Tecnicas de Sensoriamento Remoto e Geoprocessamento Aplicadas Ao Mapeamento Geologico e Geotecnico...

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  • CAPTULO IV - Metodologia Utilizada

    CAPTULO IV

    METODOLOGIA UTILIZADA

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    IV.1. INTRODUO Face ao tipo de dados existentes, constitudos por linhas ssmicas, sondagens e cores, previamente descritos no captulo precedente, a escolha da metodologia adequada sua anlise recaiu sobre a que melhor permite alcanar os objectivos que regem a execuo deste trabalho, nomeadamente, a correlao tectonostratigrfica entre as Margens Continentais Sul e Sudoeste portuguesas. Assim, a anlise dos dados e posterior integrao da respectiva informao, foi executada em trs etapas metodolgicas distintas, embora inter-relacionadas, cada uma delas caracterizada pela aplicao de um mtodo especfico aos dados existentes. Essas etapas foram as seguintes:

    1 etapa: efectuou-se a anlise de Estratigrafia Ssmica das linhas ssmicas. 2 etapa: procedeu-se calibrao estratigrfica das linhas ssmicas j interpretadas,

    recorrendo a sondagens profundas e a cores de pisto e gravidade. 3 etapa: realizou-se a correlao sismostratigrfica entre as duas margens

    continentais, integrando toda a informao obtida nas duas etapas anteriores. A metodologia utilizada na interpretao dos dados e respectiva integrao da informao fornecida, foi em cada uma destas etapas distinta, e como tal, merece ser alvo de uma descrio e discusso detalhas dos seus fundamentos, conceitos, procedimento metodolgico e problemtica. IV.2. ANLISE DE ESTRATIGRAFIA SSMICA IV.2.1. Fundamentos tericos e conceitos bsicos da Estratigrafia Ssmica Nos anos 70 do sculo XX, R. Mitchum e P. Vail lideraram o grupo da Exxon que revolucionou a abordagem clssica da anlise de bacias ao desenvolver um novo modelo conceptual e uma nova metodologia de interpretao de linhas ssmicas: a Estratigrafia Ssmica. As bases conceptuais deste recente ramo da estratigrafia foram formalizadas por este grupo de autores e publicadas na Memria n 26 da American Associaton of Petroleum Geologists: Seismic stratigraphy: Applications to hydrocarbon exploration (Payton, 1977). Rapidamente, a Estratigrafia Ssmica destacou-se, afirmando-se pelos seus aspectos inovadores:

    trata-se de uma metodologia desenvolvida com base na informao disponibilizada pelas linhas ssmicas de reflexo;

    est focalizada na interpretao da geometria das superfcies sismostratigrficas, privilegiando os tipos de terminaes dessas superfcies e as relaes geomtricas entre elas;

    revelou-se uma ferramenta poderosa na interpretao estratigrfica de linhas ssmicas, permitindo extrair informao geolgica, designadamente, relacionada com variaes eustticas e eventos tectnicos;

    introduzindo um novo corpo de ideias na estratigrafia convencional, baseada at ento na anlise biostratigrfica, litostratigrfica e cronostratigrfica.

    Os fundamentos da Estratigrafia Ssmica assentam nos seguintes pressupostos: a) a sedimentao um processo cclico; b) as reflexes ssmicas primrias so produzidas nos locais onde se verifica um contraste abrupto de impedncia acstica, sendo paralelas a superfcies de estratificao e a discordncias; c) as reflexes tm significado cronostratigrfico.

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    Atendendo a estes pressupostos assumido que as relaes geomtricas entre reflexes traduzem relaes geolgicas entre estratos e discordncias, sendo as reflexes ssmicas geradas nos locais onde se verifica um contraste abrupto de impedncia acstica (grandeza adimensional obtida atravs do produto da velocidade de propagao das ondas ssmicas pela a densidade do meio atravessado). Essas reflexes tendem a ser paralelas s superfcies de estratificao e como tal possuem significado crosnostratigrfico, possibilitando a realizao de correlaes cronostratigrficas (Mitchum et al., 1977a). Existem no entanto, situaes de excepo que, impossibilitam a atribuio deste significado cronostratigrfico a algumas reflexes, referindo-se a ttulo de exemplo, o caso dos bottom simulating reflectors, que correspondem a reflexes reais produzidas nas zonas de contactos com fluidos, em locais onde existem hidratos de metano ou em zonas de mudanas diagenticas, (Emery e Myers, 1996). Salienta-se que, a variao lateral de fcies escala da resoluo ssmica no produz reflexes ssmicas, pois estas variaes so em geral graduais (Fig. IV.1).

    Figura IV.1 Assume-se que as

    reflexes ssmicas so paralelas asuperfcies de estratificao. Oscontrastes de impedncia acsticaso abruptos ao nvel destassuperfcies, mas suaves ao longodos limites entre fcies. (Extradade Emery e Mayers, 1996).

    A Estratigrafia Ssmica trata-se assim, de uma estratigrafia das superfcies, que privilegia as relaes geomtricas entre superfcies, assentando na interpretao dessas relaes, em particular no reconhecimento de conjuntos de estratos limitados por discordncias. A interpretao de linhas ssmicas de reflexo processa-se com base na identificao dos diferentes tipos de relaes geomtricas entre as reflexes, de modo a definir as sequncias ssmicas, os seus limites, e inferir as caractersticas do ambiente deposicional. IV.2.1.1. Conceito de sequncia deposicional e significado cronostratigrfico O conceito de sequncia deposicional como entidade conceptual utilizada na anlise estratigrfica de bacias foi desenvolvida inicialmente por Sloss (1963), com base na observao da existncia de padres repetitivos de carcter sedimentar e erosivo no registo estratigrfico de bacias cratnicas. precisamente esta natureza repetitiva, cclica, dos fenmenos sedimentares e erosivos que fornece o suporte para a anlise e correlao estratigrfica escala regional. Posteriormente, Mitchum et al. (1977a, p. 53) reformularam o conceito de sequncia deposicional, tornando-o no conceito sobre o qual edificaram todo o quadro terico que sustenta a Estratigrafia Ssmica. Assim, segundo a definio destes autores uma sequncia deposicional uma unidade estratigrfica constituda por uma sucesso contnua de estratos, geneticamente relacionados e limitada na base e no topo por discordncias ou pelas suas conformidades correlativas (Fig. IV.2). Este conceito assume ainda como pressuposto que, uma sequncia deposicional tem significado cronostratigrfico, tendo as rochas que a compem sido depositadas durante um determinado intervalo de tempo geolgico, constrangido pelas idades dos respectivos limites da sequncia onde estes correspondem a conformidades (Fig. IV.2). Assim, a parte concordante do limite da sequncia geralmente sncrona. Os autores referidos defendem tambm, que a determinao de

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    uma sequncia deposicional obedece apenas a um nico critrio objectivo: as relaes geomtricas entre os prprios estratos. A sua determinao seria assim, independente de outros critrios mais subjectivos, como sejam o tipo de litologia, o contedo fossilfero, ou os processos de sedimentao. Este conceito de sequncia deposicional tal como foi definido por Mitchum et al. (1977a), tem sido alvo de crticas dirigidas principalmente a dois aspectos (ex. Miall, 1986; Walker, 1990; Miall e Miall, 2001): 1) ao significado do termo geneticamente relacionados, uma vez que no explicito nem especificado pelos autores e 2) assumpo que as discordncias que limitam a sequncia passam lateralmente a conformidades em direco bacia profunda, o que nem sempre se verifica, ou quando tal acontece pode ser aparente, devendo-se unicamente baixa resoluo das linhas ssmicas nas zonas mais profundas.

    Figura IV.2 Esquematizao de uma sequncia deposicional idealizada. Os limites sodefinidos pelas superfcies A e B que passam lateralmente de discordncias a conformidadescorrelativas. (Extrada de Mitchum et al., 1977a).

    A utilizao do conceito de sequncia deposicional como base da anlise estratigrfica continua polmico, e no rene o consenso geral, sendo largamente debatido. Outras propostas tm sido apresentadas, no mbito de outros modelos de anlise estratigrfica, sendo a nfase da discusso colocada na seleco das superfcies que constituem o limite da sequncia (ex. Sloss, 1988; Galloway; 1989; Walker, 1990). IV.2.1.2. Limites de uma sequncia deposicional: conceito e significado de discordncia De acordo com Mitchum et al. (1977a) as discordncias e as suas conformidades correlativas constituem os limites de uma sequncia deposicional, sendo a discordncia o principal critrio fsico usado na determinao do limite da sequncia, pois indica um perodo de eroso ou de no deposio. Estes limites de uma sequncia deposicional tm significado cronostratigrfico, pelo que convm distinguir entre discordncia, hiato e conformidade. Uma discordncia corresponde a uma superfcie de eroso ou de no deposio, que separa estratos recentes de rochas mais antigas e representa uma lacuna temporal significativa. A magnitude dessa lacuna de tempo varia ao longo da bacia sedimentar apresentando valores diferentes consoante o local onde observada. O seu verdadeiro valor deve apenas ser determinado escala da bacia. A Figura IV.3 pretende esquematizar essa situao, idealizando para tal uma bacia sedimentar preenchida por duas sequncias sedimentares distintas A e B, separadas por uma

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    discordncia D. Os vrios estratos que constituem o preenchimento sedimentar desta bacia esto limitados a topo por descontinuidades que materializam linhas de tempo (A1 a A5 e B1 a B3) s quais corresponde um tempo especfico (de T0 a T8). Um hiato corresponde ao intervalo total de tempo geolgico que no representado por estratos numa posio especfica ao longo de uma superfcie estratigrfica (Mitchum et al., 1977a). Pode ser atribudo a eroso, a no deposio, ou a ambas. Idealmente, um hiato medido quantitativamente recorrendo a mtodos radiomtricos ou biostratigrficos. Na prtica, numa avaliao mais rigorosa pode ainda figurar a correlao de fcies (ssmicas ou litolgicas) ou ainda recorrendo a escalas magnticas. Uma conformidade corresponde a uma superfcie que separa estratos recentes de rochas mais antigas, mas ao longo da qual no existem evidncias fsicas de eroso ou no deposio e nenhum hiato significativo reconhecido (Mitchum et al., 1977a). Figura IV.3 - Qual a idade da

    discordncia D? A sua magnitude temporal medida pelo intervalo de tempo total parao qual no h registo sedimentar. A lacunaestratigrfica entre os sedimentos acima eabaixo da discordncia D diferenteconsoante o ponto considerado. Porexemplo, no ponto P a discordncia Dtruncou a linha de tempo A5 da sequnciaA, e a topo coberta pela linha de tempoB1 da sequncia B. Assim, apenas possvel restringir a idade da discordnciaD como sendo ps-A5 e ante-B1.

    A

    B

    A1A2

    A3A4

    A5

    B1

    B2

    B3

    T0

    T1

    T2T3T4T5

    T6

    T7

    T8D

    P

    IV.2.1.3. Definio de sequncia ssmica, unidade ssmica e fcies ssmica Mitchum et al. (1977b) defendem que o mtodo de reflexo ssmica constitui a ferramenta mais eficaz para aplicar o conceito de sequncia deposicional. Tal consiste, na subdiviso de uma seco ssmica em conjuntos de reflexes concordantes, separadas por superfcies de descontinuidade, e na interpretao deste conjunto como uma sequncia deposicional. Estes autores definiram trs novos conceitos aplicveis anlise estratigrfica realizada em seces ssmicas: sequncia ssmica, unidade ssmica e fcies ssmica. Sequncia ssmica: Trata-se de uma sequncia deposicional identificada sobre uma seco ssmica. O principal critrio de reconhecimento de uma sequncia ssmica consiste na identificao do tipo de terminao das reflexes em relao s descontinuidades que limitam a sequncia (Fig. IV.4). Unidade Ssmica: Unidade tridimensional limitada por descontinuidades estratigrficas e composta por um grupo de reflexes cujos parmetros diferem das unidades adjacentes (Fig. IV.4). Fcies Ssmica: Conjunto de parmetros ssmicos (geometria e carcter das reflexes, configurao das reflexes internas e forma externa das unidades ssmicas) que permitem caracterizar uma unidade ssmica e individualiz-la das unidades adjacentes.

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    Figura IV.4 Exemplo de uma sequncia ssmica e das unidades ssmicas que a

    compem. Destacam-se as descontinuidades que constituem os limites da sequnciassmica e as que individualizam as unidades ssmicas U1, U2 e U3. (Modificada de Vaile Cramez, 1990).

    IV.2.2. Anlise de fcies ssmicas A anlise de fcies ssmica consiste num conjunto de procedimentos alicerados no corpo conceptual acima descrito, que sustenta a aplicao prtica da Estratigrafia Ssmica como tcnica de interpretao de linhas ssmicas. Distinguem-se quatro etapas neste processo de interpretao: a) identificao do tipo de terminao das reflexes; b) identificao do carcter das reflexes; c) identificao da configurao das reflexes internas das unidades ssmicas; d) identificao do tipo de forma externa das unidades ssmicas. A anlise dos diversos parmetros de fcies ssmica, fornece informaes passveis de serem interpretadas geologicamente, inferindo-se o ambiente deposicional e a litologia (Mitchum et al., 1977b) e a ocorrncia de eventos tectnicos (Winter, 1984). IV.2.2.1. Geometria e terminao das reflexes Atendendo s relaes geomtricas existentes entre reflexes, possvel distinguir cinco tipos de terminaes de reflexes, onlap, downlap, toplap, truncatura e concordncia, cuja presena, em particular dos quatro primeiros, permite definir as descontinuidades que delimitam a base e o topo de uma sequncia ssmica (Mitchum et al., 1977b). As referidas terminaes de reflexes ocupam uma posio especfica nos limites da sequncia, superior ou inferior, permitindo identifica-los com segurana (Figs. IV.5; IV.6; IV.7). Nas situaes em que no possvel distinguir onlap de downlap, utiliza-se o termo baselap. De acordo com Mitchum et al. (1977b) a presena dos diferentes tipos de terminao de reflexes nos limites inferior e superior de uma sequncia ssmica possui significado estratigrfico, pois testemunham a ocorrncia de hiatos deposicionais resultantes de eroso ou de no deposio (Fig. IV.6).

    Topo da sequncia

    Base da sequncia

    ToplapTruncatura Concordncia

    OnlapDownlapConcordncia

    Baselap

    Figura IV.5 - Tipos de terminaes dereflexes em relao base e ao topo deuma sequncia ssmica.

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    Onlap

    Downlap

    Toplap

    Truncatura

    Concordncia

    Terminao das reflexes Interpretao geolgica

    indicador de no deposio. Em alguns locais este padro de terminao de reflexes controlado pelas irregularidades do fundo. Constitui o indicador mais fivel para identificar o limite inferior de uma sequncia ssmica.

    frequentemente indicador de um hiato de no deposio.

    considerado uma evidncia de no deposio ( ). Raramente resulta de eroso.

    sedimentary bypassing

    Indica a presena de uma superfcie erosiva ou estrutural. Trata-se do critrio mais fivel para identificar o limite superior de uma sequncia

    Terminao lateral progressiva de reflexes inicialmente horizontais ou inclinadas contra uma superfcie com inclinao superior.

    Terminao lateral de uma reflexo inicialmente inclinada contra uma superfcie de menor inclinao ou horizontal.

    Terminao tangencial de reflexes inclinadas contra uma superfcie suprajacente com menor inclinao.

    Terminao lateral das reflexes c o n t r a u m a s u p e r f c i e discordante de origem erosiva ou e s t r u t u r a l q u e l i m i t a superiormente uma sequncia ssmica.

    As reflexes apresentam uma dispos io sens ivelmente p a r a l e l a a o l i m i t e superio r/ inferior de uma sequncia ssmica, estando a u s e n t e q u a l q u e r descontinuidade angular.

    M a n u t e n o d a s c o n d i e s deposicionais.

    Definio

    Figura IV.6 Tipos de terminao das reflexes e a respectiva interpretao geolgica.(Dados compilados de Mitchum et al., 1977b; Sangree e Widmier, 1977; Mignot, 1984;Hardage, 1987).

    Figura IV.7 - Principais tipos de terminaes de reflexes e sua relao com os

    limites da sequncia. (Extrada de Alonso et al., 1989).

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    IV.2.2.2. Carcter das reflexes As caractersticas exibidas pelos diferentes parmetros ssmicos so induzidas por variaes na geologia das sequncias, e apresentam por isso significado geolgico (Mitchum et al., 1977b; Sangree e Widmier, 1977; Mignot, 1984; Hardage, 1987). Distinguem-se os seguintes parmetros ssmicos (Tab. IV.1): continuidades das reflexes, amplitude das reflexes, frequncia das reflexes, assinatura. Mignot (1984) e Hardage (1987) estabeleceram uma relao entre a amplitude e a continuidade lateral das reflexes e a energia do meio deposicional, que se encontra sintetizada na Tabela IV.2.

    PARMETROS SSMICOS

    CONCEITO INTERPRETAO GEOLGICA

    Continuidade das reflexes

    Corresponde justaposio lateral de reflexes sucessivas num mesmo horizonte e est directamente relacionada com a continuidade fsica deste.

    Indica a continuidade da estratificao, a extenso de um ambiente de deposio e energia envolvida nos processos sedimentares. A continuidade elevada de um horizonte testemunha a manuteno das condies de sedimentao sem perturbaes do regime energtico; em oposio, a fraca continuidade evidencia um ambiente sujeito a variaes da energia de deposio.

    Amplitude das reflexes

    Refere-se amplitude mxima da onda reflectida, e depende directamente do coeficiente de reflexo e do contraste de impedncia acstica. Est tambm relacionado com o espaamento dos estratos e o contedo em fluidos.

    O forte contraste de impedncia acstica entre dois meios traduz-se por uma grande amplitude, evidente no registo ssmico pela ocorrncia de uma marca muito sombreada. A magnitude e continuidade lateral deste parmetro permitem deduzir o tipo de litofcies presentes tirar ilaes acerca da energia do meio. Uma variao rpida de amplitude revela uma sbita modificao na natureza das formaes, e ocorrem em ambientes caracterizados por nveis de energia e deposio elevados. A estabilidade do valor da amplitude ao longo de distncias considerveis traduz uma importante continuidade dos estratos e uniformidade da litologia. Geralmente, identificam-se fortes amplitudes na fcies detrtica de plataforma, onde existem intercalaes de depsitos de alta e baixa energia. Em oposio, as fracas amplitudes observam-se nos ambientes cuja energia constante.

    Frequncia das reflexes

    Trata-se do intervalo de tempo entre reflexes sucessivas.

    Est intimamente relacionada com as caractersticas instrumentais, sendo porm, afectada pelo contedo em fluidos, e sobretudo pela espessura das camadas sedimentares, com a qual apresenta uma relao inversa. Assim, as frequncias elevadas correspondem a estratos finos, enquanto que as zonas de transio apresentam valores baixos para este parmetro.

    Assinatura

    Consiste nas caractersticas particulares exibidas por um horizonte.

    Estas caractersticas permitem, com algumas precaues, a sua identificao quando a continuidade pequena.

    Tabela IV.1 Parmetros ssmicos e interpretao geolgica. (Dados compilados de Mitchum et al.,1977b; Sangree e Widmier, 1977; Mignot, 1984; Hardage, 1987; Catafau, 1987; Lobo, 1995).

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    AMPLITUDE CONTINUIDADE LATERAL

    ENERGIA DO MEIO

    Elevada Elevada Alternncia entre depsitos de alta e baixa energia.

    Varivel Pequena Varivel.

    Baixa Elevada Constante no espao e no tempo.

    Tabela IV.2 Relao entre amplitude, continuidade das reflexes e energia domeio. (Dados compilados de Mignot,1984; Hardage, 1987).

    IV.2.2.3. Configurao das reflexes internas As relaes geomtricas entre as reflexes que constituem uma dada unidade ssmica so variadas e esto relacionadas com os processos de deposio, eroso e paleotopografia, bem como, com a presena de fluidos (ex. Mitchum et al., 1977b; Sheriff e Geldart, 1983; Mignot, 1984; Vail e Cramez, 1990). Distinguem-se vrios tipos, representados nas Figuras IV.8 e IV.9 (Mitchum et al., 1977b).

    A sua presena sugere sedimentao segundo taxas uniformes ou a ocorrncia de subsidncia gradual e regular. Ocorrem frequentemente nas plataformas continentais ou em bacias estveis.

    Ambos os tipos de configurao esto associados a variaes laterais da taxa de sedimentao ou progressiva inclinao da superfcie de deposio.

    A s r e f l e x e s d i s p e m - s e paralelamente, apresentando boa amplitude e continuidade.

    As reflexes apresentam um padro d i v e rg e n t e o u c o n v e r g e n t e , verificando-se variaes laterais de espessura das unidades, a qual aumenta ou diminui, respectivamente em direco bacia.

    As reflexes so descontinuas e dispem-se desordenadamente, sendo caracterizadas por frequncias elevadas.

    Traduzem grande variabilidade das condies do ambiente de deposio. Esta configurao geralmente reconhecida nas estruturas de deslizamento gravtico ( ), nos complexos de eroso e nas formas de preenchimento de alta energia, nas zonas afectadas por dobramentos ou falhas.

    slumps

    Este tipo de configurao carateriza-se pela ausncia total ou parcial de reflexes ou pela inexistncia de continuidade lateral.

    Traduz a presena de litologias muito homogneas (sem constraste de impedncia acstica), ou fortemente deformadas e/ou metamorfizadas, ou a ocorrncia de corpos gneos ou massas salinas. Uma sedimentao rpida e uniforme de depsitos argilosos apresenta igualmente este tipo de resposta acstica.

    Configuraes das reflexes

    Descrio Ambiente sedimentar

    Paralela

    Paralela

    Subparalela

    Divergente

    Catica

    Transparente

    Figura IV.8 - Configuraes internas das reflexes e ambientes de deposio relacionados.(Dados compilados de Mitchum et al., 1977b; Sheriff e Geldart, 1983; Mignot,1984; Vail eCramez, 1990).

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    Esta configurao testemunha um ambiente de deposio de baixa energia e escasso acarre io sedimentar, sujeito a subsidncia rpida

    Configuraes Progradantes Descrio

    As reflexes dispem-se em sigmoide, apresentando inclinao e espessura mais elevada nos segmentos mdios, terminando em concordncia relativamente ao limite superior e em em relao ao limite inferior da unidade.

    downlap

    Sigmoidal

    Oblqua paralela

    Oblqua tangencial

    O conjunto das reflexes interpretado como exclusivamente progradante (sem agradao). Em ambos os casos, as reflexes terminam em

    em relao ao limite superior da unidade. Considerando a terminao das reflexes na base da unidade distinguem-se dois tipos de configurao:

    - as reflexes apresentam inclinao constante com terminao em .

    a inclinao das reflexes diminui progressivamente do topo para a base da sequncia progradante terminando em concordncia.

    toplap

    downlap Paralela:

    - Tangencial:

    A gnese deste padro de reflexes progradantes est dependente da conjugao de diversos factores, em particular, de um importante acarreio sedimentar num ambiente de alta energia, subsidncia nula ou insignificante, e estabilidade do nvel do mar.

    Sigmoidal-oblqua Este tipo de configurao progradante resulta de combinaes de progradaes sigmoidais e oblquas, reflectindo a alternncia de episdios ag radac iona i s e de no depos io, respectivamente.

    O seu desenvolvimento est a s so c i a do a um a m b ie n t e deposicional dominado por energia elevada.

    Shingled As reflexes apresentam geometria oblqua, embora com pequena inclinao.

    Geram-se por progradao em guas pouco profundas.

    Hummocky

    As reflexes so descontnuas e irregulares, geralmente com inclinaes opostas.

    Esta configurao interpretada como resultante da interdigitao de pequenos lbulos de progradao desenvolvidos em ambiente de plataforma interna, em guas pouco profundas numa posio prodeltaica ou interdeltaica.

    Ambiente Sedimentar

    Figura IV.9 - Configuraes internas progradantes e ambientes de deposio relacionados. (Dadoscompilados de Mitchum et al., 1977b; Sheriff e Geldart, 1983; Mignot,1984; Vail e Cramez, 1990).

    IV.2.2.4. Forma externa das unidades ssmicas Esta caracterstica contribui para a identificao e individualizao de uma dada unidade ssmica relativamente s unidades adjacentes. A respectiva forma externa est dependente da forma da superfcie sobre a qual repousa a unidade de fcies ssmicas (ou a sequncia). Este parmetro permite inferir o tipo de ambiente deposicional. Distinguem-se diversos tipos de formas externas (Mitchum et al., 1977b) (Fig. IV.10), cujos principais aspectos distintivos e interpretao do ambiente sedimentar se encontram sumarizadas na Tabela IV.3.

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    Figura IV.10 - Principais tipos de forma externa das unidades ssmicas. (Extrada deMitchum et al., 1977b).

    FORMA EXTERNA AMBIENTE DE DEPOSIO

    Lmina paralela Cunha Banco

    Estas formas podem atingir grandes dimenses e ocorrem com frequncia associadas a depsitos de plataforma, apresentando configuraes paralelas, divergentes ou progradantes.

    Lmina ondulada

    Correspondem geralmente a sedimentos pelgicos ou hemipelgicos depositados em ambiente profundo e de fraca energia.

    Lbulo Ocorre com frequncia em depsitos de talude.

    Montes Montculos

    Estas formas apresentam uma origem variada (ex.: edificaes carbonatadas, diapiros, deslizamentos). As suas dimenses so geralmente pequenas e a configurao das reflexes variada, mas geralmente quando a origem detrtica traduz um nvel de energia elevado.

    Preenchimento

    semelhana das formas acima descritas, a configurao das reflexes internas pode ser variada (ex.: preenchimento em onlap, catico, progradante, divergente). Podem atingir grande extenso, correspondendo a bacias ou apresentar dimenses mais restritas (ex. canais).

    Tabela IV.3 Forma externa das unidades ssmicas e tipo de ambiente deposicional.(Dados compilados de Mitchum et al., 1977b).

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    Os vrios parmetros ssmicos envolvidos na anlise de fcies ssmicas e as interpretaes geolgicas que se podem retirar deste tipo de estudo encontram-se sintetizados na Tabela IV.4 e esquematizados na Figura IV.11.

    PARMETROS DE FCIES SSMICAS

    TIPO DE INFORMAO GEOLGICA FORNECIDA

    Continuidade

    Continuidade dos estratos Processos de deposio

    Amplitude

    Contraste de impedncia acstica Espaamento entre as camadas

    Frequncia Espessura das camadas

    Configurao das

    reflexes

    Tipo de estratificao Processos de deposio Eroso e paleotopografia

    Forma externa

    Ambiente de deposio Fonte dos sedimentos

    Tabela IV.4 - Parmetros ssmicos utilizados na anlise de fciesssmicas e tipo de informaes geolgicas que fornecem. (Extrada deMignot, 1984).

    Terminao das reflexes

    Carcter das reflexes

    Configurao das reflexes

    Forma externa das unidades ssmicas

    OnlapDownlapToplapTruncaturaConcordncia

    AmplitudeContinuidadeFrequnciaAssinatura

    TransparenteSemitransparenteCaticaParalelaSubparalelaConvergenteDivergenteProgradante: Sigmoidal

    OblquaSigmoidal-oblquaShingledHummocky

    LminaLmina dobradaCunhaBancoLbuloMontculoLequePreenchimento

    ANLISE DE FCIES SSMICAS

    Figura IV.11 - A anlise de fcies ssmicas envolve diversos parmetros quepermitem caracterizar as fcies ssmicas: terminao das reflexes, carcterdas reflexes, configurao das reflexes internas e forma externa dasunidades ssmicas. (Extrada de Roque, 1998).

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    IV.2.3. Procedimento de interpretao ssmica utilizado A interpretao de Estratigrafia Ssmica consiste num conjunto de procedimentos que visam a determinao do significado geolgico dos dados de ssmica de reflexo, permitindo a identificao e correlao de sequncias deposicionais e inferir o ambiente deposicional e as litofcies (Mitchum et al., 1977b; Sheriff e Geldart, 1985) e eventos tectnicos (Winter, 1984). Neste processo esto assim, includos: a) o reconhecimento e correlao de sequncias ssmicas a partir das terminaes e configuraes das reflexes ssmicas; b) a anlise das variaes do carcter das reflexes de modo a reconhecer a ocorrncia de mudanas estratigrficas e eventos tectnicos; c) o reconhecimento de fcies ssmicas caractersticas que sugerem diferentes ambientes deposicionais ou actividade tectnica. Este processo interpretativo envolve numa primeira abordagem a definio das unidades ssmicas e das sequncias ssmicas e com base nas terminaes e configuraes das reflexes ssmicas, e numa abordagem posterior a anlise de fcies ssmicas. Na etapa final da interpretao ssmica o realce vai para a determinao do ambiente sedimentar e estimativa da litologia e para o reconhecimento de episdios tectnicos. O decurso do prprio processo interpretativo envolve a gradual construo mental de um modelo sismostratigrfico para a rea em estudo, culminando na proposta final de um modelo resultante da integrao de todos os dados analisados. Assim, o procedimento clssico de anlise de estratigrafia ssmica inclui as seguintes etapas:

    Reconhecimento de descontinuidades. Definio de unidades ssmicas e sequncias ssmicas. Anlise de fcies ssmica das unidades ssmicas. Calibrao estratigrfica das reflexes e unidades ssmicas recorrendo a sondagens ou cores. Inferir a litologia a partir da fcies ssmica da unidade (na ausncia de cores ou sondagens). Estabelecer relaes entre a fcies ssmica, litologia, energia do meio deposicional ou

    actividade tectnica. A aferio do grau de correco ou incorreco de uma determinada interpretao de estratigrafia ssmica raramente alcanada, pois encontra-se frequentemente condicionada partida pela escassa informao existente acerca da geologia da rea sobre a qual incide esse estudo. Atendendo a esta situao, (Anstey, 1973 in Sheriff e Geldart, 1985) preconiza que uma boa interpretao ssmica, mais do que perseguir a correco, dever antes de mais, ser consistente. Consistente com todos os dados ssmicos utilizados, mas tambm com toda a informao disponibilizada pela geologia local e regional, pelas sondagens e dragagens, e por outros mtodos geofsicos que eventualmente existam (ex. gravimetria, magnetometria). A consistncia da interpretao dever estender-se tambm correcta aplicao dos conceitos geolgicos e de estratigrafia ssmica. A abordagem interpretativa seguida neste trabalho consistiu numa primeira fase na identificao dos horizontes que correspondessem a descontinuidades, atendendo ao tipo de terminao das reflexes (onlap, toplap, downlap, truncatura) segundo os critrios expostos em Mitchum et al. (1977b). Nos casos em que as reflexes so concordantes optou-se por escolher os horizontes que se destacam dos restantes devido ao seu carcter e assinatura (ex. forte amplitude, grande continuidade), ou que separavam conjuntos de reflexes que exibiam fcies distintas. Salienta-se que esta concordncia pode ser aparente, sendo consequncia do baixo poder de resoluo da linha ssmica ou ainda, resultar do facto da orientao da linha ssmica ser paralela direco da discordncia (strike-line). Constata-se que frequentemente, os melhores horizontes, os que apresentam elevada amplitude e continuidade, constituem limites de unidades ssmicas, podendo

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  • CAPTULO IV - Metodologia Utilizada

    assim indicar a ocorrncia de diversos eventos geolgicos, como perodos erosivos, perodos tectnicos, variaes eustticas. Geralmente escala das linhas ssmicas de baixa resoluo, os limites entre unidades indicam uma lacuna no tempo geolgico e com frequncia separam sedimentos depositados em diferentes tipos de ambientes (Sheriff e Geldart, 1985). Ao longo deste trabalho, no que se refere interpretao ssmica, optou-se pela utilizao genrica do termo descontinuidade em detrimento do termo discordncia. O uso do termo descontinuidade implica somente o reconhecimento da existncia de uma quebra de continuidade no carcter fsico, quer seja devida a contrastes de impedncia acstica decorrentes do contacto entre diferentes litologias ou s relaes geomtricas entre estratos. Trata-se de um termo meramente descritivo, no tendo qualquer significado gentico. O significado do termo discordncia j foi discutido anteriormente neste trabalho, mas importa apenas realar que a sua utilizao tem sempre implcita a noo de tempo geolgico. Assim, a utilizao deste termo ficou reservada apenas para os casos, em que por calibrao estratigrfica com o recurso a sondagens ou cores, foi possvel detectar a existncia de uma verdadeira discordncia no registo estratigrfico. Salienta-se por isso, que embora o modelo de Estratigrafia Ssmica proposto por Mitchum et al. (1977a) e Vail et al. (1977) assuma que todos os limites de sequncias ou unidades ssmicas correspondem a discordncias, tal nem sempre se verifica. De modo a definir e correlacionar rigorosamente uma sequncia ssmica necessrio que os respectivos limites sejam bem definidos e bem traados ao longo das linhas ssmicas (Mitchum et al., 1977a; Mitchum e Vail, 1977). Para alcanar tais objectivos so executados procedimentos que pretendem garantir o rigor e fiabilidade da interpretao. Assim, as descontinuidades so seguidas ao longo de uma linha ssmica enquanto a sua identificao inequvoca, optando-se pelo seu abandono temporrio quando a fiabilidade da sua interpretao diminui, evitando-se deste modo uma extrapolao forada. Posteriormente, e aps a identificao dessa descontinuidade noutras linhas, e da reunio de maior nmero de informao, a sua interpretao ser de novo retomada na linha inicial, porm agora com um grau de fiabilidade superior. Um modo eficaz de exercer um controlo rigoroso sobre a interpretao ssmica consiste na realizao de percursos de calibragem (Fig. IV.12 A). Na prtica, segue-se determinado horizonte (ou descontinuidade) ao longo de um circuito fechado estabelecido entre linhas ssmicas que se intersectam (Fig.IV.12B). A posio final (profundidade em twt) ocupada pelo horizonte dever coincidir com a sua posio inicial na linha de partida. Se tal no acontecer, constata-se que foram cometidos erros durante o processo interpretativo, e este dever ser repetido de modo a reconhecer e eliminar os erros e manter a coerncia do processo interpretativo.

    Bs25

    Ar10

    Vol18

    Bs13

    Bs12 Bs24

    Vol 17

    Bs25

    Vol 1

    8

    Vol 1

    7

    Bs13

    Bs12Ar10

    Bs24

    A

    B

    Figura IV.12 A:Exemplo de um percursode calibragem de umhorizonte (a azul) ao longodas linhas ssmicas na reada Falha Marqus dePombal. O percurso foiiniciado na linha ssmicaBs25. B: esquematizaodas relaes de intersecoentre as linhas usadas nopercurso de calibragem.

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  • CAPTULO IV - Metodologia Utilizada

    Numa segunda fase da interpretao ssmica, aps a identificao das descontinuidades, procedeu-se definio e descrio das unidades ssmicas e das sequncias ssmicas aplicando os conceitos de anlise de fceis ssmicas (Mitchum et al., 1977b). Este processo de anlise de Estratigrafia Ssmica deve ser desenvolvido recorrendo somente informao disponibilizada pelas linhas ssmicas, sem que seja introduzido qualquer conhecimento acerca da litologia ou idade das unidades ssmicas ou descontinuidades. Obtm-se deste modo, um modelo de estratigrafia ssmica relativa, em que apenas interessa a posio estratigrfica ocupada por uma unidade ou sequncia face a outra, sendo possvel estabelecer uma cronologia relativa da sucesso dos vrios eventos geolgicos (Mitchum e Vail, 1977). A atribuio de idades a essas unidades ou descontinuidades ser apenas efectuada posteriormente, com o recurso a sondagens e cores, na segunda etapa metodolgica designada calibrao estratigrfica, e que ser tratada mais adiante no ponto IV.3 deste trabalho. Convm salientar que, por vezes, a escassez de dados ou a sua distribuio esparsa, com ausncia de interseces entre as linhas ssmicas que permitam efectuar um controlo da preciso da interpretao, possibilitam o surgimento de vrias hipteses de interpretao, todas passivas de serem exploradas, recaindo no entanto, a escolha apenas sobre uma delas, em funo desta apresentar a maior consistncia face aos dados e ao conhecimento entretanto adquirido sobre a rea de estudo durante a interpretao das linhas ssmicas precedentes. IV.3. CALIBRAO ESTRATIGRFICA Aps a realizao da anlise de estratigrafia ssmica procedeu-se calibrao estratigrfica das linhas ssmicas recorrendo s sondagens petrolferas existentes na margem do Algarve (Algarve-1, Algarve-2, Corvina, Ruivo e Imperador), a cores de pisto realizados tambm nesta margem, em Setembro de 2004 no mbito do cruzeiro SWIM (SWIM-38, SWIM-39 e SWIM-40), e informao publicada sobre os furos DSDP Site 120 e DSDP Site 135, efectuados respectivamente, no Banco de Gorringe e na Crista Coral Patch, e ainda ao core de gravidade BS-08, executado no flanco SE do canho de S. Vicente (Berton, 2001). Esta etapa de calibrao estratigrfica fundamental para a determinao das idades dos diferentes horizontes interpretados nas linhas ssmicas das margens continentais Sul e Sudoeste, permitindo posteriormente efectuar a correlao entre estes horizontes. IV.3.1. Aspectos gerais A utilizao de sondagens na calibrao das linhas ssmicas permite determinar, para alm da idade dos horizontes, a litologia, ambiente de deposio, discordncias, e a localizao de falhas. Geralmente as dataes so efectuadas atravs de anlise biostratigrfica. Salienta-se, que frequentemente os hiatos determinados numa sondagem atravs de anlise biostratigrfica, no tm significado escala da sequncia ssmica, pois situam-se fora do limite de resoluo da ssmica. O processo de calibrao das linhas atravs das sondagens, coloca alguns problemas, nomeadamente, a) na maioria dos casos as sondagens no foram realizadas exactamente sobre as linhas ssmicas que se pretendem calibrar, encontrando-se na melhor das hipteses nas suas imediaes. Mesmo nas situaes em que a sondagem est colocada sobre a linha ssmica, o afastamento da vertical pode provocar a disparidade entre a geologia amostrada pela sondagem e a geologia presente na seco ssmica, em virtude da inclinao (Sheriff e Geldart, 1983); b) existe o problema de converso de escalas, uma vez que a escala vertical das linhas ssmicas geralmente em tempo (segundos twt), enquanto que a escala das sondagens em profundidade (metros). Assim, necessrio a escolha apropriada da velocidade de modo a proceder converso; c) uma questo

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    que deve estar sempre presente, mesmo nas situaes em que a localizao da sondagem oferece poucas dvidas, refere-se s limitaes intrnsecas prpria amostragem realizada usando este mtodo. Apenas possibilita o acesso a uma informao geolgica muito localizada (somente alguns centmetros de rocha), a qual poder ainda ser deturpada durante o prprio processo de sondagens, devido a alteraes das rochas. Em oposio, as linhas ssmicas disponibilizam informao de uma rea muito mais vasta; d) o facto de muitas reflexes resultarem da interferncia de vrias reflexes, coloca dificuldades acrescidas ao relacionar horizontes identificados nas sondagens com eventos ssmicos especficos (Sheriff e Geldart, 1983). Nos casos em que existem dados que permitam efectuar a datao das descontinuidades, unidades ou sequncias ssmicas, recorrendo a sondagens ou cores, possvel efectuar uma correlao entre eventos geolgicos datados, ocupando uma posio temporal especfica, possibilitando deste modo o seu enquadramento num contexto regional, e a respectiva correlao temporal com outros eventos contemporneos que ocorram outros locais. Efectua-se assim, a correlao entre os horizontes ssmicos e os horizontes geolgicos reconhecidos nas sondagens. Refira-se que a integrao dos dados de sondagens, fornece informao geolgica que dever ser consistente com a interpretao ssmica j efectuada. IV.3.2. - Re-interpretao dos dados biostratigrficos das sondagens do offshore do Algarve: Corvina, Ruivo e Imperador

    O objectivo inicial consistia na calibrao estratigrfica das unidades ssmicas e descontinuidades definidas nas linhas ssmicas do offshore do Algarve, recorrendo s sondagens Corvina, Ruivo e Imperador. A execuo desta tarefa deparou-se com alguns problemas bsicos relativos s dataes do Neognico das sondagens propostas pela Chevron e Challenger e posteriormente pela Elf-Aquitaine. As referidas sondagens foram datadas primeiramente pelas companhias Challenger (1976) Chevron (1975a,b) e com base na anlise do contedo fossilfero (Foraminferos e Nanofsseis Calcrios) de apenas alguns intervalos amostrados. As dataes obtidas constam na Fig. IV.13A. Posteriormente em 1979, a companhia Elf-Aquitaine realizou nova amostragem e nova anlise micropaleontolgica (Foraminferos, Nanofsseis Calcrios, Plens) das referidas sondagens (Fig. IV.13B) dataes propostas por esta companhia so distintas e por vezes incompatveis com as apresentadas pela Challenger e pela Chevron (Fig. IV.13A e B) Esta situao lanou a dvida sobre a fiabilidade das dataes. Qual delas seria a mais fivel? IV.3.2.1. Procedimento utilizado Na tentativa de ultrapassar este impasse procedeu-se leitura atenta dos relatrios de sondagem publicados pelas duas companhias petrolferas. Desta leitura ressaltam, porm, a existncia de maiores incoerncias nas dataes e a dificuldade de discernir qual o critrio subjacente atribuio de determinada idade a determinados intervalos. Verifica-se tambm, que em alguns casos, so apresentadas dataes incompatveis para o mesmo intervalo de uma dada sondagem consoante o grupo fssil utilizado. Esta situao pode ser exemplificada pela interpretao da sondagem Corvina proposta pela Elf-Aquitaine. A leitura dos relatrios mostrou assim a disparidade das dataes e no permitiu esclarecer qual delas poderia ser mais fivel. A soluo encontrada para ultrapassar esta situao foi propor uma nova datao das sondagens baseada unicamente na re-interpretao dos dados biostratigrficos disponibilizados em ambos os relatrios para o intervalo relativo ao Cenozico.

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  • CAPTULO IV - Metodologia Utilizada

    A

    Jurssico mdio

    Cretcico 1

    Cretcico 2

    Miocnico

    Pliocnico

    Miocnico

    Oligocnico

    Eocnico

    Cretcico

    Jurssico mdio

    Jurssico superior

    Jurssico inferiorJurssico inferior

    Jurssico mdio

    Trissico

    Cretcico

    Oligocnico

    Recente/Miocnico370

    565

    943

    1368

    1507

    2633

    189

    0 m 0 m 0 m

    475

    970

    1530

    20402150

    29003083

    91

    750

    967

    1148

    20002224

    FM

    FM

    FM

    ?

    RUIVO IMPERADOR CORVINA

    B

    Pliocnico ?

    Miocnicosuperior

    Miocnicomdio

    Miocnicoinferior ?

    CORVINA IMPERADOR RUIVO

    451460

    524

    753872

    567-576777-786

    896-905

    430-439475-485

    731-740

    814-817960-963

    Figura IV.13 - Estratigrafia proposta para as sondagens do Algarve

    Corvina, Ruivo e Imperador, pelas companhias petrolferas Challenger e Chevron (A) e Elf-Aquitaine (B). Os nmeros correspondem a profundidades em metros. FM: fundo do mar.

    De modo a atingir esse objectivo, procedeu-se compilao de todos os dados biostratigrficos disponveis em nos vrios relatrios (Chevron, Challenger e Elf-Aquitaine). Posteriormente, efectuou-se uma nova interpretao biostratigrfica desses dados, (somente Foraminferos e Nanofsseis Calcrios), recorrendo comparao com esquemas biostratigrficos publicados para as espcies de foraminferos e nanofsseis calcrios identificadas nestas sondagens. Finalmente, foram atribudas idades aos intervalos de amostragem considerados e foi proposto um novo modelo cronostratigrfico para cada uma das sondagens.

    IV.3.2.2. - Discusso da metodologia utilizada A metodologia ideal para solucionar o problema da incompatibilidade e incoerncia entre as dataes obtidas pela Challenger e Chevron e pela Elf-Aquitaine, seria efectuar nova amostragem, realizar novas anlises e propor dataes. Porm na impossibilidade de realizar uma amostragem, a metodologia utilizada na resoluo deste problema merece ser discutida em diversos aspectos:

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    a) Um dos problemas inerentes escolha deste tipo de metodologia, reside no facto de ser necessrio confiar nas classificaes/identificaes dos espcimes efectuadas pelos biostratigrafos da Challenger, Chevron e Elf-Aquitaine. Ou seja, assumir que a identificao e classificao dos organismos que figuram nos relatrios esto correctas. b) Outro problema, que de alguma forma, est a montante do anterior, deve-se ao facto de no ser possvel ter acesso s amostras que foram utilizadas na identificao. Uma re-interpretao fivel dos dados passaria necessariamente por uma re-avaliao das amostras e da sua re-anlise micropaleontgica. Tal permitiria esclarecer se algumas das classificaes se devero a identificaes dbias devido a fenmenos de recristalizao, que podem afectar, designadamente alguns Nanofsseis Calcrios como por exemplo Discoaster druggi e Discoaster variabilis (?) (este ltimo quando se encontra muito recristalizado pode ser confundido com o primeiro). c) A amostragem realizada por qualquer uma das companhias petrolferas foi condicionada pelos propsitos da indstria que visavam primordialmente a identificao de reservatrios de hidrocarbonetos, no tendo por isso, como objectivo a realizao de uma anlise biocronoestratigrfica detalhada. Assim, a grande maioria das amostras utilizadas consistiram em ditch-cutting samples, que geralmente colocam problemas de fiabilidade devido ao risco de contaminao. As amostras sidewall core disponibilizadas para anlise, foram escassas. d) Subjacente a estes aspectos condicionantes da legitimidade da metodologia empregue neste trabalho, acrescem ainda os problemas inerentes anlise biostratigrfica clssica, e que merecem ser aqui expostos com algum detalhe. Considerando todas as limitaes que metodologia utilizada neste trabalho impe, a proposta de re-interpretao dos dados biostratigrficos do Cenozico das sondagens apresentada, deve ser necessariamente, encarada com as devidas precaues. Neste trabalho foram apenas considerados os dados relativos a Foraminferos e a Nanofsseis Calcrios, e excludos os dados referentes a Plens. IV.3.2.3. Problemas inerentes anlise biostratigrfica A biostratigrafia constitui o ramo da estratigrafia que subdivide o registo geolgico em unidades com base no seu contedo fossilfero, utilizando para isso a amplitude do tempo de existncia de determinado grupo fssil. Constitui a ferramenta bsica que permite correlacionar unidades litolgicas, e a escalas mais vastas, bacias e margens continentais. Actualmente, a correlao entre bacias de sub-superfcie efectuada com base na estratigrafia ssmica, porm, a biostratigrafia, a estratigrafia isotpica e a magnetostratigrafia, continuam a desempenham um papel crucial no controlo cronolgico das correlaes baseadas na interpretao de linhas ssmicas. O tempo biostratigrfico medido em biocronozonas, que representam o intervalo de tempo que medeia entre a primeira ocorrncia (FAD: first appearance datum) e a extino (LAD: last appearance datum) de determinada espcie fssil escala global. Refira-se que, numa dada bacia, o alcance temporal de uma espcie fssil poder no estar representado na sua totalidade, sendo o seu aparecimento tardio ou desaparecimento prematuro devidos a constrangimentos locais de carcter ambiental ou geogrfico. Nestas circunstncias, as biozonas baseadas nesses eventos de aparecimento e extino tm somente validade nessa bacia e apenas valor correlativo local. A resoluo cronostratigrfica obtida com base em marcadores fsseis depende do perodo geolgico, do nmero de grupos fsseis usados e do tipo de ambiente sedimentar (Emery e Mayers, 1996).

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  • CAPTULO IV - Metodologia Utilizada

    Idealmente a anlise biostratigrfica e aplicao cronostratigrfica comporta trs fases (Doyle, 1996):

    1. colheita de dados 2. anlise de dados 3. correlao de dados

    1- colheita de dados: O tipo de amostragem escolhida dever ser dependente dos objectivos que se pretendem alcanar com a anlise biostratigrfica, e com o tipo de registo fossilfero disponvel (macro ou microfsseis). O espaamento da amostragem deve ser concebido de modo a poder resolver o problema geolgico colocado. No caso particular dos microfsseis, qualquer amostragem efectuada ter necessariamente um carcter fortuito, imposto pelas dimenses do contedo fossilfero da amostra. Assim, no possvel avaliar previamente a riqueza em microformas estratigraficamente significativas de determinado sector de um afloramento ou sondagem. A amostragem dever por isso, ter um nvel de resoluo suficiente para tentar minimizar este desconhecimento. Idealmente, recomendada a colheita de amostras proximamente espaadas na vizinhana de potenciais fronteiras geolgicas (Doyle, 1996). Frequentemente, na indstria petrolfera, as amostras de sondagem disponibilizadas para a anlise biostratigrfica correspondem a fragmentos de rocha bombeadas para a superfcie em conjunto com a lama de sondagem (ditch cuttings samples), e por isso facilmente sujeitas a sofrer contaminao. Em estudos mais detalhados, nomeadamente para compreender as variaes laterais de reservatrios e conectividade entre eles, so utilizadas amostras da prpria sondagem ou da parede da sondagem (core e side-wall core samples). 2- anlise dos dados: A anlise de dados em biostratigrafia envolve classicamente trs etapas: a) escolha do grupo fssil mais adequado para efectuar a datao e posterior correlao. Esta escolha dever recair sobre os grupos taxonmicos mais susceptveis de constiturem bons marcadores estratigrficos para um intervalo de tempo geolgico especfico. Assim, para que determinado taxon possa ser considerado um bom marcador estratigrfico dever preencher os seguintes requisitos: a) ter sofrido durante o processo evolutivo modificaes morfolgicas rpidas e distintas que permitam a sua identificao inequvoca; b) apresentar uma vasta distribuio geogrfica de modo a que possa ser utilizado na correlao entre bacias; c) que ocorra em abundncia suficiente para que a sua presena no registo geolgico seja um evento estatisticamente vivel. Os Foraminferos planctnicos e Nanofsseis Calcrios so, obedecendo a estes requisitos, considerados os marcadores biostratigrficos do Cenozico por excelncia. A sua evoluo foi rpida, pautada pelo desenvolvimento de uma grande variedade de formas num curto intervalo de tempo; o facto de viverem na coluna de gua favoreceu a sua disperso por amplas regies geogrficas; e a sua abundncia era particularmente elevada nos locais cujas condies paleoambientais o permitiam. Em oposio, a utilizao de espcies bentnicas para fins biocronostratigrficos acarreta problemas devido sua estreita dependncia em relao s condies paleoambientais e fcies deposicionais. A sua importncia cronostratigrfica reduzida, no sendo por isso, as mais apropriadas para efectuar correlaes entre seces deposicionais da mesma idade. Fornecem, porm, informaes de grande interesse para a identificao e reconstituio dos paleoambientes.

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    Na indstria petrolfera, devido utilizao de sondagens, a escolha dos taxa mais adequados anlise biostratigrfica recai preferencialmente sobre trs grupos: microfsseis s.s. (ex. foraminferos, diatomceas, ostracodos, radiolrios); nanofsseis (ex. cocolitos e discoasteres) e palinomorfos (ex. dinoflagelados, plens e esporos). A elevada abundncia apresentada por estes grupos constitui uma das principais vantagens para a sua utilizao neste tipo de anlise. A utilizao combinada da informao fornecida por vrios grupos fsseis oferece melhor resoluo cronostratigrfica. Esta estar dependente do perodo geolgico, do nmero de grupos fsseis usado e do tipo de ambiente sedimentar. Frequentemente, para o Cenozico considera-se conjuntamente a informao fornecida por Foraminferos e Nanofsseis Calcrios. b) compilao de esquemas estratigrficos publicados Na generalidade, os esquemas de biozonao publicados utilizam os eventos de aparecimento e de extino de determinado taxon para definir as respectivas biozonas. Na indstria petrolfera, os topos das biozonas so preferencialmente definidos nos eventos de extino dos fsseis, enquanto que o seu aparecimento relegado para a definio de subzonas. Tal deve-se ao facto, das amostras normalmente disponveis para a anlise biostratigrfica serem ditch cuttings samples. c) desenvolvimento de um esquema biostratigrfico Esta etapa assenta na interpretao dos dados disponveis e posterior comparao com os esquemas estratigrficos publicados, de modo a aferir a sua validade. 3- correlao de dados: A correlao dos dados biostratigrficos possvel atravs da comparao de dados acumulados de uma dada rea com outros de outra regio. A possibilidade de correlao afectada, segundo Doyle (1996), por trs factores:

    - erros na colheita inicial dos dados - disperso dos grupos fsseis utilizados na correlao - aparecimento/extino diacrnica de grupos fsseis

    Salienta-se que a correlao entre eventos fsseis (identificados em sondagens) e eventos ssmicos (descontinuidades identificadas nas linhas ssmicas) deve ser efectuada com precauo, pois ambos podem ter erros associados com o processo de converso para profundidade. IV.4. CORRELAO SISMOSTRATIGRFICA No presente trabalho pretendeu-se estabelecer uma relao cronostratigrfica entre as unidades ssmicas, sequncias e descontinuidades identificadas na margem continental Sul e na margem continental Sudoeste portuguesas. IV.4.1. Significado de correlao estratigrfica A correlao estratigrfica pretende estabelecer relaes laterais e cronolgicas entre unidades estratigrficas ou entre as descontinuidades que as limitam. O termo correlao estratigrfica aplicado, por vezes de modo ambguo, referindo-se igualmente correlao litolgica (baseada somente na litologia) e correlao cronolgica. O prprio conceito de correlao estratigrfica tem implcita a noo de tempo geolgico, implicando a existncia de simultaneidade na ocorrncia de eventos deposicionais ou tectnicos, mesmo que estes se verifiquem em reas afastadas. Estes eventos esto ligados entre si por um intervalo de tempo de ocorrncia comum, isto , foram contemporneos. Importa pois, distinguir entre o significado de compatibilizao

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    (match) e de correlao (correlation). No primeiro caso, a compatibilizao pressupe somente o reconhecimento de unidades com as mesmas caractersticas litolgicas, ou seja conjuntos com litologias compatveis. Este conceito no impe a existncia de uma equivalncia temporal entre as unidades litolgicas que so sujeitas a comparao, o que conduz a um vasto leque de possibilidades de compatibilizao entre unidades litostratigrficas. No segundo caso, a correlao pressupe sempre a existncia de equivalncia temporal entre as unidades estratigrficas, mesmo que estas apresentem litologias distintas. A aplicao deste conceito implicar sempre o conhecimento da idade das unidades que esto a ser correlacionadas, o qual poder ser obtido atravs de dataes radiomtricas ou do reconhecimento de biozonas, ou ainda atravs de escalas crono-magnticas. A equivalncia lateral entre unidades litostratigrficas sem continuidade cartogrfica efectuada por compatibilizao de fcies litolgica, podendo por isso existir diversas solues possveis, em consequncia da recorrncia de fcies ou do diacronismo da deposio. Este processo implica o reconhecimento da continuidade lateral de uma dada unidade litostratigrfica, recorrendo-se para isso a trs mtodos possveis dependendo do tipo de registo estratigrfico (Friedman e Sanders, 1978): a) simples observao da respectiva extenso lateral da unidade, quando esta ocorre de modo continuo ao longo de uma vasta rea; a aplicao deste mtodo est circunscrita apenas aos casos em que as unidades apresentem boa continuidade lateral; b) comparao com outras sucesses ou unidades estratigrficas com caractersticas semelhantes, identificadas noutras reas; a utilizao deste mtodo, baseado nas fcies das unidades, escolhida nos casos em que a continuidade das unidades que se pretende relacionar se encontra interrompida; porm, a sua aplicao pode conduzir a incorreces graves, uma vez que unidades de idades diferentes podem apresentar fcies semelhantes; c) utilizando marcadores estratigrficos persistentes lateralmente, camadas-guia, cuja identificao inequvoca, independentemente do local onde ocorram; este ltimo mtodo aquele que apresenta maior fiabilidade, mas nem sempre com possibilidades de aplicao devido frequente ausncia desse tipo de marcadores estratigrficos no registo geolgico que se pretende compatibilizar. A correlao cronolgica processa-se a dois nveis distintos: a) num primeiro nvel, consiste em estabelecer as relaes de equivalncia temporal entre unidades estratigrficas que ocorrem numa mesma rea, em toda a sua extenso. Trata-se pois, de uma correlao local; b) num segundo nvel, ser necessrio decidir qual a posio dessas unidades estratigrficas na tabela cronostratigrfica padro escala global. O significado de correlao na interpretao ssmica cinge-se apenas, de acordo com a definio de Sheriff e Geldart (1983), ao reconhecimento de uma reflexo ou horizonte numa linha ssmica, como correspondendo a uma mesma interface identificada noutra linha ssmica por outro horizonte. Baseia-se na semelhana entre o carcter das reflexes e a coincidncia entre o seu tempo de chegada num ponto de cruzamento de duas ou mais linhas ssmicas (time-tie). Segundo Mitchum e Vail (1977), a correlao entre dados de reflexo ssmica pressupe que a nica informao necessria para a realizao desta tarefa, consista na fornecida pelas prprias linhas ssmicas, sem que exista qualquer conhecimento acerca da litologia ou da idade das unidades ssmicas e das descontinuidades, embora refiram que, no caso dessa informao estar disponvel possa ser incorporada no processo de correlao. A correlao sismostratigrfica dever implicar para alm da correlao s.s. entre horizontes acima referida, a componente temporal introduzida pela calibrao das unidades ssmicas e descontinuidades atravs de dados biostratigrficos provenientes de sondagens ou cores. Assim, uma definio possvel de correlao sismostratigrfica, adaptando especificidade dos dados

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    ssmicos a definio de correlao estratigrfica, ser: a correlao sismostratigrfica visa o estabelecimento de relaes laterais e temporais entre unidades ssmicas ou entre as descontinuidades que as limitam. IV.4.2. Discusso da metodologia de correlao sismostratigrfica: condicionantes e limitaes de aplicabilidade A correlao sismostratigrfica apresenta problemas que so partilhados pela correlao estratigrfica tradicional, efectuada em afloramento ou com o recurso a sondagens, e outros que lhe so especficos, derivados sobretudo da utilizao de dados ssmicos e da problemtica envolvida na respectiva interpretao geolgica. Em ambas as situaes, porm, a correlao est dependente das caractersticas inerentes ao registo geolgico, independentemente da natureza dos dados utilizados. Essas condicionantes esto ilustradas na Figura IV.14.

    Figura IV.14 Trs aspectos do registo estratigrfico que so importantes na correlao. A: Amaioria das lacunas cronostratigrficas significativas corresponde a limites de sequncias,porm estas lacunas tambm se desenvolvem ao longo dos limites internos de fcies. B: O usoda correlao de eventos pode ser mais rigoroso que a correlao biostratigrfica, em particularnos locais em que as associaes fsseis so controladas por fcies. C: Exemplifica os problemas que surgem na aplicao da equivalncia cronostratigrfica correlaolitostratigrfica. (Extrada de Hubbard et al., 1985).

    A utilizao de mtodos indirectos, em particular ssmicos, implica que a informao fornecida pelas reflexes ssmicas ser determinada pela litologia, e esta por sua vez determinada pelo tipo de ambiente deposicional. Estes aspectos so traduzidos na fcies ssmica exibida pelas unidades e sequncias ssmicas. Ao correlacionar unidades ssmicas com fcies semelhantes em diferentes linhas ssmicas, possvel incorrer no erro de correlacionar ambientes sedimentares semelhantes, mas no equivalentes no tempo. Este tipo de correlao apenas indica a existncia de continuidade das unidades ssmicas (litolgicas) com a mesma litofcies (ou seja, que correspondem mesma litologia depositada no mesmo tipo de ambiente). Esta situao coloca-se principalmente nas reas onde os dados ssmicos so escassos, ou existe um grande espaamento entre as linhas com poucos locais de interseco. No que se refere, em particular, correlao sismostratigrfica, as denominadas curvas eustticas globais de Vail constituem o mtodo de correlao por excelncia preconizado pelo modelo

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    conceptual de eustatismo global desenvolvido por Vail et al. em 1977, no mbito da Estratigrafia Ssmica (Fig. IV.15). Este modelo resultou da observao, pelos autores referidos, da existncia de onlaps costeiros sobre discordncias, cuja distribuio parece ser sncrona em todo o mundo. A explicao encontrada por estes autores foi, que o nico mecanismo responsvel por este sincronismo seriam as variaes eustticas. Desenvolveram ento, o modelo de eustatismo global, que assenta nos seguintes pressupostos:

    As discordncias que limitam as sequncias deposicionais foram geradas por variaes cclicas do nvel do mar e apresentam extenso global.

    Este controlo de natureza eusttica gera limites de sequncias sncronos. Este sincronismo tem significado cronostratigrfico escala global.

    Baseados nestes pressupostos, Vail et al. (1977) construram as curvas eustticas globais (curvas de Vail) (Fig. IV.15), assumindo que:

    As variaes relativas do nvel do mar podem ser determinadas a partir de onlap costeiro identificado em sequncias deposicionais marinhas. A durao e magnitude destas variaes eustticas podem ser utilizadas na determinao de ciclos de variaes do nvel do mar. Estes ciclos ao serem colocados por ordem cronolgica, permitiro datar e medir as variaes do nvel do mar ao longo do tempo geolgico. A compilao de diferentes ciclos eustticos locais permite a elaborao de uma carta de ciclos eustticos globais, que pode ser utilizada universalmente na correlao cronostratigrfica.

    Figura IV.15 Correlao de ciclos eustticos regionais com as curvas globais de Vail.(Extada de Vail et al., 1977).

    Inicialmente, as curvas de Vail foram acolhidas com grande receptividade por parte da comunidade cientfica, sem terem sido levantadas questes acerca da sua aplicabilidade escala global e inclusive da validade do mtodo envolvido na sua construo. Assim, estas curvas eustticas foram, num curto intervalo de tempo, aceites como um mtodo ideal, um mtodo padro, de datao e correlao cronostratigrfica das sequncias ssmicas a nvel global. Este cenrio favorvel iria, no entanto, mudar no incio dos anos oitenta, quando comearam a surgir as primeiras discrepncias notrias nas correlaes aplicando estas curvas, crescentes dvidas quanto sua validade, e crticas dirigidas aos fundamentos do prprio modelo de eustatismo global. As principais crticas efectuadas a este modelo e s curvas eustticas dele derivadas, podem ser includas em cinco grupos:

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    1. Impossibilidade de verificao dos dados originais, que serviram de base identificao dos onlaps costeiros, uma vez que estes nunca foram publicados, e por isso nunca foram sujeitos a exame e avaliao de modo a determinar se suportam ou no o modelo (Miall, 1986; Miall e Miall, 2001).

    2. A universalidade das curvas de variaes do nvel do mar tem sido um dos pontos do modelo mais sujeito a debate (ex. Sloss, 1988; Walker, 1990; Miall, 1986; Miall e Miall, 2001). O carcter universal destas curvas eustticas centra-se no sincronismo escala global dessas discordncias, mas este carcter dever ser demonstrado e confirmado, se for esse o caso, por mtodos independentes de anlise estratigrfica. Assim, por exemplo, o grau crescente de resoluo biostratigrfica poder contribuir no futuro, para demonstrar se esses eventos so realmente globalmente sncronos ou no. Por outro lado, Parkinson e Summerhayes (1985) enfatizam o papel controlador dos factores locais na gnese de eventos estratigrficos reconhecidos escala de uma bacia. Segundo estes autores, cada bacia conter no respectivo registo estratigrfico, os eventos com significado meramente local, e apenas alguns eventos globais, pelo que a extrapolao de eventos sncronos dever requerer uma anlise cuidada.

    3. Ignora a importncia da actividade tectnica, a qual pode desempenhar um papel fulcral na gnese de superfcies de discordncia. A actividade tectnica local, nomeadamente a subsidncia, introduz importantes alteraes no sinal eusttico global medido localmente (Parkinson e Summerhayes, 1985). Tal como salientam Christie-Blick e Driscoll (1995), as discordncias e a arquitectura das sequncias deposicionais no podem ser exclusivamente atribudas s variaes do nvel do mar, resultando antes da conjugao, complexa, entre vrios factores, tais como a tectnica, a taxa de acarreio sedimentar, e tambm as variaes do nvel do mar. Em determinadas circunstncias, um destes factores poder assumir um papel preponderante sobre os restantes, mas na generalidade difcil distinguir a real contribuio de cada um deles isoladamente.

    4. Ignora a contribuio de outros factores, que podem ser igualmente invocados como responsveis pela gnese de extensas superfcies de discordncia, por exemplo, as correntes marinhas profundas que actuam como agente erosivo e modelador dessas superfcies (Miall, 1986). 5. Utilizao das curvas de Vail como mtodo de correlao cronostratigrfica em detrimento da correlao baseada nos mtodos estratigrfico convencionais como biostratigrafia (Miall, 1986; Miall e Miall, 2001).

    Um dos grandes cpticos e crticos deste modelo, A. D. Miall (ex. Miall, 1986; Miall e Miall, 2001), teceu violentas consideraes acerca da validade da metodologia utilizada por Vail et al. (1977) na construo destas curvas (interpretao de onlaps costeiros nas linhas ssmicas como sendo indicadores de transgresses globais). As suas crticas estenderam-se ainda postura argumentativa demonstrada pelos autores do modelo, tendo-a classificando como raciocnio circular, sugerido pela afirmao de Vail e Todd (1981, p. 217): several unconformities cannot be dated precisely; in these cases their ages are based on our global cycle chart, with age assignments based on the basis of a best fit with the data. Miall (1986) exprime ainda o seu alerta e preocupao acerca da aceitao geral deste modelo de eustatismo global como base de correlao cronostratigrfica, sem a prvia discusso da sua validade: ... a general concern that stratigraphers in general (and seismic stratigrafers in particular) seem to be abandoning scientific caution and healthy skeptiscism in rush to apply an exiciting new idea.

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    Decorrente do que ficou acima exposto, as curvas de Vail no sero utilizadas neste trabalho como mtodo de correlao cronostratigrfica, no entanto a discusso, embora breve, do seu conceito, construo e as crticas que as rodeiam, impunha-se num trabalho cuja Estratigrafia Ssmica constitui a respectiva base metodolgica. A correlao sismostratigrfica envolve ainda outro tipo de problemas, que se prendem mais directamente com o prprio processo de interpretao dos dados ssmicos. Assim, num artigo publicado por Cartwrigth et al. (1993), estes autores advertem para os erros que podem ser cometidos na correlao sismostratigrfica devido incorrecta interpretao do significado geolgico e cronostratigrfico das terminaes das reflexes em onlap, downlap e toplap (Fig. IV.16). Este padro geomtrico de terminao de reflexes, definido inicialmente por Mitchum et al. (1977b) (Fig. IV.7), pode ser, de acordo com Cartwrigth et al. (1993), aparente e uma consequncia da baixa resoluo vertical das linhas ssmicas, que se revelam incapazes de descriminar a real geometria dos estratos sedimentares (Fig. IV.16).

    A B

    C

    T

    T

    T

    TTT2 3 4T1

    T1T 2

    1T

    TT

    21

    TTT

    TTTT1

    234

    321

    T T T T T T1 2 3 4 5 6

    SLOPEDRAPE

    ONLAP FILL

    T2 DOWNLAPS SURFACE T1

    T4 DOWNLAPS SURAFACE T3

    T3 DOWNLAPSSURFACE T2

    APPARENT DOWNLAP SURFACE

    TOPLAP SURFACE

    NO SEDIMENT ACCUMULATION DURING

    PROGRADATION DURING

    Figura IV.16 A: Onlap; B: Downlap; C: Toplap. (Extrada de Cartwrigth et al., 1993). Assim, um conjunto de estratos surge nas linhas ssmicas como uma nica reflexo, discreta e bem marcada, interpretada como uma nica descontinuidade. Na interpretao ssmica convencional estas descontinuidades constituem a base da correlao sismostratigrfica, partindo-se do pressuposto que tm significado cronostratigrfico (so discordncias). No entanto, tal assumpo generalizada carece de legitimidade, pois se essas descontinuidades forem superfcies aparentes, podero ser cronstratigraficamente invlidas, podendo cruzar camadas com diferentes idades, pelo que a sua utilizao como base de correlao incorrecta. O erro cometido ser tanto mais grave

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    quanto mais extensa for a descontinuidade aparente. S muito raramente, e em circunstncias especiais, ocorrem no registo estratigrfico verdadeiras superfcies de onlap, downlap ou toplap, assim, as discordncias definidas somente com base nestas terminaes de reflexes s raramente correspondem a discordncias reais. Os argumentos apresentados por estes autores demonstram que muito improvvel que os limites das sequncias desenvolvam uma superfcie discreta e correlacionvel escala regional. Atendendo a estes argumentos, os modelos cronostratigrficos elaborados com base na correlao regional de limites de sequncias podero em muitos casos violarem um dos princpios bsicos da estratigrafia: o principio da sobreposio dos estratos. As questes levantadas por Cartwrigth et al. (1993) aplicao do modelo clssico de interpretao e correlao sismostratigrfica so extremamente relevantes e pertinentes, e podem ser ilustradas no caso concreto dos corpos contornticos do Algarve, limitados basalmente por uma extensa superfcie de downlap, e que sero objecto de anlise e discusso, no Captulo V do presente trabalho. Um aspecto crucial relacionado com o tipo de abordagem perante a interpretao ssmica ressalta tambm do trabalho dos autores referidos. Esse trabalho demonstra que, sem uma viso dinmica, ou seja tendo em mente o modo como actuam os processos e fenmenos sedimentares e tectnicos, e da sua expresso e registo escala mesoscpica, a interpretao de estratigrafia ssmica corre o risco de se tornar num mero exerccio de geometria, a partir do qual se inferir um modelo geolgico de validade duvidosa. Ao pretender efectuar-se a correlao estratigrfica entre unidades ssmicas e descontinuidades, integrando os dados provenientes de sondagens, depara-se com novo tipo de problemas, decorrentes das limitaes impostas pela aplicao de uma abordagem estratigrfica convencional na calibrao dos dados ssmicos. Geralmente este tipo de abordagem revela-se incapaz de efectuar uma previso cronostratigrfica e correlao litostatigrfica realstica, muito em especial nas reas que se encontram mais afastadas das sondagens. Esta situao ilustrada na (Fig. IV.17). Nesta Figura, o horizonte R, embora seja reconhecido nos dados ssmicos como sendo um nico horizonte, trata-se na realidade de um conjunto de superfcies de discordncia. Este horizonte R, pode ser facilmente identificado ao longo de toda a bacia, mesmo noutra bacia, mas falta-lhe porm o poder de previso crosnostratigrfica. Assim, a idade dos depsitos acima e baixo do horizonte R so completamente diferentes nos trs locais onde foram realizados os poos. Sem esta informao proveniente das sondagens este seria considerado como uma discordncia nica.

    Figura IV.17 O horizonte R,interpretado na linha ssmica como umadescontinuidade nica, na realidade separasequncias de idades diferentes como sepode constatar nos trs poos que o cortam.(Extrada de Hubbard et al., 1985).

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    IV.4.3. Procedimento e critrios de correlao sismostratigrfica utilizados No presente trabalho, a avaliao do significado cronostratigrfico das descontinuidades de primordial importncia de modo a determinar quando ocorreram os principais eventos tectnicos e estratigrficos nas margens continentais Sul e Sudoeste portuguesas, nomeadamente, reconhecer e datar os perodos de maior actividade tectnica, os perodos de eroso, ou os hiatos sedimentares. A possvel contemporaneidade entre alguns destes eventos, conduzir necessariamente investigao da probabilidade de existncia de algum tipo de relao entre eles, visando estabelecer e compreender o seu papel no quadro da evoluo tectonostratigrfica do Sudoeste Ibrico durante o Cenozico. Uma vez que o objectivo pretendido efectuar a correlao tectonostratigrfica, integrando a informao resultante da interpretao ssmica e a fornecida pelas sondagens e cores, importa colocar-se um conjunto de questes que se debrucem sobre o procedimento utilizado, os critrios que presidiram seleco das descontinuidades e unidades ssmica utilizadas, e sobre os problemas e limitaes envolvidos neste processo. A correlao sismostratigrfica entre a Margem Sul e a Margem Sudoeste portuguesas encerra vrios problemas, de diferente ndole, que condicionam e impem algumas limitaes execuo desta tarefa. Estes condicionalismos e limitaes fazem-se sentir simultaneamente a dois nveis: a) a um nvel geral, afectando a globalidade do processo de correlao, e b) a um nvel especfico, dizendo respeito a questes mais locais e concretas; por outro lado, prendem-se principalmente com duas categorias de problemas: 1) problemas inerentes prpria geologia e morfologia da rea de estudo: a) a existncia de barreiras fsicas que constituem obstculos ao processo de correlao, interrompendo a continuidade lateral do registo estratigrfico, designadamente, os canhes submarinos de Portimo e S. Vicente, e o alto estrutural constitudo por rochas mesozicas, situado na zona deste canho, e que constitui uma fronteira fisiogrfica entre a Margem Sul e a Margem Sudoeste; b) a existncia de diversas estruturas que testemunham a actividade tectnica recente das duas margens e introduzem localmente quebras na continuidade estratigrfica, as quais se podero repercutir na correlao regional. Entre estas estruturas referem-se, a ttulo de exemplo, a ocorrncia de vrios cavalgamentos activos; c) a sucesso de diversas depresses e pequenas bacias controladas tectonicamente, em particular no campo de vulcanismo de lama do Golfo de Cdis, e cuja evoluo estratigrfica decorreu de modo confinado e independente em relao s bacias adjacentes, registando vrios eventos de cariz local, dificultando a correlao escala regional. 2) problemas relacionados com o tipo de dados utilizados: alguns destes problemas j foram previamente abordados e debatidos no Captulo III deste trabalho. Concretamente, em relao ao processo de correlao, salientam-se alguns aspectos: a) a utilizao de linhas ssmicas de diferentes provenincias, adquiridas e processadas com diferentes parmetros ssmicos e sistemas de posicionamento distintos. Assim, com base neste conjunto de dados com caractersticas to dspares que se efectua a correlao, o que coloca questes quanto ao rigor e preciso com que esta executada; b) a cobertura da rea de estudo por linhas ssmicas em alguns locais insuficiente para permitir ou garantir a preciso da correlao em relao a algumas descontinuidades; c) a inexistncia de sondagens realizadas em locais chave, que permitiriam calibrar estratigraficamente as linhas ssmicas datando unidades e descontinuidades, contribuindo assim para o esclarecimento de algumas questes pertinentes.

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    Tendo sempre presente, estes aspectos condicionantes e limitativos da realizao da correlao sismostratigrfica, procedeu-se, na tentativa de ultrapassa-los, diviso da rea de estudo em seis sectores distintos correspondentes a domnios morfostruturais e tectonostratigrficos (Fig. IV.18). Assim, na Margem Sul foram individualizados os sectores A- Bacia do Algarve e B- Golfo de Cdis e na Margem Sudoeste os sectores C- Planalto de Sagres-Planalto Marqus de Pombal-Canho de S. Vicente, D- Banco de Gorringe, E- Plancie Abissal da Ferradura, F- Monte Submarino e Crista Coral Patch (Fig. IV.18). Os critrios subjacentes diviso da rea de estudo nestes sectores, apoiam-se quer no conhecimento geolgico existente acerca de cada um deles (Captulo II), quer na distribuio espacial dos dados ssmicos e sondagens utilizados neste trabalho (Fig. III.1). Na realidade, considera-se neste trabalho que estes seis sectores correspondem a seis domnios geolgicos distintos, com histrias tectnicas e sedimentares diferentes, em particular durante o Cenozico. O procedimento de correlao sismostratigrfica envolveu ento, trs etapas distintas: 1- integrao de toda a informao proveniente da anlise ssmica e da calibrao das linhas ssmicas com o auxlio de sondagens e cores, em cada um dos seis domnios; 2- elaborao de um modelo sismostratigrfico para cada um dos domnios individualmente; 3- correlao final entre os seis modelos sismostratigrficos.

    A

    B

    CD

    E

    F

    Figura IV.18 - Localizao dos sectores individualizados nas margens continentais Sul eSudoeste portuguesas, para fins da correlao sismostratigrfica entre estas duas margens.Estes correspondem aos domnios tectonostratigrficos: Bacia do Algarve (A); Golfo deCdis (B); Planalto de Sagres-Planalto Marqus de Pombal-Canho de S. Vicente (C);Banco de Gorringe (D); Plancie Abissal da Ferradura (E); Monte submarino e CristaCoral Patch (F).

    Assim, a problemtica da correlao sismostratigrfica colocou-se primeiro localmente, ao nvel de cada domnio tectonostratigrfico, e s posteriormente a uma escala regional, ao nvel da correlao entre todos os domnios das duas margens. Inicialmente, a correlao efectuou-se de modo directo atravs da interseco entre as linhas ssmicas. Posteriormente, na correlao entre domnios, foram utilizados horizontes (descontinuidades) e unidades ssmicas susceptveis, de devido s suas caractersticas, permitirem estabelecer relaes cronostratigrficas entre os eventos tectnicos e estratigrficos das duas margens. Esses horizontes e unidades ssmicas receberam,

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    respectivamente, a designao de horizontes-guia e unidades-guia, por analogia com o conceito de camada-guia utilizado em estratigrafia. Os critrios utilizados no presente trabalho que permitiram identificar e classificar um horizonte (descontinuidade) como horizonte-guia, e a partir do qual se podem retirar informaes acerca da ocorrncia de eventos tectonostratigrficos, foram os seguintes:

    O horizonte distingue-se dos adjacentes porque possui um carcter distintivo e persistente que facilmente o individualizam das restantes reflexes e permitem identific-lo ao longo da linha ssmica e de outras linhas ssmicas. Pode por exemplo, apresentar uma amplitude e/ou continuidade elevada quando comparado com as outras reflexes, ou apresentar um ntido carcter erosivo. As reflexes sobrejacentes e/ou subjacentes terminam contra esse horizonte segundo um dos padres de terminao de reflexes acima descritos. Exemplo: horizonte M (Fig. IV.19). Segue-se de modo fivel e com um grau de confiana elevado ao longo de toda a linha ssmica, e tambm nas linhas ssmicas que a intersectam. Exemplo: horizonte M (Fig. IV.19). A sua distribuio espacial vasta, abarcando uma extensa rea, sendo identificado escala da bacia ou em alguns casos mesmo entre bacias. Exemplo: o horizonte M identificado em toda a Bacia do Algarve (Fig. IV.19). Separa unidades/sequncias ssmicas com caractersticas visivelmente distintas que revelam uma mudana importante de ambiente de deposio e/ou na actividade tectnica, registam, por exemplo, um aumento de subsidncia. Exemplo: o horizonte P1 constitui a base de uma sequncia com fcies distintas das apresentadas pelas sequncias subjacentes e marca o incremento da subsidncia na bacia (Fig. IV.19).

    Figura IV.19 - Exemplo de horizontes-guia: horizonte M e horizonte P1.

    Constituem o limite (superior ou inferior) de uma unidade ssmica que se destaca pela fcies ssmica que exibe, por exemplo, o topo e a base de uma unidade com fcies catica que se estende ao longo de uma vasta rea. Exemplo: os limites superior e inferior da unidade de fcies catica catica CCF (Fig. IV.20). Trata-se de um horizonte potencialmente correlacionvel entre os vrios sectores.

    Tambm algumas unidades ssmicas foram identificadas e classificadas como unidades-guia, tendo sido posteriormente utilizadas na correlao sismostratigrfica. Os critrios utilizados nesta classificao so idnticos, e alguns deles so mesmo partilhados, pelos horizontes-guia:

    A unidade ssmica apresenta fcies ssmica que permitem identifica-las facilmente e individualiza-las das unidades ssmicas adjacentes. Exemplo: a unidade ssmica CCF pela sua pela fcies catica (Fig. IV.20).

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    Figura IV.20 - Exemplo de horizontes-guia: base etopo da unidade ssmica CCF. Exemplo de unidade-guias: unidade ssmica CCF e unidade de fciesssmica transparente.

    Conservam a mesma fcies ssmica ao longo de uma vasta rea. Exemplo: a unidade BA6 de fcies estratificada que identificada em todo o sector oriental da Bacia do Algarve e a unidade catica CCF identificada na Plancie Abissal da Ferradura e na rea da Falha Marqus de Pombal (Fig. IV.20).

    Figura IV.21 -Exemplo de unidade-guia: unidade ssmicaBA6.

    A sua distribuio espacial extensa, escala da bacia, ou mesmo entre bacias. Ocupam uma posio estratigrfica caracterstica. Exemplo: a unidade de fcies ssmica transparente que ocorre sempre a topo da unidade ssmica de fcies catica CCF (Fig. IV.20). A unidade apresenta fcies e forma externa que sugerem actividade tectnica. Ex., a unidade ssmica limitada pelos horizontes rosa e amarelo, regista um episdio de movimentao na Falha Marqus de Pombal (Fig. IV.22).

    Figura IV.22 - Exemplo de uma unidadessmica que mostra evidncia de actividadetectnica. As setas a branco mostram aterminao das reflexes internas contra olimite superior (horizonte verde) e limiteinferior (horizonte rosa).

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    Uma vez que a correlao sismostratigrfica, pressupe o estabelecimento de uma relao cronostratigrfica entre as descontinuidades reconhecidas nos vrios sectores, convm colocar-se a questo sobre quais os critrios que devero ser usados na sua datao quando no existe um controlo de idades dessas descontinuidades devido inexistncia de sondagens. De facto, verificam-se exemplos em que a mesma descontinuidade pode ser identificada em alguns dos sectores das duas margens, embora a sua idade seja desconhecida. Assim, apenas possvel atribuir-lhe uma idade relativa ou especulativa com base na sua posio estratigrfica face a outras descontinuidades cuja idade conhecida, constrangendo deste modo os seus limites temporais, e enquadrando-a no quadro evolutivo regional.

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    CAPTULO IVIV.2.1. Fundamentos tericos e conceitos bsicos da Estratigrafia SsmicaIV.2.1.1. Conceito de sequncia deposicional e significado cronostratigrficoIV.2.1.2. Limites de uma sequncia deposicional: conceito e significado de discordnciaIV.2.2. Anlise de fcies ssmicasIV.2.2.1. Geometria e terminao das reflexes IV.2.2.2. Carcter das reflexes

    IV.2.3. Procedimento de interpretao ssmica utilizadoIV.3.2.2. - Discusso da metodologia utilizadaIV.4. CORRELAO SISMOSTRATIGRFICAIV.4.1. Significado de correlao estratigrficaIV.4.3. Procedimento e critrios de correlao sismostratigrfica utilizados