ALBANO AFONSO ANATOMIA DA LUZ

vista da exposição / primeiro andarexhibition view / first floor

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Anatomia da Luz I, 2014 / vídeo, projetor de luz, bronze, cristal, espelho, modelo anatômico, pêndulo e cabos de aço / dimensões variáveisAnatomy of Light I, 2014 / video, light projector, bronze, cristal, mirror, anatomic model, pendulum and steel cable / dimensions variable

vista da exposição / segundo andarexhibition view / second floor

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Anatomia da Luz II, 2014 / vídeo, projetor de luz, bronze, cristal, espelho, modelo anatômico, pêndulo e cabos de aço / dimensões variáveisAnatomy of Light II, 2014 / video, light projector, bronze, cristal, mirror, anatomic model, pendulum and steel cable / dimensions variable

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Os trabalhos recentes de Albano Afonso tratam da transmutação de elementos. Há certa relação com a alquimia, com a ideia de que uma matéria pode se tornar outra, que uma substância se transforma em sua oposta. A alquimia do artista vai além da investigação dos quatro elementos primordiais. É como se esses trabalhos reencontrassem a quinta-essência, o elemento espiritual que surge como inseparável da matéria, porque é só a partir dela que a energia pura, a luz, parece surgir ese manifestar.

Entretanto, em vez de trazer algum discurso transcendental, o esqueleto elaborado por Albano Afonso supera o dualismo clássico entre alma e corpo. O trabalho traz ambos os elementos simultaneamente, como se conciliasse polos opostos. Se a morte é a origem da vida, o esqueleto espelhado é o momento da cristalização do corpo, é quando a estrutura anatômica do homem ganha uma outra ordem interna e se torna luz.

Dependendo das condições de temperatura e pressão, uma substância pode cristalizar e a supersaturação é a força inicial desse processo. O equilíbrio de um sistema é atingido quando um sistema sólido-líquido cristaliza. Talvez devido a sua constância que os cristais sejam usados na harmonização de ambientes. É como se esse mineral alterasse as energias do entorno e reequilibrasse o conjunto.

Os trabalhos realizados para a mostra em São Paulo formam um conjunto de móbiles que flutua na sala escura e equilibra elementos visíveis e invisíveis. Apesar do peso dos cristais e do bronze que os compõe, eles pairam leves, oscilando de um lado a outro. Enquanto giram sobre si mesmos, as peças guardam algo de etéreo. Mas esse aspecto elevado é balanceado por um vaso, elemento ligado à terra, lugar de onde pode brotar a flora. As compensações de peso também surgem devido ao aspecto simbólico das figuras. Contraposta por um arranjo de cristais, uma espécie de árvore carbonizada, feita de pequenas partes de esqueletos, inverte as coordenadas de orientação do espaço fazendo suas raízes se dirigirem ao céu.

Um pêndulo, mais abaixo, oscila em torno de um ponto fixo e colabora no encontro da estabilidade do móbile. Crânio, coluna vertebral, braços e pernas espelhados compõe as peças que equacionam forças da natureza comuma espécie de mitologia particular do artista. É como se os reflexos dissolvessem a estrutura óssea do corpo e o transformassem em pontos luminosos, estrelas, como se o corpo se desmaterializasse sem, contudo, deixar de estar ali diante nós.

ALBANO AFONSOALQUIMIA DO CORPO

O esqueleto é uma espécie de forma básica e universal totalmente de-subjetivada, um modelo genérico de uma aula de anatomia. Mas o artista não faz um elogio à atitude científica e tampouco encarna um discurso místico. O que ocorre é uma aproximação com um mundo primordial, anterior às teorizações e dicotomias sedimentadas pela cultura. Por meio de uma alquimia singular, percebemos que o sujeito moderno, que pensou poder sobrevoar o mundo e dominá-lo completamente pelo pensamento, habita hoje um corpo esfacelado e sem identificação.

Luz e sombra no trabalho de Albano Afonso não constituem exatamente uma oposição. Só percebemos a sombra porque há a luz, por isso elas são interdependentes, subordinadas uma à outra. Seus móbiles, iluminados por diferentes temperaturas, revelam a aparição de seres fantasmáticos, sombras produzidas a partir da transubstanciação de elementos físicos e imaginários.

Em toda a produção do artista o invisível que há no corpo não é o contrário do visível. O equilíbrio, elemento central nos móbiles, nos revela que o invisível não é apenas o campo da sombra, nem o visível somente o da luz, mas há entre eles uma dependência mútua, luz e sombra são inseparáveis. A alquimia de Albano Afonso faz com que um se transmute em outro.

Cauê Alves

The recent works by Albano Afonso deal with the transmutation of elements. There is a certain relation with alchemy, with the idea that a material can become another, that a substance is transformed into its opposite. The artist’s alchemy goes beyond the investigation of the four primordial elements. It is as though these works reencountered the quintessence, the spiritual element that arises inseparable from matter, because it seems that it is only on its basis that pure energy – light – arises and is manifested.

Rather than presenting a transcendental discourse, however, the skeleton developed by Albano Afonso surpasses the classical dualism between soul and body. The work involves both elements simultaneously, as though conciliating opposite poles. If death is the origin of life, the shiny skeleton is the moment of the body’s crystallization; this is when man’s anatomical structure takes on another internal order and becomes light.

Depending on the conditions of temperature and pressure, a substance can crystallize, and supersaturation is the initial force of this process. The balance of a system is reached when a solid-liquid system crystallizes. It is perhaps due to their constancy that crystals are used in the harmonization of environments. It is as though this mineral changed the energies of its surroundings, bringing everything in the context backinto balance.

The works made for the show in São Paulo form a set of mobiles that float in the dark exhibition room and balance visible and invisible elements. Despite the weight of the crystals and bronze that compose them, they hover lightly, oscillating from one side to the other. While they rotate, the pieces bear something ethereal. But this elevated aspect is balanced by a vase, an element linked to the earth, the place where plant life can sprout. The balancing of weight also arises due to the symbolic aspect of the figures. Counterposed by an arrangement of crystals, a sort of carbonized tree, made of small parts of skeletons, inverts the coordinates of the space’s orientation, making its roots reach toward the sky.

Lower down, a pendulum oscillates around a fixed point and collaborates in the encounter of the mobile’s stability. A shiny cranium, vertebral column, arms and legs compose the pieces that materialize an equation between the forces of nature and the artist’s private mythology. It is as though the reflections dissolved the body’s bone structure, transforming it into points of light and stars, as though the body were dematerialized even while remaining there before us.

ALBANO AFONSOAN ALCHEMY OF THE BODY

The skeleton is a sort of totally desubjectivised basic and universal form, a generic model of an anatomy lesson. But the artist did not make this work in praise of a scientific attitude or to embody a mystic discourse. What is taking place is an approximation with a primordial world, prior to the theories and dichotomies established by culture. By means of a singular alchemy, we perceive that the modern subject, who thought he could fly over the world and dominate it completely by his thought, today dwells in a shattered body without identification.

Light and shadow in Albano Afonso’s work do not exactly constitute an opposition. We only perceive the shadow because there is light, so they are interdependent, each subordinated to each other. His mobiles, illuminated by different temperatures, reveal the apparition of phantasmal beings, shadows produced based on the transubstantiation of physical and imaginary elements.

In all of the artist’s production, the invisible that exists in the body is not the opposite of the visible. Balance, a central element in the mobiles, reveals to us that the invisible is not only the field of shadow, nor is the visible only that of light; rather, there is a mutual dependence between them, light and shadow are inseparable. Albano Afonso’s alchemy transmutes one into the other.

Cauê AlvesTradução/English version: John Mark Norman