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TEMPO DE IMPLÚVIO 1 Geocentelha 007 Os Romanos usavam o "impluvium". Povo a um tempo preguiçoso e operoso, preferia dedicar-se aos prazeres da vida a carregar água em pesados bornais de couro para o alto do morro. Tiravam dos elementos, nos meses de chuva anual, o álibi para dedicarem-se à poesia, ao amor, à caça, aos jogos e ao desporto da guerra. Corpo preguiçoso, mente azeitada para aproveitar o gênio grego e por o mundo a trabalhar por eles. É aí que nasce o Império Romano, sub-produto casual de quem não tinha outro projeto senão viver bem a vida. Importaram mulheres contra a vontade do exportador. Para isto liberaram taxas de importação e, deslise que prosperou, até se esqueceram de pagar a conta! Hoje o povo trabalha e trabalha. Mas os romanos atuais não merecem letra maiúscula. E tudo começou naquela ilha da garoa em que até crianças (como se fosse novidade) malhavam de aurora em aurora. Morriam cedo. Por isso tinham de trabalhar muito. Hoje morrem bem mais tarde, e trabalham menos. Então devem trabalhar até morrer para manter a média. Mesmo que isto signifique falta de trabalho para muitos. (Já pensou como deve ser a Espanha, com velhinhos desiludidos atendendo nas repartições, enquanto 20% de seus irmãos não têm sequer o esporte da "lata-dágua-na-cabeça" para praticar, quando poderiam estar vibrantes pondo experiência em mister mais útil?). A tecnologia, Romana ou romana, não veio para aliviar o corpo? Então por que submetê-lo ao faz-de-conta-que-trabalha até a beira do ocaso? Para deixar os outros sem serviço? Não! É para impedir que pensem! Ninguém aí fora "agüenta" mais a famigerada criatividade brasileira. Acho que descobriram que ela não se explica em qualquer atavismo étnico-ambiental, mas nas levas de aposentados precoces que, precisando complementar parcas aposentadorias, libertos do jugo sem criação de repartições e corporações, abrem campos, criando oportunidades novas de emprego e, aí sim, ameaçando os gigantes do Mercado. Voltando ao implúvio, ele, em sua versão atual, tem outras justificações: economizar na conta de água; compensar o mais grave impacto ambiental da urbanização, o bloqueio à infiltração, capaz de gerar inundações, erosão, assoreamento, redução da vazão de base dos rios. Além disto, ele ameniza demandas crescentes por canalizações que muitas vezes apenas transferem enchentes, e que competem com recursos públicos escassos que deveriam ser direcionados para dar infraestruturas consistentes às cidades, como transporte de massa, reurbanizações, moradias seguras. Diferentemente do coletor solar, ainda mais caro do que o desejável para que se torne bem difundido, o coletor pluvial está pronto, bastando pô-lo a funcionar, fazendo um reservatório de capacidade proporcional à área de telhado, à razão de cerca de 2m3/100m2 de telhado. Residências, clubes, escolas e prédios públicos horizontais, galpões industriais e comerciais, são edificações muito favoráveis para a implantação de reservatórios mediante soluções arquitetônicas muito simples. Os usos possíveis das águas pluviais são inúmeros, contando-se entre eles recarga de piscinas, sanitários públicos, lavajatos, rega de jardins, lavagem de calçadas e resfriamento industrial. As prefeituras deveriam exigir nas leis de uso e ocupação do solo compensação integral do bloqueio à infiltração, considerado impacto ambiental intolerável. Isto seria muito educativo e econômico para o cidadão e para o ambiente global. 1 JORNAL DOS CONDOMÍNIOS, ANO XI, NÚMERO 01 (BELO HORIZONTE)

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TEMPO DE IMPLVIO

TEMPO DE IMPLVIO

Geocentelha 007

Os Romanos usavam o "impluvium". Povo a um tempo preguioso e operoso, preferia dedicar-se aos prazeres da vida a carregar gua em pesados bornais de couro para o alto do morro. Tiravam dos elementos, nos meses de chuva anual, o libi para dedicarem-se poesia, ao amor, caa, aos jogos e ao desporto da guerra. Corpo preguioso, mente azeitada para aproveitar o gnio grego e por o mundo a trabalhar por eles. a que nasce o Imprio Romano, sub-produto casual de quem no tinha outro projeto seno viver bem a vida. Importaram mulheres contra a vontade do exportador. Para isto liberaram taxas de importao e, deslise que prosperou, at se esqueceram de pagar a conta!

Hoje o povo trabalha e trabalha. Mas os romanos atuais no merecem letra maiscula. E tudo comeou naquela ilha da garoa em que at crianas (como se fosse novidade) malhavam de aurora em aurora. Morriam cedo. Por isso tinham de trabalhar muito. Hoje morrem bem mais tarde, e trabalham menos. Ento devem trabalhar at morrer para manter a mdia. Mesmo que isto signifique falta de trabalho para muitos. (J pensou como deve ser a Espanha, com velhinhos desiludidos atendendo nas reparties, enquanto 20% de seus irmos no tm sequer o esporte da "lata-dgua-na-cabea" para praticar, quando poderiam estar vibrantes pondo experincia em mister mais til?). A tecnologia, Romana ou romana, no veio para aliviar o corpo? Ento por que submet-lo ao faz-de-conta-que-trabalha at a beira do ocaso? Para deixar os outros sem servio? No! para impedir que pensem! Ningum a fora "agenta" mais a famigerada criatividade brasileira. Acho que descobriram que ela no se explica em qualquer atavismo tnico-ambiental, mas nas levas de aposentados precoces que, precisando complementar parcas aposentadorias, libertos do jugo sem criao de reparties e corporaes, abrem campos, criando oportunidades novas de emprego e, a sim, ameaando os gigantes do Mercado.

Voltando ao implvio, ele, em sua verso atual, tem outras justificaes: economizar na conta de gua; compensar o mais grave impacto ambiental da urbanizao, o bloqueio infiltrao, capaz de gerar inundaes, eroso, assoreamento, reduo da vazo de base dos rios. Alm disto, ele ameniza demandas crescentes por canalizaes que muitas vezes apenas transferem enchentes, e que competem com recursos pblicos escassos que deveriam ser direcionados para dar infraestruturas consistentes s cidades, como transporte de massa, reurbanizaes, moradias seguras.

Diferentemente do coletor solar, ainda mais caro do que o desejvel para que se torne bem difundido, o coletor pluvial est pronto, bastando p-lo a funcionar, fazendo um reservatrio de capacidade proporcional rea de telhado, razo de cerca de 2m3/100m2 de telhado. Residncias, clubes, escolas e prdios pblicos horizontais, galpes industriais e comerciais, so edificaes muito favorveis para a implantao de reservatrios mediante solues arquitetnicas muito simples. Os usos possveis das guas pluviais so inmeros, contando-se entre eles recarga de piscinas, sanitrios pblicos, lavajatos, rega de jardins, lavagem de caladas e resfriamento industrial. As prefeituras deveriam exigir nas leis de uso e ocupao do solo compensao integral do bloqueio infiltrao, considerado impacto ambiental intolervel. Isto seria muito educativo e econmico para o cidado e para o ambiente global.

BELO HORIZONTE, DEZEMBRO DE 1996

EDZIO TEIXEIRA DE CARVALHO

ERRADICANDO O RISCO

Geocentelhas 009

A Humanidade aceita conviver, em nveis estatisticamente tolerveis, com o risco. Avanos tecnolgicos, econmicos e de conscincia vm baixando os nveis admissveis. Ideal alcanar nveis baixos, e equiparados, em relao s modalidades de risco. Isto resultar de democrtica distribuio de recursos pblicos em preveno, proporcionada por oramentos baseados no princpio do investimento socialmente justificvel, conceituado como aquele suportvel pela comunidade e do qual resulta o maior benefcio social por unidade monetria investida. verdade ch que, a quem perde vida ou propriedade, no importa a via pela qual tenha sido atingido. Da justificao para o combate ao risco de forma sistmica e estrutural, segundo o princpio acima.

Contudo necessrio atentar para realidades que distorcem a priorizao de verbas, provocando assimetria entre necessidades e recursos alocados entre as modalidades de risco: nvel muito diferenciado do conhecimento dos fatores de risco e dos meios de combat-los e nvel ainda mais diferenciado do poder de obter a alocao de recursos entre os grupos sociais em exposio. Desta forma a modalidade de risco que afeta indistintamente ricos e pobres tem maior probabilidade de obter os recursos necessrios preveno, como ocorreu com a poliomielite. O risco geolgico incide com sinistra regularidade sobre camadas mais humildes da populao, e s para elas que ele tem incidncia direta capaz de torn-lo objeto central da gesto, faltando-lhes foras para inclu-lo em prioridades oramentrias e administrativas, j que sobre as camadas mais ricas sua incidncia fortuita.

Fcil demonstrar que erradicar o risco geolgico objetivo de toda a sociedade, porque os benefcios de tal erradicao revertero para ela indistintamente. Com razo, a erradicao desse risco, e com ela a de efeitos colaterais, traz benefcios para a sociedade inteira, como se demonstra: a) reduzindo a presso sobre hospitais e ambulatrios pela reduo da ocorrncia de doenas infecto-contagiosas; b) reduzindo a presso sobre hospitais e delegacias de polcia pela reduo da criminalidade; c) reduzindo o absentesmo ao trabalho e s aulas pela reduo de ocorrncias que os provocam; d) reduzindo onerosas operaes de defesa civil em geral; e) reduzindo operaes de rescaldo e as rotineiras, de limpeza de ruas e avenidas; f) pela desocupao das reas de risco no mitigvel, recriando flexibilidades de gesto capazes de criar reas verdes onde hoje exista carncia delas (em planejamento verdes so as reas que queremos verdes), e de outros equipamentos comunitrios; g) liberando recursos para outras prioridades das cidades e ativando a construo civil; h) reduzindo esta sensao angustiante de pas de terceiro mundo, que parece gostar de misria, pela incapacidade de indignar-se.

Nosso pas no precisa estar na corrida espacial para que nos ufanemos dele, porque no tem recursos e objetivos imediatos para isto, mas no precisa mendigar recursos externos caros e onerosos em termos de autonomia tecnolgica para corrigir problemas tipicamente nossos, se temos condies perfeitas para enfrent-los sozinhos: a nossa prpria tecnologia e a to propalada falta de dinheiro.

Erradiquemos em dez anos o risco geolgico e teremos em dez anos, nas cidades que o consigam, as mais ricas do pas!

BELO HORIZONTE, DEZEMBRO DE 1996

EDZIO TEIXEIRA DE CARVALHO

METRPOLE SITIADA

PRIVATE

Geocentelhas 010

Relutei antes de usar a expresso. Considero todavia que ela se ajusta s circunstncias presentes no limiar do centenrio e virada do sculo. Quais so essas circunstncias? A da diviso poltica, que reservou cidade escassos 335km2 de territrio; a da questo geolgica, relacionada minerao e realidade geotcnica; o anel de ferro populacional, parte atrada de remotas regies pelas luzes da Capital, redistribuda na RMBH por fatores como preo de terrenos, emprego, Vale Transporte(?). O resultado: saturao ou esgotamento das condies de suporte do meio fsico a um desenvolvimento de qualidade. Urge "romper o stio" configurado nesse quadro adverso. A tarefa, de porte colossal, mas no alm das foras da cidade, pode ser levada a termo se elas forem alinhadas em frentes de ao estratgica. Internamente pela implantao do conceito de assentamento geo-suportado, envolvendo erradicao do risco geolgico, reabilitao de reas degradadas e controle dos processos geodinmicos.

No espao envolvente do municpio a outra linha de ao. urgente que se d Capital dimenso de Metrpole do futuro: No pode ela continuar a exercer tal funo com os cerceamentos presentes, acumulando-a com as de maior entroncamento do pas. O feixe de ligaes que passa por aqui sobrecarrega a infra-estrutura local e no atende bem o resto do pas. Importa quebrar a excessiva radialidade com a construo de Hiperanel virio a 100km do Centro. Esse Hiperanel, com 700km de extenso, teria em seus ns cidades como Conselheiro Lafaiete, Divinpolis, Itabira, que desempenhariam funes metropolitanas. No se trata de resolver problema de trfego. Mais que isto, o Hiperanel conceito estruturante muito concreto, pois parte significativa dele tem implantao de variada categoria (p.e. o segmento Oliveira-Divinpolis), e pode ser implantado por etapas. Quando seus segmentos comearem a induzir o desenvolvimento local, a complementao ser objeto bvio de aplicao de recursos federais e estaduais. O Hiperanel no corredor de exportao, mas alavanca de desenvolvimento regional e do mercado interno, prometendo integrao econmica e cultural em rea no menor que a do Uruguai. Com ele, a RMBH dividir funes com polos como os citados.

Oportuno assinalar que isto significa concentrar populaes em ncleos menores, onde est a gua que escasseia por aqui. l que esto os materiais de construo, matria prima da estrutura fsica das cidades. Em resumo, a tarefa colossal, de dar a Belo Horizonte um futuro mais brilhante, deve ser atacada numa linha vertical, onde interviro agentes urbansticos, arquitetnicos, sociolgicos, culturais, que podero melhorar muito o aproveitamento dos recursos do territrio, e numa linha horizontal, de cunho geopoltico, que permitir engendrar um padro de desenvolvimento de que resultar imenso benefcio para a cidade e para o estado.

importante, ainda que falando em tese de solues, tecer consideraes sobre custos. O Hiperanel, como outras opes de planejamento de cunho estruturante, em verdade no implica custo a maior em relao ao atual, pois sero redirecionados investimentos hoje feitos na ptica convencional.

Tarefa nada fcil, mas Roma no se fez num dia.

BELO HORIZONTE, DEZEMBRO DE 1996

EDZIO TEIXEIRA DE CARVALHO

RISCO GEOLGICO

Geocentelhas 011

PRIVATE Quando chegam as chuvas, a expresso risco geolgico invade pginas de jornais e telas de televiso. Implantou-se depois de graves acidentes no Rio, serra das Araras, Petrpolis e litoral de So Paulo no final dos anos 60. No Rio gerou a criao do Instituto de Geotcnica, atual Fundao GEO-RIO, e em So Paulo a formao de um grupo de pesquisadores no IPT. Essas instituies, principalmente a segunda, fizeram muito pela divulgao de mtodos e tcnicas de preveno e controle do risco geolgico no Brasil. Em Minas a Carta Geotcnica de Ouro Preto foi experincia pioneira, elaborada junto ao Convnio SPHAN/UFOP/PMOP, que, aps as chuvas de 1979, promoveu trabalhos de consolidao de encostas a custo baixo, e de remoes. O tratamento da encosta da Santa Casa de Ouro Preto caso histrico de xito de solues pouco dispendiosas, com a participao de engenheiros e gelogos de entidades diversas. Lamentvel que ao extinguir-se o Convnio, o Grupo desfez-se.

O risco geolgico urbano no uma susceptibilidade nova do sistema geolgico. O fato que ele s se manifesta com intensidade capaz de fazer dele um objeto de planejamento precisamente a partir dos anos 50, quando se renem as duas condies necessrias para que se manifestem seus efeitos mais perversos: a predisposio do terreno ocorrncia do acidente geolgico e a existncia de pessoas e propriedades expostas. Esta coexistncia agravou-se muito com a urbanizao acelerada, sem controles tcnicos calcados no conhecimento dos aspectos constitutivo e comportamental do sistema geolgico, e socialmente excludente. Um problema, portanto, de gesto.

No obstante, gelogos, engenheiros e outros profissionais atuantes na rea tm feito grande trabalho, a que se devem creditar centenas e talvez milhares de vidas salvas no pas, mas eles no podem tudo e se agora a vez do Sudeste, h poucos meses dezenas de vidas perderam-se em Recife e Salvador. O fato que a eficcia de medidas locais de mitigao do risco geolgico tem limites, aqui ou no Japo. Desta forma, embora tenham sido desenvolvidas tcnicas e metodologias modernas de classificao, preveno e controle do risco, penso que chegado o momento de os gelogos serem ouvidos com ateno quando preferem condenar uma dada rea exposta a promoverem minuciosa triagem de nveis de risco que transitam continuamente entre o tolervel e o muito grave. Mais que a frieza de critrios quantitativos para aprovar ou condenar a rea, no h orientao melhor para quem cuida do caso que a ditada pela conscincia, depois de feitos os estudos indicados: condenar a rea em que no residiria.

Dada a natureza do risco em Minas Gerais, ele pode ser muito atenuado com obras simples e medidas de planejamento pouco dispendiosas quando cotejados custos e benefcios que ensejariam alcanar (economia de vidas, casas por reconstruir, televisores, caarolas e geladeiras, alm do benefcio urbanstico representado pela abertura de novos espaos para reas verdes e outros equipamentos de interesse geral).

Poucas cidades do mundo tero, como Belo Horizonte, sua disposio, definio tcnica to abrangente do problema e das solues, ajustadas ao nosso contexto (em documentao elaborada pelo Departamento de Geologia do IGC/UFMG). Lembram-se, entretanto, da plio? Qual teria sido o impacto da descoberta de sua vacina se o genial descobridor no tivesse jogado o peso de sua credibilidade e capacidade de indignar-se para que fosse avante o programa de vacinao que tantos benefcios trouxe ao pas?

O risco geolgico tem vacinas. Acho que Belo Horizonte, que vem dando passos promissores na rea, pode, no limiar de seu centenrio, colocar nas ruas a campanha da extino, como meta a ser atingida num prazo de dez anos, do risco geolgico. Estou certo de que Sabin aprovaria. Por outro lado, esta medida constituiria a melhor resposta de nossa capital ao apelo da ONU, que declarou os anos 90 a dcada da preveno dos acidentes naturais.

BELO HORIZONTE, NOVEMBRO DE 1996

EDZIO TEIXEIRA DE CARVALHO

AJUSTE EM OURO PRETO

GEOCENTELHA 024

Por mais significativo que seja o acervo histrico e cultural de Ouro Preto, no pode ele antepor-se assim to vivamente, e to prioritariamente, ao drama humano que a cidade presencia. Tenho lido apelos do pas inteiro pela preservao do patrimnio histrico, arquitetnico e cultural ali sediado. No pode a cidade deixar de reconhecer que a solidariedade do Brasil inteiro e do exterior sempre se traduziu em apoios efetivos proteo desse patrimnio, quer na reconstruo da sacristia do Pilar na dcada de 60 e em tantos outros episdios isolados, quer nas situaes dramticas geradas pelas chuvas de 1979. Naquela ocasio perceberam bem as autoridades da SPHAN, e de seu brao executivo, a Fundao Nacional pr-Memria, que tal patrimnio se amesquinha muito com a perda de uma paisagem urbana sadia, traduzida em montanhas de ondulaes verdejantes, e tambm, onde o terreno permita, de um casario alegre instalado em condies seguras, nos seus patamares mais estveis, onde resida um povo culto, alegre e prspero.

Lamentavelmente, a cidade, pela mesma dinmica de urbanizao que caracterizou praticamente todo o resto do pas nos ltimos 40 anos, ocupou as encostas de modo temerrio.

Na dcada de 80, o Convnio SPHAN/UFOP/PMOP deu cidade seu primeiro documento de natureza geotcnica, a Carta Geotcnica de Ouro Preto, como contribuio para que se buscasse organizar racionalmente a ocupao, ainda que no com proibies drsticas, pelo menos com a introduo de critrios de segurana mnimos na escolha dos locais de construo e de mtodos construtivos adequados. A Carta Geotcnica de Ouro Preto um mapa de risco que classifica o terreno em trs categorias em relao a este aspecto, desde a Classe I, de risco desprezvel, at a Classe III, de alto risco, que se recomenda no ocupar. A Equipe do Convnio entendia quela altura que isto poderia prosperar com a adeso da Prefeitura Municipal. Pesquisadores da Universidade Federal de Ouro Preto, apoiados por outros centros, deram continuidade ao trabalho, testando, aprofundando e aperfeioando os resultados da Carta Geotcnica de Ouro Preto. Embora no tenha visitado a cidade aps a tragdia recente, tenho recolhido informaes de que muitas das ocorrncias graves concentram-se sobre reas de risco iminente, no se tratando, portanto, de eventos imprevistos ou imprevisveis.

Pela dedicao desses pesquisadores, nem sempre reconhecida e respeitada, a cidade conta com tcnicos altura das responsabilidades de promover as corretas avaliaes dos riscos que efetivamente pesam sobre o patrimnio senso estrito, representado pelo conjunto arquitetnico, e tambm sobre esse patrimnio maior que representa o prprio conjunto dentro da cidade que o envolve, como um objeto uno e indissocivel.

Do exposto foroso concluir no ser suficiente concentrar ateno exclusivamente nos importantes monumentos, e que igualmente importante dirigir a ateno para o povo, em suas condies de vida e moradia, afinal seu guardio, sem cuja segurana e prosperidade eles no sobrevivero na integridade que tanto prezamos.

Cuidar agora do futuro daquela criana que perdeu pais e irmos no deve ser encargo exclusivo dos seus tios, mas de toda a comunidade ouropretana, e que isto seja o ponto de partida de uma profunda reviso, de um verdadeiro ajuste da cidade com seu povo, com vistas ao futuro de ambos.

BELO HORIZONTE, JANEIRO DE 1997

EDZIO TEIXEIRA DE CARVALHO

PRIVATE CONTAS DA ENCHENTE

GEOCENTELHA 25

Tenho defendido a coleta de guas pluviais, disseminadamente nas cidades, aproveitando telhados, que so coletores prontos. A gua coletada presta-se a muitos usos. Em situaes arquitetonicamente favorveis, como galpes, residncias, prdios escolares, poder-se-ia alcanar uma rea de coleta da ordem de 1% do territrio municipal. Admitindo coleta efetiva de 1.000mm ao longo do ano, seriam 3,35km2 x 1.000mm o volume recolhido, ou seja, 3,35 bilhes de litros, valendo 3,35 milhes de reais. Como a economia alcanada por quem implanta o sistema, creio ser fadada ao xito uma poltica de estmulo prtica, sem nus para o errio municipal. Se imposta por lei para certas situaes, como contrapartida ambientalmente justificada, rapidamente se encontrar uso para o nada incmodo recurso que cai do cu. Essa reteno evita eroses locais, assoreamento e inundaes de curta durao. Alm disto economiza energia de aduo e produtos de tratamento, dispensveis para usos compatveis com a qualidade das guas pluviais.

Pedreiras desativadas, bem posicionadas, podem comportar grandes volumes de guas pluviais, funcionando como piscines a que s falta acabamento apropriado.

Botafora e entulho, adequadamente dispostos, podem ser usados na reabilitao de reas erodidas, transformando-as em parques e campos de vrzea, reas verdes em geral (solues compartilhadas). Absorvero um dcimo de seu volume em guas pluviais, que deixaro de correr. A cada ano, se 1 milho de metros cbicos de entulho e botafora forem dispostos desta forma, so 100.000 metros cbicos anuais de espao poroso criado em lugar de terras soltas que engrossam os caudais, ajudando a reduzir as cheias. Dezenas de quilmetros de taludes urbanos aguardam uma simples mureta para conter materiais erodidos. Dezenas de vales encaixados, fceis de fechar por obras simples, esto nas vertentes da serra, como no Taquaril e nas partes altas de Venda Nova. Instalar neles diques retentores de baixo custo dar a melhor proteo para as galerias pluviais e avenidas situadas nos baixos vales.

Esses recursos, combinados com a reimplantao de vegetao arbrea em reas de risco desocupadas, alm de reduzir muito o escoamento superficial, reduzir tambm a eroso, o transporte de materiais slidos e o assoreamento, que tanto comprometem o desempenho das galerias pluviais.

Danos das cheias recentes estaro sendo corrigidos ao longo do ano inteiro, enquanto atividades econmicas esto paralisadas ou sensivelmente prejudicadas. Muitos prejuzos no so computados e se os relacionados a obras que tero de ser refeitas importam em 350 milhes de reais, provavelmente as perdas totais ultrapassam a casa do bilho, isto sem falar das perdas humanas, que no tm preo, mas que eram indenizadas razo de 360.000 dlares por pessoa na Califrnia em 1980. Os danos crescem exponencialmente com a altura das guas, e muitos teriam sido evitados se a terra no estivesse to expoliada. Para exemplificar, se o leito do Velhas estivesse menos assoreado, parte em decorrncia da sujeira levada pelo Arrudas, provvel que a ponte do trecho Lagoa Santa - Baldim no tivesse interditada.

No campus da UFMG um dique retentor de baixo custo operou um pequeno milagre ambiental e quem for vistoriar o talude da Santa Casa de Ouro Preto com uma foto de 1979 poder ver muito bem que os milagres se repetem.

BELO HORIZONTE, JANEIRO DE 1997

EDZIO TEIXEIRA DE CARVALHO

CIDADES E ESTRELAS

GEOCENTELHA 026

As cidades costumam ser comparadas a estrelas. No conjunto, vistas de cima noite, so constelaes. Aviadores pioneiros, como Saint-Exupry, em voos noturnos com mau tempo, sem bons instrumentos, buscavam-nas com ansiedade entre as nuvens, para confirmao de suas posies. Despiam-nas assim da relevncia populacional, econmica e cultural: um retalho urbanizado de 200 fogos, onde nunca tinham descido, de onde jamais veriam um rosto sequer, era saudado por eles como a prpria Nova Iorque, estivesse na orla africana ou na imensido dos Pampas.

De outro ponto de vista, podemos comparar a grande cidade a uma estrela. Sorvedouro de populaes rurais, e dos recursos do campo, verdadeiro vrtice gravtico, assumem dinmica que desafia os governos. Depois de um sculo de crescimento acelerado, algumas cidades tornam-se "gigantes vermelhas", e comeam a encolher sob a esmagadora presso de seu prprio tamanho. Para elas no se conhece a fase terminal de "ans brancas", porque energias externas so injetadas para afastar o destino inglrio, entretanto transferindo mais sustentabilidade do campo ou de estados e pases perifricos.

O Brasil tem duas gigantes vermelhas e mais oito ou dez candidatas. H dados indicando que j crescem mais lentamente que no passado: So Paulo 0,3% ao ano a partir de 1991, Rio de Janeiro 0,2% e Belo Horizonte 0,8%, sem que iniciativa maior de cunho estrutural tenha sido tomada pelo Planejador, sinal claro de deteriorao de qualidades que o homem s vezes procura instintivamente e no mais encontra. No constitui, pois, o fato motivo para muitas comemoraes, mesmo porque ao lado de So Paulo ainda cresce razo de 4,3% a cidade de Guarulhos; volta de Belo Horizonte cidades crescem acima de 5% e, o que mais importa, a mancha conurbada em verdade vai tendo seus "buracos" preenchidos.

Essas cidades no deveriam bater-se avidamente por grandes empreendimentos, quando objetivo combater o desemprego, pois, dada a divulgao nos meios de imprensa, eles s fazem acentu-lo pela atrao de mo de obra do interior e os quadros futuros da nova empresa podero contar mais gente de fora do que pessoal incorporado por absoro de desempregados locais.

O Governo Estadual parece disposto a consolidar sua Universidade feio da UNESP (Universidade Estadual Paulista), com vrios "campi" dispersos pelo interior do Estado. Esta medida que contribuir muito para a interiorizao do desenvolvimento. No obstante a RMBH continuar crescendo em ritmo intenso e precisa de interveno bem articulada entre os governos Federal, Estadual e municipais, principalmente Belo Horizonte, que pra de crescer sozinha, mas continua vendo o anel de ferro fechar-se sua volta. Considero ponto essencial dessa interveno a construo do Hiperanel virio de Belo Horizonte, que significa dar atrituies metropolitanas a plos como Conselheiro Lafaiete, Divinpolis, Itabira e outros. O Hiperanel, com extenso da ordem de 700 km, e da categoria das vias federais que passam pela Capital, proporcionaria economia e maior eficincia ao transporte de cargas que no envolvam a RMBH (interesse federal), criao de bases para o desenvolvimento geo-suportado em rea no menor que o Uruguai (interesse estadual) e desativao do cerco ameaador que se fecha sobre a Capital.

Com o Hiperanel em implantao (em alguns segmentos pouco mais que retificar e alargar trechos existentes), cria-se cenrio para investimentos privados, que dispensaria renncias fiscais dispendiosas, adotadas para a sua atrao. este insubstituvel papel de Estado, que no pode ser to pequeno, como muitos querem.

BELO HORIZONTE, NOVEMBRO DE 1998

EDZIO TEIXEIRA DE CARVALHO

VIVIANE ENFURECIDA

GEOCENTELHA 033

J escrevi sobre o grande dbito do sculo XX: ficar imortalizado como aquele em que, at o presente, maior o fosso entre os meios disponveis de promover o bem estar e sua efetiva aplicao. Leio interessante matria no Hoje em Dia sobre escritora francesa (Cultura, 13/04/97). Para mim no constitui novidade o que Viviane Forrester escreve aos 71 anos. Novidade que na sociedade narcotizada pela subverso de valores naturais, ainda haja quem tenha lucidez (ou insanidade) desse porte, e coragem para desov-la impetuosamente.

De minha ptica, e deixando de lado a vertente geolgica (2.000 anos depois de o Sbio ter pedido um ponto de apoio para mover o mundo, e que tem por corolrio ser tambm necessrio esse apoio para mant-lo, a humanidade insiste em desconsider-lo), so claras as origens da fria transformada em sucesso editorial.

No pode ser indefinidamente contrariada a natureza, agora humana, sem que o desastre sobrevenha. E isto o que est sendo feito. A tecnologia veio para aliviar o corpo, e hoje devora empregos. Persistindo no erro, at sindicatos progressistas lutam por conquistas justas, mas isoladas (reduo de horas semanais) que, realizadas, nada faro seno aprofundar o xito do modelo, e o tamanho do colapso anunciado. Pases europeus chegam a ter 30% de desemprego na base etria da fora de trabalho. Assim no h "wellfare state" que resista! Enquanto isto outros so postos a trabalhar at a ante-sala da morte. Mais cinco anos e so compulsoriamente afastados de seus postos (quer dizer, o homem no quer trabalhar e obrigam-no a faz-lo; o homem quer trabalhar e probem-no de faz-lo!). desrespeito demais ao diverso da natureza humana. Qual a justificao? As chamadas bases atuariais de financiamento do sistema previdencirio. Assim triunfa a tese da aposentadoria por idade, sem margem a opes criativas, e implanta-se o mais abrangente sistema de escravido da histria - o trabalho forado sem razo de ser.

Apague-se tudo e reflitamos sobre a diversidade dos homens. Implantemos o sistema de aposentadoria por idade mnima, sem compulsria, seno baseada em avaliao mdica e psicolgica, e integral no sentido de ser calculada com base na mdia ponderada dos salrios de contribuio. Deixe-se ao trabalhador, no importa que nvel tenha, a opo de aposentar-se por tempo mnimo de servio, mediante contrapartida ao direito de optar (por exemplo, em lugar de deixar de recolher, recolher a mais at alcanar a idade mnima). Nem todos optaro, mas todos sero livres para agir de um ou de outro modo. Optaro os que tenham projeto de vida para depois dos 50, mais criativo e estimulante que o proporcionado em seus empregos originais. Sem reflexo mais profunda alguns dizem que esses trabalhadores "livres" disputaro os empregos com os que esto entrando no mercado. Bobagem de cartesianismo incorrigvel porque experincias e aspiraes desses grupos so to dspares que isto s ocorrer como exceo e nunca como regra. Esses "alforriados" estaro iniciando negcios prprios e criativos, escorados na segurana mnima proporcionada pela aposentadoria conquistada, e estaro ampliando a base de financiamento do sistema. Como ser bonito o mundo com um cientista de 80 anos trabalhando, criando e ensinando, porque no lhe tenham tirado o sagrado direito de faz-lo, e com trabalhadores aposentados vendendo o produto de seu trabalho livre. O mundo voltar a ser mais diverso e alegre como a natureza respeitada. Muito obrigado, Viviane.

Belo Horizonte, 14/04/97

Edzio Teixeira de Carvalho

Gelogo, Membro do Grupo de Planejamento e Avaliao do PADCT/GTM (Ministrio da Cincia e Tecnologia)

GUAS DA PROSPERIDADE

GEOCENTELHA 034

As guas da chuva no so recursos naturais, enquanto no pensemos que podem ser. Enquanto isto, provocam catstrofes anunciadas, colhendo de surpresa a humanidade. H muitas maneiras de aproveitar guas de chuva, obtendo quem o faz economia para si, de 1 real por metro cbico (1.000 litros). Importante notar que esta economia de acesso democrtico porque o cidado que tem um teto j fez o investimento principal, que o telhado, seu perfeito coletor. O complemento do investimento consiste em colocar calhas e recolher a gua numa caixa, de 2.000 litros por cem metros quadrados de telhado, tampada como qualquer outra. Essa gua quase potvel, e melhor que a de muitas cidades. Pode ser usada em sanitrios, jardins, hortas, lavagem de roupas, carros, caladas, para dar exemplos comuns.

Galpes, garagens, postos de gasolina, serralherias, escolas, universidades, com telhados de grande rea, tm muitos usos possveis para as guas de chuva, alcanando expressivas economias (um galpo de 10.000 metros quadrados, de siderrgica ou supermercado, coletando dois teros da chuva de outubro a maro, economiza 1.500 reais por ms).

De outro ngulo, quem usa gua de chuva ajuda a controlar enchentes, eroso, assoreamento; a evitar a morte gradual dos rios; a diminuir o consumo de produtos de tratamento e de energia de aduo; a reduzir o nmero de desabrigados; a reduzir outros estragos (os ltimos levaro tempo para serem corrigidos e pararem de dar prejuzos). J escrevi que se forem implantados coletores em telhados, que representem 1% da rea de Belo Horizonte, a economia anual alcanada ser da ordem de 3,35 milhes de reais. A indireta, podem crer, muito maior, porque, alm do benefcio ambiental e econmico, a efetiva educao da resultante vai fazer o povo abrir os olhos para outros grandes desperdcios que esto por a, condenando o pas a no alcanar prosperidade alguma. Isto justifica que governos pratiquem a renncia fiscal em instrumentos de gesto que estimulem a coleta de guas pluviais, sem desembolso direto, contrariamente ao caso dos piscines de So Paulo, que tipificam soluo onerosa, irreprodutvel, deseducativa e com objetivo limitado ao combate s enchentes. guas de chuva aproveitadas so as guas da prosperidade; em caso contrrio so as do luto e da pobreza.

O manejo das guas de chuva compreende outras vias de grande repercusso ambiental e econmica, mas no as querem e ficam nesse nhenhenhm que no vai resultar, porque segue a linha de sempre, que produziu os resultados conhecidos. Dir-se- que a proposta no elimina enchentes, e verdade, mas contribui e fato evidente que retirar meio metro no nvel do rio que transborda faz a diferena entre perturbao tolervel e catstrofe.

Para terminar: entidade internacional concede certificado de qualidade a empresas que zelam pelo meio ambiente. Entre contempladas com o diploma esto muitas que, com imensos telhados no aproveitados, contribuem para o maior dano ambiental imposto s reas urbanizadas (por a se vendo que no temos muitos de quem copiar).

BELO HORIZONTE, 18/04/97

EDZIO TEIXEIRA DE CARVALHO

PRIVATE RECEITA DE DESASTRE

GEOCENTELHA 035

Siga a receita, que o xito certo. Proteja o territrio como sempre fez, mantendo fronteiras. Persista por 300 anos, em fogo alto, passando a brando. No ligue para a sua qualidade, que se pode tirar da quantidade. Afinal, voc no a Holanda, que precisa conquistar palmo a palmo o cho que pisa. Voc pode destru-lo pouco a pouco. Voc dispe de mais dois sculos para queimar. Siga em frente e produza o desenvolvimento fazendo seus buracos. Saiba que essa riqueza um dia ser chamada a tap-los, mas isto daqui a sete geraes e seus filhos devem ter prioridade sobre netos de seus trinetos. Para no legitimar acusaoes de desleixo, monte um monturo de leis proibitivas e fixe que no se parcelar o solo urbano no terreno de declividade maior que 30% (alguns se julgaro seguros abaixo dos 30%, e morrero, mas no por isto se dir que a lei assassina, afinal ela nem sabe que existe). Proba que nas margens do rio estreito seja arrancada a lngua arbrea de 50m de cada lado porque disto depende sua preservao; se ele for mais largo, que tal 200m? Para aumentar na convico do povo essa sensao de zelo, monitore a baa que morreu, o rio que virou esgoto, e todos os filhos de seu pecado ambiental, porque medir seu tamanho mais fcil que suprimi-lo. Para isto, compre dos alemes aqueles aparelhinhos danados, capazes de detectar rastros sutis do pecado venial, e de arquiv-los em via digital. No crie um mercado aqui, bobagem! L fora existe um pronto para comprar soja, carne (sem aftosa, ento de frango), e o minrio. Financie o corredor de exportao, que os juros so baratinhos, como o seu povo. Combata o desemprego urbano atraindo indstrias, que vo faz-lo crescer, como bvio, e quanto ao geral, faa como Europa, boa companhia, e ponha o povo a trabalhar aos setenta, mesmo que fiquem sem trabalho 30% dos menores de 30 (mesmo que Europa erre, plagie-a!). Crie mais trs ou quatro gigantes vermelhas, como o Rio e So Paulo, e pague por metro quadrado desapropriado para novas avenidas at cem mil reais, pois o povo est a para isto mesmo. Expulse pedreiras do meio urbano, que mais fcil que conter a populao que se aproxima delas. O preo a maior pelo frete, paga quem constri; a estrada sobrecarregada, por ela paga o povo; um pouco de efeito estufa a mais nem ser notado. Deixe o povo ocupar buracos, que outros investimentos urge fazer, como limpar a baa, como limpar o rio, como desassorear a represa. Voc sabe que a ocupao dos buracos traz efeitos danosos, mas difusos, e para aliviar a conscincia, vamos relembr-los para que veja como so pequenos: contaremos com a pobreza permanente dos que para l vo, porque perdem geladeira e fogo a cada ano; nas guas, vamos ser pacientes com faltas ao trabalho, afinal descontadas, e escola; sobrecarregaro postos mdicos os resfriados infantis; no teremos como recolher o lixo, nem to volumoso; a patrulha vai rodar por fora e circunscrever o crime; crianas vo desgarrar-se das famlias, mas so s dezenas; e bem que naquele buraco cabia rea verde, mas a cidade tem outros locais para instal-la. H secretarias da educao, sade, segurana, meio ambiente, cultura, esportes, lazer e turismo. No ficaro desassistidos. Pensando bem, melhor que Manchester em 1800! No permita o uso das guas pluviais. Deixe que rolem por a, pois voc tem tecnologia para control-las e no de fazer economia de palitos. Economia mesmo voc j fez: economizou em todas as profisses (veja bem!, que se dizem necessrias!), entre elas 50.000 gelogos, que nem chegou a formar, e com aquelas leis imperiais economizou tambm os que formou. Para os que sobraram sempre resta um terremoto a explicar. (Estranhos seres, no mesmo?) Daqui a sete geraes, importe holandeses, prontinhos, que agora urge socorrer o banqueiro!

Belo Horizonte, junho de 1997

Edzio Teixeira de Carvalho

Gelogo, Membro do Grupo de Planejamento e Avaliao do PADCT/GTM (Ministrio da Cincia e Tecnologia)

REFLEXO SOBRE A GUA E SEU GERENCIAMENTO

GEOCENTELHA 038

Dimenses da gua. Quem abre a torneira no pensa em coisa to abstrata, principalmente em Belo Horizonte, que tem servio bom quanto a este aspecto. importante considerar que essa gua da torneira resulta da soluo gerencial da dimenso suprimento. Outras dimenses capazes de exigir o empenho de governo so: a dimenso agente de processos geodinmicos e geotcnicos e a dimenso veculo de poluentes e contaminantes. A primeira refere-se gua promovendo eroso, assoreamento, inundaes, escorregamentos; a segunda ao seu papel no transporte de poluentes e no suporte a formas de vida capazes de veicular doenas, como a famigerada dengue. guas contaminadas, alm de afetarem a sade de pessoas e animais, podem entrar na circulao subterrnea nas zonas de recarga de aqferos, comprometendo a utilizao futura. Isto dissipao da sustentabilidade, comprometendo economia e qualidade de vida de nossos bisnetos, infringindo normas do direito inter-geraes.

As qualidades da gua. gua de beber e cozinhar gua potvel. Outras qualidades existem: guas minerais, algumas to carregadas de sais que tm sabor e cheiro desagradveis, embora recomendadas com fins teraputicos, ou para banhos de imerso. guas para elaborao de remdios, cosmticos, bebidas e outros produtos de uso corrente podem exigir especificaes outras. guas de uso em banheiros, de lavar roupas, veculos, caladas, mquinas, equipamentos; guas de rega; guas de uso industrial, como no resfriamento de peas usinadas, dispensam condies de potabilidade. Menos de 10% da demanda de gua exige tais condies. Quais so as conseqncias do que se acaba de expor? Que, generalizando o uso da gua potvel para fins que no requeiram tal qualidade, estamos dispensando recursos que sustentariam outras formas de suprimento, que no passam por onerosos aduo, tratamento, distribuio. Entretanto o maior custo pode ainda estar escondido, objeto de consideraes a seguir. Com efeito, no utilizar guas pluviais significa que elas rolaro por a promovendo eroso e outros distrbios, exigindo investimentos pesados em canalizaes, que, como estruturas-meios, no so geradoras de riqueza, alm de transferirem cheias para as reas situadas rio abaixo (pontes ruram h um ano por causa das descargas acentuadas pelos sistemas de canalizaes urbanos). A sub-utilizao dos manaciais subterrneos, alm de ter efeito semelhante ao do caso anterior, deixa meio sem sentido o justo apelo de proteo das reas de recarga. Como est a gesto das guas (centrada no suprimento), prejuzos econmicos e ambientais sero crescentes.

Gerenciamento sustentvel. Deve obedecer a trs princpios: Limitar ao mnimo a transferncia de gua do Campo para a Cidade porque isto diminui a sustentabilidade que pertence ao Campo, at para que ele possa atender adequadamente a outras demandas da cidade cuja satisfao depende de gua; ajustar o suprimento demanda, dos pontos de vista quantitativo e qualitativo, o que significa, p. ex., usar guas de chuva em lavajatos, usar gua subterrnea onde condies hidrogeolgicas sejam favorveis (a respeito das guas pluviais, incompreensvel no serem usadas regularmente em instalaes que tenham grande demanda por gua no potvel, tendo tais estabelecimentos grandes telhados arquitetonicamente simples para a coleta); finalmente introduzir o uso sequencial, em que guas efluentes de uso nobre sejam usadas para fins menos nobres.

Riscos de perdas de mananciais: A Pampulha j contribuiu para o abastecimento de Belo Horizonte. Sua substituio, devida eutrofizao, significou transferncia da demanda para outros componentes do sistema. Se a Pampulha fosse regio industrial, haveria demanda para a sua gua, e mesmo assim permaneceriam motivaes para a recuperao do importante manancial pelas suas outras funes. Isto possvel e considero estar no propsito da PBH e no acalentado anseio de todos ns. Em situao similar da Pampulha, com 30 anos de atraso, encontra-se Vargem das Flores. Que no passe pelo efeito orloff de seguir a Pampulha, o que seria perda de sustentabilidade, exigindo recursos vultosos para a correo, que, diferentemente da construo de boas moradias e vias pblicas, no seria, em si, obra geradora de riqueza, embora inadivel.

Tecnologia. A adoo do gerenciamento baseado em poltica unificada, envolvendo as trs dimenses de gesto e as trs fontes de suprimento, com a aplicao dos princpios acima expostos, exeqvel no contexto tecnolgico atual e encerra desafios para os profissionais envolvidos com a gesto de recursos hdricos, entre os quais engenheiros, urbanistas, arquitetos, gelogos, gegrafos e advogados.

Belo Horizonte, 30/04/98

Edzio Teixeira de Carvalho

Gelogo, Membro do Grupo de Planejamento e Avaliao do PADCT/GTM (do Ministrio da Cincia e Tecnologia)

GESTO DE RECURSOS HDRICOS

GEOCENTELHA 039

A decantada Sustentabilidade tem sido usada em discursos como algo supostamente conhecido de todos. Descontextualizada, vaga abstrao. O concreto que toda a sustentabilidade fundamental repousa no sistema geolgico, cuja abrangncia vai do centro da Terra at os limites de seu campo gravitacional. Essa sustentabilidade fundamental organiza-se em pelo menos 4 grupos de fatores geolgicos da sustentabilidade: recursos minerais (inclusive o solo que sustenta a cobertura vegetal); recursos hdricos; condies de suporte fsico aos assentamentos humanos; condies (limitadas) de absoro de impactos ambientais.

O verdadeiro desenvolvimento requer a mobilizao coordenada dos fatores da sustentabilidade. Assentamentos em que isto se faz levando em considerao os aspectos constitutivos e comportamentais do sistema geolgico, e que poderiam ser chamados assentamentos geo-suportados, tendem a produzir um desenvolvimento econmico efetivamente sustentvel e ambientalmente sadio.

Muitos assentamentos humanos, a Cidade em primeiro lugar, so grandes redutores da sustentabilidade global na medida em que mobilizam discriminadamente alguns desses fatores em detrimento de outros.

O melhor exemplo d-se com a gesto dos recursos hdricos. Estes comportam trs dimenses de gesto: a dimenso suprimento, a dimenso agente geodinmico e geotcnico e a dimenso veculo de poluentes e contaminantes. Por outro lado, podem ser buscados em pelo menos trs fontes distintas: mananciais superficiais, mananciais subterrneos e guas pluviais.

A via geo-suportada, nica capaz de gerar desenvolvimento sustentvel dos pontos de vista econmico e ambiental, realiza-se pela adoo da gesto unificada dos recursos hdricos, atravs da qual se combinam do modo harmnico as dimenses de gesto acima referidas e as fontes de suprimento.

Na perspectiva acima exposta os operadores do sistema nas cidades deixam de ser apenas a Concessionria (dimenso suprimento) e a municipalidade (dimenses relacionadas ao descontrole do regime hidrolgico) e passam a incluir cada cidado e cada empresa.

No h sada fora disto.

Belo Horizonte, maio de 1998

Edzio Teixeira de Carvalho

Eng Gelogo - Membro do Grupo de Planejamento e Avaliao do PADCT/GTM (Ministrio da Cincia e Tecnologia).

E O CLARO RAIO ORDENADOR, QUEM O MOVER?

GEOCENTELHA 041

Pois : o Poeta, com sensibilidade peculiar, j entristecido com a sua amada Itabira, estende um olhar compassivo, mas no resignado, sobre a serra do Curral, e pede uma interveno divina, descrente dos humanos. Os escombros da cirurgia mineral so para ele um emblema, uma ilustrao circunstancial da colossal tragdia que j ento reportava.

Hoje chamam profetas da catstrofe os que de forma potica ou no reclamam a interveno corretiva. So, tanto quanto Jeremias, reprteres e no profetas, porque apenas viram antes dos demais a borrasca j formada. Mas a capacidade de escamotear seus verdadeiros contornos ilimitada.

O Mxico entra em bancarrota porque ocupa mal e porcamente seu territrio, concentrando num gigantesco buraco sem ventilao, sem gua, sem ter para onde remover seus resduos, sobre camadas de argila ultra-sensvel, afetado por notria sismicidade, mais de 30% da populao (pior s dentro da cratera do Mauna Loa); constri a custos colossais, e com tcnicas indiscutivelmente refinadssimas, gigantescos espiges, como a Torre Latina, e inmeras outras estruturas sismo-resistentes, para isto drenando colossais quantidades de fatores de sustentabilidade de todo o territrio, em detrimento do restante do pas. Qual o diagnstico da bancarrota? Quebrou por problemas cambiais. No Sudeste Asitico, surgem como por encanto os tigres, literalmente de papel. No h que repetir o que j se conhece, mas o desrespeito Terra e ao Homem, e no h como desrespeitar um sem faz-lo ao outro, encontra a nveis de qualidade total. Um aviso para ns (ainda) detentores (formais) da Amaznia: as madeireiras, depois de limparem as pennsulas e o gigantesco arquiplago, j esto chegando. A Unio Sovitica deixou escombros por todo lado, entre os quais o sarcfago de Chernobyl, de onde exala o hlito pestilento da morte nuclear, com a olmpica, britnica, fleugmtica indiferena de Europa, a Reluzente. Mas agora a coisa pegou de vez, porque o Japo o emblema maior do triunfo da objetividade, da praticidade, da eficincia, do primado da livre iniciativa. De fato, apoiado na formidvel capacidade do povo japons, operou-se ali excepcional aproveitamento da sustentabilidade alheia, toda ela de origem geolgica (minrios, energia, solo arvel e recursos hdricos, estes transferidos indiretamente via madeiras, produtos alimentcios, fibras vegetais e muitos outros), e promoveu-se uma das maiores acumulaes de capital da histria, que, no sendo comestvel ou desfrutvel por qualquer outra via direta, fica doido procura da nica funo que sabe exercer, que a de reproduzir-se prolificamente, despertando inveja nas ratasanas. Dizem que emprestaram mal o dinheiro e por isto a recesso teimosa de quase dez anos. l que, provavelmente por tambm terem desaprendido bastante de conhecer (e por conseqncia respeitar) a Terra, fizeram estruturas sismo-resistentes em profuso, uma das quais um ridculo elevado com a inrcia toda do tabuleiro montada sobre pilares centrais esbeltos como um obelisco, e que ruiu fragorosamente sob as vibraes de um sismo bastante previsvel, assim como o pandeiro no dedo do sambista embriagado. demais dizer que a perda de 27 entre 30 grandes estruturas de atracao do porto de Kobe (equivalente para o Japo ao nosso porto de Santos), afundadas no lodo liquefeito, deva responder por este solavanco momentneo da economia japonesa.

No custa recomendar aos que traam e definem as polticas econmicas mundiais e brasileiras que a Economia verdadeira, no esta coisa que est por a, cujo vocabulrio est, merecidamente, s portas da morte por inanio, pode nutrir-se melhor no conhecimento da Terra e do Homem. Este conhecimento, e respeito conseqente, ter o efeito do advento do claro raio ordenador reclamado pelo Poeta Maior.

No h muito espao, todavia, para otimismo a curto prazo porque nenhum dos inmeros candidatos a Presidente ou Governador revelou at aqui conhecimento, ou pelo menos preocupao, com a constituio, e portanto possibilidades de nossa terra, algo assim como ser-lhes indiferente governar o Brasil, Minas, So Paulo, ou as Ilhas Virgens.

Belo Horizonte, 23/09/98

Edzio Teixeira de Carvalho

Gelogo, Membro do Grupo de Planejamento e Avaliao do PADCT/GTM (do Ministrio da Cincia e Tecnologia)

A TERCEIRA VIA

GEOCENTELHA 042

A primeira via a at aqui triunfante na medida em que tem arrastado adeptos e no adeptos, estes por no terem sido capazes de oferecer alternativas viveis. a do Mercado totalmente livre, sem Estado incmodo a por-lhe empecilhos pelo caminho. A segunda a do Estado forte, executor, nas verses do socialismo autoritrio, do Estado democrtico do bem-estar e do Estado sobranceiro de perfil salvacionista. Buscam agora a terceira via, porque as duas, filhas siamesas do mesmo pai, na medida em que a segunda em verdade uma resposta primeira, esto esgotadas. No h sinal mais claro de que, afinal, se convenceram de que nenhuma das duas presta. Atentemos, portanto: quem carrega a proposta no excludo, ou no-alinhado, mas os responsveis pelos dois experimentos igualmente fracassados, e pelo fato de o sculo XX chegar a seu termo com um contingente de miserveis, excludos e indigentes maior que a populao total do mundo em qualquer sculo precedente.

Falharo de novo, porque ambas as vias que se pretende substituir cometeram o erro fundamental de desrespeitar a Terra e o Homem, ao mesmo tempo, porque no possvel desrespeitar um sem faz-lo ao outro e vice-versa, e porque est muito claro que esto dispostos a continuar nesta linha.

Aos fatos: a tecnologia veio, supostamente, para aliviar o corpo e liberar o esprito. No fez uma coisa nem outra: O corpo est cansado e o esprito dilacerado.

O Estado democrtico do bem-estar social, ponto de partida possivelmente interessante para a meia-sola proposta, cometeu o erro de implantar o mais sutil e abrangente sistema de escravido que j se abateu sobre as pessoas na histria da humanidade (aquela escravido que, de to sutil, desejada, o Emprego nas base em que est posto, e no o Trabalho que realmente dignifica o Homem): Instituiu a aposentadoria por idade, sob a alegao de que a nica compatvel com o financiamento da seguridade social em bases atuariais. Na outra ponta veio o desemprego, note-se, muito maior na base da PEA (Populao Economicamente Ativa), desta forma pagando sob outras rubricas o rombo que alega evitar. Seu contingente de aposentados velho, incapaz de lanar-se a empreendimentos criativos, quando deveria ser novo, com condies de trabalho livre (pela primeira vez na vida), e capaz de ampliar a base de financiamento do sistema, gerando opes para quem chega idade de trabalhar. (Essa aposentadoria, espcie de carta de alforria, no pode ser mais tardia que aos 55 anos). Mas o desrespeito ao Homem vai alm, e nos casos em que est de bem com o trabalho que faz, aos 70 anos o cidado mandado para casa quer queira, quer no queira. Esse modelo de Estado errou no menos tragicamente ao desrespeitar a Terra, sob seu prprio cu, mas principalmente alhures. Recebe o reflexo do fato de que bem se esqueceu: de que o planeta pequenino e o ponto mais remoto est porta da cozinha.

Pas como o Brasil no pode alegar que a globalizao fato inelutvel, porque dos poucos que dispem de base tecnolgica e territorial capaz de habilit-lo a desenvolver a terceira via, autnoma, e no a ficar aguardando a meia-sola (alis engendrada por quem?), que acabar por aceitar, enquanto torce para que os EUA baixem a taxa de juros, como se eles estivessem a para ouvir nossos anseios.

Para habilitar-se ao desenvolvimento de sua prpria terceira via, nica sada que nos resta, tem de comear por conhecer a Terra. Isto o ajudar a conhecer melhor o Homem. Passar a respeitar um e outro vir por conseqncia.

Belo Horizonte, 20 de setembro de 1998

Edzio Teixeira de Carvalho

Gelogo, Membro do Grupo de Planejamento e Avaliao do PADCT/GTM-MCT

A FALTA QUE FAZ A GEOLOGIA

GEOCENTELHA 044

Pensam que natureza flora e fauna (pensam e agem). A quem, sem muitos companheiros, pensa diverso, resta pensar (e reagir). Bernard de Palissy dizia que o mais importante dos livros a Natureza. No preciso ir longe para comprovar que a leitura geolgica, quanto a sua difuso na sociedade, ficou defasada das outras leituras, necessariamente fragmentrias, sem suporte geolgico. Isto caracterstica da viso cartesiana, analtica, potencializada pela mecnica newtoniana, que, se nos levou Lua, gerou esta prola de dito popular cada macaco no seu galho, que infelicita a humanidade desde antes que um annimo a cunhou. Da geologia s quiseram o caminho das pedras, onde esto os minerais teis, no importando o sutilssimo metabolismo planetrio, seno para explicar um terremoto. Hoje todos so especialistas e o prximo passo comearmos a ver naes especialistas.

No fcil sair da crise. Ser impossvel, sem a geologia explorada em seu inteiro potencial. A prpria lgica cartesiana permite comprov-lo. Relembro fatores geolgicos da sustentabilidade fundamental: Recursos minerais (inclusive solo que suporta flora, fauna e atividade rural); gua; condies de suporte aos assentamentos humanos; condies (limitadas e geodeterminadas) de absoro de impactos ambientais. Essa lgica ajuda a ler a equao seguinte: Sistema Geolgico + Ao Humana ( Sistema Tecnognico. Este, gerado pela tecnologia humana, depende no s da vontade, mas tambm das caractersticas constitutivas e comportamentais do sistema geolgico, como o resultado da cirurgia depende da anatomia e fisiologia do paciente. Se o sistema geolgico relegado como um detalhe, o tecnognico escapa ao controle, como na reao em cadeia da bomba atmica. Este o resultado lgico da manipulao emprica dos fatores da sustentabilidade, como se pudssemos todos ficar por a a operar fgados e coraes (que diriam os mdicos?). O nico setor em que a geologia atua sistematicamente a pesquisa mineral, e revelou recursos como o petrleo, que seriam desconhecidos sem seus mtodos. Ainda nessa lgica, at Bacon, ferrenho utilitarista, dizia que a natureza s ser comandada se lhe prestarmos obedincia. Concluo: no possvel obedecer, seno por ato de f, a algo que se desconhece. Vou alm: precisamos de criatividade, mas no possvel ser criativo operando sobre sistema ignorado!

Nada a estranhar sobre o uso do conhecimento geolgico centrado nos recursos minerais metlicos e energticos. Com efeito o nico fator da sustentabilidade fundamental que faz brilharem os olhos dos planejadores de governo e das corporaes.

Extinta a licenciatura da histria natural, acabou a educao geolgica como pilar da formao geral, to importante quanto o ensino da lngua para a construo de uma nao. Criados bacharelados de geologia em 1956, formatados para alavancar a indstria mineral, e no para promover ampla e fenomenolgica leitura do territrio brasileiro, so 18 no pas, formando menos gelogos que a UFMG forma de mdicos. Temos 1 gelogo (nominal) por municpio brasileiro. A pensar naquele dito popular, no h gelogos para os galhos que deveriam ocupar. A ausncia da geologia prejudica toda a pedagogia do restante, a filosofia, a compreenso da inteireza do Homem, toda a ordenao jurdica, toda a economia e toda a engenharia, porque lhes esconde o desafio de operar a equao acima no desenvolvimento de filosofias, critrios e tecnologias operativas para cada contexto geolgico.

No fcil sair da crise, repito, mas h fato positivo nela, que o de serem bem conhecidas causas remotas. Em Contagem e Betim pequenos experimentos em curso sob orientao geolgica, com outros poucos, so como um vrus da prosperidade, que levar 100 anos para contaminar o pas. Em contrapartida, imperam e prosperam vises aterrorizantemente reduzidas em torno de questes nacionais como o futuro da Amaznia e a transposio do So Francisco, e locais, como evitar que Vargem das Flores imite a Pampulha. Tal prazo precisa ser encurtado. Presidente, Governadores, Ministro, Secretrios da Educao, Reitores, deveriam parar para pensar que podem estar cometendo crime contra a Terra (contra o Homem, contra a Economia, enfim) possivelmente capitulvel (por omisso) na Lei de Crimes Ambientais, no cuidando da criao da licenciatura geolgica, com orientao pedaggica que v muito alm do show geolgico de vulces e terremotos que invadiu a televiso a cabo e que ajuda pouco.

Belo Horizonte, 27 de outubro de 1998

Edzio Teixeira de Carvalho

Gelogo, Membro do Grupo de Planejamento e Avaliao do PADCT/GTM (Ministrio da Cincia e Tecnologia)

A LUZ NO TNEL

GEOCENTELHA 048

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Tenho um amigo, o Antnio Cludio, que acumula habilitaes de gelogo, engenheiro e mdico, adquiridas nesta ordem. Na geologia especializou-se em geofsica e geologia de engenharia. Em geofsica, depois de especializao feita em Barranquilla nos anos 60, na rea de petrleo, notabilizou-se por excepcional criatividade em reas aplicadas engenharia e pesquisa de guas subterrneas. J engenheiro civil, sem deixar a geofsica, cursou medicina na UFMG, ocasio em que nos contava ter encontrado grandes similaridades entre a medicina e a geologia. Acabou por inspirar-me o modelo antropomrfico do sistema geolgico, e tenho dito a amigos mdicos que, no obstante ser o Homem sistema infinitamente mais complexo que o geolgico, , se cabe a expresso, infinitamente mais homogneo que este, nenhum de ns sendo minimamente diferente de Ramss, como no sero de ns nossos descendentes nos prximos 1.000 anos.

Em finais da dcada de 60 do sculo passado, franceses e italianos empreendiam a primeira travessia, por tnel, dos Alpes. Ia mal a obra, nas duas frentes, com cronograma atrasado em dois anos, em virtude da maravilhosa heterogenenidade do sistema geolgico local, que provocava imprevistos freqentes, acidentes, mortes. Estava difcil segurar os operrios. Entra na histria Angelo de Sismonda, estudioso da geologia dos Alpes, na Universidade de Bolonha. Contratado, dedicou-se a levantar rigorosamente a geologia ao longo do traado, com base nos dados colhidos nas duas frentes e em meticuloso trabalho ao longo do perfil do terreno sobre o tnel na poro ainda por escavar. Com base nesses estudos, elaborou uma previso dos tipos de rochas que seriam escavadas, e seus respectivos problemas, que seguia atualizando medida que a escavao avanava. A obra retomou seu ritmo sem percalos, com reduo drstica de imprevistos, acidentes e tempo de execuo. Foi to excepcional o acerto de suas previses que sobre ele os operrios, agradecidos, cunharam, uma frase clebre: Para os sbios as montanhas so transparentes. O que fez Angelo de Sismonda? Foi a luz no tnel. Iluminou o sistema geolgico, dando aos engenheiros a oportunidade de exercer sobre o sistema, j agora conhecido, sua criatividade executiva. Nos anais da histria das obras figura, no obstante, a introduo de perfuratriz a ar comprimido como elemento decisivo para a reduo do tempo de execuo! Que podemos concluir, seno que a Tecnologia pensa que venceu sozinha o desafio, e no que, ajudada pelo conhecimento oportuno, pde realizar proesa de inegvel envergadura?

O uso da tecnologia adequada, sobre sistema conhecido, pode operar maravilhas. Todavia muito mais complexo que resolver um problema pontual articular o uso da tecnologia em busca do desenvolvimento e da prosperidade. Na educao vigente, nas conformaes estamentais vigentes, na legislao vigente, na economia e engenharia vigentes, prosperam a excessiva especializao das pessoas e, logo, logo, das naes, onde s se enxerga, qual esfinge, a desafiadora frente do tnel, sem se antever o caminho a percorrer.

Ver a dilapidao dos fatores geolgicos da sustentabilidade como condio sine qua non para o desenvolvimento demais para quem, sem pretenso de sbio, (pelo contrrio, humildemente ciente da prpria impotncia em meramente mostrar esse caminho) enxerga atravs do tnel no escavado, paga impostos e ainda tem de ouvir pitos de presidente que se auto-deifica, no horrio nobre, e a arrogncia vazia de seus mitolgicos mirmides. demais, convenhamos. Enquanto no retorna a sensatez, aprendamos com humildade do maior legado egpcio: a preservao, ao longo da nada menos que 50 sculos, dos fatores geolgicos da estreita sustentabilidade de que dispunham, ns que vamos tenazmente dissipando os nossos em pouco mais de um e meio. Afinal, tambm eles, de suas tumbas imortais, tero que ouvir o eco do despeito grego (que at considero injustificado) nas salas escolares do sculo 21 (O Egito uma ddiva do Nilo).

Belo Horizonte, 14 de novembro de 1998. Edzio Teixeira de Carvalho

Gelogo, Membro do Grupo de Planejamento e Avaliao do PADCT/GTM (Ministrio da Cincia e Tecnologia)

A REVOLUO GEOLGICA (III)

GEOCENTELHA 055

O mundo acorda agora para o problema da gua? Ao contrrio, debate-se com ele h milnios. A Revoluo do Regadio, em mais de um foco independente, foi resposta tecnolgica e estamental escassez local, ou sucesso de excesso e falta, que o caso atual em muitos pases. A gua provoca guerras, nas quais eventual motivao religiosa no passa de pretexto. Indianos e paquistaneses (irmos) brigam entre si pelo controle do castelo de guas da Caxemira; as colinas de Golan so menos um baluarte militar e mais propriamente estratgica caixa dgua; portugueses e espanhis acertam diferenas antigas sobre o Guadiana, com curso em parte compartilhado, e nas bacias do Tejo e Douro onde espanhis esto a montante e portugueses a jusante; a Argentina, no sem razo fundamentada, j reclamou na ONU das aes brasileiras em Itaipu e em desvios nas cabeceiras do Paran, cobrando compensaes.

Sem pas fronteirio de quem reclamar, a gua prega peas Inglaterra: de tanto usar as guas subterrneas da bacia de Londres, viram os ingleses o lenol fretico ou a superfcie piezomtrica localmente baixar at mais de cem metros, em processo comeado no sculo XIX. Construes do metr e outras construes subterrneas foram feitas neste sculo em terreno drenado. Todavia os custos crescentes de extrao de guas subterrneas, devidos a esses rebaixamentos, combinados com custos menores de tratamento de guas superficiais, decorrentes de melhor controle ambiental dos rios, tm provocado o retorno s guas superficiais por grandes consumidores, e obras subterrneas executadas em terreno drenado enfrentam o fenmeno da sub-inundao, com custos crescentes de drenagem para evitar transtornos previsveis.

A Rssia usou intensamente as guas do Volga na agricultura, reduzindo a uma frao da original a descarga para o mar Cspio. Logicamente o nvel deste baixou devido perda de parte da descarga do maior tributrio? Surpreendentemente no: o mar Cspio sobe gerando transtornos em praias e instalaes porturias, sem alteraes climticas e movimentos crustais que possam explic-lo (contrariamente ao agonizante mar de Aral, que vai secando pelo excesso de consumo na agricultura). Para o Cspio, simplificando e admitindo que a bacia de contribuio tenha rea 10 vezes maior que a do lago, a cada 10 metros de rebaixamento do lenol fretico, com porosidade efetiva de 5% (nmeros hipotticos), teramos uma lmina dgua de meio metro retirada do reservatrio superficial, que est fluindo para o mar Cspio, onde formaria lmina adicional de 5 metros; se descontarmos a perda devida reduo da descarga do Volga e o acrscimo de evaporao direta de um lago com superfcie um pouco maior, entramos na ordem de grandeza da subida de nvel do mar Cspio. Se o fenmeno for apenas este, possvel estimar o limite dessa subida de nvel. O nvel do mar global pode ter subido na ordem de centmetros no ltimo sculo por este fenmeno, devido a todas as intervenes humanas que tendem a promover o rebaixamento do lenol fretico. No sei se h marcos precisos e estveis para medir tal ascenso, e se ter sido feita (na falta desta medida direta, o mar Cspio, que fechado, seria excelente laboratrio para aferio do mecanismo exposto). Importante lembrar que oscilaes do nvel do mar em reas tectonicamente instveis no podem contar, como as evidenciadas nas colunas do templo de Serpis na Itlia, que, de acordo com o exame de crustceos a elas aderentes, subiu e desceu alternadamente desde o perodo romano.

Se no Brasil, em 4 milhes de quilmetros quadrados, o lenol fretico desceu 10 metros em mdia, com 5% de porosidade efetiva, so 2.000 quilmetros cbicos de gua que perderam sua moradia temporria. Sem casa, como os homens, essas guas vadias vo aprontar por a, como temos visto.

Para controlar guas vadias reflorestemos o pas nas reas improdutivas. Para salvar espcies em extino, reflorestemos o pas (continuamente, colocando tneis e viadutos nas passagens em que a cobertura vegetal no possa ser interrompida, para garantir o trnsito da fauna). Para mitigar a seca, reflorestemos o pas. Para reabsorver o CO2 , reflorestemos o pas. Para salvar o pas, substituamos a lei dos homens pelas leis da natureza. Resolvamos de vez conhecer a nossa casa, para que possamos pensar globalmente, no s para cima e para os lados, mas tambm para baixo, para os pores da casa, para o passado e para o futuro. S assim saberemos agir localmente, diferentemente do ladro improvisado em casa desconhecida e escura, que vive atropelando cristaleiras.

Belo Horizonte, 29 de dezembro de 1998

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Edzio Teixeira de Carvalho

Engenheiro Gelogo

Professor aposentado do Departamento de Geologia da UFMG

HORA DE RECONSTRUIR

GEOCENTELHA060

Na hora de reconstruir devemos ser radicais, mudando tudo o que no deu certo. E no deu mesmo. Nem dar de novo, se insistirmos com os hbitos de avestruz que tanto cultivamos. Contribuo com o seguinte. A minerao atividade de grande efeito multiplicativo. Quando bem aproveitados os recursos minerais do pas, exportando parte e desenvolvendo toda a cadeia industrial apoiada no restante, parte-se de porcentagem de 2 a 4% do PIB, correspondente ao produto mineral entregue pela mina, para porcentagens da ordem de 25% quando se considera a atividade econmica industrial, comercial e de servios desencadeada. Para que se tenha idia deste efeito multiplicativo, basta considerarmos o fato de pelo menos metade da populao de Belo Horizonte aqui estar por influncia direta ou indireta da minerao.

Teve o Estado Brasileiro de intervir na minerao porque no tinha capitais privados internos, ou vocao, e os externos no estavam dispostos a promover a verticalizao que enriquece as naes. Assim entrou na rea do petrleo e tratou tambm de cuidar das refinarias e da petroqumica. Entrou na minerao de ferro e tratou de desenvolver a siderurgia. Penso que poderia ter sado gradualmente dessas atividades. Na base do indiscutvel xito dessa poltica de implantao de respeitvel estrutura industrial estava o competente e introspectivo gelogo brasileiro, com estrangeiros contribuindo muito para esse xito. Na dcada de 70, o brao internacional da PETROBRS, a BRASPETRO, assinou contrato de risco com o Iraque. A conseqncia disto j sabemos: os gelogos brasileiros lograram excepcional faanha tcnica, encontrando, em poucos anos, o campo gigante de Mahjnoon naquele pas; sabemos tambm que, por no dispor de poder econmico e militar, teve o Brasil de aceitar a renegociao de seus direitos com o Iraque. O episdio merece ser lembrado por outras razes. Essa faanha foi conseguida em rea de onde, desanimadas, tinham-se retirado as maiores empresas petrolferas do mundo, atestando a descoberta a capacidade tcnica dos brasileiros, no caso suplantando americanos e europeus. Outra razo para lembrar o fato que o monoplio (estatal ou privado) pernicioso por submeter a possibilidade de xito a uma nica filosofia de pesquisa (o que significa que, se a empresa brasileira teve xito onde outras fracassaram, possvel que ela tenha fracassado onde outras no puderam fazer a tentativa).

Contudo a razo principal para lembrar ainda o mesmo episdio que o potencial da geologia no se restringe a revelar para o mundo riquezas minerais, no importa quo sutilmente escondidas. Toda atividade exercida sobre a terra, desde a agricultura at o turismo, desde o suprimento de gua at a construo urbana, desde a preveno dos danos ambientais at a reabilitao do territrio, desde a preveno dos desastres naturais at a reduo dos seus efeitos, pode ser amplamente beneficiada pelo emprego adequado dos recursos da geologia. A economia verdadeira, sadia, fiel ao conceito etimolgico, s produz resultados com o conhecimento de possibilidades. No conhecidos os recursos minerais da terra, nenhuma economia poderia beneficiar-se deles, nenhum economista teria o que fazer a respeito, nenhum engenheiro, nenhum advogado, nenhum qumico, nenhum bilogo, nenhum cabeleireiro, nenhum taxista, nenhum diplomata, nenhum poltico . Pela milsima vez, repito. Muitssimo pouco conhecemos das possibilidades geolgicas do nosso territrio, exatamente daquelas que, ainda, no esto postas sob olhos vidrados de economistas internacionais. Se dessem geologia um milionsimo dos recursos aplicados pesquisa do petrleo, revelaria ela imensas possibilidades para a reconstruo do pas. Portanto peo, eu que, como cidado comum, tenho o direito sagrado que se confere a quem paga a conta, e o fao em nome de nossa descendncia, apenas um pouco de ateno.

preciso ensinar geologia, verdadeira, aos nossos filhos, porque a terra o nosso lar, e bem usar o lar, at para no entrar na despensa quando se pretende ir ao sanitrio, fundamental para a vida. Povo que conhea a constituio de sua terra, e como ela funciona, conhece suas possibilidades. Quem conhece possibilidades pode ter aspiraes. Quem tem aspiraes potencializa a vontade. Quem tem vontade constri.

por a que comea a (re)construo de uma nao, radicalmente, pelo conhecimento de sua infra-estrutura, seu suporte, seu bero, seus pilares. A nao suicida, o Grande Enfermo do Ocidente, tem 500.000 advogados (li nesta pgina), mas acha que pode ter 5.000 gelogos, infinitamente mal-aproveitados. Os 500.000 advogados vo viver de intermediar desavenas entre 160.000.000 de desiludidos, lanados nessa desiluso pela vampirizao de seu pas?

Belo Horizonte, 4 de fevereiro de 1998

Edzio Teixeira de Carvalho

Gelogo, Ex-Diretor do Instituto de Geocincias da UFMG, Membro Suplente do COPAM

FARRA DA TERRA. FOLIA DAS GUAS

GEOCENTELHA 063

Novas enchentes em So Paulo. Exerccio simples permite calcular os prejuzos de cada evento destes. Poderia comear com o combustvel. Penso que em trs horas de engarrafamento no demais admitir aumento mdio de consumo, por veculo, da ordem de R$ 5,00. Com um milho de veculos envolvidos, so 5 milhes, numa nica pancada de chuva. Provavelmente 70% dos municpios mineiros no tm isto de arrecadao anual. Deveremos incluir danos aos veculos. Perdas de horas de operrios, servidores pblicos, comercirios, ambulantes, profissionais liberais, executivos. Perdas de horas de professores e alunos. Desvios de policiais das atividades regulares. Passada a chuva, vem o tempo da limpeza e do rescaldo, que toma tempo adicional da populao, sonegado aos afazeres normais. No acabou: o rio sujo levou detritos encontrados no caminho e os depositou no leito a jusante, ou na primeira represa, como se rio abaixo morasse inimigo. Quem perdeu barracos vai ficar inadimplente com a conta de 200 reais que pagaria certamente, ainda do natal, com o salrio a receber. Nem poder comprar a fantasia dos garotos, porque ter de recomprar cadernos perdidos na enchente. Incalculvel prejuzo, incontabilizvel em sua totalidade, e to previsvel a qualquer cidado, que j deve estar includo no seu custo Brasil particular.

Escrevi artigo com o mesmo tema deste no incio de fevereiro. Mantenho resumido seu primeiro pargrafo. J mais de uma dezena de vezes o quadro se repete com contornos mais sombrios. O que veio desde ento e continua mais grave, como estamos vendo. a farra da terra que provoca tudo isto. Ainda em maro ouviremos dizer que a grande metrpole planeja o racionamento porque a seca estar chegando. Estar tambm seco o sistema geolgico, porque, nas partes altas, a cidade ter impedido sua recarga apesar de tanta chuva, ela que veio como lquido man, previsvel como uma nevasca da Escandinvia. Dir-se- que veio em excesso, e agora j se culpa la nia, que forma com el nio o casal 20, inimigo do Brasil, sob o olhar impassvel de Deus, o maior dos brasileiros.

A natureza de nossa terra insiste em dar-nos possibilidades ilimitadas. Relegadas, desprezadas, no consultadas estas, ela, seguindo leis naturais, determina desempenhos previsveis, insurgindo-se contra as leis e as obras dos homens. Falam de novo em aprofundar o leito do Tiet, em construir mais piscines. Esqueamos o dinheiro envolvido. Aprofundado o leito do famoso rio, do Pinheiros e demais, restaro controladas as inundaes em faixa de largura varivel ao longo de seus cursos. Restaro tambm inundaes locais em pontos no atingidos por influncia das obras; rebaixar-se-o os leitos dos tributrios at as cabeceiras remotas. Uma gerao a mais e retornaro previsivelmente as inundaes no baixo curso; a ento o processo recomea. Enquanto isto, no sobra dinheiro para outras coisas, como o metropolitano e moradia de qualidade, base operacional da cidadania. Quanto aos piscines, a que se destinam? A retirar de circulao alguns milhares de metros cbicos de gua e solt-la passada a chuva intensa. Custa cada um milhes de reais. O rebaixamento do leito se faz sem se pensar em quem est a jusante (execrvel desvio moral, at porque as inundaes provocadas rio abaixo sequer contam com o testemunho das imagens de helicptero). O desastre no pra a. O assoreamento toma reservatrios de hidreltricas a jusante. S visto quando bancos de sedimento afloram. Se compararmos a represa assoreada com o veculo de servio amortizado, veremos que este pode ser reposto com as taxas de amortizao descontadas do lucro da empresa, enquanto a represa no. Quanto aos piscines, teriam na coleta de guas pluviais dos telhados substituto muito mais eficaz, porque auto-financivel pelo uso dessa gua. H mais ainda: parte das guas do planalto paulista so desviadas para acionarem as turbinas da usina Henry Borden em Cubato. Com a escassez crescente de gua no planalto, por conseqncia desta poltica suicida, a usina, que produz mais energia que Trs Marias, dada a queda til de 700 metros, um dia ser desativada. Pagaremos ento, os brasileiros todos, os piscines do senhor Pita, o rebaixamento de calha do governador, e, quem sabe, um aprofundamento futuro do Arrudas, que provavelmente teria sado da calha com chuvas iguais s que ocorrem em So Paulo (j ameaou sair em janeiro de 1997).

Sou a favor da taxa de permeabilizao de 20% do terreno introduzida pela nova Lei de Uso do Solo de Belo Horizonte, mas preciso dizer que, num local de taxa natural de infiltrao de 30%, isto retira apenas 6% das guas pluviais de circulao. Deus deve estar ficando cansado. Sua infinita sabedoria deve estar enfrentando o maior dos desafios, o de salvar o mais prdigo de seus filhos.

Belo Horizonte, 03/03/99

Edzio Teixeira de Carvalho

Engenheiro Gelogo, Ex-Diretor do Instituto de Geocincias da UFMG

A AURORA DO PS-CAPITALISMO

GEOCENTELHA 064

Frugalidade no gasto ou consumo de dinheiro ou materiais; gerenciamento dos recursos de um pas visando sua produtividade; disposio ou regulao das partes ou funes de qualquer todo complexo. So significados para economia do dicionrio Webster (citao propositada de fonte da ptria do capitalismo moderno). Das razes gregas, economia gesto ou gerenciamento do lar. Esses significados so desconsiderados nas decises econmicas de governos ou empresrios, quando inspiradas na extremidade mais perversa da ideologia capitalista ou na ignorncia do objeto de deciso.

No vou discorrer sobre crises do capitalismo, mas sobre condies de contorno, inspirado na matemtica (certas funes, muito complexas, podem ter valores conhecidos em situaes particulares). A condio de contorno aqui usada esta: so limitados os recursos da terra e de cada pas em particular.

Quando eclodiu a crise de 1930, salvo os visveis, no eram conhecidos sequer 10% dos recursos naturais posteriormente descobertos e a seguir freneticamente consumidos, embora no esgotados. Portanto nessa crise havia limites relativos. A crise do petrleo nos anos 70, com conotaes pejorativas comandadas pelos centros do poder mundial, foi, em parte, inspirada numa viso de economia natural (portanto, em parte, motivada pela tentativa de ser fiel ao segundo conceito acima). Parece que sobra petrleo, tanto assim que seu preo, descontada a inflao do dlar, no est distante dos vigentes entre os choques de 1973 e 1977. No sobra petrleo; o carvo enfrenta problemas ambientais maiores que o petrleo e a descontaminao nuclear da Europa, incluindo o legado de Chernobyl e o desmonte futuro de centrais e de submarinos nucleares representam dispndios previstos em 1 trilho de dlares. Os centros de poder mundial antecipam em mais de 100 anos suas preocupaes de suprimento, enquanto partes perifricas, como o Brasil, mal pensam em 10 anos. Todavia esses centros de poder no pensam economicamente, no bom e global sentido: ET que monitorasse a terra em 1.900, repetindo a vistoria em 2.000, constataria que a distribuio do bem-estar no pas terra piorou muito entre as duas visitas, caracterizando inegvel fracasso da concepo e implementao de polticas econmicas e sociais.

A crise atual bate com limites absolutos e no relativos. H, portanto, que pensar no segundo significado, gerenciar os recursos de um pas visando sua produtividade. No o temos feito, porque impera o esprito extrativista, que olha para uma floresta como fonte s de madeira, e que se desdobra numa infinidade de atitudes do cotidiano, todas implicando a dissipao de fatores expressivos da sustentabilidade em benefcio de explorar um s deles. Toda ao implementada sobre a terra, assim como a do mdico sobre o corpo humano, gera o resultado desejado, acompanhado de efeitos colaterais positivos e de efeitos colaterais negativos. O bom mdico, quando seu objeto tem capacidade de resposta, consegue o resultado desejado, e o faz limitando efeitos colaterais negativos e ampliando os positivos. Nosso territrio tem capacidade de responder a intervenes bem pensadas, mas, como o corpo humano, tem de ser bem conhecido para que se levem em conta as reais possibilidades e vulnerabilidades que carrega. Sem tal conhecimento, efeitos colaterais positivos so dispersados e efeitos colaterais negativos, ampliados. A camos no caso do significado disposio ou regulao das partes ou funes de qualquer todo complexo. Como o corpo humano, a terra , constitutiva e comportamentalmente, um todo complexo. Esse todo extremamente simplificado pelos economistas hiperbreos. No podemos acompanh-los. Precisamos inaugurar o ps-capitalismo, ou estaremos condenados a financiar eternamente a limpeza do passivo ambiental determinado pela transgresso dos princpios econmicos sadios inerentes aos significados acima, e de financiar as guerras punitivas. bom que estejamos atentos para o fato bvio de que, se toda a sia, toda a frica, toda a Amrica Latina e toda a Europa Oriental tivessem alcanado nvel de desenvolvimento material equivalente mdia europia, muitos dos recursos naturais estariam s portas da extino, e os danos ambientais seriam to maiores que a visibilidade desses limites absolutos estaria escancarada percepo de todos. Por esta razo, previdentemente, os hiperbreos no querem saber de mais convidados para o banquete que montaram com os limitados frutos da terra. Para isto contam com a cooperao disciplinada de alguns lees de chcara e com a passividade ignorante dos demais. H possibilidades inimaginveis a serem aproveitadas para evitar o colapso final, mas preciso que governos de todas as esferas comecem a dar espao de reflexo sobre elas, em lugar de ficarem cuidando acriticamente, e burocraticamente, da administrao do miservel quadro pr-falimentar que vivemos.

Belo Horizonte, 25 de maro de 1.999

Edzio Teixeira de Carvalho Gelogo, ex-Diretor do Instituto de Geocincias da UFMG

UMA GUERRA QUE NO D MANCHETE

GEOCENTELHA 065

Lembra-me na insnia o Silncio cantado por Gardel: ...los hombres se matan cubriendo de sangre los campos de Francia. Nos Blcs, de novo, o aterrorizante espectro da conflagrao. No se luta mais de baioneta. Lanam-se msseis, economizando o sangue dos agressores. Depois diplomatas renem-se em sales de castelos ornados com motivos de guerra. Daro entrevistas em jardins bem aparados. Se forem reunidos bsnios, croatas, srvios, eslovenos, albaneses, muulmanos, ortodoxos, catlicos, protestantes, incrus, e levados a habitarem pas estranho, descobrir-se-o mais irmos, e haver me srvia que perdera o filho amamentando beb kosovar que perdera a me. Este o homem natural, sem valores menores a defender e com valores maiores a construir. No sei quanto pagamos pelo show de msseis cruzando os cus de Belgrado, como no sei se seria moral assistir passivamente briga fratricida. Os valores que a OTAN defende, defende-os com acerto maior que os das partes? Conforta-nos saber que algo se faz? E se feito para esvaziar paiis de munio? Na guerra difcil saber quem tem razo.

H muitas guerras entre os homens, mas h uma que no aparece nas manchetes como tal. a do homem contra a terra, que prepara as demais. H anos em So Paulo o senhor Elair Padim desenvolve luta incansvel pelo uso das guas pluviais, como meio de contribuir para a reduo das enchentes. Conheci essa luta quando ele compareceu a programa de entrevistas e foi tratado com indisfarvel ironia. Em chuva forte o entrevistador no chega de helicptero ao estdio, e no chega de carro porque a enchente no deixa. Portanto no sei a razo do tratamento dado a quem quer ajudar. Mais recentemente, aquele senhor exibiu em feira projetos de reservatrios pluviais. Despertou entusiasmo nos visitantes e na imprensa. No abalou os burocratas, que no acolhem a idia, mas tambm no resolvem o problema, como sobejamente provado. Posteriormente, fiquei sabendo que em So Paulo h (ou havia, porque vereadores tentavam a revogao) lei municipal que probe o uso de guas pluviais na lavagem de carros, uso bvio e adequado da gua coletada nos telhados de postos de gasolina. A razo da lei que, com a poluio, tais guas esto contaminadas com substncias corrosivas. Esqueceu-se quem a votou de duas coisas: Carros no trafegam de guarda-chuva, de modo que, se no recolhidos, esto expostos s chuvas corrosivas; tambm se esqueceu de que a lei contribui para a perpetuao da poluio do ar, porque elimina uso que poderia aglutinar razes a mais para acabar com ela. Seria construtiva se exigisse que o uso das guas pluviais fosse informado, sem paternalismo estril, que, a ttulo de defender o consumidor, poda alternativas que a sociedade pode explorar.

A lei (Cdigo Florestal de 1965), com a definio de faixas de proteo permanente aplicadas ao Brasil inteiro, determina que em regies montanhosas de Minas, Rio, Esprito Santo, sejam cultivadas faixas intermedirias das vertentes, nesses domnios precisamente as menos indicadas por sua maior vulnerabilidade aos processos erosivos. A mesma lei determina que a rea contida num raio de 50 metros em torno de nascente de preservao permanente. Centenas de milhares de nascentes ocorrem em voorocas (eroses surgidas com os desmatamentos), expresso acabada do desequilbrio ambiental iniciado no sculo 16. Quem as preencha com terras e resduos inertes no est matando uma nascente. Sua gua no ir para o Japo. Ir nascer a jusante, como nascia antigamente, seguindo as leis da hidrulica dos meios porosos conformadas geologia dos terrenos.

A floresta comercial foi, muito justamente, estigmatizada por dizimar a fauna e ressecar a terra (aqui talvez nem tanto). A prosaica alface faria a mesma coisa, desde que ocupasse milhares de hectares contnuos. Hoje vemos eucaliptais imensos entrecortados por corredores de matas nativas, em soluo certamente autorizada. Esses corredores so bons mas no garantem a ona pintada e o lobo guar. Do nordeste ao extremo sul deve ser replantada, com a maior continuidade possvel, a mata que a tivemos. Assim no precisaremos ter um programa de proteo para cada espcie animal. Sobrar espao para as outras coisas. A Lei, que, supostamente, pretende implantar o ideal, acaba por induzir o indesejvel e por anistiar o absurdo. A, dilapidados por todas as formas os recursos da terra, os homens pem-se a brigar por valores menores, porque j tero perdido os maiores.

Belo Horizonte, 07 de abril de 1999

Edzio Teixeira de Carvalho

Gelogo, ex-Diretor do Instituto de Geocincias da UFMG

EM DEFESA DA CINCIA NACIONAL

GEOCENTELHA 067

O PADCT parece agonizar. O que tem a ver com isto o leitor deste prestigioso jornal? que ele , como patro do Governo Federal, o nico patrocinador do Programa, e necessariamente seu beneficirio final. O PADCT o Programa de Apoio ao Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico do Ministrio da Cincia e Tecnologia. Nasceu na primeira metade da dcada de 80, apoiando as reas de Qumica e Engenharia Qumica, Biotecnologia, Geocincias e Tecnologia Mineral, Cincias do Ambiente, Novos Materiais e Educao para a Cincia, chamados subprogramas verticais, alm de outros seis subprogramas ditos horizontais, entre os quais Informao em Cincia e Tecnologia e Tecnologia Industrial Bsica. Os fundos de manuteno do Programa vm de duas parcelas, sendo 50% do Tesouro Nacional (recursos oramentrios) e 50% do Banco Mundial (emprstimo). Os recursos dos subprogramas verticais so distribudos mediante a realizao de concorrncia anunciada por Edital, a que podem habilitar-se universidades e rgos de pesquisa, segundo regras definidas por representantes da Comunidade Cientfica e Tcnica, indicados por seus pares no Brasil inteiro. Para o julgamento das propostas encaminhadas em atendimento a cada Edital, forma-se um Comit Assessor (CA) de membros dessa comunidade, no comprometidos com qualquer das propostas encaminhadas.

Desde 1984 (fase de teste) at o ano passado, o programa sofreu aperfeioamentos significativos em seus procedimentos, ganhando adeso e respeito crescentes dos pesquisadores. Entre alteraes recentemente implantadas nota-se a introduo de novas reas, como Fsica Aplicada, e a informatizao de todos os procedimentos, conferindo-lhes eficincia na tramitao e transparncia muito maior que anteriormente quanto ao julgamento, porque os interessados tomam conhecimento dos Editais e enviam propostas via internet, alm de, pela mesma via, terem acesso aos critrios adotados no julgamento, s notas que suas propostas receberam, aos pareceres emitidos por consultores especializados e ao Parecer Final do CA. Alm de ganhar-se em rapidez e qualidade operacional e credibilidade, economizou-se muito na administrao.

Limitando-me rea de Geocincias e Tecnologia Mineral, participei do Programa desde as formulaes iniciais (na redao de textos bsicos) e desde 1990 como Membro do Grupo Tcnico (GT), por 2 anos, reconduzido at 1995; atualmente sou Membro do Grupo de Planejamento e Avaliao (GPA), que na nova estrutura substituiu o GT. Nessas condies coordenei Comits Assessores em 1991, 1995 e em 1998. Em 1991, cumprindo dever inerente ao de Coordenador do CA, propus reviso do Processo de elaborao e divulgao de Editais e do Processo de julgamento, muito semelhante ao adotado a partir de 1997, que tanto contribuiu para a crescente credibilidade do Programa.

Assim, posso dar testemunho de que o PADCT alou a rea de Geocincias e Tecnologia Mineral de um nvel mais baixo que sofrvel a padres de qualidade da infra-estrutura material e de pessoal que se igualam e localmente superam os de pases desenvolvidos. A produo cientfica e tecnolgica, que a resposta final, vem-se desenvolvendo francamente, aproximando-se tambm deles, assim como, pela primeira vez em nossa histria, vem engendrando o PADCT uma forte interao universidade-empresa, aumentando em muito as possibilidades de o pas gerar as suas prprias solues.

Tem falhas o Programa, uma delas ter drenado recursos do FNDCT (Fundo Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico), em parte compensada por aparelhamento melhor, e desempenho, das FAPs (Fundaes estaduais de amparo pesquisa). Todavia o direcionamento das pesquisas com viso institucional modificou drasticamente o panorama dessas instituies, com significativa disperso geogrfica dos centros de excelncia. Penso que a principal falha o financiamento compartilhado com rgo internacional. O PADCT demonstrou cabalmente a capacidade de alavancar a gerao de cincia e tecnologia genuinamente nacionais. No pode ficar ao sabor de necessidades prementes de conteno de gastos, no caso inadiveis, porque destinados a libertar de fato o pas.

Espero que o Ministro Bresser Pereira, que se tem notabilizado por deixar um rastro de escombros sua passagem por outros ministrios, pense mil vezes antes de deitar a perder to importante programa, porque aqui no esto em causa razes discutveis, mas a soberania da Ptria.

Belo Horizonte, 09 de abril de 1999

Edzio Teixeira de Carvalho

Gelogo, ex-Diretor do Instituto de Geocincias da UFMG e Membro do Grupo de Planejamento e Avaliao do Subprograma Geocincias e Tecnologia Mineral do PADCT/MCT

O (VERDADEIRO) TERROR AMBIENTAL

GEOCENTELHA 068

J ouvi que o eucalipto resseca a terra porque, tendo raiz pivotante, esta rompe uma camada impermevel que sustenta o lenol fretico e a gua vaza para camadas inferiores, ressecando a superfcie. Vi livros de Cincias, aprovados pelo ministrio, mostrarem, em desenhos, o lenol fretico como uma camada azul de gua, sustentada no sei como. Hoje vi na televiso um desenho mostrando como os metais pesados de pilhas de telefones celulares lanados em lixo, lavados pelas guas das chuvas, alcanam o lenol fretico, representado como uma camada azul, e fico a pensar que com amigos to zelosos a terra no precisa de inimigos. Fao tudo para ser construtivo, mas a pacincia esgota-se com tamanhas barbaridades cometidas sobre a terra, com reflexos danosos sobre os homens (sobre todos eles).

Aos mdicos: A terra est doente e em terra doente no sobreviver humanidade sadia, no importa que, protegidos em bolhas ambientais de custo incomportvel, alguns passem a viver 130 anos sadios, como prometem os indiscutveis recursos de suas conquistas mais recentes.

Aos advogados: Leis ambientais ou correlacionadas revogaram a lei da gravidade. Inocentes pagaro por descumpri-las e homens de iniciativa deixaro de empreender pelo receio de serem colhidos em suas malhas aterrorizantes.

Aos engenheiros: O ensino que os deixou sem bom conhecimento geolgico bsico, retirou-lhes desafios maiores e transformou-os em cirurgies que no conhecem a anatomia e a fisiologia da terra. Seus xitos sero limitados, e pontuais, ainda que to grandes quanto uma magnfica Itaipu.

Aos urbanistas: Suas cidades so aparelhos mais complexos do que pensam. E porque pensam que suas infra-estruturas so vias pblicas, servios de gua e similares, no compreendem seu desafiante metabolismo, porque em tudo ele depende do conhecimento da anatomia e fisiologia do sistema geolgico, verdadei