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Súmula n. 174
(*) SÚMULA N. 174 (CANCELADA)
No crime de roubo, a intimidação feita com arma de brinquedo autoriza o
aumento da pena.
Referência:
CP, art. 157, § 2º, I.
Precedentes:
REsp 5.679-SP (5ª T, 06.02.1991 – DJ 18.03.1991)
REsp 12.279-SP (6ª T, 25.08.1992 – DJ 13.10.1992)
REsp 28.590-SP (5ª T, 07.12.1992 – DJ 10.10.1994)
REsp 33.003-SP (6ª T, 14.11.1995 – DJ 20.05.1996)
REsp 36.752-SP (6ª T, 19.10.1993 – DJ 29.11.1993)
REsp 38.136-SP (6ª T, 31.05.1994 – DJ 27.06.1994)
REsp 62.724-SP (5ª T, 17.05.1995 – DJ 07.08.1995)
REsp 67.524-SP (5ª T, 21.08.1995 – DJ 06.11.1995)
Terceira Seção, em 23.10.1996
DJ 31.10.1996, p. 42.124
(*) Julgando o REsp n. 213.054-SP, na sessão de 24.10.2001, a Terceira
Seção deliberou pelo CANCELAMENTO da Súmula n. 174.
DJ 06.11.2001, p. 229
(*) RECURSO ESPECIAL N. 213.054-SP (99.0039960-9)
Relator: Ministro José Arnaldo da Fonseca
Recorrente: Ministério Público do Estado de São Paulo
Recorrido: Samuel da Cunha Souza
Advogado: Marco Aurélio V de Faria - Defensor Público
EMENTA
Recurso especial. Penal. Roubo. Emprego de arma de brinquedo. Causa especial de aumento de pena prevista no inciso I, § 2º, do art. 157, do Código Penal. Súmula n. 174-STJ. Cancelamento.
O aumento especial de pena no crime de roubo em razão do emprego de arma de brinquedo (consagrado na Súmula n. 174-STJ) viola vários princípios basilares do Direito Penal, tais como o da legalidade (art. 5º, inciso XXXIX, da Constituição Federal e art. 1º, do Código Penal), do ne bis in idem, e da proporcionalidade da pena.
Ademais, a Súmula n. 174 perdeu o sentido com o advento da Lei n. 9.437, de 20.02.1997, que em seu art. 10, § 1º, inciso II, criminalizou a utilização de arma de brinquedo para o fi m de cometer crimes.
Cancelamento da Súmula n. 174-STJ.
Recurso conhecido mas desprovido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos, em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráfi cas a seguir, por maioria, deliberar pelo cancelamento da Súmula n. 174 e, conseqüentemente, conhecer do recurso, mas negar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Felix Fischer, Gilson Dipp, Hamilton Carvalhido, Jorge Scartezzini, Paulo Gallotti e Fontes de Alencar votaram com o Sr. Ministro Relator. Vencido o Sr. Ministro Edson Vidigal, que votava contrariamente ao cancelamento da Súmula n. 174 e dava provimento ao recurso. Não participou do julgamento o Sr. Ministro Fernando Gonçalves, por ter presidido a sessão de 26.09.2001.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
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Brasília (DF), 24 de outubro de 2001 (data do julgamento).
Ministro Vicente Leal, Presidente
Ministro José Arnaldo da Fonseca, Relator
DJ 11.11.2002
RELATÓRIO
O Sr. Ministro José Arnaldo da Fonseca: Trata-se de recurso especial
fundamentado na alínea c, do inciso III, do artigo 105, da Constituição Federal,
interposto pelo Ministério Público do Estado de São Paulo, contra acórdão
do Eg. Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo que, provendo
parcialmente recurso de apelação interposto pelo ora recorrido, excluiu da
condenação a causa especial de aumento de pena prevista no inciso I, § 2º, do
art. 157, do Código Penal, por se tratar, no caso, de crime de roubo cometido
com utilização de arma de brinquedo (fl s. 90-101).
Sustenta o recorrente que a incidência da referida causa especial de
aumento de pena incide mesmo quando o agente pratica o roubo com emprego
de arma de brinquedo, trazendo em apoio à sua tese julgados desta Corte e do
Col. Supremo Tribunal Federal.
Contra-arrazoado, o recurso foi admitido por despacho de fl s. 164-165.
Neste grau de jurisdição, manifestou-se o Ministério Público Federal pelo
conhecimento e provimento do recurso (fl s. 171-173).
Levado a julgamento em 20 de fevereiro do corrente ano, proferi voto no
sentido de prover o recurso do Parquet Estadual, prestigiando o enunciado da
Súmula n. 174 desta Corte (fl s. 175).
Todavia, após pedir vista dos autos, o em. Ministro Felix Fischer, com
fundamento no art. 125, § 1º, do Regimento Interno deste Tribunal, solicitou o
sobrestamento do julgamento e a remessa dos autos a esta Eg. Terceira Seção,
para revisão da Súmula (fl s. 176).
Na assentada de 3 de abril último, a solicitação foi acolhida por
unanimidade pelos Ministros integrantes da Eg. Quinta Turma (fl s. 177).
Antes de incluído o feito em pauta, determinei nova vista dos autos ao
Ministério Público Federal, nos termos do art. 125, § 2º, in fi ne, do RISTJ.
SÚMULAS - PRECEDENTES
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Em nova manifestação, o Parquet ratifi cou o parecer de fl s. 171-173.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro José Arnaldo da Fonseca (Relator): De início, cumpre
observar que, embora não observado rigorosamente o disposto no art. 255, § 1º
do RISTJ - uma vez que o recorrente apenas transcreveu e anexou as ementas
dos acórdãos paradigmários - tenho por viável o conhecimento do recurso,
porquanto, no caso, das ementas colacionadas pode-se constatar sem esforço
que está caracterizada a divergência interpretativa entre os arestos trazidos
a confronto e o acórdão impugnado acerca da questão federal suscitada. No
particular, tem advertido esta Corte:
Direito Econômico. Correção monetária. Procedimento liquidatório. Janeiro/1989. Orientação da Corte. Dissídio notório. Recurso acolhido.
I - Nos cálculos realizados em sede de procedimento liquidatório deve ser adotado, como fator de correção relativo a janeiro/1989, o percentual de 42,72%.
II - A transcrição de ementas que, por si só, sejam sufi cientes a evidenciar a dissonância interpretativa, nos casos de dissídio notório, enseja a admissibilidade do especial pela alínea c do permissor constitucional.
(REsp n. 101.956-RJ, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo, DJ de 24.02.1997, p. 3.342)
Além disso, o recurso é tempestivo e atende aos demais requisitos de
admissibilidade, razão pela qual dele conheço.
Passo ao exame do mérito.
O recorrido Samuel da Cunha Souza foi condenado em primeiro grau a
2 anos e 8 meses de reclusão, em regime inicialmente fechado, e ao pagamento
de 6 dias-multa, por infrigência ao art. 157, § 2º, inciso I, c.c. o art. 14, inciso II,
ambos do Código Penal.
Em sede de apelação, o Tribunal a quo excluiu da condenação a causa
especial de aumento de pena relativo ao emprego de arma, seguindo o
entendimento doutrinário no sentido de que “servindo a arma de brinquedo
como meio idôneo para ameaçar, sem ser “arma” na acepção legal, constituiria bis
in idem interpretá-la como meio que também qualifi ca o roubo” (fl s. 94).
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Já o recorrente, Ministério Público do Estado de São Paulo, busca a
reforma desse julgado alegando que a incidência da referida causa especial de
aumento de pena incide mesmo quando o agente pratica o roubo com emprego
de arma de brinquedo, trazendo em apoio à sua tese julgados desta Corte e do
Col. Supremo Tribunal Federal.
Vê-se, portanto, que se trata da antiga, porém ainda atual, polêmica travada
entre os subjetivistas e objetivistas em torno da relevância penal da arma de
brinquedo para fi ns de agravamento da pena do crime de roubo, controvérsia
essa que foi sintetizada de forma bastante didática pelo insigne jurista e
professor MANOEL PEDRO PIMENTEL, em valioso trabalho sobre o tema,
publicado no Repertório IOB de Jurisprudência, 1ª quinzena de janeiro de
1990, n. 1/90, p. 18-19, do qual se transcreve o seguinte trecho, in verbis:
Indaga-se, então, o que será decidido, se a arma empregada ou simplesmente exibida for uma arma de brinquedo, sem efetivo poder vulnerante? Será reconhecida, ou não, a agravante?
3. Duas correntes se formaram na doutrina na jurisprudência, às quais podemos denominar de subjetiva e objetiva. A primeira (subjetiva) sustenta que se a arma de brinquedo for apta para intimidar a vítima, funcionará como se fosse arma verdadeira, e a agravante deverá ser reconhecida. A segunda (objetiva) entende que a lei fala em arma, que é, como vimos, um “instrumento apto a lesar a integridade física”. Ora, no caso da arma ser brinquedo, isto é, apenas ter a aparência de arma, sem nenhum poder vulnerante, a agravante não poderá ser reconhecida.
A dissenção se instalou e os argumentos usados pelas duas correntes que se digladiam são ponderáveis. NELSON HUNGRIA é, no caso, subjetivista, afi rmando: “A ameaça com uma arma inefi ciente (ex.: revólver descarregado) ou fi ngida (ex.: um isqueiro com feitio de revólver), mas ignorando a vítima tais circunstâncias, não deixa de constituir a majorante, pois a ratio desta é intimidação da vítima, de modo a anular-lhe a capacidade de resistir.” (Op. cit., p. 58).
No mesmo sentido é o ensinamento de MAGALHÃES NORONHA: “Muita vez, uma arma pode não ser idônea para a realização da violência, de acordo com seu destino próprio; assim, p. ex., um revólver descarregado. Mas será idôneo para a ameaça se a vítima desconhecer essa circunstância.” (Direito Penal, Ed. Saraiva, São Paulo, 1977, 13ª ed., vol. 2, p. 166).
4. Em sentido radicalmente oposto opina DAMÁSIO DE JESUS, escrevendo: “Nós, entretanto, cremos que o emprego de arma de brinquedo não qualifi ca o crime de roubo, respondendo o sujeito pelo tipo simples. Isso decorre do sistema da tipicidade. O CP somente qualifi ca o delito de roubo quando o sujeito emprega
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arma. Ora, revólver de brinquedo não é arma. Logo, o fato é atípico diante da qualifi cadora.” (Direito Penal, Ed. Saraiva, São Paulo, 1979, 2º vol., p. 319 e 320).
Entre essas posições extremadas encontra-se o saudoso professor HELENO CLÁUDIO FRAGOSO: “O fundamento da agravante reside no maior perigo que o emprego da arma envolve, motivo pelo qual é indispensável que o instrumento usado pelo agente (arma própria ou imprópria), tenha idoneidade para ofender a incolumidade física. Arma fi ctícia (revólver de brinquedo), se é meio idôneo para a prática de ameaça, não é bastante para qualifi car o roubo. O mesmo não se diga, porém, da arma descarregada ou defeituosa em que a inidoneidade é apenas acidental.” (Lições de Direito Penal, Ed. Forense, Rio de Janeiro, 1981, 6ª ed., arts. 121 a 160 do CP, p. 303 e 304).
Não obstante tratar-se de uma opinião intermediária, o texto que se segue indica que HELENO se inclina, afi nal, para uma posição que é defendida pela corrente objetiva, acrescentando: “É corrente nos tribunais o entendimento, data venia, incompreensível, segundo o qual o emprego de um revólver de brinquedo é bastante para confi gurar o furto qualifi cado (RT 411/282, 434/422, 455/434; Julgados TACSP, 19/1, 78; 20/2, 304; 20/2, 172; 22/3, 298 etc.). A lei exige emprego de arma. Um revólver de plástico ou de papelão não é arma na realidade dos fatos, mas tão-somente na errônea interpretação da vítima. Confunde-se o emprego da arma fi ctícia como meio idôneo para ameaçar, e pois para cometer roubo, com o emprego real de arma que qualifi ca o crime. CF. Jur. Crim. n. 482. O STF lamentavelmente se orienta no sentido da jurisprudência dominante (RTJ 72/961).” (Op. cit., p. 304).
JÚLIO FABBRINI MIRABETE, sem expender propriamente sua opinião, faz uma importante resenha do assunto, dizendo: “Embora a arama simulada (brinquedo, por exemplo) não confi gure esse instrumento, a jurisprudência predominante, inclusive no STF, estudo no roubo.” Aponta, a seguir, numerosos arestos que adotam esta orientação. E prossegue: “Entretanto, o fundamento da qualifi cadora reside no maior perigo que o emprego da arma envolve, motivo pelo qual é indispensável que o instrumento usado pelo agente (arma própria ou imprópria) tenha idoneidade para ofender a incolumidade física. Arma fi ctícia, se é meio idôneo para a prática de ameaça, não é bastante para qualifi car o roubo. Assim pensam Fragoso e Damásio, com respaldo em orientação minoritária.” Alinha, em continuação, a indicação da jurisprudência que consagra este entendimento (Manual de Direito Penal, Ed. Atlas, São Paulo, 1986, 3ª ed., vol. 2, p. 214 e 215).
Observa, ainda, o mesmo autor, que: “Já quanto à arma descarregada ou defeituosa, a opinião praticamente unânime é a do reconhecimento da qualifi cadora, acentuando-se “que, no caso, a inidoneidade para vulnerar é apenas acidental (RT 571/395). Contra: RT 565/345).” (Op. cit., p. 215)
5. Este é o quadro atual da disputa. Verifica-se que os argumentos, de parte a parte, impressionam, como impressionante é, também, o renome e a competência dos autores empenhados, sem desprezar, evidentemente, o elevado
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grau de cultura e de inteligência que ostentam os magistrados que decidiram em um ou em outro sentido.
Note-se que a controvérsia acima exposta não diz respeito à relevância penal da arma de brinquedo, em si considerada. Que a arma de brinquedo ou qualquer outro simulacro de arma tem relevância penal, isso ninguém discute, porque lhe é inerente a capacidade de, simuladamente, ameaçar, intimidar, impossibilitar a resistência da vítima. Assim, não há dúvida de que a arma de brinquedo pode ser utilizada como instrumento efi ciente para a prática de qualquer crime que possa ser cometido mediante grave ameaça, inclusive o roubo.
O que é bastante discutível é a sua idoneidade para agravar a pena de roubo.
Na jurisprudência pátria, ao menos nos Tribunais Superiores, prevaleceu a corrente subjetivista, segundo a qual para a incidência da causa especial de aumento de pena prevista no inciso I, § 2º, do art. 157, do Código Penal, deve-se considerar não a efetiva potencialidade da “arma”, mas o que ela representa para efeito de intimidação da vítima, com a anulação ou diminuição de sua capacidade de resistência, o que pode vir a ocorrer mesmo quando o autor do roubo emprega arma de brinquedo.
A opção pela orientação subjetivista levou esta Corte a editar o verbete de Súmula n. 174, que assim preconiza:
Súmula n. 174 - No crime de roubo, a intimidação feita com arma de brinquedo autoriza o aumento da pena.
Aparentemente pacifi cada a quaestio, ao menos no âmbito da jurisprudência
dos Tribunais Superiores, eis que a velha polêmica reacende em face do advento
da Lei n. 9.437, de 20.02.1997, que, em seu art. 10, § 1º, inciso II, tipifi ca como
crime, punido com detenção de um a dois anos e multa, a seguinte conduta:
II - utilizar arma de brinquedo, simulacro de arma capaz de atemorizar outrem, para o fi m de cometer crimes.
Pois bem. Consoante advertiu o em. Ministro Felix Fischer, ao propor
a revisão da súmula em referência, quase a unanimidade da doutrina penal
moderna posiciona-se contrariamente ao Enunciado de n. 174, por ofender
vários princípios basilares do Direito Penal. E o fazem com convincentes
argumentos.
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Primeiramente, sustenta-se que o aumento especial de pena em razão do
uso de arma de brinquedo (consagrado na Súmula n. 174) viola o princípio da
legalidade (art. 5º, inciso XXXIX, da Constituição Federal e art. 1º, do Código
Penal). É que a lei (art. 157, § 2º, inciso I, do CP) fala em arma e não em
simulacro de arma, ou coisa parecida. Logo, se se tratar de um artefato que imita
uma arma, a qualifi cadora não pode ser reconhecida. Nesse sentido, a observação
de LUIZ FLÁVIO GOMES, com remissão à prestigiada doutrina, in verbis:
(...) O argumento de que a ampliação do conceito de arma, in malam partem, viola o princípio da tipicidade vem sendo sustentado, há anos, por Damásio E. de Jesus (Direito penal, parte especial, 18ª ed., São Paulo, Saraiva, 1996, 2º vol., p. 303), que diz: “O CP somente qualifica ao delito de roubo quando o sujeito emprega arma. Ora, revólver de brinquedo não é arma. Logo, o fato é atípico diante da qualifi cadora”. Em síntese muito acertada, Weber Martins Batista acrescenta: “Seduzidos pela lição do notável Min. Nélson Hungria, esquecem-se alguns intérpretes que o problema não é de psicologia, mas de tipicidade A lei não fala em objeto capaz de intimidar, mas, especifi camente, em arma, o que impede admitir como tal, por analogia in malam partem, qualquer objeto que não seja arma” (O furto e o roubo no direito e no processo penal, Forense, 1987, p. 234 apud Fernando de Almeida Pedroso, Roubo: sua consumação..., cit., p. 301). Majoritariamente grandes expoentes da doutrina brasileira (Alberto Silva Franco e outros (Código Penal e sua interpretação jurispudencial. 6ª ed.. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p. 2.523), Luiz Regis Prado e Cezar Roberto Bitencourt (Código Penal anotado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p. 580), Celso Delmanto (Código Penal comentado. 3ª ed. Atualizada por R. Delmanto. Rio de Janeiro: Renovar, 1991, p. 277), Paulo José da Costa Júnior (Direito penal objetivo. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1989, p. 286), Júlio F. Mirabete, Heleno Cláudio Fragoso (Os dois últimos foram mencionados no trabalho de Manoel Pedro Pimentel, Roubo com emprego de arma de brinquedo, cit.) sufragam o entendimento “objetivista”, sustentando que a arma de brinquedo viola o princípio da legalidade.
(In Estudos de direito penal e processo penal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1998, p. 138-139).
Por outro lado, o entendimento consubstanciado no Enunciado n. 174-
STJ também ofende o princípio do ne bis in idem, pois a intimidação da vítima
mediante o emprego da arma de brinquedo já confi gura a “grave ameaça” que
é elemento típico do roubo simples (art. 157, caput, ou § 1º, do CP), ou seja,
a arma de brinquedo esgota a sua efi cácia intimidativa na confi guração do
próprio injusto penal. O agente só consegue intimidar a vítima porque está
empregando a arma de brinquedo. Mas vencer a resistência da vítima, mediante
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grave a ameaça, é da essência do crime de roubo, de forma que o emprego da
arma de brinquedo ou simulacro de arma não pode servir, simultaneamente,
para caracterizar o roubo (em seu tipo básico) e, sem qualquer outro motivo
relevante, fazer incidir a causa especial de aumento de pena previsto no §
2º, inciso I, do CP. Nas palavras de DAMÁSIO E. DE JESUS, “Aplicando-
se o princípio da subsidiariedade implícita ou tácita, o emprego de arma de
brinquedo ou simulacro de arma integra o roubo simples (art. 157, caput,
ou § 1º), funcionando como meio de execução da ameaça, não incidindo a
circunstância de agravação da pena (art. 157, § 2º, I) (...)” (In Crimes de porte
de arma de fogo e assemelhados: anotações ... - São Paulo: Saraiva, 1999, p. 53). E
como adverte VALDIR SZNICK, “Usar de arma de brinquedo para mudar a
tipicidade de um crime - furto para roubo - já é agravar a conduta do agente.
Mas, mesmo considerando seu efeito intimidativo, não se pode, de novo (bis in
idem) usar da mesma conduta (emprego de arma de brinquedo) para aumentar
a pena.” (...)” (In Crime de porte de arma - São Paulo: Leud, 1997, p. 124). E
ainda, consoante entendimento doutrinário invocado pelo acórdão recorrido,
“servindo a arma de brinquedo como meio idôneo para ameaçar, sem ser “arma”
na acepção legal, constituiria bis in idem interpretá-la como meio que também
qualifi ca o roubo” (fl s. 94).
Outro fundamento também se coloca contrariamente ao Enunciado n.
174: viola o princípio da proporcionalidade da pena. No particular, a lição de
LUIZ FLAVIO GOMES, op. cit. p. 141-142, in verbis:
(...) O grau de censurabilidade de um fato penalmente relevante tem por base o “desvalor da conduta” ou do “resultado” (ambos compõem o injusto penal). Um crime cometido por motivo torpe, v.g., apresenta maior reprovabilidade porque a conduta é mais desvaliosa. Uma lesão corporal culposa que implique em deixar a vítima paraplégica é mais culpável porque o resultado é mais desvalioso. Quando há uma real graduação no injusto justifi ca-se maior pena, mesmo porque cada um deve ser punido na medida da sua culpabilidade. No fundo, essa elementar regra, que está no art. 29 do CP, nada mais é que expressão do princípio da proporcionalidade.
Considerando que a arma de brinquedo “não denota maior risco à vítima ou periculosidade maior na conduta do agente”, nada acrescenta de peculiar relevância ao conteúdo do injusto, de tal modo a justifi car qualquer agravamento especial da pena. Sendo assim, e comparando-se a arma de brinquedo com a verdadeira, o agravamento da pena em relação àquela resulta fl agrantemente desproporcional.
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Não bastassem esses argumentos, é de se observar que a doutrina alienígena
também é contra a equiparação indicada na Súmula n. 174, v.g.: FONTAM
BALESTRA (Tratado de derecho penal, vol. V, p. 518 - Abeledo Perrot -
Buenos Aires: 1969); QUINTANO RIPOLLES (Tratado de la Parte Especial
del Derecho Penal, vol. II, p. 327, Editorial Revista de Derecho Privado,
Madrid, 1964); SEBASTIÁN SOLER (Derecho penal argentino, vol. IV, p.
288, Tipografi ca Editora Argentina, Buenos Aires: 1953), apud ALBERTO
SILVA FRANCO, “Arma de Brinquedo”, Rev. Brasileira de Ciências Criminais,
n. 20, out/dez de 1997, p. 71-74. E ainda: VIVES ANTÓN e GONZÁLES
CUSSAC (Derecho penal: parte especial. Valencia: Tirant lo Blanch, 1996).
Finalmente, o Col. Supremo Tribunal Federal apresenta alguns julgados
incompatíveis com a súmula:
I. Roubo: causa de aumento da pena: emprego de arma (CP, art. 157, par. 2º, I).
A corrente jurisprudencial que entende confi gurado o “emprego de arma” - causa especial do aumento da pena do roubo -, na utilização da arma de brinquedo, a melhor doutrina tem oposto crítica demolidora; ainda, porém, que se aceite a discutível orientação, nem ela permite divisar a referida causa de exacerbação da pena, que é puramente objetiva, na circunstância de o agente simular estar armado, mediante gesto que aparente portar o revólver sob a camisa.
II. Sentença condenatória: causa especial de aumento de pena: fundamentação necessária para a exasperação maxima.
Quando, em razão de causa especial de aumento, a lei autoriza a exasperação da pena dentro de determinados limites percentuais, a opção pelo máximo da agravação permitida há de ser fundamentada, com base em dados concretos.
(HC n. 69.515-RJ, relator Min. Sepúlveda Pertence, DJU de 12.03.1993, p. 3.561)
Roubo. Utilização de arma imprópria ao uso. Efeitos.
A utilização de arma imprópria ao disparo ou de brinquedo não descaracteriza o tipo do artigo 155, caput, do Código Penal. Conforme precedente desta Corte - Habeas Corpus n. 70.534-1, por mim relatado, cujo acórdão foi publicado no Diário da Justiça de 1º de outubro de 1993 - apenas afasta a causa de aumento inserta no inciso I, par. 2º do artigo 157 daquele Diploma. Existência, no caso, da grave ameaça, muito embora sob a óptica da aparência, a evidenciar a violência a pessoa.
(...) omissis.
(HC n. 71.051-MG, 2ª Turma, relator Min. Marco Aurélio, DJU de 23.09.1994, p. 25.328)
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Esses argumentos, de inquestionável coerência dogmática e rigor científi co,
convenceram-me de que o enunciado da Súmula n. 174 não pode subsistir
frente ao Direito Penal moderno, objetivo e humanitário, que não se coaduna
com a analogia in malam partem ou mesmo com a interpretação analógica da
norma penal com o intuito de prejudicar o réu, até porque a pena, na lição de
ROXIN (Claus Roxin, Iniciación al derecho penal de hoy, trad., Sevilha, 1981,
p. 23, apud NILO BATISTA) “é a intervenção mais radical na liberdade do
indivíduo que o ordenamento jurídico permite ao Estado”.
Ademais, uma vez que a Lei n. 9.437, de 20.02.1997, em seu art. 10, § 1º,
inciso II, criminalizou a utilização de arma de brinquedo para o fi m de cometer
crimes (embora a aplicabilidade dessa nova tipifi cação também seja bastante
discutível), o fato é que com ela a Súmula n. 174 não tem mais razão de existir.
Ante o exposto, proponho o cancelamento do Verbete de n. 174 da Súmula
do Tribunal e, se acolhida a proposta, voto pelo desprovimento do presente
recurso especial.
VOTO-PRELIMINAR
O Sr. Ministro José Arnaldo da Fonseca: Sr. Presidente, penso que, como
já se iniciou o julgamento, a intervenção do Ministério Público poderá se limitar
a algum esclarecimento, mas não a título de sustentação oral. Caso contrário,
atentaríamos contra a norma regimental que prevê, que, iniciado o julgamento,
não cabe sustentação oral, mas, sim, algum esclarecimento.
RETIFICAÇÃO DE VOTO-PRELIMINAR (VENCIDO)
O Sr. Ministro José Arnaldo da Fonseca: Sr. Presidente, reconsidero meu
voto, acolhendo a intervenção do Ministério Público.
VOTO-PRELIMINAR
O Sr. Ministro Felix Fischer: Sr. Presidente, o julgamento já começou. Já
houve o voto do Sr. Ministro-Relator. Penso que a intervenção agora só poderá
ser para questão de fato.
SÚMULAS - PRECEDENTES
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VOTO-PRELIMINAR
O Sr. Ministro Gilson Dipp: Sr. Presidente, não se trata simplesmente de
reapreciar um recurso especial. A parte não está pleiteando a reposição de um
pretenso direito violado, mas uma efetiva e acertada aplicação e interpretação
da lei federal; mesmo que fosse só isso, já seria possível a manifestação do custos
legis, quando mais por se tratar da revogação de uma súmula do STJ.
Tenho dito que é mais fácil revogar uma lei do que uma súmula. É muito
cômodo fi carmos repetindo súmulas, sem termos um momento oportuno para
refl etir sobre elas.
Penso que é inteiramente procedente, cabível e necessária a manifestação
do Ministério Público nesta assentada.
PRELIMINAR SUSCITADA - VOTO-PRELIMINAR
O Sr. Ministro Hamilton Carvalhido: Sr. Presidente, fi co com a posição
ortodoxa do Sr. Ministro Felix Fischer, no sentido do incabimento da fala do
Ministério Público, após iniciada a votação, salvo para esclarecimento de fato.
VOTO-PRELIMINAR
O Sr. Ministro Paulo Gallotti: Senhor Presidente, compreendo as razões
pelas quais se concede a oportunidade de o Ministério Público, nesta assentada,
pronunciar-se, mas não encontro justifi cativa regimental. O Regimento, a meu
ver, é claro. No art. 160 diz que: “Nos casos em que cabe sustentação oral, se o
Ministério Público for parte, terá o mesmo tratamento”. Neste caso, ele é parte
e já teve o mesmo tratamento. Este feito foi colocado em pauta, divulgado,
veio para esta Seção e, no dia em que se iniciou o julgamento, após o relatório,
não houve manifestação do Ministério Público. Se eu pedir vista, poderá o
Ministério Público falar outra vez, quando voltar a ser julgado? Continuará
sendo relevante a matéria.
Com a devida vênia, entendendo as razões pelas quais os Colegas votaram
em sentido contrário, acompanho a divergência no mesmo sentido do voto do
Ministro Felix Fischer, conhecendo do recurso, mas negando-lhe provimento.
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VOTO DE DESEMPATE
O Sr. Ministro Fernando Gonçalves (Presidente): Srs. Ministros, confesso que a minha posição seria a de deferir a manifestação do Ministério Público. Prefi ro fi car atento e fi xo no Regimento Interno que tem comando contrário nessas circunstâncias.
Indefi ro a palavra do Ministério Público.
VOTO-VISTA
O Sr. Ministro Edson Vidigal: Senhor Presidente, a Eg. 5ª Turma remeteu a esta 3ª Seção este Recurso Especial interposto pelo Ministério Público do Estado de São Paulo, por envolver Súmula deste colegiado, no caso sobre arma de brinquedo, que o eminente Relator, Ministro José Arnaldo da Fonseca, pelo seu voto, pretende revogar.
Voltando a fi ta, eis os fatos.
Pouco antes das nove da noite, no dia 29 de abril de 1997, a Polícia prendeu em fl agrante Samuel da Cunha Souza, 21 anos à época, logo após ter invadido, de arma em punho, um caixa eletrônico do Banco Itaú, na Av. Paula Ferreira, em S. Paulo, Capital, obrigando duas pessoas, Claudinete e seu marido Luis Carlos Santos, a sacarem todo o dinheiro da conta, num total de R$ 380,00 (trezentos e oitenta reais).
Com o dinheiro no bolso e ainda de arma em punho, Samuel saiu correndo e atrás dele as duas vítimas a gritarem “pega ladrão”. A pronta ação da polícia impediu que o assaltante desaparecesse no meio do povo. Preso em fl agrante, viu-se depois que o revólver do assalto era de brinquedo.
Como tudo, ou quase tudo, que rola no nosso planeta, polícia, Ministério Público, justiça, é muito devagar, só agora, quatro anos depois, é que isso chega aqui para decisão fi nal e trazendo, ainda, um estopim para explodir a nossa súmula, a de n. 174, que estabelece - “no crime de roubo, a intimidação feita com arma de brinquedo autoriza o aumento da pena”.
Foi como entendeu o Juiz do caso, aplicando, na condenação a dois anos e oito meses de reclusão, a qualifi cadora de uso de arma. Em recurso de apelação, o Tribunal de Alçada Criminal entendeu que, como a arma era de brinquedo não cabia a qualifi cadora que ensejou o aumento da pena. (CP, art. 157, I, § 1º). A pena de Samuel foi então reduzida a dois anos de reclusão, em regime semi-aberto.
SÚMULAS - PRECEDENTES
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Daí este Recurso Especial do Ministério Público apontando dissídio
jurisprudencial e pedindo o restabelecimento da sentença originária.
O não provimento deste Recurso Especial aqui, nos termos propostos pelo
eminente Ministro Relator, implicará na revogação da Súmula n. 174 e o meu
voto é para que não seja revogada.
Agradeço a atenção de V.Exas. para o pouco mais que tenho a dizer
em defesa da nossa Súmula n. 174, que diz, repito, - “No crime de roubo, a
intimidação feita com arma de brinquedo autoriza o aumento da pena”.
Os comandos do nosso Código Penal abordados por esse tema jurídico
assim estabelecem:
Art. 157. Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência:
Pena - reclusão, de quatro a dez anos, e multa.
(...)
§ 2º. A pena aumenta-se de um terço até metade:
I - se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma;
Há quem sustente tese no sentido da arma de brinquedo ser idônea à
confi guração do crime de roubo, mas não à incidência da causa de aumento do
§ 2º, inciso I.
Para tanto, são apresentados os seguintes argumentos:
- Uma coisa é intimidação própria do roubo. Ela pode ocorrer pela violência, desproporção física acentuada da ameaça e (...) até pelo uso de arma de brinquedo. Até aí o aspecto subjetivo é de destaque. A majoração do § 2º, inciso I, no entanto, se dá pelo maior perigo que representa a arma, o que é um aspecto objetivo. Trata-se de um perigo real. Não se pode, pois, equiparar a conduta de quem vai roubar sem pretender, ab initio, lesionar ou matar, com aquele que, na mesma situação, pelo menos, assume o risco das conseqüências do uso de uma arma de verdade. a Súmula n. 174-STJ fere o princípio da proporcionalidade (atinge o senso comum).
Como se sabe, existem duas linhas de entendimento a respeito da quaestio
juris. Uma releva o caráter subjetivo, ou seja, o efetivo potencial de intimidação
que uma arma de brinquedo pode exercer sobre a vítima como se arma de
verdade fosse (Súmula n. 174- STJ). Outra, sustenta que a arma de brinquedo
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por não ser arma, no sentido de instrumento apto a lesar a integridade física,
mostra-se inapta à tipifi cação da majorante.
Coaduno do entendimento perfi lhado pela primeira corrente.
Tomando-se como base para análise o roubo perpetrado mediante grave
ameaça, é de se observar que o legislador, ao majorar a pena em razão da
utilização de arma de fogo, assim o fez tão-somente por verifi car que a ameaça
exercida mediante esse instrumento é tão extrema, capaz de causar tamanho
pavor, que a vítima, geralmente, não pode oferecer qualquer tipo de resistência.
Observe-se que para a confi guração da causa de aumento basta que a grave
ameaça tenha sido exercida mediante o emprego da arma, não sendo necessária
a ocorrência de dano à integridade física da vítima. Daí ser irrelevante o fato do
instrumento ser efetivamente efi caz para causar o dano ou não.
Tem-se, pois, para a caracterização da majorante a observação do caráter
subjetivo do seu conteúdo, ou seja, se a arma utilizada é realmente eficaz
para causar grande intimidação no homo medius, de forma a inviabilizar a sua
capacidade de resistir.
Sob esse prisma, é indiscutível que a arma de brinquedo é totalmente
idônea para alcançar o resultado típico - a ameaça extrema ocasionada pela
utilização do instrumento contra a vítima.
Com a tecnologia, a cada dia que passa, as armas de brinquedo estão mais
sofi sticadas, sendo impossível até mesmo aos efetivos conhecedores do engenho
de ataque distinguir, a olho nu, uma arma verdadeira de outra falsa.
Tanto é verdade, que Marcelo Borelli (ex-estudante de direito, considerado
um dos maiores ladrões de caixa-forte do País, apontado, inclusive, como um
dos participantes do assalto ao avião da Vasp no ano passado, no qual foram
subtraídos 61 quilos de ouro), no semestre passado, fez refém o próprio chefe
da carceragem da Superintendência da Polícia Federal nesta Capital, Marco
Antônio Bandeira, mediante a utilização de uma arma de brinquedo.
Justamente por não ser possível à vítima reconhecer de pronto a farsa que
se confi gura a ameaça de extremo efeito, obtendo o assaltante o mesmo resultado
aterrorizante que causaria se estivesse utilizando uma arma de verdade.
Por ocasião do Julgamento do Recurso Especial n. 33.003-SP, publicado
no DJ de 20 de maio de 1996, o eminente Ministro Vicente Leal apresentou, de
forma translúcida, a questão:
SÚMULAS - PRECEDENTES
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É a exegese que melhor se coaduna com a ratio legis do cânon sub examen. De fato, deve levar-se em consideração não a efetiva potencialidade da arma, mas o poder que a mesma tem de intimidação da vítima, que temerosa por sua integridade física, não opõe resistência à subtração da res.
Imperioso também destacar o magistério do não menos eminente Min.
Vicente Cernicchiaro1:
Sem dúvida, decorre das máximas da experiência, o agente armado, como regra, com maior facilidade vence a resistência da vítima. A causa de aumento da sanção projeta uma circunstância da conduta. Insista-se: o agente se valeu de instrumento hábil a auxiliá-lo a “subtrair coisa móvel alheia”.
A arma de brinquedo (...) interessa ao crime de roubo porque a majorante não decorre do simples emprego de arma (sentido próprio); resulta, isso sim, da potencialidade ofensiva que, circunstancialmente, possa conter. Quando, por imitar com perfeição, transmitir a alguém o efeito intimidatório, próprio da arma verdadeira, amedrontar, assustar, fazer a vítima capitular à investida do sujeito ativo, produz, então, a mesma conseqüência da arma verdadeira. Aqui está a razão de a lei cominar sanção mais severa. Insista-se: o que interessa não é a arma em si, mas o efeito que produzir no ânimo da vítima, compelindo-se a ceder à exigência do delinqüente.
Interpretação lógica do Código Penal reclama distinguir “violência ou grave ameaça”.
A primeira é a coação física; a segunda, a coação psicológica, a vítima sucumbe à imposição do agente, temerosa das conseqüências, caso não obedeça ao comando que lhe é dirigido. Imagine-se exibir a arma de brinquedo a alguém com gesto de ataque, em circunstância idônea, dando impressão de ser verdadeira, capaz, portanto, de matar a vítima, caso resista ao ataque. O que interessa para o crime de roubo é o instrumento empregado (inclui a arma de brinquedo) ser idôneo a contribuir para vencer a capacidade de resistência.
Se o criminoso, com a arma de brinquedo, obtiver o mesmo resultado, como se verdadeira fosse, impõe-se o mesmo tratamento. Interpretação diversa é insensível ao sentido fi nalístico da norma. O que conta não é a arma em si, mas a intimidação do ataque!
Nesse mesmo sentido, a doutrina de Nelson Hungria2:
A ameaça com uma arma inefi ciente (ex.: revólver descarregado) ou fi ngida (ex.: um isqueiro com feitio de revólver), mas ignorando a vítima tais circunstâncias,
1. Consulex, Ano X, n. 43.
2. Comentários ao Código Penal, Forense, 2ª ed. p. 58
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não deixa de constituir a majorante, pois a ratio desta é a intimidação da vítima, de modo a anular-lhe a capacidade de resistir. Pela mesma razão, é irrelevante indagar se o agente, ao empunhar ameaçadoramente mesmo uma arma efi caz, estava ou não, apenas simulando o propósito de atacar a vítima, desde que esta efetiva e razoavelmente se intimidou.
E Magalhães Noronha3:
Muita vez, uma arma pode não ser idônea para a realização da violência, de acordo com seu destino próprio; assim, p. ex. um revólver descarregado. Mas será idôneo para a ameaça se a vítima desconhecer essa circunstância. A lei exige apenas que a ameaça ou a violência sejam exercidas com emprego de arma. Não há questionar se o agente preparou-se de antemão com ela, para pôr em ação aqueles meios. É sufi ciente empregá-la, ofendendo a integridade corporal da vítima ou ameaçando-a.
Também coaduna do mesmo entendimento Vicente Sabino Júnio4,
subscrevendo a posição pela aplicação da majorante quando a arma inefi ciente
for efetivamente capaz de intimidar a vítima.
Diz-se, ainda, que:
- A Súmula fere o princípio da reserva legal, basilar garantia individual (art. 5º, inciso XXXIX, da CF e art. 1º CP). Brinquedo ou simulacro de arma não é arma. Nesta linha tem-se: Manoel Pedro Pimentel, Damásio E. de Jesus, Weber B. Martins, L. Flávio Gomes, Alberto Silva Franco, L. Régis Prado, Cezar Roberto Bitencourt, Celso Delmanto, J. F. Mirabete, H. C. Fragoso.
Ora, digo eu, tudo depende da interpretação que se dá a expressão “arma”.
Para aqueles que, como eu, adotam a teoria que privilegia o caráter subjetivo da
causa de aumento, basta que a “arma” seja apta para intimidar a vítima, sendo
irrelevante a sua efi cácia para causar efetivo dano.
Por ocasião do julgamento do Recurso Especial n. 5.679-SP, DJ de
18.03.1991, o eminente Ministro Costa Lima teceu as seguintes considerações:
A técnica aperfeiçoa-se a cada instante. Hoje, não é fácil distinguir uma arma real de uma de imitação. O confl ito mundial acabou de revelar ao mundo diversos tipos de armamentos de plástico imitando os verdadeiros, a tal ponto que foram confundidos e bombardeados.
3. Direito Penal, Saraiva, 1977, II: 166
4. Direito Penal, Sugestões Literárias, 1967, vol. III, p. 739.
SÚMULAS - PRECEDENTES
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(...) De conseguinte, essas espécies de armas ditas de brinquedo tornam-se meios hábeis para caracterizar a qualifi cadora pelo seu conteúdo subjetivo. Na verdade, mesmo esse meio especial, é idôneo, tem capacidade para infundir temor tal que, em pânico, o ofendido não tem como opor qualquer reação ao agente. (REsp n. 5.679-SP, DJ de 18.03.1991).
Seguindo a mesma linha de raciocínio, assim me pronunciei, no mesmo
julgamento:
Alio-me, nesta discussão, ao Ministro Relator e ao Ministro Jesus Costa Lima. Eu também conheço muitas dessas armas ditas de brinquedo e não sei se, em determinada circunstância, acuado por um desconhecido portando uma arma dessa, dita de brinquedo, qual seria a minha reação. Alguém, pego de inopino, ao saltar de um ônibus ou ao dobrar uma esquina, vai poder perguntar ao assaltante se a arma que empunha é de verdade ou é de brinquedo, se é “taurus” ou se é “trol”.
Não há hoje nenhuma diferença visual entre muitos revólveres de verdade e muitos revólveres de brinquedo. A sofi sticação dessas armas ditas de brinquedo está tão perfeita que a ONU/Organização das Nações Unidas, através da UNICEF, que é o seu organismo voltado para as questões da infância, está pedindo às indústrias que parem com a fabricação desses brinquedos que imitam armas.
Para ilustrar, lembro aqui o que se passa agora mesmo no golfo pérsico, onde a maioria dos armamentos destruídos por bombardeiros aliados sobre o território do Iraque não seriam tanques nem plataformas de mísseis de verdade mas de brinquedo, feitos de papelão ou de fi bra de vidro e expostos à localização pelos aliados apenas para cansá-los e despistá-los dos armamentos de verdade. E essas armas de brinquedo não estão sendo armas de guerra? Não estão servindo a um objetivo na guerra e produzindo conseqüências que as armas de verdade produziriam?
Pois entre nós também, nas cidades e nos campos, os revólveres de verdade já são confundidos com os de brincadeira, servindo uns e outros a um mesmo fi m - o assalto que se consuma mediante grave ameaça e até violência porque se o revólver de brinquedo ainda não expele projétil mortífero, expele susto que também pode resultar em morte e sua coronha, muitas delas já tão pesadas quanto a dos revólveres de verdade se presta à violência das coronhadas. E coronhada fere, sangra e, portanto, também até mata.
Diante da escala, sempre crescente, de crimes com esse artifício, decidiu
o legislador editar a Lei n. 9.437/1997, punindo expressamente a utilização da
arma de brinquedo ou simulacro de arma capaz de atemorizar outrem, quando
destinadas ao cometimento de crimes.
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Eis o teor da norma:
Art. 10. Possuir, deter, portar, fabricar, adquirir, vender, alugar, expor à venda ou fornecer, receber, ter em depósito, transporte, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob guarda e ocultar arma de fogo, de uso permitido, sem a autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar.
Pena - detenção de 1 (um) a 2 (dois) anos e multa.
§ 1º. Nas mesmas penas incorre quem:
(...)
II - utilizar arma de brinquedo, simulacro de arma capaz de atemorizar outrem, para o fi m de cometer crimes;
Ao discorrer sobre a Lei, Valdir Sznick tece pertinentes observações sobre
a arma de brinquedo5:
A polêmica se a arma de brinquedo é ou não punível fica agora claro e decidida, no sentido afi rmativo: arma de brinquedo é arma.
No sentido de que era arma (especialmente em caso de roubo e, de seqüestro) era a doutrina e a jurisprudência, quase toda em peso; existiam, porém, exceções. O emprego de arma em qualquer crime, com o objetivo de intimidar, ameaçar, denota no agente um grau de criminosidade maior do que aquele que comete o mesmo crime à mão livre; um exemplo simples é a briga à mão livre (limpa) e a realizada mediante o emprego de arma (seja de fogo, seja arma branca).
Nesses crimes cometidos com violência, pouco interessa a espécie de arma e sim de sua potencialidade ofensiva. Essa arma foi o instrumento usado e que obteve o seu efeito: amedrontou a vítima, já que a ameaça exercida pela arma (de brinquedo ou não) foi efetiva.
Verdade de que a arma de brinquedo, em si, não serve como meio de ataque, no sentido de causar, após amedrontar, nenhum maior efeito lesivo, além de intimidação, que o agente visava. Isto decorre da perfeição com que essas armas de brinquedo são feitas. Imitam, de tal maneira, que só pessoas que conhecem arma são capazes de distinguir; mesmo assim, a arma na mão do outrem leva até mesmo o especialista (conhecedor de arma) a se confundir. Imagine a maioria das pessoas.
Tem-se que a arma exerce uma coação psicológica (o metus) na pessoa ameaçada e, pois, cumpriu o seu papel, que é o mesmo da arma de verdade.
No caso de qualquer das armas (de verdade ou brinquedo) exerceu um efeito intimidatório à vítima; conseguiu assim, o resultado que visava.
5. Crime de Porte de Arma, Leud, 1997, p. 121-122.
SÚMULAS - PRECEDENTES
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Mas diz-se, também, que:
A Súmula ofende o princípio basilar do ne bis in idem. A intimidação da vítima serviria para o caput e simultaneamente, sem outra razão de ser, para a majoração. Uma coisa, é sem dúvida, a essência do roubo, outra é a forma agravada.
Há muito a questão tem sido enfrentada por esta Corte Superior.
Reporto-me às palavras do Min. Dias Trindade:
Ante a onda de violência, que a cada dia parece mais engolfar a sociedade, não vejo como se quedar a Justiça Criminal em exegese mais favorável aos facínoras, quando se reclama um rigor consentâneo com a repressão mais efetiva de crimes da natureza dos aqui revelados.
Com efeito, se admitimos a eficácia da arma inidônea para, qualificando a figura de furto, reconhecermos a prática do roubo, erigido em nova figura criminal, não vejo porque não admitir também essa potencialidade de infundir temor à vítima, estarrecida ante o manejo ou exibição do brinquedo em forma de arma, pelo meliante.
Não se estaria a dar dupla valoração ao meio empregado, para reconhecer a ameaça e para ter como presente a qualifi cadora, pois que a primeira se afi gura independente, enquanto que a segunda requer o emprego do meio. A ameaça ocorre por si ao passo que quando esta é feita com o emprego da arma, ainda que inefi caz, perfaz-se a majorante da pena, a ser considerada em face da real intimidação que causa à vítima (REsp n. 65-SP).
Por fi m, diz-se que:
- A doutrina alienígena é, hoje, toda, na linha ora sustentada inadmitindo a equiparação indicada na Súmula (v.g. Vives Antón/ Gonzales Cussac, Quintano Ripollés, Aftalión, etc.) e que - “O c. Supremo Tribunal Federal apresenta alguns precedentes incompatíveis com a Súmula, v.g.: a) HC n. 71.051-MG, 2ª Turma-STF, relator Min. Marco Aurélio, DJU de 23.09.1994, p. 25.328; b) HC n. 70.534-RJ, 2ª Turma-STF, relator Min. Marco Aurélio, DJU de 1º.10.1993, p. 202.215; c) HC n. 69.515-RJ, 1ª Turma-STF, relator Min. Sepúlveda Pertence, DJU de 12.03.1993, p. 3.561.
Cumpre observar que também há precedentes da Corte Suprema em total harmonia com entendimento consagrado na Súmula n. 174 deste Superior Tribunal de Justiça.
Observe-se:
Roubo. Arma de brinquedo. Se houve intimidação da vítima, por não saber que se tratava de arma de brinquedo, justifi ca-se o aumento da pena a que alude o artigo 157, § 2º, I, do Código Penal. Precedente do STF (RECr n. 90.227).
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
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Recurso extraordinário conhecido, mas não provido (RE n. 90.031, Rel. Min. Moreira Alves, DJ de 05.10.1979).
Roubo. Consumada a subtração da coisa móvel mediante violência ou grave ameaça, a prisão em fl agrante não desclassifi ca o fato típico para tentativa (RECr n. 90.426-RJ).
Roubo. Arma de brinquedo. Se houve intimação da vítima, por não saber que se tratava de arma de brinquedo, justifi ca-se o aumento de pena a que alude o art. 157, § 2º, I, do Código Penal. Precedentes de ambas as Turmas do STF. (RE n. 93.971).
RE conhecido e provido. (RECr n. 99.036-SP, Rel. Min. Cordeiro Guerra, DJ de 16.12.1982).
Roubo qualificado (art. 157, § 2º, I, do Código Penal). Uso de arma de brinquedo. O uso de arma de brinquedo (contrafação), pelo agente, não exclui a circunstância qualifi cativa prevista no artigo 157, § 2º, I, do Código Penal, desde que, ignorando a vítima tal fato, suponha estar ante real ameaça a sua integridade física. Precedentes do Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário Criminal conhecido e provido. (RECr n. 93.009, Rel. Min. Cunha Peixoto, DJ de 21.10.1980)
Ademais, o que realmente importa é destacar o pensamento já consagrado
pelos membros desta Corte Superior de Justiça, como se pode constatar dos
seguintes precedentes:
Recurso especial. Criminal. Roubo qualifi cado por emprego de arma. Momento da consumação do delito. Arma de brinquedo. Irrelevância.
1. Inexistindo semelhança entre os arrestos confrontados, não se conhece do recurso à ausência de dissídio jurisprudencial.
2. Nos crimes de roubo, a razão de ser da maior severidade punitiva decorrente do emprego de arma não reside apenas na potencialização do risco à vida e à integridade física da vítima, mas também no maior poder de intimidação do meio executório, resultando que, como na espécie, ainda que a arma empregada seja inefi ciente, subsiste a aplicação da qualifi cadora.
3. Recurso parcialmente conhecido e, nesta extensão, provido. (REsp n. 178.438-SP, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJ de 27.08.2001)
Penal. Roubo. Majorante. Ameaça com arma de brinquedo. CP, art. 157, § 2º, I. Intimidação da vítima. Súmula n. 174-STJ.
- A ameaça com arma inefi ciente ou com arma de brinquedo, quando ignorada tal circunstância pela vítima, constitui causa especial de aumento de pena
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (12): 267-350, setembro 2010 291
prevista no art. 157, § 2º, I, do Código Penal, pois tal conduta é sufi ciente para causar a intimidação da vítima.
- Inteligência da Súmula n. 174 do Superior Tribunal de Justiça.
Recurso especial conhecido e provido. (REsp n. 263.639-SP, Rel. Min. Vicente Leal, DJ de 19.02.2001)
Penal. Crime de roubo. Arma de brinquedo. Incidência. Qualifi cadora. Art. 157, § 2º, inciso I, Código Penal.
1- “No crime de roubo, a intimidação feita com arma de brinquedo autoriza o aumento da pena.” (Súmula n. 174-STJ)
2- Recurso conhecido e provido. (REsp n. 205.736-SP, Min. Fernando Gonçalves, DJ de 22.05.2000).
Penal. Roubo. Momento consumativo. Emprego de arma de brinquedo para efetivar a ameaça. Incidência da qualifi cadora do CP, art. 157, § 2º, I.
1. Considera-se consumado o roubo quando o agente, mediante violência ou grave ameaça, retira a coisa da esfera de disponibilidade da vítima, ainda que não venha a ser tranqüila a posse.
2. Ainda que a arma empregada no crime de roubo para exercer a grave ameaça seja inefi caz, deve incidir a qualifi cadora prevista no art. 157, § 2º, do Código Penal, já que a vítima - que desconhecia essa circunstância - teve, de qualquer forma diminuída ou suprimida a sua capacidade de resistência.
2. Recurso conhecido e provido. (REsp n. 162.090-SP, Rel. Min. Edson Vidigal, DJ 1º.02.1999)
Penal. Recurso especial. Tentativa de roubo. Emprego de arma de brinquedo.
A intimidação com arma de brinquedo autoriza a majoração na pena do delito de roubo (Súmula n. 174-STJ).
Recurso provido. (REsp n. 217.794-RJ, Rel. Min. Felix Fischer, DJ de 11.10.1999)
Penal. Crime de roubo com emprego de arma de brinquedo. Qualifi cadora prevista no art. 157, § 2º, item I, do Código Penal.
1. “No crime de roubo, a intimidação feita com arma de brinquedo autoriza o aumento de pena” (Súmula n. 174-STJ).
2. Recurso conhecido e provido. (REsp n. 81.421-SP, Rel. Min. Anselmo Santiago, DJ de 16.05.1997)
Penal. Roubo. Majorante. Ameaça com arma descarregada. CP, art. 157, § 2º, I. Intimidação da vítima.
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- A ameaça com arma inefi ciente ou com arma de brinquedo, quando ignorada tal circunstância pela vítima, constitui causa especial de aumento de pena prevista no art. 157, § 2º, I, do Código Penal, pois tal conduta é sufi ciente para causar a intimidação da vítima.
- Recurso especial conhecido e provido. (REsp n. 33.003-SP, Rel. Min. Vicente Leal, DJ de 20.05.1996)
Criminal. Roubo. Arma de brinquedo.
- Aumento da pena. Tradicional jurisprudência dos Tribunais quanto a justifi car a aplicação do art. 157, § 2º, inc. I, do Código Penal, quando o meio usado e bastante para tolher a capacidade de resistência da vitima inciente da inefi cácia do objeto. (REsp n. 67.524-SP, Rel. Min. José Dantas, DJ de 06.11.1995)
Penal. Roubo. Emprego de arma de brinquedo. Meio intimidativo.
I - Ainda se entenda que a lei empregue arma no sentido técnico, este não se alheia do conceito geral de que, como tal, se considera todo instrumento de ataque ou de defesa capaz de infundir no espírito da vítima justo receio de uma agressão ou de impedi-la de agir. Importa, sim, que tenha havido a concreta intimidação.
II - Precedentes do STF e STJ. (REsp n. 62.724-SP, Rel. Min. Jesus Costa Lima, DJ de 07.08.1995)
Senhores Ministros, não estamos falando de arma de brinquedo daquelas
de antigamente, carregadas de ingenuidade, que não intimidavam e não
constrangiam, nem mesmo a Papai Noel.
Como no caso da moeda falsa, são confi gurações distintas, a da falsifi cação
grosseira, primária, incapaz de iludir até esmoler em noite escura, em calçada
de cinema. E a falsifi cação por meios gráfi cos sofi sticados, em composição de
computador e impressão a frio, off -set.
Assim também, no caso da arma de brinquedo, ainda existem as que
imitam longinquamente armas de verdade. Mas essas quase não se vê mais nas
prateleiras dos armarinhos, nem nos tabuleiros dos camelôs. As que existem em
grande disponibilidade não disfarçam nada. As armas de brinquedo de última
geração, como as exibidas em passeatas anti-americanas no Paquistão, se são
mesmo de brinquedo servem, então, para outras brincadeiras.
É para essa potencialidade, altamente lesiva para a paz social, para a
segurança pública, que quero chamar a atenção em defesa da manutenção da
Súmula n. 174. Que ninguém dentre nós tenha pela frente um assaltante, em
SÚMULAS - PRECEDENTES
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casa ou na rua, portando uma destas armas, ditas de brinquedo. Tenho certeza
que sob a ameaça, dirá até o número do segredo do cofre. Mesmo que não tenha
cofre.
Voto, portanto, conhecendo do Recurso do Ministério Público e lhe dando
provimento para, restabelecendo a sentença de primeiro grau, dizer que o Juiz
sentenciante estava certo ao reconhecer a arma de brinquedo para a aplicação da
causa de aumento.
É o voto.
VOTO-MÉRITO
O Sr. Ministro Felix Fischer: Sr. Presidente, Srs. Ministros, a questão
não é acerca de liberar ou não qualquer tipo de arma, mesmo porque existe
lei específi ca tratando do assunto. Trata-se de saber se o uso de uma arma de
brinquedo, inefi caz, irá majorar o roubo. Não se trata simplesmente considerar
que não haveria roubo. O roubo existe. A questão é tão-somente acerca da
majorante. Quanto ao uso da arma de brinquedo, ele poderá ser considerado,
dependendo do caso concreto, nas circunstâncias judiciais. Se temos que
obedecer a certos princípios básicos do Direito Penal e a certos princípios
constitucionais, não podemos, por razões supralegais, em determinados casos,
deixá-los de lado. Ou os empregamos em todos os casos, ou os rejeitamos. Penso
que argumentos supralegais podem eventualmente ser utilizados em favor do
réu, dependendo da situação, mas nunca contra.
Quando o Código fala em arma, evidentemente não pode ser arma
de brinquedo. Isso fere o princípio da reserva legal e também um princípio
elementar do Direito, que é a proibição do bis in idem. A intimidação confi gura
o roubo, não importando se decorre da supremacia física, que, às vezes, pode
ser muito grande, pior do que uma arma, ou de uma arma de brinquedo, etc. A
razão de ser da majorante no emprego da arma é o perigo real que ela acarreta.
Se a arma de brinquedo intimidou, confi gura o roubo, mas não pode haver um
bis in idem. Ela não confi gura perigo real para a vítima. Se ela é empregada para
lesionar, e essas lesões forem graves, isso irá qualifi car o roubo. Está no Código.
O que não se pode é transgredir princípio elementar por qualquer motivo ou
opção pessoal. Caso contrário, abriríamos uma brecha muito perigosa. Pode-
se até pleitear uma modifi cação na legislação, mas com a legislação em vigor,
parece-me que é incorreto.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
294
Há também uma manifesta desproporção na aplicação da majorante contra
o texto legal, no caso, porque equiparar aquele que sai com uma arma verdadeira,
assumindo o risco de causar a morte de alguém, com aquele que, evidentemente,
com uma arma de brinquedo, em princípio, não pretende esse resultado. Penso
que apenas com base nesses princípios, nessas regras elementares, já não se deve
aplicar a majorante do emprego da arma quando se trata de arma de brinquedo.
A doutrina moderna - não se trata de mercado editorial - apresenta esses
argumentos, que são fortes, ao passo que os argumentos apresentados para a
manutenção da majorante não encontram amparo na lei. São argumentos que
poderiam sugerir modifi cação na lei, mas não aplicação da lei em vigor. Seriam
desejos pessoais de autores antigos, respeitáveis, mas que não se aplicaria ao
texto de lei. Volto a frisar que abrir mão contra o réu de certos princípios
elementares é um perigo muito grande.
Portanto, nego provimento ao recurso, acompanhando o voto do Sr.
Ministro-Relator.
VOTO-MÉRITO
O Sr. Ministro Gilson Dipp: Sr. Presidente, preocupava-me inicialmente a possibilidade de o Sr. Ministro Edson Vidigal estar portando uma arma de uso restrito ou proibido na presença do Ministério Público. Consolei-me ao verifi car que se tratava de uma arma de brinquedo.
Minha posição sempre foi de profunda restrição à edição desmesurada de súmulas. Há matérias que, mesmo refl etindo o posicionamento reiterado do Tribunal, não necessitariam de súmula para ter vigência junto aos tribunais inferiores. Em outros casos, há divergência doutrinária e mesmo jurisprudencial. No caso concreto, temos argumentos belíssimos a favor da tese da manutenção da súmula e outros tantos, ponderáveis, contrários à majorante do emprego da arma de fogo no roubo. Só por esse motivo, já não seria conveniente a edição de uma súmula.
O Sr. Ministro Fontes de Alencar, quando da revogação da Súmula n. 91, foi muito claro ao afi rmar: “Essa súmula hoje não mais auxilia; antes, pelo contrário, causa transtorno, perplexidade e dificulta a aplicação da lei nos Tribunais Ordinários”.
Por esse motivo, penso que a súmula não poderia vingar. O que não quer dizer que, ao se revogá-la, se estará dando um salvo conduto para a utilização
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (12): 267-350, setembro 2010 295
de arma de brinquedo ou simulacro com a impossibilidade de qualifi cá-la como majorante. Não estaremos substituindo uma súmula por outra em sentido contrário; estaremos revogando uma que está causando perplexidade. Uma eventual revogação não será salvo conduto, porque não estaremos dizendo, de forma contrária, que a arma de brinquedo não constitui isso ou aquilo.
A intimidação própria do roubo pode ocorrer pela violência, pela desproporção física, pela ameaça e até pelo uso da arma de brinquedo, e não tão-somente por ela. Não concebo que se possa dar o mesmo tratamento a quem porta uma arma de verdade, que representa um perigo efetivamente real, e a quem porta uma arma de brinquedo. Quem está portando uma arma de verdade, sabe que poderá matar; quem porta uma arma de brinquedo, sabe que não poderá fazê-lo.
Penso, sim, que o princípio da proporcionalidade poderá estar malferido nesses casos. Não vejo como fugir do senso comum dessa assertiva. Também penso, na esteira do Sr. Ministro Felix Fischer, que a preservação do entendimento sumulado fere o princípio da reserva legal, que é um princípio constitucional. Está no art. 5º da Constituição e no art. 1º do Código Penal.
Brinquedo ou simulacro de arma não é arma.
Com a edição da Lei n. 9.437, de 1997, que concretizou a utilização de
arma de brinquedo ou simulacro de arma para o fi m de cometer crimes como
um delito autônomo, mais perplexidade a manutenção da súmula poderia
causar. Não vou entrar em detalhes porque a doutrina tem feito inúmeros
comentários. Seria despiciendo. Apenas para reforçar meu ponto de vista, peço
vênia para ler trecho do voto do saudoso Ministro Assis Toledo, que ponderou
atualíssimamente sobre o tema da seguinte forma:
A subtração de coisa alheia é crime de furto, previsto no art. 155. Quando essa subtração é feita mediante “grave ameaça”, o furto se transforma em roubo, com pena bastante agravada. A jurisprudência e a doutrina, tomando as considerações que foram feitas pelos eminentes Relator e Ministro Costa Lima, estendeu-as ao crime de roubo com emprego de arma de brinquedo, por considerar que a arma de brinquedo, devido a sua aparência, tem aptidão para fazer com que a vítima suponha estar realmente sob grave ameaça. A jurisprudência, portanto, passou a admitir o crime de roubo nessa fi cção - emprego de arma de brinquedo -, quando, na verdade, o que ocorre é uma hipótese de furto mediante fraude. entretanto, essa tolerância tem uma justifi cação lógica, a arma de brinquedo pode verdadeiramente criar ameaça subjetiva no espírito do sujeito passivo do crime.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
296
Todavia, um segundo passo foi dado aqui, baseado em grave equívoco, segundo penso: supor que a arma de brinquedo possa, numa segunda etapa, ser considerada espécie de “arma” para qualifi car o roubo. Note-se que, no art. 157, o legislador fala em “grave ameaça”, podendo esta ser feita por um objeto de fantasia ou até verbalmente, mas, no § 2º, o legislador já não fala em “grave ameaça” e sim em “emprego de arma”.
Para que possamos entender que arma de plástico, destinada a brinquedos infantis, seja “arma”, teremos que recorrer à analogia in malan partem , que, como se sabe, não é permitida em Direito Penal. Analogia é o raciocínio que vai do semelhante para o semelhante, tomo como ponto de partida uma hipótese regulada expressamente na lei e aplico a mesma solução a uma outra hipótese semelhante não prevista em lei, baseado no raciocínio segundo o qual o que é bom para a primeira também é bom para a segunda.
O que é bom para a arma de verdade, sê-lo-ia para a de brinquedo (...).
Ora, as imitações de plástico de revólver e outras, que as crianças usam para brincar, não podem ser consideradas “arma”, porque arma é instrumento de ataque, com aptidão para causar, no mínimo, lesões à integridade física, o que não ocorre com aquelas imitações.
O Sr. Ministro Costa Lima (Aparte): Hoje, há revólveres de brinquedo com espoleta que explode, expelindo, inclusive, bala e causando temor.
O Sr. Ministro Assis Toledo: Se o revólver tem espoleta e explode, expelindo uma bala que pode causar lesões, esse revólver é arma, não brinquedo. Não é esse o caso dos autos.
O que está ocorrendo aqui é um bis in idem sobre uma fantasia. A primeira, justificada, porque há aparente grave ameaça. A segunda, não, porque o legislador, no § 2º, exige “arma” e qualquer coisa que não seja arma, só por analogia poderá encaixar-se no conceito de arma.
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence tem entendido mais ou menos nessa
linha de raciocínio. Pelos antecedentes trazidos pelo Sr. Ministro Felix Fischer,
penso que também o Sr. Ministro Marco Aurélio.
Evidentemente que também deploro a aplicação da Emenda
Constitucional n. 22, a qual, ao mesmo tempo em que retirou do Supremo
Tribunal Federal a prerrogativa de examinar qualquer decisão de tribunal de
instância inferior que poderia ser atacada por habeas corpus deu essa competência
ao Superior Tribunal de Justiça, manteve a prerrogativa de rever nossas decisões,
fazendo com que, em relação à matéria infraconstitucional, à lei ordinária, haja
decisões dessemelhantes entre dois tribunais. E aqui não se tem o Supremo
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (12): 267-350, setembro 2010 297
Tribunal Federal como Corte constitucional, porque se está julgando matéria
infraconstitucional. Infelizmente temos, para perplexidade dos juízes de 1º e 2º
Graus, decisões confl itantes sobre lei ordinária, oriundas do Supremo Tribunal
Federal e do Superior Tribunal de Justiça.
Em relação à súmula, eu não gostaria de tecer as mesmas críticas que faço
e que outros fazem à enxurrada de leis criminais que são editadas neste País a
todo momento. Basta que um fato apareça na imprensa para que imediatamente
o Poder Legislativo e o Poder Executivo lavem as mãos editando uma lei,
como se a lei levada ao diploma legal pudesse solucionar males de ocasião. Leis
ambíguas, onde há falta de técnica, como a Lei dos Crimes Hediondos, que
causa até hoje perplexidade em todos nós. Quando houve a primeira fraude
na indústria farmacêutica, o governo editou uma lei na qual a falsifi cação de
pomada para verrugas teria a mesma pena que uma falsifi cação de remédios
contra a AIDS. Logo depois, isso foi transformado em crime hediondo.
Então, essa é a crítica que se faz ao legislador: querer resolver as situações
que têm estrépito na imprensa como um mal de ocasião. Não quero que esse mal
de ocasião seja resolvido por uma súmula que, no meu modo de ver, não está
de acordo com os preceitos da Lei Penal e das normas constitucionais e que, se
assim não fosse, pelo menos pela ampla divergência doutrinária e jurisprudencial
que esta tese acarreta, não poderia ser matéria de enunciado sumular.
Cabe ainda uma ressalva quanto à assertiva de que “a súmula já vem há
quase uma década”. Eu a recebi tal como está e assim vinha decidindo, porque
respeito não só a súmula como também as decisões da Seção e da Turma. Mas
há um momento em que se pode rever o enunciado sumular.
Com essas considerações, pedindo vênia ao Sr. Ministro Edson Vidigal,
conheço do recurso mas lhe nego provimento.
É como voto.
VOTO
O Sr. Ministro Hamilton Carvalhido: Sr. Presidente, Srs. Ministros, ouvi
atentamente os votos lançados pelos meus eminentes Pares que, muito embora
tenham por matéria uma questão que tem suscitado o nosso permanente exame,
a nossa permanente refl exão, recebeu hoje contornos absolutamente singulares
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
298
pela forma como foram oferecidos, pelo modo como foram ajustados a uma
realidade presente de uma violência que alcança níveis inimagináveis de toda
ordem em que se faz presente o homem. Essa preocupação e esse modo de
expor, com clareza meridiana, o problema da violência em que vivemos, tornou
extremamente delicada a missão de votar e julgar no presente momento.
O voto do ilustre Sr. Ministro e Professor Edson Vidigal, se me permite,
é um voto pleno de sabedoria com a profi ciência natural de S. Exª e com a
penetração, qual cirurgião, na realidade das coisas, como poucas vezes se pode
encontrar.
Essa colocação realmente mostra toda a perplexidade que, na verdade, esse
dispositivo vem trazendo. A velha doutrina veio estabelecer uma discussão que
hoje ainda se projeta - o Sr. Ministro Felix Fischer a repetiu - em que a causa
do aumento do emprego de arma - prefi ro chamá-la assim - estaria na linha de
direção da incolumidade física do indivíduo, e não da liberdade subjetiva. Daí, a
exclusão da arma de brinquedo, mas não menos ilustres autores mostraram que,
por natureza, e tendo a arma potencialidade ofensiva material, ela tem também
extraordinária potencialidade ofensiva na direção da formação da vontade
interior, da liberdade, de modo que, precisamente por ser conceitualmente
dirigida à ofensa, ela produz uma intimidação profundamente maior.
Essa linha doutrinária, exatamente por isso, via que, na arma ali colocada,
a objetividade ali era dupla, não apenas da incolumidade física, mas também da
liberdade interior e subjetiva, provocando, na dimensão acadêmica, uma refl exão
permanente.
Além disso, no voto do Sr. Ministro Assis Toledo trazido à luz pelo Sr.
Ministro Gilson Dipp, o próprio conceito de arma, colocado como um conceito
metajurídico, fora do Direito, compreenderia todo e qualquer instrumento
dotado de capacidade ou de potencialidade ofensiva.
Ora, incluidamente, tem-se hoje que o medo, o temor, não é apenas uma
impressão subjetiva, que não deixa marcas no corpo, na parte física do homem;
há todo um processo físico que se desencadeia pelo medo. O próprio temor,
na ameaça, tem fi sicidade e está presente no mundo. Com isso, esse conceito
mais abrangente de arma deslocaria e permitiria compreender, nessa categoria,
também, a arma de brinquedo.
Estou procurando inventariar, e serei breve, porque quero fundamentar
o meu voto. Trouxe sempre, das modestas aulas que ministrei nessas três
décadas de anos, que havia um problema de tipicidade. Restava saber se para
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (12): 267-350, setembro 2010 299
a lei, quando foi elaborada, a “arma” a que ela se referiu era a arma que hoje
chamamos de verdadeira, real, ou se ela usou “arma” em um sentido que pudesse
abranger a arma de brinquedo; no meu sentir, essa era a questão, a qual externei
para o ilustre Professor Felix Fischer, de certa feita, no corredor, quando de suas
preocupações acerca da causa de aumento pelo emprego de arma. Estava a viger,
ao mesmo tempo, a Lei de Contravenções Penais.
Esta, no seu artigo 19, fala “trazer consigo arma”; então, o termo “arma”
surge de novo no Código Penal.
Evidentemente, a lei, tipifi cando como contravenção aquele “trazer consigo
arma sem licença da autoridade” , não estava incluindo no termo “arma” a arma
que não fosse real. Estou trabalhando apenas com a interpretação dogmática
e, portanto, com a lei. Então, “arma” no Código Penal, e “arma” na Lei de
Contravenção Penal são, sem sombra de dúvida, arma verdadeira. Se é assim
acertada a conclusão, acertada seria afi rmar-se a ausência de tipicidade, ou seja,
problema de tipicidade na causa de aumento, de maneira que só haveria causa de
aumento com o emprego da arma verdadeira.
Com a edição da Lei de Porte de Arma, penso que se criou uma situação
legal de exame da vigência ou, não, da súmula, porque trazer consigo arma de
brinquedo, simulacro de arma, para o fi m de cometer crimes, é crime, e existe
uma pena que vai de um a dois anos. O emprego de arma verdadeira é crime com
a mesma pena; essa é a questão. A causa de aumento é de um terço à metade.
Pensado o roubo somente, o roubo, ela iria de um ano e quatro meses a até dois
anos na pena mínima. Se ultrapassada a mínima, a causa de aumento no roubo
vai ser punida mais gravemente do que se a considerássemos autonomamente
como crime, em concurso material.
A questão, a meu sentir, é, em última análise, de vigência formal no
presente momento. A tipifi cação autônoma do porte de arma, que passou a
ser crime, e da arma de brinquedo que foi criminalizada, coloca a questão,
pelo menos no que concerne à súmula, quanto a poder sobreviver, tornando a
causa de aumento mais grave do que o concurso material. Parece-me que seria
uma razão determinante dessa revogação da súmula, como é hoje uma questão
altamente elegante saber-se se as causas de aumento de arma de fogo verdadeira,
que conduziram a uma exasperação de pena maior do que o máximo do que a
pena abstrata por aquele crime, subsistem ou se devem ceder à força do concurso
material benéfi co.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
300
Por essas razões, manifestando extraordinário respeito pelos meus ilustres
Pares e uma admiração aprofundadamente crescente pelo magistério que
também neste Tribunal exerce o Professor Edson Vidigal, voto no sentido da
exclusão do quantum relativo ao aumento, por entender incaracterizada a causa
com o emprego da arma de brinquedo.
Com essas considerações, voto no sentido da exclusão, no caso concreto,
dos efeitos da causa de aumento na apenação do réu.
VOTO-VOGAL
O Sr. Ministro Jorge Scartezzini: Sr. Presidente, ouvi atentamente a
manifestação dos meus Pares e penso que, efetivamente, a matéria é importante,
transborda e transcende ao objeto do processo.
De qualquer forma, há um aspecto técnico do qual não se pode fugir, o
aspecto formal. Por que se conceder a palavra ao Ministério Público nesta fase
do andamento do feito, em que há o voto do Relator?
Como bem salientou o Sr. Ministro Hamilton Carvalhido, por que não se
chamar a defesa? Ela também tem interesse na revogação ou não da súmula. Por
que, nessa hipótese concreta, abrir-se-ia um precedente fugindo, portanto, de
todo tecnicismo ao permitir que o Ministério Público fale agora, sem que se dê
a mesma oportunidade à outra parte? Em se tratando de um processo, mesmo
que a repercussão desta decisão o transcenda, estamos julgando um processo.
Neste processo, seguindo a posição do Sr. Ministro Felix Fischer e a do Sr.
Ministro Hamilton Carvalhido, também entendo ser, nesta fase, absolutamente,
impossível, impertinente e inadequada a manifestação do Ministério Público.
A matéria já está amplamente analisada por todos os Srs. Ministros que
me antecederam, e eu teria pouca coisa a acrescentar. Teço, no entanto, alguns
comentários sobre o brilhante voto do eminente Sr. Ministro Edson Vidigal,
filiando-me à sua posição para utilizar de um instrumento que objetiva a
eventual autorização legislativa. Diante do Direito posto, não há como se ter
outra interpretação. O legislador fala em arma, e quando ele quis distinguir
arma de arma de brinquedo, editou uma lei e distinguiu nitidamente. Portanto,
não posso entender como aplicar uma majorante.
Como penso que esta súmula fere o princípio da reserva legal, submetendo-
me às colendas manifestações dos Srs. Ministros Felix Fischer e Hamilton
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (12): 267-350, setembro 2010 301
Carvalhido, acompanho o Sr. Ministro-Relator, conhecendo do recurso, mas
negando-lhe provimento.
É como voto.
VOTO
O Sr. Ministro Paulo Gallotti: Senhor Presidente, assim como já acentuou o Ministro Jorge Scartezzini, tenho que a matéria está amplamente debatida. A partir do momento em que se suscitou a idéia de trazer ao âmbito desta Seção um recurso da 5ª Turma, comecei a refl etir sobre o tema.
Na verdade, muito me impressiona o argumento da reserva legal. Penso que, de alguma forma, a interpretação que julgados desta Corte deram à causa de aumento do art. 157, inciso I, foi no sentido de procurar atender a uma situação de fato que preocupa a todos até hoje, vale dizer o crescimento da violência. Mas, mesmo tendo presente essa preocupação, encontro difi culdade em concluir que a arma mencionada na causa de aumento a que se refere o art. 157 possa ser uma arma sem potencialidade ou uma arma de brinquedo, o que não autoriza reconhecer sua ocorrência.
Penso também que o Ministro Gilson Dipp foi muito preciso ao mostrar que bastava esse debate para deixar evidente que o tema talvez não fi casse bem em uma súmula, com o rigor de seus contornos, mesmo sem seu caráter vinculante, não parecendo razoável engessar esse entendimento.
Pedindo vênia ao Ministro Edson Vidigal, conheço do recurso pela divergência, mas lhe nego provimento.
É como voto.
VOTO-VISTA
O Sr. Ministro Fontes de Alencar: Sr. Presidente, pedi vista, naquela
oportunidade em que se apreciou este caso para verifi car os aspectos relativos
aos pressupostos do recurso e o fi z. Sem dúvida que o tema ensejou debates
acesos e proveitosos para todos nós da Corte.
A minha posição, bem examinada a causa, é no sentido de acompanhar o
voto do eminente Ministro Relator na proposta do cancelamento da Súmula n.
174, negando-se provimento ao recurso especial.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
302
RECURSO ESPECIAL N. 5.679-SP (90.0010652-4)
Relator: Ministro Flaquer Scartezzini
Recorrente: Ministério Público do Estado de São Paulo
Recorrido: Solimá Ancelmo da Silva
Advogado: Gilberto João Wickert
EMENTA
Criminal. Roubo. Arma de brinquedo. Art. 157, parágrafo 2º, I,
do CP.
- Na intimidação, feita com arma de brinquedo, para a prática
de crime de roubo, justifi ca-se o aumento da pena a que se refere
o art. 157, parágrafo 2º, I, do CP, quando o meio usado é bastante
para tolher a capacidade de resistência da vítima, que desconhecia a
inefi cácia do objeto.
- Recurso conhecido e provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.
Decide a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por maioria,
conhecer e dar provimento ao recurso, para elevar a 5 (cinco) anos e 4 (quatro)
meses de reclusão a pena corporal imposta ao recorrido, na forma do relatório e
notas taquigráfi cas anexas, que fi cam fazendo parte do presente julgado.
Custas, como de lei.
Brasília (DF), em 06 de fevereiro de 1991 (data do julgamento).
Ministro José Dantas, Presidente
Ministro Flaquer Scartezzini, Relator
DJ 18.03.1991
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (12): 267-350, setembro 2010 303
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Flaquer Scartezzini: Trata-se de recurso especial com fulcro no art. 105, III, c, da Constituição Federal, que a douta Procuradoria Geral de Justiça interpõe ao v. acórdão da Quarta Câmara do E. Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo que, apreciando recursos, da defesa e do MP, contra a sentença de primeiro grau que condenou Solimá Ancelmo da Silva a 4 anos de reclusão e 10 dias multa, por infringência do art. 157, caput, do Código Penal, houve por bem negar provimento à apelação da Justiça Pública e acolher parcialmente o recurso do réu para estabelecer o regime semi-aberto para início de cumprimento da pena.
Alega a D. Procuradoria Geral, em síntese, que o v. acórdão fustigado, ao entender que o uso de revólver de brinquedo não justifi ca a causa de aumento prevista no inciso I do parágrafo 2º ao art. 157 do estatuto repressivo, divergiu de julgados de outros tribunais do País.
Houve impugnação, após o que, o Dr. Juiz Presidente do TACSP, por ver caracterizada a divergência jurisprudencial, deferiu o processamento e a subida do recurso, o qual, vindo a esta Superior Instância, mereceu parecer da douta Subprocuradoria Geral da República no sentido do seu conhecimento e provimento.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Flaquer Scartezzini (Relator): Senhor Presidente, Solimá Ancelmo da Silva foi denunciado como incurso no art. 157, parágrafo 2º, I, do Código Penal, porque, munido de uma faca e um revólver, que depois se soube, de brinquedo, abordou Antônio Pereira da Silva, cobrador de ônibus, e subtraiu do mesmo, determinada quantia em dinheiro e vales.
No entanto, foi condenado como incurso no art. 157, caput do Código Penal, pelo entendimento de que a prova não se mostrou fi rme no sentido de indicar que a grave ameaça exercida pelo agente se caracterizou pelo emprego de arma, estabelecido o regime fechado para início do cumprimento da pena.
A E. 4ª Câmara do TACSP, não atendeu aos reclamos do recurso da Justiça Pública e deu provimento parcial ao do réu, para estabelecer o regime semi-aberto, afastando a qualifi cadora do emprego de arma, por haver sido empregado revólver de brinquedo.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
304
Daí o presente recurso, em que a Procuradoria Geral entende haver
divergência jurisprudencial desse acórdão com os do E. TJSC, deste Colendo
Superior Tribunal de Justiça e do Excelso Supremo Tribunal Federal, que
colacionou no sentido de provar o dissídio.
Vejamos a prefalada divergência.
Diz, num determinado trecho, o v. acórdão atacado:
A causa do aumento do inciso I do parágrafo 2º, do art. 157, do CP é objetiva. A ameaça grave, ou a violência, devem sar praticadas com emprego de armas. Revólver de brinquedo é brinquedo, e não arma.
Dos arestos colacionados, tomemos estes do Excelso STF, como paradigma:
Criminal. Roubo. Assalto com arma de brinquedo.
Não descaracteriza o crime de roubo qualifi cado ter-se o assaltante utilizado de revólver de brinquedo para impor-se à vítima, pois a intimidação pela violência de qualquer sorte ocorreu, eis que ignorava a vítima ser a arma de brinquedo. Precedentes.
(R. Ext. n. 102.779-7-SP, 2ª T, rel. Min. Aldir Passarinho, v.u., 04.12.1984, RTJ 114/341).
Roubo. Arma de brinquedo. Código Penal, art. 157, parágrafo 2º, I.
Se houve intimidação da vítima, por não saber que se tratava de arma de brinquedo, justifi ca-se o aumento da pena a que alude o art. 157, parágrafo 2º, I, do Código Penal.
Precedentes do Supremo Tribunal Federal.
Recurso Extraordinário do MP conhecido, por dissídio jurisprudencial, e provido.
(R. Ext. n. 102.776-2-SP, 1ª T., rel. Min. Néri da Silveira, v.u., 21.09.1984, RTJ 119/275)
Também esta E. Corte já se pronunciou sobre o assunto, haja vista o
acórdão proferido no REsp n. 65-SP, em que foi relator o eminente Ministro
Dias Trindade. Eis o ementado referido acórdão:
Penal. Crime de roubo. Ameaça com arma de Brinquedo. Exegese do art. 157, parágrafo 2º, I, do Código Penal.
A ameaça com o emprego de arma de brinquedo é sufi ciente para tolher a capacidade de resistência da vítima, inciente da inidoneidade ofensiva do meio
SÚMULAS - PRECEDENTES
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empregado, de modo a confi gurar a qualifi cadora do item I do parágrafo 1º do art. 157 do Código Penal.
(in DJU de 25.09.1989, p. 14.953).
Pelo confronto dos arestos trazidos com o proferido pela E. Quarta Câmara do TAC de São Paulo, nota-se que, enquanto este, afasta a qualifi cadora do delito, aqueles afi rmam que o uso da arma de brinquedo justifi ca, plenamente o aumento da pena previsto no inciso I, do parágrafo 2º do art. 157 do CP.
Com isto, entendo perfeitamente demonstrado o dissídio jurisprudencial, o que me leva a conhecer do recurso pela letra c, do inciso III, do art. 105, da Constituição vigente.
Quanto ao mérito, narra o v. acórdão recorrido que o réu foi condenado a pena de quatro anos de reclusão e dez dias-multa, por infringência do art. 157, caput do CP, e que a Procuradoria Geral de Justiça pleiteou a exasperação da pena, sob o argumento de que o delito praticado pelo réu, qualifi cou-se pelo emprego de arma.
No entanto, os Drs. Juízes componentes da Quarta Câmara Criminal do Tribunal de Alçada Criminal, por maioria de votos, negaram provimento a este apelo, por entenderem que, verbis:
A causa do aumento do inciso I do parágrafo 2º, do art. 157, do Código Penal é objetiva. A ameaça grave, ou a violência, devem ser praticados com o emprego de arma. Revólver de brinquedo é brinquedo, e não arma.
A nobre Procuradoria apelante, no entanto, argumenta que, verbis:
Têm razão aqueles que entendem que o revólver de brinquedo é meio efi caz para a qualifi cação do roubo. Obviamente, o reconhecimento da qualifi cadora há que ser precedido de análise profunda que abranja as circunstâncias específi cas do caso, em especial, enfocando-se o temor que a vítima venha a sentir, julgando-se ameaçada.
Esta opinião se afi na com os inúmeros julgados da Excelsa Suprema Corte, onde se tem decidido que incide o artigo 157, parágrafo 2º, I, do Código Penal, assim quando a arma empregada constitui melo idôneo para a realização da violência ou da ameaça, como quando, embora não idônea a arma para esse fi m, ou por estar descarregada, ou por ser mera contrafacção, mostrou-se efi caz para infundir na vítima, que desconhecia a impropriedade do meio utilizado, justo receio de vir, pela resistência que opusesse, a por em risco a sua integridade física.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
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Conforme o magistério de Nelson Hungria, in Comentários ao Código
Penal, Vol. VII, Forense, 1980, p. 58:
Por armas se deve entender não só as propriamente tais ou em sentido técnico (especialmente destinadas ao ataque ou defesa), como qualquer instrumento apto a lesar a integridade física (ex. uma barra de ferro, um furador de gelo, um machete, etc.). Não é preciso que a arma seja efetivamente manejada, bastando que seja portada ostensivamente, como uma ameaça implícita. A ameaça com uma arma inefi ciente (ex. revólver descarregado) ou fi ngida (ex. um isqueiro com feitio de revólver), mas ignorando a vítima tais circunstâncias, não deixa de constituir a majorante, pois a ratio desta é a intimidação da vítima, de modo a anular-lhe a capacidade de resistir. Pela mesma razão, é irrelevante indagar-se se o agente, ao empunhar ameaçadoramente mesmo uma arma efi caz, estava, ou não, apenas simulando o propósito de atacar a vítima, desde que esta efetiva e razoavelmente se intimidou.
No mesmo diapasão, quando relatou o RExt n. 96.902-SP, o eminente
Ministro Alfredo Buzaid, assim se expressou:
Com efeito, a arma de brinquedo é meio idôneo a intimidar pessoas, levando-as à condição de vítima, mormente nos crimes contra o patrimônio.
E justifi cou sua afi rmação com estas palavras:
As armas de brinquedo, hoje fabricadas, são de tal modo idênticas às verdadeiras, que difi cilmente numa rápida vista d’ olhos, se pode dizer da sua autenticidade ou não. E tanto isso é mais improvável quando a pessoa se acha sob o impacto de um gesto ameaçador ou violento, em que o sujeito ativo, desconhecido, em posição iminentemente agressiva e proclamando suas intenções, a exibe àquela, causando-lhe surpresa.
Apesar de correntes doutrinárias em sentido oposto, filio-me nesta,
proclamada pela Suprema Corte, no sentido de que a arma, ainda que de
brinquedo, presta-se a qualifi car o roubo, desde que na vítima refl ita-se o temor
inibitório de qualquer reação, desconsiderando a inefi ciência lesiva do objeto
empregado pelo agente.
Aqui, nesta E. Corte, temos a orientação unânime da E. Sexta Turma
no mesmo sentido, haja vista o REsp n. 65-SP, em que foi relator o eminente
Ministro Dias Trindade, de cujo voto, permito-me transcrever um trecho, nestes
termos:
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (12): 267-350, setembro 2010 307
Ante a onda de violência, que a cada dia parece mais engolfar a sociedade, não vejo como se quedar a Justiça Criminal em exegese mais favorável aos facínoras, quando se reclama um rigor consentâneo com a repressão mais efetiva de crimes da natureza dos aqui revelados.
Com efeito, se admitimos a eficácia da arma inidônea para, qualificando a figura de furto, reconhecermos a prática do roubo, erigido em nova figura criminal, não vejo porque não admitir também essa potencialidade de infundir temor à vítima, estarrecida ante o manejo ou exibição do brinquedo em forma de arma, pelo meliante.
Não se estaria a dar dupla valoração ao meio empregado, para reconhecer a ameaça e para ter como presente a qualifi cadora, pois que a primeira se afi gura independente, enquanto que a segunda requer o emprego do meio. A ameaça ocorre por si, ao passo que quando esta é feita com o emprego de arma, ainda que inefi caz, perfaz-se a majorante de pena, a ser considerada em face da real intimidação que causa à vítima.
Quando se retrata ao agente uma situação de fato que, se real, tornaria legítima a sua ação, reconhece-se a discriminante putativa, como estatuído no parágrafo 1º do art. 20 do Código Penal, de modo que, aquela vítima de roubo, com o emprego de arma de brinquedo, estaria autorizada a matar seu agressor, por se reconhecer a ausência de dolo em sua ação, enquanto que, quando a contrafacção da arma fosse capaz de anular a capacidade de reação da vítima, consumando-se o roubo, esse emprego de meio sem potencialidade de infl ingir mal além da própria ameaça, seria tido como irrelevante, o que se apresenta como verdadeiro absurdo.
A sentença, embora reconhecendo o emprego da arma para a consecução
do ato tido como delituoso, entendeu que sendo a mesma de brinquedo, não
representou um perigo objetivo, com o que desclassifi cou o crime de roubo
agravado para roubo simples.
Como já visto, pelas razões que expus, não comungo com este entendimento,
pois, se a arma usada, mesmo que de brinquedo, é meio efi caz para intimidar a
vítima, representa um perigo para a mesma, mesmo que subjetivo: assim, o
crime de que se trata, deve ser qualifi cado como roubo agravado pelo emprego
de arma.
Com estes argumentos, conheço do recurso pela ocorrência de dissídio
jurisprudencial, e lhe dou provimento, reformando, assim, o v. acórdão
recorrido para que a pena imposta ao réu seja fi xada nos moldes propostos pela
douta Subprocuradoria Geral da República, às fl s. 230, ou seja, reconhecer a
qualifi cadora do parágrafo 2º, do inciso I, do art. 157, do Código Penal, com
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
308
o que aumento a pena imposta em um terço (1/3), tornando-a defi nitiva em 5
anos e 4 meses, mantendo a pena pecuniária, e o regime inicial de cumprimento
da reprimenda, considerando a primariedade técnica do condenado, mas estar
ele respondendo inquéritos por delitos da mesma natureza (fl s. 66), o que
registra maus antecedentes, tal como impostos na sentença, que fi ca assim,
reformada parcialmente.
É o meu voto.
VOTO
O Sr. Ministro Jesus Costa Lima: Senhor Presidente. Filio-me, também,
ao entendimento agora exposto pelo Senhor Ministro Relator.
A técnica aperfeiçoa-se a cada instante. Hoje, não é fácil distinguir uma
arma real de uma de imitação. O confl ito mundial acabou de revelar ao mundo
diversos tipos de armamentos de plástico imitando os verdadeiros, a tal ponto
que foram confundidos e bombardeados.
No caso dos autos - acentuou o Senhor Ministro-Relator - o fato aconteceu
em assalto dentro de um ônibus.
A população das grandes cidades acha-se insegura, em pânico, com os
constantes seqüestros e assaltos ocorridos, inclusive, em transportes coletivos.
De conseguinte, essas espécies de armas ditas de brinquedo tornam-se
meios hábeis para caracterizar a qualifi cadora pelo seu conteúdo subjetivo. Na
verdade, mesmo esse meio especial, é idôneo, tem capacidade para infundir
temor tal que, em pânico, o ofendido não tem como opor qualquer reação ao
agente. O problema está, pois, na idoneidade ou aptidão do meio empregado
para intimidar, anular a capacidade de resistir ao emprego de arma dita de
brinquedo, mas ignorado pela vítima.
Feitos estes breves comentários, adiro ao voto do Sr. Ministro Flaquer
Scartezzini.
VOTO (VENCIDO)
O Sr. Ministro Assis Toledo: Sr. Presidente, lamento ter que discordar dos
votos que me precederam.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (12): 267-350, setembro 2010 309
A subtração de coisa alheia é crime de furto, prevista no art. 155. Quando
essa subtração é feita mediante “grave ameaça”, o furto se transforma em
roubo, com pena bastante agravada. A jurisprudência e a doutrina, tomando
as considerações que foram feitas pelos eminentes Relator e Ministro Costa
Lima, estendeu-as ao crime de roubo com emprego de arma de brinquedo,
por considerar que a arma de brinquedo, devido a sua aparência, tem aptidão
para fazer com que a vítima suponha estar realmente sob grave ameaça. A
jurisprudência, portanto, passou a admitir o crime de roubo nesta fi cção -
emprego de arma de brinquedo -, quando, na verdade, o que ocorre é uma
hipótese de furto mediante fraude. Entretanto, essa tolerância tem uma
justifi cação lógica: a arma de brinquedo pode verdadeiramente criar ameaça
subjetiva no espírito do sujeito passivo do crime.
Todavia, um segundo passo foi dado aqui, baseado em grave equívoco,
segundo penso: supor que a arma de brinquedo possa, numa segunda etapa,
ser considerada espécie de “arma” para qualifi car o roubo. Note-se que, no art.
157, o legislador fala em “grave ameaça”, podendo esta ser feita por um objeto
de fantasia ou até verbalmente; mas, no § 2º, o legislador já não fala em “grave
ameaça” e sim em “emprego de arma”.
Para que possamos entender que arma de plástico, destinada a
brinquedos infantis, seja “arma”, teremos que recorrer à analogia in malam
partem, que, como se sabe, não é permitida em Direito Penal. Analogia é
o raciocínio que vai do semelhante para o semelhante: tomo como ponto
de partida uma hipótese regulada expressamente na lei e aplico a mesma
solução a uma outra hipótese semelhante não prevista em lei, baseado no
raciocínio segundo o qual o que é bom para a primeira também é bom para
a segunda.
O que é bom para a arma de verdade, sê-lo-ia para a de brinquedo...
Ora, as imitações de plástico de revólver e outras, que as crianças usam
para brincar, não podem ser consideradas “arma”, porque arma é instrumento
de ataque, com aptidão para causar, no mínimo, lesões à integridade física, o que
não ocorre com aquelas imitações.
O Sr. Ministro Costa Lima (Aparte): Hoje, há revólveres de brinquedo
com espoleta que explode, expelindo, inclusive, bala e causando temor.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
310
O Sr. Ministro Assis Toledo: Se o revólver tem espoleta e explode,
expelindo uma bala que pode causar lesões, esse revólver é arma, não brinquedo.
Não é esse o caso dos autos.
O que está ocorrendo aqui é um bis in idem sobre uma fantasia. A primeira,
justifi cada, porque há aparente grave ameaça. A segunda, não, porque o legislador,
no § 2º, exige “arma” e qualquer coisa que não seja arma, só por analogia poderá
encaixar- se no conceito de arma.
Pelas razões expostas, data maxima venia dos eminentes Colegas que
pensam em sentido contrário, conheço do recurso, por estar demonstrada a
divergência, mas lhe nego provimento.
É o meu voto.
VOTO
O Sr Ministro Edson Vidigal: Senhor Presidente, a discussão representa,
sem dúvida, uma contribuição muito importante desta Eg. Turma para a
defi nição de conceitos. O que é uma arma num crime? Um brinquedo imitando
uma arma pode ser tido como arma num crime? Qual a potencialidade do dano
que possa causar uma arma de verdade e uma arma de brinquedo?
Alio-me, nesta discussão, ao Ministro Relator e ao Ministro Costa Lima.
Eu também conheço muitas dessas armas ditas de brinquedo e não sei se, em
determinada circunstância, acuado por um desconhecido portando uma arma
dessa, dita de brinquedo, qual seria a minha reação. Alguém, pego de inopino, ao
saltar de um ônibus ou ao dobrar uma esquina, vai poder perguntar ao assaltante
se a arma que empunha é de verdade ou é de brinquedo, se é “taurus” ou se “trol”.
Não há hoje nenhuma diferença visual entre muitos revólveres de verdade e
muitos revólveres de brinquedo. A sofi sticação dessas armas ditas de brinquedo
está tão perfeita que a ONU/Organização das Nações Unidas, através da
Unicef, que é o seu organismo voltado para as questões da infância, está pedindo
às indústrias que parem com a fabricação desses brinquedos que imitam armas.
Para ilustrar, lembro aqui o que se passa agora mesmo no golfo pérsico,
onde a maioria dos armamentos destruídos por bombardeios aliados sobre o
território do Iraque não seriam tanques nem plataformas de mísseis de verdade
mas de brinquedo, feitos de papelão ou de fi bra de vidro e expostos à localização
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (12): 267-350, setembro 2010 311
pelos aliados apenas para cansá-los e despistá-los dos armamentos de verdade. E
essas armas de brinquedo não estão sendo armas de guerra? Não estão servindo
a um objetivo na guerra e produzindo consequências que a armas de verdade
produziriam?
Pois entre nós também, nas cidades e nos campos, os revólveres de verdade
já são confundidos com os de brincadeira, servindo uns e outros a um mesmo
fi m - o assalto que se consuma mediante grave ameaça e até violência porque
se o revólver de brinquedo ainda não expele projétil mortífero, expele susto
que também pode resultar em morte e sua coronha, muitas delas já tão pesadas
quanto a dos revólveres de verdade, se presta à violência das coronhadas. E
coronhada fere, sangra e, portanto, também até mata.
(Segue a intervenção do Ministro Assis Toledo)
O Sr. Ministro Edson Vidigal: Eminente Ministro Assis Toledo, pelo que
depreendi do Relatório, salvo engano, havia além dessa arma dita de brinquedo
uma faca...
(Segue o Ministro Assis Toledo)
O Sr. Ministro Edson Vidigal: Acompanho o Eminente Ministro-Relator,
data venia do Eminente Ministro Assis Toledo.
VOTO
O Sr. Ministro José Dantas: Não obstante a boa lógica dos argumentos
do Sr. Ministro Assis Toledo, prefi ro o apoio que o Sr. Ministro-Relator deu à
tranqüila jurisprudência dos Tribunais, reiterada nos cinqüenta anos de aplicação
prática do Código Penal.
Ousaria argumentar contra a tese de S. Exa. que, se há bis in idem no
concurso da grave ameaça com a qualifi cadora do uso de arma de brinquedo,
segundo a construção jurisprudencial, tal bis in idem estaria na própria lei, que
a seu tempo qualifi ca o roubo pelo uso de “arma” ofensiva sem consideração a
que já seja “grave a ameaça”, segundo a tipifi cação do caput do mesmo art. 157
do Cód. Penal; donde a objeção não me parecer procedente, com a devida vênia.
Portanto, peço permissão a S. Exa. para acompanhar o Sr. Ministro-
Relator.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
312
RECURSO ESPECIAL N. 12.279-SP (91.0013243-8)
Relator: Ministro Costa Leite
Recorrente: Ministério Público do Estado de São Paulo
Recorrido: Agamenon da Conceição (ou Agamenor da Conceição)
Advogada: Izabel Irlanda Castro Correia Araújo
EMENTA
Penal. Roubo. Arma de brinquedo. Qualifi cadora.
O fundamento da qualifi cadora do art. 157, § 2º, I, do Código Penal, está na intimidação da vítima, com a anulação ou diminuição da sua capacidade de resistência, o que pode perfeitamente ocorrer com o emprego de arma de brinquedo. Recurso conhecido e provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e notas taquigráfi cas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer do recurso e lhe dar provimento. Votaram com o Relator os Ministros Vicente Cernicchiaro, José Cândido e Pedro Acioli.
Brasília (DF), 25 de agosto de 1992 (data do julgamento).
Ministro José Cândido, Presidente
Ministro Costa Leite, Relator
DJ 13.10.1992
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Costa Leite: - Adoto, à guisa de relatório, a parte expositiva do parecer do Ministério Público Federal, da lavra do ilustre Subprocurador-Geral da República, Doutor Raimundo Francisco Ribeiro de Bonis, nestes termos:
Trata-se de Recurso Especial n. 12.279, interposto pela Procuradoria Geral de Justiça do Estado de São Paulo, do v. acórdão proferido pela Sexta Câmara do Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo, de fl s. 121, 126.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (12): 267-350, setembro 2010 313
O recurso tem fundamento no artigo 105, III, alínea c, da Constituição Federal.
Escorço histórico-processual
O Recorrido foi condenado, em primeiro grau, por infração ao art. 157, § 2°, incisos I e II do CP, e ainda no mesmo dispositivo (caput), combinado com os arts. 70 e 14, todos do Código Penal, às penas de sete anos de reclusão e dezessete dias-multa.
Apelou, pedindo reforma absolutória ou o cancelamento da qualifi cadora do emprego de arma, obtendo provimento quanto à segunda alternativa, sendo-lhe reduzida a pena para seis anos, dois meses e vinte dias de reclusão.
Destaque-se o seguinte tópico do v. acórdão recorrido:
A subtração foi praticada por três elementos. O concurso de agentes não pode ser desprezado. Utilizaram arma de brinquedo. Este fato restou devidamente provado. A arma de brinquedo - figura o roubo mas não permite que se tipifi que a qualifi cadora do emprego de arma (fl s. 124).- (fl s. 129)
No desprezo à confi guração da qualifi cadora, viu o recurso da Procuradoria Geral de Justiça discrepância da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal no aresto proferido no RECr n. 80.037-SP - 2ª Turma - 10.12.1974 - v.u. - Rel. Ministro Leitão de Abreu, publicado na Revista Trimestral de Jurisprudência n. 72/961, com a seguinte ementa:
Recurso extraordinário criminal. Interpretação do art. 157, § 2º, I, do Código Penal. Incide esse dispositivo, assim quando a arma empregada constitui meio idôneo para a realização da violência ou da ameaça, como quando, embora não idônea a arma para esse fim, ou por estar descarregada, ou por ser mera contrafação, infundiu na vítima, que desconhecia a impropriedade do meio utilizado, justo recaio de vir, pela resistência que opusesse, a por em risco a sua integridade física. (RECr n. 80.037-SP - 2ª Turma - 10.12.1974 v.u. - Rel. Min. Leitão Abreu). (Revista Trimestral de Jurisprudência, vol. 72/961), - fl s. 130.
Mais dois acórdãos da Suprema Corte, entendem caracterizada a qualifi cadora, repetindo em essência aquele acórdão, e são invocados como paradigmas do dissídio. São eles o acórdão proferido no RECr n. 86.138-SP, 1ª Turma - 25.03.1977 - v.u. - Rel. Min. Rodrigues Alckmin, publicado na Rev. dos Tribunais n. 500/411 e o proferido no RECr n. 90.227-SP. 2ª Turma 17.10.1978 - v.u. Rel. Ministro Djaci Falcão, publicado no DJU de 20.11.1978, p. 9.237.
Arremata o recurso:
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
314
É patente, como se vê, o paralelismo existente entre as hipóteses dos arestos trazidos à colação e à hipótese dos autos. Em todos os casos, a questão enfrentada é a mesma, ou seja, a incidência da majorante do § 2º, inciso I, do artigo 157 do Código Penal às hipóteses de roubo com emprego de arma inefi caz ou de brinquedo. De outro lado, é manifesto o dissídio jurisprudencial, pois, enquanto o v, acórdão recorrido afastou a qualifi cadora, os julgados referidos nesta petição afi rmaram a incidência do § 2°, inciso I, ainda que o agente tenha empregado arma inidônea para a realização da ameaça ou revólver de brinquedo. - (fl s. 131-132).
Aberta oportunidade de contra-razões não a aproveitou a defesa.
Despacho admitindo o recurso cujo dispositivo exara:
Manifesto o dissídio jurisprudencial, eis que, para os julgados trazidos à colação, incide a qualifi cadora do art. 157, parágrafo 2º, I, do Código Penal, ainda que a arma seja de brinquedo, enquanto a r. decisão recorrida esposa tese divergente.
Pelo exposto, defi ro o processamento do recurso. - (fl s. 135).
Opinando, o parecer é pelo conhecimento e improvimento do recurso.
É o relatório, Senhor Presidente.
VOTO
O Sr. Ministro Costa Leite (Relator): Perfeitamente caracterizado o
dissídio jurisprudencial, conheço do recurso. Ao que se viu do relatório, a questio
juris consiste em saber se o emprego de arma de brinquedo no roubo determina
a incidência da qualifi cadora do item I, do § 2º, do art. 157, do Código Penal.
Como consabido, trata-se de questão controvertida, assim na doutrina
como na jurisprudência, estabelecendo-se a controvérsia na definição do
fundamento da qualifi cadora.
De acordo com o magistério de Helena Fragoso, reside no que o emprego
da arma envolve, motivo pelo qual é indispensável que o instrumento usado
pelo agente tenha idoneidade para ofender a incolumidade da vítima, de modo
que a qualifi cadora pressupõe o emprego de arma real; para Hungria, está
na intimidação da vítima, com a anulação ou diminuição da sua capacidade
de resistência, o que pode perfeitamente ocorrer com o emprego de arma de
brinquedo.
SÚMULAS - PRECEDENTES
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A jurisprudência do colendo Supremo Tribunal Federal orientou-se no sentido dessa última corrente interpretativa, como atestam os julgados trazidos a confronto pelo recorrente.
Ao julgar o REsp n. 65-SP, esta Turma prestigiou a orientação da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Eis a ementa que o eminente
Ministro Dias Trindade escreveu para o acórdão:
Penal. Crime de roubo. Ameaça com arma de brinquedo. Exegese do art. 157 § 2º do Código Penal.
A ameaça com o emprego de arma de brinquedo, é sufi ciente para tolher a capacidade de resistência da vítima, inciente da inidoneidade ofensiva do meio empregado, de modo a confi gurar a qualifi cadora do item I do § 2º do art. 157 do Código Penal.
No mesmo sentido, destaca-se o acórdão da e. Quinta Turma no REsp n. 5.679-SP, da relatoria do ilustre Ministro Flaquer Scartezzini, assim exteriorizado:
Criminal. Roubo. Arma de brinquedo. Art. 157, parágrafo 2º, I, do CP.
- Na intimidação, feita com arma de brinquedo, para a prática do crime de roubo, justifi ca-se o aumento da pena a que se refere o art. 157, parágrafo 2º, I, do CP, quando o meio usado é bastante para tolher a capacidade de resistência da vítima, que desconhecia a inefi cácia do objeto.
- Recurso conhecido e provido.
Procedendo-se à interpretação sistemática, não há como arredar a incidência da qualifi cadora. A propósito, é irrecusável o argumento expendido no voto condutor do acórdão desta Turma no REsp n. 65-SP, neste relanço:
Quando se retrata ao agente uma situação de fato que, se real, tornaria legítima sua ação, reconhece-se a discriminante putativa, como estatuído no § 1º do art. 20 do Código Penal, de modo que, aquela vítima de roubo, com o emprego de arma de brinquedo, estaria autorizada a matar o seu agressor, por se reconhecer a ausência de dolo em sua ação, enquanto que, quando a contrafação da arma fosse capaz de anular a capacidade de reação da vítima, consumando-se o roubo, esse emprego de meio sem potencialidade de infl ingir mal além da própria ameaça, seria tido como irrelevante, o que se apresenta como verdadeiro absurdo.
Do quanto exposto, Senhor Presidente, dou provimento ao recurso, para cassar o v. acórdão recorrido e restabelecer sentença de primeiro grau. É como voto.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
316
VOTO-VOGAL
O Sr. Ministro Vicente Cernicchiaro: Sr. Presidente, acompanho o Sr.
Ministro-Relator, não obstante a intervenção do Ilustre Representante do
Ministério Público.
Há de se entender que o crime de roubo pode ser praticado por conduta
alternativa: violência ou grave ameaça. Não vinga, portanto, o argumento de
que a arma deveria ser efi caz para causar dano a pessoa. Se fosse em relação
a crime de homicídio, onde a violência é física, estaria tudo bem. Com essa
circunstância, estar-se-ia majorando a conduta mais grave, em que o agente,
aparentemente se apresenta com arma idônea, incutindo o medo, todavia a
vítima, por ela não poderia ser morta. Diferente quando a modalidade da
conduta é a - grave ameaça. Aqui, gerar o medo, o pavor, a ponto de vencer a
capacidade de resistência, é ínsito à conduta delituosa. A arma de brinquedo, ao
contrário da hipótese anterior, é idônea, válida para alcançar o resultado típico.
Trata-se de um problema de culpabilidade, isto é, a maior reprovação que
se faz ao agente por ter havido daquela maneira.
Data venia, acompanho o Sr. Ministro-Relator.
VOTO-VOGAL
O Sr. Ministro José Cândido: Srs. Ministros, acompanho o Sr. Ministro-
Relator, com base nas decisões anteriores da Turma, data venia da questão de
ordem levantada pelo Ilustre Subprocurador-Geral da República.
RECURSO ESPECIAL N. 28.590-SP
Relator originário: Ministro Assis Toledo
Relator para o acórdão: Ministro Edson Vidigal
Recorrente: Ministério Público do Estado de São Paulo
Recorrido: Jose Fernandes de Oliveira Filho (réu preso)
Advogado: Willians Pereira de Melo
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (12): 267-350, setembro 2010 317
EMENTA
Penal. Extorsão. Arma de brinquedo. Recurso especial.
1. Alegar que a arma usada para subjugar a vítima à vontade do
agente é de brinquedo não elimina o fato de que o crime foi praticado
mediante emprego de arma.
2. Recurso conhecido e provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráfi cas a seguir, por maioria, conhecer do recurso pela alínea c e dar-lhe provimento. O Sr. Min. Cid Flaquer Scartezzini votou de acordo com o Sr. Min. Edson Vidigal, que lavrará o Acórdão. Votou vencido o Sr. Min. Relator. Ausentes, justifi cadamente, os Srs. Mins. José Dantas e Jesus Costa Lima.
Brasília (DF), 07 de dezembro de 1992 (data do julgamento).
Ministro Cid Flaquer Scartezzini, Presidente
Ministro Edson Vidigal, Relator
DJ 10.10.1994
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Assis Toledo: José Fernandes de Oliveira Filho foi
condenado por extorsão qualifi cada (art. 158, § 1º, do CP) e posse de drogas
(art. 16 da Lei n. 6.368/1976), em concurso material.
Em grau de apelação, a Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça
do Estado de São Paulo deu parcial provimento ao apelo da defesa para
desclassifi car o crime de extorsão para sua modalidade simples, por entender
que arma de brinquedo não qualifi ca o crime. Nesse ponto, o acórdão fi cou
assim redigido:
Restou, portanto, caracterizada a extorsão, que é crime de natureza formal.
Pode-se discutir se se trata ou não de extorsão qualifi cada pelo emprego de arma.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
318
No caso dos autos ressurge, mais uma vez, a discussão se a qualifi cação do crime está presente quando o agente ativo emprega arma de brinquedo.
A jurisprudência tem se manifestado, quando se trata de roubo, entendimento no sentido de que o emprego de arma de brinquedo, quando intimida a vítima, caracteriza a qualifi cadora.
Mas a arma de brinquedo não é arma em sentido técnico.
Quem emprega arma de brinquedo não se revela dotado de periculosidade.
Por esta razão, acolhe-se parcialmente o apelo a fi m de considerar confi gurada a extorsão simples, reduzidas as penas do crime patrimonial para quatro anos de reclusão e dez dias-multa.
(Fls. 153-154).
Inconformado com essa conclusão, ingressou com recurso especial o Dr.
Procurador-Geral de Justiça do Estado, pela letra c do permissivo constitucional,
citando como divergentes acórdãos desta turma (REsp n. 5.679-SP, Rel. Min.
Flaquer Scartezzini) e do Supremo Tribunal Federal (RECr n. 80.037-SP e
outros).
Admitido o recurso, a douta Subprocuradoria-Geral da República, em
parecer da lavra do Dr. Edinaldo de Holanda, opina pelo conhecimento e
provimento do recurso.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Assis Toledo (Relator): Repete-se, nestes autos, a conhecida
discussão sobre se a arma de brinquedo, considerada por uma fi cção “grave
ameaça” para caracterização dos crimes de roubo e de extorsão, pode numa
segunda etapa, com infração da proibição do bis in idem, ressurgir para qualifi car
o roubo ou a extorsão pelo emprego de “arma” (§ 2º, I, do art. 157, e § 1º do art.
158).
Sobre o tema tenho fi cado vencido, na Turma, conforme voto que proferi
no REsp n. 5.679-SP, in verbis:
Sr. Presidente, lamento ter que discordar dos votos que me precederam.
A subtração de coisa alheia é crime de furto, previsto no art. 155. Quando essa subtração é feita mediante “grave ameaça”, o furto se transforma em roubo, com pena bastante agravada. A jurisprudência e a doutrina, tomando as considerações
SÚMULAS - PRECEDENTES
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que foram feitas pelos eminentes Relator e Ministro Costa Lima, estendeu-as ao crime de roubo com emprego de arma de brinquedo, por considerar que a arma de brinquedo, devido a sua aparência, tem aptidão para fazer com que a vítima suponha estar realmente sob grave ameaça. A jurisprudência, portanto, passou a admitir o crime de roubo nesta fi cção - emprego de arma de brinquedo -, quando, na verdade, o que ocorre é uma hipótese de furto mediante fraude. Entretanto, essa tolerância tem uma justifi cação lógica: a arma de brinquedo pode verdadeiramente criar ameaça subjetiva no espírito do sujeito passivo do crime.
Todavia, um segundo passo foi dado aqui, baseado em grave equívoco, segundo penso: supor que a arma de brinquedo possa, numa segunda etapa, ser considerada espécie de “arma” para qualifi car o roubo. Note-se que, no art. 157, o legislador fala em “grave ameaça”, podendo esta ser feita por um objeto de fantasia ou até verbalmente, mas, no § 2º, o legislador já não fala em “grave ameaça” e sim em “emprego de arma”.
Para que possamos entender que arma de plástico, destinada a brinquedos infantis, seja “arma”, teremos que recorrer à analogia in malam partem, que, como se sabe, não é permitida em Direito Penal. Analogia é o raciocínio que vai do semelhante para o semelhante, tomo como ponto de partida uma hipótese regulada expressamente na lei e aplico a mesma solução a uma outra hipótese semelhante não prevista em lei, baseado no raciocínio segundo o qual o que é bom para a primeira também é bom para a segunda.
O que é bom para a arma de verdade, sê-lo-ia para a de brinquedo...
Ora, as imitações de plástico de revólver e outras, que as crianças usam para brincar, não podem ser consideradas “arma”, porque arma é instrumento de ataque, com aptidão para causar, no mínimo, lesões à integridade física, o que não ocorre com aquelas imitações.
O Sr. Ministro Costa Lima (Aparte): Hoje, há revólveres de brinquedo com espoleta que explode, expelindo, inclusive, bala e causando temor.
O Sr. Ministro Assis Toledo: Se o revólver tem espoleta e explode, expelindo uma bala que pode causar lesões, esse revólver é arma, não brinquedo. Não é esse o caso dos autos.
O que está ocorrendo aqui é um bis in idem sobre uma fantasia. A primeira, justificada, porque há aparente grave ameaça. A segunda, não, porque o legislador, no § 2º, exige “arma” e qualquer coisa que não seja arma, só por analogia poderá encaixar-se no conceito de arma.
Pelas razões expostas, data maxima venia dos eminentes Colegas que pensam em sentido contrário, conheço do recurso, por estar demonstrada a divergência, mas lhe nego provimento.
É o meu voto.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
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Não vendo razão para modifi car esse entendimento que, mutatis mutandis,
aplico à extorsão qualifi cada, conheço do recurso pela divergência mas lhe nego
provimento.
É o voto.
VOTO-VOGAL
O Sr. Ministro Edson Vidigal: Senhor Presidente, tenho posição conhecida
nesta Eg. 5ª Turma quanto ao tema. Por isso, lembrando o voto que proferi no
REsp n. 5.679-SP, peço vênia ao eminente Relator para divergir.
O voto que trago agora, a propósito deste caso sob julgamento, é o seguinte:
a discussão representa, sem dúvida, uma contribuição muito importante desta Eg. Turma para a defi nição de conceitos. O que é uma arma num crime? Um brinquedo imitando uma arma pode ser tido como arma num crime? Qual a potencialidade do dano que possa causar uma arma de verdade e uma arma de brinquedo?
Alio-me, nesta discussão, ao Ministro Relator e ao Ministro Jesus Costa Lima. Eu também conheço muitas dessas armas ditas de brinquedo e não sei se, em determinada circunstância, acuado por um desconhecido portando uma arma dessa, dita de brinquedo, qual seria a minha reação. Alguém, pêgo de inopino, ao saltar de um ônibus ou ao dobrar uma esquina, vai poder perguntar ao assaltante se a arma que empunha é de verdade ou é de brinquedo, se é “taurus” ou se é “trol”.
Não há hoje nenhuma diferença visual entre muitos revólveres de verdade e muitos revólveres de brinquedo. A sofi sticação dessas armas ditas de brinquedo está tão perfeita que a ONU/Organização das Nações Unidas, através da Unicef, que é o seu organismo voltado para as questões da infância, está pedindo às indústrias que parem com a fabricação desses brinquedos que imitam armas.
Para ilustrar, lembro aqui o que se passa agora mesmo no golfo pérsico, onde a maioria dos armamentos destruídos por bombardeios aliados sobre o território do Iraque não seriam tanques nem plataformas de mísseis de verdade mas de brinquedo, feitos de papelão ou de fi bra de vidro e expostos à localização pelos aliados apenas para cansá-los e despistá-los dos armamentos de verdade. E essas armas de brinquedo não estão sendo armas de guerra? Não estão servindo a um objetivo na guerra e produzindo conseqüências que as armas de verdade produziriam?
Pois entre nós também, nas cidades e nos campos, os revólveres de verdade já são confundidos com os de brincadeira, servindo uns e outros a um mesmo fi m - o assalto que se consuma mediante grave ameaça e até violência porque
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (12): 267-350, setembro 2010 321
se o revólver de brinquedo ainda não expele projétil mortífero, expele susto que também pode resultar em morte e sua coronha, muitas delas já tão pesadas quanto a dos revólveres de verdade se presta à violência das coronhadas. E coronhada fere, sangra e, portanto, também, até mata.
Entendendo, portanto, que alegação de que a arma era de brinquedo não
elimina o fato de que o crime foi praticado mediante emprego de arma, ou seja,
não faz desaparecer a qualifi cadora “emprego de arma”, conheço do recurso, e ao
mesmo dou provimento pela letra c.
É o voto.
VOTO-VOGAL
O Sr. Ministro Flaquer Scartezzini: Data venia do Sr. Ministro-Relator,
acompanho o Sr. Ministro Edson Vidigal. Posteriormente, farei juntada do meu
voto.
ANEXO
RECURSO ESPECIAL N. 5.679-SP (90.0010652-4)
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Flaquer Scartezzini: Trata-se de recurso especial com fulcro
no art. 105, III, c, da Constituição Federal, que a douta Procuradoria Geral
de Justiça interpõe ao v. acórdão da Quarta Câmara do E. Tribunal de Alçada
Criminal do Estado de São Paulo que, apreciando recursos, da defesa e do MP,
contra a sentença de primeiro grau que condenou Solimá Ancelmo da Silva a 4
anos de reclusão e 10 dias multa, por infringência do art. 157, caput, do Código
Penal, houve por bem negar provimento à apelação da Justiça Pública e acolher
parcialmente o recurso do réu para estabelecer o regime semi-aberto para início
de cumprimento da pena.
Alega a D. Procuradoria Geral, em síntese, que o v. acórdão fustigado, ao
entender que o uso de revólver de brinquedo não justifi ca a causa de aumento
prevista no inciso I do parágrafo 2º ao art. 157 do estatuto repressivo, divergiu
de julgados de outros tribunais do País.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
322
Houve impugnação, após o que, o Dr. Juiz Presidente do TACSP, por
ver caracterizada a divergência jurisprudencial, deferiu o processamento e a
subida do recurso, o qual, vindo a esta Superior Instância, mereceu parecer da
douta Subprocuradoria Geral da República no sentido do seu conhecimento e
provimento.
É o relatório.
Ementa: Criminal. Roubo. Arma de brinquedo. Art. 157,
parágrafo 2º, I, do CP.
- Na intimidação, feita com arma de brinquedo, para a prática
do crime de roubo, justifi ca-se o aumento da pena a que se refere
o art. 157, parágrafo 2º, I, do CP, quando o meio usado é bastante
para tolher a capacidade de resistência da vítima, que desconhecia a
inefi cácia do objeto.
- Recurso conhecido e provido.
VOTO
O Sr. Ministro Flaquer Scartezzini (Relator): Senhor Presidente, Solimá
Ancelmo da Silva foi denunciado como incurso no art. 157, parágrafo 2º, I, do
Código Penal, porque, munido de uma faca e um revólver, que depois se soube,
de brinquedo, abordou Antônio Pereira da Silva, cobrador de ônibus, e subtraiu
do mesmo, determinada quantia em dinheiro e vales.
No entanto, foi condenado como incurso no art. 157 caput do Código
Penal, pelo entendimento de que a prova não se mostrou fi rme no sentido de
indicar que a grave ameaça exercida pelo agente se caracterizou pelo emprego de
arma, estabelecido o regime fechado para início do cumprimento da pena.
A E. 4ª Câmara do TACSP, não atendeu aos reclamos do recurso da
Justiça Pública e deu provimento parcial ao do réu, para estabelecer o regime
semi-aberto, afastando a qualifi cadora do emprego de arma, por haver sido
empregado revólver de brinquedo.
Daí o presente recurso, em que a Procuradoria Geral entende haver
divergência jurisprudencial desse acórdão com os do E. TJSC, deste Colendo
Superior Tribunal de Justiça e do Excelso Supremo Tribunal Federal, que
colacionou no sentido de provar o dissídio.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (12): 267-350, setembro 2010 323
Vejamos a prefalada divergência.
Diz, num determinado trecho, o v. acórdão atacado:
A causa do aumento do inciso I do parágrafo 2º, do art. 157, do CP é objetiva. A ameaça grave, ou a violência, devem ser praticadas com emprego de armas. Revólver de brinquedo é brinquedo, e não arma.
Dos arestos colacionados, tomemos estes do Excelso STF, como paradigma:
Criminal. Roubo. Assalto com arma de brinquedo.
Não descaracteriza o crime de roubo qualifi cado ter-se o assaltante utilizado de revólver de brinquedo para impor-se à vítima, pois a intimidação pela violência de qualquer sorte ocorreu, eis que ignorava a vítima ser a arma de brinquedo. Precedentes.
(R. Ext n. 102.779-7-SP, 2ª T., rel. Min. Aldir Passarinho, v.u., 04.12.1984, RTJ 114/341).
Roubo. Arma de brinquedo. Código Penal, art. 157, parágrafo 2º, I.
Se houve intimidação da vítima, por não saber que se tratava de arma de brinquedo, justifi ca-se o aumento da pena a que alude o art. 157, parágrafo 2º, I, do Código Penal.
Precedentes do Supremo Tribunal Federal.
Recurso Extraordinário do MP conhecido, por dissídio jurisprudencial, e provido.
(R. Ext n. 102.776-2-SP, 1ª T., rel. Min. Néri da Silveira, v.u., 21.09.1984, RTJ 119/275)
Também esta E. Corte já se pronunciou sobre o assunto, haja visto o
acórdão proferido no REsp n. 65-SP, em que foi relator o eminente Ministro
Dias Trindade. Eis o referido acórdão ementado:
Penal. Crime de roubo. Ameaça com arma de brinquedo Exegese do art. 157, parágrafo 2º, I, do Código Penal.
A ameaça com o emprego de arma de brinquedo é sufi ciente para tolher a capacidade de resistência da vítima, inciente da inidoneidade ofensiva do meio empregado, de modo a confi gurar a qualifi cadora do item I do parágrafo 1º do art. 157 do Código Penal. (in DJU de 25.09.1989, p. 14.953).
Pelo confronto dos arestos trazidos com o proferido pela E. Quarta
Câmara do TAC de São Paulo, nota-se que, enquanto este, afasta a qualifi cadora
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
324
do delito, aqueles afi rmam que o uso da arma de brinquedo justifi ca, plenamente
o aumento da pena previsto no inciso I, do parágrafo 2º do art. 157 do CP.
Com isto, entendo perfeitamente demonstrado o dissídio jurisprudencial,
o que me leva a conhecer do recurso pela letra c, do inciso III, do art. 105, da
Constituição vigente.
Quanto ao mérito, narra o v. acórdão recorrido que o réu foi condenado a
pena de quatro anos de reclusão e dez dias-multa, por infringência do art. 157,
caput do CP, e que a Procuradoria Geral de Justiça pleiteou a exasperação da
pena, sob o argumento de que o delito praticado pelo réu, qualifi cou-se pelo
emprego de arma.
No entanto, os Drs. Juízes componentes da Quarta Câmara Criminal do
Tribunal de Alçada Criminal, por maioria de votos, negaram provimento a este
apelo, por entenderem que, verbis:
A causa do aumento do inciso I do parágrafo 2º, do art. 157, do Código Penal é objetiva. A ameaça grave, ou a violência, devem ser praticados com o emprego de arma. Revólver de brinquedo é brinquedo, e não arma.
A nobre Procuradoria apelante, no entanto, argumenta que, verbis:
Têm razão aqueles que entendem que o revólver de brinquedo é meio efi caz para a qualifi cadora do roubo. Obviamente, o reconhecimento da qualifi cadora há que ser precedido de análise profunda que abranja as circunstâncias específi cas do caso, em especial, enfocando-se o temor que a vítima venha a sentir julgando-se ameaçada.
Esta opinião se afi na com os inúmeros julgados da Excelsa Suprema Corte,
onde se tem decidido que incide o artigo 157, parágrafo 2º, I, do Código Penal,
assim quando a arma empregada constitui meio idôneo para a realização da
violência ou da ameaça, como quando, embora não idônea a arma para esse fi m,
ou por estar descarregada, ou por ser mera contrafacção, mostrou-se efi caz para
infundir na vítima, que desconhecia a impropriedade do meio utilizado, justo
receio de vir, pela resistência que opusesse, a por em risco a sua integridade
física.
Conforme o magistério de Nelson Hungria, in Comentários ao Código
Penal, Vol. VII, Forense, 1980, p. 58:
Por armas se deve entender não só as propriamente tais ou em sentido técnico (especialmente destinadas ao ataque ou defesa), como qualquer instrumento
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (12): 267-350, setembro 2010 325
apto a lesar a integridade física (ex. uma barra de ferro, um furador de gelo, um machete, etc.). Não é preciso que a arma seja efetivamente manejada, bastando que seja portada ostensivamente, como uma ameaça implícita. A ameaça com uma arma inefi ciente (ex. revólver descarregado) ou fi ngida (ex. um isqueiro com feitio de revólver), mas ignorando a vítima tais circunstâncias, não deixa de constituir a majorante, pois a ratio desta é a intimidação da vítima, de modo a anular-lhe a capacidade de resistir. Pela mesma razão, é irrelevante indagar-se se o agente, ao empunhar ameaçadoramente mesmo uma arma efi caz, estava, ou não, apenas simulando o propósito de atacar a vítima, desde que esta efetiva e razoavelmente se intimidou.
No mesmo diapasão, quando relatou o RExt n. 96.902-SP, o eminente
Ministro Alfredo Buzaid, assim se expressou:
Com efeito, a arma de brinquedo é meio idôneo a intimidar pessoas, levando-as à condição de vítima, mormente nos crimes contra o patrimônio.
E justifi cou sua afi rmação com estas palavras:
As armas de brinquedo, hoje fabricadas, são de tal modo idênticas às verdadeiras, que difi cilmente numa rápida vista d’olhos, se pode dizer da sua autenticidade ou não. E tanto isso é mais improvável quando a pessoa se acha sob o impacto de um gesto ameaçador ou violento, em que o sujeito ativo, desconhecido, em posição eminentemente agressiva e proclamando suas intenções, a exibe àquela, causando-lhe surpresa.
Apesar de correntes doutrinárias em sentido oposto, filio-me nesta,
proclamada pela Suprema Corte, no sentido de que a arma, ainda que de
brinquedo, presta-se a qualifi car o roubo, desde que na vítima refl ita-se o temor
inibitório de qualquer reação, desconsiderando a inefi ciência lesiva do objeto
empregado pelo agente.
Aqui, nesta E. Corte, temas a orientação unânime da E. Sexta Turma
no mesmo sentido, haja visto o REsp n. 65-SP, em que foi relator o eminente
Ministro Dias Trindade, de cujo voto, permito-me transcrever um trecho, neste
termos:
Ante a onda de violência, que a cada dia parece mais engolfar a sociedade, não vejo como se quedar a Justiça Criminal em exegese mais favorável aos facínoras, quando se reclama um rigor consentâneo com a repressão mais efetiva de crimes da natureza dos aqui revelados.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
326
Com efeito, se admitimos a eficácia da arma inidônea para, qualificando a figura de furto, reconhecermos a prática do roubo, erigido em nova figura criminal, não vejo porque não admitir também essa potencialidade de infundir temor à vítima, estarrecida ante o manejo ou exibição do brinquedo em forma de arma, pelo meliante.
Não se estaria a dar dupla valoração ao meio empregado, para reconhecer a ameaça e para ter como presente a qualifi cadora, pois que a primeira se afi gura independente, enquanto que a segunda requer o emprego do meio. A ameaça ocorre por si, ao passo que quando esta é feita com o emprego de arma, ainda que inefi caz, perfaz-se a majorante de pena, a ser considerada em face da real intimidação que causa à vítima.
Quando se retrata ao agente uma situação de fato que, se real, tornaria legítima a sua ação, reconhece-se a discriminante putativa, como estatuído no parágrafo 1º, do art. 20 do Código Penal, de modo que, aquela vítima de roubo, com o emprego de arma de brinquedo, estaria autorizada a matar seu agressor, por se reconhecer a ausência de dolo em sua ação, enquanto que, quando a contrafacção da arma fosse capaz de anular a capacidade de reação da vítima, consumando-se o roubo, esse emprego de meio sem potencialidade de infl ingir mal além da própria ameaça, seria tido como irrelevante, o que se apresenta como verdadeiro absurdo.
A sentença, embora reconhecendo o emprego da arma para a consecução
do ato tido como delituoso, entendeu que sendo a mesma de brinquedo, não
representou um perigo objetivo, com o que desclassifi cou o crime de roubo
agravada para roubo simples.
Como já visto, pelas razões que expus, não comungo com este entendimento,
pois, se a arma usada, mesmo que de brinquedo, é meio efi caz para intimidar a
vítima, representa um perigo para a mesma, mesmo que subjetivo; assim, o
crime de que se trata, deve ser qualifi cado como roubo agravado pelo emprego
de arma.
Com estes argumentos, conheço do recurso pela ocorrência de dissídio
jurisprudencial, e lhe dou provimento, reformando, assim, o v. acórdão
recorrido para que a pena imposta ao réu seja fi xada nos moldes propostos pela
douta Subprocuradoria Geral da República, às fl s. 230, ou seja, reconhecer a
qualifi cadora do parágrafo 2º, do inciso I, do art. 157, do Código Penal, com
o que aumento a pena imposta em um terço (1/3), tornando-a defi nitiva em 5
anos e 4 meses, mantendo a pena pecuniária, e o regime inicial de cumprimento
da reprimenda, considerando a primariedade técnica do condenado, mas estar
ele respondendo inquéritos por delitos da mesma natureza (fl s. 66), o que
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (12): 267-350, setembro 2010 327
registra maus antecedentes, tal como impostos na sentença, que fi ca assim,
reformada parcialmente.
É o meu voto.
RECURSO ESPECIAL N. 33.003-SP (93.0006798-2)
Relator: Ministro Vicente Leal
Recorrente: Ministério Público do Estado de São Paulo
Recorrido: Jailton Feitosa da Rocha (preso)
Advogado: Luiz Rogério Rollo
EMENTA
Penal. Roubo. Majorante. Ameaça com arma descarregada. CP, art. 157, § 2º, I. Intimidação da vítima.
- A ameaça com arma inefi ciente ou com arma de brinquedo, quando ignorada tal circunstância pela vítima, constitui causa especial de aumento de pena prevista no art. 157, § 2º, I, do Código Penal, pois tal conduta é sufi ciente para causar a intimidação da vítima.
- Recurso especial conhecido e provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe provimento, na conformidade dos votos e notas taquigráfi cas a seguir. Votaram os Srs. Ministros Adhemar Maciel, William Patterson, Luiz Vicente Cernicchiaro e Anselmo Santiago.
Brasília (DF), 14 de novembro de 1995 (data do julgamento).
Ministro Adhemar Maciel, Presidente
Ministro Vicente Leal, Relator
DJ 20.05.1996
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
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RELATÓRIO
O Sr. Ministro Vicente Leal: Jailton Feitosa da Rocha foi condenado em primeira instância a 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão, em regime semi-aberto, e 11 dias multa por infringência ao art. 157, caput, c.c. o art. 70, todos do Código Penal (fl s. 98-101), sendo o decisum confi rmado pela eg. Nona Câmara do Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo. (fl s. 130-133).
Irresignada, a Procuradoria Geral de Justiça daquele Estado interpõe recurso especial com esteio na alínea c do permissivo constitucional verberando ter o acórdão em tela ensejado divergência jurisprudência ao excluir a incidência da qualifi cadora do emprego de arma. Sustenta, em síntese, que deve incidir a referida qualifi cadora, não obstante o fato da arma utilizada pelo réu estar descarregada, de vez que a mesma teria constituído em meio idôneo para a realização da ameaça e subtração dos bens.
Sem contra-razões e admitido o recurso na origem, os autos ascenderam a esta Corte.
Nesta instância, a douta Subprocuradoria-Geral da República, em parecer de fl s. 154-158, opina pelo não conhecimento do recurso, mas caso conhecido, pelo seu improvimento.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Vicente Leal (Relator): A controvérsia estampada no
presente recurso especial reside em saber se o uso de arma inefi ciente, seja,
descarregada, constitui a majorante prevista no art. 157, § 2º, I, do Código Penal.
A situação de fato examinada nas instâncias ordinárias não enseja dúvida.
O réu fez uso de arma descarregada, o que provocou grande pavor nas vítimas.
O Tribunal a quo entendeu, todavia, não ser cabível a majorante, consoante
excerto do voto condutor do acórdão recorrido, in verbis:
No caso em exame, consoante laudo de fls. 50-51, a pistola usada pelo apelado, da maneira como o foi como arma própria, para ameaçar a vítima, ostentava a mais absoluta inidoneidade como instrumento vulnerante, pois além de desmuniciada, estava emperrada e sequer dispunha de gatilho.
Nessas condições, à toda evidência, como bem decidiu o nobre julgador, não se há falar em qualifi cação do delito pelo emprego de arma. (fl s. 131-132).
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (12): 267-350, setembro 2010 329
Tal entendimento não deve no entanto, prevalecer.
Na espécie, como proclamado na sentença e não contrariado no acórdão, o
emprego da arma desmuniciada no roubo foi sufi ciente para tolher a capacidade
de resistência das vítimas, que ignoravam a inefi cácia do objeto, alcançando,
assim, o agente, o resultado típico almejado, qual seja, a subtração da res mediante
grave ameaça. Impõe-se, portanto, a incidência da qualifi cadora do § 2º, inciso
I, do art. 157 do CP.
É a exegese que melhor se coaduna com a ratio legis do cânon sub examen.
De fato, deve levar-se em consideração não a efetiva potencialidade da arma,
mas o poder que a mesma tem de intimidação da vítima, que temerosa por sua
integridade física, não opõe resistência à subtração da res.
A propósito, merece registro o magistério do grande Nelson Hungria, in
litteris:
A ameaça com arma inefi ciente (ex.: revólver descarregado) ou fi ngida (ex.: um isqueiro com feitio de revólver), mas ignorando a vítima tais circunstâncias, não deixa de constituir a majorante, pois a ratio desta é a intimidação da vítima, de modo a anular-lhe a capacidade de resistir (in Comentários ao Código Penal, 2ª edição, vol. VII, Forense, Rio, 1958, p. 58).
O mesmo entendimento tem sido consagrado por este Tribunal em
hipótese semelhante de roubo praticado com arma de brinquedo, merecendo
registro os seguintes precedentes:
Ementa: Penal. Roubo. Arma de brinquedo. Qualifi cadora.
O fundamento da qualificadora do art. 157, § 2°, I, do Código Penal, está na intimidação da vítima, com a anulação ou diminuição da sua capacidade de resistência, o que pode perfeitamente ocorrer com o emprego de arma de brinquedo.
Recurso conhecido e provido. (REsp n. 12.279-0-SP, 6ª Turma, Rel. Min. Costa Leite, Publicado in RSTJ 36/407).
Ementa: Criminal. Roubo. Arma de brinquedo. Art 157, parágrafo 2º, I, do CP.
- Na intimidação, feita com arma de brinquedo, para a prática do crime de roubo, justifi ca-se o aumento da pena a que se refere o art. 157, parágrafo 2°, I, do CP, quando o meio usado é bastante para tolher a capacidade de resistência da vítima, que desconhecia a inefi cácia do objeto.
Recurso conhecido e provido. (REsp n. 5.679-SP, 5ª Turma, Rel. Min. F1aquer Scartezzini, Publ. no DJ 18.03.1991).
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
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Penal. Roubo. Revólver de brinquedo (“arma fi nta”). Circunstância agravante. Precedentes da Sexta Turma. Recurso especial conhecido e provido.
I - A recorrida, acompanhada de dois comparsas, utilizando-se de arma de brinquedo (revólver), intimidou e assaltou sucessivamente três vítimas. O juiz monocrático a condenou a sete anos de reclusão (CP, art. 157, § 2º, I e II). Inconformada, ela apelou. Sua pena privativa de liberdade foi reduzida para 6 anos, 4 meses e 24 dias de reclusão. O Ministério Público do Estado de São Paulo, por seu turno, recorreu de especial pela alínea c do autorizativo constitucional.
II - O § 2° do art. 157 do CP tem como agravante “se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma”. Assim, o que se tem de levar em conta não é a efetiva potencialidade da “arma”, mas o que ela pode aparentar aos olhos do homo medius para efeito de violência e intimidação. Sibilina seria a distinção entre “arma de verdade” mas sem condições de utilização efetiva (revólver sem cão, sem tambor, sem bala, etc) e um revólver de brinquedo, imitativo do verdadeiro. Precedentes da Sexta Turma do STJ.
III - Recurso especial conhecido e provido para restaurar a sentença de primeiro grau. (REsp n. 38.136-3, 6ª Turma, rel. Min. Adhemar Maciel, Publ. no DJ 27.06.1994).
Assim sendo, conheço do recurso pela alínea c, e dou-lhe provimento com vistas a corrigir a pena que passa a ser a seguinte: Quatro anos de reclusão que elevo para cinco anos e quatro meses de reclusão pela incidência da qualifi cadora do inciso I, do § 2° do art. 157 do CP. Mantida a incidência do aumento de 1/6 pela existência de concurso formal, a pena fi ca majorada em dez meses e vinte dias, pelo que passa a ser de seis anos, dois meses e vinte dias. A pena de multa recorrida fi ca mantida em onze dias multa, mantido também o regime.
É o voto.
VOTO-VOGAL
O Sr. Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro: Sr. Presidente, o art. 157, ao falar na subtração, afi rma que o agente se valeu da ameaça ou violência, incutindo terror e medo. Nas circunstâncias em que se encontrava, a vítima acreditou que o agente - valendo-se de instrumento para o caso de haver reação por parte da vítima - poderia matá-la. Não há dúvida alguma, a arma, seja no sentido próprio ou impróprio, contribuiu para aumentar o terror, afastando a possibilidade de defesa. No caso concreto não foi utilizada violência, sendo a ameaça sufi ciente para incutir terror e medo. O objeto, apesar de estar com o defeito mencionado, não foi relevante nesta hipótese, uma vez não percebido pela vítima. Em face disso a resistência foi vencida e a ameaça exaurida.
Acompanho o eminente Ministro-Relator.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (12): 267-350, setembro 2010 331
RECURSO ESPECIAL N. 36.752-SP (93.0019012-1)
Relator: Ministro José Cândido de Carvalho Filho
Recorrente: Ministério Público do Estado de São Paulo
Recorrido: Valdinei Faustino
Advogados: Maria Betania do Amaral e outro
EMENTA
Recurso especial. Tentativa de roubo. Revólver de brinquedo.
Art. 157, § 2º, inc. I e art. 14, inc. II, ambos do Código Penal.
Hipótese em que o comerciante deixou-se intimidar, sob ameaça
de um revólver utilizado pelo assaltante, que, somente após apoderar-
se do dinheiro do caixa, foi dominado pela vítima com ajuda de um de
seus empregados.
Não é possível deixar-se de configurar a tentativa, com a
qualifi cadora do delito, com a violência exercida com emprego de
revólver de brinquedo. Tratando-se de crime complexo, é importante
examinar-se se a violência ocorreu antes ou depois da subtração. In
casu, foi antes da subtração, impondo reconhecer-se o êxito do início
da execução, em decorrência da comprovada intimidação da vítima,
ignorando tratar-se de arma de brinquedo. O que deve levar em conta
é a vontade criminosa do agente.
Recurso provido para prestigiar a sentença de primeiro grau, que
concluiu pela forma qualifi cada da tentativa do delito.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, prosseguindo no julgamento,
acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por
unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe provimento, na conformidade dos
votos e notas taquigráfi cas constantes dos autos. Votaram os Srs. Ministros
Pedro Acioli, Adhemar Maciel e Anselmo Santiago.
Brasília (DF), 19 de outubro de 1993 (data do julgamento).
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
332
Ministro Pedro Acioli, Presidente
Ministro José Cândido de Carvalho Filho, Relator
DJ 29.11.1993
RELATÓRIO
O Sr. Ministro José Cândido: Adoto como relatório o despacho de
admissibilidade do presente recurso, de fl s. 140:
Valdinei Faustino foi condenado, pelo Juízo da Nona Vara Criminal da Comarca de São Paulo, a 1 ano, 9 meses e 10 dias de reclusão e 4 dias-multa, por infringência ao art. 157, § 2º, I, c.c. o art. 14, II, ambos do Código Penal, concedido o sursis por 2 anos.
Inconformada, apelou a defesa, e a E. Décima Câmara desta Corte, à unanimidade, deu provimento parcial ao recurso para fi xar a pena privativa de liberdade em 1 ano e 4 meses de reclusão.
Com apoio no art. 105, III, c, da Constituição da República, a Douta Subprocuradoria Geral de Justiça interpõe recurso especial. Alega, em síntese, que o ven. acórdão atacado, ao entender que o uso de revólver de brinquedo não justifi ca a qualifi cadora prevista no inciso I do § 2° do art. 157 do estatuto repressivo, divergiu de julgados do Col. Superior Tribunal de Justiça e do Pretório Excelso.
Não foram apresentadas contra-razões.
Concluiu o ilustre Presidente do Tribunal de Alçada Criminal do Estado
de São Paulo, admitindo o processamento do recurso especial.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro José Cândido (Relator): O egrégio Tribunal a quo, dando
provimento ao apelo do réu, diminuiu a pena que lhe foi aplicada, argüindo:
O recurso merece parcial provimento para o fi m de ser excluída a qualifi cadora descrita no inciso I do § 2º do art. 157 do Código Penal - emprego de arma, porque se constatou (fl s. 5 e 94-95) que o apelante usou uma arma de brinquedo para exercer ameaça contra a vítima.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (12): 267-350, setembro 2010 333
A jurisprudência ainda discute, e parece distante de pacifi cação, a respeito de a violência ou a ameaça exercida com emprego de arma de brinquedo caracterizar, ou não, a qualifi cadora do inciso I do § 2º do artigo 157 do Código Penal. Para tal constatação, confirmam-se ementas colacionadas in “Código Penal e sua interpretação Jurisprudencial”, Ed. Revista dos Tribunais, 1990, p. 933-935, item 13.02, Alberto Silva Franco e outros, mas é evidente que se se tratava de arma de brinquedo, a circunstância não poderia ter sido reconhecida. (fl .122).
Como arma de brinquedo, em primeiro lugar não é arma, e, em segundo lugar, quando empregada em delito de roubo, não contém idoneidade sufi ciente para causar perigo ou lesionar a pessoa do ofendido, afasta-se o reconhecimento da circunstância objetiva prevista no inciso I do § 2º do art. 157 do Código Penal. (fl . 124).
E conclui o acórdão, excluindo a qualifi cadora, fi xando-se no preceito do
caput do art. 157, diminuiu a pena.
A tese do Ministério Público guarda entendimento diverso, com base em
reiteradas decisões do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de
Justiça, tal como refl ete, dentre outras, a decisão proferida no RE n. 102.151-
9-SP, pela egrégia 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal, sendo Relator o
eminente Ministro Francisco Rezek, assim ementada:
Roubo. Arma de brinquedo. Art. 157, parágrafo 2º, I, do CP.
O uso de arma de brinquedo, se intimida a vítima, credencia o aumento de pena em virtude da qualifi cadora do art. 157, parágrafo 2º, ZI, do CP. Precedentes. (RE n. 102.151-9-SP - 2ª T. - Min. Francisco Rezek - DJU 96:7741, 18.05.1984). (fl .132).
O tema não merece mais discussão, diante do alongado debate já provocado
no seio dos Tribunais da União, como advertiu o acórdão hostilizado, sendo
apenas necessário fi xar posição ao lado da corrente que se apresenta como
refl etindo o melhor direito.
No caso dos autos, ocorreu o seguinte:
Restou cabalmente comprovado que ele, no dia 22 de agosto de 1990, ingressou no bar da vítima José Dias de Araújo (fl s. 59), onde depois de tomar um refrigerante, sacou de uma arma e anunciou um roubo. Intimidada, a vítima, permitiu que o réu apanhasse o dinheiro que havia no caixa, até o momento em que conseguiu dominá-la e chamar a polícia. Não sofreu prejuízo e verifi cou posteriormente que a arma que ele usou era de brinquedo.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
334
Edelcio Martins dos Santos (fls. 60), empregado da vítima, presenciou toda a cena e confi rmou a detenção e a identifi cação do apelante como autor da tentativa de roubo. (fl . 121).
O réu foi condenado por infração ao art. 157, § 2°, inc. I, c.c. o art. XIV,
inc. II, ambos do Código Penal, vale dizer, por tentativa de crime de roubo
especialmente agravado.
Diz a sentença que ele não logrou “retirar as coisas roubadas da esfera da
vigilância e disponibilidade da vítima”. (fl . 83).
O egrégio Tribunal a quo desclassifi cou o delito tentado para o caput do art.
157, reduziu a pena aplicada.
Tenho para mim, que essa desclassificação improcede. NELSON
HUNGRIA, nos seus Comentários ao Código Penal. vol. VII, Forense, 2ª ed. p.
58, ao comentar o art. 157, diz:
A ameaça com uma arma inefi ciente (ex.: revolver descarregado) ou fi ngida (ex.: um isqueiro com feitio de revolver), mas ignorando a vítima tais circunstâncias, não deixa de constituir a majorante, pois a ratio desta é a intimidação da vítima, de modo anular-lhe a capacidade de resistir. Pela mesma razão, é irrelevante indagar se o agente, ao empunhar ameaçadoramente mesmo uma arma efi caz, estava ou não, apenas simulando o propósito de atacar a vítima, desde que esta efetiva e razoavelmente se intimidou.
Convém lembrar que o roubo é crime complexo, devendo-se levar em conta, para qualquer das hipóteses de consumação ou tentativa, o fato de haver o emprego da violência sido antes ou subtração da coisa. No caso dos autos, a violência procedeu à subtração de certa quantia em dinheiro, deixando a vítima sob intimidação, só vencida depois da posse do dinheiro, ignorando o comerciante tratar-se de arma de brinquedo, vindo em decorrência de reação súbita, dominado o assaltante com a ajuda de um seu funcionário. Não houve, assim a consumação que só se completava com a subtração patrimonial.
Desta forma, se a vítima apavorada não evitou, desde o início, o assalto, em razão do medo, fi rme está a classifi cação da sentença, no art. 157, § 2º, inc. I, c.c. o art. 14, inciso II, ambos do Código Penal. In casu, o que se deve levar em conta é a vontade criminosa do agente.
Com estes fundamentos, conheço do recurso, e lhe dou provimento para cassar o acórdão recorrido, fazendo prevalecer a decisão de primeiro grau.
É o meu voto.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (12): 267-350, setembro 2010 335
VOTO VISTA
O Sr. Ministro Adhemar Maciel: Pedi vista. O relator, o eminente Ministro
José Cândido, proveu o recurso interposto pelo Ministério Público do Estado de
S. Paulo, restaurando a condenação de primeiro grau, que havia sido minimizada
pelo TASP.
O recorrido, o menor Valdinei Faustino, munido de um revólver de
brinquedo, tentou roubar de um comerciante a quantia de Cr$ 30.000,00. Não
logrou consumar o crime previsto no art. 157 do CP por circunstâncias alheias
à sua vontade.
O juiz singular julgou procedente a ação, apenando o réu no art. 157, § 2º,
inciso I (emprego de arma), c.c. art. 14, II, todos do CP.
O egrégio TASP, tendo como relator o eminente Juiz Márcio Bártoli,
por se tratar de “arma de brinquedo” (inciso I do § 2º do art. 157), excluiu a
qualifi cadora.
O Ministro relator, com arrimo em ementa do Min. Francisco Rezek, deu
provimento ao especial, restaurando a pena fi xada pelo juízo de primeiro grau.
Durante o julgamento nesta Turma, o douto representante do Ministério
Público Federal, Dr. Ribeiro De Bonis, sustentou que o dispositivo em tela fala
em “violência ou ameaça” com “emprego de arma”. Um revólver de brinquedo
não pode ser encarado como “arma” para o fi m de majorar a pena-base. Trata-se
de dado objetivo e não subjetivo.
Senhor Presidente, peço vênia ao nosso estudioso subprocurador-geral da
República para acompanhar V. Exª. Deve-se levar em linha de conta o pavor da
vítima diante de um “revólver”, ainda que, sob o ângulo objetivo, não seja arma.
O que importa é a efi cácia produzida pela “arma de brinquedo”, pelo “revólver
sem cão” etc. No caso concreto, no momento do assalto, aos olhos do homo
medius, tal brinquedo tomou feições de arma intimidatória. MAGALHÃES
NORONHA, discorrendo sobre “armas próprias”, ensina:
Muita vez, uma arma pode não ser idônea para a realização da violência, de acordo com seu destino próprio; assim, p. ex., um revólver descarregado. Mas será idôneo para a ameaça se a vítima desconhecer essa circunstância. A lei exige apenas que a ameaça ou a violência sejam exercidas com emprego de arma. Não há questionar se o agente preparou-se de antemão com ela, para pôr em ação aqueles meios. É sufi ciente empregá-la, ofendendo a integridade corporal da vítima ou ameaçando-a. (“Direito Penal”, Saraiva, 1977, II: 166).
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
336
A jurisprudência predominante é no sentido esposado pelo eminente
relator Celso Delmanto colaciona arestos do STF nas RTJS 113/404, 114/341,
592/425, 592/435 e 109/1.285.
O Min. Rafael Mayer assim sumariou acórdão do STF:
A arma defeituosa não descaracteriza a qualificadora do crime de roubo advinda de seu emprego. (JUTACRIM 82/482, apud Alberto Silva Franco e outros in “Cód. Penal e sua interpretação jurisprudencial”, RT, 4ª ed., p. 1.074).
Assim, acompanho o eminente relator. Dou provimento ao recurso.
É como voto.
RECURSO ESPECIAL N. 38.136-SP (93.023790-0)
Relator: Ministro Adhemar Maciel
Recorrente: Ministério Público do Estado de São Paulo
Recorrido: Edneide Fabrício da Silva Lima
Advogada: Vera Lúcia de Souza
EMENTA
Penal. Roubo. Revólver de brinquedo (“arma fi nta”) circunstância
agravante. Precedentes da Sexta Turma. Recurso especial conhecido e
provido.
I - A recorrida, acompanhada de dois comparsas, utilizando-se
de arma de brinquedo (revólver), intimidou e assaltou sucessivamente
três vítimas. O juiz monocrático a condenou a sete anos de reclusão
(CP, art. 157, § 2º, I e II). Inconformada, ela apelou. Sua pena privativa
de liberdade foi reduzida para 6 anos, 4 meses e 24 dias de reclusão. O
Ministério Público do Estado de São Paulo, por seu turno, recorreu de
especial pela alínea c do autorizativo constitucional.
II - O § 2º do art. 157 do CP tem como agravante “se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma”. Assim, o que se tem de
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (12): 267-350, setembro 2010 337
levar em conta não é a efetiva potencialidade da “arma”, mas o que ela pode aparentar aos olhos do homo medius para efeito de violência e intimidação. Sibilina seria a distinção entre “arma de verdade” mas sem condições de utilização efetiva (revólver sem cão, sem tambor, sem bala etc) e um revólver de brinquedo, imitativo do verdadeiro. Precedentes da Sexta Turma do STJ.
III - Recurso especial conhecido e provido para restaurar a sentença de primeiro grau.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.
Decide a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator, na forma do relatório e notas taquigráfi cas constantes dos autos, que fi cam fazendo parte integrante do presente julgado. Votaram de acordo os Srs. Ministros Anselmo Santiago e Pedro Acioli. Ausente, por motivo de licença médica, o Sr. Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro.
Custas, como de lei.
Brasília (DF), 31 de maio de 1994 (data do julgamento).
Ministro Pedro Acioli, Presidente
Ministro Adhemar Maciel, Relator
DJ 27.06.1994
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Adhemar Maciel: Trata-se de recurso especial interposto pelo Ministério Público do Estado de São Paulo com apoio no art. 105, III, c, da CF contra acórdão da Quinta Câmara do Tribunal de Alçada Criminal do Estado
de São Paulo.
2. A ora recorrida, Edneide Fabrício da Silva Lima, foi condenada a 7 anos de reclusão e 18 dias-multa, em regime fechado, pelo juiz da 28ª Vara Criminal da Comarca de São Paulo, por infringência ao art. 157 (roubo), § 2º, I e II, do Código Penal. A recorrida, com outros acusados, nos dias 14 e 16 de dezembro de 1991, praticaram três assaltos, utilizando um revólver de brinquedo.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
338
Inconformada, apelou a defesa. O acórdão recorrido deu provimento parcial ao recurso para afastar a qualifi cadora de emprego de arma e reduziu a pena para 6 anos, 4 meses e 24 dias de reclusão e 15 dias-multa, fi xado o regime semi-aberto. Entendeu o aresto impugnado que o uso de revólver de brinquedo não justifi ca a qualifi cadora prevista no § 2º do art. 157 do Código Penal.
3. O recorrente alega divergência jurisprudencial, uma vez que o STF e STJ entendem, consoante jurisprudência pacífi ca, que o emprego de arma de brinquedo, se intimida a vítima , credencia o aumento de pena previsto no art. 157, § 2º, do CP. Pede seja cassado o acórdão recorrido para o restabelecimento de pena na forma imposta pela sentença de 1º grau.
4. O Ministério Público Federal, em parecer da lavra do Dr. F. Adalberto Nóbrega, opinou pelo provimento do recurso especial a fi m de que seja cassado o acórdão atacado e restabelecida a pena original imposta na 1ª instância. Entendeu que a razão da qualifi cadora é a ameaça para a vítima que está tanto numa arma de brinquedo, como numa arma verdadeira.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Adhemar Maciel (Relator): Senhor Presidente, conheço
julgados não só do STF (Ministro Marco Aurélio, HC n. 70.534, DJU de
14.09.1993), como de TJs no sentido de não se admitir a “arma de brinquedo”
como agravante no crime de roubo. Tenho para mim que tal posicionamento
advém, em parte, da jurisprudência italiana ao tratar da “circostanza aggravante”
pelo uso de “giocattolo” como “arma fi nta”.
O eminente relator, Juiz Wálter Swesson, assim fundamentou seu voto:
O reconhecimento da qualifi cadora seria, com o devido respeito pelas opiniões em sentido contrário, autêntico bis in idem, visto que a grave ameaça seria não só utilizada para a caracterização do roubo, mas também para o reconhecimento da qualifi cadora do emprego de arma, em autêntica falta de sintonia com o espírito da lei.
No caso concreto, a recorrente em companhia de uma amiga e um terceiro
fi zeram três assaltos com uma arma de brinquedo (revólver). Primeiro um
chofer de táxi, que fi cou sem seu veículo; no segundo assalto, a vítima foi uma
mulher que estava em ponto de ônibus e o terceiro roubo, o de um transeunte, o
qual fi cou privado de sua carteira de notas.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (12): 267-350, setembro 2010 339
O recorrente demonstrou a existência de dissídio jurisprudencial.
No REsp n. 36.752-SP, em que fi gura como relator o eminente Ministro
José Cândido de Carvalho Filho, publicado no DJU de 29.11.1993, p. 25.908,
pedi vista. Assim alinhavei meu voto:
Durante o julgamento nesta Turma, o douto representante do Ministério Público Federal, Dr. Ribeiro De Bonis, sustentou que o dispositivo em tela fala em “violência ou ameaça” com “emprego de arma”. Um revólver de brinquedo não pode ser encarado como “arma” para o fi m de majorar a pena-base. Trata-se de dado objetivo e não subjetivo.
Senhor Presidente, peço vênia ao nosso estudioso subprocurador-geral da República para acompanhar V. Exª. Deve-se levar em linha de conta o pavor da vítima diante de um “revólver”, ainda que, sob o ângulo objetivo, não seja arma. O que importa é a efi cácia produzida pela “arma de brinquedo”, pelo “revólver sem cão” etc. No caso concreto, no momento do assalto, aos olhos do homo medius, tal brinquedo tomou feições de arma intimidatória. MAGALHÃES NORONHA, discorrendo sobre “armas próprias”, ensina:
Muita vez, uma arma pode não ser idônea para a realização da violência, de acordo com seu destino próprio; assim, p. ex., um revólver descarregado. Mas será idôneo para a ameaça se a vítima desconhecer essa circunstância. A lei exige apenas que a ameaça ou a violência sejam exercidas com emprego de arma. Não há questionar se o agente preparou-se de antemão com ela, para pôr em ação aqueles meios. É sufi ciente empregá-la, ofendendo a integridade corporal da vítima ou ameaçando-a. (“Direito Penal”, Saraiva, 1977, II: 166).
A jurisprudência predominante é no sentido esposado pelo eminente relator Celso Delmanto colaciona arestos do STF nas RTJS n. 113/404, 114/341, 592/425. 592/435 e 109/1.285.
O Min. Rafael Mayer assim sumariou acórdão do STF:
A arma defeituosa não descaracteriza a qualifi cadora do crime de roubo advinda de seu emprego (JUTACRIM 82/482, apud Alberto Silva Franco e outros in “Cód. Penal e sua interpretação jurisprudencial”, RT, 4ª ed., p. 1.074).
Assim, acompanho o eminente relator. Dou provimento ao recurso.
A ementa fi cou assim:
Recurso especial. Tentativa de roubo. Revólver de brinquedo. Art. 157, § 2º, inciso I e art. 14, inc. II, ambos do Código Penal.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
340
- Hipótese em que o comerciante deixou-se intimidar, sob ameaça de um revólver utilizado pelo assaltante, que, somente após apoderar-se do dinheiro do caixa, foi dominado pela vítima com ajuda de um de seus empregados.
- Não é possível deixar-se de confi gurar a tentativa, com a qualifi cadora do delito, com a violência exercida com emprego de revólver de brinquedo. Tratando-se de crime complexo, é importante examinar-se se a violência ocorreu antes ou depois da subtração. In casu, foi antes da subtração, impondo reconhecer-se o êxito do início da execução, em decorrência da comprovada intimidação da vítima, ignorando tratar-se de arma de brinquedo. O que deve levar em conta é a vontade criminosa do agente.
- Recurso provido para prestigiar a sentença de primeiro grau, que conclui pela forma qualifi cada da tentativa do delito.
(REsp n. 36.752/1993-SP, Rel. Min. José Cândido de Carvalho Filho, DJU de 29.11.1993, p. 25.908).
Com tais considerações, conheço e provejo o recurso, restabelecendo as penas fi xadas pelo juiz singular.
É meu voto.
RECURSO ESPECIAL N. 62.724-SP (95.0014016-0)
Relator: Ministro Jesus Costa Lima
Recorrente: Ministério Público do Estado de São Paulo
Recorrido: Flávio Henrique Bicudo
Advogada: Márcia Auxiliadora Ferreira
EMENTA
Penal. Roubo. Emprego de arma de brinquedo. Meio intimidativo.
I. Ainda se entenda que a lei empregue arma no sentido técnico, este não se alheia do conceito geral de que, como tal, se considera todo instrumento de ataque ou de defesa capaz de infundir no espírito da vítima justo receio de uma agressão ou de impedi-la de agir. Importa, sim, que tenha havido a concreta intimidação.
II. Precedentes do STF e STJ.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (12): 267-350, setembro 2010 341
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quinta
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráfi cas a seguir, por maioria, conhecer do recurso e lhe dar provimento
para restabelecer a sentença. Votaram com o Relator os Ministros José Dantas,
Cid Flaquer Scartezzini e Edson Vidigal. Votou vencido, o Ministro Assis
Toledo.
Brasília (DF), 17 de maio de 1995 (data do julgamento).
Ministro Jesus Costa Lima, Presidente e Relator
DJ 07.08.1995
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Jesus Costa Lima: Recurso especial interposto pelo
Ministério Público do Estado de São Paulo com base na alínea c do permissivo
constitucional, irresignado com o v. aresto de fl s. 91-95, proferido pela Primeira
Câmara do Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo, que afastou da
condenação a qualifi cadora do emprego de arma prevista no § 2º, I, art. 157 do
CP, porque utilizado revólver de brinquedo, sem potencialidade ofensiva, não
obstante tenha servido para ameaçar a vítima.
A pena do acusado, Flávio Henrique Bicudo, foi reduzida a quatro anos de
reclusão e multa como infrator do art. 157, caput, do Código Penal.
Alega o recorrente que apesar de se tratar de arma de brinquedo,
infundiu-se à vítima justo receio, reporta-se a precedentes do colendo Supremo
Tribunal Federal e também desta Corte, nos quais se determina a inclusão
da qualifi cadora. Pleiteia o restabelecimento da pena aplicada na sentença de
primeiro grau (fl s. 98-105).
Não houve contra-razões (fl . 102v) e o especial foi admitido (fl s. 109).
Opina a Dra. Aurea Maria Etelvina Nogueira Lustosa Pierre, em exercício
como Subprocuradora-Geral da República, pelo provimento do recurso,
arrimada nos precedentes jurisprudenciais que menciona (fl s. 117-121).
Relatei.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
342
VOTO
O Sr. Ministro Jesus Costa Lima (Relator): Diz o douto voto condutor do
acórdão:
Sem embargo de elevados entendimentos em contrário, simples arma de brinquedo, apesar de ser sufi ciente para compor a grave ameaça típica do roubo, não pode servir para caracterizar a qualifi cadora do emprego de arma prevista no art. 157, § 2º, inciso I, do Código Penal, uma vez que aí a lei se refere, tecnicamente, à arma verdadeira, seja própria ou imprópria, à qual não se equipara, por motivos óbvios, um simples brinquedo. Se esse brinquedo, pelas suas características, serviu para ameaçar a vítima, reduzindo-a à impossibilidade de resistência, fi cou tipifi cado o roubo simples, porque o objeto usado para concretizar essa ameaça não possuía qualquer potencial ofensivo como ocorre com as armas em geral. (fl . 93).
Tenho o maior respeito pelas opiniões alheias. Mas, ainda se entenda que a lei empregue arma no sentido técnico, este não se alheia do conceito geral de que, como tal, se considera todo instrumento de ataque ou de defesa capaz de infundir no espírito da vítima justo receio de uma agressão, coarctando-lhe as possibilidades de agir. Quem, nos dias atuais, por amor ao tecnicismo, se encadeia ao conceito de “arma verdadeira”, é porque não teve oportunidade de vê, manusear um desses instrumentos tão perfeitos em sua estrutura e apresentação que, somente a um detido exame, pode desfazer a dúvida.
A vítima declarou:
Por volta de vinte e três e trinta horas, quando voltava para sua casa pela Avenida Nove de Julho, em São Vicente, foi abordado por um elemento, preto, alto, o qual com um revólver na mão direita, disse ‘’pára, pára é assalto” e mandou que o declarante entregasse dinheiro; que, o declarante disse que não tinha dinheiro, sendo que então o elemento pediu o tênis que o declarante estava usando e sua bicicleta, além da mochila que estava nas costas; que, o declarante quando tirava a mochila, segurou-a nas mãos e saiu correndo; que, chamou uma viatura da Polícia Militar, porém não esperou no local, ou próximo, pois, fi cou com medo, tendo em vista que o elemento estava armado. (fl . 12)
Ora, quem horas tantas da noite, assim intimidado, vai previamente
examinar se o assaltante está empregando arma em sentido técnico ou uma
imitação “sem potencial ofensivo”? Claro que ninguém.
Em hipótese que não guarda perfeita identidade com a destes autos
entendi:
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (12): 267-350, setembro 2010 343
Recurso especial. Roubo qualifi cado. Dissídio não demonstrado.
Os precedentes do Supremo Tribunal Federal apontados no recurso especial referem-se a casos em que o agente empregou arma de brinquedo para cometer o crime. Todavia, a hipótese dos autos trata de agente que se limitou a mostrar o revólver de brinquedo, que postava à cintura.
A divergência, portanto, não está caracterizada, o que acarreta o não conhecimento do recurso6.
Tanto é assim que a jurisprudência predominante vem decidindo:
Roubo. Utilização de arma imprópria ao uso. Efeitos.
A utilização de arma imprópria ao disparo ou de brinquedo não descaracteriza o tipo do artigo 155, caput, do Código Penal. Conforme precedente desta Corte - Habeas Corpus n. 70.534-1, por mim relatado, cujo acórdão foi publicado no Diário da Justiça de 1º de outubro de 1993 - apenas afasta a causa de aumento inserta no inciso I, parágrafo 2º do artigo 157 daquele diploma. Existência, no caso, da grave ameaça, muito embora sob a óptica da aparência, a evidenciar a violência a pessoa.
Atenuante. Menoridade. Não há como cogitar da atenuante quando a pena-base é fi xada considerado o quantitativo mínimo previsto para o tipo. Sendo o direito uma ciência, descabe confundir institutos que têm signifi cado próprio - o da atenuante - com o revelado pela causa de diminuição da pena. Somente em relação a esta é possível chegar-se a quantitativo inferior ao mínimo estabelecido na norma de regência.
Competência. Habeas corpus. Empréstimos de efeito suspensivo a recurso. A competência para o habeas corpus, no que ganha contornos de verdadeira demanda cautelar, é do Tribunal competente para julgar o recurso. Precedente: Habeas Corpus n. 68.547-SP, relatado pelo Ministro Néri da Silveira, cujo acórdão foi publicado no Diário da Justiça de 11 de outubro de 1991, à p. 14.249.7
Roubo.
O uso de arma de brinquedo, com efetiva intimidação da vítima, justifi ca a capitulação do crime no art. 157, caput, do Código Penal, não sendo, no caso, objeto do recurso, a qualifi cadora do par. 2°, do mesmo dispositivo.
Medida de segurança cuja exclusão se mantém, ante a superveniência da Lei n. 7.209/1984.
6 REsp n. 20.719-1-SP, Relator Ministro Jesus Costa Lima, DJU de 05.10.1992.
7 HC n. 71.051-MG, Relator Ministro Marco Aurélio, DJU de 23.09.1994, p. 25.328
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
344
Recurso extraordinário do Ministério Público estadual em parte provido.8
Roubo. Consumada a subtração da coisa móvel mediante violência ou grave ameaça, a prisão em fl agrante não desclassifi ca o fato típico para tentativa. ReCr n. 90.426-RJ.
2 - Roubo, arma de brinquedo. Se houve intimação da vítima, por não saber que se tratava de arma de brinquedo, justifi ca-se o aumento da pena a que alude o art. 157, parágrafo 2º, I, do Código Penal, precedentes de ambas as turmas do STF. (RE n. 93.971).
RE conhecido e provido.9
Roubo. Arma de brinquedo. Se houve intimidação da vítima, por não saber que se tratava de arma de brinquedo, justifi ca-se o aumento de pena a que alude o artigo 157, a, 2º, I, do Código Penal. Precedente do STF (ReCr n. 90.227). Recurso extraordinário conhecido, mas não provido. 10
Penal. Crime de roubo. Ameaça com arma de brinquedo. Exegese do art. 157 par. 2º, I, do Código Penal.
A ameaça com o emprego de arma de brinquedo, é sufi ciente para tolher a capacidade de resistência da vítima, inciente da inidoneidade ofensiva do meio empregado, de modo a confi gurar a qualifi cadora do item I do par. 2º do art. 157 do Código Penal.11
Criminal. Roubo. Arma de brinquedo. Art. 157, parágrafo 2º, do CP.
- Na intimidação, feita com arma de brinquedo, para a prática do crime de roubo, justifi ca-se o aumento da pena a que se refere o art. 157, parágrafo 2º, I, do CP, quando o meio usado é bastante para tolher a capacidade de resistência da vítima, que desconhecia a inefi cácia do objeto.
- Recurso conhecido e provido.12
Penal. Extorsão. Arma de brinquedo. Recurso especial.
1. Alegar que a arma usada para subjugar a vítima à vontade do agente é de brinquedo não elimina o fato de que o crime foi praticado mediante emprego de arma.
2. Recurso conhecido e provido13
8 ReCr n. 103.675-SP, Relator Ministro Octávio Gallotti, DJU de 12.04.1985, p. 4.940
9 ReCr n. 99.036-SP, Relator Ministro Cordeiro Guerra, DJU de 11.03.1983, p. 2.478
10 RE n. 90.031-SP, Relator Ministro Moreira Alves, decisão de 05.10.1979
11 REsp n. 65-SP, Relator Ministro Dias Trindade, DJU de 25.09.1989, p. 14.953
12 REsp n. 5.679-SP, Relator Ministro Cid Flaquer Scartezzini, DJU de 18.03.1991, p. 2.805
13 REsp n. 28.590-SP, Relator Ministro Edson Vidigal, DJU de 10.10.1994, p. 27.183
SÚMULAS - PRECEDENTES
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Por tais motivos conheço do recurso especial e dou-lhe provimento para
restabelecer a sentença.
É o voto.
VOTO VENCIDO
O Sr. Ministro Assis Toledo: Sr. Presidente, tratando-se de matéria referente a arma de brinquedo, data venia fi co vencido nos termos dos votos que tenho proferido.
O direito penal não admite a aplicação de analogia in malam partem.
É o meu voto.
RECURSO ESPECIAL N. 67.524-SP (95.0028095-7)
Relator originário: Ministro Assis Toledo
Relator para o acórdão: Ministro José Dantas
Recorrente: Ministério Público do Estado de São Paulo
Recorrido: Ivair Eleutério (preso)
Advogada: Lourdes de Oliveira Fernandes - Defensora
EMENTA
Criminal. Roubo. Arma de brinquedo.
- Aumento da pena. Tradicional jurisprudência dos tribunais
quanto a justifi car a aplicação do art. 157, § 2º, inc. II do Cód. Penal,
quando o meio usado é bastante para tolher a capacidade de resistência
da vítima inciente da inefi cácia do objeto.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quinta
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
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346
taquigráfi cas a seguir, por maioria, conhecer do recurso e lhe dar provimento. Os
Ministros Cid Flaquer Scartezzini, Jesus Costa Lima e Edson Vidigal votaram
com o Ministro José Dantas. Votou vencido o Ministro Relator.
Brasília (DF), 21 de agosto de 1995 (data do julgamento).
Ministro Assis Toledo, Presidente
Ministro José Dantas, Relator
DJ 06.11.1995
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Assis Toledo: Ivair Eleutério foi condenado a cinco anos e quatro meses de reclusão, pela prática do crime do art. 157, § 2º, I, do Código Penal, com regime inicial semi-aberto.
Apreciando os recursos, a Primeira Câmara do Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo, por maioria de votos, deu provimento ao apelo ministerial para imposição do regime inicial fechado e parcial ao apelo da defesa para afastar a qualifi cadora de arma de fogo. Por votação intermediária, decretou a redução da pena para quatro anos de reclusão e dez dias-multa.
Inconformada, a Procuradoria-Geral de Justiça interpôs recurso especial, apoiada na alínea c do permissivo constitucional, sustentando divergência com diversos julgados do Supremo Tribunal Federal e desta Corte, no que diz respeito à qualifi cadora do emprego da arma de brinquedo.
Admitida a irresignação, nesta instância a douta Subprocuradoria-Geral da República, em parecer da lavra da Drª Julieta E. Fajardo Cavalcanti de Albuquerque, opina pelo provimento.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Assis Toledo (Relator): O acórdão adotou a tese de que a
arma de brinquedo não qualifi ca o roubo (fl s. 106).
Tal orientação diverge frontalmente dos acórdãos paradigmas, como se
pode observar, entre outros, do proferido no REsp n. 5.679-SP, desta Quinta
Turma, relator o Ministro Cid Flaquer Scartezzini, assim ementado:
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Criminal. Roubo. Arma de brinquedo. Art.157, parágrafo 2º, I, do CP.
- Na intimidação, feita com arma de brinquedo, para a prática do crime de roubo, justifi ca-se o aumento da pena a que se refere o art. 157, parágrafo 2º, I, do CP, quando o meio usado é bastante para tolher a capacidade de resistência da vítima, que desconhecia a inefi cácia do objeto. (DJ 18.03.1991).
Demonstrada a divergência, conheço do recurso.
A hipótese dos autos diz respeito à conhecida discussão sobre se a arma de brinquedo, considerada por uma fi cção “grave ameaça” para a caracterização dos crimes de roubo e de extorsão, pode numa segunda etapa, com infração da proibição do bis in idem, ressurgir para qualifi car o roubo ou a extorsão pelo emprego da arma (arts. 157, § 2º, inciso I, e 158, § 1º, do CP).
Sobre o tema, tenho fi cado vencido, na Turma, conforme voto que proferi no acórdão referido, in verbis:
Sr. Presidente, lamento ter que discordar dos votos que me precederam.
A subtração de coisa alheia é crime de furto, previsto no art. 155. Quando essa subtração é feita mediante “grave ameaça”, o furto se transforma em roubo, com pena bastante agravada. A jurisprudência e a doutrina, tomando as considerações que foram feitas pelos eminentes Relator e Ministro Costa Lima, estendeu-as ao crime de roubo com emprego de arma de brinquedo, por considerar que a arma de brinquedo, devido a sua aparência, tem aptidão para fazer com que a vítima suponha estar realmente sob grave ameaça. A jurisprudência, portanto, passou a admitir o crime de roubo nesta fi cção - emprego de arma de brinquedo -, quando, na verdade, o que ocorre é uma hipótese de furto mediante fraude. Entretanto, essa tolerância tem uma justifi cação lógica: a arma de brinquedo pode verdadeiramente criar ameaça subjetiva no espírito do sujeito passivo do crime.
Todavia, um segundo passo foi dado aqui, baseado em grave equívoco, segundo penso: supor que a arma de brinquedo possa, numa segunda etapa, ser considerada espécie de “arma” para qualifi car o roubo. Note-se que, no art. 157, o legislador fala em “grave ameaça”, podendo esta ser feita por um objeto de fantasia ou até verbalmente; mas, no § 2º, o legislador já não fala em “grave ameaça” e sim em “emprego de arma”.
Para que possamos entender que arma de plástico, destinada a brinquedos infantis, seja “arma”, teremos que recorrer à analogia in malam partem, que, como se sabe, não é permitida em Direito Penal. Analogia é o raciocínio que vai do semelhante para o semelhante: tomo como ponto de partida uma hipótese regulada expressamente na lei e aplico a mesma solução a uma outra hipótese semelhante não prevista em lei, baseado no raciocínio segundo o qual o que é bom para a primeira também é bom para a segunda.
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O que é bom para a arma de verdade, sêlo-ia para a de brinquedo...
Ora, as imitações de plástico de revólver e outras, que as crianças usam para brincar, não podem ser consideradas “arma”, porque arma é instrumento de ataque, com aptidão para causar, no mínimo, lesões à integridade física, o que não ocorre com aquelas imitações.
O Sr. Ministro Costa Lima (Aparte): Hoje, há revólveres de brinquedo com espoleta que explode, expelindo, inclusive, bala e causando temor.
O Sr. Ministro Assis Toledo: Se o revólver tem espoleta e explode, expelindo uma bala que pode causar lesões, esse revólver é arma, não brinquedo.
Não é esse o caso dos autos.
O que está ocorrendo aqui é um bis in idem sobre uma fantasia. A primeira, justificada, porque há aparente grave ameaça. A segunda, não, porque o legislador, no § 2º, exige “arma” e qualquer coisa que não seja arma, só por analogia poderá encaixar-se no conceito de arma.
Pelas razões expostas, data maxima venia dos eminentes Colegas que pensam em sentido contrário, conheço do recurso, por estar demonstrada a divergência, mas lhe nego provimento.
É o meu voto.
Também a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal vem,
recentemente, se posicionando no sentido de que o emprego da arma de
brinquedo não pode ser considerado como causa de aumento prevista no inciso
I do § 2º do art. 157 do Código Penal. Confi ram-se, a respeito, as seguintes
ementas:
Roubo. Causa de aumento. Emprego de arma imprópria ao disparo. Insubsistência. Constatado, mediante exame pericial da arma utilizada no roubo, a impossibilidade de produzir disparos, descabe a observância da causa de aumento do inciso I do § 2º do artigo 157 do Código Penal. O quadro é semelhante àquele revelado pelo emprego de arma de brinquedo, valendo notar que não se pode colocar na vala comum situações concretas em que a potencialidade do risco tem gradação diversa. A hipótese está compreendida pelo caput do citado artigo, no que cogita da grave ameaça, isto considerada a óptica, da vítima, decorrente das aparências.
(HC n. 70.534-1, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ 1º.10.1993).
Roubo. Utilização de arma imprópria ao uso. Efeitos. A utilização de arma imprópria ao disparo ou de brinquedo não descaracteriza o tipo do artigo 157, caput, do Código Penal. Conforme precedente desta Corte - Habeas-Corpus n.
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70.534-1, por mim relatado, cujo acórdão foi publicado no Diário da Justiça de 10 de outubro de 1993 - apenas afasta a causa de aumento inserta no inciso I, § 2º do artigo 157 daquele Diploma. Existência, no caso, da grave ameaça, muito embora sob a óptica da aparência, a evidenciar a violência à pessoa.
(HC n. 71.051-4, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ 23.09.1994.
Ante o exposto, conheço do recurso, mas nego-lhe provimento.
É o voto.
VOTO
O Sr. Ministro José Dantas: Senhor Presidente, com a devida vênia de V.
Exª, mantenho o meu entendimento pronunciado anteriormente, no sentido de
que a arma de brinquedo produz na vítima o mesmo malefício como se fosse a
arma verdadeira.
Desse modo, juntarei, oportunamente, xerocópia do voto que aqui proferi
sobre o tema (REsp n. 5.679).
É bem verdade que V. Exª agora lembra recente precedente da Segunda
Turma do Supremo Tribunal Federal, modificando a sua tradicional
jurisprudência. Aguardo, porém, que o Plenário daquele Egrégio Tribunal ou
a sua Primeira Turma também venham a adotar esse entendimento, para então
me render à nova jurisprudência.
Com essas considerações, dou provimento ao recurso para restabelecer a
sentença de Primeiro Grau.
ANEXO
RECURSO ESPECIAL N. 5.679-SP
VOTO
O Sr. Ministro José Dantas: Não obstante a boa lógica dos argumentos
do Sr. Ministro Assis Toledo, prefi ro o apoio que o Sr. Ministro-Relator deu à
tranqüila jurisprudência dos Tribunais, reiterada nos cinqüenta anos de aplicação
prática do Código Penal.
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Ousaria argumentar contra a tese de S. Exª que, se há bis in idem no
concurso da grave ameaça com a qualifi cadora do uso de arma de brinquedo,
segundo a construção jurisprudencial, tal bis in idem estaria na própria lei, que
a seu tempo qualifi ca o roubo pelo uso de “arma” ofensiva sem consideração a
que já seja “grave a ameaça”, segundo a tipifi cação do caput do mesmo art. 157
do Cód. Penal; donde a objeção não me parecer procedente, com a devida vênia.
Portanto, peço permissão a S. Exª para acompanhar o Sr. Ministro-Relator.
VOTO-VOGAL
O Sr. Ministro Flaquer Scartezzini: Sr. Presidente, data venia de V. Exª,
mantenho o meu ponto de vista, no mesmo sentido do expressado pelo Sr.
Ministro José Dantas, reservando-me a possibilidade de revisão, no momento
em que o Supremo Tribunal Federal manifestar-se a respeito no seu Plenário.
É como voto.
VOTO
O Sr. Ministro Jesus Costa Lima: Senhor Presidente, atento à
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal expresso apenas por uma de suas
turmas, vou persistir no meu entendimento.