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TEMA: História e memória: questões teóricas e metodológicas Poderíamos iniciar esta discussão argumentando que a Escola dos Annales ao expandir a noção de fontes propondo novas abordagens, novos objetos e novos problemas permitiu, por volta de 1970, inserir nas ciências sociais e humanas o trabalho com a memória, mas nesta inferência não há plausibilidade porque no século XIX Sigmund Freud já iniciara o debate sobre a memória humana a respeito de seu caráter parcial, pois para ele que escolhemos o que nos lembramos. Então onde pautar-se para analisar as questões tangíveis entre história e memória? Primeiro consideremos que o estudo da memória não se restringe à história mas abarca desde a psicologia à biologia; agora observaremos assim como Jacques Le Goff que memória não é história, mas sim um de seus objetos, desta forma não pecaremos por tomar relatos como fatos históricos. O trato com memória exige um grande rigor científico para enquadrar este objeto no campo da História Social e a condição necessária para que a memória (coletiva) torne-se história é descobrir nela o sentido da continuidade, o sentido por trás da memorização que permite ao historiador ir além do que é lembrado. Abordando a obra História e Memória de Jacques Le Goff seguimos uma análise breve da relação entre história e memória que vai do estudo da memória coletiva dos povos sem escrita às condições atuais de memória que estão ligadas a instrumentos cada vez mais complexos. Em sociedades sem escrita observamos que existem depositários da história, pessoas que são responsáveis por manter a coesão do grupo pois a memória também se liga à formação da identidade coletiva. Mas devemos fazer uma observação importante: visto que a transmissão oral é a

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TEMA: Histria e memria: questes tericas e metodolgicas

Poderamos iniciar esta discusso argumentando que a Escola dos Annales ao expandir a noo de fontes propondo novas abordagens, novos objetos e novos problemas permitiu, por volta de 1970, inserir nas cincias sociais e humanas o trabalho com a memria, mas nesta inferncia no h plausibilidade porque no sculo XIX Sigmund Freud j iniciara o debate sobre a memria humana a respeito de seu carter parcial, pois para ele que escolhemos o que nos lembramos.Ento onde pautar-se para analisar as questes tangveis entre histria e memria? Primeiro consideremos que o estudo da memria no se restringe histria mas abarca desde a psicologia biologia; agora observaremos assim como Jacques Le Goff que memria no histria, mas sim um de seus objetos, desta forma no pecaremos por tomar relatos como fatos histricos. O trato com memria exige um grande rigor cientfico para enquadrar este objeto no campo da Histria Social e a condio necessria para que a memria (coletiva) torne-se histria descobrir nela o sentido da continuidade, o sentido por trs da memorizao que permite ao historiador ir alm do que lembrado. Abordando a obra Histria e Memria de Jacques Le Goff seguimos uma anlise breve da relao entre histria e memria que vai do estudo da memria coletiva dos povos sem escrita s condies atuais de memria que esto ligadas a instrumentos cada vez mais complexos.Em sociedades sem escrita observamos que existem depositrios da histria, pessoas que so responsveis por manter a coeso do grupo pois a memria tambm se liga formao da identidade coletiva. Mas devemos fazer uma observao importante: visto que a transmisso oral a fonte da memria nessas sociedades sem escrita, percebemos que a memria transmitida pela aprendizagem no sempre exatamente a mesma mas vai aos poucos se modificando. Portanto a memria coletiva nessas sociedades sem escrita no funciona segundo uma memorizao mecnica mas como uma reconstruo constante.Em seguida Le Goff nos apresenta a transio da oralidade escrita, explicando que o aparecimento da escrita est ligado a uma profunda transformao da memria coletiva e essa transformao permite um duplo progresso com o desenvolvimento de duas formas de memria: a comemorao e o documento, sendo que esta ltima forma (o documento) a escrita se encarrega de duas funes: armazenar informaes e reexaminar, reordenar, reanalisar. Com o surgimento da escrita impressa nasce o leitor que fica diante de uma memria coletiva to extensa que ele j no era capaz de memorizar e fixar tudo. Por um lado isso permitiu a explorao de textos novos e incorporao de novas leituras a uma velocidade muito rpida, mas por outro lado fez com que a memria individual fosse exteriorizada e fixada nas pginas impressas. E esta uma mudana que se torna ainda mais explcita no sculo XX com o desenvolvimento de tecnologias que levam a criao da memria eletrnica. Feitos alguns apontamentos tericos supracitados seria comum pensarmos agora que histria e memria se confundem e que como nota Pierre Nora a histria parece ter-se desenvolvido sobre o modelo da rememorao mas tal assertiva cai por terra porque como diz Le Goff a memria coletiva no somente uma conquista, tambm um instrumento e um objeto de poder e logo observamos que h um elemento inerente a relao entre histria e memria que justamente as relaes de poder que se estabelecem entre o que se quer que esteja na memria coletiva.Partindo da concepo de poder de Michel Foucault trazemos a essa anlise alguns apontamentos crticos de Jean Chesneaux para averiguarmos que a transmisso da memria coletiva atravs da oralidade ou atravs dos mais sofisticados meios eletrnicos se insere num sistema de relaes de poder. Em sua obra Devemos Fazer Tbula Rasa do Passado? Jean Chesneaux nos diz que se o passado conta, pelo que ele significa para ns. Ele o produto de nossa memria coletiva e s por esta afirmao j podemos perceber que h uma real importncia material sobre o que o passado representa para a memria coletiva. Trata-se de uma relao intrnseca no apenas para responder dvidas presentes ou explicar o que houve, a relao entre histria e memria uma relao de poder porque existe uma preocupao em manter a memria popular ao servio do Estado. A memria coletiva no neutra, e quando Chesneaux afirma isso porque compreende que h pessoas, setores e classes especficas interessadas em controlar o presente por meio do passado. O prprio trabalho do historiador oral se insere neste sistema de relaes de poder, no momento em que prima por exteriorizar de sua fonte apenas aquilo que lhe interessa e deixa passar em branco uma srie de outros assuntos ligados memria do entrevistado ele faz um recorte sobre o que lhe interessa e institui uma minscula mas significante relao de poder.