SOLUÇÃO DE CONTROVÉRSIAS · “integração”. O significado usual do termo “integração”...

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CONFERÊNCIA DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE COMÉRCIO E DESENVOLVIMENTO SOLUÇÃO DE CONTROVÉRSIAS ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO COMÉRCIO 3.11 Têxteis e Vestuário NAÇÕES UNIDAS Nova York e Genebra, 2003

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CONFERÊNCIA DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE COMÉRCIO E DESENVOLVIMENTO

SOLUÇÃO DE CONTROVÉRSIAS

ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO COMÉRCIO

3.11 Têxteis e Vestuário

NAÇÕES UNIDAS Nova York e Genebra, 2003

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NOTA

O Curso de Solução de Disputas em Comércio Internacional, Investimento e Propriedade Intelectual compreende quarenta módulos. Este Módulo foi elaborado pelo Sr. Munir Ahmad, a pedido da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD). As visões e opiniões aqui expressas são do autor, e não necessariamente das Nações Unidas, da Organização Mundial do Comércio, da Organização Mundial da Propriedade Intelectual, do Centro Internacional para a Resolução de Disputas sobre Investimentos (ICSID), da Comissão das Nações Unidas sobre Direito do Comércio Internacional (UNCITRAL) ou do Centro de Consultoria em Direito da OMC. Os termos usados e a forma de apresentação do documento não implicam a expressão de nenhuma opinião por parte das Nações Unidas sobre o status jurídico de qualquer país, território, cidade ou área, nem de suas autoridades, ou sobre a delimitação de suas fronteiras ou limites. Nas citações de documentos oficiais e da jurisprudência de organizações e tribunais internacionais, o nome dos países é mantido em sua forma original. As Nações Unidas são titulares dos direitos autorais deste documento. O curso também está disponível, em formato eletrônico, no website da UNCTAD (www.unctad.org). Cópias poderão ser obtidas gratuitamente, por download, no entendimento de que serão usadas para ensino ou pesquisa, e não para fins comerciais. Solicita-se o devido reconhecimento desta fonte. A versão deste módulo em língua portuguesa foi feita pela Srta. Carolina Saldanha, participante do Programa de Capacitação de Advogados da Missão Permanente do Brasil junto às Nações Unidas e outros Organismos Internacionais em Genebra.

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ÍNDICE Nota O que você aprenderá 1 Introdução 1.1 Por que ATC 1.2 Objetivo do ATC 1.3 Escopo das Controvérsias do ATC 1.3.1 Controvérsias Envolvendo Produtos Têxteis e de Vestuário 1.3.2 Controvérsias Sob o ATC 1.3.3 Controvérsias Multidisciplinares 1.3.4 Controvérsias Sob Outros Acordos da OMC 1.4 Principais Dispositivos do ATC 1.4.1 Um Ponto Introdutório 1.4.2 Cobertura de Produto 1.4.3 O Processo de Integração e Seu Mecanismo 1.4.4 Aumentos nas Taxas de Ampliação das Quotas 1.4.5 Salvaguarda Provisória 1.4.6 Supervisão da Implementação 1.4.7 Outros Dispositivos Diversos 2 Corpo de Monitoramento de Têxteis 2.1 Funções do TMB 2.1.1 O Papel de Revisão e Supervisão do TMB 2.1.2 O Papel de Solucionador de Controvérsias do TMB 2.2 Composição do TMB 2.3 Procedimentos do TMB 2.3.1 Procedimentos de Trabalho do TMB 2.3.2 Relatórios do TMB 2.3.3 Limitações do TMB 2.4 Significativos Pareceres do TMB 2.4.1 Pareceres do TMB em seu Papel de Supervisão 2.4.2 Pareceres do TMB em seu Papel de Solucionador de Controvérsias 3 Solução de Controvérsias Segundo o ATC 3.1 Padrões de Revisão 3.2 Estrutura do Artigo 6 do ATC 3.3 Informações Relevantes a Serem Examinadas 3.4 Período de Referência para Selecionar Informações Utilizadas 3.5 Definição de Indústria Doméstica 3.6 Ameaça de Dano Material 3.7 Atribuição de Dano Material 3.8 Retroatividade das Medidas de Salvaguarda 3.9 Novas Restrições Apenas Sob o ATC 4 Panorama Resumido de Controvérsias sob o ATC 4.1 US – Underwear 4.2 US – Wool Shirts and Blouses

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4.3 US – Cotton Yarn 5 Teste Sua Compreensão 6 Um Estudo de Caso 7 Leitura Adicional 7.1 Livros e Artigos 7.2 Relatórios do Painel e do Órgão de Apelação 7.3 Documentos e Informação

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O QUE VOCÊ APRENDERÁ O Acordo sobre Têxteis e Vestuário (Agreement on Textiles and Clothing - “ATC”) é um dos poucos acordos setoriais específicos na OMC. É limitado em seu escopo e na sua duração. Prevê dispositivos a serem aplicados em um período de transição de dez anos, contados a partir de 1995. Seu objetivo básico é assegurar a integração do comércio de têxteis e vestuários às regras normais do GATT, mediante a eliminação gradual das restrições de quotas que vêm sendo há muito aplicadas pelos maiores países desenvolvidos sobre as importações de países e economias em desenvolvimento. Refletindo o escopo específico (e limitado) do ATC, nem todas as controvérsias envolvendo têxteis e vestuário estão sob sua alçada. Por exemplo, as controvérsias relativas a medidas antidumping não recaem no âmbito do ATC. Estão cobertas pelo Acordo Antidumping. Para as controvérsias oriundas de violações do próprio ATC, o Acordo prevê um procedimento em duas etapas. Este procedimento é único para o ATC, uma vez que estabelece uma etapa adicional perante o Órgão de Monitoramento de Têxteis (Textiles Monitoring Body - “TMB”). Casos devem ser considerados pelo TMB antes de serem remetidos ao procedimento do painel. Durante os sete anos e meio em que o ATC vigora, houve várias controvérsias, algumas das quais foram resolvidas pelo TMB. Três passaram por painéis e pelo Órgão de Apelação. Este módulo dá um panorama do ATC, seus principais dispositivos, e como estes foram esclarecidos ou interpretados pelo TMB, por painéis ou pelo Órgão de Apelação. O primeiro Capítulo faz uma breve introdução ao ATC e seus principais dispositivos. O segundo Capítulo descreve o papel e procedimentos do TMB, e traz alguns esclarecimentos significativos resultantes de seu trabalho. O terceiro Capítulo recapitula pareceres importantes de painéis e do Órgão de Apelação oriundos de controvérsias trazidas sob o ATC. Revê ainda alguns pareceres pertinentes de casos em que a violação das obrigações do ATC foram invocadas como um assunto suplementar. Finalmente, o Quarto Capítulo contém um panorama resumido de casos de controvérsias de ATC examinados por painéis e pelo Órgão de Apelação. 1. INTRODUÇÃO Este capítulo apresenta um breve histórico do Acordo sobre Têxteis e Vestuário (Agreement on Textiles and Clothing - ATC), por que ele é necessário, qual é seu objetivo principal, e qual é o escopo das disputas sob o ATC. Este capítulo apresenta ainda um panorama resumido dos principais dispositivos do Acordo. 1.1 Por que ATC O ATC é essencialmente desenhado para corrigir uma antiga anomalia no sistema multilateral de comércio. Histórico Desde 1961, o comércio internacional de têxteis e vestuário estava virtualmente excluído das normas e disciplinas regulares do GATT. Era então governado por um sistema de restrições discriminatórias, que distorciam alguns dos princípios básicos do

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GATT. O sistema foi constituído no chamado Acordo Algodoeiro de Curto Prazo (Short-Term Cotton Arrangement - “STA”), seguido por um Acordo de Longo Prazo (Long-Term Arrangement - “LTA”) e, posteriormente, pelo Acordo Multifibras (Multi-fibre Arrangement - “MFA”). O MFA permaneceu até que os Acordos da OMC entraram em vigor em 1o de janeiro de 1995. Enquanto as regras do GATT proibiam o uso de restrições quantitativas visando proteger indústrias domésticas, o sistema permitia o uso de tais restrições. Enquanto o princípio da Nação Mais Favorecida (“MFN”) do GATT preceituava tratamento igual para todos os países fornecedores, o sistema permitia a imposição de restrições contra importações de determinados países. Tão óbvio desvio dos princípios básicos do sistema multilateral de comércio se constituía em significativa distorção no comércio internacional, sobretudo porque restrições foram principalmente aplicadas sobre importações oriundas de economias em desenvolvimento. Representava também um obstáculo para o desenvolvimento normal do comércio. Entre os principais objetivos da Rodada Uruguai estava a eliminação de tais distorções e aprofundamento da liberalização do comércio. Consistente com esses objetivos, foi acordado que negociações seriam realizadas de forma a trazer a reintegração do setor de têxteis e vestuário para o mesmo arcabouço de regras multilaterais aplicável a qualquer outro setor industrial. E, portanto, o ATC. 1.2 Objetivo do ATC De acordo com seus termos, o objetivo do ATC é integrar o setor de têxteis e vestuário às regras e disciplinas normais do GATT. Artigo 1:1 do ATC Este Acordo estabelece regras a serem aplicadas por Membros [da OMC] durante o período de transição visando à integração do setor de têxteis e vestuário ao GATT 1994. (Grifos do autor). “Integração” elucidada O ATC, entretanto, não estabelece nenhuma definição explícita para o termo “integração”. O significado usual do termo “integração” consiste no ato de unificar ou extinguir a diferença de tratamento. Portanto, como usado no ATC, implica na eliminação destas práticas do setor que não estavam em conformidade com as regras normais do GATT. Contexto de integração De forma a determinar quais as práticas que não estavam em conformidade com as regras do GATT, e, portanto, quais constituem o contexto do ATC, pode ser útil se referir ao Parágrafo 2 do Preâmbulo do ATC, que evoca a Decisão do Comitê de Negociações Comerciais de abril de 1989. Esta decisão especificou que a integração do setor cobrirá a eliminação das restrições do Acordo Multifibras e outras restrições de

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têxteis e vestuário não consistentes com as regras e disciplinas do GATT. A Decisão estipulou que: Decisão do Comitê de Negociações Comerciais, abril de 1989 (a) Negociações substanciais terão início em abril de 1989 de forma a se atingir um acordo dentro do cronograma da Rodada Uruguai nas modalidades de integração deste setor ao GATT, de acordo com o objetivo negociador; (b) tais modalidades para o processo de integração ao GATT com base em regras e disciplinas do GATT mais fortalecidas deveriam englobar, entre outras coisas, a eliminação das restrições do Acordo Multifibras e outras restrições sobre têxteis e vestuário que sejam inconsistentes com as regras e disciplinas do GATT, o curto espaço de tempo para tal processo de integração, e o caráter progressivo deste processo que deverá ter início após a conclusão das negociações… (Grifos do autor) O contexto do ATC demonstra então que o objeto e propósito da “integração” é a eliminação das restrições sobre produtos têxteis e de vestuário que estavam sujeitos ao Acordo Multifibras e quaisquer outras restrições que não sejam consistentes com as regras e disciplinas do GATT. Embora a Decisão do Comitê de Negociações Comerciais tenha também se referido a “outras restrições não consistentes com as regras e disciplinas do GATT” em complementação às restrições do Acordo Multifibras, tais restrições são na realidade extremamente raras. Conseqüentemente, a principal finalidade do ATC é a eliminação das restrições existentes à luz do MFA. Estas restrições foram aplicadas por grandes países desenvolvidos, quase que exclusivamente, sobre importações de países e economias em desenvolvimento. 1.3 Escopo das Controvérsias do ATC O ATC é um acordo setorial específico para o comércio de têxteis e vestuário. Conforme mencionado acima, entretanto, seu escopo é limitado a garantir a eliminação das restrições sobre importações de produtos têxteis e de vestuário durante o período de transição de dez anos. O Acordo dispõe sobre os mecanismos para que isso se efetive. Além disso, o ATC trata do disciplinamento a ser observado visando à (i) operação e administração destas restrições até que sejam gradualmente eliminadas, e que seus respectivos produtos sejam integrados às regras normais do GATT 1994; (ii) introdução de quaisquer novas restrições durante o período de transição sob critérios cuidadosamente definidos; e (iii) a uma supervisão regular de sua implementação. 1.3.1 Controvérsias Envolvendo Produtos Têxteis e de Vestuário Devido aos específicos (e limitados) escopo e objetivos do ATC, nem todas as disputas envolvendo produtos têxteis e de vestuário recaem sob sua alçada. Uma vez que o ATC não cobre assuntos como compromissos tarifários, antidumping ou direitos compensatórios, matérias relativas a valoração aduaneira ou equivalentes, as controvérsias envolvendo violações alegadas nessas áreas são cobertas por outros 1 GATT, MTN, TNC 9.

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acordos da OMC que sejam aplicáveis. As controvérsias que estão sob a alçada do ATC são aquelas em que as violações dos dispositivos do ATC são o objeto principal. Em alguns casos, entretanto, violações dos dispositivos do ATC podem ser alegadas em conjunto com outras violações dos demais acordos da OMC. Na realidade, houve diversos casos em que a violação de um ou dois dispositivos do ATC foi invocada como uma questão suplementar. O ATC vigora há mais de sete anos. Durante este período (1995 até o início de 2002), houve muitas controvérsias envolvendo produtos têxteis e de vestuário. Porém, nem todas elas foram levantadas sob o ATC. 1.3.2 Controvérsias sob o ATC A tabela a seguir lista os casos em que as violações dos dispositivos do ATC foram levantadas como o objeto principal. Casos em que o ATC foi o objeto principal Violações Alegadas United States - Restrictions on Imports of Cotton and Man-Made Fibre Underwear, demandado pela Costa Rica, WT/DS24

ATC, Artigos 2, 6 e 8

United States - Measure Affecting Imports of Women’s and Girls’ Wool Coats, demandado pela Índia, WT/DS32

ATC, Artigos 2, 6 e 8

United States - Measure Affecting Imports of Woven Wool Shirts and Blouses, demandado pela Índia, WT/DS33

ATC, Artigos 2, 6 e 8

Colombia - Safeguard Measure on Imports of Plain Polyester Filaments, demandado pela Tailândia, WT/DS181

ATC, Artigos 2 e 6

Argentina - Transitional Safeguard Measures on Certain Imports of Woven Fabrics of Cotton and Cotton Mixtures, demandado pelo Brasil, WT/DS190

ATC, Artigos 2, 6 e 8

United States - Transitional Safeguard Measure on Combed Cotton Yarn from Pakistan, demandado pelo Paquistão, WT/DS192

ATC, Artigos 2 e 6

1.3.3 Controvérsias Multidisciplinares Há diversos outros casos em que as principais violações foram alegadas com base em obrigações oriundas de outros acordos da OMC. Além destas violações, infrações de algumas obrigações do ATC também foram levantadas como questões suplementares. Casos em que Violações do ATC foram questões suplementares

Violações Alegadas

Turkey - Restrictions on Imports of Textiles and Clothing Products, demandado pela Índia; WT/DS34

GATT Art. XI e XIII; ATC Art. 2

Turkey - Restrictions on Imports of Textile and Clothing Products, demandado pela Tailândia; WT/DS47

GATT Art. I, II, XI e XIII; ATC Art. 2

Argentina - Certain Measures Affecting Imports of Footwear, Textiles, Apparel and Other Items, demandado pelos Estados Unidos; WT/DS56

GATT Art. II, VII, VIII e X; Acordo sobre Barreiras Técnicas ao Comércio (“TBT”); Acordo de Valoração Aduaneira; ATC Art.7

Argentina - Measures Affecting Textiles and Clothing, demandado pela Comunidade Européia; WT/DS77

GATT Art. II; ATC Art. 7

United States - Measures Affecting Textiles and Apparel Products, demandado pela Comunidade Européia; WT/DS85

ATC Art. 2 e 4; Acordo sobre Regras de Origem; GATT Art. III e TBT

United States - Measures Affecting Textile and Apparel Products, demandado pela Comunidade Européia; WT/DS151

ATC Art. 2 e 4; Acordo sobre Regras de Origem;

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Brazil - Measures on Minimum Import Prices, demandado pelos Estados Unidos; WT/DS197

GATT Art. III e TBT GATT Art. II e XI; Acordo sobre Valoração Aduaneira; Acordo sobre Procedimentos para Licenciamento de Importações; ATC Art. 2 e 7; Acordo sobre Agricultura

1.3.4 Controvérsias sob Outros Acordos da OMC Ainda, em outros casos relativos a produtos têxteis e de vestuário, questões relativas ao ATC não foram sequer levantadas; apenas violações de outros acordos da OMC. Casos em que as violações ao ATC não estavam em questão Violações Alegadas Turkey - Restrictions on Imports of Textile and Clothing Products, demandado por Hong Kong, China, WT/DS29

GATT Art. XI e XIII;

Australia - Textiles, Clothing and Footwear Import Credit Scheme, demandado pelos Estados Unidos, WT/DS57

Acordo sobre Subsídios e Medidas Compensatórias

India - Quantitative Restrictions on Imports of Agricultural, Textile and Industrial Products, demandado pelos Estados Unidos, WT/DS90

GATT Art. XI e XVIII; Acordo sobre Agricultura; Acordo sobre Procedimentos para Licenciamento de Importações

India - Quantitative Restrictions on Imports of Agricultural, Textile and Industrial Products, demandado pela Austrália; WT/DS91

GATT Art. XI e XVIII; Acordo sobre Agricultura; Acordo sobre Procedimentos para Licenciamento de Importações

India - Quantitative Restrictions on Imports of Agricultural, Textile and Industrial Products, demandado pelo Canadá, WT/DS92

GATT Art. XI, e XVIII; Acordo sobre Agricultura; Acordo sobre Procedimentos para Licenciamento de Importações

India - Quantitative Restrictions on imports of Agricultural, Textile and Industrial Products, demandado pela Nova Zelândia, WT/DS93

GATT Art. XI, XVIII e XXIII; Acordo sobre Agricultura; Acordo sobre Procedimentos para Licenciamento de Importações

India - Quantitative Restrictions on Imports of Agricultural, Textile and Industrial Products, demandado pela Suíça, WT/DS94

GATT Art. XI e XVIII; Acordo sobre Procedimentos para Licenciamento de Importações

India - Quantitative Restrictions on Imports of Agricultural, Textile and Industrial Products, demandado pela Comunidade Européia, WT/DS96

GATT Art. XI, XIII; XVII e XVIII; Acordo sobre Agricultura; Acordo sobre Procedimentos para Licenciamento de Importações;

European Communities - Anti-Dumping Investigations Regarding Unbleached Cotton Fabrics, demandado pela Índia, WT/DS140

SPS; Acordo Antidumping; GATT Art. I e VI

European Communities - Anti-Dumping Duties on Imports of Cotton Type Acordo Antidumping;

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Bed-Linen, demandado pela Índia, WT/DS141 GATT Art. I e VI Brazil - Measures on Import Licensing and Minimum Import Prices, demandado pela Comunidade Européia, WT/DS183

GATT II, VIII, X e XI;

Agreement on Agriculture; Agreement on Import Licensing Procedures; Customs Valuation Agreement Brazil - Anti-Dumping Duties on Jute Bags, demandado pela Índia, WT/DS229

GATT Art. VI e X; Acordo Antidumping; Acordo da OMC Art. XVI

United States - Rules of Origin for Textiles and Apparel Products, demandado pela Índia, WT/DS243

Acordo sobre Regras de Origem

Vale notar, entretanto, que nem todos os casos indicados nas tabelas acima resultaram na abertura de painéis de solução de controvérsias. Dentre os que violações das obrigações do ATC foram a questão principal, três tiveram continuidade mediante o processo de solução de controvérsias e resultaram em painéis, bem como em conclusões e pareceres significativos por parte do Órgão de Apelação. Os aspectos principais destes pareceres e regras podem ser revistos no Capítulo 3 deste Módulo. O Capítulo 3 traz ainda importantes decisões de painéis com referência aos dispositivos do ATC em algumas controvérsias multidisciplinares, nas quais a violação de obrigações do ATC emergiu como um pedido suplementar. 1.4 Principais Dispositivos do ATC Nesta subseção, é apresentado um breve panorama dos principais dispositivos do ATC, sem, contudo, tratar de questões de interpretação. Estes aspectos são tratados concomitantemente aos esclarecimentos e conclusões conseqüentes do trabalho do TMB, dos pareceres do Painel ou do Órgão de Apelação, nas Seções 2 e 3 deste Módulo. 1.4.1 Um Ponto Introdutório O ATC é estruturado com o objetivo principal de acabar com o já duradouro sistema de restrições utilizado pelos maiores países desenvolvidos sobre produtos têxteis e de vestuário importados de países em desenvolvimento, uma vez que estas restrições distorciam alguns dos princípios e regras fundamentais do GATT. O Acordo estabelece uma estrutura mediante a qual se atingirá este objetivo de forma gradual e sistemática ao longo do período de transição de dez anos. Os principais elementos da estrutura do ATC são razoavelmente claros, embora os mecanismos do processo de integração sejam um tanto complexos. Os elementos principais da estrutura estão explicados abaixo. Os esclarecimentos e pareceres desenvolvidos pelo Órgão de Monitoramento de Têxteis e, em alguns casos, pelos painéis e pelo Órgão de Apelação, serão revistos em seções posteriores deste Módulo. 1.4.2 Cobertura do Produto O ATC estabelece, em um Anexo, uma lista detalhada de produtos aos quais se aplica. A lista é baseada no Sistema Harmonizado de Designação e de Codificação de

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Mercadorias (o chamado Sistema Harmonizado - SH), e define determinados produtos no nível de seis dígitos do SH. Artigo 1:7 do ATC Os produtos têxteis e de vestuário aos quais este Acordo se aplica estão indicados no Anexo. Geralmente, os produtos cobertos são os indicados na Seção XI (Têxteis e Artigos Têxteis) do SH, excluindo, entretanto, fibras naturais, tais como rama de algodão, juta, seda etc. Além disso, a lista inclui produtos fora da Seção XI definidos nas linhas ou sub-linhas tarifárias do SH. No total, a lista consiste de 781 linhas tarifárias cheias no nível de seis dígitos do SH, e outras quatorze linhas tarifárias das quais apenas alguns itens estão cobertos pelo ATC. Esta cobertura extensiva de produtos tem estado na raiz das preocupações acerca da chamada “back-loading” (procrastinação) do processo de integração. 1.4.3 O Processo de Integração e Seu Mecanismo Artigo 2:6 e 2:8 do ATC O segundo elemento, central na estrutura do ATC, refere-se ao processo de integração. Nesse sentido, cada Membro importador deve notificar e integrar produtos da lista abrangidos pelo Acordo, de acordo com o seguinte cronograma2: Após janeiro de 1995: Produtos que contabilizaram pelo menos 16% das importações do Membro em 1990, em termos de volume Após 1o de janeiro de 1998: Pelo menos outros 17% Após 1o de janeiro de 2002: Mais, pelo menos, 18% Após 1o de janeiro de 2005: Todos os demais produtos. O artigo 9 do ATC dispõe: Artigo 9 do ATC O presente Acordo e todas as suas restrições devem estar extintos no 121o mês de vigência do Acordo da OMC, data em que o setor têxtil e de vestuário deverá ter se tornado completamente integrado ao GATT 1994. Não haverá prorrogações ao Acordo. Quando um determinado produto estiver integrado, todas as restrições de quotas sobre suas importações de Membros da OMC deverão estar extintas. A integração também implica que o país importador estará a partir de então comprometido a observar a totalidade das regras e disciplinas do GATT com respeito àquele produto. O Acordo deixou a efetiva escolha dos produtos para integração nas primeiras três etapas (i.e., após janeiro de 1995, 1998 e 2002 respectivamente) a critério do Membro importador em questão, com a única condição de que a lista de cada etapa incluísse uma 2 Artigos 2:6 e 2:8(a), (b) e (c) do ATC.

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combinação dos produtos de todos os quatro segmentos, (i.e., fibras e filamentos, tecidos, produtos utilizando têxteis, e vestuário). Na efetiva implementação, os países importadores restritivos desfrutaram totalmente do benefício de escolha e da cobertura extensa de produtos conforme abaixo: (i) Primeiramente, a lista de produtos coberta pelo Acordo incluiu um número significativo de produtos que nunca sofreram restrições pelo MFA. De acordo com as estimativas, no caso da UE, tais produtos sem restrições contabilizaram perto de 42% da totalidade das importações. No caso dos Estados Unidos, o mesmo número estava por volta de 40%. A porcentagem do Canadá foi ainda mais alta. Todos os países decidiram incluir os produtos sem restrições às listas de integração que foram notificadas para as três primeiras fases. Conseqüentemente, eles evitaram integrar os produtos que estavam efetivamente sob restrições. (ii) Em segundo lugar, uma vez que podiam escolher os produtos, eles também optaram por incluir primeiramente fibras e filamentos, tecidos ou produtos utilizando têxteis, com o mínimo possível de itens de vestuário, sobre os quais os países em desenvolvimento tinham uma maior competitividade relativa devido à natureza de trabalho intensivo necessário aos processos de fabricação, bem como produtos sobre os quais as quotas restritivas eram mais acentuadas. Desta forma, ainda que a obrigação de atendimento dos mecanismos de integração das porcentagens exigidas possa ter sido satisfeita, o mesmo talvez não possa ser dito quanto ao cumprimento do objeto e propósito do Acordo. Esta é a razão pela qual uma preocupação generalizada foi manifestada acerca do processo de implementação, no que diz respeito à realização do objetivo central do ATC. 1.4.4 Aumentos nas Taxas de Ampliação das Quotas O terceiro elemento da estrutura do ATC relaciona-se aos aumentos nas taxas de crescimento das quotas. Quanto a esse aspecto, o Acordo estipulou que, até que os produtos relevantes fossem integrados, os níveis de restrições de quotas quanto a esses produtos deveriam ser aumentados de acordo com a seguinte fórmula3: Após 1o de janeiro de 1995: Todas as taxas de crescimento anuais de ampliação de quotas que existiram em acordos bilaterais anteriores ao ATC, fossem ampliadas em no mínimo 16%. Portanto uma taxa anual de ampliação de 6% deveria ser ampliada para 6,96%; 5% para 5,80%; 4% para 4.64%; 3% para 3.48%; 2% para 2,32%; 1% para 1,16%. Após 1o de janeiro de 1998: A taxa anual de ampliação resultante da fórmula acima deveria ser aumentada em, pelo menos, mais 25%. Após 1o de janeiro de 2002: As taxas resultantes acima (i.e. 1998) deveriam ser aumentadas em, pelo menos, mais 27%. 3 Artigos 2:13 e 2:14(a) e (b) do ATC.

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Na prática, sob os acordos bilaterais do MFA, existia uma ampla variedade de taxas de ampliação, sendo que a média estava entre 3% e 5%. Elas também variavam para cada um dos países restritivos. Conseqüentemente, os níveis de quota foram ampliados em relação aos níveis pré-ATC. Entretanto, a ampliação média global no acesso (principalmente quanto aos principais produtos comercializados) não foi significativa de forma suficiente para eliminar o efeito restritivo das quotas. 1.4.5 Salvaguarda Provisória O quarto elemento do ATC estabelece que, durante o período de transição, pode ser necessária a aplicação de um mecanismo de salvaguarda provisória. O artigo 6 do Acordo dispõe acerca dos procedimentos e condições sob os quais um Membro importador pode introduzir novas restrições às importações de produtos específicos. De maneira geral, o Artigo 6 estipula que a salvaguarda provisória deverá ser aplicada o mais moderadamente possível, em coerência com os dispositivos deste Artigo e efetiva implementação do processo de integração. Artigo 6:1 do ATC Os Membros reconhecem que durante o período de transição pode ser necessária a aplicação do mecanismo de salvaguarda provisória (denominada neste Acordo como “salvaguarda provisória”). A salvaguarda provisória pode ser aplicada por qualquer membro sobre os produtos cobertos pelo Anexo, exceto aqueles [produtos] integrados ao GATT 1994 sob os dispositivos do Artigo 2… A salvaguarda provisória deverá ser aplicada o mais moderadamente possível, em coerência com os dispositivos deste Artigo e efetiva implementação do processo de integração do presente Acordo. (Grifos do autor) Todas as ações de salvaguarda tradicional devem ser revistas pelo TMB. Mesmo nos casos em que os países importadores e exportadores envolvidos concordem que a situação pede a imposição de um limite, o TMB precisa determinar se o limite é justificado de acordo com os dispositivos do Artigo 64. 1.4.6 Supervisão da Implementação Artigo 8:1 do ATC Em quinto lugar, ao contrário de outros acordos negociados na Rodada Uruguai, o ATC não previu um Comitê para periodicamente revisar e ser consultado na implementação do Acordo. Em vez disso, criou-se um Órgão permanente de Monitoramento de Têxteis para supervisionar de maneira regular a implementação do ATC e, mais do que isso, examinar todas as medidas tomadas com base no ATC e a conformidade das mesmas com tais dispositivos. Artigo 8:1 do ATC 4 Artigos 6:9 e 6:10 do ATC.

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De forma a supervisionar a implementação deste Acordo, a examinar todas as medidas tomadas sob este Acordo e suas respectivas conformidades, bem como a tomar ações especificamente de sua competência sob este Acordo, o Órgão de Monitoramento de Têxteis (“TMB”) é, neste ato, estabelecido. Adicionalmente, para fiscalizar a implementação do ATC em âmbito multilateral, o Acordo estabelece o Conselho para o Comércio de Bens da OMC (“CTG”) para conduzir uma ampla revisão antes da conclusão de cada etapa do processo de integração. Artigo 8:11 do ATC De forma a inspecionar a implementação deste Acordo, o Conselho para o Comércio de Bens deverá conduzir uma ampla revisão antes da conclusão de cada etapa do processo de integração. Para auxiliar nesta revisão, o TMB deverá, pelo menos cinco meses antes da conclusão de cada etapa, transmitir ao Conselho para o Comércio de Bens um extenso relatório acerca da implementação deste Acordo durante a etapa sob revisão, particularmente sobre os assuntos relativos ao processo de integração, a aplicação do mecanismo de salvaguarda, [etc.]... O extenso relatório do TMB pode incluir quaisquer recomendações consideradas apropriadas pelo TMB ao Conselho para o Comércio de Bens. Artigo 8:12 do ATC À luz destas revisões, ao CTG compete tomar as decisões apropriadas para assegurar que o equilíbrio de direitos e obrigações incorporados no Acordo não esteja sendo comprometido. Artigo 8:12 do ATC À luz de sua revisão, ao CTG compete tomar, por consenso, as decisões que considerar apropriadas para assegurar que o equilíbrio de direitos e obrigações incorporados no Acordo não esteja sendo comprometido. 1.4.7 Outros Dispositivos Diversos Afora os elementos principais do ATC ora resumidos, o Acordo contém dispositivos para tratamento preferencial em acesso para pequenos fornecedores5, para a administração de restrições6, e para a prevenção de fraudes ao Acordo7. Estabelece ainda que os Membros tomem as ações necessárias para subsistir às regras e disciplinas do GATT, de forma a atingir uma melhoria no acesso a mercados e assegurar a aplicação de políticas relativas a condições eqüitativas de comércio em matérias como regras antidumping, subsídios e direitos compensatórios e a proteção de direitos de propriedade intelectual.8 5 Artigos 1:2, 2:18 e 6:6 do ATC. 6 Artigos 2:17 e 4 do ATC. 7 Artigo 5 do ATC. 8 Artigo 7 do ATC.

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2. ÓRGÃO DE MONITORAMENTO DE TÊXTEIS O ATC estabelece um procedimento bifásico para a solução de controvérsias oriundas de violações aos seus dispositivos. Qualquer assunto pendente deve ser primeiramente analisado pelo Órgão de Monitoramento de Têxteis (“TMB”) antes de ser levado ao Órgão de Solução de Controvérsias para a constituição de um painel. Este Capítulo apresenta um panorama (i) do papel e funções do TMB, (ii) dos procedimentos do TMB com respeito a controvérsias, e (iii) alguns concernentes pareceres e esclarecimentos resultantes do trabalho do TMB. Estes esclarecimentos podem ser vistos como um meio de prevenir o recurso a painéis de controvérsias. 2.1 Funções do TMB Artigo 8 do ATC O Artigo 8 do ATC descreve o papel e as funções do TMB. Ele dispõe que o TMB foi estabelecido para: (i) supervisionar a implementação do ATC, (ii) examinar todas as medidas tomadas Segundo o ATC e sua conformidade com tais dispositivos, e (iii) tomar outras ações de competência do TMB constantes de vários Artigos do Acordo. O TMB desempenha uma função dupla: (1) uma função de revisão e supervisão; e (2) uma função de solução de controvérsias. No seu papel de revisor e supervisor, o TMB compromete-se à vigilância regular e contínua da operação e implementação do Acordo. Pode fazer observações e recomendações que considerar apropriadas. Em seu papel de solucionador de controvérsias, a atribuição ao TMB não visa à conciliação entre as partes. Mais propriamente, de certa forma, ele age como um tribunal de primeira instância e examina a conformidade da medida em questão com os dispositivos do ATC. Embora o TMB possa proferir pareceres e recomendações em casos de discordâncias trazidos a ele, as partes não são obrigadas a aceitar suas recomendações. 2.1.1 O Papel de Revisão e Supervisão do TMB O Papel de Revisão e Supervisão do TMB está disseminado no ATC em inúmeros artigos. Sem descrever esse papel em detalhes, abaixo encontram-se algumas importantes áreas em que o TMB deve revisar e supervisionar a implementação do ATC. Primeiramente, o TMB recebe, revisa e circula as notificações exigidas dos Membros da OMC com respeito à sua implementação sob dispositivos específicos do ATC. Conseqüentemente, ele serve como uma espécie de registro de informações relativas a questões têxteis. Em segundo lugar, no que concerne à implementação das obrigações de integração, ao TMB compete manter sob sua revisão a implementação e a evolução do processo de integração.

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Em terceiro lugar, em casos de alegação de fraude em que os Membros concordem com quaisquer soluções em consultas mútuas, o TMB pode lhes fazer as necessárias recomendações. Em quarto lugar, se, após os pedidos de consultas feitos para estabelecer novas restrições a título de salvaguardas transitórias no ATC, os Membros chegarem a um entendimento mútuo sobre o estabelecimento de medidas restritivas, o ATC exige que o TMB determine se o acordo entre os Membros é justificado segundo os dispositivos do Artigo 6 do Acordo. Se não houver acordo entre as partes e a medida de salvaguarda for implementada, o assunto também será levado ao TMB para que este decida se a medida tomada pelo Membro importador é justificada e faça recomendações aos Membros envolvidos. 2.1.2 O Papel de Solução de Controvérsias do TMB Artigos 8:5 e 8:6 do ATC O ATC estabelece que, na ausência de soluções mutuamente acordadas em consultas bilaterais, o assunto pode ser levado ao TMB por qualquer Membro. Nesses casos, o ATC determina que o TMB conduza uma meticulosa e pronta análise do assunto e que teça recomendações aos Membros envolvidos. Passar pelo processo junto ao TMB em uma controvérsia é um primeiro passo necessário antes da mesma ser submetida ao DSB para o estabelecimento de um painel segundo o DSU. Artigos 8:5 e 8:6 do ATC Na ausência de uma solução mutuamente acordada nas consultas bilaterais previstas neste Acordo, o TMB deverá, a pedido de qualquer um dos membros e após uma consideração meticulosa e pronta do assunto, tecer recomendações aos Membros envolvidos. A pedido de qualquer Membro, o TMB deverá rever prontamente todos os assuntos específicos que o Membro considerar prejudiciais a seus interesses sob este Acordo, quando as consultas entre ele e o Membro ou Membros envolvidos não conseguirem gerar uma solução mutuamente satisfatória. Em tais casos, o TMB pode proferir as observações que considerar apropriadas para os Membros envolvidos… Artigos 8:9 e 8:10 do ATC Entretanto, os Membros não são obrigados a aceitar as recomendações do TMB, mas apenas a se esforçar em fazê-lo. Se, após quaisquer das recomendações do TMB, o assunto permanecer sem solução, o Membro em questão pode trazer o assunto perante o DSB e invocar diretamente o Artigo XXIII do GATT 1994. Não é necessário solicitar quaisquer outras consultas em conformidade com o Artigo 4 do DSU. Neste sentido, o processo do TMB substitui a fase de consulta do processo de solução de controvérsias do DSU.

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Artigos 8:9 e 8:10 do ATC Os Membros devem se esforçar para aceitar integralmente as recomendações do TMB… Se um Membro se considerar inapto a seguir as recomendações do TMB, ele deve informar ao TMB suas razões até um mês do recebimento de tais recomendações. Após meticulosa consideração das razões apresentadas, o TMB deverá emitir quaisquer recomendações adicionais que considerar apropriadas ao caso. Se, após estas recomendações adicionais, o problema permanecer sem solução, qualquer dos dois Membros poderá levar o assunto perante o Órgão de Solução de Controvérsias e invocar o parágrafo 2 do Artigo XXIII do GATT 1994 e os dispositivos aplicáveis do Acordo de Solução de Controvérsias. Artigo 1.2 DSU Vale notar que o DSU também dispõe que, na medida em que exista uma diferença entre as regras e procedimentos do DSU e regras e procedimentos especiais ou adicionais contidos em diferentes Acordos (incluindo o ATC), deverão prevalecer as regras e os procedimentos especiais ou adicionais dos Acordos abrangidos.9 2.2 Composição do TMB Artigo 8:1 do ATC O TMB é constituído por um Presidente e 10 membros. Os membros do TMB são nomeados pelos Membros da OMC designados para o Conselho para o Comércio de Bens. Os membros do TMB devem desempenhar suas funções no TMB ad personam (de forma personalíssima). Artigo 8:1 do ATC O TMB deverá consistir de um Presidente e 10 membros. Sua associação deverá ser equilibrada e amplamente representativa dos Membros [da OMC] e deverá prever a rotatividade de seus membros em intervalos apropriados. Os membros do TMB são nomeados pelos Membros [da OMC] designados pelo Conselho para o Comércio de Bens para servir no TMB, cumprindo suas funções em uma base pessoal. Artigo 8:3 do ATC Na qualidade de um órgão permanente, o TMB reúne-se freqüentemente para cumprir suas funções. A ele é concedido considerável arbítrio em termos de obter informações de uma variedade de fontes. Artigo 8:3 do ATC O TMB deverá ser considerado como um órgão permanente e deverá se reunir tanto quanto necessário para desempenhar as funções estabelecidas neste Acordo. Deve 9 Artigo 1.2 do DSU.

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contar com notificações e informações fornecidas pelos Membros quanto aos Artigos aplicáveis deste Acordo, complementadas por quaisquer informações ou detalhamentos necessários que eles possam apresentar ou que o TMB possa decidir procurar. Também poderá contar com notificações e relatórios de outros órgãos da OMC e de outras fontes, conforme entender apropriado. 2.3 Procedimentos do TMB Artigo 8:2 do ATC O ATC autorizou o TMB a desenvolver seus próprios procedimentos de trabalho.10 De acordo com uma decisão do Conselho Geral da OMC adotada em janeiro de 1995, o TMB deve tomar todas as suas decisões por consenso.11 Isto, entretanto, está sujeito à condição de que o consenso não exija o acordo dos membros do TMB indicados por Membros da OMC envolvidos em uma questão não solucionada que esteja sob revisão do TMB.12 2.3.1 Procedimentos de Trabalho Procedimentos de Trabalho do TMB Desta forma, o TMB desenvolveu procedimentos detalhados para o seu trabalho.13 Com respeito a controvérsias, estes procedimentos exigem que o TMB convide representantes dos Membros da OMC que sejam partes na controvérsia para apresentarem seus pontos de vista e responderem às questões que possam ser indagadas pelos membros do TMB. As partes da controvérsia têm a faculdade ainda de convidar um representante designado, que pode estar presente nas deliberações do TMB, mas que não pode participar da efetiva elaboração de seus pareceres, observações e recomendações. Regras 6:1 e 6:2 dos Procedimentos de Trabalho do TMB O TMB deverá convidar representantes dos Membros da OMC que sejam partes na controvérsia a apresentar integralmente seus pontos de vistas e responder questões feitas pelos Membros do TMB… Cada parte de uma controvérsia deverá ser convidada a designar um representante que... pode estar presente... na discussão atinente, mas não na elaboração de recomendações, pareceres e observações. As intervenções por tais representantes deverão se limitar aos aspectos fundamentais relevantes à discussão… 10 Artigo 8:2 do ATC. 11 WT/L/26, parágrafo 6. 12 Artigo 8:2 do ATC. 13 G/TMB/R/1.

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2.3.2 Relatórios do TMB Os Procedimentos de Trabalho do TMB estabelecem que os relatórios do TMB deverão ser compostos de (a) apresentação fática dos assuntos a serem examinados, (b) no caso de uma controvérsia, um sumário dos argumentos principais, (c) o texto de quaisquer recomendações, observações e pareceres proferidos pelo TMB, e (d) uma fundamentação lógica comum (acordada) para tais recomendações, observações e pareceres.14 2.3.3 Limitações do TMB Pelos termos do seu mandato, ao TMB compete revisar e supervisionar a implementação do ATC, em todos os aspectos, de forma imparcial e estritamente baseada nos mesmos padrões necessários segundo qualquer outro acordo da OMC, já que o ATC é parte integrante da WTO. No seu papel de solução de controvérsias, espera-se que ele observe os mesmos altos padrões. Embora ao TMB seja necessário tomar todas as decisões por consenso, isto às vezes pode ser de difícil consecução porque, em um grande grupo de dez membros, pode haver genuínas diferenças de pontos de vista acerca do significado dos vários dispositivos do ATC. Adicionalmente, o desempenho do TMB está condicionado pelo fato de que seus membros são designados por Membros da OMC representando abordagens particulares ao tema da proteção dos produtores domésticos no setor. Adicionalmente, devido à longa experiência com o MFA, cujos padrões eram bastante indistintos e ambíguos, alguns membros do TMB, pelo menos nos dez anos iniciais do ATC, encaravam o papel do TMB como sendo o de promover conciliação e acomodação entre pontos de vista díspares. Por fim, o ATC estabelece o revezamento dos membros do TMB. Na realidade, contudo, aqueles designados por países que aplicam restrições geralmente têm servido no TMB por longos períodos. Os indicados por países em cujas exportações são aplicadas as restrições mudam com bastante freqüência. Isto produz um desequilíbrio inerente ao efetivo funcionamento do TMB. 2.4 Significativos Pareceres do TMB Este Capítulo apresenta um panorama de alguns pareceres fundamentais do TMB, primeiramente no seu papel de revisor ou supervisor, e em segundo lugar, no seu papel de solucionador de controvérsias. Na maioria dos casos, os pareceres do TMB podem ser encarados como uma forma de evitar que se recorra aos procedimentos do DSU. Eles contribuem igualmente para a completa e efetiva implementação do Acordo. 2.4.1 Pareceres do TMB no seu Papel de Supervisão Em conformidade com seu papel de revisão ou supervisão, o TMB examina minuciosamente todos os aspectos da implementação do ATC. Possui certo arbítrio para procurar informações em diversas fontes. Embora seus pareceres ou recomendações não sejam vinculantes às partes, seu exame pode, sim, esclarecer sobre a validade ou não de 14 Ibid, Regra 8.

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algumas questões e assim contribuir para prevenir que se recorra desnecessariamente aos procedimentos de solução de controvérsias do DSU. Ao longo dos últimos sete anos e meio de vigência do ATC, o TMB teve que revisar e examinar um grande número de notificações feitas pelos Membros da OMC de acordo com os requisitos dos vários dispositivos do ATC. Esta subseção é dedicada a trazer algumas das áreas significativas em que o exame do TMB resultou na correção de erros na implementação do ATC. Os casos relativos ao TMB em sua função de solucionador de controvérsias serão tratados em um capítulo posterior. Questão de antigas posições no SH No capítulo que descreve os produtos cobertos pelo ATC, mostrou-se que o Anexo do ATC lista os produtos no nível de seis dígitos do SH, mas que, tomando-se as linhas tarifárias do SH de quatorze dígitos, apenas partes dos produtos abrangidos pelas linhas tarifárias de seis dígitos estão cobertas pelo ATC. Estas partes são definidas por uma breve descrição da porção abrangida. Por exemplo, na classificação do SH, o título 3921.90 refere-se a “outras chapas, folhas, películas, tiras e lâminas de plásticos ou materiais não-celulares”. O ATC inclui este título, mas cobre somente “tecidos, tecidos de malha ou falsos tecidos revestidos, recobertos ou estratificados com plástico”. Quando o TMB revisou os programas de integração notificados por alguns Membros da OMC consoantes os Artigos 2:6 e 2:8 do ATC, verificou-se que a Comunidade Européia contou o volume de comércio abrangido nas linhas tarifárias de seis dígitos cheias ao invés de limitá-las às porções cobertas pelo Acordo. O TMB confirmou este ponto de vista e recomendou que a CE reexaminasse seu programa. Após este reexame, a CE corrigiu sua lista, retirando o volume de comércio correspondente a mais de 2% da totalidade de suas importações que, de outra forma, estariam contabilizados como pertencentes ao ATC. Um fenômeno similar foi verificado durante o exame pelo TMB das listas de integração apresentadas pelo Canadá. Também neste caso, o questionamento do TMB resultou na correção pelo Canadá de suas listas, retirando cerca de 9,5% do volume de comércio que era reconhecido como pertencente ao ATC. Esse foi, portanto, um exemplo concreto em que a revisão e supervisão pelo TMB contribuíram para assegurar a correta e apropriada implementação de um dispositivo fundamental do ATC, e que se preveniu um recurso desnecessário aos procedimentos de solução de controvérsias. Ao examinar a questão, entretanto, o TMB observou que as correções feitas pela CE, Canadá, etc., foram baseadas em suas estimativas de quais proporções do total do comércio contabilizadas naquela linha tarifária de seis dígitos do SH poderiam estar em conformidade com as definições de produtos cobertos pelo ATC e que o TMB não estava em posição de verificar as estimativas disponibilizadas pelos Membros.15 15 G/TMB/R/41, parágrafos 4-26.

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Questão de necessidade de visto Sob o regime de acordos bilaterais do MFA, vários países aplicadores de restrições desenvolveram seus próprios procedimentos para controlar e administrar o comércio de produtos sujeitos a restrições de quota. Uma vez que as quotas eram essencialmente restrições voluntárias a exportações, estes procedimentos exigiam que os países exportadores emitissem certificados de exportação. Os Estados Unidos denominavam estes certificados de exportação como “vistos”, idealizados como uma ferramenta administrativa para monitorar e controlar as importações de produtos têxteis e de vestuário sob restrições. Exigia-se que estes vistos acompanhassem todos os carregamentos, além dos documentos regulares de expedição. Este procedimento obrigava os países exportadores a designar oficiais para emitir os vistos. Cada visto deveria indicar a categoria precisa do produto, a quantidade do carregamento, a data de emissão do visto, e a assinatura do oficial designado. Sem um visto, a entrada do carregamento poderia ser recusada. Qualquer erro no certificado do visto também poderia resultar no carregamento ter sua entrada recusada. Para harmonizar estas práticas e procedimentos administrativos, um dispositivo do ATC estipulou que estes arranjos administrativos seriam objeto de acordo entre os Membros envolvidos. Artigo 2:17 do ATC Arranjos administrativos, quando considerados necessários em relação à implementação de qualquer dispositivo deste Artigo, deverão ser objeto de acordo entre os Membros envolvidos. Todos estes arranjos devem ser notificados ao TMB. Estes certificados de visto não são necessários para todos os países exportadores; apenas para aqueles sobre cujas exportações são impostas restrições de quotas. São, portanto, discriminatórios e, assim, inconsistentes com a regra do GATT de tratamento da Nação Mais Favorecida (MFN). Eles podem representar uma maneira indireta de restringir importações e, conseqüentemente, são inconsistentes com o Artigo XI do GATT 1994, o qual exige que nenhuma restrição, “independentemente se efetivada por meio de quotas, licenças de importação ou exportação ou outras medidas, poderá ser instituída ou mantida”. Além disso, a elaboração e emissão de documentos de visto envolvem encargos administrativos e custos adicionais para o processamento das remessas de carregamentos.

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A exigência de visto foi estabelecida com o propósito de implementar restrições de quotas e era inconsistente com as regras normais do GATT. Aconteceu que, com a integração de relevantes produtos têxteis e de vestuário, e conseqüente eliminação de restrições de quota sobre eles, a exigência deveria ser abolida. Os Estados Unidos, entretanto, não o fizeram. Ao invés disso, eles anunciaram que a exigência de visto continuaria mesmo depois que os produtos relevantes fossem integrados ao GATT 1994.16 Como o propósito da integração é que, uma vez que um determinado produto esteja integrado, os Membros da OMC devem observar as regras e disciplinas do GATT em sua totalidade no que concerne àquele produto, alguns Membros remeteram esta questão ao TMB. Após esse fato, os Estados Unidos cederam e retiraram a exigência de visto com respeito a produtos integrados. Posteriormente, o TMB confirmou que a integração completa sob o ATC significava não somente a eliminação das restrições de quota, mas também quaisquer outros procedimentos administrativos relativos. Relatório do TMB O TMB relembrou que os respectivos arranjos de visto foram notificados pelos Estados Unidos, conforme o Artigo 2:17, como parte de arranjos administrativos e que, pelo Artigo 2:17, arranjos administrativos poderiam ser considerados necessários [exclusivamente] em relação à implementação de restrições aplicadas segundo o Artigo 2.17 Penalizando fraudes de quotas O Artigo 5 do ATC estabelece que Membros cooperem com a solução de problemas oriundos de fraudes de restrições por meio de embarques indiretos, transbordos, declarações falsas sobre o país ou local de origem, e falsificação de documentos oficiais. Ele ainda dispõe que os Membros concordam em tomar todas as ações necessárias para prevenir, investigar e, quando apropriado, tomar medidas judiciais e/ou administrativas contra práticas fraudulentas. Nos casos em que, como resultado da investigação, haja provas suficientes de que uma fraude ocorreu (por exemplo, quando a prova disponível refere-se o país ou lugar de verdadeira origem, e às circunstâncias de tal fraude), o Artigo 5 dispõe acerca de procedimentos para ações apropriadas, na medida do necessário para solucionar o problema. Está ação pode incluir a recusa de entrada, ou quando os produtos já foram internados, ajuste às taxas para que as quotas reflitam o verdadeiro país ou local de origem. Pouco antes da OMC e do ATC entrarem em vigor, e como resultado de uma campanha engendrada pelos Estados Unidos, os países exportadores aceitaram modificações nos arranjos administrativos incorridos sob a alçada do Artigo 2:17 do ATC (também descritos na subseção precedente). Estes arranjos adicionaram um procedimento detalhado aos arranjos administrativos pelos quais os países exportadores eram 16 Vide relatório do TMB no G/L/459, parágrafo 58. 17 TMB, Relatório do 77o Encontro, G/TMB/R/76, parágrafo 8.

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obrigados a cooperar em instâncias de fraude ou alegação de fraude de forma a resolver o problema e a estabelecer fatos relevantes, incluindo a facilitação de visitas conjuntas às fábricas nos países exportadores. Uma estipulação importante nos arranjos administrativos dos Estados Unidos, porém, acrescentou dizendo que, em casos de fraudes reincidentes por exportadores de um determinado país, os Estados Unidos poderiam deduzir valores das quotas até três vezes os valores de transbordo. Os Estados Unidos argumentaram que este dispositivo era consistente com o Artigo 2:17 do ATC e incluiu a chamada cláusula dos encargos triplos em suas notificações ao TMB sob este Artigo. Porém, ao revisar as notificações dos Estados Unidos ao Artigo 2:17, o TMB não concordou com esta linha de argumentação dos Estados Unidos. Relatório do TMB O TMB notou, entre outras coisas, que o Artigo 5:4 do ATC parecia dar certa flexibilidade em termos de remédios ou ações acordadas que podiam ser previstas em casos de fraudes, mas observou, contudo, que o Artigo 5 não continha referências à possibilidade do Membro importador de impor encargos triplos sobre quotas, como um desestímulo para fraudes... O TMB relembrou que os Estados Unidos declararam que, em casos em que os dispositivos dos arranjos administrativos fossem inconsistentes com o ATC, os dispositivos do ATC seriam aplicados.18 Novamente aqui o exame meticuloso do TMB desencorajou os Estados Unidos a lançarem mão do que poderia representar uma situação injusta de penalizar o país exportador. Questão de novas restrições O Artigo 2:1 do ATC dispôs que todos os Membros da OMC notificassem o TMB sobre quaisquer restrições quantitativas que eles mantivessem sob o MFA dentro de 60 dias após a entrada em vigor do Acordo da OMC. As restrições então notificadas devem constituir a totalidade de restrições pelo respectivo Membro e deverão ser, desta maneira, reguladas pelos dispositivos do ATC. Quaisquer novas restrições podem ser apenas introduzidas de acordo com os dispositivos do ATC, i.e., sob o Artigo 6 referente a salvaguardas provisórias. Artigo 2:4 do ATC … Nenhuma nova restrição em termos de produtos ou Membros deverá ser introduzida exceto sob os dispositivos deste Acordo ou dispositivos aplicáveis do GATT 1994.19 Durante os sete anos e meio do ATC, houve vários casos de introdução de novas restrições. A maioria delas foi em conformidade com o mecanismo de salvaguarda 18 G/L/179, parágrafo 221. 19 Os dispositivos aplicáveis do GATT 1994 não incluirão os dispositivos do Artigo XIX com respeito a produtos ainda não integrados ao GATT 1994, exceto quando especificamente disposto no parágrafo 3 do Anexo.

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provisória do ATC. Tais restrições são, entretanto, permitidas, caso justificadas segundo os requisitos do Artigo 6 do ATC. Em diversos casos a invocação das salvaguardas do Artigo 6 foi contestada pelos Membros afetados, incluindo recurso ao DSU. Em três destes casos, os painéis e o Órgão de Apelação proferiram pareceres fundamentais e desenvolveram importantes interpretações. Eles serão revistos no Capítulo 3 deste Módulo. Adicionalmente, contudo, houve alguns exemplos em que novas restrições foram introduzidas sem uma justificativa aparente sob qualquer dispositivo do ATC. Tais restrições poderiam potencialmente debilitar as disciplinas do ATC. Em um caso, os Estados Unidos introduziram uma nova restrição em um determinado produto da Turquia, não obstante os dois países já terem atingido então um entendimento mútuo. O TMB tomou ciência da questão e convidou as duas partes (Estados Unidos e Turquia) a notificarem a restrição ao TMB. Os Estados Unidos argumentaram que a restrição em questão era justificada por “um dispositivo” do ATC que não exigia notificação ao TMB. Subseqüentemente e por sua iniciativa própria, sob seu mandato geral estabelecido no Artigo 8:1 do ATC, o qual dispõe que o TMB “examine todas as medidas tomadas [sob o ATC] e suas respectivas conformidades...”, o TMB comprometeu-se a examinar todos os dispositivos do ATC visando a identificar se havia algum dispositivo sob o qual tal medida poderia ser acordada entre as partes sem que se notificasse o TMB. O TMB concluiu que a medida acordada entre ambas as partes não estava em conformidade com nenhum dispositivo do ATC. Adicionalmente, o TMB fez várias observações, esclarecendo que as novas restrições não poderiam ser introduzidas, exceto sob as salvaguardas provisórias do Artigo 6. Relatório do TMB O TMB observou… que os Artigos 1, 7, 8 e 9 não estabelecem a possibilidade de introduzir medidas restritivas sobre importações de outros Membros da OMC. … Nenhum dispositivo sob o Artigo 2 estabelece a possibilidade de introduzir novas restrições. O Artigo 3 não exclui a possibilidade, entre outras coisas, de introduzir novas restrições em produtos têxteis e de vestuário. Entretanto… [ele] limita a possibilidade de aplicar … novas restrições para os casos em que as medidas foram adotadas sob qualquer dispositivo do GATT 1994 [não do ATC]. Uma leitura segundo a qual a introdução de uma nova restrição no sentido do Artigo 2.4… em conformidade com o Artigo 4… foi, no entendimento do TMB, inconsistente com as intenções dos redatores do ATC, uma vez que o Artigo 4 relaciona-se com a implementação ou administração das restrições mencionadas no Artigo 2 [i.e., aquelas já existentes] ou aplicadas sob o Artigo 6.20 (Grifos do autor) 20 G/TMB/R/60, parágrafos 30 e 31.

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2.4.2 Pareceres do TMB em seu Papel de Solução de Controvérsias Em casos de discordância entre os Membros da OMC acerca de qualquer assunto afetando a operação do ATC, o assunto deverá ser remetido ao TMB antes que se recorra aos procedimentos do DSU. Neste sentido, o TMB age como um tribunal de primeira instância. Seu procedimento substitui o estágio de consulta do Artigo 4 do DSU. Se a questão permanecer sem solução como resultado do procedimento do TMB, só então ela poderá ser remetida ao DSB para o estabelecimento de um painel, sem a necessidade de consultas adicionais sob o DSU. Desde que o ATC está em vigor, vários casos foram remetidos ao TMB para sua análise e recomendação. Eles foram, em grande parte, relacionados à invocação de medidas de salvaguarda provisória. Como explicado em outra parte deste Módulo, ao TMB compete determinar a justificativa para todas as medidas de salvaguarda, tanto quando elas forem remetidas a ele após fracasso nas consultas bilaterais, quanto após os dois Membros concordarem em estabelecer uma medida restritiva. Medidas de salvaguarda provisória Este Capítulo apresenta um panorama dos pareceres do TMB com respeito a medidas de salvaguarda. Em tais casos, se houver um entendimento mútuo entre os Membros envolvidos de que a situação demanda o estabelecimento de uma nova restrição, detalhes acerca da medida restritiva acordada devem ser comunicados ao TMB. O TMB, por sua vez, deve determinar se o acordo é justificado em conformidade com os dispositivos do Artigo 6 do ATC. Artigo 6:9 do ATC Detalhes acerca da medida restritiva acordada deverão ser comunicados ao TMB dentro de 60 dias contados da conclusão do acordo. O TMB deve determinar se o acordo é justificado em conformidade com os dispositivos [do Artigo 6]. Se não houver um acordo entre as partes envolvidas e a medida de salvaguarda for imposta, a questão deve ser remetida e analisada pelo TMB.21 Inicialmente a revisão pelo TMB de algumas medidas de salvaguarda ocasionou preocupações acerca dos padrões a serem seguidos pelo TMB. Subseqüentemente, porém, o exame destas medidas melhorou consideravelmente, especialmente à luz das regras do painel e do Órgão de Apelação (discutidas no Capítulo 3 deste Módulo). De um total de 46 medidas de salvaguarda revistas pelo TMB desde início do ATC até o princípio de 2002, ele considerou a grande maioria destas ações inconsistentes com os dispositivos do Artigo 6. Ele então contribuiu para impedir que se recorresse ao DSU. O exame das medidas de salvaguarda pelo TMB também esclareceu vários requisitos do Artigo 6. O capítulo seguinte (relativa aos precedentes da OMC sob o ATC) é dedicado 21 Artigo 6:10 do ATC.

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em larga medida à revisão destes requisitos. Entretanto, é necessário destacar um esclarecimento muito significativo feito pelo TMB acerca da estrutura do Artigo 6. Relatório do TMB O TMB notou que a determinação de dano material causado pelo aumento das quantidades de importações era um processo segmentado composto das seguintes partes: • Verificação se o produto em questão estava sendo importado em quantidades crescentes; • Determinação de dano material causado à indústria doméstica; • Estabelecimento de um nexo causal entre o aumento das quantidades de importações e o dano material. Se qualquer das condições acima não fosse verificada, as medidas de salvaguardas não seriam consideradas justificadas de acordo com os dispositivos do Artigo 6 e, neste caso, portanto, não seria necessário ao TMB proferir pareceres e conclusões sobre todos os três elementos.22 22 G/TMB/R/60, parágrafo 14.

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3. SOLUÇÃO DE CONTROVÉRSIAS SEGUNDO O ATC Até hoje, três casos sob o ATC foram objeto de litígio em painéis e no Órgão de Apelação, todos referentes a medidas de salvaguardas provisórias tomadas pelos Estados Unidos. Embora outros três casos tenham sido remetidos aos painéis, os Membros reclamantes não lhes deram continuidade, uma vez que as restrições sob análise foram retiradas. Além disso, em outros poucos casos, as questões sob o ATC foram trazidas como questões complementares. Em todos os três casos em que a validade das medidas de salvaguardas provisórias foi contestada, os painéis e o Órgão de Apelação julgaram que elas não eram justificadas pelo ATC. Seus relatórios contêm várias regras pertinentes. Enquanto breves resumos dos três casos de medidas de salvaguardas provisórias discutidas em painéis são apresentados no Capítulo 4 deste Módulo, este capítulo apresenta um panorama dos aspectos fundamentais das regras dos painéis e do Órgão de Apelação. Discutem-se também alguns pareceres de casos em que o ATC não era a questão principal. Não se discute, porém, questões de interpretação geral, tais como as relativas à partilha e distribuição do ônus da prova, o princípio de economia processual, e outros assuntos similares. Ainda que estas questões tenham aparecido nos casos das controvérsias sob o ATC, elas são mais de aplicação geral e apropriadamente pertencem a outro Módulo deste Curso.23 Resultados das controvérsias do ATC A tabela abaixo lista o resultado de casos remetidos ao processo de painel sob o ATC, incluindo aqueles em que questões do ATC tenham sido levantadas como questões complementares. Casos em que o ATC foi a questão principal

Resultado do Painel / Órgão de Apelação

United States - Restrictions on Imports of Cotton and Man-made Fibre Underwear, demandado pela Costa Rica, WT/DS24

O painel e Órgão de Apelação julgaram que a medida violava as obrigações do ATC.

United States - Measure Affecting Imports of Women’s and Girls’ Wool Coats, demandado pela Índia, WT/DS32

Os Estados Unidos retiraram a medida. O Reclamante concluiu o processo do painel.

United States - Measure Affecting Imports of Woven Wool Shirts and blouses, demandado pela Índia, WT/DS33

O painel e o Órgão de Apelação julgaram que a medida violava as obrigações do ATC.

Colombia - Safeguard Measure on Imports of Plain Polyester Filaments, demandado pela Tailândia, WT/DS181

O processo do painel não teve continuidade, e a medida de um ano expirou.

Argentina – Transitional Safeguard Measures on Certain Imports of Woven Fabrics of Cotton and Cotton Mixtures, complaint by Brazil, WT/DS190

O processo do painel foi descontinuado devido à retirada de medidas.

United States - Transitional Safeguard Measure on Combed Cotton Yarn from Pakistan, demandado pelo Paquistão, WT/DS192

O painel e o Órgão de Apelação julgaram que a medida violava as obrigações do ATC.

Casos em que a violação ao ATC foi uma questão complementar

23 Vide Módulos 3.1, 3.2, 3.3 e 3.4 deste Curso.

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Turkey - Restrictions on Imports of Textile and Clothing Products, demandado pela Índia, WT/DS34

O painel e o Órgão de Apelação julgaram que as restrições eram também inconsistentes com o Artigo 2:4 do ATC.

As subseções a seguir apresentam um panorama das regras fundamentais de painéis e do Órgão de Apelação sob os títulos dos tópicos. 3.1 Padrões de Revisão Em todos os três casos, a questão do padrão de revisão que deveria ser aplicado sob o ATC foi extensamente discutida: como uma questão geral de interpretação, no que se refere à aplicabilidade dos precedentes de outros acordos da OMC e à compatibilidade do MFA com o ATC. Padrão aplicável No caso US - Underwear, os Estados Unidos defenderam um padrão de revisão similar ao do caso Fur Felt Hat, em que às autoridades dos Estados Unidos foi concedida considerável discricionariedade por um Grupo de Trabalho do GATT.24 O Grupo de Trabalho concluiu que, ao revisar as medidas de salvaguardas dos Estados Unidos aplicadas contra as importações da Checoslováquia, de acordo com o Artigo XIX do GATT 1947, aos Estados Unidos foi concedido o benefício da dúvida. O painel US – Wool Shirts and Blouses também foi contestado pelos Estados Unidos com a mesma linha de raciocínio.25 No mais recente caso US - Cotton Yarn, ainda, os Estados Unidos argumentaram que o painel deveria somente revisar se a medida dos Estados Unidos houvesse sido baseada na melhor informação disponível, como estabelecido em uma declaração de mercado do momento em que os Estados Unidos conduziam sua determinação de que a situação exigia o estabelecimento de uma restrição.26 Os painéis e o Órgão de Apelação rejeitaram a linha de raciocínio dos Estados Unidos. Eles julgaram, ao contrário, que o ATC não possuía qualquer dispositivo particular sobre o padrão de revisão. Desta forma, o Artigo 11 do DSU deveria ser usado para revisar as medidas tomadas por um Membro sob o ATC. O Artigo 11 do DSU dispõe que “… um painel deve fazer uma avaliação objetiva da questão diante dele, incluindo uma análise objetiva dos fatos do caso e de sua conformidade com os acordos relevantes aplicáveis…”. O painel no caso US – Underwear declarou: 24 United States – Restrictions on Imports of Cotton and Man-made Fibre Underwear, demandado pela Costa Rica, WT/DS24 (“US – Underwear”). 25 United States – Measure Affecting Imports of Woven Wool Shirts and Blouses from India, demandado pela Índia, WT/DS33/R, (“US – Wool Shirts and Blouses”). 26 United States – Transitional Safeguard Measure on Combed Cotton Yarn from Pakistan, demandado pelo Paquistão, WT/DS192/R (“US – Cotton Yarn”).

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Painel, US – Underwear … uma política de total deferência aos pareceres das autoridades nacionais não poderia assegurar uma “análise objetiva” confome previsto no Artigo 11 do DSU. … No nosso entendimento, a tarefa do Painel é examinar a consistência da ação norte-americana com as obrigações internacionais dos Estados Unidos, e não a consistência da ação norte-americana com os estatutos domésticos dos Estados Unidos que implementam obrigações internacionais dos Estados Unidos.27 Relevância da jurisprudência da OMC Outra questão extensamente examinada pelos painéis com relação às medidas de salvaguarda provisória do ATC refere-se à relevância ou não dos precedentes da OMC desenvolvidos sob outros acordos da OMC. Os Estados Unidos defenderam vigorosamente que o ATC era um acordo específico, para um período de transição e negociado com um propósito específico. Desta forma, a aplicação das interpretações desenvolvidas com referência a conceitos ou termos similares por outros acordos da OMC não seria apropriada. No entendimento dos Estados Unidos, o ATC difere significativamente de outros acordos não-transitórios da OMC em termos de status de um acordo de transição, em seu propósito de gradualmente integrar o setor ao GATT, e em sua linguagem, etc. Conseqüentemente, os painéis deveriam interpretar os dispositivos do ATC limitando-se aos seus ‘quatro cantos’; eles deveriam olhar o texto e o propósito único do ATC, e não para outros acordos ou para interpretações sob outros acordos. Eles declararam que interpretações de termos similares dos Artigos III e XIX do GATT 1994, ou dos acordos antidumping, de salvaguardas, etc, não eram relevantes ao contexto do ATC.28 Discordando dos Estados Unidos, os países reclamantes argumentaram que o ATC era parte integrante do Acordo da OMC e que, portanto, interpretações de termos similares por outros acordos da OMC eram relevantes. O painel US - Cotton Yarn parece ter terminado com essa discordância, decidindo contra a linha de raciocínio dos Estados Unidos e interpretando que, como parte integrante do Acordo da OMC, os dispositivos do ATC somente deveriam ser vistos com uma parte do tratado integral da OMC. Painel, US – Cotton Yarn O Artigo 3.2 do DSU dispõe que o sistema de solução de controvérsias da OMC “serve... para esclarecer os dispositivos existentes daqueles acordos [i.e. os acordos da OMC abrangidos], de acordo com regras tradicionais de interpretação de direito internacional público”. Com respeito às “regras tradicionais de interpretação do direito internacional público”, o Órgão de Apelação reiteradamente refere-se aos Artigos 31 e 32 da Convenção de Viena sobre Leis de Tratados (“Convenção de Viena”) como diretrizes interpretativas. O parágrafo 1 do Artigo 31 dispõe que “[um] 27 Relatório do Painel, United States-Underwear, parágrafos 7.10 e 7.12. 28 Relatório do Painel, United States – Cotton Yarn, parágrafos 4.9 e 7.43.

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tratado deve ser interpretado em boa-fé, de acordo com o significado ordinário a ser dado aos termos do tratado nos seus contextos e à luz de seu objeto e propósito”… Como indicado no Artigo 31(2) da Convenção de Viena, o “contexto” dentro do significado do Artigo 31(1) compreende o próprio “texto” do tratado, incluindo o preâmbulo e anexos. O tratado ora em questão é o Acordo da OMC, do qual o ATC é parte integrante. Então, refere-se ao Acordo da OMC em sua integralidade, incluindo o Artigo III do GATT, que estabelece o contexto do Artigo 6 do ATC. … …[Como] a Corte Permanente em uma Opinião Consultiva anterior destacou …, o contexto não é meramente o artigo ou seção do tratado em que o termo aparece, mas o tratado como um todo. Neste caso, o “tratado como um todo” é o Acordo da OMC e seus anexos; não é somente o ATC.29 Compatibilidade com o MFA Uma terceira questão interpretativa que vem sendo objeto de litigância é a da compatibilidade do ATC com o MFA. Os Estados Unidos destacaram que, ao interpretar o ATC, os painéis deveriam ser guiados pelo fato de que o ATC substituiu o MFA e reteve diversos conceitos e frases do MFA. Eles argumentaram que o MFA era relevante como “contexto” para a interpretação do ATC, e que os painéis deveriam traçar fortes inferências do MFA e, de fato, das práticas dos Estados Unidos sob o MFA.30 Novamente aqui o Painel US - Cotton Yarn parece ter resolvido a questão. Ele rejeitou a reivindicação dos Estados Unidos e decidiu que o MFA não deveria ser tomado como parte do “contexto” do ATC no sentido do Artigo 31(2) da Convenção de Viena, que foi base de orientação para todos os precedentes da OMC. No caso US-Underwear, o Órgão de Apelação também julgou nesta mesma linha. Painel, US – Cotton Yarn O Painel primeiramente nota que o Artigo 31(2) da Convenção de Viena estabelece o seguinte: “O contexto para o propósito de interpretação de um tratado deverá compreender, além do texto, incluindo seu preâmbulo e anexos,: (a) quaisquer acordos relativos ao tratado que tiverem sido efetuados entre todas as partes em conexão com a conclusão do tratado; (b) qualquer instrumento que tenha sido elaborado por uma ou mais partes em conexão com a conclusão do tratado e aceito pelas demais partes como um instrumento relacionado ao tratado.” 29 Ibid., parágrafo 7.46. 30 Ibid., parágrafos 4.62 e 7.72.

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Isto claramente indica que o MFA não pode ser parte do “contexto” do ATC dentro do significado do Artigo 31(2) da Convenção de Viena. O MFA não é parte integrante do Acordo da OMC, e não foi efetuado “em conexão com a conclusão” deste tratado. Ainda notamos que o Relatório do Órgão de Apelação no caso US – Underwear mencionou como parte do “contexto” do Artigo 6.10 do ATC, não o próprio MFA, mas a “existência anterior e extinção … do MFA”. Elas são antes ocorrências que propriamente “qualquer acordo” ou “qualquer instrumento”. Claramente, no nosso entendimento, o Órgão de Apelação usou o MFA não como parte do “contexto” do ATC no sentido do Artigo 31(2) da Convenção de Viena, mas como parte das circunstâncias da conclusão do ATC.31 3.2 Estrutura do Artigo 6 do ATC Todas as controvérsias sob o ATC até agora relacionaram-se com as medidas de salvaguardas provisórias e, como o Artigo 6 do ATC tem sido o dispositivo do ATC relevante à questão, é recomendável reproduzir os mais importantes dispositivos deste Artigo. O Artigo 6 estabelece na parte aplicável: Artigo 6 do ATC 2. A Medida de salvaguarda pode ser tomada sob este Artigo quando, com base na determinação de um Membro, é demonstrado que um produto específico está sendo importado para o seu território em surtos que causem dano material, ou efetiva ameaça neste sentido, à indústria doméstica produtora de produtos similares e/ou diretamente concorrentes. O dano material ou a efetiva ameaça de dano devem ser demonstradamente causados por tais surtos nas importações do produto e não por outros fatores como mudanças tecnológicas ou mudanças nas preferências dos consumidores. (nota de rodapé omitida) 3. Para a determinação do dano material, ou efetiva ameaça de dano, conforme referido no parágrafo 2, o Membro deverá examinar o efeito de tais importações na condição daquela indústria em particular, refletido em mudanças nas variáveis econômicas relevantes como produção, produtividade, utilização da capacidade, estoques, porções de mercado, exportações, salários, emprego, preços no mercado interno, lucros e investimentos, dos quais nenhum, tomados individualmente ou combinados com outros fatores, podem necessariamente dar a orientação decisiva. 31 Relatório do Painel, United States – Cotton Yarn, parágrafo 7.73.

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4. Qualquer medida invocada de acordo com os dispositivos deste Artigo deverá ser aplicada a cada Membro individualmente. O Membro ou Membros a quem o dano material, ou efetiva ameaça de dano, referidos nos parágrafos 2 e 3, são atribuídos, serão determinados com base em um aumento agudo e substancial nas importações, efetivo ou iminente32, originárias de tal Membro ou Membros individualmente, e com base no nível de importações comparado ao das importações de outras fontes, porção de mercado, e os preços de importação e os praticados no mercado interno, em um nível comparável de transação comercial; nenhum destes fatores, tanto individualmente como combinados, pode necessariamente dar uma orientação definitiva. Tal medida de salvaguarda não poderá ser aplicada a exportações de algum país cujas exportações daquele produto já estejam sob alguma limitação sob este Acordo. Estrutura do Artigo 6 Tanto quanto os painéis do TMB têm devotado considerável atenção à revelação e esclarecimento da estrutura do Artigo 6 do ATC, eles notaram que o propósito geral do Artigo 6 é dar aos Membros a possibilidade de adotar novas restrições sobre produtos ainda não integrados ao GATT, e que o Artigo 6 estabelece uma abordagem em três passos, a qual deve ser seguida para que uma nova restrição seja imposta. Primeiramente, o país importador deve fazer uma determinação de que o produto específico sujeito a uma medida de salvaguarda esteja sendo importado em quantidades crescentes (em termos absolutos, não meramente em relação à produção doméstica conforme permitido, por exemplo, sob o Acordo de Salvaguardas). Em segundo lugar, o país importador deve determinar que o aumento das importações é tamanho que causa dano material ou efetiva ameaça de dano à indústria doméstica produtora de produto similar e/ou de produto diretamente concorrente, e que o dano material ou efetiva ameaça de dano sejam devidos ao aumento das importações, não a outros fatores. Em terceiro lugar, após ter satisfeito as condições acima, o Membro deve atribuir o dano material ou efetiva ameaça de dano a um determinado Membro ou Membros por cujas exportações sejam responsáveis. Uma determinação como a acima descrita é necessária uma vez que nenhuma medida de salvaguarda pode ser tomada baseada em qualquer dos passos mencionados acima individualmente. Painel, US - Underwear … O Artigo 6 do ATC, no nosso entendimento, estabelece uma abordagem em três passos que deve ser seguida para que uma nova restrição seja importa. Os Artigos 6.2 e 6.4 do ATC constituem os dois primeiros passos que, tomados no conjunto, possibilitarão a determinação de se o dano material ocorreu ou realmente ameaça se efetivar, e se ele pode ser atribuído ao aumento agudo e substancial das importações 32 Nota de rodapé original: “Tal aumento iminente deverá ser mensurável e sua existência não deverá ser determinada com base em alegações, conjecturas ou mera possibilidade de surgimento, por exemplo, da existência da capacidade produtiva nos Membros exportadores.”

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originárias de um determinado Membro ou Membros: Nenhuma ação pode ser tomada com base no Artigo 6.2 individualmente. Uma determinação sob o Artigo 6.2 do ATC é, portanto, uma condição necessária, mas não suficiente, para se recorrer a consultas bilaterais sob o Artigo 6.7 do ATC. Somente quanto o dano material ou efetiva ameaça de dano tiverem sido demonstrados sob o Artigo 6.2 e tenham sido atribuídos a um determinado Membro ou Membros sob o Artigo 6.4 do ATC, poderá se recorrer ao Artigo 6.7 do ATC de maneira consistente com os dispositivos do ATC.33 O Órgão de Apelação também esclareceu a estrutura do Artigo 6 nas mesmas linhas que o Painel US - Underwear, embora o tenha feito no contexto de análise de atribuição sob o Artigo 6:4 do ATC, e especificamente com referência à interpretação dos termos ‘aplicação’ e ‘atribuição’. Órgão de Apelação, US – Cotton Yarn … distinguimos três elementos diferentes, mas inter-relacionados, sob o Artigo 6: primeiro, causa de dano material ou efetiva ameaça de dano por surtos de importações, segundo, a atribuição deste dano material ao(s) Membro(s) cujas importações contribuíram para aquele dano; e terceiro, a aplicação das medidas de salvaguarda provisória a tais Membro(s).34 3.3 Informações Relevantes a Serem Examinadas Uma nova restrição sob salvaguardas provisórias do ATC pode ser imposta, de forma consistente com o Artigo 6, apenas após se efetivar a determinação que possa demonstrar (a) que as importações de um produto particular tenham aumentado; (b) que o aumento seja tamanho que cause dano material ou ameaça efetiva de dano à indústria doméstica produtora de produtos similares e/ou diretamente concorrentes, (c) que o dano não é resultante de fatores não-relacionados com o surto das importações, e (d) que o aumento seja atribuível a Membros particulares cujas exportações já não estejam sob restrições. O Artigo 6:7 obriga que o Membro apresente informações fáticas com base em quais destes fenômenos podem ser demonstrados. O dispositivo referente a informações fáticas é, portanto, essencial para a determinação de se a restrição é justificada. A natureza e escopo precisos desta informação, entretanto, têm sido um pomo de discórdia. Alguns pontos dos precedentes da OMC, até hoje, são discutidos a seguir. Primeiro, o Artigo 6:3 dispõe que a demonstração de dano material ou ameaça efetiva de dano pode ser baseada no exame dos efeitos das importações refletidos em variáveis como produção, produtividade, utilização da capacidade, estoques, porções de mercado, exportações, salários, emprego, preços no mercado interno, lucro e investimentos. O Painel US – Wool Shirts and Blouses decidiu que um Membro importador deve examinar pelo menos cada um desses fatores. Além disso, o país importador deve 33 Relatório do Painel, US - Underwear, parágrafos 7.23 e 7.24. 34 Relatório do Órgão de Apelação, US - Cotton Yarn, parágrafo 109.

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demonstrar que também considerou e mencionou a questão de que o dano ou ameaça de dano não foi devido a outros fatores, como mudanças tecnológicas e mudanças nas preferências dos consumidores. Painel, US – Wool Shirts and Blouses No nosso entendimento, a redação dos Artigos 6.2 e 6.3 do ATC deixa claro que todos os fatores econômicos, particularmente todos os listados no Artigo 6.3 do ATC, devem ser mencionados pelo CITA, independentemente de se subseqüentemente descartados ou não, com uma explicação apropriada. A redação da primeira frase do Artigo 6.3 do ATC impõe ao Membro importador a obrigação de examinar, no momento de sua determinação, pelo menos todos os fatores listados naquele parágrafo. O Membro importador pode decidir — na sua avaliação de se houve ou não dano material ou efetiva ameaça de dano em prejuízo da indústria doméstica — que alguns destes fatores representam maior ou menor peso. O Membro importador deve ser capaz de demonstrar, no mínimo, que considerou a relevância ou não de cada um dos fatores listados no Artigo 6.3 do ATC. O Artigo 6.2 do ATC exige que o dano material ou ameaça de dano à indústria doméstica não deve ter sido causado por outros fatores como mudanças tecnológicas ou mudanças nas preferências dos consumidores. A referência explícita a esses fatores específicos impõe uma exigência adicional ao Membro importador de mencionar a questão de se o dano material ou ameaça de dano não foram causados por fatores tais como mudanças tecnológicas ou mudanças nas preferências dos consumidores.35 (Grifos do autor) Em segundo lugar, e talvez com maior importância, a exata natureza e escopo das informações a serem examinadas foi tema de alguma controvérsia. O Painel no caso US – Underwear decidiu que sua avaliação da matéria deveria se restringir à revisão das informações fornecidas pelos Estados Unidos à Costa Rica na chamada Declaração de Março (March Statement) e que qualquer informação posterior não deveria ser vista como uma base juridicamente independente para a caracterização do dano material ou ameaça de dano.36 Ao longo da avaliação, porém, o Painel observou que ele poderia considerar a Declaração de Julho [subseqüente] (July Statement) como prova apresentada pelos Estados Unidos na nossa avaliação da precisão geral da Declaração de Março.37 O Painel do caso US – Wool Shirts and Blouses também observou que ele era obrigado a examinar o caso apenas baseado nas informações que foram efetivamente utilizadas pela autoridade investigadora local no momento em que aquela realizou sua determinação. Em outras palavras, que quaisquer informações subseqüentes não poderiam ser consideradas. 35 Relatório do Painel, US – Wool Shirts and Blouses, parágrafos 7.25-7.27. 36 Relatório do Painel, US - Underwear, parágrafo 7.26. 37 Ibid, parágrafo 7.29.

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Painel, US – Wool Shirts and Blouses … Ao contrário do TMB, o painel do DSU não é constituído, em sua definição de trabalho, para investigar novamente a situação do mercado. Ao analisar a compatibilidade com a OMC da decisão de impor remédios nacionais de defesa comercial, os painéis do DSU não re-investigam a situação de mercado, mas, ao contrário, limitam-se às provas apresentadas por aquele Membro importador por ocasião de sua determinação de implementar a medida. Além disso, os painéis do DSU, diferentemente do TMB, não consideram desenvolvimentos posteriores à determinação inicial…38 No caso US - Cotton Yarn, o demandante, o Paquistão, alegou que os Estados Unidos basearam sua determinação acerca da situação da indústria doméstica em informações não verificadas, incorretas e incompletas fornecidas por uma associação de fabricantes de filamentos dos Estados Unidos, que buscavam proteção para a indústria. Ao concordar com o parecer do Painel no caso US – Wool Shirts and Blouses de que painéis não deveriam investigar novamente a situação de mercado quando analisassem decisões de autoridades nacionais, o Painel no caso US – Cotton Yarn observou que “nós deveríamos examinar quaisquer provas, desconsiderando se estavam disponíveis ou se foram consideradas no momento da investigação para avaliar a profundidade e suficiência da investigação em que se baseou a decisão da autoridade dos Estados Unidos.”39 O Painel conseqüentemente examinou provas posteriores para os propósitos da verificação. O Órgão de Apelação, contudo, culpou o Painel e reverteu o parecer mencionado, determinando que ele excedia o seu mandato segundo o Artigo 11 do DSU. Órgão de Apelação, US – Cotton Yarn Um Membro não pode, obviamente, ser culpado por não ter considerado o que não poderia ser de seu conhecimento ao fazer a sua determinação. Se um painel precisasse examinar tal prova, o painel estaria, de fato, conduzindo uma nova revisão, e o estaria fazendo sem ter tido o benefício dos pontos de vista das partes interessadas. O painel estaria avaliando a devida diligência de um Membro ao obter suas conclusões e ao fazer suas projeções com o benefício da retrospecção e, estaria, de fato, investigando novamente a situação de mercado e substituindo o julgamento do Membro pelo seu próprio. No nosso entendimento, isto seria inconsistente com o padrão de revisão de um painel sob o Artigo 11 do DSU.40 A controvérsia não parece ter terminado, entretanto. O Paquistão protestou vigorosamente no DSB no momento da adoção dos relatórios do Painel e do Relatório do Órgão de Apelação, argumentando que sem o benefício de testar a precisão das informações utilizadas por autoridades nacionais que são freqüentemente disponibilizadas pelas partes interessadas, os painéis não têm outra alternativa a não ser confiar apenas na boa fé do Membro importador, sem poder fazer uma análise objetiva dos fatos do caso. 38 Relatório do Painel, US – Wool Shirts and Blouses, parágrafo 7.21. 39 Relatório do Painel, US – Cotton Yarn, parágrafo 7.33. 40 Relatório do Órgão de Apelação, US – Cotton Yarn, parágrafo 78.

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3.4 Período de Referência para Selecionar Informações Utilizadas No caso US - Cotton Yarn, o demandante argumentou que uma análise da data-base de um período de meros oito meses não seria suficiente para a determinação de dano material à indústria doméstica. Referiu-se às diretrizes recomendáveis adotadas pelo Comitê de Práticas Antidumping para o período de investigação, que dispõe que “o período para seleção de informações para investigações de dano normalmente deverá ser de pelo menos três anos.” Foi ainda observado que “períodos de investigação de cinco anos são comuns”, segundo o Artigo XIX do GATT. Os Estados Unidos contestaram que o ATC não estabelecia um período específico mínimo de investigação. O Painel discordou com o demandante no que diz respeito à noção de uma diretriz geral sobre a duração do período em que o dano poderia ocorrer. Painel, US – Cotton Yarn Em nosso entendimento, se um período selecionado é justificadamente longo ou não dependeria, ao menos parcialmente, da extensão do dano sofrido durante aquele período pela indústria doméstica envolvida. Assim, nós consideramos inapropriado fixar uma diretriz geral acerca da duração do período em que o dano ou respectivo motivo ocorra, quando não há redação específica pactuada no ATC.41 3.5 Definição de Indústria Doméstica No caso US - Cotton Yarn, a questão central foi a definição de indústria doméstica produtora de filamentos de algodão nos Estados Unidos. Esta mesma questão foi a base sobre a qual os Estados Unidos adotaram outra medida de salvaguarda restringindo as importações de filamentos de fibra artificial de algodão da Tailândia. Após entendimentos mútuos entre ambos, o TMB, após sua avaliação da restrição segundo o Artigo 6:9 do ATC, declarou que a restrição era justificada.42 Em ambos esses casos, os Estados Unidos definiram a indústria doméstica como os produtores de filamentos que atendiam ao mercado de atacado. Excluiu-se do escopo da sua definição de indústria doméstica os produtores de tecidos verticalmente integrados que produziam filamentos para seu próprio uso internamente. O Paquistão alegou que em fazendo isso, os Estados Unidos violaram o Artigo 6.2 do ATC, uma vez que não investigaram sua indústria doméstica produtora de filamentos de algodão inteira. Referiu-se a um antigo precedente do GATT/OMC sob o Artigo III do GATT, no qual o termo “produtos diretamente concorrentes” vinha sendo consistentemente interpretado como se referindo não somente aos produtos em efetiva concorrência em um dado momento, mas também àqueles que tinham potencial para concorrer. Assim, o termo “produtos concorrentes” também era encarado como se incluísse produtos que seriam capazes de concorrer entre si.43 41 Relatório do Painel, US – Cotton Yarn, parágrafo 7.115. 42 G/TMB/R/42, parágrafos 5-13. 43 US-Cotton Yarn, parágrafo 7.37.

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Os Estados Unidos argumentaram que a produção dos chamados produtores de tecido integrados não competia diretamente com importações. Os Estados Unidos afirmaram que era necessário para dar total significado para o conector “e/ou” na expressão “indústria doméstica produtora de produtos similares e/ou diretamente concorrentes” no Artigo 6:2 do ATC e, que se ela fosse ignorada, a palavra “e” se tornaria inútil. Afirmou ainda que o conector “e/ou” era exclusivo do ATC. Não era encontrado em nenhum outro acordo da OMC em que se definiu o relacionamento entre produtos nacionais e importados.44 O Painel sustentou que os filamentos produzidos pelos produtores integrados competiam diretamente com os filamentos importados do exterior e que os Estados Unidos violaram a exigência do Artigo 6:2 ao excluírem os filamentos produzidos internamente do escopo de indústria doméstica. O Órgão de Apelação confirmou e decidiu que “…não aceitamos a contestação dos Estados Unidos de que os filamentos produzidos pelos produtores verticalmente integrados não competem diretamente com os filamentos importados do Paquistão.”45 Órgão de Apelação, US – Cotton Yarn A definição de indústria doméstica, nos termos do Artigo 6.2, é determinada pelo que a indústria produz, isto é, produtos similares e/ou diretamente concorrentes. Em nosso entendimento, o termo “produtora”, por si só, não pode ter um significado diferente ou condicional com base no que o produtor doméstico decide fazer com o seu produto. … A palavra “concorrente” deve ser distinguida das palavras “competidor” ou “estando em efetiva competição”. Possui uma conotação mais ampla que “efetivamente competindo” e inclui também a noção de um potencial para concorrer. Não é necessário que dois produtos estejam competindo, ou que haja uma efetiva competição entre eles, em um mercado a um dado momento para que estes produtos sejam considerados como concorrentes. De fato, produtos que sejam concorrentes podem não estar competindo entre eles no dado momento por uma série de razões, como restrições regulatórias ou decisão dos produtores. Assim, a percepção estática é incorreta, uma vez que implica que os mesmos produtos sejam considerados como competidores em um momento, e não no próximo, dependendo de se estão ou não no mercado.46 3.6 Ameaça de Dano Material Nos termos do Artigo 6:2 do ATC, a medida de salvaguarda pode ser tomada com base em uma determinação demonstrando que houve dano material ou efetiva ameaça de dano material à indústria doméstica. Parecia que os Estados Unidos consideravam os dois conceitos de dano material e de ameaça de dano material como se fossem intercambiáveis, e que a determinação em ambos os casos poderia ser feita com base na mesma análise dos fatos, isto é, sem conduzir uma avaliação independente em casos alegando ameaça de dano material. 44 Relatório do Órgão de Apelação, US - Cotton Yarn, parágrafo 84. 45 Relatório do Órgão de Apelação, US – Cotton Yarn, parágrafo 103. 46 Relatório do Órgão de Apelação, US – Cotton Yarn, parágrafos 87 e 96.

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Os painéis, entretanto, interpretaram estes conceitos como sendo diferentes. Assim, o Painel no caso US-Underwear decidiu que enquanto a conclusão de dano material “exige que a parte que aplica medidas demonstre que o dano já ocorreu, uma conclusão de ameaça de dano material exige que a mesma parte demonstre que, a não ser que uma ação seja tomada, é muito provável que o dano ocorra no futuro próximo.”47 Em outras palavras, que a determinação de ameaça de dano material requer uma ‘análise prospectiva’. O Painel no caso US - Cotton Yarn decidiu similarmente. Conclui-se que: “… para se obter uma conclusão independente de efetiva ameaça de dano material, uma análise adicional necessita ser feita para consubstanciar a conclusão. Em outras palavras, uma análise prospectiva é exigida se se pretende obter uma conclusão independente de efetiva ameaça de dano material, ao invés de uma análise redundante e condicionada [isto é, condicionada somente à determinação de dano material]”.48 3.7 Atribuição de Dano Material No caso US-Cotton Yarn, a questão da atribuição de dano material também foi uma consideração fundamental. Na sua determinação, os Estados Unidos atribuíram o alegado dano a importações do Paquistão sem realizar uma avaliação comparativa das importações do Paquistão e do México e seus respectivos efeitos. O Painel, bem como o Órgão de Apelação, concluiram que ao deixar de examinar o efeito das importações do México (e possivelmente de outros Membros apropriados) individualmente, os Estados Unidos agiram inconsistentemente com o Artigo 6 do ATC. A questão da atribuição é tratada no Artigo 6:4 do ATC. Artigo 6:4 do ATC O Membro ou Membros a quem o dano material, ou efetiva ameaça de dano, referidos nos parágrafos 2 e 3, são atribuídos, deverão ser determinados com base em um agudo e substancial aumento das importações, efetivo ou iminente, de tal Membro ou Membros individualmente, e com base no nível de importações comparadas às importações de outras fontes, porções de mercado, e preços de importações e nacionais, em um nível comparável de transação comercial; nenhum desses fatores, tomados individualmente ou combinados a outros fatores, pode necessariamente dar uma orientação decisiva. (nota de rodapé omitida) Os Estados Unidos argumentaram que o Artigo 6:4 autoriza o Membro importador a aplicar medidas de salvaguarda específicas para cada Membro, e que a obrigação do Membro importador é apenas a de comparar as importações de um Membro em particular às importações de “todas as outras fontes conjuntamente”, não de cada um individualmente. A abordagem contrária foi que a atribuição apropriada do dano não poderia ser feita se o maior exportador, neste caso, fosse simplesmente ignorado. Ao fazê-lo, na realidade a responsabilidade por todo o dano recairia no outro Membro. 47 Relatório do Painel, US - Underwear, parágrafo 7.55. 48 Relatório do Painel, US - Cotton Yarn, parágrafo 7.138.

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O Painel no caso US – Cotton Yarn rejeitou o argumento dos Estados Unidos e concluiu que a análise do efeito das importações de cada Membro individualmente era necessária, para que ela fosse consistente com a exigência do Artigo 6:4. Painel, US – Cotton Yarn … diferentemente de outras investigações de salvaguarda, e conseqüente aplicação de medidas, que era feita com base no tratamento da MFN, ... o Membro que impõe uma salvaguarda segundo o ATC deve então fazer uma análise de atribuição adicional e estreitar a motivação apenas para aqueles Membros cujas exportações estão causando o dano material. Isto não significa, contudo, que um Membro que impõe uma salvaguarda pode então selecionar e escolher para qual(is) Membro(s) ele fará uma análise de atribuição. A atribuição não pode ser feita somente a alguns dos Membros que causam dano, mas sim para todos esses Membros. A redação do Artigo 6.4 leva a essa conclusão. A primeira sentença contém a exigência de que as medidas de salvaguarda sejam aplicadas a cada Membro especificamente. Entretanto, esta é uma referência para a aplicação da medida, não [para] a análise de atribuição de que Membros estarão sujeitos a essa(s) medida(s). Isto é tratado na segunda sentença que fala especificamente em “atribuição” da causa do dano material em contraste com a primeira sentença, que descreve como a medida deve ser “aplicada”. Na segunda sentença lê-se: “O Membro ou Membros a quem o dano material, ou efetiva ameaça de dano, referidos nos parágrafos 2 e 3, é atribuído, deve(m) ser determinado(s) com base no aumento agudo e substancial das importações, efetivo ou iminente, de tal(is) Membro ou Membros individualmente, e com base no nível de importações comparado ao das importações de outras fontes, participação de mercado, e preços de importação e doméstico em um estágio comparável da transação comercial...” [O] explícito rastreamento da determinação do dano material, em nosso entendimento, exige que todos os Membros que causam o dano material devam ser assim atribuídos.49 O Órgão de Apelação também decidiu como o Painel: Órgão de Apelação, US – Cotton Yarn … quando importações de mais de um Membro contribuem para o dano material, é apenas a parte do dano total que é efetivamente causada pelas importações deste Membro que pode ser atribuída a este Membro sob o Artigo 6.4, segunda sentença. O dano que é efetivamente causado à indústria doméstica pelas importações de um Membro não pode, em nosso entendimento, ser atribuído às importações de um Membro diferente, as quais não foram a causa daquela parte do dano. Isto representaria uma atribuição errônea do dano e seria inconsistente com a interpretação em boa-fé dos termos do Artigo 6.4. Portanto, a parte do dano material total atribuída a um Membro exportador deve ser proporcional ao dano causado pelas importações daquele Membro. Contrariamente à opinião dos Estados Unidos, acreditamos que o Artigo 6.4, segunda sentença, não permite a atribuição da totalidade 49 Relatório do Painel, US – Coton Yarn, parágrafos 7.126 e 7.127.

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do dano material a um Membro, a menos que as importações daquele Membro sozinhas tenham causado todo o dano material. … Uma avaliação da parcela do dano material como um todo, que é proporcional ao dano efetivamente causado pelas importações de um Membro em particular, exige, portanto, uma comparação de acordo com os fatores descritos no Artigo 6.4 com todos os outros Membros (cujas importações também cresceram de maneira aguda e substancial) tomados individualmente.50 3.8 Retroatividade de Medidas de Salvaguarda A questão da data a partir da qual a aplicação da medida de salvaguarda entrará em vigor foi levantada em ambos os casos US - Underwear e US – Wool Shirts and Blouses. Os Estados Unidos impuseram as restrições (unilateralmente), após as partes fracassarem em atingir um entendimento mútuo acerca das medidas, retroagindo a data efetiva das restrições às datas em que as consultas foram solicitadas com os respectivos Membros exportadores. Os Membros exportadores demandantes – Costa Rica e Índia – discordaram da abordagem dos Estados Unidos. O Painel no caso US – Wool Shirts and Blouses recusou-se a julgar esta questão, declarando que, desde que se concluiu que a própria restrição não era consistente com os requisitos dos Artigos 6:2 e 6:3, não seria necessário considerar se a data da aplicação da medida era igualmente consistente (ou não) com as regras da OMC.51 O Painel no caso US - Underwear julgou que as restrições poderiam ser justificadamente impostas a partir da data em que os Estados Unidos publicaram seu pedido de consulta. Painel, US - Underwear … [N]ós concluimos que a prática que prevalecia sob o MFA de fixar a data inicial do período de restrição na data do pedido de consulta não pode ser mantida sob o ATC. Contudo, notamos que se o país importador publica o período de restrição proposto e o nível de restrição após o pedido de consulta, ele pode posteriormente fixar a data inicial do período de restrição na data de publicação da restrição proposta. Neste caso, os Estados Unidos violaram suas obrigações sob o Artigo X:2 do GATT 1994 e, consequentemente, sob o Artigo 6.10 do ATC, ao fixar o período de restrição… com início em 27 de março de 1995. … Caso tivesse fixado o início do período de restrição em 21 de abril de 1995, que foi a data de publicação da informação acerca o pedido de consulta, não teria agido de maneira inconsistente com o GATT 1994 ou com o ATC no que concerne ao período de restrição.52 Na apelação pela Costa Rica, o Órgão de Apelação concluiu que o painel no caso US - Underwear errou juridicamente e reverteu suas conclusões, decidindo que a restrição poderia ser aplicada somente após as consultas descritas no Artigo 6. O parecer do Órgão de Apelação foi extremamente instrutivo a esse respeito. 50 Relatório do Órgão de Apelação, US – Cotton Yarn, parágrafos 119 e 124. 51 Relatório do Painel, US – Wool Shirts and Blouses, parágrafo 7.58. 52 Relatório do Painel, US – Underwear, parágrafo 7.69.

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Órgão de Apelação, US - Underwear É essencial observar que, nos termos expressos do Artigo 6.10, ATC, a medida restritiva apenas pode ser “aplicada” “após o término do período de 60 dias” para consultas, fracassadas, e apenas dentro da “janela” de 30 dias imediatamente após o período de 60 dias. Da mesma forma, acreditamos que, na ausência de uma expressa autorização segundo o Artigo 6.10 do ATC, para retroagir a efetividade de uma medida restritiva de salvaguarda, uma presunção surge do próprio texto do Artigo 6.10 de que tal medida pode ser aplicada apenas prospectivamente. … O Órgão de Apelação acredita que inserir no Artigo 6.10 uma autorização para retroagir a efetividade da medida restritiva encorajará o retorno à prática de medidas restritivas retroativas, que aparentemente eram amplamente utilizadas no regime do MFA, um regime que já teve seu fim, ... Esta introjeção, além disso, flexibilizaria a redação cuidadosamente negociada do Artigo 6.10, que reflete o equilíbrio de direitos e obrigações entre os Membros delineado de maneira igualmente cuidadosa, ao facultar ao Membro importador uma habilidade ampliada de restringir a entrada de bens em seu território em cujas exportações não houve práticas desleais de comércio, como dumping ou fraude ou falsidade de origem, alegadas ou comprovadas. Porque a aplicação retroativa de uma medida restritiva efetivamente permite que o Membro importador exclua mais mercadorias ao impor a medida de quota antes e não depois.53 3.9 Novas Restrições Apenas Sob o ATC O Artigo 2:4 do ATC estabelece que quaisquer novas restrições sobre produtos têxteis e de vestuário que não estejam já integrados ao GATT podem ser aplicadas somente se justificadas pelo ATC ou por dispositivos aplicáveis do GATT 1994, exceto o Artigo XIX do mesmo. Artigo 2:4 do ATC … Novas restrições em termos de produtos ou Membros não poderão ser introduzidas exceto quando sob os dispositivos deste Acordo ou dispositivos aplicáveis do GATT 1994… Em várias controvérsias envolvendo produtos têxteis ou de vestuário, os Membros reclamantes alegaram violação deste dispositivo, além de violação de outros dispositivos do ATC (como o Artigo 6) ou outros dispositivos do GATT (como os Artigos XI, XIII, etc.). Em tais instâncias, os painéis e o Órgão de Apelação julgaram que, se uma restrição sobre produtos têxteis e de vestuário fosse considerada infringindo o Artigo 6 do ATC ou Artigo XI e/ou XIII do GATT, automaticamente ela também seria considerada infringindo o Artigo 2:4 do ATC. 53 Relatório do Órgão de Apelação, US – Underwear, p. 22 e 23.

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Painel, US – Underwear No nosso entendimento, um parecer que os Estados Unidos infringiram o Artigo 2.4 do ATC dependeria de um parecer prévio de que os Estados Unidos infringiram o Artigo 6 do ATC; por outro lado, um parecer do Painel de que os Estados Unidos agiram consistentemente com suas obrigações do Artigo 6 do ATC automaticamente significaria que o Artigo 2.4 do ATC não foi violado. Notamos a nossa conclusão prévia de que os Estados Unidos impuseram a restrição de maneira inconsistente com suas obrigações pelos Artigos 6.2, 6.4 e 6.6(d) do ATC. No nosso entendimento, os Estados Unidos, ao violarem suas obrigações pelo Artigo 6 do ATC automaticamente violaram também o Artigo 2.4 do ATC.54 Neste sentido, é importante notar que a Turquia aplicou restrições sobre importações de têxteis e produtos de vestuário após o estabelecimento de uma união aduaneira entre a Turquia e a Comunidade Européia.55 Argumentou-se que tais restrições foram necessárias para a formação da união aduaneira. Em uma contestação na OMC pela Índia, o Painel concluiu que a medida da Turquia era inconsistente com os dispositivos do Artigo XI e XIII do GATT 1994 e conseqüentemente também com o Artigo 2:4 do ATC. O Painel no caso Turkey - Textiles rejeitou o argumento da Turquia de que a medida em questão seria permitida pelo Artigo XXIV do GATT 1994 relativo à formação de uniões aduaneiras.56 O Órgão de Apelação manteve a conclusão do Painel declarando que “…O Artigo XXIV não permite que a Turquia adote, mediante a formação de uma união aduaneira com a União Européia, restrições quantitativas nas importações de 19 categorias de produtos têxteis e de vestuário, as quais foram consideradas inconsistentes com os Artigos XI e XIII do GATT 1994 e Artigo 2:4 do ATC.”57 [Grifos do autor] Em outro importante parecer, o Painel do caso Turkey - Textiles argumentou o seguinte: Painel, Turkey – Textiles 54 Relatório do Painel, US - Underwear, parágrafos 7.70 e 7.71. 55 Turkey – Restrictions on Imports of Textile and Clothing Products, demandado pela Índia, WT/DS34/ R (“Turkey – Textiles”). 56 Relatório do Painel, Turkey – Textiles, parágrafo 10.1. 57 Relatório do Órgão de Apelação, Turkey - Textiles, parágrafo 64.

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A proibição de “novas restrições” deve ser interpretada considerando a sentença anterior [do Artigo 2:4 do ATC]: “As restrições notificadas segundo o parágrafo 1o serão consideradas como as que constituem a totalidade de tais restrições aplicadas pelos respectivos Membros no dia anterior ao início da vigência do Acordo da OMC”. O significado normal das palavras indica que os Membros da OMC tinham o intuito de que, após 1o de janeiro de 1995, a incidência de restrições sob o ATC apenas poderia ser reduzida. Entendemos que qualquer ficção jurídica pela qual uma restrição existente pudesse ser simplesmente aumentada, sem a constituição de uma “nova restrição”, derrotaria o claro propósito do ATC, que é o de reduzir o escopo das restrições, a partir de 1o de janeiro de 1995 (exceto para situações excepcionais mencionadas no Artigo 2.4 do ATC). Assim, consideramos que, colocando de lado a possibilidade de exceções e justificativas mencionadas no Artigo 2.4 do ATC, qualquer aumento de uma restrição quantitativa compatível e notificada segundo o Artigo 2.1 do ATC, constitui uma “nova” restrição.58 No caso Argentina – Textiles and Apparel também, o demandante, os Estados Unidos, argumentou que, porque a Argentina violou os Artigos II e VIII do GATT com respeito a têxteis e vestimentas, conseqüentemente também teria violado o Artigo 7 do ATC. O Painel, contudo, recusou-se a julgar este pedido, exercendo o princípio da economia processual. Painel, Argentina – Textiles and Apparel As partes e terceiros incorreram em longos e controversos debates acerca de se o Artigo 7 abrange apenas ações e obrigações cobertas pelo ATC, isto é, restrições quantitativas, ou se o propósito do Artigo 7 seria [também] assegurar que medidas não-quantitativas, como tarifas, barreiras não-tarifárias, dispositivos de licenciamento e dispositivos de propriedade intelectual não sejam usados de maneira a debilitar o acesso a mercados no setor de têxteis e vestimentas para todos os Membros da OMC. Decidimos exercer o princípio da economia processual e não tratar do pedido dos Estados Unidos relativo ao ATC. Tal decisão é consistente com as conclusões do Relatório do Órgão de Apelação no caso Shirts and Blouses. Não vemos como um parecer sobre o Artigo 7 do ATC ajudaria as partes a resolverem sua controvérsia.59 58 Relatório do Painel, Turkey – Textiles, parágrafo 9.71. 59 Relatório do Painel, Argentina – Measures Affecting Imports of Footwear, Textiles, Apparel and Other Items (“Argentina – Textiles and Apparel”), WT/DS56/R, adotado em 22 de abril de 1998, como modificado pelo Relatório do Órgão de Apelação, WT/DS56/AB/R e Corr.1, DSR 1998:III, 1033, parágrafos 6.86 e 6.87.

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4. PANORAMA RESUMIDO DE CONTROVÉRSIAS SOB O ATC O propósito central do ATC era assegurar a eliminação progressiva de restrições de quota sobre têxteis e vestuário, mantidas pelos grandes países desenvolvidos sobre as importações de países em desenvolvimento, segundo o MFA e arranjos anteriores. Mas o Acordo também estabeleceu a possibilidade de novas restrições nesse ínterim, por meio de “salvaguardas provisórias” sobre produtos que restavam ser integrados. O Artigo 6 do ATC estabelece as condições e procedimentos para as “salvaguardas provisórias”, que devem ser seguidas pelo Membro importador que desejar introduzir quaisquer novas restrições. Os parágrafos 1 - 4 do Artigo dispõem os requisitos substantivos, enquanto que os principais requisitos procedimentais são tratados nos parágrafos 7 - 11. Em resumo, um Membro importador pode recorrer a medidas de salvaguarda provisória se demonstrado que o produto objeto da medida está sendo importado em quantidades tão crescentes que causam dano material, ou efetiva ameaça de dano, à indústria doméstica produtora de produtos similares e/ou diretamente concorrentes, e que tal dano ou ameaça é atribuível a um aumento agudo e substancial nas importações do Membro sobre o qual a medida é aplicada (Artigos 6:1 to 6:4). O Membro importador proponente da medida de salvaguarda deve buscar consultar o Membro ou os Membros que seriam afetados por esta medida (Artigo 6:7). No seu pedido de consultas, deve disponibilizar informações específicas justificando a nova restrição. Se, durante as consultas, houver um entendimento mútuo entre o Membro importador e o exportador, a restrição pode passar a vigorar, e os detalhes acerca da medida acordada são comunicados ao TMB. Se não houver entendimento mútuo, o Membro importador pode aplicar a restrição e, concomitantemente, remeter a questão ao TMB. Em ambos os casos, o TMB deve examinar a medida e determinar se ela é justificada conforme os dispositivos do Artigo 6. Se após a análise do TMB, a questão permanece sem solução, qualquer dos Membros pode invocar os procedimentos de solução de controvérsias do DSU. Como mencionado anteriormente, até hoje, três casos de medidas de salvaguarda provisórias aplicadas pelos Estados Unidos foram contestados em painéis de solução de controvérsias. Em todos os três casos, alguns pareceres dos painéis foram apelados para o Órgão de Apelação. Enquanto aspectos chave das conclusões do Painel e do Órgão de Apelação nesses casos foram considerados no Capítulo 3 deste Módulo, o capítulo a seguir foi delineado para apresentar breves sumários dos casos. Os vários estágios dos três casos foram entabulados a seguir:

Estágio Underwear Wool Shirts and Blouses

Cotton Yarn

Pedido de consulta pelos Estados Unidos (Artigo

6.7)

27 de março de 1995 18 de abril de 1995 24 de dezembro de 1998

Resultado das Consultas Sem acordo. Sem acordo. Sem acordo. Restrição introduzida unilateralmente (Art.

6.10)

23 de junho de 1995 14 de julho de 1995 5 de março de 1999

Restrição efetiva a partir de

27 de março de 199560 18 de abril de 199561 17 de março de 1999

60 Em outras palavras, a efetividade do limite retroagido à data do pedido de consulta.

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Após o processo perante o TMB

Questão não-solucionada

Questão não-solucionada

Questão não-solucionada

Solicitação de Painel 22 de fevereiro de 1996 14 de março de 1996 3 de abril de 2000 Estabelecimento do

Painel 5 de março de 1996 17 de abril de 1996 19 de junho de 2000

Relatório do Painel 8 de novembro de 1996 6 de janeiro de 1997 31 de maio de 2001 Parecer do Painel

apelado 11 de novembro de 1996 24 de fevereiro de 1997 9 de julho de 2001

Relatório do Órgão de Apelação

10 de fevereiro de 1997 25 de abril de 1997 8 de outubro de 2001

Os assuntos de cada caso encontram-se resumidos abaixo. 4.1 US – Underwear Neste, o primeiro caso referente a uma medida de salvaguarda sob o ATC, o TMB concluiu que os Estados Unidos não conseguiram demonstrar que sua indústria doméstica sofreu dano devido ao aumento das importações. Entretanto, o TMB não pôde chegar a um consenso sobre a comprovação da situação de efetiva ameaça de dano à indústria dos Estados. Ele recomendou consultas adicionais entre as partes, o que, a Costa Rica acreditava, o TMB não tinha a competência de fazer segundo o ATC. Não obstante, mesmo após consultas adicionais, a questão permaneceu sem solução. O TMB novamente examinou o caso conforme pedido da Costa Rica, sob o Artigo 8.10, e manteve suas conclusões anteriores, permitindo que a Costa Rica solicitasse o estabelecimento de painel de solução de controvérsias. A Costa Rica alegou perante o Painel que os Estados Unidos, ao impor uma restrição quantitativa unilateral, agiu em violação aos Artigos 2, 6 e 8 do ATC, e solicitou que o Painel recomendasse aos Estados Unidos que retirassem a medida em questão. Especificamente, ela alegou que os Estados Unidos violaram suas obrigações ao: (a) impor uma restrição sem ter atendido às condições dos Artigos 6.2 e 6.4 do ATC, particularmente, ao não conseguir demonstrar que o dano material ou efetiva ameaça de dano resultou das importações da Costa Rica; (b) não conceder, ao aplicar a restrição, tratamento mais favorecido às re-importações da Costa Rica, em desatenção ao Artigo 6.6(d) do ATC; (c) não consultar a Costa Rica acerca da questão da efetiva ameaça de dano material, contrariamente à sua obrigação sob o Artigo 6.7 e 6.10 do ATC (porque o pedido de consultas dos Estados Unidos somente alegou dano à sua indústria, não efetiva ameaça de dano); (d) aplicar a restrição retroativamente, em desatenção ao Artigo 6.10 do ATC; (e) violar o Artigo 2.4 do ATC, ao introduzir uma nova restrição que não era justificada sob o Artigo 6; e (f) não respeitar a recomendação do TMB, contrariamente ao Artigo 8 do ATC. O painel acolheu os pedidos da Costa Rica, com exceção do item (f) acima. Recomendou ao DSB solicitar que os Estados Unidos adequassem a medida ao atendimento de suas obrigações sob o ATC. Também sugeriu que “esse atendimento pode ser melhor alcançado, bem como anulação e comprometimento dos benefícios da Costa Rica segundo o ATC melhor prevenidos, com a pronta remoção da medida…” 61 Idem.

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A Costa Rica apelou das conclusões do Painel com respeito à retroatividade da restrição. Em essência, o Painel concluiu que os Estados Unidos estavam sem razão ao fixar o início do período de restrição a partir da data do pedido para consultas com a Costa Rica; mas seria justificado fixar esta data a partir do dia em que foi publicado o pedido de consulta. O Órgão de Apelação descartou esse parecer do Painel e decidiu, por outro lado, que a medida restritiva não poderia ser retroativa, mesmo da maneira alegada pelo Painel. O Órgão de Apelação decidiu que a restrição apenas poderia ser aplicada “após o término do período de 60 dias” para consultas, e somente dentro da “janela” de 30 dias imediatamente posteriores ao período de 60 dias. 4.2 US – Wool Shirts and Blouses Neste caso, após exaustivo processo perante o TMB, a Índia pediu ao Painel para se pronunciar no sentido de que a restrição introduzida pelos Estados Unidos era inconsistente com diversas de exigências substantivas e procedimentais dos Artigos 6, 8 e 2 do ATC, desta forma anulando ou comprometendo os benefícios concernentes à Índia. Adicionalmente a Índia solicitou parecer complementar esclarecendo que, de acordo com o Artigo 6 do ATC, o ônus de demonstrar dano material ou efetiva ameaça de dano era dos Estados Unidos e eles deveriam ter escolhido, no início do processo, se alegariam a existência de “dano material” ou “efetiva ameaça de dano”, uma vez que as duas situações não seriam intercambiáveis. A Índia alegou ainda que não havia nenhum dispositivo no ATC segundo o qual os Estados Unidos poderiam impor uma restrição com efeitos retroativos. O Painel concluiu que a medida restritiva em questão violou os substantivos dispositivos dos Artigos 2 e 6 do ATC. Entretanto, ele se recusou a se pronunciar sobre os pedidos complementares da Índia. Invocando o princípio da economia processual, o Painel sustentou que, considerando que concluiu que a medida dos Estados Unidos não respeitava aos requisitos dos Artigos 6.2 e 6.3 do ATC e, assim, violava o Acordo, o Painel não necessitava considerar e se pronunciar acerca das questões complementares. Apesar da recusa do Painel em fazer todos os julgamentos pedidos pela Índia, as conclusões do Painel e do Órgão de Apelação no caso US - Underwear foram instrutivas, ao menos no que dizia respeito à retroatividade da medida restritiva e aos requisitos distintos para a determinação de ameaça de dano (em contraposição ao dano). A Índia apelou da abordagem do Painel com relação às questões de (i) ônus da prova, e de (ii) exercício da economia processual. Também apelou da conclusão em que o Painel teria decidido que o TMB não estava restrito a considerar somente as informações iniciais apresentadas pelo Membro importador. O Órgão de Apelação concordou com o Painel com respeito às duas primeiras questões. Com relação à terceira, concluiu que a declaração do Painel teria sido apenas um comentário gratuito, e que, portanto, não deveria ser entendida como um “parecer ou conclusão jurídica”.

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4.3 US – Cotton Yarn Como nos dois casos anteriores, após passar pelo processo perante o TMB, o Paquistão solicitou que o Painel verificasse que os Estados Unidos não conseguiram demonstrar, antes de aplicar a medida de salvaguarda, que as importações causaram dano material ou efetiva ameaça de dano à sua indústria doméstica e que tal dano ou ameaça de dano seria atribuível ao Paquistão uma vez que os Estados Unidos: • não examinaram a situação da indústria doméstica produtora de filamentos de algodão penteado como um todo, apenas a de filamentos produzidos por unidades que vendessem para terceiros; • basearam sua determinação na situação da indústria doméstica em informações incorretas e incompletas, que não poderiam ser verificadas; • basearam sua determinação de nexo causal entre as importações e o dano material com base em variáveis econômicas durante um período de apenas oito meses; • não conduziram uma análise prospectiva dos efeitos das importações de forma a determinar se elas estavam ou não causando uma ameaça de dano material; e • atribuiram o dano material às importações do Paquistão sem fazer uma análise comparativa das importações do Paquistão e do México (cujas importações tinham aumentado de maneira similar) e seus respectivos efeitos. Além disso, o Paquistão solicitou que o Painel: • julgasse, com base nas conclusões supra, que a medida de salvaguarda foi inconsistente com as obrigações dos Estados Unidos sob o Artigo 6 do ATC; • julgasse adicionalmente que os Estados Unidos anularam ou comprometeram direitos do Paquistão sob o ATC, uma vez que, de acordo com o Artigo 3.8 do DSU, a infração de uma obrigação constitui um caso evidente de anulação ou comprometimento; • recomendasse, de acordo com o Artigo 19.1 do DSU, primeira sentença, que o DSB solicitasse aos Estados Unidos que se colocassem em conformidade com as obrigações do ATC; e • sugerisse, de acordo com o Artigo 19.1 do DSU, segunda sentença, que a maneira mais apropriada de implementar as conclusões do Painel seria rescindir a medida de salvaguarda. O Painel decidiu não exercer a economia processual e examinou todos os pedidos apresentados pelo Paquistão. Sustentou que todos os pedidos, com exceção dos relativos: (i) às informações utilizadas pelos Estados Unidos para basear sua determinação; e (ii) ao reduzido período de oito meses para a determinação do nexo causal entre as importações e o dano material. Os Estados Unidos apelaram das conclusões do Painel com respeito às questões de: (i) padrão de revisão; (ii) definição de indústria doméstica, em que os Estados Unidos haviam excluído a porção de filamentos produzidos pelos chamados produtores verticalizados para seu próprio uso; e (iii) atribução de dano material (em que o Painel culpou os Estados Unidos por não examinar as importações do México e possivelmente outros Membros individualmente e atribuir, ao invés disso, o dano alegado inteiramente às importações do Paquistão).

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O Órgão de Apelação rejeitou as contestações dos Estados Unidos e concordou com o Painel com respeito às duas últimas questões. Entretanto, concluiu que o Painel excedeu seu mandato ao considerar informações que não foram disponibilizadas ao Membro importador, os Estados Unidos, quando ele realizou sua determinação de dano causado à sua indústria pelo aumento das importações.

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5. TESTE SUA COMPREENSÃO Após ter estudado este Módulo, você consegue responder às seguintes perguntas? Você deve responder simplesmente “sim” ou “não”. Considere breves justificativas. 1. O setor de têxteis e vestuário não foi ainda integrado ao GATT. Nesse contexto, como pode o DSU ser relevante para a solução de controvérsias referentes ao ATC? 2. O ATC substituiu o MFA que por muito tempo regulou o comércio de têxteis e vestuário. Em que aspecto o MFA é ainda relevante? Ele também tem relevância em controvérsias referentes ao ATC? 3. Por que uma controvérsia envolvendo a imposição de direitos antidumping sobre vestimentas não pode ser analisada segundo o ATC? 4. Um Membro da OMC está considerando solicitar consultas com outro Membro da OMC para tomar posicionamento com relação às mudanças feitas pelo segundo em suas regras de origem de produtos têxteis. Quais são os processos e procedimentos corretos que o Membro solicitante deve seguir? 5. Um Membro da OMC impôs uma restrição de quota nas importações de um produto de vestuário originário de outro Membro da OMC sem solicitar ou empreender quaisquer consultas de acordo com o Artigo 6 do ATC. Esta medida é justificada pelo ATC? 6. O TMB recomendou que um Membro importador deveria retirar uma restrição imposta por ele sob a salvaguarda provisória do ATC. O Membro insiste na justificativa de sua medida e se recusa a aceitar a recomendação do TMB. Pode este Membro agir assim? Qual recurso está disponível ao Membro exportador sob a OMC? Cite os dispositivos aplicáveis para amparar a abordagem que você sugere. 7. O que o TMB declarou com respeito à questão da dedução tripla de quotas devido às reiteradas ocorrências de tranbordos? 8. Dois Membros da OMC concordaram em estabelecer uma restrição de quota para um período de três anos a partir de 15 de maio de 2002, de acordo com o Artigo 6 do ATC. Esta restrição será consistente com o ATC e o Acordo da OMC após 1o de janeiro de 2005?

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6. UM ESTUDO DE CASO Este capítulo identifica um caso hipotético com referência a certos dispositivos do ATC. Sugere-se que os leitores deste Módulo tentem desenvolver argumentos e arrazoamentos detalhados quanto a este caso, presumindo que será litigado perante a OMC. Vale relembrar a partir do Capítulo 1.4.4 deste Módulo que o Artigo 2.13 e 2.14 do ATC estipularam que os níveis de quota para os produtos que ainda não estiverem integrados ao GATT 1994 deverão ser diminuídos durante o período de transição de acordo com a seguinte fórmula: Após 1o de janeiro de 1995: Todas as taxas anuais de ampliação de quotas, que existiram nos respectivos acordos bilateral anteriores ao ATC, sejam aumentadas em pelo menos 16%62. Assim, uma taxa de ampliação anual de 6% deverá ser aumentada para 6,96%; de 5% para 5,80%; de 4% para 4,64%; de 3% para 3,48%; de 2% para 2,32%; de 1% para 1,16%. Após 1o de janeiro de 1998: A taxa de ampliação anual resultante da fórmula acima deverá ser aumentada em pelo menos mais 25%.63 Após 1o de janeiro de 2002: As taxas resultantes do cálculo acima (isto é, de 1998) deverão ser aumentadas em pelo menos mais 27%.64 Entretanto, para países exportadores considerados pequenos fornecedores, o ATC estabeleceu tratamento preferencial para tais aumentos nas quotas. Assim o Artigo 1.2 do ATC estipulou: Os Membros permitem que se utilize os dispositivos do parágrafo 18 do Artigo 2… de tal forma que permita significativos aumentos nas possibilidades de acesso para pequenos fornecedores…65 [Grifos do autor] Além disso, o Artigo 2.18 do ATC dispôs: No que concerne àqueles Membros cujas exportações estejam sujeitas a restrições no dia anterior à entrada em vigor do Acordo da OMC e cujas restrições representam 1,2% ou menos do volume total das restrições aplicadas por um Membro importador após 31 de dezembro de 1991 …, significativas melhorias no acesso a sua exportações deverão ser realizadas, na entrada em vigor do Acordo da OMC e pela duração deste Acordo, mediante o avanço em uma etapa das taxas de ampliação indicadas nos parágrafos 13 e 14 [reproduzidas acima], ou mediante ao menos mudanças equivalentes conforme for mutuamente acordado com respeito à diferente combinação de dispositivos acerca de níveis basais, aumento e flexibilidade. Tais melhorias devem ser notificadas ao TMB. [Grifos do autor] 62 Artigo 2:13 do ATC. 63 Artigo 2:14(a) do ATC. 64 Artigo 2:14(b) do ATC. 65 Na medida do possível, as exportações originárias de um Membro menos desenvolvido podem também ser beneficiadas por este dispositivo.

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Ao concretizar o tratamento preferencial para pequenos fornecedores, entretanto, os países importadores que mantiverem restrições de quota (“países restritivos”) deram várias interpretações aos dispositivos citados acima. Assim, na primeira etapa a partir de janeiro de 1995, o país restritivo ‘A’ aumentou suas taxas existentes antes do ATC primeiramente em 16% e, após, em 25%, isto é, cumulativamente. Conseqüentemente, a taxa de ampliação pré-ATC de 6% foi aumentadas em 8,7%. Subseqüentemente, na segunda etapa a partir de 1998, a taxa resultante foi aumentada em 27% para 11.05%. A taxa foi então novamente aumentada em 27% para 14.03%, na terceira etapa a partir de 2002. Mas o país restritivo ‘B’ simplesmente apresentou os fatores de ampliação prescritos para as etapas subseqüentes. Assim, para a etapa 1, aplicou 25%; para a etapa 2,27%; e para a etapa 3, outros 27%. Consequentemente, a taxa de ampliação pré-ATC de 6% foi aumentada para 7.5%, 9,53%, e 12,10%, respectivamente. Pode-se notar que as taxas permitidas pelo país restritivo ‘B’ produziram menor ampliação de acesso a mercado para os pequenos fornecedores envolvidos que as permitidas pelo país restritivo ‘A’. País A País B Após 1o de Janeiro de 1995 8,7 % 7,5 % Após 1o de Janeiro de 1998 11,05 % 9,53 % Após 1o de Janeiro de 2002 14,03 % 12,10 % À luz dos princípios de interpretação aplicados pelos painéis e pelo Órgão de Apelação para os casos revistos neste Módulo, os leitores estão convidados a desenvolver argumentos com respeito às justificativas ou rejeição das duas abordagens. Podem ainda especificar o processo perante o ATC e o DSU, em que uma controvérsia seja perseguida por um pequeno país exportador, Membro da OMC.

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7. LEITURA ADICIONAL 7.1 Livros e Artigos • Bagchi, S., International Trade Policy in Textiles: Fifty Years of Protectionism (Geneva, ITCB, 2001) • Baughman, L., et al., “Of Tyre Cords, Tyres and Tents: Window-Dressing in the ATC?”, The World Economy, Vol. 20, No. 4 • Raffaelli, M. and Jenkins, T., The Drafting History of the Agreement on Textiles and Clothing (Geneva, ITCB, 1995) • Tang, Xiaobing, “The Integration of Textiles and Clothing into GATT and WTO Dispute Settlement”, in Dispute Resolution in the World Trade Organization (Cameron May, London) 7.2 Relatórios do Painel e do Órgão de Apelação • Relatório do Painel, United States – Restrictions on Imports of Cotton and Man-made Fibre Underwear (“US – Underwear”), WT/DS24/R, adotado em 25 de fevereiro de 1997, como modificado pelo Relatório do Órgão de Apelação, WT/DS24/AB/R, DSR 1997:I, 31. • Relatório do Órgão de Apelação, United States – Restrictions on Imports of Cotton and Man-made Fibre Underwear (“US – Underwear”), WT/ DS24/AB/R, adotado em 25 de fevereiro de 1997, DSR 1997:I, 11. • Relatório do Painel, United States – Measure Affecting Imports of Woven Wool Shirts and Blouses from India (“US – Wool Shirts and Blouses”), WT/ DS33/R, adotado em 23 de maio de 1997, as upheld by the Relatório do Órgão de Apelação, WT/DS33/AB/R e Corr.1, DSR 1997:I, 343. • Relatório do Órgão de Apelação, United States – Measure Affecting Imports of Woven Wool Shirts and Blouses from India (“US – Wool Shirts and Blouses”), WT/DS33/AB/R e Corr.1, adotado em 23 de maio de 1997, DSR 1997:I, 323. • Relatório do Painel, Turkey – Restrictions on Imports of Textile and Clothing Products (“Turkey – Textiles”), WT/DS34/R, adotado em 19 de novembro de 1999, como modificado pelo Relatório do Órgão de Apelação, WT/DS34/AB/R. • Relatório do Órgão de Apelação, Turkey – Restrictions on Imports of Textile and Clothing Products (“Turkey – Textiles”), WT/DS34/AB/R, adotado em 19 de novembro de 1999. • Relatório do Painel, United States – Transitional Safeguard Measure on Combed Cotton Yarn from Pakistan (“US – Cotton Yarn”), WT/DS192/ R, adotado em 5 de novembro de 2001, como modificado pelo Relatório do Órgão de Apelação, WT/DS192/AB/R.

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• Relatório do Órgão de Apelação, United States – Transitional Safeguard Measure on Combed Cotton Yarn from Pakistan (“US – Cotton Yarn”), WT/ DS192/AB/R, adotado em 5 de novembro de 2001. 7.3 Documentos e Informações • International Textiles and Clothing Bureau (ITCB) “Conduct of Textile Trade Relations under GATT/WTO – A Chronological Account” (www.itcb.org) • OMC, Relatórios do Órgão de Monitoramento de Têxteis (G/TMB/R/-) e (G L/459).