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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANÁ - UNIOESTE CAMPUS DE FRANCISCO BELTRÃO TRABALHO DE PÓS GRADUAÇÃO MESTRADO EM GEOGRAFIA TERRITÓRIO E PODER: A PRODUÇÃO AGROECOLÓGICA COMO ESTRATÉGIA DE DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL ELAINE FABIANE GAIOVICZ Francisco Beltrão MARÇO - 2011.

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANÁ - UNIOESTE

CAMPUS DE FRANCISCO BELTRÃO

TRABALHO DE PÓS GRADUAÇÃO – MESTRADO EM GEOGRAFIA

TERRITÓRIO E PODER: A PRODUÇÃO AGROECOLÓGICA COMO

ESTRATÉGIA DE DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL

ELAINE FABIANE GAIOVICZ

Francisco Beltrão

MARÇO - 2011.

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANÁ - UNIOESTE

CAMPUS DE FRANCISCO BELTRÃO

TRABALHO DE PÓS GRADUAÇÃO – MESTRADO EM GEOGRAFIA

ELAINE FABIANE GAIOVICZ

TERRITÓRIO E PODER: A PRODUÇÃO AGROECOLÓGICA COMO

ESTRATÉGIA DE DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de

Pós-Graduação em Geografia, como requisito parcial

para obtenção do título de Mestre em Geografia.

Área de Concentração: Produção do Espaço e Meio

Ambiente.

Orientador: Prof. Dr. Marcos Aurélio Saquet.

Francisco Beltrão

Março – 2011

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DEDICATÓRIA

A Deus, meu companheiro de todas as horas, que além de me dar calma, sabedoria,

paciência, me deu principalmente força, para continuar desenvolvendo cada linha desse

trabalho. E, ao meu esposo, Eduardo Gaiovicz, pela força, apoio, amor e compreensão.

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AGRADECIMENTOS

A Deus pela graça da vida, da serenidade e da sabedoria.

A meus pais, Rubi e Marilene Fabiane, que nos momentos difíceis me apoiaram e

incentivaram dando a mim amor e muito zelo.

A toda minha família, em especial ao meu primo-irmão Bruno de Souza e ao meu esposo

Eduardo Gaiovicz.

A UNIOESTE – pelas oportunidades de graduação e mestrado.

Aos funcionários pelo desenvolver de seu trabalho construindo com as brincadeiras e

incentivos uma verdadeira família acadêmica.

Ao meu orientador Marcos Aurélio Saquet, pelo apoio, incentivo, amizade e principalmente

compreensão.

A todos os Geterrianos que de uma forma ou outra contribuíram para realização deste

trabalho.

Aos colegas do projeto do programa Universidade Sem Fronteiras, os quais foram de extrema

importância para mim enquanto pesquisadora.

A Suzana, a Michele e a Poliane, pela paciência, amizade e momentos de descontração.

A Valentina, querida amiga pelos auxílios, pela força e pela amizade.

Aos amigos Felipe e Rafael, que nas brincadeiras muito me ensinaram.

Aos professores Luciano Candiotto e Roseli Alves dos Santos, pelo apoio e pelos debates.

A Andréia, secretária do mestrado, que me orientou, e muito contribuiu com sua amizade.

Enfim, a todos aqueles que de alguma forma me incentivaram, seja em pensamento ou

efetivamente.

Muito obrigada.

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Aprendi que se aprende errando; que crescer não significa fazer aniversário; que o silêncio é a melhor resposta, quando se ouve uma bobagem; que trabalhar significa não só ganhar dinheiro; que amigos a gente conquista mostrando o que somos; que os verdadeiros amigos sempre ficam com você até o fim; que a maldade se esconde atrás de uma bela face; que não se espera a felicidade chegar, mas se procura por ela; que quando penso saber de tudo ainda não aprendi nada; que a Natureza é a coisa mais bela na Vida; que amar significa se dar por inteiro; que um só dia pode ser mais importante que muitos anos; que se pode conversar com estrelas; que se pode confessar com a Lua; que se pode viajar além do infinito; que ouvir uma palavra de carinho faz bem à saúde; que dar um carinho também faz; que sonhar é preciso; que se deve ser criança a vida toda; que nosso ser é livre; que Deus não proíbe nada em nome do amor; que o julgamento alheio não é importante; que o que realmente importa é a Paz interior. "Não podemos viver apenas para nós mesmos. Mil fibras nos conectam com outras pessoas e por essas fibras nossas ações vão como causas e voltam pra nós como efeitos." (Herman Melville, 2010)

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Resumo

A chamada modernização da agricultura representou um período de intensificação do processo de

degradação ambiental e modificações profundas nas relações de trabalho. Um dos movimentos de

resistência a essa padronização de produção é a agricultura agroecológica emergente, que vem gerando

em alguns municípios do Sudoeste do Paraná, como Verê, resultados importantes. A agroecologia

baseia-se na produção de alimentos saudáveis, na preocupação com a saúde humana e na preservação

do ambiente; além disso, vem criando novas redes com ritmos e tempos diferenciados, organizando

elementos do espaço geográfico de acordo com um padrão particular, construído coletivamente, com

respeito à diversidade cultural, política, ambiental e econômica local. Dessa maneira, novas redes,

fluxos e fixos foram inseridos no processo de territorialização da agroecologia, que se desenvolve

amparada por associações como a APAV e a APROVIVE, com ONGs como a ASSESOAR e o

CAPA, além das instituições certificadoras como a REDE ECOVIDA, as quais desempenham um

importante papel junto aos agricultores. Por esses motivos, buscamos compreender a dinâmica de

produção agrícola familiar agroecológica no município de Verê, como uma forma alternativa ao modo

de produção apregoado pela Revolução Verde; além de verificar uma forma de submissão do

agricultor familiar, de mecanismos de controle, através da integração avícola, representada pela Sadia

– Unidade de Dois Vizinhos; ainda procuramos analisar as condições de organização política e mapear

os agricultores agroecológicos de Verê. Para isso, lançamos mão de uma revisão bibliográfica, de

trabalho de campo nas propriedades agroecológicas de Verê, em uma integrada à Sadia e em todas as

entidades parceiras da produção agroecológica, realizando entrevistas com agricultores, avicultor

integrado e com representantes e responsáveis por cada entidade. A partir dos dados coletados

elaboramos o mapa de localização das propriedades, os quadros sínteses quantitativos e qualitativos,

os croquis de representação de cinco propriedades e conclusões teóricas a respeito da agricultura

agroecológica como movimento territorial de resistência no município de Verê. A produção

agroecológica ainda possui muitas dificuldades, que podem e precisam ser superadas, para que a

agroecologia seja dinamizada em favor do desenvolvimento local, da autonomia e da qualidade de

vida.

Palavras-chaves: agroecologia, agricultura familiar, território, desenvolvimento, Verê.

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Abstract

The so-called modernization of agriculture constituted a period of intensification of the

process of environmental degradation and significant changes in labor relations. Among the

movements of resistance to the standardization of production, it emerged the agroecology,

which in some municipalities of the Southwest of Paraná, such as Verê, progressively

generated considerable results. The agroecology is concerned with the production of healthy

food, human health and the preservation of the environment. It promotes the creation of new

networks characterized by different rhythms and times, it organises the elements of the

geographic space accordingly to a specific pattern, based on the inputs of the collectivity,

while respecting the local culture, policy, environment and economy. In this way, new

networks, flows and assets were included in the process of territorialization of the

agroecology, which gradually develops with the support of associations such as the APAV

and APROVIVE, ngos, namely CAPA and ASSESOAR, and certification bodies as REDE

ECOVIDA, who play an important role together with local farmers. For these reasons, we aim

to understand the agroecological approach adopted by some family farms in Verê, as a way of

producing that establishes alternative systems to the ones claimed by the Green Revolution;

moreover, we prove the existence of forms of submission and mechanisms of control of

family farmers, throughout an integrated farming system where poultry are raised, which is

backed by the enterprise Sadia – Unit of Dois Vizinhos; and finally, we intend to analyze the

existence of a political organization and to produce a map of the agrocological family farms

existing in Vere. With this purpose, we started with a literature review, and followed up with

field work in the agroecological farms in the municipality of Verê and in a farm integrated to

the Sadia, calling for the support of all partner agencies involved with organic production, and

conducting interviews with farmers, integrated poultry raisers, representatives and managers

of each institution. After collecting data, we drew a map illustrating the farms, the

quantitative and qualitative synthetic frameworks, the sketches representing five farms and

the theoretical conclusions with regard to the territorial resistance movement promoting

agroecology, specifically in Verê. Finally, we conclude that this production system still faces

many challenges, however these can and have to be overcome, in order to contribute to local

development, sustainability and quality of life.

Keywords: agroecology, family agriculture, territory, development, Verê.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

FIGURA - 1 Histórico da Sadia: Sociedade Anônima Concórdia....................... 44

FIGURA - 2 Organograma das entidades parceiras vinculadas à agroecologia

no município de Verê...................................................................... 78

FIGURA - 3 Propriedade integrada à Sadia......................................................... 107

FIGURA - 4 Propriedade de Aldair Alberton...................................................... 111

FIGURA - 5 Propriedade de Décio Cagnini........................................................ 118

FIGURA - 6 Propriedade de Darci Cassol........................................................... 125

FIGURA - 7 Propriedade de Baldoino Berns...................................................... 132

FOTO - 1 Construção do complexo agroindustrial da Sadia – 1978............... 45

FOTO – 2 Parque Industrial Sadia – Unidade de Dois Vizinhos 2010............ 46

FOTO – 3 Fachada do CAPA - núcleo de Verê............................................... 89

FOTO – 4 Mercado da APAV, na cidade de Verê........................................... 92

FOTO – 5 Mulheres sócias da APAV produzindo geleia de uva..................... 93

FOTO – 6 Produção de sucos dentro da fábrica de sucos Viry........................ 94

FOTO – 7 Propriedade integrada à Sadia – Dois Vizinhos.............................. 104

FOTO – 8 Parreiral da propriedade de Aldair Alberton................................... 110

FOTO – 9 Parreiral na propriedade de Miguel Thomé.................................... 113

FOTO - 10 Produção de vinhos e geleias da família Thomé............................. 114

FOTO - 11 Estufa de alface............................................................................... 115

FOTO - 12 Produção de mudas na propriedade de Décio Cagnini................... 116

FOTO - 13 Cobertura verde na propriedade de Décio Cagnini......................... 117

FOTO – 14 Estufa com plantação de pepinos da família Lang.......................... 120

FOTO – 15 Produção própria de mudas – Lang................................................ 121

FOTO – 16 Estufa de hortaliças da propriedade de Darci Cassol...................... 123

FOTO – 17 Estufas e canteiros da propriedade de Lídia Ferreira...................... 127

FOTO – 18 Lídia com um pé de alface produzido em sua estufa...................... 129

FOTO – 19 Canteiros de alho, cenoura, beterraba e parte do terreno em

pousio.............................................................................................. 129

FOTO – 20 Plantação de mandioca e barreira verde da propriedade da 130

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Família Berns..................................................................................

FOTO - 21

Aos fundos, área de reflorestamento da propriedade da família

Berns...............................................................................................

133

GRÁFICO - 1 Conjunto das propriedades estudadas do município de Verê....... 18

GRÁFICO - 2 Objetivos ao aderir a agroecologia................................................. 144

MAPA - 1 Localização dos municípios de Verê e Dois Vizinhos no

Sudoeste do Paraná......................................................................... 39

MAPA - 2 Distribuição das Unidades Industriais da Sadia no Brasil.............. 42

MAPA - 3 Distribuição de aviários da Sadia Dois Vizinhos – Paraná............. 48

MAPA - 4 Territorialização da ECOVIDA: localização dos núcleos

regionais.......................................................................................... 80

MAPA – 5 Núcleos do CAPA........................................................................... 88

MAPA - 6 Localização das propriedades agroecológicas de Verê................... 103

QUADRO - 1 Dados quantitativos da produção parcialmente agroecológica do

município de Verê...................................................................... 136

QUADRO - 2 Dados quantitativos da produção agroecológica no município de

Verê................................................................................................. 139

QUADRO - 3 Dados qualitativos dos produtores parcialmente agroecológicos

do município de Verê...................................................................... 141

QUADRO - 4 Dados qualitativos da produção totalmente agroecológica............. 143

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LISTA DE SIGLAS

AAO: Associação da Agricultura Orgânica

ACEMPRE: Associação Central dos Mini-Produtores Rurais Evangélicos

ANA: Associação Nacional de Agroecologia

APAV: Associação dos Produtores Agroecológicos de Verê

APROVIVE: Associação dos Produtores Vitivinicultores de Verê

ASSESOAR: Associação de Estudos Orientação e Assistência Técnica

BRF: Brasil Foods

CAIs: Complexos AgroIndustriais

CAPA: Centro de Apoio ao Pequeno Agricultor

C-E-P-A: Cultural, Econômica, Políticas e Ambientais

COASUL: Cooperativa Agroindustrial

CONTAG: Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais

CRESOL: Cooperativa de Crédito Rural com Interação Solidária

DAP: Declaração de Aptidão ao PRONAF

DOC: Denominação de Origem Controlada

ECO-92: Conferência para o Desenvolvimento e o Meio Ambiente

EMATER: Instituto Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural

E-P-C-N: Econômicos, Políticos, Culturais e Naturais

FAO: Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura

FCR: Fundo de Crédito Rotativo

FGV: Fundação Getúlio Vargas

GSPs: Grupos de Planejamento e Sustentabilidade

IBD: Instituto Biodinâmico

IBGE: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IFOAM: Federação Internacional dos Movimentos da Agricultura Orgânica

IGP: Indicação Geográfica Protegida

IGP-M: Índice Geral de Preço de Mercado

INCRA: Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária

MDA: Ministério de Desenvolvimento Agrário

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MMA: Ministério do Meio Ambiente

MST: Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra

ONGs: Organizações Não-Governamentais

PAA: Programa de Aquisição de Alimentos

PRONAF: Programa Nacional de Fortalecimento a Agricultura Familiar

SADIA: Sociedade Anônima Concórdia

S.A.: Sociedade Anônima

SETI: Secretaria de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior

SIF: Sistema de Inspeção Federal

SISCLAF: Sistema de Cooperativas de Leite da Agricultura Familiar com Interação

Solidária

SLOT: Sistema Local Territorial

SPG: Sistema Participativo de Garantia de Conformidade

SSP: Sistema Sadia de Produção

STR: Sindicato dos Trabalhadores Rurais

TDR: Territorialização, Desterritorialização e Reterritorialização

TECPAR: Instituto de Tecnologia do Paraná

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LISTA DE TABELAS

Tabela - 1 Número de aviários por município atendido pela Sadia – Unidade de

Dois Vizinhos.......................................................................................... 47

Tabela – 2 Tipos de certificação de produtos e marcas de conformidade................. 81

Tabela - 3 Evoluções da Cooperativa CRESOL....................................................... 97

Tabela - 4 População urbana e rural de Verê............................................................ 145

Tabela - 5 Composição das família por unidade produtiva agroecológica de Verê

– 2009...................................................................................................... 146

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO................................................................................................................... 16

CAPÍTULO I – PAISAGEM E TERRITÓRIO: RELAÇÕES DE PODER................. 20

1.1– CONCEPÇÕES DE PAISAGEM....................................................................... 20

1.2 - CONCEITO DE TERRITÓRIO: O PROCESSO DE TERRITORILIZAÇÃO,

DESTERRITORIALIZAÇÃO E RETERRITORIALIZAÇÃO........................................... 25

1.3 - DESENVOLVIMENTO SÓCIO-ESPACIAL, TERRITORIAL E

RELAÇÕES DE PODER...................................................................................................... 32

CAPÍTULO II - INTEGRAÇÃO: A SADIA DOIS VIZINHOS E VERÊ..................... 39

2.1 – SADIA, DOIS VIZINHOS E VERÊ: O HISTÓRICO....................................... 39

2.1.1 – A Sadia de Dois Vizinhos........................................................................ 45

2.2 – A INTEGRAÇÃO OU SUBORDINAÇÃO?..................................................... 51

2.2.1 – Mecanismos e Impactos da Integração..................................................... 51

2.2.2 – A integração e os mecanismos de articulação e amarramento da

produção mediante contrato.................................................................................................. 54

CAPÍTULO III - AGRICULTURA FAMILIAR: A PRODUÇÃO

AGROECOLÓGICA COMO ESTRATÉGIA DE DESENVOLVIMENTO

TERRITORIAL................................................................................................................... 61

3.1 – AGRICULTURA FAMILIAR........................................................................... 61

3.2 – AGROECOLOGIA: UMA ALTERNATIVA PARA O

DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL............................................................................ 68

CAPÍTULO IV – ENTIDADES PARCEIRAS DA AGROECOLOGIA EM VERÊ –

PR.......................................................................................................................................... 77

4.1 – REDE SOLIDÁRIA DE COMERCIALIZAÇÃO E CERTIFICAÇÃO

PARTICIPATIVA: REDE ECOVIDA................................................................................. 79

4.2 – ASSESOAR: ASSOCIAÇÃO DE ESTUDOS, ORIENTAÇÃO E

ASSISTÊNCIA RURAL....................................................................................................... 83

4.3 – CAPA: CENTRO DE APOIO AO PEQUENO AGRICULTOR....................... 87

4.4 – APAV: ASSOCIAÇÃO DOS PRODUTORES AGROECOLÓGICOS DE

VERÊ..................................................................................................................................... 91

4.5 – APROVIVE: ASSOCIAÇÃO DOS PRODUTORES VITIVINICULTORES 94

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DE VERÊ..............................................................................................................................

4.6 – CRESOL: COOPERATIVA DE CRÉDITO RURAL E INTERAÇÃO

SOLIDÁRIA.......................................................................................................................... 96

4.7 – CONSIDERAAÇÕES SOBRE AS ENTIDADES LOCAIS DA

AGROECOLOGIA NO MUNICÍPIO DE VERÊ................................................................. 99

CAPÍTULO V – AGROECOLOGIA: UMA ALTERNATIVA DE

DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL LOCAL......................................................... 101

5.1 – PROPRIEDADE INTEGRADA À SADIA....................................................... 104

5.2 – PRODUTORES PARCIALMENTE AGROECOLÓGICOS............................ 109

5.3 – PRODUTORES TOTALMENTE AGROECOLÓGICOS................................ 122

5.4 – SÍNTESE DA PRODUÇÃO AGROECOLÓGICA DO MUNICÍPIO DE

VERÊ..................................................................................................................................... 135

CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................................. 149

REFERÊNCIAS.................................................................................................................. 152

ENTREVISTAS................................................................................................................... 160

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INTRODUÇÃO

Com a finalidade de explicar as características fundamentais no processo de integração

dos trabalhadores familiares rurais e de apresentar - baseada na autonomia - destes a

agroecologia como uma forma alternativa de produção, descrevemos no presente texto, os

resultados da pesquisa sobre a territorialização do capital através da integração em espaços

que pertencem à agricultura familiar, mais minuciosamente sobre as atividades da Sadia –

unidade de Dois Vizinhos. E contrapondo-se a este processo, a agroecologia, - no município

de Verê, - que se baseia no cultivo de alimentos saudáveis, na preocupação com a saúde

humana e na preservação do ambiente.

O motivo de escolha da Sadia - unidade de Dois Vizinhos foi devido ao considerável

aumento de aviários integrados à empresa no Sudoeste do Paraná e pelo crescimento da

produção, a qual tornou o município a ―Capital Nacional do Frango‖; a produção

agroecológica no município de Verê, por ser um dos municípios do Sudoeste do Paraná com

mais organização em termos de produção, comercialização, assistência técnica e associações

de agricultores agroecológicos.

Ambos os municípios são formados por pequenas propriedades. Dos 23 municípios

atendidos pela Sadia, Dois Vizinhos é o que possui o maior número de integrados, 299, já

Verê é o terceiro, com 78. O processo de territorialização da Sadia em tais municípios é

recente, aproximadamente 30 anos, mas é intenso. Atualmente, abrange 23 municípios do

Paraná, com 1031 avicultores que ingressaram na produção integrada de frangos, levando esta

unidade a um abate diário de 500.000 aves, com uma produção mensal de aproximadamente

14.000 toneladas de carne, segundo dados do departamento de fomento Sadia – Dois Vizinhos

(2010).

As modificações ocorridas na paisagem de algumas ―comunidades rurais‖ dos dois

municípios são perceptíveis e, na maioria das vezes, descaracterizam as atividades da

agricultura familiar, pois esta perde seus princípios fundamentais de autonomia, a utilização

de técnicas menos degradantes, a policultura e o uso da mão-de-obra familiar. Por tais

motivos apresentamos uma alternativa recente e emergente, que está gerando resultados

importantes no município de Verê, a agroecologia.

A produção agroecológica do município de Verê é bem significativa. Das 19

propriedades estudadas, todas apresentam alguns produtos agroecológicos. Entre elas, 7 são

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totalmente convertidas a esta forma de produção, ou seja, toda a propriedade é voltada para a

produção de alimentos saudáveis, sem uso de agrotóxicos ou qualquer insumo químico, com

quais a utilização das técnicas tradicionais de produção e o uso da força de trabalho familiar.

Além disso, o município possui duas associações voltadas à comercialização e

organização da produção, - a APAV (Associação dos Produtores Agroecológicos de Verê) e a

APROVIVE (Associação dos Produtores Vitivinicultores de Verê), - e um Centro de Apoio

ao Pequeno Agricultor (CAPA), que atua através da assistência técnica e incentivo à produção

agroecológica, oferecendo oficinas, cursos e palestras voltadas à prática agroecológica como

alternativa à produção convencional de alimentos e como forma do agricultor familiar se

manter no campo.

Assim, temos como principal objetivo compreender a dinâmica de uma forma

alternativa de produção agrícola familiar agroecológica. Além disso, verificamos os

mecanismos utilizados pela Sadia para subordinar os agricultores familiares; analisamos as

condições de organização política e mapeamos os agricultores agroecológicos de Verê.

Os procedimentos utilizados nesta pesquisa são: a) pesquisa bibliográfica buscando

compreender as concepções de paisagem e território, de agricultura familiar e agroecologia, e

de sistemas de integração; b) trabalho de campo por meio de entrevistas com os 19 produtores

estudados, com os responsáveis por entidades e pelo setor de fomento e logística da empresa

Sadia, além de um avicultor integrado para ter uma visão do que é a integração; e, c) análise

documental do Contrato de Produção Avícola Integrada ao Sistema Sadia de Produção.

A participação no projeto Agricultura Familiar Agroecológica nos municípios de Verê,

Salto do Lontra e Itapejara d‘Oeste como estratégia de inclusão social e desenvolvimento

territorial, através do Programa Universidade Sem Fronteiras, financiado pela Secretaria de

Ciência e Tecnologia Ensino Superior (SETI) do Governo do Paraná, muito contribuiu para a

realização desta pesquisa.

A partir disso, construímos cinco capítulos: no primeiro, analisamos as concepções de

paisagem e território, o processo de territorialização, desterritorialização e reterritorialização,

a formação de nós, redes e malhas a partir da circulação de pessoas, informações e produtos e,

por fim, o desenvolvimento territorial atrelado às relações de poder.

No segundo capítulo, apresentamos um breve histórico da territorialização da Sadia no

Brasil e sua instalação no município de Dois Vizinhos com abrangência em Verê. Analisamos

as implicações ocorridas a partir da implantação de um sistema tecnológico de produção

integrada de frangos e os mecanismos de subordinação, ao Sistema Sadia de Produção,

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considerando o contrato, através do qual se estabelece uma relação de amarramento do

avicultor, que deve cumprir inúmeras obrigações e deveres, respeitando os interesses da

integradora.

No terceiro, tratamos dos conceitos de agricultura familiar e de sua perda de

identidade a partir da modernização da agricultura e da consequente dependência por parte

das indústrias de tecnologias e insumos químicos. Como alternativa para o desenvolvimento

territorial, apresentamos a agroecologia, um contraponto ao processo de perda de autonomia e

de identidade, através do qual se amenizam os problemas ambientais e se proporciona a

inclusão social dos agricultores familiares.

No quarto capítulo, desenvolvemos um breve histórico da atuação e da

responsabilidade das entidades parceiras dos produtores agroecológicos de Verê: o CAPA, a

APAV, a REDE ECOVIDA, a CRESOL, a APROVIVE, e a ASSESOAR, todas com um

papel fundamental no incentivo aos produtores, e na organização da produção e da

comercialização. Ademais, todos os agricultores atribuem a estas entidades o mérito pelo

desenvolvimento da agroecologia no município de Verê.

No quinto e último capítulo, descrevemos algumas propriedades agroecológicas do

município de Verê, divididas em dois grupos: dos agricultores parcialmente agroecológicos e

dos produtores totalmente agroecológicos. Cabe ressaltar que essa divisão faz-se necessária

porque algumas propriedades têm, juntamente com a produção agroecológica, a produção

convencional, às vezes como agricultor ou, ainda, como arrendador. Dessa maneira,

exemplificamos através da descrição de 4 propriedades parcialmente e de 3 totalmente

agroecológicas. Apresentamos, ainda,um mapa com a localização de cada produtor do

município, evidenciando a formação de um centro de produtores na Vila Colonial e a relação

existente entre alguns agricultores que pertencem à mesma família, como os irmãos Moreschi

que, através de cursos ofertados pelo CAPA, produzem agrecologicamente nas suas

propriedades.

Num segundo momento, realizamos uma síntese da produção nas propriedades, em

que os dados qualitativos e quantitativos foram divididos em quadros que mostram

sucintamente parte da organização, da produção e da comercialização agroecológica em Verê.

Esperamos, com esta pesquisa, contribuir para a discussão acadêmica sobre a

paisagem, o território, o desenvolvimento e as suas relações identitárias e de poder e, ainda,

apresentamos a agroecologia como forma de produção alternativa, em relação à agricultura

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familiar, com o intuito de colaborar na reflexão e encontros de resistência ao modo de

produção agrícola convencional.

Além da análise científica realizada, buscamos através da sistematização das

informações, elaboração dos croquis, disponibilização de dados da produção agroecológica do

município de Verê, trabalhar com as entidades parceiras da agroecologia e agricultores

agroecológicos, contribuindo com o processo de organização e divulgação da agroecologia,

pautada no desenvolvimento socioespacial.

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CAPÍTULO I – PAISAGEM E TERRITÓRIO: RELAÇÕES DE PODER

1.1 – CONCEPÇÕES DE PAISAGEM

Desde o século XI, há discussões sobre a paisagem, que era dividida entre a paisagem

natural e a cultural; atualmente, essas discussões são realizadas para entender as relações

sociais e naturais num determinado espaço. O conceito de paisagem tem-se constituído num

conceito-chave da geografia, capaz de possibilitar unidade num contexto de afirmação da

ciência.

A paisagem foi importante em várias vertentes epistemológicas como na geografia

alemã, por exemplo, que a introduziu como categoria científica; os autores franceses

caracterizam a ―paysage” (paisagem) como resultado do relacionamento do homem com o

seu espaço físico; após os anos 1940, com a Revolução Quantitativa, nos Estados Unidos,

surge a “Human Ecology” (Ecologia Humana), substituindo o termo ―landscape” (paisagem),

deixando de ser um conjunto de variáveis deduzidas da realidade (ação humana) para ser

entendida como um sistema ecológico, cujas características são destacadas por Schier (2003).

Na geografia alemã, introduziu-se o conceito de paisagem compreendida até os anos

1940, como um conjunto de fatores humanos e naturais. Conforme Claval (2004), a paisagem

foi considerada interface de processos naturais e sociais, podendo ser analisada a partir de

representações cartográficas e de análise geográfica. Para o autor, o papel do geógrafo é

multiplicar os pontos de vista, olhar o relevo, de perto e de longe, e construir, a partir daí, uma

imagem sintética da região que analisa.

Entre os autores citados por Paul Claval está Humboldt. Este considerava as palavras

insuficientes para descrever as paisagens visualizadas e representava a paisagem da América

Latina com gravuras, originando a Vues dês cordillères et Monuments dês Peuples Indigènes

de l’Amèrique (Vistas de Cordilheiras e Monumentos de povos indígenas da América) que,

segundo Claval (2004), permitiu compreender o que eram as paisagens naturais e as formas de

ocupação do solo de alguns países da América, além de demonstrar aspectos da paisagem

vista a partir da linguagem comum. Além disso, Humboldt tinha uma visão holística da

paisagem, associando elementos diversos da natureza e da ação humana.

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Em 1880/90, outro geógrafo também contribuiu para a concepção de paisagem,

Friederich Ratzel, que, por meio de sua obra Antropogeografia, buscou compreender a

influência do meio sobre os indivíduos e grupos, procurando explicar as transformações que a

atividade humana desencadeava no ambiente. Segundo Claval (2004), Ratzel via a paisagem

de uma forma antropogênica, demonstrando ser ela o resultado do distanciamento do espírito

humano do meio natural, descrevendo uma dialética entre os elementos fixos da paisagem

natural, ― como solos e rios ― com elementos móveis, comumente humanos.

Analisando as formas com que Claval (2004) descreve as concepções de paisagem de

Humboldt e Ratzel, percebemos que Humboldt observava mais os objetos naturais da

paisagem tais como o solo, as montanhas e a vegetação; já Ratzel não deixava as questões

naturais de lado, porém destacava fatores como as transformações ocorridas no ambiente

através da ação humana.

Mais tarde, no século XX, Sauer (1925) afirma que o termo paisagem é apresentado

para definir o conceito de unidade da geografia, para caracterizar a associação peculiarmente

geográfica dos fatos. Pode ser definida ―como uma área composta por uma associação

distinta de formas, ao mesmo tempo físicas e culturais”. (p. 23)

Para Sauer, a existência da paisagem não está ligada à necessidade de interação entre

os elementos naturais e antrópicos, pois as características anteriores às ações humanas são

morfológicas; com a ação humana, o mesmo espaço passa a formar um novo conjunto: há,

então, uma paisagem anterior à ação humana e outra posterior a ela.

Claval (2004) afirma que, na geografia posterior a 1900, a leitura da paisagem deixa

de ser horizontal — quando partes importantes ficavam escondidas — e passa a ser vertical,

pois, a partir de mapas da vegetação, da utilização do solo, das formas de habitat, tornam-se

perceptíveis os contrastes e características importantes nas paisagens.

Segundo Claval (2004), a partir da visão vertical,

O geógrafo aprende, a multiplicar os pontos de vista. Também procura

aproveitar-se da visão oblíqua para dar à paisagem a dimensão vertical que a

visão horizontal esmaga: vistos do solo, os traços da topografia são lidos

diretamente; as colinas, as montanhas dominam a cena. (p. 26)

Por alguns anos, o conceito de paisagem foi deixado de lado, dando lugar a outros

conceitos — como o de território, lugar, região e espaço — considerados mais relevantes na

ciência geográfica. Porém, o conceito não desapareceu e passou a ser novamente discutido,

merecendo mais atenção, passando a depender da cultura das pessoas que o constroem, pois

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ele é um produto cultural resultado do meio ambiente sob ação da atividade humana.

(SCHIER, 2003).

Segundo Corrêa (2004), a partir de 1970, a retomada do conceito de paisagem ocorreu

com novos sentidos fundados em outras matrizes epistemológicas. Assim, apresenta as

dimensões que cada matriz epistemológica privilegia.

[...] tem uma dimensão morfológica, ou seja, é um conjunto de formas

criadas pela natureza e pela ação humana, e uma dimensão funcional, isto é,

apresenta relações entre as suas diversas partes. Produto da ação humana ao

longo do tempo, a paisagem apresenta uma dimensão histórica. Na medida

em que uma mesma paisagem ocorre em certa área da superfície terrestre,

apresenta uma dimensão espacial. Mas a paisagem é portadora de

significados, expressando valores, crenças, mitos e utopias: tem assim uma

dimensão simbólica. (CORRÊA, 2004, p. 8)

A complexidade do conceito de paisagem, assim como outros conceitos, permite aos

geógrafos concebê-la diferentemente e estudar vários tipos de paisagens, o que torna as

discussões mais diversificadas, conforme cita Schier (2003):

Tradicionalmente, os geógrafos diferenciam entre a paisagem natural e a

paisagem cultural. A paisagem natural refere-se aos elementos combinados

de terreno, vegetação, solo, rios e lagos, enquanto a paisagem cultural,

humanizada, inclui todas as modificações feitas pelo homem, como nos

espaços urbanos e rurais. De modo geral, o estudo da paisagem exige um

enfoque, do qual se pretende fazer uma avaliação definindo o conjunto dos

elementos envolvidos, a escala a ser considerada e a temporalidade na

paisagem. Enfim, trata-se da apresentação do objeto em seu contexto

geográfico e histórico, levando em conta a configuração social e os

processos naturais e humanos. (p. 80).

A citação de Schier (2003) faz referência a uma visão tradicional e clássica da

geografia em relação à paisagem. Essa visão de separação entre paisagem natural e cultural

foi predominante até o início da década de 1970, quando surgem trabalhos propondo

perspectivas integradoras como as de Augustin Berque, Claude Bertrand e Paul Claval.

Para Bertrand apud Schier (2003), a paisagem não é a simples adição de elementos

geográficos. É uma determinada porção do espaço, resultado da combinação dinâmica de

elementos físicos, biológicos e antrópicos que, reagindo dialeticamente uns sobre os outros,

fazem da paisagem um conjunto indissociável. Com esse autor, percebemos a valorização da

paisagem de forma homogênea, entendendo que a sociedade e a natureza têm uma relação

íntima, pois juntas conseguem formar uma só entidade.

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Berque apud Schier (2003), descreve a sua concepção, comentando que a paisagem

tem um papel duplo, pois, ao mesmo tempo, ela é marca/grafia e matriz. Grafia que o próprio

homem imprime na superfície terrestre; marcas constituem matrizes, isto é, condições para a

existência e ação humana. Como ele mesmo afirma, a paisagem é plurimodal, assim como os

sujeitos que nela existem; é conjunto unitário que se autoproduz e se autorreproduz.

Dessa forma, a paisagem existe na sua relação com a sociedade que a produziu e está

em constante transformação; isso indica a ação cultural de transformação da sociedade.

Assim, Machado (2009) destaca que a paisagem é o resultado da ação humana no espaço, ou

seja, o resultado das transformações do espaço provocadas pela ação humana.

Segundo Claval (2004), nesse ―novo período‖, surge uma discussão sobre a paisagem

agrária, que exprime as ações do homem no solo a partir da produção agrícola. Assim, a

paisagem agrária é definida como uma combinação de fatores como o habitat, as parcelas de

terra que intervêm na organização do espaço rural, revelando que o aspecto cultural teve um

papel relevante na concepção de paisagem. Esta, segundo Schier (2003), é resultado da

determinação do comportamento das pessoas em relação ao ambiente.

Claval (2004) afirma que o homem é responsável pelas transformações das paisagens e

que os diferentes grupos culturais são capazes de provocar nelas diferentes transformações.

Segundo Schier (2003), a ação humana é a materialização das ideias dentro de

determinados sistemas de significação. Assim, ela [paisagem] é humanizada não apenas pela

ação humana, mas igualmente pelo pensar. Cria-se a paisagem como uma representação

cultural (p. 81).

Quando falamos em humanização da paisagem, não podemos esquecer as

consequências das ações, pois, muitas vezes, o enfrentamento do homem em relação à sua

natureza exterior é tão forte que chega a ser degradante.

Segundo Machado (2009), as forças produtivas variam de acordo com o tempo e com

a evolução da sociedade, o que causa diferentes impactos no ambiente.

A transformação da paisagem pelas atividades humanas está intimamente

ligada à relação sociedade-natureza, apresentando um caráter dialético e

complexo. É por isso, que a busca do elo entre os aspectos naturais e sociais

formadores da paisagem tem sido realizada por pesquisadores que

apresentem um viés materialista (materialismo histórico dialético)

(MACHADO, 2009, p. 45).

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Quando há apropriação, demarcação, ocupação, cultivo e transformação na paisagem,

a impressão do homem nela é inevitável, porém, antes disso acontecer, a paisagem já existe,

pois ela é anterior e posterior ao homem.

A concepção de paisagem de Milton Santos é diferente de outras como as de Paul

Claval e Raul Schier, pois Santos (1996), em suas contribuições sobre o conceito de paisagem

segue um posicionamento materialista, definindo a paisagem como “conjunto de formas que,

num dado momento, exprimem as heranças que representam as sucessivas relações

localizadas entre o homem e a natureza” (p. 102). Para esse autor, a paisagem é tudo aquilo

que é possível alcançar com a visão. Porém, devemos lembrar que a paisagem não está

parada, mas em constante transformação; é formada por fixos e fluxos naturais e sociais que,

muitas vezes, ficam como herança de diferentes períodos históricos.

Para Turri apud Saquet (2007), a paisagem é compreendida como materialidade

resultante do processo histórico de formação de certo território, ―(...) a paisagem é a

vestimenta histórica do território, mas este e as mudanças diacrônicas nele inscritas

permanecem, como dados, incorporados no tecido territorial‖ (p. 8). Para Saquet (2007), a

paisagem pode ser compreendida como o aparente, o observado, o percebido, o representado,

todavia não está separada do território.

Hoje, podemos perceber a existência de várias concepções de paisagem; Discutir a

pluralidade conceitual é, para a Geografia, um grande desafio bem como relacionar a

paisagem com outros conceitos, como o de território. Dessa forma, analisaremos também o

conceito de território, que é onde os sujeitos e objetos transformadores da paisagem

encontram-se e constroem novas paisagens através de um processo de ocupação, apropriação

e modificação do espaço geográfico.

Santos (1996) considera o espaço geográfico como conjuntos indissociáveis de

sistemas de objetos e sistemas de ações, definição que permite pensar uma multiplicidade de

combinações entre ações e materialidade. Tal conceituação de espaço geográfico condicionou

Santos (2000) a propor que a categoria de análise seja a de ―território usado‖.

O território usado constitui-se como um todo complexo onde se tece uma

trama de relações complementares e conflitantes. Daí o vigor do conceito,

convidado a pensar processualmente as relações estabelecidas entre o lugar,

a formação socioespacial e o mundo [...] O território usado, visto como uma

totalidade, é campo privilegiado para a análise, [...], da própria

complexidade do seu uso. (SANTOS, 2000, p. 3 e 12)

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1.2 – CONCEITO DE TERRITÓRIO: O PROCESSO DE TERRITORIALIZAÇÃO,

DESTERRITORIALIZAÇÃO E RETERRITORIALIZAÇÃO

Os diferentes conceitos de território são abordados, por autores de grande importância

na formação da ciência geográfica e de outras ciências sociais como Jean Gottmann, Félix

Guatarri, Milton Santos, Manuel Corrêa de Andrade, Rogério Haesbaert, Claude Raffestin,

Marcelo Lopes de Souza, que definem o território evidenciando as vertentes epistemológicas,

explicitando suas concepções teórico-metodológicas e as dimensões políticas, culturais ou

econômicas, ou mesmo interligando todas elas para explicar a formação e a construção de um

território que está sempre em movimento espacial e temporal (histórico).

O conceito de território, na geografia, foi deixado de lado durante boa parte do século

XX, quando outros conceitos, como o de região, eram discutidos. Foi, então, resgatado e

integrado, nas décadas de 1960/1970, subjacente ao movimento de renovação do pensamento

geográfico, segundo Cazella (2009), com base metodológica marxista, que propõe uma

reflexão essencialmente econômica e política e resulta numa concepção que define o território

pelo seu uso social.

Ratzel apud Machado (2009), desenvolveu a noção de território a partir da concepção

de habitat, ou ―área de domínio‖ de uma espécie, muito utilizado pelas ciências biológicas.

Dessa forma, o território surge como sinônimo de ambiente, solo, recursos naturais. De

acordo com Ratzel, as relações entre a sociedade e o território ocupado por ela são

determinadas pelas necessidades de habitação e alimentação. E é ele que dá possibilidade de

desenvolvimento da vida humana, sendo ou não habitado.

Segundo Machado (2009), a palavra território, do latim, territorium, é derivado da

palavra ―terra‖. No sentido ontológico, é entendido como o ambiente de um grupo social e

também como o ambiente de uma pessoa. No ―Dicionário de Língua Portuguesa‖ organizado

por Bueno (1996), o território é descrito como ―extensão de terra, área de um país ou

província, área de uma jurisdição‖; o ―Dicionário de Geografia Humana‖, organizado por

Johnson apud Machado (2009), mostra que o território pode ser entendido como um termo

para descrever uma porção do espaço ocupado por uma pessoa, um grupo ou um Estado.

Um dos pioneiros na conceituação renovada de território na geografia foi Claude

Raffestin, que pauta suas ponderações nas dimensões políticas e econômicas do uso do espaço

e da efetivação da territorialidade. Assim, nas palavras do autor:

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É essencial compreender bem que o espaço é anterior ao território. O

território se forma a partir do espaço, é o resultado de uma ação conduzida

por um ator sintagmático (ator que realiza um programa) em qualquer nível.

Ao se apropriar de um espaço, concreta ou abstratamente [...] o ator

‗territorializa‘ o espaço. (RAFFESTIN, 1993, p. 143).

O território é tratado por Raffestin (1993) com uma visão reticular, ou seja, relacional,

pois o espaço deixa de ser território quando há trabalho humano que o delimita e transforma-o

em Estado onde o poder é expresso sobre tal espaço. O território, para esse autor, é ―um

espaço onde se projetou um trabalho, e por conseqüência (sic) revela relações de poder, ele se

apóia no espaço, mas ao mesmo tempo não é espaço, é uma produção a partir do espaço‖

(Raffestin, 1993, p. 144).

O território, segundo Raffestin (1993), surge a partir da apropriação do espaço pelas

relações nele estabelecidas, relações estas que se inscrevem no campo do poder. Os indivíduos

ou grupos ocupam pontos no espaço e se distribuem de acordo com modelos que podem ser

aleatórios, regulares ou concentrados (p. 150). Nesse processo, o fator distância é

fundamental, pois refere-se à interação entre os diferentes locais. As interações política,

econômica e cultural conduzem a sistemas de malhas, nós e redes que se imprimem no espaço

e constituem o território.

Esse sistema de malhas, nós e redes organizados hierarquicamente, asseguram o

controle sobre aquilo que se movimenta de um território para outro. As malhas, nós e redes

não são iguais em todas as sociedades, porém sempre estão presentes.

A tessitura territorial pode comportar níveis que são determinados pelas funções que

devem realizar-se em cada uma das malhas. Conforme Raffestin (1993), uma tessitura pode

assegurar à população um conjunto de atividades; dessa forma, existem dois tipos de

tessituras (malhas) que precisam ser diferenciadas: a “desejada” e a “suportada”; a primeira,

aquela que tenta aproveitar da melhor forma possível o campo operatório do grupo; a

segunda, aquela que tenta aumentar o controle do grupo. Nos dois casos, a malha é a projeção

de limites, no entanto, ela é sempre o enquadramento de poder, expressando a área de

exercício dos poderes. Enfim, as malhas superpõem-se, cortam-se e recortam-se sem parar.

Segundo Saquet (2007), a dimensão de uma malha cristaliza todo um conjunto de

fatores, que podem ser físicos e/ou humanos (E-P-C-N)1. Conforme já citamos, as malhas não

são idênticas nem uniformes, todavia sempre estão presentes; assim, além da população,

1 Segundo Saquet (2007), os fatores Econômico, Político, Cultural e Natural (E-P-C-N) cristalizam a referida

malha.

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acolhem elementos como agroindústrias, indústrias e bancos, que revelam nós ou marcos

territoriais.

Segundo Raffestin (1993) os nós podem modificar não somente a imagem como

também as malhas onde se encontram. Os nós expressam os locais de poder e, ao mesmo

tempo, locais de referência, cuja disposição determina independência ou relações, pois

representam a localização dos atores. Como exemplo disso, podemos citar a APAV, no

município de Verê, ponto determinante das relações dos produtores agroecológicos e dos

consumidores.

Mas esses atores não se opõem; agem e, em conseqüência, procuram manter

relações, assegurar funções, se influenciar, se controlar, se interditar, se

permitir, se distanciar ou se aproximar e, assim, criar redes entre eles. Uma

rede é um sistema de linhas que desenham tramas. Uma rede pode ser

abstrata ou concreta, visível ou invisível (RAFFESTIN, 1993, p. 156).

As redes são as ―linhas‖ que ligam um território a outro, através da movimentação de

mercadorias, pessoas, comunicações e ideias; dessa forma, podemos vê-las ou não, mas

percebemos que estão presentes. Conforme Raffestin (1993), as redes asseguram a

comunicação entre os diferentes pontos que desempenham o papel de comunicação e podem

impedir outras comunicações como, por exemplo, redes rodoviárias, ferroviárias e de

navegação que, muitas vezes, arruínam o tráfego entre pontos importantes ou não. Para

finalizar, Raffestin (1993) enfatiza que toda rede é uma imagem de poder, ou mais

exatamente, do poder ou dos atores dominantes (p. 158). Isso pode ser observado na empresa

Sadia, que estabelece uma rede, ligação com os produtores integrados e, ao mesmo tempo,

exerce seu poder de integradora sobre eles, através do contrato ou das normas impostas para o

produtor conseguir integrar-se, conforme abordaremos no capítulo 2.

A organização do território é marcada pelas redes de comunicação que influenciam na

formação da estrutura social do grupo. O sistema é tanto um meio como um fim (p. 158).

Como meio, demonstra o território, e como fim, conota a ideia de organização, que se objetiva

na paisagem.

Para Raffestin (1993), o sistema territorial pode ser compreendido a partir de

combinações estratégicas realizadas pelos atores; como meio pode ser interpretado por

mediação dos ganhos auferidos e dos custos pagos por esses atores. O sistema territorial é,

portanto, produto e meio de produção (p.158).

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Como o território é composto por atores, que realizam ações e relações onde o poder é

usado e representado, para Raffestin (1993), a territorialidade pode ser entendida como um

conjunto de relações que são produzidas num sistema tridimensional (sociedade-espaço-

tempo), buscando sempre autonomia.

A territorialidade aparece então como constituída de relações mediatizadas,

simétricas ou dissimétricas com a exterioridade [...]

A territorialidade se inscreve no quadro da produção, da troca e do consumo

de coisas [...]

A territorialidade se manifesta em todas as escalas espaciais e sociais, ela é

consubstancial a todas as relações (RAFFESTIN, 1993, p. 161-162).

Percebemos, então, que o território, para Raffestin (1993), é formado pelas relações

multidimensionais e a territorialidade é o produto dessas relações; portanto, cada território

possui sua territorialidade, que pode ser potencializada para a conquista de autonomia, como

ocorre em Verê por meio das ações do CAPA ( a ser trabalhado mais adiante, no capítulo 4).

Em outro momento, além do território, Raffestin descreve o processo TDR

(territorialização, desterritorialização e reterritorialização), relacionado a fatores econômicos.

Conforme Saquet (2007), o processo de TDR gera um espaço temporalizado por causa das

informações, comunicações que circulam e comunicam; ao mesmo tempo, há também o

condicionamento do TDR por fatores culturais numa relação economia-cultura.

[...] a territorialização implica [...] um conjunto codificado de relações [...], a

desterritorialização é, em primeiro lugar, o abandono do território, mas

também pode ser interpretada como a superação de limites das fronteiras [...]

A reterritorialização [...], pode ocorrer sobre qualquer coisa, através do

espaço, a propriedade, o dinheiro etc. (RAFFESTIN 1984, apud SAQUET

2007, p. 78)

Conforme Saquet (2007), esse processo corresponde à perda e reconstrução de

relações sociais. Na territorialização, há limites, enquadramento e distinção; já as inovações e

sua difusão provocam a desterritorialização e novas relações. A territorialidade é dinâmica e

é caracterizada por continuidades e descontinuidades (SAQUET, 2007, p. 79).

Consoante Meo (1998), para ocorrer a construção do território, são necessárias quatro

dinâmicas particulares: a) o poder político como tecido administrativo; b) as dinâmicas sócio-

econômicas ligadas ao sistema produtivo (como os distritos industriais); c) os

comportamentos e aspectos identitários e de pertencimento, que dão origem à

dominação/apropriação do território como forma de demonstração do exercício do poder; d)

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as dinâmicas naturais, ligadas à dominação de determinado grupo social sobre a natureza,

transformando-a e apropriando-se dela.

Assim como em Raffestin e Méo, a ideia de poder entra na discussão de território feita

por Saquet. Este autor faz um resgate das diferentes interpretações de território, considerando

a territorialidade e evidenciando as dimensões sociais fundamentais de sua compreensão e

constituição no real, ou seja, a economia, a política, a cultura e as relações do homem vivendo

em sociedade com a sua natureza exterior:

O território é produzido espaço-temporalmente pelas relações de poder

engendradas por um determinado grupo social. Dessa forma, pode ser

temporário ou permanente e se efetiva em diferentes escalas, portanto, não

apenas naquela convencionalmente conhecida como o ‗território nacional‘,

sob gestão do Estado-Nação (SAQUET, 2004, p.81).

Em obra anterior, Saquet (2003/2001) dá sua contribuição ao citar que o território é

uma construção coletiva e multidimensional, com múltiplas territorialidades, diferenciando o

território do espaço geográfico através de três características principais: as relações de poder,

as redes e as identidades.

Para Saquet (2007), a identidade pode ser individual, quando uma pessoa adapta-se e

identifica-se com um novo contexto social, e coletiva, quando um grupo social constrói sua

identidade com relações de afetividade, confiança e reconhecimento. A identidade se refere à

vida em sociedade, a um campo simbólico e envolve a reciprocidade. (idem)

A identidade pode sofrer modificações como, por exemplo, em seu caráter político,

que dá possíveis condições de transformação social, todavia a conservação da forma de vida é

fundamental para a reprodução dessa identidade, que também pode ser entendida como

unidade na diferencialidade tanto econômica como política e cultural.

Conforme Saquet (2007), a identidade é entendida como produto histórico e unidade

entre as relações transescalares. Unidade de contradições, lugares, pessoas na circulação e

comunicação, histórica e simultaneamente constituída econômica, cultural e politicamente.

(idem)

A circulação e comunicação, citadas por Saquet, são possíveis através de redes, vias

para os fluxos, mediações e articulações entre os territórios e lugares. As redes são

construídas a partir da ligação, circulação e comunicação entre um território ou vários

territórios.

Outro fator presente no território descrito por Saquet (2007) é o poder inerente às

relações sociais, relações estas que são estabelecidas e, juntamente com outros fatores (E-P-C-

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N), dão origem ao território, substantivando o campo de poder. Este, presente nas ações do

Estado, das instituições, das empresas, enfim, nas relações sociais que se efetivam na vida

cotidiana visando do controle e à dominação de homens e coisas.

Assim como o poder e a identidade, a natureza, para Saquet (2007), também faz parte

do território, onde ocorre uma interação interdisciplinar e significante, sobre a qual há outras

discussões referentes ao ambiente natural, à natureza e à sustentabilidade. Assim, o território é

condição para o desenvolvimento; é natureza e sociedade manifestando-se de forma específica

em diferentes lugares.

Por fim, a natureza é compreendida pelo autor como corpo inorgânico do homem,

como algo exterior ao homem, pois este significa natureza e sociedade ao mesmo tempo, e o

território é produto histórico da relação sociedade-natureza, multiescalar e condição para a

vida (idem). Tanto na natureza como na sociedade, o homem vive relações construindo um

mundo material e imaterial.

O homem, por ser natureza e sociedade ao mesmo tempo, estabelece relações, ligações

e mudanças entre vários territórios. Segundo Saquet (2007), a territorialização é resultado e

condição dos processos sociais e espaciais, efetivando-se nessa relação, sociedade-natureza,

mediada pelas territorialidades. A territorialização cria enraizamentos e identidades que

podem ser transformadas, modificadas com a desterritorialização, processo que leva à perda

do território, de raízes, ao mesmo tempo ocorrendo a reterritorialização, que corresponde à

constituição de novos territórios com uma nova apropriação política e/ou simbólica do espaço.

Portanto, para Saquet (2007), a desterritorialização num lugar significa a

reterritorialização em outro lugar, pois os processos TDR são concomitantes e

complementares, ou seja, os processos de mobilidade dos indivíduos e as mudanças-

permanências sociais e territoriais que estão presentes em qualquer arranjo e apropriação

espacial (p. 89-90).

Desse modo, concordamos com Saquet (2007) quando ele afirma que

O território é produto social e condição. A territorialidade também significa

condição e resultado da territorialização. O território é o conteúdo das

formas e relações materiais e imateriais, do movimento, e significa

apropriação e dominação, também material e imaterial (p. 90).

Posteriormente, Saquet (2008) afirma que as redes, poderes, territórios, apropriações,

territorialidades, atores, trabalhos, produções são elementos e movimentos presentes na

territorialização, desterritorialização e reterritorialização. Para compreender tais fatores, é

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necessário levar em consideração alguns aspectos como: a) os atores sociais e suas ações

cotidianas em forma de redes; b) as formas de apropriação simbólica e materiais do espaço,

isto é, econômicas, políticas e culturais; c) as técnicas e tecnologias, os instrumentos e

máquinas, o saber popular como mediações entre o homem e o espaço; d) as relações de poder

e de trabalho; e) os objetivos, as metas e as finalidades de cada grupo social ou conjunto de

atividades; f) as diferentes relações do homem com sua natureza exterior; g) as identidades; i)

os processos de territorialização, desterritorialização e reterritorialização, todos elementos que

servem de orientação para esta pesquisa.

É mister considerar o território como espaço habitado por determinada classe ou grupo

social que, através de suas ações, dão identidade e forma ao território; nele, as relações de

poder, de trabalho, de trocas, de movimento e transformação ocorrem, pois está sempre apto a

modificações, transformações e tornam-se indispensáveis os processos de territorialização,

desterritorialização e reterritorialização (TDR), pois o mesmo território recebe/perde/recebe

grupos sociais, identidades e características, propícios a alterações.

Desse modo, a territorialização é a construção/apropriação do espaço a partir do

trabalho de classes ou grupos sociais que imprimem uma dimensão simbólica e cultural,

dando origem e caracterizando particularmente cada território, dando identidade e

estabelecendo relações sociais e de poder.

A territorialização, para Turco (1988), significa um processo de complexificação que

ocorre sobre o espaço com componentes e relações sociais, isto é, um cenário plural que deve

ser compreendido contemplando-se uma pluralidade escalar. Ao mesmo tempo que o processo

de territorialização significa enraizamento de um determinado grupo social num território, o

processo de desterritorialização corresponde ao desarraigamento que ocorre no território, pois

há um constante movimento de informações, pessoas e mercadorias, presentes na sua

(re)construção e efetivação, o que também dá origem a uma nova identidade — que é

reterritorializada — criando novas territorialidades.

O processo de desterritorialização, conforme Saquet (2007), significa a destruição de

antigos territórios e/ou desintegração de novos espaços em redes promovidas especialmente

pelas redes nacionais - globais dos complexos agroindustriais capitalistas.

Um exemplo claro é o que ocorre com alguns trabalhadores da fábrica de produção de

aves da Sadia, pois vários se deslocam dos seus municípios (Verê, Salto do Lontra, Cruzeiro

do Iguaçu) para trabalhar em Dois Vizinhos e, em muitos casos, passam a residir neste

município perdendo suas raízes e estabelecendo outras num novo território.

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Mesmo com o processo de mundialização de informações, mercadorias e pessoas

ocasionado pelo capital, ainda há experiências de enraizamento e fixação com relações

afetivas e políticas reproduzidas na construção do território. Com o processo de

reterritorialização, podemos considerar que as informações, mercadorias e pessoas vão criar

um novo enraizamento no território.

Para Deleuze e Guatarri (1976), a reterritorialização é como a reconstituição, a

restituição do poder: ―As sociedades modernas civilizadas se definem por procedimentos de

decodificação e de desterritorialização. Mas, o que elas desterritorializam de um lado, se

reterritorializam de outro” (p. 327). São novas territorialidades complexas e variadas

constituídas na reterritorialização.

Assim, concluímos que o território é um espaço habitado, construído, transformado e

apropriado por uma classe ou grupo social que imprime, através do trabalho, características

particulares na economia, política e cultura. A identidade do território é, portanto, uma

consequência do processo de territorialização estabelecida pelas relações de poder e contendo

diferentes significados de desenvolvimento.

1.3 - DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL E RELAÇÕES DE PODER

Para Furtado (1980), a idéia corrente de desenvolvimento refere-se a um processo de

transformação que engloba o conjunto da sociedade. Essa transformação está ligada à

introdução de métodos produtivos mais eficazes e manifesta-se sob a forma de aumento do

fluxo de bens e serviços finais à disposição da coletividade. O desenvolvimento vai em

direção da eficiência e da satisfação plena das necessidades humanas.

[...] O comportamento racional do homem tem sua origem na prática da

produção dos meios de subsistência. Essa prática conduz o homem a fixar

objetivos e a adequar meios para consecução desses objetivos [...] Traduzir

essa percepção em regras, em informação transferível mediante símbolos, é

criar uma técnica. Portanto, a técnica é uma forma de ação programada em

um código. Seu ponto de partida é a ação, [...] O comportamento é tanto

mais racional, quanto mais se obtém os fins almejados, dados os meios

disponíveis. Comportamento racional corresponde, portanto, a

comportamento eficiente, e maior eficiência significa progresso técnico. Ora,

o progresso técnico é fruto da criatividade humana, da faculdade do homem

para inovar. Portanto, é essa faculdade que possibilita o avanço da

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racionalidade no comportamento que cria o desenvolvimento (FURTADO,

1980, p. 43).

Entendemos que o desenvolvimento e a eficiência estão ligados, pois há uso da

racionalidade no comportamento humano; como a técnica é um complemento dos meios

naturais de que dispõe o homem para agir, com essa racionalidade ele dá origem aos métodos

que satisfazem às suas necessidades, sejam elas naturais ou criadas. Portanto, o

desenvolvimento da capacidade do homem para agir e para produzir funda-se num misto de

inventividade e acumulação (Idem, p. 46).

Quando falamos em acumulação, surge outra discussão em torno do desenvolvimento

econômico, visto como processo de difusão da civilização industrial, que Furtado (1980)

chama de “adoção dos padrões de modernidade”, que não exprime o desenvolvimento

referido anteriormente, pois não permite o desenvolvimento hegemônico e, ao mesmo tempo,

monopoliza a criatividade em benefício de alguns países.

A aceleração do processo de acumulação na organização das forças de produção

provoca rápida transformação nas estruturas sociais; segundo Furtado (1980), entre as

transformações podemos citar: a urbanização desigual, a desorganização da vida comunitária,

o desemprego, a venda da força de trabalho. Tais resultados estão presentes na sociedade atual

como subordinação da mão-de-obra dos trabalhadores assalariados aos donos dos meios de

produção; muitos assalariados vivem em condições precárias aumentando o banditismo, o

tráfico de drogas e outros processos que expõem a diferenciação da sociedade em classes

sociais.

Para Souza (2008), mais do que a concepção de desenvolvimento econômico,

devemos considerar as estratégias de desenvolvimento sócio-espacial, voltadas diretamente

para a justiça social e não somente para o desenvolvimento do capitalismo e modernização

tecnológica. O autor compreende o crescimento através da satisfação das necessidades

humanas como liberdade, acesso à cultura, alimentação, vestuário, infra-estrutura de serviços

públicos, habitação e outros.

Segundo Souza (2008), não se pode confundir crescimento com desenvolvimento, pois

o crescimento não traz justiça social e o desenvolvimento tem como base a autonomia; é um

processo de auto-instituição da sociedade em direção à liberdade, à justiça social com menos

desigualdades, com discussão livre e racional por parte de cada um dos membros da

coletividade acerca do sentido e dos fins do viver em sociedade.

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Para o autor, a sociedade autônoma possui identidade cultural, contém recursos que

estão disponíveis à acessibilidade igual para todos; é uma sociedade com relações de poder,

não o poder do Estado separado da sociedade, mas uma sociedade que formule as suas

próprias leis. Essa autonomia é a base do desenvolvimento, isto é, da transformação e da

autocrítica na direção de uma justiça social cada vez maior (Souza, 2008, p. 106).

Quando falamos sobre desenvolvimento, englobamos todos os desenvolvimentos, ou

seja, o econômico, o social, o regional e o territorial, porquanto todos estão interligados e

aparecem no mesmo espaço dominado por relações de poder, o que dá origem ao território.

Consoante Saquet (2007), o desenvolvimento territorial supera o desenvolvimento

econômico, pois o primeiro é mais amplo e complexo; o próprio desenvolvimento econômico

é, ao mesmo tempo, social e territorial, pois resulta dos processos sociais. Para Dematteis

apud Saquet (2007), o desenvolvimento está ligado à dimensão local do território, sem ser

somente local, isto é, efetiva-se na relação entre o local e o global.

Para entender a questão de desenvolvimento territorial e do próprio território,

Dematteis (2008) faz duas abordagens da territorialidade: a ativa, ―positiva‖, que deriva das

ações coletivas territorializadas dos sujeitos locais e objetiva a construção de estratégias de

inclusão; nela, a territorialidade corresponde às mediações simbólicas, cognitivas e práticas

entre a materialidade dos lugares e o agir social nos processos de transformação territorial; e a

passiva, ―negativa‖ que, com estratégias de controle e com o sistema normativo associado,

objetiva excluir os sujeitos dos recursos.

Para que a concepção ativa possa estar presente nos processos de desenvolvimento, é

necessário explicá-la para servir de análise à descrição da realidade e das potencialidades

territoriais já existentes, para construir os sistemas territoriais e sociais destinados a se

configurarem em atores de desenvolvimento local no âmbito das políticas municipais,

estaduais e nacionais.

Dessa maneira, Dematteis (2008) cita um modelo simplificado de Sistema Local

Territorial (SLOT), ao mesmo tempo, analítico e meio para o planejamento e concretização

de projetos de desenvolvimento. Um SLOT é construído a partir do que já existe e isso pode

garantir a eficácia da projeção do que será edificado (p.27).

Dessa forma, Dematteis (2001) propõe os seguintes componentes analíticos

para o SLOT: a) a rede local de sujeitos, que corresponde às interações entre

indivíduos em um território local, onde há relações de proximidade e

reciprocidade entre os sujeitos do local e de outros lugares. Há a construção

de um ator coletivo; b) o milieu local, entendido como um conjunto de

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condições ambientais locais nas quais operam os sujeitos coletiva e

historicamente; c) a interação da rede local com milieu local e com o

ecossistema, de forma tanto cognitiva (simbólica) quanto material. Há

interações entre os domínios do social e do ambiente; d) a relação interativa

da rede local com redes extralocais, em distintas escalas: regional, nacional e

global. (SAQUET e SPÓSITO, 2008, p. 27).

Segundo Dematteis (2008), através do SLOT indicamos uma potencialidade realizável

na relação entre certos componentes objetivos e subjetivos que são analisados caso a caso.

Esta análise indica possibilidades de articulação do território, sendo a governança direcionada

ao desenvolvimento territorial mais eficaz em relação a outros encaminhamentos que não

consideram a distribuição territorial das capacidades auto-organizativas dos sujeitos e suas

interações com o ―capital territorial‖ local.

Cada um desses sistemas, para Giuseppe Dematteis, tem aspectos ambientais além da

construção social histórica, na qual se dá uma organização política no sentido da coesão e da

projeção do futuro. E, como há preocupação e intencionalidade com a projeção e com o

planejamento, é importante que cada SLOT tenha capacidade de se autoprojetar, consistindo o

estudo num meio para a conquista de autonomia que, como em Souza (1995), significa a

capacidade de controle e gestão de determinados processos políticos, econômicos, culturais e

ambientais. Ser autônomo significa ter liberdade para criar e dar-se a sua própria lei, ao invés

de recebê-la por imposição, tomar nas mãos o próprio destino.

Segundo Souza (2006), a autonomia, além de ser individual, quando o sujeito toma em

suas mãos seu próprio destino, pode também ser coletiva, quando existe a presença de

instituições que garantam igualdade efetiva de oportunidades aos indivíduos, para que estes

possam satisfazer suas necessidades, e para que os sujeitos envolvidos definam os planos e

projetos a serem desenvolvidos juntamente com atores e processos de outros lugares,

relevantes para a regulação da vida coletiva, assim criam-se indivíduos autônomos e

indivíduos educados para a liberdade. Uma relação de unidade na diversidade que precisa ser

gerida com vistas ao desenvolvimento com mais justiça social (DEMATTEIS, 2008, p. 28).

Nas propriedades agroecológicas pesquisadas, a autonomia significa a autogestão, ou

seja, uma resistência ao modo de produção capitalista, pois, segundo Viana (2003), a

autogestão significa que os próprios produtores dirigem sua atividade e o produto dela

derivado. Enquanto no capitalismo há domínio do trabalho morto sobre o trabalho vivo, na

autogestão é diferente, o trabalho vivo predomina, ou seja, a força de trabalho agricultora é

predominante diante dos investimentos em maquinários, (capital fixo).

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A partir disso e dos componentes analíticos do SLOT, será observada e analisada a

organização da produção e das propriedades agroecológicas no município de Verê, pois tal

sistema permite, segundo Dematteis (2008): i) delinear a geografia da projeção e do agir

coletivo num território com base nas relações territoriais existentes; ii) individuar o estado

atual dessas relações; iii) avaliar as possibilidades de ativar as relações que faltam e os

processos de desenvolvimento autocentrados; iv) avaliar a existência e as características dos

valores territoriais produzidos; v) avaliar a sustentabilidade territorial do desenvolvimento,

compreendida como capacidade de produzir o capital territorial sem empobrecer o de outros

territórios; vi) oferecer uma sustentação cognitiva para planos e políticas de vastas áreas

baseada na articulação dos sistemas locais territoriais em rede. Enfim, com o uso do SLOT, o

desenvolvimento territorial torna-se mais acessível, pois permite verificar as dificuldades, as

necessidades e, as características do local onde o plano será realizado.

Para reconhecer o desenvolvimento territorial, de acordo com Saquet e Spósito (2008),

é necessário compreender e conhecer os componentes de cada território como, por exemplo,

os econômicos, os políticos, os culturais e ambientais. Dessa maneira, buscamos entender o

desenvolvimento territorial no município de Verê a partir da agroecologia, seguindo os

elementos e processos que Saquet e Spósito (2008) apontam como necessários: a) a

articulação de classes e construção de redes e tramas locais e extralocais, que significam

relações de poder; b) o caráter (i)material, relacionado com fatores e elementos culturais,

econômicos, políticos e ambientais; c) a produção de mercadorias, a recuperação e

preservação da natureza exterior ao homem; d) a valorização das pequenas e médias

iniciativas produtivas; e) a valorização dos saberes locais e das identidades; f) a consideração

do patrimônio de cada local; g) a produção ecológica de alimentos; h) a organização política

local, visando à conquista de autonomia; i) a diminuição das injustiças e das desigualdades

sociais e outros.

Segundo Saquet e Spósito (2008), para refletir, debater e constituir ações de

desenvolvimento territorial, é necessário, primeiramente, ter uma compreensão renovada e

crítica do território, da territorialidade e do desenvolvimento; é fundamental considerar os

componentes de cada território e também os sujeitos que concretizam esse território, as

necessidades, os valores identitários e patrimoniais, as condições naturais e, finalmente, as

relações e os lugares da vida cotidiana desses sujeitos. É necessário adaptar as técnicas a cada

tipo de território no intuito de realmente concretizar formas de desenvolvimento territorial

com a autonomia que, como diz Souza (1995), é a base do desenvolvimento. Desse modo,

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compreendemos “o desenvolvimento territorial como a organização e a luta pela liberdade,

pela justiça e pelo conhecimento. Quanto mais conhecimento mais condições de organização

política e luta por autonomia”.

Segundo Bonnal e Maluf (2009), no Brasil, a concepção atual para a base das políticas

públicas é a de desenvolvimento territorial, isto é, essas políticas estão enquadradas no

processo de reforma político-administrativa que houve no início, nos anos 1980, e continuou

com a implementação de políticas de ordenamento territorial e desenvolvimento regional dos

anos 1990, voltadas principalmente para o espaço rural e a agricultura familiar.

Foram alguns acontecimentos, conforme Bonnal e Maluf (2009), que influenciaram

diretamente na elaboração dessas políticas públicas, entre eles, a reorganização dos

movimentos sociais agrícolas e rurais, a emergência da agricultura familiar como categoria

sociopolítica e a multiplicação de iniciativas coletivas realizadas pelos movimentos sociais

que definiram políticas específicas para cada modelo de agricultura como, por exemplo, a

ANA – Associação Nacional de Agroecologia. Por fim, por meio dessas políticas públicas,

procura-se fortalecer os agricultores familiares, através de créditos rurais (PRONAF-

Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar), da reforma agrária e de

transferências sociais.

Assim como é importante compreender o território, a territorialidade e o

desenvolvimento para a implantação e manutenção das técnicas de desenvolvimento

territorial, é também necessário conhecer as relações de poder estabelecidas dentro e entre os

territórios. E, para que o desenvolvimento territorial seja efetivado, é indispensável que as

relações sejam estabelecidas não só pelo Estado, mas entre todos os sujeitos que buscam

benefícios coletivos, para que todos tenham acesso aos recursos disponíveis no território.

Então, para Saquet (2007), há necessidade de reordenamento das relações de poder. O

poder está presente em todas as ações realizadas em um território, sejam elas feitas pelo

Estado, pela Igreja, por empresas, sindicatos ou associações.

O campo da relação é um campo do poder que organiza os elementos e as

configurações [...] Toda relação é o ponto de surgimento do poder, e isso

fundamenta sua multidimensionalidade [...] Toda relação é um lugar de

poder, isso significa que o poder está ligado muito intimamente à

manipulação dos fluxos que atravessam e desligam a relação, a saber, a

energia e a informação (RAFFESTIN, 1993, p. 53-54).

O importante dessa discussão sobre o desenvolvimento e as relações de poder é que

ambos se completam, cada um tem papel fundamental na construção do território. Para que

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essa construção se efetive, é necessário que ocorra a apropriação de um espaço por um grupo

social, tornando-o território com base nas relações coletivas e o desenvolvimento deve

diminuir as desigualdades e aumentar a justiça social e a autonomia em cada território.

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CAPÍTULO II – A INTEGRAÇÃO: A SADIA DOIS VIZINHOS E VERÊ

2.1 – SADIA, DOIS VIZINHOS E VERÊ: O HISTÓRICO.

Os municípios de Dois Vizinhos e Verê estão localizados na mesorregião Sudoeste do

Paraná. A população de Dois Vizinhos, segundo a contagem da população do IBGE, em 2007,

é de 34.001 habitantes para uma área de 418,320 km²; já a de Verê, no mesmo ano, é de 8.002

habitantes para uma área de 312,495 km². Ambos os municípios destacam-se pela sua

economia voltada significativamente para a produção agropecuária.

0 30 60 90 Km

Escala aproximada

PARANÁ

Verê

Dois Vizinhos

Base digital: SUDERHSA/IBGE.

Fonte: Sadia de Dois Vizinhos, 2010.Org: BRISKIEVICZ, M.(2010).

MAPA 1 – Localização dos municípios de Verê e Dois Vizinhos no Sudoeste do

Paraná

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A história da Sadia iniciou em Santa Catarina, a partir de Atílio Fontana, lavrador e

descendente de colonos do Rio Grande do Sul que migraram para o Oeste de Santa Catarina.

Segundo Alba (2002), Atílio Fontana instalou-se no Vale do Rio do Peixe, em 1920, e,

em 1925, iniciou uma venda (estabelecimento comercial) de artigos de primeira necessidade

que abastecia as propriedades locais e agia ainda na compra de excedentes agrícolas e suínos

que eram revendidos em São Paulo. A estrada de ferro que se instalou nos anos 1930 foi

importante para seu comércio, pois, em 1936, Fontana administrava seis casas de comércio

distribuídas ao longo da ferrovia, e cada estação era receptora de suínos da região. Em 1940,

adquiriu o Frigorífico Concórdia, reativou-o e em 1944, passou a se chamar Sadia.

A década de 60 foi marco para a Sadia em termos de expansão. Em 1951

adquiriu o moinho da Lapa em São Paulo. Em 1964, inaugurou a Frigobrás

(SP) e criou a Sadia Comercial no Rio de Janeiro. Em 1966 a Sadia adquiriu

o Frigorífico em Toledo no Paraná. Os anos que se seguiram foram

igualmente de grande expansão. Em 1970 foi instalada em Chapecó a Sadia

Avícola S.A., e, em 1974, foi inaugurada a Sadia Oeste S.A., em Várzea

Grande – Mato Grosso (ALBA, 2002, p. 72).

Consoante vimos, a empresa teve sua origem, em 1944, quando Atílio Fontana

reativava o Frigorífico Concórdia, juntamente com o funcionamento do moinho de trigo que,

na época, tinha capacidade de produzir 6 toneladas por dia. Segundo Alba (2002), no mesmo

ano, adquiriram máquinas suíças que passaram a moer 24 toneladas de grãos por dia.

Conforme Kurtz (2009), o abatedouro da Sadia começou a funcionar, em 20 de

novembro de 1944, com o abate de 30 suínos/dia e com 50 funcionários. Naquele ano,

adquiriram maquinários para o frigorífico que passou a abater cerca de 100 animais por dia.

Com a matéria-prima eram produzidos banha, toucinho, carnes salgadas, pernil, presunto,

salame, lombo e linguiça. Já nos anos 1950, a região de Concórdia era a mais desenvolvida do

país na criação e industrialização de suínos.

Nos anos de implementação da Sadia, as dificuldades no transporte eram imensas;

estradas precárias, distâncias enormes, a única maneira de vencê-las era garantir a qualidade

do produto da indústria até o consumidor; então, surgiram as primeiras câmaras frias,

utilizando-se, na época, de geradores de energia elétrica. Conforme Alba (2002), preparam-se

os caminhões isotérmicos e contrataram-se os primeiros técnicos no setor. A empresa possuía

postos de armazenamento de frangos em São Paulo, Bauru, Londrina, Campinas e Ribeirão

Preto e uma representação no Rio de Janeiro.

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Alba (2002) afirma, ainda, que as dificuldades com o transporte obrigaram a Sadia a

buscar alternativas investindo também nos transportes aéreos, criando, em 1955, a Sadia S.A.

Transporte Aéreos, que funcionou até 1972, quando deu lugar à Transbrasil S.A. Linhas

Aéreas, com sede em Brasília.

A década de 1960 foi a de maior expansão da Sadia, pois, em 1961, iniciou o trabalho

com avicultura, com um abate inicial de 90.000 aves. Naquele mesmo ano construíram um

frigorífico em São Paulo; em 1967 foi criada a Sadia Comercial – Sadial, em São Paulo, por

meio da Frigobrás. Até a metade da década de 1960, a Sadia era dona de 8 filiais que faziam

parte da rede comercial da empresa e já concentrava 70% do mercado nacional.

Em 1970, aumentaram ainda mais suas fábricas, partindo para o ramo de grãos, ou

seja, transformação de soja, com a construção de duas fábricas, uma em Paranaguá e a outra

em Rondonópolis, responsáveis pelo refino e envasamento do óleo de soja.

Segundo Alba (2002), essa década marcou o início do projeto da Sadia para entrarem

no ramo de produção e industrialização de perus. Chapecó foi escolhida para a implantação

dessa atividade e, em 1973, foram realizados os primeiros abates – 550.000 perus/ano. Esse

ramo de avicultura foi muito incentivado pelo poder público local, estadual e federal.

Em 1978, foi inaugurada uma unidade de abate e industrialização de frangos em Dois

Vizinhos, no Sudoeste do Paraná, e, assim, seguiu-se a ampliação no ramo de bovinos, suínos

e aves, construindo novos frigoríficos. Em 1989, a ampliação do potencial de abate deu-se

com a aquisição das unidades de Andradina e Araçatuba no Oeste Paulista. Nesse mesmo ano,

foi incorporado um abatedouro de suínos em Frederico Westphalen/RS e foi construído

também uma nova fábrica de presunto cozido em Concórdia. Em 1971, a Sadia passou a se

chamar Sadia Concórdia S.A..

Os anos 1980/90 são marcados pela compra de mais frigoríficos de aves, em Francisco

Beltrão/ PR, e a entrada no setor de margarinas e massas com as unidades em Paranaguá e

Itapetininga. Segundo Alba (2002), há também a operação da fábrica de salsichas em Duque

de Caxias, o lançamento da linha Califórnia de Chapecó e a inauguração da Sadia

Agroavícola S.A. em Várzea Grande-MT. E, em 1997, a inauguração da fábrica de

empanados junto à unidade industrial de Chapecó. (Mapa 02)

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MAPA 2 – Distribuição das Unidades Industriais da Sadia no Brasil

Em 1967, foi assinado o primeiro contrato de exportação, composto pela venda de

carne bovina e suína in natura para o Mercado Comum Europeu e a Suíça, mais tarde

ampliado para o Oriente Médio e a América do Norte. Atualmente, a Sadia continua

comercializando carnes em vários países do mundo.

Conforme Alba (2002), a Sadia Trading S.A. Exportação e Importação a partir de

1980, passou a se responsabilizar pelo setor de exportações, ampliando e melhorando tal

empreendimento para o mercado do Extremo Oriente, Hong Kong e Japão.

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Atualmente a Sadia Trading S.A. possui filiais em Tóquio, Milão, Buenos

Aires, EUA e Taiwan, abrindo com isso novas possibilidades de mercado,

como é o caso dos países do Mercosul. A exportação é feita para mais de 40

países e o principal produto exportado é a carne in natura de frango, peru,

suínos e gado. Dos produtos industrializados, a linha Califórnia de carne de

peru e os empanados são os mais exportados (ALBA, 2002, p. 92).

Conforme verificamos nessa afirmação, a rede de exportação assim como a rede de

distribuição da Sadia são bem extensas, as quais, através da Sadia Comercial, possuem 24

postos de revenda dos produtos para os supermercados e outras redes. Alba (2002) cita que as

vendas diretas são realizadas apenas para grandes pedidos, como redes de fast food. No Brasil

e em vários países, a Sadia constitui-se de uma vasta rede de postos de produção,

industrialização, marketing e comercialização.

No início do ano de 2010, surgiram rumores de que a Sadia estava em crise, mas o que

aconteceu foi uma fusão entre a Sadia S.A. e a Perdigão S.A. através de trocas de ações,

resultando na Brasil Foods. Segundo Landim (2010), o objetivo é identificar os melhores

processos de Sadia e Perdigão e trazer novas idéias do exterior através do estudo da

McKinsey2.

A governança da BRF terá a marca da Perdigão. A estrutura da empresa, definida

pelos acionistas, é composta por 10 vice-presidências: seis da Perdigão (finanças, fusões e

aquisições, operações e tecnologia); duas da Sadia (mercado interno e food service) e duas em

aberto.

A marca Sadia foi escolhida para liderar o esforço internacional porque já é

bem conhecida na Rússia e no Oriente Médio, onde alcança a liderança em

alguns produtos. Sob o comando da Perdigão, a Sadia deve chegar a cada

vez mais consumidores ao redor do globo (Landim, 2010, p. 01).

2 A McKinsey é a firma de consultoria de gestão de topo, líder em nível mundial; assessora as principais

instituições líderes em nível global, tanto do setor público como do setor privado e do setor social, ajudando-as a

alcançar um desempenho de nível superior através da identificação de novas oportunidades e da resolução de

problemas críticos nas áreas de estratégia, operações, organização, e tecnologia.

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2.1.1 – A Sadia de Dois Vizinhos

Conforme entrevista com o supervisor do setor de logística (2010), a Sadia, unidade

de Dois Vizinhos, não era para ser instalada nesse município, e sim em Pato Branco, mas

devido à falta de incentivo público acabou instalando-se em Dois Vizinhos.

Para a implantação, em 1977, juntaram-se algumas autoridades do município e Atílio

Fontana para acertar pontos importantes como a escolha do lote e políticas públicas de

parceria com a Prefeitura Municipal para implementação e construção do parque industrial da

Sadia, cuja instalação iniciou em 1978 (foto 1).

Foto 1 – Construção do complexo agroindustrial da Sadia – 1978 Fonte: http://www.portaldoisvizinhos.com.br/municipio_sobre_ampliafoto.asp?img=45

Atualmente, o parque industrial da Sadia de Dois Vizinhos tem 64.270,38 m², (foto 2),

distribuídos em escritórios, fábrica de ração, produção de aves, departamento técnico

operacional, sala de garantia de qualidade, departamento de Recursos Humanos,

controladoria, suprimentos, e logística. Além disso, a empresa possui, no município,

126.516,11m², distribuídos em granjas, e 748 hectares de áreas de reflorestamento,

distribuídos em Dois Vizinhos, Cruzeiro do Iguaçu, Boa Esperança, Salto do Lontra e Enéas

Marques.

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Segundo o departamento de logística da Sadia – Unidade de Dois Vizinhos (2010), o

lote, onde hoje se localiza a empresa, foi doado pela Prefeitura Municipal num processo foi

iniciado no final do governo de Ervelino Colleti (1973 a 1976) e finalizado no governo de

José Ramuski Jr. (1977 a 1982). Além do lote, receberam como incentivo a isenção de

impostos municipais por 30 anos e a construção das estradas para os integrados, para as quais

a Sadia e a Prefeitura Municipal estabeleceram uma parceira, em que a primeira auxiliava

com o combustível e o restante era por conta da prefeitura.

Em 12 de agosto de 1980, o frigorífico de Dois Vizinhos começou a funcionar e

produzir as primeiras aves, mas, estas foram abatidas na unidade de Toledo, pois o frigorífico

ainda não estava pronto. A produção e industrialização da carne de frango na Sadia unidade

de Dois Vizinhos teve suas primeiras atividades no ano de 1981, com aproximadamente 500

funcionários.

Segundo o departamento de logística da Sadia – unidade de Dois Vizinhos (2010),

atualmente, a empresa conta com 2.737 funcionários. Os trabalhadores estão distribuídos por

toda produção dentro da fábrica, divididos em três turnos: o primeiro, das 05h00min às

13h00min; o segundo das 13h00min às 22h00min; e o terceiro, das 22h00min às 05h00min.

Os salários são bem variáveis. Quando o funcionário entra na produção, começa recebendo

R$588,95, passando por três meses de experiência, depois passa a receber R$625,16 e

Foto 2 – Parque Industrial da Sadia – Unidade de Dois Vizinhos em 2010 Fonte: Departamento de Logística Sadia – Dois Vizinhos, 2010.

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dependendo do desempenho, vai acrescentando ao salário; além disso, em todo mês de

novembro, é reposta a inflação anual, o Dissídio Coletivo de Trabalho.

Conforme o departamento de logística da Sadia – Unidade de Dois Vizinhos (2010),

em 1980, quando a Sadia iniciou suas atividades tinham poucos integrados; atualmente, são

843 propriedades integradas, com 1031 aviários de frango de corte, distribuídas em 23

municípios do Estado do Paraná. (tabela 01 e mapa 03)

Considerando a quantidade de aviários integrados à Sadia – Unidade de Dois

Vizinhos, verificamos com o departamento de logística (2010), que o abate está no limite da

capacidade, 500.000 frangos/dia, com uma produção mensal de aproximadamente 18 mil

toneladas de carne de frango. Dessa produção, 90% é exportada para os países árabes como:

Catar, Bahrain, Omã, Kuwait, Arábia Saudita e Emirados Árabes; o restante, 10% da

produção, permanece no mercado interno na forma dos cortes de frango.

Tabela 1 – Número de aviários por município atendido pela Sadia – Unidade de Dois Vizinhos

Município Integrados

Boa Esperança do Iguaçu 34

Campo Bonito 23

Catanduvas 8

Chopinzinho 5

Cruzeiro do Iguaçu 48

Diamante do Sul 1

Dois Vizinhos 299

Enéas Marques 14

Espigão Alto do Iguaçu 19

Guaraniaçu 71

Ibema 5

Nova Esperança do Sudoeste 23

Nova Laranjeiras 15

Nova Prata do Iguaçu 31

Quedas do Iguaçu 31

Salto do Lontra 128

São João 41

São Jorge d’Oeste 71

Saudade do Iguaçu 26

Santa Izabel do Oeste 10

Sulina 47

Três Barras do Paraná 3

Verê 78

TOTAL 1031

Fonte: Dados: Sadia-Unidade de Dois Vizinhos, Departamento de Logística, 2010

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MAPA 3 – Distribuição de aviários da Sadia de Dois Vizinhos - Paraná

Em relação à criação de matrizes, segundo o departamento de Avicultura Matrizes

(março de 2010), atualmente, há 4 integrados com 20 aviários voltados para a recria e 58

integrados com 156 aviários voltados para a produção. Além disso, a Sadia possui 28 aviários

de matrizes próprios.

O preço do kg de frango depende de algumas variáveis, que podem ser diferentes em

cada região, como a distância da indústria em relação ao mercado. Quanto maior a distância,

maior o preço do frete e isso vai caracterizando o aumento de preço do produto, ou então, o

tipo do produto, pois o frango inteiro recebe um valor e os cortes outro.

Conforme o supervisor do departamento de logística da Sadia – Unidade de Dois

Vizinhos, o maior problema encontrado na produção de carne de frango é a falta de mão-de-

obra, além de outros como a falta de água na época de estiagem e inadequações da

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propriedade em relação às leis ambientais. Entre as facilidades para a produção de frango está

a aquisição de grãos para a fábrica de ração; o transporte, devido às boas condições da maioria

das estradas na área rural; e a disponibilidade de água na maioria das propriedades, quando

não há estiagem.

Hoje, para se tornar um integrado, produtor avícola, são necessários vários requisitos

adotados pela empresa a partir de 2009.

Por meados de 2009, os requisitos para tornar-se um integrado ficaram mais

criteriosos, pois agora é necessário fazer um estudo da viabilidade e da

sustentabilidade do negócio na propriedade, como: ter a licença ambiental;

possuir o terreno onde será instalado o aviário, a matrícula; estar no padrão

Sadia: tamanho 100x12, equipamentos aprovados pela Sadia. (Supervisor do

departamento de logística, Sadia – Unidade de Dois Vizinhos, março de

2010).

Conforme o Supervisor do departamento de logística, Sadia – Unidade de Dois

Vizinhos, (março de 2010), a integração, para a Sadia, é uma parceria com os agricultores,

pois um interdepende do outro, ou seja, a Sadia necessita da matéria-prima para industrializar

e o produtor precisa vendê-la, então, a integradora entra com a transformação,

industrialização da matéria-prima e sua inclusão no mercado e o produtor entra com o produto

bruto, o frango pronto para o abate; assim, estabelecem uma relação, na qual a Sadia fornece

os pintainhos, a ração, os remédios, a assistência técnica, a transformação e comercialização

do produto; o produtor integrado fornece a mão-de-obra, as instalações, a água e a energia,

mas não tem o poder de verificar a pesagem nem a quantidade de frangos que chegam até a

unidade de transformação.

Percebemos, nessa relação, a existência de uma hierarquia de poder bastante visível,

ou seja, a Sadia ―fornece‖ o frango, estabelece as normas para criá-los, o integrador trabalha

obedecendo às normas impostas pela Sadia por intermédio de um contrato muito bem

elaborado pela integradora e, por fim, não pode verificar se seu trabalho foi rentável ou não,

pois, depois de alguns dias, ele simplesmente recebe uma notificação que seu lote deu um

valor x, no qual já estão descontados os gastos com ração e pintainhos. Além disso,

dependendo da ―obediência‖ do integrado às leis da integradora, ele recebe um ―gancho‖ e

pode ficar mais de 30 dias com o aviário parado, sem produzir, e, consequentemente, sem

receber.

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Conforme Paulilo (1990), o pagamento da integradora ao integrado é feito de acordo

com indicadores técnicos constantes do contrato de integração celebrado entre as partes. A

integradora, portanto, terceiriza a engorda das aves junto aos produtores integrados.

Segundo o departamento de fomento da Sadia – Unidade de Dois Vizinhos (2010), a

equipe que presta assistência técnica aos integrados é formada por 2 supervisores, 1 staff

sanidade, 2 coordenadores, 12 veterinários, 1 zootecnista e 14 técnicos agrícolas. Eles prestam

assistência através de 4 visitas à propriedade do agricultor; a primeira visita, no pré-

alojamento, é feita entre 24 e 2 horas antes do alojamento; a segunda é a visita de alojamento,

de 24 a 72 horas após o alojamento dos pintainhos; a terceira, de 12 a 15 dias após o

alojamento, para fazer uma verificação geral da produção; a quarta e última visita, no pré-

abate, entre 24 e 26 dias após o alojamento, quando é verificado o peso e se há doenças nos

frangos. Por fim, são realizadas as considerações finais, de limpeza do aviário, nota de

produtor e carregamento.

Nessa perspectiva, segundo Alves (2005), em muitos casos, o técnico torna-se o

administrador da propriedade, pois, além de disponibilizar assistência técnica em relação à

produção integrada, e partindo das exigências e interesses da empresa, orienta para a produção

de determinados tipos de cultivos agropecuários; nesse sentido, o agricultor integrado, além

de perder sua autonomia em relação à produção integrada, perde também a capacidade de

tomar decisões em relação às outras atividades em sua propriedade.

Além das exigências técnicas e operacionais, a empresa é quem define o

preço do frango pago ao produtor rural, não cabendo questionamentos ou

discussões em relação às determinações da indústria. [...] Enquanto os

agricultores aumentam sua escala de produção, o valor unitário recebido

recua. [...] Para piorar a situação dos agricultores integrados, as empresas

têm poder para determinar os instrumentos e produtos necessários para

criação e engorda dos animais, como rações, vacinas, aquecedores,

ventiladores, entre outros. Enquanto os preços pagos pela indústria vêm

caindo vertiginosamente, os preços dos insumos – que são comprados da

própria integradora – vêm aumentando, fazendo com que os lucros do

agricultor integrado sejam significativamente reduzidos. (ALVES, 2005, p.

148/149)

Outro fator interessante na integração é que segundo Alves (2005), a empresa não

responde por nenhum ônus que a produção venha acarretar no ambiente, em relação à

legislação ambiental, que é de inteira responsabilidade do avicultor integrado, além da mão-

de-obra familiar, treinada pela empresa, passando a desempenhar os exaustivos trabalhos para

que a produção seja entregue conforme o exigido. Dessa maneira, os técnicos avaliam os

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integrados e selecionam as famílias que permanecerão no sistema, sendo elas preparadas

tecnicamente para corresponder às exigências do mercado integrado, cada vez mais

competitivo.

E, ainda, percebemos que está ocorrendo, atualmente, um processo de concentração

espacial da produção avícola integrada, pois, conforme veremos a seguir, os impactos são

significativos num sistema de produção presente na agricultura familiar. A presença de um

contrato de “parceria avícola” entre a integradora, Sadia, e o integrado, avicultor, bem como

o conceito de integração serão analisados nos próximos itens deste capítulo.

2.2 – INTEGRAÇÃO OU SUBORDINAÇÃO?

2.2.1 – Mecanismos e impactos da integração

Segundo Alves et. al. (2005), o processo de integração iniciou-se nos Estados Unidos

da América na década de 1950; desde então, realizaram-se estudos para discutir a questão da

integração de agricultores no sistema agroalimentar. Já no Brasil, essas discussões iniciaram-

se mais tarde, até porque as primeiras atividades integradoras iniciaram-se por volta de

1960/70.

O sistema de integração é consequência do processo de expansão do capital. Segundo

Ferreira (1995), a ideia central é que a agricultura torna-se integrada aos circuitos industriais e

elos do sistema agro-alimentar, passando então, a ser subordinada, recebendo diretrizes e

ordens.

Vários estudos apresentam a integração como subordinadora dos agricultores, pois

estes são vistos como agentes passivos, subordinados, comandados por uma empresa de

produção que, além de extrair o valor de trabalho dos produtores, organiza e dirige a produção

agrícola para atender as necessidades mercantis. Segundo Alves et. al. (2005), no centro deste

debate, está a capacidade de organização industrial e financeira para gerir amplos espaços

territoriais amparados pela ideia do contrato e por um aparato tecnológico que começa e

termina na indústria.

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Segundo Filho e Queiroz (2010), no modelo tradicional de integração da avicultura de

corte brasileira, os aviários eram manuais; atualmente, utilizam inovações tecnológicas com

alto nível de automação, alto volume de aves confinadas por aviário/produtor integrado,

redução significativa do número de produtores integrados para cada planta industrial e, ao

mesmo tempo, do número de contratos estabelecidos pela firma integradora, integrados com

maior capacidade de alavancagem de financiamento em função do aumento significativo dos

custos de instalação de novos aviários, uso predominante de mão-de-obra assalariada.

Há também uma nova territorialização das agroindústrias integradoras devido à

necessidade de se localizarem em regiões com abundância de matérias-primas e insumos ―

como hoje ocorre, no Brasil, o deslocamento dessas empresas para a região Centro-Oeste ―,

além da existência de incentivos fiscais necessários para a redução do risco de possíveis

perdas financeiras com o investimento.

Cabe ressaltar que a essência do que é a integração não muda com o passar dos anos,

seja o integrado pequeno, médio/grande produtor. Em qualquer um dos modelos, tradicional

ou tecnológico, a integradora fornece ao integrado: a ave de um dia, a ração para alimentação,

os medicamentos e a assistência técnica. Compete ao integrado a responsabilidade pela

construção dos aviários, instalação dos respectivos equipamentos, de acordo com as

determinações da integradora, mão-de-obra principalmente familiar, água de boa qualidade,

energia e entrega das aves para a integradora quando a mesma estiver com o peso apropriado

para o abate.

O sistema de integração constitui uma estratégia cada vez mais

implementada pelas grandes agroindústrias, que vêm conquistando novos

mercados e ampliando sua produção e, conseqüentemente, seus lucros. A

integração com os agricultores garante uma produção com qualidade e com

baixos custos, pois a empresa não precisa comprar terras, ampliar a

contratação de mão-de-obra, nem se preocupar com questões trabalhistas.

(ALVES, 2005, p.145)

Para Belato (1985), a integração indica sempre a ação do capital sobre a agricultura e

seu movimento de concentração. O capital busca destruir as formas históricas de organização

do trabalho e do excedente camponês mediante uma estratégia concentrada no sentido de

eliminar os mecanismos de autonomia e identidade camponesa. Outro fator que consideramos

importante descrever, é que a empresa integradora domina o processo de integração a partir da

assinatura do contrato com os agricultores, ditando as normas e o agricultor é obrigado a

cumpri-las para permanecer como integrado, pois aqueles que não se adaptam e não atingem a

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produtividade satisfatória para a empresa correm riscos de serem excluídos do sistema de

integração.

Assim, percebemos o uso do poder da integradora sobre o integrado, quando este é

―obrigado‖ a instalar equipamentos de alta tecnologia. Porém, conforme afirma Evilásio de

Justina, ex-integrado da Sadia,

[...] na maioria das vezes, os agricultores não têm condições de adquirir os

equipamentos para adaptar-se às normas impostas pela integradora ou,

quando adquirem, acabam contraindo dívidas substantivas, através de altos

juros pagos por financiamentos3.

Além disso, segundo Filho e Queiroz (2010), ocorrem outros impactos, devido às

transformações do sistema de produção integrada tradicional e a reestruturação da produção

de frangos de corte, os quais podem ser observados em quatro grandes áreas:

social, a disseminação do modelo de integração baseado no médio/grande produtor,

provoca a exclusão do pequeno produtor da condição de integrado se mantidas as condições

institucionais referentes às exigências para concessão de empréstimos bancários; a redução do

número de pessoas que trabalham nos aviários, devido ao elevado nível de automatização; o

aumento da concentração de renda e ausência de políticas compensatórias.

regional, com a localização dos novos projetos em regiões onde há médios e grandes

produtores interessados na integração, acarretando uma regionalização da avicultura de corte

nas áreas propícias ao desenvolvimento desta atividade.

econômica, com a redução dos custos de transação, de produção e de logística; com o

crescimento da competitividade e aumento das exportações de frango; com o

desenvolvimento expressivo da produção interna, diminuindo os impactos sociais em termos

de emprego;

ambiental, a concentração da produção de aves em poucas unidades ou numa

determinada região faz com que o potencial de poluição dos dejetos produzidos nos aviários

seja ainda maior, aumentando as dificuldades de manejo, o odor e a poluição da água,

causando danos à natureza.

Nesse sentido, percebemos os impactos causados pela modernização de equipamentos

que, aos poucos, vão excluindo e substituindo os pequenos agricultores do sistema de

produção integrada. Isso se efetiva quando as exigências de padronização típicas de um

3 Informação oral: Testemunho de Evilásio de Justina, na 8ª Jornada de Agroecologia, em maio de 2009 em

Francisco Beltrão.

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modelo modernizante intensificam-se e os ganhos com a produção diminuem, dificultando a

permanência do agricultor e de sua família no campo e mais ainda como avicultor integrado.

Tudo isso, segundo Alves (2005), obedece a uma rigorosa engenharia projetada pelos

interesses da empresa integradora, visando à diminuição de custos e de tempo de assistência

técnica, além de diminuir, através da genética, o tempo de produção de frangos intensificando

a produção, aumentando a quantidade, diminuído o tempo e ampliando o abastecimento de

produtos no mercado.

2.2.2 – A integração e os mecanismos de articulação e amarramento da produção mediante

contrato

Segundo Espíndola (1999), o sistema de integração começou a ser implantado no

Brasil pela empresa Sadia, em meados da década de 1950, primeiramente no estado de Santa

Catarina, de onde se disseminou pelo resto do país, provocando transformações na base

técnica da produção, bem como na organização das unidades familiares, que foram [...] de

mudanças, forçadas a adotar estratégias de reprodução de suínos e aves baseadas no sistema

de integração (Espíndola, 1999, p. 104).

Dessa maneira, Espíndola (1999) afirma que, com a integração, os laços tradicionais

mantidos entre os comerciantes e agricultores são substituídos por relações de capital, entre o

industrial e o bancário, com o aval do Estado através da Política Nacional de Crédito Agrícola

e a Política Fundiária, e o agricultor que, neste caso, aparece apenas como o produtor de

matérias-primas.

Percebemos que a adoção do sistema de integração é de interesse dos agentes do

capital, voltado para o aumento da produção em menor tempo, gerando concentração de

capital nos segmentos que dominam o sistema, neste caso, as agroindústrias.

Conforme Belato (1985), integração, para os teóricos do agribusiness, significa

exatamente essa concentração de alto grau de capital no segmento industrial que passa a

comandar o processo produtivo, ou seja, nos Complexos AgroIndustriais (CAI‘s) como a

Sadia. Para Dinarte Belato, o grau e a forma [em] que se dá a subordinação da agricultura

em relação aos segmentos agroindustriais é o que determina a forma e o grau em que se dá a

integração. (p. 265).

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Assim, com a difusão da integração na agricultura, esta passa a receber

desdobramentos impostos pelas ações do capital, adquirindo novas formas e intensidades.

Segundo Belato (1985), esses desdobramentos determinam as formas de integração e os

mecanismos de articulação e amarramento da produção de matérias-primas, mediante

contrato, cada vez mais presentes na produção integrada de frangos de corte, tal como ocorre

na Sadia. Para Belato (1985), o contrato de produção é o componente básico do processo de

integração.

É importante ressaltar que, de acordo com Belato (1985), a integradora (Sadia) e os

integrados (avicultores) possuem interesses distintos no processo de integração: a primeira

entende a integração como forma de controle dos mercados rurais e redução de mão-de-obra;

para os avicultores, a integração é vista como uma oportunidade, uma garantia de produção,

de preço, de renda eliminação de riscos e acesso ao capital.

Os contratos de produção, ou de integração, estabelecem relações entre duas partes

como se estivessem em condições de igualdade, definem os deveres, as responsabilidades e os

direitos entre a integradora (Sadia) e do integrado (avicultor). Para Belato (1985), o contrato

serve como uma ―ordem de serviço‖, uma forma de subordinar, obrigar o avicultor a cumprir

com seus deveres enquanto contratado, pois o contrato não passa de uma forma de

―aprisionar‖ o integrado.

O modelo de contrato utilizado pela Sadia é o contrato de transferência plena que,

segundo Ferreira (1995), é caracterizado por cláusulas de comercialização, de produção e de

transferência de uma parte importante ou de todas as funções de gestão da empresa como o

risco e o controle dos métodos de produção. É o comprador que detém a propriedade dos

produtos, o agricultor restringe-se a fornecer as instalações e o trabalho. Além disso, este

processo de integração ―representado pelo contrato― caracteriza a integração vertical.

Dessa maneira, observamos que, com o contrato, o agricultor tem pouco poder de

decisão sobre o processo produtivo, perdendo sua autonomia em relação às atividades

desenvolvidas em suas propriedades. Ainda, segundo Alves (2005), tais contratos são

propostos por grandes agroindústrias que dominam o mercado brasileiro, com uma

participação crescente no que tange às exportações, como exemplo, a Sadia e a Perdigão,

atualmente Brasil Foods.

Podemos verificar isso melhor, ao observarmos o contrato para produção avícola

integrada, utilizado pela Sadia – Dois Vizinhos, em 2006, com um integrado: ―o integrado

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declara não ter firmado, com nenhuma outra empresa, qualquer contrato para integração

avícola no imóvel‖. (p. 01)

Entre as obrigações dos integrados estão: a) cuidados necessários e indispensáveis

para a criação e terminação das aves; b) serviço de manuseio das aves; c) desenvolver a

criação e terminação das aves conforme normas técnicas impostas pela Sadia; d) proibido

utilizar insumos, medicamentos e vacinas que não sejam prescritas pela Sadia; e) não permite

a criação de quaisquer outras aves ao redor do imóvel onde será executada a criação e

terminação das aves fornecidas pela integradora; f) manter as instalações, a propriedade e os

equipamentos em boas condições de acordo com a recomendação técnica da Sadia; g)

concordar com a suspensão do novo lote de aves, por tempo indeterminado, sem ônus para

a Sadia, caso ocorram restrições de ordem ambiental; h) concordar com o sacrifício das

aves, sem ônus para a integradora, caso ocorram restrições de biossegurança ou de ordem

sanitária; i) cuidar das aves de um dia até que as mesmas atinjam o peso programado para

devolução; j) adequar as instalações para que se previnam possíveis acidentes com aves ou

insumos fornecidos pela Sadia; k) fornecer água de boa qualidade, energia elétrica,

combustível para aquecimento das aves, material para formação da cama com qualidade

assegurada; l) garantir condições de tráfego nas vias de acesso ao aviário; m) assegurar

para a integradora a preferência na compra de parte de aves que lhe couber em razão do

contrato feito; o) comunicar à Sadia antes do alojamento do lote a sua intenção de não vender

a parte das aves vivas que lhe será cabível quando da partilha; p) facilitar para a Sadia o

acompanhamento da criação de aves, assegurando-lhe livre e permanente acesso à

propriedade e instalações onde o plantel está sendo criado; q) proibido dar outro destino aos

insumos fornecidos pela Sadia, que não seja a criação e terminação das aves da integradora; r)

obrigado a obter a produtividade mínima, ou seja, produção de, no mínimo, 65% calculado

sobre o percentual básico cabível ao integrado, definido pela integradora e, nos últimos doze

meses de produção, resultados superiores a 30%, média prevista para o integrado; s) deixar o

aviário preparado para apanha das aves, antes da chegada do caminhão, de acordo com as

instruções da Sadia; t) o integrado é responsável pelo equipamento e mão-de-obra para

carregamento das aves de acordo com recomendação técnica; u) o integrado poderá

contratar terceiros para apanha das aves, cabendo a si todos os critérios que atendam as

exigências legais e em especial que possam atender as exigências técnicas quanto aos modos

preventivos de lesões das aves, garantindo o bem-estar e o conforto das mesmas; v) cabe ao

integrado, além de pagar 50% do custo da contratação de terceiros para execução dos

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serviços de apanha, fornecer as informações técnicas necessárias, energia elétrica e

iluminação adequada, água e estrutura adequada, os meios necessários ao carregamento, as

vias de acesso em boas condições, as cercas para facilitar apanha; supervisionar o

carregamento de acordo com as normas técnicas da Sadia; disponibilizar a documentação

fiscal necessária para transporte das aves; proceder às devidas anotações na planilha de

controle do carregamento; manter as aves em jejum tempo determinado pela integradora; x) o

integrado autoriza a Sadia, no momento em que realizar o pagamento de sua parte pelos

serviços de apanha executada pelas empresas prestadoras de serviços a pagar também a sua

parte; z) o integrado concorda com a realização de deduções do lote entregue, considerando-

se o número de animais que não atendam as exigências do Serviço de Inspeção Federal – SIF;

aa) a Sadia não fornecerá aves para quem suceder na posse do imóvel onde será realizado a

criação e terminação das aves (grifos do Contrato de Integração).

Observamos as inúmeras obrigações que os avicultores têm ao se tornarem integrados

do Sistema Sadia de Produção (SSP). Com vistas à subordinação, verificamos, claramente, a

sua existência na maioria dos itens descritos, mas principalmente naqueles que tratam da

assistência técnica e dos investimentos, ou seja, quando o avicultor é obrigado a cumprir

normas técnicas impostas e fiscalizadas pela Sadia; a investir em tecnologias mesmo sem

condições, contraindo dívidas que, muitas vezes, não são compensadas pela produção; a

facilitar o acesso da empresa à propriedade em qualquer momento que aquela julgue

necessário; a concordar com o atraso da entrega das aves de um dia, retardando assim a

produção e a renda; a vender a produção somente para a integradora; a alcançar a

produtividade mínima exigida pela integradora; a concordar com deduções no valor do lote,

caso as aves não alcançarem as exigências mínimas da Sadia, mesmo sem saber se isso

realmente ocorre.

Como a produção é dividida em etapas, os avicultores são donos do seu negócio,

todavia, ao mesmo tempo, constroem com a empresa um sistema de dependência que se

estende a vários aspectos como o fornecimento das matrizes, o rigoroso cumprimento dos

horários de alimentação das aves, a exposição à luz, os níveis de calor e umidade. Assim, a

Sadia repassa normas aos avicultores e obriga-os a submeterem-se a trabalhos exaustivos,

com grande dispêndio de energia, já que possuem estimativas de produção a alcançar, prazo

de entrega da produção para cumprir, padrões de qualidade a conseguir, tornando rotineiras as

atividades diárias do avicultor integrado e sua família.

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[...] considera-se como AVES DE QUALIDADE, quando alcançarem os

seguintes resultados, por ocasião da entrega das aves na plataforma do

abatedouro da Sadia:

a) Se o lote de aves entregue, não ultrapassar o limite de 15% das aves, com

―calo de pés‖, na avaliação realizada por profissional da empresa no

abatedouro;

b) Se o lote de aves entregue, não ultrapassar 1,2 vezes o valor da média

obtida no mês anterior de perdas por condenações, para o mesmo tipo de

ave, por causas agropecuárias, na avaliação realizada pelo Serviço de

Inspeção Federal, por ocasião do abate dos respectivos lotes de aves.

(Contrato de Produção Avícola Integrada, 2006, p. 12)

Na produção de frango, as relações de poder da empresa são desempenhadas de forma

direta através da assistência técnica, através da qual o trabalho do avicultor é averiguado em

média 5 vezes durante o lote, observando se as etapas de produção impostas pela empresa

estão sendo cumpridas e se a infra-estrutura está sendo utilizada do modo que a empresa

deseja.

De acordo com o contrato de produção avícola integrada, para o integrado adotar o

Sistema Sadia de Produção, ele precisa atender as várias exigências da empresa, entre elas

destacamos:

4.2.1 Instalações e equipamentos

Adequar, dispor e fornecer a propriedade, instalações e todos os

equipamentos necessários para a atividade, de modo a atender as normas de

biosseguridade, segurança alimentar, bem estar animal, rastreabilidade,

ambiental e sanitária, conforme necessidades técnicas exigidas pelo

mercado, variações climáticas, nutricionais e genéticas, orientadas pela Sadia

[...]

4.3 Normas de Qualidade

Dispensar todos os cuidados necessários e indispensáveis para a criação e

terminação das aves, observando normas técnicas, bem como as normas de

biosseguridade, segurança alimentar, bem estar animal, rastreabilidade,

ambiental e sanitárias. (Contrato de Produção Avícola Integrada, 2006, p. 8)

No contrato, verificamos também as premissas da fórmula de calcular a renda, o que

nos permite observar melhor o poder exercido por parte da Sadia quando ela afirma custear

93% dos gastos para produzir um lote de frango, enquanto o integrado suporta apenas 7%.

Com isso, podemos perceber que o contrato é uma forma de subordinação do avicultor, pois,

apesar da empresa fornecer as aves de um dia, a assistência técnica, os remédios e a ração, o

integrado paga por esses produtos, os quais são descontados antes do valor final do lote ser

depositado pela empresa na conta do integrado e, além disso, a manutenção dos aviários, o

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exaustivo trabalho do avicultor e seus familiares, os gastos com energia e água só

correspondem a 7% dos gastos com a produção de um lote?

Essa pergunta fica difícil de ser respondida, pois a Sadia mantém em sigilo os gastos

com os produtos fornecidos ao integrado que, por não ter acesso aos valores cobrados pela

ração, medicamentos, aves e assistência técnica, fica sabendo apenas o valor do lote quando

as aves já estão no frigorífico.

Ao analisar o contrato, o que chama atenção é a quantidade de obrigações que os

agricultores têm para tornar-se um integrado; no entanto para deixar de ser integrado ao

sistema Sadia de Produção basta, como está no contrato, no subitem i, do item 7.1, na página

14, basta o não cumprimento de qualquer cláusula do contrato.

O integrado pode deixar de sê-lo sem ônus somente em casos em que a integradora

não forneça as rações, vacinas, medicamentos ou deixar de prestar assistência técnica e

veterinária necessária, e pelo não cumprimento de qualquer cláusula do contrato ou pela

decretação de falência.

Qualquer descumprimento por parte do integrado ou da integradora das cláusulas do

contrato, acarreta multa de 10% calculada sobre o somatório da renda dos 6 últimos lotes,

obtidos pelo integrado, devidamente corrigidos, de acordo com variação do IGP-M (Índice

Geral de Preço de Mercado) da FGV (Fundação Getúlio Vargas), para obter ressarcimento por

perdas e danos.

Por fim, a integradora e os integrados obrigam-se a tratar como confidenciais as

informações relacionadas aos produtos e assuntos que vierem a ter conhecimento em razão do

contrato e das condições deste durante sua vigência. Talvez seja esse o principal motivo que

condiciona muitos agricultores a serem integrados, entendendo a integração como um bom

investimento, antes de conhecer suas exigências.

Ao analisarmos o caso da Sadia - Dois Vizinhos, percebemos que as exigências da

empresa aos produtores, ―assinatura de contratos em que são descritas as obrigações do

integrado e do integrador, condições de higiene e manejo, adequação da criação e o tipo de

galpão, equipamentos utilizados nas granjas― são todas padronizadas pela empresa. Desse

modo, segundo Alves (2005), o agricultor faz altos investimentos ultrapassando os

R$100.000,00 por aviário e, a partir disso, o agricultor fica ―amarrado‖ à empresa, pois, para

compensar o investimento inicial, são necessários anos de trabalho intenso.

Além desses fatores, segundo Alves (2005), é importante também salientar que a

maioria dos avicultores integrados são agricultores familiares, e o sistema de integração vem

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transformando tanto a unidade familiar nas divisões do trabalho e nas tomadas de decisões,

como as unidades de produção, nas atividades agropecuárias, nas técnicas de manejo

utilizadas e na organização da propriedade. Através disso o agricultor vai perdendo sua

autonomia e identidade. Assim, no próximo capítulo descreveremos a agricultura familiar

seus conceitos e diretrizes a fim de observarmos as modificações ocasionadas pela produção

avícola integrada e, ainda, apontaremos uma das alternativas para o desenvolvimento

territorial local, baseada na autonomia, na preservação ambiental e na qualidade de vida: a

agroecologia.

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CAPÍTULO III – AGRICULTURA FAMILIAR: A PRODUÇÃO AGROECOLÓGICA

COMO ESTRATÉGIA DE DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL

3.1 – AGRICULTURA FAMILIAR

Como pudemos verificar no capítulo II, a principal forma de trabalho empregada no

processo de integração é a mão-de-obra familiar, pois conforme Moreira (1999), o que sucede

nos contratos de serviços e produções ocorre também no contrato de produção integrada da

Sadia. O que realmente se torna mais relevante é o fato do agricultor exercer o trabalho na sua

propriedade e em seu aviário, sendo, assim, proprietário e trabalhador para terceiros.

Segundo Moreira (1999), é nesse sentido que os agentes do capital agem sobre a

produção organizada de forma familiar, caracterizando a possibilidade de captação de lucros

como norma de operação do sistema proprietário/trabalhador, implicando a subordinação do

trabalho ao capital.

Contudo, observamos que, nas propriedades pesquisadas no município de Verê, há

características de uma agricultura familiar com bases camponesas, como a resistência e a

valorização do saber fazer, reproduzidas de geração em geração combinando produção de

subsistência com produção de mercadorias. O camponês, detém tanto a propriedade privada

da terra quanto a dos instrumentos de seu trabalho e a posse dos meios de vida necessários a

sua manutenção.

Segundo Wanderley (1996), os traços característicos das sociedades camponesas são a

autonomia face à sociedade global, a importância estrutural dos grupos domésticos e um

sistema econômico de autonomia relativa da vida social, pautado na coletividade, na

diversidade e na homogeneidade. Esses fatores, segundo palavras da autora, fazem com que a

agricultura camponesa tradicional venha a ser uma das formas sociais de agricultura

familiar, uma vez que ela se funda sobre a relação entre propriedade, trabalho e família

(1996, p.03).

Assim, segundo Wanderley (2004), as sociedades camponesas definem-se pelo fato de

manterem, com a sociedade globalizante, laços de integração, entre os quais os vínculos

mercantis têm significativa importância. Desse modo, o agricultor familiar é um agente social

do mundo moderno, mas mantém, em si, um camponês, uma tradição adaptada às condições

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modernas de produzir e de viver em sociedade, tendo capacidade de resistência e adaptação

aos novos contextos econômicos e sociais, fato que dá condição para que esse agricultor

mantenha-se como agente social. Esse agricultor familiar, de certa forma, permanece

camponês na medida em que a família continua sendo o objetivo principal que define as

estratégias de produção e reprodução e a instância imediata de decisão (WANDERLEY,

2004, p. 48).

O fato de ocorrerem transformações na base do sistema de produção camponês é

inegável, mas, segundo Wanderley (2004, p. 51):

[...] para muitos agricultores familiares, a força do passado não se

enfraqueceu e permanece como uma referência que determina as práticas e

as representações das famílias. Assim, apesar da crescente influência da

escolarização, os agricultores nunca renunciaram à socialização dos filhos

pela própria família.

[...] A terra trabalhada por uma família não é apenas um espaço técnico, é

também o espaço de uma certa concepção de liberdade individual

conquistada sobre a sociedade e, mais ainda, contra o Estado. Em todo lugar,

os trabalhadores desenvolvem suas iniciativas em continuidade com seus

pertencimentos antigos e em luta contra as formas de dominação política ou

econômica.

Além disso, é na agricultura familiar que se desvenda um rural diversificado, com

estratégias de sobrevivências específicas, conforme afirma Wanderley (2004). Em alguns

países onde a agricultura familiar é reconhecida há mais tempo, os próprios agricultores

definem-se como camponeses, defendendo uma concepção diferente de agricultura moderna,

pautada num modelo fundado na qualidade dos produtos, na relação afetiva dos agricultores

com os consumidores, dispondo de competência profissional que é resultado da influência do

saber técnico aprendido com o conhecimento da terra e da atividade agrícola herdado, das

tradições camponesas.

Dessa maneira, a tradição camponesa, diante do processo de modernização da

agricultura, torna-se uma qualidade positiva, pois o agricultor familiar conhece de modo

detalhado a terra, as plantas e os animais que possui. Assim, sente-se responsável pelo

respeito e preservação da natureza, possuindo, segundo Brandão (1999), afeto à terra e amor à

profissão. Concordamos com Wanderley (2004), quando ela afirma que os agricultores

familiares, em sua grande maioria, têm a sua história vinculada a uma história camponesa e

não correspondem a uma invenção moderna do Estado, no entanto esses agricultores precisam

adaptar-se às condições modernas da produção agrícola e da vida social.

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Atualmente, os agricultores familiares recebem várias denominações como pequenos

produtores, trabalhadores rurais, colonos, camponeses etc, muitas delas equivocadas, pois por

ser um agricultor familiar não quer dizer que ele seja um pequeno produtor; em geral, ele

pode ser pequeno porque dispõe de poucos recursos e tem restrições para potencializar suas

forças produtivas, porém, não é a sua dimensão que determina sua natureza e sim as relações

internas e externas que realiza cotidianamente.

Efetivamente, a expressão ―agricultura familiar‖ é ainda recente no Brasil, pois surgiu

nos anos 1990, fortaleceu-se em 1995 com o PRONAF – Programa Nacional de

Fortalecimento da Agricultura Familiar. A discussão teórica em torno dessa temática avança

em virtude da sua importância e do seu papel no desenvolvimento local e na segurança

alimentar.

Segundo Moreira (1999), a agricultura familiar refere-se a formas já constituídas,

presentes desde o campesinato que, assim como a agricultura familiar, possui seus elementos

baseados no trabalho familiar, nas práticas de ajuda mútua, na propriedade da terra, dos meios

de produção e na autonomia.

Para análise do conceito de agricultura familiar, temos que considerar o estudo

realizado, no âmbito de um convênio de cooperação técnica entre a Organização das Nações

Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) e o Instituto Nacional de Colonização e

Reforma Agrária (INCRA), que considera a agricultura familiar a partir de três características

centrais:

a) a gestão da unidade produtiva e os investimentos nela realizados são feitos

por indivíduos que mantêm entre si laços de sangue ou casamento; b) a

maior parte do trabalho é igualmente realizada pelos membros da família; c)

a propriedade dos meios de produção pertence à família e é em seu interior

que se realiza sua transmissão em caso de falecimento ou aposentadoria dos

responsáveis pela unidade produtiva. (INCRA/FAO, 1996, p. 4)

Na legislação brasileira, a definição de propriedade familiar consta no inciso II do

artigo 4º do Estatuto da Terra, estabelecido pela Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964,

com a seguinte redação:

[...] propriedade familiar: o imóvel que, direta e pessoalmente explorado

pelo agricultor e sua família, lhes absorva toda a força de trabalho,

garantindo-lhes a subsistência e o progresso social e econômico, com área

máxima fixada para cada região e tipo de exploração, e eventualmente

trabalhado com a ajuda de terceiros.

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Na definição da área máxima, a lei nº 8629, de 25 de fevereiro de 1993, estabelece

como pequeno os imóveis rurais com até 4 módulos fiscais e como média propriedade,

aqueles entre 4 e 15 módulos fiscais.

Lei 11.326, aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo presidente da

República, em 24 de junho de 2006, define o agricultor familiar, o empreendedor familiar

rural, aquele que pratica atividades no meio rural, atendendo aos seguintes requisitos:

I- não detenha área maior que 4 módulos fiscais; II- utiliza

predominantemente a mão-de-obra da família nas atividades econômicas do

seu estabelecimento ou empreendimento; III- tenha renda familiar

predominantemente originada de atividades econômicas vinculadas ao

próprio estabelecimento ou empreendimento; IV- dirija seu estabelecimento

ou empreendimento com sua família. (Brasil, 2006)

Também para a Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais (CONTAG), a

agricultura familiar é praticada em menos de quatro módulos rurais e com mão-de-obra

permanente. Já para o PRONAF, é formada por proprietários, posseiros, arrendatários,

parceiros ou concessionários da Reforma Agrária que residam na propriedade ou em local

próximo; detenham, sob qualquer forma, no máximo 4 (quatro) módulos fiscais de terra,

quantificados conforme a legislação em vigor, ou, no máximo, 6 (seis) módulos quando se

tratar de pecuarista familiar; com 80% da renda bruta anual familiar advinda da exploração

agropecuária ou não agropecuária do estabelecimento e mantenham até 2 (dois) empregados

permanentes – sendo admitida a ajuda eventual de terceiros.

Segundo o documento, Novo Retrato da Agricultura Familiar, do Instituto Nacional

de Colonização e Reforma Agrária – INCRA (1995), no Brasil, existem duas formas de

produção agrícola, o patronal e o familiar. A agricultura patronal tem como características: o

processo produtivo com organização centralizada, ênfase na produção em escala, práticas

agrícolas padronizadas, mão-de-obra contratada e utilização de tecnologia de ponta. Já a

agricultura familiar é aquela com mão-de-obra basicamente familiar, contratando

trabalhadores quando necessário, a organização do processo de produção é feita pela família,

a produção é diversificada, há melhor ocupação da área de produção e cuidados com a

preservação dos recursos naturais.

Devido ao trabalho familiar numa unidade de produção agrícola onde propriedade e

trabalho estão intimamente ligados à família, consideramos que a mais importante

característica dessa produção é a fusão entre a família e a propriedade, partes do mesmo

sistema de produção de alimentos.

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Segundo Taschetto e Walkowicz (2007), os agricultores familiares produziam, até

1970, alimentos para o consumo e só o excedente era comercializado para poder comprar

itens que não eram produzidos na propriedade. Algumas vezes, devido ao afastamento das

cidades, os agricultores montavam pequenas agroindústrias artesanais para suprir as

necessidades domésticas e da ―comunidade‖. Muitas vezes, quanto mais distante a

propriedade estava da cidade, mais diversificada era a produção, garantindo a sobrevivência

da família.

A partir dos anos 1960-1970, intensificou-se no Brasil o processo de modernização da

agricultura, com a introdução de máquinas, insumos, adubos químicos, créditos rurais e a

criação de um sistema de armazenamento, comercialização e transporte. E isso transformou

também a forma de vida de muitos agricultores familiares, pois existiam diferenças entre eles,

como por exemplo, o tamanho da propriedade, as relações de trabalho, os produtos cultivados

etc.

É importante destacar também que, no Brasil, a agricultura familiar é constituída por

pequenos e médios produtores representando a maioria dos produtores rurais. De acordo com

o censo agropecuário (2006/07), dos 5.175.489 estabelecimentos da agricultura familiar

presentes no Brasil, a região que apresenta o maior número é o Nordeste, com 2.187.295

estabelecimentos, seguido do Sul, com 849.997; do Sudeste, com 699.978; do Norte, com

413.101 e do Centro-Oeste, com 217.531. Na Região Sul, o estado com o maior número é o

Rio Grande do Sul, com 378.546 estabelecimentos, seguido pelo Paraná, com 302.907, e

Santa Catarina, com 168.544.

O Sudoeste do Paraná possui 39.532 estabelecimentos, o que representa

aproximadamente 14% dos estabelecimentos agropecuários da agricultura familiar do

estado; no entanto ocupam 566.635 hectares, com uma média de 14 hectares, enquanto os

estabelecimentos não familiares ocupam uma área de 403.316 hectares, totalizando uma

média aproximada de 82 hectares por estabelecimento. Dessa maneira, podemos concluir

que na mesorregião Sudoeste paranaense há predominância da agricultura familiar, com

muitas pequenas propriedades (menores de 20 hectares), com uso da mão-de-obra familiar,

de donos dos meios de produção e gestão familiar.

Isso também pode ser verificado no município de Verê, em que, segundo o censo

agropecuário (2006/2007), há 1301 estabelecimentos agropecuários; destes, mais de 90% são

estabelecimentos da agricultura familiar, ocupando uma área de 18.855 hectares, com uma

média de 16 hectares. Por sua vez, as propriedades não familiares representam 9% dos

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estabelecimentos agropecuários e o tamanho das propriedades atingem uma média de 80

hectares por estabelecimento. O fato é que as propriedades analisadas nesta pesquisa, além

de agroecológicas, são também familiares, pois, das 19 estudadas apenas 5 possuem mais

que 20 hectares; todas possuem gestão familiar; a principal mão-de-obra utilizada em 17

delas é familiar e os agricultores são donos das terras e dos meios de trabalho produzindo

alimentos saudáveis, preservando o ambiente e a saúde humana, fatores que caracterizam as

propriedades da agricultura familiar agroecológica.

Muitas transformações continuam ocorrendo no espaço rural, evidenciando a

construção de novos arranjos sociais e produtivos. Existem muitos desafios a serem

enfrentados. Segundo Portugal (2002), os principais limitantes do desenvolvimento da

agricultura familiar são a inserção no mercado ou no processo de desenvolvimento, que vai

depender da tecnologia e das condições político-institucionais, representadas pelo acesso ao

crédito, informações organizadas, canais de comercialização, transporte, energia, além de

outros fatores. O principal desafio é adaptar e organizar a produção a partir das tecnologias

disponíveis e das condições financeiras de cada agricultor.

Para Sauer (1998), uma forma de superar tais problemas é a reforma agrária, pois

através dela, dá-se o desenvolvimento combinado com distribuição de riqueza e renda,

consolidando a produção familiar e promovendo a interiorização do desenvolvimento.

Segundo Portugal (2002), cabe ressaltar que os desafios apresentados não são da

mesma intensidade em todas as regiões, estados e municípios do Brasil, pois as diferenças são

significativas e cada local requer um plano diferenciado de acordo com suas dificuldades e

com as características de cada território.

Além disso, conforme Portugal (2002), a agricultura familiar tem um papel crucial na

economia das pequenas cidades, pois, no Brasil, 4.928 municípios têm menos de 50 mil

habitantes; destes, mais de quatro mil têm menos de 20 mil habitantes. Os produtores

agropecuários e seus familiares atuam em alguns empregos no comércio e nos serviços

prestados nas pequenas cidades. A melhoria de renda por meio de sua inserção no mercado

tem impacto importante no interior do país e por consequência, nas metrópoles.

Para Nazzari (2007), o fortalecimento da agricultura familiar pode contribuir para a

inclusão social, desenvolvimento econômico e elevação dos índices de capital social, que tem

como variáveis a confiança, a cooperação e a participação política dos cidadãos. O capital

social é processo e instrumento de cidadania que pode mudar as relações pessoais e produzir

intercâmbios que gerem redes de cooperação e solidariedade, conforme demonstra Dematteis

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(2008), por meio do SLOT (Sistema Local Territorial), através do qual, há a construção de um

ator coletivo.

Para Altafin (s/d), a diversidade das situações em que a agricultura familiar está

inserida reflete-se também nas reações da dinâmica econômico-social dos territórios, as quais

já faziam parte das práticas camponesas bloqueadas pelo modelo produtivista. Para a autora,

há sete contribuições da agricultura familiar para a sociedade:

a) a primeira é o seu papel original de garantir a segurança alimentar, fornecendo alimentos e

possibilitando o acesso eles.

b) a segunda é a função de gerar emprego no espaço rural;

c) a terceira é a preservação ambiental;

d) a quarta é a relação com os recursos naturais, fator ligado à sua capacidade de respeitar e

conviver, de forma harmônica, com os ecossistemas naturais, tidos pelos agricultores como

patrimônio familiar;

e) a quinta é a sua ―vocação‖ para produzir e consumir valorizando a diversidade, essencial à

preservação ambiental, além de a gestão da propriedade propiciar a realização de atividades

que requerem maior cuidado no manejo dos recursos;

f) a sexta é a função sócio-cultural, o resgate de um modo de vida que associa conceitos de

cultura, tradição e identidade;

g) a sétima e última é a valorização de desenvolvimento local, baseado em processos

endógenos, com o aproveitamento racional dos recursos disponíveis em unidades territoriais

delimitadas pela identidade cultural.

Conforme observamos, são variadas as concepções em relação à agricultura familiar,

assim como existem agricultores familiares em diferentes estágios de reprodução social,

generalizados a uma única concepção, a de agricultor familiar. Assim, percebemos a

importância da agricultura familiar em várias discussões, no entanto, verificamos também os

limites para o desenvolvimento dessa forma de produção. É preciso melhorar as condições

para a diversificação na produção, proporcionando renda, melhorias sociais, ambientais e das

condições de vida, da valorização do espaço rural e da relação afetiva do agricultor com o

consumidor.

E é desse modo que a agricultura familiar é reconhecida como responsável por parte

significativa das dinâmicas rurais e de grande relevância na articulação rural-urbana. Além

disso, estamos convencidos de que o agricultor familiar não é apenas um ―personagem‖

passivo diante da modernização e da produtividade; ao contrário, ele é um ser construtor que

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escreve a sua própria história no emaranhado campo de poder que é a agricultura, atuando

com a experiência herdada do campesinato e com as adaptações aos novos desafios da

modernização agrícola.

Por isso, os agricultores familiares agroecológicos do município de Verê têm muito

interesse em permanecer no campo ―conforme mostraremos no capítulo 5― produzindo para

consumir e comercializar, buscando, cada vez mais, formas alternativas de produção, entre

elas, a agroecologia, uma prática agrícola baseada no uso racional dos recursos naturais, na

produção de alimentos saudáveis e na valorização da qualidade da vida do homem do campo,

da sua família, do seu trabalho e da sua cultura. Produzem alimentos sem o uso de agrotóxicos

e de forma artesanal, utilizando técnicas e tecnologias que não geram impactos significativos

na natureza.

Nessa perspectiva, segundo Saquet (2009), a natureza é um patrimônio territorial e

precisa ser gerida pela sociedade local, articulada a outros grupos sociais, com capacidade de

autogestão, valorizando a natureza, a ajuda mútua, o pequeno comércio, a autonomia, o

trabalho manual do agricultor, os saberes populares, a cooperação, o patrimônio cultural-

identitário, a biodiversidade, as microempresas, enfim, a vida.

3.2 – AGROECOLOGIA: UMA ALTERNATIVA PARA O DESENVOLVIMENTO

TERRITORIAL

Primeiramente, cabe destacar que a agricultura alternativa é distinta da agricultura

baseada nos princípios agroecológicos, pois a agricultura alternativa pode meramente ser vista

como conotação da aplicação de práticas que visam atender requisitos sociais e ambientais e

não necessariamente atendem às orientações mais amplas emanadas da agroecologia,

conforme veremos adiante.

As discussões em relação aos impactos sócio-ambientais provindos do processo de

modernização da agricultura iniciado nos anos de 1960 vem-se expandindo tanto no Brasil

como em vários países do mundo devido aos impactos ambientais e à concentração de terra e

riqueza nas mãos de poucos. Segundo Saquet et. al. (2009), o modelo de desenvolvimento

econômico, pautado no pacote tecnológico exposto pela revolução verde, ampliou a

quantidade de alimentos produzidos, porém, ao mesmo tempo, intensificou tanto a agressão

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ao ambiente como as desigualdades sociais fazendo-nos pensar num modelo de

desenvolvimento que considere as dimensões sociais (economia, cultura e política) e naturais,

conforme descrevemos no capítulo 1.

Dessa forma, como contraponto à revolução verde, novos métodos e técnicas agrícolas

denominados alternativos desenvolveram-se, buscando adaptação à dinâmica dos

ecossistemas e, ao mesmo tempo, empregar seus elementos (animais, vegetais, minerais,

hídricos, solos etc) buscando a sustentabilidade. Segundo Saquet et. al. (2009), uma das

correntes dessa possibilidade alternativa traduz-se na agroecologia. Esta compreende a

utilização de uma agricultura menos agressiva ao ambiente, que promova a inclusão social,

proporcionando melhores condições econômicas para os agricultores e favorecendo a

segurança alimentar.

Segundo Miklós (1998), a produção agroecológica e suas diversas modalidades ou

escolas tiveram início na Europa, na década de 1920, com a experiência de pequenos grupos

de agricultores e o acompanhamento de especialistas, pesquisadores e filósofos que, na época,

não encontraram recepção fácil às suas ideias.

Conforme Adriano Saquet et. al.(2005), em novembro de 1972, na França, cria-se a

IFOAM - Federação Internacional dos Movimentos de Agricultura Orgânica - hoje com sede

na Alemanha. A IFOAM passou a reunir centenas de entidades e pessoas físicas ligadas à

agricultura ecológica e a agroecologia começou a se fortalecer. No entanto, com a necessidade

de produção de alimentos rápida em grande escala, criou-se, há algumas décadas, um sistema

de produção agrícola baseado na aplicação de agroquímicos, chamado de agricultura

convencional, implantada a partir da modernização da agricultura.

Todavia, após a Conferência para o Desenvolvimento e o Meio Ambiente, a ECO-92,

no Rio de Janeiro, chegou-se à conclusão de que os padrões de produção e atividades

humanas em geral teriam que ser modificados. Isso propiciou a procura de alternativas de

produção, inclusive nas atividades agrícolas. Os movimentos ocorridos no sentido da

implantação de maior qualidade dos produtos agrícolas desenvolveram-se de forma ímpar.

Segundo Miklós (1998), a evolução da agroecologia foi gradual, iniciando-se no fim

da 1ª Guerra Mundial, quando surgiam, na Europa, as primeiras preocupações com a

qualidade dos alimentos consumidos pela população. Após a 2° Guerra Mundial, a agricultura

sofreu um novo incremento, uma vez que o conhecimento humano avançava nas áreas da

química industrial e farmacêutica. Logo depois dessa fase, com o objetivo de reconstruir

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países destruídos e dar base a um crescente aumento populacional, surgiram os adubos

sintéticos e agrotóxicos seguidos, posteriormente, das sementes geneticamente melhoradas.

A produção cresceu e houve grande euforia em todo o setor agrícola mundial,

que passou a ser conhecido como Revolução Verde. Por outro lado, duvidava-

se que esse modelo de desenvolvimento fosse perdurar, pois ele negava as leis

naturais. Neste contexto, surgiram em todas as partes do mundo movimentos

que visavam resgatar os princípios naturais, a exemplo da agricultura natural

(Japão), da agricultura regenerativa (França), da agricultura biológica

(Estados Unidos), além das formas de produção já existentes, como a

biodinâmica e a orgânica (MIKLÓS, 1998, p.4).

Alguns movimentos tinham princípios semelhantes e passaram a ser conhecidos como

agricultura orgânica. Segundo a Associação da Agricultura Orgânica (2008), o conceito de

agricultura orgânica surge com o inglês Albert Howard, entre os anos de 1925 e 1930, quando

pesquisou o tipo de agricultura praticada pelos camponeses na Índia. Howard ressaltava a

importância da utilização da matéria orgânica e da manutenção da vida biológica do solo. Já

nos anos de 1990, tal conceito ampliou-se e trouxe uma visão mais integrada e sustentável

entre as áreas de produção e preservação, procurando resgatar o valor social da agricultura e

passando a ser conhecido como agroecologia. A agroecologia torna-se, dessa forma, uma

alternativa em potencial ao sistema tradicional de produção agrícola (SAQUET, 2008).

Da mesma maneira, em obra anterior, Altieri (2004, p. 204) trata a agroecologia como

[...] uma nova abordagem que integra os princípios agronômicos, ecológicos e

socioeconômicos, a compreensão e avaliação do efeito das tecnologias sobre

os sistemas agrícolas e a sociedade como um todo [...] O objetivo é trabalhar

com e alimentar sistemas agrícolas complexos onde as interações ecológicas e

sinergismo entre os componentes biológicos criem, eles próprios, a fertilidade

do solo, a produtividade e a proteção das culturas.

Segundo Saquet et al.(2005), a agricultura ecológica, envolvida pela agroecologia, tem

como principal objetivo a produção de alimentos saudáveis, sem uso de agrotóxicos, de boa

qualidade, bom sabor, aroma e valor nutricional. Ao mesmo tempo, devem ser preservados os

recursos e as paisagens naturais, assegurar o trabalho e servir como fonte de renda para a

subsistência das famílias agricultoras. Segundo os autores, a entidade mais antiga nos

movimentos favoráveis à agricultura ecológica, ou agroecologia, no Brasil, é a Estância

Deméter, de Botucatu, São Paulo, instalada em 1934, originando o Instituto Biodinâmico

(IBD), fundado em 1981. A primeira Organização Não governamental (ONG) de agricultura

ecológica no Brasil foi a Mokiti Okada.

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Benthien (2007) afirma que a história da formação de movimentos ecológicos, no

Brasil, culminando no que hoje conhecemos como agroecologia, conflui com o

fortalecimento, em nível mundial, da luta das organizações não-governamentais (ONGs) e

com a discussão sobre o meio ambiente e desenvolvimento desde a década de 1970.

A agroecologia, mesmo restrita a espaços específicos e incipientes em várias regiões

do Brasil, representa a formação de uma base concreta de contestação à lógica da

racionalidade econômica empregada pelo modo de produção capitalista, além de concretizar a

manutenção do modo de vida de agricultores familiares sugerindo perspectivas alternativas de

reprodução social. Algumas ONGs brasileiras, como a ASSESOAR, no Sudoeste do Paraná,

têm um papel importante no estabelecimento de práticas agroecológicas, principalmente pela

formação de grupos de assessoramento e acompanhamento rural que levam aos agricultores

informações sobre a melhor forma de trato com a terra, além de auxílio no escoamento da

produção, evitando perdas.

Segundo Benthien (2007), a Conferência de Estocolmo, ocorrida no início da década

de 1970, provocou grandes avanços de ordem jurídica e social, expondo ao mundo a constante

ocorrência de catástrofes ambientais tais como: o surgimento de nuvens tóxicas devido a

vazamentos químicos, chuvas ácidas e derramamento de petróleo no mar. A contribuição

principal de tal conferência foi de fazer com que as preocupações ambientais internacionais

ocupassem um lugar de destaque na agenda de negociações dos países, com o intuito de

cooperação internacional.

Um pouco antes, em 2003, Silva-Sánchez afirmou que:

[...] o meio ambiente, compreendido em sua concepção mais ampla, que

envolve as relações políticas, econômicas e sócio-culturais, passou a ocupar

um lugar central nas relações e políticas internacionais e se, por um lado, os

problemas ambientais podem levar a conflitos e enfrentamentos entre os

Estados-Nação podem também, ou pelo menos têm potencial para isto, forçar

uma cooperação entre os Estados (p.16).

Assim, segundo Benthien (2007) vinte anos após a Conferência de Estocolmo, com a

Eco-92 destaca-se a necessidade de cooperação internacional em favor do desenvolvimento

sustentável4. Porém, isso não provocou resultados significativos para os problemas

encontrados em sua agenda, a Agenda 21 que, conforme o MMA (2010) (Ministério do Meio

4 Segundo Almeida a noção de desenvolvimento sustentável vem sendo utilizada como portadora de um novo

projeto para a sociedade, capaz de garantir, no presente e no futuro, a sobrevivência dos grupos sociais e da

natureza. Ideia que teve origem a partir do Relatório de Brundtland (1987), conhecido no Brasil por ―Nosso

Futuro Comum‖, a ideia de desenvolvimento sustentável aparece nos seguintes termos: é aquele ―capaz de

garantir as necessidades das gerações futuras‖. (1997, p. 20-21)

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Ambiente), é um programa de ação, (...), que se constituí na mais ousada e abrangente

tentativa já realizada, em promover, em escala planetária, um novo padrão de

desenvolvimento, conciliando métodos de proteção ambiental, justiça social e eficiência

econômica (p.01). A discussão e internalização político-legislativa da problemática ambiental

no Brasil são percebidas nesse período, mesmo já existindo, desde meados da década de 1980,

as raízes do movimento ambientalista.

Na década de 1980, o ambientalismo no país ainda era incipiente; as ONGs existentes

até então tinham poucos militantes, baixo orçamento e atuação local:

Eram um conjunto de organizações desarticuladas, amadoras, que viviam do

heroísmo de seus militantes e de campanhas pontuais. Faziam muito barulho,

causavam comoção, mas ainda tinham muito pouca efetividade na

formulação de políticas públicas, situação que mudou radicalmente após a

Rio-92 (CRESPO, 2003, p.62).

Conforme Benthien (2007), nas últimas quatro décadas de conferências internacionais

sobre o meio ambiente e através das manifestações contra as ideologias dominantes presentes

em muitas ONGs no Brasil, a agroecologia começa a se desenvolver como uma forma de

resistência à lógica do mercado imposta pelo capitalismo, incorporando aspectos da

sustentabilidade ambiental em suas práticas, além de ser uma alternativa de sobrevivência aos

agricultores agroecológicos, como descreveremos no capítulo 5, por meio do estudo da

agricultura familiar agroecológica no município de Verê

No Brasil, a agroecologia começa a apresentar raízes na década de 1970, segundo

Brandenburg (2002), passando a ser construída através do auxílio de instituições da sociedade

civil organizada, de segmentos da Igreja (como a Pastoral da Terra) e por entidades estatais

como a EMATER. Por ser uma prática alternativa, sua participação no mercado também

atende a um viés alternativo na medida em que há, por parte de grupos de agricultores

ecológicos, a intenção de formação de organizações sociais autogestionáveis, que atinjam um

mercado consumidor, gerando a valorização e preferência por seus produtos.

A agroecologia envolve várias correntes da produção agrícola como alternativa aos

métodos técnico-econômicos de produção ou agricultura convencional, e é a partir dessa

lógica que buscamos apresentar essa alternativa para contrapor ao modelo de produção

integrada efetivada pela Sadia.

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Para Saquet et al. (2005, p.13), o objetivo principal da agricultura alternativa é a

formação e manutenção de um equilíbrio ecológico nas áreas agrícolas produtivas e gerar

uma independência dos recursos externos de produção.

Quando o autor se refere à independência dos recursos externos é porque as formas de

produção convencional utilizam tecnologias, máquinas e toneladas de insumos químicos que

fazem com que o agricultor passe a depender do mercado e da indústria. Então, a agroecologia

significa uma forma de substituir a produção agrícola convencional, além de produzir

alimentos mais saudáveis, proteger e conservar os recursos naturais, socializar a mão-de-obra

do agricultor e buscar autonomia.

Em Altieri (2004), a agroecologia é definida como ciência ou disciplina científica que

apresenta uma série de princípios, conceitos e metodologias para estudar, analisar, dirigir e

avaliar agroecossistemas, com o objetivo de favorecer a implantação e o desenvolvimento de

sistemas de produção com maiores níveis de sustentabilidade, ou seja, para esse autor, a

agroecologia não é a forma agrícola de produzir, mas sim, a ciência que procura compreender

os processos produtivos de uma maneira mais ampla, principalmente as formas de agricultura

como a orgânica e a ecológica.

Para Gliessman (2001), a agroecologia é uma fusão da agronomia com a ecologia e

constitui-se numa ciência. ―A agroecologia proporciona o conhecimento e a metodologia

necessários para desenvolver uma agricultura que é ambientalmente consistente, altamente

produtiva e economicamente viável (p.54). Seguindo a mesma linha, para Caporal e

Costabeber (2002, p.16), a agroecologia é um conjunto de conhecimentos que vem orientar o

correto redesenho e o adequado manejo de agroecossistemas na perspectiva da

sustentabilidade. Além disso, na agroecologia, apóia-se a transição dos atuais modelos de

desenvolvimento rural baseados na agricultura convencional para estilos de desenvolvimento

rural baseados na agricultura sustentável.

Conforme Caporal e Costabeber (2004), a agroecologia, vista a partir de um enfoque

sistêmico, adota o agroecossitema5, cujos objetivos não são a maximização da produção de

uma atividade particular, mas a otimização do agroecossistema como um todo, enfatizando o

conhecimento das relações entre as pessoas, dos cultivos, do solo, da água e dos animais.

Portanto, para Caporal e Costabeber (2004, p. 12):

5 Segundo Altieri (1989), agroecossistema é a unidade fundamental de estudo, no qual os ciclos minerais, as

transformações energéticas, os processos biológicos e as relações sócio-econômicas são vistas e analisadas em

seu conjunto.

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Na agroecologia, é central o conceito de transição agroecológica, entendida

como um processo gradual e multilinear de mudança, que ocorre através do

tempo, nas formas de manejo dos agroecossistemas, que, na agricultura, tem

como meta a passagem de um modelo agroquímico de produção [...] a estilos

de agriculturas que incorporem princípios e tecnologias de base ecológica

[...] a transição agroecológica implica na busca de uma maior racionalização

econômico-produtiva e numa mudança nas atitudes e valores dos atores

sociais em relação ao manejo e conservação dos recursos naturais.

Para Gliessmán (2001), o processo de transição ocorre através de três fases: a primeira

concretiza-se com a diminuição das práticas convencionais para reduzir o uso de insumos

externos caros, escassos e daninhos ao ambiente; a segunda é a substituição de insumos e

práticas convencionais por práticas alternativas; e, por fim, a terceira, e mais complexa, é o

redesenho dos agroecossistemas para que estes funcionem com base em novos conjuntos de

processos ecológicos, por isso consideramos o processo de transição agroecológica difícil,

levando alguns agricultores a desistirem de produzir alimentos agroecologicamente.

Contudo, chegamos à conclusão de que, como afirma Gliessman (2001), a

agroecologia é uma ciência que orienta uma agricultura ambientalmente sustentável e

economicamente produtiva, utilizando tecnologias ecologicamente viáveis, incorporando-as a

um novo padrão produtivo que garanta produção satisfatória sem pôr em risco o ambiente

natural e a saúde humana.

Candiotto (2008), por sua vez, concorda que cabe à agroecologia pensar na

produtividade agrícola a partir da dinâmica de cada ecossistema e de sua transformação em

agroecossistemas sustentáveis, buscando compatibilizar benefícios ambientais, econômicos e

sociais, sobretudo para os agricultores familiares envolvidos. A partir de seus princípios

elementares, é possível menor agressão ao ambiente, produção de alimentos mais saudáveis e

geração de recursos para a autossustentação dos produtores. (SAQUET, 2008)

A dinâmica da chamada Revolução Verde implantou um modelo agrícola baseado na

utilização de algumas técnicas de manejo do solo que desencadearam problemas de ordem

econômica, natural e social. Contaminação das águas pelo uso excessivo de agrotóxicos,

consequentemente, causando danos ao ambiente. Economicamente a manutenção do produtor

familiar no espaço rural torna-se inviável, contribuindo para a desintegração da agricultura

familiar e ocasionado uma leva de despossuídos de terras.

Portando, a agroecologia surge como uma alternativa para amenizar os problemas

ambientais e sociais ocasionados pela intensa modernização agrícola e proporcionar a

inclusão dos pequenos produtores agrícolas no processo socioeconômico.

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A concretização da agroecologia não se dará com facilidade, visto que ela

pressupõe a construção de uma nova ciência comprometida com os interesses

sociais e ecológicos dos movimentos populares e com a articulação entre

ciências sociais e naturais na compreensão dos problemas socioambientais da

atualidade, buscando cada vez mais soluções realmente sustentáveis.

Pressupõe, ainda, um enfrentamento político com os interesses econômicos

que dominaram o desenvolvimento do capitalismo industrial na agricultura

durante os últimos 130 anos (MOREIRA, p.128, 2004).

Pressupomos, então, para a agroecologia um elevado caráter social, pois pode

promover melhores condições de vida para o produtor que, além de praticar uma agricultura

familiar consolidada, evita a contaminação por produtos químicos, contribuindo com a

conservação do ambiente e possibilitando mais autonomia ao agricultor, conforme

descrevemos no capítulo 1.

A agricultura orgânica fundamentada na agroecologia é um sistema de produção

viável em pequenas áreas e permite a produção em pequena escala (SAQUET, 2008); desse

modo, praticar a agricultura orgânica requer uma detalhada organização da propriedade.

Referente ao desenvolvimento que se busca através da agricultura orgânica, não podemos

deixar de apontar que é um equívoco a afirmação de que o desenvolvimento está ligado

somente ao fator econômico. O desenvolvimento desejado tem que aliar processos

econômicos, sociais, culturais e naturais, conforme descrevemos no item 1.3 desta pesquisa.

Pensar em desenvolvimento aliando economia e sociedade é pensar em

desenvolvimento territorial. A agricultura familiar baseada no conceito de agroecologia pode

ser um viés ―apoiado nas noções de sustentabilidade― para a construção de um

desenvolvimento para o local. O acesso à agroecologia exige transformações nas esferas

políticas, sociais e econômicas, ou seja, o Estado enquanto provedor de políticas públicas

deve aliar-se às instituições que têm interesse nessa forma de produção e criar mecanismos

que tornem possível aos agricultores familiares à sua integração na agricultura sustentável.

Esta, por sua vez, usada na promoção da agricultura familiar, tem capacidade de assegurar

uma produção voltada para a subsistência, podendo também ser comercializada, gerando

outras fontes de renda para o produtor. Altieri (2004) ratifica que, novos agroecossistemas

sustentáveis não podem ser implementados sem uma mudança dos determinantes

socioeconômicos (p. 21).

De acordo com essa configuração, a agricultura familiar carece de ser estruturada

através da elaboração de políticas adequadas à sua produção, que atendam ao

desenvolvimento socioeconômico através de uma perspectiva cultural e política, como uma

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proposta para a diminuição da pobreza e da exclusão social. Segundo Saquet (2008), a

agricultura familiar possibilita a inclusão social das pessoas no campo e melhora a saúde do

produtor e do consumidor.

A agricultura familiar baseada na produção agroecológica, pode dar certo desde que

haja pré-disposição de todos os interessados na melhoria da condição humana e ambiental

como ocorre em algumas propriedades do município de Verê – Sudoeste do Paraná, que

possuem várias culturas agrícolas agroecológicas. Sabemos que, em pequenas propriedades,

torna-se difícil a manutenção econômica baseada apenas na agricultura convencional. Assim,

conforme demonstraremos no capítulo 4, as pequenas famílias que vivem da produção de

alimentos, encontraram na agricultura agroecológica uma alternativa para a subsistência da

família e geração de renda.

Entretanto, em virtude dos elevados cuidados e do não uso de produtos químicos na

produção de alimentos agroecológicos, dependendo do número de

atravessadores/intermediários (mercados e associações), tornam-se mais caros para o

consumidor, já que o poder de compra da maioria dos brasileiros não possibilita o consumo

desses produtos, no entanto, se a comercialização é realizada in loco, na venda direta ou em

feiras, os preços ficam mais baixos. Antes de calcular o valor econômico destes produtos,

porém, devemos lembrar-nos dos inúmeros benefícios que eles oferecem à saúde humana e ao

ambiente.

Os estudos segundo a ciência agroecológica permitem alternativas pensadas em prol

do agricultor familiar, em que este, através da agricultura familiar, consiga as condições

necessárias para se manter no campo colaborando com a recuperação e preservação do

ambiente.

Por fim, a agroecologia promove uma concepção de que é possível fazer uma

agricultura familiar estruturada na produção orgânica de alimentos, voltada para a

subsistência da família e para o mercado consumidor. A agricultura que utiliza recursos

naturais em sua produção precisa ser incentivada pelo Estado, pelos Movimentos Sociais,

pelas instituições privadas e pelo próprio mercado consumidor.

A agroecologia, além de proporcionar rendimentos ao produtor, contribui também para

a preservação do ambiente e produção de alimentos saudáveis. Isso significa pensar em um

desenvolvimento territorial que não leva em conta apenas o crescimento econômico, mas,

possibilita avanços e conquistas ambientais, políticas e culturais.

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CAPÍTULO IV – ENTIDADES PARCEIRAS DA AGROECOLOGIA EM VERÊ-PR.

A produção agroecológica, como forma alternativa, está sendo implementada para

substituir o uso excessivo do pacote tecnológico disseminado pela ―revolução verde‖. O fato é

que muitas ONGs, associações de produtores e agricultores familiares estão assumindo um

compromisso em defesa da saúde humana e da preservação e conservação ambiental, aliando

a isso o desenvolvimento econômico e social, facilitando a inclusão social, buscando justiça

social e autonomia.

Exemplos delas são o CAPA e a ASSESOAR, preocupados com a permanência do

agricultor familiar no campo, buscando informá-lo e conscientizá-lo da importância de

produzir agroecologicamente, mostrando que a sua estabilidade no campo é possível,

utilizando a mão-de-obra da família e diminuindo os custos de produção se comparados com

o cultivo convencional. Os ganhos com a venda da produção agroecológica podem ser mais

significativos e, ao mesmo tempo, cuida-se da saúde da família, do consumidor e da

preservação e manutenção dos ecossistemas.

As associações de produtores, como a APAV e APROVIVE, em Verê, atuam

incentivando a produção agroecológica e a permanência dos agricultores familiares no campo,

através do planejamento, organização e comercialização da produção.

Além disso, um papel importante também é desempenhado pelas instituições

certificadoras como a REDE ECOVIDA, que preocupadas com a garantia da qualidade da

produção, vêm atuando na região Sul do Brasil, facilitando as trocas de informações e a

certificação participativa.

De acordo com as normas da Rede Ecovida (2010), a certificação participativa é um

sistema solidário de geração de credibilidade, no qual a elaboração das normas de produção

ecológica é realizada com a participação efetiva dos agricultores, buscando o

aperfeiçoamento, com respeito à realidade de cada produtor. A certificação, além de garantir a

qualidade do produto, respeita e valoriza a cultura local, buscando aproximar os agricultores e

consumidores para a construção de uma rede que congregue iniciativas de diferentes regiões.

Outra entidade que desempenha um papel fundamental é a CRESOL (Cooperativas de

Crédito Rural com Interação Solidária), atuando nos estados do Paraná e Santa Catarina, com

facilidades de acesso a financiamentos custeio/investimento, disponibilizando uma linha de

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crédito específica para agricultura orgânica ou agroecológica. Além disso, todos os seus

cooperados são exclusivamente agricultores familiares.

As entidades parceiras como o CAPA, a APAV e a APROVIVE possuem o papel mais

importante, pois são as principais incentivadoras e responsáveis pela evolução da produção

agroecológica no município de Verê, atuando com assistência técnica especializada, na

organização e comercialização da produção, oferencendo alternativas de comercialização que

atendam à realidade do produtor e às exigências do consumidor, conforme apresentaremos a

seguir.

Figura 2- Organograma das entidades parceiras vinculadas à agroecologia no município de Verê

Org.: GAIOVICZ, E. F. 2010.

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4.1 - REDE SOLIDÁRIA DE COMERCIALIZAÇÃO E DE CERTIFICAÇÃO

PARTICIPATIVA: REDE ECOVIDA

Segundo Santos (2003), ao final do ano de 1998, iniciaram-se os debates para a

formação da Rede Ecovida. Em 2000, uniram-se organizações de todo Sul do Brasil e iniciou-

se a reunião dos primeiros documentos sobre o funcionamento e o processo de certificação. A

Rede Ecovida é formada por agricultores familiares, técnicos e consumidores reunidos em

associações, cooperativas e grupos informais, juntamente com pequenas agroindústrias,

comerciantes ecológicos e pessoas comprometidas com o desenvolvimento da agroecologia.

Atualmente, a Rede Ecovida conta com 21 núcleos regionais, abrangendo em torno de

170 municípios. Seu trabalho congrega, aproximadamente, 200 grupos de agricultores, 20

ONGs e 10 cooperativas de consumidores. Em toda a área de atuação da Ecovida, são mais de

100 feiras livres ecológicas e outras formas de comercialização.

Nesse processo, ocorre a constituição de um território, pois, de fato, as interações

política, econômica e social são efetivadas pela Rede Ecovida, através dos núcleos regionais e

da certificação participativa, concretizando malhas, nós e redes. A malha é a conexão entre as

diversas instituições, os nós são a Ecovida e as demais entidades e a rede são as ligações entre

os diversos nós – entidades e associações. Esse sistema está organizado hierarquicamente,

assegurando o controle sobre tudo o que se movimenta dentro e fora do território abrangido

pelos núcleos.

O funcionamento da Rede é descentralizado e está baseado na criação de núcleos

regionais (mapa 4) que reúnem membros de uma região com características semelhantes,

facilitando a troca de informações e a certificação participativa. Dessa maneira, em cada

núcleo regional, todos os atores têm papel fundamental, podendo participar para melhorar a

qualidade dos produtos e a forma de produzir. Para tanto, a Rede Ecovida faz reuniões e

visitas para conhecer as propriedades com iniciativas de produção e transformação

agroecológica, de forma transparente, construindo relações de confiança. Desse modo, ocorre

a certificação participativa, a obtenção das informações, a verificação do cumprimento das

normas e o aperfeiçoamento dos sistemas produtivos são realizados com o envolvimento dos

produtores, técnicos e das organizações de assessoria, como a ASSESOAR, no Sudoeste do

Paraná.

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MAPA 4 – Territorialização da Ecovida: localização dos núcleos regionais

Fonte: http://www.ecovida.org.br/?sc=SA003, acesso em 05/11/2010; Org.: GAIOVICZ, E.F., 2010.

No Sudoeste do Paraná, no município de Francisco Beltrão, existe um núcleo da Rede

Ecovida, parceiro da ASSESOAR e do CAPA, chamado Grupo Sudoeste, que contribui na

conversão de algumas propriedades, na produção, comercialização e certificação dos produtos

orgânicos produzidos a partir da agroecologia; isso, pode ser verificado nas 19 propriedades

estudadas, pois todas possuem certificação da Rede em algum produto.

Os objetivos da Rede Ecovida são: a) desenvolver e multiplicar as iniciativas em

agroecologia; b) estimular o trabalho associativo na produção e no consumo de produtos

ecológicos; c) articular e disponibilizar informações entre as organizações e pessoas; d)

aproximar, de forma solidária, agricultores e consumidores; e) estimular o intercâmbio, o

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resgate e a valorização do saber popular; f) possuir uma marca e um selo que expressam o

processo, o compromisso e a qualidade, isto é, a certificação.

Segundo Santos e Oliveira (2004), a certificação teve início no começo do século XX

na França, onde pequenos produtores de vinho pretendiam diferenciar suas bebidas daquelas

produzidas em maior escala através de processos industriais. Assim, criaram critérios que,

hoje, são parte da certificação de produto conhecidas como Marcas de Conformidade. Como

exemplos, citamos: Denominação de Origem Controlada (DOC), Indicação Geográfica

Protegida (IGP).

Segundo os mesmos autores, a certificação pode ser facultativa ou voluntária em

alguns casos, compulsória ou obrigatória em outros. Isso depende do país, do produto em

questão, do processo envolvido e, por fim, da legislação pertinente. Conforme a tabela abaixo,

veremos as diferenças:

TABELA 2 – Tipos de certificação de produtos e marcas de conformidade.

TIPO DE CERTIFICAÇÃO DIFERENCIAL DO PRODUTO

Especialidade Tradicional

Garantida

Matéria-prima e modo de preparo

característicos.

Denominação de Origem

Controlada

Forte influência do clima, solo, raças,

variedades e saber fazer sobre o produto.

Indicação Geográfica Protegida Influência parcial do clima, solo, raças,

variedades e saber fazer sobre o produto.

Orgânica Produção de acordo com as normas da

agricultura orgânica. Fonte: Rede Ecovida, 2004. Org.: GAIOVICZ, E.F. 2010.

A finalidade da certificação é atribuir um diferencial ao produto, processo ou serviço, a

fim de obter vantagens para os produtores, tais como agregar valor; permitir a entrada em

novos mercados; diminuir a concorrência de produtos, processos ou serviços de menor

qualidade; e estimular a melhoria contínua da qualidade. Possibilitar, ainda, vantagens aos

consumidores como: facilidade de distinção pela marca, economia de tempo e esforço,

segurança e garantia (compromisso público de qualidade e diversificação da oferta de

produtos de qualidade).

A certificação participativa é um sistema solidário de geração de credibilidade e o selo

Ecovida é obtido após uma série de procedimentos realizados dentro de cada núcleo regional,

onde ocorre a filiação à Rede, a troca de experiências e a verificação do Conselho de Ética.

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Assim, segundo Santos e Oliveira (2004), para conseguir o selo da Rede Ecovida, são

necessários: a integração na Rede e a solicitação da certificação, o preenchimento e

encaminhamento do formulário para requerimento da certificação ao conselho de ética do

núcleo, o qual analisa os formulários, visita a propriedade ou agroindústria, apresenta um

parecer e o núcleo regional (des)aprova a certificação.

Em relação à agroecologia, Santos e Oliveira (2004) afirmam que é uma estratégia de

fortalecimento da agricultura familiar e, ao mesmo tempo, o começo de um processo de

grandes mudanças na base produtiva das propriedades, com incorporação de técnicas

diferenciadas para correção dos solos, para o controle de "pragas", doenças e ervas

"daninhas". Ocorrerão, ainda, modificações nas formas de organização dos agricultores para

que possam superar e avançar contra as barreiras da industrialização e comercialização. Para a

Rede (2010 s/d), não podemos:

[...] repetir os erros do passado recente, ou seja, sair da ditadura dos

químicos para outra ditadura, dos orgânicos e nos deixarmos conduzir,

apenas pela ótica do mercado. Dessa forma, os mesmos que exploram

poluindo e contaminando com os agrotóxicos, continuarão explorando com a

venda de insumos orgânicos e comprando produtos em nome do

desenvolvimento sustentável. Sair dessa ciranda significa construir um

caminho próprio e fazer dele um projeto de vida para agora e para as

próximas gerações.

Dessa maneira, não caem novamente na ciranda de exploração imposta pela

comercialização capitalista, pois além de comercializarem alimentos saudáveis, valorizam a

cultura, o meio ambiente, o produtor e seu saber popular, a propriedade, a autonomia e as

organizações associativas.

Percebemos que, através da agroecologia, com a Rede Ecovida, outras associações,

grupos e cooperativas que apóiam a produção de alimentos saudáveis, aproximamo-nos do

desenvolvimento territorial sustentável, com autonomia na agricultura familiar, produção e

comercialização de alimentos saudáveis e preservação ambiental, mas, para atingirmos

proporções de equilíbrio com outras formas de produção, ainda há muito que trabalhar.

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4.2 – ASSESOAR: ASSOCIAÇÃO DE ESTUDOS, ORIENTAÇÃO E ASSISTÊNCIA

RURAL

Conforme a direção da ASSESOAR (2010), no início dos anos 1960, um grupo de

padres da Bélgica chegou ao Sudoeste do Paraná com algumas idéias, animados pelo Concílio

Vaticano II. Esse Concílio reuniu os bispos de todo o mundo e motivou uma grande

renovação na Igreja Católica. Movidos por esse espírito de renovação, os padres chegaram e

encontraram muito trabalho na região Sudoeste, na qual havia ocorrido, recentemente, a

Revolta dos Posseiros, em 1957, quando os posseiros enfrentaram e expulsaram jagunços e

companhias de terras, conquistando o direito definitivo sobre as terras. Os eventos foram

organizados pelas comunidades populares, com apoio de diferentes setores da sociedade

regional.

Havia muito para fazer nestas terras, novas para os padres recém-chegados e para os

colonos que vinham chegando, sobretudo do Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Como

transformar a fé em compromisso concreto em defesa da vida era o grande desafio da época.

Algumas ações não eram funções da igreja, mas eram necessárias, para isso, surge a

ASSESOAR.

A ASSESOAR teve seus Estatutos inscritos no Registro de Imóveis da 1ª

Circunscrição, 1º Ofício de Registro de Títulos e Documentos, Curitiba, aos 17 de outubro de

1966. No dia 10 de fevereiro de 1966, foi realizada a assembléia de fundação da ASSESOAR.

Fundada por 33 jovens rurais, com o apoio de um grupo de padres, religiosos e leigos,

empenhados no bem-estar da família do agricultor familiar, devido à necessidade de se

estabelecer um serviço autônomo e organizado para diferentes iniciativas em

desenvolvimento na região, implantado, desde 1962, pelos Missionários do Sagrado Coração

de Jesus. Cabe aos agricultores associados assumirem sua direção, cuidar de seu destino e do

trabalho que devem realizar. Os associados cumprem sua função através das Miniassembleias

Municipais, da Assembléia Geral, do Conselho Diretor, do Conselho Administrativo e da

Diretoria Executiva. O Conselho Diretor é composto por 24 sócios, o Conselho

Administrativo por 10 e a Diretoria Executiva por 3 sócios.

A ASSESOAR "tem por fins fundamentais, promover melhores condições de vida aos

agricultores na lavoura e na pecuária e um maior desenvolvimento rural, de acordo com a

doutrina Social Cristã" (Estatutos, cap. I, art. 1º). Tais fins serão atingidos "pela direta

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participação dos agricultores na associação através dos meios por ela promovidos" (Idem,

art. 2º). "A educação e formação do homem do campo procurará atingir a todas as faces que

dizem respeito à sua personalidade moral, religiosa e social e principalmente quando

relacionada com as atividades profissionais propriamente ditas..." (Idem art. 3º)

Segundo Tonini (2008), engenheira agrônoma da entidade, a ASSESOAR foi fundada

com o propósito de trabalhar com os agricultores familiares, com o foco na preservação do

ambiente, na educação popular, na formação de sujeitos capazes de trilhar os caminhos de

suas vidas e se organizarem.

Inicialmente, os serviços eram prestados considerando as necessidades pastorais e

organizativas (sindicalismo e cooperativismo), pois os agricultores, recém-vindos de Santa

Catarina e Rio Grande do Sul, enfrentavam graves problemas de legalização da propriedade,

de escoamento e comercialização da produção.

O atendimento aos agricultores é feito por educadores e técnicos, que vai desde

encontros de estudos, reflexões e debates da prática até a execução de determinadas práticas

ligadas à vida profissional do agricultor.

Eram princípios iniciais da ASSESOAR: a coletividade, a solidariedade, a união e o

incentivo para que os agricultores se organizassem de forma autônoma, (princípios que ainda

hoje são referência na entidade).

Embasada nesses princípios, a ASSESOAR foi desenvolvendo programas de ações

pastorais, sindicais e cooperativas, além de realizar capacitação técnica (1967),

experimentação agrícola (1976), monitorias agrícolas (1977), monitorias domésticas (1977) e

banco de sementes nativas (1984), buscando com isso tecnologias alternativas. Apoiou a luta

pela terra (1981) e o associativismo (1985). Formou o quadro social (1984 e 1994), fez

adequação tecnológica e educação rural através da Escola Comunitária de Agricultores

(1991), da gestão de sistemas produtivos (1995), produção orgânica (1996) e desenvolveu um

Projeto Vida na Roça (1996).

Implantou o crédito rural, com o Fundo de Crédito Rotativo (1989), e apoiou a

implantação do Sistema Cre$ol-Baser (1995), uma cooperativa central do sistema CRESOL.

Buscando sempre a comunicação popular através da cartilha Cambota (1973) e de recursos

áudios-visuais.

Atualmente, a ASSESOAR localiza-se em Francisco Beltrão, no Sudoeste paranaense,

atuando de forma direta em 12 municípios e indireta em mais de 30. Para tanto, mantém

relações de parceria e cooperação com outras entidades públicas, privadas e populares

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estaduais, nacionais e internacionais, atendendo aos seguintes municípios: Ampére, Barracão,

Capanema, Coronel Vivida, Cruzeiro do Iguaçu, Dois Vizinhos, Francisco Beltrão, Itapejara

d´Oeste, Marmeleiro, Planalto, São Jorge d´Oeste e Verê.

Segundo Tonini, em 2008, iniciou-se um novo triênio, o plano para três anos de

trabalhos da ASSESOAR, dividido em três eixos: Agroecologia, gênero e sustentabilidade,

envolvendo basicamente a organização da produção agroecológica e organização das

mulheres nos municípios, uma ação local.

No centro de educação popular, trabalham com processos formativos ligados às

Universidades e com cursos e encontros realizados em outros espaços. A gestão e articulação

institucional garantem a relação com outras entidades,tais como os sindicatos, as

cooperativas de crédito e de produção, e também outras instituições estaduais, regionais e

nacionais como, por exemplo, a Articulação Nacional de Agroecologia, a Rede Ecovida, as

articulações de educação do campo, e a Abong (Associação Brasileira das ONGs).

Tonini (2008) afirma que, desde a fundação da ASSESOAR, procura-se trabalhar com

a preservação ambiental, no início era mais formativa, mas, vai-se fortalecendo com a criação

de vários grupos de agricultores que trabalham com sementes, adubação, agro-

industrialização, e outros.

Quando a ASSESOAR foi fundada, havia uma equipe maior trabalhando,

conseguindo, assim, acompanhar os grupos que, nos anos 1980, chamavam-se GSPs, (Grupos

de Planejamento e Sustentabilidade), trabalhando com diversas áreas da produção, desde as

sementes, a adubação verde, o enleramento de pedras, técnicas voltadas à proteção e

conservação dos solos.

Segundo Tonini (2008), a preocupação com a agroecologia vem desde a fundação;

antes, mais voltada à produção orgânica, levando até a constituição de uma certificadora da

ASSESOAR, com um selo de produtos orgânicos. Com o tempo, percebeu-se que, além do

produto, era necessário dar atenção especial às unidades de produção como um todo, passando

a trabalhar para o fortalecimento da agroecologia, associando outras redes de nível regional e

nacional que possuem a mesma linha de produção, visando compreender o conjunto de

relações da unidade de produção e o bem estar da família.

Ainda, segundo a agrônoma mencionada, os principais objetivos em apoiar a produção

agroecológica são possibilitar autonomia ao agricultor e às regiões, preservar o ambiente,

produzir alimentos saudáveis e de qualidade, além de gerar saúde e bem estar aos produtores e

consumidores.

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É preciso ter alimentos saudáveis não só para os agricultores mas, para quem

está na cidade, pois estes também necessitam de qualidade de vida, é isso

que a ASESSOAR incentiva para toda região e não só para os agricultores

(Entrevista com Fábia Tonini, 2008).

Atualmente, a ASSESOAR possui aproximadamente 250 associados, todos têm

alguma prática agroecológica, mas destes, pouco menos de 70 são totalmente agroecológicos.

Porém, o trabalho da ASESSOAR não é voltado apenas para os sócios, pois a maioria dos

agricultores atendidos não são associados e dentre eles também há produtores agroecológicos.

Em relação à comercialização, a ASSESOAR não visa à exportação, pois a produção

orgânica presente na agricultura familiar é bem diversificada e em pequena escala. O que é

produzido em excedente como a soja e a pipoca do Assentamento Missões é exportado

através de uma empresa privada, porém, a ASSESOAR não trabalha diretamente com esse

tipo de produção.

Segundo Fabro (2008), também engenheira agrônoma da ASSESOAR, há muito

tempo esta entidade vem incentivando o processo de certificação participativa, ―para que os

agricultores garantam produtos livres de agrotóxicos― através de uma certificação complexa,

pois a entidade está inserida no Sistema Participativo de Garantia de Conformidade (SPG),

cujo objetivo central não é o lucro.

Para Tonini (2008), o que fortaleceu ainda mais a certificação participativa foi a Lei

dos Orgânicos, no entanto, é necessário o registro das instituições certificadoras no Ministério

da Agricultura e, ainda, um técnico que se responsabilize pela questão jurídica, pois, de

acordo com a lei, apenas o sistema de certificação participativa não é suficiente.

Para Fabro (2008), as perspectivas para a agroecologia no Sudoeste são favoráveis,

pois existe um movimento para resgate de sementes crioulas; para melhoramento genético de

galinhas (crioulas), para produção de frutíferas agroecológicas, além do aumento na procura

por alimentos saudáveis por parte dos consumidores. Há também turmas que debatem a

agroecologia e o sistema de produção de leite (SISCLAF), buscando sempre uma produção

mais sustentável.

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4.3 - CAPA: CENTRO DE APOIO AO PEQUENO AGRICULTOR

Conforme Vanderlinde (2002), o CAPA é uma organização não-governamental, ligada

à Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil. Foi criado em maio de 1978, em uma

conferência dos pastores regionais, como Centro de Aconselhamento ao Pequeno Agricultor,

financiado por entidades da Alemanha e iniciou suas atividades em junho de 1978, na cidade

de Santa Rosa/RS. Seu objetivo inicial era orientar, conscientizar, apoiar e acompanhar os

pequenos agricultores através de reuniões, seminários de lideranças, seminários com jovens,

palestras, cursos práticos, oferecendo alternativas e procurando manter o homem no campo.

Segundo Brose (2000), apud Vanderlinde (2002), em 1979, passou a se chamar Centro

de Apoio ao Pequeno Agricultor e atuou em Santa Rosa até 1987, prioritariamente na

realização de seminários regionais para o diagnóstico e discussão da realidade no espaço rural

e iniciativas piloto em algumas propriedades. Em 1988, foram criados mais dois núcleos, um

em Erechim e outro em Três de Maio, também no Rio Grande do Sul. Em 1994, fechou-se o

núcleo de Três de Maio e ampliou-se a equipe técnica de Erechim, passando a atender o Norte

do estado e o Oeste de Santa Catarina. A partir disso, redirecionou o seu enfoque para

trabalhar com a “organização dos produtores em grupos, associações e cooperativas, na

agregação de valor à produção familiar e no fomento à agroecologia”. (VENDERLINDE,

2002, p. 80)

Os objetivos do CAPA são: apoiar o fortalecimento e união das famílias de

agricultores para que eles, junto com outros segmentos da sociedade, participem no

desenvolvimento baseado nos princípios de agroecologia e de cooperação através de

experiências com produção, beneficiamento, industrialização e comercialização; desenvolver

tecnologias viáveis, que sirvam de sinais de que o meio rural pode ser um espaço de vida

saudável, de realizações e de viabilidade econômica para todos. Segundo o CAPA (2009),

―[...] a luta é pela afirmação da agricultura familiar como parte de uma estratégia de

desenvolvimento rural sustentável”.

Os objetivos do CAPA são: apoiar o fortalecimento e união das famílias de

agricultores para que eles, junto com outros segmentos da sociedade, participem no

desenvolvimento baseado nos princípios de agroecologia e de cooperação através de

experiências com produção, beneficiamento, industrialização e comercialização; desenvolver

tecnologias viáveis, que sirvam de sinais de que o meio rural pode ser um espaço de vida

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saudável, de realizações e de viabilidade econômica para todos. Segundo o CAPA (2009),

―[...] a luta é pela afirmação da agricultura familiar como parte de uma estratégia de

desenvolvimento rural sustentável”.

Atualmente, o CAPA conta com 5 núcleos (mapa 5), Erechim, Pelotas e Santa Cruz do

Sul, no Rio Grande do Sul e, Marechal Cândido Rondon e Verê, no Paraná, através dos quais

são atendidas aproximadamente 5.400 famílias, incluindo agricultores familiares, indígenas,

quilombolas e pescadores artesanais, tudo isso financiado pela Central Evangélica de

Cooperação e Desenvolvimento da Alemanha.

MAPA 5 – Núcleos do CAPA

Fonte: http://www.capa.org.br/site/content/nucleos/index.php; Org.: GAIOVICZ, E.F. 2010.

No município de Verê (foto 3), o CAPA iniciou suas atividades em setembro de 1997,

atendendo, no Sudoeste do Paraná, os municípios de Ampére, Itapejara d‘Oeste, Marmeleiro,

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São Jorge d‘Oeste, e Verê. Os trabalhos da entidade estão concentrados em Verê, enquanto,

que nos demais municípios, o apoio dá-se de forma indireta, através de associações e de

cooperativas, principalmente na construção da rede solidária de comercialização e de

certificação participativa (Rede Ecovida).

Foto 3 – Fachada do CAPA núcleo de Verê

Fonte: Arquivo pessoal, GAIOVICZ E.F. 2010.

De acordo com o CAPA, hoje, a agricultura familiar continua a enfrentar desafios.

Para haver viabilidade na pequena propriedade necessário se fez que haja organização,

preparo e persistência, além do

[...] respeito à diversidade – biológica, cultural, étnica e religiosa – ser

fundamental para a manutenção da vida e para a construção de

independência e de autonomia. Atualmente, o trabalho do CAPA atende

agricultores familiares, agricultores assentados, quilombolas, indígenas e

pescadores profissionais artesanais, organizados em grupos, associações

comunitárias e cooperativas. Sua atuação se dá em diferentes regiões dos

estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná, por meio de cinco

núcleos ligados em rede. As equipes técnicas, formadas por profissionais das

áreas da agricultura, saúde, administração e comunicação, prestam assessoria

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na organização social e política, na formação e na produção econômica das

famílias beneficiadas (CAPA, 2009, s/p).

Desde o início, o CAPA tentou contribuir para a prática social e de serviço junto às

famílias agricultoras, como estratégia de desenvolvimento sustentável. Por isso, Vanderlinde

(2002, p. 77) diz que,

[...] é possível concluir que o CAPA está empenhado em construir uma nova

paisagem no meio rural. Uma paisagem que inclua a inserção responsável do

homem sem necessariamente deteriorar este ambiente onde ele está inserido.

Esta tarefa não é fácil e exige considerável esforço e sabedoria de todos os

envolvidos nesta empreitada.

A revolução verde não resolveu o problema da alimentação, além de deteriorar o

ambiente com o uso excessivo de agrotóxicos e substituiu a mão-de-obra humana por

máquinas, inserindo o agricultor familiar numa dependência constante da indústria e do

capitalismo, inviabilizando a sua sobrevivência no campo. O êxodo rural é a principal

preocupação da ONG, pois, segundo Décio (2009), técnico agrícola do núcleo de Verê,

“ficam no meio rural apenas os idosos, que já não têm a mesma força para trabalhar, os

jovens estão estudando e indo embora das propriedades, vendendo sua força de trabalho nas

cidades”.

É por esse motivo que a entidade oferece cursos de formação para produtores,

realizados nas propriedades agroecológicas, buscando conciliar teoria e prática; após o curso

os agricultores passam a receber visitas, para realização de diagnósticos da propriedade, de

orientação e de implantação de atividades; a propriedade torna-se integrada, passando a

receber assessoria permanente do Centro, com a única exigência de que participem das

reuniões e das práticas em dias de campo.

A equipe técnica do CAPA é multidisciplinar, formada por técnicos e profissionais de

várias áreas, prestando apoio aos agricultores familiares. Segundo Luchman (2008),

ultimamente os trabalhos estão mais concentrados no município de Verê, onde as atividades

de assessoria são realizadas diretamente com os produtores, enquanto, nos demais municípios,

o apoio é de forma indireta, através de associações e de cooperativas, principalmente nas

atividades de construção e fortalecimento da Rede EcoVida.

Além disso, o CAPA, através da assistência, acumulando experiências vivenciadas

com as famílias acompanhadas, pretende ensinar e estimular o agricultor a ―desintoxicar a

terra‖, preocupado que está com a garantia do sustento da família, com a saúde de quem

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produz e consome os alimentos; pretende auxiliar de diversas outras formas, tais como: na

produção e incremento tecnológico, entendendo que é necessário fazer frente ao mercado

consumidor exigente e à ansiedade de retorno financeiro por parte dos agricultores; no

planejamento para que haja regularidade de ofertas exigidas pelo mercado consumidor; na

comercialização, buscando atender as necessidades do produtor e as exigências dos

consumidores, estabelecendo uma ligação entre agricultor-consumidor; na organização de

grupos e formação de associações, assim como ocorre, em Verê, com a APAV.

No ano de 2000, o CAPA, atendia 5 famílias que produziam hortaliças agroecológicas,

comercializadas diretamente com consumidores da cidade, mas como houve um aumento

considerável da produção e esses consumidores não conseguiam absorver toda a produção, os

produtores sentiram a necessidade de se organizar a produção e de espaço para

comercialização. Assim, em parceria com o CAPA, fundaram a APAV.

4.4 – APAV: ASSOCIAÇÃO DOS PRODUTORES AGROECOLÓGICOS DE VERÊ

A APAV foi fundada com o apoio do CAPA, em agosto de 2001. Surgiu devido à

necessidade de um espaço de comercialização de seus produtos sem agrotóxicos, diretamente

ao consumidor. A APAV, atualmente, mantém um mercado na cidade de Verê, atendendo

diretamente um grande número de consumidores conscientes, os quais têm um bom

relacionamento com os produtores, pondo em prática a essência da agroecologia, que envolve

a sociedade preocupada com a segurança alimentar e a sustentabilidade ambiental.

Segundo Fritz (2008), com a assessoria do CAPA no município de Verê e com a

APAV como um espaço de comercialização(foto 4), além do apoio de outras entidades, a

produção agroecológica do município fortaleceu-se, principalmente a hortifruti, que passou a

ter destaque. Hoje, os principais produtos comercializados são hortaliças, frutas, grãos, doces,

conservas, embutidos e derivados de leite; estes possuem certificação participativa, fornecida

pela Rede Ecovida, por intermédio do CAPA.

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Foto 4 – Mercado da APAV- na cidade de Verê

Fonte: Arquivo CAPA, 2008.

Segundo Luchman (2008), a APAV, montou um sistema de comercialização em

supermercados de Verê e municípios vizinhos (Dois Vizinhos e Francisco Beltrão), com

bancas próprias onde expõe seus produtos cujos preços definidos pela própria associação. O

supermercado apenas pratica a sua margem de lucro, o que é um avanço dentro desse tipo de

estabelecimentos, pois, muitas vezes, os produtores isolados são tratados de forma bruta e

desumana. Outro fator importante é a participação em feiras da região e a montagem de

sacolas as quais são entregues a domicílio. Outro canal de comercialização é o envio de

hortaliças para a Feira Orgânica de Curitiba. Além da participação no Programa de Aquisição

de Alimentos (PAA)6, fornecendo alimentos saudáveis para várias entidades, a associação

possui uma cozinha (foto 5) no parque industrial do município, onde os produtos não

comercializados in natura, no mercado da APAV, são transformados em geleias e conservas,

e vendidos na própria associação.

6 Segundo o MDA (2010), o PAA foi criado em 2003, é uma das ações do fome Zero e tem como objetivo

garantir o acesso a alimentos em quantidade e regularidade necessárias às populações em situação de

insegurança alimentar e nutricional . visa também contribuir para a formação de estoques estratégicos e permitir

aos agricultores familiares que armazenem seus produtos para que sejam comercializados a preços mais justos,

além de promover a inclusão social no campo.

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Foto 5 – Mulheres sócias da APAV Produzindo geleia de uva

Fonte: Arquivo pessoal, 2010.

Atualmente, a associação conta com aproximadamente 70 sócios, dos quais, apenas 25

entregam produtos agroecológicos com regularidade; e os demais são sócios interessados em

manter o mercado, pagando uma taxa no valor de uma saca de milho por ano; além disso, das

famílias associadas, 30 produzem de forma agroecológica; a maioria delas, além de produzir

hortaliças e frutas, têm como principal produto a uva agroecológica, com a qual fabricam

vinho, vinagre, sucos e geleias, comercializados na APAV, com a venda direta ao consumidor

e para a fábrica de sucos Viry da APROVIVE.

O intercâmbio entre produtores de associações regionais, estaduais e interestaduais,

que há muito vem sendo estimulado nos grandes encontros da agroecologia, finalmente

começa a ser praticado. É uma operação que ajuda a escoar a produção e proporciona maior

variabilidade na oferta ao consumidor. Assim, as constantes experiências e tentativas de ajuste

são necessárias para buscar o equilíbrio entre redução de custos de operacionalização sem

perder o vínculo entre produtor e consumidor.

Quando observamos a APAV, percebemos que, além do respeito ao consumidor, há

valorização cultural e ambiental, facilitando o contato direto com os produtos e também com

os produtores. Isso permite estabelecer uma relação afetiva entre os envolvidos; pois os

interesses dos consumidores e dos produtores são atendidos através da garantia do consumo

de alimentos saudáveis.

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4.5 – APROVIVE: ASSOCIAÇÃO DOS PRODUTORES VITIVINICULTORES DE VERÊ

Em 2000, a empresa Sucoeste surgiu, em Verê, com o projeto de implantação de

parreirais em algumas propriedades do município, comprometendo-se com a compra da uva e

transformação desta em suco, mas, pouco tempo depois, a empresa faliu e os produtores

ficaram sem apoio e sem ter para quem vender a produção. Como os investimentos nos

parreirais já haviam sido realizados, os vitivinicultores foram forçados a construir uma

alternativa e, com o apoio do CAPA e da APAV, instituiram outra associação. Assim, em

2002, surge a APROVIVE com o objetivo de utilizar a uva produzida.

Dois anos mais tarde, tendo como parceira a Prefeitura Municipal, foi construído o

barracão e instalada a fábrica de Sucos Viry (foto 6), para a qual é destinada a maior parte da

produção de uva do município, cerca de 80%, transformada em suco de uva orgânico. O

restante é comercializado in loco, na venda direta ao consumidor e na APAV, e/ou produzem

derivados como geleia, vinho e vinagre para consumo próprio e para comercialização.

Foto 6 – Produção de suco dentro da fábrica de sucos Viry

Fonte: Arquivo pessoal,GAIOVICZ E.F. 2010.

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Inicialmente, em 2002, havia 25 famílias associadas dos municípios de Verê, Itapejara

d‘Oeste e São Jorge d‘Oeste; atualmente, a associação conta com 17 famílias, destas, apenas

11 estão produzindo, 7 de Verê e 4 de Itapejara d‘Oeste, fornecendo uva orgânica à fábrica.

Em 2010, 6 famílias estavam em processo de conversão.

Durante o funcionamento (janeiro/fevereiro de 2010), a fábrica contava com

aproximadamente 28 funcionários, distribuídos em três turnos, entre 05h30min da manhã e

14h00min e entre 14h00min e 23h00min. Os funcionários eram divididos nas atividades de

produção e transporte, recebendo R$40,00 por dia. Havia também alguns associados da

APAV e do CAPA, atuarem na organização e administração da fábrica.

Na APROVIVE, o produtor é responsável pelo transporte da sua produção, pela

classificação da uva, obedecendo aos padrões de qualidade previamente indicados pela

associação, Dessa maneira, em 2010, 04 produtores desistiram de entregar a produção devido

à baixa qualidade. O pagamento da uva ao produtor é feito por Kg, R$0,90 a francesa e

R$1,30 a bordô; já o pagamento do transporte é por km percorrido. Quando chega à fábrica a

uva é armazenada em câmara fria até o processamento.

O processamento da uva é feito em várias etapas: a colheita, transformação em suco,

engarrafamento, lacre da tampa, colocação do rótulo com data de validade e número de lote e,

por fim, a comercialização, em geral a R$3,00 a garrafa, com exceção da APAV que paga

R$2,00.

As sobras da uva (casca e semente) também são utilizadas na cozinha da APAV,

acrescentando-se 1 kg de açúcar a cada quilo de casca e produzida a geleia, que é envasada e

lacrada. O mesmo ocorre com a produção da polpa para suco, a qual é colocada em saquinhos

e lacrada. Além disso, os produtos que não são comercializados na APAV também são

transformados por uma equipe especializada, mantendo o padrão e a qualidade dos produtos

transformados, os quais são conhecidos pelos consumidores e comercializados na associação,

em alguns mercados fora do município, como Curitiba, e para a merenda escolar.

Na última safra, 2009/2010, Décio, técnico agrícola do CAPA, que auxilia na

organização da produção na fábrica, informou que a previsão de produção era de 50 toneladas

de uva, o que originaria 70 mil garrafas de sucos com 500 ml, mas a grande quantidade de

chuvas atrasou o amadurecimento e a incidência de abelhas ocasionou perda de mais de 60%

da produção. No entanto, a previsão para a safra 2010/2011 é muito boa, pois os parreirais

estão bem carregados e em condições climáticas favoráveis.

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Apesar de o suco ter mercado garantido, a principal dificuldade enfrentada pela

associação é a falta de colaboração por parte dos produtores, além da falta de matéria-prima

em algumas safras. O que percebemos é que essas dificuldades podem ser superada; como

garante Décio (2010), a fábrica está bem equipada e instalada e, a partir do ano de 2011,

começarão a comprar uva de outros produtores, que serão apenas fornecedores e não-sócios,

desde que garantam que a produção seja agroecológica, o que é necessário para manter o

padrão de qualidade.

4.6 – CRESOL: COOPERATIVA DE CRÉDITO RURAL E INTERAÇÃO SOLIDÁRIA

Segundo Schröder (2005), as fontes externas de recursos financeiros provindos das

cooperativas de crédito contribuem de forma decisiva no padrão de desenvolvimento rural,

definindo as condições de manutenção do agricultor familiar em seu espaço de vida. Dessa

maneira, o Sistema CRESOL é fruto da luta dos agricultores familiares por acesso ao crédito

e, por uma vida digna e sustentável no campo.

Conforme a CRESOL (2010), as cooperativas nasceram das experiências do Fundo de

Crédito Rotativo (FCR). Esse fundo, financiado pela cooperação internacional

(MISEREOR7), foi criado na década de 1980 e início dos anos 1990, no Sudoeste do Paraná,

por um conselho de entidades populares da região. Na mesma época, na região Centro-Oeste

do Paraná, pequenos investimentos também eram financiados para grupos de agricultores

familiares.

Dessas experiências com o crédito rotativo e com o propósito de difundir a utilização

do crédito, surgem, em 1996, as primeiras Cooperativas CRESOL, sendo três no Sudoeste

(Dois Vizinhos, Marmeleiro e Capanema) e duas no Centro-Oeste (Pinhão e Laranjeiras do

Sul) do estado do Paraná.

Segundo a CRESOL (2010), neste ano, a cooperativa possuía 78 filiais espalhadas

pelos estados do Paraná e Santa Catarina, contando com 80.281 cooperados. Na tabela 03,

observamos a evolução da cooperativa desde 1996, ano de sua fundação, até 2010.

7 MISEREOR foi fundada em 1958 como organização contra "a fome e a doença no mundo". Na sua função de

agência de desenvolvimento da Igreja Católica da Alemanha MISEREOR oferece uma cooperação em espírito

de parceria a todos os homens de boa vontade para combater a pobreza a nível mundial, abolir estruturas de

injustiça, promover a solidariedade com os pobres e perseguidos e contribuir para a construção de "UM

MUNDO".

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Tabela 3 – Evoluções da Cooperativa CRESOL

Anos de análise Números de cooperativas Números de cooperados

1996 5 1.639

1999 28 11.316

2002 71 29.990

2005 59 34.340

2008 75 62.474

2009 76 76.375

2010 78 80.281

Fonte: Central Cresol Baser, 2010.

Conforme percebemos na tabela 03, o número de cooperativas aumentou 15 vezes e,

aproximadamente, 49 vezes o número de cooperados registrados nos 13 anos de

funcionamento. A partir disso, podemos averiguar a importância da agricultura familiar na

região Sul do Brasil que, até 1996, estava excluída do sistema financeiro tradicional.

Segundo a CRESOL (2010), as modalidades de crédito com recursos próprios da

cooperativa buscam atender as demandas do quadro social, tanto na implantação e

desenvolvimento de atividades financiadas ou não com recursos oficiais. Entre as

modalidades de crédito com recursos próprios da CRESOL estão: a)Crédito investimento;

b)Crédito Custeio Agropecuário; c)Crédito pessoal; d)Créditos sociais ou conveniados. Em

cada modalidade de crédito, existem linhas específicas de financiamentos, como:

- Investimento na produção orgânica ou agroecológica:

(...) modalidade de crédito criada para estimular investimentos (mais de um

ciclo produtivo) em atividades de produção que visam progressivamente à

consolidação ou à (re)conversão de sistemas produtivos convencionais para

base tecnológica agroecológica, visando dar maior sustentabilidade às

unidades produtivas familiares

(CRESOL, 2010, disponível em http://www.cresol.com.br/site/, acesso em

20 de novembro de 2010).

- Custeio na produção orgânica e agroecológica:

...criado para estimular a produção agroecológica, através de financiamentos

em condições diferenciadas. Ao disponibilizar créditos para custeio de

atividades agropecuárias visa-se à progressiva consolidação ou a

(re)conversão de sistemas produtivos convencionais para base tecnológica

agroecológica, visando dar maior sustentabilidade às unidades produtivas

familiares. (...) Podem ser financiados produtos e serviços necessários ao

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custeio da produção animal e/ou vegetal, de acordo com proposta técnica

simplificada apresentada junto a cooperativa, observando critérios de

produção orgânica/agroecológica (CRESOL, 2010, disponível em

http://www.cresol.com.br/site/, acesso em 20 de novembro de 2010).

No entanto, segundo a CRESOL (2010), para um agricultor familiar ter acesso a essas

linhas de crédito, é necessário que possua algum tipo de certificação de produção orgânica ou

agroecológica, ou então, que participe de algum programa (governamental ou não) de

produção orgânica ou agroecológica.

De acordo com a entrevista realizada com o gerente da CRESOL de Verê (2010),

primeiramente, para que um agricultor possa ter acesso aos financiamentos da CRESOL, ele

necessita ser agricultor familiar comprovadamente, através de uma DAP (Declaração de

Aptidão ao PRONAF) que é fornecida pelo STR ou pela EMATER e, a partir disso, tornar-se

um cooperado e requerer financiamento.

Na cooperativa de Verê, os agricultores são todos conhecidos, assim como suas

propriedades, dessa maneira, quando o crédito requerido provém de recurso próprio da

CRESOL, o agricultor não necessariamente precisa ter certificação. No entanto, quando o

crédito é de recursos oficiais, é exigido certificação, que pode ser o selo da Rede Ecovida,

mas são necessários outros requisitos como: área para comprovar onde será investido; atender

as especificações da linha de crédito; possuir capacidade de endividamento.

De acordo com os agricultores entrevistados do município de Verê, o acesso ao crédito

não é facilitado como afirma o gerente; pelo contrário, por utilizarem insumos naturais na

produção agroecológica, não obtêm nota fiscal de gastos com produtos, assim, o crédito não é

liberado, buscando outras formas de financiamentos, principalmente aqueles que são

parcialmente agroecológicos, utilizando-se da produção convencional para adquirirem

financiamentos, porquanto, pagam juros mais altos para investimento agrícola e pecuário e/ou

custeio agrícola e pecuário.

Ao analisar a função da CRESOL em relação à produção agroecológica, verificamos

que há uma contradição entre o que é proposto pela cooperativa e o que realmente ocorre com

os agricultores. O fato é que, os agricultores têm acesso ao crédito, mas não à linha voltada

para produção orgânica/agroecológica, e sim, ao PRONAF, que todo agricultor familiar tem

direito desde que comprove os requisitos anteriormente descritos. Por esse motivo, a

cooperativa é citada como entidade parceira pela maioria dos agricultores agroecológicos

estudados, embora façam críticas

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4.7 CONSIDERAÇÕES SOBRE AS ENTIDADES LOCAIS DA AGROECOLOGIA NO

MUNICÍPIO DE VERÊ

Com a ação das entidades parceiras da agroecologia citadas, podemos concluir que o

que ocorre com elas é o que Dematteis (2008) chamou de territorialidade ativa, ou seja, há

relações derivadas de ações dos sujeitos locais, o que objetiva a construção de estratégias de

inclusão, na qual a territorialidade corresponde às mediações simbólicas, cognitivas e práticas

entre a materialidade dos lugares e o agir social nos processos de transformação/adaptação

territorial que se inscrevem no quadro da produção, da troca e do consumo. A partir disso, as

relações estabelecidas ocorrem dentro de um campo de poder, neste caso, no município de

Verê, entre a CRESOL, a EMATER, o CAPA, a APROVIVE, a APAV e a Prefeitura

Municipal, criando condições favoráveis à expansão da agroecologia no município.

Segundo Dematteis (2008), a territorialidade ativa é utilizada na construção de

sistemas territoriais cooperativos, que se configuram como atores do desenvolvimento

territorial local. Este sistema permite analisar a rede local de sujeitos que corresponde às

interações entre os indivíduos em um território local, bem dispostos em Verê pelas relações

entre os agricultores, a APAV e a APROVIVE, que servem de mediadores para a

comercialização de seus produtos, além de construírem atores coletivos que influenciam

tendências na produção.

A metodologia proposta por Dematteis (2008) permite analisar o milieu local, ou seja,

o conjunto de condições locais em que os agricultores agroecológicos trabalham individuais,

coletiva e historicamente, interagindo com a rede local e com o ecossistema. Tudo isso

comporta, ainda, que os agricultores estabeleçam relações extralocais, sejam estas realizadas

individualmente, como acontece em Verê, com Iraci Zanin que comercializa vinhos, geleias e

compotas de fabricação caseira em supermercados de Curitiba e Porto Alegre; ou,

coletivamente, como fazem a APAV e a APROVIVE, que comercializam os produtos dos

agricultores agroecológicos na Feira da Agricultura Familiar de Curitiba e nos supermercados

de municípios vizinhos como Francisco Beltrão e Dois Vizinhos, agindo, assim, como

mediadores de comercialização, o que é valorizado pelos agricultores como algo positivo,

pois mesmo que estabeleçam relações de poder, fortalecem a sua organização política.

Nas relações de poder são instituídas hierarquias, nas quais as malhas, nós e redes

estão presentes. A malha, segundo Raffestin (1993), demarca e expressa limites de poder. No

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caso de Verê, os agricultores e as entidades são os nós locais de poder; a ligação

visível/invisível entre eles dá origem às redes que podem ser locais e extralocais; a junção dos

nós e redes origina a malha: isso pode ser exemplificado ao analisarmos o papel do CAPA,

entidade que possui ligação com os agricultores bem como com a APAV e APROVIVE, mas,

ao mesmo tempo, atende outros agricultores de outros municípios, como podemos observar

no item 4.1.3 deste capítulo. A formação de malhas, nós e redes que ocorre em Verê, dá

origem a um campo de relações de poder, no qual, através da agroecologia, criam-se

condições para o desenvolvimento territorial/local.

Compreendemos o desenvolvimento territorial no município, a partir da agroecologia,

por meio de alguns elementos e processos expostos por Saquet e Spósito (2008), tais como: a)

a articulação de classes e construção de redes locais e extralocais, como ocorre com os

agricultores agroecológicos, através da produção e venda de sua mercadoria, efetivada nas

ações da APAV dentro e fora do município; b) o caráter (i)material, relacionado com

elementos sociais (C-E-P-A)8, o que acontece através do respeito ao saber popular e do

manejo do solo de maneira adequada para não degradar o ambiente; c) a produção de

mercadorias (alimentos saudáveis) e a preservação da natureza com o uso de técnicas de

conservação do solo sem insumos químicos; d) a valorização de pequenas e médias iniciativas

produtivas, pois todos que produzem agroecologicamente tem seu lugar garantido no mercado

consumidor e na APAV; e) valorização das identidades de cada agricultor familiar; f) a

consideração do patrimônio de cada local; g) a organização política dos agricultores

agroecológicos através da APAV e da APROVIVE, com auxílio do CAPA, buscando sempre

autonomia; h) a diminuição das injustiças e desigualdades sociais, tornada possível através da

agroecologia, pois além de proporcionar a inclusão social também permite o desenvolvimento

territorial/local.

A partir da análise das entidades parceiras da agroecologia, em Verê, e de suas ações

para com os agricultores agroecológicos, percebemos a importância e a preocupação dessas

entidades com o fortalecimento da agroecologia, pois, além de proporcionar a produção de

alimentos saudáveis, preserva a natureza com uso de técnicas alternativas de produção e,

como veremos no próximo capítulo, isso permite ao agricultor familiar, autonomia, qualidade

de vida e inclusão social.

8 Culturais, Econômicos, Políticos e Ambientais

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101

CAPÍTULO V – AGROECOLOGIA: UMA ALTERNATIVA DE

DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL LOCAL

Os agricultores familiares são os membros mais importantes na luta pela efetivação da

produção agroecológica como processo alternativo e rentável não só econômica, mas também

ambiental e culturalmente. Para entendermos melhor esse processo em pequenas

propriedades, descreveremos a seguir os produtores que fazem da produção agroecológica

uma forma de subsistência e fonte de renda, os que apresentam uma propriedade integrada à

Sadia, demonstrando sua organização, e também a insatisfação do avicultor integrado.

Compreendemos a produção agroecológica envolvendo a produção diversificada de

alimentos, a preservação e conservação do ambiente e o cuidado com a saúde da família do

agricultor e dos consumidores em geral, garantindo autonomia e inclusão social do produtor

agroecológico.

Em Verê/PR, há 19 agricultores que produzem agroecologicamente; porém, alguns

destes possuem renda de outras atividades, tais como arrendamento de terras para terceiros,

cultivo de produtos convencionais, e, ainda, venda de seu trabalho na cidade como

trabalhador assalariado. Para compreender melhor esta análise, dividimos os produtores em

parcialmente agroecológicos e agroecológicos, pois entre os 19, 12 são parcialmente

agroecológicos, associando a produção orgânica ao cultivo convencional na mesma

propriedade, porém em terras diferentes, seja como agricultor ou como arrendador. Os outros

7 têm a propriedade totalmente agroecológica.

A integração é consequência do processo de expansão do capital; é a ação do capital

sobre a agricultura em seu movimento de concentração, causando impactos sociais, regionais,

econômicos e ambientais. O número de aviários integrados à Sadia, no município, é

considerável; são 78, mas isso não quer dizer que há 78 propriedades integradas, pois, em

algumas delas, há mais de um aviário. No próximo item deste capítulo, descrevemos a

organização de uma propriedade integrada que possui dois aviários, registrando a insatisfação

do proprietário, o qual garante que “se fosse hoje, eu não investiria em produção avícola

integrada...”.

O município de Verê é pequeno se comparado a outros municípios como Francisco

Beltrão e Dois Vizinhos, pois possui uma área de 312Km². O fato que nos chama a atenção é

que, em 10 das 36 comunidades, os agricultores agroecológicos estão presentes. Em uma

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delas, com maior destaque, na comunidade de Vila Colonial formando um núcleo de 6

produtores agroecológicos, entre os 19, destes, 4 são parcialmente - Décio Cagnini, Francisco

Carniel, Irinaldo Calgarotto, e Associação Santo Antônio - e 2 são totalmente agroecológicos,

Darci Cassol e Baldoino Berns.

É importante comentar que, em duas comunidades, - Boa Esperança e Águas do Verê -

os agricultores agroecológicos encontrados pertencem à mesma família como Dirceu, Nelson

e Alcides Moreschi, de Boa Esperança, que aprenderam a cultivar agorecológicos em cursos

oferecidos pelo CAPA; já Armindo Lang e seu genro Valmir Jahn, de Águas do Verê,

afirmam que aprenderam a cultivar com base na ―Tradição Familiar‖ e, dessa maneira,

buscam passar adiante para seus filhos e netos.

Os outros produtores, conforme observamos no Mapa 6, estão distribuídos por outras

comunidades como: Janete e Lídia Ferreira que, apesar de possuírem os mesmos sobrenomes,

não possuem grau de parentesco e residem na comunidade de Vila Rural São Luiz; a

propriedade de Valdemar Betiollo encontra-se em Colônia Nova; Aldair Alberton – Planalto;

Aldoino Colpani – Sede Progresso; Iraci Zanin – Plano Azul/Vista Alegre; Miguel Thomé –

Barra do Marrecas e Rudi Castagna, na comunidade de Linha Belé. Mostramos também no

mapa, o tipo de produto que cada agricultor cultiva e, a partir disso, verificamos que o produto

com maior destaque é a uva, encontrada em 15 dos 19 produtores, além das hortaliças

cultivadas em 14 propriedades.

Verificamos a territorialização da produção agroecológica em Verê; nele há nós

distribuídos de Norte a Sul e de Leste a Oeste, formando entre eles redes de ligação, que se

dão pelas trocas de experiências, de mudas, de sementes ou, até mesmo, por eles próprios;

através disso, forma-se a malha da produção agroecológica, um conjunto de relações

econômicas, políticas, sociais e ambientais uma vez que, segundo Raffestin (1993), são

produzidas tridimensionalmente (sociedade-espaço-tempo).

Além disso, todos os produtores agroecológicos fazem parte de um mesmo território,

da agroecologia, mas cada um possui sua identidade, expressa individualmente quando cada

produtor adapta-se ao seu contexto social ou coletivamente, construída por meio da APAV,

com relações econômicas, mas também de reconhecimento, afetividade e confiança.

Ademais, a agroecologia, além de ser uma forma de identificação do agricultor, serve

também, como alternativa de produção, viabilizando a pequena propriedade, produzindo

alimentos saudáveis, protegendo o ambiente ensejando parcerias entre pessoas do mesmo

território, ou não, estabelecendo novas relações de troca.

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Pitangueiras

Bananal

Pres. Kennedy

Linha Pastro

Alto Alegre

Vila Colonial

União da Barra

Barra

Barra do Marrécas

Piloneto

Barra

CurvaFlor da Serra

Plano Azul

Vista Alegre

Sede

Boa Vista

São Luiz

Boa

Maracajá

Alto Lajeado

Lambedor

Serra do

Alto

Nova

N.Sª Salete

L. Brasilia

Planalto

ColôniaBarra Verde

Linha Bellé

Verezinho

Progresso

Esperança

Linha

FONTE: MAPA VIÁRIO MUNICIPAL/2005Adaptação: SOUZA,P. Geterr 2010

VERÊ - PARANÁ

PRODUTORES AGROECOLÓGICOS

01 - Alcides Moreschi

02 - Aldair Alberton

03 - Adoino Colpani

04 - Armindo Lang05 - Ass. Santo Antonio

06 - Baldoino Berns

07 - Darci Cassol

08 - Décio Cagnini

09 - Dirceu Moreschi

10 - Francisco Carniel

11 - Iraci Zanin

12 - Irinaldo Calgarotto

13 - Janete F. Da Silva

14 - Lídia Ferreira

15 - Miguel Thomé

16- Nelson Moreschi

17 - Rudi Castagna

18 - Valdemar Bettiolo

19 - Valmir Jang

Comunidades/Localidades

Perímetro Urbano

Rodovias Estaduais/Asfalto

Hortaliças

Frutas

PRODUTORES

Grãos

PRODUÇÃO

Animal e derivadosEstradas Municipais

Limite do municipio

Doces/Conservas

Legenda

VERÊ

0 4,51,5 3,0 6 km

L. Farroupilha

Alto Verê

N. Sª.Saúde

dos crentes

Grande

União

Lambedor

Nova

Lambedor

do Santana

do Cerne

Escala aproximada

Localização

Sudoeste do Paraná Francisco Beltrão

VerêFonte: SUDERHSA/IBGE

Org: SOUZA, P. Geterr 2010Mapa de localização sem escala

Núcleo de produtores

da Vila Colonial

MAPA 6 – Localização das propriedades agroecológicas de Verê

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Para conhecermos a organização das propriedades estudadas, elaboramos cinco

croquis, um de uma integrada, dois das parcialmente agroecológicas e dois das totalmente

agroecológicas. Eles permitem analisar aspectos da paisagem de cada propriedade. Convém

esclarecer que a paisagem é compreendida como o resultado de elementos biológicos e

antrópicos, que imprimem suas características produzindo, reproduzindo e continuamente

transformando a paisagem. Ressaltamos que, em algumas propriedades, as ações humanas são

mais visíveis, enquanto em outras a natureza tem o papel central e fundamental. Iniciamos

nossa discussão com a integração contratual realizada pela Sadia.

5.1 – PROPRIEDADE INTEGRADA À SADIA – DOIS VIZINHOS

A propriedade estudada integrada à Sadia localiza-se na comunidade de Planalto,

município de Verê; nela trabalha um casal contratado e, em alguns finais de semana, o

proprietário. Com 4,42 hectares, apenas a produção de frangos é para comercialização, as

ovelhas, hortaliças e frutas são para consumo da família.

Foto 7 – Propriedade Integrada à Sadia – Dois Vizinhos

Fonte: Arquivo pessoal, GAIOVICZ, E. F. Agosto de 2010.

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A base dos dados a seguir é referenciada por uma entrevista realizada com um

avicultor integrado (2010). Atualmente, para construir um aviário nos padrões 24x100,

exigidos pela Sadia, são necessários aproximadamente R$500.000; destes, R$80.000 são para

terraplenagem e terreno, e R$420.000 para implantação, construção e automatização

(equipamentos) do aviário, um investimento alto para quem sobrevive somente disso. E é este

fator que, na maioria das vezes, impede os avicultores de ―abandonarem‖ este tipo de

produção.

Em um aviário de 12x100, é possível uma produção de 18.000 aves por lote.

Dependendo da qualidade do frango (avaliada pela integradora) recebem de 0,52 a 0,56

centavos por cabeça, aproximadamente R$19.500 por lote. É um valor considerável, se não

contar com os descontos (ração, frangos de um dia, assistência técnica, medicamentos,

carregamento...) e com os custos de produção (maravalha, lenha, luz, manutenção, mão-de-

obra), que variam de 70% a 85% do total, originando um ganho de 30% a 15% quando o lote

é considerado bom, gera em torno de 25% ou R$4.875 que, durante 7 anos, foram todos

investidos na propriedade.

As atividades realizadas, durante o desenvolvimento de um lote de frangos, são

cansativas e desgastantes; nos primeiros cinco dias, são necessários atenção e cuidados

especiais, inclusive à noite, observando o acesso à água, comida e o controle da temperatura,

que são os mais importantes; é a fase de adaptação da ave de um dia, após esses dias, os

espaços de tempo de averiguação e cuidados ficam mais extensos. É preciso tomar cuidado

para não faltar água nem ração e para não criar casca na cama de aviário, para garantir

qualidade da produção. A assistência técnica é exigente e acompanha a produção desde a ave

de um dia até sua saída para o abate, são aproximadamente 6 visitas por lote.

No final do lote, a Sadia permite que o avicultor acompanhe a produção até a balança,

com carro próprio, no entanto, dentro da empresa nada é permitido, nem mesmo a entrada, por

isso, o avicultor não acompanha a avaliação da sua produção, e, na maioria das vezes, não

sabe de onde vêm tantos descontos, e se conhece alguns problemas ― calo de patas, baixo

peso, ― não tem certeza de que isso ocorreu, pois não é permitido o acompanhamento da

avaliação.

Dentre as exigências da empresa integradora, estão metas de produção,

manejo adequado e sanidade. Eu nunca deixei de cumpri-las, mas soube

através de alguns avicultores, que se o integrado não atingir a média (peso e

qualidade), pode receber gancho de até 60 dias, ou seja, ele fica sem

produzir e conseqüentemente sem receber. Se fosse hoje, eu não investiria na

produção avícola integrada, mas sim, em outros ramos, mas como na época,

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2003, eu já trabalhava com a comercialização de equipamentos avícolas,

facilitou. (Entrevista do avicultor integrado, realizada por GAIOVICZ, E.F.,

2010).

Entre os pontos positivos e negativos, os últimos são mais consideráveis, pois os

resultados sempre surpreendem; a comercialização da cama não é garantida, ficando

depositada na propriedade ocupando os pequenos espaços que restam; os investimentos,

muito altos e constantes devido à rigidez das exigências da integradora e há um cálculo de

renda média, utilizando a renda de outros avicultores através de conversões ilusórias,

dificultando o cálculo preciso por parte dos avicultores. Apesar de poucos, os aspectos

positivos são investimentos a longo prazo e experiência de uma forma diferente de produção.

Na propriedade (figura 3), há dois aviários de 100x12, construídos no ano de 1990; na

época, com pouca automatização, os bebedouros e comedouros eram limpos e preenchidos

manualmente assim como o controle da temperatura; eram necessárias duas pessoas para dar

conta de um aviário.

Desde 2003, quando o avicultor adquiriu a propriedade, até 2010, todo o ganho e ainda

alguns financiamentos realizados nos bancos Itaú e Bradesco foram investidos na

propriedade, aproximadamente R$90.000 por aviário. Além de não utilizar os ganhos da

produção em outros investimentos, o avicultor ainda pagou 8,75% ao ano de juros ao banco

Itaú, por um financiamento de 5 anos, e 6,75% ao Bradesco por um financiamento de 8 anos.

Por esse motivo, paralelamente à produção avícola integrada, mantém outra atividade, o

comércio de equipamentos para produção avícola, para ordenha mecânica e para proteção de

fontes.

De acordo com o avicultor, é desanimador trabalhar com uma empresa integradora

como a Sadia, pois há um descaso com os avicultores, principalmente na parte de logística da

empresa, a qual controla a distribuição de insumos nas propriedades, pois ―a empresa deixou

a minha propriedade quatro lotes sem ração”. Apesar desses contratempos, afirma que a

Sadia é uma empresa séria, que não engana os avicultores no peso da produção, mas as

técnicas utilizadas para contabilizar os ganhos, empregando a média de alguns avicultores,

desvaloriza o trabalho e a produção de outros, diminuindo a renda, dificultando a permanência

como avicultor integrado.

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Figura 3 – Propriedade Integrada à Sadia

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A técnica de produção integrada organiza a paisagem da propriedade de forma

simplificada, como podemos observar na figura 3. Não existe diversificação de cultivos, toda

a propriedade é organizada a partir do centro, que são os aviários, separando-os das demais

dependências através de cercados. O pomar, o parreiral, a estufa, a horta e o espaço de criação

das ovelhas ficam separados, ao Sul da propriedade. As casas do proprietário e do caseiro, o

espaço de lazer localizam-se ao Norte e, a Oeste, está a produção de eucaliptos para uso na

caldeira dos aviários. Conforme o avicultor, a produção de eucaliptos em propriedades

avícolas integradas é comum, pois é a forma que o avicultor encontra para diminuir os custos

de produção por um período determinado, utilizando-as nos aviários, evitando o gasto com a

compra de lenha.

O que observamos, na figura 3, é uma paisagem humanizada, definida por Sauer

(1925) como uma área composta por uma associação distinta de formas, ao mesmo tempo

físicas e culturais, chamada de paisagem posterior à ação humana. Assim, podemos afirmar

que a paisagem da propriedade integrada é uma paisagem cultural, ou seja, humanizada, inclui

todas as modificações feitas pelo homem no espaço rural. Além da cultura, verificamos

também elementos econômicos como, por exemplo, a localização ― próxima à rodovia

principal― facilitando o transporte das mercadorias.

Observamos que o sistema de produção avícola integrada é um interesse dos agentes

do capital que buscam aumentar a produção em menor tempo, concentrando o capital nos

elementos dominantes do processo, neste caso, as agroindústrias.

Percebemos que integradora e integrado possuem interesses diferentes, pois, a

primeira, entende a integração como uma estratégia de controle dos mercados rurais e redução

da mão-de-obra; já para os integrados é uma oportunidade, garantia de produção, de preço e

de renda, facilitando seu acesso ao capital, mas, não é exatamente isso que encontramos na

prática; o que notamos é o distanciamento do avicultor integrado de sua autonomia financeira;

é a presença de mecanismos de subordinação e um deles é o contrato, no qual são

estabelecidas ―normas‖, obrigações e deveres dos avicultores; ao mesmo tempo, são

esclarecidos significativamente os interesses e direitos da integradora. Através do contrato o

integrado perde autonomia e identidade, vivendo um processo de subordinação, dominação de

sua força de trabalho e de sua propriedade, conforme descrevemos no capítulo 2.

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5.2- PRODUTORES PARCIALMENTE AGROECOLÓGICOS

Entre os produtores parcialmente agroecológicos do município de Verê estão: Aldair

Alberton, Armindo Lang, Associação Santo Antônio9, Décio Cagnini, Dirceu Moreschi,

Francisco Carniel, Iraci Zanin, Irinaldo Calgarotto, Miguel Thomé, Nelson Moreschi, Valmir

Jahn e Valdemar Betiollo. Apresentamos a seguir quatro sínteses dos dados coletados em

trabalho de campo, em 2009 e 2010, em algumas propriedades dos produtores do município.

Essas quatro propriedades foram escolhidas, devido ao seu tamanho e à relação existente entre

a produção agroecológica e a convencional.

De acordo com entrevista realizada em trabalho de campo (2009), a família Alberton

reside em Verê, na comunidade de Planalto, e na propriedade há 40 anos; atualmente,

trabalham permanentemente 5 pessoas; destas, duas são empregados e os outros pessoas da

família.

A família trabalha com a produção agroecológica desde 2000, devido a uma

intoxicação do proprietário. Aprenderam a cultivar através de cursos oferecidos pelo CAPA,

CRESOL e Prefeitura Municipal. A certificação da uva é fornecida pela Rede Ecovida, que

faz a certificação participativa, conforme o Art.3, parágrafo 1º da Lei 10.831 de 23 de

dezembro de 2003, por intermédio da indústria de sucos Viry, da APROVIVE, em Verê.

A área total da propriedade é de 39,72 hectares (figura 4), distribuídos da seguinte

forma: 24,24 de culturas temporárias como soja e milho convencionais; 4,80 são

agroecológicos, com produção de hortaliças como alface, rúcula, beterraba, cenoura, pepino,

tomate e outros; 1 de parreiral com uvas concórdia e bordô agroecológicas (foto 8); 7,26 de

pastagem permanente e, 2,42 de mata nativa.

Na área agroecológica da propriedade, o combate às pragas é feito através de insticidas

naturais, que servem como repelentes e a fertilidade do solo é mantida com uso de adubação

verde, que serve como cobertura e proteção do solo. As mudas de parreira foram compradas

em Bento Gonçalves-RS, através do CAPA, uma das entidades parceiras do produtor, que

fornece assistência técnica juntamente com o Sindicato dos Trabalhadores Rurais; além da

APROVIVE, que transforma a uva e comercializa o suco e a geleia, por fim, a CRESOL com

os financiamentos. Quando há disponibilidade, Aldair Alberton participa de feiras em outros

9 Associação formada por 6 agricultores que produzem uva na propriedade de um dos sócios, que trabalha

permanentemente na propriedade juntamente com a esposa.

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municípios como Curitiba – Feira dos Sabores; e, no Rio de Janeiro – Alfoque, onde

comercializa parte da sua produção.

Foto 8 – Parreiral da Propriedade de Aldair Alberton

Fonte: Arquivo pessoal, GAIOVICZ, E.F. Agosto de 2009.

Segundo Aldair, para incentivar os produtores a aumentarem a produção, é necessário

valorização do produto no mercado, diferenciando-o; organização por parte dos produtores de

outras associações, como a APAV, que servem para fortalecer a produção e a permanência do

agricultor como agroecológico; e, por fim, é importante a divulgação: informar ao consumidor

a importância de consumir produtos agroecológicos, mais saudáveis e sem agrotóxicos em sua

produção.

Outro fato interessante, comentado pelo nosso entrevistado, é que a agroecologia, além

de produzir alimentos saudáveis, ainda preserva o ambiente, com solos, água e ar de

qualidade. Na propriedade de Aldair, a captação de água é realizada através de um poço de 90

metros de profundidade que a família construiu, não ocorrendo problemas como falta de água

ou má qualidade desta, além da propriedade possuir SISLEG. Os lixos orgânicos produzidos

pela família são utilizados na compostagem na horta, os dejetos animais servem como adubo e

o reciclável é acumulado num galpão e levado à cidade onde os catadores o recolhem.

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Figura 4 – Propriedade de Aldair Alberton

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Na figura 1, observamos que, na área com práticas convencionais ― a maior da

propriedade ―, há monocultura, formando uma paisagem homogênea, constante quando

falamos de cultivos convencionais, diferente da área do parreiral, das hortaliças e do

mandiocal, relativamente pequena, mas com diversidade vegetal; ademais, é a área

agroecológica da propriedade. Desse modo, coexistem duas paisagens dentro de uma mesma

propriedade, a Leste, homogeneidade e simplificação da paisagem no cultivo convencional; a

Oeste, uma heterogeneidade, com a presença de elementos naturais e antrópicos associados,

através da produção agroecológica. Por isso, essa propriedade é considerada parcialmente

agroecológica, pois apenas parte dela é agroecológica.

Enquanto na área com produção convencional há produção de duas variedades de

produtos (milho e soja) ao longo do ano, em diferentes épocas, comercializadas com a

COASUL, na área de práticas agroecológicas, a diversificação é mais intensa: 5 a 10 produtos

diferentes, além da uva, da qual, 80% é entregue para a indústria de sucos Viry e, 20%

comercializados em duas partes: uma diretamente com os consumidores e a outra

transformada em vinho artesanal para consumo da família. Há também a produção de leite

agroecológico, com 25 animais (vacas holandesas) e uma produção de 10 a 12 mil litros/mês

comercializados com o Laticínio Lambedor, de Verê, embora o produto não receba valor

diferenciado.

Outro aspecto importante dessa figura é que, na área de práticas convencionais, não há

presença de mata nativa, pois esse espaço é todo ―aproveitado‖ para a produção; já na porção

Oeste da propriedade, há mata nativa, utilizada como área de pastagem para o gado leiteiro,

além da mata ciliar que protege o rio que passa pela propriedade. Ademais, a área de

produção convencional, além de diminuir a diversidade, agrega elementos que eliminam o

trabalho e facilitam o acesso das máquinas e insumos necessários ao cultivo.

Entre as vantagens em produzir agroecologicamente, Aldair aponta: a) menos contato

com agrotóxicos; b) menores custos de produção; c) facilidade de financiamentos através da

CRESOL com menores juros. Em relação às desvantagens, ele relaciona: a) falta de mão-de-

obra; b) dificuldade na conversão do solo.

A paisagem encontrada nessa propriedade é aquela compreendida, neste trabalho,

como uma relação entre elementos físicos, biológicos e antrópicos, que dão formas

diferenciadas à paisagem. É, ao mesmo tempo, natural e cultural; é o que Berque (2004)

chama de grafia e matriz, grafia efetivada pela ação humana impressa na paisagem e matriz,

pois a natureza é quem possibilita condições para a concretização das ações humanas.

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Outra propriedade similar à da família Alberton é a de Miguel Thomé, proveniente do

Rio Grande do Sul e residente em Verê há 45 anos. A gestão da propriedade é familiar,

alitrabalham duas pessoas da família, além de 5 ou 6 empregados temporários, no período da

colheita da uva. A área total da propriedade é de 14,7 ha: 7 ha para culturas temporárias

convencionais (milho, soja, feijão); 1 ha para culturas permanentes, parreiral, (foto 9); 3 ha de

pastagem permanente; 3 ha de mata nativa e 500 pés de silvicultura e reflorestamento, o

restante são para benfeitorias em geral.

Foto 9 – Parreiral na propriedade de Miguel Thomé Fonte: Arquivo pessoal, GAIOVICZ, E. F./Agosto de 2009

O que torna essa propriedade similar à de Aldair Alberton é o fato de possuir uma área

destinada à produção agroecológica de uvas, hortaliças e tubérculos em geral, divididas por

uma barreira verde, e também outra área designada à produção convencional de alimentos, a

mesma condição visualizada na figura 4 da propriedade anterior, mas numa proporção menor,

pois a propriedade da família Thomé é menor que a da família Alberton.

Miguel Thomé trabalha com a agroecologia há 5 anos, graças às atividades realizadas

pelo CAPA, aprendendo através de cursos, reuniões e intercâmbios com produtores do Rio

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Grande do Sul. Inicialmente, essa uva era transformada em suco pela empresa catarinense

Sucoeste; quando essa empresa deixou de comprar a uva em Verê, os produtores tiveram que

construir uma alternativa, então, juntos com a prefeitura de Verê e o CAPA escreveram um

projeto solicitando financiamento para fazer uma construção/edificação e para comprar

equipamentos de uma fábrica de sucos ― APROVIVE.

A família optou pela agroecologia com a intenção de produzir uva saudável para eles e

para os filhos, num contexto de produção dominado por agrotóxicos. As mudas são

compradas em Santa Catarina. Como a uva é um produto de pouca durabilidade, a

comercialização precisa de cuidados especiais. A família utiliza boa parte para

comercialização in loco, em feiras e, outra parte para transformação em suco através da

Associação APROVIVE; e o restante da uva (Concórdia e Bordô) (foto 10), 12.000 kg na

última safra, transformada em vinho para consumo da família e para comercialização na

APAV.

Foto 10 – Produção de vinhos e geleias da família Thomé

Fonte: Arquivo pessoal, GAIOVICZ, E. F./Agosto de 2009.

Além do parreiral, a família possui uma produção agroecológica considerável para

subsistência e vende apenas os excedentes: feijão (2 ou 3 sacas por ano), mandioca, hortaliças,

leite, suínos e frutas, as três primeiras produzidas embaixo do parreiral nas entressafras e

comercializadas na APAV, o restante é para consumo da família. As principais vantagens

destacadas pelo agricultor consistem no valor diferenciado recebido pelo produto, superior ao

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convencional; baixo custo de produção; venda fácil e garantida. Como desvantagem,

evidenciou a falta de assistência técnica contínua.

A propriedade de Décio Cagnini é diferente das anteriores, pois, além de produtor

agroecológico, é técnico agrícola especializado nessa produção e trabalha no CAPA. Assim,

sua unidade produtiva está muito bem organizada e serve de referência no município e região.

O que a define como parcialmente agroecológica é o fato de haver, na propriedade, plantação

de eucaliptos, não considerada produção alternativa sustentável, pois, além de degradar o

solo, consome grande quantidade de água, eliminando nascentes, portanto contrariando os

objetivos da agroecologia.

A família Cagnini é originária do Rio Grande do Sul e mora no município desde 1951.

Como ele se ocupa das atividades do CAPA, em algumas épocas, contratam um casal como

empregados temporários, ou diaristas, para auxiliarem nas tarefas de sua propriedade. A

gestão da propriedade é familiar, com área total de 13,6ha (figura 5); nos 3 ha que eram

cultivados convencionalmente, agora há eucaliptos; 1 ha de pastagens permanentes, 20% da

área total da propriedade é de mata nativa e o restante dedicado à fruticultura [uvas (niágra,

bordô e francesa), maçã, pêra, pêssego e laranja], erva-mate (5.000 pés) e hortaliças em

estufas (foto 11) (alface, tomate, vagem, pepino, cenoura, beterraba, brócolis...), além da

produção própria de mudas em estufa (foto 12). A produção é certificada pela Rede Ecovida.

Foto 11 – Estufa de alface

Fonte: Arquivo pessoal, GAIOVICZ, E.F./Maio de 2010.

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Foto 12 – Produção de mudas na propriedade do Décio Cagnini

Fonte: Arquivo pessoal, GAIOVICZ, E.F./Maio de 2010.

Décio trabalha agroecologicamente há 10 anos. Fez essa escolha para cuidar das

crianças, pois sua filha havia-se intoxicado com ―o veneno dos tomates‖. Foram os primeiros,

em Verê, a optar pela agroecologia, graças ao trabalho no CAPA. “Foi um desafio naquela

época”, comenta Décio. ―Como funcionário do CAPA, tive que dar o bom exemplo e o

experimento deu certo‖. Para comercialização, vende uma parcela da produção in loco,

participa de feiras a cada 15 dias (Foz do Iguaçu e Curitiba), entrega as hortaliças na APAV e

a uva na fábrica de sucos Viry da APROVIVE.

A propriedade de Décio Cagnini é bem diversificada, com cultivo variado de produtos;

isso se deve aos métodos utilizados pelo técnico; como fertilizante e protetor do solo, utiliza

cobertura verde (foto 13); como inseticidas, usa repelentes e predadores naturais mantendo o

equilíbrio ecológico e preservando as espécies. Além disso, a água captada na propriedade de

Décio é proveniente de um poço protegido, que ele próprio construiu, e o lixo orgânico,

utilizado diretamente como adubo nas hortas.

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Foto 13 – Cobertura Verde na propriedade do Décio Cagnini

Fonte: Arquivo pessoal, GAIOVICZ, E.F./Maio de 2010.

Ao falar sobre as vantagens da produção agroecológica, Décio destaca: a) os preços

obtidos pela produção; b) venda garantida dos produtos; c) saúde familiar e dos consumidores

através da produção de alimentos saudáveis. ―A comercialização sempre dá certo e há

garantia de que tudo será vendido. Além disso, é o produtor que estabelece o preço, sem ter

que contratar grandes empresas‖, afirma. Como desvantagem, menciona a falta de força de

trabalho, ou seja, de pessoas disponíveis para fazer o trabalho braçal que a prática

agroecológica exige: ―Os jovens saem do campo e deixam o trabalho rural. O mercado

também é frágil, é difícil criar um mercado regular e ainda falta organização dos produtores

em um sistema coeso‖. Além disso, faltam técnicos especializados em agroecologia.

Apesar de destacar a fragilidade do mercado, Décio afirma que há consumidores para

a produção, vendem tudo que cultivam e faltam produtos. Assim, é necessário ampliar a

produção criando redes de comercialização envolvendo o território de Verê e outros vizinhos,

como Francisco Beltrão. Na opinião do entrevistado, isso pode ocorrer através da criação de

uma central, um ponto de referência que articule os produtores agroecológicos de diferentes

municípios numa comercialização em rede, formada a partir de nós estratégicos de território.

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Figura 5 – Propriedade de Décio Cagnini

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Ao analisarmos a figura 5, observamos que a propriedade possui uma paisagem bem

diversificada, pois vemos homogeneidade apenas em 20% da propriedade, na área destinada

para a produção de eucaliptos; a maior parte é utilizada para a produção agroecológica de

alimentos, com mais de 20 variedades de produtos, cada qual com um planejamento

específico para cada época de produção.

Outro aspecto importante é a presença significativa de mata ciliar e reserva legal, um

ponto positivo para a propriedade, pois na maioria das propriedades parcialmente

agroecológicas, tal área é destinada também para pastagem, ou para plantio de forrageiras, ou,

até mesmo, vista como sujeira e, assim, destruída. Ademais, há também a agrofloresta, com

plantação de erva-mate, através da qual o produtor consegue uma renda extra, pela colheita

anual.

Uma propriedade semelhante à da Família Cagnini é a de Armindo Lang, que reside

no município de Verê há 60 anos e, na propriedade, há 40. Trabalham na propriedade apenas

o casal, que tem 5 filhos.

Armindo faz parte do Conselho do CAPA, possui um sítio parcialmente agroecológico

e recebe visitas de turistas (turismo rural) que vêm até o Termas Águas de Verê. Armindo já

realizou intercâmbio através do CAPA para a Alemanha e também recebeu grupos de

intercambistas deste país em sua propriedade.

A propriedade tem 19,90ha, dos quais, aproximadamente, 7,00ha são utilizados para

culturas temporárias convencionais, através do arrendamento para terceiros; 3,98 ha compõem

a área de reserva legal; possui 03 estufas onde produz hortaliças agroecológicas, com 210m2

cada, totalizando 630m2, o restante da área - isolada com barreira verde - compreende

pastagens permanentes, área de pomar e área construída.

Armindo trabalha com agroecologia há 10 anos. As hortaliças produzidas são:

cenoura, alface, feijão de vagem, tomate, cenoura, pepino (foto 14), couve e temperos. Iniciou

a produção de agroecológicos por questões de saúde; comercializar e consumir alimentos

saudáveis. Na opinião deste produtor, a renda não se diferencia dos outros tipos de produção,

mas optou por questões de saúde. Na produção animal possuem uma vaca para produção de

leite e queijo para consumo e, ainda, coelhos, galinhas caipiras e ovos comercializados na

APAV, quando há excedente. Aprendeu a cultivar com a família, ――tradição familiar‖―,

através de cursos e palestras oferecidos pelo CAPA e com intercâmbios.

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Foto 14 – Estufa com plantação de pepinos da família Lang

Fonte: Arquivo pessoal, GAIOVICZ, E. F./Setembro de 2009.

A certificação é feita pela Rede Ecovida, através da APAV, sendo esta última quem

fabrica e cola o selo no produto na hora da venda. Entre as vantagens da produção

agroecológica, o produtor destaca: maior valor do produto; como utilizam estufas podem

produzir mais safras durante o ano (no inverno, por exemplo) obtendo melhor preço nas safras

fora de época.

As sementes e mudas utilizadas na propriedade são de criação própria (foto 15), mas a

maioria são adquiridas com o técnico do CAPA, Décio, que presta assistência técnica e

também é produtor agroecológico, conforme já mencionamos. Para combater pragas e pestes

utilizam produtos naturais como calda de pimenta, chá de arruda, calda de cinza, super-magro,

com a intenção de repelir e não de matar, pois a própria natureza se encarrega de fazer o

equilíbrio.

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Foto 15 – Produção própria de mudas – Lang

Fonte: Arquivo pessoal, GAIOVICZ, E. F./Setembro de 2009.

Na área arrendada é plantado feijão, milho e soja. Pelo arrendamento recebem 20% do

total gerado na safra segundo o produtor, pediu-se ao arrendatário para que não utilizasse

sementes transgênicas. Além disso, Armindo diz que arrendou porque ele e a esposa não dão

conta de cuidar de toda a propriedade, pois a agroecologia exige muita mão-de-obra e esta é

difícil de encontrar.

Ademais, o produtor não abandonou nenhuma atividade para iniciar a produção

agroecológica. Não participa de feiras, pois toda produção agroecológica é comercializada

com a APAV mensalmente, além de auxiliar na comercialização, atua organizando a

produção (entrega, certifica, embala etc). Inicialmente, para transportar os produtos até a

APAV, utilizava carro fretado, atualmente adquiriu um veículo para transporte particular e

dos produtos.

Entre as desvantagens destacam: a produção exige mais mão-de-obra, o consumidor

compra pela aparência do produto, e isso, algumas vezes, prejudica a venda; a presença de

intermediários atrapalha na comercialização, pois o produtor preferia vender direto ao

consumidor.

Além da APAV, a família Lang é sócia do Sindicato dos Trabalhadores Rurais e fazia

financiamentos através da CRESOL para plantar a lavoura convencional, mas, atualmente,

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não o faz. O capital investido na produção agroecológica é retirado da própria venda das

hortaliças ou das duas aposentadorias que o casal recebe mensalmente. Acreditam que se

houvesse maiores incentivos a produção agroecológica melhoraria, por exemplo, se não fosse

o CAPA e a APAV, já teriam desistido.

O que torna esta propriedade semelhante à propriedade de Décio é o fato de boa parte

da unidade produtiva ser destinada à produção não agroecológica, e, outra porção, à produção

agroecológica; ambos produzem hortaliças e frutas, além de destacarem a falta de mão-de-

obra como principal empecilho para o desenvolvimento da produção agroecológica no

município.

Ao estudarmos estas propriedades, verificamos que há consciência dos produtores em

relação aos benefícios trazidos pela produção agroecológica, porém, ao mesmo tempo,

pensam na rentabilidade imediata e no pouco uso de mão-de-obra da produção convencional,

já que esta é mecanizada. Alegam, ainda que não há incentivo por parte do governo e falta de

mão-de-obra na propriedade agroecológica, resultando na busca por uma renda rápida,

disponibilizada pela produção convencional ou pelo arrendamento. No entanto, a maioria

deles têm como objetivo principal, a longo prazo, a conversão total da propriedade em

agroecológica, sabendo que esta forma de produção exige muito tempo de trabalho e cuidados

especiais.

5.3 – PRODUTORES TOTALMENTE AGROECOLÓGICOS

Para enfatizar ainda mais a importância de produzir e consumir alimentos saudáveis,

em preservar e conservar o ambiente, apresentaremos os produtores totalmente

agroecológicos do município de Verê-PR, que veem na agroecologia uma forma alternativa de

sobreviver e manter-se na pequena propriedade rural. Estes produtores são os que possuem

toda propriedade voltada para a produção de alimentos saudáveis, entre eles estão: Alcides

Moreschi, Aldoino Colpani, Baldoino Berns, Darci Cassol, Janete Ferreira, Lídia Ferreira e

Rudi Castagna, representados pelas três propriedades apresentadas a seguir.

A primeira é a da Família Cassol, que mora no município de Verê há 56 anos e na

propriedade atual desde 1973. Nela trabalha o produtor e, na época de produção, contrata

alguns empregados temporários. A área total da propriedade é de 2,4 hectares, toda destinada

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às culturas agroecológicas temporárias, com estufas de hortaliças (foto 16), frutas e 20% da

propriedade é destinada à mata nativa e capoeira. Além disso, as hortaliças são irrigadas à

noite para diminuir os gastos com energia elétrica, através de um projeto de irrigação noturna

do governo estadual.

Foto 16 – Estufa de hortaliças na propriedade de Darci Cassol

Fonte: Arquivo pessoal, GAIOVICZ, E. F./Agosto de 2010.

Fátima, a esposa, mora na propriedade, mas trabalha no mercado dos produtores da

APAV, na área central da cidade de Verê. O casal tem duas filhas: uma mora no Rio Grande

do Sul e a outra é aluna do curso de Fruticulturas da Universidade Tecnológica Federal do

Paraná, campus de Dois Vizinhos.

Darci trabalha com agroecologia há 13 anos. Antes, a família produzia

convencionalmente; foi Fátima quem incentivou a conversão para a produção agroecológica.

O CAPA, com Décio como técnico, e o STR, que organizou uma lista dos produtos que os

consumidores gostariam de ter no mercado, tiveram papéis fundamentais, ensinando técnicas

de cultivo, organizando e planejando a produção agroecológica.

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Além do CAPA, que auxilia com assistência técnica, outras entidades também são

parceiras de Darci na produção agroecológica, entre elas, a CRESOL, que, apesar de cobrar

juros por seus financiamentos, tem uma linha de crédito específica para os produtores

agroecológicos, para investimento na construção das estufas, e/ou custeio para a compra de

mudas. No entanto, conforme afirma Darci (2009):

...a CRESOL não acreditava na produção orgânica, dava maior prioridade às

produções transgênicas (convencionais), pois faltavam linhas de crédito aos

produtores agroecológicos. Graças ao Governo do Paraná que está

trabalhando muito nos incentivos à agroecologia, principalmente com o

programa Fome Zero. Parece que a CRESOL não aprendeu ainda trabalhar

com os produtores familiares. As entidades se acomodam: têm muito

dinheiro que chega, porém, não usam em atividades, deixam o dinheiro

parado.

A família Cassol comprou as primeiras sementes de Décio e agora compra no

mercado. Para combater as pragas usam super-magro, dipel (inseticida biológico), óleo de nim

(extrato de sementes de uma espécie de árvore meliaceae) e calda bordalesa. Darci abandonou

a produção de suínos após a inserção na agroecologia, pois como o produtor afirma ao Jornal

de Beltrão (06/03/2010) ―com a crise na suinocultura, eu chegava a ter R$100,00 de prejuízo

por dia...‖.

A comercialização dos produtos acontece diretamente in loco com consumidores

(sobretudo vizinhos). Mas a maior parte é comercializada na APAV e o meio de transporte

utilizado para entregar os produtos é a camionete da associação, pela qual paga R$2 por

viagem.

Em entrevista ao Jornal de Beltrão, em março de 2010, o agricultor afirmou que, com

a produção agroecológica, consegue uma renda significativa, suficiente para se manter no

campo em sua pequena propriedade. Diz ainda que, se fosse plantar produtos convencionais,

não daria nem para pagar os gastos com a produção, mas, a agroecologia viabiliza a pequena

propriedade e a produção em pequena escala, desde que haja grande variedade, pois o

mercado para tais produtos é garantido, principalmente para aqueles produzidos fora de

época, como o tomate, que, em estufa, pode ser produzido também no inverno.

Além da produção agroecológica de hortaliças, há produção de leite, carne suína e

peixe para consumo da família e, na cozinha da APAV, produzem conservas e sucos. Ao

mesmo tempo em que o produtor cuida da saúde da família e dos consumidores, cuida

também do ambiente; a captação de água de boa qualidade é feita através de um poço e uma

fonte protegida.

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Figura 6 – Propriedade de Darci Cassol

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Na figura 6, observamos claramente a paisagem da propriedade totalmente

agroecológica, uma diversidade considerável de produtos, em uma pequena área se

comparada com outras propriedades estudadas. Há variedade de produtos em seis estufas,

além de vários canteiros de hortaliças entremeando as estufas e, ao lado delas, um espaço

destinado ao pomar recentemente ― em janeiro de 2010 ― plantado.

Outro aspecto interessante a barreira verde feita com carreiras de capim elefante e

cana-de-açúcar. Segundo o agricultor, a barreira verde é importante para evitar a entrada de

agrotóxicos de outras propriedades convencionais, trazidos pelo vento e pela água. É

relevante comparar a propriedade de Darci Cassol com a de Aldair Alberton, em apenas 2,4

hectare; aquele consegue produzir maior variedade de produto que na propriedade da família

deste que tem quase 40 hectares; isso é possível devido à produção agroecológica de

alimentos. A organização planejada de toda propriedade revela muito bem os princípios

adotados pela família em seu lugar e território de vida.

As principais vantagens da produção são a venda garantida e a geração de um ganho

semanal, que pode ser verificado na produção de rúcula e agrião, comercializadas a R$1,50 ao

maço, e na alface R$0,75 ao pé. Conforme diz Darci em entrevista ao Jornal de Beltrão

(06/03/2010), ―a gente vai juntando esses pequenos valores e conseguimos um bom

montante‖. Além disso, o aspecto fundamental é a saúde da família e dos consumidores: ―Não

estou no meio do veneno!‖, diz Darci. Tem um mercado garantido para os produtos, embora

falte produção: ―no começo de julho, por exemplo, faltou muita alface‖. A produção desta

necessita de mais cuidado e mão-de-obra, por isto, é limitada ao manejo nas estufas.

Segundo o produtor, para melhorar a produção e a comercialização dos produtos

agroecológicos é necessário maior envolvimento dos produtores, organização de cursos,

―porque as pessoas envelhecem e não aprendem mais novas técnicas para cultivar

agroecologicamente‖, assistência técnica para acompanhar durante toda a produção, pois o

CAPA não consegue assessorar a todos.

Enfim, é uma propriedade pequena, mas com aspectos diversificados, uma relação

íntima entre o homem e a natureza, consolidando a criação de uma paisagem

natural/cultural/agrária e transformada.

A propriedade de Lídia Ferreira é bem semelhante à da família Cassol, o que as

diferencia é apenas o tamanho, pois a primeira possui apenas 0,5 hectare, mas é bem

diversificada com grande variedade de produtos, principalmente hortaliças e frutas.

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127

A família Ferreira mora no município de Verê há 20 e, na propriedade, há 12 anos.

Como Dinarte, esposo de Lídia, tem problemas de saúde, trabalham na propriedade ela e o

filho, quando necessário. A área total da propriedade é de 0,5 ha, subdividida em: 0,2 ha de

horta e 1 estufa (foto 17); 0,1 ha de pastagens permanente (pasto-potreiro); 0,1 ha de mata

nativa; 0,05 ha de capoeira; 0,05 ha de reflorestamento e a moradia.

Foto 17 – Estufas e canteiros da propriedade de Lídia Ferreira

Fonte: Arquivo pessoal, GAIOVICZ E. F./Setembro de 2009.

A propriedade de Lídia, assim como a de Janete Ferreira, é resultado do Programa Vila

Rural10

, que atendeu, no Paraná, 16 mil famílias em 411 vilas rurais. O programa era uma

tentativa de dar ao trabalhador rural volante e ao bóia-fria um sentido de vida com maior

dignidade, beneficiando famílias que não tinham onde morar.

10

Segundo a Revista Eletrônica Cidades do Brasil (2001), o programa era desenvolvido pelo Governo do

Paraná, - Jaime Lerner era o governador - iniciado em 1995 e executado pela Cohapar (Companhia de Habitação

do Paraná). As famílias são selecionadas a partir de seu vínculo com a terra e ter morado, pelo menos 5 anos, na

cidade. Durante 30 meses, a família recebia todo apoio necessário: moradia, um galinheiro, um depósito para

produtos, instrumentos de trabalho e cursos de capacitação; por isso, a família teria que pagar R$40 por 25 anos.

O financiamento para esse programa veio de outro Programa maior, ―Paraná 12 meses‖ e uma grande parte de

financiamentos junto ao Banco Mundial.

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128

A família começou produzir produtos agroecológicos a partir de 2001, optando por

esse tipo de produção porque é mais saudável e rentável. A agroecologia, segundo Lídia, em

entrevista (2009), viabiliza economicamente a pequena propriedade, pois, ―cultivos como

milho e soja convencionais, por exemplo, não renderiam muito numa propriedade tão

pequena, enquanto através das hortaliças conseguimos uma renda de R$ 1.000 a cada

produção da estufa (4/6 meses), quando nós tínhamos 3 estufas, tirava quase R$ 2.000 por

plantio‖.

Lídia aprendeu a cultivar agroecologicamente devido aos cursos, às palestras e à

assistência técnica do CAPA, através de seus técnicos Décio e Rome; depois, ela passou a

visitar outras propriedades para trocar experiências.

Quem forneceu as mudas utilizadas para a produção das hortaliças foi Décio. O

controle de pragas é feito com uso de calda bordaleza, óleo de nim e spray contra formigas;

para conservação do solo e utiliza adubação verde. Em relação ao controle de pragas, a

produtora teve, no passado, um problema com manchas brancas nos tomates, isso ocasionou

perda total das mudas e da produção.

A comercialização da produção é toda realizada na APAV, que disponibiliza um

motorista para apanhar os produtos (verduras e frutas) na propriedade; por esse serviço o

produtor paga uma taxa de R$2,00 por viagem, segundo Lídia, um valor bem inferior ao que

pagaria se fosse fretar um carro para essa tarefa.

As únicas entidades parceiras da família são o CAPA, que atua por meio da assistência

técnica, e a APAV, associação que comercializa os produtos, emitindo um extrato que permite

contabilizar os gastos e ganhos da produção, que é certificada pela Rede Ecovida.

A família de Lídia e alguns vizinhos fizeram um financiamento, o PRONAF

investimento, para construção de uma estufa, porém, Lídia afirma que

O financiamento foi feito junto com o vizinho, seu José, e mais 3 produtores

do Distrito de Sede Progresso, porém esse, só piorou a situação econômica

da família, porque agora tem que pagar regularmente parcelas, e a produção

não é regular, às vezes produz bastante, às vezes não; e, desse jeito, nunca

mais na vida vou fazer um financiamento. (Entrevista realizada com Lídia

Ferreira, setembro de 2009)

Na produção agroecológica, os produtos de maior destaque são: milho, feijão,

mandioca para consumo da família, hortaliças e mais uma horta onde são produzidas alface,

vagem, repolho, rabanete, cenoura, beterraba, pepino e tomate (fotos 18 e 19) comercializados

na APAV, juntamente com outros produtos, como frutas que, quando não comercializadas são

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129

transformadas em geleias e sucos na cozinha da associação. A produção animal também é

considerável, usada principalmente para o consumo da família: aves caipiras, aves de granja, e

ovos dos quais, parte é consumido e parte comercializada na APAV.

Foto 18 (esquerda)– Lídia com um pé de alface produzido em sua estufa

Foto 19 (direita)– Canteiros de alho, cenoura, beterraba e parte do terreno em pousio Fonte: Arquivo pessoal, GAIOVICZ E.F./Setembro de 2009.

A principal vantagem da produção agroecológica destacada por Lídia é a possibilidade

de produzir sem uso de agrotóxicos e ter um produto mais saudável. Quanto às desvantagens,

a produtora alega que há dificuldade em combater doenças e pragas; além disso, falta

assistência pública que assegure, no mínimo, as despesas em casos de perda total da produção

como, por exemplo, na safra de tomates citada anteriormente.

A propriedade de Baldoino Berns é diferente em relação às demais propriedades

estudadas, pois, além de possuir o selo do IBD (Instituto Biodinâmico) e da Rede Ecovida, é a

única propriedade do município a produzir soja e milho para exportação, comercializados com

uma empresa privada de Capanema, a Tozan.

A família Berns veio de Angelina - Santa Catarina mora em Verê, desde 1957 e na

propriedade desde 1972. A gestão da propriedade é familiar e nela moram 12 pessoas, todas

da família e por isso não contrata empregados. O cuidado com a plantação é feito por todos,

principalmente pelos filhos, que cuidam da metade da área de cultivo, isto é, a parte da

propriedade que lhes pertence.

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A propriedade possui 26 hectares (figura 7) dedicados exclusivamente à agricultura

agroecológica desde 2000, quando passaram a produzir agroecologicamente devido a duas

intoxicações na família, causadas por agrotóxicos empregados no cultivo convencional.

Atualmente, as principais produções agrícolas, para comercialização são soja, mandioca,

milho e feijão (foto 20); produzem, ainda, trigo, batata-doce, linhaça, pipoca, frutas e verduras

estas últimas para consumo da família.

Foto 20 – Plantação de mandioca e barreiras verdes da propriedade da família Berns

Fonte: Arquivo pessoal, GAIOVICZ E.F./Janeiro de 2011.

Baldoino demonstra cuidado muito grande com o ambiente e interesse nos assuntos de

conservação ambiental. Comentando sobre o processo de colonização da região, diz que,

quando vieram morar em Verê, só havia mata (pinhal e eucaliptos), tudo era terra que

pertencia aos caboclos. O Governo já havia realizado a divisão dos lotes e, desde 1968, a

madeira era vendida, sob financiamentos públicos e incentivos ao desmatamento ― antes era

simplesmente queimada para deixar espaço para a produção, vendida por baixo preço devido

ao excesso de oferta ―. “A lei do Brasil veio muito atrasada em relação ao meio ambiente.

Quem destruiu foi o governo mesmo, com financiamentos; os moradores não queriam

desmatar, e agora falam de aquecimento global e poluição. A gente não vê mais tucanos e

passarinhos como naquela época, foi uma destruição louca‖, diz Baldoino, em entrevista.

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Baldoino afirma que boa parte dos produtos consumidos pela família são produzidos

na própria propriedade, e isso só é possível, graças a agroecologia, que permite a plantação de

vários produtos ao mesmo tempo, sem degradar o solo, preservando as águas e o ar, pois não

utilizam agrotóxicos.

Conforme a lei do programa Fome Zero, em Verê, os produtos agroecológicos

garantem 30% acima do valor do convencional, pois deriva da agricultura familiar, a APAV e

o Fome Zero são os intermediários das vendas. A orientação e a assistência técnica é realizada

pelo CAPA.

A principal vantagem da agroecologia, segundo o produtor, é o baixo preço da

produção; no entanto, produzem em menor quantidade, no máximo, 150 sacas de soja e milho

em 7,26 hectares. Conforme Baldoino, em entrevista em julho de 2009,

[...] com o uso de veneno, a gente sabe que a produção é maior. Se fosse só

pelo dinheiro e pelas lógicas do capitalismo, nóis já teria parado com a

produção agroecológica, mas esse não é nosso objetivo, ficamos na canoa e

temos que remar contra as correntes. O nosso objetivo é a saúde e o cuidado

com o meio ambiente.

As desvantagens, citadas por Baldoino, são a falta de produtos para abastecer o

mercado; de financiamentos para auxiliar no aumento da produção em pequenas propriedades,

de união dos produtores, pois sozinhos não alcançam seus objetivos, dificultando a

valorização da produção agroecológica. ―Sem dinheiro não é possível aumentar a produção

na pequena propriedade e, assim, é a grande propriedade que vai conseguir abastecer o

mercado, mas aí, com produtos convencionais, cheios de veneno‖. A esperança de Baldoino e

da maioria dos entrevistados de Verê é uma diferenciação nos financiamentos

governamentais, com menores juros, que auxiliem e incentivem a produção agroecológica de

alimentos.

Conforme apresentamos na figura 7, a família Berns, não utiliza grandes áreas com o

mesmo cultivo, realiza rotação de culturas, nem sempre os mesmos produtos estão plantados

sobre as mesmas áreas, diferente da produção convencional de alimentos, na qual se cultiva

uma grande extensão de terra com o mesmo produto, gerando uma monotonia na paisagem

com esse tipo de produção.

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Figura 7 – Propriedade de Baldoino Berns e família

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Além disso, são respeitadas as épocas do ano para cada tipo de cultivo. Quando há

poucos produtos, em determinada época do ano, grande parte das terras cultiváveis da

propriedade são deixadas em pousio, para que a cobertura verde venha, por conta própria,

revigorando as forças e a fertilidade do solo.

Na figura 7, percebemos com maior clareza a diversidade de produtos que são

possíveis numa produção agroecológica, uma paisagem diferenciada, heterogênea e

diversificada. Outro aspecto que observamos é a presença de áreas de mata nativa,

reflorestamento (foto 21), grande quantidade de mata ciliar no entorno do rio que passa pela

propriedade. Isso nos remete ao fato de que desmatar completamente a propriedade, como se

faz no cultivo convencional, não é alcançar a eficiência produtiva, como se anunciava na

modernização da agricultura. Essa propriedade é um exemplo de que, para se ter organização

não é necessário desmatar, eliminar a diversidade, significa integrar cada espécie de forma a

gerar complementaridade, a fim de produzir alimentos saudáveis, preservar o ambiente e

viabilizar economicamente a permanência do agricultor no campo, conquistando autonomia e

qualidade de vida.

Foto 21 – Aos fundos, área de reflorestamento da propriedade da família Berns.

Fonte: Arquivo pessoal, GAIOVICZ E.F./ Janeiro de 2011.

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Ao estudar as propriedades agroecológicas, verificamos que todos os produtores

buscam melhorar, a saúde familiar e dos consumidores, a viabilização econômica e cultural de

sua permanência no campo, na pequena propriedade e a preservação ambiental, mas, ao

mesmo tempo, encontram muitos desafios, como um grande dispêndio de energia no trabalho,

falta de mão-de-obra temporária para auxiliar na limpeza ou na colheita dos produtos e falta

de incentivos financeiros por parte do governo. No entanto, os produtores alegam que esses

desafios podem ser superados, quando há união, força de vontade, preocupação com o

ambiente e com a saúde e, principalmente, quando se acredita que é na agroecologia que a

melhoria da qualidade de vida se torna possível.

Ao findar a apresentação e análise da organização das propriedades estudadas,

observamos a presença de um elemento fundamental na construção/transformação da

paisagem: o homem. Ao mesmo tempo, ele consegue criar várias paisagens culturais,

humanizadas e agrárias, mas tudo isso é possível pela relação existente com as características

naturais (clima, relevo, vegetação) já presentes em determinado espaço, ou seja, a paisagem

natural é anterior à ação humana, mas é ela quem dá condições para a concretização das ações

dos humanos que se territorializam constantemente, em cada propriedade, cada safra, todos os

dias.

Em todas as propriedades, há paisagem; todavia, algumas mais humanizadas, outras

mais naturais, o que encontramos são paisagens naturais e culturais juntas, indissociáveis,

uma é parte da outra. Neste estudo, percebemos que todas são o que Claval (2004) chamou de

paisagem agrária, com diferentes ações do homem no solo, buscando a produção agrícola

necessário, e/ou desejada, agroecológica e/ou convencional. A paisagem agrária é a

combinação de fatores como o habitat e as parcelas de terra que intervêm na organização do

espaço rural e na territorialização.

Neste momento, vale lembrar que, muitas vezes, as transformações ocorridas na

paisagem, pelas atividades humanas ou pelo próprio avanço da sociedade, são tão fortes que

chegam a ser degradantes, e é também por este motivo que os objetivos da agroecologia

devem ser divulgados e adotados, para termos paisagens transformadas, porém, a favor da

qualidade de vida e da preservação do ambiente.

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5.4 – SÍNTESE DA PRODUÇÃO AGROECOLÓGICA DO MUNICÍPIO DE VERÊ

Todos os dados foram coletados durante trabalho de campo realizado, em 2009,

juntamente com as demais atividades do projeto ―Agricultura Familiar Agroecológica, nos

município de Itapejara d‘Oeste, Salto do Lontra e Verê (Sudoeste do Paraná), como estratégia

de inclusão social e desenvolvimento territorial‖, financiado pela SETI – Secretaria de

Ciência, Tecnologia e Ensino Superior do Estado do Paraná, através do Programa

Universidade Sem Fronteiras.

Nos quadros a seguir, apresentamos algumas sínteses dos dados qualitativos e

quantitativos da produção agroecológica do município de Verê, dividindo os agricultores de

acordo com o tipo de produção. Assim, dividimos os produtores entre parcialmente

agroecológicos e totalmente agroecológicos, elaboramos dois quadros quantitativos e dois

qualitativos. O primeiro quadro (Nº1) mostra os 12 produtores parcialmente agroecológicos,

pois, juntamente com a agroecologia, atuam como agricultores de produtos convencionais, ou

como arrendadores que alugam parte da terra para terceiros plantarem produtos convencionais

não transgênicos.

O segundo quadro (N°2), também quantitativo, apresenta os 7 produtores totalmente

agroecológicos que encontraram neste tipo de produção uma alternativa de cultivo sem o uso

de agrotóxicos, sem dependência da indústria, ou seja, uma forma de preservar e conservar o

ambiente, de produzir e consumir alimentos saudáveis e, dessa maneira, cuidar da saúde da

família e dos consumidores.

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136

Agricultor Tamanho da

propriedade

Nº de

trabalhadores

Principais produtos agroecológicos Certificação Comercialização

Comercialização Consumo familiar

Aldair

Alberton

24,24 ha/conv.

15,48 ha/agroe. 5 (2 p*)

1- milho, frutas (uva), leite.

2 – vinho

1 – hortaliças e frutas Rede Ecovida

(uva)

Indústria de Sucos

Viry e in loco

Armindo

Langue

7 ha/conv.

12,9 ha/agroe. 2

1 – hortaliças, frutas e leite

2 - Conservas

1 – hortaliças e frutas

2- queijo Rede Ecovida APAV

Ass. Santo

Antonio

5ha/conv.

9ha/agroe. (2 p*) e 5 t*

1- Frutas (uva) e leite.

2- queijo

1- mandioca, leite e

hortaliças. 2- queijo

Rede Ecovida

(uva)

Indústria de Sucos

Viry e APAV

Décio

Cagnini

3 ha/conv.

10,6 ha/agroe. 3 (1 t*)

1- hortaliças, frutas, feijão, mudas,

leite e cana-de-açúcar

2- queijo, açúcar-mascavo e geleias.

Tudo que é produzido é

também consumido pela

família.

Rede Ecovida APAV

Dirceu

Moreschi

14,56ha/conv.

8,42ha/agroe. 2 1– uva 1- uva

Rede Ecovida

(uva)

Indústria de Sucos

Viry

Francisco

Carniel

2,42ha/conv.

21,05ha/agroe. 2

1 – leite, mandioca, e frutas

2 - queijo e conservas

1 – mandioca, frutas.

2 - queijo e conservas Rede Ecovida APAV

Iraci Zanin 10,89ha/conv.

10,89ha/agroe. 3 (1 t*)

1- frutas (uva), milho, feijão,

mandioca, hortaliças, e leite

2-vinho, queijo, geleias e conservas

1 – milho, feijão,

mandioca, hortaliças,

frutas e leite.

2 – queijo e conservas

Rede Ecovida

(uva)

Indústria de Sucos

Viry, APAV e in loco

Irinaldo

Calgarotto

2,42ha/conv.

2,42ha/agroe. 2 (1 t*)

1- frutas (uva) e hortaliças

2- vinho e geleias

1 – leite e carnes;

2 - queijo Rede Ecovida

Indústria de Sucos

Viry e APAV

Miguel

Thomé

7 ha/conv.

7,7 ha/agroe. 2 (6 t*)

1 – frutas (uva), feijão, mandioca e

hortaliças

2 – vinho e geleias

1 – uvas, feijão, frutas,

carnes, hortaliças e

mandioca;

2 - vinho

Rede Ecovida

(uva)

Indústria de Sucos

Viry e APAV

Nelson

Moreschi

2,42ha/conv.

4,84ha/agroe. 2

1- uva, feijão, e hortaliças

1 – feijão e hortaliças

2 - vinho

Rede Ecovida

(uva)

Indústria de Sucos

Viry e APAV

Valdemar

Betiollo

4,84ha/conv.

7,26ha/agroe. 2

1- frutas, hortaliças, feijão, mandioca,

pipoca, moranga e leite

2- queijo

1 – feijão, frutas e

hortaliças;

2- queijo

Rede Ecovida APAV

Valmir

Jahn

7,68ha/conv.

9,98 há/agroe. 4

1 – hortaliças, feijão, mandioca, e

frutas.

1 – feijão, mandioca,

hortaliças e frutas. Rede Ecovida APAV

Quadro 1 - Dados quantitativos da produção parcialmente agroecológica do município de Verê Fonte: Trabalho de campo, programa USF/SETI, entrevista com agricultores, 2009.

No Quadro: conv.: área destinada a produção convencional e agroe.: corresponde a área destinada a produção agroecológica, mata nativa, pastagem permanente, reserva legal

e área construída; t* equivale a temporários e p* equivale a permanentes; 1 – produto in natura e 2 produto transformado;.

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Ao avaliar o quadro 01, observamos que o tamanho das 12 propriedades varia de 3 a

39,72 hectares, alcançando uma média de aproximadamente 17,67 hectares e, considerando

que, nelas trabalham 49 pessoas, permanente e temporariamente, a média é de 4 trabalhadores

por propriedade com uma área de aproximadamente 4,28 ha por trabalhador.

Além disso, constatamos que cinco produtores possuem empregados temporários,

contratados na época de limpeza da produção, ou poda de parreiras e colheita da uva. Isso

ocorre porque a maioria dos produtores parcialmente agroecológicos têm como principal

produto para comercialização a uva, sendo, nas 19 unidades estudadas, produzidos

aproximadamente 50.000 kg por ano, dos quais a maior parte, cerca de 80%, é transformada

em suco orgânico na fábrica de sucos Viry da APROVIVE e o restante (20%),

comercializados in natura, nas propriedades, através da venda direta ao consumidor ou na

APAV.

Além da uva, outros produtos são cultivados nas propriedades: hortaliças, mandioca,

feijão e frutas para o consumo da família e o excedente é comercializado na APAV ou

diretamente aos consumidores. Isso não ocorre com Armindo Langue, Décio Cagnini,

Francisco Carniel, Valdemar Betiollo e Valmir Jahn; eles utilizam basicamente a mão-de-obra

familiar e produzem hortaliças, mandioca e feijão para comercialização na APAV.

Alguns agricultores possuem pequenas agroindústrias domésticas, onde produzem

vinhos, queijos, embutidos, geleias e conservas para o consumo próprio. Os produtos que

permanecem no mercado da APAV também são transformados; a associação possui uma

cozinha, no parque industrial do município, onde produzem conservas e geleias e as

comercializam.

De acordo com o quadro 01, a maior parte dos produtos é comercializada na APAV e

na Indústria de sucos Viry da APROVIVE, ambas conveniadas à certificadora Rede Ecovida,

a qual fornece certificação aos 12 agricultores; no entanto, nos casos de Aldair Alberton, da

Associação Santo Antônio, de Dirceu Moreschi, de Iraci Zanin, de Miguel Thomé e de Nelson

Moreschi, a certificação é somente de um produto, da uva, e, nas propriedades dos outros

agricultores, é fornecida à maioria dos produtos agroecológicos.

No gráfico 01, apresentamos a distribuição por tamanho das 19 propriedades

estudadas, dessa forma, verificamos que 74% das propriedades são menores de 20 hectares, e

associamos esse fato à divisão do Sudoeste do Paraná em colônias agrícolas. De acordo com o

quadro 02, observamos que algumas dessas propriedades são classificadas como totalmente

agroecológicas, como a de Darci Cassol (1), Lídia Ferreira (0,5) e Janete Ferreira (0,5),

(t*) temporários, (p*) permanentes; 1 – in natura, 2 – transformados; Fonte: Trabalho de campo, entrevista com os produtores, 2009.

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completamente vinculadas à produção de alimentos saudáveis e, ainda, apenas 1 das 7

propriedades necessitam contratar mão-de-obra temporária.

Gráfico 1 - Conjunto das propriedades estudadas do município de Verê Fonte: Trabalho de campo, 2009.

As maiores unidades de produção têm suas atividades vinculadas às produções

convencional e agroecológica, como o caso da propriedade de Aldair Alberton (38,72), de

Dirceu Moreschi (28), de Francisco Carniel (23,5) e de Iraci Zanin (21,8), mas, em meio a

estas com mais de 20 hectares, há uma totalmente agroecológica, a de Baldoino Berns, com

26 hectares, com a produção certificada pelo Instituto Biodinâmico (IBD), através da Tozan,

uma empresa privada de produtos alimentícios orgânicos, que compra parte da soja e do milho

agroecológicos. A outra parte é comercializada com a empresa Gralha Azul, para

transformação em ração, a qual, segundo Fritz (2008), trabalha com a produção de ovos

orgânicos em Francisco Beltrão, com 12 famílias, sendo 6 certificadas pelo sistema orgânico

da Tecpar11

e as demais como produto colonial. Além da soja e do milho, a família Berns

produz feijão, mandioca, linhaça, frutas e hortaliças para o consumo próprio.

11 O Instituto de Tecnologia do Paraná, com sede em Curitiba, é uma instituição de certificação de qualidade.

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Quadro 2 - Dados quantitativos da produção agroecológica no município de Verê.12

12

(t*) temporários; 1 – in natura, 2 – transformados;

Fonte: Trabalho de campo /Programa USF/SETI, entrevista com os produtores, 2009.

Agricultor Tamanho da

propriedade

Nº de

trabalhadores

Produtos agroecológicos Certificação Comercialização

Comercialização Consumo próprio

Alcides

Moreschi 7,2 ha 2

1- frutas (uva) e

hortaliças 1 - hortaliças Rede Ecovida APAV

Aldoino

Colpani 13,7 ha 2

1- hortaliças, frutas (uva)

e leite;

2- vinhos, geleias e

conservas

1- Milho, feijão,

mandioca;

2 – queijo e

embutidos;

Rede Ecovida

Indústria de Sucos

Viry, APAV e

Laticínio Progresso

Baldoino

Berns 26 ha 4

1- milho, feijão, soja,

trigo, mandioca, linhaça;

1 – hortaliças e leite;

2 – queijo;

IBD/Tozan e

Rede Ecovida

APAV, Tozan e

Gralha Azul

Darci Cassol 2,42 ha 1 1- hortaliças e frutas

1 – hortaliças e

frutas;

2- conservas

Rede Ecovida APAV

Janete Ferreira

da Silva 0,5 ha 2 (1 t*)

1- hortaliças, feijão,

mandioca, e frutas

1 – feijão, mandioca,

hortaliças e frutas;

2- conservas

Rede Ecovida APAV

Lídia Ferreira 0,5 ha 2

1- hortaliças, milho,

feijão, mandioca e frutas

1 – milho, feijão,

mandioca, hortaliças

e frutas;

2- conservas

Rede Ecovida APAV

Rudimar

Castagna 2,42 ha 1

1-frutas e aveia

2- vinho

1 – frutas

2 – vinho

Rede Ecovida Indústria de Sucos

Viry e in loco

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Em relação à produção, - quadro 2, - observamos que os produtos com participação

significativa são as hortaliças, frutas, mandioca, feijão e leite, além dos produtos

transformados a partir destes, como geleias, salames, queijos, conservas e compotas, alguns

produzidos na propriedade do agricultor para seu consumo e, outros, na cozinha da APAV,

por uma equipe especializada, para comercialização no mercado da associação.

Outro fato importante é que todos os produtores possuem algum produto com

certificação; Baldoino Berns, além de possuir a certificação do milho, da soja e do trigo pelo

Instituto Biodinâmico, através da Tozan, ainda possui certificação da Rede Ecovida nos

outros produtos – hortaliças, feijão e mandioca, através da APAV. Os outros 5 produtores,

possuem o selo de certificação participativa da Rede Ecovida também por intemédio da

APAV.

A comercialização do excedente desses produtos é realizada na APAV, na Indústria de

sucos Viry, no caso do suco de uva, in loco e diretamente ao consumidor. Dois dos sete

produtores comercializam com outras empresas. Aldoino Colpani comercializa o leite com o

Latícinio Progresso, não recebendo valor diferenciado pelo produto; Baldoino Berns vende a

soja, o milho e o trigo para a Tozan e, algumas vezes, com a Gralha Azul de Francisco

Beltrão.

Contudo, verificamos em entrevista com os responsáveis pela APAV, que boa parte

do excedente dos produtos entregues para comercialização na associação são também

transferidos para outros municípios como Dois Vizinhos, São Jorge d´Oeste e Marechal

Cândido Rondon, onde são comercializados nos supermercados, nas associações

(ACEMPRE) e no mercado do produtor, além de Curitiba, onde são revendidos nas Feiras da

Agricultura Familiar da cidade.

Os quadros 3 e 4 apresentam os dados qualitativos dos produtores parcialmente

agroecológicos e dos totalmente agroecológicos; neles, são apresentadas as entidades

parceiras dos produtores agroecológicos, os objetivos, as dificuldades, as vantagens e as

possibilidades de cada agricultor produzir agroecologicamente. Cabe-nos ressaltar que a

divisão é de acordo com a descrita anteriormente.

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Agricultor Entidades

parceiras Objetivos com agroecologia Dificuldades (limites) Vantagens

Aldair

Alberton

Prefeitura,

CAPA,

CRESOL e

APROVIVE

- Não usar insumos

químicos.

Dificuldades de adaptação e altos custos no

início da conversão;

falta de mão-de-obra e de reconhecimento

do produto orgânico.

- Diminuição dos custos;

- acesso aos financiamentos da CRESOL.

Armindo

Langue

CAPA,

APAV

- Preservar a saúde com

produtos naturais e

saudáveis;

A produção é trabalhosa;

o consumidor é influenciado pela aparência

dos produtos convencionais.

- Produtos melhores, saudáveis e com bom

preço.

Associação

Santo

Antonio

CAPA -Cuidar da saúde A produção é mais trabalhosa e falta mão-

de-obra;

- Maior venda e melhor preço;

- oferta de produtos mais saborosos e

saudáveis.

Décio

Cagnini

CAPA,

CRESOL e

Prefeitura

-Cuidar da saúde da família;

-seguir as exigências dos

consumidores e do mercado

atual.

Falta de mão-de-obra;

a produção é trabalhosa;

o mercado consumidor ainda é frágil;

faltam organizações por parte dos

produtores.

- Maior valor econômico;

- autonomia para estabelecer o preço dos

produtos;

- cuidar da saúde da família;

- venda garantida da produção.

Dirceu

Moreschi

CAPA e

Prefeitura

- Adquirir financiamento,

para construção do parreiral.

Falta de incentivos e financiamentos.

- Preço melhor e saudável;

- a produção agroecológica é menos trabalhosa

que a convencional.

Francisco

Carniel

APAV,

APROVIVE

E CAPA

- Produtos de qualidade;

- agradar os familiares.

Falta assistência técnica;

a necessidade de barreiras verdes para

proteção dificulta a produção

agroecológica.

- Melhorar a saúde da família;

- redução de gastos com remédios e vantagens

econômicas.

Iraci Zanin

STR (Enéas

Marques),

CAPA e

APAV

- Baixo custo da produção;

- produto saudável;

- maior lucro;

- obter apoio do CAPA;

- saúde da família.

Dificuldade em conseguir a certificação o

que atrapalha a comercialização;

perda da produção;

falta de mão-de-obra e divulgação dos

produtos.

- Maior lucro com a produção;

- autonomia para vender os produtos in loco.

Irinaldo

Calgarotto

CRESOL

CAPA e

Prefeitura

- Viver com saúde. Dificuldades com o transporte da produção.

- Maior renda;

- venda garantida dos produtos;

- viabiliza a pequena propriedade.

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Miguel

Thomé

CAPA,

APROVIVE

e CRESOL

- Saúde da família;

- produção saudável.

Falta de mão-de-obra, de assistência técnica

e de uma feira de produtos agroecológicos;

irregularidade da produção.

- Menores custos;

- venda garantida do produto saudável;

- maior preço dos produtos;

- espaço garantido no mercado popular.

Nelson

Moreschi

CAPA,

CRESOL,

STR e

Prefeitura

- Cuidar da saúde e da

natureza;

- preservar os valores éticos.

Falta de auxílio financeiro, de mão-de-obra,

de assistência técnica;

irregularidade de oferta dos produtos.

- Garantia de um alimento mais saudável;

- preço melhor para o produto.

Valdemar

Bettiolo

CAPA E

APAV

- Cuidar da natureza;

- ter sustentabilidade na

propriedade para a família ter

um lugar digno;

- produzir alimentação

diferenciada;

- maiores lucros.

Produção trabalhosa;

falta mão-de-obra e assistencialismo por

parte do governo;

faltam produtos para abastecer o mercado;

faltam famílias que trabalhem

agroecologicamente;

insuficiência de reuniões entre os

produtores e entidades.

- Saúde para a família;

- maiores lucros;

- baixos custos da produção.

Valmir

Jang

CAPA,

CRESOL e

STR

- Geração de emprego;

- maior renda a agroecologia

viabiliza a pequena

propriedade;

- saúde da família;

- alimento saudável.

Faltam incentivos governamentais; faltam

reuniões entre os associados da APAV e

responsáveis.

- Renda maior;

- saúde da família;

- alimento saudável.

Quadro 3 – Dados qualitativos dos produtores parcialmente agroecológicos do município de Verê. Fonte: Trabalho de campo, Programa USF/SETI, entrevista com os produtores, 2009.

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Agricultor Entidades

parceiras

Objetivos com a

agroecologia Dificuldades (limites) Vantagens

Alcides

Moreschi

CAPA,

CRESOL e

STR

Preservar a saúde e

a natureza,

mantendo os

valores éticos.

Falta de auxílio financeiro, de mão-de-obra, e de

assistência técnica;

falta de produtos.

- Garantia de um alimento saudável e de preço

diferenciado dos produtos;

- disponibilidade de produtos fora da época.

Aldoino

Colpani

CAPA,

CRESOL e

EMATER

- Garantir a saúde

da família e dos

consumidores.

Faltam incentivos;

insuficiência de cursos e informações sobre as

vantagens da agroecologia.

- Produtos aceitos no mercado, pois são

reconhecidos como mais saudáveis;

Baldoino

Berns

CAPA e

APAV

-Cuidar da saúde e

evitar intoxicações.

Dificuldades financeiras;

faltam incentivos do governo;

falta diferenciação e valorização do produto.

- Qualidade de vida;

- oferta de produtos mais saudáveis;

- preservação ambiental.

Darci Cassol CAPA e

CRESOL

-Não usar

agrotóxicos.

Falta de produção, de mão-de-obra e de incentivo

por parte da Prefeitura Municipal.

- Venda e renda garantidos;

- saúde da família e dos consumidores.

Janete F. Da

Silva CAPA

- Saúde da família e

garantia de

consumir produtos

saudáveis.

Faltam trocas de experiências;

a produção exige maiores cuidados, tornando-se

mais trabalhosa.

- A agroecologia permite ao agricultor familiar

permanecer no campo;

- maior independência na produção e nos

valores dos produtos;

- menores custos e melhor renda.

Lídia

Ferreira CAPA

- Produto saudável

e viabilização da

pequena

propriedade.

Difícil combater pragas e doenças;

falta de um seguro para a produção, nos casos de

perdas.

- Produtos saudáveis;

- procura de alimentos saudáveis por parte do

consumidor;

- assistência pública.

Rudi

Castagna CAPA

- Não utilizar

agrotóxicos.

Falta de mão-de-obra;

faltam trocas de experiências entre os produtores.

- A produção é menos trabalhosa (apenas 3

meses por ano).

Quadro 4 – Dados qualitativos da produção totalmente agroecológica Fonte: Trabalho de campo, Programa USF/SETI, entrevista com os produtores, 2009.

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Com referência nos dados dos quadros 3 e 4, observamos que todos os agricultores

apontam o CAPA como a principal entidade parceira e incentivadora da produção

agroecológica, através da assistência técnica e dos cursos de técnicas de produção

agroecológica. Outra entidade importante é a APAV, que, além de comercializar os produtos,

auxilia na organização e no planejamento da produção.

São citadas também a CRESOL, vista pelos agricultores como parceira, pois esta

cooperativa tem uma linha de crédito voltada para os produtores agroecológicos; a Prefeitura

Municipal, com projetos de auxílio a agroecologia; a APROVIVE, através da fábrica de sucos

Viry, a qual transforma e comercializa suco orgânico de uva; o Sindicato dos Trabalhadores

Rurais, que representa os agricultores e auxilia com assistência técnica e, por fim, a

EMATER.

Gráfico 2 – Objetivos ao aderir à agroecologia.

Fonte: Trabalho de campo, entrevista com os agricultores, 2009.

Conforme verificamos no gráfico 2, 53% dos agricultores estudados têm como

principal objetivo produzir agroecológicos, melhorar a saúde da família e dos consumidores.

Em segundo lugar, com 27%, está a preocupação com a preservação ambiental,

através do uso de insumos naturais que evitam a contaminação dos trabalhadores, das águas,

do solo e do ar, aumentando as chances de uma vida saudável. Em terceiro, com 17%, a

geração de renda, pois com a venda dos produtos agroecológicos, os lucros são maiores e os

Fonte: Trabalho de campo do projeto, entrevista com os produtores, 2009.

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custos menores devido ao uso de insumos naturais e mais baratos, da adubação verde e da

utilização de mão-de-obra familiar. Por último, mas não menos importante, a geração de

emprego, com 3%, pois esta permite ao agricultor e sua família permanecerem no campo,

viabilizando a pequena propriedade e a mão-de-obra familiar empregada na produção.

No entanto, os produtores, encontram várias dificuldades como a falta de assistência

técnica, de diferenciação na valorização dos produtos, na falta de incentivos financeiros por

parte do governo, de divulgação e de um seguro, pois há com frequência perda de parte ou de

toda a produção, devido ao ataque de pragas ou doenças e fatores climáticos, dificultando-lhes

a permanência como produtores agroecológicos.

Além disso, a falta de mão-de-obra também é uma dificuldade, pois está associada à

redução da população rural, conforme dados dos censos demográficos de 1996, 2000 e 2007:

de 6.246 habitantes no primeiro, diminui para 5.692 no segundo e, por fim, para 4.765 no

terceiro. A população urbana aumenta gradativamente nesses períodos enquanto a população

total diminui, conforme podemos verificar na tabela 4.

Tabela 4 – População urbana e rural de Verê

DISTRIBUIÇÃO DA

POPULAÇÃO 1996 2000 2007

População Rural 6246 5692 4765

População Urbana 2735 3029 3204

TOTAL 8.981 8721 7969

Fonte: Dados IBGE, Censos Demográficos 1996, 2000 e 2007. Org. Gaiovicz, 2010

Constatamos, no município, que, das 19 propriedades estudadas, mais de 50%

possuem crianças e adolescentes, totalizando 16: 8 menores de 12 anos e 8 entre 12 e 18 anos,

sendo 7 destes últimos (Tabela 5), auxiliares na produção agroecológica, na propriedade dos

pais, [Baldoino Berns (2), Valmir Jahn (2), Iraci Zanin(1), Lídia Ferreira (1) e Aldair

Alberton(1)]; essa mão-de-obra auxiliar tem significativa importância, pois, na maioria das

propriedades estudadas, os produtores apresentam a falta dela como maior dificuldade,

embora a produção agroecológica seja baseada no trabalho familiar.

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Tabela 5 - Composição das famílias por unidade produtiva agroecológica de Verê – 2009

Filha Filho Trabalhadores

Unidade de Produção

Agroecológica Casal

De 0 a 12

anos

12 anos

e mais

De 0 a

12 anos

12 anos e

mais Temp. Perm.

Alcides Moreschi 2

Aldair Alberton 2 1 2

Aldoino Colpani 2

Ass. Stº Antonio 2 5

Armindo Lang 2

Baldoino Berns 2 1 1

Darci Cassol 1

Décio Cagnini 2 1

Dirceu Moreschi 2

Francisco Carniel 2

Iraci Zanin 2 1 1

Irinaldo Calgarotto 1 1

Janete Ferreira 2 1

Lídia Ferreira 1 1

Miguel Thomé 2 6

Nelson Moreschi 2

Rudimar Castagna 1

Valdemar Betiollo 2

Valmir Jahn 2 1 1 Fonte: Trabalho de campo, 2009. Org.: GAIOVICZ, E. F. 2010.

Por fim, observamos que essas dificuldades estão condicionadas a fatores

econômicos e políticos que influenciam diretamente e limitam a produção agroecológica em

Verê.

Doutra forma, os produtores encontram na agroecologia, muitas vantagens e

possibilidades, principalmente em Verê, considerando um município organizado em se

tratando de produção e comercialização, com associações que apoiam, incentivam e

organizam a produção agroecológica, e entidades que auxiliam na manutenção e conservação

dessa forma alternativa de produção que, segundo os agricultores, viabiliza a pequena

propriedade gerando renda e emprego, preservando a saúde e o ambiente, diminuindo os

custos da produção, gerando produtos saudáveis e conquistando autonomia da/na produção.

Além das vantagens, há também as possibilidades econômicas, políticas e culturais,

que melhorariam a produção agroecológica no município, tais como: aumento de mão-de-obra

especializada através de cursos para formação de profissionais; venda direta ao consumidor

melhorando a comercialização e a relação produtor/consumidor; criação de uma cooperativa

dos produtores agroecológicos entre os municípios da região Sudoeste do Paraná; maiores

incentivos públicos para financiamentos, construções de benfeitorias e seguros da produção;

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criação de uma feira de produtos agroecológicos no município; execução do projeto da

Prefeitura Municipal para ampliação da fábrica de suco de uva orgânico para produzir

também sucos de frutas cítricas; planejamento da produção, melhorando a diversificação de

produtos no mercado em diferentes períodos do ano e disponibilização, por parte da Prefeitura

Municipal, de um carro, para recolher a produção nas propriedades.

A partir dessas informações, percebemos vantagens e possibilidades em produzir

agroecologicamente, mas, como ocorre em outras atividades, há dificuldades que vão

surgindo em cada fase de conversão da propriedade, que podem ser superadas quando há

esforço em prol da saúde e da preservação ambiental, quando o agricultor decide o que

plantara e para quem venderá, conquistando autonomia e sobrevivendo na pequena

propriedade rural, utilizando a força de trabalho da família, obtendo melhor renda, saúde e

qualidade de vida.

A qualidade de vida13

é um dos pontos positivos observados no decorrer de nossa

pesquisa, pois, segundo os agricultores, com a agroecologia é possível manter-se no campo,

com saúde física e mental, porquanto com a produção convencional ocorreram intoxicações

de familiares que levaram muitas pessoas a desistirem de trabalhar no campo; ao mesmo

tempo, conseguiram ter acesso a saúde, educação, lazer, além de obter melhoria na renda,

tendo acesso às tecnologias disponíveis no mercado (internet, TV, rádio), além de condições

de adquirirem seus automóveis, melhorarem a qualidade de suas moradias, e, ainda, o melhor,

considerado por eles, consumirem alimentos com segurança de que são saudáveis e farão bem

a sua saúde, ademais mais utilizam o trabalho familiar, deixando uma herança cultural para

seus filhos e parentes, substantivando princípios de um desenvolvimento territorial com

participação e solidariedade, conforme descrevemos no capítulo 1.

Outro ponto positivo é a autonomia. Segundo os agricultores, a agroecologia dá

condições do agricultor ser autônomo. Neste caso, ela é individual e coletiva; ― individual,

pois cada agricultor tem em suas ―mãos‖ o poder de decisão; e coletiva, quando há uma

insituição como a APAV, capaz de garantir igualdade de oportunidades aos indivíduos para

que estes satisfaçam suas necessidades. A autonomia dá condições para que o agricultor tenha

capacidade de gestionar e controlar os processos econômicos, políticos, culturais e ambientais

em sua propriedade. Além disso, ele tem liberdade de produzir o que deseja, de vender para

13

Segundo a Associação Brasileira de Qualidade de Vida, está envolve o bem físico, mental, psicológico e

emocional, além de relacionamentos sociais, saúde, educação, lazer, poder de compra e outras circunstâncias, é o

equilíbrio entre corpo/mente/sociedade/ ambiente. Disponível em www.abqv.org.br, acesso em 15 de janeiro de

2011.

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quem quiser e ao preço que achar necessário; estes são os fatores definidos pelos agricultores

estudados que determinam a autonomia, através da agroecologia, pois com a produção

convencional ―através da compra do pacote tecnológico― e/ou com a integração, o

produtor é obrigado a seguir padrões de produção impostos pelas empresas.

O ponto positivo mais evidenciado pelos agricultores é a possibilidade de plantar para

consumir. Não é uma volta ao passado, é uma forma de utilizar mecanismos de produção

atuais que dão origem a produtos tão saudáveis como na agricultura tradicional. ―A gente

consome sem medo de comer veneno, pois sabemos de onde tá vindo, de como foi produzido”,

diz Armindo Lang (2009).

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com a modernização da agricultura, vários atores passaram a modificar o espaço

geográfico, imprimindo, no território, elementos que caracterizam intensas modificações a

partir da incorporação de novas tecnologias. Mesmo com pouca participação, as relações

capitalistas globais influenciaram no local e as estruturas territoriais que vinham sendo

construídas voltaram-se para a classe social dominante. Muitos agricultores que possuíam

pouca terra eram obrigados a vender o que possuíam e tornar-se trabalhadores assalariados

marginalizados nas cidades.

Se, por um lado, a modernização da agricultura é fruto da territorialização das relações

capitalistas, por outro, criou condições para que se iniciasse a percepção dos problemas ―

ambientais, sociais e culturais ― ocasionados por esses novos padrões. É com o

desenvolvimento da agricultura convencional que a agricultura alternativa emergente

consolida-se. Entre as práticas alternativas, a que se destacou no município de Verê foi a

agroecologia.

Em Verê, a constituição da agricultura agroecológica foi condicionada por relações

culturais, econômicas, políticas e ambientais histórica e tradicionalmente constituídas. Essa

dinâmica vem-se caracterizando, há cerca de 10 anos, como um movimento territorial

justamente porque essa forma de produção estabelece novas relações de organização social,

formando redes em novas estruturas territoriais. É um movimento de resistência aos padrões

de produção impostos pela modernização centrada no pacote tecnológico.

Alcançamos os objetivos desta pesquisa quando percebemos que além da agricultura

convencional, que condiciona o agricultor a um padrão de produção e a uma dependência da

indústria, existem outras formas de subordinação, a integração, vista a partir do processo de

produção avícola integrada, realizada pela Sadia - Dois Vizinhos. Compreendemos que há

uma subordinação do agricultor familiar em relação à indústria, através de mecanismos de

subordinação como um contrato de integração muito bem elaborado para atender as

necessidades e requisições da integradora; exigentes investimentos em aviários,

automatizações, em construções, organização da propriedade e em relação às leis ambientais.

Os investimentos nos aviários tornam-se tão altos, que não há como o avicultor simplesmente

abandonar esse tipo de produção e, cada vez mais, contrai dívidas substanciais que, muitas

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vezes, se não tiver outra atividade paralela, como vacas de leite, produção de grãos, ou outro

trabalho fora da propriedade, não consegue pagá-las.

Outro objetivo que atingimos foi a descrição e análise de uma forma alternativa de

produção, como contraponto à produção avícola integrada, como alternativa à produção

convencional. Todos os agricultores estudados, já tiveram suas propriedades completamente

voltadas para a produção convencional de alimentos e eles garantem que a produção

agroecológica é melhor, pois oferece boa renda, autonomia e qualidade de vida.

A dinâmica de produção agroecológica de alimentos encontrada no município de Verê

é diversificada e muito bem organizada. São 19 propriedades, 12 parcialmente, pois possuem

parte da propriedade agroecológica e outra parte com produção convencional, arrendamento

ou, ainda, com silvicultura (eucaliptos), mas com previsão, a longo prazo, de se tornar

totalmente agroecológicas; e 7 propriedades totalmente agroecológicas, todas as atividades

agrícolas realizadas dentro delas são voltadas a agroecologia.

Ademais, os agricultores possuem duas organizações políticas, APROVIVE e APAV,

que organizam e comercializam a produção, além de um Centro de Apoio ao Pequeno

Agricultor (CAPA), que disponibiliza assistência técnica aos agricultores agroecológicos do

município e região. Todas as propriedades possuem certificação fornecida pela REDE

ECOVIDA, entidade, cuja certificação é participativa, num sistema solidário de geração de

credibilidade que, por sua vez, elabora as normas com a participação efetiva dos agricultores.

Há ainda, a ASSESOAR, que desempenha o papel de incentivadora e promove cursos

voltados para a produção de alimentos agroecológicos, e a CRESOL, que disponibiliza

financiamentos aos agricultores familiares. Todas juntas, essas entidades formam um campo

de forças em favor da agroecologia, da sua autonomia e dos agricultores.

Outro fato importante é que, com a agroecologia, além da relação homem/natureza ser

amistosa, há também as relações estabelecidas entre os próprios agricultores; há uma

experiência de afetividade singular nesta forma de produção. E, a partir dessa proximidade e

força, a resistência da agricultura agroecológica de Verê, fortalece-se constantemente,

absorvendo demandas e resultando em novas formas de interação entre os agricultores e

consumidores.

Isso se reflete também na forma de organização das propriedades agroecológicas,

exemplo disso, é a propriedade de Décio, que, apesar de ser parcialmente agroecológica, é

modelo no município e na região, buscando, cada vez mais, atrair o consumidor até ela,

através do Colhe e Pague Cagnini, onde o consumidor pode escolher e colher o produto que

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quer levar para casa, sem pagar um valor diferenciado, o preço é o mesmo encontrado no

mercado da APAV.

Verificamos também que a produção agroecológica exige um cuidado especial, com

trabalho diferenciado, com cultivos diversificados, com a natureza, com a água, com a

biodiversidade em geral, o que antes ―na modernização da agricultura― era prejuízo e

demandou investimentos para extermínio, ―insetos e vegetação verde― hoje, são utilizados

como auxílio, de forma proveitosa para o desenvolvimento de cada propriedade. Porém, isso é

possível quando há financiamentos favoráveis para investimento e mão-de-obra disponível

para lidar com a terra, pois a produção agroecológica não é tão simples, há dificuldades.

Principalmente falta mão-de-obra, valorização da produção e financiamentos que sejam

disponibilizados aos agricultores para que haja melhores investimentos na propriedade.

Todas as características citadas são da agricultura familiar brasileira, diferenciada pela

agroecologia, mas que continua sendo mediada por Ongs, organizações sociais e pelas

associações fundadas pelos agricultores, revelando que as relações estabelecidas no(s)

território(s) podem e precisam ser dinamizadas em favor do desenvolvimento local e, a partir

da organização dos agricultores agroecológicos de Verê, das associações, das Ongs e de todas

as entidades envolvidas, apresentam um bom potencial para ampliar a produção, melhorar

ainda mais a renda e a qualidade de vida das famílias envolvidas na pesquisa.

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ENTREVISTAS

ALBERTON, Aldair. Produção Agroecológica.. Entrevista concedida a Elaine Fabiane

Gaiovicz e Valentina Bianco, Verê, 25 de agosto de 2009.

AVICULTOR INTEGRADO À SADIA. Sistema Sadia de Integração. Entrevista

Concedida a Elaine Fabiane Gaiovicz, Dois Vizinhos, 13 de setembro de 2010.

BERNS, Baldoino. Produção Agroecológica. Entrevista concedida a Carolina Bonelli,

Valentina Bianco e Poliane de Souza, Verê, 21 de julho de 2009.

BETIOLLO, Valdemar. Produção Agroecológica. Entrevista concedida a Elaine Fabiane

Gaiovicz, Valentina Bianco e Poliane de Souza, Verê, 05 de agosto de 2009.

CAGNINI, Décio. Produção Agroecológica. Entrevista concedida a Elaine Fabiane

Gaiovicz, Verê, 05 de agosto de 2009.

CAGNINI, Dirceu. Produção Agroecológica na Associação Santo Antônio. Entrevista

concedida a Elaine Fabiane Gaiovicz, Valentina Bianco e Marcos Aurelio Saquet, Verê, 01 de

setembro de 2009.

CALGAROTTO, Irinaldo. Produção Agroecológica. Entrevista concedida a Valentina

Bianco, Marcos Aurelio Saquet e Carolina Bonelli, Verê, 18 de agosto de 2009.

CARNIEL, Francisco. Produção Agroecológica. Entrevista concedida a Elaine Fabiane

Gaiovicz, Valentina Bianco e Marcos Aurelio Saquet, Verê, 25 de agosto de 2009.

CASSOL, Darci. Produção Agroecológica. Entrevista concedida a Elaine Fabiane Gaiovicz,

Valentina Bianco e Camila Casiraghi, Verê, 05 de agosto de 2009.

CASSOL, Fátima. APAV: Associação dos Produtores Agroecológicos de Verê. Entrevista

concedida a Elaine Fabiane Gaiovicz, Valentina Bianco e Carolina Bonelli, Verê, 17 de

outubro de 2009.

CASTAGNA, Rudimar. Produção Agroecológica. Entrevista concedida a Elaine Fabiane

Gaiovicz, Valentina Bianco, Marcos Aurelio Saquet e Poliane de Souza, Verê, 07 de agosto

de 2009.

COLPANI, Aldoino. Produção Agroecológica. Entrevista concedida a Elaine Fabiane

Gaiovicz, Valentina Bianco e Poliane de Souza, Verê, 10 de outubro de 2009.

FERREIRA Janete. Produção Agroecológica. Entrevista concedida a Elaine Fabiane

Gaiovicz, Valentina Bianco, Marcos Aurelio Saquet e Poliane de Souza, Verê, 01 de setembro

de 2009.

FERREIRA, Lídia, Produção Agroecológica. Entrevista concedida a Elaine Fabiane

Gaiovicz, Valentina Bianco, Marcos Aurelio Saquet e Poliane de Souza, Verê, 01 de setembro

de 2009.

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GARBOSSA, Fábio. APROVIVE: Associação dos Produtores Vitivinicultores de Verê.

Entrevista concedida a Elaine Fabiane Gaiovicz, Verê, 15 de janeiro de 2010.

JAHN, Valmir. Produção Agroecológica. Entrevista concedida a Elaine Fabiane Gaiovicz,

Valentina Bianco e Carolina Bonelli, Verê, 10 de setembro de 2009.

LANG, Armindo. Produção Agroecológica. Entrevista concedida a Elaine Fabiane Gaiovicz,

Valentina Bianco e Carolina Bonelli, Verê, 11 de setembro de 2009.

MARTINS, Maria Odete. Setor de Fomento da Sadia: Produção e integração. Entrevista

concedida a Elaine Fabiane Gaiovicz, Dois Vizinhos, 19 de março de 2010.

MORESCHI, Alcides. Produção Agroecológica. Entrevista concedida a Elaine Fabiane

Gaiovicz, Valentina Bianco e Poliane de Souza, Verê, 02 de setembro de 2009.

MORESCHI, Dirceu. Produção Agroecológica. Entrevista concedida a Elaine Fabiane

Gaiovicz, Valentina Bianco e Poliane de Souza, Verê, 02 de setembro de 2009.

MORESCHI, Nelson. Produção Agroecológica. Entrevista concedida a Elaine Fabiane

Gaiovicz, Valentina Bianco e Poliane de Souza, Verê, 02 de setembro de 2009.

SANTOS, Adão dos. CRESOL: linhas de crédito para agreocologia. Entrevista concedida

a Elaine Fabiane Gaiovicz, Verê, 17 de novembro de 2010.

SCARIOT Ronaldo – O sistema Sadia de Produção e Integração. Entrevista concedida a

Elaine Fabiane Gaiovicz, Dois Vizinhos, 19 de março de 2010.

SCHNEIDER, Romi. CAPA: Centro de Apoio ao Pequeno Agricultor. Entrevista

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THOMÉ, Miguel. Produção Agroecológica. Entrevista concedida a Elaine Fabiane Gaiovicz,

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ZANIN, Iraci. Produção Agroecológica. Entrevista concedida a Elaine Fabiane Gaiovicz,

Valentina Bianco, Poliane de Souza e Carolina Bonelli, Verê, 07 de agosto de 2009.