Sociologia Urbana

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Isabela Veloso Lopes Versiani Maria da Luz Alves Ferreira Sociologia Urbana

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  • Isabela Veloso Lopes VersianiMaria da Luz Alves Ferreira

    Sociologia Urbana

  • Montes Claros/MG - 2012

    Isabela Veloso Lopes VersianiMaria da Luz Alves Ferreira

    Sociologia Urbana

  • EDITORA UNIMONTESCampus Universitrio Professor Darcy Ribeiro

    s/n - Vila Mauricia - Montes Claros (MG)Caixa Postal: 126 - CEP: 39.401-089 - Telefone: (38) 3229-8214

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    VICE-REITORAMaria Ivete Soares de Almeida

    DIRETOR DE DOCUMENTAO E INFORMAESHuagner Cardoso da Silva

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    REVISO LINGUSTICAngela Heloiza BuxtonArlete Ribeiro NepomucenoAurinete Barbosa TiagoCarla Roselma Athayde Moraes

    Luci Kikuchi VelosoMaria Cristina Ruas de Abreu MaiaMaria Lda Clementino MarquesUbiratan da Silva Meireles

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    DESIGN EDITORIAL E CONTROLE DE PRODUO DE CONTEDOAndria Santos DiasCamilla Maria Silva RodriguesClsio Robert Almeida CaldeiraFernando Guilherme Veloso QueirozFrancielly Sousa e SilvaHugo Daniel Duarte SilvaMarcos Aurlio de Almeida e MaiaPatrcia Fernanda Heliodoro dos SantosSanzio Mendona HenriquesTatiane Fernandes PinheiroTtylla Ap. Pimenta FariaVincius Antnio Alencar BatistaWendell Brito MineiroZilmar Santos Cardoso

    - EDITORA UNIMONTES - 2012Universidade Estadual de Montes Claros

    V482s Versiani, Isabela Veloso Lopes. Sociologia urbana / Isabela Veloso Lopes Versiani, Maria

    da Luz Alves Ferreira. Montes Claros : Unimontes, 2012. 67 p. : il. color. ; 21 x 30 cm.

    Caderno didtico do Curso de Licenciatura em Cincias Sociais da Universidade Aberta do Brasil - UAB/Unimontes. Inclui bibliografia. ISBN 978-85-7739-197-4

    1. Ensino superior. 2. Sociologia urbana. 3. Poltica urbana. 4. Urbanizao. I. Ferreira, Maria da Luz Alves. II. Universidade Aberta do Brasil - UAB. III. Universidade Estadual de Montes Claros - Unimontes. IV. Ttulo.

    CDD 378.007

  • Chefe do Departamento de Cincias BiolgicasGuilherme Victor Nippes Pereira

    Chefe do Departamento de Cincias SociaisMaria da Luz Alves Ferreira

    Chefe do Departamento de GeocinciasGuilherme Augusto Guimares Oliveira

    Chefe do Departamento de HistriaDonizette Lima do Nascimento

    Chefe do Departamento de Comunicao e LetrasAna Cristina Santos Peixoto

    Chefe do Departamento de EducaoAndra Lafet de Melo Franco

    Coordenadora do Curso a Distncia de Artes VisuaisMaria Elvira Curty Romero Christoff

    Coordenador do Curso a Distncia de Cincias BiolgicasAfrnio Farias de Melo Junior

    Coordenadora do Curso a Distncia de Cincias SociaisCludia Regina Santos de Almeida

    Coordenadora do Curso a Distncia de GeografiaJanete Aparecida Gomes Zuba

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    Coordenadora do Curso a Distncia de PedagogiaMaria Narduce da Silva

    Ministro da EducaoFernando Haddad

    Presidente Geral da CAPESJorge Almeida Guimares

    Diretor de Educao a Distncia da CAPESJoo Carlos Teatini de Souza Clmaco

    Governador do Estado de Minas GeraisAntnio Augusto Junho Anastasia

    Vice-Governador do Estado de Minas GeraisAlberto Pinto Coelho Jnior

    Secretrio de Estado de Cincia, Tecnologia e Ensino SuperiorNrcio Rodrigues

    Reitor da Universidade Estadual de Montes Claros - UnimontesJoo dos Reis Canela

    Vice-Reitora da UnimontesMaria Ivete Soares de Almeida

    Pr-Reitora de EnsinoAnete Marlia Pereira

    Diretor do Centro de Educao a DistnciaJnio Marques Dias

    Coordenadora da UAB/UnimontesMaria ngela Lopes Dumont Macedo

    Coordenadora Adjunta da UAB/UnimontesBetnia Maria Arajo Passos

    Diretor do Centro de Cincias Humanas - CCHAntnio Wagner Veloso Rocha

    Diretora do Centro de Cincias Biolgicas da Sade - CCBSMaria das Mercs Borem Correa Machado

    Diretor do Centro de Cincias Sociais Aplicadas - CCSAPaulo Cesar Mendes Barbosa

    Chefe do Departamento de ArtesMaristela Cardoso Freitas

  • Autoras

    Isabela Veloso Lopes VersianiMestre em Desenvolvimento Social pela Universidade Estadual de Montes

    Claros (Unimontes). Especialista em Metodologia Cientfica e Epistemologia da Pesquisa. Professora conteudista e formadora da UAB/UNIMONTES.

    Maria da Luz Alves FerreiraDoutora em Sociologia e Poltica pela Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG. professora de Teoria Sociolgica Contempornea do Departamento

    de Poltica e Cincias Sociais da Universidade Estadual de Montes Claros Unimontes. Professora formadora e conteudista da Universidade Aberta do

    Brasil UAB/UNIMONTES.

  • Sumrio

    Apresentao . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .9

    Unidade 1 O contexto do surgimento da sociologia urbana . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .11

    1.1 Surgimento da sociologia urbana . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .11

    1.2 Principais correntes de pensamento. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .13

    Referncias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .14

    Unidade 2 A cidade enquanto fenmeno cultural . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .15

    2.1 Max Weber: conceito e categorias da cidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .15

    2.2 George Simmel: a metrpole e a vida mental . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .17

    2.3 Louis Wirth: o urbanismo como modo de vida . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .19

    2.4 Park: a cidade e as sugestes para a investigao do comportamento

    humano no meio urbano. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22

    Referncias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25

    Unidade 3 A cidade determinada atravs de critrios polticos e econmicos . . . . . . . . . . . . . . . .27

    3.1 As contribuies de Marx e Engels para o estudo das cidades: bases

    para uma sociologia urbana crtica. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .27

    3.2 Manuel Castells: O estruturalismo marxista no espao urbano. . . . . . . . . . . . . . . . .29

    3.3 Henry Lefbvre e o urbano como espao poltico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .31

    3.4 Paul Singer e as migraes internas como fenmeno de criao e/ou

    crescimento de cidades . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .32

    Referncias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .39

    Unidade 4 Planejamento e gesto de cidades contemporneas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .41

    4.1 Planejamento urbano e gesto urbana: instrumentos de interveno no

    espao. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .41

    4.2 Poltica urbana no Brasil: desafios e experincias de participao social . . . . . . .45

    Referncias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .49

  • Unidade 5 Problemas urbanos e novos temas de investigao: o destino das cidades . . . . . . . .51

    5.1 Problemas urbanos: dificuldades na efetivao de direitos e a excluso social. .51

    Referncias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .59

    Resumo. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .61

    Referncias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .63

    Atividade de Aprendizagem - AA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .67

  • 9Cincias Sociais - Sociologia Urbana

    ApresentaoCaro (a) acadmico (a), desde o contexto

    de surgimento da Sociologia, da especificida-de do objeto sociolgico, bem como de suas peculiaridades, temos avanado na discusso sociolgica para compreender diferentes fe-nmenos que acontecem na vida social ligada aos processos econmicos, s relaes polti-cas, s instituies, dimenso cultural, entre outros.

    Assim, com muita alegria que introdu-zimos a vocs uma nova disciplina na rea da sociologia que a disciplina de Sociologia Ur-bana. Esta uma disciplina muito gostosa de estudar porque trata do nosso cotidiano, do nosso dia a dia, da nossa vida nas cidades.

    Antes de irmos diretamente para a disci-plina de urbana, vamos lembrar o que vimos de Sociologia no curso de Cincias Sociais Li-cenciatura. Nos dois primeiros perodos, ns estudamos o contexto do surgimento da so-ciologia, bem como as condies histricas e intelectuais que possibilitaram o surgimento da cincia da sociedade. Neste sentido, es-tudamos a importncia de eventos como a Revoluo Industrial, a Revoluo Francesa, o Renascimento e o Iluminismo para a mudan-a das relaes sociais e relaes de trabalho, bem como as novas formas de pensar a vida social foram fundamentais para gestar o sur-gimento da Sociologia, que nasceu com o objetivo de analisar os problemas sociais que ficaram mais visveis com o surgimento da so-ciedade capitalista.

    A partir de toda a contextualizao do surgimento da Sociologia, passamos para o conhecimento das matrizes clssicas da Socio-logia vistas nos dois primeiros perodos (seja com base no positivismo de Durkheim, do ma-terialismo histrico de Marx ou da abordagem compreensiva de Weber) e dos desdobramen-tos dessas perspectivas na Sociologia Contem-pornea (englobando o estrutural funcionalis-mo, a teoria da ao social, o interacionismo simblico, a etnometodologia) ou em ques-tes mais atuais (com a perspectiva crtica da Escola de Frankfurt, a compreenso do siste-ma e do mundo da vida, a ampliao do con-ceito de classes sociais, a investigao da mo-dernidade, novas relaes de tempo e espao, globalizao, entre outros), at a influncia dessas perspectivas no desenvolvimento da Sociologia Brasileira. Voc pde perceber que existe um fio condutor no estudo da Sociolo-gia, com desdobramentos em outros campos de sua influncia.

    Assim, estudos mais aprofundados em reas como, por exemplo, da Sociologia da Educao, Sociologia do Trabalho, Sociologia Urbana e Sociologia Rural iro constituir-se em campos especializados do debate nas Cincias Sociais para compreender como se processam diferentes fenmenos sociais em cada uma dessas reas, amparado por um conjunto te-rico estabelecido, que varia de acordo com a perspectiva sociolgica adotada e com os m-todos de investigao produzidos.

    No caso especfico da Sociologia Urbana, as anlises sociolgicas fundamentam-se no estudo sobre os fenmenos urbanos a partir das relaes sociais, econmicas, polticas e culturais que acontecem no espao urbano e, consequentemente, tambm se refletem no prprio estudo sobre as cidades.

    Se considerarmos que o surgimento da Sociologia, em geral, foi influenciado pelas transformaes ocasionadas, principalmente, pela Revoluo Industrial e consolidao do modo de produo capitalista, a Sociologia Urbana como campo especializado desse de-bate, inicialmente, procurou refletir sobre o impacto desses processos no crescimento das cidades, nos modos de vida da populao ur-bana em expanso e na diversidade e quanti-dade de problemas urbanos que passaram a existir.

    As abordagens sobre a questo urbana foram desenvolvidas com vieses diferentes, influenciados pelas vrias correntes do pensa-mento sociolgico, que configuraram leituras sobre o espao urbano e as relaes sociais nele presentes, seja com base em uma pers-pectiva mais econmica, seja pela da tcnica, da cultura, do indivduo, do coletivo, do polti-co e outras.

    Das questes tratadas no incio de forma-o do campo da Sociologia Urbana, muitas ainda so atuais. Porm, as cidades contem-porneas so marcadas a cada dia por uma avalanche de novas questes e problemas, principalmente em sua dimenso social, o que transforma essa disciplina em um constante desafio para seus estudiosos.

    nesse sentido que apresentamos a Dis-ciplina de Sociologia Urbana para voc. Como um campo de estudo em que teoria e empiria caminham juntas, em que as dimenses espa-cial, econmica, poltica, cultural e social das cidades manifestam-se nas anlises de gran-des tericos da Sociologia clssica e contem-pornea, com desdobramentos em nossa per-

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    UAB/Unimontes - 7 Perodo

    cepo sobre os fenmenos urbanos e como eles se manifestam em nosso cotidiano.

    Para aprofundarmos um pouco mais es-ses temas, a disciplina est estruturada em trs unidades. Na primeira unidade apresentam-se o contexto de surgimento da Sociologia Urba-na e os elementos para uma teoria sobre o ur-bano, em que a cidade analisada a partir de critrios culturais, econmicos e polticos.

    Na segunda unidade, apresentam-se o Planejamento Urbano e a Gesto Urbana como estratgias de ao e interveno no espao urbano, tanto em sua dimenso fsica quanto social, aprofundando a anlise sobre a insero desse debate no contexto da Poltica Urbana no Brasil.

    Na ltima unidade, busca-se discutir um pouco mais sobre os problemas urbanos das cidades contemporneas, em especial das ci-dades brasileiras, como a excluso social, a segregao espacial, a violncia e a violao

    dos direitos humanos que atinge boa parte da populao urbana, no s do Brasil, como em muitos outros pases. Por outro lado, eviden-ciam-se novas perspectivas, principalmente com a emergente preocupao com a qualida-de de vida urbana incorporada busca por um outro tipo de desenvolvimento urbano. Por ltimo, ainda so abordadas novas questes urbanas do mundo contemporneo, que mo-dificam e diversificam a compreenso de es-pao nas cidades, seja atravs de investigaes sobre cyberespao, cidades globais, consumo, sustentabilidade urbana e outras.

    Esperamos que voc aproveite o estudo da disciplina para ampliar seu campo de co-nhecimento no universo das Cincias Sociais.

    Bom estudo para voc!

    As autoras.

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    Cincias Sociais - Sociologia Urbana

    UNIDADE 1O contexto do surgimento da sociologia urbana

    Esta Unidade tem como objetivo definir a Sociologia Urbana como um dos ramos da Sociologia que tem como objeto central de estudo o meio urbano e seus desdobramen-tos na vida social. Desse modo, importante compreender em que contexto essa disciplina surge, bem como quais foram as correntes do pensamento sociolgico que influenciaram as interpretaes sobre o conjunto inicial de transformaes ocorridas no espao das cida-des e nas relaes sociais a partir da Revoluo Industrial e da expanso do capitalismo.

    Iremos estudar como se deu o surgimen-to da Sociologia Urbana e quais foram os pri-meiros tericos que empreenderam anlises no sentido de compreender o fenmeno ur-bano. Inicialmente vamos ver que os estudos de Sociologia Urbana tinham como objeto privilegiado a cidade e, nesse sentido, con-forme Nunes (1998), tem-se tambm no Brasil uma tradio em pensar a cidade e a questo urbana, ou seja, h uma relao estreita entre a cidade e o urbano. Para o autor o enfoque utilitarista prevaleceu na maioria das anlises feitas, j que condicionava a compreenso da cidade ao carter poltico da urbanizao.

    Neste contexto, a maioria da produo acadmica condicionou-se s evidncias em-pricas de que a transferncia da populao do campo para as cidades se dava em funo da carncia das condies materiais bsicas para uma vida no campo, assim, alm da procura por emprego, que, concomitantemente in-dustrializao, houve a urbanizao.

    Ainda vamos ver que quando se d o sur-gimento da Sociologia Urbana, na Universida-de de Chicago, os tericos concentraram suas anlises na cidade, sendo que o que os dife-renciava era o vis analtico de cada um de-les. Destacaram-se, sobretudo, duas vertentes tericas sobre a cidade: 1) a cidade analisada sob uma perspectiva cultural, cujo foco reflete qual a influncia desta nova forma de socia-bilidade humana no indivduo. Nesta vertente os principais autores so: Weber, Simmel, Wir-th e Park; 2) a cidade analisada por critrios polticos e econmicos, cujo foco o deter-minismo econmico como fator interveniente da vida na cidade. Os autores centrais so Karl Marx, Henry Lefbvre, Paul Singer e Manuel Castells. Na prxima seo destacaremos o surgimento da Sociologia Urbana.

    1.1 Surgimento da sociologia urbana

    A formao de cidades no um processo recente, tendo assumido, ao longo dos tempos, diferentes signi-ficados. Desde as civilizaes da Antiguidade, da Idade Mdia, passando pelas cidades modernas e, mais recente-mente, as cidades contemporneas, h diversas interpreta-es sobre suas delimitaes conceituais.

    Devido s diferentes influncias do contexto histrico e social, as cidades tm sido analisadas a partir de mlti-plos olhares, como da Histria, Geografia, Arquitetura e Urbanismo, Economia ou Sociologia, que buscam decifrar, de forma isolada ou interdependente, a complexidade de aspectos sociais, culturais, econmicos, polticos, geogr-ficos e/ou histricos que caracterizam seus processos de formao, expanso, consolidao, fragmentao, entre outros.

    Figura 1: Cidade Grega. Civilizao Micnica (1450 a.C.)Fonte: VEIGA, Ana. Planeja-mento Urbano. Seminrios TIM. EE/ UFMG.

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    UAB/Unimontes - 7 Perodo

    No seio da sociedade moderna, o fenmeno da urbaniza-o consolidou-se a partir de uma formao socioespacial do-minante, configurada no mbito de um processo social histori-camente especfico o modo de produo capitalista. Atravs das dinmicas e transformaes trazidas pelo capitalismo, as cidades que j existiam ou que foram criadas a partir de sua ex-panso passaram a se configurar como centros, no s das ati-vidades econmicas, mas, tambm, das atividades polticas, hu-manas e culturais.

    Nesse processo, evidencia-se um conjunto de transforma-es nas cidades urbanizadas e emergncia do espao urbano para alm de uma delimitao fsica. O urbano passa a ser sin-nimo de um conjunto de relaes sociais especficas, vivencia-das no contexto de transformaes advindas com o incio da Revoluo Industrial.

    Os novos acontecimentos colocados pela consolidao da civilizao capitalista refletiram-se em novas formas de organi-zao da vida social por meio da modificao das relaes de trabalho, dos costumes, das instituies, e outros aspectos. Com a rpida industrializao e urbanizao de algumas cidades, vie-ram tambm o aumento de problemas como de alcoolismo, vio-lncia, prostituio, suicdio, doenas, etc.

    Esses acontecimentos passaram a ser objeto de estudo de diversos pensadores, que coloca-vam a sociedade em um plano de anlise, constituindo-se em problema, em objeto a ser inves-tigado, preocupados no s em compreender as novas condies de vida geradas pela Revolu-o Industrial, mas, tambm, em introduzir modificaes na sociedade (MARTINS, 1994).

    Assim, verifica-se que o contexto de surgimento da Sociologia Urbana se confunde com o prprio processo de surgimento da Sociologia, uma vez que muitas questes abordadas pela So-ciologia em seu incio tm relao direta com o meio urbano e as relaes sociais desenvolvidas em seu interior. Dentre os autores da Sociologia Clssica, Weber desenvolveu uma tipologia so-bre as cidades e destacou a sua dimenso poltica. Durkheim influenciou estudos positivistas so-bre as cidades, com impacto direto na obra da 1 fase da Escola de Chicago. A influncia da anli-se sobre o Capitalismo de Marx e Engels teve desdobramentos importantes no desenvolvimento da Sociologia Urbana em uma perspectiva crtica.

    Nessa perspectiva, a Sociologia Urbana ser, ento, um ramo da Sociologia que se centra na dimenso urbana dos diversos aspectos da vida social. Ela se interroga sobre a maneira segundo a qual o meio urbano se constitui em objeto de estudo por meio da compreenso de como dife-rentes agentes e interesses estruturam as relaes sociais e espaciais nesse contexto especfico.

    Porm, a complexidade da produo do espao urbano formada pela multiplicidade de as-pectos envolvidos proporciona variadas possibilidades de interpretao e abordagens de an-lise. A partir da centralidade dada a um ou outro aspecto, algumas abordagens urbanas signi-ficativas foram reflexos ora da interpretao das novas relaes estabelecidas entre as cidades capitalistas e a construo de modos de vida diferenciados, com influncia direta sobre o com-portamento dos indivduos e o sistema social (estudos ligados Ecologia Humana da Escola de Chicago no incio do Sc. XIX, por exemplo, e sua influncia em abordagens interpretativas mais atuais); ora de abordagens de cunho mais economicista (que analisavam a questo urbana a par-tir da busca pela maximizao do uso do espao na estruturao urbana) ou do desdobramento de anlises do sistema capitalista feito por abordagens marxistas que, atravs do pressuposto te-rico do materialismo histrico e da dialtica, procuraram compreender os reflexos das contradi-es capitalistas na produo material e social do espao.

    PARA SAbER MAIS Neste primeiro momen-

    to, falar de urbano era falar de cidade. Hoje, diferentemente, falar

    de cidade falar de urbano, mas falar de

    urbano no necessaria-mente falar de cidade,

    j que uma pessoa pode morar na zona

    rural, mas pelo fato de ter acesso informao atravs da televiso, da internet e outros meios

    pode ser considerada um cidado urbano.

    Figura 2: Gravura de Londres no incio Sculo XIX. Fonte: Disponvel em: http://conhecimentogeohistoria.blogspot.com/2011/05/revolucao-industrial.html . Acesso em 11 de out. 2011.Legenda: Excessiva concentrao urbana. Falta de saneamento e moradias precrias eram problemas tpicos dos grandes centros industriais ingleses como Londres, no Sculo XIX.

    DICAAlguns autores, entre eles o prprio Carlos

    Benedito Martins, no livro O que Socio-logia, afirmam que a Sociologia nasceu

    objetivando analisar os problemas sociais que surgiram com a

    sociedade capitalista. Porm, a anlise de

    Karl Marx, que tinha como objeto de an-lise a luta de classes,

    nos mostra que nas sociedades anteriores

    ao capitalismo, ou seja, o escravismo e o

    feudalismo, tambm existiam problemas

    sociais devido opo-sio entre as classes.

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    Cincias Sociais - Sociologia Urbana

    1.2 Principais correntes de pensamento

    Apesar das dificuldades em se criar uma tipologia sobre o estudo das cidades, Brbara Frei-tag (2006), em seu livro Teorias da cidade, prope uma abordagem interdisciplinar, envolvendo registros da realidade que perpassam caminhos entre o urbano, o econmico, o poltico, o social e o cultural, para compreender e explicar o fenmeno urbano atravs dos tempos.

    A partir de sua anlise, a leitura da questo urbana desemboca na disciplina de sociologia urbana, defendida por vrias escolas de pensamento sociolgico. Para exemplificar a discus-so proposta pela autora, elaboramos um quadro no qual podem ser identificadas as principais correntes definidas pela autora, que abrangem um conjunto de tericos que pensam a questo urbana e o fenmeno das cidades com base em sua cultura, tempo, tradies filosficas e socio-lgicas.

    Quadro 01 Principais escolas sobre a teoria da cidade e respectivos autores

    Escola Alem Escola FrancesaEscola Anglo-Saxnica do Reino Unido

    Escola Anglo-Saxnica Americana

    Autores e principais ideias desenvolvidas

    - Max Weber- George Simmel.Enfatizavam em suas anlises a cidade a par-tir de uma perspectiva cultural, bem como a forma de sociabilidade dos citadinos no contex-to da cidade.

    - Manuel Castels- Henri Lefevre. Centravam suas anli-ses na transformao dos espaos urbanos produzida pela apro-priao dos habitantes que os ocupam.

    - Thomas Morus- Peter HallCentravam em trs grandes modelos de cidade: o modelo utpi-co; o modelo das cida-des jardins e o modelo da cidade cultural.

    - Os representantes da Escola de Chicago (Park e Wirth).- Richard Sennet- Saskia SassenEnfatizavam a questo urbana a partir do urbanismo, da histria da cultura urbana e da viso ps-moderna de cidade.

    Fonte: elaborao prpria a partir de FREITAG, 2006.

    Dentro dessa diversidade, muitos estudiosos da rea consi-deram que a Sociologia Urbana surgiu, de forma sistemtica, no final de Sculo XIX, concomi-tantemente criao do Depar-tamento de Sociologia da Uni-versidade de Chicago. A criao do referido departamento teve como objetivos analisar os pro-blemas sociais da cidade, j que Chicago seguia a mesma ten-dncia de Nova York e Filadlfia (as trs maiores cidades ameri-canas) e se encontrava com uma taxa de crescimento muito gran-de, com cerca de trs milhes e meio de habitantes em 1890 (COULON, 1995).

    O crescimento da cidade de Chicago foi consequncia de fatores como migraes em mas-sa de estrangeiros: alemes, escandinavos, irlandeses, italianos e judeus. Nesse sentido, Chicago se tornou uma cidade industrial que, a partir do crescimento do capitalismo, assistiu a grandes greves operrias. Mas era, tambm, a cidade da arte e da cultura, influenciada pela religio pro-testante. Assim, tornou-se uma cidade moderna com grandes prdios construdos a partir do de-senvolvimento arquitetnico modernista.

    GLOSSRIOEcologia Humana: O conceito de ecologia humana e a concepo ecolgica da sociedade foram muito influencia-dos pelas abordagens tericas do evolu-cionismo social, ao sustentarem uma ana-logia entre os mundos vegetal e animal, de um lado, e o meio social integrado pelos seres humanos, de outro.

    Fonte: Escola de Chi-cago - UOL Educao. Disponvel em: www.uol.com.br/sociologia/escola-de-chicago--contexto-histrico.jhtm . Acesso em: 08 nov. 2011.

    PARA SAbER MAISBrbara Freitag no livro Teorias da Cidade faz uma excelente contextua-lizao das escolas do pensamento sociol-gico sobre a cidade com destaque para os principais autores representantes das escolas supracitadas, bem como as princi-pais teses defendidas por eles. Quem tiver interesse em apro-fundar sobre esta temtica deve ler o livro cuja referncia completa est nas referncias bibliogr-ficas.

    Figura 3: A cidade de Chicago na dcada de 1890. Fonte: Disponvel: www.chuckmanchicagonos-talgia.wordpress.com. Acesso em 30 jul. 2011.

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    UAB/Unimontes - 7 Perodo

    O departamento de Sociologia e Antropo-logia da Universidade de Chicago tornou-se, a partir de 1910, o principal centro de estu-dos e de investigao sociolgica dos Estados Unidos. O referido departamento foi fundado por Albion Small, que teve um grande papel na instalao da Sociologia, tanto em Chicago como nos Estados Unidos. Small iniciou sua carreira de professor universitrio ministrando aulas de Sociologia Alem.

    O autor Albion Small influenciou decisi-vamente a Sociologia americana, tanto como professor quanto como gestor, j que dirigiu o departamento de Sociologia da Universida-de de Chicago no perodo de 1892 (ano de sua fundao) at 1924 quando se aposentou.

    Outro fator importante da sociologia de Chicago foi a orientao multidisciplinar. Os pes-quisadores da Sociologia estabeleceram interface com outras disciplinas do conhecimento, entre elas, a Antropologia, a Cincia Poltica, a Psicologia e a Filosofia. Agora que vocs j conhecem um pouco sobre o surgimento da Sociologia Urbana, nas prximas Unidades vamos conhecer os principais autores da Sociologia Urbana que analisavam a cidade numa perspectiva cultural e, tambm, aqueles que privilegiavam aspectos polticos e econmicos para sua anlise.

    RefernciasCOULON, Alain. A Escola de Chicago. Campinas, SP: Papirus, 1995.

    FREIGAG, Brbara. Teorias da Cidade. Campinas, SP: Papirus, 2006.

    MARTINS, Benedito. O que Sociologia. 34 ed. So Paulo, Brasiliense, 1994.

    PARA SAbER MAISAlbion Small (1854-

    1926) estudou em Berlim onde conheceu um grande terico da

    Sociologia Urbana que foi George Simmel, e estudou histria,

    filosofia e a sociologia alems. Depois de con-cludos os seus estudos

    retornou aos Estados Unidos e concluiu o

    doutorado em Histria Social. Para saber mais ler o livro A Escola de

    Chicago de Alain Cou-lon, referncia no final

    desta unidade.

    Figura 4: Foto de Albion Small, fundador da Sociologia Urbana na Universidade de Chicago. Fonte: Disponvel em: www.brocku.ca/mEADpRO-JECT/Timeline/ASAPresidentials.html. Acesso em: 30 jul. 2011

    ATIVIDADEEm grupos de 4

    pessoas fazer a leitura do primeiro captulo do livro A Escola de

    Chicago e comparar os problemas sociais

    da cidade de Chicago levantados pelo autor

    com os problemas sociais da sua cidade e/

    ou cidades prximas.

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    Cincias Sociais - Sociologia Urbana

    UNIDADE 2A cidade enquanto fenmeno cultural

    Nesta unidade vamos estudar os autores que estudaram a cidade em uma perspectiva cul-tural, ou seja, o que era central para estas anlises centrava-se em saber qual era a interferncia da nova sociabilidade humana no cotidiano dos indivduos. Vamos focar nossa anlise em quatro autores que muito contriburam para a Sociologia Urbana: dois representantes da escola alem: Max Weber e George Simmel, e dois representantes da escola americana: Louis Wirth e Robert Park.

    2.1 Max Weber: conceito e categorias da cidade

    Caros acadmicos, vocs devem estar pensando: estudar o Weber de novo? Mas ele no era apenas o terico da sociologia clssica? Sim, ele . Ao lado de Karl Marx e Emile Durkheim so os representantes da Sociologia Clssica, como ns estudamos no primeiro e no segundo perodo.

    Alm de ser um grande representante da Sociologia Clssica, Weber tambm se dedicou aos estudos urbanos. O texto central do autor para analisar a cidade numa perspectiva cultural foi escrito em Conceito e categorias da cidade. Nesta obra, apesar de o autor considerar um nmero de pessoas como cidade, acha que isto no suficiente para designar a cidade. A partir desta constatao ele define a cidade a partir de critrios empricos e considera tambm como fatores culturais. A cidade para ele um fato eminentemente cultural.

    A localidade considerada sociologicamente significaria um estabelecimento de casas pegadas umas s outras ou muito juntas, que representam, portanto, um estabelecimento amplo, porm conexo, pois do contrrio faltaria o conhe-cimento pessoal mtuo dos habitantes, que especfico da associao de vizi-nhana (WEBER, 1976 p.68).

    O texto chave para entender a concepo de Weber sobre a cidade Conceito e categorias da cidade onde vai explicitar sua definio de cidade. Na procura do conceito ele comea considerando que a definio de cidade envolve um quantitativo de indivduos. Portanto, o que gera a cidade so estes indivduos que moram uns juntos aos outros. Outro fator importante considerado por Weber para definir a cidade so as rela-es de vizinhana, diferentemente da representao de vizinho que ns conhecemos de senso comum. O conceito de vizinho durkheiniano, ou seja, o vizinho aquela pessoa com quem desenvolvimentos laos de so-lidariedade social. Portanto, o vizinho aquele que concebemos de sen-so comum. aquela pessoa que tem livre acesso a nossa casa, que nos pede coisas emprestadas, enfim, que sabe quase tudo da nossa vida. J a vizinhana no sentido weberiano aquela relao interessada. Lem-bra do conceito de ao social com relao a fins? aquele tipo de ao social onde o ator define um fim/objetivo e a combina todos os meios para se chegar a este fim. A relao de vizinhana isso, ou seja, uma re-lao interessada. Este tipo de relao caracterstico da cidade, j que no campo os laos so mais por afetividade, solidariedade.

    Figura 5: Foto de Max Weber. Fonte: Disponvel em: www.biologojeovani.blogspot.com . Acesso em: 30 de jul. 2011.

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    UAB/Unimontes - 7 Perodo

    Ainda na perspectiva weberiana da cidade enquanto um elemento cultural, o autor considera que a alimentao estaria sob a responsabilidade da produo origi-nria da indstria. Ele define ainda como caractersticas da cidade: aglomerao, re-laes de vizinhana que produzem indi-vduos diferentes dos vindos da rea rural, sustenta de produtos transformados mais do que os outros vindos da agricultura. D um peso essencial ao mercado. Neste con-texto, a cidade seria o local da troca de pro-dutos. A dinamizao da cidade por ser o espao de interao da troca e dos produ-

    tos. Os consumidores seriam aqueles que possuam dinheiro para a compra de produtos. Centra no comrcio a viabilidade da aglomerao e privilegia a circulao de produtos para caracterizar a cidade.

    Alm dos produtores, Weber d um peso grande aos consumidores, que, nas suas anlises, seriam aqueles que possuam dinheiro para a compra de produtos, sendo o comrcio que viabili-zaria a aglomerao. Assim, privilegia a circulao de produtos para caracterizar a cidade.

    Um aspecto importante a ser destacado a partir da leitura do texto que a cidade no um fenmeno exclusivo da produo capitalista. Considera a cidade de produtores e comerciantes e destaca a importncia da cidade como local do lugar da produo que vai consolidando pouco a pouco. Para ele no existe um tipo puro de cidade; elas apresentam sempre um carter misto que tem caractersticas da era moderna.

    Weber construiu uma tipologia das cidades e definiu vrios tipos das mesmas, tais como: as cidades agrrias, que seriam caracterizadas como cidades pequenas. Contrariamente, a cidade na era moderna aquela que tem que ter uma produo industrial para o sustento. Portanto, procurou classificar as cidades na Histria. Cada um dos tipos de cidade tem um modelo de ges-to correspondente quele modelo. Fator importante: a natureza poltica, ou seja, a prtica de gesto do espao urbano.

    Freitag (2006) discute a tipologia de cidade trabalhada por Weber e d alguns exemplos de cidades que ilustram a referida tipologia:

    A cidade do prncipe, Postsdam,Versalhes, Braslia; a cidade do consumo, Dar-mastadt; a cidade produtora, Manchester, Bochum e So Paulo; a cidade co-mercial, exemplificada pelas cidades hanseticas, Hamburgo, Lubeck e Kiel (FREITAG, 2006 p. 25).

    A autora, fazendo a leitura da concepo de cidade e suas respectivas funes em Weber, coloca ainda:

    Cada um desses tipos preenche, prioritariamente, uma funo principal: ser sede do governo, por a instalar-se a moradia do prncipe, rei, monarca, presi-dente, etc; ser uma cidade meramente consumidora, sem produo prpria, como cidade de aposentados, pensionistas, estudantes. [...] ser essencialmente industrial, produtora, como Manchester, Chicago, Detroit, Volta Redonda; ser uma cidade de mercado, exportadora, ou porturia, como Hamburgo e as cida-des da liga hansetica na Alemanha, como Marselha, na Frana (FREITAG, 2006, p.25).

    Mas, como discutimos antes, Weber no trabalha com tipos puros, mas sim tipos mistos. Vocs se lembram do conceito de ao social? Embora ele tivesse definido quatro tipos puros de ao social, chamava a ateno que no existiam tipos puros, j que o indivduo na sua ao poderia combinar dois ou mais tipos de motivaes. Neste sentido, a sua discusso sobre as fun-es da cidade tende a seguir a mesma lgica metodolgica, como destaca Freitag na citao abaixo:

    Os tipos mistos, empricos, apresentam acmulo de funes ou as preenchem no decorrer de sua evoluo no tempo, como o caso de modernas metrpo-les que tendem a ser, ao mesmo tempo, sede do governo, cidade produtora e consumidora, cidade porturia (pensemos nos modernos aeroportos) e, at mesmo, sede do dinheiro (FREITAG, 2006, p.25).

    PARA SAbER MAISVoc se lembra que Weber nunca traba-

    lhou com tipos puros, mas sim tipos mistos. Lembra dos conceitos

    de ao social e dos conceitos de domi-

    nao. Ele definia os tipos de ao social (afetiva, tradicional,

    racional com relao a valores e racional com relao a fins),

    mas considerava que no existia um tipo puro, mas um

    tipo misto, j que os indivduos poderiam

    agir a partir de vrias motivaes. Tambm

    com o conceito de dominao ele seguiu

    a mesma metodo-logia. Definiu trs

    tipos de dominao: dominao legal, dominao tradi-

    cional e dominao carismtica. Mas

    tambm considerava que poderia existir um lder que fosse

    legal e carismtico ao mesmo tempo.

    Figura 6: Cidade fortaleza.

    Fonte Disponvel em http://www.google.com.

    br/imgres?q=cidades+antigas+fortalezas&um Acesso

    em: 17 de out. 2011.

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    Cincias Sociais - Sociologia Urbana

    Em termos metodolgicos, Weber traba-lhou com uma perspectiva histrico-evolutiva, ou seja, coisas que acontecem no territrio variam muito no tempo e no espao. O espa-o produz um novo tipo de indivduo, e para a existncia deste pressupe outro tipo de sta-tus. 1) O cidado; 2) o estrangeiro e 3) o empre-srio. Na Antiguidade estes existiam, mas s a partir da industrializao uma pessoa (estran-geiro) poderia residir em um local que no era o seu.

    Com o capitalismo, comea-se a moneta-rizar as relaes. Pressupe o cidado que pos-sui o produto e comercializa com quem quiser, diferente do servo que s poderia comerciali-zar com o senhor feudal. Neste contexto o que caracterizava o indivduo que vivia na cidade era a liberdade, ou seja, o cidado urbano como cidado livre.

    O autor supracitado chama a ateno para liberar a questo econmica das amarras do se-nhor feudal. Portanto, este indivduo no produz mais para o senhor feudal e, sim, para o comr-cio, o que culmina na autonomizao do campo jurdico e poltico. Em suma, na cidade o campo econmico adquire uma racionalidade prpria que estrutura as relaes jurdicas e polticas. O que interessa a atividade do indivduo na produo dentro do espao da cidade. Ento, a cida-de na perspectiva weberiana lugar do novo, onde se estabelece relaes diferentes da socieda-de feudal.

    Agora que vocs j sabem um pouco mais sobre o Weber, j que estudamos que ele no apenas um grande terico clssico da sociologia, mas que tambm dedicou grande parte do seu tempo ao estudo da cidade, vamos estudar outro autor que alemo como Weber e que tambm fez vrias discusses tericas sobre a cidade, ou seja, a influncia da grande metrpole na vida nervosa dos indivduos. Esperamos que vocs gostem da perspectiva de George Simmel sobre a cidade.

    2.2 George Simmel: a metrpole e a vida mental

    Outro importante terico da sociologia urbana o Geor-ge Simmel. Embora ele no seja muito estudado no Brasil, foi um grande terico da sociologia, contemporneo de Max We-ber, e se dedicou a vrios temas, tais como: a moda, a filoso-fia do amor, a filosofia do dinheiro, etc. Ele enfatizava em suas pesquisas o contexto da industrializao e da grande diviso do trabalho, mas, especificamente, como o desenvolvimento das relaes sociais na grande cidade culminou na intensifica-o da vida da vida nervosa dos indivduos. A fim de cumprir este desiderato, ele comea considerando como o sculo XVIII exigiu a especializao funcional do homem e seu trabalho. Essa especializao torna um indivduo incomparvel a outro e cada um deles indispensvel na medida mais alta possvel. As-sim, essa especializao torna cada homem proporcionalmen-te mais dependente de forma direta das atividades suplemen-tares de todos os outros. Mas o homem uma criatura que procede a diferenciaes.

    Assim, a vida moderna nas grandes cidades exige cada vez mais do indivduo um tipo de adaptao a esta nova rea-lidade de forma que ele se adapte ao estilo de vida da cidade, sem perder as suas origens, o que ele traz do lugar de onde veio para viver numa grande cidade.

    Figura 7: Cidade de mercado. Fonte: Disponvel em: http://www.google.com.br/imgres?q=cidade+de+rotherd . Acesso em 17 de out. 2011.

    DICAQuem tiver interesse em aprofundar seus estudos na anlise que Weber fazia da cidade, ler o texto de Brbara Freitag, Teorias da Cidade, onde a autora faz uma tima reflexo sobre o texto de Weber.

    Figura 8: Foto de Simmel. Fonte: Disponvel em: www.pt.wikipedia.org. Acesso em 30 jul. 2011.

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    UAB/Unimontes - 7 Perodo

    Neste contexto, em cada atravessar da rua, com o ritmo e a multiplicidade da vida econ-mica ocupacional e social, a cidade grande faz um contraste profundo com a vida da cidade pe-quena e a vida rural, no que se refere aos fundamentos sensoriais da vida psquica. Nesta pers-pectiva, a metrpole extrai do homem, enquanto criatura que procede a discriminaes, uma quantidade de conscincia diferente da que a vida rural extrai. Na zona rural, contrariamente, o ritmo da vida e do conjunto sensorial de imagens mentais fluem lentamente, de modo mais ha-bitual, mais uniforme. A partir da d para compreender como a vida nas metrpoles se enrazam nas camadas mais inconscientes do psiquismo e crescem sem grande dificuldade ao ritmo cons-tante da aquisio ininterrupta de hbitos.

    O tipo metropolitano de homem desenvolve um rgo que o protege das correntes e dis-crepncias ameaadoras de sua ambientao externa, as quais, ao contrrio, o desenraizariam. Ele reage com a cabea, ao invs de com o corao. A vida metropolitana implica uma conscin-cia elevada e uma predominncia da inteligncia no homem metropolitano. A intelectualidade se destina a preservar a vida subjetiva contra o poder avassalador da vida metropolitana.

    A grande cidade como o lugar da Blasiertheit, do francs blas (indiferente, in-sensvel), que se refere ao fato de que as coisas so comercializveis, compr-veis, mesmo o amor. Isso se manifesta entre os citadinos como desinteresse por aquilo que os cerca, distncia pessoal. O anonimato passa a ser uma van-tagem na vida urbana. Nela, todos so estrangeiros entre si. Os outros no nos interessam, no nos importamos com eles (FREITAG, 2006, p. 22).

    Para o autor supracitado, a metrpole sempre foi a sede da economia monetria. Nela, a multiplicidade e concentrao da troca econmica do uma importncia aos meios de troca que a fragilidade do comrcio rural no tinha permitido. A economia monetria e o domnio do in-telecto esto intrinsecamente vinculados. O homem metropolitano negocia com seus fornece-dores e clientes, seus empregados domsticos e frequentemente at com pessoas com quem obrigado a ter intercmbio social. Por causa desse intercmbio social, a metrpole moderna provida quase que inteiramente pela produo para o mercado, para compradores inteiramen-te desconhecidos, que nunca entram pessoalmente no campo de viso propriamente dito do produtor. Neste contexto, a economia do dinheiro domina a metrpole; ela desalojou as ltimas sobrevivncias da produo domstica e a troca direta de mercadorias; ela reduz diariamente a quantidade de trabalho solicitado pelos clientes.

    Para Simmel, os relacionamentos e afazeres do metropolitano tpico so habitualmente to variados e complexos que, sem a mais estrita pontualidade nos compromissos e servios, toda a estrutura se romperia e cairia num caos.

    A tcnica da vida metropolitana inimaginvel sem a mais pontual integrao de todas as atividades e relaes mtuas em um calendrio estvel e impessoal. Pontualidade, calculabilida-de, exatido, so introduzidas fora na vida pela complexidade e extenso da existncia me-tropolitana e no esto apenas muito intimamente ligadas sua economia do dinheiro e car-ter intelectualstico. Tais traos devem tambm colorir o contedo da vida e favorecer a excluso daqueles traos e impulsos irracionais, instintivos, soberanos, que visam determinar o modo de vida de dentro, ao invs de receber a forma de vida geral e precisamente esquematizada de fora.

    Figura 9: As relaes sociais numa cidade pequena e o isolamento numa grande cidade. Fonte: Disponvel em: www.memoriasdomar.blogspot.com . Acesso em 14 out. 2011.

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    Cincias Sociais - Sociologia Urbana

    As grandes cidades, principais sedes do intercmbio monetrio, acentuam a capacidade que as coisas tm de poderem ser adquiridas muito mais notavelmente do que as localidades meno-res. por isso que as grandes cidades tambm constituem a localizao da atitude blas. Com a atitude blas a concentrao de homens e coisas estimula o sistema nervoso do indivduo at seu mais alto ponto de realizao, de modo que ele atinge seu pice.

    O horizonte da cidade se expande de uma maneira comparvel ao modo pelo qual a riqueza se desenvolve, certo volume de propriedade cresce de modo semi-automtico em progresso sempre mais rpida. A caracterstica mais significativa da metrpole essa extenso funcional para alm de suas fronteiras fsicas. A cidade consiste em seus efeitos totais, que se estendem para alm de seus limites imediatos.

    As grandes cidades, antes de mais nada, como lugares da mais alta diviso eco-nmica e social do trabalho. Nelas, impe-se a necessidade da especializao e da alta competncia. Cada um d o melhor de si em sua rea. A cidade como um novo valor na histria mundial do esprito, graas a essas qualidades e ca-ractersticas da metrpole. As cidades tornam-se a expresso, o rosto, o lado visvel da vida mental de uma sociedade, que lhes conferem feies prprias (FREITAG, 2006, p. 22-23).

    Na concepo de Simmel, as cidades so sede da mais alta diviso econmica do trabalho. funo da metrpole fornecer a arena para combate e reconciliao dos combatentes, ou seja, as interaes sociais entre os indivduos. A metrpole apresenta as condies peculiares que nos so reveladas como as oportunidades e os estmulos para o desenvolvimento de ambas essas maneiras de conferir papis aos homens. Em suma, a metrpole se revela como uma daquelas grandes formaes histricas em que correntes opostas que encerram a vida se desdobram, bem como se juntam s outras com igual direito.

    Agora que ns estudamos um pouco a teoria de Simmel sobre a cidade como elemento cul-tural, vamos adentrar-nos na teoria social de outro importante pensador que segue a mesma li-nha de anlise de George Simmel e de Max Weber, que Louis Wirth.

    Para no acumular muita leitura sem uma sistematizao dos pensamentos dos autores, gostaramos de solicitar de vocs que faam a leitura dos autores anteriores e vo destacando os principais pontos de divergncias e semelhanas entre os mesmos.

    2.3 Louis Wirth: o urbanismo como modo de vida

    Seguindo esta linha de anlise em que se privilegia a cidade como fenmeno cultu-ral, outro grande autor da sociologia urbana Louis Wirth. O seu texto O urbanismo como modo de vida constitui um marco referen-cial dentro da produo da escola de Chicago sobre a sociologia urbana. O autor procura uma definio sociolgica de sociologia da cidade preocupado como estava na formula-o de uma abordagem que pudesse servir como instrumento para atrair ateno sobre as inter-relaes que se passam na sociedade urbana. Podemos lembrar que a Escola de Chicago tinha em seu laboratrio vivo uma realidade absolutamente original de misturas de culturas as mais diferenciadas, que atual-mente esto sendo chamadas de multicultu-ralismo, de resto, um fenmeno tipicamente urbano/ metropolitano.

    DICAPara compreender melhor a teoria de Simmel sobre a cidade, pesquise na sua cidade se existem moradores que vieram de outras cidades e observe em suas casas ou em seus cotidianos se eles preservam alguma coisa do lugar de onde vieram. isso que Sim-mel chama de usar o objetivo para preservar o subjetivo.

    Figura 10: Foto de Louis Wirth. Fonte: Disponvel em: www.en.wikipedia.org. Acesso em: 30 jul. 2011

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    UAB/Unimontes - 7 Perodo

    Na concepo dele a urbanizao no simplesmente a evidncia de um processo pelo qual as pessoas so atradas para um lugar chamado cidade e incorporados ao seu sistema de vida. Ele incisivo quando afirma que, mesmo se o quantitativo de pessoas numa aglomerao um dado a ser considerado, s poderamos caracterizar uma definio sociolgica do espao urbano quando a este dado agregamos informaes sobre o contexto cultural geral no qual as cidades nascem e vivem: eles s seriam pertinentes na medida em que eles se tratassem de fato-res condicionantes da vida social.

    As suas reflexes questionam a relao mecnica do fenmeno urbano com o fato industrial e mesmo com o capitalismo moderno. Neste sentido, reencontra Simmel, que baseia na relao de troca monetria o aparecimento das cidades, no sentido que as conhecemos hoje. Da mes-ma forma Weber tambm, quando insiste que a cidade por excelncia o lugar do mercado, nas relaes de troca que ele ir se basear para caracterizar a cidade. Nos trs autores o que fica como referncia maior na definio da cidade seria assim a ocorrncia de um contexto espacial importante demograficamente, denso e permanente, onde coexistem indivduos socialmente heterogneos.

    Definiu algumas proposies sociolgicas para o estudo da vida urbana:

    1 Dimenso do agrupamento populacional: embora este no seja um critrio que, por si s, v refletir a complexidade do fenmeno social da cidade, ele d uma importncia relativa de peso. Esta aglomerao complexa de indivduos dar origem segregao espacial em funo da cor da pele, da origem tnica, do status econmico e social, de seus gostos e preferncias. Para ele os citadinos desempenham papis fortemente segmentrios, com relao impessoal com uma grande quantidade de pessoas, mas, ao mesmo tempo, so menos dependentes de pessoas particulares. A cidade se caracteriza mais por contatos secundrios, mais do que prim-rios. Mesmo que os contatos nas cidades sejam aqueles face a face, mas tambm em sua maioria superficiais e segmentados. Entre a liberdade garantida pelo anonimato que permite ao indiv-duo escapar de controles pessoais e afetivos, ele perde tambm sua espontaneidade e torna-se fluida a exigncia de um comportamento moral, tico e mesmo o sentido de uma vida participa-tiva que a caracterstica, mesmo das sociedades mais integradas.

    O superficialismo, o anonimato e o carter transitrio das relaes urbano-so-ciais explicam, tambm, a sofisticao e a racionalidade geralmente atribudas ao habitante da cidade. Nossos conhecidos tm uma tendncia de manter uma relao de utilidade para ns, no sentido de que o papel que cada um desem-penha em nossa vida sobejamente encarado como um meio de alcanar os fins desejados. Embora, portanto, o indivduo ganhe, por um lado, certo grau de emancipao ou liberdade de controles pessoais e emocionais de grupos ntimos, perde, por outro lado, a espontnea auto-expresso, a moral, e o sen-so de participao, implcitos na vida numa sociedade integrada (WIRTH, 1976, p. 101).

    2 Densidade: os espaos urbanos tendem a se espe-cializarem em funo de um uso determinado por critrios de natureza dominante econmica: reas de trabalho, de residncia, de lazer, de comrcio so assim estruturadas se-gundo usos dominantes. impossvel caracterizar uma rea urbana de uma grande e densa aglomerao como algo homogneo. Ao contrrio, na justaposio de personali-dades e de modos de vida muitas vezes divergentes que a viso do indivduo urbano se relativiza e caminha no senti-do de tolerar as diferenas. Em sntese, a densidade popula-cional termina por ser uma das variveis determinantes no modo de vida urbano, estando na base mesma das socieda-des ditas complexas.

    3 Heterogeneidade: A interao social entre uma grande variedade de tipos de personalidade no meio urba-

    no termina por complicar a estrutura de classes, gerando uma estratificao social mais ramifi-cada e diferenciada daquela das sociedades mais integradas. o desenvolvimento social termina por provocar uma alta rotao na participao dos grupos. Conforme afirma o autor: em geral o habitante da cidade termina por no possuir um eu, pois um habitante passageiro no gera

    Figura 11: Densidade da cidade.

    Fonte: Disponvel em: www.blog.ambientebrasil.com.br. Acesso em 14 out.

    2011.

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    Cincias Sociais - Sociologia Urbana

    as tradies e os sentimentos que criam ligaes, raro que ele seja um verdadeiro vizinho. A vida urbana produz uma populao altamente diferenciada e tambm cria os mecanismos de nivelamento dos indivduos. Fazendo uma articulao entre o aparecimento da mquina a vapor como um dos fatores estratgicos para o surgimento das grandes cidades, criou-se a fbrica que produz em massa para um mercado annimo.

    Aps as consideraes para justificar sua definio de cidade como um aglomerado per-manente, relativamente denso e grande, de indivduos socialmente heterogneos, o autor exa-minou as formas de organizao social que mais frequentemente surgem nas cidades, demons-trando que essas formas podiam ser atribudas ao tamanho, densidade e heterogeneidade incomuns. Assim, apresentou vrios argumentos sobre as consequncias do grande tamanho, da elevada densidade e heterogeneidade para a vida social organizada:

    1. O crescimento e a diversidade esto associados na cidade a vnculos relativamente fracos entre os co-residentes, visto que os moradores da cidade tm menos probabilidade do que os moradores do campo de terem vivido juntos durante algumas geraes.

    2. proporo que a cidade cresce, torna-se cada vez menos provvel que qualquer citadi-no conhea todos os outros pessoalmente. Assim, o carter das relaes sociais muda ao mesmo tempo em que se assiste a um aumento no nmero de pessoas com quem as ou-tras travam conhecimento e que, em certa medida, so dependentes.

    3. Uma diviso do trabalho altamente desenvolvida est associada nfase no tratamento das relaes sociais como meio para fins pessoais. Essa diviso do trabalho vai se aperfei-oando na medida em que o mercado cresce.

    4. medida que a cidade cresce, torna-se impossvel reunir todos os seus moradores em um nico lugar.

    5. Com o aumento da densidade populacional em uma rea, a tendncia para cada vez maior a diferenciao e a especializao.

    6. Os contatos fsicos na cidade so estreitos, ao passo que a maioria dos contatos sociais superficial.

    7. Os habitantes da cidade pertencem a uma grande variedade de grupos e suas lealdades a tais grupos so frequentemente conflitantes, visto que os grupos usualmente apelam para aspectos muito diversos da personalidade e suas reivindicaes no so necessaria-mente harmoniosas.Um aspecto importante da teoria

    do autor que ele no sugeriu que o ur-banismo como modo de vida fosse pecu-liar aos citadinos, mas reconheceu que a influncia da cidade vai muito alm das fronteiras administrativas e fronteiras na-cionais.

    Wirth concorda com Weber e Sim-mel em que o mercado e a moeda so elementos estruturantes da vida urbana. A produo em massa termina por ca-racterizar a produo industrial urbana, decorre da a necessria integrao do in-divduo em movimentos de massa, completando a natureza ambivalente da vida urbana, carac-terizada pela atrao-repulsa dos indivduos entre si. Insiste que a cidade mais uma consumi-dora de homens do que produtora de homens: prevalece neste espao os contatos secundrios em detrimento daqueles contatos primrios.

    Nesta situao ocorrem inmeros movimentos na organizao da sociedade, especialmente se enfraquecem as ligaes de parentesco e o declnio da significao social da famlia, o desa-parecimento das relaes de vizinhana e a eroso das bases tradicionais da solidariedade social. Neste caldo de culturas, com modos de vida altamente diferenciados, onde aparece de forma permanente a indiferena e a tolerncia caracterizando o espao urbano por um lugar de con-trastes os mais violentos. O controle social que deve necessariamente a ser feito deve se efetuar, sobretudo a partir de grupos organizados formalmente. Portanto, a autodeterminao, tanto no domnio econmico, poltico quanto no cultural, reduz-se a uma forma pura de falar, ou melhor, submete-se, na melhor das hipteses, ao equilbrio instvel dos grupos de presso. Diante da perda de foras verdadeiras, laos de parentesco, criam-se grupos de parentesco fictcio.

    Sintetizando as reflexes de Wirth sobre o fenmeno urbano entendido como modo de vida caracterstico, este poderia ser abordado empiricamente segundo trs perspectivas interligadas:

    Figura 12: Heterogeneidade na cidade. Fonte: Disponvel em> http://www.google.com.br/imgres?q=grupos+heterogeneos. Acesso em 17 out. 2011.

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    UAB/Unimontes - 7 Perodo

    1. Como estrutura material formada sobre a base de uma populao, uma tecnologia e uma ordem ecolgica.

    2. Como sistema de organizao social, comportando uma estrutura social caracterstica, uma srie de instituies sociais e um modelo tpico de relaes sociais.

    3. Como um conjunto de atitudes e de ideias e aglomerado de pessoas envolvidas em for-mas-tipo de comportamento coletivo e submetidas a mecanismos caractersticos de con-trole social.Agora que j estudamos o pensamento de Louis Wirth, vamos adentrar-nos no pensamento

    de Robert Park que, tal como o autor que acabamos de estudar, tambm foi um dos pesquisado-res centrais da Escola de Chicago e que contribuiu muito para os estudos da sociologia urbana. Recomendamos o mesmo exerccio mental por parte de vocs que recomendamos no final dos estudos de Simmel e Weber, que montar um esquema, na cabea de vocs, de como estes au-tores pensavam a cidade e quais eram os elementos privilegiados por eles.

    2.4 Park: a cidade e as sugestes para a investigao do comportamento humano no meio urbano

    O ltimo autor que ns vamos estudar que analisa a cidade a partir de uma perspec-tiva cultural Park. O texto do autor que vai subsidiar nossas reflexes aqui A cidade: sugestes para a investigao do comporta-mento humano no meio urbano. um texto muito importante e tambm altamente did-tico que expe toda a sua concepo teri-co-metodolgica sobre a cidade. Ele inicia o texto afirmando que a cidade pode ser defi-nida como estado de esprito, produto da na-tureza humana, e, portanto, mais do que um amontoado de homens cuja nfase maior nos costumes e tradies.

    Em termos metodolgicos, discute a ci-dade a partir da Ecologia Humana - cincia que procura descrever as constelaes tpi-cas de pessoas e instituies produzidas pela operao conjunta de tais foras. Assim, a es-trutura da cidade s tem sentido se se levar

    em conta a participao do homem, e a mesma no pode ser vista e entendida apenas como uma unidade geogrfica e ecolgica, mas tambm uma organizao econmica. A organizao econmica da cidade baseia-se na diviso do trabalho cuja multiplicidade de ocupaes e profis-ses dentro dos limites da populao urbana um dos mais notveis e menos entendidos aspec-tos da vida citadina moderna.

    Na perspectiva de Park, o que caracteriza a cidade a existncia de homens que habitam nela. Neste contexto, a cidade o habitat natural do homem civilizado onde predomina um tipo de cultura peculiar. Enfim, a existncia da cidade est condicionada a homens que habitam nela pela inter-relao social. O homem constri a cidade, mas ao mesmo tempo dependente dela.

    Do ponto de vista da metodologia, discute a vida urbana a partir de 03 elementos: 1) sua organizao fsica; 2) suas ocupaes e 03) sua cultura.

    Figura 13: Foto de Robert Park.

    Fonte: Disponvel em: www.lib.uchicago.edu .

    Acesso em 30 de jul. 2011.

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    1) Planta da cidade e a organizao local

    Park considerava que a planta da maioria das cidades americanas um tabuleiro de xadrez. A unidade de distncia o quarteiro, isto sugere que a cidade seja uma construo puramente artificial que poderia ser separada e reagrupada como uma casa de blocos. Entretanto, a cidade est enraizada nos hbitos e costumes das pessoas que a habitam. Assim, a cidade possui uma organizao moral e uma organizao fsica, as duas se interagem mutuamente de modos ca-ractersticos para se moldarem uma outra. Apesar de a estrutura ser mais perceptvel por ser visvel, tem suas bases na natureza humana, de que expresso.

    Atravs dos tempos, todo setor e quarteiro da cidade assumem algo do ca-rter e das qualidades dos seus habitantes. Cada parte da cidade tomada em separado inevitavelmente se cobre com os sentimentos peculiares sua po-pulao. Como efeito disso, o que a princpio era simples expresso geogrfica converte-se em vizinhana, isto , uma localidade com sentimentos, tradies e uma histria sua. Dentro dessa vizinhana a continuidade dos processos his-tricos de alguma forma mantida. O passado se impe ao presente e a vida de qualquer localidade se movimenta com um certo momento prprio, mais ou menos independente do crculo da vida e interesses amplos ao seu redor (PARK, 1976, p. 30).

    Na concepo do referido autor, a planta da cidade estabelece metas e limites, fixa de ma-neira geral a localizao e o carter das construes da cidade, e impe aos edifcios levantados pela iniciativa privada, bem como pela autoridade pblica uma arrumao ordenada dentro da rea citadina. Gostos e convenincias pessoais, interesses vocacionais e econmicos tendem in-falivelmente a segregar e, por conseguinte, a classificar as populaes das grandes cidades. As-sim, muitas vezes a cidade foge de um projeto (devido dinamicidade). A expresso geogrfica da cidade se transforma em vizinhana, proximidade e contato entre vizinhos so as bases para a mais simples e elementar forma de associao com que lidamos na organizao da vida citadina. Interesses e associaes locais desenvolvem sentimento local e sob um sistema que faz da resi-dncia a base da participao no governo, a vizinhana passa a ser a base do controle poltico. Na organizao social e poltica da cidade, ela a menor unidade local.

    O sentimento de vizinhana (enraizado nos costumes e tradies locais) exerce uma decisi-va influncia seletiva sobre as populaes das cidades europeias mais antigas, transparecendo, assim, as caractersticas dos habitantes.

    2) A organizao industrial e a ordem moral

    Seguindo sua concepo metodolgica de cidade, Park enfatiza o contraste entre a cidade antiga e a cidade moderna. Enquanto a cidade antiga era uma fortaleza (refgio em tempo de guerra), A cidade moderna uma convenincia do comrcio (deve sua existncia ao mercado e praa onde foi erigida). A competio industrial e a diviso do trabalho s so possveis por cau-sa da existncia do mercado, do dinheiro e de outros expedientes para facilitar os negcios e o comrcio.

    A cidade oferece um mercado para os talentos especficos dos indivduos. A competio pessoal tende a selecionar, para cada tarefa especfica, o indivduo mais adequado para desem-penh-la. Neste sentido, a cidade libera os indivduos para seguirem seus talentos.

    Os efeitos da diviso do trabalho enquanto disciplina, isto , enquanto os meios de moldar o carter, podem, portanto, ser melhor estudados nos tipos vocacionais que a diviso do trabalho produziu. Entre os tipos cujo estudo po-deria interessar esto: a vendedora, o guarda noturno, a quiromante, o come-diante de teatro de revista, o balconista de bar, o reprter, o corretor de fundos pblicos, todos estes so produtos caractersticos das condies da vida citadi-na; cada um, com sua experincia, perspectiva e ponto de vista especficos, de-termina sua individualidade para cada grupo vocacional e para a cidade como um todo (PARK, 1976, p. 38).

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    O comrcio e a indstria preparam o caminho para uma nova diviso do trabalho e, dessa forma, tendem posteriormente a especializar as tarefas nas quais o homem encontra suas voca-es. H uma ruptura com a antiga organizao social e econmica que se baseava em laos fa-miliares, associaes locais, na tradio, casta e status, e sua substituio por uma organizao baseada em interesses ocupacionais e vocacionais.

    Assim, qualquer vocao tende a assumir um carter de profisso e a disciplina que a qual-quer vocao o sucesso impe. No apenas de especializar, mas de racionalizar e desenvolver uma tcnica consciente e especfica. A cidade produz os tipos vocacionais: o ator, o bombeiro, etc. Tambm h uma ruptura nas associaes que se baseavam na associao pessoal e nos laos comuns da natureza humana. H um agrupamento por classes profissionais.

    O espao urbano o espao onde complexifica a diviso do trabalho. A solidariedade se d a partir de uma comunidade de interesses. Esses implicam a existncia de meios e de uma conscincia da distino entre meios e fins. O dinheiro o principal artifcio pelo qual os valores foram racionalizados e os sentimentos substitudos pelos interesses. A extenso da organizao industrial, que se baseia nas relaes impessoais definidas pelo dinheiro, tem avanado passo a passo com uma crescente mobilidade da populao.

    Esta mobilidade ampliada pela educao, pela capacidade de ler e extenso da econo-mia monetria a um nmero de interesses da vida sempre crescente, na medida em que tende a despersonalizar as relaes sociais. A concentrao das populaes em cidades, os mercados maiores, a diviso do trabalho, a concentrao de indivduos e grupos em tarefas especficas tm continuamente mudado as condies materiais de vida e realizado reajustamentos s novas con-dies cada vez mais necessrios.

    O mercado (origem da cidade moderna) um desses dispositivos, mais interessantes que so as trocas a bolsa de valores e a junta do comrcio onde os preos esto constantemente sendo fixados em resposta s mudanas nas condies econmicas atravs de todo o mundo. Park entendia a crise como uma condio normal das variaes de cmbio. Pnicos financeiros que algumas vezes seguem as crises financeiras so uma precipitao dessa condio crtica.

    A cidade grande, onde as relaes humanas tendem a ser impessoais e racionais, definidas em termos de interesse e em termos de dinheiro, num sentido bem real um laboratrio para a investigao do comportamento coletivo. O resultado que os enormes agregados casuais e mveis que constituem nossas populaes urbanas esto em estado de perptua agitao. A co-munidade est numa crise crnica.

    3) Relaes secundrias e controle social

    As mudanas na organizao industrial (transportes modernos e comunicao urbanos) e na distribuio da populao tm sido acompanhadas pelas mudanas correspondentes nos h-bitos, sentimentos e carter da populao urbana. O crescimento das cidades foi acompanhado por relaes indiretas, secundrias, nas associaes de indivduos na comunidade.

    Grande parte das instituies (igreja, escola e famlia) tem sido sob influncias desintegran-tes da vida citadina, grandemente modificadas. Considerava que a ruptura das unies locais e o enfraquecimento das restries e inibies do grupo primrio influenciados pelo meio urbano que so responsveis pelo aumento do vcio e do crime nas grandes cidades.

    Com relao s formas de controle social coloca que a opinio pblica torna-se importante como uma fonte de controle social em sociedades baseadas em relaes secundrias, de que as cidades grandes so tpicas. Nos grupos secundrios e na cidade, a moda tende a substituir o costume, e a opinio pblica, mais do que os mores, torna-se fora dominante do controle social.

    4) O temperamento e o meio urbano

    O cidado urbano muda vrias vezes ao dia (de casa para o trabalho, do trabalho para o bar, etc.). Uma parcela bem grande da populao vive boa parte do tempo como as pessoas em al-gum grande hotel, encontram-se, mas sem se conhecer umas s outras. Assim h a substituio das associaes mais ntimas e permanentes da comunidade menor por uma relao causal e fortuita.

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    A cidade muitas vezes se transforma em um mosaico de pequenos mundos que se tocam, mas no se interpenetram. Esse carter superficial e adventcio complica as relaes sociais e produz tipos sociais novos e divergentes.

    A atrao da metrpole devido ao fato de o indivduo encontrar entre as variadas mani-festaes da vida citadina o tipo de ambiente no qual se expande e se sente vontade, encontra o clima moral em que sua natureza peculiar encontra os estmulos. A cidade pequena no tole-ra o homem em excentricidade. A cidade, pelo contrrio, a recompensa. Nem o criminoso, nem o defeituoso, nem o gnio, tem na cidade pequena a mesma oportunidade de desenvolver sua disposio inata que invariavelmente encontra na cidade grande. Em suma, a cidade mostra em excesso o bem e o mal da natureza humana. Isso justifica a perspectiva que faz da cidade um laboratrio ou clnica onde a natureza humana e os processos sociais podem ser estudados con-venientemente e proveitosamente.

    Como vocs acabaram de estudar, os autores Weber, Park, Simmel e Wirth se dedicaram a analisar a cidade de uma perspectiva cultural, o que interessava aos autores era o tipo de socia-bilidade desenvolvido nas cidades. Na prxima unidade vamos estudar as concepes de cidade de outros autores que privilegiavam em suas anlises as influncias polticas e econmicas para entender o desenvolvimento das cidades.

    Referncias FREITAG, Brbara. Teorias da Cidade. Campinas, SP: Papirus, 2006.

    PARK, Robert. A cidade: sugestes para a investigao do comportamento humano no meio ur-bano. In: Velho , Otvio Guilherme. (org). O Fenmeno Urbano. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1976.

    SIMMEL, Georg. A Metrpole e a Vida Mental. In: Velho, Otvio Guilherme. (org). O Fenmeno Urbano. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1976.

    WEBER, Max. Conceito e Categorias da Cidade. In: Velho, Otvio Guilherme. (org). O Fenmeno Urbano. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1976.

    WIRTH, Louis. O Urbanismo como modo de Vida. In: Velho, Otvio Guilherme. (org). O Fenmeno Urbano. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1976.

    Figura 14: A cidade para Park o lugar que aceita todo tipo de indivduo tanto o excntrico quanto o mendigo. Fonte: Disponvel em: http://www.google.com.br/imgres. Acesso em: 17 out. 2011.

    ATIVIDADEAps a leitura siste-mtica da segunda unidade, faa um quadro comparativo de Weber, Park, Simmel e Wirth destacando as semelhanas e diver-gncias entre eles, em relao ao indivduo e suas relaes sociais e a perspectiva de cidade.

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    UNIDADE 3 A cidade determinada atravs de critrios polticos e econmicos

    Inicialmente, podemos perceber que a abordagem culturalista influenciou a maioria dos es-tudos que consolidaram a Sociologia Urbana como uma disciplina no campo das Cincias So-ciais. Porm, existem outras abordagens que seguiram um caminho diferente. Nessa outra linha de pensamento, as categorias econmicas passam a ser fundamentais, ora enfatizadas isolada-mente, ora seguidas por reflexes no campo poltico e social do meio urbano.

    Na primeira corrente, destacam-se os trabalhos que relacionam a economia marginalista e a cidade. Essa corrente centra-se na compreenso do espao urbano a partir da importncia da lo-calizao urbana para influenciar a tomada de deciso dos agentes econmicos, buscando obter a maximizao dos lucros a partir do equacionamento entre as relaes de produo e consumo.

    Segundo Vras (2000), essa corrente entende a cidade capitalista a partir de uma aborda-gem positivista e matemtica baseada no equilbrio do sistema de preos, tendo como pressu-posto a concepo da sociedade humana como um palco da luta econmica entre agentes pri-vados e consumidores, reguladas pelo mercado.

    Ao analisar o espao urbano, esse visto por meio da localizao e da aglomerao, catego-rias centrais que influenciam a relao do espao com a economia, poltica e tecnologia, eviden-ciando que a aglomerao evitaria despesas de fretes e protege as unidades de produo das deseconomias externas. Assim, a cidade vista como mercadoria, chamando a ateno para as regularidades do processo capitalista e racionalizao da produo, na qual a realidade urbana reduzida s negociaes mercantis da troca, focalizando as empresas, as unidades industriais e seus papis, desconsiderando a dimenso social (VRAS, 2000).

    No outro extremo de uma interpretao economicista da cidade, surge a teoria marxista, que abrange a economia capitalista ao mesmo tempo em que denuncia contradies nas rela-es de produo, inserindo aspectos sociais e polticos na compreenso do espao urbano. Essa perspectiva e sua influncia no campo da Sociologia Urbana sero aprofundadas nos tpicos se-guintes.

    3.1 As contribuies de Marx e Engels para o estudo das cidades: bases para uma sociologia urbana crtica

    No h como negar a importncia das anlises desenvolvidas por Marx acerca da lgica de funcionamento do capitalismo, assunto que voc viu intensamente nas discusses de Sociologia Clssica. Embora Marx no tenha produzido nenhum texto que tratasse diretamente sobre a ci-dade capitalista enquanto objeto de estudo, ela constitui todo o pano de fundo de sua obra por ser o local onde se d a metamorfose do capital.

    Ao contrrio de Marx, Engels (1975) aprofundou um pouco o debate sobre a cidade como espao de luta entre burguesia e proletariado a partir do livro em que faz uma brilhante descri-o acerca da situao da classe trabalhadora na Inglaterra nos anos de 1845, na qual so evi-denciadas as condies precrias dos bairros operrios de algumas cidades industriais inglesas do final do Sculo XIX, um exemplo emblemtico que retrata a influncia da lgica capitalista e

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    da determinao econmica nas relaes de trabalho e, consequentemente, no modo de vida os operrios, buscando reconhecer as causas e razes da desordem urbana evidenciada.

    A partir de uma pesquisa exploratria nas cidades de Londres, Manchester, Birmingham e outras, Engels (1975) denuncia que os traos encontrveis em qualquer bairro operrio da cidade capitalista por volta de 1845 caracterizavam-se por blocos de casas ou cmodos e pores alu-gados, construes irregulares e precrias, desprovidas de infraestrutura urbana (esgoto, abaste-cimento de gua). Em vrias passagens de sua descrio, a semelhana com algumas situaes com as quais convivemos no mundo de hoje, denunciam que quase depois de dois Sculos, mui-tos problemas ainda continuam os mesmos. Observe a citao abaixo:

    As grandes cidades so habitadas, sobretudo, por operrios que no possuem nada; eles vivem de seu salrio, a cada dia; a sociedade, tal qual ela , lhes deixa o cuidado de suprir suas necessidades e de sua famlia; ela no lhes fornece os meios de faz-lo de uma maneira eficaz e durvel (ENGELS, 1975, p. 116).

    Ainda com relao forma como a desigualdade social era reproduzida no espao urbano

    por meio da segregao entre as classes, o autor expe que:

    Todas as grandes cidades possuem um ou vrios bairros de m reputao onde se encontra a classe operria. certo que frequente a pobreza morar em vielas escondidas, muito perto dos palcios dos ricos; mas, em geral, desig-nam-lhe um lugar parte, onde, ao abrigo de olhares das classes mais felizes, tem de se safar sozinha, melhor ou pior (ENGELS, 1975, p. 59).

    O reflexo da situao da classe trabalhado-ra de algumas cidades inglesas se espalhou pelo mundo medida que a industrializao se ex-pandia. Exemplo desse processo a descrio de bairros e cortios na cidade de So Paulo no incio do processo de industrializao no Brasil, eviden-ciando a segregao, a pobreza e as contradies capitalistas.

    Segundo Lefbvre (2001), para entender a entrada da cidade no pensamento marxista, preciso compreender os processos de diviso do trabalho e da ideologia para perceber a com-plexidade, as diferenas e as contradies dessa sociedade. Em linhas gerais, o autor expe que a cidade para Marx vista a partir de uma dupla acepo do termo: o lugar onde se produzem as obras diversas, inclusive aquilo que faz o sentido da produo: necessidades e prazeres; por outro lado, o lugar onde so produzidos e trocados os bens, onde so consumidos.

    A partir da compreenso da obra de Marx, possvel perceber que, ao longo dos Sculos XIX e XX, o espao urbano passou a concentrar os locais de produo e reproduo do capital, onde os homens obtm as condies necessrias sua sobrevivncia de forma desigual, o que resulta em contradies na forma como se produz e distribui a riqueza social. Assim, as aglome-raes urbanas refletem a diviso social e territorial do trabalho no processo de acumulao ca-pitalista, no qual se concentram: os meios de produo e a fora de trabalho, o capital e o prole-tariado, a produo e o consumo, os prazeres e as necessidades (VRAS, 2000).

    A obra marxista foi importante tambm para influenciar autores que desenvolveram uma concepo crtica acerca do processo urbano, principalmente a partir da dcada de 1970, com o agravamento dos problemas sociais que se evidenciavam no meio urbano.

    Tericos como Lefbvre, Castells e Harvey propuseram, nos anos 1970 e 1980, uma reno-vao crtica da pesquisa urbana, na qual os problemas sociais manifestados na cidade passaram a ser vistos como desdobramentos da dinmica das relaes de produo e estrutura de poder na sociedade capitalista, sendo o espao urbano caracterizado como um produto social das con-tradies e conflitos de classe (SOUZA, 2008).

    Figura 15: Cortio na Rua dos Invlidos, em So Paulo. Fonte: Disponvel em: www.vivercidades.org.br . Acesso 13 out. 2011.

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    As obras desses autores de influncia marxista so consideradas uma renovao crtica das pesquisas urbanas na medida em que divergem do vis centrado na influncia culturalista, prin-cipalmente dos trabalhos da Escola de Chicago. Segundo Vras (2000, p.16).

    Esses estudos denunciavam a raiz dos problemas urbanos na propriedade pri-vada do solo urbano, na desigualdade de acesso aos equipamentos, aos servi-os urbanos, habitao tratada como mercadoria e inacessvel s camadas de menores rendimentos, na existncia de bairros populares e extensas periferias desequipadas.

    Ao expor o quadro de desigualdades que ainda acompanha a constituio do urbano vin-culado expanso capitalista nas cidades, essa abordagem influenciou o desenvolvimento de estudos que procuram explicar processos e mudanas ocorridas no urbano, levando-se em conta aspectos econmicos, mas, tambm, sublinhando processos polticos, prticas de consumo, mo-vimentos sociais e aes do Estado, o que aproxima o debate sobre a cidade como construo sociolgica de um objeto de estudo que tambm um espao da vida e da conquista da cidada-nia (VRAS, 2000, p. 107).

    Embora muitas anlises do desenvolvimento capitalista tenham se centrado na perspec-tiva econmica refletida na compreenso das contradies entre capital e trabalho, ressaltar a dimenso poltica para problematizar as relaes espaciais urbanas revela novos conflitos que permeiam o cotidiano urbano, notadamente no ponto que diz respeito ao desigual acesso aos bens de consumo coletivo.

    Nesse sentido, contribuies como as de Castells (2006) e Lefbvre (2008) so importantes para aprofundar a anlise do urbano baseada na emergncia de processos contraditrios, vincu-lados esfera poltica, com nfase nas intervenes do Estado e surgimento de novas demandas coletivas no contexto urbano.

    3.2 Manuel Castells: O estruturalismo marxista no espao urbano

    Manuel Castells um dos socilogos contemporneos mais importantes da atualidade, principalmente por suas pesquisas e estudos na rea da tecnologia da informao e comunicao, sendo destaque a trilogia de livros publicada sobre A Era da Informao: Economia, Sociedade e Cultura.

    Porm, durante a dcada de 1970, o autor estudou a influncia dos conflitos sociais na paisagem urbana, sendo considerado uma importante referncia para estudos ur-banos em uma linha marxista. Seu livro, A questo urbana (1970), passou a ser referncia para socilogos, urbanistas e planejadores urbanos, sobretudo na Amrica Latina.

    Segundo Freitag (2006), A questo urbana procura mostrar que a problemtica urbana fundamental em nossa sociedade, formada por problemas concretos que precisam de categorias adequadas para analis-los; apesar de partir de uma base marxista, o autor reconhece alguns dos limites que a contribuio marxista trouxe para a rea, uma vez que a maior parte dos problemas urbanos faz parte da esfera da reproduo; por ltimo, expe que o papel central do Estado, no atual processo de urbanizao, exige uma teoria capaz de integrar a anlise do espao com as lutas sociais e os processos polticos.

    Figura 16: Foto de Manuel CastellsFonte: Disponvel em: www.comunicacaoepolitica.

    com.br. Acesso em: 28 jul. 2011.

    PARA SAbER MAISembora Karl Marx seja um dos grandes auto-res clssicos da sociolo-gia, ele no se ocupou em sua vasta obra a fazer uma discusso especfica sobre a cidade. Mas como toda a sua anlise caminha no sentido de criticar o capitalismo e, a partir da, propor um projeto poltico-revolucionrio para a ruptura com o modo de produo capitalista e a instaura-o de uma sociedade comunista. Para Marx esta mudana s seria possvel a partir da luta de classes e, ainda, sendo que a oposio entre a classe dominan-te e a classe dominada seria acirrada com a industrializao e como a industrializao um fenmeno caracters-tico das cidades, po-demos inferir, a partir da leitura de Marx, sua grande influncia para os estudos da cidade. Engels foi o grande parceiro de Marx e como este tambm in-fluenciou autores para analisarem a cidade a partir da influencia de critrios polticos e econmicos.

    DICAPara aprofundar o contedo, consulte as obras de Henry Lefeb-vre, O direito cidade (1968); A revoluo urbana (1970); O pensa-mento marxista e a cida-de (1972) e A Cidade do Capital (2001). Manuel Castells, A questo urbana (1972). David Harvey, A justia social e a cidade (1980).

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    Partindo da teoria marxista como ponto de partida e base para sua anlise, Castells prope uma reflexo sobre a questo urbana com nfase nos aspectos econmicos como determinantes dos processos polticos e sociais. Assim, a cidade e seus espaos so entendidos como estruturas subordinadas e ligadas ao processo de produo capitalista e reproduo social em sua totalida-de.

    Para Castells (2006), a problemtica urbana tornou-se fundamental na sociedade, principal-mente quando analisada sob a tica da reproduo da fora de trabalho e de sua formalizao em meio ao sistema urbano, por exprimir formas de articulao entre as classes, a produo, o consumo e o Estado. A partir de uma anlise integrada do espao com as lutas sociais e os pro-cessos polticos, o autor evidencia que a apropriao e o uso do espao nas cidades refletem a desigualdade entre os homens, gerada pela interveno do capital no consumo do espao e, dessa forma, no se pode entender o processo de consumo sem o ligar acumulao do capital e s relaes polticas entre as classes (CASTELLS, 2006, p.551).

    Nessa perspectiva, uma unidade urbana no ser somente uma unidade em termos de con-sumo de produo, mas tambm um espao cotidiano, em termos de residncia e servios cor-respondentes, delineado pelo processo de reproduo da fora de trabalho que se diferencia em dois tipos: o consumo individual e o consumo coletivo (CASTELLS, 2006). Em linhas gerais, o con-sumo individual seria o de bens necessrios reproduo da fora de trabalho enquanto mer-cadoria e vinculado acumulao do capital. Assim, dentro da lgica capitalista, tudo poderia tornar-se mercadoria e, logo, ser objeto de consumo individual.

    Porm, Castells (2006) chama a ateno para o consumo que no faz parte direta da esfera do mercado, mas que representando pelo consumo no qual o tratamento econmico e social se faz por meio do aparelho do Estado e no pode ser convertido em mercadoria, pois, no pro-cesso de produo, no gera taxa de lucro satisfatria ao capital. Seriam os bens coletivos, ou seja, aqueles bens ou servios sobre os quais o Estado deve ter o monoplio para assegurar o in-teresse da classe capitalista no seu conjunto e a partir dos quais se estruturam as reprodues da fora de trabalho e das relaes sociais. Para esclarecer, observe a descrio feita no Box 1 sobre o que seriam essas necessidades sociais.

    BOX 1

    Na segunda metade do sculo XX, essas necessidades passam a revelar-se sob a tica dos equipamentos coletivos, zoneamento do territrio, higiene pblica, etc. Cabe lembrar aqui que a cidade influi nas condies de vida da populao: a prpria organizao do espao urbano, da infra-estrutura e dos servios determina a qualidade de vida. Na reproduo da fora de traba-lho, esta tem de consumir e esse consumo pode-se dividir em individual (aqueles bens e servi-os comprados individualmente, como alimentos, roupas, mveis, casas, atendimento mdico, beleza) dependendo do dinheiro recebido em forma de salrio. H, porm, servios que so de uso coletivo, mas aos quais o acesso individual e para aqueles que possam pag-los (e so or-ganizados geralmente para estes): a chamada infra-estrutura urbana gua, esgoto, eletricidade , os transportes coletivos, certas formas de lazer e divertimentos pblicos. H, tambm, uma srie de bens e servios cujo custo recai sobre a coletividade de pagantes de impostos: abertura de ruas, parques e praas, coleta de lixo, iluminao pblica, etc. O acesso a esses servios se faz desigualmente pela valorizao imobiliria, pois os terrenos e moradias melhor servidos so mais caros, causando assim a distribuio espacial da populao.

    Fonte: VRAS, Maura. Trocando Olhares: uma introduo construo sociolgica da cidade. 2000, p.77.

    Voc pode perceber que muitas dessas necessidades ainda continuam as mesmas, princi-palmente na realidade no nosso pas. A importncia dessa forma de compreender as relaes sociais no meio urbano est em identificar que a realizao de necessidades e seus impactos nas condies de vida da populao no se revelam da mesma forma para todos no espao urbano. Com a prevalncia do acesso desigual a servios e equipamentos, a discusso acerca dos bens de consumo coletivo e sua distribuio constituem esses novos conflitos que transpem a dicoto-mia capital/trabalho e se firmam nas contradies cotidianas.

    Partindo de uma anlise sociolgica da questo urbana, Castells (2006, p. 351) aponta que sua essncia est no estudo da articulao especfica dos processos designados como urbanos com o campo da luta de classes e, por conseguinte, com a interveno da instncia poltica (apa-ratos do Estado) objeto e centro da luta poltica. Esse campo se agrava medida que os proble-mas urbanos tornam-se problemas polticos, explicitados pelo estreitamento das contradies e

    GLOSSRIOPlanificao Urbana:

    a interveno do pol-tico sobre a articulao especfica das diferen-tes instncias de uma

    formao social no seio de uma unidade cole-tiva de reproduo de

    trabalho com a finalida-de de assegurar sua re-produo ampliada, de regular as contradies no-antagnicas susci-

    tadas e de reprimir as contradies antagni-cas, assegurando assim

    os interesses da classe social dominante no

    conjunto da formao social e a reorganizao

    do sistema urbano, de modo que se d a

    reproduo estrutural do modo de produo

    dominante. (CASTELLS, 2006, p. 541).

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    Cincias Sociais - Sociologia Urbana

    maior visibilidade da dominao de classe, principalmente na esfera do consumo, que ser mar-cada pelos efeitos da desigualdade social considerados como quase naturais (CASTELLS, 2006, p.351).

    Nesse contexto, o estudo da poltica urbana assume destaque e, para sua melhor compreen-so, Castells (2006) enfatiza a planificao urbana e os movimentos sociais urbanos como cam-pos analticos que esto diretamente ligados. Observe a definio dada pelo autor para a planifi-cao urbana e os movimentos sociais no glossrio.

    A partir dessa relao entre movimentos sociais urbanos e conflitos sociais, essa obra de Castells foi apropriada por boa parte dos estudos urbanos no Brasil, influenciando diversas linhas de pesquisa acerca da realidade das cidades brasileiras at bem pouco tempo. Mesmo que o autor reconhea limitaes sua prpria obra, principalmente a partir de um distanciamento da teoria marxista nos seus temas d