0,

o que implica x = 0 ou x = −1/√

6Q. Desta forma, para y = 0 temos dois pontos

xos: (a) (x, y, z) = (0, 0, 1) e (b) (x, y, z) = (−1/√

6Q, 0 ,√

1− c0/2Q2). O ponto

(a) corresponde a uma era dominada pela radiação padrão com Ωϕ = 0, enquanto

para o ponto (b) há uma fração de energia do campo escalar dada por Ωϕ = c0/6Q2.

No caso (ii) tem-se x = 4/√

6λ e z2 = 1− 8g/λ2, enquanto y só é determinado

pela forma especíca de g e poderia muito bem ser zero. De (4.34) obtém-se a

relação A(λ + 4Q)(g − g1) = 0, que leva a três diferentes pontos xos: (c) g =

g1, (d) λ = −4Q, e (e) A = 0. Resolvendo-se g = g1 uma vez especicada a

forma de g, obtém-se o valor y = yc(6= 0), isto é, o ponto xo (c) (x, y, z) =

(4/√

6λ, yc ,√

1− 8g/λ2). O caso especial em que λ = −4Q (e portanto Q < 0)

é interessante pois yd e zd não cam especicados nem mesmo após escolher-se a

função g. De fato, dada a forma de g, a curva crítica (d) é encontrada solucionando-

se a relação zd =√

1− 8 g(8/(3λ2y2

d)). Finalmente, o ponto (e) exige que y seja

zero, caso contrário uma vez que x é nito, g seria nita e A = (g + 5g1 + 2g2)−1

não se anularia. Mas neste caso z é ou imaginário ou innito, de modo que tal ponto

xo não é nunca uma realidade.

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4.4. É POSSÍVEL HAVER DOIS REGIMES ESCALÁVEIS? 89

4.4 É Possível Haver dois Regimes Escaláveis?

Conforme antecipamos no capítulo 1, iremos agora buscar uma ocorrência de

uma cosmologia de dois estágios: uma época desacelerada da matéria e um regime

escalável acelerado. Isto corresponde a uma procura por dois pontos xos distintos

para um mesmo conjunto de parâmetros Q, λ. Claramente, o ponto da matéria

deve ser um ponto de sela de modo a dar lugar ao atrator acelerado nal. Como

em geral durante a EDM há uma contribuição não-desprezível do campo escalar,

este ponto é normalmente um ponto escalável. Buscaremos portanto dois regimes

escaláveis subseqüentes. É em princípio possível obter-se uma fase da matéria aprox-

imada sem um ponto xo associado, mas isto requereria um ajuste no das condições

iniciais e assim sendo iremos excluir aqui esta possibilidade.

Como se mostrou na seção anterior, há duas alternativas que levam à expansão

acelerada em tempos tardios usando tanto o ponto xo dominado pelo campo

escalar A quanto o ponto escalável B. O ponto xo C, tipo EDMϕ, aparece antes da

época acelerada para os modelos dados por (4.58). Para um campo escalar ordinário

com potencial exponencial já se mostrou que a EDMϕ é seguida por um ponto

atrator A [Amen00] (ou por um ponto B, em qual caso sem aceleração). Neste caso o

universo atual (Ωϕ ' 0, 7) seria no m dominado pela densidade de energia do campo

escalar (Ωϕ = 1). Contrariamente, se o presente universo acelerado corresponde a

um atrator acelerado B, foi mostrado que a época dominada pela matéria, caso

exista, não é sucientemente longa para formar estruturas em larga escala. Isto

está associado ao fato de se necessitar um forte acoplamento Q para se obter um

atrator acelerado escalável, mas neste caso a solução rapidamente se aproxima do

atrator após a era dominada pela radiação uma vez que não há um ponto de sela

da matéria. Logo, não é possível haver o regime duo-escalável supracitado (o ponto

desacelerado C seguido do ponto acelerado B) através de um campo escalar padrão

com potencial exponencial.

Nesta seção investigar-se-á se um regime duo-escalável pode ser realizado por

uma lagrangiana geral (4.20) com g(Y ) dado por (4.24). Sondaremos todo o espaço

de parâmetros Q , λ em busca de uma cosmologia escalável bem-sucedida. Uma

vez que a dinâmica cosmológica difere dependendo do sinal de c0, três casos serão

considerados separadamente: (i) c0 > 0, (ii) c0 < 0 e (iii) c0 = 0. Atenção também

será dada a uma lagrangiana alternativa, tipo lei-de-potência, dada por

g(Y ) = c0 − c Y −u , (4.67)

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CAPÍTULO 4. INTERAÇÕES ESCURAS POR CAMPO ESCALAR 90

em que u, contrário a n, não está restrito a valores inteiros.

4.4.1 Caso em que c0 > 0

A função g fornecida em (4.24) é composta por potências positivas e negativas

de Y . Mostraremos inicialmente que o caso de potências positivas não são cosmo-

logicamente viáveis e então prosseguiremos ao caso de valores negativos de n.

Potências positivas de Y

Consideremos inicialmente a função g dada por

g = c0 +∑n<0

cnY−n . (4.68)

Neste caso, todos os pontos críticos com y = 0 desaparecem devido à singularidade.

Assim, as únicas possibilidades que dão luz a uma EDM correspondem ou a x = 0

ou a g = g1 = 0 (vide equações (4.32) e (4.39)), para os quais de fato wef = 0 e

Ωϕ = 0. Para x→ 0, entretanto, tem-se a partir de (4.68) que g → c0 e g1, g2 → 0.

É portanto imediato notar de (4.34) que dx/dN (x → 0) = −√

6Q/(2c0), de modo

que não temos pontos xos a menos, é claro, que Q = 0 (em qual caso a solução

escalável B não é acelerada, como pode ser visto de (4.53)). Se g = g1 = 0, a situação

é a mesma e novamente só obtemos pontos xos quando Q = 0. Assim, não existem

cenários cosmológicos bem-sucedidos para as funções dadas por (4.68). Outro ponto

importante é que para o modelo g = c0− cY −u com u negativo, a fração de energia

do campo escalar Ωϕ para o ponto B tem de ser negativa (conforme será mostrado

pela equação (4.73)) sempre que a condição (4.53) para uma aceleração for imposta.

Potências negativas de Y

Uma vez que foi mostrado que todas as potências positivas de Y na forma poli-

nomial geral de g estão descartadas, focar-nos-emos nos polinômios com potências

apenas negativas de Y , isto é,

g = c0 +∑n>0

cnY−n . (4.69)

Iremos provar que quando cn 6= 0 para n ≥ 1 é impossível haver dois regimes

escaláveis viáveis que satisfaçam os vínculos observacionais.

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4.4. É POSSÍVEL HAVER DOIS REGIMES ESCALÁVEIS? 91

Das equações (4.61) e (4.48) vemos que a solução desacelerada de EDMϕ (ponto C)

e o ponto acelerado B têm sempre sinais opostos de x. De fato, ao exigir aceleração

em B temos ou Q > λ/2 > 0 ou Q < −λ < 0. No primeiro caso tem-se xB > 0

e xC < 0, enquanto no segundo, xB < 0 e xC > 0. Entretanto, a função g dada

em (4.69) é singular em x = 0 (exceto para potências u ≤ 1, conforme abaixo), o que

acarreta que a seqüência de C para B é impedida. No que segue será providenciada

uma análise mais detalhada da possibilidade de se obter um regime duo-escalável.

Consideremos primeiro uma função g tipo lei de potência com um só expoente

dada por (4.67). No limite x→ 0 com valor não-nulo de y (que pode ser y 1), o

termo gx2y no lado direito de (4.35) exibe uma divergência para u > 1 junto com

uma divergência do termo gx3 no lado direito de (4.34) para u > 3/2. De fato,

para u 6= 1 tem-se ∣∣∣∣dy/dNdx/dN

∣∣∣∣x→0

→∞ . (4.70)

Logo quando u 6= 1 as soluções não podem passar a linha estabelecida por x = 0.

Uma vez que os sinais de xB e xC são sempre distintos, é inevitável cruzar esta

singularidade para u > 1 se as soluções se deslocam do da EDMϕ do ponto C para a

solução escalável B. Isto mostra que a seqüência de soluções de C para B é proibida

pela singularidade em x = 0.

Na gura 4.1 representamos o espaço de fase para o modelo (4.67) com u = 2,

c = c0 = 1, λ = 4 e Q = 0, 7 em conjunto com os pontos xos do sistema.

O espaço de fase é caracterizado por outra singularidade na equação (4.34), asso-

ciada à divergência da velocidade do som. Isto ocorre sempre que a quantidade

A−1 = c0 − c(u− 1)(2u− 1)Y −u se anula, ou seja, quando

y = ±(

c0

c(u− 1)(2u− 1)

)1/2u

x . (4.71)

Para valores positivos de c, ela existe para u > 1 ou 0 < u ≤ 1/2 mas desaparece

se 1/2 < u ≤ 1 . Quando c < 0 o oposto é verdade.

Observe que para o modelo (4.67) o ponto xo B corresponde a

xB =

√6

2(Q+ λ), yB =

(2Q(Q+ λ) + 3c0

3c

)1/2u

xB . (4.72)

Quando a condição para aceleração (4.53) é satisfeita, nós exigimos c > 0 para a

existência do ponto B. Desta forma no que sucede considerar-se-á apenas o caso

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CAPÍTULO 4. INTERAÇÕES ESCURAS POR CAMPO ESCALAR 92

-1 -0.5 0 0.5 1x

0

0.1

0.2

0.3

0.4

0.5

0.6y

n = 2

DC

BA

D

Figura 4.1: Espaço de fase para o modelo (4.67) com u = 2, c = c0 = 1, λ = 4 eQ = 0, 7 em conjunto com os pontos xos A, B, C e D. Aqui e nas guras seguintesa área cinza representa a região em que Ωϕ > 1. A linha pontilhada corresponde àsingularidade dada por (4.71), na qual a velocidade do som diverge.

de c positivo. Se u > 3/2 o ponto B não satisfaz a condição A > 0, ou seja,

y <(

c0c(u−1)(2u−1)

)1/2u

|x|. Isto pode ser conferido na gura 4.1, na qual a solução

escalável B existe na região A < 0. Quando 1 < u < 3/2, é possível obter-se valores

positivos de A. No entanto, ainda é necessária outra condição: Ω(B)ϕ < 1, o que

fornece um vínculo mais severo. A menos que u seja próximo a 1, não é fácil para o

ponto crítico B satisfazer as condições A > 0 e Ω(B)ϕ < 1. Um exemplo satisfazendo

estas últimas é u = 1, 1, Q = 2, λ = 2 com c0 = c1 = 1, conforme descrito pela

gura 4.2. Neste caso, entretanto, o ponto EDMϕ se situa na região Ω(C)ϕ > 1. Mais

importante ainda é o fato das trajetórias não poderem ligar os pontos C e B devido

às singularidades em x = 0 e em A−1 = 0.

A discussão acima mostra que quando u > 1 um regime duo-escalável não pode

ser realizado. Por outro lado, o caso u = 1 (um campo escalar ordinário com

potencial exponencial) está livre de ambas singularidades em x = 0 e A−1 = 0.

Este caso entretanto já foi previamente descartado enquanto modelo cosmológico

viável [Amen00]. Reproduziremos o argumento a seguir; deixaremos u como um

parâmetro livre de modo a esclarecer alguns aspectos interessantes do caso mais

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4.4. É POSSÍVEL HAVER DOIS REGIMES ESCALÁVEIS? 93

-1 -0.5 0 0.5 1x

0

0.2

0.4

0.6

0.8

1

yu = 1.1

D

A

A

D

B

Figura 4.2: Espaço de fase para o modelo (4.67) com u = 1, 1, c = c0 = 1, λ = 2e Q = 2 em conjunto com os pontos xos A, B e D (o ponto C jaz na regiãoΩϕ > 1). A linha pontilhada corresponde à singularidade dada por (4.71), na quala velocidade do som diverge.

geral. As quantidades relevantes para os pontos xos B e C são dados pelas

equações (4.50), (4.62) e pela seguinte relação:

Ω(B)ϕ =

(2u− 1)Q(Q+ λ) + 3uc0

(Q+ λ)2. (4.73)

Vamos impor os seguintes vínculos observacionais durante a fase C: Ω(C)ϕ < 1 e

durante a fase B: w(B)ef < −1/3 e Ω

(B)ϕ < 1 (note que o valor wEE observado através

de supernovas é na verdade denido através da equação de Friedmann padrão de

modo que ele não pode ser usado diretamente aqui; foi mostrado em [Amen04b]

que o melhor ajuste para w(B)ef é de fato próximo a −0, 6 ± 0, 1). Na realidade,

observações exigem vínculos bem mais restritivos que este. Por exemplo, observações

de supernovas restringem Ω(B)ϕ = 0, 7 ± 0, 2 e w

(B)ef < −0, 6 ± 0, 1. Ademais, EE

em excesso durante a fase C induz um fraco crescimento das perturbações e a sérios

conitos com a RCF, de forma que um limite conservador seria Ω(C)ϕ < 0, 2 (vide

por exemplo [Amen00]).

A condição para a aceleração da solução escalável B (w(B)ef < −1/3) requer que

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CAPÍTULO 4. INTERAÇÕES ESCURAS POR CAMPO ESCALAR 94

-1 -0.5 0 0.5 1x

0

0.25

0.5

0.75

1

1.25

1.5

yu = 1

AB

CDD

Figura 4.3: Espaço de fase para o modelo (4.67) com u = 1, c = c0 = 1, λ = 1, 54 eQ = 1, 02 em conjunto com os pontos xos A, B, C e D.

Q > λ/2 > 0 ou que Q < −λ < 0. Neste último caso é fácil ver que Ω(B)ϕ se torna

maior que 1 para u > 1. Já no primeiro caso, a condição 3Q > Q+ λ fornece

Ω(B)ϕ >

uc0

3Q2+

2u− 1

3, (4.74)

enquanto a condição |Q| <√

3c0/2 para a existência de uma EDMϕ implica

Ω(B)ϕ >

8u− 3

9. (4.75)

Isto mostra explicitamente que para qualquer u ≥ 3/2 a existência de um ponto

B acelerado está em contradição com a existência do ponto C. Quando u = 1 é

possível haver duas soluções escaláveis C e B, mas não se obtém valores inferiores a

w(B)ef = −0, 4, Ω

(B)ϕ = 0, 9 e Ω

(C)ϕ = 0, 7. Isto certamente exclui o caso u = 1 do

grupo de modelos cosmológicos viáveis. Os valores dos parâmetros que resultam

neste limite são λ = 1, 54 e Q = 1, 02. O gráco do espaço de fase para este caso

encontra-se na gura 4.3, da qual é claro que o ponto C (do tipo EDMϕ) é de

fato seguido por uma solução escalável B sem singularidades, embora tais soluções

não sejam cosmologicamente viáveis. Quando 1 < u < 3/2 tampouco é possível

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4.4. É POSSÍVEL HAVER DOIS REGIMES ESCALÁVEIS? 95

satisfazer os vínculos observacionais em adição à impossibilidade de se alcançar o

ponto B a partir de C. Na gura 4.2 está representado o espaço de fase para o

modelo (4.67) com u = 1, 1, λ = 2 e Q = 2 em conjunto com os pontos xos do

sistema.

Demonstramos portanto que não é possível obter-se dois regimes escaláveis ideais

para a função (4.67) com u ≥ 1. Estenderemos agora esta prova para a forma poli-

nomial g(Y ) com potências negativas. O problema conforme vimos é basicamente

associado ao fato das duas soluções escaláveis B e C estarem separadas por singu-

laridades em x = 0 e A−1 = 0. Esta última pode desaparecer ao considerar-se a

soma das potências dadas em (4.69) com o ajuste dos coecientes cn. No entanto,

se o polinômio incluir algum n maior que 1, isto gera a singularidade em x = 0

mesmo que a singularidade A−1 = 0 não esteja presente. Logo, se a função g possuir

ao menos um termo cuja potência n seja superior a 1, os polinômios (4.69) estarão

excluídos enquanto cosmologias escaláveis ideais. Isto completa a prova da impossi-

bilidade de se obter duas soluções escaláveis no caso de potências negativas de Y e

de c0 positivo.

Concluiremos esta subseção com uma breve discussão do caso u < 1 na (4.67).

Quando u < 1 a linha x = 0 não é mais singular; entretanto, a equação (4.70)

ainda vale e o espaço de fase é uma vez mais separado em subespaços de abscissa

positiva e negativa. Além do mais, a singularidade em A−1 = 0 desaparece para

1/2 < u < 1 (lembre-se de que estamos interessados apenas em c > 0). Neste

caso é também possível haver outra fase praticamente dominada pela matéria. Isto

corresponde à situação na qual se toma o limite x → 0 com um y não-nulo porém

pequeno em (4.34) e (4.35). Então pode-se ter uma EDM na região x > 0 seguida

de uma solução escalável B com xB > 0 (quando Q é positivo). Esta situação é

semelhante também ao caso 0 < u ≤ 1/2; conquanto o sistema esteja inicialmente

na região x > 0 e A > 0, as soluções alcançam o atrator escalável B sem nenhuma

singularidade. É interessante observar que quando u < 1 e c > 0, toda a classe

de pontos A com xA1 > 0 é acompanhada por um segundo ponto A: um atrator

fantasma (xA2 < 0). Logo, pode acontecer que a EDMϕ seja seguida por um ponto

A sem singularidade mesmo para Q > 0 (xC < 0). As lagrangianas fracionárias

u < 1 são portanto promissoras, mas claramente para que estes modelos funcionem

várias outras questões observacionais e teóricas precisam ser consideradas e assim

os guardamos para um trabalho futuro.

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CAPÍTULO 4. INTERAÇÕES ESCURAS POR CAMPO ESCALAR 96

4.4.2 Caso em que c0 < 0

Vamos agora considerar o caso de c0 negativo. As potências positivas de Y dadas

em (4.68) estão excluídas dos cenários cosmológicos viáveis por argumentos análogos

aos apresentados na subseção anterior. Assim, vamos nos concentrar nas potências

negativas de Y dadas por (4.69). Neste caso tem-se uma solução EDMϕ (4.61) com

Ωϕ negativo [vide (4.62)].

Além do fato de que isto pode ser não-físico, somos confrontados com um outro

problema para se obter um regime duo-escalável CB. Como a EDMϕ satisfaz à

condição (4.59), tem-se A−1 = g + 5g1 + 2g2 = c0 , o que signica que A é negativo.

Por outro lado, de modo a obter uma solução escalável B com 0 ≤ Ωϕ < 1, é preciso

que A seja positivo. Assim, para alcançar o ponto B do ponto C, é necessário cruzar

a singularidade em A−1 = 0 (o que não é permitido) ou ir através de A = 0 (x = 0).

Esta última possibilidade só pode ser realizada no modelo alternativo (4.67) com

u = 1. Assim sendo, não se pode obter uma boa cosmologia escalável quando c0 é

negativo.

4.4.3 Caso em que c0 = 0

O caso c0 = 0 é igualmente simples de se descartar. De fato, neste caso não há

soluções cinéticas e, portanto, EDM com y = 0 [vide (4.61) e (4.64)]. É possível

obter uma fase dominada pela matéria também para x → ∞ com n ≥ 1 ou para

x → 0 com potências fracionárias inferiores a um. Em ambos os casos, entretanto,

A é singular e portanto não há pontos xos . Finalmente, se ambos y e x forem para

zero de modo que Y = constante, então pode-se vericar que dx/dN não se anula e

desta forma o ponto (0, 0) não é uma solução.

Isto completa nossa prova. Embora a discussão tenha sido bastante longa e

técnica, a conclusão é imediata: mostrou-se que nenhuma solução escalável cos-

mologicamente viável existe para a classe geral de lagrangianas de campo escalar

polinomiais com potências inteiras e com acoplamento arbitrário.

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Capítulo 5

Interações Escuras Fenomenológicas

No capítulo anterior mostrou-se que a construção de modelos com interação

baseados em campos escalares enfrenta sérias diculdades. A saber, acoplamentos

descritos como função apenas de ϕ limitam fortemente a forma funcional da la-

grangiana do campo que possa resultar no regime duo-escalável almejado. Embora

possam existir lagrangianas especícas que escapem das barreiras impostas no capí-

tulo 4, encontrá-las pode constituir um processo não-trivial. Outra possibilidade

consiste em se generalizar Q(ϕ) para Q(ϕ,X), mas isto envolve rever toda a análise,

bastante técnica, anterior. Neste capítulo proceder-se-á por outra via, adotando-

se uma descrição (ainda mais) fenomenológica das diferentes componentes: uma

descrição de uidos.

Fazendo uso de um modelo de três parâmetros com um esquema de acoplamento

que generaliza resultados anteriores na literatura (seção 5.1), analisar-se-á o espaço

de fase (seção 5.2) e aplicar-se-ão dois diferentes testes cosmológicos (seção 5.4): su-

pernovas do tipo Ia (SNIa), fornecidas pelo catálogo combinado [Davi07], e o assim

chamado parâmetro de deslocamento da RCF (shift parameter, em inglês), con-

forme inferido pelos resultados de três anos da sonda-satélite Wilkinson Microwave

Anisotropy Probe (WMAP3) [Wang07]. Três aspectos serão observados: qual é a

região paramétrica que permite tal cosmologia duo-escalável (seção 5.3); como o

modelo se sai frente ao PCIEE (vide capítulo 1) dentro desta região paramétrica;

e qual é a SCI (seção 5.5). Propor-se-á ainda um modelo de brinquedo de dois

parâmetros (seção 5.6) para o qual há soluções analíticas e o qual tem uma razoavel-

mente pequena SCI, alivia o PC e, em alguns casos, também PCIEE. Finalmente,

será mostrado que, ao escolher livremente os três parâmetros, é de fato possível re-

solver o PC, embora nesses casos diculdades podem surgir em se ajustar o espectro

97

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CAPÍTULO 5. INTERAÇÕES ESCURAS FENOMENOLÓGICAS 98

de potência da matéria.

Este capítulo está em sua essência contido no artigo [Quar08].

5.1 O Modelo de Interações Escuras

Considerar-se-á o universo preenchido por quatro componentes: radiação, bári-

ons, e dois uidos (em latu sensu)1 barotrópicos acoplados. Um, uma matéria escura

fria (MEF), sem pressão, e o outro uma energia escura de pressão negativa. Estes

quatro serão denotados, respectivamente, pelos sub-índices r, b, c e x. Por simpli-

cidade, nossa análise se restringirá a modelos com parâmetro da equação de estado

wx ≡ px/ρx constante. Vínculos gravitacionais locais limitam fortemente qualquer

possibilidade de interação entre EE e bárions. Permitir tal acoplamento requer um

mecanismo que ou torne estes vínculos efetivos apenas no presente e não no passado,

ou que faça com que o alcance da interação seja curto o suciente, como se consegue

nos modelos de campo escalar do tipo camaleão [Mota04, Khou04]. Ignorar-se-á por-

tanto esta possibilidade e o foco será em acoplamentos com a matéria escura apenas.

Uma interação com a radiação também está descartada com base no fato de que tais

reações não afetariam a dinâmica do sistema próximo ao regime duo-escalável alme-

jado, pré-requisito para atacar o PC, conforme mencionado nos capítulos 1 e 4. Por

outro lado, um acoplamento com a radiação pode ser desejável para abordar tam-

bém o PCIEE. Porém, uma vez que isto introduz por si só muitos obstáculos, não

será doravante considerada esta hipótese.

Nosso interesse jaz em soluções para uma métrica de FLRW chata (vide

equação (4.5)) cujo fator de escala a(t) é dado por:

ds2 = −dt2 + a2(t)dx2. (5.1)

A equação de Friedmann na Relatividade Geral é dada por (2.6), recapitulada abaixo

3H2 = M−2P (ρx + ρc + ρb + ρr) , (5.2)

em que M−2P = 8πG e G é a constante gravitacional, e em que os diferentes ρi

compõem a densidade de energia do universo. No que sucede, será feito MP = 1.

Diferentes formas de acoplamento já foram consideradas na literatura. Pode-se

1Por latu sensu, queremos chamar a atenção que esta pode ser apenas uma descrição efetiva, epode-se encontrar resultados sem equivalente físico, como densidades de energia negativa.

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5.1. O MODELO DE INTERAÇÕES ESCURAS 99

tomar o acoplamento entre a MEF e a EE para ser tal que

dρxdN

+ 3(1 + wx)ρx = −3Q(ρc, ρx),

dρcdN

+ 3ρc = 3Q(ρc, ρx),

(5.3)

em que N ≡ ln a, às vezes denominado número de e-plicações. Assim, algumas das

formas propostas (não mutuamente exclusivas) para Q(ρc, ρx) até o momento são:

Q(ρc, ρx) =

(λ− wx)ρxρcρx + ρc

[Cai05, Zimd03],

λρc√

ρx + ρc[Boeh08],

λ (ρx + ρc) [Chim03],

λ ρc [Zimd01, Guo07],

λ1 ρλ2x ρ

λ3c [Mang03],

(5.4)

em que, além de wx, supusemos λ e os diferentes λi como constantes. Note que

valores positivos de Q(ρc, ρx) indicam que a energia está sendo transferida da EE

para a ME, o que signica que esta última vai se diluir mais lentamente do que no

caso sem interações.

Nossa análise será restrita ao caso2

Q(ρc, ρx) = λxρx + λcρc, (5.5)

o qual é uma forma mais geral do que aquelas encontradas em [Chim03] ou [Guo07],

mas que se reduz a estes casos, respectivamente, sempre que λx = λc ≡ λ e

λx = 0, λc ≡ λ. Ela pertence, entretanto, a uma classe diferente das usadas em

diversos modelos de campo escalar interagente. Em particular, não é equivalente

ao acoplamento usado no capítulo anterior (ou equivalentemente, em [Amen06a]) e

portanto pode contornar os árduos desaos ali impostos à solução do PC. Além do

mais, no que se segue considerar-se-á sempre que wx seja uma constante negativa,

cujo valor é o terceiro parâmetro livre do nosso modelo.

Um dos motivos para se considerar o esquema de acoplamento acima é que tal

é uma extensão imediata de algumas das outras formas encontradas na literatura.

Todavia, tal esquema possui algumas características peculiares que o leitor deve ter

2Apenas recentemente atentamos para o fato de que esta forma proposta foi previamente con-siderada por [Sadj06].

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CAPÍTULO 5. INTERAÇÕES ESCURAS FENOMENOLÓGICAS 100

em mente. Primeiro, ao se introduzir um acoplamento proporcional a ρc e não,

digamos, a ρcρx, cuidados precisam ser tomados relativos ao próprio signicado do

termo matéria escura. O motivo para tal é que mesmo na ausência de EE, a ME

adquire um parâmetro da equação de estado não-nulo. De fato, para ρx = 0 tem-se

weffc = −λc, como pode ser facilmente vericado de (5.3). Segundo, tal acoplamento

naturalmente permite que ρx e ρc se tornem negativos conforme o universo evolua,

e o modo de se lidar com isto será discutido na próxima seção. Terceiro, o sinal

de Q(ρc, ρx) pode mudar conforme as densidades de energia diluam. Um regime

escalável tardio que leve à aceleração cósmica garante um valor positivo hoje, mas

deixa aberta a possibilidade de uma transferência de energia oposta no passado, o

que pode propiciar uma formação de estruturas mais forte durante a EDM.

Reescrevendo as equações (5.3) usando (5.5), chega-se a

dρxdN

+ 3(1 + wx + λx)ρx = −3λc ρc,

dρcdN

+ 3(1− λc)ρc = 3λx ρx.

(5.6)

Tal sistema não admite soluções analíticas no caso geral3 mas existem algumas ex-

ceções notáveis para alguns casos particulares, a saber: (i) λx = 0; (ii) λc = 0;

(iii) λc = 1 e (iv) wx = −1 − λx. Para cada uma destas possibilidades, é possível

desacoplar as equações acima. O caso (i) foi estudado em [Guo07]. O segundo caso,

ainda que em princípio merecedor de investigação, mostra-se incapaz de aliviar o

PCIEE, conforme será demonstrado na seção 5.5. O caso (iii) está completamente

descartado pelas observações, como cará claro na seção 5.4. A última possibilidade,

do contrário, é bastante interessante. Ela permite simultaneamente wx e λx serem

próximos a −1 e 0, respectivamente, ao mesmo tempo em que exibe um comporta-

mento distinto quando comparado a ΛCDM. Não apenas este caso pode facilmente

satisfazer os testes observacionais empregados, mas também aborda tanto o PC

como o PCIEE. Retornar-se-á a esta particular escolha de parâmetros na seção 5.6.

3Soluções gerais existem ao se desprezar bárions e radiação, conforme foi demonstradoem [Barr06].

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5.2. PONTOS FIXOS 101

5.2 Pontos Fixos

De forma a estudar a dinâmica do modelo, iremos introduzir o seguinte conjunto

de variáveis,

X =1

H2

ρx3, Y =

1

H2

ρc3, z =

1

H

√ρb3, u =

1

H

√ρr3, (5.7)

e reescrever as equações de continuidade e a equação (5.2) como

dXdN

= X[3wx(X − 1) + u2 − 3λx

]− 3λc Y,

dYdN

= Y[3wxX + u2 + 3λc

]+ 3λxX,

dzdN

=z

2

[3wxX + u2

],

dudN

=u

2

[3wxX + u2 − 1

].

(5.8)

Tal conjunto de equações, combinado com o vínculo

X + Y + z2 + u2 = 1 (5.9)

imposto por (5.2), forma o sistema autônomo sobre o qual o restante deste capítulo

irá se basear. Dois comentários são necessários aqui.

• Denimos X e Y e não, digamos, x2 e y2 como variáveis para naturalmente

permitir valores negativos de ρx e ρc. Enquanto que ρx < 0 não somente

não pode ser descartado mas é de fato obrigatório em muitas teorias f(R) que

visam resolver o PC e satisfazer os vínculos observacionais atuais [Amen07c],

poderia se argumentar que ρc < 0 não é físico, ou que no mínimo é algo

indesejável. Esta classe de modelos, contudo, exige tal exibilidade e negá-la

a priori leva a um entendimento incompleto da dinâmica envolvida.4 Toda

e qualquer consideração física deste tipo precisa ser feita a posteriori, por

exemplo, descartando-se trajetórias para as quais ρc < 0 em algum instante.

• Devido ao vínculo acima o sistema se reduz a um sistema tridimensional, e

portanto uma das equações (5.8) pode ser eliminada. Note que o sistema

reduzido ainda precisa satisfazer um vínculo o qual, escolhendo-se eliminar a

4Um trabalho anterior [Oliv07] ignorou isto, e desta forma não tomou conhecimento da existên-cia de alguns pontos xos e permitiu trajetórias que cedo ou tarde violariam a condição (5.9).

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CAPÍTULO 5. INTERAÇÕES ESCURAS FENOMENOLÓGICAS 102

variável z, é descrito por

X + Y + u2 ≤ 1. (5.10)

Nossa notação para os pontos xos obedecerá a forma (Xfp, Yfp, zfp, ufp). Das

duas últimas equações do sistema (5.8) é imediato perceber que, para qualquer

ponto xo, zfp 6= 0 implica ufp = Xfp = 0 . Isto por sua vez força ou Yfp = 0 ou

λc = 0 . A primeira opção corresponde ao ponto bariônico (0, 0, 1, 0) . A última, ao

universo de MEF (sem EE) que como se sabe, converge para (0, Yfp, zfp, 0) . Todos

os demais pontos xos têm zfp = 0 . Por outro lado, quando ufp 6= 0 pode-se

mostrar que o único ponto xo possível é o (0, 0, 0, 1) , a menos que λx, λc e wxsejam escolhidos de modo a satisfazer a relação bastante especíca dada por

(1− 3wx)(1 + 3λc) = 3λx. (5.11)

Assim, os pontos xos de interesse, responsáveis pela EDM e presente aceleração,

podem ser escritos como (Xfp, Yfp, 0, 0) . Conforme mencionado anteriormente, será

seguida a abordagem do capítulo 4 e buscar-se-ão dois pontos xos: um ponto de

sela responsável pela EDM e um atrator que presida a época dominada pela energia

escura.

Estes dois importantes pontos serão denominados A ≡ (XA, YA, 0, 0) e

B ≡ (XB, YB, 0, 0) . Do sistema (5.8) encontra-se

XA =wx + λx − λc +

√(wx + λx − λc)2 + 4wxλc2wx

, (5.12)

XB =wx + λx − λc −

√(wx + λx − λc)2 + 4wxλc2wx

, (5.13)

com YA,B = 1−XA,B . Note que XB ≥ XA, uma vez que wx < 0. Na seção 5.3 será

mostrado que os pontos A e B são candidatos para a EDM e para a presente época

acelerada, respectivamente. Nesse momento é útil introduzir as desigualdades

−wx = |wx| >(√

λx +√λc

)2

, (5.14)

−wx = |wx| <(√

λx −√λc

)2

. (5.15)

Note que a segunda condição em wx é muito forte uma vez que uma aceleração tardia

exige tanto λx ou λc a ser da ordem da unidade para que wx seja sucientemente

negativo, o que está em contradição com o que se espera baseado em resultados

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5.2. PONTOS FIXOS 103Ponto

XY

zu

Existência

Estabilidade

Aceleração

A1

XA<

01−XA

00

λc<

0ou

λc>

0eλx>λc

e|w

x|<

( √ λ x−√λc

) 2sela

soba

cond

ição

(5.16);

docontrário,

instável

não

A2

0≤XA<

11−XA

00

λx<

0eλc>

0ou

λx,λ

c≥

0e|w

x|>

( √ λ x+√λc

) 2ponto

desela

wxXA<−

1 3

A3

XA>

11−XA

00

0<λx<λce|w

x|<

( √ λ x−√λc

) 2ponto

desela

wxXA<−

1 3

B1

XB<

01−XB

00

λc>

0eλx>λce|w

x|<

( √ λ x−√λc

) 2ponto

desela

não

B2

0<XB≤

11−XB

00

λx>

0eλc<

0ou

λx,λ

c≥

0e|w

x|>

( √ λ x+√λc

) 2atrator

wxXB<−

1 3

B3

XB>

11−XB

00

λx<

0ou

0<λx<λce|w

x|<

( √ λ x−√λc

) 2atrator

wxXB<−

1 3

C0

01

0∀wx,λ

x,λ

cponto

desela

não

D0

00

1∀wx,λ

x,λ

cinstávelou

sela

não

E0

YE

z E0

λc

=0

sela

se|w

x|>

λx;

docontrário,

atrator

não

F−∞

+∞

+∞

+∞

indeterm

inada,

mas

vergura5.3

N/A

N/A

Tabela5.1:

Aspropriedades

dospontoscríticos

para

oModelode

Interações

Escuras.Estáim

plicitam

ente

suposto

que

wx<

0equeacond

ição

(5.11)

nãoésatisfeita.Aúltimacoluna

mostraas

cond

içõespara

umaaceleração

tardiado

universo.

Agura5.1ilu

stra

esta

tabela.

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CAPÍTULO 5. INTERAÇÕES ESCURAS FENOMENOLÓGICAS 104

anteriores [Oliv07], e de fato com os resultados obtidos adiante na seção 5.4. Ambos

pontos existem sempre que: (i) λx > 0, λc > 0 e uma das condições (5.14) ou (5.15)

for satisfeita; ou (ii) ao menos um dentre λx e λc for negativo. No entanto, depen-

dendo do sinal destes parâmetro obtém-se XA,B negativo ou superior a 1. Se λx e λcforem positivos e a condição (5.14) for satisfeita, ambos pontos cam situados entre

0 e 1. Por outro lado, se a inequação satisfeita for a (5.15), ambos XA e XB serão

negativos (para λx > λc ) ou maiores que 1 (para λx < λc). Quando λx < 0 ,

tem-se XB > 1 e sinal(XA) = sinal(λc). Por último, no caso λc < 0 , encontra-se

que XA < 0 e XB ≤ 1 se e somente se λx ≥ 0.

Outra possibilidade é a existência de um ponto catastróco no innito

(X → −∞ , Y → +∞), para o qual o sistema pode desmoronar em alguns ca-

sos (o ponto recíproco com X positivo e Y negativo pode ser mostrado não existir).

De modo a ilustrar este caso, considere, para ns de argumento, λx < 0 , λc > 0

e z = u = 0 . Então vê-se que dX/dN é negativo para qualquer X pequeno e

positivo, e permanece assim após X se tornar negativo. Segue-se um decaimento

catastróco e X → −∞ em um N nito.5

Finalmente, como mencionado anteriormente, o sistema possui outros três pontos

de interesse. Um ponto bariônico C, um ponto dominado pela radiação D, e um

ponto dominado por matéria mista E, denidos respectivamente por (0, 0, 1, 0),

(0, 0, 0, 1) e (0, Y, z, 0) . O ponto C é sempre um ponto de sela, o ponto D pode

ser tanto instável como ponto de sela dependendo nos valores de λx, λc e wx, e o

ponto E é um ponto de sela a menos que |wx| < λx, em qual caso ele é um atrator.

5.2.1 Estabilidade dos pontos xos

A tabela 5.1 resume as condições para a existência e estabilidade de todos os 6

pontos xos. Visando uma maior clareza de exposição, subdividimos os pontos A e

B em três, separando os casos Xfp < 0, 0 ≤ Xfp ≤ 1 e Xfp > 1.

Independentemente da positividade de λx e λc, os pontos A2, A3 e B1 são sempre

pontos de sela, enquanto os pontos B2 e B3 são sempre atratores. O ponto A1 é um

5Neste caso, nenhuma das densidades de energia está de fato divergindo pro innito, e sim oparâmetro de Hubble H é que está indo a zero.

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5.2. PONTOS FIXOS 105

pouco mais capcioso. É um ponto de sela sempre que satisfeitas as condições|wx|(1 + 3λc) > λx − λc −

1

3se λc ≤ 0 ;[

λx − λc − 13

](1 + 3λc)

< |wx| ≤1

9λcse λc > 0 .

(5.16)

Em todos os demais casos, ele será instável. De todos modos, enquanto os pontos

A2, A3 e B1 possuem 2 autovalores negativos (e 1 positivo), o ponto A1 pode ter no

máximo apenas um autovalor negativo.

O ponto bariônico C é um ponto de sela, mas como não esperamos uma era

dominada por bárions, para condições iniciais razoáveis as trajetórias não devem

passar muito perto deste (entretanto, vide seção 5.6). Já o ponto dominado por

radiação D, mesmo que ele possa tecnicamente ser um ponto de sela (dependendo

dos valores de λx, λc e wx), em todos os cenários sicamente relevantes ele será

instável.

5.2.2 Resumo dos pontos xos

No decorrer desta subseção supor-se-á, por simplicidade, que as condições pe-

culiares (5.11) e λc = 0 não são satisfeitas. Temos assim 4 pontos xos mais um

possível abismo catastróco rotulado F . O ponto D é a condição inicial para o

nosso sistema. Uma proximidade com o ponto C deve ser evitada de modo a sat-

isfazer as observações. Os pontos A e B constituem nosso interesse principal: o

primeiro, um candidato para uma EDM tipo ponto de sela e o último um candidato

para a época acelerada atual. Os pontos A e B serão em geral um ponto de sela e

um atrator, respectivamente, mas há exceções.

Neste modelo, ao contrário do caso particular estudado em [Oliv07], em que

λc = λx, temos XA/YA 6= YB/XB . De fato, mostra-se que XA − YB = (λx −λc)/wx em vez de zero. Isto é um resultado desejável, pois permite que o ponto

xo acelerado ter uma densidade de EE mais próxima do valor atual. Dito de outro

modo, quando XA/YA = YB/XB , ao se ajustar o ponto xo da EDM de modo a

não afetar demasiadamente a formação de estruturas (digamos, XA . 0, 1), o ponto

acelerado ca restrito a XB & 0, 9, o que é substancialmente maior que o valor

atual de 0, 74. De fato, para o caso [Oliv07] obtém-se uma razão R = ρx/ρc & 45

(vide seções 5.4 e 5.6), enquanto observações atuais armam que R0 ≈ 3, 4. Iremos

retornar a esta questão na seção 5.6, onde investigaremos possíveis melhorias quando

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CAPÍTULO 5. INTERAÇÕES ESCURAS FENOMENOLÓGICAS 106

as duas constantes de acoplamento diferem.

Uma amostra de possíveis trajetórias estão representadas na gura 5.1 para três

diferentes casos, todos os quais possuem wx xo em −1: λx = λc = 0 (ΛCDM),

λx = λc = 0, 04 e λx = −λc = 0, 15. O volume cinza corresponde à região proibida,

isto é, aquela para a qual o vínculo (5.10) é violado. A curva preta tracejada corres-

ponde à trajetória que atravessa as densidades de energia (observacionais) atuais,

as quais por sua vez estão representadas pela estrela vermelha. Note que, conforme

observado anteriormente, em todos os casos é possível haver trajetórias que cruzem

as superfícies X = 0 e Y = 0 . Caso houvéssemos escolhido 1H

√ρx/c

3 como vari-

áveis, veríamos trajetórias atingir estas superfícies mas articialmente incapazes de

atravessá-las. Isto é especialmente importante para modelos com valores negativos

de λx e/ou λc, para os quais os pontos xos A e B podem ter tanto Xfp < 0 como

Yfp < 0.

5.3 Possibilidade de duas Épocas Escaláveis

Analisaremos agora a viabilidade de uma cosmologia duo-escalável, para a qual

a EDM é garantida pela existência de um ponto de sela adequado e a presente

aceleração pela existência de um atrator nal apropriado. Da tabela 5.1 é claro que

precisamos que o ponto A seja tal ponto de sela, com XA . 0, 1 , e que o ponto

B seja o atrator, com XB & 0, 7 . Em outras palavras, os pontos A3 e B1 estão

excluídos. O ponto B3, por sua vez, não é muito interessante pois signicaria que:

(i) o universo está agora em uma fase transiente entre duas épocas escaláveis, o que

inevitavelmente requer um ajuste mais preciso de parâmetros; e (ii) a densidade de

energia da ME se tornaria negativa no futuro. A primeira das duas é a característica

crucial, uma vez que ela automaticamente previne uma solução para o PC do modo

que o denimos. Iremos considerar portanto apenas o sabor B2 do ponto B e

conseqüentemente exigir λx ≥ 0. Trocando em miúdos, nos limitamos a apenas

duas possibilidades:

• Ponto A1 seguido de B2 (o que exige λc < 0);

• Ponto A2 seguido de B2 (o que exige λc > 0).

Para tornar o ponto A1 um ponto de sela viável é necessário que λc seja negativo,

uma vez que as condições (5.14) e (5.15) são mutuamente exclusivas. Além do mais,

de (5.16) e do fato de que λx ≥ 0 , encontra-se que λc precisa ser superior a −1/3.

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5.3. POSSIBILIDADE DE DUAS ÉPOCAS ESCALÁVEIS 107

0

0.5

1

X

A

B

C

D

ø

00.51Y

0

0.5

1

u

0

0.5

1

X

A

B

C

D

ø

00.51Y

0

0.5

1

u

0

0.5

1

X

A

B

C

D

ø

00.51Y

0

0.5

1

u

Figura 5.1: Trajetórias no espaço de fase em conjunto com os pontos xos A, B,C e D. De cima para baixo tem-se λx = λc = 0 , λx = λc = 0, 04 e λx = −λc =−0, 15, enquanto wx = −1 para todos os três grácos. Note que algumas trajetóriascruzam as superfícies X = 0 e Y = 0 . O volume cinza representa a região emque o vínculo (5.10) é violado. A curva preta tracejada corresponde à trajetóriaque atravessa as densidades de energia (observacionais) atuais, as quais por sua vezestão representadas pela estrela vermelha.

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CAPÍTULO 5. INTERAÇÕES ESCURAS FENOMENOLÓGICAS 108

Porém mesmo −1/3 ≤ λc < 0 pode não ser o suciente, uma vez que o ponto A1

tem no máximo um autovalor negativo e, desta forma, não é claro que ele teria uma

grande bacia de atração como é necessário para se abordar tanto o ajuste no das

condições iniciais (SCI) como o PC. Em outras palavras, a correspondente EDM

pode ser curta e levar a valores menores de ∆.

Os pontos A2 e B2 são mais fáceis de se reconciliar. De fato, uma condição

suciente para que o sistema tenha os dois regimes escaláveis necessários para se

atacar os problemas da coincidência e das condições iniciais é que λx, λc > 0 e que

wx satisfaça a condição (5.14). No entanto, como será mostrado na próxima seção,

vínculos observacionais impõem limites à intensidade de acoplamento que são mais

restritivos neste caso que naquele em que λc < 0.

Seguindo estas diretrizes, desenvolver-se-á uma análise quantitativa na seção 5.5

para alguns dos valores observacionalmente permitidos do espaço de parâmetros.

Investigar-se-ão também possíveis melhorias na faixa de condições iniciais que evo-

luem para o universo observado atual (ou seja, estudar-se-á o PCIEE).

5.4 Vínculos Observacionais

De modo a sondar quantitativamente a faixa permitida de valores das duas cons-

tantes de acoplamento, iremos submeter o modelo a dois diferentes testes obser-

vacionais: supernovas do tipo Ia e o assim chamado parâmetro de deslocamento

da RCF. Conforme mencionamos no capítulo 2, o primeiro tem como alicerce a

hipótese bem aceita de que este tipo de objeto astronômico é uma vela padronizável,

e consiste em comparar os seus módulos de distância em diferentes desvios para o

vermelho àqueles calculados através do modelo em questão. O segundo teste pode

ser considerado uma boa aproximação à análise completa da RCF (especialmente

quando utilizado em conjunto com a posição do pico acústico [Elga07])6, que exige

estabelecer-se as equações de perturbação de densidade de primeira ordem para o

nosso modelo e empregar um dos códigos bem estabelecidos de análise da RCF, tais

6Apesar de haver incluído a escala do primeiro pico em nossos cálculos, nós iremos apenascitar os resultados combinados de SNIa e do parâmetro de deslocamento. A razão para tal é umatríplice: primeiro, o pico acústico impõe vínculos que são paralelos àqueles impostos pelo parâmetrode deslocamento (o que é consistente com [Elga07] uma vez que não permitimos Ωc0 variar muito);segundo, desta forma mantemos um vínculo mais conservador, pois pode ser argumentado queestes dois testes de RCF se tornam duvidosos quando se afasta consideravelmente do modelode concordância; por último, os contornos se tornam um pouco mais grossos, o que aumenta aqualidade da apresentação. De qualquer modo, nenhum dos nossos resultados principais mudariamdo contrário.

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5.4. VÍNCULOS OBSERVACIONAIS 109

Figura 5.2: Resultados combinados dos testes de supernovas e parâmetro de desloca-mento. Os volumes representam níveis de conança de 1 e 2σ, marginalizados sobreΩc0 com uma a priori gaussiana baseada nos resultados de WMAP3+SDSS. Os con-tornos verticais estão desenhados em λx = 0 (branco) e λc = 0 (preto). O cortehorizontal amarelo é feito em wx = −1 (vide gura 5.3), e outros cortes pontilhadosforam feitos como guias visuais em wx = −1, 5, wx = −2, 0 e wx = −2, 5.

como o CAMB ou o CMBEASY.

Fizemos uso do catálogo combinado de supernovas dos levantamentos Essence,

Hubble, Supernova Legacy Survey (SNLS) e supernovas próximas, conforme com-

pilado por [Davi07]7, para um total de 192 supernovas, e do resultado de três anos

da sonda-satélite WMAP para o parâmetro de deslocamento [Wang07] (a saber,

7Este catálogo tem a conhecida característica de concordar com ΛCDM em 1σ. Aqui nãoestamos advogando o seu uso frente a outros conjuntos de SNIa, mas o leitor deve ter isto emmente quando analisar nossos contornos de níveis de conança; a saber, a inclusão de interaçõesnão alteram este quadro.

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CAPÍTULO 5. INTERAÇÕES ESCURAS FENOMENOLÓGICAS 110

Figura 5.3: Contornos em níveis de conança de 1, 2 e 3σ para wx xo em −1. Alinha marrom tracejada representa o caso particular em que λx = λc , conformeconsiderado em [Chim03], e o ponto amarelo aponta o caso ΛCDM. A área cinza notopo é a região para a qual o sistema entra no abismo catastróco caracterizadopelo ponto xo F , o que na prática signica que H(z∗) = 0 para algum z∗ <zrecombinação.

1, 70 ± 0, 03). Empregamos um método baseado em grade para computar o χ2 para

diferentes valores de λx, λc, wx e Ωc0. Os valores atuais da densidade de energia

bariônica Ωb0 e da densidade de energia da radiação Ωr0 foram mantidos xos respec-

tivamente em 0, 042 e 4, 2× 10−5, que constituem o melhor ajuste das observações

combinadas do WMAP3 e do Sloan Digital Sky Survey (SDSS) [Sper07]. O valor

de h, o parâmetro de Hubble reduzido, foi marginalizado analiticamente. Para Ωc0

supusemos uma a priori gaussiana equivalente às observações de WMAP3+SDSS,

ou seja, com uma média em 0,22 e desvio padrão de 0,03. Nós também consideramos

uma a priori tipo cartola (em inglês, top-hat) na faixa 0, 14 < Ωc0 < 0, 30, mas os

resultados foram muito parecidos.

A gura 5.2 descreve os níveis de conança de 1 e 2σ para uma a priori gaussiana

e contém bastante informação a respeito do modelo. Ela mostra que, em termos ab-

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5.4. VÍNCULOS OBSERVACIONAIS 111

solutos, valores negativos de λx podem ser muitas vezes maiores que os positivos.

É igualmente claro que nenhum dos testes desfavorece valores fantasmas (isto é,

inferiores a −1) para wx, e que a região permitida no quadrante λx > 0, λc > 0 é

bem pequena. Um corte bidimensional em wx = −1 é mostrado na gura 5.3 e

fornece uma boa idéia da faixa de valores que λx e λc podem assumir assim como

o alinhamento geral dos contornos com a linha λx = −kλc em que k ∼ 2. Tecnica-

mente ela não é um corte da gura 5.2 e sim um gráco dos contornos de um modelo

de dois parâmetros com wx xo em −1 do início. Na prática, a única diferença é

que os contornos na gura 5.3 são menores do que os amarelos (e horizontais) na

gura 5.2. A gura 5.4 fornece diferentes contornos bidimensionais obtidos da função

de verossimilhança de dimensão superior, supondo-se prioris planas em todos os 3

parâmetros do modelo, assim como as funções de verossimilhança unidimensionais

para cada um. O uso de prioris planas permite a interpretação de todos estes 6 grá-

cos como projeções dos de dimensão maior, desta forma ajudando na visualização da

gura 5.2. Finalmente, a gura 5.5 funde o gráco tridimensional com as regiões do

espaço de parâmetros que exibem o regime duo-escalável. No interior da região verde

transparente tem-se um regime duo-escalável tipo A1 −B2, enquanto no interior do

volume cinza quadriculado opaco tem-se um do tipo A2 −B2. Além da existência e

estabilidade dos pontos xos A2 e B2, as fronteiras cinzas estão desenhadas de modo

a garantir que XA2 < 0, 1. A idéia é que a EE precisa ser sub-dominante durante a

EDM de modo a não interferir demasiadamente com a formação de estruturas. De

todos modos, como pode ser visto do gráco, um ponto xo XA2 > 0, 1 é excluído

em mais de 2σ.

O foco principal de trabalhos anteriores que adotaram modelos de interação

semelhantes foi no quadrante de λx, λc positivos. Está claro agora que tal região

constitui um pedaço extremamente limitado do espaço de parâmetros. Da gura 5.3

nota-se que se nos limitarmos a, digamos, λx = λc > 0 conforme feito em [Oliv06],

precisamos ter λc < 0, 014 (0, 020) para o nível de conança de 2σ (3σ). Se con-

siderarmos λc negativo, por outro lado, as constantes de acoplamento podem ser

tão grandes quanto 0, 30 (0, 42) e −0, 20 (−0, 35) em 2σ (3σ) para λx e λc, respec-

tivamente. Isto é um aumento de mais de uma ordem de magnitude em valores

absolutos. Iremos explorar esta liberdade no que se segue e investigaremos a viabil-

idade de modelos com λc negativo.

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CAPÍTULO 5. INTERAÇÕES ESCURAS FENOMENOLÓGICAS 112

Figura 5.4: Contornos de 1, 2 e 3σ marginalizados em cada um dos três parâmetrosdo modelo, e as funções de verossimilhança unidimensionais. Todas as prioris foramtomadas planas. As linhas pretas verticais nos grácos unidimensionais e os pontosamarelos nos contornos representam wx = −1, λc = 0 e λx = 0 respectivamente. Acurva marrom tracejada no gráco inferior central representa o caso λx = λc .

5.5 Ajuste Fino e Problemas de Condições Iniciais

Conforme mencionado anteriormente, há duas maneiras pelas quais quaisquer

modelos que visem abordar o PCIEE com uma pequena SCI podem oferecer me-

lhorias. Uma é possuir um maior valor para a sua densidade de energia de EE em

algum momento do passado, ou mais precisamente, aumentar a razão ζ entre as

densidades de energia da EE e da radiação ao nal da inação. A outra é aumentar

a faixa ∆ que irá evoluir para os valores observados de Ωx0. A primeira pode ajudar

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5.5. AJUSTE FINO E PROBLEMAS DE CONDIÇÕES INICIAIS 113

Figura 5.5: Intersecção dos contornos de 1 e 2σ com as regiões do espaço de parâmet-ros que permitem o regime duo-escalável. No interior da região verde transparentetemos uma solução escalável tipo A1−B2, enquanto no interior da região cinza opacaquadriculada temos um regime duo-escalável do tipo A2 − B2. As fronteiras cinzasforam delineadas de modo a garantir que XA2 < 0, 1, de modo a não se comprom-eter a formação de estruturas durante a EDM. Os contornos 2D são os mesmos dagura 5.2.

a conciliar a componente de energia escura, sob uma interpretação de campos, com

o nosso atual entendimento do Modelo Padrão da física de partículas ou de suas

extensões. A última é uma medida direta da bacia de atração do ponto de sela da

EDM e, portanto, da redução do ajuste no necessário.

Espera-se que um modelo que se submeta a um regime duo-escalável seja menos

sensível às condições iniciais devido à presença do ponto de sela A da EDM. A quan-

tidade de afrouxamento não é todavia clara ao se usar os argumentos anteriores. É

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CAPÍTULO 5. INTERAÇÕES ESCURAS FENOMENOLÓGICAS 114

preciso portanto avaliar a faixa de condições iniciais para, digamos, a densidade de

energia da EE para diferentes valores do espaço de parâmetros permitidos pelas ob-

servações e comparar com a faixa de condições iniciais permitidas no modelo ΛCDM.

Isto está feito na gura 5.6, na qual para wx = −1 estão ilustrados os valores de

∆/∆ΛCDM e ζ, computados obtendo-se a faixa de valores iniciais de ρx que evoluem

para as presentes observações (X0 = 0, 74±0, 03). Conforme observado no capítulo 1,

tomamos nossos valores iniciais ao nal da inação, mais precisamente em z = 1026.

Para referência, ∆ΛCDM ' 0, 08 (ou seja, as condições iniciais podem variar ∼ 8%) e

ζΛCDM ' 9×10−101. Observa-se que quando interações estão presentes, melhorias de

um fator entre 1 e 30 para ∆ e de dezenas de ordens de magnitude para ζ (contanto

que λc 6= 0) são possíveis. Para valores pequenos porém positivos de λc (iniciando-se

por volta de 10−4), ζ cai abruptamente para o valor de ΛCDM. Note que a região de

λc negativo possui ρxi negativo, e portanto nesta seção ζ perde a sua importância

uma vez que o PCIEE não é mais aplicável (lembre-se que estamos identicando

o PCIEE com argumentos de equipartição). O vale próximo a λc = 0 , e o pico

no na sua base (λx ' −0, 18) no gráco de ∆ foram articialmente alargados na

gura 5.6 visando uma maior claridade de exposição. Ambos são na verdade muito

mais nos do que representados, e existem apenas para |λc| . 10−60. Na verdade,

este pico no fundo é espúrio: ρmaxxi , o denominador de ∆, é muito próximo a zero

nesta região. Conforme previsto na seção 5.3, a região em que λx > 0 é menos

sensível às condições iniciais, o que é devido à presença do regime duo-escalável.

Dois importantes comentários são necessários. Primeiro, no que concerne o

PCIEE, ele é muito mais sensível a λc do que a λx. De fato, os maiores valores

possíveis de ζ são obtidos para valores de λc positivos e muito pequenos. Acopla-

mentos mais fortes com a ME apenas pioram o PCIEE, ao mesmo tempo que nenhum

valor de λx permitido pelos testes observacionais fazem qualquer diferença quando

λc 1. Segundo, na região de λx positivo, que é a mais interessante por permitir

a existência de ambos regimes escaláveis, a SCI é consideravelmente menor que em

ΛCDM, o que representa uma vantagem para qualquer abordagem fenomenológica.

Em particular, a região ao redor de λx = 0, 2 e λx = −0, 1, que possuem melhorias

em ∆ por fatores de 10− 30, é a mais promissora para se resolver o PC, como será

discutido na próxima seção.

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5.6. UM MODELO DE BRINQUEDO DE DUAS VARIÁVEIS 115

Figura 5.6: A variável ζ do PCIEE (acima) e a variável ∆ da SCI (abaixo), calculadascomo função das constantes de acoplamento λx e λc. Fixou-se aqui wx = −1 .As melhorias em ζ variam entre 55 e 75 ordens de magnitude (ζΛCDM ∼ 10−100),enquanto ∆ se situa entre 1 e 30 vezes o valor em ΛCDM. A queda abrupta de ζpróximo a λc = 0 é esperada (vide seção 5.6). A largura do vale em λc = 0 nográco de ∆ está grosseiramente exagerada por motivo de claridade de exposição.De fato, a queda tem início apenas para |λc| . 10−60. Para λc < 0, ζ é negativo, eportanto nesta seção ζ perde a sua importância uma vez que o PCIEE não é maisaplicável.

5.6 Um Modelo de Brinquedo de duas Variáveis

Inspirado nos resultados das seções precedentes, procuramos um modelo de brin-

quedo que ao mesmo tempo alivie o PCIEE, não tenha alta SCI, se submeta a um

regime duo-escalável e satisfaça os vínculos observacionais obtidos neste capítulo.

Um bom ponto de partida é selecionar um modelo que possua solução analítica.

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CAPÍTULO 5. INTERAÇÕES ESCURAS FENOMENOLÓGICAS 116

Como mencionado na seção 5.1, o melhor candidato é aquele em que

wx = −1− λx . (5.17)

Neste caso, podemos escrever a razão R entre ρx e ρc como

R =(S + L)R0 − 2λc + (1 + z)3S [(S − L)R0 + 2λc]

S − L + 2R0 λx + (1 + z)3S [(S + L)− 2R0 λx], (5.18)

em que S ≡√

1 + λc(−2− 4λx + λc) , L ≡ 1 − λc e R0 ≡ ρx0/ρc0 ' 3.4 . De

modo a melhor compreender a inuência das duas constantes de acoplamento é

frutífero escrever a expressão acima nos limites z →∞ e z → −1. Uma vez que só

serão consideradas constantes de acoplamento que são razoavelmente menores que

a unidade, vamos desprezar todos menos os dois termos de menor ordem em λx e λcem (5.18). Chega-se assim a

limz→∞

R = λc (1 + λc −R0 λx) +O(λ3) , (5.19)

limz→−1

R =R0 + λx − λc (1 +R0)

λx+O(λ) . (5.20)

Vemos que para λc = 0, R vai assintoticamente para zero para altos desvios para

o vermelho. Se λc for não-nulo obtemos (a menos que valores muito especícos de

acoplamento sejam escolhidos de modo a cancelar o termo proporcional a 1 + z no

numerador) um valor constante e não-nulo para R conforme z vá ao innito. Na

outra extremidade, quando z → −1, vemos que ajustar λx = 0 signica que a

razão entre as densidades de energia irão crescer indenidamente no futuro. Isto

nos equipa de uma intuição física a respeito dos papéis de ambos λx e λc quando

os mesmos assumem valores não-nulos. A primeira é necessária para garantir um

comportamento escalável tardio, ou seja, para manter R pequeno, enquanto a última

garante um valor não-nulo de R no universo primordial. Dito de outro modo, valores

altos de λx ajudam a resolver o PC, enquanto valores altos de λc aliviam o PCIEE.

Referindo-se de volta à seção 5.2, isto poderia igualmente ser notado do fato de que

XA2 = 0 sempre que λc = 0 e de que XB2 = 1 quando λx = 0.

Torna-se necessário agora escolher valores particulares para λx e λc (lembre-se

que estamos supondo wx = −1 − λx) que satisfaçam os vínculos observacionais

obtidos e que forneçam um valor nal R−1 de R o qual não esteja distante do

atual. Das guras 5.2 e 5.3 vê-se que os menores valores assintóticos de R permi-

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5.6. UM MODELO DE BRINQUEDO DE DUAS VARIÁVEIS 117

Wr Wc

Wb

Wx

-0.7110102103104105

0

0.25

0.5

0.75

1-0.7110102103104105

0

0.25

0.5

0.75

1

z

W

Figura 5.7: Evolução de todas as quatro densidades de energia como função do desviopara o vermelho. Da esquerda para a direita, a componente dominante é, em ordem:radiação, matéria escura e energia escura. Bárions são sempre sub-dominantes.As curvas tracejadas correspondem ao modelo ΛCDM e as linhas sólidas ao casoλx = 0, 18, λc = −0, 08, wx = −1, 18. Note que a igualdade matéria-radiaçãoé arrastada para z ' 20000, e que a EE possui densidade de energia negativa paraz > 2.

tidos no quadrante de acoplamento positivo é R−1 ' 32 (R−1 ' 45 se λx = λc),

enquanto para λc negativo pode-se chegar a valores tão baixos quanto

R−1 ' 5. De todos modos, o problema da coincidência é na melhor das hipóteses ape-

nas aliviado, e não solucionado, pois estaríamos ainda distantes destes valores. Com

base nestas considerações, selecionamos λx = 0, 18, λc = −0, 08, wx = −1, 18 e

λx = λc = 0, 014, wx = −1, 014 como exemplos do nosso modelo de brinquedo.

No primeiro caso, EE primordial possui densidade de energia negativa, e portanto

não é um candidato a solução do PCIEE. No segundo, a densidade de energia escura

é positiva ao longo de toda a história, mas o PC é pior.

Na gura 5.7 representamos as diferentes densidades de energia como função de

desvio para o vermelho para o primeiro conjunto de parâmetros e as comparamos

com as obtidas em ΛCDM. Os distintos valores de Ω hoje são ajustados ao melhor

ajuste de WMAP3+SDSS. Note que ρx é negativo ao longo de toda a EDM, o

que ajuda a aumentar sua duração. Outra característica importante deste exemplo

é que a igualdade entre matéria e radiação ocorre muito antes, em z ' 20000, e

portanto é possível que outros testes observacionais tais como uma análise completa

da RCF descartem tal antecipação da EDM. De fato, ajustar o espectro de potência

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CAPÍTULO 5. INTERAÇÕES ESCURAS FENOMENOLÓGICAS 118

WrWc

Wb

Wx

-0.71101021031041050

0.25

0.5

0.75

1-0.7110102103104105

0

0.25

0.5

0.75

1

z

W

Figura 5.8: Idem à gura 5.7 para o caso em que λx = λc = 0, 014 e wx = −1, 014.Aqui a evolução é mais parecida com o de ΛCDM, e em particular a densidade deenergia da EE é sempre positiva.

da matéria será um desao uma vez que seu pico é a grosso modo estimado por

keq, o número de onda das perturbações que entram no horizonte no momento da

equivalência matéria-radiação, e este seria deslocado para menores escalas por um

fator de ' 6.1 (em unidades de h × distância−1). Este exemplo desfruta de pequena

SCI, com ∆/∆ΛCDM ' 18, como pode ser visto da gura 5.6. A gura 5.8 é a mesma

para o segundo exemplo, para o qual λx = λc = 0, 014. Neste caso, o PCIEE é válido

e obtemos ζ ' 3 × 10−26, o que deve ser comparado a ζΛCDM ' 9 × 10−101. Note

que neste caso estamos mais distantes do atrator nal acelerado que no anterior. De

fato, R−1 = 6, 1 no primeiro exemplo enquanto R−1 = 70, 4 no segundo.

Concluímos este capítulo notando que é possível obter-se R−1 mais próximo a R0

para regiões do espaço de parâmetros que não permitem soluções analíticas. Inspi-

rado em (5.20), buscamos valores altos de λx, e da gura 5.2 vemos que maiores val-

ores de λx são permitidos quando wx > −1. Vasculhando esta região, encontramos

um bom candidato para λx = 0, 23, λc = −0, 14, wx = −0, 85. A gura 5.9 ilustra

a evolução do modelo para esses valores dos parâmetros, que fornecem R−1 = 3, 48.

Este valor está a apenas 4% do valor presente (WMAP3+SDSS), e poder-se-ia argu-

mentar que isto resolve o PC. Entretanto, uma vez mais a equivalência adiantada põe

em risco a viabilidade do modelo (aqui keq é deslocado de um fator ' 6, 6). Outro

aspecto importante que devemos frisar é que esta região do espaço de parâmetros é

extremamente sensível. Isto reete-se nas ondulações e descontinuidades na ponta

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5.6. UM MODELO DE BRINQUEDO DE DUAS VARIÁVEIS 119

Wr

Wc

Wb

Wx

-0.7110102103104105

0

0.25

0.5

0.75

1-0.7110102103104105

0

0.25

0.5

0.75

1

z

W

Figura 5.9: Idem à gura 5.7 para o caso em que λx = 0, 23, λc = −0, 14, wx =−0, 85. Uma vez mais, a igualdade matéria-radiação é arrastada para z ' 20000.Note que por um não tão curto intervalo de desvio para o vermelho os bárionsse tornam a componente (marginalmente) dominante. Neste cenário, já teríamosalcançado o atrator acelerado (R−1 esta a menos de 4% de R0) e portanto, pelanossa denição, solucionado o PC.

dos contornos da gura 5.2. O que isto signica é que pequenas variações nos valores

dos parâmetros são amplicadas, isto é, podem resultar em evoluções signicativa-

mente distintas. Por exemplo, para λx = 0, 235 a matéria escura adquire densidade

de energia negativa para z > 8; para λx = 0, 20 igualdade matéria-radiação é arras-

tada para z > 105. Isto pode ser problemático ao se tentar estender nossa análise

para cenários com wx e/ou λx, λc variáveis.

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CAPÍTULO 5. INTERAÇÕES ESCURAS FENOMENOLÓGICAS 120

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Capítulo 6

Conclusões e Perspectivas

Neste trabalho, abordamos alguns dos problemas teóricos da cosmologia atual,

com ênfase na origem física da matéria escura (partículas massivas fracamente in-

teragentes ou modicação da lei da gravidade?) e nos problemas da coincidência

(cósmica) e das condições iniciais da densidade de energia da energia escura.

6.1 Matéria Escura

O estudo de teorias relativísticas de MoND ainda é incipiente. TeVeS contém,

com sua função arbitrária D na lagrangiana do campo escalar, toda uma classe

de teorias. Embora a rigor a escolha de D não seja completamente livre, pois é

necessário impor-se os limites newtoniano e MoNDiano de forma adequada, por

outro lado a escolha original proposta por Bekenstein não possui qualquer caráter

fundamental ou especial. Como o próprio arma [Beke07], tal escolha representa

uma prova de princípios de que é possível reproduzir a fenomenologia de MoND

com uma teoria relativística consistente e a qual reproduz um lenteamento gravita-

cional adequado. Outras escolhas para esta função podem resultar em aspectos ainda

mais interessantes do ponto de vista da evolução cosmológica e, quiçá, inclusive da

própria energia escura.

Alguns resultados muito recentes lançaram dúvidas sobre a estabilidade dos cam-

pos de TeVeS [Cont08], mas estes, mesmo se conrmados, não devem deter a busca

por uma boa teoria relativística de MoND. Além da função livre D, as ações de

TeVeS possuem certo grau de arbitrariedade e pequenas modicações na ação dos

campos vetorial e escalar podem ser tão bem justicadas como a proposta inicial.

De todos modos, o grande sucesso e simplicidade de MoND instigam a curiosidade

121

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CAPÍTULO 6. CONCLUSÕES E PERSPECTIVAS 122

cientíca da comunidade. Que uma prescrição ingênua baseada apenas em uma nova

constante universal consiga explicar uma gama tão vasta de fenômenos certamente

representa mais do que uma mera peculiaridade das equações. É também intrigante

que TeVeS adicione uma nova coincidência: o fato do campo vetorial, introduzido

para aumentar a intensidade das lentes gravitacionais, proporcione um crescimento

acentuado de estruturas, talvez em escala necessária para suplantar a ME também

neste quesito. Ainda que o atual paradigma de matéria escura venha a se conrmar

em sua plenitude em laboratório, MoND ainda representará uma fenomenologia que

precisará ser melhor compreendida e explicada.

6.2 Energia Escura

Buscou-se aqui um esclarecimento dos diversos aspectos de ajuste no cosmológico

e sua relação com possíveis interações escuras. Para tanto, propusemos três variáveis

para quanticar cada uma das mais recorrentes questões de modelos cosmológicos:

o PC, o PCIEE e a SCI. A busca por uma solução ao PC nos levou a um estudo

profundo de cosmologias escaláveis.

Através do uso de campos escalares, abordamos um bom número de aspectos

interessantes relativos a esta classe de evolução cosmológica, e obtivemos os seguintes

resultados:

• Nós identicamos a forma mais geral de uma lagrangiana de campo escalar

de segunda ordem (fornecida por (4.18)) com um acoplamento com a matéria

na forma de uma função arbitrária de ϕ (mas que não depende de X) sob a

exigência que o sistema exiba soluções escaláveis. Esta é a generalização dos

trabalhos [Piaz04, Tsuj04] nos quais uma forma semelhante de lagrangiana foi

obtida no caso de um acoplamento constante.

• Nós classicamos a topologia do espaço de fase para a lagrangiana escalável e

obtivemos 4 classes de pontos xos: (A) pontos dominados pelo campo escalar,

com Ωϕ = 1; (B) solução escalável com Ωϕ = −Q/[wϕ(Q + λ)]; (C) uma

solução EDMϕ; (D) soluções puramente cinéticas. Pontos das duas primeiras

classes podem existir para qualquer lagrangiana escalável e podem levar a uma

expansão acelerada. O atrator escalável acelerado B, quando existe na região

−Q/(Q+λ) ≤ Ωϕ < 1, é o único atrator global a menos que um outro atrator

fantasma A esteja presente. os pontos C eD aparecem quando a função g pode

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6.2. ENERGIA ESCURA 123

ser expandida na forma (4.58). A solução EDMϕ C é outra solução escalável

(sempre desacelerada nos casos de interesse).

• Nós abordamos a possibilidade de se obter um regime duo-escalável e concluí-

mos que isto é impossível para qualquer lagrangiana que possa ser aproximada

por uma série de potências positivas e negativas do seu argumento Y . Isto

se deve essencialmente ao fato de que uma lagrangiana escalável ser sempre

singular ao longo ou do eixo x ou do eixo y no espaço de fase, desta forma

prevenindo uma EDM ou isolando a região viável para tal região onde ocorrem

soluções escaláveis aceleradas.

É notável que uma seqüência duo-escalável não possa ser obtida para uma classe tão

vasta de lagrangianas de campo escalar (embora, sejamos justos, não investigamos

a fundo as conseqüências de (4.24) poder ter innitos termos). Isto demonstra a

diculdade em se resolver o PC: embora soluções escaláveis cosmológicas tenham sido

estudadas há mais de uma década, nenhum caso bem sucedido ainda foi encontrado,

e este trabalho mostra que mesmo uma larga generalização dos modelos não ajuda.

A busca por uma boa cosmologia escalável ainda não está contudo encerrada. De

fato, mostramos também que uma possível exceção existe no setor 0 < u < 1 da g(Y )

dada em (4.67). Uma investigação detalhada deste tipo de lagrangiana fracionária

está em andamento.

Este resultado nos impulsionou em uma nova direção: considerar um acopla-

mento diretamente nas equações de uido da energia e matéria escuras. Esta abor-

dagem escapa dos vínculos acima por introduzir um acoplamento que (em princípio)

não recai na classe até então estudada. Restringindo nossos parâmetros pelo uso de

vínculos observacionais provenientes de supernovas e do parâmetro de deslocamento

da RCF, assim como através da exigência da possibilidade de uma cosmologia duo-

escalável, limitamos fortemente nosso espaço de parâmetros.

Aplicando as variáveis propostas (ζ, ∆ e R) ao nosso Modelo de Interações

Escuras, o qual possui algumas características distintas tais como densidades de

EE negativas, descobrimos que cada constante de acoplamento está relacionada

a um regime diferente. O PC só pode ser resolvido para grandes valores de λx,

enquanto grandes valores de λc garantem maiores quantias de EE no universo pri-

mordial, e portanto se relaciona com o PCIEE. Descobrimos também que valores

não-nulos de λc também dão lugar a uma menor SCI para qualquer valor de λx.

Nós investigamos portanto dois exemplos de uma classe de modelos de brinquedo

(caracterizados por (5.17)) para os quais existe solução analítica de modo a adquirir

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CAPÍTULO 6. CONCLUSÕES E PERSPECTIVAS 124

alguma intuição sobre como abordar estes diferentes problemas. Para ambos o PC

e o PCIEE foram no máximo aliviados, uma vez que o menor valor de R−1 obtido

foi 6, 1 e o maior valor de ζ foi ∼ 10−26. Mesmo que não uma solução de fato, isto

representa uma melhoria de 74 ordens de magnitude sobre o cenário ΛCDM. É

possível que uma solução para o PCIEE requeira uma terceira solução escalável:

uma solução escalável entre EE e radiação. Tal regime somente seria alcançado

se lançássemos luz nas interações escuras, incluindo radiação no nosso esquema de

acoplamento.

É também notável o fato de que, baseado nos exemplos mostrados, soluções para

o PC (na nossa classe de modelos) parecem requerer que a densidade de energia da

EE seja negativa no passado. Isto pode ser uma pista de que teorias de gravitação

modicadas, as quais podem mais facilmente acomodar densidades de energia (efeti-

vas) negativas, possam ter uma vantagem em explicar esta questão. De fato, campos

com densidade de energia negativas que se espalhem por grandes regiões espaciais

podem dar lugar a uma série de fenômenos exóticos (vide [Fews98] e referências ali

contidas).

Finalmente, concluímos que R−1 ' R0 só ocorre em uma região bastante turbu-

lenta do espaço de parâmetros, na qual wx não é muito negativo e λx é grande o

suciente. Como neste caso a igualdade entre radiação e matéria difere substancial-

mente daquela de ΛCDM, é preciso averiguar se demais testes observacionais (espe-

cialmente aqueles envolvendo perturbações) irão descartá-lo. Em particular, lidar

com o deslocamento do pico do espectro de potência da matéria será um desao

para este modelo. Caso as equações de perturbação mostrem-se consideravelmente

diferentes que as do modelo de concordância e o espectro de potência da matéria seja

ajustado,1 então por mais sensível que o modelo possa ser aos seus parâmetros nesta

região, comparado a ΛCDM ou a quintessência, nenhum ajuste no propriamente

dito será necessário para se solucionar o problema da coincidência.

1Um trabalho recente [Vali08] arma, no entanto, que modelos de interação como o nosso, comwx constante, apresentam uma séria divergência na evolução da perturbação de curvatura, o quese comprovado descartaria toda esta classe de modelos.

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Apêndice A

Derivação da solução para

acoplamento arbitrário

Em busca de uma solução para (4.16), iremos primeiramente reescrevê-la uti-

lizando como campo o produto do parâmetro λ pela equação (4.19). Ou seja, no-

tando que ∂/∂ϕ = λQ(ϕ) ∂/∂ψ:

∂ ln p

∂ lnX

[1 +

2

Q(ϕ)

dQ(ϕ(ψ))

]− ∂ ln p

∂ψ= 1. (A.1)

Nós então decompomos p(X,ϕ) em

ln p(X,ϕ) ≡ −ψ + ln f(X,ψ), (A.2)

e chegamos assim a

∂ ln f

∂ lnX

[1 +

2

Q(ϕ(ψ))

dQ(ϕ(ψ))

]− ∂ ln f

∂ψ= 0. (A.3)

Esta última equação pode ser resolvida por análise de Fourier:

ln f(X,ψ) ≡ 1√2π

∫eiω lnXF (ω, ψ) dω. (A.4)

A equação (A.3) ca escrita como (com Qψ ≡ Q ϕ, em que usamos para denotara função composta)

iωF

[1 +

2

dQψ

]=∂F

∂ψ, (A.5)

125

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APÊNDICE A. DERIVAÇÃO DA SOLUÇÃO PARA ACOPLAMENTO ARBITRÁRIO 126

que possui como solução

lnF =

∫ ψ

[1 +

2

Qψ(z)

dQψ(z)

dz

]dz +B(ω), (A.6)

em que B(ω) é uma função arbitrária. Desfazendo-se a transformada de Fourier,

obtém-se

ln f =1√2π

∫dω B(ω) exp

[lnX +

∫ ψ(1 +

2

Qψ(z)

dQψ(z)

dz

)dz︸ ︷︷ ︸]

. (A.7)

= ψ + 2 lnQψ(ψ) + const.

Finalmente, recordando (A.2) e notando que a função composta Qψ ψ = Q,

chega-se a

p(X,ϕ) = e−ψ(ϕ) g(X eψ(ϕ) Q2(ϕ)

), (A.8)

a partir da qual (4.18) segue imediatamente de uma redenição da função arbi-

trária g e ao estabelecer-se ψnew → ψold/λ. Note que a arbitrariedade da função B

é absorvida na de g.

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Apêndice B

Fundo cosmológico mais geral

Por completeza iremos também derivar a lagrangiana escalável sob uma equação de

FLRW efetiva dada por

H2 = β2qρ

qT , (B.1)

em que βq e q são constantes. Relatividade Geral, universos de branas de Randall-

Sundrum [Rand99], universos de branas de Gauss-Bonnet [Char02, Davi03] e cos-

mologias cardassianas [Free02] correspondem a q = 1, q = 2, q = 2/3 e q = 1/3,

respectivamente. As equações (4.7) e (4.9) permanecem inalteradas mesmo para

um fundo (B.1). As denições de Ωϕ e Ωm são modicadas para as formas

Ωϕ ≡ρϕ

(H/βq)2/q, Ωm ≡

ρm(H/βq)2/q

, (B.2)

que todavia ainda satisfazem Ωϕ + Ωm = 1 conforme (B.1).

Enquanto que (4.11) ainda é válida para q 6= 1, a equação (4.14) está sujeita à

mudança:

2X = H2

(dϕdN

)2

∝ρqϕQ2

∝ pq(X,ϕ)

Q2. (B.3)

Obtém-se então a seguinte equação mestra

q

[1 +

2

qλQ2

dQ(ϕ)

]∂ ln p

∂ lnX− 1

λQ

∂ ln p

∂ϕ= 1, (B.4)

em que λ é denido em (4.17). A integração desta equação fornece

p(Xψ, ψ) =(XQ2(ϕ)

)1/qg(XQ2(ϕ) eqλψ

), (B.5)

127

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APÊNDICE B. FUNDO COSMOLÓGICO MAIS GERAL 128

em que ψ é denido em (4.19). Para Q constante isto reproduz o resultado obtido

em [Tsuj04].

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