SOLOS ILP: melhor para a palhada, saída para a compactação · feras. Além do efeito físico, as...

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28 | DEZEMBRO 2015 SOLOS ILP: melhor para a palhada, saída para a compactação A integração lavoura-pecuária é a opção mais indicada para melhorar a física de solo, manter a cobertura vegetal e promover o retorno econômico ao produtor de maneira ambientalmente sustentável Dr. Edemar Moro, professor e pesquisador da Unoeste, especialista em ILP, e Dr. Juliano Carlos Calonego, professor e pesquisador da Unoeste, especialista em Física de solo O s sistemas de manejo, ou mes- mo as condições em que o solo é trabalhado, podem promover al- terações na qualidade estrutural dos so- los, que além de causar danos ambien- tais prejudicam o desenvolvimento das plantas causando redução de produtivi- dade. O sistema plantio direto (SPD) seria a solução da agricultura tropical. O problema é que a área de 30 milhões de hectares considerada como SPD con- templa de forma correta apenas um dos princípios do sistema, o não revolvimen- to do solo. A rotação de cultura e a co- bertura morta, na maioria dos casos, não são observadas da maneira como deveriam. O que predomina hoje no Brasil é a sucessão de culturas, soja-milho safri- nha, ou então, soja-pousio. A área de soja no Brasil é superior a 30 milhões de hectares, sendo que dessa área o mi- lho safrinha ocupa apenas 9 milhões de hectares. Somando-se à área de milho safrinha com cereais de inverno e as demais culturas de segunda safra (fei- jão, girassol, sorgo, amendoim...), tem- se uma área cultivada após a soja de 15 milhões de hectares. Isso significa que mais de 50% da área após soja é deixa- da em pousio. O pousio, além de não rentabilizar economicamente o produ- tor, aumenta as chances da degradação Fotos: Edemar Moro

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28 | DEZEMBRO 2015

SOLOS

ILP: melhor para apalhada, saída para a

compactação

A integração lavoura-pecuária é a opção mais indicada para melhorar afísica de solo, manter a cobertura vegetal e promover o retorno econômico

ao produtor de maneira ambientalmente sustentávelDr. Edemar Moro, professor e pesquisador da Unoeste, especialista em ILP, e Dr. Juliano Carlos Calonego, professor e

pesquisador da Unoeste, especialista em Física de solo

O s sistemas de manejo, ou mes-mo as condições em que o soloé trabalhado, podem promover al-

terações na qualidade estrutural dos so-los, que além de causar danos ambien-tais prejudicam o desenvolvimento dasplantas causando redução de produtivi-dade. O sistema plantio direto (SPD)seria a solução da agricultura tropical.O problema é que a área de 30 milhõesde hectares considerada como SPD con-

templa de forma correta apenas um dosprincípios do sistema, o não revolvimen-to do solo. A rotação de cultura e a co-bertura morta, na maioria dos casos,não são observadas da maneira comodeveriam.

O que predomina hoje no Brasil é asucessão de culturas, soja-milho safri-nha, ou então, soja-pousio. A área desoja no Brasil é superior a 30 milhõesde hectares, sendo que dessa área o mi-

lho safrinha ocupa apenas 9 milhões dehectares. Somando-se à área de milhosafrinha com cereais de inverno e asdemais culturas de segunda safra (fei-jão, girassol, sorgo, amendoim...), tem-se uma área cultivada após a soja de 15milhões de hectares. Isso significa quemais de 50% da área após soja é deixa-da em pousio. O pousio, além de nãorentabilizar economicamente o produ-tor, aumenta as chances da degradação

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do solo, principalmente no que diz res-peito às características físicas.

Tanto a sucessão de culturas comoo pousio são prejudiciais para a boa es-truturação física do solo. É comum as-sociarmos qualidade do solo com aquantidade de palhada. Nos solos are-nosos a palhada é importante para evi-tar o adensamento superficial do solo.No gráfico desta página, o solo arenosorefere-se à área de pastagem degradadano Oeste paulista com solo exposto.Pode-se observar que nessas condiçõesa camada superficial do solo arenosoapresenta um adensamento superior aoargiloso. Quando o solo arenoso não estácoberto por palhada, ocorre o selamen-to superficial por obstrução dos porospelas partículas de argilas que são maisfinas do que a areia. Apesar de não secaracterizar como solo compactado,esse selamento gera uma dureza super-ficial que dificulta a infiltração de águado solo.

O solo argiloso no gráfico refere-sea uma área de mais de 20 anos de “plantiodireto” no Oeste do Paraná, sendo que,na maioria dos anos agrícolas, predo-mina a sucessão soja-milho. A ausênciade rotação de culturas em solos argilo-sos acarreta em problemas de física dosolo, com valores de resistência à pe-netração na camada 20 a 25centímetros próximos a 5 MPa(Megapascal) e na camada 40a 60 centímetros superiores a7 MPa. Nos anos normais dechuva, a “compactação” dossolos argilosos não compro-mete a produtividade das cul-turas, apesar de aumentar aschances de erosão. Porém,quando ocorrem veranicos, osprejuízos podem ser grandes,tendo em vista, que as raízesterão dificuldades para rom-per as camadas adensadas dosolo e acessar regiões commaior umidade.

ILP & SPD — A soluçãopara a aplicação correta doSPD e aos problemas de com-pactação do solo é a integra-ção lavoura-pecuária (ILP). AILP encaixou-se perfeitamen-te no SPD, e permite ajustar oconceito que dá base e susten-tação ao sistema. A integraçãoadicionou melhorias ao SPD

em dois aspectos: o primeiro foi que,além da rotação de culturas, agregou aconsorciação de espécies; e o segundofoi priorizar a manutenção do solo ve-getado, enquanto que a prioridade doSPD é a manutenção de cobertura mor-ta. Do ponto de vista da física de solo,a manutenção de uma espécie vegetan-do na área é primordial para evitar acompactação do solo. Quanto maior éo tempo que o solo permanece com plan-tas no ciclo vegetativo, maior será aquantidade de raízes nesse solo e maiorserá o efeito na qualidade física do solo.

Assim como o sistema radicular, aparte área das plantas de cobertura tam-bém surte efeitos na física do solo. Oprimeiro deles é a proteção do solo con-tra o impacto direto das gotas de chu-va. Um solo sem cobertura vegetal (vivaou morta) fica suscetível ao primeiroprocesso de erosão, conhecido como“salpicamento”, quando a gota da chu-va atinge diretamente o solo causandoa desestruturação dos agregados, e,consequentemente, o selamento super-ficial.

Outro importante papel da palhada naqualidade física do solo diz respeito àdiversidade microbiológica que a cober-tura morta proporciona. Quando o solonão é exposto à ação direta dos raios

solares, sofrendo menores amplitudestérmicas e não sendo submetido a cons-tantes ciclos de umedecimento e seca-gem, milhões de microrganismos desen-volvem-se e auxiliam na humificação damatéria orgânica e na formação de agre-gados, resultando no aumento da poro-sidade do solo e no equilíbrio entre ma-cro e microporos, ou seja, no equilíbrioentre aeração e retenção de água (indis-pensável para a vida do solo). Além dis-so, maior atividade dos organismos dosolo (macro e microfauna) na transfor-mação dos restos vegetais em húmusproporcionará maior friabilidade ao solo,tornando-o menos suscetível à compac-tação. Por essas razões devem ser prio-rizados sempre sistemas que contem-plem a rotação de culturas com foco emativar a microbiota do solo e a elevaçãodos teores de matéria orgânica.

Escarificação biológica — Apesarde todos os problemas ocasionados peloadensamento do solo, a melhor opçãoainda é a escarificação biológica, ou seja,o uso de plantas de cobertura de siste-ma radicular agressivo. As espécies maisindicadas para essa finalidade são asgramíneas que apresentam volume ra-dicular vigoroso, ocupam grande volu-me de solo e ainda produzem grandequantidade de palhada. Quando as gra-

míneas são dessecadas para aimplantação da cultura princi-pal, a decomposição das raízesproporciona um efeito direto nafísica de solo. Cada raiz que sedecompõe deixa um espaçoporoso de menor resistência, oque facilitará o desenvolvimen-to radicular das culturas graní-feras. Além do efeito físico, asraízes decompostas auxiliam nafertilidade do perfil do solo. Osnutrientes liberados em cama-das mais profundas serão utili-zados para o crescimento radi-cular e da parte aérea das plan-tas subsequentes.

Geração de palhada —Uma forma de produzir palha-da e maior volume de raízes nosolo sem abdicar da produçãode grãos é o consórcio de mi-lho com capim. O consórcio foicriado pela Embrapa e denomi-nado como Sistema Santa Fé.Esse sistema é fundamentalpara a sobrevivência da suces-

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são soja-milho, além de produzir gran-de quantidade de palhada para cobertu-ra total do solo, a braquiária “coloniza”,descompacta e agrega o solo. À esquer-da da foto nesta página observa-se que,apesar do não revolvimento do solo, apalhada formada não é suficiente parauma cobertura homogênea do solo, eisso permite a emergência e o desen-volvimento de plantas daninhas. Já nolado direito da imagem, observa-se quea braquiária cobriu todo o solo, evitou osurgimento de plantas daninhas. Alémda importância visível da cobertura dosolo, há de se considerar a grande im-portância do sistema radicular que pro-move a escarificação biológica do solo.

As máximas muito usadas hoje –construir a fertilidade do solo e criarperfil do solo – só terão êxito se foremusadas plantas de cobertura com capa-cidade de produzir grande quantidade dematéria seca, tanto de parte área, quan-to de raiz. Apesar de a ILP ter se desen-

volvido com foco na recuperação deáreas degradadas, o sistema evoluiu eatualmente é indicado também paramelhorar a eficiência de sistemas deprodução com altos níveis de tecnolo-gia. A ILP é fundamental para o suces-so do SPD, especialmente em regiõesde solos arenosos com histórico fre-quentes de veranicos e em regiões desolos argilosos com problemas de com-pactação.

Quando se faz o preparo mecânicopara descompactar o solo, os efeitossão imediatos, porém, os benefícios nafísica do solo não são persistentes. Osequipamentos de preparo promovem aquebra dos agregados, pulverizando o

solo e dando origem a partículas muitopequenas e leves. Essas partículas emum processo natural de acomodaçãoocuparão o espaço poroso, aumentarãoa densidade do solo, constituindo umabarreira ao crescimento radicular emprofundidade.

Além de todos esses inconvenien-tes, o ponto de apoio das ferramentasde preparo do solo acaba recebendo acarga oriunda do peso do implementooriginando uma camada compactadacom alta resistência mecânica à pene-tração. Essa camada compactada loca-lizada aproximadamente a 20 centíme-tros de profundidade, popularmente co-nhecida como “pé-de-grade”, ocasionauma barreira ao crescimento radicular,confinando as raízes nas camadas su-perficiais do solo, tornando as plantassusceptíveis aos períodos de estiageme deficiência nutricional.

O preparo do solo interrompe aindaa continuidade dos macroporos devi-

À esquerda, a palhada não ésuficiente para uma cobertura

homogênea do solo, o quepermite as daninhas; e à direita, a

braquiaria cobriu todo o solo eevitou o surgimento de invasoras

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do ao rompimento e à destruição doscanais deixados no solo pela macro-fauna e pelas raízes da cultura ante-cessora, ou seja, os chamados “biopo-ros”. Os bioporos, além de constituí-rem uma área do solo com melhor qua-lidade química devido aos efeitos damatéria orgânica, são canais que orien-tam o crescimento das raízes em pro-fundidade, porém, a abundância dessescanais será maior em sistemas de pro-dução que priorizam plantas de cober-tura com sistema radicular exuberante,como é o caso das gramíneas. Sendoassim, a ILP é a opção mais indicadapara melhorar a física de solo, mantercobertura vegetal e gerar retorno eco-nômico de forma sustentável e ecolo-gicamente correta.

Uma forma de produzir palhadae maior volume de raízes sem

abdicar da produção de grãos é oconsórcio de milho com capim,

esquema denominado comoSistema Santa Fé