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  • DISTRIBUIO ESPACIAL DA

    VIOLNCIA EM CAMPINAS:

    UMA ANLISE POR GEOPROCESSAMENTO

    Lauro Luiz Francisco Filho

    2004

    UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

    CENTRO DE CINCIAS MATEMTICAS E DA NATUREZA

    INSTITUTO DE GEOCINCIAS

    DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM GEOGRAFIA

  • ii

    UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

    CENTRO DE CINCIAS MATEMTICAS E DA NATUREZA

    INSTITUTO DE GEOCINCIAS

    DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM GEOGRAFIA

    DISTRIBUIO ESPACIAL DA VIOLNCIA EM CAMPINAS:

    UMA ANLISE POR GEOPROCESSAMENTO

    Lauro Luiz Francisco Filho

    Tese de Doutorado apresentada ao programa

    de Ps-graduao em Geografia, Departamento

    de Geografia da Universidade Federal do Rio

    de Janeiro, como parte dos requisitos

    necessrios obteno do ttulo de Doutor em

    Orientador: Jorge Xavier da Silva, Ph.D.

    Rio de Janeiro

    Maro de 2004

  • iii

    DISTRIBUIO ESPACIAL DA VIOLNCIA EM CAMPINAS: UMA ANLISE POR GEOPROCESSAMENTO

    Autor

    Lauro Luiz Francisco Filho

    Orientador

    Jorge Xavier da Silva

    Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Ps-graduao em

    Geografia, Departamento de Geografia da Universidade Federal do Rio de

    Janeiro, como parte dos requisitos necessrios obteno do ttulo de Doutor

    em Geografia.

    Aprovada por:

    Presidente, Prof. Jorge Xavier da Silva, Ph.D.

    Prof. Dr. Josilda Rodrigues da Silva de Moura Prof. Dr. Lia Osrio Machado Prof. Doris Catharine Cornelie Knatz Kowaltowski, Ph.D. Prof. Dr. Hindemburgo Francisco Pires

    Rio de Janeiro Maro de 2004

  • iv

    Dedicatria

    Este trabalho dedicado aos meus pais

    Lauro Luiz Francisco e Maria Jorge Francisco,

    sem os quais no teria chegado at aqui, e a meu

    filho, Marcos Andr, que mesmo sem saber,

    sempre foi minha fonte de inspirao

  • v

    Agradecimentos

    A elaborao de qualquer trabalho s possvel com a participao de outras

    pessoas que, mesmo sem perceber, colaboram na amizade e companheirismo

    que oferecem, formando um lastro que nos mantm seguros, mesmo nos

    momentos mais revoltos.

    Gostaria de agradecer a todos aqueles que ao longo do desenvolvimento deste

    estudo me ajudaram a chegar at aqui. Ao professor Andr Heidemann, da

    Universidade Catlica de Petrpolis, cujas discusses iniciais sobre a lngua e os

    aspectos jurdicos foram de grande ajuda; aos inmeros amigos que fiz na

    Universidade Federal do Rio de Janeiro ao longo deste perodo, especialmente a

    Snia Vidal Gama, professora da UERJ, Csar Henrique Barra Rocha, professor

    da Universidade Federal de Juiz de Fora e a Jos Amrico de Mello Filho,

    professor da Universidade Federal de Santa Maria, pela amizade,

    companheirismo e colaborao nas horas mais difceis.

    Um agradecimento aos amigos da Unicamp, a Professora Stelamaris Rolla

    Bertoli, Professora Regina Coeli Ruschel, Professora Slvia Aparecida Mikami G.

    Pina, Professora Doris C. Cornelie K. Kowaltowski e Professor Edison Fvero,

    pelo companheirismo e apoio prestado sempre que necessrio. Um

    agradecimento especial professora Lucila Chebel Labaki, pelo apoio material

    que permitiu a finalizao deste estudo, e a Elaine Lopes de Sales, cuja

    colaborao no acerto das questes lingsticas foi inestimvel.

    A todos aqueles que participaram direta ou indiretamente, mesmo que aqui no

    citados, a minha eterna gratido.

  • vi

    Francisco Filho, Lauro Luiz

    Distribuio espacial da violncia em Campinas: uma

    anlise por geoprocessamento/ Lauro Luiz Francisco Filho.

    Rio de Janeiro: UFRJ/IG, 2003.

    Xi, 170f.; il.; 29 cm.

    Orientador: Jorge Xavier da Silva

    Tese (doutorado) UFRJ/ Instituto de Geocincias/

    Departamento de Geografia/ Programa de Ps-graduao em

    Geografia, 2003.

    Referncias Bibliogrficas: f.160-170

    Geoprocessamento. 2. Sistema de informao geogrfica. 3.

    Geografia. 4. Gesto Urbana. I. Francisco Filho, Lauro Luiz. II.

    Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto de

    Geocincias, Departamento de Geografia, Programa de Ps-

    graduao em Geografia

  • vii

    DISTRIBUIO ESPACIAL DA VIOLNCIA EM CAMPINAS:

    UMA ANLISE POR GEOPROCESSAMENTO

    Autor

    Lauro Luiz Francisco Filho

    Orientador Jorge Xavier da Silva

    Resumo da Tese de Doutorado submetida ao programa de Ps-

    graduao em Geografia, departamento de geografia da Universidade Federal

    do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessrios obteno do ttulo de

    Doutor em Geografia

    O estudo da violncia urbana atravs da distribuio espacial no

    municpio de Campinas tem como objetivo estabelecer as relaes entre os atos

    criminosos e os aspectos scio-econmicos, usando o geoprocessamento como

    ferramenta de anlise para estabelecer um modelo que possa auxiliar a

    compreenso dos fenmenos urbanos relativos violncia.

    O estudo situa a violncia urbana nos seus aspectos histricos,

    culturais, sociais, antropolgicos e econmicos. Baseado numa metodologia de

    abstrao do ambiente urbano atravs de planimetrias que estabelecem a

    relao das ocorrncias criminosas e fenmenos scio-econmicos com

    unidades territoriais, foram definidos planos de informao que servem de base

    para a anlise de relacionamentos dos temas atravs do Sistema de Anlise

    Geo-Ambiental SAGA. Das anlises resultaram planos de informao que

    representam potenciais de ocorrncia de crimes contra a pessoa e o patrimnio

    no municpio de Campinas, e servem de base para a gesto do municpio por

    parte daqueles que tm a responsabilidade de zelar pela segurana e pelo bem

    pblico.

    Palavras chaves: Geoprocessamento. Anlise Ambiental. Violncia Urbana

    Rio de Janeiro

    Maro de 2004

  • viii

    SPATIAL DISTRIBUTION OF VIOLENCE IN CAMPINAS:

    AN ANALYSIS THROUGH GEOPROCESSING

    Adutor:

    Lauro Luiz Francisco Filho

    Thesis Adviser: Jorge Xavier of Silva

    Abstract of the Doctoral Thesis submitted to the graduate program in

    Geography, Department of Geography of the Federal University of Rio de

    Janeiro, as part of the requirements for obtaining the title of Doctor in

    Geography.

    The study of urban violence through spatial distribution in the municipal

    district of Campinas, Brazil, aims to establish relationships between the criminal

    actions and specific socioeconomic aspects, using geo-processing as analysis

    tools. A further goal is to establish a model which can aid in the understanding

    of urban violence.

    Urban violence is related to its historical, cultural, social, anthropological and

    economical aspects. Based on a methodology of abstraction of the urban

    environment, through planimetrics that establish the relationship of criminal

    occurrences and socioeconomic phenomena, according to territorial units.

    Information maps are developed that serve as a basis for the analysis of

    relationships of these topics through the System of Geo-environmental

    Analyses - SAGA. The results of the analyses are information maps that show

    potential occurrences of crimes against persons and property in the municipal

    district of Campinas. The maps can be used as a basis for programs by the

    municipal administration to establish law and order programs and by

    personnel responsible for public and property security.

    Key words: geoprocessing, urban violence

    Rio de Janeiro

    March of 2004

  • ix

    SUMRIO

    1 INTRODUO ......................................................................................................... 1

    1.1 APRESENTAO DA TESE .............................................................................. 2

    1.2 APRESENTAO DO TEMA............................................................................ 3

    1.2.1 A DEFINIO DO TEMA.................................................................................5

    1.2.2 A PERDA DA QUALIDADE DE VIDA EM REAS URBANAS

    PELA VIOLNCIA .............................................................................................6

    1.2.3 O QUE A VIOLNCIA URBANA?...............................................................7

    1.2.4 A DENSIDADE URBANA E A VIOLNCIA: UMA VISO

    ANTROPOLGICA E SOCIAL ......................................................................10

    1.2.5 A IMPLICAO COMPORTAMENTAL DO HOMEM EM

    RELAO AO AMBIENTE COM ALTA TAXA DE OCUPAO..........15

    1.2.6 AGRESSIVIDADE, VIOLNCIA E DENSIDADE URBANA.....................20

    1.2.7 POBREZA URBANA E VIOLNCIA MITO OU REALIDADE? ............24

    1.3 GEOGRAFIA DO CRIME ................................................................................. 27

    1.3.1 O ESPAO URBANO COMO PALCO DA VIOLNCIA...........................30

    1.3.2 A VIOLNCIA COMO UMA QUESTO SOCIAL .....................................37

    1.4 A URBANIZAO NO BRASIL E A ESCALADA DA VIOLNCIA ....... 39

    1.4.1 UM BREVE RETRATO DA VIOLNCIA NO BRASIL ...............................44

    1.4.2 A VIOLNCIA NO BRASIL EM NMEROS ...............................................46

    1.4.3 A VIOLNCIA NO ESTADO DE SO PAULO...........................................55

    1.4.4 A REGIO METROPOLITANA DE CAMPINAS .......................................58

    1.4.5 A VIOLNCIA NO MUNICPIO DE CAMPINAS......................................64

    1.4.5.1 OS NMEROS DA VIOLNCIA EM CAMPINAS...................................64

    2 OBJETIVOS.............................................................................................................. 67

    2.1 OBJETIVO GERAL............................................................................................. 67

    2.2 OBJETIVOS ESPECFICOS ............................................................................... 67

    3 METODOLOGIA GERAL DO TRABALHO....................................................... 68

    3.1 DIRETRIZES METODOLGICAS................................................................... 68

    3.2 DEFINIES E DELIMITAES DO TEMA................................................ 70

  • x

    3.2.1 CONJUNTO DE ATOS A SEREM ANALISADOS ......................................73

    3.3 A ESPACIALIZAO DOS ATOS CRIMINOSOS SEGUNDO SUA

    NATUREZA........................................................................................................ 78

    3.4 OBTENO DOS DADOS............................................................................... 79

    3.4.1 BANCO DE DADOS DA POLCIA CIVIL ....................................................80

    3.4.2 BANCO DE DADOS DO IBGE .......................................................................82

    3.5 TRANSFORMAO DOS DADOS ................................................................ 84

    3.6 TRANSFORMAO DOS DADOS Da POLCIA CIVIL............................. 86

    3.7 DEFINIO DA ESTrUTURA COMPUTACIONAL................................... 89

    3.8 MODELAMENTO.............................................................................................. 91

    3.9 PROCEDIMENTOS DE ANLISE .................................................................. 93

    3.9.1 ELABORAO DO INVENTRIO PARA AS ANLISES .......................95

    3.9.2 MTODO DE CLASSIFICAO DOS TEMAS ...........................................96

    3.9.2.1 ALGORITMO BASE DO MTODO DE JENKS.........................................98

    4 ANLISE DA VIOLNCIA EM CAMPINAS .................................................. 100

    4.1 ANLISE DOS CRIMES CONTRA A PESSOA EM CAMPINAS ............ 101

    4.1.1 PRINCPIOS TCNICOS PARA ASSINATURAS AMBIENTAIS ...........103

    4.1.2 ASSINATURA DE CRIMES CONTRA APESSOA E A

    CONDIO DE RENDA...............................................................................106

    4.1.3 ANLISE DE CRIMES CONTRA A PESSOA E A CONDIO DE

    RENDA.............................................................................................................112

    4.1.4 ASSINATURAS DE CRIMES CONTRA A PESSOA E CONDIO

    DA INFRA-ESTRUTURA ..............................................................................122

    4.1.5 ANLISE DOS CRIMES CONTRA A PESSOA E A CONDIO

    DE INFRA-ESTRUTURA...............................................................................129

    4.1.6 ASSINATURAS DE CRIMES CONTRA A PESSOA E CONDIO

    DE EDUCAO .............................................................................................133

    4.1.7 ANLISE DOS CRIMES CONTRA A PESSOA E A CONDIO

    DOS NVEIS DE EDUCAO......................................................................140

    4.2 CONDIO DE SEGURANA PARA CRIMES CONTRA A

    PESSOA.............................................................................................................. 155

  • xi

    4.3 ANLISE DE CRIMES CONTRA O PATRIMNIO EM CAMPINAS.... 164

    4.3.1 ASSINATURAS DE CRIMES CONTRA O PATRIMNIO E

    CONDIO DE RENDA...............................................................................165

    4.3.2 ANLISE DAS ASSINATURAS DE CRIMES CONTRA O

    PATRIMNIO E CONDIO DE RENDA ...............................................172

    4.3.3 ASSINATURAS DE CRIMES CONTRA O PATRIMNIO E

    CONDIO DA INFRA-ESTRUTURA ......................................................175

    4.3.4 ANLISE DA ASSINATURA DOS CRIMES CONTRA O

    PATRIMNIO E CONDIO DE INFRA-ESTRUTURA........................181

    4.3.5 ASSINATURA DE CRIMES CONTRA O PATRIMNIO E NVEIS

    DE EDUCAO. ............................................................................................183

    4.3.6 POTENCIAL PARA CRIMINALIDADE CONTRA O

    PATRIMNIO EM CAMPINAS...................................................................194

    4.4 CONDIO DE SEGURANA PARA CRIMES CONTRA O

    PATRIMNIO .................................................................................................. 198

    5 CONCLUSES ...................................................................................................... 203

    6 BIBLIOGRAFIA..................................................................................................... 208

  • xii

    LISTA DAS TABELAS

    Tabela 1 Evoluo das maiores cidades do mundo at 2014...............................43

    Tabela 2 Coeficiente de mortalidade por homicdio e participao dos

    homicdios no total das mortes na faixa etria de 15 a 24 anos em

    19 paises selecionados..................................................................................48

    Tabela 3 - Coeficiente de mortalidade por homicdio por 100 mil

    habitantes e participao dos homicdios no total das mortes na

    faixa etria de 15 a 24 anos nos estados ....................................................52

    Tabela 4- Coeficiente de mortalidade por homicdio por 100 mil habitantes

    e participao dos homicdios no total das mortes na faixa etria

    de 15 a 24 anos regies metropolitana.......................................................53

    Tabela 5 - Populao residente no estado de So Paulo..........................................57

    Tabela 6 - Distribuio do Nmero de Estabelecimentos por Setores de

    Atividade Econmica, segundo os Municpios em 2000........................59

    Tabela 7- Evoluo do Nmero de Ocorrncias Policiais na RM de

    Campinas de 1997 a 200...............................................................................62

    Tabela 8: Aumento da populao e evoluo do nmero de ocorrncias

    policiais segundo os municpios da RM de Campinas...........................62

    Tabela 9 - Evoluo do Nmero de Ocorrncias Criminais Contra a Pessoa

    no municpio de Campinas: 1997/2000. ...................................................65

    Tabela 10 - Evoluo do Nmero de Ocorrncias Policiais, segundo a

    Natureza do Crime, Contravenes Penais e Policiais No-

    Criminais em Campinas: 1997/2000..........................................................66

    Tabela 11 Banco de dados da Polcia Civil com as ocorrncias de crimes

    em Campinas durante o ano de 2001 (baseados nos Boletins de

    Ocorrncia BO) ..........................................................................................82

    Tabela 12 Estrutura do Banco de Dados Comum (BDC) da base de dados

    do Censo 2000 (IBGE) ..................................................................................86

    Tabela 13 - Ocorrncia de crimes com a insero do nmero e chave dos

    setores censitrios.........................................................................................87

  • xiii

    Tabela 14 - Banco de dados da polcia convertido para o padro IBGE...............88

    Tabela 15 - Assinatura de baixa ocorrncia do mapa Crimes contra a pessoa

    com os nveis de renda ..............................................................................107

    Tabela 16 - Distribuio da correlao entre a baixa ocorrncia de crimes

    contra a pessoa e nveis de renda.............................................................107

    Tabela 17 - Assinatura de Mdia baixa ocorrncia do mapa Crimes contra

    a pessoa com os nveis de renda..............................................................108

    Tabela 18 Distribuio da correlao entre mdia baixa ocorrncia de

    crimes contra a pessoa e nveis de renda................................................108

    Tabela 19 - Assinatura de Mdia ocorrncia do mapa Crimes contra a

    pessoa com os nveis de renda.................................................................109

    Tabela 20 - Distribuio da correlao entre mdia ocorrncia de crimes

    contra a pessoa e nveis de renda.............................................................109

    Tabela 21 - Assinatura de Mdia alta ocorrncia do mapa Crimes contra a

    pessoa com os nveis de renda .................................................................110

    Tabela 22 - Distribuio da correlao entre mdia alta ocorrncia de crimes

    contra a pessoa e nveis de renda.............................................................110

    Tabela 23 - Assinatura de Alta ocorrncia do mapa Crimes contra a

    pessoa com os nveis de renda.................................................................111

    Tabela 24 - Distribuio da correlao entre alta ocorrncia de crimes contra

    a pessoa e nveis de renda.........................................................................111

    Tabela 25 - Assinatura de baixa ocorrncia do mapa Crimes contra a

    pessoa com os nveis de Infra-estrutura .................................................124

    Tabela 26 Distribuio da correlao entre baixa ocorrncia de crimes

    contra a pessoa e infra-estrutura..............................................................124

    Tabela 27 - Assinatura de Mdia baixa ocorrncia do mapa Crimes contra

    a pessoa com os nveis de Infra-estrutura ..............................................125

    Tabela 28 Distribuio da correlao entre a mdia baixa ocorrncia de

    crimes contra a pessoa e infra-estrutura .................................................125

    Tabela 29 - Assinatura de Mdia baixa ocorrncia do mapa Crimes contra

    a pessoa com os nveis de Infra-estrutura ..............................................126

  • xiv

    Tabela 30 distribuio da correlao entre a mdia ocorrncia de crimes

    contra a pessoa e infra-estrutura..............................................................126

    Tabela 31 - Assinatura de Mdia alta ocorrncia do mapa Crimes contra a

    pessoa com os nveis de Infra-estrutura .................................................127

    Tabela 32 Distribuio da correlao entre a mdia alta ocorrncia de

    crimes contra a pessoa e infra-estrutura .................................................127

    Tabela 33 - Assinatura de alta ocorrncia do mapa Crimes contra a

    pessoa com os nveis de Infra-estrutura .................................................128

    Tabela 34 Distribuio da correlao entre a alta ocorrncia de crimes

    contra a pessoa e infra-estrutura..............................................................128

    Tabela 35 - Assinatura de baixa ocorrncia de crimes contra a pessoa e

    nveis de educao .....................................................................................135

    Tabela 36 - Distribuio da correlao entre a baixa ocorrncia de crimes

    contra a pessoa e nveis de educao ......................................................135

    Tabela 37 - Assinatura de mdia baixa ocorrncia de crimes contra a pessoa e

    nveis de educao .....................................................................................136

    Tabela 38 - Distribuio da correlao entre a mdia baixa ocorrncia de

    crimes contra a pessoa e nveis de educao..........................................136

    Tabela 39 - Assinatura de mdia ocorrncia de crimes contra a pessoa e

    nveis de educao .....................................................................................137

    Tabela 40 - Distribuio da correlao entre a mdia ocorrncia de crimes

    contra a pessoa e nveis de educao ......................................................137

    Tabela 41 - Assinatura de mdia alta ocorrncia de crimes contra a pessoa

    nveis de educao .....................................................................................138

    Tabela 42 - Distribuio da correlao entre a mdia alta ocorrncia de

    crimes contra a pessoa e nveis de renda................................................138

    Tabela 43 - Assinatura de alta ocorrncia de crimes contra a pessoa e

    nveis de educao .....................................................................................139

    Tabela 44 Distribuio da correlao entre a alta ocorrncia de crimes

    contra a pessoa e nveis de renda.............................................................139

  • xv

    Tabela 45 - Assinatura de alta e mdia alta ocorrncia de crimes contra a

    pessoa e potencial de crimes.....................................................................153

    Tabela 46 - Assinatura de mdia, mdia baixa e baixa ocorrncia de crimes

    contra a pessoa e potencial de crimes......................................................154

    Tabela 47 - Assinatura de mdia alta e alta ocorrncia de crimes contra a

    pessoa e potencial ampliado de crimes contra a pessoa.......................162

    Tabela 48 - Assinatura de crimes contra a pessoa e potencial ampliado de

    crimes contra a pessoa...............................................................................163

    Tabela 49 - Assinatura de baixa ocorrncia de crimes contra o patrimnio e

    renda.............................................................................................................167

    Tabela 50 Distribuio da correlao entre a baixa ocorrncia de crimes

    contra o patrimnio e renda .....................................................................167

    Tabela 51 - Assinatura de mdia baixa ocorrncia de crimes contra o

    patrimnio e renda.....................................................................................168

    Tabela 52 - Distribuio da correlao entre a mdia baixa ocorrncia de

    crimes contra o patrimnio e renda.........................................................168

    Tabela 53 - Assinatura de mdia ocorrncia de crimes contra o patrimnio e

    renda.............................................................................................................169

    Tabela 54 - Distribuio da correlao entre a mdia ocorrncia de crimes

    contra o patrimnio e renda .....................................................................169

    Tabela 55 - Assinatura de mdia alta ocorrncia de crimes contra o

    patrimnio e renda.....................................................................................170

    Tabela 56 - Distribuio da correlao entre a mdia alta ocorrncia de

    crimes contra o patrimnio e renda.........................................................170

    Tabela 57 - Assinatura de alta ocorrncia de crimes contra o patrimnio e

    renda.............................................................................................................171

    Tabela 58 - Distribuio da correlao entre a alta ocorrncia de crimes

    contra o patrimnio e renda .....................................................................171

    Tabela 59 - Assinatura de baixa ocorrncia de crimes contra o patrimnio e

    infra-estrutura .............................................................................................176

  • xvi

    Tabela 60 Distribuio da correlao entre a baixa ocorrncia de crimes

    contra o patrimnio e infra-estrutura......................................................176

    Tabela 61 - Assinatura de mdia baixa ocorrncia de crimes contra o

    patrimnio e infra-estrutura .....................................................................177

    Tabela 62 - Distribuio da correlao entre a baixa mdia ocorrncia de

    crimes contra o patrimnio e infra-estrutura .........................................177

    Tabela 63 - Assinatura de mdia ocorrncia de crimes contra o patrimnio e

    infra-estrutura .............................................................................................178

    Tabela 64 - Correlao entre mdia ocorrncia de crimes contra o

    patrimnio e infra-estrutura .....................................................................178

    Tabela 65 - Assinatura de mdia alta ocorrncia de crimes contra o

    patrimnio e infra-estrutura .....................................................................179

    Tabela 66 - Distribuio da correlao entre a mdia alta ocorrncia de

    crimes contra o patrimnio e infra-estrutura .........................................179

    Tabela 67 - Assinatura de alta ocorrncia de crimes contra o patrimnio e

    infra-estrutura .............................................................................................180

    Tabela 68 - Distribuio da correlao entre a alta ocorrncia de crimes

    contra o patrimnio e infra-estrutura......................................................180

    Tabela 69 - Assinatura entre baixa ocorrncia de crimes contra o

    patrimnio e nveis de educao..............................................................184

    Tabela 70 Distribuio da correlao entre baixa ocorrncia de crimes

    contra o patrimnio e nveis de educao ..............................................185

    Tabela 71 - Assinatura entre mdia baixa ocorrncia de crimes contra o

    patrimnio e nveis de educao..............................................................186

    Tabela 72 - Distribuio da correlao entre mdia baixa ocorrncia de

    crimes contra o patrimnio e nveis de educao..................................187

    Tabela 73 - Assinatura entre mdia ocorrncia de crimes contra o

    patrimnio e nveis de educao..............................................................188

    Tabela 74 - Distribuio da correlao entre mdia ocorrncia de crimes

    contra o patrimnio e nveis de educao ..............................................189

  • xvii

    Tabela 75 - Assinatura entre mdia alta ocorrncia de crimes contra o

    patrimnio e nveis de educao..............................................................190

    Tabela 76 - Distribuio da correlao entre mdia alta ocorrncia de

    crimes contra o patrimnio e nveis de educao..................................191

    Tabela 77 - Assinatura entre alta ocorrncia de crimes contra o patrimnio

    e nveis de educao...................................................................................192

    Tabela 78 - Distribuio da correlao entre alta ocorrncia de crimes

    contra o patrimnio e nveis de educao ..............................................193

    Tabela 79 - assinatura de baixa, mdia baixa e mdia ocorrncia de crimes

    contra o patrimnio e mdio potencial de crimes contra o

    patrimnio...................................................................................................197

    Tabela 80 - Assinatura de mdia alta e alta ocorrncia de crimes contra o

    patrimnio e mdio alto e alto potencial de crimes contra o

    patrimnio...................................................................................................198

  • xviii

    LISTA DAS FIGURAS

    Figura 2 Regies metropolitanas do Estado de So Paulo...................................58

    Figura 3 - Definio da estrutura computacional para entrada, tratamento

    e avaliao dos dados ..................................................................................90

    Figura 4 - rvore de deciso para a gerao dos mapas de potencial de

    criminalidade em Campinas.......................................................................92

    Figura 5 Proposta Metodolgica para Anlise por Geoprocessamento ............94

    Figura 6 - Clculo de tolerncia para simplificao de vrtices.............................98

    Figura 7 - Esquema para assinatura ambiental ......................................................103

    Figura 8 - Tabela para ndice de correlao das assinaturas ....................................106

  • xix

    LISTA DOS GRFICOS

    Grfico 1 Composio total de mortes por causas externas na faixa etria

    de 15 a 24 anos no Brasil..............................................................................49

    Grfico 2 - Brasil Participao da faixa etria de 15 a 24 anos no total de

    mortes por homicdios.................................................................................50

    Grfico 3 - Brasil - Evoluo do coeficiente de mortalidade por homicdio

    por 100 mil habitantes na faixa etria de 25 a 24 anos por grandes

    regies............................................................................................................51

    Grfico 4 Relao do nmero de empresas por setor der atividades por

    municpios da RM de Campinas (fonte: www.emplasa.sp.gov.br)......60

    Grfico 5 - Correlao baixa ocorrncia de crimes e renda...................................113

    Grfico 6 - Distribuio da correlao entre mdia baixa ocorrncia de

    crimes contra a pessoa e nveis de renda................................................114

    Grfico 7 - Distribuio da correlao entre mdia ocorrncia de crimes

    contra a pessoa e nveis de renda.............................................................115

    Grfico 8 Distribuio da correlao entre mdia alta ocorrncia de

    crimes contra a pessoa e nveis de renda................................................116

    Grfico 9 Distribuio da correlao de alta ocorrncia de crimes contra a

    pessoa e nveis de renda............................................................................117

    Grfico 10 Distribuio da correlao entre a baixa ocorrncia de crimes

    contra a pessoa e nveis de educao ......................................................141

    Grfico 11 Distribuio da correlao entre a baixa mdia ocorrncia de

    crimes contra a pessoa e nveis de educao..........................................142

    Grfico 12 Distribuio da correlao entre mdia ocorrncia de crimes

    contra a pessoa e nveis de educao ......................................................143

    Grfico 13 Distribuio da correlao entre mdia alta ocorrncia de crimes

    contra a pessoa e nveis de educao ......................................................144

    Grfico 14 Distribuio da correlao entre alta ocorrncia de crimes

    contra a pessoa e nveis de educao ......................................................145

  • xx

    LISTA DOS MAPAS

    Mapa 1 - Nmero de empregos na Regio Metropolitana de Campinas.............61

    Mapa 2 Base dos Setores Censitrios do municpio de Campinas para o

    censo de 2000 do IBGE.................................................................................84

    Mapa 3 - Condio da renda em Campinas concentrao por setor

    censitrio de pessoas com ganho at meio Salrio Mnimo.................118

    Mapa 4 - Condio da renda em Campinas concentrao por setor

    censitrio de pessoas com renda de meio at 1 Salrio Mnimo .........119

    Mapa 5 - Condio da renda em Campinas concentrao por setor

    censitrio de pessoas com renda maior que 10 Salrios Mnimos ......120

    Mapa 6 - Percentagem de domiclios por setor censitrio com

    abastecimento de gua...............................................................................129

    Mapa 7 - Percentagem de domiclios por setor censitrio com coleta de lixo ...130

    Mapa 8 - Percentagem de domiclios por setor censitrio com coleta de

    esgoto ...........................................................................................................131

    Mapa 9 - Percentagem de pessoas analfabetas.......................................................146

    Mapa 10 - Ocorrncia de Pessoas Analfabetas por Setor Censitrio...................147

    Mapa 11 - Analfabetos responsveis pelos domiclios..........................................148

    Mapa 12 - Percentagem de responsveis pelos domiclios nvel primrio ........149

    Mapa 13 - Potencial para a criminalidade contra a pessoa por deficincia

    de educao.................................................................................................151

    Mapa 14 - Distritos policiais de Campinas..............................................................156

    Mapa 15 - Condio de segurana em Campinas ..................................................158

    Mapa 16 - ndice de segurana Detalhe da rea central.....................................159

    Mapa 17 - Potencial de criminalidade em Campinas ampliado pelo ndice

    de segurana................................................................................................160

    Mapa 18 - Potencial de para crimes contra o patrimnio em Campinas............195

    Mapa 19 - Condio de segurana para crimes contra o patrimnio..................199

    Mapa 20 - Detalhe da da rea central para a condio de segurana ................201

    Mapa 21 - Potencial ampliado de criminalidade contra o patrimnio ...............202

  • 1 INTRODUO

    Para MUMFORD (1965), as duas maiores invenes do homem foram a escrita e

    as cidades. A primeira permitiu o desenvolvimento do processo civilizatrio; a

    segunda criou os meios para que a civilizao pudesse se desenvolver.

    A cidade, como habitat humano por excelncia, tem se desenvolvido desde a

    aurora dos tempos como o ambiente formador das sociedades, representando

    em seu espao a organizao que determinada civilizao apresenta.

    Da aldeia s grandes metrpoles, a saga humana criou ambientes complexos em

    que as relaes sociais, econmicas e culturais da sociedade se rebatem em

    espaos caracterizados por uma profunda segregao, geradora das formas que

    condicionam e so condicionadas pelos grupos humanos que neles habitam.

    Nesse espao conhecido por cidade, as pessoas vivem seus sonhos dirios,

    lutam para se manterem vivas e buscam viver suas vidas da melhor forma

    possvel. A qualidade de vida que o cidado persegue, no entanto, depende de

    inmeros fatores que comeam por um ambiente naturalmente sadio, passando

    pelo acesso riqueza gerada pela sociedade e terminam na segurana em viver

    esse espao. As cidades modernas tm falhado em suprir todos estes itens

    totalidade de seus cidados, se apresentando como um ambiente degradado,

    com a riqueza concentrada nas mos de poucos e com um alto grau de

    insegurana pela exploso da violncia.

    A violncia passa, ento, a participar cada vez mais dos temores daqueles que

    habitam as cidades, moldando um comportamento em que o medo passa a

    ocupar o topo de suas preocupaes. Viver a cidade, hoje, viver o medo, a

    incerteza de chegar em casa ao final do dia, se nossos filhos voltam ilesos

    depois de se aventurarem pela cidade, seja em busca de divertimento, ou de

    conhecimento.

    Conhecer essa realidade, entender como esse processo nasce, se desenvolve e se

    espacializa nas nossas metrpoles de grande importncia, pois sem isso

    estaremos fadados a viver em espaos cada vez mais segregados, fechados

    dentro de uma realidade que no vai alm dos muros e das cercas eletrificadas.

  • 2

    As cidades crescem em clulas estanques, isolando cada vez mais seus

    cidados, que buscam na segurana o principal elemento balizador da

    qualidade de vida.

    Pesquisadores, governos e instituies tm se debruado na busca incessante

    por solues que tornem as cidades menos violentas. Assistimos a um processo

    dicotmico de uma polcia cada vez mais impotente diante de um crime cada

    vez mais organizado. Buscam-se solues a esmo, sem entender de forma clara

    e consistente como a violncia se distribui no espao urbano e quais as variveis

    envolvidas nesse processo. Sem o conhecimento adequado, as aes passam a se

    concentrar nos rgos repressivos, condenando parcelas da sociedade a viver

    acuadas em seus enclaves, vtimas de uma violncia perpetrada pelos rgos

    que, em princpio, deveriam zelar pela segurana de todos. Aes que visem

    uma melhoria das condies sanitrias, educacionais e culturais de grupos da

    sociedade, so desvinculadas do combate violncia, que passa a existir como

    um fim em si, dotada de vida prpria, de uma organizao que se desenvolve

    margem do estado legal, impondo a todos regras prprias baseadas unicamente

    na fora.

    Por conta disso, o estudo da forma com que apresenta-se e comporta-se esta

    violncia no espao urbano, atravs do uso de ferramentas que possam

    localizar, quantificar e relacionar cada ocorrncia criminosa com outros

    elementos que compem a dinmica das cidades, de grande importncia.

    Entendendo sua distribuio no espao e estabelecendo uma relao de causa e

    efeito com outros fenmenos, poderemos desenvolver metodologias que

    orientem os responsveis pela gesto da cidade, seja na tarefa de propor o

    direcionamento adequado das verbas do estado ou na orientao de aes

    repressivas perpetradas pelos rgos responsveis.

    1.1 APRESENTAO DA TESE

    Esta tese resulta de minha insero no Programa de Ps-Graduao em

    Geografia (PPGG), do Departamento de Geografia da UFRJ, como doutorando

  • 3

    no ano de 1999.

    Durante o primeiro ano, atravs de um regime de dedicao exclusiva, foram

    cursadas as disciplinas obrigatrias do programa. Em maio de 2000, por conta

    da prestao de concurso na Universidade Estadual de Campinas, fui

    transferido para essa cidade, onde assumi o cargo de professor colaborador na

    faculdade de Engenharia Civil, junto ao curso de Arquitetura e Urbanismo

    recm implantado. O andamento do programa de doutoramento deu-se, a

    partir de ento, atravs de visitas peridicas Universidade Federal do Rio de

    Janeiro para a obteno de orientao na elaborao da presente tese, como

    requisito bsico para a obteno do ttulo de Doutor em Cincias: Geografia.

    A tese foi desenvolvida dentro da linha de pesquisa em Planejamento e Gesto

    Ambiental, com nfase em Geoprocessamento e vinculada ao LAGEOP -

    Laboratrio de Geoprocessamento, tendo como orientador o Prof. Jorge Xavier

    da Silva.

    Como tema de estudo, foi escolhida a violncia urbana, justamente por se

    apresentar como um tema atual, rico em nuanas que tanto tm transformado

    nossas cidades em locais de difcil convivncia. flagrante a falta um olhar para

    o espao urbano das cidades usando a violncia como parmetro para balizar a

    qualidade de vida. O geoprocessamento se caracteriza como uma ferramenta de

    extremo valor para a anlise de fenmenos com expresso territorial, pois

    permite sua espacializao atravs da quantificao, qualificao e localizao,

    bem como o relacionamento com outras variveis espaciais, estabelecendo uma

    relao de causa e efeito extremamente til a todos aqueles que tm como

    funo a gesto do espao urbano.

    No basta apenas reprimir, pois a represso inadequada apenas muda o foco da

    violncia, que se volta para espaos onde encontra, novamente, condies

    favorveis para se desenvolver.

    1.2 APRESENTAO DO TEMA

    inegvel a importncia do estudo da violncia urbana, tendo em vista o

  • 4

    aumento das ocorrncias criminosas nas cidades. Nos ltimos 20 anos, houve

    discusses de especialistas, formadores de opinio e da populao em geral

    sobre a problemtica, tornando o tema de interesse geral e foco central de suas

    preocupaes. As populaes passaram a conviver com um medo crescente,

    juntamente com uma queda na credibilidade das instituies que deveriam

    garantir a segurana e a justia ao cidado. Por conta disso, a escalada do crime

    vem sempre a reboque de uma polcia cada vez mais despreparada, tanto do

    ponto de vista humano quanto material, enquanto a criminalidade demonstra

    uma organizao cada vez maior, ocupando o vcuo deixado pelo Estado.

    Como conseqncia, as cidades do final do sculo passam a apresentar na sua

    estrutura os reflexos desta grande preocupao com a violncia, que vai se

    concretizar numa morfologia caracterstica, com espaos altamente segregados,

    isolados por elementos fsicos na esperana de que a violncia possa ser, se no

    banida, pelo menos mantida fora de suas fronteiras. Os condomnios fechados,

    os shopping centers, as favelas, as grades e os muros so smbolos dessa nova

    cidade, vtima de sua prpria grandeza.

    O tema violncia urbana amplo e permite, igualmente, uma ampla

    abordagem. Esse trabalho, no entanto, pretende estudar a distribuio espacial

    da violncia no espao urbano, fazendo uso do geoprocessamento como

    ferramenta de anlise.

    Embora o crescimento da violncia seja sentido por toda a populao, sua

    distribuio no ocorre de forma homognea por toda a cidade, mas possui

    especificidade, qualitativa e quantitativamente. As regies perifricas, por

    exemplo, apresentam maiores ndices que apontam para os crimes contra a

    pessoa, enquanto nas regies centrais, mais ricas, esto concentrados os crimes

    contra o patrimnio.

    O Ministrio da Sade, atravs de seu sistema de informaes sobre

    mortalidade, aponta que em 1988 as principais causas de mortalidade no Brasil

    foram as doenas do sistema circulatrio 27,6% dos bitos e as causas

    externas, com 12,6% dos bitos nesse ano. Analisando isoladamente, vemos que

    os homicdios dolosos respondem por 35,7% e os acidentes de transporte a

  • 5

    26,4% dos bitos considerados como causas externas (Izumino & Neme, 2002).

    Se observarmos o fato de que o Brasil um dos pases que apresenta uma das

    mais altas taxas de mortes em acidentes de trnsito, teremos noo da

    gravidade representada pela violncia, que apresenta nmeros superiores.

    A violncia vem crescendo em ritmo considervel em todo o pas,

    principalmente pelo incremento na participao como responsvel pelas mortes

    por causas externas. Em 1980 e 1985, os homicdios correspondiam,

    respectivamente, a 19,8% e 23% das causas externas de mortalidade. Em 1990,

    essa taxa subiu para 31,8% e, em 1995, para 32,3% (Izumino & Neme, 2002).

    Essas taxas, porm devem considerar as diferentes variveis envolvidas no

    processo, tais como a regio, estado ou o municpio, e a distribuio de sua

    populao segundo sua faixa etria, sexo e nvel socioeconmico, pois assim se

    pode observar de forma mais consistente a distribuio destes crimes.

    Certamente cada regio vai apresentar nmeros diferentes, por possurem

    especificidades que os tornam nicas. Porm, mas o fenmeno da violncia

    urbana permeia todo o espao e, em que pese se apresentar de forma diferente,

    acaba por gerar o mesmo tipo de reao, representado pelo medo, insegurana

    e, conseqentemente, uma considervel perda da qualidade de vida para as

    populaes urbanas.

    1.2.1 A DEFINIO DO TEMA

    A violncia pode ser analisada sob vrias formas, dependendo do discurso e

    do objetivo a ser alcanado atravs da anlise que promovemos. Pode ser

    uma abordagem terica sobre as questes sociais, econmicas e culturais

    que levam ao estado de violncia, ou uma anlise direta de seus efeitos na

    sociedade. No primeiro caso, estabelece-se uma teoria sobre origens e

    desenvolvimento da violncia e como ela se instala na sociedade, buscando-

    se entender todo o processo sob o ponto de vista das vrias reas do

    conhecimento humano. No segundo caso procede-se a uma avaliao dos

    impactos que a violncia j instalada causa no meio social. No se pode,

  • 6

    no entanto, elaborar propostas para combater ou erradicar a violncia sem

    conhecimento profundo de todo o processo que leva ao desencadeamento

    de um estado violento.

    Muitas teorias, no entanto, tm tratado desse assunto. Inmeros autores

    socilogos, antroplogos, juristas, urbanistas tm-se dedicado a estabelecer

    tratados sobre o comportamento humano e seus relacionamentos dentro do

    convvio social, o que faz existir uma bibliografia extensa e variada sobre o

    tema. O estudo do impacto que a violncia causa tambm intenso, por ser

    este um fato que gera grande stress na sociedade. A grande diferena est em

    que no primeiro caso no se constri modelos de ao direta, apenas teorias

    que tm por objetivo embasar quem pretende estabelecer formas de combate

    ao estado de violncia. No segundo caso, busca-se o estabelecimento de

    modelos que tm por objetivo agir diretamente no sentido de evitar que os

    estados de violncia se instalem ou combater e minimizar seus efeitos.

    1.2.2 A PERDA DA QUALIDADE DE VIDA EM REAS URBANAS PELA

    VIOLNCIA

    Quem vive nas grandes metrpoles, atualmente, depara-se no dia-a-dia com

    uma situao aparentemente paradoxal: se por um lado viver em reas urbanas

    ter a garantia de acesso a toda uma estrutura de apoio vida, por outro lado

    h a sensao de que as condies geradas nessa estrutura sufocam e oprimem

    cada cidado num constante estado de agresso. Vm tona discusses sobre

    qualidade de vida nos centros urbanos, e percebe-se que essa qualidade,

    dependendo dos valores em jogo, muito relativa. Numa sociedade segregada

    social, econmica e espacialmente, o acesso qualidade de vida, num primeiro

    momento, est diretamente relacionado classe a que pertence cada cidado e,

    conseqentemente, sua capacidade de compra das benesses que a cidade oferece.

    Em princpio, se o cidado tem acesso a uma boa educao, a um sistema de

    sade eficiente, dispe de toda uma infra-estrutura de lazer, tem uma fonte de

    renda estvel, pode-se afirmar que tem uma boa qualidade de vida. O que

  • 7

    acontece, na realidade, que essas benesses presentes nas grandes cidades no

    garantem que cada cidado no fique exposto a uma situao diria de stress e

    angstia. Certamente muitos fatores contribuem para isso, mas a exposio

    violncia , sem dvida, um dos maiores fatores que contribuem para a queda

    da qualidade de vida nas grandes cidades. A violncia faz com que no se

    desfrute das qualidades que um grande centro oferece, e os cidados vo aos

    poucos se encastelando em seus refgios, cada vez mais transformados em

    fortalezas, que os afastam da sociedade e os transformam, por conseguinte, em

    portadores de atitudes segregacionistas. Talvez seja nisso que os cidados

    urbanos se transformaram: numa massa de indivduos segregados em seus

    mundos, isolados em ilhas, como por exemplo, os condomnios.

    A cidade impessoal, opressiva, onde as relaes primrias entre os indivduos

    so substitudas por relaes secundrias, prprias de um aglomerado social

    cujos componentes, em elevado nmero, se associam em virtude de interesses

    comuns. (Ferrari, 1986).

    Nesse meio impessoal, a violncia surge como um fator que empurra cada

    cidado para a parania da insegurana, em que a preocupao bsica o medo

    dirio de sofrer algum ato de agresso. A mdia, por sua vez, tende a agravar

    esse estado na medida em que d destaque aos atos violentos que ocorrem no

    dia-a-dia das grandes cidades. a violncia ultrapassando a barreira imposta

    pelos muros e sistemas de segurana, entrando diretamente nas casas e

    amedrontando os j acuados cidados urbanos.

    1.2.3 O QUE A VIOLNCIA URBANA?

    Estabelecer o que venha a ser violncia urbana no tarefa fcil, dado o

    grande nmero de definies com que os vrios ramos do conhecimento

    humano dedicado ao estudo das cidades a colocam.

    Quando analisamos a violncia das cidades como uma sciopatia, o panorama

    que se apresenta como Crimes Sociais muito amplo. A realidade dos fatos nos

    leva muito alm daquilo que o Direito define como Crime; preciso estender

  • 8

    esses limites para que o crime seja visualizado na sua plenitude.

    Para MORAIS (1981), existe uma violncia especificamente criminosa,

    juridicamente passvel de punio; mas h tambm outro tipo de violncia, que

    s crime em linguagem figurada. Essa violncia foi assimilada pela nossa

    rotina diria e incorporada de tal forma que no visada pelos cdigos penais.

    Os eufemismos criados pela sociedade, impulsionados pela mdia, tentam

    amenizar os atos de violncia atravs de termos que abrandam ou aprofundam

    o sentido do que aceito ou no, como uma linha que define os limites do

    suportvel e do insuportvel. Para MORAIS (1981):

    Usam-se expresses como:violncia vermelha e violncia branca,

    manipulao brutal e manipulao sutilou simplesmente brutalidade e

    opresso, todas estas oposies significando a convivncia entre ns de

    violncias criminosas (punveis) e violncias institucionalizadas (aceitas at pela

    lei). (MORAIS, 1981, p.78).

    Nessa rota se encontra aquilo que podemos chamar de banalizao do crime,

    ou um processo cultural que transforma os atos, antes odiosos e pesados ante

    nossos olhos, em fotos aceitveis e inevitveis. H, como em tudo na natureza,

    uma evoluo que refina e se perpetua num comportamento que aparece cada

    vez mais cedo. Basta olharmos a quantidade de crimes em que h o

    envolvimento de crianas e adolescentes, no s nos aspectos quantitativos, mas

    na qualidade do que perpetrado. Os crimes praticados por esses jovens esto

    longe de serem apenas atos inconseqentes; so aes brutais que, no raro,

    acabam em mortes. O mais irnico disso tudo so as motivaes para que tais

    atos sejam praticados, quase sempre banais. POSTERLI (2000), anota o seguinte:

    Como se no bastasse, a criana e o adolescente muito jovem tm recrudescido

    muito no concerto dessa animosidade contra seu semelhante. No dia 19.02.1999,

    por exemplo, um garoto matou um cidado por conta de 30 centavos. No ms

    seguinte do mesmo ano, algum matou-lhe o vizinho por causa de uma lata de

    lixo. Seqestros h que no vem a tona tambm porque o que se exige muito

    pouco, ninharia e a vtima no famosa.

    Os 30 centavos , a lata de lixo, o apoucado resgate exigido nesses casos so

    bagatelas, mas as aes perpetradas esto longe de constiturem crime de

    bagatela ou de menor potencial ofensivo.

  • 9

    Esto distantes da rotulada criminalidade de ninharia, sem embasamento,

    portanto, no princpio da insignificncia, em que certos resultados atpicos so

    considerados inexpressivos ao bem jurdico protegido. (POSTERLI, 2000, p.22)

    As cidades, pelas suas peculiaridades, so locais onde as paixes humanas

    afloram em toda a sua intensidade, gerando disputas e conflitos que vo

    desembocar no oceano comum da violncia. Cada crime, real ou no sentido

    figurado, constitui, na realidade, um crime contra o direito do homem, e cerceia

    a sua liberdade de viver dignamente num espao que, em princpio, de direito

    a todos os cidados que nele habitam.

    Por conta disso, as cidades se apresentam como o lugar onde a violncia

    fermenta, toma uma forma prpria que transforma a agressividade, inerente ao

    ser humano, em um ato que vai alm das necessidades de sobrevivncia. O

    estado de direito, preconizado por uma sociedade dita civilizada, constantemente

    violado nos seus aspectos mais bsicos, em que todos querem se apropriar do

    seu quinho sem que as necessidades dos tenha importncia.

    A cidade , pois, o lugar, por excelncia, do homem. nela que devemos

    comear a entender de que forma os processos que culminam na violncia se

    formam, se desenvolvem e se reproduzem. Onde est o homem est o perigo.

    No fcil entender o comportamento humano. Pior ainda quando se trata de

    mau comportamento. (POSTERLI, 2000). Por tudo isso, a violncia adquire uma

    personalidade prpria quando se desenvolve na cidade, conhecida como

    Violncia Urbana. Mas em que esta violncia difere de outros tipos de

    Violncia?. Existe realmente uma violncia especificamente urbana?

    Para SOUZA (2000), a pergunta mais apropriada seria se h, realmente, algo de

    especificamente urbano em certas manifestaes de violncia.

    O que seria, assim, a violncia propriamente urbana? No parece razovel

    apontar sua especificidade como residindo meramente no fato de que uma

    cidade serve de palco ao ato violento. Que poder de discriminao analtica

    residiria, afinal, em considerar batalhas travadas em cidades, em meio a uma

    guerra convencional e de larga escala, como violncia urbana? Parece muito

    mais produtivo reservar a expresso violncia urbana para as diversas

    manifestaes da violncia interpessoal explcita que, alm de terem lugar no

  • 10

    ambiente urbano, apresentem uma conexo bastante forte com a espacialidade

    urbana e/ou com problemas e estratgias de sobrevivncia que revelam ao

    observador particularidades ao se concretizarem no meio citadino, ainda que

    no sejam exclusivamente urbanos (a pobreza e a criminalidade so,

    evidentemente, fenmenos tanto rurais quanto urbanos) e sejam alimentados

    por fatores que emergem e operam em diversas escalas, da local

    internacional. (SOUZA, 2000, p.52)

    Para que possamos responder a esta pergunta, imperativo que se proceda a

    um entendimento das vrias faces que essa violncia apresenta como

    comportamento humano. Nessa esteira, uma srie de muitas outras perguntas

    surgem como enigmas a serem respondidos e ligados numa teia que parece no

    ter fim. O mais intrigante, no entanto, parece ser o fato de que os processos que

    do origem violncia urbana tm uma relao com a alta densidade aliada a

    um nmero absoluto alto de indivduos vivendo num determinado territrio.

    Em outras palavras, quanto maiores e mais densas as cidades, maiores so as

    ocorrncias de atos criminosos que caracterizam esse estado prprio que

    definimos como violncia urbana.

    1.2.4 A DENSIDADE URBANA E A VIOLNCIA: UMA VISO

    ANTROPOLGICA E SOCIAL

    Os conflitos sociais se manifestam de vrias formas no meio urbano. H aqueles

    legtimos, regidos por um conjunto de normas e leis que do ao conflito uma

    certa vitalidade, uma legitimidade que busca, atravs da luta, uma melhora nas

    instituies que as representam. Podemos definir como legtimos, nesse caso, os

    conflitos entre as classes trabalhadoras e os proprietrios dos meios de

    produo, caracterizadas pelas greves. As classes trabalhadoras, organizadas

    em sindicatos, buscam, atravs de um processo de luta, legitimado por normas

    e leis, uma melhoria na sua condio de vida atravs de presses sobre o

    sistema produtivo, para o qual vendem sua fora de trabalho. oportuno frisar

    que as lutas de classes, como exposto, no possuem uma caracterstica

    eminentemente urbana. H tambm conflitos de toda ordem envolvendo o

  • 11

    campo, ou, se preferirmos, o meio rural. Mas na cidade que os conflitos

    aparecem com mais vigor, talvez pela prpria estrutura centralizadora que as

    cidades oferecem.

    Esses conflitos sociais, definidos de legtimos, podem ser classificados como de

    primeira ordem, pois so identificveis, classificveis e sujeitos, em princpio, a

    um conjunto de normas e leis que os regulam. H, porm, conflitos sociais que

    fogem a essa estrutura, pois no esto totalmente atrelados ao conjunto de

    normas, e na verdade se contrapem a elas. A luta pelo poder de determinados

    setores da sociedade ilustra bem essa situao, pois as regras so

    constantemente burladas ou usadas de formas distorcidas para beneficiar um ou

    outro grupo. As organizaes poltico-partidrias, por exemplo, se utilizam

    constantemente desses artifcios. As instituies que praticam o mercado de

    bens e capital tambm o fazem em benefcio prprio, gerando conflitos entre

    aqueles que produzem o bem e aqueles que consomem. Atitudes como boicotes,

    campanhas e, em ultimo caso, ataques a determinadas instituies ou empresas,

    representam a forma com que as classes levam a termo seus conflitos. Esses,

    apesar de estarem, em princpio, regidos por normas e leis, fogem ao seu

    controle, criando uma dinmica auto-reguladora prpria, s vezes considerada

    no legtima, mas aceita ou tolerada. Esses conflitos sociais podem ser

    classificados de segunda ordem, pois continuam ainda a ser identificveis,

    classificveis, mas no esto sujeitos, na sua totalidade, ao conjunto de normas e

    leis que deveriam regul-los.

    Por ltimo, existem aqueles conflitos que fogem totalmente ao controle das

    normas e leis. So, a priori, contrrios justamente ao sistema legal que

    regulamenta as aes dos indivduos no meio social. Esses conflitos, definidos

    como ilegais, o conjunto de aes, organizadas ou no, que deflagram o

    processo da violncia em suas vrias formas. Existem inmeras definies do

    que seja violncia, algumas restritas a indivduos, outras a propriedades e

    aquelas mais abrangentes que tratam do estado de direito. MICHAUD (1978)

    apresenta uma definio abrangente de violncia, definindo-a como um

    comportamento, um estado prprio:

  • 12

    H violncia quando, numa situao de interao, um ou vrios atores agem

    de maneira direta ou indireta, macia ou esparsa, causando danos a uma ou

    vrias pessoas em graus variveis, seja em sua integridade fsica, seja em sua

    integridade moral, em suas posses, ou em suas participaes simblicas e

    culturais (MICHAUD, 1978).

    A violncia, tratada no seu sentido mais amplo, um conjunto de aes que est

    presente em toda a cadeia social e se apresenta de vrias formas, atingindo

    indivduos, grupos ou toda a sociedade. Entender seu mecanismo o primeiro

    passo para que se estabeleam formas, se no de erradicao, ao menos de

    convvio, prevendo e amenizando seus efeitos. A violncia, no seu sentido

    amplo, apresenta vrios fatos, definidos por MICHAUD (1989) da seguinte

    forma:

    a) Inicialmente, do carter complexo das situaes de interao nas quais

    podem intervir mltiplos atores, at mquinas administrativas (a mquina

    judiciria, a organizao burocrtica da deportao e dos campos nos regimes

    totalitrios) que diluem as responsabilidades multiplicando os participantes. A

    violncia ento no mais apenas o enfrentamento aberto de dois adversrios,

    mas o efeito de uma empresa annima na qual todo mundo se subtrai

    responsabilidade (genocdios do sculo XX, campos soviticos ou nazistas).

    b) Das diversas modalidades de produo da violncia segundo os

    instrumentos em causa. No a mesma coisa matar com a prpria mo, fuzilar

    e assinar uma ordem de bombardeio. Os progressos tecnolgicos se orientaram

    no sentido de uma violncia produzida indiretamente por meios cada vez mais

    limpos.

    c) Do timing, isto , da distribuio temporal da violncia. Esta pode ser

    ministrada de uma vez (macia) ou gradualmente, at insensivelmente

    (distribuda). Pode-se matar, deixar morrer de fome ou favorecer condies de

    subnutrio. Pode-se fazer desaparecer um adversrio ou afast-lo

    progressivamente da vida social e poltica atravs de uma srie de proibies

    profissionais e administrativas. Aqui aparece claramente a distino entre

    estados e atos de violncia. Entretanto a dificuldade reside no fato de que esses

    estados de violncia supem situaes de dominao que abrangem todos os

    aspectos da vida social e poltica e se tornam, assim, cada vez menos passveis

    de localizao.

  • 13

    d) Dos diferentes tipos de danos que podem ser impostos: danos fsicos mais ou

    menos graves, danos psquicos e morais, danos aos bens, danos aos prximos

    ou aos laos culturais. Aqui tambm, rapidamente a situao torna-se

    inextricvel. Os prejuzos materiais e fsicos so considerados mais importantes,

    nem que seja porque so visveis, mas as perseguies morais e psicolgicas, a

    intimidao reiterada, os danos sacrlegos s crenas e aos costumes tambm

    podem ser graves. No fundo, a questo saber quais so os contornos exatos da

    pessoa e nada garante que esta se limite apenas individualidade fsica.

    (MICHAUD, 1989).

    O que mais evidente e preocupante, em se tratando da violncia inserida na

    estrutura urbana, a sua diferenciao entre estado e atos. O estado de violncia,

    conforme define MICHAUD (1989), pressupe uma estrutura inserida dentro

    do contexto social, uma violncia institucionalizada por mecanismos que tm

    sua origem nas relaes de poder que ocorrem no prprio meio social. Temos a

    a violncia poltica, a econmica, a administrativa, a social, enfim, todas as

    formas de aes executadas, a priori, por um estado de direito, imposto pelas

    classes dominantes.

    O ato de violncia, no entanto, a expresso, a materializao do estado de

    violncia, e pode ser anterior a este ou, como conseqncia, posterior. No

    ambiente das cidades temos essas duas formas caminhando juntas, onde os atos

    de violncia rotineiros banalizam e do legitimidade ao estado de violncia.

    GALTUNG (1981) define essas duas formas como violncia direta, ou do

    comportamento, e violncia estrutural. A primeira se reduz, em ltima instncia,

    ao uso da fora fsica para atingir, ou responder, a aes de outros seres

    humanos. A violncia estrutural, por outro lado, o resultado de estruturas

    sociais que afetam os indivduos indiretamente - a distribuio de renda, a

    fome, o desemprego, a discriminao racial.

    Nesse sentido, a violncia direta, que tem como expresso os atos praticados

    contra indivduos ou instituies, tem seu fundo no comportamento humano

    diante de certas situaes. Cumpre ento questionar: o ambiente urbano, de

    alguma forma, contribui para que o indivduo se torne violento ou apenas faz

  • 14

    aflorar um estado que j lhe inato?

    Para FERRAZ (1994), o estudo da violncia inerente ao homem deve ser

    realizado, observando a natureza prpria do homem e o seu ambiente. No primeiro

    caso, teremos que averiguar a natureza instintiva do homem para a violncia;

    no segundo, a influncia causada pelo meio em que est inserida: a cidade.

    Alguns autores defendem a idia de que o homem s se torna violento pela

    influncia externa, ou seja, a violncia um estado imposto pelo ambiente, e

    no inato. Outros autores, no entanto, defendem que a natureza violenta do

    homem instintiva, faz parte de sua gentica, e que o ambiente apenas faz com

    que esse comportamento instintivo aflore, em maior ou menor grau.

    FERRAZ (1994) define que O homem se assemelha a certas espcies de

    animais, quando entra em conflito com os de sua prpria espcie; e , dentre as

    espcies, a nica em que o ato de lutar destruidor, comete assassinatos em

    massa e possui desajustados dentro de seu prprio meio. Essa viso de que o

    homem um ser dotado de uma violncia letal, corroborada por FROMM

    (1979), mas que diferencia esse aspecto inato, colocando-o em um patamar

    diferente dos outros seres, onde a agressividade mais um elemento de

    controle e sobrevivncia do que uma violncia espria e gratuita.

    Se a agresso humana estivesse mais ou menos no mesmo nvel que a dos

    outros mamferos particularmente dos que lhe so mais prximos, os

    chipanzs a sociedade humana seria perfeitamente pacfica e no violenta.

    Mas isso no acontece. A histria do homem um registro de extraordinria

    destrutividade e crueldade, e a agresso humana, parece, sobrepassa de muito

    dos ancestrais do homem, sendo este, em contraste com a maioria dos

    mamferos, um autntico assassino (FROMM, 1979)

    Para entendermos essa viso da violncia como caracterstica inata do homem e

    relacion-la com o meio ambiente, mais especificamente, o meio ecolgico, que

    conhecemos por cidades, pode-se seguir dois caminhos: voltar ao passado e

    analisar o comportamento dos ancestrais humanos, ou fazer uma observao

    cuidadosa do comportamento das espcies animais no mundo atual. Ao

    optarmos pela primeira hiptese correremos o risco de deixarmos passar certos

    aspectos importantes do comportamento, que s so perceptveis quando se

  • 15

    observa a dinmica do grupo em seu momento real. Analisar o passado trilhar

    o terreno da suposio de que determinadas aes tenham ocorrido da forma

    como imaginamos. Isso nem sempre verdade. Por outro lado, quando

    analisamos grupos de indivduos interagindo entre si, tem-se um retrato fiel das

    relaes em tempo real. H, porm, o perigo de fazermos analogias erradas,

    foradas pela busca de uma semelhana ao problema que estamos estudando.

    Pesados os dois lados, ainda mais sensato trabalharmos com grupos atuais,

    quando o objeto de estudo o comportamento.

    1.2.5 A IMPLICAO COMPORTAMENTAL DO HOMEM EM RELAO

    AO AMBIENTE COM ALTA TAXA DE OCUPAO

    O aspecto mais perceptvel da caracterstica do comportamento urbano est

    relacionado ao ambiente com altas taxas de ocupao territorial; em outras

    palavras, um ambiente denso, tpico das cidades. Esse ambiente, onde temos

    indivduos convivendo com outros indivduos em grande nmero e muito

    prximos uns dos outros, gera uma certa tenso que estabelece um

    comportamento tpico do homem urbano. As altas densidades criam

    comportamentos estranhos a nossa lgica perceptiva. Como entender que

    indivduos que habitam num edifcio, convivendo to prximos com muitos

    outros indivduos e separados apenas por paredes, possam viver sem tomar

    conhecimento do vizinho que mora ao lado? Moradores de edifcios densos so

    conhecidos (quando muito) pelo sndico e pelos porteiros e desenvolvem uma

    apatia diante das relaes de vizinhana e, em muitos casos, tornam-se

    agressivos e violentos com todos que os cercam.

    Com relao a isso FERRAZ (1994) relata:

    Enquanto o homem estiver habitando as cidades racionalmente organizadas,

    no demasiadamente populosas, e esteja fazendo parte de sociedades tambm

    racionalmente formadas, pode-se afirmar que mesmo as pessoas de lares

    desfeitos e recebendo doses elefantinas de violncia pelos meios de

    comunicao de massa no se entregam pratica de atos anti-sociais, embora

    outras pessoas os cometam sem serem influenciadas por tais causas. No caso

  • 16

    das sociedades de massa, mesmo as pessoas no propensas ao crime acabam

    perdendo o controle de si mesmas, passam a cometer desatinos e tornam-se

    problemas sociais. A explicao deste fenmeno reside no fato de que todo ser

    vivo precisa de espao para viver. (FERRAZ, 1994, p. 37 e 38)

    Para FROMM (1979) A reduo fsica do espao retira do animal funes vitais

    importantes de movimento, de deslocamentos importantes. Da, com o espao

    roubado, pode vir a sentir-se ameaado por essa reduo de suas funes vitais

    importantes e reagir por meio de agresso. Podemos, atravs dessa

    observao, constatar que as atividades violentas ocorrem de forma rotineira

    em cidades excessivamente populosas, e que quanto maior a cidade, mais

    violenta se torna. como se um mecanismo de agresso, presente em todos os

    indivduos, tivesse seu gatilho disparado ao se atingir determinado nmero de

    pessoas vivendo num mesmo espao.

    Quais, no entanto, as condies para que isso ocorra? E uma vez alcanado,

    quais os desdobramentos no comportamento do indivduo, em particular, e no

    grupo, como um todo?

    Em 1947 o etlogo John B. Calhoun realizou vrios estudos comparativos com

    animais na tentativa de estabelecer como as exigncias de espao do homem so

    influenciadas por seu meio ambiente. Para tentar explicar como esse mecanismo

    age em indivduos expostos a grande densidade populacional, Calhoun usou

    ratos da Noruega, observando seu comportamento numa srie de

    experimentos, que variaram, desde sua observao em estado natural, at

    condies que permitissem uma observao minuciosa, sem influenciar o

    comportamento dos ratos em suas relaes uns com os outros.

    As experincias de Calhoun se tornaram clssicas no estudo do comportamento

    de animais que vivem em grupos sociais (incluindo a o homem) e serviram

    como base para vrios estudos, a partir da dcada de 50, envolvendo o

    comportamento do homem em sociedade.

    HALL (1989), que destacou as conseqncias do stress experimentado por

    indivduos vivendo em densidades extremas de populaes, relata assim as

    experincias iniciais de Calhoun:

  • 17

    Em maro de 1947, Calhoun iniciou seus estudos sobre dinmica da populao

    sob condies naturais, introduzindo cinco ratas selvagens da Noruega num

    cercado aberto de um quarto de acre. Suas observaes duraram vinte e oito

    meses. Mesmo com bastante alimento e sem nenhuma presso da predao, a

    populao jamais excedeu 200 indivduos, e estabilizou-se em 150. Esses

    estudos ressaltam a diferena entre as experincias realizadas no laboratrio e o

    que acontece com os ratos selvagens vivendo sob condies mais naturais.

    Calhoun enfatizou que, nos vinte e oito meses cobertos pelo estudo, as cinco

    ratas poderiam ter produzido uma descendncia de 50.000 animais. Entretanto,

    o espao disponvel no poderia acomodar este nmero. No obstante, 5.000

    ratos podem ser mantidos em estado saudvel, num espao de 350 metros

    quadrados, se conservados em cercados de 60 centmetros quadrados. Caso o

    tamanho da gaiola seja reduzido para 20 centmetros, os 50.000 ratos podero

    ser acomodados e tambm permanecerem saudveis. A pergunta que Calhoun

    fez foi: por que a populao estabilizou-se em 1 50, no estado selvagem?

    Calhoun descobriu que, mesmo com 150 ratos, num cercado de um quarto de

    acre, as brigas interrompiam os cuidados maternos normais a ponto de apenas

    alguns poucos filhotes sobreviverem. Alm disso, os ratos no se espalharam ao

    acaso em toda a rea, mas se organizaram em doze ou treze discretas colnias

    localizadas, com uma dzia de ratos cada. Ele tambm notou que doze ratos so

    o nmero mximo podendo viver harmoniosamente num grupo natural, e

    mesmo este nmero pode induzir o estresse. (HALL, 1989, p 33)

    Em experincias posteriores Calhoun verificou que o controle efetivo da

    populao de ratos estava vinculado a um mecanismo que impedia a

    reproduo logo que a populao atingia um determinado nmero de

    indivduos, e que esse mecanismo tinha na agressividade, gerada pelo stress

    populacional, seu principal componente. Para tanto usou o termo Esgoto

    Comportamental para se referir ao estado de total distoro do comportamento

    que afetou a maioria dos ratos submetidos ao experimento no celeiro de

    Rockevile. Segundo Calhoun, esse fenmeno o resultado de qualquer

    processo comportamental que rena animais em nmero desusadamente

    grande. As conotaes insalubres do termo no so acidentais: um esgoto

    comportamental realmente age no sentido de agravar todas as formas de

    patologia que possam ser encontradas dentro de um grupo. (Calhoun, apud

    Hall, 1989)

  • 18

    Outras observaes sugerem que o esgoto comportamental pode surgir de

    forma natural, quando as populaes atingem determinado nmero,

    independente de haver ou no disponibilidade de alimento para todos. Ou seja,

    o elemento principal envolvido no aparecimento de situaes de stress extremo,

    e que desenvolve o esgoto, a densidade populacional, e no a disponibilidade

    de alimentos. Para corroborar essa idia, Hall cita o caso da morte em massa de

    veados sika ocorridos na ilhas James em 1958;

    Cerca de dezoito quilmetros a oeste da cidade de Cambridge, Maryland, e

    menos de dois quilmetros ao largo na Baa de Chesapeake, fica a Ilha James,

    com aproximadamente um quilmetro quadrado (280 acres) de terra

    desabitada. Em 1916, quatro ou cinco veados Sika (Cervus nippon) foram soltos

    na ilha. Procriando vontade, a manada aumentou constantemente, at contar

    entre 280 e 300 cervos, uma densidade de cerca de um animal por acre. A essa

    altura, em 1955, tomou-se evidente que algo teria de mudar, sem muita demora.

    Naquele ano, Christian comeou sua pesquisa, matando a tiros cinco veados,

    para realizar detalhados estudos histolgicos das glndulas endcrinas, timo,

    bao, tireide, gnadas, rins, fgado, corao, pulmes e outros tecidos. Os

    veados foram pesados, os contedos de seu estmago registrados, bem como a

    idade, sexo e condies gerais, alm de se observar a presena ou ausncia de

    depsitos de gorduras sob a pele, no abdome e entre os msculos.

    Uma vez feitos estes registros, os observadores ficaram espera. Em 1956 e

    1957, nenhuma mudana ocorreu, mas nos primeiros trs meses de 1958, mais

    da metade dos veados morreu e 161 carcaas foram recolhidas. No ano

    seguinte, mais veados morreram e houve outra queda. A populao estabilizou-

    se em cerca de oitenta. Doze veados foram recolhidos para estudos histolgicos,

    entre maro de 1958 e maro de 1960.

    A que atribuir a morte sbita de cento e noventa veados, num perodo de dois

    anos? No foi fome, porque o abastecimento de alimentos era adequado. Na

    verdade, todos os veados recolhidos estavam em excelentes condies, com

    plos brilhantes, msculos bem desenvolvidos e depsitos de gorduras entre os

    msculos.

    As carcaas recolhidas entre 1959 e 1960 assemelhavam-se s apanhadas em

    1956 e 1957, em todos os aspectos exteriores, com exceo de um. Os veados

    recolhidos aps a queda e estabilizao da populao tinham o tamanho do

    corpo acentuadamente maior do que os apanhados antes da morte em massa, e

    durante ela. Os veados de 1960 eram, em mdia, 34 por cento mais pesados do

  • 19

    que os de 1958. J as coras apanhadas em 1960 eram, em mdia, 28 por cento

    mais pesadas do que as de 1955-57.

    O peso das glndulas endcrinas dos veados Sika permaneceu constante de

    1955 a 1958, durante o perodo da mxima densidade e da morte em massa. Nos

    veados imaturos, que formavam grande proporo dos mortos, o peso das

    glndulas endcrinas caiu 81 por cento, depois de iniciada a morte em massa.

    Houve, tambm, importantes modificaes na estrutura das clulas das

    glndulas endcrinas, que indicavam um grande estresse, mesmo entre os

    sobreviventes. Embora dois casos de hepatite fossem descobertos, acreditou-se

    serem resultado da diminuio de resistncia ao estresse, devido a supra-renais

    demasiado ativas. Ao interpretar os dados de Christian, importante esclarecer

    a significao das glndulas endcrinas. Estas desempenham importante papel

    na regula9o do crescimento, reproduo e nvel de defesas do corpo. O

    tamanho e o peso dessas importantes glndulas no fixo, mas corresponde ao

    estresse. Quando os animais sofrem estresse com demasiada freqncia, as

    supra-renais, para enfrentar a emergncia, tomam-se excessivamente ativas e

    aumentam de tamanho:As supra-renais aumentadas, com estrutura celular

    caracterstica indicando o estresse, foram, portanto, altamente significativas.

    (HALL, 1989. p28)

    Esses estudos demonstram uma tendncia a alterao do equilbrio entre

    indivduos, quando submetidos a altas densidades populacionais. Quando o

    grupo aumenta, conseqentemente h uma diminuio do espao individual de

    que cada indivduo dispe, afetando a sua territorialidade.

    A territorialidade oferece proteo contra os predadores e expe os incapazes

    a predao, demasiado fracos para estabelecer e defender um territrio.

    (HALL, 1989)

    Essas relaes do indivduo com o seu meio ambiente tm sido desenvolvidas

    pelo processo de seleo e adaptao ao longo de milnios, fazendo com que

    cada espcie no s se adapte ao seu meio, mas melhore cada vez mais sua

    linhagem. Em outras palavras, um comportamento inato que age como

    regulador e selecionador das espcies.

    Segundo Hall, O homem tambm tem territorialidade e inventou muitas

    maneiras de defender aquilo que considera sua prpria terra, prado ou

    extenso... (HALL, op. Cit., p. 21). At onde o comportamento do homem

  • 20

    dominado pelos processos instintivos, ou inatos, e at onde cultural, no

    sabemos ao certo. O fato que determinadas caractersticas observadas em

    grupos animais tm sua congnere humana.

    Para FERRAZ (1994), enquanto os instintos constituem fatores inatos do

    comportamento dos animais, variveis de acordo com a espcie, caracterizados

    por aes elementares e automticas, o comportamento do homem

    comandado por sua razo. Defende que A diferena entre o instinto e o

    carter pode ser explicada de outra forma: no instinto imperam as impulses

    radicadas nas necessidades fisiolgicas do homem, so impulsos orgnicos

    comandados pela natureza; no carter imperam os impulsos comandados pelo

    prprio homem, de acordo com a maneira pela qual foram introduzidas nele,

    deliberadamente, as faculdades componentes de sua razo. (FERRAZ, Op. Cit.

    P. 30)

    Ainda assim fica a pergunta: a territorialidade, a necessidade de espao e

    locomoo presentes no homem, tm seus desdobramentos em atos de

    agressividade e violncia comandados pelo instinto ou pela razo?

    O mais provvel que haja uma dissimulao dos processos instintivos por

    outros cobertos com a roupagem cultural. Em outras palavras, nossa razo

    procura sempre um equivalente cultural em substituio aos instintos. Nesse

    caso estaramos - luz da razo - mascarando reaes instintivas por reaes

    racionais, com desdobramentos, porm, de igual magnitude.

    1.2.6 AGRESSIVIDADE, VIOLNCIA E DENSIDADE URBANA.

    Se nos guiarmos pela mdia, no resta dvida, as cidades so, por excelncia,

    violentas em sua totalidade. Diariamente somos bombardeados por notcias de

    toda ordem que exaltam justamente o lado violento das grandes metrpoles.

    Temos a impresso de que a sociedade urbana doente, visto que os mesmos

    sintomas se apresentam em qualquer cidade, independente do pas ou

    continente onde se encontram. Como parmetro, tirado apenas da observao,

    podemos constatar que esses fenmenos ocorrem com mais intensidade

  • 21

    medida que as cidades se tornam maiores. Em outras palavras, quanto maior o

    tamanho da cidade, maior sua taxa de violncia.

    Se estudarmos o fenmeno com mais profundidade, veremos uma gama

    enorme de fatores ligados ao que poderamos chamar de estado de violncia

    urbana. A primeira pergunta a ser feita : a violncia urbana tem sua origem na

    alta densidade ou est relacionada com o nmero absoluto1 alto de habitantes?

    CASTELLS (1983) d uma viso da dimenso do estado da agressividade

    urbana, baseado na alta densidade, partindo de uma interpretao sociolgica,

    mas no perdendo de vista a origem do comportamento instintivo do homem:

    a densidade refora a diferenciao interna, pois, paradoxalmente, quanto

    mais prximos estamos fisicamente, tanto mais distantes so os contatos sociais,

    a partir do momento em que se torna necessrio s se comprometer

    parcialmente em cada um dos relacionamentos. H portanto uma justaposio

    sem mistura de meios sociais diferentes, o que gera o relativismo e a

    secularizao da sociedade urbana (indiferena a tudo que no esteja

    diretamente ligado aos objetivos prprios de cada indivduo). Enfim, a

    coabitao sem possibilidade de expanso real resulta na selvageria individual

    (para evitar o controle social) e, conseqentemente, na agressividade.

    (CASTELLS, 1983, p. 103)

    O aparente paradoxo verificado na realidade da concentrao X individualizao

    tem sua explicao na caracterstica do homem em voltar-se para si, quando

    esto em jogo interesses que so desenvolvidos por uma sociedade

    extremamente diversificada e especializada, formadora do espao urbano. A

    diversificao das atividades e dos meios urbanos provoca uma forte

    desorganizao da personalidade, o que explica a progresso do crime, do

    suicdio, da corrupo, da loucura, nas grandes metrpoles... (CASTELLS, Op.

    Cit. p. 104).

    Parece que h um consenso entre os estudiosos do espao urbano em relacionar

    a densidade com estados alterados de comportamento. Esses estados esto

    presentes no s quando se tem alta densidade, mas quando o indivduo

    forado a viver isolado, sem a presena fsica de outro indivduo. Nesse caso,

    1 Numero absoluto, neste caso, refere-se a quantidade de habitantes que compem uma cidade, sem levar em conta o nmero de indivduos por uma determinada rea. (N.A)

  • 22

    porm, as psicopatias desenvolvidas no afetam a sociedade, na medida em que

    as reaes de agressividade ou apatia atingem mais o indivduo do que o

    grupo. Quando as psicopatias atingem indivduos ou grupos de indivduos

    vivendo em sociedade, os problemas comeam a aparecer, na medida em que as

    vtimas passam a ser no mais apenas a pessoa afetada, mas toda a sociedade.

    Muitos planejadores urbanos partem da constatao de que as aglomeraes,

    uma vez ultrapassadas determinadas taxas, tornam-se um fator de degradao

    da qualidade de vida do indivduo que habita esses espaos - no caso as cidades

    - e desenvolvem um padro de comportamento que valoriza o individualismo.

    Nas cidades modernas, industrializadas, onde o homem vive sem amigos,

    annimo e s na multido, em permanente estado de stress, toma-se um

    introvertido para aliviar suas tenses. Essa introverso, em forma extrema, d

    origem esquizofrenia. O individualismo acentuado do urbanita, caracterizado

    pelo cada um para si e Deus para todos na desenfreada luta pela vida, , pois,

    uma inevitvel conseqncia do processo de urbanizao. O sonho

    suburbano de morar em casas isoladas, amplas, em locais afastados da cidade

    uma fuga realidade e uma forma de introverso que pode ser o incio de

    uma neurose. Um psiquiatra vienense constatou que seus pacientes neurticos

    desejavam morar em casas isoladas, amplas, em locais arborizados. (FERRAZ,

    1983)

    Baseados apenas nessa premissa, poderamos crer que o simples fato de se ter

    uma densidade mais elevada seria suficiente para estabelecimento de um estado

    alterado do comportamento dos indivduos que fazem parte desse meio. A

    realidade, no entanto, nos mostra que h algo mais interferindo nesse processo,

    posto que densidades elevadas levam ao isolamento do indivduo, mas no

    necessariamente a estados de agressividade e violncia. O estado de violncia

    parece estar mais relacionado chamada sociedade de massa, como refere Ferraz,

    em que a densidade apenas um elemento de um conjunto maior: o

    aglomerado urbano como um todo. Nesse caso o nmero absoluto de

    habitantes de uma cidade o fator mais expressivo;

    O homem das cidades gigantescas, envolvido na massa, no faz parte de uma

    coletividade - pois esta no existe nessas cidades -, mas faz parte da multido

    que nela se forma; o indivduo da massa no tem personalidade e se limita a

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    fazer somente o que a massa espera dele. O homem da cidade grande no tem

    convices, nem se orienta por princpios, mas somente por ideologias

    expressas em slogans difundidos pelos partidos polticos, pelos mercadores,

    atravs dos meios de comunicao de massa. As idias no so suas, nem so

    frutos de reflexes; no visam a um objetivo humano, coletivo, mas, sim,

    individual, de resultados benficos para ele prprio, alis, duvidosos. A

    presena de um contingente numeroso de pessoas desta natureza torna a vida

    urbana intolervel; as pessoas transforma m-se em torturadores monstruosos

    por agirem em nome de grandezas desumanas, sob a alegao de vantagens

    inconcebveis pela razo. O homem urbano torturado, no pelo outro homem,

    mas, sim, pelas relaes desumanas geradas nesses ambientes de

    massa.(FERRAZ, 1994, p 40)

    O ambiente massivo faz com que os valores baseados nos relacionamentos

    pessoais sejam substitudos por outros baseados nos relacionamentos de

    grupos. Como conseqncia, temos a mudana ou o convvio mtuo daquilo

    que a sociologia define como grupo primrio e grupo secundrio

    A Sociologia distingue entre os diversos grupos humanos (grupo de

    brinquedo, vicinal, marginal, gentico, familiar, de presso, funcional,

    profissional, etc.) dois grupos bsicos: primrio ou comunidade e secundrio ou

    sociedade.

    O primeiro um agregado social em nmero relativamente reduzido, cujos

    membros esto intimamente relacionados e que se caracteriza por um intenso

    grau de cooperao e associao...

    ... O grupo secundrio um aglomerado social cujos componentes, em

    elevado nmero, se associam em virtude de interesses comuns. (FERRARI,

    1986)

    No se pode imaginar, porm, que a agressividade e a violncia tenham sua

    origem pura e simplesmente no fato das sociedades se tornarem massivas. Na

    realidade, os grandes aglomerados, como foi visto at agora, apenas

    transformam o indivduo no sentido de torn-lo propenso agressividade. A

    violncia, no entanto, um estado da agressividade caracterizado pelos d