Texto Aula 5

9
UMA ATITUDE REFLEXIVA FILOSÓFICA ACERCA DA EDUCAÇÃO FÍSICA BRASILEIRA: CRÍTICAS E POSSIBILIDADES Sidnei Lopes Dos Santos Junior 1 Resumo: O presente estudo que procura refletir acerca das varias questões que permearam a Educação Física brasileira no ultimo século. A verdade e que desde a fatídica pergunta “o que é educação física” em meio a um cenário de crescente fragmentação desta área, a educação física nunca mais foi a mesma. Envolta em discussões de toda ordem e que surgem desce grandes pensadores de diversas correntes de conhecimento à políticas governamentais ora elitista ora populista, cada qual com um interesse próprio, gerou algumas inquietudes que se traduziram por instaurar ao que parece uma crise de identidade permanente e que portanto abre margem para reflexões polêmicas aqui apresentadas sobre a relação entre educação física e prática pedagógica, educação física e ciência, educação física e alienação, almejando lançar nesta conjuntura, através de bases filosóficas de discussão críticas O estudo aponta para a necessidade de adoção de posturas e práticas pedagógicas no trabalho docente voltadas para além da pura e simples transmissão de técnicas. É fundamental que realmente a aula de Educação Física se transforme num espaço de discussão e reflexão crítica, onde o respeito a diversidade cultural se estabeleça como trampolim para a consciência, ou seja, pode transformar-se num real complexo educacional capaz de efetivamente possibilitar o desenvolvimento das inúmeras potencialidade humanas de forma critica, reflexiva e portanto consciente. Palavras–chave: Educação Física. Educação. Filosofia. Este estudo caracteriza-se por uma atitude reflexiva filosófica acerca da Educação Física. Queremos, outrossim, encaminhar este estudo dentro de uma abordagem critico- reflexiva, enfocando os vários e complexos fenômenos que envolvem a Educação Física brasileira, que salvo raras e oportunas exceções, são marcadas, pelo academicismo e por posturas e políticas educacionais equivocadas, ingênuas quando não populistas. 1 Professor de Educação Física, especialista em Ciência do Movimento Humano, sub-área Pedagogia do Movimento Humano e Mestrando em Educação PPGE/CE/UFSM. e-mail: [email protected] .

description

filosofia do ensino de educação física na escola e universidade.

Transcript of Texto Aula 5

  • UMA ATITUDE REFLEXIVA FILOSFICA ACERCA DA EDUCAO FSICA

    BRASILEIRA: CRTICAS E POSSIBILIDADES

    Sidnei Lopes Dos Santos Junior1

    Resumo:

    O presente estudo que procura refletir acerca das varias questes que permearam a Educao

    Fsica brasileira no ultimo sculo. A verdade e que desde a fatdica pergunta o que

    educao fsica em meio a um cenrio de crescente fragmentao desta rea, a educao

    fsica nunca mais foi a mesma. Envolta em discusses de toda ordem e que surgem desce

    grandes pensadores de diversas correntes de conhecimento polticas governamentais ora

    elitista ora populista, cada qual com um interesse prprio, gerou algumas inquietudes que se

    traduziram por instaurar ao que parece uma crise de identidade permanente e que portanto

    abre margem para reflexes polmicas aqui apresentadas sobre a relao entre educao fsica

    e prtica pedaggica, educao fsica e cincia, educao fsica e alienao, almejando lanar

    nesta conjuntura, atravs de bases filosficas de discusso crticas O estudo aponta para a

    necessidade de adoo de posturas e prticas pedaggicas no trabalho docente voltadas para

    alm da pura e simples transmisso de tcnicas. fundamental que realmente a aula de

    Educao Fsica se transforme num espao de discusso e reflexo crtica, onde o respeito a

    diversidade cultural se estabelea como trampolim para a conscincia, ou seja, pode

    transformar-se num real complexo educacional capaz de efetivamente possibilitar o

    desenvolvimento das inmeras potencialidade humanas de forma critica, reflexiva e portanto

    consciente.

    Palavraschave: Educao Fsica. Educao. Filosofia.

    Este estudo caracteriza-se por uma atitude reflexiva filosfica acerca da Educao

    Fsica. Queremos, outrossim, encaminhar este estudo dentro de uma abordagem critico-

    reflexiva, enfocando os vrios e complexos fenmenos que envolvem a Educao Fsica

    brasileira, que salvo raras e oportunas excees, so marcadas, pelo academicismo e por

    posturas e polticas educacionais equivocadas, ingnuas quando no populistas.

    1Professor de Educao Fsica, especialista em Cincia do Movimento Humano, sub-rea Pedagogia do Movimento Humano e Mestrando em Educao PPGE/CE/UFSM. e-mail: [email protected].

  • J aqui podemos salientar o entendimento da Educao Fsica, como um prtica

    pedaggica, concordando assim com Bracht (1999) e Libneo (2001). Segundo Libneo

    (2001) se a Educao Fsica no tiver esse carter pedaggico ela incua enquanto prtica

    educativa intencional. O mesmo autor elucida este ponto ao afirmar que a educao, as

    prticas educativas, a ao, os processos de formao das pessoas, a pedagogia a reflexo

    e deciso sobre essa ao para definir objetivos e formas de realizar o trabalho educativo.

    Como a educao refere-se a assimilao e reconstruo da cultura, a pedagogia lida com tudo

    o que diz respeito transmisso e assimilao de saberes e modos de ao, como so os

    conceitos, os cdigos, as tcnicas, as habilidades, as atitudes, os valores.

    Se temos saberes, modos de agir, modos de fazer, atitudes em relao motricidade,

    ao corpo, ao desenvolvimento fsico, a serem internalizados pelas pessoas, ento posso falar

    de uma educao fsica e de uma pedagogia da educao fsica ou da dimenso pedaggica da

    educao fsica. Este modo de compreender a dimenso pedaggica da Educao Fsica

    apoia-se na idia de que a escola um lugar em que os alunos aprendem a desenvolver a

    razo crtica e a se construrem como sujeitos autnomos e crticos (Libneo, 2001).

    Por outro lado, constata-se que a alienao consiste num importante obstculo a ser

    superado quotidianamente, pois de certa forma, ope-se ao pensamento crtico-reflexivo e a

    conscincia individual, se baseando numa relao acritica fora da realidade numa concepo

    de mundo ocasional e desagregada. Caracteriza-se portanto, pela sua adeso total e sem

    restries a uma concepo de mundo fragmentada incompreendida e elaborada fora dele

    prprio, que se realiza num conformismo cego e numa obedincia irracional a princpios e

    preceitos indemonstrveis (Codo, 1985).

    Em contra partida, tem-se uma concepo de mundo unitria, coerente e homognea

    formada de uma maneira crtica e consciente, num processo critico-reflexivo, questionador da

    realidade. Esclarecendo esta discusso, Chau (2001), identificou na sociedade moderna a

    existncia de pelo menos trs formas bsicas de alienao: a social, a econmica e a

    intelectual. Num esforo de aproximao destas ao contexto da Educao Fsica encontramos

    as mesmas sem maiores dificuldades, principalmente a alienao social, na qual os docentes e

    discentes no se reconhecem como construtores das relaes e instituies scio-polticas. Da

    mesma forma existe alienao intelectual, que resulta da separao social entre o trabalho

    material e o trabalho intelectual, evidenciada com maior significncia no corpo docente, onde

    o taylorismo aliado ao positivismo fragmentou o mesmo em departamentos, e mais adiante

    em laboratrios. Sendo que a principal conseqncia do taylorismo a fragmentao do

    trabalho que conduz a uma fragmentao do saber, e em funo desse processo de

    2

  • especializao no tardou a instalar-se no seio da Educao Fsica brasileira um "dialogo de

    surdos" (Bracht, 1999) e um isolamento tanto da realidade como do conhecimento.

    Interessante observar que, apesar da flagrante necessidade de mediao e entre os

    saberes disciplinares no campo da Educao Fsica, os especialistas nas diferentes

    subdisciplinas do nosso campo no conseguem dialogar a partir de sua especialidade com

    outra (Bracht, 1999). As razes que nos faz indagar estas contradies e incoerncias e

    apontam para a dificuldade que a maioria dos acadmicos e professores tem de "ler o mundo"

    a sua volta ( na tica de Paulo Freire), ir do fragmentado ao holstico, da alienao

    conscincia filosfica, do senso comum autonomia crtica de pensamentos, ou seja, no

    conseguimos ter uma viso crtica da realidade, do todo universal, indissolvel e

    indissocivel, mas apenas de suas dependentes e alienantes partes.

    Nesse sentido, somos conduzidos a um processo ingnuo de alienao que atinge o

    campo social, pessoal e do trabalho, talvez pela nossa j denotada incapacidade de refletir e

    criticar as intenes, as atitudes, as decises vivenciadas e/ou tomadas por ns durante o

    processo de formao acadmica.

    Nessa perspectiva, poucos acadmicos conseguem romper a barreira do senso comum

    e avanar at a autonomia crtica de pensamentos, e isto me leva a crer que "muitos" de ns

    no se preocupam em construir uma conscincia filosfica que permita-lhes, ao menos, serem

    crticos sem serem incoerentes com suas aes e concepes de educao, sade, escola,

    sociedade, cultura, poltica e de mundo.

    Segundo Mochcovictch (1988) para passar da conscincia ocasional e desagregada

    para a conscincia coerente e homognea preciso criticar as concepes que se tem, partindo

    da conscincia daquilo que somos e chegando a conscincia social.

    Voltando ao senso comum, Gramsci apud Mochcovictch (1988) diz que ele a

    filosofia dos no-filsofos, isto , a concepo de mundo absorvida acriticamente pelos

    diferentes meios sociais e culturais, em que se desenvolve a individualidade, pois no se

    baseia numa reflexo crtica, numa interrogao.

    E porque to poucos estariam preocupados em se constiturem em sujeitos crticos e

    conscientes, a luz filosofia? As respostas a esta indagao so amplas e complexa, mas

    analisando-a de perto, ela parece flutuar entre o campo dos conhecimento relacionados ao

    "ser" e ao do "ter", estabelecendo a seguinte relao na atual conjuntura da sociedade

    capitalista: quanto mais ns preocupamos em "termos", menos preocupamos em "sermos" ou

    seja, hoje cada vez mais somos levados pela lgica do mercado a primeiro "termos" e aps,

    que sabe, "sermos". O "ser" aqui enfocado constitudo por saberes filosficos, sociolgicos,

    3

  • antropolgicos e histricos. Que via de regra, na sociedade atual, por razes econmicas

    obvias, so tidos para "muitos" como conhecimentos "inteis", de pouca valia, pois no do

    um bom retorno material. Ao passo que o "ter", composto pelas cincias positivas que

    segundo Santin (2002) "dispensam a reflexo filosfica por entend-la com uma atividade

    estril, improdutiva e por vezes incmoda e intil" encontra-se em uma situao privilegiada,

    confortvel, cmoda, hegemnica, ideolgico e extremamente "til", sendo o influenciador

    determinante de uma sociedade capitalista excludente, marcada por significativas desiguales

    sociais, econmicas e sobretudo de saberes. Sendo assim, interessante! para "poucos" e

    alienante! para "muitos".

    Recorrendo-se Chau (2001) a mesma nos ensina que o primeiro ensinamento

    filosfico justamente perguntar: o que til? Para que e para quem algo til? O que o

    intil? E por que e principalmente para quem algo intil? O senso comum de nossa

    sociedade considera til o que d e/ou representa simbolicamente prestgio, poder, fama,

    riqueza e poder nas relaes sociais. Julga o til pelos resultados quantificveis e visveis das

    coisas e das aes, identificando utilidade e a famosa expresso "levar vantagem em tudo".

    Desse ponto de vista, a filosofia inteiramente intil e defende o direito de ser intil (Chau,

    2001).

    A autora indaga ento, qual seria a utilidade da Histria, da Sociologia e sobretudo

    da Filosofia? Se abandonar a ingenuidade e os preconceitos do senso comum for til; se no

    se deixar guiar pela submisso s idias dominantes e aos poderes estabelecidos for til; se

    buscar compreender a significao do mundo, da cultura, da histria for til; se conhecer o

    sentido das criaes e aes humanas nas artes, nas cincias e na poltica for til; se dar a cada

    um de ns e nossa sociedade os meios para serem conscientes de si e de suas aes numa

    prtica que deseja a liberdade, a eqidade e a felicidade para todos para todos for til, ento

    podemos dizer que a Filosofia o mais til de todos os saberes de que os seres humanos so

    capazes.

    Entretanto, Saviani (1996) adverte que "passar do senso comum conscincia

    filosfica significa passar de uma concepo fragmentria, incoerente, desarticulada,

    implcita, degradada, mecnica, passiva e simplista a uma concepo unitria, coerente,

    articulada, explcita, original, intencional, ativa e cultivada". Para passar da conscincia

    ingnua e desagregada para a conscincia coerente e homognea preciso criticar a

    concepes que se tem, partindo da conscincia daquilo que somos e chegando conscincia

    do que podemos "ser."

    4

  • Santin, (1988) refora este aspecto ao afirmar que a conscincia crtica, no uma

    conquista, nem um fato dado, nem um bem adquirido, mas ela uma atitude um

    comportamento que se refazem e se renovam a cada momento. Por isso mais do que "ter"

    conscincia crtica, preciso "ser" conscincia crtica. Portanto, "ser" conscincia crtica no

    fixar-se em uma perspectiva, mas mergulhar no movimento que conduz a estabelecer vrias

    e distintas relaes e direes. Entendendo-a como uma eterna inquietude de quem no quer

    repetir-se, de quem no quer ser sempre o mesmo, de quem quer evoluir nas mais variadas

    formas de conhecimentos e sentimentos.

    Diante do exposto, destaca-se neste processo, a indubitvel importncia da educao.

    E cabe entend-la no como um processo passivo e autoritrio de fragmentao e transmisso

    de conhecimento e, portanto da realidade social, mas como um instrumento pedaggico de

    conscientizao, reflexo, crtica, indagao e claro curiosidade, realando sempre a

    importncia dos porqus de certas iniciativas, leis e reivindicaes, pois na opinio de Freire

    (1996) a raiz da educao consiste basicamente em oportunizar ao ser humano a reflexo

    sobre si mesmo e colocar-se, num determinado momento, numa certa realidade: um ser na

    busca constante de ser mais e, como pode fazer esta auto-reflexo, pode descobrir-se como

    um ser inacabado, que esta em constante de busca.

    Neste momento, oportuno lembrar que estranhamente a Educao Fsica no est

    ainda atrelada de fato a rea da educao, mas sim a rea da sade que etimologicamente

    consiste em um erro. No entanto, os conhecimentos desenvolvidos curricularmente nas

    instituies de ensino superior fazem jus a tal vinculao, pois os mesmos no so oriundos

    na sua imensa maioria, nem da educao e muito menos da Educao Fsica, mas da fsica,

    bioqumica, medicina e outras reas de produo conhecimentos. O que importante ressaltar

    aqui que o campo da Educao Fsica historicamente tem sido marcado menos como um

    campo de construo do conhecimento, e mais como aplicao do conhecimento (Bracht,

    1999).

    O mesmo autor, exterioriza suas preocupaes e coloca um ponto que julgo ser

    importante, ele nos mostra que no campo da Educao Fsica, no tocante produo de

    conhecimento cientfico, surgiram os especialistas, no em Educao Fsica , mas, em

    fisiologia do exerccio, em biomecnica, em psicologia do esporte, em aprendizagem motora,

    em sociologia do esporte, etc. Neste contexto, o mesmo autor argumenta que os professores

    de Educao Fsica , enquanto "cientistas", passaram a se identificar como especialistas em

    fisiologia, em biomecnica, etc. E no em Educao Fsica. Entretanto, a fisiologia do

    exerccio, a biomecnica e etc, continuam sendo reas de conhecimentos importantes na

    5

  • investigao da atividade fsica se houver uma perspectiva de mudana para no priorizar

    investigaes isoladas e fragmentadas do conhecimento, distanciadas da interdisciplinaridade

    e de problemas relevantes.

    Com a sua privilegiada e impar capacidade de elaborar analogias e metforas Rubem

    Alves (2000, p. 31), opina a sobre

    Acho que a educao freqentemente cria antas: pessoas que no se atrevem a sair das trilhas aprendidas, por medo da ona. De suas trilhas sabem tudo, os mnimos detalhes, especialistas. Mas o resto da floresta permanece desconhecido (...).

    A anta descrita por pelo autor um animal apetitoso, sem defesas e presa fcil para as

    onas. Contra a ona ela s dispe de uma arma: estabelece uma trilha pela floresta, e dela

    no se afasta. Este caminho passa por baixo de um galho de rvore, rente s suas costas.

    Quando a ona ataca ela sai em desabalada corrida por sua trilha. Seu corpo passa por baixo

    do galho, mas o da ona no. E assim, a anta consegue fugir com ferimentos, mas viva dessa

    embosca feita pelo desconhecido.

    Considerando-se estas afirmaes, pensa-se que apesar de diversos pensadores

    alertarem que a histria a mestra da vida, poucas pessoas despendem tempo, ateno e a

    preocupao merecida e necessria para o seu entendimento. E em se tratando de Educao

    Fsica a situao ainda mais complexa, pois alm de estud-la, principalmente temos que

    "re" signific-la a ponto construir e/ou consolidar uma identidade pedaggica consistente e

    sobretudo coerente com a realidade da educao brasileira. Superando assim, o entendimento

    de v-la subordinada ao eixo paradigmtico da aptido fsica, compreenso essa arcaica e

    limitada.

    Nesse particular, urge chamarmos a ateno de nossa academia, muito mais

    preocupada com as formalidades do rigor cientfico, banalizando-o, do que com a imperiosa

    necessidade de interveno qualificada e conseqente na nossa realidade educacional, abrindo

    e preservando espaos de debate e reflexo crtica em torno das questes nela presentes

    (Castellani Filho, 1998).

    Dentro da conjuntura atual da Educao Fsica, enquanto uma prtica pedaggica, a

    mesma apresenta-se fortemente fundamentada e teoricamente valorizada por grandes

    pensadores e educadores, sendo ainda amparada por legislao especfica. Entretanto,

    evidencia-se que entre a palavra escrita, o discurso e a situao concreta de seu ensino,

    incoerncias, interpretaes ingnuas e errneas, ou at mesmo o desconhecimento se

    6

  • interpe. Em outras palavras, no mbito das cincias biolgicas e esportivas que os

    profissionais da rea vm buscando o saber necessrio s suas prticas pedaggicas.

    No Brasil, a Educao Fsica ainda no recebeu o tratamento adequado face a sua

    denotada importncia no processo sociocultural, fruto de uma histria marcada em sua

    maioria por uma total ou parcial ausncia de conscincias crticas capazes de coibir a

    manipulao de seus fins atravs de polticas pblicas educacionais ditadoras que objetivavam

    o controle e a dominao social, bem como a mercantilizao da educao como um todo.

    A Educao Fsica no incio desse sculo traduz a incapacidade histrica dessa rea de

    conhecimento para perceber e aprender as novas demandas sociais que emergem ao longo do

    tempo, devido forte rigidez dos paradigmas da Educao Fsica conservado.

    Na verdade, a atual Educao Fsica representa a sociedade brasileira, que tenta definir

    novos pressupostos que possibilitem articular os interesses, no de uma minoria privilegiada,

    mas de uma maioria excluda. Nesta conjuntura, no mais compatvel que o intelectual

    mantenha uma postura de alienamento completo com relao a sociedade.

    Querendo encaminhar finalizao deste texto, na perspectiva apontada at este

    momente, cabe a citao de Libneo apud Ghiraldelli Junior (1988) que tambm considera a

    Educao Fsica como uma atividade educativa que ser tanto mais conseqente em relao

    aos seus objetivos poltico-pedaggicos, quanto mais os professores, como intelectuais

    critico-reflexivos, desenvolverem a capacidade de descobrir a todo o instante, na sua prtica

    de vida e trabalho, as relaes sociais reais que esto por trs das tendncias, das tcnicas, dos

    discursos, dos programas de ensino e, por a, dar uma dimenso poltica sua pedaggica.

    Nesse sentido, o mesmo autor destaca que o trabalho docente deve buscar ao invs do

    condicionamento ordem social, formar alunos crticos e participativos, ao invs de

    adestramento fsico, a compreenso sociocultural do corpo, ao invs do esporte-espetculo e

    ufanista, o esporte educativo, ao invs da disciplina imposta e da repetio mecnica e

    autoritria de ordens do professor, o autodomnio, a formao do carter, a autovalorizao da

    atividade fsica, ao invs do corpo-instrumento, o corpo como ser social crtico e consciente.

    Ainda nessa direo, Castellani Filho (1998) aponta que seja na faculdade, no nosso

    local de trabalho (faculdade, escola, clube, administrao pblica...), enfim, seja l onde for,

    devemos estar cientes de que no nosso cotidiano que podemos e devemos construir as

    condies objetivas (na extrapolao dos limites impostos pelas reformas educacional e

    poltica imperantes), tanto para a superao da forma atual de ser da Educao Fsica,

    enquanto (num alargado horizonte) da forma de organizao social brasileira o que, em ltima

    instncia, defendemos e almejamos.

    7

  • Em suma, o trabalho do professor de Educao Fsica como vai alm da pura e simples

    transmisso de tcnicas. fundamental que realmente a aula de Educao Fsica se

    transforme num ambiente crtico, onde a riqueza cultural se estabelea como trampolim para a

    conscincia. Ou seja, a Educao Fsica dever deixar de ser uma prtica incua, para

    transformar-se num real complexo educacional capaz de efetivamente oportunizar o

    desenvolvimento das inmeras potencialidade humanas de forma critica, reflexiva e portanto

    consciente.

    Dentro desse quadro, cabe perguntar, porm, longe de dar por inteiramente

    respondidas s questes aqui levantadas. Quem vai assumir o papel de ser o cultivador,

    semeador e alimentador de curiosidade e criticidade, de que a Educao Fsica brasileira tanto

    necessita? Olhando mais de perto, suspeito que comecemos, talvez, a priori pelo exerccio

    continuado da autoconscincia critico-filosfica, para a posteriori lev-la at o senso comum,

    "extraindo o seu ncleo vlido (o bom senso)" (Saviani, 1996), com vistas elaborao e

    consolidao de uma concepo pedaggica de Educao Fsica impregnada de paradigmas

    socio-humanos, identidade, autonomia e reflexo. Oportunizando a construo de

    conscincias, capazes de construir outras, novas e necessrias perspectivas educacionais.

    "Nem tudo o que se enfrenta pode ser modificado. Mas nada pode ser modificado at

    que se enfrente".

    James Baldwin

    Referncias bibliogrficas

    ALVES. Rubem; A alegria de ensinar. Campinas: Papirus, 2000.

    BRACHT, V. Educao Fsica e Cincia: cenas de um casamento (in)feliz. Iju: Uniiju,

    1999.

    CASTELLANI FILHO, Lino; Poltica educacional e Educao Fsica. Campinas: Autores

    Associados; 1998.

    CODO, Wanderley. O que alienao. So Paulo: Brasiliense, 1985.

    CHAU, Marilene, Convite Filosofia. , 12ed, So Paulo: tica, 2001.

    FREIRE, Paulo, Pedagogia da autonomia: saberes necessrios prtica educativa. 20 ed.

    So Paulo: Paz e Terra, 1996.

    GHIRALDELLI JUNIOR. P. Educao Fsica Progressista: a pedagogia crtico-social dos

    contedos e a Educao Fsica Brasileira. So Paulo: Edies Loyola, 1988.

    8

  • LIBNEO, Jos Carlos. A dimenso pedaggica da educao fsica: questes didticas e

    epistemolgicas. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CINCIAS DO ESPORTE, XII.,

    2001, Caxambu, MG. Sociedade, cincia e tica: desafios para a educao fsica/cincias do

    esporte. Anais... Caxambu, MG: DN CBCE, Secretarias Estaduais de Minas Gerais e So

    Paulo, 2001.

    MOCHCOVITCH, L. G. Gramsci e a Escola. So Paulo: tica, 1986.

    SANTIN, Silvino, Pelos Caminhos do Pensamento Crtico: universidade e sociedade. Santa

    Maria: UFSM/CCSH, 1988.

    ______, Textos Malditos: Porto Alegre: Est edies, 2002.

    SAVIANI, Demerval, Educao: do sendo comum conscincia filosfica. 12 Ed

    Campinas: Ed. Autores Associados, 1996.

    9

    UMA ATITUDE REFLEXIVA FILOSFICA ACERCA DA EDUCAO FSICA BRASILEIRA: CRTICAS E POSSIBILIDADESResumo:Referncias bibliogrficas