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ACESSOS VASCULARES Taxa de Recirculação - Implicação prática da sua avaliação Autor: Arminda Tavares Co-Autores: Paula Vareda ; Romeu Outeiro Enfermeiros no Serviço de Diálise do Centro Hospitalar de Coimbra – EPE Palavras – chave: Acessos Vasculares; Monitorização; Taxa de recirculação; Enfermagem 0 - INTRODUÇÃO A avaliação/monitorização constante do acesso vascular do Insuficiente Renal em hemodiálise assume considerável importância na prevenção e detecção de problemas tais como tromboses, estenoses, débito insuficiente, com o objectivo de os solucionar mais precocemente diminuindo assim as taxas de internamento por problemas de acesso. Na monitorização dos acessos vasculares são recomendados vários métodos, entre os quais a taxa de recirculação do acesso que, quando elevada, pode diminuir a eficácia de diálise. A recirculação do acesso ocorre quando o sangue dialisado entra novamente no circuito extracorpóreo em vez de entrar na circulação sistémica. O acesso vascular no insuficiente renal deve ser um acesso funcional e deve permitir débitos de sangue suficientes para o circuito de hemodiálise. Um acesso disfuncional diminui a adequação da diálise, aumentando a morbilidade e mortalidade do doente. Existem vários métodos de avaliação da taxa de recirculação, entre os quais o módulo do BTM (blood temperature monitor) dos monitores FRESENIUS 4008H, que consiste em medir a temperatura sanguínea do circuito

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ACESSOS VASCULARES

Taxa de Recirculação - Implicação prática da sua avaliação

Autor: Arminda Tavares Co-Autores: Paula Vareda ; Romeu Outeiro

Enfermeiros no Serviço de Diálise do Centro Hospitalar de Coimbra – EPE

Palavras – chave: Acessos Vasculares; Monitorização; Taxa de recirculação;

Enfermagem

0 - INTRODUÇÃO

A avaliação/monitorização constante do acesso vascular do Insuficiente Renal em

hemodiálise assume considerável importância na prevenção e detecção de problemas

tais como tromboses, estenoses, débito insuficiente, com o objectivo de os solucionar

mais precocemente diminuindo assim as taxas de internamento por problemas de

acesso. Na monitorização dos acessos vasculares são recomendados vários métodos,

entre os quais a taxa de recirculação do acesso que, quando elevada, pode diminuir a

eficácia de diálise. A recirculação do acesso ocorre quando o sangue dialisado entra

novamente no circuito extracorpóreo em vez de entrar na circulação sistémica. O

acesso vascular no insuficiente renal deve ser um acesso funcional e deve permitir

débitos de sangue suficientes para o circuito de hemodiálise. Um acesso disfuncional

diminui a adequação da diálise, aumentando a morbilidade e mortalidade do doente.

Existem vários métodos de avaliação da taxa de recirculação, entre os quais o módulo

do BTM (blood temperature monitor) dos monitores FRESENIUS 4008H, que consiste

em medir a temperatura sanguínea do circuito extracorpóreo, monitorizando o acesso

através da medida de recirculação pela técnica de termodiluíção. Com base nas

recomendações internacionais que preconizam uma vigilância e monitorização

constante do acesso vascular, orientámos o nosso estudo para atingir os seguintes

objectivos:

- Monitorizar o tipo de acesso vascular através do cálculo da taxa de recirculação;

- Avaliar a importância das velocidades de bomba efectivas na taxa de recirculação;

- Implementar a monitorização e avaliação do acesso vascular nos doentes em

ambulatório na unidade de diálise do Centro Hospitalar de Coimbra-EPE;

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1 - ACESSOS VASCULARES PARA HEMODIÁLISE

Com a criação de dialisadores, surgiu o interesse em desenvolver acessos venosos que

permitissem fluxos sanguíneos para uma eficiente hemodiálise. Em 1960 Quinton

apresentou um shunt artério-venoso durável e eficaz que revolucionou o tratamento dos

insuficientes renais crónicos. Cimino-Brescia em 1966 desenvolveu a fístula artério-

venosa. Actualmente os acessos venosos usados para a realização de hemodiálise são

a Fistula artério-venosa, a prótese artério-venosa e os Cateteres venosos centrais.

O sucesso da hemodiálise depende muito de um adequado fluxo de sangue através do

dialisador. Sem um acesso vascular funcional a morbilidade e mortalidade dos doentes

aumenta.

1.1 – Fistula artério-venosa

É o acesso vascular permanente mais seguro e mais duradouro para a diálise, devido a

barreira que impede as bactérias de entrar na circulação sanguínea, a pele. É o acesso

mais recomendado para o tratamento dialítico. Envolve uma ligação directa entre uma

artéria e uma veia do doente, para que a veia fique com um fluxo sanguíneo muito

aumentado, sujeita portanto a uma maior pressão que leva à sua dilatação e

espessamento (arterialização da veia). Como complicações das fístulas arterio-venosas

temos:

Infecção

Trombose

Isquémia – síndrome de “roubo vascular”

Aneurisma

Hemorragia

Hipertensão venosa

Fluxo sanguíneo inadequado

Para prevenir complicações os enfermeiros de diálise devem ser correctamente

formados com o objectivo de manter alguns cuidados durante a utilização do acesso

vascular, cuidados no manuseamento e na punção da FAV.

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1.2 – Próteses vasculares

Em situações em que não é possível criar uma FAV, devido ao facto de as veias serem

de baixo calibre, ou em situações vasculares inexistentes associadas à idade ou a

patologias, recorre-se à implantação subcutânea de um tubo sintético que faz ligação

de uma artéria a uma veia (anastomose cirúrgica).

O sangue percorre a prótese, que pode ser de material sintético,

PTFE(politetrafluoroetileno), Teflon ou biológico (bovino; humano). Pode ser

configurada numa linha recta, mas o mais frequente é a implantação em ansa, pois

proporciona maior área de superfície para punção.

A primeira utilização da prótese pode durar 4 semanas, embora em alguns casos possa

ser utilizada a partir da segunda semana. Proporcionam elevadas velocidades de fluxo

e normalmente uma área de punção extensa. No entanto está sujeita a mais

complicações em relação à FAV, tais como:

Estenose

Trombose

Aneurisma

Infecções

Deterioração do material (devido ás constantes punções ou má utilização)

Do mesmo modo que as FAV, as próteses vasculares requerem uma cuidada e

especializada manutenção, a sua utilização deve ser realizada por enfermeiros

experientes na área da diálise.

1.3 – Acessos Vasculares Centrais

Dispositivo sintético que é inserido numa veia de grande calibre localizada

centralmente. A sua importância é focada principalmente para situações de urgência,

mas também é muito utilizado em situações provisórias (maturação de FAV) ou em

doentes com má circulação periférica.

a)Tipos de CVC

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- Provisório: Têm duração máxima de 3 semanas e são utilizados para situações

transitórias

- Longa duração: Podem ser utilizados durante anos e são alternativas às fístulas

artério-venosa e próteses em doentes com problemas vasculares que impossibilitem a

construção de FAV ou PTFE. Apresentam um cuff que cria um ponto de fixação que

serve de apoio e de barreira á infecção ao nível do túnel. Os cateteres venosos centrais

são os acessos vasculares que requerem mais cuidados, devido ás suas complicações

tais como:

Infecção

Coagulação/trombose

Fluxo insuficiente

Estenose/recirculação

Restrição da actividade do doente.

Obstrução

Existe no entanto algumas vantagens no uso dos cateteres venosos centrais,

Rápido e de fácil colocação

Usado imediatamente.

Não requer utilização de agulhas.

Alternativas a doentes sem vasos periféricos.

b)Locais dos CVC

- Veia jugular interna:

Este local é escolhido devido a ser um vaso quase recto e menos complicado de

encontrar (lado direito), o que permite uma técnica de inserção mais simples.

- Veia subclávia

É um local bastante confortável para o doente, em relação aos outros e de fácil

colocação devido ao calibre do vaso. No entanto tem grande incidência de estenoses o

que pode provocar limitações em termos de futuras colocações de cateteres tanto na

subclávia e na jugular.

- Veia femoral

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O local ideal para colocação do cateter irá depender do doente; se tem mobilidade;

patologias associadas; o tratamento ser a curto prazo ou a longo prazo e o débito

necessário. Os CVC requerem cuidados especializados que previnam o risco de

infecção, logo devem ser manuseados e cuidados por enfermeiros de diálise.

2 – VIGILÂNCIA E MONITORIZAÇÃO

A eficácia do tratamento de hemodiálise, contribuindo para um aumento da qualidade

de vida do doente insuficiente renal, depende da prescrição de diálise (tempo de

tratamento, dialisador, fluxo de dialisante e débito de sangue). O débito de sangue para

o tratamento de diálise provém do acesso vascular do doente e da sua adequada

utilização. O aumento de número de doentes com patologia renal associado a co-

morbilidades tais como patologia cardiovascular e diabetes influenciam, desde o início,

a construção do acesso vascular no doente. Acompanhando a evolução tecnológica

existente na área da nefrologia nos cuidados aos doentes renais, a criação de

orientações permite que os profissionais direccionem melhor os seus cuidados,

nomeadamente na vigilância dos acessos vasculares. Segundo as Kidney Disease

Outcome Quality Iniciative (K/DOQI) 2006 recomendam que os doentes diagnosticados

com Insuficiência renal de estádio 5 sejam referenciados pelo nefrologista para criar um

acesso vascular e esse acesso vascular, após o início do tratamento de hemodiálise,

deve ser regularmente monitorizado e mantido em vigilância por uma equipa de

profissionais experientes de modo a prevenir complicações responsáveis pelos

múltiplos internamentos dos doentes nas unidades de saúde.

Usa-se apenas temporariamente

(alguns dias), devido ao risco de

infecção ser elevado e às

limitações provocadas ao doente.

É de fácil colocação normalmente

e tem menos risco de

complicações associadas á

inserção no local.

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A estenose no acesso vascular é das principais complicações e é o prenúncio de

trombose do próprio acesso. A estenose reduz o débito de sangue do acesso podendo

conduzir a uma diálise inadequada. Assim é recomendado pela comunidade

internacional e descrito nas próprias guidelines europeias e americanas a monitorização

periódica do acesso vascular. Existem várias técnicas de monitorização, desde a

avaliação física do acesso (presença de sopro e frémito, presença de sinais de

infecção, presença de aneurismas, presença de hematoma), avaliação da pressão

venosa do acesso, a taxa de recirculação, doppler de avaliação do fluxo e outras que

ajudam na detecção de um acesso vascular disfuncional.

Elevadas taxas de recirculação podem indicar a presença de estenoses, um sinal para

que o acesso seja revisto e reparado. Uma avaliação periódica do acesso permite a

identificação precoce de problemas, que atempadamente podem ser solucionados,

contribuindo para a sua sobrevida. Os profissionais de saúde, nomeadamente os

enfermeiros de nefrologia/diálise, assumem particular importância porque deles

depende o ensino do doente durante o período pré-diálise. Posteriormente nas clínicas

de hemodiálise ou unidades hospitalares é da responsabilidade dos enfermeiros de

diálise vigiarem e detectarem problemas no acesso vascular.

Antes de qualquer utilização do acesso, ele deve ser avaliado em relação á sua

funcionalidade, a presença de frémito e sopro, é importante despistar sinais de

estenose ou mesmo trombose do acesso. Durante a sessão de hemodiálise importa

vigiar o débito efectivo do acesso, as suas pressões arteriais e venosas. No caso das

fístulas artério-venosa, devem ser capazes de apresentar um fluxo intraacesso superior

a 450ml/min permitindo velocidades de bomba acima dos 350ml/min, manter pressões

arteriais acima dos -200mm/Hg e as pressões venosas não devem exceder os

300mm/Hg. A presença de estenoses a nível da anastomose ou no trajecto do

desenvolvimento da fístula provoca alterações a nível dos parâmetros, os quais devem

ser registados e referenciados.

Tal como as FAV as próteses vasculares devem ser avaliadas antes do início do

tratamento, a presença de frémito e sopro é fundamental para que a quantidade de

diálise administrada seja a adequada. As próteses vasculares, devem apresentar fluxo

de sangue intraacesso superiores a 600ml/min, permitindo velocidades de bomba

Page 7: taxa de recirculação em acessos vasculares

acima dos 350ml/min. A trombose é a principal causa de falência das próteses

vasculares. Uma incorrecta utilização do acesso, bem como a alteração do débito ou

das pressões arteriais e venosas podem ser o sinal precoce de trombose do acesso. As

pressões arteriais deve ser mantidas acima dos -200mm/hg para prevenir hemólise e as

pressões venosas não dever exceder os 300mm/Hg. A avaliação do frémito e do sopro

deve ser realizada em cada sessão de hemodiálise e deve acompanhar todo o trajecto

da prótese vascular.

Os cateteres venosos centrais dependendo do seu tipo e da sua inserção, devem

permitir uma velocidade de bomba adequada para o tratamento de hemodiálise de 300

a 350ml/min. A principal causa de disfunção nos cateteres venosos centrais é a

dificuldade de débito ou débito insuficiente, seja por mau posicionamento do cateter ou

por depósito de fibrina na ponta do cateter. A vigilância de exsudado, sinais

inflamatórios, ou de cuff exteriorizado no caso dos CVC tunelizados são sinais

importantes na prevenção de complicações evitando posteriormente o internamento do

doente. Outro factor importante que pode afectar a eficácia de diálise quando o

paciente tem como acesso vascular um cateter venoso central, é a inversão dos lúmens

para fornecer melhor débito de sangue. A inversão dos lúmens provoca um aumento da

recirculação do acesso, pelo que deve ser evitado, e o acesso deve ser referenciado

para ser revisto.

2.1. - TAXA DE RECIRCULAÇÃO

A taxa de recirculação no acesso vascular pode ser influenciada por vários factores: a

estenose da veia, como débito arterial insuficiente, ramos invertidos nos cateteres

venosos centrais, as agulhas de diálise colocadas demasiado próximas. O cálculo da

recirculação de um acesso pode ser efectuado por vários métodos. Segundo a literatura

os métodos mais utilizados são, a técnica das duas agulhas baseada no cálculo da taxa

de ureia no sangue, e as técnicas não baseadas no cálculo da taxa de ureia, na qual a

taxa de recirculação poderá ser calculada por técnicas de termodiluíção ou pelo método

de diluição. As guidelines de 2006 (K/DOQI) recomendam que na avaliação a

recirculação de um acesso deve-se preferencialmente utilizar métodos não baseados

no cálculo da taxa de ureia o que requer equipamento próprio. De acordo com

Daugirdas et al (2007) taxa de recirculação que exceda os 10% usando o método das

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duas agulhas no calculo da taxa de ureia, 5% usando método de diluição ou 15% pelo

método de termodiluíção significa que o acesso vascular deve ser investigado e

reparado.

Um dos pressupostos da realização deste trabalho tem igualmente por base

estabelecer uma relação entre a taxa de recirculação e o débito efectivo de sangue

caracterizado pelo débito de bomba das máquinas de diálise. Está demonstrado que a

velocidade de bomba é um factor importante no cumprimento da prescrição de diálise

de modo a que o tratamento de diálise seja eficaz. Num acesso em recirculação, a

velocidade de bomba é um factor que igualmente deve ser vigiado e monitorizado.

O estudo desenvolvido avaliou o calculo da taxa de recirculação pelo método de

termodiluíção validado por Schneditz D. et al., um dispositivo electrónico inserido nas

maquinas de hemodiálise FRESENIUS 4008H, chamado BTM( Blood Temperature

Monitor).

3 – METODOLOGIA

3.1. - Questão de investigação

Qual a Taxa de recirculação nos vários tipos de acessos vasculares a diferentes débitos

efectivos de sangue e qual a sua influência na redução da taxa de ureia nos doentes

que realizaram tratamento de hemodiálise no período de Julho de 2008 a Janeiro de

2009 no serviço de Diálise no Centro Hospitalar de Coimbra?

3.2 – Tipo de Estudo

O nosso estudo apresenta-se como um estudo descritivo-correlacional, essencialmente

exploratório, quantitativo.

3.3 – Definição da amostra/variáveis em estudo

A nossa amostra foi retirada da população alvo que são todos os doentes insuficientes

renais em hemodiálise da área de abrangência do CHC, logo trata-se de uma amostra

aleatória não probabilística. No nosso estudo, e sendo uma unidade hospitalar que

recebe doentes com patologias crónicas e agudas definimos como critérios de inclusão,

permanência em diálise há mais de 3 meses, com a seguinte prescrição dialítica: 4h de

tratamento, com filtro Poliflux 21L Gambro®, com fluxo de dialisante a 500ml/min,

débito de sangue 350mil/min efectivos; agulhas de diálise 16G, no monitor Fresenius

4008H com o módulo BTM. A nossa amostra é constituída por 60 doentes Insuficientes

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renais crónicos que realizaram Hemodiálise na unidade hospitalar do Centro Hospitalar

de Coimbra no período de Julho de 2008 a Janeiro de 2009.

A definição das variáveis do estudo teve em linha de conta os objectivos inicialmente

traçados. Na caracterização da amostra definimos como variáveis de atributo o género,

idade, etiologia da IR, motivo de internamento, anos em HD, nº total de acessos

vasculares, acesso vascular actual. Na realização do estudo estabelecemos duas

variáveis dependentes a taxa de recirculação e a taxa de redução de ureia, como

variáveis independentes manipulámos no nosso estudo os diferentes débitos de bomba

definindo para a taxa de recirculação três variáveis independentes, taxa de recirculação

com débitos de bomba efectivos de 200ml/min, taxa de recirculação com débitos de

bomba efectivos de 300ml/min, taxa de recirculação com débitos de bomba efectivos de

350ml/min. Estudámos de igual modo a variável pressão arterial (PA) nos diferentes

débitos de sangue. A variável dependente taxa de redução de ureia, teve como

variáveis independentes a ureia pré e a ureia pós tratamento de hemodiálise.

3.4 – Recolha de Dados

No nosso estudo, não havendo nenhum instrumento em Portugal, validado na colheita

de dados, para a monitorização de acessos vasculares, construímos um instrumento de

recolha de dados que nos permitiu obter o maior número de dados relevantes para a

caracterização da nossa amostra. Na recolha dos dados, todos os doentes foram

informados e deram o seu consentimento para pertencerem ao estudo. A recolha de

dados procedeu-se durante a sessão de hemodiálise. Ao doente que satisfazia os

critérios de inclusão no estudo, inicialmente era colhida uma análise pré-diálise para o

doseamento da ureia, era iniciado o tratamento de hemodiálise com débito de bomba

prescrito (débito de sangue = 350ml/min efectivos), ao fim da 1ª hora de tratamento o

débito de sangue era diminuído para 200ml/min e era calculada a 1ª taxa de

recirculação, após o cálculo, o débito de sangue era novamente colocado a 350ml/min,

ao fim da 2ª hora de tratamento diminuía-se para 300ml/min, procedia-se a novo

cálculo, e ao fim da 3ª hora o calculo da taxa de recirculação era efectuada com o

débito de sangue a 350ml/min efectivos. Após diálise fazia-se nova colheita de sangue

pós-diálise para o doseamento da ureia. Não foram excluídos do estudo os acessos

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vasculares que não atingiram débitos efectivos de 350ml/min, por sua vez foram

definidos no estudo como acessos disfuncionais.

3.5 – Limitações do Estudo

O estudo desenvolvido apresenta limitações, pelo que os resultados apenas podem ser

aplicados á amostra. Tratando-se de uma unidade hospitalar o número de doentes para

a inclusão no estudo mostrou-se reduzido, visto que muitos dos doentes não

satisfaziam os critérios de inclusão. Também foi considerada uma limitação do estudo o

facto de a taxa de redução de ureia poder estar modificada pelo motivo de durante o

tratamento ter-se variado apenas que por minutos os débitos efectivos de bomba para o

cálculo da taxa de recirculação.

3.6 – Métodos estatísticos utilizados

Na análise estatística foi utilizado o programa, SPSS 12.0, para a estatística descritiva.

Para a estatística inferencial foi utilizado o teste de t-student, o coeficiente de

correlação de pearson.

Foi utilizada a fórmula URR= (Ureia inicial – Ureia final)/Ureia inicial x100 para o cálculo

da taxa de redução de ureia (URR), citada por Daugirdas(2007).

4 - APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

4.1 – Estatística Descritiva

Os seguintes resultados caracterizam a nossa amostra em relação à idade, género,

etiologia da Insuficiência Renal, motivo de internamento. Consideramos estas variáveis

úteis para descrever as principais características demográficas dos doentes que

realizam diálise na nossa unidade hospitalar.

Tabela nº 1 – Caracterização da amostra (n=60)

Classes Frequência (N) Média/Moda Desvio-padrão

Idade

Até 40 anos 9

ẋ 62,57 sd± 16,285

40 a 50 anos 5

50 a 60 anos 10

60 a 70 anos 14

Mais de 70 anos 22

Género Masculino 40

Feminino 20

Etiologia da IRC

Nefropatia Diabética 16

HTA 13

Outras 31

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Motivo de

Internamento

Falência de acesso 10

Infecção do acesso 11

Outras 39

A tabela descreve-nos que a nossa amostra é composta maioritariamente pelo sexo

masculino, com mais de 60 anos de idade, com uma média de 62,57 anos de idade e

um desvio padrão de 16,285. Como etiologia da Insuficiência renal a nefropatia

diabética na amostra é a segunda maior causa com 16 casos. É importante referir que

21 dos 60 internamentos foram motivados por problemas de acesso vascular.

Considerámos igualmente relevante o conhecimento do acesso actual e o nº de

acessos e os anos em hemodiálise.

Tabela nº 2 – Caracterização da amostra (n=60) segundo o nº de acessos, anos em diálise e acesso

actual

Classes Frequência (N) Média/Moda Desvio-

padrão

Nº de acessos 0 a 2 acessos 29

ẋ 3,06 sd± 1,812 a 4 acessos 12

Mais de 4 acessos 19

Anos em

Hemodiálise

0 a 2 anos 35

ẋ 2,6 sd± 2,862 a 4 anos 10

Mais de 4 anos 15

Acesso Actual

FAV 29

PTFE 4

CVC Jugular 13

CVC Femural 14

Os nossos doentes faziam HD, em média, há 2,6 anos e tiveram uma média de 3,06

acessos por doente, num total de 157 acessos em 60 doentes. O acesso mais

prevalente foi a FAV e o menor a PTFE. Os cateteres distribuíram-se de forma uniforme

pela veia femural e veia jugular interna.

Tabela nº 3 – Caracterização das taxas de recirculação por Débito de sangue

Nº Media Mediana Mínimo Máximo Desv.pad

TxREC

200ml/min

60 11,22 7,9 1,8 58,2 9,7

TxREC

300ml/min

59 14,49 10,1 4,3 61,7 11,7

Tx REC

350ml/min

54 15,16 12,1 - 5,8 46,9 10,23

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A taxa de recirculação varia com o aumento do débito efectivo de sangue,

acompanhando o seu aumento. Seis acessos vasculares não atingiram a velocidade

efectiva de 350ml/min e 1 não atingiu a velocidade efectiva de 300ml/min.

Tabela nº 4 – Variação das Pressões Arteriais por Débito de sangue

Nº Media Mediana Mínimo Máximo Desv.pad

PA

200ml/min

60 -122.33 -100 -220 -60 39,15

PA

300ml/min

59 -165.085 -160 -290 -80 41,49

PA

350ml/min

54 - 197.593 -200 -280 -100 41,97

A monitorização da PA descreve a resistência da passagem do sangue pela linha

arterial e é monitorizada pelo transdutor do monitor. Se a PA for demasiado baixa

(superior a -200mm/Hg) há o risco de hemólise, bem como pode ser também sinal de

estenose a nível da veia nativa do acesso vascular no caso de FAV ou Próteses

vasculares. Há um aumento da pressão arterial, que acompanha o aumento da

velocidade efectiva; na nossa amostra a media situou-se nos -197.6mm/Hg a uma

velocidade efectiva de 350ml/min.

Tabela nº 5 – Estatística descritiva da variável Taxa de Redução de Ureia (URR)

Nº Media Mediana Mínimo Máximo Desv.pad

URR 60 70,63 71,97 46,0 90,4 9,656

A taxa de redução de ureia serve-nos para medir a eficácia de diálise, a nossa amostra

apresentou uma URR media de 70,63%.

Tabela nº 6 – Caracterização da amostra (N=60) segundo a função do acesso

versus taxa redução de ureia (URR)

N URR

Acesso Funcional 48 71,31%

Acesso Disfuncional 12 67,91%

A vigilância e monitorização dos acessos ajuda-nos a reconhecer quais os acessos

funcionais dos disfuncionais, considerámos acessos disfuncionais aqueles que

apresentavam aneurismas nas FAV superiores a 5 cm, necessidade de inverter os

Page 13: taxa de recirculação em acessos vasculares

lúmens nos CVC, e dificuldade de débito. Os acessos disfuncionais apresentam uma

URR inferior.

Tabela nº 7 – Média Taxa de recirculação por acesso Vascular

TxREC 200ml/min TxREC

300ml/min

TxREC

350ml/min

N

FAV 7% 11% 13% 29

PTFE 7% 8% 9% 4

CVC JUG 7% 8% 10% 13

CVC FEM 24% 29% 28% 12

Total 60

A tabela mostra-nos o comportamento da taxa de recirculação nos diferentes acessos

vasculares. Os CVC femurais apresentaram uma taxa de recirculação

significativamente superior, média de 24% a apenas 200ml/min efectivos.

Perante os resultados os acessos vasculares na femural devem ser utilizados apenas

como último recurso e deve ser avaliado caso a caso, na utilização deste acesso como

acesso de longa duração para os doentes que necessitem de tratamento regular de

hemodiálise.

Gráfico nº 1 – Taxa de recirculação no Acesso Vascular versus Débito efectivo de

sangue

13%

9% 10%

28%

0%

5%

10%

15%

20%

25%

30%

Taxa de Recirculação

FAV PTFE CVC JUG CVC FEM

Acesso Vascular

TxREC Vs Qblood

QB200ml/min

QB300ml/min

QB350ml/min

Pela observação do gráfico, podemos verificar que os acessos vasculares FAV, PTFE,

e CVC na jugular não tem uma taxa de recirculação elevada, sendo que as PTFE são

os acessos que menos recirculam. Por sua vez os CVC na femural são o tipo de acesso

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com taxa de recirculação mais elevada, excedendo os 15% a um débito efectivo de

sangue de 200ml/min.

4.2 – Estatística Inferencial

A análise dos dados através da estatística inferencial permite-nos estabelecer relações

entre as variáveis. No nosso estudo utilizamos os testes de t-student e correlação de

pearson para melhor compreender a relação entre as variáveis.

Tabela nº 8 – Taxa de recirculação versus Débito de sangue

t-student para amostras independentes

Teste p

TxREC 200ml/min

Versus

TxREC 350ml/min t-student 0,0371*

p<0,05

De acordo com a tabela existe uma relação significativa entre a taxa de recirculação e o

débito efectivo de sangue. Foi utilizado o mesmo teste na demonstração da existência

de relação estatística entre as pressões arteriais e o débito de sangue, de acordo com

os resultados existe significância estatística (p<0,05) entre a PA e o débito de sangue,

logo, o aumento da velocidade de bomba aumenta as pressões arteriais dos acessos

vasculares.

Gráfico nº 2 – Nº de Acessos vasculares por etiologia da IRC

Etiologia da IRC por nº total de acessos

52

33

62

0

10

20

30

40

50

60

70

nefropatia diabética HTA Outras

Etiologia da IRC

Nº nº

nº de acessos

O gráfico representa o nº de acessos vasculares totais por etiologia da IRC, podemos

verificar que os doentes portadores de nefropatia diabética são os que mais acessos

vasculares constroem por número de doentes.

Page 15: taxa de recirculação em acessos vasculares

Tabela nº 9 – Taxa de redução de ureia (URR) versus Taxa de Recirculação

Correlação de Pearson

Teste r p

Taxa de Rec 200ml/min

Vs

URR

Correlação de Pearson -.0402607* .001427*

Taxa de Rec 300ml/min

Vs

URR

Correlação de Pearson -.442725* .000446*

Taxa de Rec 350ml/min

Vs

URR

Correlação de Pearson -.336120* .012957*

p<0,05

r = 1(correlação perfeita positiva)

r = 0(duas variáveis não dependem linearmente uma da outra)

r = -1(correlação negativa perfeita)

+/- 0.70 – forte relação

+/-0.3 – 0.70 – moderada correlação

+/- 0 – 0.3 – fraca correlação

A correlação de pearson mede o grau de correlação e a direcção dessa correlação

entre duas variáveis. Os dados da tabela mostra-nos que um aumento da taxa de

recirculação diminui a taxa de redução de ureia, e que existe significado estatístico

entre as variáveis.

Utilizámos a mesma correlação de pearson para verificar a existência de relação entre

as variáveis dependentes, taxa de recirculação e taxa de redução de ureia, com as

variáveis independentes sexo, idade e etiologia da IRC, não encontrando significado

estatístico, logo, a idade, sexo e a etiologia não influenciam a taxa de recirculação, nem

a taxa de redução de ureia.

5 - APLICAÇÃO PRÁTICA

A vigilância e monitorização do acesso vascular permite aos profissionais de saúde

uma adequação da prescrição de diálise ao doente. Durante o desenvolvimento deste

estudo, nos doentes em ambulatório na nossa unidade, os que apresentavam taxa de

recirculação elevada, a prescrição de diálise foi alterada até à reparação do acesso.

Nos dois casos foi aumentado o tempo de diálise e diminuído o débito de sangue até ao

permitido. Dando continuidade ao projecto de formação em serviço, a realização deste

estudo vai permitir a realização e a implementação em serviço da vigilância e

Page 16: taxa de recirculação em acessos vasculares

monitorização periódica dos acessos vasculares dos doentes em ambulatório na

unidade de diálise.

6 – CONCLUSÃO

A vigilância e monitorização do acesso vascular permite que se detectem problemas

precocemente evitando assim internamentos desnecessários. A função do enfermeiro

de diálise passa por conhecer quais os principais cuidados a ter com um acesso

vascular, e quais os seus sinais de disfunção. Um registo periódico é fundamental para

a sobrevida do acesso e para a melhoria da qualidade de vida do doente em

hemodiálise. A realização deste estudo permitiu-nos aprofundar conhecimentos sobre

os cuidados a ter com os diferentes acessos vasculares desde a sua criação á sua

manutenção e utilização. Durante a recolha de dados permitiu que toda a equipa de

enfermagem ficasse desperta para os sinais a monitorizar no acesso, bem como no

cálculo da taxa de recirculação. A realização destes pequenos estudos permitem que

os profissionais de saúde conheçam melhor a população que cuidam, quais são os

seus problemas e, em equipa, discutir resultados e implementar medidas para melhorar

os cuidados a prestar ao doente em hemodiálise.

A realização do protocolo de procedimentos de Enfermagem direccionado para a

monitorização e vigilância do acesso vascular na unidade de diálise do CHC, está

inserido no âmbito do projecto de formação em serviço, para uniformizar os cuidados de

modo que estes sejam executados de igual forma por todos os profissionais.

Page 17: taxa de recirculação em acessos vasculares

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