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 VISÕES DE LUZ O PENSAMENTO DE ARQUITETOS MODERNISTAS SOBRE O USO DA LUZ NA ARQUITETURA Autor: Ladislão Pedro Szabo Trabalho apresentado como requisito para a obtenção do título de mestre em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Mackenzie, sob a orientação do Professor Dr. Paulo Julio Valentino Bruna. São Paulo, outubro de 1995.

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VISÕES DE LUZ

O PENSAMENTO DEARQUITETOS MODERNISTAS

SOBRE O USO DA LUZ NAARQUITETURA

Autor: Ladislão Pedro Szabo

Trabalho apresentado como requisito para a obtenção dotítulo de mestre em Arquitetura e Urbanismo pelaUniversidade Mackenzie, sob a orientação do Professor Dr.Paulo Julio Valentino Bruna.

São Paulo, outubro de 1995.

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Sumário

Resumo......................................................................................................................... 04

I) Problemas pesquisados e objetivos.................................................................. ..... 05

•  Fundamentação teórica............................................................................................ 08•  Métodos .................................................................................................................. 17

II) A luz suave de Wright........................................................................................... 21

•  Natureza e luz.......................................................................................................... 22•  A caixa..................................................................................................................... 24•  A luz orgânica.......................................................................................................... 25•  O novo instrumento.................................................................................................. 29• 

A luz nas obras......................................................................................................... 32

III) A luz racional de Gropius.................................................................................... 40

•  Conjuntos operários................................................................................................. 41•  A luz racional........................................................................................................... 42•  Os novos conjuntos.................................................................................................. 43•  Cortina de vidro........................................................................................................ 45•  Luz dinâmica............................................................................................................. 46•  As idéias na prática: a fábrica Fagus......................................................................... 47•

 

O pavilhão da Werkbund.......................................................................................... 48•  O edifício da Bauhaus.............................................................................................. 49

IV) A luz poética de Le Corbusier............................................................................. 51

•  A cidade radiosa...................................................................................................... 51•  Projetando a luz....................................................................................................... 52•  Reinterpretando a história........................................................................................ 52•  Formulando propostas............................................................................................. 53•  Janelas...................................................................................................................... 54•  Teoria na prática....................................................................................................... 55• 

Reviravolta .............................................................................................................. 56•  As primeiras obras.................................................................................................... 56•  Vila Savoye.............................................................................................................. 59•  Edifícios................................................................................................................... 59•  Depois da Segunda Guerra....................................................................................... 62•  Ronchamp..................................................................................................….......... 63•  La Tourette.............................................................................................................. 64•  Claro – escuro……………………………………………………………….......... 66

V) Louis Khan: silêncio e luz..................................................................................... 67

•  Espaço e luz............................................................................................................. 67•  Estrutura e luz.......................................................................................................... 68

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•  A luz como definidora de espaços.......................................................................... 68•  Silêncio e Luz.......................................................................................................... 70•  Da teoria à prática.................................................................................................... 72•  Em busca das qualidades da luz: Igreja Unitária de Rochester................................ 74•  Painéis anti-ofuscantes............................................................................................. 76• 

Filtros....................................................................................................................... 78•  Museu Kimbell.......................................................................................................... 80•  Silêncio e Luz: sinagoga Hurva................................................................................. 81•  A difusão da luminosidade moderna......................................................................... 82 

VI) Outros arquitetos................................................................................................... 83

6.1 Alvar Aalto............................................................................................................... 836.2 MIES e a cortina de vidro........................................................................................ 846.3 Luis Barragan............................................................................................................ 856.4 A geração pós-khantiana........................................................................................... 866.5 Tadao Ando............................................................................................................... 87

VII) O uso da luz depois dos modernos..................................................................... 88

7.1 O exemplo de Álvaro Siza....................................................................................... 88•  Influência............................................................................................................ 88•  Depoimento........................................................................................................ 89•  A arquitetura da transformação.......................................................................... 91•  A luz metamorfoseada........................................................................................ 92•  Primeiras obras.................................................................................................... 94•

 

Casa Beires......................................................................................................... 97•  Zenitais.............................................................................................................. 98•  Fau Porto........................................................................................................... 100

VIII) Algumas conclusões sobre a luz dos modernos............................................... 101

•  Algumas conclusões................................................................................................ 103•  Aberturas ................................................................................................................. 105•  Interior / Exterior..................................................................................................... 105•  Qualidade da luz...................................................................................................... 107•  Transparência ......................................................................................................... 108• 

Simbologia .............................................................................................................. 110

IX) Críticas à luz dos modernos................................................................................. 115

•  Quantidade x qualidade........................................................................................... 115•  Desconsideração do contexto.................................................................................. 116•  Simplismo ............................................................................................................... 117•  A crítica de Wright................................................................................................... 118•  A influência de Kahn................................................................................................. 118•  Moore........................................................................................................................ 119

• 

Alexander.................................................................................................................. 122

Bibliografia ................................................................................................................... 127

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Resumo

A luz, como componente do projeto arquitetônico, ultrapassa a questão meramentehigienicista, quantitativa, contribuindo com suas características e qualidade intrínsecas na criação

do espaço. Dessa forma, o uso da luz em arquitetura varia de acordo com escolas e épocas, o queatesta sua importância e elemento distintivo.

Como quatro arquitetos do movimento moderno – Wright, Gropius, Le Corbusier, Kahn– pennsaram a luz?

A introdução visa situar historicamente a luz do modernismo. A seguir, quatro capítuloschave esmiuçam o pensamento dos arquitetos escolhidos: o primeiro, sobre a luz suave de FrankLloyd Wright; o segundo, sobre a luz racional de Walter Gropius; o terceiro, sobre a luz poética deLe Corbusier e, o quatro, sobre o silêncio e a luz de Louis Kahn. Cada capítulo é composto pelarecomposição de pensamento do arquiteto sobre o uso da luz, baseado em seus escritos esparsos epor uma análise de suas obras mais significativas que mostrem na prática este pensar. A utilizaçãode fontes primárias e o trabalho comparativo, ilustrado com inúmeros esquemas gráficos e imagens,resulta num panorama de largo espectro sobre a questão.

O trabalho encerra com uma análise dessa influência na arquitetura que se seguiu aquelados mestres do movimento moderno, em particular nas obras de Alvaro Siza, além de um panoramacrítico sobre o pensamento modernista do uso da luz.

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I) PROBLEMAS PESQUISADOS E OBJETIVOS

Ouçam o bater de asas da primavera vocês também estão leves para voar.

O brilhar de novas estrelas no céu traz a descoberta

de novas ilhas e caem como pesadas folhas de uva

os sinais de luz de um sonho realizado.

 Lajos Kassák.

Sabemos, vemos que é a aurora, e um novo mundo nasceu.

 Mihály Babits

O uso da luz sempre é apontado por arquitetos ou teóricos de arquitetura como um doosprincipais componentes do projeto arquitetônico. Le Corbusier, sem dúvida, um dos maisimportantes do século, chega a definir a arquitetura em frase célebre como o “jogo sábio, correto emagnifico dos volumes reunidos sob a luz”.

Ao se propor um estudo sobre o pensar da luz na arquitetura logo se poderia supor quese pretende fazer um trabalho sobre quantidade necessária de luz, índices de ofuscamento, níveis deiluminamento, método dos lúmens, diagramas polares, isto é, sobre os instrumentos daluminotécnica. Ora, este trabalho não pretende se debruçar sobre a física aplicada da luz.

Pretende sim estudar a visão empírica dos arquitetos sobre o uso da luz, isto é, comopensam o uso da luz, onde a observação e a experiência desses pesam mais que fórmulas físicas,pois estas indicam apenas quantidades necessárias, enquanto a conceituação arquitetônica leva a

construção do espaço através da luz. Em A chama de uma vela Bachelard coloca a isso em palavrasinesperadas: “no caso da luz branca, a ordem moral vem primeiro que a ordem física. (...) a chamanão é mais um objeto de fatos para entrar no reino de uma física de valores” (Bachelard, 1989,pp.36-37). Ousando mais, pode-se dizer que a luz cria uma poética do espaço, ou como diria LouisKahn: “com a ajuda da luz, um instrumento dos mais poderosos, é o resultado lógico da construçãoou o uso apropriado do material de construção; em outros tempos construções ilógicas e artificiaistêm sido projetadas para se obter bons efeitos de luz” (Kalff, 1971, p. 51). Tanto Kahn como Kalfffalam relacionam à luz a idéia do ‘espaço vivo’. Ao se aprofundar nesse pensamento, o presentetrabalho se aproxima de uma estética da luz.

Um paralelo entre arquitetura e poesia talvez explique melhor esta questão. Octavio Pazem seu livro O arco e a lira (1982, p.15) coloca que a poesia é uma operação capaz de criar, revelare transformar o mundo. A unidade da poesia, porém só pode ser apreendida “através do tratodesnudo com o poema”. Mas quantas vezes não se confunde poesia com poema? Paz explica: “nemtodo o poema” (...). Um soneto não é um poema, mas uma forma literária, exceto quando essemecanismo retórico – estrofes, metros e rimas foi tocado pela poesia. Há máquinas de rimar, masnão de poetizar Por outro lado, há poesias sem poemas; paisagens, pessoas e fatos podem serpoéticos (...). Quando passivo ou ativo, acordado ou sonâmbulo – o poeta é o fio condutor etransformador da corrente poética, estamos na presença de algo radicalmente distinto: uma obra.Um poema é uma obra no poema a poesia se recolhe e se revela plenamente (...). O poema não éuma forma literária, mas o lugar de encontro entre a poesia e o homem. O poema é um organismoverbal que contém, suscita. Forma e substância são a mesma coisa (Paz, 1982,pp.16-17).

Assim como nem todo poema “construído sob as leis da métrica” contém poesia, nemtoda edificação construída com as leis da física contém poesia, pois se a poesia é uma operação decriar, revelar e transformar o mundo, consegue-se poesia, na edificação, por meio da luz. Um

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pavimento tipo pode ser muito bem modulado, com todos os pilares corretamente colocados, assimcomo os dutos e as maçanetas das portas, mas será amorfo, se a luz não der vida e poesia a esteespaço. Então esse espaço, iluminado, se transforma em uma obra, como diz Octávio Paz. Aarquitetura é uma construção poética da luz, onde a luz revela a poesia do espaço para o homem, oucomo diz Bachelard (1989, p.11), “a chama determina a acentuação do prazer de ver, algo além do

sempre visto. Ela nos força a olhar”.Fazer um estudo físico do uso da luz ou compêndio luminotécnico seria como fazer um

trabalho sobre estrofes, métrica e rimas. Voltando ao raciocínio de Paz: “técnica e criação, utensílioe poema são realidades distintas. A técnica é um procedimento e vale na medida de sua eficácia,isto é, na medida em que é um procedimento susceptível de aplicação repetida: seu valor dura atéque surja um novo processo” (p.20), isto é, o carro substitui a carroça, a lâmpada a vela, aslâmpadas de nova geração as anteriores. Mas a Eneida não substitui a Odisséia, Shakespeare nãosubstitui Dante, a obra de Corbusier não substitui a de Wright, nem a de Kahn substitui a deCorbusier. “Cada poema é um objeto único”, que pode servir de referência para outras criações, eentão se diz que tal obra foi feita no “estilo de”, ou à “maneira de”, porém “o estilo é o pnto departida de todo projeto criador; por isso mesmo, todo artista aspira a transcender esse estilo comum,

ou histórico (...). Os estilos nascem, crescem e morrem. Os poemas permanecem, e cada um delesconstitui uma unidade auto-suficiente, um exemplar isolado, que não se repitirá jamais” (Paz, 1982,p.27), nas que poderá ser gerador de novas poesias, ou de novas arquiteturas.

Apesar da importância da luz Ter sido sempre apontada, seu uso na arquitetura pouco foiestudado. É claro que existe um sem número de manuais técnicos que a estudam sob o aspectoquantitativo, isto é, físico. Porém, como elemento de composição arquitetônica, não. No decorrer dahistória da arquitetura, poucos arquitetos abordaram teoricamente a questão. Vitrúvio é o primeiroarquiteto, ao que se sabe, que escreveu um pouco nos seus Dez livros sobre a arquitetura:“Precisamos atentar para que todos os edifícios sejam bem iluminados. (...) portanto nós devemosaplicar o seguinte teste. Do lado do qual a luz deve ser obtida, estique uma linha do alto da paredeque supõe-se obstruirá a luz até o ponto onde a luz entrará, e se uma parte considerável do céu

aberto pode ser vista quando se olha por sobre aquela linha, não haverá obstruções para a luznaquela situação” (apud Yan-Yung, 1989,p.293).

O tratado de luz de Leonardo da Vinci foi “talvez o pioneiro em estudar luz em termosespaciais e proporcionais. O desenvolvimento da concepção de luz, não como símbolo da luz deDeus que tudo ilumina, como os medievais gostavam de colocar, mas como engrandecimento dosentido da vida no Renascimento em si era a locomotiva atrás de sua filosofia de luz” (Yan-Yung,1989, p.294).

Palladio, no seu famoso l quatro libri dell’architettura, editado em Veneza o ano de1570, escreve pouco sobre o assunto, dizendo que “não se pode dar regras precisas e seguras (...)sobre altura e largura. (...) as janelas não devem ser mais largas que a Quarta parte da extensão dos

quartos, ou mais estreitas que a Quinta parte, e em altura devem Ter dois quadrados e a sexta partede sua extensão” (Palladio, 1982, p. 72-73).

Neste século, poucos textos sistemáticos surgiram sobre a questão. Alguns devem serdestacados por muito influenciaram o autor na escolha do assunto deste trabalho. O arquitetoholandês L. C. Kalff, que trabalhava no departamento de luminotécnica da Philips em Eindhoven,lançou em 1971 o livro Creative light, em que estudou as relações entre luz natural e luz artificial:“...outros efeitos dinâmicos que podemos obter com a ajuda da luz. Neste aspecto devemosmencionar uma teria publicada em 1918 em um livro chamado plastik und Raum pelo professorBrinkmann. Ele diz que os interiores de edifícios monumentais produzem seu principal efeitoatravés das sucessivas impressões que o espectador recebe ao entrar e passar pelos diferentesespaços”.

“Por exemplo, pode-se entrar no edifício por um hall alto e espaçoso e depois,continuando através de um corredor mais baixo e mais estreito, chegar a um lugar amplo oposto aocorredor em ângulo reto, no fim do qual o olho pode perambular para o alto através de um espaço

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central alto e circular, coberto por um domo e ampliado por nichos que interrompem as paredes”.

“Para se poder analisar esta sucessão de impressões especiais, ele sugeriu uma novaidéia, a Raumkurve (curva do espaço) – linha que se pode desenhar em planta e corte, indicando ascurvas dos nossos olhos (e também da mente) seguem ao cruzar a edificação. Nós sempreacreditamos que essa Raumkurve pode nos ajudar consideravelmente para analisar e apreciar

interiores monumentais”.“Podemos com ela descrever os efeitos dinâmicos que o arquiteto obtém e o que

experimentamos ao caminhar através de uma sucessão de espaços diferentes. Adentramos por umaentrada relativamente pequena, onde nosso olho se acomoda à escuridão relativa; depois vamos paraum espaço mais largo e mais brilhante, e logo em seguida estamos de novo fechados em um longo eestreito corredor; e finalmente experimentamos uma sensação de libertação em hall central alto elargo”.

“É com certeza o que o arquiteto almejava quando fez o projeto. Nós gostaríamos deapontar que esta sucessão de impressões terá um efeito ainda maior se a luz e a cor em diferentesespaços seguir a trilha da Raumkurve: espaços amplos, muita luz; espaços menores, menos luz,

oferecendo assim maior ênfase à composição espacial. De novo é um refinamento do uso da luz emedifícios que nós podemos chamar de ‘arquitetura da luz’.”

“Esse termo foi inventado em 1920 pelo professor Teichmuller da LichttechnischesInstitut in Stuttgart. É um termo sugestivo, logo obtendo uso geral, mas na nossa opinião, de umamaneira equivocada”, pois geralmente o termo era utilizado para definir uma tendência nadecoração de interiores, o uso de pilares, bordar e paredes de vidro translúcido com luz embutidapor trás, mas que pouca relação tinha com a arquitetura do edifício. (Kalff, 1971, p.43).

Outro arquiteto europeu, o dinamarquês Steen Eiler Rasmussem, escreveu uminteressante trabalho editado pelo The Massachussets Institute of Technology, intituladoArquitetura vivenciada (Expreriencing architecture), no qual um dos capítulos é dedicado à questão

da luz – “A luz do dia em arquitetura”. O seguinte parágrafo explica o enfoque principal de seutexto: “Antes de proseguir, seria bom explicar o que entendo por ‘luz excelente’. Isto é necessárioporque para a maioria das pessoas uma boa luz significa apenas muita luz. E, com muita frequência,verificamos que tal noção é innconsequência, já que a quantidade de luz está longe de ser tãoimportante quanto a sua qualidade” (Rasmussen, 1985, p. 182).

Em 1985, o espanhol Victor Nieto Alcaide, no seu livro la luz, símbolo y sistema visual,relaciona qualidade e significado, analisando a luz na arquitetura românica e na gótica. Enquantoque na catedral romântica a luz penetra por minúsculas aberturas no alto da construção, criando umgrande contraste de luz e sombra, nas catedrais góticas as paredes, por não mais serem estruturais,são rasgadas por vitrais que introduzem na história da arquitetura uma luminosidade até entãodesconhecida. “(...) o sistema de iluminação, determinado pelo controle e aplicação da luz,

configura de forma fundamental a relação entre as normas. O espaço arquitetônico define-se então,pela estrutura e pela articulação plástica dos elementos que a compõe, pelos valores que seu sistemaconstrutivo comporta e pelos valores significativos a que obedece” (Alcaide, 1985, p. 13). Estanova concepção de luz é chamada por Spenler (1973, pp. 130-131) de “a arquitetura da janela”, queoferece a noção de profundidade: “ai se percebe nitidamente a vontade de sair do espaço interior ede penetrar no infinito”. Em lugar de “buracos na parede”, o gótico é o primeiro momento nahistória da arquitetura onde grandes vitrais criam uma parede quase que imaterial.

Com a ajuda livros acima, definiu-se o tema deste trabalho: o pensar do uso da luz porarquitetos, envolvendo, portanto, arquitetos que refletiram, isto é, qual momento da história daarquitetura será privilegiado e, consequentemente, quais os arquitetos cujo pensamento seráestudado.

O período histórico escolhido é o do modernismo. Quer-se discutir como a questão douso luz acabou sendo uma determinante nos partidos assumidos pelo Movimento Moderno. Não sequer, aqui, falar sobre edificações específicas, mas sim sobre as idéias dos arquitetos reconhecidos e

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renomados deste século, que levaram a reformular o conceito como iluminar um espaço.

Para tanto, serão estudados textos de quatro importantes arquitetos do modernismo, cujaaçào teórica e prática influenciou os rumos da arquitetura deste século: Frank Lloyd Wright, Waltergropius, Le Corbusier e Louis Kahn. Além da importância de suas obras e da inegável liderança quetiveram dentro do movimento, foram arquitetos que escreveram sobre o assunto, isto é,

verbalizaram atitudes teóricas e práticas indicando um modo de “usar” a luz na arquitetura. Otrabalho deixará de abordar o pensamento em relação à luz de mestres como László Moholy-Nagyque, na Bauhaus, talvez tenha sido a pessoa que mais se interessou pela questão da luz, trabalhando-a através da fotografia e, inclusive, concebendo uma curiosa máquina chamada de “modulador deespaço e luz”, da qual extraiu uma série de efeitos de luz e sombra; Mies não escreveu textos sobreo assunto, ao que se saiba; Alvar Aalto, cuja iluminação, tanto natural, como artificial mereceria umestudo à parte, mas que pouco escreveu sobre o assunto, preferindo que suas obras falassem por si,Rchard Neutra (1985, p.58), que, se diz que “as obras edificadas não são iluminadas apenas pelaluz, mas também pelo som; para a total percepção, todos os sentidos são necessários”, no livroArquitetura e natureza não chega a abordar especificamente a questão luz.

Coloca-se assim a questão: Qual é o pensamento de Wright, Gropius, Corbussier e Kahnsobre o uso da luz na arquitetura? O primeiro, pioneiro do movimento, representa o pensamentoorganicista e sugere “uma luz suave e difusa que o cliente agradece”, o segundo representa opensamento da Bauhaus, basicamente recionalista, que se expressa na frase “aumentam as janelas,diminuam os quartos”, o terceiro uma linha de pensamento que, por um lado se quer racionalista,por outro lado ultrapassa as questões higienicistas e coloca a luz como um elemento poético naconcepção do espaço, como mostra sua frase citada no início do trabalho. A estes três se soma opensamento de Louis Kahn, arquiteto que trabalha no final do movimento moderno, que abre asportas do pós-modernismo, que possui um pensamento extremamente pessoal sobre o uso da luz: “oprojeto de um edifício deve ser lido como uma harmonia de espaços em luz”, pois “toda a matéria éluz... ela não cessa de ser luz quando passa ao estado de matéria. No silêncio, há uma tendência paraa expressão; na luz, para a obra”.

Fundamentação teórica

Rouanet, em seu livro As razões do iluminismo (1990), define modernidade citandoWeber: “é o processo de racionalização que ocorreu no ocidente, desde o final do século XVII, eque implicou na modernização da sociedade e a modernização da cultura. (...) Compreende amodernização social pela diferenciação da economia capitalista e do Estado Moderno (...), supõe aexistência de força de trabalho formalmente livre e um tipo de organização racional de produçãobaseado no cálculo contábil e na utilização técnica de conhecimentos científicos”. A modernização

cultural é um processo de racionalização das visões de mundo e especialmente da religião. Namodernidade existe uma obsessão pela tecnologia, uma admiração pelas máquinas. A lâmpadaelétrica poderia ser perfeitamente um dos símbolos da modernidade, tudo iluminando, eliminandoas trevas da irracionalidade. O próprio termo iluminismo mostra isso.

Para mostrar como era vista pelos arquitetos modernistas a questão da luz, escolheu-setextos de Alvar Aato que, se pouco escreveu, como dito anteriormente, quando o fez soube retrataradmiravelmente o espírito da época.

“As condições biológicas para a vida humana são, entre outras, ar, luz e sol. Ar não serelaciona com o tamanho do quarto ou com o número de quartos. É um conceito independente.Podemos com certeza construir moradias com uma grande cubagem de ar se usar a área do piso deuma forma não econômica e afetando a altura do forro. Espaço aerado é uma questão de ventilação.Por outro lado devemos dar uma grande atenção à questão da qualidade do ar. E essa é uma questãoque depende da organização interna da cidade, do planejamento urbano.”

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“Luz e sol. Sob condições extremas não se pode deixar ao acaso o acesso do sol àmoradia. Luz e ar são pré-condições tão importantes para a vida que as atuais má condições queprevalecem hoje em dia devem ser mudadas. As normas não apenas devem prever que cada moradiatenha acesso ao sol; o ângulo de incidência também deve ser estabelecido, para, se me é permitidodizer, ao nível da liberdade individual. O sol é uma fonte de energia, mas só se usarmos de uma

maneira científica e em quantidades exatas se tornará sob todas as circunstâncias um fator positivopara o conceito biodinâmico que rege a vida da família e do indivíduo dentro das paredes damoradia. Em uma habitação de 50 m2 não temos folga para deixar isso ao acaso nem permitir a nãoutilização dessa energia. E ao mesmo tempo temos que eliminar os inconvenientes que esses doisfatores, o sol e a luz, sob circunstâncias desfavoráveis, possam trazer” (Aalto, 1979, p. 32).

Porém como colocar luz e sol dentro da casa, dentro de um conceito modernista?

“A situação em que é produzida hoje a arte não é simples. Em termos gerais pode sercaracterizada pela oposição tradicional-moderno, escolheu-se um texto de Aalto, onde o arquitetofinlandês escreve sobre iluminação artificial, para depois se fazer um paralelo com iluminaçãonatural:

“Permitam-me apresentar... um outro exemplo, a luminária. Pertence à tradição nessecaso o candelabro ou porque não a lamparina a óleo com a mesma forma chegou a era daeletricidade. Isso não é tradição, Isso é Kitsch”.

“Até o ponto que a iluminação foi concebida, o modernismo tem para apresentar bolasbrancas brilhantes de porcelana e globos de opalina e mesmo autores racionalista seguiramaproximadamente a mesma linha. Sem dúvida um globo de porcelana fechado, livre de poeira comsuporte niquelado é aceitável sob o ponto de vista do produtor. Mas é ruim sob o ponto de vista doconsumo de energia. Mas um item que geralmente não é levado em consideração ou até mesmonegligenciado é a qualidade da luz. O que nós queremos dizer com qualidade da luz? A luz existepara o homem, um fenômeno que ele precisa ininterruptamente. Qualidade apropriada é, em outraspalavras, mais importante nesse caso que no caso dos objetos com os quais o contacto humano é

meramente temporário. Encontramos aqui o mesmo fenômeno que em outros casos: uma perfeiçãoaceitável de um ponto de vista puramente técnico o aparelho, suas partes removíveis, o método damanufacura, etc, receberam tratamento racional, mas de um outro ponto de vista, sua tarefaprincipal, gerar uma boa iluminação para o homem, adaptada para o olho, para uma boa visão, e emgeral suas qualidades que se relacionam com o homem, não foram resolvidas. Nesse campo, se nãoem todos, tentou-se improvisar com um arranjo inapropriado de formas. Luminárias inglesas comquadros de Piranesi e similares querem representar uma certa domesticidade”.

“Da mesma forma, o modernismo criou um número enorme de luminárias de desenhoagradável, montadas em tubos de porcelanas, etc. Fazer um objeto com idéia racional, voltado paraa visão e psicologia do homem não é um problema que venha à tona com frequência em umaresidência. Mas se formos para um hospital, encontraremos uma porção de pessoas debilitadas quenão podem receber apenas um tipo de tratamento. Uma pessoa debilitada pela doença possuiirritações e sensibilidades físicas que podem piorar seu estado físico, como por exemplo a irritaçãode seus nervos ópticos. Eu mesmo tive experiência disso. Era aparente que a iluminação hospitalarusual, luminárias com difusores branco-opalinas não era adequada, gerando irritação, mesmoquando o nível de ofuscamento era reduzido ao mínimo possível. O local de instalação dasluminárias, o clássico meio do quarto determinado por um ‘x’, tinha que ser revisto e a luz geral doquarto resolvida levando em consideração o doente, sua posição horizontal, etc. Cada solução, decerta maneira, era um compromisso quando se considerava a condição e a posição do doente”.

“Uma grande dificuldade em desenhar uma luminária humanizada, com luz humanizadadeve ser apontada: é difícil examinar a qualidade da luz como é feito em espectroanálise. E mais

difícil é criar uma luz com o espectro adequado ao ser humano. A dificuldade é aumentada pelo fatoque existe uma grande diferença quantitativa entre a luz natural e a artificial. Diz-se que nãopodemos chegar a bons resultados dando o mesmo espectro da luz natural à artificial, porque elesdependem das grandes quantidades de certas partes do espectro da luz do sol. De acordo com isso,

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tem se dito que a luz amarela do candelabro e a inclinação dos decoradores de acentuar suacomposição de luz com cúpulas de seda amarela estão mais próximas dos desejos humanos que oluminotécnico com seu luxímetro e seu conceito esquemático de luz branca”.

“Em outras palavras, podemos aceitar a crítica que em muitos aspectos a luz racionalistaé desumana. Mas o exemplo do do hospital mostra que uma melhoria não será arquivada pelo

desenho formalista de luminárias, sejam elas tradicionais ou modernas. Podemos talvez chegar adesenhos elegantes através de soluções formalistas, luminárias que parecem divertidas quandodesligadas, etc, mas nós não podemos construir uma ‘cultura’ de luz na era da eletricidade com essetipo de diletantismo. Devemos sim aprofundar o método racional com a inclusão de outro dadosligados ao problema. Devemos examinar racionalmente as necessidades técnicas e higiênicas, quese encontram com as necessidades psicológicas resolvendo-as com nossas melhores habilidades.

O paralelo é simples: em lugar do candelabro ou da lamparina a óleo, a janelatradicional. Segundo o raciocínio de Aalto, usar a janela tradicional em projeto de concepçãomodernista seria Kisch, pois o que deve ser procurado é uma nova qualidade de luz, para o novohomem do modernismo: “O olho é apenas uma pequena parte do corpo humano, mas a maissensível e talvez mais importante. Projetar uma luz natural ou artificial que venha a destruir o olhohumano ou danificá-lo significa arquitetura reacionária mesmo se o edifício tenha altas qualidadesconstrutivas” (Aalto, 1979, p. 78).

Como seria essa luz, diferente da “reacionária”? Qual seria ou quais seriam suasqualidades, aspecto que Aalto tanto faz questão de destacar no texto? Se existe uma luz moderna,deve-se procurar seus antecedentes na história da arquitetura: que paradigmas da história daarquitetura devem ser analisados para se entender a luz do modernismo?

Até que paradigma retroceder? O Classicismo? O barroco? A renascença? Ou mais paratrás, para a luz da Idade Média, para o gótico e o romântico? A luz da arquitetura romântica não éum paradigma que embase a do modernismo: “a arquitetura romântica, com seu sistema construtivode paredes compactas e contínuas era mais indicada para receber uma ‘ilustração’ de pintura mural

que um complexo programa de iluminação espacial... os vãos que se abrem cumprem uma funçãoobjetiva de iluminação. Com sua cabeceira voltada ao oriente, a luz do sol penetra inicialmente poresta parte do edifício, passando depois, de forma gradual, pelas janelas abertas na parede sul. A luz,estendida como meio físico, cumpre sua função de possibilitar a leitura dos programasiconográficos desenvolvidos nas pinturas ou nas esculturas dos capiteis... [assim] a decoraçãosubordina-se ao sistema de iluminação... [mas] esta iluminação é resultado de um controle. Os vãos,pelas dimensões, determinam que o interior da igreja romântica, se não conta com um sistema deiluminação diferenciado do natural, seja. Ao menos, introspectivo... a janela romântica cumpriafunções de vão aberto ao exterior: de um foco de luz no sentido estrito” (Alcaide, 1985, p. 20.).

A mudança da janela romântica para a gótica porém não é apenas um aumento de vão:“os efeitos que se derivariam na arquitetura gótica seriam os de um simples aumento deluminosidade do interior da igreja, quando o resultado que se buscava era todo contrário. Adiferença fundamental estava em que a organização dos vãos na arquitetura gótica determina umatransformação radical nas relações entre vão e muro e a possibilidade de estabelecer um sistema deiluminação de caráter simbólico completamente inédito... o vão, convertido em um fechamentotranslúcido e colorido, assume o papel de parede e de agente transformador da luz que penetra nointerior. No edifício gótico pode-se dizer que o vão, entendido como foco de luz, desapareceu. Nãoexistem pontos de iluminação abertos na parede porque, agora, esta é um paramento translúcido queo fecha por inteiro e que o ilumina todo com uma sistema de luz colorida e não natural. Assim, nacatedral gótica perde-se a referência ao espaço exterior ao não existir vão nenhum que o sugira... ointerior aparece escurecido e cromaticamente matizado. A intensidade da luz “por causa desteprocesso de controle e transformação...[fica] reduzido em proporção inversa ao aumento do

tamanho da janela” (Alcaide, 1985, pp. 22-24).Assim, se a luz é filtrada pelos vitrais, por outro lado o novo conceito de não utilizar o

muro portanto estabelece um diálogo com o sistema estrutural modernista, onde também as paredes

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perdem sua função estrutural, podendo ser transformadas, conforme o caso, em paredes de vidro.Mas a qualidade da luz vem da Idade Média; seus antecedentes podem ser encontrados na qualidadede luz do renascimento, que, liberta dos vitrais que amarelavam sua qualidade branca natural,difunde-se no interior das igrejas com as mesmas características que possuia no exterior. Osseguintes trechos do admirável livro de Rudolf Wittkower, Architectural principles in the age of

humanism, ilustram esta questão; “O caráter de limpeza da igreja não deve ser maculado por efeitosfáceis e sentimentais. O brilho deve ser alcançado primeiro de tudo através do emprego de materiaisnobres. Mas como Cícero dizia, caminhando nas pegadas de Platão, a cor branca é mais adequadapara as igrejas” (p.22.).

“A ação construtiva reflete a teoria. Na primeira metade do século XV começam aaparecer as igrejas centralizadas”, como Santa Maria dei Angeli em Florença projetada porBruneleschi... “as proporções são as mais simples possíveis e, por isso, as mais claras... assuperfícies totalmente lisas e limpas das paredes e dos forros” (p.29), pois “o branco é a cor dasigrejas, uma vez que, como a cor da pureza, está mais próxima de Deus” (p.31). A cúpula é o retratodo céu “parece flutuar no ar, como se não tivesse peso”(p.29), difundindo a luz, como faz a abóbodaceleste, como se fôsse um grande refletor.

Os paradigmas de luz pós renascença são abordados por Paolo Portoghesi, em textoescrito para a série Light and Space da revista japonesa GA. Procurando entender a luz domodernismo, Portoghesi retrocede até o baroco, um momento da arquitetura onde luz quase se tronasinônimo de arquitetura, pensamento que séculos mais tarde será também professado por LouisKahn. Portoghesi comenta que na luz do barroco, por exemplo na arquitetura de Borromini, a luz éo ponto central, portanto seu controle, determinação dos seus efeitos são resultantes de uma técnicamuito refinada onde a luz incidente, direta, funde-se com a luz refletida no mesmo espaço, aomesmo tempo que se trabalha com uma luz lateral, geralmente filtrada, estudada para gerar efeitoscênicos, para gerar profundidade no espaço.

Porém talvez seja a luz do Classisismo Romântico a que esteja mais próxima da luz do

modernismo, diz Portoghesi, pois nela a luz tem importância, mas num outro papel: é a “luzuniversal”, símbolo de clareza e racionalidade, inserida no contexto do iluminismo, obtida peladisposição mudular das janelas ou através zenitais que permitam a entrada dos raios solares. OPanteão surge como a grande inspiração, sendo assim descrito por Rasmussem (1986) “nenhumreprodução pode fazer-lhe justiça, pois é o imenso espaço arquitetonicamente fechado à nossa voltaque causa a mais profunda impressão, não qualquer vista parcial do monumento. Ao entrar noPanteão, vindo da emaranhada teia de ruas e ruelas vizinhas, sentimos uma perfeita expressão depaz e harmonia. A escala normal das casas por que acabamos de passar faz com que o peristilo, emcomparação, pareça esmagadoramente alto, com suas gigantescas colunas desaparecendo napenumbra sob o telhado. Quando entramos na rotunda, apercebemos-nos imediatamente de uma luzmoderada proveniente de uma fonte no topo, três vezes mais alto que o teto do peristilo. A cúpulanão parece limitar o espaço, mas, pelo contrário, ampliá-lo e elevá-lo ainda mais’.

“A rotunda é tão grande e espaçoso quanto piazza romana. Em nenhum ponto as paredesse projetam para diante; a grande massa de alvenaria forma um círculo perfeito em torno do enormerecinto. A cúpula é um hemisfério situado tão alto que, se continuássemos descrevendo a esferainteira, sua parte inferior tocaria o solo. Em outras palavras, a altura do cilindro da parede é igual aoraio da cúpula e a altura do recinto igual à sua largura e extensão. Essa harmonia de formacorresponde a algo grandioso e ideal na execução do edifício e, sobretudo, em sua iluminação. Aabertura circular no ápice constitui a única conexão. Essa harmonia de forma corresponde a algograndioso e ideal na execução do edifício e, sobretudo, em sua iluminação. A abertura circular noápice constitui a única conexão com o mundo exterior - não com o mundo ruidoso e displicente dasruas, mas com a abóbada celeste que se lhe sobrepõe. Quando o sol não penetra num cilindro

oblíquo de raios, a luz é finalmente difusa porque provém de uma altura muito grande. Mas toda elaincide na mesma direção, uma vez que provém de uma única fonte de luz e produz sombras reais. Opiso, magnificamente pavimentado num padrão de quadrados e círculos de mármore, recebe a maior

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qualidade da luz e boa parte dela é refletida, fazendo brilhar até os pontos mais escuros, de modoque não existem realmente sombras negras em parte alguma. A parede recua e tabernáculos, comsuas colunas e cornijas negras em parte alguma. A parede recua e tabernáculos, com suas colunas ecornijas coríntias, recebem luz suficiente para realçar as formas arquitetônicas em plenaplasticidade” (pg. 185-186).

Continua Portoghesi: “entre os arquitetos do século vinte, Adalberto Libera, umracionalista italiano, foi o que mais se inspirou nas formas antigas. Na sua junventude desenhou oPanteão e fez vários projetos inspirados nele, incluindo um esboço notável de uma construção dedômo, com a parede lateral contendo nichos arranjados lado a lado no logar do oculus de tôpo. Aluz entre e passa por esses nichos”. Assim Libera descreve o dômo: “o sugestivo e misteriosointerior do salão – com luz entrando indiretamente pela parte superior das colunas perimetrais – aspartes inferiores das pilastras da cúpula estão iluminados por trás, demonstrando um efeito detemporalidade”.

“Ao fundo dos nichos da periferia, as paredes brilhantes se transformam em corposluminosos, e as colunas e outros elementos perdem seu perfil ao se posicionarem contra a luzbrilhante”.

“O contraste entre claridade e escuridão visto no poço de luz brotando do espaço escurodo edifício sugere a luz da revelação, centrada ao redor da metafísica da luz e da experiênciamística, uma crença sustentada em comum com a filosofia de Bonaventura na Idade Média e com omundo íntimo de Georges da la tour, quem introduziu uma luz secreto dentro das tramas daspinturas” (Libera apud Futagawa, 1994, pg. 174).

O Panteão transformou-se no paradigma da iluminação zenital e logo procurou-seexplorar essa luz, que permitia que não existissem “sombras negras em parte alguma”, como dizRasmussen. Começou-se a se projetar grandes superfícies transparentes zenitais. A tecnologia doaço permite a construção de zenitais cobertas com domos translúcidos que geram uma luz suave,difusa, com sombras agradáveis, aproximando-se do paradigma do Panteão. São então construídas

obras em vidro e aço, como o Palácio de Cristal de Joseph Paxton, de 1851, com um espaçoarquitetural nascido de um trabalho estrutural com linhas flutuantes, gentilmente pousadas sobre oterreno, espostas ao sol, mas protegidas dos ventos e das chuvas. Constroi-se zenitais transversais elongitudinais, e as janelas começam a crescer em suas dimensões. A luz zenital revela um outro céuque a arquitetura tradicional de janelas não conhecia, um céu infinito, eterno e azul que penetra nasedificações, especialmente nas novas tipologias nascentes: estações de trem, galerias públicas. A luzse casa com a arquitetura, mostra-a bem e, ao mesmo tempo oferece uma imaterialidade para assuperfícies, como se fizessem parte de uma aquarela e não de um edifício e, ao mesmo tempo, arealização do sonho de leveza e transparência dos mestres góticos, como observado anteriormente,pois a luz gótica, no começo do século 19, continuava a ser uma das grandes aspirações daarquitetura, aspiração esta sintetizada na obra de Viollet-Le-Duc, com sua interpretação racionalista

do gótico.Diz Portoghesi: “...esta desconhecida luminosidade dos grandes espaços envidraçados

tornaram-se parte do repertório das novas e pertubadoras experiências visuais, que profundamenteinfluenciam o nascente gosto moderno”(apud Futagawa, 1994, p.7).

No período do art-noveau, optou-se por uma luz sutil para se trabalhar com formascurvas e retorcidas, optou-se por uma luz, como mostra a obra de Victor Horta que, ao lado deoutros arquitetos, usava a estrutura metálica transfigurada em colossais árvores, transformada emícones nos vitrais das janelas (Portoghesi apud Futagawa, 1994, p. 72), uma leitura figurativa diretada árvore, que Wright trabalhará com maior sutileza, através de sua alegoria da árvore. No projetode Horta a luz penetra por toda a casa, iluminando até seu centro que não é mais escuro e íntimo, o

refúgio da família sob a proteção das penunbras, mas muito brilhante e cenográfico, envolvido porvidros coloridos que reproduzem o tema religioso das catedrais em uma leitura burguesa,celebrando o tipo de vida social que aspirava ser um ritual cheio de sugestões poéticas. Em termosde qualidade da luz, nesse período, a de Horta é colorida ou amarelada, já a de Mackintosh é branca

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e translúcida: a qualidade do gótico em um, a do renascimento no outro. Enquanto isso, na radiosa equente Catalúnia, Gaudi trabalha sua luz metafísica, onde janelas representam estrelas, como umadas cúpulas do Palácio Guell, ou como a janela de entrada da casa Bellescard que representa aEstrela polar. Em seus espaços Gaudi mostra “aberturas singulares com vidros coloridos através dasquais penetram raios coloridos, atirando a luz para as colunas de pedra calcárea e para o piso. A

arquitetura cavernosa de Gaudi é sempre caracterizada esta luz penetrando em vastos espaçosatravés dessas aberturas” (Portoghesi apud Futagawa, 1994, p. 108). Na mesma época surge o blocode vidro, usado pela primeira vez, ao que se sabe, no Castel Béranger de Guimard. Esse materialcria uma atmosfera onde a luz externa se transporta através do bloco, sendo ao mesmo tempofiltrada e retrabalhada, criando uma luminosidade diferente da luminosidade de uma janela, mesmoque translúcida; anos mais tarde utilizada por Auguste Perret no seu famoso apartamento da rueFranklim e, depois da Primeira Guerra Mundial, na sua Igreja de Notre Dame du Raincy; por LeCorbusier no edifício do Exército da Salvação e no Centrosoyus em Moscou. Em Viena, OttoWagnner utiliza o bloco e vidro no piso do Edifício do Correio, um conceito diferente de utilização,oferecendo transparência a um plano até agora nunca teve tal qualidade na história da arquitetura, eo que Wagner com Hoffmann e Loos têm em comum, diz Portoghesi, “a interpretação da luz comoluz universal que ajuda a percepção geométrica das formas e contribui para sua descriçãoapurada”(Portoghesi apud Futagawa, 1994, p.8).

Paul Scheebart escreve em 1914 em seu livro Glassarchitectur: “a superfície da terra setransformaria consideravelmente se a arquitetura de alvenaria fosse substituída pela arquitetura dovidro. A terra pareceria vestida em diamantes e esmalte. Seria um espatéculo ininginável. Nósteríamos algo na Terra mais belo que os jardins das Arabian Nights. Nós teríamos um paraísoterrestre, e não seria mais necessário esperar pelo paraíso celestial” (Portghesi apud Futagawa,1994, p. 8). “No mesmo ano o poeta futurista Aldo Palazzeschi, levando sua luta contra a ‘luz dalua’, iniciada por Marinetti em seu manifesto, declarou não querer mais sonhos de castelos emruínas, vilas abandonadas, mas sim casas de campo de vidro, bem no meio da cidade... uma casa decampo que não tem nada de extraordinário, exceto ser completamente transparente, da qual a rua

pode ser vista de todos os lados, e o céu visto debaixo. Ambos os textos eloquentemente expressamuma das grandes aspirações coletivas na base da arquitetura moderna: a aspiração da transparência,claridade e luz, entendida como valor simbólico libertado da escravidão do passado e procurandopor um estilo característico que expresasse o Zeitgeist, o espírito da época” (Portoghesi apudFutagawa, 1994, p. 8).

Já no expressionismo, a luz foi o tema central da busca arquitetônica, como se podedetectar nos projetos de Behrens, Bruno Taut, Gropius, Scharoun. “As possibilidades do vidrorespondiam às necessidades básicas da pesquisa arquitetônica. Na pausa imposta pela desastre daguerra, num tempo quando era impossível construir, os arquitetos meditavam sobre o futuro e sepreparavam para o grande desafio de construir a cidade moderna: uma cidade transparente,luminosa, onde os monumentos da nova sociedade, as ‘casas para o povo’, os ‘templos universais’,

as grandes fábricas brilharam como faróis sobre o modo de projetar” (Portoghesi apud Futagawa,1994, p. 9). Nos desenhos de época, diz Portoghesi, vê-se uma “luz que joga com a subjetividade dapercepção, uma luz filtrada, guiada e materializada, determinando um tipo de identificação na qualo observador se situa entre a luz e o espaço, extensão e iluminação. Mesmo os aranha-céusdesenhados por Mies van der Rohe nos anos vinte são moldados e lapidados como cristais mineraisou como moldes gigantes em escala urbana, oferecendo à luz a mais inesquecível, múltipla ecomplexa superfície refletora. Quase parece que o arquiteto se colocou o problema do grandeilusionista, interpretando o volume arquitetônico insinuado e defenido por lâmpadas de vidro, e eleperseguiu este objetivo com um rigor cartesiano paradoxal”(Portoghesi apud Futagawa, 1994, p. 9).

“A contradição vital que faz a luz emergir das sombras e faz o imaginário aflorar datensão racional, desaparecendo tão logo entrar em contacto ou encontrar-se com forças produtivasda realidade dos arquitetos da geração de Gropius e Le Corbusier para estabelecer um código, paracom a lei consagrar uma aliança concreta com as forças políticas e econômicas... o estatutofuncionalista – nascido da homologação das experiências contrastantes da avant-garde e da redução

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2 Frank Lloyd Wright: nasceu em Richland Center, no estado de Wisconsin, em 1867 efaleceu em Phoenix, no estado do Arizona, 1959. Começou seus estudos na Universidade deWisconsin, mas logo se dirigiu para Chicago para trabalhar com Aldler e Sullivan. Sintetizou umespírito inovador e humanista, sendo o principal arquiteto da vertente organicista.

significado industrial de sua era. São, ou precisam ser, intérpretes do amor à vida na suaera”, porém a concepção que embase o seu pensamento não é mecanicista, como a de grande partedos arquitetos europeus, mas ele vê a sociedade como um grande organismo. Ter uma filosofia nabase do pensamento arquitetônico é tão importante para Wright que ele abre seu testamento com aseguinte afirmação: “filosofia é a mente do arquiteto, assim como a visão são seus passos”.

Outra frase de Wright é bastante significativa para se compreender sua filosofia: “se anatureza pode ser metáfora da arquitetura, então a arquitetura pode ser metáfora da natureza”. Esteseu pensamento é desenvolvido principalmente na sua Autobiografia, onde coloca que o edifícioideal deve ser “metáfora de árvore” permita passar, e para concretizá-la, Wright projeta o grandebeiral em balanço, cuja sombra recriará a luz que a copa da árvore produz. Assim, edificações não

mais serão como “caixas ardendo ao sol”. O ponto seguinte será saber como Wright propõe que estasuave luz penetre no interior dos ambientes. O projeto wrightiano nega a “caixa com buracos”,escura úmida, malcheirosa, ilumina pelos citados buracos rasgados nas paredes. Wright propõe criarelementos que integrarão o exterior com o interior, com uma “sensação de abrigo, luz e suavesombra, características da arquitetura orgânica”, e as paredes desaparecem como elementos sólidos,e reaparecem como imaginativos painéis que abraçam a luz. Para tanto, Wright explorará aomáximo as novas tecnologias, em especial o vidro, que considera o maior diferenciador entre asedificações antigas e as modernas, gerando assim uma radical transformação na história daarquitetura. Na sua coletânea de artigos In the cause of architecture, dedica um capítulo só para ovidro – “The meaning of materials: the glass”- que é de importância decisiva para compreender opensamento de Wright sobre iluminação, e que assim será estudado neste trabalho. O segundo

arquiteto chamado a responder a questão é Walter Gropius3, cuja preocupação arquitetônica seposiciona frente à “agitação européia”. As possíveis origens de sua resposta podem ser encontradasem Berlim, cidade marcada pelo cortiço operário, descrita por Kopp como o lugar onde “a luz e osol nunca penetram”. É nessa cidade que começa sua carreira de arquiteto, projetando habitaçõescoletivas para o proletariado, com a intenção de procurar respostas a questões higienicistas e nãoestéticas. Para poder oferecer luz, ar ar e sol democraticamente a todas as residências, propõeshabitações em fileira, de orientação nort-sul, com um espaçamento tal entre as fileiras que permitauma boa insolação e ventilação, um “modus vivendi”.

Esta proposta é fundamental para se entender a luz em Gropius, pois aqui seupensamento se apoia na idéia de que quando o homem dispõe da possibilidade de tomar ar e sol,precisa de pouco espaço habitacional; e para obter “um máximo de luz, sol, ar para todas as

habitações”, diz a sua famosa frase: “aumentem as janelas, diminuam os quartos”. Como obter ummáximo de luz? Gropius repensa a janela, do mesmo modo que Wright, não como um “buraco” naparede, mas sim como uma parede de vidro: “as estreitas janelas de grade com pequenas vidraças,necessárias em outros tempos, por causa dos limitados métodos de fabricação de vidro, foramsubstituídas por grandes aberturas de janelas com vidros inteiros”.

Este pensamento de Gropius conduz diretamente à prática de Mies van der rohe, a suastorres de cristal que se difundiram mundo afora e a uma reflexão sobre quantidade de luz contraqualidade de luz. O máximo de luz é a melhor luz? Como trabalhar a qualidade na luz?

3 Walter Gropius: nasceu em Berlin, em 1883, e faleceu em Cambbridge, no estado deMassachusetts, em 1969. Foi arquiteto, professor e teórico da arquitetura. Filho e sobrinho de

notáveis arquitetos berlinenses, sua obra de carater racionalista influenciou decisivamente osprincípios da vanguarda do Movimento Moderno.

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O terceiro arquiteto que responde a pergunta é Le Corbusier4, que, além de suas obras eescritos sobre arquitetura, também se posiciona frente à questão da “cidade funcional”. Sua respostaé a “cidade radiosa”, nome significativo para um trabalho que pretende escrever sobre luz. Tábularasa é o que pretende fazer com os espaços urbanos existentes, mas tábula rasa também com osantigos hábitos humanos e com os antigos modos de vida: Corbusier quer um “homem novo, ávido

de luz, de sol, de ar puro”.O espaço corbusierano sempre é criado em conjunto com a luz, parte integrante dele.

Talvez o projeto que melhor exemplifique sua preocupação com a luz seja Ministério da Educaçãodo Rio de janeiro, através do caminho da entrada da luz no edifício. Sua proposta são os brisessoleils, que cortam a luz, sombreando o edifício.

Assim como Wright e Gropius, rejeita a janela buraco, fato que verbaliza ao comentar aarquitetura de Pompéia: “respeitem as paredes. Os habitantes de Pompéia não furam suas paredes;têm a devoção das paredes, o amor da luz. A luz é intensa se está entre paredes que a refletem (...)esses buracos são amiúde destruidores de formas; é preciso torná-los reveladores de forma”. Suaproposta é “uma parede toda em janela, uma sala em plena claridade”, e nesse ponto, seupensamento se une ao de Gropius.

Curiosamente o velho Corbusier, em La Tourette e Ronchamp não trabalha “em plenaclaridade”, mas com elaborado jogo de luz e sombra. Como entender este Cobusier, depois de Terestudado todo seu raciocínio a favor dos espaços cuja luminosidade responda aos anseios do“homem novo, ávido de luz, de sol, de ar puro”? A resposta pode estar nos seguintes comentáriosde Gaston Bachelard: “as fantasias da pequena luz nos levam de volta ao reduto da familiaridade.Parece que existem em nós

4 Le Corbusier: Charles-Édouard Jeanneret nasceu em La Chaux-de-Fonds, na Suiça,em 1887, e faleceu em Roquebrune-Cap-Martin, na Costa Azul, em 1965. Francês de origem Suiça,

conheceu os arquitetos Josef Hoffmann, Tony Garnier, Auguste Perret e peter Behrens; suas obrasrefletem um profundo idealismo.

Cantos sombrios que toleram apenas uma luz bruxulenta... o inconsciente trannquilo,sem pesadelos, em equilíbrio com sua fantasia, é exatamente o claro-escuro do psiquismo, ou,melhor ainda, o psiquismo do claro-escuro. Imagens da pequena luz nos ensina a gostar desse claro-escuro da visão íntima... longe das claridades do pensamento” (Bachelard, 1989, p. 14-15).

Longe das claridades do pensamento: longe do iluminismo, longe da modernidade,longe do processo de racionalização. É dentro deste cenário que se analisa o pensamento do quartoarquiteto escolhido para responder a questão, Louis Kahn5. Para melhor entender a arquitetura,

volta-se para a história e estudando os clássicos cria sua obra que transformará radicalmente ahistória da arquitetura.

Todos os seus escritos refletem essa preocupação, porem o pensamento é colocado comuma forma “sumamente pessoal”, conforme expressão de Romaldo Giurgola (1980). Estes escritosquase sempre se voltam para a questão da luz, podendo-se dizer que Kahn é o arquiteto maispreocupado com o pensar do uso da luz na arquitetura.

“Um espaço nunca encontrará seu lugar na arquitetura sem luz natural”, diz Kahn.

Essa procura de um lugar na arquitetura reflete uma preocupação não apenashigienicista, ou luminotécnica, mas uma procura poética, indo ao encontro do pensamento citado deOctavio Paz: “nem todo poema-ou, para sermos exatos, nem toda a obra constituída sob as leis da

métrica – contém poesia”. Kahn “aspectos imensuráveis”: “o projeto do edifício deve poder ser lidocomo uma harmonia de espaços iluminados. Cada

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5 Louis Kahn: nasceu na ilha de Osel, na Estônia, em 1901, e faleceu em Nova Yorke,em 1974. Arquiteto norte americano, centro de polêmicas internacionais, considerado um “clássicoda vannguarda”. Faz uma arquitetura própria, compacta, na qual o estudo da incidência da luz é umdos elementos mais característicos.

Espaço deve ser definido pela sua estrutura e por seu caráter de iluminação natural”.Rejeitando a idéia de massificação, diz que para cada indivíduo deve-se projetar um espaçoespecífico, que deve ter a sua luz específica: “um quarto quadrado pede sua própria luz”.

Assim ao definir os cheios e vazios no projeto arquitetônico, define-se a “não luz”e a“luz “luz”, para se usar a expressão de Kahn. A leitura de um templo grego é expressão de luz noespaço entre as colunas e a “não luz”, que é a coluna: “portanto, os meios de conformar um espaçoimplicam que a luz penetre nele, e a escolha de uma estrutura é ao mesmo tempo a escolha do tipoluz que se deseja. Acredito que isso é verdadeiramente um requisito arquitetônico”.

Para melhor entender o princípio da criação com luz, kahn realmente retorna aosprincípios e exprime isso através da sua teoria de “Silênncio e Luz”. “Silêncio: desejo de ser, e Luz,oferta da presença; no ponto de encontro ocorre a inspiração, que dirigirá a criação da obra de arte”.Uma visão bíblica da criação que se repete sempre no ato de criação do projeto arquitetônico.

Métodos

Definida a pergunta, isto é, qual é o pensamento de Wright, Gropius, Corbusier e Kahnsobre o uso da luz na arquitetura, o passo sequinte é procurar a resposta em seus escritos; afinal estetrabalho quer estudar a verbalização das suas atitudes teóricas e práticas, indicando um modo de“usar” a luz na arquitetura.

Porém a questão não é assim tão simples; é fato que Wright, Gropius, Corbusier e Kahnescreveram sobre o assunto, mas não o fizeram de uma forma sistemática. Nem na Autobiografia deWright, nem em por uma arquitetura de Corbusier se encontrará um capítulo específico sobre otema. A dificuldade do trabalho se encontra em selecionar frases ou parágrafos esparsos, juntá-losnuma sequência lógica que reflita a possível estrutura de pensamento do arquiteto.

Cada arquiteto apresenta dificuldades específicas neste processo. Frank Lloyd Wrightproduziu um grande número de escritos, infelismente não traduzidos para o português. Adificuldade principal para se pesquisar Wright está justamente na extensão de sua obra escrita,proporcional à extensão de sua obra construída. A pesquisa se baseia principalmente naAutobiografia, em sua série de artigos para a Architectural Record, In the cause of architecture,

além de seu testamento. Trechos de suas famosas Kahn lectures complementam o raciocínio, emconjunto com frases recolhidas nos seus mais diversos livros e textos de palavras.

Já a dificuldade maior em relação ao raciocínio de Gropius foi a escassez de material.Seus escritos acessíveis foram publicados no Brasil pela editora Perspectiva, sob o título Bauhaus:novarquitetura, e este livro é a fonte principal de pesquisa sobre o raciocínio de Gropius.Fortuitamente o livro de Argan, Walter Gropius e a Bauhaus, completa adequadamente a pesquisa,associado ao excelente trabalho de Sigfried Gideon, Walter Gropius – work and teamwok.

Em compensão, a obra teórica de Corbusier é bastante bem difundida no Brasil, atravésdas várias publicações da Editora Perspectiva. Os três estabelecimentos humanos, Planejamentourbano, e claro, por uma arquitetura, formam o tripé principal de fonte de pesquisa sobre oraciocínio de Corbusier, completamentado por Cuanddo las catedrales eram blancas e Mensaje a losestudiantes de arquitectura, além do interessante livro de charles Jencks, Le Corbusier and the tragicvivew of architecture, ond relaciona suas obras com seus escritos pessoais de época.

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Já a pesquisa sobre Kahn apresenta uma dificuldade diferente: analisar seus escritos decaráter bastante hermético, “sumamente pessoal”, como escrito acima, acostumar-se com sualinguagem, comseu jogo de palavras, como por exemplo “Silêncio: desejo de ser” representa umadificuldade tão grande, ou até maior do que decifrar o inglês da Autobiografia de Wright. Por sorte,sua filha Alexandra Tyng em seu livro Beginings Louis I. Kahn’s philosophy of architecture

sistematizou o pennsamento do pai, e dedicou um capítulo inteiro à questão da luz, recolhenndotodos os escritos e depoimentos de Kahn sobre o assunto. Assim, esse livro é a principal fonte depesquisa, complementada por livros como de Urs Buttiker, Luis I, Kahn - Licht und Raum – Lightand Space, e o de Romaldo Giurgola sobre o arquiteto.

O objetivo é transformar cada pesquisa específica sobre o pensamento de um arquitetoem um capítulo. Assim, fora a introdução, enriquecida com o acima exposto texto de Portoghesi, otrabalho é composto por quatro capítulos-chaves: o primeiro, sobre a luz suave de Frank LioydWright; o segundo, sobre a luz racional de Walter Gropius; o terceiro, sobre a luz poética de LeCorbusier e, o quarto, sobre o silêncio e a luz de Louis Kahn. Cada capítulo será composto pelarecomposição de pensamento do arquiteto sobre uso da luz baseado em seus escritos esparsos e poruma análise de suas obras mais significativas que mostrem na prática este pensar.

Porém uma objeção poderia ser levantada nesse ponto, mais especificamente a questãocontextual. Evidentemente diferentes climas levam a variações arquitetônicas: “Na Grécia, Áfricado Norte e sul da Espanha as janelas são geralmente aberturas pequenas e profundas nas espesasparedes que devem proteger contra a luz do sol e o calor. Quando mais viajamos para o norte,maiores são as janelas e mais finas as paredes”, comenta Kalff em seu livro Creative Light (1971, p.9), não só internamente, como externamente. “Quando olhamos para um edifício percebemos quesua aparência muda com as variações da luz do dia. Pode ficar triste e escuro sob nuvens e chuva;cores e detalhes mostram sua beleza e delicadeza sob a luz do sol”, assim “ao olharmos paraedifícios em climas e latitudes diferentes, devemos chegar à conclusão que a arquitetura émarcantemente influenciada pelo clima”.

“Quando a luz do sol e céu aberto são as condições prevalescentes, é óbvio que osarquitetos concebem seus edifícios sob essas circunstâncias, e em países onde neblina, nuvens eumidade prevalecem ao lado de um sol que não brilha forte no céu, gerando uma luz, mais difusa efria, os edifícios têm formas, cores e texturas diferentes”(Kalff, 1971, p.5).

Pode-se comprar a luz de uma edificação projetada nos Estados Unidos com a de umaedificação projetada na Alemanha? Ou dentro mesmo dos Estados Unidos, comprar a luz de umaresidência em Chicago com outra no deserto do Arizona? Rasmussem levanta a mesma indagaçãoem seu livro Arquitetura Vivenciada: “a luz do dia altera-se constantemente. Os outros elementosde arquitetura podem ser determinados exatamente... só não se pode controlar a luz do dia. Elaaltera-se da manhã para a tarde, de dia para dia, em intensidade e cor. Como é possível trabalharcom um fator tão caprichoso? Como esse fator pode ser utilizado artisticamente?” (Rasmussem,

1986, p. 180).Mostram os manuais de luminotécnica que em dias de verão, sob pleno sol, pode-se

atingir iluminâncias de 100.000 lux. Já no mesmo local, em dia de inverno, ao meio dias, tem-se10.000 lux, isto é, uma variação de 10: 1 dentro do mesmo contexto físico (Re, 1978. P. 17). Porexemplo, a cidade de São Paulo tem no verão sob céu claro 78.700 lux; ainda no verão, sob céuencoberto, a iluminância cai para 18.100 lux; já no inverno, sob céu claro a cidade tem 47.100 lux e,sob céu encoberto 16.000 lux. Nos equinócios, sob céu aberto, 59.500 lux e sob céu encoberto,14.300. (Mascaró, 1991. pp. 201-203).

Como essas variações poderam influenciar este trabalho? Responde Rasmussen: “emprimeiro lugar, as variações na quantidade de luz podem ser ignoradas, uma vez que, embora

possam ser medidas com a ajuda de instrumentos, dificilmente nos apercebemos delas. Aadaptabilidade do olho humano é surpreendentemente grande. A luz brilhante do sol pode ser250000 vezes mais intensa do que a luz da lua e, no entanto, podemos ver as mesmas formas empleno dia ou iluminadas apenas pelo luar” (Rasmussem, 1986, p. 180).

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1919

Contribui para tanto o fato que não se está levando em consideração a luz do sol, apenetração dos raios solares, isto é, a insolação, esta sim extremamente dinâmica e quaseimpossível de se contextualizar para cada caso levantado, mas sim a iluminação difusaproporcionada pela abóboda celeste, que, se por um lado apresenta grandes variações como asmostradas no caso da cidade de São Paulo, por outro lado, devido a sua característica difusa,

enquadra-se na argumentação de Rasmussen.A análise proposta das obras de cada arquiteto é parcialmente descritiva e parcialmente

gráfica. Para a parte descritiva serão utilizados textos do próprio arquiteto, ou de críticos ouhistoriadores ou teóricos de arquitetura, ilustrados com esquemas que indicam o percurso da luz doexterior da edificação. Na parte gráfica os cortes serão transformados em esquemáticos e sobre elesaplicados simbolos gráficos que se baseiam na da citada obra de Urs Buttiker, que propões umasimbologia de setas representando ou luz filtrada.

Assim a luzdifusa da abóboda celestepenetra diretamente naedificação sem passar poranteparo algum eapresenta-se no interior daedificação com ou quasecom as mesmasqualidades que tinha noexterior ou é filtrada porelementos arquitetônicoscriados pelos arquitetos,transformando-se numanova luz, diferente daexterior. Colocar ou não

anteparos pode ser umanecessidade contextual,assim como pode tambémser uma propostaarquitetônica visandorecriar a realidade.

Estasimbologia será aplicadasem cortes característicosque analisam a entrada daluz na edificação:

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2020

Após a leitura dos textos que procuram responder à indagação básica deste trabbalho,qual é o pensamento de Wright, Gropius, Corbusier e Kahn sobre o uso da luz na arquitetura,ilustrados com os cortes analíticos acima exemplificados, uma comclusão se faz necessária. Nestaconclusão, depois de confrontadas as principais idéias, serão estabelecidos alguns critérios para

caracterizar a luz do modernismo, sendo utilizados textos de apoio de Kalff, Rasmussen, ColinRowe, Renato de Fusco, Robert Venturi, Cristopher Alexander, Riichi Miyake e Victor Alcaide.

Este trabalho não estaria completo sem a verificação da continuidade dos paradigmasestudados. Assim será feito um rápido apanhado geral da difusão luminosa do modernismo. Paratanto utilizou-se textos de Portoghesi, Riichi Miyake, Kenneth Frampton e depoimentos de AlvarAalto e Tadao Ando. Em seguida será annalisado um caso específico de como a linguagem de luzWright, Gropius, Corbusier e Kahn pode ser detectada nna obra de um arquiteto da atualidade, nocaso na obra do Português Álvaro Siza. É importante salientar que nesse ponto o trabalho nãoaborda obras de arquitetos brasileiros. Tal fato não pretende ser uma falha, mas uma promessa decontinuidade do trabalho, enfocando especificamente esta questão.

Para finalizar, será apresentada uma visão crítica da proposta do uso da luz pelosarquitetos modernista, através do pensamento de alguns arquitetos cuja produção localiza-se depoisda dos modernistas históricos. Anterior ao período pós-moderno comparece Cristopher Alexander e,

 já neste período, Charles Moore.

Ao valorizar os caminhos que transformam o projeto, construído sob as leis da mérica,mas sem poesia, em uma obra iluminada capaz de criar, revelar e transformar, o trabalho deixa deapontar, numa primeira leitura, a melhor solução de iluminação, porém analisa a metodologia deuso da luz dos grandes mestres da arquitetura e desta forma apresenta possíveis caminhos a seguir.

Os caminhos de Frank Lloyd Wright, Walter Gropius, Le Corbusier e Louis Kahnmostram que a sutil inserção da poesia na obra é feita também fundamentalmente pela luz.

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II) A LUZ SUAVE DE WRIGHT

Tudo em torno é brilho e fausto...

Goethe

Logo no primeiro parágrafo da introdução da Autobiografia (1992) de Wright, intitulada“Prelúdio”, constata-se sua enorme sensibilidade para a percepção da luz: “Um leve cobertor deneve que acabara de cair sobre os campos montanhosos bailava sob o sol da manhã. Brotos de tufosde mato tecidos de bronze brotavam cá e lá na expansão imaculada da luz. Raios escuros de linhasmetálicas, retas e elegantes, com as pontas estremecidas. Padrão revelado na medida que o solespalha delicadas redes de outros modelos em sombra azuis na brancura do chão” (p. 104).

Os campos, neve, mato do texto de Wright são o seu cenário, o motor de sua obra: anatureza. Assim, ao se analisar seu pensamento sobre a iluminação, é importante constatar na

primeira frase de sua Autobiografia a descrição de uma paisagem sob o sol, e, maisespecificamente, sob o sol da manhã, o sol de uma luz suave. “Expansào imaculada da luz, raiosescuros, sombras azuis na brancura do chão” remetem a uma leitura quase impressionista do sol eda natureza. A luz de Wright sempre estatá ligada a natureza, em uma dimensão física e tambémsimbólica, em um vislumbre bíblico da criação: “nós nos estendemos para a luz espiritualmente,como as plantas o fazem fisicamente, se somos o som de nosso coração, e não a sofisticação denossa educação” (Wright, 1992, p. 105).

Em uma sequência famosa de palostras (Modern Architecture, being the Kahn Lectures),a fim de destacar esta dimensão simbólica, diz: “nossa refer6encia para a autoridade é este escritode Moti, antigo sábio chinês: no crepúsculo, à luz das lanternas, ou na escuridão não adore antigasimagens, nem corra atrás de novas. Elas podem aparecer para cegá-lo, ou, sendo falsas, enganá-lo,

levando-o à escravidão, na qual a própria esperança murcha” (crepúsculo aqui significaprovavelmente compreensão parcial; luz de lanterna, feitiço, escuridão, ignor6ancia). Ou outratranscrição – “o chinês é distante do inglês: com exceção da luz plena do dia jogue foora asimagens, atiradas, esculpidas ou construídas por outros, porque elas, no mínimo, sendo falsas,levarão à cegueira, à importância. Outra ainda outra: sem o total conhecimento, não adore imagens,pois, sendo falsas, elas cegarão sua capacidade de tomar de sua própria verdade”( Wright, 1992, p.43.

As “imagens falsas”, que levam à “cegueira, à importância”, podem aqui perfeitamenteser a arquitetura historicista, a “caixa com buracos” que Wright tanto combatia. “Caixa comburacos”: ambiente escuros, sem luz. Não é o ideal de arquitetura que Wright propõe. Ohistoricismo pouco lhe significa, o que expressa em algumas frases famosas: “Estilo é importante,

um estilo não é”, e “Principle is the only safe- tradition”, frase que em inngl6es soa ainda maisforte. Não é no historicismo que se deve procurar segurança no ato de projetar: “segurança da almadepende da coragem”, diz Wright.

Apesar disso, alguns críticos como Jencks colocam Wright como um pré-modernotradicionalista, com alguns edifícios beirando o kitsch, “a kitsch that is occasionally redeemable”(Jencks, 1982). Já Zevi coloca Wright como herdeiro dos movimentos Arts and Crafts e ArtNoveau, assim como cubista e expressionista, depois racionalista e infoormalista, pop eminimalista, chegando a pós-modernista. Não se quer neste trabalho discutir o papel de Wright nomovimento moderno, no qual expressou sua fé inúmeras vezes (“arquitetos são, ou precisam ser,mestres do significado industrial de sua era: são, ou precisam ser, intérpretes do amor à vida na sua

era” – 1975, p. 133), mas sim obter respostas à indagação básica – como os arquitetos domovimento moderno concebiam o uso da luz. Assim Wright é o primeiro a responder, até pela suaposição pioneira na história do movimento moderno.

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No catálogo de sua exposição na Europa, Ausgefuhrte Bauten und entwurfe von FrankLloyd Wright (obras executadas e projetos de Frank Lloyd Wright), que tanto influennciou omovimento modernista europeu, ele diz: “a luminosidade mestre abre, como diretamenteentusiasmada pela intensidade, a dávida do aço tensionado (...) e conhecimentos, agora, a perfeitaclaridade do ar, para manter o ar fora, ou dentro, e permitir perfeita visibilidade ao olhar humano

para perscrutar o céu ou a terra. Isso é o vidro o temos em nosso tempo – a dádiva das dádivas. Esabemos, agora, o tecido perfeito para vestir o espaço interior, com o vidro: para modificar a relaçãodo espaço interior com o espaço do sol. Todas as nuanças da natureza se emaranham como umatextura ou padrão em suas malhas”. Este “tecido perfeito” seria trabalhado por Wright de umaforma totalmente diversa que seus colegas europeus, como será visto adiante. “Prédios modernosagora crescem, irmãos das árvores. Setas de luz brilhando para o sol, verdadeira aceitação do sol.Indestrutível fábrica metálica de luz, entrelaçada no tecido turquesa, azul ou verde, dourado ouprateado, ou nos pesados matizes do bronze – ou todos juntos. Ou deixemos o edifício ao largo,flutuando docemente na superfície: um rasgo de luz. Ou pode ainda estar sobre um arco íris de luzcuidadosamente colorido, vidro mesclado com tiras de metal, assim como a música é feita pornotas...” (Wright, 1992, p. 337).

Se Wright, devido a uma hierarquia cronológica, é o primeiro a responder a questãobásica deste trabalho, poderia se perguntar sobre a contemporanneidade de seu pensamento sobreiluminação dentro de uma concepção orgânica, ou seja, onde a arquitetura deve servir ao homem,em vez de dominá-lo, onde forma e função formam uma unidade, onde a construção, com afinalidade perseguida. As idéias de Wright sobre o uso da luz, enfim, são atuais e tiveramseguidores?

Seu discípulo Edgar Tafel (1979, p. 129) diz que “em períodos de furor histérico, afilosofia de Wright sobre casa, família e cultura não tem lugar”. Porém, com a redescoberta daecologia e da dimensão individual do homem, ocorre uma “redescoberta” de Wright, expressãoutilizada por Bbruno Zevi, que no texto “A language after Wright” diz: “apenas algumas pessoas,selecionadas, são maneiristas, não em relação a princípios abstratos, mas em relação aos mestres.

Em geral, essas pessoas não estão interessadas em simplificar e tornar acessíveis as falas mestres,mas sim em traduzi-las em novas linguagens” (apud Wright, 1975, p. 35).

“Acabam, isso sim, complicando essas falas, elaborando-as intelectualmente mais emais, até se cansarem desse exercício narcísico e o abandonam”. Esta observação de zevi se referenão somente aos seguidores de Wright, mas sem dúvida a um leque muito mais amplo. Porém, alinguagem deve ser retomada: “não vejo outra saída para esse impasse. Nos anos 60, nós nosvirávamos sem uma linguagem, pois tinhamos um pai – entre os mestres da arquitetura moderna –que nos alimentava e apoiava. Agora, somos órfãos, selvagens, sem saber o que fazer. Alguns dosmelhores exploram maneirismos, estudam, mais que os mestres, seus primeiros imitadores comoTerragni ou Schindler: uma saída fascinante porém transitória. A maioria é cética e, às vezes,cínica. Tudo isso é, sem dúvida infantil, e torna-se demagogia quando se passa a abrir mão daresponsabilidade de uma nova arquitetura para o crescimento apocalíptico de uma novasociedade”(p. 133).

Natureza e luz

Wright abre o seu famoso Testamento (1961) com a seguinte afirmação: “a filosofia é amente do arquiteto assim como a visão são seus passos”. De onde vêm sua filosofia que embasa suaarquitetura? O seguinte trecho do primeiro livro de sua Autobiografia (1992), narrado na terceirapessoa, mostra as pista necessárias: “...assim ele aprendeu a conhecer a madeira das árvores, os

arbustos e a grama, e as milhões de curiosas vidas escondidas com este conhecimento. Era como seseu ouvido se tornasse atento, olhar mais aguçado, e o toque mais sensível; seu espírito tornava-sefamiliar com este maravilhoso livro dos livros, o único realmente lido: o livro da criação.

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Um pequeno garoto de onze anos ouvia suas experiências sobre o que tinha ouvido, visto outocado. Nenhum jardim cultivado se iguala a esses espaços selvagens.

O nascer do sol.

O pôr do sol.

As sombras da noite, tão maravilhosamente azuis, como sombras azuis sobre a neve.A cerejeira com suas flores pendentes e cachos de cerejas pretas que fazem você engasgar.

Sólidas profundezas de sombras.

Primaveras, um que passa através das folhas das árvores, espalhando-se no solo (...)

O mundo das luzes do dia, dourados e laranjas, passando pelos violetas, transformando-se num azulprofundo ou na púrpura escura da noite.

E o garoto aprendeu nesse dia que o segredo de todos os estilos humano na arquitetura eram osmesmos que caracterizavam as árvores”(p. 121).

O que o pequeno garoto de onze anos aprendeu pode ser sintetizado por suas conhecidasfrases que relacionam arquitetura com natureza: “se a natureza pode ser metáfora da arquitetura,então a arquitetura pode ser uma metáfora da natureza”, “nós precisamos fazer desta nova vida parteda Natureza Externa mais do que nunca. Como parte da Natureza Eterna por causa da harmoniacom a Natureza Interna”(Wright, 1992, p. 348); “um ideal de cultura: eu agora proponho aqueleideal para a arquitetura da era da máquina, o edifício ideal americano. Cresça nesta imagem: aárvore. Mas aqui é puro apelo para a imaginação, não significa sugerir a imitação da árvore” (idem,p. 206). Wright procura uma ordem, mas não uma ordem cartesiana; sua ordem será parecida com ada natureza. E, ao fazer sua arquitetura metáfora da natureza, a luz de sua arquitetura será metáforada luz que a árvore, seu símbolo favorito de natureza, permita passar.

“Suponha, para a argumentação, que uma vez nós realmente moramos nas árvores,

pulando com leveza de galho em galho, balançando nossos rabos, enquanto atirávamos cocos unsnos outros. A folhagem sobre nós nos abrigava do sol e da chuva e agradecíamos tanto pelo abrigocomo pela sombra. Agradecíamos por aquela cobertura e pela percepção e sentido dela que estiveraconosco pela história como cornijas, finalmente se transformando num emblema um símbolo visual.O agradecimento instintivo hoje é fraco, é claro. Mas onde a cornija, verdadeira naquele momentoprimaveral, ficou uma verdadeira cobertura, ou mesmo um sentido dela, e deixava cair a chuvalonge das paredes do edifício bem, a cornija então não era uma cornija, mas um teto em balanço.Deixemos o teto em balanço ficar com abrigo para o homem. Ela nunca desaparecerá da arquitetura.O sentido de arquitetura como um abrigo é um sentido muito especial um senso comum, de fato”(Wright, 1992, p.45).

O grande beiral em balanço unido ao vidro recriará essa agradável luz, conforme escrito

na Autobiografia (1992): “pelo sentido do vidro, então, algo da liberdade de nossos ancestrais queviviam nas árvores retornará, uma liberdade da vida do século 20, assim como os animais selvagensque se abrigavam por proteção eram características da vida baseada na força dos tempos feudais, ouos novos tempos clássicos baseados no trabalho escravo. Num país livre, nós também livres,podemos ir para a luz sem o pavor dos animais. Sim, mais importante, talvez, que isso tudo, atravésdo vidro, o espaço iluminado será uma realidade numa ordem mais elevada do espírito humano. Umsenso de limpeza diretamente relacionado com o viver à luz do sol está chegando. E com as vistasampliadas adquiridas pelos conexão do edifício ao terreno, jardins e morros, este novo sentidocomeçará a nos mover no edifício todos os nossos edifícios.

Mais e mais desejaremos o sol. Mais que desejamos o sol, mais desejaremos a liberdadedo chão. (...)

E este nascer de sentido será realidade, visão da Natureza.

Em pouco tempo, através do vidro, o jardim será o edifício, assim como o edifício será o

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 jardim. O tempo das paredes está chegando ao fim. A caverna está desaparescendo. As própriasparedes estão se transformando em janelas e as janelas como nós conhecemos não serão mais vistas.Forros serão as paredes das janelas, com bastante frequência. A textura será usada como uma lindaroupa para o espaço, um atributo da arquitetura, em lugar da camuflagem do decorador.Aquecimento mecânico moderno, iluminação integrada, e unidade sanitária estandartizada são

metas razoáveis para os ideais do século 20 de abolir o edifício como caixa ou pequena cidade”(Wright, 1992, p. 367).

O texto é claro: a arquitetura das caixas são as cavernas escuras dos homens pré-históricos. As paredes que não serão mais paredes, mas sim elementos que integração o exteriorcom o interior, pois, como disse Wright, “está na natureza de qualquer edifício orgânico crescer doseu sítio, sair da terra para a luz”, a benção de seus ocupantes. Nossos ancestrais que habitavam asárvores nos indicavam um caminho melhor que os animais selvagens que se abrigavam em cavernaspara a proteção. Sim, num sentido espiritual, a ordem mais alta é o sentido do espaço iluminadopela luz, do sol e a leveza (lightness – jogo de palavras n.t.) da estrutura tecido pela malha, comoJohn Roebling idealizou e realizou na sua ponte de Brooklin... (...) sim, agora um sentido delimpeza (higiene) diretamente relacionado com o viver à luz do sol trabalhando em nós, e

trabalhando não somente para nos emancipar de caverna, mas despertando-nos para um desejo deuma substância de uma nova e mais apropriada simplicidade surgindo agora com um semblantelimpo da verdade cheia de juventude” (Wright, 1992, p.45).

A caixa

“É evidente”, diz Wright, “que mais espaços e mais luz, além de maior liberdade demovimentos, concorrem à função mais natural e à conservação da vida humana”(Wright 1961, p.23). Mas então o que é que Wright rejeita, como era a “caixa” que Wright denunciou? Na

Autobiografia (1961), descreve como era casa naquela época: “invariavelmente o úmido, grossobarro da padaria era afastada da construção por de um porão embaixo de toda a casa, e paredes depedra bruta deste úmido porão malcheiroso saiam um pé do chão e eram iluminadas com meias

 janelas”.

“Assim a adega universal se mostrava sobre o chão como uma linha de algum tipo dealvenaria correndo por todo o contorno da casa, para que a casa sentasse nela como uma cadeira”.

Descreve “o buraco na caixa”: “estas muito revestidas paredes de casas de madeiratinham cortadas nelas, ou cortadas delas, para ser mais preciso, grandes buracos para os grandesgatos e pequenos buracos para os pequenos gatos entrarem e saírem. Ou, mais remotamente, para aluz e o ar. Estas paredes recebiam cornijas na sua parte mais alta e telhados propositadamentecomplicados com janelas de sótão. Todo o exterior era tutuoso, juntado como um quebra cabeça,com arremates de canto, almofadas, molduras de janelas, pedras de canto, pedestais, rosetas,misturam de engenhosidade com irregularidade (...) Sempre bay-windows elaborados e varandasfantasiosas reunidas em “ring around a rosie” – este imaginativo fetiche de canto. E os construtoresdaquele período podiam trabalhar com todos estes fetiches em pedra ou alvenaria” (Wright, 1992, p.199).

Diz Tafel (1979, p. 44) que invariávelmente a “caixa” era subdividida em “pequenascaixas”, sem nenhuma qualidade de vida. Reunidas caixas, elas formavam um a cidade de caixa.Em La ciudad viviente (1961, p. 57) Wright comenta que, à noite, a cidade pode parecer fascinantecom sua sinfonia de luzes artificiais. Mas, de dia, a luz do sol revela um monstro de pedra, caixas devidro projetando sombras sobre as outras caixas de vidro. E continua: “nem na construção, nem na

cidade, deve-se tolerar nenhuma forma de mesquinhez. Os edifícios, como as pessoas, são filhos doSol, desenvolvem-se graças ao Sol e com a natureza filha do Sol; e pela natureza, a vida sob o Sol éa aceitação da vida dos edifícios; se não for assim, os edifícios não seriam construções orgânicas”(p. 99).

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A luz orgânica

“...casas humanas não devem ser como caixas, ardendo ao sol”, diz Wright (1992, p.

57), mas devem causar uma “sensação de abrigo, luz e suave sombra, característica da arquiteturaorgânica” (1961, p. 168).

Como será então esta casa com sensação de luz e suave sombra? A resposta está naAutobiografia (1992, p.199): “as paredes da casa agora nasceriam da base, uma mesa de concretoou pedra, que parecia uma plataforma baixa sob o edifício, e geralmente era. Mas as paredes da casaparavam no nível das janelas do segundo andar, deixando o quarto aparecer em uma série contínuade janelas sob largo beiral de um telhado em balanço> Para esta nova casa estava desaparescendo aidéia de parede como um impedimento para a luz e ar do exterior. A velha parede era parte da caixaem que apenas um número limitado de buracos podiam ser abertos. Esta era ainda a concepção deparede quando eu desenhei a casa Winslow. Mas depois disso, minha concepção começou amudar”.

No Testamento (1961, p.205), Wright comenta melhor sua nova concepção de parede:“ao fazer desaparecer as paredes sólidas, fazendo-as reaparecer como imaginativos painéis queabraçam a luz... a arquitetura orgânica vê o abrigo não só como um aspecto de qualidade, mas simde espírito, como o primeiro fator em qualquer conceito de ligar o homem ao seu ambiente, comoum rasgo legítimo do mesmo. O clima é onipresente e os edifícios devem excluir a interpérie. Oabrigo está destinado a estes elementos. Tanto é assim que quase todos os demais rasgos do desenhotendem a conduzir um para o outro através deste importante rasgo: o abrigo e seu componente, asombra... graças à sombra, o encanto se une ao caráter, o estilo ao conforto, o significado à forma”.

Voltando para a Autobiografia: “Meu conceito de parede não era o lado de uma caixa.Era enclausuramento para conseguir proteção contra tempestade ou calor quando necessário. Mas

era também trazer o mundo do exterior para a casa, e deixar o interior da casa ir para o exterior.Neste sentido, eu estava trabalhando pela eliminação da parede enquanto parede para obter a funçãode tela, que significa abrir o espaço que, com as novas tecnologias, finalmente permitisse o uso livrede todo o espaço, sem afetar a estrutura”.

“Sendo o clima como é, violento em extremos de frio e calor, úmido e seco, claro eescuro, eu projetei uma larga concha protetora sobre o todo, retomando o propósito original peloqual a cornija foi desenhada. A parte inferior da projeção do beiral era plana e clara para refletir aluz que fazia os quartos superiores não escuros, mas aconchegantes. Os balanços tinham uma duplafunção: proteção e preservação das paredes da casa, assim como difusão da luz refletida para oandar superior, através da telas de luz nas paredes que eram as janelas” (p. 199).

Por que beirais tão grandes? Em In the cause of architecture, Wright diz “ser capaz defazer beirais resistentes à água, ao tempo, de qualquer tamanho ou extensão seria só umasimplificação. O tamanho grande significa um grande fim... este é o princípio econômico dobalanço. Uma nova estabilidade, bem como uma nova economia. Eis a mais romântica de todas aspossibilidades estruturais”(Wright, p. 141).

Sobre portas e janelas: “...todos os altos das portas e janelas eram agora alinhados unscom os outros com apenas uma confortável distância da cabeça em uma média das alturas humanas(...) assim o fim para a casa desordenada: poucas portas, poucos buracos de janelas, com uma áreamuito maior de janela; portas e janelas abaixadas para as medidas convencionais do homem. Feitasestas mudanças, o forro dos  quartos pode ser rebaixado sobre as paredes, no mesmo sentido daslargas faixas de argamassa das paredes sobre as janelas, da mesma cor que o forro dos quartos. Isto

irá trazer a superfície do forro e sua cor sobre a parte de cima das janelas. Os forros assimestendidos sobre faixas de parede sobre as janelas davam uma generosa cobertura até mesmo paraos quartos pequenos”.

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“Aqui entrou o importante novo elemento de plástica como eu vejo” lembrando queWright entende plasticidade como continuidade física. “E eu vejo como um elemento indispensávelpara o uso da máquina com sucesso. As janelas podem algumas vezes ser dobradas em torno doscantos dos edifícios, enfatizando a plasticidade e o sentido de espaço interior. Eu lutei por janelas deabrir para fora porque as janelas com dobradiça associam a casa com o exterior, oferecem aberturas

livres para o fora, sendo assim mais humanas, mais naturais”(Wright, 1992, p. 200).Nas Kahn Lectures detalha: ‘Tendo compreendido que janelas e portas foram aí

deixadas alinhadas e niveladas em uma conveniente escala humana, o forro dos quartos, tambémpode ser trazido até as paredes, pela horizontal, largas faixas de argamassa nas paredes sobre as

 janelas, a argamassa pintada da mesma cor do forro do quarto... Isto traria o a superfície do forropara baixo, até altura das janelas. O forro assim expandido através das laterais das faixas sobre as

 janelas dava uma generosa cobertura até para ambientes pequenos. O todo se alargava, com umsentido plástico também, através deste expediente. As paredes envolventes, e o forro eramprojetadas assim para voarem juntos”.

“... Luz, ar, e a vista permeadas pelo todo com um senso de unidade... para harmonizaras aberturas necessárias para o exterior ou para o interior, com uma boa escala (proporção n.t) –humana, fazendo-a acontecer naturalmente em separado ou em série no esquema do todo daedificação. Geralmente tinham a aparência de painéis (ou telas) de luz em vez de paredes, por quetoda arquitetura da casa era que determinava o meio que as aberturas apareciam naquelas paredes,agrupadas sobre os quartos como telas envoltórias. O quarto agora era a principal expressãoarquitetônica, e lá não deveria Ter buracos cortados nas paredes, como os buracos cortados nascaixas, porque isto não estava de acordo com a idéia de plasticidade”(Wright, 1992, p. 55).

E nas nove recomendações que faz na sua Autobiografia (1992, p. 200), na Quintareafirma que “...não devem existir buracos nas paredes em nenhum lugar e de nenhuma maneira,como os buracos são cortados numa caixa, porque isto não está de acordo com o ideal de plástica.Cortar buracos é violência”.

De onde vinha esta concepção de janela? Edigar Tafel coloca “o que caracterizava osaltos edifícios da Escola de Chicago além do arrojo e coragem inovativa era o uso do esqueleto demetal como sistema estrutural de organização ligado a uma visão realista de desenho. O uso e opropósito de cada edifício era cuidadosamente considerado no processo de projetação. Cadaelemento no edifício tinha uma significação.

(...) No seu lugar uma elegante ornamentação em baixo relevo nascendo da próprianatureza do edifício. A ênfase estava na altura, naturalmente, mas esses arquitetos tinham umaconcepção muito particular de janelas. Nas estreitas e muitas vezes escuras ruas de Chicago, osnovos edifícios altos tinham de ser providos de quanto mais possível luz natural, pois odesenvolvimento das lâmpadas incandescentes estava nos seus primórdios e a eletricidade custavamuito caro. Considerações de projeto por muita luz e ventilação trouxeram a janela de Chicago,uma longa faixa de janelas acentuadamente horizontais” (Tafel, 1979, p. 34). Esta janela horizontalantecede e gera as de Wright, mas ao mesmo tempo pode ser considerada a mãe das torrescontemporâneas de acó e vidro, isoladas, vitrificadas ao externo.

São interessantes os comentários de discípulos de Wright sobre suas casas. EscreveTafel: “paredes? Não mais serão barreiras, separando o interior do exterior. Serão panos, telas,ligando o exterior ao interior. Como nas casas japoneas: oferecem mobilidade ao espaço:rearranjando as telas, mude o espaço, sendo portando apenas uma interrupção no espaço, ummomento no espaço. Tanto as prairie houses como as casas japonesas abraçam a terra. Por dentro,os painéis móveis oferecem um espaço aberto, ambas são muduladas. A malha é sempre o ponto departida do desenho. O arquiteto que está desenhando no papel usa a malha para ter o sentido da

escala e ritmo do espaço. É o pavimento principal aberto: as caixas do interior são destruídas. Nopiso principal são eliminados portas e divisórias que isolam espaços. Abrindo a casa, a família se junta. A formalidade da sala de jantar é abolida, e o espaço é dividido em áreas de comer, ler ereunião. Projeta a casa em totalidade: o alto e o baixo ao mesmo tempo. Um princípio básico é criar

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a sensação de uma concha confortável. Depois, para reforçar o sentido de segurança, reforça aslinhas horizontais e o embasamento. O telhado pontiagudo é achatado para quase plano outotalmente plano, extendendo-o como proteção sobre toda a casa. Sobre o telhado, a chaminé indicao ponto focal da casa. Transformando as paredes em telas, panos, os espaços adjacentes exterioresadquirem nova significação. A parede nasce na plataforma de embasamento e segue até a soleira

das janelas do segundo pavimento. Mas não se choca com o forro, como borda de caixa. Essaslinhas circundando a parte superior da casa fazem o forro parecer descer com intimidade sobre oespaço. As linhas de janelas do pavimento superior iluminam toda a casa, inundando o forro,através das cornijas, dos beirais, das janelas, refletindo uma suave luz para o interior. O interior dacasa Wrightiana é sempre psicologicamente quente, causado pelo modo que a luz do sol atinge opiso e é refletida de novo. A altura das janelas é diminuída, mas a sua área aumentada, assim a casafica mais brilhante, mais alegre, mais arejada, mais espaçosa, querendo ser uma com a naturezaexterior”(Tafel, 1979, p. 34).

Donald Hoffmann, que escreveu uma série de livros sobre a obra de Wright, comentaem Architecture and nature (1986) que alguns dos edifícios de Wright são bem maciços,principalmente quando limitados por uma área reduzida ou um orçamento pequeno. Por causa da

busca linha horizontal, seus edifícios mais expansivos são mais característicos. Ele dividia a massado edifício em três partes distintas: o piso térro, de paredes geralmente ininteruptas, expressando opeso do edifício, que se agarra à terra, expondo o porão à luz do dia, como se fôsse um palcomaçiço. O pavimento principal encontra o exterior através de compridas janelas ou portas de vidroque provêm o edifício com luz, e é comparativamente mais leve que o pavimento inferior. Oterceiro piso é um refúgio. Estas três divisões se fundamentaram em Ruskin, que dizia que a parededevide-se em três partes: a fundação, ou base, o corpo, e a cornija. Dizia que um deve nascer dooutro como as raízes, caule e copa da flor.

Os grandes beirais brincam com a gravidade e parecem flutuar sobre os espaços vazios.Esses beirais marcam linhas horizontais no espaço. É o pensamento de Wright de relacionar oedifício com o horizonte, e trazê-lo mais próximo à vida, numa escala mais íntima, além do que a

linha horizontal é oferecida naturalmente pelo instrumento natural do arquiteto, a régua “T”. Wrightconsiderava a linha horizontal como a linha da domesticidade. Hoffmann explica este pensamento:as plantas crescem no eixo da gravidade, assim existe na natureza um jogo constante da vertical – agravidade – contra a horizontal – o horizonte. Daí resulta o espaço tridimensional, lembrando queWright não entende a terceira dimensào como espessura, mas como profundidade, e coloca noTestamento (1961,p.133) “a dimensão da profundidade gera a Quarta dimensão: o sentido doespaço”. Em In the cause of architecture (1975, p. 133) Wright diz que “arquitetura não é algobidimensional – há uma terceira dimensão, que pode ser interpretada, num sentido espiritual, comoa qualidade integral da obra”.

Por séculos, as paredes têm sido usadas para isolar espaço, e portas e janelas para seremburacos nesse espaço. Wright resolve este problema agrupando numa ampla faixa de horizontais.Insista em janelas com dobradiças, não apenas porque abriam vigorosamente para o exterior, mastambém se colocavam como ornamentos verticais, fazendo o contraponto à horizontal, como a forçada gravidade conntra a linha do horizonte.

Hoffmann comenta também que Wright dificilmente projetava numa simetria rígida,estática. (“perfeita simetria não pode ser chamada de abstração, entre duas coisas iguais não podehaver proporção, e simetria sem proporção não é composição”, dizia Wright). Uma planta naturalcresce em todas as direções. A natureza se satisfaz em simetrias radiais ou bilaterais em pequenaescala. Em grande escala, tal simetria poderia ser tediosa, não convencendo como expressão emfunções mais complexas. Do princípio de composição nasce a luz interior: “as entradas sãogeralmente pequenas e escuras. A sombra no interior wrightiano é tão importante quanto a luz. A

lareira é a primeira fonte de luz, que oferece luz e calor para a casa. Depois ocorre uma suavetransição para a luz. Sempre que possível orientava seu edifício para o sul e sudeste e abria osaposentos principais através de uma linha longa de janelas ou portas de vidro. O forro era a

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metáfora da floresta. Fazia o forro vir até a parede e inversamente, fazia o ambiente crescergenerosamente até que aparentemente tocasse o forro. Forros também podem ser fontes de luz, deuma luz como da floresta, que passa pelas árvores” (Hoffmann, 1986, pg. 50).

O arquiteto argentino Eduardo Sacriste em seu livro Usonia: aspectos de la obra deFrank Lloud Wright (1960) faz uma excelente síntese do projetar wrightiano, e, em consequência,

de sua “luz orgânica”: ao propor as paredes como limites do espaço, geradoras do conforto térmico,e , ao mesmo tempo, elementos de integração do exterior, obtêm-se no projeto wrightiano umasequência de espaços, que formam um todo uno, que se organizam em torno de um núcleo, alareira, símbolo que une a família e é o coração da casa. Esta sequência de espaços proporcionamdiferentes sensações através de suas luminosidades: os ambientes baixos são mais escuros, osambientes altos são mais luminosos e alegres, como os diversos andamentos das sinfonais docompositor favorito de Wright, Beethoven, conforme relata Olgivanna Wright (1970). Fundamentalno projeto wrightiano é a compreensão de sua gramática: jogos de contrastes com a luz, altura eprofundidade e um clímax, um ponto culminante, como nas sinfonias do referido compositor.

Diz Sacriste que o desenho das portas e janelas exerce um papel fundamental, pois sãoos elementos através dos quais se identifica o espaço exterior e o espaço interior. A transição entreestes dois deve acontecer de modo gradual, quase imperceptível. O beiral em balanço é o elementoque se projeta como continuação da casa até se confundir com a paisagem, ou com o espaçointerior. Cria, portanto, um espaço intermediário, além de uma penunbra interior – nas palavras deWright: “uma luz suave e difusa que o habitante agradece”. Entre a parede e o forro se coloca umalinha de janelas, sendo a parte inferior do beiral iluminada por reflexos e fazendo que se prolongueo interior para o exterior. Eliminando o ângulo escuro que as paredes formam com os tetos, eprojetando estes para o exterior, gera-se um espaço etéreo. Conclui Sacriste que no projeto deWright a forma está intimamente ligada à sua luz (vice-versa), sendo a janela, portanto, oinstrumento fundamental. Sua plástica de espaço reside no jogo de contrastes e na forma que esteselementos se relacionam com o forro.

Assim Rasmussen comenta a luz wrightiana: “a luz pode, por si só, criar o efeito deespaço fechado. Uma fogueira de acampamento numa noite escura forma uma caverna de luzcircunscrita por uma muralha de escuridão. Aqueles que estão no interior do círculo luminoso têm asensação de que se encontram juntos no mesmo recinto. Portanto, se desejamos criar um efeito deabertura não podemos empregar luz concentrada. No início de sua carreira, Frank Lloyd Wrightreconheceu isso. Em suas casas construídas no chamado plano aberto, encontramos paredes edivisórias que não sobem até o teto, mas deixam espaço para aberturas no topo. Isso não só confereuma sensação de abertura ao aposento mas admite luz extra. De modo geral, entretanto, os interiorescriados por Wright são, muitas vezes, predominantemente escuros, visto que, apesar das grandes

 janelas, os beiras e as árvores circundantes absorvem muito da luz direta. E, especialmente, osmateriais que ele usa aumentam a escuridão. Ele emprega efeitos ásperos e rústicos, pedra rusticadae madeira tosca, assim como paredes nuas e tapetes espessos. Para os cantos, que de outro modoestariam completamente na sombra, escondendo interessantes efeitos texturais, Wright obtém luzextra através de uma janela baixa e longa, uma vidraça triangular ou alguma outra novidade, queaclara as sombras à semelhança das lâmpadas extras usadas pelos fotógrafos profissionais. E nessaluz lateral o padrão de veios de madeira e as talhas geométricas podem ser claramente vistas. É umaarte superlativamente refinada, com muita deliberação e engenho; mas é perigoso imitá-la”(Rasmussen, 1986, p. 202).

Assim, a luz orgânica de Wright, simbolizada em seus projetos pela lareira, trabalha nãosó com a luz, mas também com a sombra. “A noite não é nada mais que uma sombra projetada pelosol. O presente é a sombra sempre móvel que divide o ontem do amanhã” (Wright, 1961, p. 159). Éassim que Wright destruiu as caixas ardendo ao sol, e “...o edifício era agora uma criação de espaço

interior banhado em luz” (Wright, Kahn Lectures, 1992).

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O Novo Instrumento

Se, como diz Sacriste, o instrumento fundamental para relacionar forma e luz é a janela,o material deste instrumento é o vidro. Assim, Wright procurará dissecar o funcionamento deste

novo material, principalmente em um dos artigos de In the cause of de architecture (1975), que emgrande parte será aqui reproduzido para melhor ilustrar o raciocínio de Wright.

Nas Kahn Lectures, diz: “toda a história da arquitetura poderia Ter sido radicalmentediferente tivessem nossos antepassados usufruído esses grandes privilégios desta conexão evisibilidade que fazem as paredes – e mesmo os pilares – algo que se vê livre de qualquer custo. Ovidro fez isso. O vidro sozinho, sem ajuda de nenhum de nós, poderia eventualmente Ter destruídoa arquitetura clássica completamente”, ou a melhor caixa que Wright tanto combate.

“O vidro possui agora uma perfeita visibilidade, finas folhas de ar cristalizadas paraconter as correntes de ar dentro ou fora. A superfície do vidro pode também ser modificada paradeixar a visão ampla em qualquer extensão até a perfeição (...) as sombras eram o realce da antigaarquitetura. Façamos a arquitetura moderna trabalhar com luz, luz difusa, luz refletida, luz refratada,a luz como seu próprio objetivo, as sombras indesejáveis (...) o prisma sempre fascinou o homem.Nós podemos agora morar em edifícios prismáticos, limpos, bonitos e novos” (Wright, 1992, p. 38).

Como pode o vidro concretizar a relação forma – luz? “Inúmeras vezes, o edifício devidro foi retalhado em escalas – qualquer uma, conveniente ou não. Foi usado em dormitórios,prédios de escritórios, hotéis, prédios de apartamento, fábricas, casas de força, residências –raramente com identidade próprio”, “a caixa de vidro, juntamente com a fachada protegida, isolada,e dezenas de outros modismos rejeitados, funcionais em alguns protótipos, estranhamente familiaresdevido a suas incontáveis réplicas, tornaram-se não internacionalmente símbolos da sociedade semrosto, indiferenciada, que os produziu. O glamour da inovação tecnológica é apenas aparente”(Wright, 1975, p. 260); “a casa de alguém que vive na cidade poderá Ter muito vidro, mas não o

tanto que cegue seu morador” (Wright, 1961, p. 159). Como utilizar então o vidro? “pelo sentido dovidro, então (...) o postulado de integridade precisa encontrar o significado da realização. Abrir oencontro do edifício com o terreno, e o interior do edifício encontrar o fora e associá-lo ao terreno.Terreno e edifício, serão assim mais e mais integrados ao se abrirem para o entorno, alcançando asdifíceis implicações e efeitos do postulado de integridade, o conceito de espaço orgânico interior.Realização de suas necessidades nesta época complexa em toda a vasta variedade de tipos deedifícios” (Wright, 1992, p. 367).

Wright detalha o “significado da realização” no citado artigo In the cause of architecture(1975), mais especificamente no capítulo “The meaning of materials – glass”.

“A maior diferença entre as edificações antigas eas modernas é o uso do vidro”.

“A maior necessidade de visibilidade fez com que paredes e colunas fossem intrusas,que precisavam ser eliminadas a qualquer custo”.

“Chapas de cristal tomam lugar da parede estrutural na maioria dos edifícios comerciais.O vidro é uma oportunidade para o uso de belas construções com chapas de metal e aço. Tudo o quefoi feito com vidro, até agora, arquitetônicamente falando, foi ocupar os mesmos espaços abertospelo vidro opaco, apenas agora com uma perfeita visibilidade, execeção feita nos determinadospelos donos de lojas. As lojas são o local onde o vidro chega quase a seu espaço natural”.

“Qual é esse material mágico, que só não é visto quando olhamos para ele? Você podeolhá-lo também como um brilho, que recebe reflexos e reflete luz límpida”.

“O vidro, como cristal, ainda não adentrou completamente a poesia da arquitetura.

De um lado, é muito novo; de outro, não tem tradição. É essencialmente moderno. Asmáquinas, ao fabricarem o vidro, deram ao arquiteto um novo material com que trabalhar. Se ovidro fosse eliminado agora das construções, isso significaria, visto a que ponto chegamos, que

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nossos olhos seriam eliminados também. Não combinar o vidro com o metal, a teia de aranha, etecer a moldura da construção como um argumento para a clareza do cristal – o cristal seguro pelometal como o diamante é seguro pela base de ouro e fazer disso a construção?”

“As sombras foram a pintura dos arquitetos quando modelavam as formasarquitetônicas. Que se trabalhe agora com a luz difusa, a luz refratada, luz refletida sombras à

parte”.“Máquinas podem fazer qualquer tipo de vidro: grosso, fino, colorido, texturizado, ou

ordinário e barato. Novas experiências o aguardam”.

“Então, porque cidades modernas são imitações de fortificações medievais?

Pranchas de vidro grosso, preto ou branco, já fazem muito como substituições. Azulejosde vidro não são incomuns, como também mosaicos”.

Percebe-se aqui que Wright escolheu o vidro como matéria prima para suasornamentações. Seus desenhos eram puramente geométricos, para não serem confundidos com anatureza. Wright considerava o gótico o mais próximo ao orgânico, analogia que pode ser feita

também nos seus vitrais. Assim. Jecks considera suas janelas uma reinterpretação dos vitrais dascatedrais góticas. Continuando o texto: “A dificuldade é que os arquitetos estão presos a idéiastradicionais de como uma construção precisa parecer. E, quando se utilizam de novos materiais, épara usá-los em conformidade com as idéias preconcebidas”.

“Todo novo material significa uma nova forma, um novo uso de acordo com suanatureza”.

“Agora, as paredes tendem a desaparecer, os tetos também, e sim também o chão. Porque não? Em certos casos ... bem cuidados, recursos dessa monta podem ampliar e transformar umgabinete num reino, um quarto num belvedere, uma unidade simples em áreas ilimitadas de cores,formas e padrões”.

“Na natureza, o espelho encontra-se na natureza na superfície de lagos, nas cavidades demontanhas e nas poças sob a sombra das árvores, nos sinuosos desenhos dos rios que retêm edevolvem as aves, nuvens e o céu azul”.

“Mas para entender a vista, completar a forma, multiplicar a unidade onde a repetiçãoseria um prazer, trazer ilusão e brilho junto a efeitos de luz todos esses são bons usos que oarquiteto pode fazer dos espelhos”.

“A verdade é que o arquiteto nunca usa vidro plano nas suas janelas ou nos interiores;não emprega em seus edifícios o mesmo elemento que se apresenta nos lagos límpidos da paisagemexpostos a reflexões”.

“E essa oportunidade é nova. Engenhosamente mostra a beleza do interior e do exterior,

e os efeitos podem ser vistos se o vidro de má qualidade for substituído por vidro plano polido”.“Talvez nenhuma outra mudança nos materiais usados na construção poderia

materialmente desmoralizar o efeito do todo quanto essa substituição”.

“Nas aberturas de minhas construções, o vidro faz o papel da jóias na categoria dosmateriais. O elemento padrão é mais barato e bonito quando introduzido no vidro da janela do queem outro lugar que a arquitetura tenha a oferecer”.

“As divisões metálicas são a tela, de qualquer modelo leve ou pesado, chapeado emqualquer material, seja ele ouro ou prata. O vidro é um acento rítmico, subordinado de qualquer detodo e qualquer significado emocional e vice-versa. Os modelos podem ser calculados tendo comoreferência a proporção do interior e o esquema da decoração será dado, ou mantido, pelos motivos

do modelo do vidro”.“Tenho usado opalescentes, opacos, branco e ouro nos grupos geométricos dos spots

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fixados no vidro limpo. Usei, preferencialmente, cores primárias limpas, como os vitrais alemães,para conseguir efeitos decorativos. Creio que a ênfase nas cores primitivas interfere menos nafunção de janela e adiciona uma nota arquitetônica superior para o efeito luz propriamente dito”.

“Esse recurso pode ser visto em quase todas minhas obras, com algumas adaptações. Eleé empregado comumente em nossas construções mas usualmente super-utilizado ou não

suficientemente convencionado”.“Nada é mais aborrecido para mim que qualquer tendência em direção ao realismo na

forma de janelas de vidro que são misturadas com a vista de fora. Um padrão de janela precisa estarfirmemente colocada. O magnífico cenário da janela e a tela dos edifícios religiosos é outra história.Ali, as janelas são maravilhosas pinturas, apenas a luz, luz suficiente para ser difundida e inundar ointerior”.

“Construções de vidro e bronze são as possibilidades mais engajadas na arquiteturamoderna. Imagine uma fábrica iridescente de dia, luminosa à noite, imperecível. Construçõesfábricas brilhantes, salpicadas com vidro, todo transparente ou meio opaco, meio transparente,colorido ou estampado com as tramas do metal, para unificar tudo e ser, em si mesmo, algo de

delicadeza beleza compatível com a esguia construção do metal, expressando a natureza daconstrução na matemática da estrutura, que é, ao mesmo tempo, a matemática da música”.

“Em qualquer extensão a luz pode ser reduzida com o uso de telas, anteparos, ou cominserções de vidro opaco”.

“Também há o ornamento da luz, que faz parte da construção. Não um aplicativo, nemuma completamente, mas realmente arquitetura”.

“Esse é um campo novo. Comecei-o cedo no meu trabalho e não vejo limites naspossibilidades de beleza dessa característica do uso de vidro. Felizmente, esse campo está sedesenvolvendo mais que os outros. O senso de iluminação total, integral, vem mais fácil e naturalporque não há precedentes que impeçam seu progresso. E assim como com a iluminação, em breve

pairará desgraça sobre o arquiteto que deixou algo da natureza física não assimilada em suasconstruções, no seu design como todo”.

“Iluminação integral começou com esse ideal em minha mente. Vidro e luz duas formasde uma mesma coisa”(Wright: 1975, pp. 197-202).

Pioneiro na exporação das potencialidades do vidro, Wright soube evitar os problemasque este material pode acarretar: “o edifício de vidro é um exemplo. É possível que tenha nascidocom a própria tentativa de Wright em abandonar a caixa com buracos nos lados. Seu objetivo eramalcançar uma qualidade espacial no interior que se relacionasse com o exterior, um espaço contínuo,sem ser inibido por cantos fechados, tanto transversalmente quanto no plano. Paralelamente com oproblema espacial havia o do janelamento, que Wright e sucessivas gerações de arquitetos

resolveram com a strip window, (janela corrida). A esta seguiu-se a janela que ia do chão ao teto.Finalmente, ao fazer do prédio todo uma janela, o problema deixou de existir. Essa solução colocouum outro: o extraordinário calor perdido no inverno e o ganho no verão” (Victor Honbein apudWright, 1975, p. 26).

Hoffmann comenta a seguir o uso de vidro por Wright: “Wright considerava o vidro amaterialização da luz, o espetáculo da leveza. Considerava-o maios paradoxal material daarquitetura, e o mais complexo em relação à natureza. Como um sólido plano, através do qual podese ver com perfeição a paisagem exterior. Também como lentes que enquadram artisticamente anatureza, tornando até os quadros reduntantes. Assim como Thodeau dizia serem os lagos os olhosda natureza, vidro são os olhos da edificação para a natureza, que traz para o interior a menormudança de luz. Pode ser transparente ou colorido, como as asas de uma borboleta”(Hoffmann,

1986, p. 29).

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A Luz nas Obras

A primeiraobra de Wright onde pode se detectar a prática de seu pensamento teórico é acasa Winlow, de 1893. Ainda possui o conceito que a casa é uma caixa em que se deve abrir janelas

do tipo agulhas, porém o beiral já se lança em um arrojado balanço, sombreando as janelas dopavimento superior e estas t6em a parte superior encostada na parte inferior do beiral. Mas “oproblema seguinte a ser resolvido era da continuidade espacial, sua extensão para o exterior, e aexpressão disto na edificação como um todo (...) a textura quebradiça da superfície espalha a luz ecria um jogo de sombras que diminui qualquer sentido solidez estrutural na parede sob o balanço”(Scully Jr, 1969, p. 15).

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Em 1900, Wright propõe “casas numa cidade da pradaria”, onde a concepção básica das janelas em linha, tetos planos em balanço, generosos beirais marcam a composição. Tal pensamentoconcretiza-se na casa Willits, de 1902: “as janelas são recuadas, assim as paredes tornam-se apenasplanos que definem o espaço e a cobertura lança-se para frente em continuidade, flutuando eexpressando aquela continuidade de espaço ao redor à qual toda edificação agora está integrada”

(Scully Jr, 1969, p.18), ao mesmo tempo que é marcante nas elevações o jogo das paredes clarascontra a madeira natural e o vidro decorativo. Mas talvez seja a casa Robie de 1908 a mais bemsucedida de suas “casas de pradaria”, onde o telhado realmente flutuano espaço, onde as janelas sãoprojetadas como elementos componentes da estrutura, agrupadas ritmicamente, dialogando com ailuminação artificial construída ao redor das paredes do salão para gerar um efeito indireto,transformando o forro em céu dourado. Os vidros com seus desenhos florais modificando a cor daluz para dourado, violeta, turquesa, rosa, marron e verde retêm uma associação com os vitrais dasgrandes catedrais góticas.

Descrevendo o edifício Larkin de 1904, Wright diz em sua Autobiografia: “o interioriluminado pelo alto criava o efeito de uma grande família trabalhando à luz do dia, morada ao arlivre, oferecida pelo pátio central” (Wright, 1992, p. 2060). Para chegar a este efeito, projeta oedifício “introvertido, antítese dos da pradaria, com um grandioso poço iluminado zenitalmente”(Zevi, 1990, p. 67 ) tendo em baixo um grande pátio central rodeado de balcões que o ampliam.

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Esta idéia de iluminação zenital é retomado no projeto do Templo Unitário de 1906, de

planta quadrada e volume cúbico, onde o cubo representa na concepção wrightiana, a integridade.“A cobertura da sala de culto é um gigantesco jogo de claraboias. (...) ... o espaço é sorvido paracima para expandir-se depois em todas as direções”(Zevi, 1990, p. 72) e “a luz e o espaço, semponto fixo de referência, vindo de várias fontes, dá dinamismo ao cubo estático. Sempretrabalhando em altos contrastes de luz e espaço: assim como Beethoven, acentua o drama através deviolentos contrastes”, comenta Jencks (1982, p. 48).

Em 1936 projeta sua residência mais famosa, a casa Kaufmann, “Fallingwater”, em BearRun, Pennsilvânia. Ponto culminante na sua exploração da linha horizontal e de sua concepção de“explodir a caixa”, oferece saliências impressionantes na sala de estar e nos terraços superiores. O

 jogo dramático de contrastes luminosos começa no exterior, com os balanços brancos contrapondo-as árvores verdes, continuando com uma entrada de dimensões limitadas para que a luminosidadeda sala seja ressaltada ao máximo, num jogo de luzes e sombras. Totalmente integrada à natureza,“a casa é cenário de fundo para as estações do ano, para as mudanças de tempo, para a luz do dia;ao mesmo tempo, os espaços mais escuros e mais progetido desenhados por grandes massas depedra, contrabalançados pelos balanços dos terraços, são acolhedores, e um sentido de abrigorefúgio, onde o murmurar da cascata reforça a quietude da floresta” (Hoffmann, 1978, p. 21).

O ponto culminante da casa é um complexo e transparente poço de luz definido pelaescadeira, parapeitos, paredes de vidro e pergolado que se abrem no canto leste da sala para a luz

acima e abaixo, e para as vistas horizontais, contrabalançados pela grande massa da chaminé nocanto oposto, que se liga a uma linha contínua de janelas horizontais, que não iluminam apenas asescadas da casa, mas também a cozinha e dois dormitórios voltados para o leste. Assim é como que

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se as paredes se “dissolvessem” em janelas com um desenho básico de contraponto de horizontaiscom verticais, abrindo-as para vistas em constante mutação e as janelas liberam os grandesbalanços, desaparecendo a tradicional composição estrutural d vigas e pilares.

No mesmo ano do projeto da “Casa da Cascata” é o Edifício da Administração Jonhson.Wright retoma idéias do projeto do Edifício Larkin de 22 anos atrás: de novo o edifício voltando-se

para dentro, de novo um grande espaço central extremamente luminoso. O edifício é assim descritopelo arquiteto argentino Sacriste: “jogos de luz, proporção e cor. Entra-se por um túnel quecontrasta com os espaços e luz exterior. A imagem das portas é de um plano muito brilhante: ocristal, tubos pirex, bronze, luz forte. Da porta entra-se num hall luminoso. Os planos verticais ehorizontais não se tocam, mas estão separados por uma faixa luminosa, as esquinas recebem umintenso golpe de luz. A estas faixas de luz se soma a luz zenital que cai por entre os capitéisfungiformes no centro, repetindo a imagem do sol que se desfaz num bosque para cair em forma deraios. Os capitéis se vêm a contraluz” (1960, p. 76). Curiosa é a combinação de cores: roxo nosladrilhos contra os amarelos dos tubos pirex. O comentário de Jencks é sucinto: “uma catedral dotrabalho, com janelas de vidro pirex, sem conexão com o exterior, mas com uma luz difusa quedança sobre as cabeças”. Zevi comenta o edifício com entusiasmo: “o elemento linguístico de maior

relevo, a verdadeira invensão, consiste nos tubos de vidro que tornam a construção mais leveprecisamente no ponto em que tradicionalmente se torna pesada devido à cornija. Depois de terlibertado as esquinas mediante um uso generoso de janelas-portas angulares, Wright decide estendero sistema da horizontal à vertical e pela primeira vez na história, abre também à luz o nó de uniãode paredes e telhado. Deriva daí uma característica fluida, mágica, ondulante do invólucro livre depeso, flutuando entre faixas e segmentos de luz, ajustado aos movimentos humanos” (1985, p. 160).

Miyake comenta assim o Edifício Johnson: “é bastante diferente de Taaliesin ou dasPrairie Houses, sua filosofia de luz, materiais e espaços para este edifício é oposta às funcionalistase sua objetividade. As fileira das colunas em forma de cogumelo, como lótus num lago, a luz caindoatravés das aberturas entre as pétalas das colunas e o cintilar dos tubos de pirex no forro e nasparedes nos faz perceber a reflexão e a refração como se nós estivéssemos olhando do fundo de umlago para as ondas da superfície” (Miyake apud Futagawa, 1994, p. 215).

Nos projetos seguintes Wright estuda vários filtros para a luz, como em Taliesin West(1938) no Arizona: “localizado no deserto som um constante e severo sol. Para Wright, que quisabrir sua arquitetura para a natureza, o sol em si se tornou o leitmotif trazido para dentro daarquiterua”.

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“No deserto cruel, entre montanhas rochosas, exposto ao sol eterno e a um rígidocontraste entre vida e morte, a luz não é o sustento da vida, mas uma entidade horrível que leva ohomem à beira da morte através de de seu sufocante calor. A luz penetrando através de uma fendado edifício gera terror como uma faca afiada. A arquitetura de Taliesim West, que parece evocar aestrutura de uma tenda indígena, simboliza a luta dos habitantes do deserto contra o sol” ( Miyake

apud Futagawa, 1984, p. 215).

Nos projetos seguintes Wright estuda vários filtros para a luz, como em Taliesin West(1938) no Arizona: “Localizado no deserto som um constante e severo sol. Para Wright, que quisabrir sua arquitetura para a natureza, o sol em sí se tornou o leitmotif trazido para dentro da

arquitetura”.“No deserto cruel, entre monhanhas rochosas, exposto ao sol eterno e a um rígido

contraste entre vida e morte, a luz não é o sustento da vida, mas uma entidade horrível que leva ohomem à beira da morte através de seu sufocante calor. A luz penetrando através de uma fenda doedifício gera terror como uma faca afiada. A arquitetura de Taliesin West, que parece evocar aestrutura de uma tenda indígena, simboliza a luta dos habitantes do deserto contra o sol” (Miyakeapud Futagawa, 1984, p.214). A grande inovação é o uso da lona como cobertura. A luz entra poraberturas perfuradas num material opaco, mas parece estar no ambiente, difusa e uniforme. Outraproposta de filtro é feita na casa Johnson (1937): o vidro é separado por largos montantes que sópermitem vistas paralelas a elas mesmas, interceptando as vistas oblíquas. Na casa Lewis (1940),rodeada por uma espessa floresta, os beirais, pergolados e caixilharia criam um jogo de luz esombra parecido com o da folhagem das árvores do entorno.

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Um projeto extremamente interessante é a Torre Price, em Bartleville, Oklahoma, de1956; utiliza brise-soleil e parapeitos em cobre e vidros refletores de cor dourada. Wright escreveum livro sobre o edifício – The story of the tower – the tree that escaped the crowed forest ( 1956)do qual foram destacados os seguintes comentários; “... não é uma mera fachada ou propagandasobre o vidro (p.11)... o espaço interno ao vidro é protegido, permitindo mais ou menos luz,

conforme o desejado (p.12)... o edifício foi implantado de uma maneira que o sol ilumina apenasuma fachada por vez e lâminas de proteção (...) fazem sombras cair sobre as fachadas conforme osol se move, oferecendo proteção e confortos necessários (p.16)... os quebra-sóis verticais, com seuexterior de cobre e interior de material não condutor, são largos e fortes o suficiente para sesustentar de piso a piso e projetam sombras no vidro, em maior ou menor quantidade, conformedesejado. Mais projeção enriquece a sombra. Menos, dissipa-a e o brilho do interior. Essas lâminasde cobre atuam no sol como óculos escuros”(1975, p.14).

Assim Victor Hornbein comenta o edifício: “a solução de Wright para a Price Tower,em Bartlesville, Oklahoma, foi sombrear as paredes: sombras horizontais no sul e verticais no lestee oeste. Encobrir o sol nos espaços interiores reduz o calor proviniente da radiação,consideravelmente. A solução típica, porém, é tecnológica: maiores sistemas mecânicos, isolados e

vidros semi-espelhados que refletem uma quantidade considerável de calor, mas que permitem umaentrada maior do que caso os vidros fosssem sombreados externamente. O resultado é um consumoextremo de energia” (apud Wright, 1975, p. 27).

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Quarenta e três anos depois de seu famoso projeto da Igreja Unitária, Wright projetaoutra em Madison, Wisconsin, em 1949. Assim Bruno Zevi descreve a igreja, começando com umacitação de Wright: “se o quadrado significa integridade, se a esfera significa universidade, otriângulo significa aspiração. Esta é uma construção em atitude de oração... os unitários, numprimeiro instante, queriam realizar a igreja na cidade. Partindo da idéia de descentralização,conseguimos no entanto persuadi-los a edificarem a igreja no campo, fazendo dela um típico centro

social. A atitude da pessoa em oração simboliza a unidade suprema. O telhado de complexosvigamentos de madeira foi revestido de cobre”, e concluída a citação de Wright, continua Zevi:“muros de pedra calcárea que os próprios membros da comunidade arrancaram a poucas milhas dedist6ancia Auditório para 250 pessoas que pode ampliar-se a 400 com a sala adjacente. Mais queuma ‘casa de Deus’ é um ambiente para encontrar-se e meditar. Onde desemboca o itinerário dequem a pecorrer? Na paisagem enquadrada por uma imensa vidraça. Portanto trata-se do diálogo dohomem associado não com a trancendência, mas consigo mesmo. Uma religiosidade intensa masque não procura transferir a entes superiores as próprias responsabilidades. O destino humano já ébastante pleno de mistérios para que tenha necessidade de recorrer à persuação oculta dasatmosferas místicas, às cavidades incomensuráveis, às luzes antigas. Para os unitários, o templonão é um refúgio, muito menos uma evasão” (Zevi, 1990, pg. 220 -223).

Já Portoghesi comenta a igreja assim: “para Wright não foi preciso repudiar nenhumaortodoxia racionalista para descobrir o valor simbólico e a riqueza dos efeitos luminosos, pois elepertencia à geração de Olbrich, Mackintosh e Guimard, e assim permaneceu sempre fiel à inpiraçãotardo-romântica defendida desde o início de qualquer rigor neo-iluminista. O ‘trabalho de luz’,protagonista da fabulosa administração Johnson, se transformou na ‘luz da oração’ na primeiraIgreja unitária em Madison. Enquanto a cobertura inclinada insinua o gesto das mãos em oração, a

 janela de vidro duplo abertas na parede traseira onde o teto nasce se transforma em ‘luz petrificada’transferida para uma simples caixa de vidro. Vidro, que na tradição funcionalista tem a função detornar tudo transparente, eliminando os lugares escuros e misteriosos, aqui vem a ser, mais uma vezcomo numa catedral baroca ou numa cúpula, um símbolo do misterioso, do desconhecido, dapresença tangível de algo que não pode ser analisado e revelado, mas apenas ‘sentido’ em nós

(Portoghesi apud Futagawa, 1994, p. 16).

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“O itinerário wrightiano culmina ao ancorar na metrópole mais hostil e odiada”, diz Zevi(1990, p. 248), “trampolim de lançamento de todos os movimentos acadêmicos e reacionários quedesprezaram as tendências renovadoras do Middle West e do West, a começar pela Escola deChicago. O Guggenheim é uma intervenção urbanisticamente polêmica porque denuncia asincongruências do tabuleiro de xadrez nova-iorquino. É polêmico e blasfemo com relação à habitualordenação dos museus, já que recusa o inerte mecanismo de salas-caixas justapostas, cada umafechada em si mesma, sem continuidade”. Pode aí ser acrescentado que Wright é blasfemo tambémem relação à iluminação tradicional destas caixas. Comenta Michael Graves no citado livro deJencks: “penso que museus devem ser templos de arte, mas este parece ser um templo da luz. Essainacreditável luz que vêm através da cúpula e é finalmente filtrada quando é refletida de volta para

as superfícies das paredes. É um templo para a luz e procissão, para ser visto em vez de verpinturas nele”.

Donald Hoffmann, em seu livro Frank Lloyd Wright: Architecture and nature, sintetizao percurso de Wright em busca da luz: “em 1893, experimentou o uso da luz difusa no seuescritório de Chicago, com um forro de vidro trabalhado na altura das portas. O efeito da luz zenitalera como raios de sol. Concluiu que aqueles raios de sol eram prazerosos, uma verdade essencialcontra o sofrimento do mundo e que a sabedoria do céu deveria fazer parte da vida do espaçointerior, como a sabedoria da terra. Clareiras podem ser criadas por luzes fortes em lugaresinesperados” (1986, p. 50). E estas clareiras surgem nos projetos de Wright, muitas vezes de umamaneira não convencional, mas sempre para dar o toque definitivo de criação em seus projetos. Doforro da sala da Casa Robie vê-se o céu que protege esta clareira; o salão cúbico do templo unitário

tem a luz da floresta com suas árvores balançando ao vento; o salão de desenho de Taliesin é aclareira em contraponto a uma escura floresta; o salão pricipal da Johnson Administration é umafloresta de colunas de concreto, recebendo luz de grupos de tubos de vidro no forro. O museuGuggenheim é um projeto de luz, um templo dedicado ao sol, símbolo da vida em meio à selva deconcreto.

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III) A LUZ RACIONAL DE GROPIUS

 Às vezes, em dias de luz perfeita e exata

Fernando PessoaAntes de 1860 a Alemanha era um país predominantemente agrário, com 60% de suapopulação residindo no campo. Mas em 1914 já era a maior nação industrializada da Europa. Esseprocesso de industrialização refletiu-se no aumento de sua população: se em 1815 existiam 25milhões de alemães, cem anos depois já eram 70 milhões. A industrialização levou à urbanização:em 1840 havia na Alemanha duas cidades com mais de cem mil habitantes; em 1910 já havia 48(Gideon, 1954, p. 5 ). Como resultado, uma nova classe surgia: o proletariado, concentrado nascidades que precisavam lhe oferece moradias.

É neste cenário que irá trabalhar Walter Gropius. “Filho de um arquiteto que cresceranuma família que combinava a melhor devoção prussiana ao dever e à disciplina com a fortetendência liberal e inclinação artística das famílias alemãs da alta classe média. Alto e simpático,ele ostentava seu grande idealismo com a dignidade comedida de um oficial cavalariano da velhaguarda. Ele é o pedagogo paciente, o sintetizador de idéias. Para ele nada é ou ... ou, mas, comomuitas vezes, é sempre é” (Von Eckardt, 1975, p. 90).

“Gropius abriu a Bauhaus em Weimar, a capital alemã, em 1919. Era mais que umaescola; era uma comuna, um movimento espiritual, uma abordagem radical da arte sob todas asformas, um centro de filosofia comparável ao Jardim de Epicuro. Gropius, o epicuro dessa peça,tinha trinta e seis anos, os cabelos negros e bastos, penteados para trás, era era magro, vestia-se comapuro e simplicidade, era irresistivelmente atraente para as mulheres, correto e educado à maneiraclássica alemã, fora tenente da cavalaria na guerra, condecorado por bravura, uma figura quetranspirava calma, certeza e convicção no centro do turbilhão” (Wolfe, 1990, p. 12). Um arquiteto

segundo Gideon (1954, p. 12) de pensamento racional, disciplinado, voltado para o futuro, àprocura de um método universal de abordar problemas: “os novos tempos exigem a sua própriaexpressão”, escreve Gropius em 1913, “uma forma desenhada com exatidão, sem nenhum tipo deacaso, contrastes nítidos, ordem das componentes, a organização em série das partes similares, eunidade de forma e cor: estas serão as bases estéticas do arquiteto moderno que estão emcorrespondência com a energia e economia da nossa vida pública” (apud Berdini, 1983, p. 10). Estasua preocupação é sintetizada em duas de suas colocações quando professor da Harvard University:“na era da especialização, método é mais importante que informação”, “o como é de longe maisimportante que o que” (Gideon, 1954, p.11).

Em artigo de fevereiro de 1950, a Architecture d’Aujourd’hui comenta sua influência:“Gropius foi o primeiro homem que interpretou a revolução industrial em termos arquitetônicos

para nós, em termos de design, em termos de planejamento urbano. Ele constantemente investigavaas grandes potencialidade da sociedade industrial e nos mostrava como assimilá-las em nossassempre mutantes necessidades... olhando de volta para estes últimos doze anos, nós, que fomos seusalunos, podemos dizer com gratidão que ele nos mostrou um lugar na sociedade; que ele nosensinou que mecanização e liberdade individual não são incompatíveis; que ele nos expôs aspossibilidades e valores da ação comunitária” ( Walter Gropius et son ecole apud gideon, 1954, p.11).

Frequentemente sua arquitetura é chamada de funcionalista. Porém “a arquiteturaracional de Gropius é qualquer coisa de substancialmente distinto do funcionalismo”, diz Berdini(1983, p. 11), pois sua intenção é “empobrecer o vocabulário para enriquecer a sintaxe, isto é, asrelações com a existência, através da renúncia ao gratuito e adoção do imprescindível que se traduz

em meras relações geométricas e matemáticas para chegar por fim à autenticidade libertadora evirtuosa da idéia”.

Sua arquitetura oferece soluções a importantes problemas: a organização dos volumes

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no espaço, a pré-fabricação e produção em massa de conjuntos habitacionais e, importante para estetrabalho, a questão da transparência. Só estes três pontos colocariam em destaque seu nome nahistória da arquitetura, porém, seu caráter amistoso prefere o trabalho em conjunto, em grupo.Gideon (1954), ao escrever sobre Gropius, mostra isso no título: Walter Gropius – work andteamwork. Trabalha na Bauhaus com Klee, Kandinky, Feininger, Schlemme e Moholy-Nagy, e em

projetos de arquitetura com Adolph Meyer, Maxwell Fry, Marcel Breuer; em algumas obras seunome nem chega a aparecer, apenas a sigla de seu escritório, TAC – The Architects Collaborative.

Como iluminar uma obra, como criar transparências é uma das preocupações centrais desua arquitetura. As janelas de canto, a escadaria circular dentro de um cilindro de vidro do pavilhãoda Werkbund viraram ícones arquitetônicos. Porém, para se entender como seu raciocínio construiuestas obras, deve se entender a realidade alemã daquele momento.

Conjuntos operários

“Irmãos, em direção ao sol, em direção à liberdade, irmãos, para a frente em direção àluz, que o passado sombrio ilumina o futuro”. Esta velha canção revolucionária é citado por AnatoleKopp em seu livro Quando o moderno não era um estilo e sim uma causa (1990, p. 42) como umaconcepção do ambiente e da habitação que, de uma certa forma, o modernismo e em especial a novaarquitetura alemã tentaria realizar no período entre as duas guerras.

“No século 19 a luz não muito aprecia pelo público (exceto talvez pelo fazendeiro) eainda não era considerado como um importante fator para nossa saúde física ou mental. Naquelesdias, janelas em casas e edifícios eram taxadas, como se representassem luxo. As mulheres seprotegiam contra a luz do sol com sombrinhas e cosméticos. A luz do dia nas casas era filtrada porduas ou três camadas de cortinas. E os operários das fábricas estavam em condições piores: só como desenvolvimento gradual das reformas sociais foi garantida a todos o direito de vida e condições

de trabalho melhores. Mesmo no início do século, os níveis mínimos de iluminação para tarefaseram totalmente inadequados. Somente após a primeira guerra mundial as pessoas passaram ausufruir a luz do sol e um rosto queimado pelo sol não era mais algo degradante” (Kalff, 1971, p.V).

Diz Kopp que os pontos em comum entre os arquitetos modernos eram o “papelpredominante reservado à indústria na produção arquitetônica e artística, em detrimento doartesanato; a pesquisa de soluções de massa para as necessidades da massa; a crença nas virtudespedagógicas do ambiente construído considerado como um instrumento de transformação social” –como um condensador social, dirão os arquitetos da vanguarda soviética – “mas sobretudo a fé naiminência das transformações sociais”. E assim, continua Kopp, esses arquitetos utilizam o“emprego de materiais e técnicas novas surgidas (...) e fizeram explodir o espaço geométricofechado e abriram-no para o exterior, para a luz e para o verde” (Kopp, 1990, p. 23).

Walter Gropius começa a trabalhar em Berlim, cidade marcada pelo cortiço operário.Conta Kopp (1990) que em 1880 a metade de todas as habitações da cidade possuía apenas umaposento que podia ser aquecido, ou seja, munido de um condutor de vapor e “perto de 4000habitações não tem qualquer possibilidade de aquecimento!”. Isso numa cidade de condiçõesclimáticas pesadas. Lembra ainda Kopp que “nesses alojamentos a luz e o sol nuncapenetram”9p.30).

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A luz racional

Em 1926 Gropius escreve que “não são mais vilas particulares, mas centenas deapartamentos que precisam ser construídos. Não mansões para os ricos, mas boas casas, utilizáveis

pelos operários, residências que respondem não a princípios estéticos, mas sim a dados objetivos”(apud Kopp, 1990, p. 46); esses “dados objetivos” são assim definidos por Gropius: “luz, ar sol”, .A concepção mais favorável de conjunto, se levarmos em conta todas as considerações econômicase de higiene, deveria ser obtida pelo Zielenbau- habitações em fileira – de orientação norte-sul, comespaçamento suficiente entre essas fileiras.

Obviamente os grandes conjuntos alemães dos anos vinte e trinta resultam sermonótonos, na medida que a melhor orientação e a distribuição rigorosamente igual são elementosdeterminantes, mas este trabalho não requer analisar a questão da monotonia, mas sim como osproblemas de orientação, de iluminação foram determinantes na concepção arquitetônica.

Apesar da Fábrica Fagus, do Edifício da Bauhaus e da proposta para a concorrência paraa Torre do Chicago Tribune serem as obras destacadas de Gropius que qualquer livro de arquitetura,a habitação operária é um dos pontos centrais de sua considerações teóricas: “O problema dahabitação mínima é questão de um mínimo elementar de espaço, ar, luz, calor, que o homem precisapara não sofrer, por causa da moradia, inibição no pleno desenvolvimento de suas funções vitais,portanto um mínimo de ‘modus vivendi’ em vez de um ‘modus non moriendi” (Gropius, 1971, p.151). Este mínimo varia segundo as condições locais da cidade e país, paisagem e clima; a mesmaárea de espaço livre tem função diversa numa rua estreita do centro da cidade e num subúrbiomenos habitado. Von Drygalski, Paul Vogler e outros higienistas afirmam que o homem, quandodispõe da possibilidade de tomar ar e sol, precisa de pouco espaço habitacional do ponto de vistabiológico, “ainda mais quando este é bem organizado tecnicamente; pode-se obter um quadro claroda superioridade de uma pequena habitação moderna, bem estruturada, em face de uma casa velha esuperada, na comparação que um conhecido arquiteto faz entre uma mala de viagem dividida com

refinamente e um baú” (p.151).E, entretanto, na questão da iluminação, diz Gropius: “Se a adução de luz, sol e calor é

culturalmente mais importante e também mais econômica, com preços normais de terreno, do que oaumento do espaço, a lei deve ser: aumentem as janelas, diminuam os quartos”.

E qual seria o tamanho destas habitações? “As causas biológicas para a determinação dotamanho das habitações mínimas também são decisivas para o tipo de seu agrupamento eincorporarão no plano urbano. Um máximo de luz, sol, ar para todas as habitações!” (p. 151).

Como colocar, então, tecnicamente, um máximo de luz? “As estreitas janelas de gradecom pequenas vidraças, necessárias em outros tempos, por causa dos limitados métodos defabricação de vidro, foram substituídas por grandes aberturas de janelas com vidro inteiros” (p.151).

Mas não grandes janelas em um projeto tradicional de arquitetura. Os edifícios de fim deséculo berlinense não são aceitos por Gropius: “... os blocos em torno de um pátio central... estaforma de construção apresenta a grande desvantagem de não permitir suficiente iluminação eventilação, pois do bloco de construções dispostos em todos os quadrantes resulta, para a maioriados apartamentos, uma orientação deficiente, com inevitáveis cômodos de face norte, bem comosoluções imperfeitas para os ângulos e para os apartamentos próximos que recebem sombra destesângulos; em suma, ela deixa de observar importantes requisitos higiênicos”(p. 166).

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Os novos conjuntos

Eis como Gropius chega à idéia de blocos paralelos: “...construção em faixas paralelas,que nos novos tempos se faz respeitar cada vez mais (...) possui a vantagem de permitir que todos

os apartamentos aproveitem igualmente as possibilidades de insolação...”; e então passa a exporcomo definir o partido do projeto: “Devido à diferença de qualidade do ar e da intensidade da luz,sempre tentar a determinação numérica de um limite mínimo a partir do qual seja possível calcular aquantidade de luz e ar requerida em um dado bairro. (...) O pavimento de luz e ar para a habitação énaturalmente a meta de todas as leis de planejamento urbano. Cada legislação no domínio daconstrução sobrebuja a anterior no sentido do diminuir a densidade habitacional e com issomelhorar as condições de aeração e iluminação. (...) A estrutura interna da família industrial sedistancia da casa unifamiliar e busca o grande edifício de minutos andares e finalmente a grandeorganização dos serviços domésticos. (...) a concentração habitacional de uma zona pode serregulada, sem limitação de altura construída, pela simples estipulação das relações quantitativas dasuperfície da habitação, ou seja, da massa de construção com respeito ao terreno da construção.Assim o problema do desenvolvimento do grande edifício de múltiplos pavimentos estariaresolvendo no sentido vertical. (...) O edifício em altura oferece vantagens essenciais de tipocultural face aos edifícios baixos. Confrontando-se um conjunto de edifícios dispostos no sentidonorte-sul, em blocos paralelos com um números de andares diverso, verificamos as seguintesescalas (ver figura)”.

“...se em uma nova lei fôsse estabelecida a limitação da densidade habitacional em lugarda limitação da altura das construções, isto é, a proporção entre a área ocupada, ou seja, a massa daconstrução e a área construída. As comparações que organizei mostram que as condições higiênicase econômicas são favorecidas em muitos sentidos com o número crescente de andares, e que osgrandes edifícios de apartamentos levam vantagem sobre os prédios comuns de 3, 4 ou 5pavimentos, os quais não podem dispor de áreas verdes entre os blocos e suficiente espaço entre

uma janela e outra. Nas minhas comparações suponho que no dia 21 de dezembro, que é o dia maisbreve do ano, as duas frentes dos edifícios construídos pelo sistema de faixas, obtêm no mínimo 2horas de insolação”.

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“Daí resulta, segundo Heilingenthal, como regra geral para a distância entre as fileiras:1 ½ vezes a altura da construção na direção norte-sul dos blocos, 2 ½ vezes na direção leste-oeste e2 vezes no sentido diagonal dos blocos. Esta regra evidencia que a posição norte-sul seria a maisfavorável para o aproveitamento econômico do terreno. Demais, a melhor solução para a maioriadas plantas no norte da europa reside na insolação bilateral, no sentido leste-oeste, das fachadas dos

edifícios. Partindo daí, investiguei comparativamente a edificação, em áreas de terrenos iguais, defileiras de edifícios de 2 a 10 andares, construídos na direção norte-sul, e achei as seguintes normasfundamentais que devem servir para concretizar minhas propostas para modificar a densidadepopulacional”.

“1. Em terrenos do mesmo tamanho, com ângulo de incidência de luz (30 graus), isto é,as mesmas condições de insolação, cresce o número de leitos conforme o número de andares”.

“2. Com o mesmo ângulo de incidência de luz e o mesmo número de leitos (15m2 paracada leito) em fileiras de edifícios com andares cujo número varia, a área do terreno construídodiminui conforme aumente o número de andares”.

“3. Em terrenos da mesma área e mesma quantidade de leitos, o ângulo de incidência de

luz solar decresce com o aumento do número de andares, favorecendo assim a insolação dasfachadas dos edifícios”.

“Em prédios de 10 pavimentos com o mesmo aproveitamento do terreno e a mesmasuperfície habitacional ou quantidade de leitos, a distância entre os blocos de edifícios cresce odobro do necessário para satisfazer a regra geral, e isto sem nenhum prejuízo econômico. Umavantagem que salta aos olhos. É pois absurdo que as leis imponham restrições ao gabarito e não àsuperfície habitada, privando o público dessas vantagens econômicas e higiênicas. Em um edifíciode 10 a 12 andares, também o morador do pavimento térreo poderá vero o céu! Em vez de olharpara os corredores ajardinados de 20 metros de largura, abrem-se janelas para uma área de 100metros, arborizada, que ajuda a purificar o ar proporciona às crianças grandes praças para brincar.Assim a natureza penetra na cidade, dando novos estímulos ao citadino. Se todos os telhados se

transformassem em jardins, o que até agora quase não ocorreu, o citadino também reconquistaria láem cima as terras perdidas pela construção dos prédios. A cidade grande precisa positivar-se,precisa de estímulo de uma forma habitacional por ela mesma desenvolvida, que corresponda ao seuorganismo vital, que reuna um relativo máximo de luz, sol e plantas a um mínimo de trânsito eesforços administrativos. O prédio de muitos andares pode satisfazer essas exigências e por isso suapromoção seria a mais importante das tarefas da construção habitacional” (pp. 166-168).

“Estes resultados escalares asseguram ao edifício em altura a vantagem, tão vital doponto de vista biológica, de maior insolação e iluminação, maior distância dos prédios vizinhos epossibilidades de estender parques, jardins e playgrounds entre os edifícios (...) . Este prédioapartamento não significa, então, um mal necessário de uma época decadente e atrasada, mas simuma construção biologicamente requerida para a população industrial urbana”(p. 154).

Cortina de vidro

Alguns passos a mais e se chega a Mies van der Rohe e seus arranha-céus de vidro, quediz: “podemos ver com maior clareza os novos princípios estruturais quando usamos vidro em lugardas paredes externas, o que é factível hoje, uma vez que, em um edifício formado por uma estrutura,tais paredes externas na realidade não suportam o peso. O uso do vidro impõe novas soluções (...)Descobri, ao trabalhar com modelos reais de vidro, que o importante é o jogo de reflexões, e não oefeito de luz e sombra como nos edifícios comuns”(apud Banhan, 1975, p. 422), portanto levando

adiante a idéia funcionalista de Gropius, tirando partido estético dela, ou como diz o companheirode Bauhaus de Gropius, László Moholym Nagy, “interessar-se (...) por materiais modernos, taiscomo plásticos transparentes, não simplesmente porque eram novos, mas em virtude de um

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interesse devedor pela luz (...) enquanto meio de criar um volume escultório”(apud Passuth, 1982,pg. 56).

Assim Walter Gropius não postula utilizar a luz apenas sob um aspecto higiênico-funcional; sua preocupação é também estética. O edifício da Bauhaus, de concreto armado,exemplifica: “a cortina de vidro contínua e em contacto direto com a face horizontal da superfície

exterior do muro branco, destaca tanto nas paredes altas como baixas do edifício. Um fotografiaaérea nos mostra claramente suas funções: são panos sensíveis que nada sustentam. Vista de talforma, a massa cúbica do conjunto se assemelha a enormes planos horizontais flutuando sobre oterreno”.

“A cortina de vidro não é a zona transparente, limitada e bem distinta que Eiffel utilizana exposição de 1878: aqui os vidros correm sem interrupção em volta do edifício, sem suportealgum, nem elemento de encontro dos ângulos. A cortina de vidro se desenvolve sensívelmente emtorno dos ângulos do edifício; em outras palavras, as paredes de cristal se ajustam ali umas com asoutras, precisamente no momento em que a vista do observador espera encontrar um elemento queseja garantia de que poderá suportar a carga do conjunto do edifício”.

Estas observações levam Gideon a fazer o seguinte comentário: “duas das mais urgentesnecessidades da arquitetura moderna obtiveram aqui sua realização, não como resultadoinconsciente dos progressos técnicos, mas como realização consciente dos propósitos do artista: oreagrupamento suspenso e vertical dos planos que satisfaçam nosso sentido das relações do espaçoe a transparência, realizada de maneira plena, que nos vemos frente a situação de versimultaneamente o interior e o exterior, de frente e de lado, como na L’Árlésienne de Picasso, de1911-12: multiplicidade de níveis de referência, ou de pontos de referência e simultaniedade, emuma palavra, o conceito de tempo” (Gideon, 1978, p. 517).

Luz dinâmica

Esta preocupação estética é verbalizada quando compara o uso da luz artificial ao uso daluz natural: “Quando comparamos o efeito psicológico da luz do dia e da iluminação artificial, anecessidade de variação torna-se especialmente evidente. Há pouco tempo veio-me às mãos um‘Relatório do Comitê para a Iluminação de Museus’. Lá encontrei frases assim: ‘Hoje a iluminaçãoartificial para uma galeria é de melhor efeito do que a luz do dia. Além disso, a iluminação artificialsalienta, a qualquer tempo, as peculiaridades, da obra de arte em seu aspecto mais vantajoso, o queà luz natural não passa de um acontecimento fugaz’. Um ‘acontecimento fugaz’! Aqui, creio, residea falsa conclusão; pois a melhor luz artificial, que ressalte vantajosamente todos os detalhes de umobjeto exposto é, apesar de tudo, apenas estética. Ela não se transforma. A luz natural, que semodifica constantemente, é viva e dinâmica. O ‘acontecimento fugaz’, que surge pela variação dailuminação, é exatamente o que precisamos, pois o objeto, que vemos na variação viva da luz dodia, oferece a toda hora outra impressão”.

“Ou imagine-se a surpresa de um fiel, quando um raio de sol, caindo pelo vidro coloridode uma catedral, caminha lentamente pela penumbra da nave e atinge de repente o altar. Quãoimpressionante para o observador, embora passe apenas por um acontecimento fugaz’. (...)”.

“No futuro possuiremos talvez luz artificial que se movimente e seja variável á vontade,quer na quantidade, quer na intensidade, quer na cor e direção. Mas enquanto a luz artificial nãocorresponder totalmente às nossas necessidades, não deveríamos excluir, sempre que possível, aqualidade dinâmica da luz do dia como complemento da artificial, já que ela vai de encontro àsnossas necessidades de variação” (p.75).

O seguinte texto sintetiza o pensamento de Walter Gropius sobre o uso da luz: “as pré-condições indispensáveis para o vingar do homem são afora a nutrição e o aquecimento suficiente,luz ar e liberdade de movimento (...) . O grande edifício, cuidadosa e responsavelmente planejado,

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erigido com recursos bastantes, em meio a largas áreas verdes, pode no entanto preencher asrequeridas condições de luz, ar e movimentação e, demais, conceder ao citadino um porção deoutras vantagens” (p. 160).

As idéias na prática: a Fábrica Fágus

Giulio Carlo Argam em seu livro Walter Gropius e a Bauhaus  (1990) coloca que osdois líderes da renovação da arquitetura européia no começo do século foram Le Corbusier eGropius. Sobre o segundo, Argan diz que “na sua obra, o rigor lógico adquire evidência formal”(p.7) e que o “rígido formalismo, esquemas teóricos exatos, inflexível disciplina racional” (p. 12)eram seus postulados arquitetônicos, sempre defendendo a superioridade da indústria sobre oartesanato, procurando transformar a velha sociedade hierárquica alemã numa sociedade funcional.

Não é coincidência então que a primeira obra de destaque de Gropius seja uma fábrica, aFábrica Fagus, assim descrita por Nikolaus Pevsner: “...pela primeira vez toda a fachada é

concebida em vidro. Os elementos portantes foram reduzidos a sutis hastes de aço” (Pevner, 1980,p. 233). Gideon (1954, p.47) comenta: (Gropius) descobriu a expressão artística da estruturafechada por caixilharia metálica. Suas paredes mostram com clareza que não mais precisamsuportar o peso do edifício ... ele suspende a parede nas colunas recuadas... em um canto daedificação as paredes de vidro batem umas contra as outras sem a intervenção de qualquer coluna.Isto é um espetáculo não usual para os olhos acustumados às paredes portantes... o ponto maisimportante é que aqui pela primeira vez o caminho para a transparência e leveza encontra inegávelexpressão arquitetônica”.

Argan descreve a fábrica como “fusão de espaços, procurando o infinito, destruição daidéia de massas, de volumes... “(p.57). Argan remete à distinção feita por Alberti entre superfície,que é o limite do espaço e o plano, “como pura secção ou projeto de profundidade” (p. 59), então

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conclui que “o vidro, tal como Gropius o emprega, é sempre função do plano como pura entidadeespacial (...) na Fábrica Fagus, os delgados suportes de cobertura não coincidirem com os ângulosdo bloco, onde as placas de vidro se encontram em ângulo reto: pretende-se que o planoenvidraçada não tenha limites de contorno, que não encontre na solidez de uma cornija uma medidade superfície, que não receba, de uma proporção definida entre altura e largura, uma situação

espacial precisa e imutável”.“Casas vidraças, de resto, não valem por si próprias, mas sim pela profundidade ou

estrutura interna que nelas se pode ler à transparência; pelo espaço oposto, internos e externos, quese reflete nas placas espelhantes; por estes dois espaços se sobreporem ou se interpenetrarem, o decá e o de lá, nesse diafragma suspenso e incorpóreo. Desaparece assim (...) qualquer separação entreespaço interior e exterior, como era lógico que acontecesse, visto que, tendo-se desde o princípioconsiderado o espaço como extensão não definível por limites, mas apenas por indícios, oudireções. Todo o espaço era já unitariamente suposto como interior, isto é, não como vista, mascomo lugar de ação e do movimento” (pp. 59-60).

O que se tem então é a destruição da superfície como limite, sólido, e a destruição daprofundidade como “vazio efetivo e praticável”. O plano de vidro que se vê parece um papelmilimetrado, desenho este feito pela estrutura metálica. Diz Argan que “o vazio deixa de semanifestar como efeito naturalista de massa ou de penumbra atmosférica, e vale como merahipótese ou possibilidade de espaço. Por outras palavras: esse plano envidraçado não é um valorexpressivo do espaço, mas sim uma condição, e precisamente uma condição de divisibilidade, emvirtude da qual duas regiões espaciais opostas, embora sobrepondo-se e interpenetrando-se e quasetranscorrendo com um fluxo contínuo de uma para outra, se constituem em imagem” (p. 60).

Surge assim na obra de Gropius o motivo da vidraça contínua. “Desenhando umesquema fechado, mas procurando no seu interior uma possibilidade de expansão e quase deimpulso para o exterior, e na qualidade variada das superfícies um contacto, ora brusco edesgostante, ora apenas tangencial, como a luz, procura captar e assimilar à estrutura o espaço

empírico; o mundo da matéria, quer dizer, filtrando-o através de sucessivias redes gráficassobrepostas ou entrecortadas (...); o objetivo real daquele traçado é alargar a extensão óptica dasuperfície para lá das suas dimensões efetivas, prolongá-la mais na duração do que no espaço,aumentando assim a sua capacidade de absorver a luminosidade condensada nos corposenvidraçados laterais” (Argan, 1990, p. 64).

O pavilhão da Werkbund

Os pavilhões de exposição sempre funcionaram como laboratórios de experiênciasarquitetônicas. Exemplos clássicos são o Palácio de Cristal da Feira de Londres 1851, e a TorreEiffel, da Feira de Paris, de 1889. Para a arquitetura alemã, um marco é o pavilhão construido porBruno Taut para uma indústria de vidro. Era um “espaço enclausurado por prismas de vidro, forrode vidro, telhas de vidro, escada de vidro. As qualidades prismáticas, translúcidas do vidro foramaqui exploradas, assim como sua transparência. O edifício parecia um cristal mágico” (Gideon,1954, p. 46).

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Um outro marco é o pavilhão da Werbund, da feira de Colônia, de 1914. “A estrutura,que era uma fábrica modelo para uma empresa de médio porte, consistia de um corpoadministrativo ligado à estacionamento para carros e uma grande área de trabalho. Era interessantever a mão do arquiteto naquelas garagens abertas... assim como na área da fábrica fechada por umagrande nave central, cobertura inclinada e iluminação zenital”.

“Mais importante entretanto era a arquitetura do bloco administrativo, com sua escadariatransparente, os escritórios fechados com paredes de vidro, a vidraça contínua nos cantos e o teto-

 jardim... Gropius envolveuas escadas com vidro e ‘desmaterializou’ as quinas do edifício... atransparência do vidro produziu um efeito surpreendente. A escada, liberta de sua casca protetora,parecia pairar no espaço. A escada circular aparentava Ter seu movimento congelado. Esse uso datransparência era algo de muito novo na arquitetura. O efeito era incrementado pela justaposição da

parede sem vidro...” (Gideon, 1954, p. 46).

O edifício da Bauhaus

O edifício da Bauhaus é considerado a obra-prima de Gropius. No seu partidoarquitetônico, nota Argan (1990), p. 72), procura-se a “neutralização da massa como fato plásticoou pictórico, e a sua construção como esboço, através do princípio da divisibilidade fixada pelaplanta”.

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O programa do edifício compreendia a própria Bauhaus com seus vários departamentos,uma escola para aprimoramento de ofícios e alojamento de estudantes, além de auditório, cantina eadministração. O alojamento é conectado à Bauhaus por uma estrutura ponte; outra ponte liga aescola de ofícios. Todo o complexo no fundo são “L” – s se interpenetrando se interceptando emvários níveis. O uso das passarelas alivia o peso visual do complexo; essa leveza é dada com maior

ênfase pelas paredes de vidro do bloco Bauhaus.“Essas cortinas de vidro, que se desenham ao longo das esquinas do edifício principal

dominam a cena... a principal diferença entre essa façaha de vidro e aquelas do século XIX é queessa fachada não é mais composta por grandes janelas colocadas dentro de rígidas estruturas. Pelocontrário, elas correm ao longo da edificação até o ponto mais crítico da estrutura, oferecendo umatransparência cristalina” (Gideon, 1954, p. 54).

A composição de paralelas e ortogonais evita interromper o tecido urbano,“escancarando ao exterior as frentes envidraçadas, não tanto para captar luz, quanto para satisfazer anecessidade instintiva de levantar o olhar de vez em quando de um trabalho manual, para refazer aperspectiva destruída pelo empenho obstinado na matéria” (Argan, 1990,p.72) Como a luz penetrana edificação? “Planos de alvenaria brancos e planos envidraçados alternam-se numa dialéticaapertada que priva as vidraças de qualquer natureza de profundidade e as paredes de qualquernatureza de superfície, anula o contraste do vazio e do cheio, designa o espaço na construção idealou na forma que nasce da resolução dessa antítese naturalista”. Marcante na obra é o que Gropiuschama de “a nova estética das horizontais”: “O edifício não é senão uma série de planos horizontaissuspensos, quase a planar acima do solo” (Argan, p. 74). Como a vidraça trabalha com estashorizontais? “A própria vidraça contínua que percorre os quatro lados do laboratórios tem umsignificado formal, realmente novo: aumenta o intervalo entre as faixas horizontais que, na galeria eno corpo da escola, se sucedem em níveis triplos e quadruplos. É esse o lugar onde o movimentocentrífugo atinge o máximo de intensidade, inicia a sua fase de queda; assim, a densidadeconstrutiva da massa rarefaz-se, os planos ganham altura, alargam e estreitam. É por isso que essavidraça não nos diz mais nada sobre a profundidade que está para além dela, sobre a estrutura

portante que ela envolve; é pura vibração e radiação luminosa. O espaço formal já não é hipóteseabstrata que transcede o espaço natural; no seu pleno valor de realidade apresenta-se com absolutaimediação, satisfaz ao mais alto grau a necessidade de luz e atmosfera e o desejo de sensaçõesestéticas que são próprias do homem civilizado” (Argan, 1990, p. 75).

Assim, a luz é convidada para participar do jogo das superfícies e das massas, dos cheiose dos vazios, deixa de ser um elemento luminotécnico aplicado ao edifício para se transformar numa“qualidade interior à forma, com elemento ativo da construção. O espaço e a luz são o produto dopróprio ato construtivo. A construção de espaço é construção da luz; e o processo construtivo queganha um espaço organizado à profundidade empírica ou extensão opõe agora, às infinitas einconstantes impressões luminosas, uma construção luminosas, uma luz espacial” (Argan, 1990, p.64).

Na arquitetura tradicional trabalhava-se com conceitos de vazios e cheios. Gropius, emsuas obras, sempre procurou uma transparência e uma geometricidade das estrutura que gerassemum termo de igualdade entre cheios e vazios. Diz Argan (1990) que “Gropius visava atingir umaconsubstanciação de espaço e de reduzi-lo à construção geométrica. O processo caminhava doparticular para o universal, da sensação, que era ainda um dado, para o conceito (p. 97), “maisprecisamente, está implícita na proposta de Gropius a idéia de que a luz, como fato formal, sejarealmente independente da relação naturalista entre a fonte e ‘écran’, a própria forma é sensaçãoluminosa” (p.102).

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IV) A LUZ POÉTICA DE LE CORBUSIER

Autor de 50 livros contra 57 obras finalizadas, Le Corbusier, apesar de residir em Paris,nunca se desligou da história de sua cidade natal na Suíça, Chaux-de-Fonds, que, além de

importante centro de relojoaria, cuja técnica Corbusier dominava (Gideon, 1978, p.538) também foipalco de ação pra hugenotes, heréticos albigeneses, e importantes figuras históricas como Rosseau erevolucionárias como Bakunin, Kropotkin e Lenin; com estes personagens enfim, uma cidade, semdúvida ligada à idéia de utopia. Dentro desse espírito, ou como ele próprio dizia, l’esprit noveau,partiu em busca de uma representação de verdade, talvez metafísica ou lírica, nem semprecientífica, em cujo roteiro atuavam muitos heróis como Theo van Doesburg, os construtivistasrussos, toda a equipe da Bauhaus, mas sem dúvida a ele era reservado o papel principal: Charles-Édouard Jeanneret passou a se apresentar como Le Corbusier, nome que adotou para assinar seusartigos na revista l’esprit noveau, e nome que o imortalizou como revolucionário na história daarquitetura. Era um pseudônimo, assim como Lenin e Stalin atuavam no campo político com nomesadotados por razões práticas contra a polícia, máscara protetora e até uma certa auto-dramatização.

“Como uma plausível ficção do escritor Borges, Le Corbusier construiu um mundoalternativo que é tortuosamente rico e verdadeiro, como o mundo real, com todas as suascoer6encias, exceto referências convencionais” (Jencks, 1972, p. 153).

“Le Corbusier era um homem magro, pálido, míope que andava numa bicicleta branca,metido em um terno preto e justo, camisa branca, gravata preta, óculos redondos de aro preto comoos de uma coruja e um chapéu-coco preto” (9Wolfe, 1990. P. 24-25); “estes pesados óculos dearmação preta tornaram-se o zeitgeist do Movimento Moderno, um signo puro que um arquitetodeve compreender no seu todo”(Jencks 1972, p. 140): “nos anos anteriores à Primeira GuerraMundial, Le Corbusier divertiu seus amigos andando de bicicleta por paris, usando um chapéu-cocoe enfureceu todo mundo chamando a casa de machine à habiter, máquina de morar” (von Eckard,

1975, p. 120).Gostava muito de esporte, tênis, futebol e principalmente boxe, chegando a declarar: Je

suis un type boxeur. É como um boxeador partiu para a destruição de convenções, para poderrealizar suas idéias revolucionárias: “quando eram brancas as catedrais, não se aplicava oregulamento. As catedrais eram antiregulamentárias... Hoje, quando surge o mundo novo sob apressão dos milagres técnicos, os senhores da cidade luz aplicam o regulamento. E já não haverámais luz na cidade” (Corbusier, 1948, p. 38). Ou como escreveu em Après le Ccubisme, “nossaépoca é melhor equipada que a de Péricles para realizar o ideal da perfeição” (apud Jencks, 1972, p.99). Este “ideal de perfeição” pode ser encontrado em três Corbusiers: um naturalista, Art Noveaugeometrizante de 1918, o segundo purista de 1931 e o terceiro brutalista, em 1959.

Os Corbusiers de 1931 e 1959 ultrapassam de longe questões higienistas no uso da luz, evoltam-se para uma poesia da luz. Para o Corbusier purista tudo deve ser banhado em luz; já o“velho” Corbusier, brutalista, além da luz trabalha também a sombra.

As obras realizadas nesses dois períodos levaram críticos a denominar Corbusier “opoeta da luz”, apesar do ácido comentário que sua esposa, Yvonne Gallis, fez sobre a cozinha quelhe projetara: “toda essa luz está me matando, deixando-me louca” (apud Jencks, 1973, p. 99). Mas,apesar da cozinha de Gallis, a fachada livre, a janela horizontal, o brise soleil modificaram parasempre a concepção do uso de luz na arquitetura e, por consequência, a história da arquitetura.

A cidade radiosa

No pensamento utópico de Le Corbusier surge La Ville Radieuse, a “Cidade Radiosa”,sem dúvida um bom nome quando se está escrevendo sobre arquitetura e luz, ou melhor, como

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escreve Corbusier em Mensaje a los estudiantes de arquitectura (1961, p. 21), “a palavra não estavalá por acaso...” Le Corbusier, diz Kopp (1990, p. 125-126), quer “tábula rasa” dos espaços urbanosexistentes; dos modos de transporte inadequados, como os bondes, das periferias distantes, e até dascidades-jardins que não trazem para seus habitantes nem as vantagens das cidades, nem as docampo; e, ressalta Kopp, “tábula rasa” também dos “antigos hábitos humanos e do antigo modo de

vida”; é o homem ‘antigo’, escondido nos sombrios recantos do deserto de pedra das cidades,barrigudo, amante de botequins e aperitivos que deve ceder o lugar “homem novo” de Le Corbusier,ávido de luz, de sol, de ar puro”.

Desenvolve este pensamento em seu livro que relata sua viagem para os Estados Unidos,ou para o “país dos tímidos”, como ele mesmo define: “o arranha-céu é um irradiador de luz; o quesignifica que nenhuma superfície de escritório deve ser privada de luz solar... não deverá haverescritórios voltados para o norte.. Seu traçado derivará do caminhar do sol no céu... a fachada podeser uma parede de vidro, uma pele de vidro. Por que repudiar a riqueza: a luz que entra torretorrentemente? Envoco agora os escritórios de Paris; Ah! Pobres oficinas, miséria e mediocridade,envelhecimento insuspeito do espírito do trabalho – essas entradas, esses elevadores grotescos,burlescos, idiotas, esses vestíbulos sombrios e pobres, a sucessão de ambientes escuros, abertos para

os barulhos das ruas ou pra a miséria dos pátios” (Corbusier, 1948, p. 83).

Projetando a luz

A origem de seu raciocínio voltado para a iluminação pode ser percebida em frasescomo “o homem (esse homem que sempre está adiante de mim, com suas dimensões, seus sentidose seus sentimentos) está sentado junto a sua mesa; seus olhos pousam sobre os objetos que orodeiam: moveis, tapetes, cortinas, quadros ou fotografias e muitos outros objetos aos quais dáimportância. Uma lâmpada o ilumina ou o sol que penetra pela janela, separando a sombra da luz,

opondo estes dois pesados extremos de reação sobre o físico e o psicológico: o claro e o escuro... océu domina, sobressaindo sobre todas as coisas, o céu que é o céu de um clima. O ângulo deincidência solar sobre o meridiano impõe condições fundamentais ao comportamento dos homens.Tropical úmido, continental tórrido, zona temperada, fria ou glacial, tantos outros contrastesdiversos impondo modalidades particulares à vida. Considero natural à aspiração do homem à luz.Em um clima temperado, não temeria ver fluir raios de luz e de sol mesmo sobre a moradia”(Corbusier, 1967, p. 25-28).

O arquiteto holandeês C. C. Kalff, autor de um dos poucos livros a especular sobre otema luz e arquitetura, Criative Light , diz que Corbusier “via os espaços que ele estava criando emconjunto com a luz que fazia parte dele. O Ministério da Educação, no Rio de Janeiro, que eleconcebeu em 1939, com clareza mostra que o modo como considerava o caminho da entrada da luz

no edifício um dos principais motivos de sua arquitetura. O clima quente faz o sol aquecer asenormes fachadas para um grau insuportável. Teria sido impossível construir este edifício tão altocom paredes pesadas, absorvendo calor. Assim, inventou o ‘brises soleil’, faixas que cortam a luz,fazendo as paredes e as janelas permanecerem na sombra. A luz difusa, vindo do céu, pode entrarlivremente pela horizontal, produzindo um agradável efeito de luz no interior” (Kalff, 1971, p. 33).

Kalff conta que várias vezes discutiu problemas de iluminação com Corbusier: “elepegava em um lápis amarelo e outro violeta – amarelo para a luz, violeta para a sombra e com elesindicava nas plantas e cortes as áreas que ele queria iluminadas ou na sombra” (p.39).

Reinterpretando a história

Mesmo querendo construir um mundo alternativo, sem referências convencionais, “Le

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Corbusier partiu – com as mãos vazias – a caminho de Atenas e do Oriente Próximo. Em SãoPedro, Roma, na Acrópolis, nas casas características da cultura mediterrânea; de todas as partes e detodos estes elementos quis extrair a ajuda espiritual necessária para a construção de sua obramoderna” (Godeon, 1978, p. 539); não só estuda as arquiteturas locais mas também seus respectivos

 jogos de luz, que mais tarde relata em seu Por uma arquitetura  (1977): “em Brousse, na Ásia

Menor, na Mesquita Verde, penetra-se por uma pequena porta em escala humana; um pequenovestíbulo opera em você a mudança de escala que é necessário apreciar; depois das dimensões darua e do lugar de onde você vem, as dimensões com que pretendem impressioná-lo. Então você asente a grandeza da Mesquita e seus olhos medem. Você está em um grande espaço branco demármore, imudado de luz. Além deste, se apresenta um segundo espaço semelhante e com asmesmas dimensões, cheio de penumbra e elevado sobre alguns degraus; de cada lado, dois espaçosde penumbra ainda menores; você se volta para o lado, dois pequeninos espaços de sombra. Da luzplena à sombra, um ritmo. (...) Você é levado por um ritmo sensorial (a luz e o volume) e pormedidas próprias a um mundo em si que lhe diz aquilo que tinha a dizer.” (127).

Em seguida, Corbusier analisa a arquitetura de Pompéia e seus efeitos de luz e sombra:“Os elementos arquiteturiais do interior: dispõe-se de paredes retas, que são passagens para o

homem ou para a luz, portas ou janelas. As cavidades iluminam ou escurecem, tornam triste oualegre. As paredes estão brilhando de luz ou em penumbra ou em sombra, tornam alegre, sereno outriste. Sua sinfonia está arranjada. A arquitetura tem por fim tornar alegre, sereno. Respeitem asparedes. O habitante de Pompéia não fura suas paredes; tem a devoção das paredes, o amor da luz.A luz é intensa se está entre as paredes que a refletem (...). A luz brilha em intenção formal em umadas extremidades e ilumina as paredes. A luz estende sua impressão ao exterior pelos cilindros ( nãogosto de dizer colunas, é uma palavra estagnada) pelos peristilos, ou pelos pilares (...). Não háoutros elementos arquiteturiais do interior; a luz e as paredes que a refletem como um grande véu eo piso que é uma parede horizontal. Fazer paredes iluminadas é constituir os elementosarquiteturiais do interior. Fica a proporção.” (p.133).

Retornando de Atenas, Le Corbusier visitou a Villa Adriana em Tívoli, nas vizinhanças

de Roma”, conta Miyake (apud Futagawa, p. 259). “Roma é uma paisagem pitoresca. Lá a luz é tãobela que ratifica tudo (Ccrbusier, 1977, p. 105)... a luz acaricia formas puras: isso rende” (p.111).“Lá encontrou o sepulcro de Serapis cavado na pedra. Um furo vertical levava a luz para o fundo dacaverna. Tocado por este efeito, imediatamente fez um croqui e o descreveu como ‘o buraco domistério’, onde a luz penetra ao fundo da caverna. Este dirigir a luz se tornou um detalhe importanteque ele tentaria reinterpretar na capela de Ronchamp ou no convento Dominicano de Sante Mariede La Tourette. A luz penetra através de misteriosas aberturas furadas nas paredes, refletindo emcada lado das aberturas em formato piramidal e preenchendo o interior da capela com uma luzmetafísica. Neste aspecto, sua viagem para o oriente em 1911 foi uma peregrinação em busca daluz. Onde estivesse, Le Corbusier descobria um novo tipo de luz, e a guardava para incorporá-la emsua arquitetura... para Le Corbusier, a experiência com a luz foi o momento de iniciação que

ofereceu um derradeiro sentido pessoal” (Miyake apud Futagawa, p. 259).

Formulando propostas

Após sua viagem, Corbusier está pronto para formular sua arquitetura econsequentemente sua proposta de projetar a luz. No livro Planejamento Urbano (1971), Corbusierfala de sua “tábula rasa” para o nascer de um novo homem: “necessidades biológicas impostos porhábitos milenares e que serviram, pouco a pouco, para construir sua própria natureza, requerem apresença de elementos e de condições precisos, sob a ameaça de estiolamento1: sol, espaço,

vegetação. Para seus pulmões, uma determinada qualidade de ar. Para seus ouvidos, um quantum1 Estiolamento:descoramento e enfraquecimento dos indivíduos que vivem privados da influência da luz e do ar puro;definhamento. Alteração mórbida das plantas que vegetam em lugar escuro ou são privadas da luz.

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suficiente de silêncio. Para seus olhos, uma luz favorável e assim por diante” (p.67); e assim chegaà formulação no Por uma arquitetura da relação espaço-luz: “Arquitetura é o jogo sábio, correto emagnífico dos volumes reunidos sob a luz. Nossos olhos são feitos para ver as formas sob a luz; assombras e os claros revelam as formas; os cubos, os cones, as esferas, os cilindros ou as pirâmidessão as grandes formas primárias que a luz revela bem; suas imagens não são nítidas e tangíveis, sem

ambiguidades. É por isso que são belas formas, as mais belas formas” (p.13). E do volumeiluminado Corbusier passa para o espaço, para a superfície: “deixar a um volume o esplendor de suaforma sob a luz mas por outro lado, consagrar a superfície a tarefas quase sempre utilitárias, e ver-se obrigado a encontrar na divisão imposta da superfície as linhas reveladoras, as geratrizes daforma. Em outras palavras, uma arquitetura é uma casa, templo ou fábrica. A superfície do temploou da fábrica é, na maiorias dos casos, uma parede furada de porta e de janelas; esses buracos sãoamiúde destruidores de forma; é preciso torná-lo reveladores de formas” (p.21).

Assim, a arquitetura corbusiana é contra “os buracos” nas paredes e propõe: “Umaparede toda em janelas, uma sala em plena claridade. Que contraste com nossas janelas de casas quefuram uma parede determinando de cada lado uma zona de sombra, tornando triste a peça e fazendoa claridade parecer tão dura que as cortinas são indispensáveis para peneirar e amortecer essa luz”

(p.61), e é também contra as paredes espessas: “hoje a composição das fachadas com emprego degrandes blocos de pedra tensa conduz à consequência paradoxal de que as janelas, concebidas paraintroduzir a luz, são guarnecidas por aberturas profundas que contrariam formalmente a intenção”(Corbusier, 1977, p. 65). “Pergunto a um jovem estudante: como você faz uma porta? De quetamanho? Como você faz uma janela? Se sabe, poderia me explicar por que uma janela é quadrada,retangular ou curva? Quero razões para isso, e completaria: penso: precisamos realmente de janelashoje em dia? ... outro ponto, igualmente importante: para onde se abrem as aberturas das janelas?Você se dá conta que, de acordo com de onde vem a luz, tem-se uma sensação determinada, assimdesenhe todas as formas possíveis de se abrir as janelas e logo me diga qual e a melhor. Narealidade, porque fez o quarto com essa forma? Pense em outras formas com mais possibilidades eabra as aberturas das portas e janelas. É conveniente comprar um grande caderno de notas para este

trabalho – necessário de folhas e mais folhas” (Corbusier, 1967, p. 64).

Janelas

Quais são, portanto, as janelas propostas por Le Corbusier? “As janelas servem parailuminar um pouco, muito, nada e para olhar para fora. Há as janelas do vagão-leito que se fechamhermeticamente, que se abrem à vontade; há as grandes paredes de vidro dos cafés modernos que sefecham hermeticamente, mas que podem se abrir completamente graças à manivela que as fazdescer até o solo; há as janelas dos vagões-restaurantes que têm pequenas venezianas de vidro quese abrem para ventilar um pouco, muito, nada; há os vidro de Saint-Gobain que substituíram osfundos de garrafa e os vitrais; há as venezianas que podem se fazer descer por frações e interceptara luz à vontade conforme a distância de suas finas lâminas. Mas os arquitetos só praticam as janelastipo Versailhes ou Compiégne, Luiz X, Y ou Z, que fecham mal, que têm pequenos quadrados, quese abrem com dificuldade e cujas persianas estão do lado de fora; se chove à noite, para puxá-las,recebe-se a chuva” (p. 79). No livro Os 3 Estabelecimentos Humanos, Corbusier chega à idéia depano de vidro: “...supressão das paredes portantes, possibilidades de dispor de toda a fachada para ailuminação...” (Corbusier, 1979, p. 28).

Comenta Jencks (1972, p. 158) sobre esse “repensar” a janela: “vimos como [Corbusier]criou, com sucesso parcial, três novas linguagens: uma naturalísta de um Art Noveau geométricoem 1918, purista em 31 e brutalista em 51”, disso restou “ao menos quarenta novas expressões e

duas novas estéticas que mudaram duas vezes a linguagem arquitetônica”, o que é confirmado pelassuas palavras: “é necessário partir do zero...” Criando uma nova linguagem arquitetônica, “a palavraondulatories, que primeiro utilizou para o edifício da secretaria em Chandigarh, “repensou o‘problema da janela’ em quatro funções separadas: aerar, ventilar, ver e iluminar. As quatro funções

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que de certa forma estavam compromissadas com a caixilharia tradicional colocadas de lado e cadauma resolvida de uma nova maneira. Os vários brises soleil protegem o vidro do sol; lâminaspivotantes ou verticais permitem o ar fresco entrar – de outro modo a ventilação é resolvida porventilação mecânica; finalmente a parede fixa de vidro, escurecido em certos pontos para se obterluz indireta e aberta em outros para as vistas responde para os dois últimos problemas da janela’. O

sistema de ondulatoires  tomado em seu todo constitue uma nova palavra no vocabuláriocorbusiano...”..

“Cidades... daqui por diante, sem barreira. O edifício é descolado do solo. O corterevolucionário moderno concilia o edifício ao solo pelo espaço livre, o vazio, a passagem possível,a luz e o sol sob a casa. Os pilares de concreto armado tornaram-se os pilotis”. (Corbusier, 1979, p.45), e no livro Planejamento Urbano, Corbusier sintetiza esta idéia (sobre a arquitetura moderna):“Emprego do pano de vidro transparente ou translúcido. O traço característico será luz e limpidez”(Corbusier, 1971, p. 37).

Teoria na prática

Chega o momento de passar da teoria para a prática. Em Por uma arquitetura, Corbusierdiz o que deve ser exigido: “Exijam uma toilette com boa iluminação, (...) uma parede toda de

 janelas, abrindo, se possível, para um terraço para banhos de sol”, e “exijam basculantes nas janelasde todas as suas peças. Ensinem aos seus filhos que a casa só é habitável quando a luz abunda,quando os pisos e as paredes são claros” (Corbusier, 1977, p. 85).

Visionário como sempre, Corbusier toca também na questão da iluminação artificial:“Exijam do seu proprietário que para compensar as estátuas de gesso e as tapeçarias, ele instale aluz elétrica em filas escondidas ou refletores” (p.85).

“Eletricidade dá claridade. Há as rampas dissimuladas e também refletores e projetores.Enxerga-se tão claro como em pleno dia e nunca a vista fica limitada. Uma lâmpada de 100 velaspesa 50 gramas, mas você tem candelabros ornamentados de 100 quilogramas (...) E tambémcausam problemas aos olhos, à noite” (Corbusier, 1977, p. 79).

Kalff conta que Corbusier, no Covento de La Tourette, impediu o desfiguramento dasuperfície de concreto com instalações elétricas com a frase “ne détruisez pas la noblesse de monbeton!” (Kalff, 1971, p. 39).

Mas, frequentemente, queria ter a luz artificial entrando nos quartos da mesma formaque a luz do dia. Para obter este efeito, as luminárias eram colocadas em nichos próximos às

 janelas, assim o brilho existente na sua concepção original seria o mesmo de dia e à noite.

De panos de vidro onde a claridade penetra com abundância a rigorosos jogos de luz esombra, foi Corbusier talvez o maior poeta da luz deste século. Mas, como grande construtor defrases de efeito que também foi, não se pode deixar de registrar as ligada à iluminação:

•  “Nossos olhos são feitos para ver as formas sob a luz” (1977, p. XXIX).

•  “Os elementos arquiteturais são a luz e a sombra, a parede e o espaço”(p. XXXI).

•  “Em sua casa não se vê o dia. Suas janelas são incômodas para abrir” (p. 77).

•  “Habituamo-nos ao ar livre e à luz plena” (p. 61)

•  “Uma sociedade vive primeiro do pão, de sol, do conforto necessário” (p. 67)

 

“Uma casa... um receptáculo de luz e de sol” (p. 75)•  “Por que essas janelas em forma de pequenos quadrados...” (p. 77).

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•  “Paredes e luz, sombra ou luz, alegre ou sereno etc. É necessário compor com esses elementos”(Corbusier, 1977, p. 140).

Quando uma edificação não responde a estas chamadas, diz Le Corbusier que “não secontou com os elementos arquiteturais do interior que são superficies que se juntam para receber luze revelar volumes.” (Corbusier, 1977, p. 140). E, no livro Os 3 Estabelecimentos Humanos,

sintetiza essas idéias: “Como a habitação, o escritório liga-se a uma certa ordem de condiçõescósmicas: a lei do sol (orientação de onde resultam luz, temperatura e radiações). Além disso,requer ar útil (teor e temperatura); iluminação mais favorável em todos os locais, a fim de permitir-lhe um optimum de utilização”(Corbusier, 1979, p. 79).

Reviravolta

Porém estas idéias, que caracterizam o jovem Corbusier, o Corbusier purista sofre umareviravolta com a Segunda Guerra Mundial. Até que ponto o drama europeu influenciou suas

idéias? Não se sabe. Porém, sua arquitetura não é mais pura, branca, brilhando sob o sol, que tãobem descreveu e tão brilhantemente divulgou nos seus escritos como Cuando las catedrales eramblancas, (1948),  Mensaje a los estudantes de arquitectua, (1967), Os três estabelecimentoshumanos, (1979), Planejamento Urbano, (1971), Por uma Arquitetua, (1977), livros utilizados atéaqui como fontes de textos principais.

Uma carta de Corbusier à época do projeto unidade habitacional de Marselha mostra queestá interessado em ver o tosco, imperfeito e o feio e seus possíveis significados de contrastes. Diz acarta: “... decidi fazer a beleza pelo contraste. Acharei os complementares e estabelecerei um jogoentre o bruto e o acabado, entre o opaco e o intenso, entre a precisão e o acidental. Farei as

 pessoas pensarem e refletirem, esta é a razão da violenta, clamorosa, triunfante policromia das fachadas.” (apude Jencks, 1972, p. 142).

Não foi possível verificar em outros seus escritos de época o desenvolvimento de seuraciocínio, porém o citado trecho de carta explica a Capela de Ronchamp ou o Convento de LaTourette, cujos audazes jogos de luz e sombra estão muito distantes do Corbusier purista. TalvezJencks seja o crítico que melhor comente este momento corbusiano: “... (Corbusier) demonstrou‘prazer’ em muitas partes chaves da edificação: os três ‘prazeres essenciais’, sol, espaço e verde; osmateriais coloridos e quebradiços (sinuosos) que contrastariam com o contreto bruto. Em todo olugar a mensagem está misturada, como o significado da tragédia é dual. Um pode ver estedualismo em desenho que Corbusier produziu enquanto brigava com as autoridades sobre a unidadede Marselha: parte Apolo, parte Medusa, parte um sorridente sol da razão, parte uma sensual figuradionisíaca do submundo – uma amarga penumbra contrabalanceada pelo prazer e pela luz” (Jencks,1972), p. 182).

As primeiras obras

Le Corbusier faz na Casa Citrohan (1920) sua primeira importante experiência detrabalhar luz e espaço. Coloca grandes planos de vidro na elevelação principal, expressando aimportância da área de estar e janelas horizontais corridas para se obter o que ele mesmo chama deuma “boa iluminação”. Na laje plana da cobertura, propõe um solarium, símbolo de suaspreocupações higienistas. Dois anos depois propõe uma Ville Contemporaine, que é a casaCitroham em termos urbanos.

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Diz Geoffey H. Baker no seu livro Le Corbusier – Análisis de la forma que VilleContemporaine” é uma “resposta contra as ruas estreitas e sombrias” (1992, p. 98). Implanta seusedifícios em meio a uma extensa área verde. No setor comercial, elegante torres de vidro.

Mas estes dois projetos eram propostas. A primeira obra onde Corbusier realmente testasuas concepções espaciais é a casa-estúdio Ozenfant, de 1922: planos de vidro, janelas horizontais eno último pavimento, clarabóias para iluminar o estúdio. Para filtrar a luz, clarabóias numa suaveluz difusa: o estúdio do pintor se enche de luz.

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Rasmussen faz uma interessante observação crítica sobre esta fase de Corbusier: mas LeCorbusier, que é pintor e escultor, além de arquiteto, projetou desde o início aposentos em que a luzvem de um lado através de janelas que abrangem uma parede inteira. Isso podia dar uma luz à casaquanto uma antiga casa holandesa”, onde janelas de quatro molduras com um postigo para cadamoldura, que podia ser aberto ou fechado independentemente a fim de regular a luz. Fechando asmetades inferiores, produz-se uma luz mais uniforme em toda a sala; fechando-se as metadessuperiores e deixando as inferiores sem persianas, a luz concentra-se perto das janelas. “Mas as

 janelas de Le Corbusier geralmente não oferecem meios para regular a luz” (Rasmussen, 1986, p.

199).

Na casa La Roche a melhor face de insolação é a posterior; assim o projeto se abre embusca de luz. O banqueiro suíco Raoul La Roche, “que não apenas admirava essa radical novaarquitetura, mas também comprou pinturas cubistas e puristas, para as quais foi desenhada uma casa

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por Corbusier. A exposição dessas pinturas gerou o fato que a casa é uma ‘promenade arquitetural’,i. e. , uma sequência controlada de espaços, começando com entrada de pé direito triplo, e,dependendo da rota, terminando numa galeria-rampa ou num terraço jardim. A sequência espacial émemorável e mostra uma constante preocupação de Le Corbusier” (Jencks, 1972, p. 67).

“Na entrada encontramos blocos que se sobrepõem iluminados por trás, assim sempre

sugerindo algo além; e se o olho e a mente são abruptamente parados por quinas e superfíciesdelimitadas, elas são oferecidas à exploração, quase nunca explicando o mistério da sobreposição. Amaior parte das superfícies são brancas, mas aquelas em sombras, que Le Corbusier queria suprimir,são azuis, enquanto aquelas expostas à luz direta são marrom-avermelhadas” (Jencks, 1972, p. 67).

Vila Savoye

Na Vila Savoye, Le Corbusier desenvolve as idéias preliminarmente esboçadas na casaCitrohan: “a Vila em Poissy é também uma realização dos ‘cinco pontos’ ... tem os elementoscaracterísticos como rampas de entrada (que corta a malha ao meio), as paredes curvas do solário e,sobretudo, os pilotis e a composição em placas... É uma imagem forte, dissonante, especialmentepara a paisagem próxima à Paris. Uma forma branca, um pedaço de gelo brilhante, pairando,suavemente sobre o solo, a imagem da machine à habiter, o homem fazendo artefatos em oposição ànatureza. O efeito do cubo branco sobre a grama verde até hoje é marcante” (Jencks, 1972, P. 93).

A edificação é elevada por pilotis para se obter uma boa iluminação natural, que penetra

pelas janelas horizontais corridas que marcam as elevações. “O quarto de banho e o terraço refletemuma adequação ética que simboliza virtudes saudáveis de sol, de ar e de higiene”. Um pátio internono primeiro piso controla e, ao mesmo tempo, difunde a luz; a sala de estar é um “terraço ao sol,símbolo de ordem e claridade, idéias essenciais na arquitetura de Corbusier” (Baker, 1992, pp. 151e 158). “A orientação do sol é oposto à da visão. Foi, então, preciso recuperar o sol através doespaço aberto do terraço-jardim. Para coroar o conjunto, um solário cujas formas curvas protegemdo vento e constituem um rico elemento arquitetônico” (Boesiger, 1976, p. 44).

Edifícios

O Centrosoyus é o edifício de Corbusier construído em 1929 em Moscou, pouco antesde seu projeto para o palácio dos Soviets ser rejeitado por Stalin. “Tratava-se de construir modernosescritórios para 3500 funcionários... O edifício foi construído em concreto armado paredes

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divisórias de pedra roxa do Cáucaso. Os blocos de pedra cortada tinham uma espessura de 40 cmque assegurariam transformar uma temperatura negativa de 40 graus no exterior em 18 graus de

calor no interior”(Boesiger, 1976, p. 56)

Uma outra importante inovação técnica foi a parede de vidro com ar condicionado,chamada por Corbusier de princípio da “respiração exata”, porém as autoridades soviéticasacabaram não instalando todo o equipamento necessário. Porém este princípio da respiração exata éaplicado no edifício do Exército da Salvação em Paris.

“Buscávamos uma oportunidade. Chegou: o asilo do Exército da Salvação, a Cité deRefugé. Ali vivem seiscentos pobre diabos, homens e mulheres. Foi lhes dado a alegria gratuita einefável da plena luz e do sol. Um pano de vidro de mil metros quadrados ilumina as habitações dopiso ao teto, de parede à parede... a vidraça é hermética, já que o ar aquecido e purificado circulaabundantemente no interior, regulado por bombas e pela calefação... as dificuldades se produziramem pleno verão, quando o calor se acentuava... a verba exígua da construção só havia permitidocolocar em funcionamento os dispositivos para o inverno. Os destinados ao verão – para refrescar oar – foram suspensos. Não havia novo créditos! Era preciso esperar” (Corbusier, 1948, p. 38).

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Mesmo com a demora das instalações, o edifício do Exército da Salvação “é o primeiroedifício de moradia totalmente hermético, que se caracteriza por uma parede de vidro de mil metrosquadrados, sem aberturas. O interior dispõe de um sistema de ar condicionado, cujos resultadosforam perfeitos no inverno e bastante satisfatórios no verão”

Outro edifício importante desta fase é o Ministério da Educação que projetou no Rio deJaneiro em conjunto com sua equipe de arquitetos brasileiros. O repertório corbusiano é enriquecidocom a utilização do quebra-sois, dos brise-soleil, além dos pilotis, da fachada de vidro, da estruturaindependente, do terraço-jardim. O brise-soleil é a grande inovação corbusiana neste projeto, que,de um lado, desenvolve a questão da parede de vidro proposta no edifício do Exército da Salvação

(com resultados “satisfatórios” no verão) e, pelo outro, procura responder à questão do confortoambiental determinado pelo clima da cidade do Rio de Janeiro. “O brise-soleil funciona a maneirade um filtro, é a epiderme permeável que rodeia o edifício, permite a penetração espacial e suavizao impacto formal à semelhança do peristilo que com colunas circunda o templo grego e amortiza arelação entre a massa deste e o espaço que o envolve. O brise-soleil destruiu a sensação de formacúbica das primeiras casas do que resultou a perda da precisão expressiva. Sem dúvida, LeCorbusier tirou proveito da profundidade dimensional do artifício para dar a conhecer elementosfuncionais do interior, tanto é assim que no arranha-céu biológico e em outras obras do pós-guerra éo tratamento superficial que oferece significado à forma” (Baker, 1992, p. 258). Comenta ReynerBanhan: “propõe uma solução ambiental constante em vez de controles flexíveis, porém procurainovar em uma área onde poucos arquitetos estão procurando soluções” (apud Jencks, 1972, p. 12).

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Este diálogo com as condições locais é desenvolvido no projeto de Chandigarh: “osrecursos mecânicos são escassos na Índia para se poder pensar em condicionamento de ar durante asépocas perigosas. É a natureza da Índia que impõe então sua regra ao urbanista: as noites frescas”(Boesiger, 1976, p. 202). Esta “noite fresca” é recriada pelos brise-soleils do edifício da secretaria,do palácio da Justiça e pela grande sombra de cobertura do palácio da Assembléia. O projeto de

Chandigarh sofreu inúmeras críticas, principalmente ao impor uma cultura arquitetônica estranha aolocal, porém a tentativa corbusiana de criar um microclima adequado nem sempre recebeu odestaque merecido.

Depois da Segunda guerra

Após a Segunda Guerra mundial, Corbusier muda de atitude em relação às suas obras naquestão da iluminação, pois foram detectados problemas técnicos: na Casa Ozenfant, constatou-seum excesso de janelas e, por consequência, um excesso de luz. As clarabóias foram fechadas, masmesmo assim houve um efeito de superaquecimento, gerando um efeito de estufa e o própriodesenho da caixilharia teve de ser revisto, pois passou por um processo de deformação.

Mas, como visto, não são apenas problemas objetivos que determinam esta mudança.Afinal, Corbusier decidira “fazer a beleza pelo contrastes. Acharei os complementares eestabelecerei um jogo entre o bruto e o acabado, entre o opaco e o intenso, entre a precisão e oacidental”. Esta mudança de atitude é retratada primeiro na sua Unité d’habitacion em Marselha,com o uso do concreto aparente e o desenho dos brise-soleils que dão um ritmo todo especial àsfachadas. “A sala grande dos apartamentos de seu bloco de Marselha lembra as salas da loggia numpalácio veneziano. O teto é muito alto e a abertura da janela abrange uma parede inteira. Onde ascasas antigas tinham uma massa de finos detalhes de pedra, como colunas e arcos rendilhados, a deLe Corbusier tem reixas de concreto. E ele procurou regular a luz para que uma quantidade

comparativamente grande dela penetrasse até o fundo da sala. As paredes laterais estão bemiluminadas”, funcionando, portanto, como rebatedores, isto é, fontes secundárias de luz “e tudo nasala apresenta aquela claridade cristalina que ele tanto admira”(Rasmussen, 1986, p. 200).

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Ronchamp

Este jogo de opostos explode na Capela de Ronchamp, considerada por muitos críticossua obra-prima. “Rasgos de luz cortam a parede sul, permitindo a luz difusa refletir nas paredes

laterais. Um fino rasgo de luz separa a parede e o forro escuro... esta capela de peregrinação estásituada numa paisagem revolta e sua forma branca contraposta contra as montanhas verdes pode servista a milhas de distância. As quatro elevações mostram formas esculturais, algumas vezesprojetando-se para o espaço exterior, algumas vezes abraçando-o. Os espaços exteriores tambémfazem uma espécie de contraponto, com a cobertura em declive, as paredes apontando para o altoe opiso se desencontrando da cobertura. Todas as formas dialogam umas com as outras” (Jencks, 1972,p. 150). Baker diz em seu livro que “a dimensão espiritual do recinto se expressa mediante aluz”(1992, p. 204). A variedade de modos como a luz penetra na capela produz uma sensação demistério. Formas e espaços se modelam e refletem graças à pluralidade e contrastes luminosos. Domuro sul chega uma multicolorida inundação de luz e, nas capelas pelo contrário, é refletidasuavemente através das paredes de concreto. A luz indireta das capelas orientadas para leste e oestemuda de intensidade com a posição solar e na capela orientada para o norte, a luz é constante. Acobertura se eleva suavemente na fachada sul e leste, para que uma estreita linha de luz penetre.Atrás do altar oriental, surgem fontes luminosas pontuais. “A luz é chave, a luz ilumina as figuras eas figuras possuem poder emocional”, diz Corbusier (apud Baker, 1992, p. 243).

O arquiteto Steen Eiler Rasmussen, em seu livro Arquitetura Vivenciada descreve assimo projeto: “Le Corbusier, que até então trabalhara com aposentados inundados de luz diurna, tãoadequados para formas precisas e cores puras, criou um interior de igreja em Ronchamp que possuio apelo emocional de se basear na penumbra da iluminação indireta, na qual a forma só é

obscuramente revelada. Trata-se de um santuário católico dedicado a uma imagem da VirgemMaria, e o projeto de todo o edifício baseou-se em idéias e emoções inteiramente distintas das quehaviam determinado sua obra até então. À distância, as paredes e a torre branca da igreja podem servistas dominando o mais alto cume de uma paisagem montanhosa em Haute Saone, onde as cristasdas serras se sucedem umas atrás das outras. O ritmo ondulante da paisagem parece continuar notraçado da igreja. À medida que nos aproximamos, descobrimos que não existe uma só superfícieplana; todo o edifício se curva e se dilata numa composição extraordinariamente bem integrada”.

Continua Rasmussen: “ao entrarmos na igreja, o que primeiro impressina é o ambienteestar muito escuro. Gradualmente, apercebemo-nos das paredes e começamos a notar quesuperfícies planas e regularidades não serão mais encontradas no interior do que no exterior doedifício. O próprio piso é como uma paisagem ondulada de lajes de pedra, num padrão irregular.

Um pequeno grupo de bancos sólidos para os fiéis forma um palalelogramo a um lado do recinto,defronte do altar-mor e da imagem da Virgem colocada bem acima dele. Essa relíquia sagrada estánuma caixa de vidro inserida na parede grossa, de modo que pode ser vista tanto do interior como

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do exterior da igreja, onde, muitas vezes, são celebradas missas campais. À direita há uma grandeparede espessa, perfurada por numerosas aberturas de dimensões desiguais. Do lado de fora, elasparecem minúsculas vigias mas, no interior, elas abrem-se em vãos amplos e brancos que projetamconsiderável quantidade de luz refletida no recinto penumbroso. Algumas dessas aberturas foramfechadas com vidro em que foram pintados ornamentos ou inscrições. No ângulo formado pela

parede do lado sul e a parede do fundo, que contém a Virgem, existe uma fissura estreita do piso aoteto com um arranjo gigantesco de concreto, semelhante a uma tela ou cortina, que tem o objetivoevidente de impedir a entrada de luz direta. Mas a luz que penetra é tanta que chega a atrapalhar osfiéis que tentam concentrar-se em suas devoções. A penumbra da igreja é fendida para raios de luzradiantes que jorram da fissura estreita. Com essa única exceção, é muito pouca a luz que penetrano recinto. Entre paredes e teto, existe uma abertura muito estreita que admite apenas luz bastantepara vermos o teto, de cimento áspero contra as paredes rebocadas de branco. O que do lado de foraparecem torres – duas voltadas para leste e uma para oeste – são vistas do interior como absides,ampliações recuadas do recinto. E o que parecem aberturas do campanário são, na verdade, janelasque não podem ser vistas do interior, mas que, acima do telhado, espalham uma luz mágica sobre asparedes curvas da ábside, atraindo a atenção dos fiéis para o altar e mais para o alto, onde a luz émais brilhante”.

Quando se fala em projetar a luz em arquitetura, é senso comum imediatamente citar acapela de Ronchamp como exemplo. Rasmussen detecta corretamente que ela significa umamudança no pensamento de Corbusier no uso da luz, “pois até então trabalhara com aposentosinundados de luz diurna”, porém esta mudança já era sinalizada em Marselha e na correspondênciade época citada por Jencks: “fazer a beleza pelo contraste”. Tem-se como resultado que “LeCorbusier, através desse templo notável, deu uma nova contribuição para a arquitetura e mostrou demaneira impressionante como a luz do dia e sua distribuição constituem um maravilhoso meio deexpressão para o artista” (Rasmussen, 1986, pp. 202 e 207).

Paolo Portoghesi comenta assim: “em Ronchamp, Le Corbusier deixa a luz entrar porfrestas que parecem ser entalhadas pela própria luz, interpretada como um bloco piramidal

cristalino, ou melhor, como vigas lâminas de vidro difusoras, que cortam a parede, fazendo suainercia e materialidade aparecer pelo contraste. Mas esse não é o único efeito de luz estudado nacapela. Se, com a parede perfurada, Le Corbusier parece querer simbolizar uma luz humanadescendo do alto, mas nos atingindo e descrevendo as qualidades do nosso mundo, outra luz, umaluz divina, parece ser a referência simbólica do fluxo luminoso canalizado para baixo por aquelasérie de aberturas colocadas sobre a cobertura. Para o observador que olha por baixo, a luz, filtradapor poços verticais, parece opalina e distante, vinda de uma região inatingível: uma transcendente,mas não triunfante e ofuscante luz, como a da glorie barroca: uma luz projetando o divino no limitede uma existência vivida em frustação e desejo. Le Corbusier foi criticado naquela época por terabandonado seu espírito laico e ter se oferecido para uma operação de propaganda: de propaganda

 fide. Mas o fato é que o mestre, então pelos sessenta, estava apto para prever a crise de uma

secularidade iluminista, que veio depois de uma outra religião, a religião da razão e do intelectopuro” (Portoghesi apud Futagawa, 1994, p. 13).

La Tourette

Essa idéia de focos luminosos é repetida no convento de La Tourette: o impacto visualprovém de três focos luminosos que repartem a luz sobre o santuário e o altar. Na sacristia, a luztambém penetra por focos diagonais provenientes do teto.

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Assim Paolo Portoghesi analisa a luz do convento: “em La Tourette, Le Corbusierconcebe um programa de edifício ‘fora do tempo’, dando forma a uma sequência de espaços queespalham uma forma de vida, que a comunidade dominicana não mudou desde a distante época dafundação da ordem religiosa. O conteúdo da obra não podia ser a ‘vida moderna’, que inspirou aVilla Savoye ou a Unité d’Habitation em Marselha, mas sim a contemplação e permanência, apermanência de uma ordem, da amizade entre homens, suas vidas, e o abrigo sob o qual suas vidasse desenrolam, do amanhecer ao alvorecer, de acordo com um ritual preciso do qual a arquitetura se

transforma no traço visível”.“Le Corbusier assim redescobriu o valor da tipologia e a importância de trancrevê-la em

uma linguagem atual, a importância de uma operação que, sem invenções, transformações,subverções, sem ‘partir do zero’, repete de uma maneira diferente algo que ainda está vivo, ou aomenos pode voltar a viver. Padre Regamey, cliente e amigo de Le Corbusier, propôs um modeloexplícito: o Convento de  Le Thoronet in Var . Depois de visitá-lo, o arquiteto assimilou suas liçõesprofundamente e fez reviver principalmente sua extraordinária qualidade luminosa. Alguns anosapós sua visita, o arquiteto aceitou a oferta de escrever uma breve introdução para o livro dedicadoao convento, de autoria de François Cali. ‘ Le plus grande aventure du monde’, e assim apresentou-se com gratidão para as qualidades, caracterizando-as. ‘le pierre y est amie d’homme, as nettetéasurée par l’arête enferme des plans d’une peau rude; cette rudesse dit: pierre est non pas marbre;

et pierre est un mot bien plus beau... La lumière et lómbre sont les hautparleurs de cettearchitecture de vérité, de calme et de force. Et rien de plus n’y ajouterait’ . A luz e a sombra são osporta-vozes’ no convento de La Tourette: elas de fato amplificam o caráter de uma ininterruptatorrente de diferentes espaços amarrados uns aos outros por uma qualidade de complementaridade,e sublinha suas extraordinárias qualidades métricas e proporcionais, concebidas pela experiênciaadquirida pelo uso do instrumento teórico do Modulor.”

“No convento de La Tourette, luz e matéria, luz e espaço, se tornam fatores dialéticos deuma constante troca. O material uniformemente difusor, o concreto, que oferece à luz a impressãode um trabalho formal impresso em suas superfícies, em nenhuma outra edificação precedente, nemmesmo nas de Le Corbusier, alcançou um significado expressivo tão intenso, e precisamente pela

questão da luminosidade do material que aparece muito evidente nos espaços interiores. É a luz quedesenha na superfície do concreto desformado o caráter de um material diferente, a madeira, queexiste apenas como uma memória, apenas como uma idéia. A vibração da ‘pele enrugada’ contém ainscrição que apenas a luz pode decifrar e revelar aos nossos olhos. Assim o material perde sua

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unicidade através da luz e se divide em uma dupla aparência: concreto e madeira. O concreto ébruto e uniforme enquanto material, a madeira é a impressão de uma idéia, a ‘forma’ que nessesentido o escultor oferece para esse mundo”.

“Sprechend Beton”, concreto que fala: esta expressão cunhada em conexão com oGoetheamun de Steiner se concretiza melhor em La Tourette, onde constantemente descreve um

processo, e opõe a infinita variedade de impressões deixadas pelas formas à compacidade monótonade sua substância. Aqui a ‘arquitetura brutalista’ tem sua mais clara anunciação e seu insuperávellimite.”(Portoghesi apud Furtagawa. 1994. P. 17).

Claro – escuro

Conclui Ggeoffey Baker em Le Corbusier – Análisis de la forma (1992 ) que nestas duasobras, na Capela de Ronchamp e no Convento de La Tourette, a “luz transcende a forma comoveículo fundamental da expressão emocional”(p. 243).

Mesmo conhecendo as inquietações do Corbusier pós-guerra, mesmo sabendo que quer“fazer a beleza pelo contraste”, após a leitura dos textos corbusianos de antes da guerra, surge adúvida se a sua obra tardia e principalmente estas duas obras não seriam contraditórias dentro doprocesso analisado. Wright, Gropius e Corbusier procuraram romper os conceitos de vazios echeios. Não trabalhavam mais com buracos nas paredes, mas sim com planos de alvenaria e planosde vidro. Procuraram romper o tradicional conceito de luz e sombra, para propor a idéia detransparência. A luz, nas edificações dos três grandes mestres, procurava obter independência dafonte e se transformar em sensação luminosa. Estas idéias se fazem presentes na Casa da Cascata,no edifício das Ceras Johnson, na Fábrica Fagus, no Edifício da Bauhaus, na Casa Ozenfant e naVilla Savoye.

Ronchamp e La Tourette, talvez por serem edificações de caráter religioso, talvez porserem obras tardias do mestre Corbusier, retomam a idéias da luz e sombra, dos cheios e vazios, dosburacos na paredes. Mas não nos parece uma negação das idéias anteriormente expostas, mas, pelocontrário, um aprofundamento da questão da iluminação, abrinndo um caminho que, nas próximasdécadas, os arquitetos irão retrabalhar, reelaborar.

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V) LOUIS KAHN: SILÊNCIO E LUZ

Como primavera e inverno,

tua sombra e tua luz se unirão num todo... Imre Madách

Os escritos de Louis Kahn à primeira vista parecem herméticos, se comparados aoscartesianos de Gropius e Corbusier ou, como diz Romaldo Giurgola, de caráter “sumamentepessoal” (Giurgola, 1980, p. 15). Kahn talvez seja o arquiteto que mais tenha se preocupado com opensar do uso da luz na arquitetura, como mostram seus escritos e entrevistas. O seguinte textoilustra seu pensamento a respeito: “um espaço nunca encontrará seu lugar na arquitetura sem luznatural. Luz artificial é a luz da noite expressa por luminárias fixas, que nunca poderá sercomparada com o imprevisível jogo da luz natural... A estrutura é um desenho na luz. O arco, a

abôboda, a coluna são estruturas relacionadas ao caráter da luz. A luz natural revela o espaço pelasnuances da luz nos vários períodos do dia, das estações do ano, penetrando e modificando o espaço”(Kahn apud Tyng, 1984, p. 162). As necessidades de conforto ambiental, determinantes nopensamento modernista europeu de uso da luz, recebem um outro enfoque de Kahn: usar luz comoinstrumento poético, ultrapassando as questões higienicistas. A análise de seu pensamento mostraráque esta poesia está presente não somente nas suas obras, mas no próprio pensamento conceitual.

“Devemos mencionar um arquiteto que recusou o status quo do modernismo e fez seupróprio caminho para seu ideal de luz. Louis Kahn, reconhecido como filósofo da luz, contrapôsuma arquitetura majestosa e sublime contra o cenário do continente americano, e cuja idéia de luzera única, consistente com seu trabalho e pensamento” coloca Miyake em seus comentários sobre ouso da luz na arquitetura (apud Futagawa, 1994, p. 322).

Espaço e Luz

Assim Le Corbusier, Kahn também formulou uma série de frases relacionandoarquitetura e luz. A seguinte pode ser tomada como palavra de ordem de sua obra: “o projeto de umedifício deve ser lido como uma harmonia de espaços em luz” (Kahn apud Tyng, 1984, p. 163).

Na conceituação de Kahn, assim como na de Corbusier ou na de Wright, o espaço é oprincipal elemento da arquitetura, “e dá o tom” (Kahn, 1984, p. 11: “o arquiteto cria espaços”).Mas, em seguida, coloca que cada pessoa é um indivíduo distinto e, portanto, os espaços devem

também ser didtintos, variados. Para que haja essa variedade de espaços, é necessário que haja umavariedade de iluminação natural e de orientação relativa dos espaços em relação à penetração daluz: “a estrutura de um quarto deve ser evidente no próprio quarto. A estrutura, eu acredito, é oformador da luz. Um quarto quadrado pede por sua própria luz para se ler o quadrado. Espera poruma luz mesmo vinda de cima ou dos quatros lados de janelas ou de reentrâncias”(Kahn apud Tyng,1984, p. 168).

Para compreender seu raciocínio sobre a luz, deve-se estudar alguns aspectos dopensamento projetual de Kahn: “ajustar-se ao circunstancial é justamente o papel que compete aodesenho” (1984, p. 16), diz. Assim diferencia forma e desenho, tanto no que tange à concepçãoquanto aos aspectos mensuráveis e não mensuráveis do trabalho do arquiteto. “A arquitetura temlimites. Quando tocamos os muros invisíveis de seus limites é quando melhor conhecemos o queeles contém” (Kahn, 1984, p. 16). Porém ressalta que a arquitetura não consiste em apenassatisfazer os aspectos mensuráveis desejados pelo cliente: os mensuráveis devem ser o ponto departida e os finalizadores do projeto (“porque você não pode medir o amor; porque você não pode

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medir o ódio; você não pode medir a nobreza; são coisas complemente imensuráveis”- Kahn apudTyng, 1984, p. 162). Os aspectos mensuráveis serão aqueles retratados pelo desenho. Assim,enquanto o desenho é a expressão do mensurável do pensamento, o não mennsurável deve vir dapsique, do sentimento. Mensurável e imensurável: pensamento e sentimento. Pode-se então resumirassim: os aspectos mensuráveis serão expressos pelos aspectos quantitativos, pela metragem

quadrada, método de construção, cálculos.A técnica é para Kahn uma medida mensurável de expressar com mais e mais exatidão o

desejo e a vontade de ser das aspirações. Os aspectos não mensuráveis serão expressos pelaqualidade inerente: o espirírito de ser tomará conta do edifício. Arquitetura é também a criação deespaços que evoquem o sentimento de seu uso adequado. Em termos de projeto de iluminação, osaspectos mensuráveis enfocam as questões higienicistas e os calculos luminotécnicos expressamisso em números. Já a poética de luz de Kahn está no não mensurável: “O projeto do edifício devepoder ser lido como uma harmonia de espaços iluminados. Cada espaço deve ser definido pela suaestrutura e por seu caráter de sua iluminação natural. Mesmo um espaço concebido para permaneceràs escuras deve ter luz suficiente – proveniente de alguma misteriosa abertura – que nos mostrequão escuro é na realidade, (...) a luz, com suas características influi naquilo que distinge a

arquitetura de uma zona da outra” (Kahn, 1984, p. 17). Kahn acredita que a qualidade de constantetransformação da luz do dia ofereça vida à arquitetura, porque a relação da edificação com a luzmude conforme esta a envolve e nela penetre.

Estrutura e Luz

Tom Wolfe, em seu livro Da Bauhaus ao nosso Caos, conta que Kahn tinha umaaparência que não impressionava muito: era baixo, com “cabelos ralos, branco avermelhados, queapontavam para todas as direções. O rosto era todo retalhado em consequência de um acidente na

infância. Usava camisas amassadas e ternos pretos. As costas de suas mangas eram lustrosas.Sempre carregava um charutinho de cor infeliz na boca. A gravata permanentemente frouxa. (...)Mas isso era apenas exteriormente. (...) Kahn entrava na sala de aula, encarava os alunos (...) e desuas entranhas saía uma voz notável” (Wolfe, 1990, p. 50): “eu não posso falar o bastante sobre luz,porque a luz é tão importante, em verdade a estrutura é que molda a luz. Quando você decide poruma estrutura, você está decidindo sobre a luz. Nos velhos edifícios, as colunas eram a expressão daluz e não luz, luz, não luz, luz, não luz, luz, você pode ver. O módulo também é luz – não luz. Asabóbodas são feitas para isso. As cúpulas são feitas para isso, a mesma realização de quando vocêestá criando luz” (Kahn apud Tyng, 1984, p. 173 – 174).

Dentro da tradição modernista de negação do ornamento, diz Kahn que um espaçoarquitetônico deve revelar a evidência de sua formação pelo espaço em si. Assim, a citada escolha

da estrutura deve direcionar a escolha da luz que dará forma a esse espaço. Ao se analisar umaplanta, observa-se cheios e vazios. Os cheios mostram onde não há luz e são ao mesmo tempo, oselementos que compõem a estrutura. Os vazios mostram onde está a luz. Esta luz é a natural, luzque é a base do projetar kahniano. Não se dá a mesma ênfase à luz artificial, que é estática, e n~`aopode igualar os jogos de luz e sombra criados durante as horas do dia e pelas estações do ano.

A luz como definidora de espaços

Pode-se-ia perguntar como ficam os espaços sem iluminação natural, ou apenasiluinados artificialmente, ou o que acontece com os espaços à noite, quando prevalece a iluminaçãoartificial. “All spaces need natural light” diz Kahn (1984), e completamente: “todos os espaços quemereçam ser chamados de espaços necessitam de luz natural”. Sobre a luz artificial, diz que é só umpequeno momento de luz. Não pode existir sozinha. Mesmo a noite deve ser complementada pela

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luz natural... a luz natural também é a lua cheia e ela basta para que haja realmente umadiferença”(1984, p. 42).

Cada espaço deve ter sua própria luz, e o argumento usado por Kahn é que a naturezanão trabalha com “tipos”, mas cada folha é diferente da outra, cada nuvem tem o seu própriodesenho, cada pessoa tem sua personalidade única. Aqui seu pensamento entra em confronto com o

de Gropius, que sempre se preocupou com a reprodução industrial dos espaços, criticando por issoas obras que não apresentassem esta característica.

Assim, se Kahn diz que cada espaço é único e deve ter sua luz adequada, entãoestabelece uma relação de dependência entre luz natural e espaço. O seguinte trecho coloca suaposição: “não posso definir o espaço se não há luz natural. E isso porque as características criadaspelas horas do dia e pelas estações do ano ajudam a reconhecer o que pode ser um espaço quandohá luz e o que não pode quando ela falta. Uma luz artificial, seja numa galeria ou num auditório,está sempre perdida”. Note-se que Kahn coloca exemplos bastante específicos de espaços quegeralmente trabalham só com a luz artificial ou que podem trabalhar sem a luz natural. ContinuaKahn: “...gostaria de construir um teatro com luz natural (...). Por que se deve fazer os ensaios emum lugar desagradável? O ensaio é uma função? Não, a função é a função e só vemos isso, e não oensaio. Durante o ensaio, o teatro deve ser o mais agradável possível, com outro tipo de atmosfera.Não acredito que se deva ter sempre luz artificial, a menos que se esteja ensaindo em outro lugar.Eu acredito que se deva ter luz natural em todo o espaço que mereca este nome. Acredito que omodo em que se conforma um espaço implica em grande medida na consciência das possibilidadesda luz; desde que se veja uma coluna, por exemplo, pode-se dizer – ali está uma coluna – só porqueexiste a luz. O mesmo não acontece com a parede... mas em se tratando de uma coluna, de umaabóboda, ou de um arco, você diz que a luz existe. Portanto, os meios de conformar um espaçoimplicam que a luz penetre nele, e a escolha, de uma estrutura é ao mesmo tempo a escolha do tipode luz que se deseja... Acredito que isso é verdadeiramente um requisito arquitetônico.”(1984, p.42).

Dentre as várias interpretações que se poderia dar a esta passagem, a abordagemestritamente física é bastante precisa: tudo é visto através da luz. Só se vê aquela coluna porque umafonte de luz a ilumina, e raios de luz dirigem-se para os olhos. No olho, a retina decodifica amensagem visual trazida e remonta a coluna. Se ela é azul, é azul por causa da luz que a iluminou.Seus pigmenntos azuis aborveram os comprimentos de ondas não azuis, e refletiram oscomprimentos de ondas azuis. Esses chegaram aos olhos e os cones fizeram a leitura da cor,enquanto os bastonetes ocuparam-se da luminosidade. Luz e cor são irmãs gêmeas que caminham

 juntas: luz tem o seu espectro composto pelos vários comprimentos de onda, e cada comprimentode onda corresponde a uma cor específica. Dependendo da composição do espectro, a corperceptível da luz muda, podenndo ficar mais dourada, mais azulada, conforme as horas do dia e acomposição da abóboda celeste. O projeto de iluminação até este ponto trabalhou com os aspectosmensuráveis. Mas essa cor aparente da luz permite várias interpretações, não mensuráveis, poéticas.A luz azulada de um dia encoberto pode significar sobriedade ou depressão. O aumento de tensãoantes da tempestade é simbolizada por uma ameaçadora luz púrpura. Depois os raios do sol rompemas núvens com uma luminosidade prateada. A imaginação é instigada pela luz.

Um armário escuro, sem luz, não é, portanto, um espaço. Se alguém abre este armário,deixando a luz penetrar, forma-se o espaço: sua geometria, sua textura, as cores dos objetosdepositados. Diz Kahn para um exemplo similar: “...tem-se um espaço quando se abre a porta eentra a luz... caso a luz seja natural” (1984, p. 42). Como já dito, a luz natural é a única e verdadeiraluz. Sendo assim, a janela é a componente mais importante do espaço, o que lhe dá caráter evitalidade. Cada espaço projetado tem sua própria característica e personalidade, que será reveladapelo espectro da luz. Kahn acreditava não existir luz branca, como uma concepção abstrata, mas sim

luz com diferentes espectros. A mutabilidade dos espectros é o que vivificaria os espaço, que teriamvárias faces, conforme a mudança da luz do dia pelo andar do sol na abóboda celeste. A luz comocomponente da natureza não tem consciência em si. Mas quando interage com a arquitetura, dá lhe

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uma qualidade “mágica”, uma espécie de consciência. “...a luz, que dá a consciência; pela esperançapela lei. Você pode dizer que luz, que sempre dá a consciência; é o que faz o material, e o materialfoi feito para moldar a sombra, e a sombra pertence à luz” (Kahn apud Tyung, 1984, p. 172).Adiante, ao se analisar sua concepção de silêncio e luz, esta questão será desenvolvida.

Silêncio e Luz

“Inspiração é o sentimento de começar no princípio, onde Silêncio e Luz se encontram:Silêncio, que é o desejo de ser, e Luz, que oferece toda a esperança (...) Viver é expressar. Toda ainspiração serve a isso” (Kahnn apud Tyng, 1984, p. 169). Mas a luz não é só um meio parareconhecer os objetos, para torná-los visíveis. “É a fonte original que contém todas as leis danatureza, conhecidas ou não pelo homem” (Gourgola, 1980, p. 16), ou como diz Kahn:

•  “A natureza faz seu desenho através dos princípios da ordem.

•  A natureza não sabe quão belo é o por do sol.

•  A natureza é uma existência não consciência.

•  A regra é consciente. A lei não é consciente” (Kahn apud Tyng, 1984, p. 162).

Essa linha de raciocínio levou Kahn a formular seu conceito de silêncio e luz, sua últimae mais abstrata teoria, voltada para a origem da expressão criativa na mente humana.

Alexandra Tyng, em seu livro  Beginnings – Louis I. Kahn’s of Architecture, quesistematiza textos e entrevistas de seu pai, Louis Kahn, diz que ele via a luz como ferramenta,instrumento dado pela natureza e o silêncio como a expressão proveniente do inconsciente coletivo:“no ponto de encontro ocorre a inspiração que dirigirá a criação da obra de arte” (Tyng, 1984, p.134).

Para tanto, Kahn se interessou pelas leis da natureza, que para ele é a realidade materiale objetiva. Suas leis são eternas e inflexíveis, trabalham numa relação harmônica, que Kahn chamoude Ordem. Forma e Ordem são palavras chaves de seu pensamento. Se o espaço aspira a umaOrdem, a luz deve ter uma qualidade espiritual. Para melhor compreender este raciocínio, far-se-áuma recapitulação de seu pensamento: em 1954 Kahn ressaltava as relações entre a estrutura daedificação e a luz. Já em 1960 coloca que a estrutura de um espaço é definida pela luz. Diz Tyng(1984, p. 130): “num projeto, quando os espaços iluminados são ordenados isso resulta tal qual umacomposição musical, onde a harmonia é formada pelas notas da luz”. Nesse período Kahncomeçava a discorrer sobre o efeito mágico da luz que toca as superfícies do edifícios, que lava asparedes, que diferencia as faces do sólido tridimensional e que penetra no interior pelas aberturas.Por isso, luz e estrutura são inseparáveis. Todos os elementos do edifício – paredes, janelas arcos,pilares existem quando são moldados por luz e sombra. Como já anteriormente colocado, Kahn viaalgo além de físico na luz: no encontro da luz com o espaço, a luz ofereceria consciência ao mesmo,como um toque divino, dando vida ao espaço. Segundo Tyng, foi em 1967 que Kahn formulou aexpressão Luz e Silêncio. Luz e silêncio juntos, dizia, produziam inspiração.

Qual seria porém o sentido da palavra silêncio? Não a usava no sentido convencional.No mesmo ano de 1967, numa palestra proferida no  New England Conservatory, Kahn declarouque “silêncio não era uma vontade pré-existente, mas uma vontade que se prolongava além daexistência”. Um ano depois colocou que o silêncio nasce de um estado de completa introversão, deuma unidade com seu “eu” (self) interior. Em 1969, desenvolveu este pensamento, ao dizer noInstituto Federal de Tecnologia da Suíça que “silêncio não era nem luz, nem escuridão, mas uma

vontade que principiaria a existir em algum lugar bem no fundo de todas as coisas vivas” (Tyng,1984, p. 132). Giurgola afirma que, para Kahn, a matéria é “luz extinguida”, isto é, quando a luzcessa de existir, e ela só existe em movimento, converte-se em matéria. “O silêncio tende a

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expressar algo, a luz o cria, dando-lhe forma. O gênio criador possui dois aspectos, um luminoso e ooutro não luminoso. O luminoso faz-se em luz, chama e matéria, da qual surgem os meios, aspossibilidades e as evidências. Em consequência as montanhas, os rios, e o ar são luzextinguida”(Kahn apud Giurgola, 1980, p. 16). “Luz é vida materializada. As montanhas, osriachos, a atmosfera é luz apagada (...) Nós somos provinientes da luz apagada (...) Da luz que ficou

exausta.” (Kahn apud Tyng, 1984, p. 177). Além dessas descrições poéticas, Kahn declarou tambémque silêncio é um grande vazio além dos domínios do tempo e do espaço, um vazio sem vida ouqualquer outra coisa. Todavia, desse vazio vêm as galáxias, os planetas e a vida. Assim, este vaziosilencioso contém um potencial para a vida. Conforme já colocado, esta é a procura dos “começos”,porque o “começo de toda a atividade estável do homem é o seu momento mais maravilhoso”(Kahn, 1984, p. 10). Kahn tinha chegado neste momento a vasculhar os começos, a procurar omomento antes do começo. Alexandra Tyng (1984, p. 132) pergunta: “Como pode algo vir donada? O que existia antes da centelha da criação que gerou esta centelha? Pode este vasto reino dosilêncio conter o potencial de algo que vai ser?”. Kahn pensa a luz relacionada com o silêncio comoum desenvolvimento de seu pensamento da luz como princípio da vida. A luz vem do silêncio, umavez que o silêncio é primeiro e imaterial, contendo a vontade de ser uma expressão consciente. “Já aluz contém um potencial de ser material, mas é turbulenta e indócil porque é desprovida deconsciência” (Tyng, 1984, p. 132). E continua: “a feição física do mundo é composta pela luz quese perdeu no ato da sua criação. Luz, então, é o sentido de expressão presente na natureza, que foidomesticada e utilizada para criar o que agora existe”. Giurgola (1980, p. 15 ) resume esta parte dopensamento kahniano como sendo o silêncio a origem da arte, e traça um paralelo com AndréMalraux, que diz que arte é “a voz do silêncio”.

Existe um ponto onde luz e silêncio se encontram: é o encontro do desejo de expressão –silêncio – com o instrumento de expressão – luz. É um ponto em constante mutação. Mas é aí quesurge a inspiração. Esse ponto é diferente para cada pessoa ou para qualquer forma de expressão.Ting associa-o com o antigo pensamento chinês sobre o Yin e o Yang (“... acho que todas as coisasvivas e não vivas são dicotômicas”- Kahn apud Tyng, 1984, p. 166). Como se sabe, a representação

gráfica deste pensamento é um círculo dividido em hemisférios de luz e sombra, girando em tornode um eixo. Significa a interdependência de duas naturezas opostas: o princípio feminino do Yin,qualidades intuitivas e intelectuais da alma, simbolizadas pela escuridão, e Yang, o princípiomasculino, racional e inflexível, como as leis da natureza. Representa o que é espiritual,simbolizado pela luz. Yin se relaciona com o silêncio kahniano e Yang com as qualidadesespirituais da luz. A representação simbólica é perfeita para mostrar a interdependência: para que oato de criação ocorra, silêncio e luz devam trabalhar juntos.

“Assim, eu coloco isso na lousa: Silêncio e Luz. Silêncio não é quietude, muitaquietude. É algo que você pode dizer que é falta de luz; falta de sombras. Tudo isso são palavrasinventadas. Falta de sombra (darkless): não existe essa palavra. Mas por que não? Falta de luz(lightless); Falta de sombra – não luz e sombra? Desejo de ter, de ser; de expressar (...) Eu volto

para a luz, que dá a Presença; por vontade; pela lei. Você pode dizer que a luz, que oferece toda apresença, é o criador do material, e o material foi feito para moldar a sombra, e a sombra pertence àluz (...) Tudo que a luz faz, é moldado pela sombra. Nosso trabalho é de sombra.; e isso pertence àluz” (Kahn apud Tyng, 1984 p. 172).

“Inspiração é o sentido do princípio no limiar onde Silêncio e Luz se encontram:Silêncio, que é o desejo de ser, e luz que oferece toda a presença. Isso, eu creio, está em todas ascoisas vivas; nas árvores, nas rosas, nos micróbios. Viver é expressar. Toda a inspiração serveisso.... No limiar, no encontro do Silêncio e da Luz, jaz o santuário da arte, a única linguagem dohomem. É o tesouro das sombras. O que se faça com a luz se molda uma sombra. Nossa trabalho écom sombras, que pertencem à luz” (Kahn apud Tyng, 1984, p. 175).

Miyake faz uma síntese poética desse raciocínio: Kahn = silêncio e luz = essência sendo,portanto, o retorno à origem das coisas, construindo um mundo essencial imbuido de uma luzprimitiva, envolta pela escuridão (Miyake apud Futagawa, 1994, p. 322).

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Em 1972, Kahn falou sobre a existência de dois mundos separados: o mundo de “doisirmãos”, o primeiro “o desejo de ser expressão” (the desired to be express), com falta deluminosidade, o segundo irmão “que quer ser” to be to be to be make, que é luminosidade sempresença, um reluzir que ainda não é foco de luz. Silêncio e luz (Tyng, 1984, p. 137). Mas Kahnsublinhou que, na verdade, esses dois irmãos são na verdade um só, a separação só existe como

meio para se fazer compreender. São dois aspectos da eternidade que existem desde antes daeternidade principiar como realidade finita. É uma visão intuitiva, misteriosa, bíblica da formação eestruturação do universo em fusão com o ato arquitetônico.

Da teoria à prática

Para se estudar o uso da luz nas obras de Louis Kahn, deve-se entender seu conceito de“lugar”. Diz Giurgola que para Kahn a idéia de “lugar” não é algo físico, representado por umaimagem. É a consequência de um programa que satisfaz as necesssidades humanas para umdeterminado local. Kahn definiu que no “lugar” o homem realiza suas atividades e manifesta suaessência humana. “Em toda sua obra se observa uma paulatina redução do entorno, uma transiçãodo ruído ao silêncio, da luz para a penumbra, das zonas públicas às privadas” (Giurgola, 1980, p.54).

Diz Alexandre Ting (1984, p. 137) que projetar a luz é domar sua ferocidade e, aomesmo tempo, tirar partido de suas mutações, além de não esquecer seu significado simbólico. Aprática de Kahn começou de modo empírico, e aos poucos foi obtendo resultados. Esta experiênciaé transformada em teoria, aparecendo em escritos pela primeira vez em 1959, conforme vistoanteriormente. Mas desde os anos 40 sua obra mostra experiências com a luz.

Nas suas primeiras obras, neste aspecto, sua intenção é controlar a quantidade de luz.Por exemplo, a casa Weiss de 1948/49 tem uma parede toda composta por cinco janelas duplas de“suspender” no salão: são painéis/panos que podem mover-se verticalmente, de acordo com o graude luminosidade desejado. A intenção de Kahn era prover a casa com um sistema que pudessecontrolar a quantidade de luz penetrada no interior, conforme a posição do sol.

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A mesma estratégia foi usada no hospital psiquiátrico de Filadélfia, onde janelasofereciam aos pacientes diferentes graus de luz e privacidade. Numa outra ala do hospital, usousombreadores feitos de cerâmica queimada, que criaram um interessante efeito de luz sobre assuperfícies das janelas.

Na Yale Art Gallery e na AFL-CIO Medical Service Plan Building em Filadélfiautilizou o receituário da arquitetura modernista internacional: cortinas de vidro, sem controle de luz.Porém Kahn especificou no projeto telas que filtrariam a luz do sol., que não foram utilizadas porcausa do custo, substituídas por vidros azuis revestidos com películas que teoricamente filtrariam aluz do sol, o que na prática não ocorreu.

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No edifício de laboratórios do Instituto Salk, Kahn, em 1959, sombreou as janelas paraprotegê-las do sol do oeste – do Oceano Pacífico. Miyake descreve o projeto assim: “sua arquiteturasempre se relacinava com o meio circundante. De fato, o Salk Institute for Biological Studies,constuído na beira de um precipício voltado para o Oceano Pacífico, gera um contraste de luz esombra na superfície de concreto fundido sob o duro sol californiano” (Miyake apud Futagawa, p.322). Diz Kahn: “no projeto do Salk Institute for Biological Studies  estou desenvolvendo paredesem torno do edifício para abrigá-lo do ofuscamento. Eu não penso que venezianas e cortinas e todosesses tipos de janelas sejam arquitetura. São artigos de loja e não pertencem à arquitetura. Oarquiteto deve achar uma arquitetura livre de ofuscamentos, livre de ventos, dos quais sua forma edimensões provêm” (kahn apud Tyng, 1984, p. 164). É uma firme intenção de controlar a luz. Aquise sente que o arquiteto começa a ter segurança na posição do método, e parte para a procura daqualidade.

Em busca das qualidades da luz: igreja Unitária de Rochester

De 1958 a 1960, Kahn começa a trabalhar em projetos que irão influenciar seusprimeiros pensamentos sobre os efeitos metafísicos da luz na arquitetura. Após voltar sua atençãopara dar a quantidade apropriada de luz ao espaço interno, agora preocupa-se com a qualidade da

luz, preocupação esta que irá direcionar de agora em diante seu trabalho teórico. Isso resulta numapostura mais poética, mais pessoal, como visto nas páginas anteriores. Por volta de 1960, Kahnfalava da imprevisilibidade da luz natural, em oposição à luz artificial estática; descrevia o papelmágico da luz natural transformando o espaço; considerava que a relação entre estrutura e luz davavida ao espaço.

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A Primeira Igreja Unitária de Rochester retrata essa fase, onde desponta o uso da luzindireta. Para iniciar o projeto, Kahn quis saber em que se baseava a atividade Unitária para definirorientação na edificação. “Eu (tinha que) compreender que vontade de ser e que ordem de espaços apergunta expressava” (Kahn, p. 12). Kahn desenha um quadrado central dentro do qual coloca umsigno de interrogação. “...pensei que o santuário fosse simplesmente o centro das perguntas e aescola a formadora dessas perguntas... e senti que o ente que formula a pergunta e o sentido damesma – o espírito da pergunta – eram inseparáveis. O diagrama era a expressão da forma da igreja,não o seu desenho (num quadrado o santuário, ao redor um círculo que contém um ambulatório. Emtorno do ambulatório, um corredor, destinado à escola, que constituia as paredes do edifício – demodo que a escola são as paredes que rodeiam a pergunta). Como a sala de reuniões não possuiparedes que possam abrir para o exterior, “conseguir luz ...era um problema... de modo que

introduzi um poço de luz em cada uma das quatro esquinas. A luz entrava por cima e descia paradefinir o espaço de baixo (...) consegue-se luz das quatro esquinas. Quatro colunas e aqui umaparede de concreto armado. E a partir desta parede de concreto o teto sai em balanço. A paredetambém sustenta estas lajes que se cruzam; as vigas não estão, as retirei... mas há luz” (Kahn, 1984,p. 47 ). Dessa maneira, ele conseguiu dar expressão à forma do espaço escolhida, o quadrado.

Descreve Giurgola o projeto: “nesta Igreja Unitária, Kahn nos mostra suas idéias sobre arealidade da forma e da composição, tanto nos seus aspectos gerais, como nos particulares. Antes dasolução definitiva, o arquiteto elaborou uma série de anteprojetos nos quiais foi conciliandoprogressivamente estas duas realidades. Porém nunca se afastou da idéia preliminar, que a escolatinha uma estreita relação com a área destinada ao culto. A sala de reunião é definida por quatroparedes de bloco de concreto e por quatro lanternins que iluminam o recinto (...) As salas de aula, a

biblioteca e a cozinha se organizam ao redor da sala de reuniões. Em cada caso, a forma responde àfunção. Os efeitos de luz e sombra modulam a fachada” (Giurgola, 1980, p. 39).

Na igreja de Rochester, as reentrâncias têm uma profundidade de 91.5 cm. As janelas de

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madeira estão colocadas no plano interior. Os profundos nichos das janelas têm por objetivooferecer proteção contra os raios solares diretos. Essa luz filtrada, entrando pelos cantos, difusa, nãoproduz ofuscamento, pois não ocorre contraste entre o brilho exterior e a penumbra interior. Aspequenas janelas quadradas nas paredes maciças proporcionam luz pontual para o interior. DizKahn: “...antes as janelas estavam no plano da parede; agora tinham sido empurradas para o

interior. Sentimos o rigor da luz aprendendo a tomar consciência de seu resplendor em todo omomento (...) Isso dava um bom resultado, porque permitia a luz se refletir nas paredes da aberturae ajudava atenuar o reflexo. A luz indireta favorece a visão, e por isso me ocorreu que seria bom tera janela recuada para suavizar a luz, de maneira que quando não se está olhando diretamente parafora... quando se está no interior, num certo ângulo, pode se escolher por receber a luz diretamenteou não, de acordo com a largura da própria janela. Assim se começa a perceber que os vãosprofundos são necessários.” (Kahn, 1984, p. 48).

Esse partido é retomado nos Dormitórios Bryn Marw. Kahn usa novamente acombinação de um grande espaço central circulando por espaços menores, que recebem luz por

 janelas recuadas nos cantos ou, como diz Giurgola, “a planta se desenvolveu em torno de trêspátios. A luminação zenital dos mesmos se faz mediante lanternins que se sobrassaem da cobertura”(Giurgola, 1980, p. 26). Kahn estava aprimorando o controle da luz e também seu uso para definir anatureza e o espiríto do espaço.

Painéis anti-ofuscantes

Nos projetos seguintes, sua preocupação se volta para o desenho das janelas. No projetopara o edifício do Tribune Rewiew, previu janelas que oferecessem o máximo de parede“aproveitável”. Assim, projetou janelas compostas de duas partes: em cima, um grande pano devidro. Embaixo, com a altura de uma pessoa, uma tira vertical de abertura, portanto, em forma defechadura.

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Essa janela se destaca do edifício, funcionando como um quebra-sol no projeto do

consulado americano em Luanda. “Um lugar muito próximo ao Equador. Grande luminosidade daatmosfera. O ofuscamento é impossível. No interior de qualquer edifício e impossível olhar para as janelas. O contraste com as paredes é muito grande. Todas as pessoas parecem pretas quando vistasà contraluz. A luz é necessária, mas também é uma inimiga”(Kahn, 1984, pg. 19).

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Encontrar uma expressão arquitetônica para o evitar o ofucamento, sem nada agregar à janela, para não se ter a parede escura contra a luz, gerando contrastes, além de cortar a visão: éagradável olhar, das janelas, edifícios próximos a elas. “Ao observar que as pessoas trabalham defrente para as paredes, recebendo luz indireta, me dei conta de que a cada janela se deve opor um

painel livre para receber a luz do dia e que este painel deve ter uma abertura voltada para o céu”(Kahn, 1984, p. 19). Tyng diz que as janelas olham para paredes que refletiriam os raios do sol,criando uma iluminação indireta no interior. Desta maneira, o painel controla o ofuscamento e nãoanula a visão da paisagem. “Se você tem luz no interior - não necessariamente luz do sol -, ocontraste entre a escuridão dos sólidos e o brilho das aberturas não é tão grande, e então você nãosente o ofuscamento” (Kahn apud 1984, p. 163). E evita-se o contraste causado pelas manchas deluz e sombra que qualquer elemento em frente à janela projetaria. O edifício mostra o modo de vidadas pessoas, sua história cívica.

Indagado sobre a reação fisiológica ao ato de se sentar na escuridão e olhar para a luzcomo uma máquina fotográfica regula seu diafragma, como esse tipo de abertura facilitaria aacomodação do olho? Não causaria uma reação fisiológica dolorosa? Responde Kahn que a luz queentra pela janela rodeada pela escuridão é o que causa o ofuscamento. Qualquer coisa que secolocasse em frente produzia pontos ou linhas de luz com muito ofuscamento. Porém, quando esseselementos se fazem cada vez menores, não se sente tanto. E se produz uma grande modificação naluminosidade.

Apesar de o consulado nunca ter sido construído, esses painéis anti-ofuscantesmarcaram Kahn. Sinalizam a solução adotada nas salas de leitura do laboratório do Salk Institute,projeto que começou a trabalhar em 1959: placas quadradas com enormes “buracos de fechadura”envolvendo um edifício circular. Nos halls de leitura do instituto, Kahn retomou o conceito decolunas gregas em termos de luz. Já em 1954, conforme Alexandra Tyng, Kahn pensava que umacoluna possa ser “sulcada, oca”, como a grega, de manneira que se torne um filtro de luz.

Filtros

Essa idéia de envolver um edifício com uma concha independente também pode servista nas colunas envoltórias do edifício. Em 1961. Kahn aplica esses conceitos no projeto daSinagoga Mikveh Israel em Filadélfia, onde inseriu colunas ocas nas paredes exteriores emintervalos. Esses cilindros não estruturais eram enormes difusores de luz. A luz do dia penetrava

pelas aberturas exteriores, era refletida pelas paredes internas da coluna, e penetrava, filtrada, nasinagoga.

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No complexo governamental de Dacha, Kahn desenvolveu ainda mais esse princípio.Afinal, uma coluna no tamanho do edifício era espaçosa o suficiente para abrigar espaçosutilizáveis, e suas paredes poderiam receber janelas que dariam a necesssária vida conforme os

pressupostos kahnianos ao espaço. O edifício da Assembléia Nacional é um cilindro dividido porcima por um sistema estrutural de seções radiais, como se divide uma pizza. Cada “pedaço” é“perfurado” por aberturas circulares que permitem a penetração da luz, filtrando-a para as aberturasseguintes. De novo é retomada a idéia do envoltório: “o edifício é uma coluna ranhurada comparedes perfuradas, um volume translúcido na sua parte superior” (Tyng, 1984, p. 146). “Asaberturas que perfuram as paredes e coberturas desses edifícios (construídos no subcontinenteindiano) não mais mantêm a escala normal de janelas e zenitais, mas são relacionadas diretamentecom o novo tipo de dinâmica espacial. A forte luz solar indiana cria um espaço de luz e sombradepois de penetrar por essas aberturas. A luz emana das paredes exteriores através de uma série decamadas especiais; mais luz provêm do alto. A luz altera-se dinâmicamente, ennvolvendo erevolvenndo o espaço” (Miyake apud Futagawa, 1994, p. 322).

Esse é um ponto importante na obra de Kahn: houve uma modificação na postura deuso. Primeiro, Kahn utiliza uma concha protetora para atenuar o ofuscamento, porém, no edifício daAssembléia Nacional, o filtro de luz já não é um acessório, mas parte integrante da estrutura. É suaconcepção da inseparabilidade de luz e estrutura posta em prática. “Estabelecendo ainterdependência entre a luz e a estrutura, observou que a luz define o espaço enquanto o espaçoanima a luz nele contida” (Tyng, 1984, p. 146), ao mesmo tempo que falava da qualidade espiritualda luz. Exemplo disso é seu projeto para o edifício escolar de Ahmedabad, onde as janelasdistanciadas da fachada em nichos que chama de “bay windows ao contrário”, que dispensamacessórios de sombreamento, e os dormitórios tem suas janelas “afundadas” atrás de arcadas. OHospital Central de Dacca é considerado por Alexandra Tyng a síntese de seu pensamento sobre luzda década de 60: arcadas incorporadas à estrutura que protegem o espaço interior que oferecem

uma nova qualidade de luz ao interior. Diz Tynng: “assim como as salas de leitura de Salk, ohospital é essencialmente um edifício para viver, circundado por um edifício para o sol” (Tyng,1984, p. 148).

Conclui Miyake: “a despeito dos diferentes contextos, o modo como Kahn maneja a luznos remete à obra de Brunelleschi, do início da Renascença. A perspectiva, o chiaroscuro, as leis dageometria, as diferentes soluções de luz remetem tanto à interpretação contemporânea de Kahncomo às invenções dos mestres da Renascença. Seu discurso era motivado pelo caminho primitivoque retomava aos princípios do homem, e para tanto ele se voltou para o classisismo europeu.Quanto mais primárias e maiores eram suas referências, passava pela Europa e enraizava-se napaisagem e climas novo continente ou até no subcontinente indiano” (Miyake apud Futagawa, 1994,p. 322).

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Museu kimbell

Em 1966, Kahn recebeu a incumbência de projetar o museu Kimbell. Entre todos é oprojeto que mais evoca a mágica qualidade da luz. Diz “estou desenhando um museu de arte noTexas. Ali eu senti que a luz nas salas de estrutura em concreto terão uma luminosidade de prata. Eusei que salas para pinturas e objetos que podem desbotar devem ser iluminadas modestamente pelaluz natural”. Como é o projeto? A estrutura é composta de seis abóbodas paralelas. Ao longo de

cada abóboda corre um estreito rasgo pelo qual a luz do sol penetra na edificação. Um elementorefletor, composto por uma chapa de alumínio furada curvada instalada abaixo do rasgo espalha ereflete a luz natural para a face interior da abóboda, lavando-as com luz. A luz não é “dura”, osraios de sol não penetram diretamente, e sim difusa, não agressiva em relação às obras de arte.“Essa luz dará um toque de prata para a sala sem tocar diretamente os objetos, todavia oferecendo oconfortador saber das horas do dia” (kahn apud Tyng, 1984, p. 170).

Para tirar partido da mutabilidade da luz do sol, Kahn projetou uma série de espaços aoar livre, pátios, cada qual com uma graduação de luz oferecida pelas dimensões do pátio, reflexõesna água, concreto, travertino e variações da luz do dia. “Anexo à luz proveniente dos rasgos da salade exibição, eu cortei através das abóbodas em ângulo reto, um contraponto de pátios, ao céuaberto, de dimensões e caráter calculados, fazendo-os Pátio Amarelo, Pátio Azul, chamados assim

pelo tipo de luz que projetei pelas suas proporsões, pela folhagem, pela reflexão do céu nassuperfícies ou na água” (Kahn apud 1984, p. 170). Assim os pátios são íntimos ou amplos, frios ouquentes, com luz suave, “dura”, direta, indireta. Kahn esperava que as obras de arte revelassemsurpresas, novas características com cada mudança de luz. Mais que um acervo, é o desenvolver daidéia de como mostrar esse acervo, é descobrir novidades nele, redescobrir, procurar a primeiradescoberta, o espírito do primeiro museu. “A compreensão e apreciação de kahn pela naturezamutante da luz levou-o ao ponto de usá-la como elemento de criação como se fosse pedra ouconcreto. Ele estava literalmente criando desenhos com luz, como fora sua intenção verbal. Quando,nos últimos anos de sua vida, falava da miraculoso tomada de consciência da luz do sol ao entrarem contato com a arquitetura, ele evocava conscientemente o toque mágico nos seus edifícios porquase uma década” (Tyng, 1984, p. 155).

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Silêncio e Luz: sinagoga Hurva

Em 1967, surge o conceito kahniano de silêncio e luz, uma postura quase metafísica.

Um ano depois começa o estudo preliminar da sinagoga Hurva, em Jerusalém. A idéia

de usar a luz como um material de construção está presente no projeto que consiste de uma praçadentro de outra praça: um edifício de pedra envolvendo uma estrutura de concreto.

Dezesseis estruturas gigantescas, quatro de cada lado, filtram a luz do sol. Suas facesinteriores são escavadas em nichos, superfícies de reflexão, luminárias a homenagear as conotaçõesdivinas da luz natural (Tyng, 1984, p. 157). As pedras seriam reutilizadas, as mesmas da muralhaocidental de Jerusalém – “o edifício antigo ainda em vigoroso uso tem a luz da eternidade” (Kahnapud Tyng, 1984, p. 166). No interior, uma estrutura de concreto sustenta uma cobertura,demarcando o santuário e os outros espaços, lembrando a concepção da Igreja Unitária.

Este uso simbólico das pedras da muralha de Jerusalém nas paredes externas do templopossui uma significação muito especial. Hurva, em hebreu, significa ruína, retomando a concepçãokahniana de 1959 para o consulado de Luanda onde ruínas no sentido kahniano circundavam aedificação, assim como nas salas de leitura do Instituto Salk. A conclusão de seu trabalho nasinagoga é a junção do conceito de ruína e silêncio palavra com que descrevia o eterno em toda aobra de arte. Diz Tyng: “quando se vê remanescências de uma grande construção Kahn gostavaespecialmente do exemplo das pirâmides; sente-se o silêncio, porque quando o edifício é uma ruína,seu espírito está livre para emerger de novo” (Tyng, 1984, p. 157).

Segundo Potoghesi, o ‘encontro entre luz e silêncio’ pode ser a definição mais exata do

espaço Kahniano, o espaço construído entre volumes esculpido na pedra e posto em funcionamentopela luz que une e funde unidades separadas, desenhadas próximas umas as outras como uminventário ideal. A luz kahniana é sinônimo de unidade, e, com o espaço, se esta palavra écompreendida como a visível e transversal extensão interior e exterior criada pela arquitetura, que,como uma linha demarcatória, o delimita e identifica. Kahn fala da ‘selvagem dança da chama’ quepouco a pouco se queima e se transforma em matéria. De fato, a matéria alvenaria parece ser umvaso frio e poroso que o fogo queimou e deixou sua marca. Por essa razão, tão frequentemente a luzpenetra através de fissuras e é filtrada e refletida de uma tal maneira como em velho forno para setrasnformar em cinza. Por essa razão, o mais fascinante de sua arquitetura de luz é o projeto daSinagoga Mikverh Israel na Filadélfia, onde a luz, antes de entrar para o espaço central, éforçosamente filtrada, esfriada no vazio das torres angulares, câmaras de luz similares aquelas

usadas pelos mestres do barroco” (Portoghesi apud Futagawa, 1994, p. 21).Com Kahn, uma visão de arquitetura emergiu das ruínas da história: a revalorização da

história. Isto está expresso no seu conceito de silêncio e luz e tem como melhor exemplo o seu

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projeto da Sinagoga de Hurva. É o retorno às origens, o reencontrar do eixo histórico, simbolizadopelo uso das pedras da muralha ocidental de Jerusalém. É o abandono da visão a história dosmodernistas.

No silêncio da Sinagoga de Hurva, a luz é significado, é o sentido do projeto, é oinstrumento dado pela natureza para que o momento mágico da criação possa ser presenciado. Na

ordem da sinagoga, a luz adquire qualidade espiritual, dando vida ao espaço do tempo: é a procurados começos, da centelha da criação.

A difusão da luminosidade moderna

 Acenderam-se as luzes repentinas

Endre Ady

Que aconteceu com a luz dos modernos? Que continuidade teve o pennsamentoluminoso de Wright, Gropius, Corbusier e Kahn? Afirmações como “exerceram uma forteinfluência” sem dúvida refletem a verdade, porém muitas vezes é difícil apontar uma continuidadelinear.

Um bom ponto de partida é a análise que Portoghesi faz do momento pós-Segundaguerra mundial: “é talvez por causa deste longo jejum, dessa rigorosa abstinência da busca do nãoabsoluto em efeitos de luz e de transparência que um dos mais óbvios sintomas da arquiteturadepois da Segunda guerra mundial, e particularmente nos anos cinquenta, foi precisamente oretorno paa a dialética da luz sombra e para a questão dos efeitos de luz capazes de restaurar umadimensão perdida na arquitetura” (apud Futagava, 1994, p. 13).

Portoghesi coloca quatro edificações paradigmáticas desse período; a Capela deRonchamp de Corbusier, a Primeira Igreja Unitária em Madison de Frank Lloyd Wright, a Igreja deImatra de Aalto, a Ccapela no MIT de Eero Saarinen. Estabelece-se aqui um curioso aspectoarquitetôniico que é o fator religioso ligado à luz, fato abordade em capítulo anterior. Tanto a capelade Corbusier como a igreja de Wright já foram estudadas nos capítulos específicos de cada umdesses arquitetos, comentando-se a segir as outras duas obras:

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VI) OUTROS ARQUITETOS

6.1 Alvar Aalto

“Na igreja de Aalto em Imatra, a luz penetra resvalanndo pelos lados e desliza para oaltar do alto, atravessando uma ‘câmara de luz’ e revela com um efeito suava o caráter da formacôncava da alvenaria, moldada para o efeito de luz como a base de uma coluna clássica. No mesmoespírito da recuperação de uma espacialidade amplificada pela luz é a pesquisa de Saarinen, que édirecionada mais cenograficamente para o contraste entre a intensa luz do alto e a meia luz debaixo, quebrada por reflexos móveis filtrados por baixo pela água da fonte em anel... A explanaçãode Saarinen sobre a divisão das fontes de luz, como se elas estivessem amarradas à memória de umapaisagem espanhola onde a luz difusa da luz coexiste com os últimos raios do sol que se espalhamhorizontalmente ao longo do horizonte, restitui ainda mais a evidência da origem naturalística doefeito, e a questão de uma provocação emocional e simbólica” (Portoghesi apud Futagawa, 1994, p.

16).Alvar Aalto é um arquitetos que merece uma análise mais detalhada de suas concepções

luminosas. Enquanto arquiteto, busca da relação entre função e a existência humana, assim suaarquitetura pode ser classificada de orgânica nas suas referências à plantas e animais. Sem professarum espaço universal, portanto sem uma luz universal, Alto articula os espaços demostrando asfunções, e expressa a individualidade de cada parte; quando sua luz acompanha essa postura, deuma certa forma antecipa o pennsamento de Louis Kahn. Aalto descreve a luz de sua biblioteca deViipuri como “luz sem sombras”, como mostra o seguinte texto de sua autoria: “a luz do diapassando por simples janelas, mesmo que grandes, ilumina apennas parte de um espaço. Mesmo seo espaço for adequadamente iluminado, a luz não será uniforme e variará nos diferente ponntos dopiso. Essa é a razão porque luz zenital tem sido usada em bibliotecas, museus e similares. Mas a luz

zenital, que cobre todo o piso, vem com uma intennsidade exagerada, se não forem tomadoscuidados especiais. No edifício da biblioteca esse problema foi resolvido com a ajuda de uma sériede zenitais circulares constuídas de uma tal forma que a luz penetrasse indiretamente. A zenitalcircular é tecnicamente racional por causa da peça única de vidro empregada. (Toda zenital consisteem uma base cônica de seis pés de diâmetro e uma peça de vidro no topo sem estrutura de suporte).Esse sistema é racional sob o ponto de vista humano porque oferece um tipo de luz que é agradávelpara a leitura, filtrada a atenuada por ser refletida pelas superfícies cônicas da zeinital. Na finlândia,o maior ângulo de penetração do sol é 52 graus. Os cones de concreto foram construídos de umaforma que a luz do sol sempre permanece indireta. As superfícies do cone espalham a luz do sol emmilhares de direções. Teoricamente, quando a luz atinge um livro aberto de todas essas diferentesdireções e depois, refletida pela página branca do livro, dirige-se para o olho humano. (O brilho

refletido pelas páginas é um dos fenômenos mais fatigantes que ocorrem durante a leitura). Damesma maneira, esse sistema de iluminação elimina o problema da sombra gerada pela posição doleitor. O problema de ler um livro é mais que um problema do olho; a boa leitura permite aacomodação do corpo humano nas mais variadas posições e cria uma relação agradável entre o livroe o olho. Ler um livro envolve tanto uma concentração cultural como uma física. A arquitetura deveeliminar todos os elementos que possam causar distúrbios”.

“É possível cientificamente apontar que tipo e que quantidade de luz é mais adequada aoolho humano, mas, no projeto, a solução deve vir dos diferentes elementos arquitetônicos. Aqui azenital é um produto tanto do projeto do forro que é alto o suficiente para a instalação dos conesquannto da técnica de produção do vidro” (Aalto, 1979, p. 78).

“Essa idéia de ‘luz sem sombras’ dialoga com o desenho das paredes muitas vezesondulantes que difundem a luz. O espaço interno branco se articula com as curvas das paredes e, emdeterminados momentos, aparecem as ‘paredes-tetos’, que são “uma suave integração das paredes edo forro, criando um espaço de um único tom, ligeiramente perturbado pela pálida luz escandinava

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penetrando através de de zenitais e janelas laterais... a metodologia espacial de Aalto relacionandodiretamente função com sua relação com a atividade humana resultou em espaços orgânicos, cheiosde luz” (Miyake apud Futagawa, 1994, p. 307). O espaço e a luz orgânica de Aalto se diferencia dade Wright, gerada pela própria individualidade que caracteriza o movimento, porém a luz de ambostem uma qualidade em comum: a suavidade.

Outro arquiteto se destaca pelas suas iluminações zenitais através de seus projetos decoberturas translúcidas. Nervi cria espaços com arcos de concreto e elementos translúcidos noPalácio dos Esportes de Roma de 1960 e no Hall Beneditino do Vaticano, de 1970.

Portoghesi comenta que este último projeto lembra a inscrição da capela arcebispal deRavena: Aut lux hic nata est, aut capta hic libera regnat – a luz nasce neste lugar, e solta reina livre,pois “a luz se torna una com a estrutura, penetrando em seus elementos e permeando-os. Aimpressão não é de uma passagem fluída, mas sim que o material é imbuído de luz, que transformaos raios solares, absorvendo sua força, reduzindo-os a uma reflexão aperolada de vibraçãoconstante”. Assim Nervi trabalha a qualidade da luz e abandona o contraste entre luz e material deconstrução. “Sua luz assim compartilha a qualidade clássica da luz universal, típica do Panteão, e aqualidade filtrada e mutante da luz incidente, mediada pelo vidro, típica do gótico francês” (apudFutagawa, 1994, p. 20).

As zenitais de Aalto e de Nervi estabelecem um diálogo com as de Wright em sua IgrejaUnitária, em Taliesin, na Administração Johnson, ou Guggenhein, e com as de Kahn na IgrejaUnitária, de Rochester, no Museu Kimbell, no Yale Center. Porém o pensamento de Gropiustambém pode ser detectado em uma série de obras contemporâneas e posteriores. Existe umpercurso lógico entre sua frase “aumentem as janelas” e as cortinas de vidro.

6.2 MIES e a cortina de vidro

Diz Portoghesi que essas são “o jogo mágico da intersecção e interpenetração dassuperfícies refletores”, que se expressa melhor na cidade de Nova Yorke, difundindo-se para omundo, homogeneizando a paisagem urbana independente de sua posição geográfica”.

Uma obra paradigmática são os  Lakes Shore Drive Apartments  de Mies em Chicago.Uma “influência desintegrante” que este partido exerceu sobre o meio urbano: “luminosidadeincontrolada e incontrolável, à mercê da atmosfera e de sua instabilidade, esta paisagem efêmerasem pontos de referência fixos se tornou um símbolo trágico da perda de identidade dos lugares quevivemos. E nisso, a luz, assim como nos espelhos dos salões rococós, celebra ao mesmo tempo suaarrogante vitória e sua intrínseca negação” (Miyake apud Futagawa, 1994, p. 21).

Da mesma época dos Lake Shore Drive Apartments é outra obra importante de Mies, a

Farnsworth House. Se na Alemanha trabalhava com enfoques semi-funcionalistas, já nos EstadosUnidos sua preocupação é o espaço homogêneo que procura alcançar através do uso do vidro,através da transparência e da leveza da estrutura de aço que deixa penetrar uma “luz universal” quepreenche cada quina com a mesma densidade, equalizando interior e exterior com a mesmaquantidade de luz, portanto sem raios de luz, como Gaudi, sem a translucidez de blocos de vidros,sem o contraste entre a janela brilhando e as paredes na escuridão.

“O espaço universal, conforme desenvolvido por Mies van Der Rohe, refletia a condiçãocontemporânea do homem, significando uma arquitetura na qual, como os cientistas do século XIXanunciavam, a luz e o espaço se aproximam e se homogeneizam. O mundo é uma existênciaobjetiva iluminada pela luz e, consequentemente, a consciência humana deve ser clara como a luz.As áreas públicas e privadas devem ser integradas, indivíduos e grupo devem dividir igualmente oespaço. A claridade da forma miessiana foi realizada apenas após uma completa investigação dospadrões da sociedade atual” (Miyake apud Futagawa, 1994, p. 306).

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Seu Seagram Building  é a concretização da torre de vidro idealizada em Berlim,paradigma que gera toda uma arquitetura de arranha-céus de vidro que se espalham pelos EUA epor todo o mundo, através da obra de Philip Johnson, Kevin Roche, Richard Meier e I.M. Pei. Acomposição é feita com formas geométricas simples e caixas de vidro, sendo uma espécie de“manifestação da civilização das massas do século XX. Entretanto, a tecnologia contemporânea cria

um tipo de arquitetura transparente diferente dos protótipos de Mies”, que são a Farnsworth House,os  Lake Shore Drive Apartments  e o Seagram Building. Atualmente, “o fechamento transparenteexpõe um esqueleto dinâmico e dispõe-se a mostrar os mecanismos e a estrutura interior”, assimtransparência significaria hoje expôr a estrutura e os equipamentos do edifício, “como o esqueleto eos órgãos circulatórios do corpo humano desvendados por uma pele invisível”. Talvez o exemplomais citado deste pensamento arquitetônico seja o Centro Pompidou, já da década de 70, de Piano eRogers, onde além da estrutura, os dutos de ar-condicionado, tubos, elevadores e escadarias serevelam pela transparência e se transformam em elementos de composição: “é a emergência daestética High-Tech. Nessa arquitetura, a luz é permeada pelo sentido de visão do homem; a relaçãoentre ver e ser visto é estabelecida através da arquitetura. O movimento dos elevadores e escadas épara ser visto e percebido pelos que estão fora do edifício e o espetáculo das pessoas na praça étransportado através dos painéis de vidro transparente para os que estão no interior da edificação...(uma) manipulação do ver” (Miyake apud Futagawa, 1994, p. 292).

“Arquitetos como Piano, Rogers e Foster produzem novos projetos desde a década de70. Sua arquitetura é o produto de uma sociedade high-tech ainda baseada em modelos mecânicos.Caracteriza-se pelo uso arrojado do vidro e pelo sentido de transparência somado à qualidade dovidro e dos componentes metálicos, permitindo a visão através da estrutura e dos equipamentos. Ànoite, tomam a forma de máquinas brilhantes, imersas na luz, envolvidas pela fluência da peletransparente” (p. 293). De uma certa forma, seus edifícios anunciam um novo mundo que está parachegar, assim como faziam os edifícios dos pioneiros do modernismo.

6.3 Luis Barragán

Em total contraste com este novo mundo acima anunciado, está a obra de uma série dearquitetos que de uma certa forma podem ser identificados com o pensamento de Louis Kahn,porque representam uma continuidade de seu pensamennto ou porque se afastam dos cânones domodernismo, procurando outros caminhos.

“Contrastando com a discussão convencional da metafísica da luz na Europa, um sentidoestético totalmente diferente no tocante à luz foi desenvolvido no continente americano. Nósencontramos isso no México, onde a cultura indígena manteve uma forte influência, especialmenteno trabalho de Luis Barragán, que foi influenciado pela paisagem natural e pela simplicidade da

arquitetura venacular mexicana muito ligada à terra. O contraste entre o amarelo, o vermelho, oazul, e as paredes rosas contra o céu azul e a interação com luxuosa paisagem de flores e árvorestraz um mundo mágico de luz aos olhos de qualquer um. Certa vez Barragán disse: nos jardins ecasas por mim desenhados, eu tenho sempre me empenhado em levar para o interior o plácidomurmúrio do silêncio, e nas minhas fontes o silêncio canta” e aqui a palavra silêncio não éacidental, mas sim um diálogo com a formulação de Silêncio e e Luz de Kahn.

“A habilidade de silenciosamente dar forças expressiva ao espaço pela incorporação dascores simples das flores... para a arquitetura pode ser feito apenas por um mágico. Silêncio, masrepleto de murmúrios: o corpo sucumbe a um poder superior acético. Este enfoque da luz écompletamente diferente do enfoque na região sul da Europa; é uma expressão mais direta da luz.Uma luz encorpada entre através de amplas janelas e ilumina de alto a baixo as paredes de seus

projetos residênciais. Na sua própria casa e atelier, a luz reage com as cores brilhantes das paredes edas escadarias. Na casa Gillardi, a luz se espalha através do espelho d’água interno e cria umavariedade infinita de tonalidades. Os espaços são dispostos com o prazer da luz na mente” (Miyake

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apud Futagawa, 1994, pp. 174-175).

“Barragán compõe seus espaços mediante uma luz natural extraordinária”, escreve oarquiteto mexicano Ignácio Dias Morales. “Usa a luz procedente de uma janela, ou uma porta, ou deuma abertura zenital pata sublinhar e valorizar a geometria de seus espaços.

Põe o acento luminoso onde e como é necessário. Trabalha com a luz da mesma formaque com a geometria de seus espaços. Estes vivem em cada momento do dia em uma vibraçãointensa e vital; é expressão da estética do ato humano perfeito. Outra característica da configuraçãodos espaços de Barragán é a sua dimensão. Alguns espaços pecam por ser um pouco grandes, masesta característica é própria da arquitetura colonial mexicana, cujos espaços eram muito generososem dimensão e muito recatados em iluminação. Na obra de Barragán esta atitude não é mimética,mas sim uma melhor tradução dos elementos constantes do estilo mexicano”.

“A mais sublinhada das características do espaço de Barragán éa sua proposta cromática.Existe uma perigossíssima tentação de interpretar isso como algo pictórico em vez de arquitetônico.Barragán utiliza a cor arquitetônicamente, na maior parte dos casos para sublinhar a expressão deseus espaços. Subordina a cor ao espaço, mas seu refinado sentido de geometria, luz, escala e cor

cria uma verdadeira poesia harmônica... se nos fixarmos nas características expressivas da obra deBarragán, -poderíamos assinalar a serenidade como a mais destacável: seus espaços irradiam paz”.(Morales apud Portugal, 1994, p. 14). Este método de pensar a luz foi herdado pelo discípulo deBarragán, Ricardo Legorreta.

6.4 A geração pós-kahniana

“Os arquitetos italianos do pós-guerra fizeram experimentos para se apossar da herançamística da luz. Entre os inumeráveis arquitetos está Paolo Portoghesi, que procurou reviver oenfoque barroco da luz, e Carlo Scarpa, que tenntou se aprofundar no lado místico da luz. Sua obraprima tardia em Treviso, o cemitério Brion-Veja, entra em um ‘outro’ mundo de arquitetura atravésda experiência espacial embuída no mistério”, comenta Miyake.

Porém faz algumas ressalvas a respeito da geração pós-Kahniana que começou a utilizaro vocabulário da Kahn: “permitindo-se até serem indiscretos e pedantes ao mesmo tempo quesolenes e fundamentais. O tema do silêncio e luz, que remete diretamente à questão da existência enão existência do homem foi gradualmente trocada por um tipo de maneirismo nos sofisticadosespaços da europa contemporânea”. Se Carlo Scarpa busca um certo resplendor através do uso dediferentes materiais, combinado a primitiva luz Kahniana com o mundo dos labirintos, já MárioBotta “segue persistentemente” as formas e idéias Kahnianas, especialmente a concentração de

aberturas que aplicou em uma série de casas; “é claro, existem arquitetos cujo trabalho tentaconfrontar o mundo real e presente. A arquitetura de Ricardo Boffil em Barcelona expressaintensivamente a substância da matéria e do espaço através da luz. Ele se preocupa em transportaros elementos naturais como terra, ar e luz para dentro de sua forma arquitetural em trabalhos comoWalden 7. E ainda, esforça-se em dominar a forma arquitetônica através de uma quase místicaalquimia entre matéria e luz, motivado por uma mais dissimulada saudade que as visões de LouisKahn” (Miyake apud Futagawa, 1994, p. 323).

‘Aldo Rossi, outro mestre da metafísica, procurou criar uma experiência transcendenteatravés da relação do homem com a arquitetura, transformando tal misticismo em uma matéria áridae inorgânica. O método analógico de Rossi é frequentemente associado com a experiência ememória pessoal. A prais portuguesa, a novela de Roussel, ou um acidente na estrada para Istambulserve como inspiração e é introduzida em seu desenho como um fragmento espacial. Seu espaçoarquitetural é sempre caracterizado pelo vazio e pela inquietação que deve ser entendida como umainteriorização. Escadarias e corrimãos aparentes e testura tosca de concreto são, no sentido da arte

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povera, materiais comuns que esculpem com severidade a superfície de sua arquitetura comproporções refinadas... representando sua estética da pobreza e a interpretação metafísica da luz nasociedade contemporânea” (Miyake apud Futagawa, 1994, p. 175).

6.5 Tadao Ando

Um dos arquitetos da geração pós kahniana que mais se destaca é Tadao Ando, quetrabalha com as formas puras contrapostas à luz. Projeta uma luz simples, como simples são suasformas arquitetônicas, sem compromissos com a tecnologia.

Kenneth Frampton (1985) comenta que em um mundo dominado pela mídia, Andovaloriza o “silêncio”, retomando assim o tema Kahniano. Para tanto, trabalha uma arquitetura demuros”, que estabelece uma “zona humana onde o indivíduo pode desenvolver-se em meio àestandartização da sociedade que o rodeia” (pg. 6), sendo assim sua arquitetura um veículo muitomais de fechamento que de abertura, para a “restauração da unidade entre casa e natureza,

qualidades que as casas japonesas perderam no processo de modernização... a imagem da escuridãoexistente em algumas zonas das casas tradicionais do Japão se superpõe na minha mente à idéia degerar um conhecimento de luz por meio da escuridão (Ando apud Frampton, 1985, pp. 6 e 136).Ando tem “preferência pela luz tênue, mas que, de repente, rompe a escuridão. Trata assim de criaruma sensação de expansão no interior de um domínio reduzido... segundo Ando, a arquitetura temque incorporar sempre um movimento dual que supõe uma adaptação de uma vida cotidiana e amanutenção de uma abertura para o simbólico. Sua obra tem-se estruturado, para este fim, medianteconceitos absolutos: o muro contra a coluna, quadrado contra circunferência, concreto contra vidro,escuridão contra a luz, materialidade contra imaterialidade. A característica substancial da mesmatermina na inteiração dessas quatro últimas oposições no sentido que a luz transforma o volume e amassa, induzindo alterações de acordo com as horas, convertendo o escuro em luminoso e a massa

pesada em superfícies cintilantes” (pp. 7-8).Comenta Ando: “Quanto mais sóbrio é o muro, ao ponto de ser frio, mais nos falará. Àsvezes é uma arma pujante que ameniza, outras vezes é um espalho sobre o qual se refletedebilmente a luz e a paisagem. A luz que se difunde pelos cantos vai se reunir com a escuridão gerale entra em contraste vigoroso com a luz direta. Com o transcorrer do tempo, essas duas luzes secombinam e enriquecem o espaço. O homem e a natureza se enncontram graças à arquitetura (p.24)... o significado do espaço pode mudar controlando simplesmente a quantidade de luz. Os ritmosbrotam da alternância de espaços com muita luz e com pouca luz... A luz pode ser utilizada comoum objeto, mas, sem dúvida, para a vida cotidiana requer-se uma luz em geral mais suave. O usoplástico da luz suscita um problema artístico, acompanhado se sua manipulação acertada parasimplificar as atividades do dia, fazer um entorno mais cômodo e proporcionar uma atmosfera grata.

A luz que penetra por uma janela baixa é suave e difusa; a luz que penetra por uma janela alta émuito bonita. Com a manipulação dessas duas classes de luz é possível enriquecer o espaço. Osarquitetos modernos se omitiram deste método porque se interessaram pelos problemaseconômicos, pela construção rápida e em grande escala. Não obstante, tampouco prestaram atençãoà maneira de criar um entorno agradável ao homem” (p. 132)... a luz nas minhas obras tem umpapel predominante no controle dos espaços”(Ando apud Frampton, 1985, p. 136).

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VII) O USO DA LUZ DEPOIS DOS MODERNOS

7.1 O exemplo de Alvaro Siza

 Depus a máscara e vi-me ao espelho.

Fernando Pessoa

“Nos museus a luz se faz doce, cuidados, de preferência, imutável. Não se deve ferir,não se deve ferir os cuidados de Vermeer, não se deve competir com a violenta luz de Goya, apenumbra não pode desfazer a atmosfera envolvente de Ticiano, ao ponto de extingui-la, ou a luzuniversal de Velazquez, ou a dissecada de Picasso, tudo isso escapa ao tempo e ao lugar no vôo daVitória de Samotrácia... entra na ponta dos pés, silêncio, o que iluminas resistiu a tua violência, ateus recursos de novidades monótonas e rápidas, e só resistir, só pretende resistir”.

“Assim é a Arquitetura dos Museus, idealmente sem paredes, sem portas, sem janelas,

sem todas essas defesas, por demais evidentes, pensadas e repetidas. Museus que recolhem o queesteve em palácios, ou igrejas, ou cabanas, ou sótãos, cobertos de glória ou de poeira, dobradosdebaixo do colchão, e agora silenciosamente observando, sob uma luz indiferente, ao restante quese move” (Siza, 1995, p. 66).

O texto acima revela um escritor com enorme sensibilidade para a percepção e descriçãoda luz. Maior é a surpresa ao se saber que não se trata de um escritor, mas sim de um arquiteto, maisespecificamente do português Álvaro Siza. Neste ponto do trabalho, pretende-se deter u pouco maisna análise do uso da luz por este arquiteto. Poderia então se pensar que Siza entra como mais umparadigma de concepção do uso da luz, assim como Wright, Gropius, Corbusier e Kahn e seremseus escritos e sua obra analisados sob esse prisma, assim como foi feito com os arquitetosanteriores.

Porém não é esse o caso. Siza não possui uma obra paradigmática, ou escritossistemáticos sobre arquitetura ou sobre o uso da luz na arquitetura. Aliás, analisando suas obras, écom certo grau de dificuldade que se nota uma unidade visual ou uma linguagem comum. Sizapossui uma característica muito diferente: ele retrabalha a obra dos mestres do modernismo e, comose quer demonstrar, reelabora a linguagem do uso da luz dos arquitetos até agora estudados nestetrabalho.

Influência

“Ainda que Siza utilize essas tipologias como base de partida”, escreve kennethFrampton, “não as deixa exercer sua influência além de um certo limite, e, paralelamente, evita todaa sensação de unidade ideal sempre e quando seja possível acomodar o programa de maneira”(Frampton apud Siza, 1993, p 17). Em outro texto escrito para o livro Profissão Poética, K.Frampthon destaca um dos aforismos mais reveladores de Siza: “os arquitetos não inventam nada,mas transformam a realidades”, e comenta: “para Siza, a noção de transformação em arquiteturaimplica um vasto e complexo campo de ação, cujo raio vai da modificação ditada pelascircunstâncias (e logo orgânica) dos modelos racionais esquemáticos recebidos em herança àssucessivas transformações físicas de um contexto concreto urbano ou rural, através de umaintervenção específica” Frampton apud Siza, 1990, p. 12), levando o crítico a observar influênciasde Wright e Aalto, “do primeiro sobretudo em muitas de suas obras”. Trata-se, no entanto, de

presenças filtradas de uma estratificação metafórica e de um gosto minimalista no pormenor,resultando virtualmente imperceptíveis na acepção mais literal” (Frampton apud Siza, 1990, p. 16).Outro estudioso como William Curtis reafirma isso, colocando a obra de Siza como uma resposta

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ao clima, à paisagem, à luz fria do Atlântico e à cultura da região e, ao mesmo tempo como umaprocura dos aspectos universais da arquitetura moderna, tendo como fontes a arquitetura holandesamoderna dos anos 20 e Alvar Aalto (pg. 19), Wright, Loos, Le Corbusier e Oud (Curtis apud Siza,1995, p. 21). Quanto a Aalto, diz Curtis: “parece importante ressaltar esta idéia de edifício como umcampo de espaços entrelaçados, onde distintas atividades humanas tem lugar, e onde os alrredores –

sejam rurais urbanos ou naturais – se intensificam. Esta é a base da lealdade de Siza à arquitetura deAalto” (Curtis em El Croquis, 1994, nº 68/69, p. 34), e completa: “desde o princípio, a arquiteturade Siza esteve comprometida com a situação concreta de Portugal, sua paisagem, sua luz e suacultura, mas também tem estado em contínuo diálogo com certas obras trancedentais de mestresmodernos como Le Corbusier, Wright, Loos e Oud – entre outros, com fases interiores da história”(p.36).

Note-se que curtis agora cita Corbusier, Oud e Loos. Frampton comenta: “Nos últimosanos da década de setenta, Loos começa a emergir como uma referência dominante na obra de Siza,informando não apenas o estoicismo subjacente à sua posição – a arquitetura de grau zero tãoevidente em toda a obra, mas também a imagem global das partes...” (Frampton apud Siza, 1990, p.12).

Assim, na arquitetura de Siza, o importante não é a marca de um estilo pessoal, - outalvez possa até se dizer que sua marca pessoal seja a transformação consciente, assim como otambém português Fernando Pessoa escrevia sob vários heterônimos, sendo chamado “um rosto devárias faces”, título que serve muito bem para Siza. Será o desaparecimento do autor na arquitetura?“Com a morte da autoridade e o eclipse do gênio, um futuro libertador mas incerto desponta nohorizonte: a perspectiva de uma poesia vital e ao mesmo tempo privada do fardo da originalidade osarquitetos não inventam nada, transformam a realidade”(Frampton apud Siza, 1990, p. 23). “Siza,agora cada vez menos isolado do ‘grande circo’ internacional e reconhecido como uma daspersonalidades periféricas (como o fora Aalto...)... como se procurasse contrapor a exigência austerae agressiva do neo à licenciosidade filosógica e desalmada do post... a prática de ‘citar’ queostensivamente vem fazendo de Loos a Taut ou agora com Corbusier nas entrelinhas, aos modernos

tardios dos anos 50 constitui um risco assumido e pertinaz, coomo se pretendesse com a memóriados pioneiros, salvar a moralidade do ato de projetar face a um panorama revisteiro da arquiteturaem estado de ‘derision’ cultural” (Nuno Portas apud Siza, 1990, p. 46-47).

Depoimento

Na entrevista “Fragmentos de uma experiência” conversa com Carlos Castanheira,Pedro de Llano, Francisco Rey e Santiago Seara, todas essas considerações de influênciaslevantadas por Frampton e Cutis são confirmadas por Siza que conta que nas primeiras Architecture

d’aujourd’hui folheadas enquanto estudante, viu obras de Gropius, obras da arquitetura brasileira eobras de Alvar Aalto... “Wright, Le Corbusier, Mies, Gropius... Quem menos me impressionou, aoque me lembro, porque era mais difícil para um jovem como eu, foi Mies van der Rohe. Realmentenão me dizia muito. Com Mies não bbastava ver as fotos. Uma fotos de Le Corbusier, de Wright oude Aalto entusiasmavam de imediato, mas com Mies van der Roche não acontecia o mesmo”.

“Le Corbusier era o mestre, a personalidade mais forte para a geração desses novosprofessores. Le Corbusier mantinha ainda sua enorme influência no CIAM, a variedade e alcance desua obra, sua universalidade... Le Corbusier no Brasil, Le Corbusier na Argélia... Era a figuradominadora e esse domínio foi inclusive reforçado quando chegou a Portugal a nova arquitetura deNiemeyer. Era o grande personagem para todos... Na escola (...) foi bastante influente WalterGropius. Recordo-me do ano em que todos tínhamos junto à prancheta a AA sobre Gropius... Aalto,

como dizia, impressionou-se muito e logo haveria de marcar bastante no início minha práticaprofissional, nos primeiros projetos desenvolvidos no clima da arquitetura vernacular portuguesa. Aprodução mais interessante de Portugal daquele momento, pouco numerosa, mas com coisas

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interessantes, estava marcada por sua relação com a arquitetura vernacular. Dentro dessa tendênciaestá, por exemplo, o restaurante Boa Nova, ainda mais marcado pelo descobrimento de um AlvarAalto com evidentes conotações de arquiteto procedebte de outro país dos limites da Europa quepela arqutetura vernacular (Siza, 1995, p. 29)... meu projeto para a piscina de água do mar em Leça

 já não tem nenhuma relação com... influência (da arquitetura vernacular portuguesa). Recordo que,

quando começava o projeto, comprei algumas publicações sobre a obra de Frank Lloyd Wright ecertos aspectos, certas partes de suas obras como a Casa do Deserto, exerceram uma influênciapositiva sobre meu trabalho. Na piscina está presene o poder de sua essencialidade geométrica,concretizando-se, inclusive, sua presença no ângulo de 45 graus de implantação, utilizados porWright em seu projeto. Lembro que então Wright foi para mim como uma via de liberação” (Siza,1995, p. 32).

Assim a hipótese levantada, que Siza retrabalha a obra dos mestres do modernismo ereelabora a linnguagem do uso da luz dos arquitetos até agora estudados neste trabalho, no tocante àprimeira colocação, foi demonstrada. Quanto à Segunda, será respondida pela própria obra de Siza.Porém o amor de Siza pelos seus mestres não está expresso apenas em suas obras. Siza gosta deocasionalmente escrever (“algumas vezes sinto a necessidade de escrever – escrevo” – Siza, 1995,

p. 57) e em alguns textos curtos homenageia seus mestres. Sobre Aalto: “...dominando modelosexperimentados – o modelo é universal – transforma-os, ao introduzi-los em realidades diferentes,deforma-os, cruza-os também, utiliza-os de forma surpreendente e luminosa: objetos estranhos quese cobrem de terra e mais tarde fazem raizes... Aalto, arquiteto finlandês, não teorizava, não falavade método: fazia, genialmente. (...) A segunda fase de influência de Aalto pode estar próxima”(Siza, 1995, pp. 60-1);

Sobre Wright: “Interessa-me o conceito de orgânico na arquitetura no sentido propostopor Frank Lloyd Wright: correlação entre todos os elementos da construção, de modo que o todo eas partes gerem-se, influenciando-se mutuamente. Sincretismo e não pressupostos formais. Numaépoca em que cada vez mais aqueles elementos são normalizados e prefabricados, a arquiteturaexige um distanciamento da descontinuidade do material, ou das transições suaves. A correlação

entre materiais e formas autônomas é sincopada e inclui rpturas, como sucede em (algumas)arquiteturas deconstrutivistas. A síntese entre expressionismo e racionalismo alimenta a reflexão e aprodução contemporâneas”(Siza 1995, pp. 60-1);

Le Corbusier: “persegue uma idéia em profundidade e em extensão; desenhos rigorosos,mas não totalmente detalhados, abertos ao conformismo ou a aventura, atravessados por dúvidas,intuições, influências... o que impressiona neste Corbusier e recorre ao final de toda a sua obra,escrita ou projetada, é a desconcertante degeneração do que tinha afirmado, uma espécie deinocência, uma imquietude que as capacidades de análise e de síntese e as convicções não destroem,uma certa insegurança, o desprezo da autosuficiência sob uma aparente arrogância”(Siza, 1995, p.63).

De Gropius, ficam as recordações de estudante; sobre Kahn, se não escreveu um textoespecífico, os seguintes trechos, onde fala sobre voltar-se para a história, sobre ordem, sobresilêncio, indicam uma forte ligação:

“Dizem-me de minhas obras, recentes e antigas: baseam-se na arquitetura tradicional daregião... a tradição é um desafio para a inovação. É feita de enxertos sucessivos. Sou conservador etradicionalista, isto é: movo-me entre conflitos, compromissos, mestoçagens, transformação...”(Siza, 1995, p. 62);

“Redescobrir a mágica estranheza, a singularidade das coisas evidentes” (p. 62);

“A clareza e a utilidade da arquitetura dependem do compromisso na complexidade dastransformações que cruzam o espaço; compromisso que não obstante só transforma a arquitetura

quando, através do desenho, alcança a estabilidade e uma espécie de silêncio, o território intemporale universal da ordem. Complexidade e ordem conferem aos materiais e aos volumes e aos espaçosvibração luminosa e disponibilidade permanente”(p. 73).

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A arquitetura da transformação

Estudadas as influências, como é o projetar de Siza? “...O problema que se seguia noencontro desamparado com uma folha de papel em branco. A partir de então, sempre tive o cuidado

de ‘ver o lugar’ e fazer um desenho antes de calcular os metros quadrados da área a serconstruída”(Siza, 1995, p. 57); como se pode caracterizar o Siza dessas palavras?

“A obra de Ávaro Siza não se encaixa nas categorias que se tem usado para descrever ahistória arquitetônica das últimas décadas. Nunca se alinhou com escolas ou movimentos, e temtido uma saudável despreocupação com as declarações teóricas e pelas polêmicas vazias” (Cutis emEl croquis, 1994, nº 68/69, p. 32); já Oriol Bohigas escreve: “a arquitetura de Siza, no seu períodode madurez e de criação mais personalizada, continua aceitando as leis linguísticas do racionalismo,mas articula-se e transfigura-se de uma forma crítica de acordo com um procedimento que seassemelha à grande transformação operada pelo Maneirismo: respeitoso com uma tradição próximae contudo operativa pelo seu eficaz sistema de códigos, mas, ao mesmo tempo, crítico e dissolventeno seu novo estilo, onde o collage, a surpresa e as alterações sintáticas passam a um plano

protagonista” (Bohigas apud Siza, 1990, p. 183).Poderia essa afirmação de Bohigas, que Siza continua aceitando “as leis linguísticas do

racionalismo” caracterizar Siza como um “moderno”? Ou a seguinte colocação de Frampton: “Sizamantém a si mesmo o compromisso de continuar o projeto moderno, entendido este em seu maisamplo sentido”? (Frampton apud Siza, 1993, p. 16). Responde Curtis: “existe um outro cenário emque Siza é apresentado como um herói do inacabado projeto moderno, mas esse papel tampouco lhecai bem, já que ignora sua consciente manipulação dos modelos históricos, seu ceticismofundamental e seu recorrente maneirismo em relação com a herança arquitetônica moderna” (Curtisen El croquis, 1994, nº 68/69, p. 32).

Talvez o próprio Siza elucide melhor esta polêmica quando se propõe a escrever sobre o

momento atual: “quase sempre distanciado desse copromisso e dessa autonomia, a produção atualtende a ocilar entre o hermetismo e o popular; entre o kitsch e a elegância; de uma forma ou deoutra, sugere a substituição do criticado continuum de ‘ismos’ por um ‘ismos’ único, tãodivertidamente indiferente... estão ultrapassados os códigos do modernismo? Ou nunca se definiramrealmente, a não ser em sínteses episódicas, excluindo o que perturbava a suposta universalidade”?

Até agora, este capítulo estudou a questão do retrabalhar da obra dos mestres domodernismo por Siza. Para mostrar que os mestres em questão são os abordados nesse trabalho,mostrou-se influências apontadas e confessas de Siza. Depois, discutiu-se onde os teóricos e críticosde arquitetura posicionam Siza na produção arquitetônica atual, tendo essa discussão a finalidade deverificar se a luz proposta pelos mestres do modernismo permanece inalterada ou então tambémsofreu uma releitura da concepção original.

Um autor que estuda em profundidade essa questão é Jacinto Rodrigues, que define Sizacomo “pós-moderno”: “Não vou aqui prosseguir uma análise detalhada às teses do chamado pós-modernismo na arquitetura. Quero apenas insistir nas diferenças profundas que existem nasarquiteturas pós-modernas. Vejam-se diferenças entre o chamado ‘Higt Tech’ (Rogers, Piano e Pei)e o classicismo (Krier e Boffil). E ainda as abissais divergências entre estas anteriores vertentes comas preocupações ecológicas... (Rodrigues, 1992, p. 13). “É neste ponto de vista crítico, na novaemergência paradigmática (o pós-modernismo – N. A.), que se pode situar o discurso arquitetônicode Álvaro Siza. Uma racionalidade que incorpora os valores poéticos e sensíveis da realidade. Umabusca processual e contínua onde a morfologia complexa da informação, do desenho e do lugar é ametamorfose entre o real concreto e o desejo da criação. Uma articulação enntre o social, o técnicoe o expressivo.

Pode-se dizer que a arquitetura de Siza resulta do impulso da natureza concreta, doimpulso da forma e do impulso criativo, que se expressa como um jogo entre a informação e o real,o desejo e a idéia. Afinal, a síntese do lugar, do desenho e do tema. Como em Schiller, é o Spiel

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trieb, o impulso lúdico, o dominante na metodologia de Álvaro Siza. É nesse sentido queconsideramos Álvaro Siza no contexto do debate internacional da arquitetura um pós-moderno deresistência. Porque é um moderno que toma consciência de si mesmo e é capaz de se transformarpela racionanalidade. Siza integra à razão uma dimensão sensível e intuitiva” (Rodrigues, 1992, p.16). Porém “a racionalidade em Álvaro Siza não se restringe ao racionalismo. A racionalidade Siza

Vieira prolonga a tentativa de Geothe em apreender os princípios geradores de metamorfose. É umolhar de vida sobre a realidade viva: o desenho ganha consciência desenhando”(Rodrigues, 1992, p.22), chegando a afirmar “não inventamos nada, transformamos apenas” (Siza apud Rodrigues, p.23).

A luz metamorfoseada

Siza posui a sensibilidade necessária para pensar em projetar a luz; mas projeta em basea um repertório confesso; esse repertório gera informação arquitetônica, que, num impulso lúdico,exprime-se no desenho e esse desenho transforma essa informação. Se o paradigma arquitetônicodos mestres escolhidos de Siza é transformado, por consequência também seu tratamento de luz. Oresultado é a luz dos modernos metamorfoseada.

“Em Álvaro Siza, a expressão arquitetônica não é um ‘estilo’ que resulta numa moda. Éum processo sempre em constante procura. ‘Errância sem fim’. Este processo procedeucronológicamente a denominada arquitetura pós-moderna” (Rodrigues, 1992, p. 16).

Curtis assim comenta o resultado desse processo: “O melhor dos edifícios de Siza, narealidade, não são edifícios, mas campos de espaço e luz que foram inseridos na topografia... aquise entende arquitetura como um meio para ressaltar a ação humana e para intensificar a experiênciacotidiana, assim como para ativar as linhas ocultas de energia na cidade ou na paisagem. Osedifícios se transformam em promenades de acontecimentos nos que se vinculam vistas e interiores.

Planos dinâmicos e linhas convergentes traçam a figuram. Uma planta de Siza significa muito maisque uma descrição de usos; é uma espécie de partitura de música onde se desenvolvem os temas aolongo do tempo” (Curtis apud Siza, 1995, p. 20).

“Se pudesse reduzir um edifício de Siza a sua imagem essencial, poderia-se descobriruma rede de vetores no espaço cujo traçado delineia superfícies de luzes e sombras variáveis, emsintonia com os ritmos de um terreno particular... nelas se explora a experiência do movimentomediante distintas camadas de opacidade e transparência. As perspectivas e as vistas demarcadasno interior são orquestradas para guiar o visitante. A intensidade da luz e a sensação de vizinhançasão controladas mediante a cuidadosa colocação de janelas e zenitais... no meomento de se entrarem um edifício de Siza, capta-se a anatomia da circulação interna, que com frequência reitera ocaráter do acesso exterior. O corte revela vários níveis, escadas, descansos ou passarelas, com aajuda de tetos e paredes moduladas.

As variações de luz e sombra e as cpmpressões e expansões do volume realçam estasensação de dinâmica interna e externa... superfícies pintadas de branco, revestimento de mármore etransparências de vidro oferecem presença material aos gestos abtratos” (Curtis em El Croquis,1994, nº 68/69, pp. 33-5). E conclui: “os edifícios de Siza, em sua melhor expressão, são comocampos de força e energia ativados pela luz. Utiliza com frequência as paredes de tal maneira que seentrecortam num labirinto através do qual se abre um percurso iluminado. A sensação que se tem éa de atravessar capas reais ou implícitas, como se as máscaras públicas fossem tiradas para revelar ocoração do projeto, as vezes apenas um vazio luminoso” (p. 40).

Percebe-se a importância que a relação interior/exterior assume na obra de Siza. Na

citada entrevista “Fragmentos de uma experiência”, Siza verbaliza essa questão: “acredito queexistem mil possibilidades nesse campo e que é um dos principais ingredientes de toda aarquitetura. A relação entre interior e exterior. Em alguns momentos, uma determinada visão dessa

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relação foi privilegiada ou foi considerada como progresista por seus aspectos simbólicos, deprogresso social, etc. Nos anos 30 era tão evidente e tão programática a crença nas necessidades deuma total continuidade nessa relação que, em muitos casos, os vidros iam de cima a baixo, fazendotodo fechamento”.

“ Para Mies van der Rohe as divisões da caixilharia desprezíveis por serem pequenas. As

 janelas não tinham nenhuma peça em ângulo. É curioso que isso acontecia num momento em quepraticamente tinha-se instituído, formalizado um corte, uma ruptura com a história. Sabemos quenão havia hisstória na Bauhaus, que no ensino da Bauhaus a arquitetura moderna era concebidacomo uma ruptura total, criadora e seguidora de uma nova organização social e também sabemosque o interesse pela história, que está de volta influi decisivamente na nova arquitetura, no trabalhoteórico, etc. Hoje sabemos que podemo fazer um grande vidro que enquadre toda a cidade,tecnicamente podemos fazer, é possível, e que isso pode ser impotantíssimo no conjunto de umanova proposta arquitetônica, como sabemos que podemos fazer uma pequeníssima janela enfocandouma paisagem especial, que podemos Ter uma luz doce, neutra, como a luz do norte... e quepodemos mesclar isso tudo, que podemos utilizar tudo isso de uma forma, por que não dizer,racional. Mas racional entendido não como limitado, mas como dominado, controlado. É isso o que

caracteriza, acredito, o aspecto mais positivo do momento da arquitetura. Exatamente essaampliação de coisas controláveis, utilizáveis de uma forma racional, comunicável em termos depoder ser materializada, implica, ao meu juízo, a um avanço para uma teoria que inclui tudo, atécnica, a sensibilidade à paisagem, o conforto, etc. Tudo o que podermos imaginar” (Siza, 1995, p.40).

Em seguida, perguntado sobre ouso da luz: “na história da arquitetura a luzaparece como um aspecto de fundamentalimportância. No Panteão... através da cúpula,pelo óculo entra uma luz que parece estarescupindo o espaço...”

Na tua arquitetura, o tema da luzparece se mover dentro dessa tradição. A luzsucita uma apreensão particular do espaço e,unida a textura e às cores, adquire essacapacidade de emoção que definitivamentefaz a arquitetura atraente. Se tomarmos comomostra um de teus primeiros projetos, apiscina para Leça de Palmeira poderíamosfalar de uma arquitetura comprendida comoum fragmentário jogo de volumes ativadospor essa luz. Poucos espaços arquitetônicospodem chegar a impressionar como essapiscina que, com a força de uma escultura,converte-se em um limite entre a magníficapaisagem e a cidade. Aqui, no Centro de ArteComtemporânea, a luz, seja zenital ouhorizontal, tem uma presença muitosingular...”

Responde Siza: “acho que Louis Kahn disse que só existia arquitetura onde havia luz,porque a simples percepção depende da luz. A luz está associada a outros temas: a relação entre

interior e exterior, a sintonia com o tempo, a mudança de orientação, com não sei quais mecanismospsicológicos, que, desde que você nasce, por uma continuidade de percepção que não sabereiexplicar, estão profundamente ligados a teus ritmos, teu estado de espírito, de atuação, de ação,

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etc... Se falamos da luz das igrejas, tenho a sensação e acredito que todos a temos, de que hojeperdemos aquela sabedoria, fazendo sentir a frustração de que estamos nos aleijando, nesse caso, daverdade da arquitetura”.

“Existem estudos fantásticos sobre as catedrais góticas, onde se explica como suageometria estava relacionada em um plano físico e também em um plano simbólico com o percurso

do sol, com a situação de onde se projeta a luz em um determinado dia e todas essa coisas que devoreconhecer que nunca estudei, essas coisas que leio em revistas, a respeito de livros e meimpressionam profundamente. Sempre me dão a impressão de incapacidade de entender, deconhecer determinados temas e me fazem acreditar que, com respeito à arquitetura contemporânea,algo faz falta. Isso se relaciona com um reconhecimento profundo das coisas, é tudo um poucomáscara e nos deveria fazer pensar em como é cpmplexo hoje um edifício. Toda a cargatecnólogica, todod os problemas de energia, como tudo é afrontado... toda essa complicação, quefaz que um projeto, uma construção, torne-se cada dia mais complexo”.

“Sempre me resta a impressão que algo não vai bem e que temos uma ignorânciafundamental que nos connduz cada vez mais para uma complexidade tecnológica que cria outrosproblemas e uma espécie de distância de algo que esquecemos faz muito ou pelo menos alguns denós esquecemos”.

“Uma coisa que muito me impressiona na arquitetura é o esbanjamento, tambémexistente no tema da luz. Uma coisa que me fascina é ver como uma pequena entrada de luz podeser multiplicada não sei quantas vezes. Agrada-me exercitar isso, - como por exemplo, aqui, noCGAC-, a luz do lucernário ilumina o átrium, o corredor e as escadas. Há um outro lucerário naFaculdade de Arquitetura do Porto que ilumina quatro espaços incluindo um através de umachaminé. Esse realmente tem a ver com o despedício generalizado que se faz muitas vezes naconstrução a respeito à energia. Lembro que aqui, no CGAC como tivemos de lutar para reduzir antensidade energética, que se reduziu à metade, talvez menos que a potência de iluminação inicial.Era não sei quantas vezes maior e foi reduzida utilizando a luz natural e a arquitetura propriamente

dita... não só a lâmpada que gera a luz, mas os reflexos, as cores”.“Esse aspecto parcial, o da luz, é também importante porque obriga a desencadear as

relações entre os distintos elementos da arquitetura. A luz está relacionada com a cor, a rextura...”(Siza, 1995, p. 42 e seguintes).

Projetar levando em consideração a luz, por consequência a sombra, a cor e a textura é,acima de tudo, um grande exercício de abstração intelectual, pois sempre se deve Ter em mente aquestão da invisibilidade da luz, o que significa, em termos práticos, que a luz não pode serrepresentada em desenho. Siza, ainda na citada entrevista, relata que trabalha com maquete, quepermite “verificar em escala reduzida problemas de espaço que tem relação com a complexidade dealguns aspectos como a luz...” (Siza, 1995, p. 48). A seguir serão analisados algumas obras deÁlvaro Siza, onde as questões acima colocadas tentarão ser detectadas.

Primeiras Obras

Em suas quatro casas em Matosinho, de 1954-57, o desenho das janelas ainda éinfluência pelo vernacular português, mas elas possuem “uma ritmação que dearticula asaxialidades, para revelar uma expressão mais orgânica” (Rodrigues, 1992, p. 50). Essa organicidadetambém está presente na Casa de Chá Restaurante da Boa Nova, onde telhados com grandes beiraispairam sobre paredes brancas que refletem a luz do mar. No corte pode se perceber a marcanteinfluência de Wright, com as janelas encostando nos forros, sombreadas por grandes beirais.

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Na citada entrevista comentou-se a piscina para Leça de Palmeira: “poderíamos falar deuma arquitetura compreendida como um fragmentário jogo de volumes ativados por essa luz.Poucos espaços arquitetônicos podem chegar a impressionar como essa piscima que, com a força deuma escultura, converte-se em um limite entre a magnífica paisagem e a cidade”. Assim Curtisdescreve o projeto: “as construções principais da Piscina de Leça de Palmeira estão dispostas em

bloocos paralelos abaixo do nível da rua e são pouco visíveis de cima. Mas as linhas cobertas e ospontiagudos blocos de concreto cortados por sombras formam um fundo para a visão, que se tem,por cima das rochas, das piscinas, colocadas estas dentro das pedras com geometrias curvas einflexionadas” (Curtis em El Croquis, 1994, nº 68/69, p. 42). Observando-se a plannta,imediatamente vem a mente o desenho de Taliesin West de Wright: um grande eixo cortado poruma violenta diagonal, portanto uma influência confessa, assim comentada por Curtis: ...(emTaliesin onde umas galerias paralelas e uns caminhos transversais também precedem uma expansãodiagoal através da água”.

Na piscina de Leça desce-se por uma rampa, atravessa-se uma séri de passarelas nasombra, e chega-se a diagonal que leva às piscinas. “Todos os materiais são extremamente sensíveisà luz, e poços e fendas formam zonas de sombras profundas. As próprias piscinas se transformamem superfícies refletantes... essas superfícies e os contornos curvos que as delimitam produzem oefeito de cercar o horizonte e ampliar a visão do oceano... os muros e as lajes flutuantes sãodestaques luminosos que impulsionam gradualmente o corpo humano da terra para o mar” (Curtisem El Croquis, 1994, nº 68/69, p. 43).

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No Banco Pinto & Sotto Maior Siza Trabalha com linhas reguladoras, uma clara

influência de Le Corbusier. Antecedente desse é projeto de Edifício de Escritórios no Porto, assimcomentado por Vittório Gregotti: “... propõe por fim através de sutis inclinações da grande paredeennvidraçada um grande écram (tela0 que refletcte sequência dos edifícios históricos muitofraccionados que fazem frente à nova construção”.

“O tema da reflexão em arquitetura tem ilustres precedentes; mas, diferentemente dosque utilizaram este instrumento para anular interiormente a natureza do objeto construído, ou, comono caso de van der Rohe, a reflexão se torna um jogo totalmente dentro do edifício, atuando entrevárias partes da mesma arquitetura, no caso do edifício de Siza o problema é meter à obra umaestratégia que permita ao local, como preexistência geografia e histórica, torna-se matériaprotagonista do projeto” (Gregotti apud Siza, p. 187).

Enquando os projetos anteriores situavam-se foram do contexto urbano, o edifício deescritórios e o banco são de caráter urbano. Internacionalmente ou não, essa mudança leva a umatroca de paredigma. Não mais Wright, mas Rohe e Corbusier, e pricipalmente esse ultimo noprojeto do banco. Superfícies brancas se confrontam com panos de vidro, desaparecendo o conceitotradicional de janela, uma hábil releitura do purismo corbusiano.

Casa Beires

Na Casa beires de 1975, um grande volume circular caracterizar o conjunto, uma sutilreferência à Vila Schwob, de Corbusier, mas enquanto nessa as jannelas ainda são tradicionais, naCasa Beires Siza corta o volumes com uma janela horizontal corrida, juntando assim doismomentos do mesmo Corbusier.

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“Os muros do jardim transmitem a sensação de um recinto voltado para o interior. O jardim está delimitado por uma fachada primativa côncavo, tratada como uma parede múltipla devidro, de modo que os espaços situados próximos a essa borda curva concentram-se na ‘sala’exterior do jardim (Curtis em EL Croquis, 1994, n. 68/69, p. 40). Essa parede angulada de vidropode ser considerada uma releitura dos panos de vidro de gropius e Corbusier através de uma ópticavernacular, onde se destaca o uso da janela guilhotina.

A casa Beires é considerada por Kenneth Frampton o “resultado mais lúcido e fecundona obra até agora produzida por Siza:... este excesso funcional ou mecânico é evidente na

enngenhosa combinação da caixilharia de abrir ou guilhotina – respectivamente na armação embaixo e nas duas de cima. Uma penetração que permite a total abertura do envidraçamento em todosos locais principais e estende igualmente ao interior esta retóorica de abertura, donde, ao longo doperímetro mais estreito, prolifera uma variedade de divisões ligeiras de correr e de portasdobradiças... a fachada adquire além disso a profundidade posterior por uma série de soluções quevão do parapeito de sacada à buganvília que cresce agora como uma cortina verde através da frenteda própria sacada, às persianas de manivela que protegem do sol, filtranndo a luz” (Frampton apudSiza, 1990, p. 16).

Zenitais

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No projeto da Fábrica Dom, em Colônia, na Alemanha, o paradigma volta a sernovamente Wright. Retrabalhando o corte do Museu Guggenheim, aliado à concepção do edifícioLarkin, de caráter introspectivo, Siza cria um zigurath innvertido; “este tronco inclinnado, comoocorrera com a forma e lugar introspectivos de Wright, permitiu que Siza introduzisse numapaisagem anódina um hiato, criticando, com a proposta do espaço interno, a jaula weberiana do

edifício de escritórios neo-miesiano. Os espaços de escritórios, em forma de fragmentosconcêntricos, dispostos escalonadamente e interligados por uma rampa contínua acessível aopúblico, que se desenvolve helicoidinalmente em torno de um vão cônico, iluminado por umaabertura zenital, constituem a organização que permitiu a Siza oferecer uma experiência modulada,sintética e democraticamente aberta que é difícil encontrar em edifícios de tamanho e usosemelhante” (Frampton apud siza II, 1993, p. 17).

A questão da zenital é retomada no projeto do Centro Galego de Arte Comtempânea,

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onde na sala de exposições cria uma “mesa de luz” literal, afastando uma laje pelas quatroextremidades do forro e transformando-a em um grande rebatedor de luz: a luz penetra através deuma clarabóia existente sobre a mesa, chega até o tampo superior da mesa e é refletida, difundindo-se por todo o ambiente.

Fau Porto

No conjunto de edifícios da Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto, Sizatalvez reúna seus paradigmas favoritos e, por conseguinte, seus paradigmas de iluminação que operseguiram por toda a sua obra. Ao se olhar pela primeira vez os edifícios brancos, é Le Corbusierque vem a mente; e lá estão suas janelas corridas horizontais. Um dos edifícios recebe shads nacobertura, dialogando com a Casa do Pinntor Ozentant. Várias janelas são sombreadas por lajessaindo rente de sua parte superior: a presença de Wright. As diagonais do edifício “G” dialogamcom as diagonais do Instituto Salk de Kahn. Os prédios enfileirados dialogam com a visãourbanística de Gropius e os volumes com o projeto de casas para professores da Bauhaus emDessau; e a zenital da biblioteca, um prisma que penetra o pé direito duplo do espaço central, é umaclara homenagem a Aalto, afinal um arquiteto, como já observado, a quem Siza sempre se manteveleal.

Assim JoaquimRodrigues comenta o conjunto doPorto: “...uma poética feita depragmatismo. Oantropomorfismo marcante dosedifícios parece querer dar vidaao processo de pedagogiaempenhada na criatividade”(Rodrigues, 1992, p. 186),criatividade esta claramentemarcada pelo método de projetarde Ávaro Siza.

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VIII) ALGUMAS CONCLUSÕES SOBRE A LUZ DOS MODERNOS 

Como provar melhor que a cotemplação do fogo nos conduz

às próprias origens do pensamento filosófico?

Gaston Bachelard

Quais são as conclusões às quais se chega após o estudo do pensamento sobre o uso daluz em Wright, Gropius, Corbusier e Kahn?

Rasmussen (1986) expõe algumas:

“Seria bom explicar o que entendo por ‘luz excelente’. Isso é necessário porque para amaioria das pessoas uma boa luz significa apenas muita luz. E, com muita frequência, verificamosque tal noção é inconsequente, já que a quantidade de luz está longe de ser tão importante quanto asua qualidade” (p. 182).

“No início, o funcionalismo era mais uma questão de slogans do que de soluções

definitivas para o problema de design e estrutura. Muitas palavras como livre, aberto, luz, eram atônica do novo estilo. Muita vezes, porém, o que se procurava era mais a quantidade do que aqualidade da luz” (p. 199).

“Um dos problemas com que os arquitetos modernos frequentemente se defrontamconsiste em obter luz boa e uniforme para muitas partes diferentes de um vasto recinto. O uso declarabóias não é tão eficaz porque a luz vinda dela é difusa demais para produzir as sombrasnecessárias que permitem ver clara e facilmente forma e textura. Tampouco a luz lateral ésatisfatória embora muito melhor porque não penetra com profundidade suficiente. A solução foiencontrada no telhado em forma de dentes de serra, isto é, uma série de elevadas lanternins queproduzem uma exelente luz em todas as partes do recinto”(p. 200).

Assim, segundo Rasmussen, as características principais dos modernos seriam avalorização da quantidade como a grande qualidade e a procura de uma luz uniforme, encontradaem soluções zenitais. Essas características podem ser de uma parte do modernismo pois sãoconfirmadas pelo pensamento de Gropius “um máximo de luz, sol, ar para todas as habitações” epelas propostas do jovem Corbusier, cuja arquitetura era voltada “...para o novo homem, ávido deluz, de sol, de ar, puro”. Porém essas características não encontram eco no pensamento de Wright,com sua “luz suave e difusa que o habitante agradece”, nem na de Kahn, cuja preocupação maiornão é a quantidade ou a uniformidade, mas sim o encontro da luz adequada para cada espaço: “oprojeto deve ser lido como uma harmonia de espaços em luz”.

Outro autor já citado neste trabalho, Kalff, também apresenta algumas conclusões. Suatese principal é que, “com a ajuda da luz, um instrumento dos mais poderosos, é possível dar vida

aos espaços interiores... algumas vezes um belo projeto é o resultado lógico da construção ou o usoapropriado do material de construção; em outros tempos, construções ilógicas e artificiais tem sidoprojetadas para se obter bons efeitos de luz... na arquitetura moderna, com seus novos métodosconstrutivos, menos individualizada e caracterizada pelo uso, é mais difícil usar a luz natural comoparte da concepção”(Kalff, 1971, p. 51).

Essa tese é bastante curiosa, uma vez que vai contra todo o material levantado até aquipor este trabalho. É impossível dizer que a luz não foi parte integrante da concepção das casaswrightianas, das transparências gropiusianas, do purismo corbusiano ou das formulações kahnianasa respeito de silêncio e luz.

Continuando seu raciocínio, Kalff chega a formular conclusões mais específicas: “na

arquitetura moderna o uso da luz está muito mais restrito a criar boas condições de trabalho; issosignifica que a atenção volta-se do edifício ou da arquitetura de interiores para a quantidade de luzrequerida para a execução da tarefa. O edifício agora a ser planejado é o edifício onde pessoas

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trabalham. Elas sempre desejam contacto visual com o exterioor, assim as janelas devem serlocadas e dimensionadas para que essa comunicação se torne possível” (Kalff, 1971, p. 52).

“As diferenças entre passado e presente podem ser assim enumeradas:

1.  Nas cidades, a carência de espaços faz os arquitetos aceitam situações que seriam certamente

rejeitadas se tivessem mais espaços ou liberdade;2.  A carência de espaço gera também a tendência de edifícios mais altos, e isso de novo temgrande influência na quantidade e na direção da luz penetrando através das janelas e nosedifícios;

3.  Para edifícios altos, especialmente aqueles com cortinas de vidro, a elevação deve ser a maischapada possível para facilitar a limpeza do vidro. Proteção contra a luz do sol, como porexemplo através de cortinas venezianas, deve ser instalada no interior, uma vez quesombreadores no exterior são caros e não práticos;

4.  Frequentemente, todas as quatro elevações do edifício recebem tratamento uniforme,desconsiderando a orientação solar;

5. 

As janelas são simples em forma, a dimensão é geralmente decorrência da modulação dividir ourearranjar o inteior da edificação;

6.  Na construção do edifício moderno, as paredes raramente suportam o peso do edifício: são levese finas. Isso significa que não existem umbrais nas janelas, a luz entra com um contraste muitoforte entre o vidro e a caixilharia;

7.  É obvio que, para esses edifícios, o sol representa dificuldade. Todo trabalho sob a luz direta dosol se torna impossível. Na América do Norte, onde o clima apresenta extremos maiores que naEuropa, tornou-se prática fechar as janelas com painéis cegos de até 5 pés do piso, apenasdeixando uma fina faixa de vidro, que possibilita o contacto com o mundo exterior; aqui, éclaro, um alto n’vel de iluminação artificial se faz essencial;

8. 

Os altos níveis de luz artificial geram uma considerável carga de calor, que se adiciona ao calorexterior de verão, tornando obrigatorimante o uso do ar-condicionado em larga escala” (Kalff,1971, p.53)

Essas considerações de Kalff são sem dúvida pertinentes, não paro o pensamento detodo o Movimento Moderno a respeito de iluminação, mas para parte dele. Criar caixas de vidro,indiscriminadamente, sem levar em consideração o contexto é uma postura arquitetônica bastantefreqüente, mas não caracteriza todo o movimento. Afinal, como diz Wright: “...casas humanas nãodevem ser como caixas ardendo ao sol”.

Kalff completa seu raciocínio: “como resultado dessas considerações fica claro que ouso da luz do dia na arquitetura moderna não é mais ditada por circunstâcias climáticas. O tamanhodas janelas e o uso da luz artificial pesam na concepção do edifício. Isso significa que os arquitetosmodernos têm poucas possibilidades de aplicar a luz diurna para obter efeitos arquitetônicos eestéticos, comparando-se com seus predecessores, que podiam usar materiais e métodos tradicionaisde construção.”

Não se quer aqui discutir a questão da contextualização, pois ela deveria ocorrerisoladamente sobre cada edificação, e não de uma maneira geral, como é o caso desse trabalho.Quanto ao restante das colocações realmente o tamanho das janelas influi na concepção daedificação, porém foi uma escolha funcional e estética consciente (Gropius: “...aumentem as

 janelas, dimunuam os quartos.”), porém isso não significa que os arquitetos modernos tenham

poucas possibilidades de aplicar a luz diurna, pois efeitos luminosos não ocorrem apenas poraberturas diminutas; podem acontecer através de qualquer aberturza, não estando ligados amateriais e métodos tradicionais de construção.

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Algumas Conclusões

Conclusões mais sólidas que as de Kalff podem ser enumeradas, ao se procurar aspectoscomuns nas obras de Wright, Gropius, Corbusier e Kahn. Este trabalho levanta sete aspectos

básicos como ponto de partida para se chegar a essas conclusões. Assim, ao se analisar a obra decada arquiteto, serão procuradas respostas a esses aspectos.

São eles: a) qual a idéias geradora da concepção; b) como é definida a abertura que faz acomunicação interior com exterior; c) quais são as palavras do arquiteto que melhor definem essesconceitos; d) quais são as características arquitetônicas que determinam a qualidade e acaracterística de luz; e) qual é a qualidade básica da luz que penetra no interior, isto é, se ela é igualà do exterior ou de é filtrada, se é direta, gerando sombras fortes, ou se é difusa, ocasionandosombras suaves f) qual é a característica do espaço iluminado, se está em plena claridade, se está empenumbra, se ocorre um jogo de luz e sombra; e, finalmente, g) qual a simbologia desejada ouresultante.

Em Wright, na base de sua concepção de luz está a analogia com a natureza, a metáforada árvore, isto é, obter-se uma sombra tão agradável quanto se tem sob uma árvore, a idéia dadestruição da caixa com furos, a harmonia da natureza externa com a da natureza interna (aliás,significativamente, Wright usa letras maiúsculas para grafar “natureza”, interna e externa). Eiscomo o próprio Wright define sua luz: “...sensação de abrigo, luz suave sombra, características daarquitetura orgânica”, e “uma luz suave e difusa que o habitante agradece”.

A luz penetra por janelas corridas, abrigadas sob generosos beirais em balanço, estandoa janela alinhada com o forro. A luz wrightiana tem como qualidades ser filtrada, isto é, não é iguala do exterior, mas modificada por filtros, e ser difusa, não gerando sombras fortes. Seu interior podeser definido como uma claridade em penumbra, com jogos de claro-escuro buscando efeitosdramáticos, ocasionais. A metáfora da árvore remete a uma forte simbologia com a natureza, que

por sua vez é definida por Wright como o vislumbre bíblico da criação.Em Gropius, a concepção de luz é embasada em aspectos higienicistas e empreocupações sociais. Quer a abolição da janela enquanto buraco, abrindo o espaço para luz, aomesmo tempo que busca realizar uma estética da transparência, ou em suas palavras: “um mínimoelementar de espaço, ar, calor, que o homem precisa para não sofrer”, “aumentam as janelas,diminuam os quartos” e “um máximo de luz, sol, ar para todas as habitações”. Através de umaarquitetura de janelas de canto, de paredes envidraçadas, onde se percebe a separação entre estruturae vedação, a luz penetra no interior de Gropius através de panos de vidro, iluminando o ambientecom uma luz natural, sem filtros ou amortecedores, gerando sombras fortes, mas colocando oespaço em plena claridade, uma claridade branca. Esta cor branca da luz simboliza por um lado seupensamento higienicista, por outro remete à questão do iluminismo.

Em Corbusier, é possível detectar dois momentos principais. O jovem Corbusier,anterior à Segunda guerra munndial, trabalha com concepções puristas, pretende uma tábula rasaarquitetônica, descarta a janela tradicional: “...para o novo homem, àvido de luz, de sol, de ar puro”,propõe espaços luminosos, pois a “arquitetura é o jogo sábio, correto e magnífico dos volumesreunidos sob a luz”, porque “nossos olhos são feitos para ver as formas sob a luz”. Nas fachadaslivres, penetrando por panos de vidro, janelas corridas horizontais ou brise soleil, a luz atinge ointerior com as mesmas qualidades que possuia no exterior, sendo eventualmente quebrada, quandoo contexto assim o exige. Essa luz direta que gera fortes sombras, pois afinal “os lementosarquitetônicos são a luz e a sombra, a parede e o espaço”, é uma luz branca, cor essa ligada aopurismo, ao iluminismo, bastante próxima ao pensamento de Gropius. Já o velho Corbusier,posterior à segunda guerra mundial, trabalha com o brutalismo, com contrastes: “...decidi fazer a

beleza pelo contraste. Achei os complementares e estabelecerei um jogo entre o bruto e o acabado,entre o opaco e o intenso, entre a precisão e o acidental”. A fachada continua livre, mas o tamanhoda abertura varia conforme necessidades e intenções plásticas; essas intenções impõem ora uma luz

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direta, ora filtrada ou indireta, criando um jogo de luz e sombra, atingindo o contraste desejado:“farei as pessoas pensarem e refletirem, esta é a razão da violenta, clamorosa triunfante policromiada fachadas”.

Já em Kahn, a luz é concebida levando-se em consideração aspectos mensuráveis, comoa questão higiênica e aspectos não mensuráveis, a poética do espaço e da luz. A escolha da estrutura

de sustentação, entendida essa no seu significado amplo e não apenas físico, deve direcionar aescolha da luz que dará forma a esse espaço (“estrutura, acredito, é o formador da luz”). Cheios evazios, seja de que tamanho forem, são os locais onde a luz está ou não presente. No cheio não setem luz: no vazio sim. Diz Kahn: “um espaço nunca encontrará seu lugar na arquitetura sem luznatural”, “a luz natural revela o espaço pelas nuances de luz nos vários períodos do dia, das estaçõesdo ano, penetrando e modificando o espaço”, “o projeto do edifício deve ser lido como umaharmonia de espaços em luz”. Negava uma tipologia, isto é, não condicionava a concepçãoarquitetônica a panos de vidro, janelas corridas, mas sim sempre idealizanndo controladores de luz,filtros, que se transformam em elementos fundamentais da composição arquitetônica. No interior, aluz kahniana já é uma luz filtrada, que procura valorizar o espectro mutante da luz do dia, e quegera sombras, um complemento natural e necessário da luz. Essa dualidade de luz/sombra, que está

no princípio do pensamento de Kahn sobre Silêncio e Luz, reflete a procura da ordem primitiva danatureza, estando na base dessa ordem a qualidade espiritual da luz, que simboliza o momento dacriação.

Cada arquiteto representa uma vertente do uso da luz no modernismo. Como vertente,cada um tem suas características específicas. O seguinte quadro procura resumir as mesmas:

Arquiteto Concepção Carater.Arquitetura

Aberturas Qualidadedaluz

Carater.

da luz

Simbologia

Wright Analogia com

a natureza

Grande beiral Janela

horizontal

Filtrada

difusa

Claridade e

penumbra

Natureza

GropiusHigiene

preoc. Social Transparência Pano de vidro DiretaPlena

claridade Iluminismo

Corbusier

1Purismo Fachada livre

 janela corrida

Janelahorizontal

pano de vidroLuz direta Plena

claridade Iluminismo

Corbusier

2Brutalismo Jogo de

contrastesJogo deaberturas

Contrastes Luz e sombra Reflexão

KahnCheios,

vazios espaço

e luz

Filtros Negação datipologia

Filtrada Luz e sombra Silêncio e luz,criação

O ponto de partida comum de Wright, Gropius e do jovem Corbusier é a negação da janela tradicional, da “caixa com buracos”, depois, a luz de cada um parte para sua especificidade.Já o velho Corbusier e principalmente Kahn trabalham a luz em si sem se preocupar se a aberturapela qual penetra é um pouco ou não; filtrada ou contrastada, a luz se impõe como elementofundamental de concepção do espaço, trabalhando em conjunto com a sombra, seu irmãocomplementar. As observações de Paolo Portoghesi sobre o barroco, poderiam ser aplicadas sobre aobra do velho Corbusier e de Kahn, onde luz quase se torna sinônimo de arquitetura. Portoghesicomenta que no barroco, a luz é o ponto central do projeto, portanto seu controle, determinação dos

seus efeitos são resultantes de uma técnica muito refinada onde a luz incidente, direta funde-se coma luz refletida no mesmo espaço, ao mesmo tempo que se trabalha com uma luz lateral, geralmentefiltrada estudada para gerar efeitod cênicos, para gerar profundidade no espaço.

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Alguns aspectos da síntese acima colocada merecem ser aprofundados, especificamentea nova concepção de aberturas propostas pelos modernos, a nova revelação interior/exterior que estaconcepção gerou, a gestão da qualidade da luz, a questão da transparência e os aspectos simbólicosrelacionados a essa nova maneira de pensar a luz natural.

Aberturas

Quanto às aberturas, Rasmussem considera a existência de três tipos característicos:

a)  espaço que recebe luz do lado: é a solução tradicional, adotada em larga escala, podendo serconcebida através de uma janela solitária, ou então duas ou três, conforme o caso; quando afonnte de luz é apenas uma janela, surge o problema do alto contraste enntre o brilho da janela eo seu entorno em sombras;

b)  espaço que se abre à claridade: a luz penetra pelos lados, com grande luminosidade e brilho,variedade de efeitos luminosos nas diferentes partes do espaço, podendo chegar a entrar por

todos os lados, como na casa de Philip Johnson em New Canaan: faz, porém, a seguinteressalva: “hoje em dia, um excessivo número de casas são inundadas de luz proviniente de todasas direções, sem qualquer propósito artístico, criando apenas uma luminosidade ofuscante”(1986, p. 202);

c)  espaço que recebe luz do alto: a luz se faz homogênea em todas as partes do espaço, moderada edifusa, quase não existindo sombras; porém, esta ausência de sombras no interior pode fazae asformas perderem sua plasticidade e is efeitos texturais são geralmente medíocres.

Qual é o raciocínio dos modernos? Tanto Wright, como Gropius e Corbusier negam oprimeiro tipo levantado por Rasmussen e procuram se aprosimar do segundo, com maior ou menorintensidade. A janela tradicional é pejorativamente chamada de “buraco”. Nos dezessete pontos da

arquitetura neoplástica que Theo van Doesburg publicou em 1925, o ponto sete aborda essaquestão: “a nova arquitetura não inclui qualquer parte passiva, ela superou o buraco. A janela já nãoé um buraco na parede. Um buraco ou um vazio não provêm de nenhuma parte, porque tudo édeterminado de manneira rígida pelo seu contraste” (van Doesburg apud De Fusco, 1984, p. 156).

Já o terceiro tipo apontado por Rasmussen é exaustivamente explorado pelos modernos.Wright, em sua Igreja Unitária; em várias residências, em Taliesin; na Administração Johnson; noGuggenhein; Corbusier no Estúdio Ozenfant; em Ronchamp e La Tourette; Kahn na Igreja Unitáriade Rochester; no Museu Kimbell; no Yale Center. O mestre da zenital moderno, entretanto, é talvezAlvar Aalto, como no caso do hall do edifício de escritórios Rautatalo; da biblioteca do institutodos aposentados; no auditório do Instituto Finlandês de Tecnologia; na livraria acadêmica emHelsinki e nas igrejas de Vuoksenniska e Riola.

Inteior/ Exterior

A nova relação interior/exterior é abordada por Robert Venturi em seu livroComplejidad y contradicción en la arquitectura (1978): “ talvez a contribuição mais atrevida daarquitetura moderna foi o chamado ‘espaço fluído’, que se utilizou para conseguir a continuidadeentre o interior e o exterior. A idéia tem sido realçada pelos historiadores desde o descobrimentorealizado por Vincent Scully de sua evolução primitiva nos interiores do estilo shingle, até seuflorescimento na Prairie House e sua culminação com o De Stijl e o Pavilhão de Barcelona. ‘O

espaço fluído’ produziu uma arquitetura de planos horizontais e verticais relacionados. Aindependência visual destes plans ininterruptos se conseguiu com a inclusão de áreasennvidraçadas; as janelas como agulhas no muro desaparecerame se converteram, ao contrário, em

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interrupções de paredes que a visão reduzia a elementos positivos do edifício. Tal arquitetura semcantos implicou em uma continuidade total do espaço. O ênfase na unidade do espaço interior eexterior pode se conseguir graças ao novo equipamento mecânico que, pela primeira vez, fez ointerior termicamente independente do exteior”; o que foi chamado por Corbusier de prncípio da“respiração exata”, ou como conta o próprio arquiteto sobre seu projeto para o exército da salvação,

“um pano de vidro de mil metros quadrados ilumina as habitações do piso ao teto, de parede àparede... a vidraça é hermética, já que o ar aqecido e purificado circula abundamente no interior,regulado por bombas e pela calefação”.

“Mas a antiga tradição do espaço interior fechado e contrastado, que quero analisar aqui,tem sido reconhecida por alguns mestres modernos, ainda que não muito realçada por historiadores.Ainda que Wright tenha dito que ‘destruiria a caixa’ na Praire House, os cantos arredondados doedifício da Johnson Wax Administration são análogos às wsquinas diagonais arredondados dosinteriores de Borromini e a de seus seguidores do século XVIII, e com o mesmo propósito: exagerara sensação de fechaento horizontal e promover a separação e a unidade do espaço interior mediantea continuidade das quatros paredes. Mas Wright, de maneira diferente que Borromini, não furou asparedes contínuas com janelas. Isto teria debilitado o atrevido contraste do fechamento horizontal e

a abertura vertical. E também teria sido para ele demasiado tradicional e amíguoestruturalmente”(Venturi, 1978, p. 110).

Em seguida, Venturi caracteriza melhor a nova relação que surge entre o interior e oexterior: “o propósito essencial dos interiores dos edifícios é acolher em vez de dirigir o espaço eseparar o interior do exterior. Kahn disse: ‘um edifício é um objeto que abriga’. A função da casa deproteger e prover o isolamento psicológico e físico é uma função antiga. O edifício da Johnson Waxsegue uma tradição posterior: a diferenciação expressiva dos espaços interiores e exteriores. Alémdo que, ao fechar o interior com paredes, Wright diferencia a luz interior, uma idéia que tem umaevolução rica desde a arquitetura bizantina, gótica e barroca até a de Corbusier e Kahn. Atualmenteo interior é diferente do exterior... outro edifício clássico da arquitetura moderna e novamenteconsiderado atípico, ilustra meu ponto de vista. A Villa Savoye, com suas aberturas na parede, que

são mais agulhas que interrupções, limita por demais o fechaento, o espaço fluido na direçãovertical. Mas existe uma implicação espacial que a contrasta com o edifício da Johnson Wax. Seusevero exterior, quase quadrado, encerra uma confusa configuração interior, que se percebe atravésde aberturas e das saliências superiores. Neste contexto, a imagem tennsa da Villa Savoye pordentro e por fora mostra uma resolução contrapontual com uma envoltura rígida parcialmenteinterrompida e um interior complexo parcialmente revelado. Sua ordem interior se adapta àsmúltiplas funções de uma casa, à escala doméstica e ao mistério parcial inerente à sensação deprivacidade. Sua ordem exterior expressa a unidade do conceito de casa em uma escala apropriadapara o terreno que dominava e para cidade que provávelmente a envolverá” (Venturi, 1978, p. 111).

Em seguida, Venturi cita uma máxima de Wright para comentar a questão específicadesse arquiteto na relação interior/exterior: “uma forma orgânica faz crescer sua estrutura fora desuas condições como uma planta cresce de terra pois ambos se desenvolvem similarmente desdedentro. Mas a analogia de Wright se auto-limita, porque o desenvolvimento de uma planta éinfluenciada, produzindo-se distorções particulares, tanto por forças particulares de seu meio-ambiente como por sua ordem genética de desenvolvimento. D’Arcy Wentworth thompson via aforma como um registro do desenvolvimento no meio-ambiente. A ordem natural retangular daestrutura e o espaço da casa de apartamentos de Aalto em Bremen cede ante às necessidadesinteriores de luz e espaço para o sul, como o crescimento de uma flor para o sol. Mas falando emtermos gerais, para Wright o espaço exterior e interior de suas edificações (invariavelmenteisoladas) era contínuo e, como urbanófobo, o meio ambiente suburbano de seus edifícios, ainda queespecificamente regional, não era tão limitativo espacialmente como um contexto urbano (semdúvida, a planta da Robie House se adapta ao estreitamento dos limites posteriores da residência).Wright, sem dúvida, acredito, recursou aceitar sua situação que não estava de acordo com aexpressão direta do interior. O Museu Guggenheim é uma anomalia na Quinta Avenida. Mas o

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edifício da Johnson ax talvez faça um gesto negativo a seu meio ambiente urbano diferente,dominando-o e excluindo-o” (Venturi, 1978, p. 132).

Qualidade da luz

Assim Venturi coloca a questão da continuidade entre o interior e o exterior, através do“espaço fluído”, conseguindo através dos grandes panos de vidro. Mas e a luz, esta também é fluida,isto é, continua no interior com as mesmas qualidades da luz do exterior?

Ao se analisar o quadro comparativo acima exposto, percebe-se que sim, nas obras deGropius e do jovem Corbusier. É uma luz direta, que penetra abundantemente no interior, e que, sepor um lado, é uma luz “dura”, não trabalhada, que cria sombras fortes, por outro realizaperfeitamente essa intenção estética de continuidade.

Já Wright, o velho Corbusier e Kahn trabalham com uma outra qualidade de luz, a luzfiltrada. Assim Christopher Alexander, em seu livro A pattern language (1980), comenta essa luz:

“a luz filtrada através das folhas das árvores ou uma gelosia é maravilhosa. Mas porque?”“Sabemos que a luz se filtra através de uma árvore frondosa é muito agradável, estimula

a alegria, o júbilo e o interesse; e sabemos também que se a iluminação é uniforme, criam-seespaços monótonos e carentes de atrativos. Mas por que?”

“1. A razão mais óbvia é esta: a luz direta que procede de uma fonte pontual criasombras muito marcadas e, como resultado, imagens duras com fortes contrastes. E as pessoas temum hábito óptico que piora esse contraste: nosso olho reforça automaticamente as fronteiras peloque percebemos as coisas com uma nitidez maior do que existe na realidade. Por exemplo, um mapaclorido com cores diferenciadas e contíguas nos parecerá como se existissem linhas negras deseparação entre essas cores. Esses contrastes, essas fronteiras duras são desagradáveis, pois os

objetos parecem ter um caráter cortante e nosso olhos, incapazes de se ajustar a esse contraste, nãocaptam os detalhes”.

“Por todas essas razões, nos é natural o desejo de suavizar a luz, controlando os focosluminosos ou mediante iluminação indireta, para que as imagens criadas sejam mais brandas, isto é,que as fronteiras percebidas não sejam marcantes, e haja menos contraste, menos sombras e sejamais fácil captar os detalhes. Por essa mesma razão os fotógrafos utilizam a luz e não a luz direta,quando fotografam os objetos; desse modo registram detalhes que em caso contrário se perderiamnas sombras”.

“2. A Segunda razão é reduzir o resplendor em torno da jannela. Quando nos chega umaluz brilhante pela janela, produz-se um resplendor contra a escuridão da parede que rodeia a janela.

Filtrando-se a luz, sobretudo nas bordas da janela, elimina-se o resplendor ao se diminuir a entradade luz”.

“Existe uma terceira razão, que de momento é pura conjectura: talvez o fato de umobjeto que apresente padrões luminosos mais reduzido seja sennsualmente agradável ebilogicamente estimulante. Alguns realizadores de cinema asseguram que o jogo de luz sobre aretina é sensula por si mesmo”. ( Alexander, 1980, pp. 961-2).

Wright, o “velho” Corbusier e Kahn procuram obter essa qualidade de luz filtrada atravédas mais variadas soluções arquitetônicas possíveis; Kahn chega a descartar persianas e venezianas,pois considera que a própria arquitetura deve resolver a questão do filtro e não produtos de lojas: osgrandes beirais, os vidro de tubo pirex, os brise soleil, os lanternins de concreto, os painéis annti-ofuscante, os filtros são respostas para a questão de como recriar a luz no interior.

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Transparência

A questão da transparência é colocada por Gideon em Espacio, tienpo y arquitectura: “...a transparência, realizada de maneira plena, que nos vemos frente a situação de ver

simultaneamente o interior e o exterior, de frente e de lado, como na L’Árlésienne de Picasso, de1911-12: multiplicidade de níveis de referência, ou de pontos de referência e simultaneidade, emuma palavra, o conceito de tempo-espaço”(Gideon, 1978). Argan coloca a Fábrica Fagus comoexemplo do fenômeno: “isto é um espetáculo não usual para os olhos acustumados às paredesportantes... o ponto mais importante é que aqui pela primeira vez o caminho para a transparência eleveza econtra inegável expressão arquitetônica... edifícios envidraçados, de resto, não valem por sipróprios, mas sim pela profundidade ou estrutura interna que neles se pode ler á transparência, peloespaço oposto, internos e externos, que se reflete nas placas espelhantes; por estes dois espaços sesobrepoem ou se interpenetrarem, o de cá e o de lá, nesse diafragma suspenso e incorpóreo.

Desaparece assim (...) qualquer separação entre espaço interior e exterior, como eralógico que acontecesse, visto que, tendo-se desde o princípio considerado o espaço como extensão

não definível por limites, mas apenas por indícios, ou direções. Todo o espaço era já unitariamentesuposto como interior, isto é, não como vista, mas como lugar de ação e do movimento”.

O que se tem então é a destruição da superfície como limite sólido, e a destruição daprofundidade como “vazio efetivo e praticável”. O plano de vidro de vidro que se vê parece umpapel milimetrado, desenhad pela estrutura metálica. Diz. Argan que “o vazio deixa de semanifestar como efeito naturalista de massa ou de penumbra atmosférica, e vale como merahipótese ou possibilidade de espaço. Por outras palavras: esse plano envidraçado não é um valorexpressivo do espaço, mas sim uma condição, e precisamente uma condição de divisibilidade, emvirtude da qual duas regiões espaciais opostas, embora sobrepondo-se e interpenetrando-se e quasetranscorrendo com um fluxo contínuo de uma para outra, se constituem em imagem” (Argan, 1990).

Assim comenta de Fusco (1984): “...Bauhaus... onde a parede de vidro concorre para aexaltação do dinamismo próprio do conjunto da volumetria arquitetônica (p. 90)... o limite simplistada definição de Gideon é compensada pela vantagem de oferecer, nos anos do racionalismo, a maisdivulgada interpretação do espaço-tempo e, por consequência, da principal relação formal entrecubismo e arquitetura. Esta traduz-se, segundo o próprio Gideon, na representação espacó-temporal,no princípio da simultaneidade, na interpenetração entre os espaços internos e externos, no empregode planos curvos e de superfícies diferenciadas. Zevi, ao descrever a nova dimensão, refere outroselementos do léxico comum à arquitetura racional: “dela provêm algumas características que voltama ser encontradas na arquitetura moderna: planos avançados e recuados, superfícies que seintersectam e que penetram uma na outra formando vários ângulos, planos suspensos no espaço semrelação entre si (no sentido unívoco e focal da perspectiva) e, por fim, a transparência, formas quesurgem uma atrás da outra e que nesse efeito se sobrepõem. A insistência cubista na pesquisaespacial levava os arquitetos a trbalhar em termos de volumes – espaços definidos por planos – enão mais em termos de massa e solidez”(p. 130).

Porém a questão da transparência é entendida de uma outra maneira por Colin Rowe. Notexto Transparência: literal e fenomenal, procura demonstrar a existência de duas formas detransparência. Primeiro destaca o novo conjunnto de palavras que esse fenômeno trouxe àlinguagem verbal arquitetônica: “simultaneidade”, “interpenetração”, “superposição”,“ambivalência”, “espaço-tempo”, “transparência”. “...Na literatura da arquitetura contemporâneaestas e outra palavras semelhantes são empregadas como sinôminos. Todos conhecemos asmanifestações às quais são aplicadas, ou pelo menos presuminos. Trata-se, segundo acreditamos,das características formais específicas da arquitetura contenporânea; e, como respondemos a elas,

raramente intentamos analisar a natureza de nossas respostas”.“Segundo a definição do dicionário, a qualidade ou estado de ser transparente, é uma

condição material – a de ser permeável à luz e ao ar”. Rowe diz que a palavra tem, portanto, um

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significado físico e também uma conotação moral, portanto “é uma palavra que, desde ao pricípio, éfortemente carregada de possibilidades de sentido e de incompreensão”. Cita ainda Kepes emLinguagem da Visão, que diz que quanndo duas figuras se sobrepõem, cada uma reclama para si aparte sobreposta, o que leva a uma contradição em níveis espaciais. Assim a transparência não éapenas um fato óptico, mas uma ordem espacial mais ampla, que é a percepção simultânea, o que,

segundo Rowe, leva a uma ambiguidade.“Portanto, no princípio de qualquer investigação sobre a transparência, deve-se deixar

estabelecida a distinção que é, seguramente, básica. A transparência pode ser uma qualidadeinerennte à substância – como ocorre em uma tela metálica ou uma parede de vidro – ou pode seruma qualidade inerente à organização... e precisamente por esta razão podemos distinguir entretransparência literal ou real a tranparência fenomenal, ou aparente” (Rowe, 1978, pp. 155-7).

Quais são as origens desses fenomênos? Segundo Rowe, a transparência literal deriva daestética da máquina, já a transparência fenomenal deriva da pintura cubista, pois são característicasdo cubismo: a frontalidade, a supressão de profundidade, a contração do espaço, a definição dosfocos de luz, o adiantamento dos objetos, a palheta limitada, as retículas oblíquas e retilíneas, atendência para o desenvolvimento periférico.

Na pintura, a transparência literal é o efeito trompe-lóeil de um objeto translúcido emum espaço profundo e naturalista; a transparência fenomenal parece se dar quando um pintor buscaa apresentação articula de objetos frontalmente alinhados em um espaço pouc profundo e abstraído.

“Mas, se passarmos a considerar não as transparências pintadas, mas as arquitetôncas,inevitavelmente surgirão confusões. Pois, ainda que a pintura só implique uma terceira dimensão, aarquitetura jamais poderia suprimir-la. Tratando-se da realidade, e não de um âmago de trêsdimensões, a transparência literal pode se converter, em arquitetura, em um fato físico. Atranspar6encia fenomenal, sem dúvida, é mais difícil de conseguir, e, desde logo, é tão difícil dediscutir que geralmente os críticos tem-se mostrado totalmente partidários de associar atransparência arquitetônica a uma simples transparência dos materiais. Assim Gyorgy Kepes, depois

de proporcionar uma explicação quase clássica dos fenômenos que vimos em Bbraque, Gris eLeger, parece considerar que o análogo arquitetônico dos mesmos deve enncontrar-se nasqualidades físicas do vidro e dos plásticos, e que o equivalente das calculadíssimas composiçõescubistas deve ser descoberto nas fortuitas superposições que proporcionam os reflexos acidentais daluz jogados sobre a superfície brilhante ou translúcida. Sigfried Gideon parece supor, igualmente,que a presença de uma parede totalmente envidraçada no edifício da Bauhaus, com suas ‘extensaszonas transparentes’, permite ‘a flutuante relação dos planos e o tipo de superposição que aparecenos quadros comtemporâneos’, e logo passa a reforçar esse critério com uma citação de Alfred Barrsobre a característica ‘transparência dos planos superpostos’ no cubismo analítico (L’Árlésiene dePicasso, onde está transparência dos planos superpostos se exibe com toda a obviedade): oobservador tem a sensação de olhar através deles e, ao fazê-lo, suas sensações são, sem dúvida, um

tanto similares às do observador da ala das oficinas da Bauhaus. Em ambos os casos, descobrimos atransparência dos materiais... mas a parede envidraçada da Bauhaus, superfície sem ambiguidades,que mostra um espaço que também carece delas, parece curiosamente prescindir dessa qualidade”.

Quais seriam as qualidades dessa transparência fenomenal? Rowe cita como exemplo aVila Stein em Guarches, onde Le Corbusier explora as qualidades planas do vidro ao contrário deGropius que se preocupa com as transparentes. Diz Rowe: “o vidro não parece exercer a mesmafascinação para Le Corbusier, ainda que, evidentemente, se possa ver através de suas janelas, não énnelas que encontramos a tranparência de seu edifício”. Em Guarches, a superfície da planta baixavolta a ser definida sobr o teto pelas duas paredes independentes nas que termina o terraço; eidêntifica formulação de profundidade encontramos nas portas envidraçadas das paredes lateriasque atuam como fechamento da caixilharia. Deste modo Le Corbusier planta a idéia de que,

imediatamente por trás do vidro, existe uma estreita parte de espaço que se move paralelamente aelas; e, naturalmente, como consequência disso, dá um novo passo: rodeando este trecho espacial eatrás dele, existe um plano do qual fazem parte tanto a parede baixa, as paredes independentes do

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terraço, como os batentes inferiores das portas; e ainda que esse plano possa ser considerado maisuma conveniência conceitual que um fechamento, não se pode negar sua presença inoportuna. Aoreconhecer o plano físico do vidro e do concreto e esse plano imaginário (ainda assim não pormenos real) que está atrás, compreendemos que aqui a transparência não se obtém por meio de uma

 janela, mas sim pela consciência dos conceitos primários que se “interpenetram sem a destruição

óptica dos outros”. (Rowe, 1978, p. 161– 2).“Deste moodo vemos que em toda a casa existe uma contradição das dimensões

espaciais que Kepes tomava como características da transparência... A realidade do espaçoprofundo se opõe constantemente à interferência do espaço superficial e, graças à tensão resultante,nos obriga a efetuar sempre novas leituras. Os cinco estratos de espaço que dividem verticalmente ovolume do edifício e os quatro que seccionam horizontalmente requerem, uma ou outra vez, nossaatenção e esta retícula espacial é que direcionará a contínuas flutuações de interpenetração”.

“Estes refinamentos possivelmente cerebrais são bastante menos notórios na Bauhaus; éevidente que se trata de atributos aos quais uma estética dos materiais resiste mal. Na ala dasoficinas da Bauhaus, encontramos a transparência literal que tanto aplaudiu Gideon; em garches oque chama a atenção, sem dúvida, é a transparência fenomenal” (Rowe, 1978, pp. 163 e seguinte).Assim se relacionam Corbusier e Léger, mas também Moholy e Gropius, segundo Rowe.

Simbologia

A utilização da palavra luz em termos simbólicos é bastante conhecida; um dosmelhores exemplos é a famosa frase de Nehru quando da morte de Gandhi: “a luz de nossas vidas seapagou; só nos restam as trevas”. Porém existe liguagem simbólica da luz arquitetônica, que,mesmo silenciosa, fala com clareza.

Por exemplo, a perspectiva sanitarista em Gropius voltada para a questão da higiene, dahelioterapia está claramente sinaliza em sua obra – atrav’s do uso da luz. No jovem Corbusier estaperspectiva tembém está presente, ao lado de um purismo demonstrado pelas formas puras e pelacor branca. Paralelos arquitetônicos podem ser f eitos sobre essa determinada qualidade de luz e seusignificado histórico; certas observações que Victor Nieto Alcaide faz em seu livro  La luz, símbolo

 y sistema visual (1985) sobre a simbologia da luz da renascença poderiam perfeitamente seremaplicadas a este momento do modernismo. “...não trabalha mais com elementos que configuram aidéia de um espaço simbólico”, como no caso do romântico ou do gótico, simbologia está que serácomentada a seguir. “A atenção pela representação da realidade, de acordo com um sistemanormativo e regular, determinou uma valorização da luz natural como meio de articular uma idéiade espaço, do volume e da corporalidade dos objetos” (p. 85)... sistema de proporções, a valorizaçãodo corporal dos objetos e figuras, o cenário ‘natural’ são sublinhados por uma iluminação derivadade uma idealização da luz natural... a luz na arquitetura do renascimento é um instrumento deadmiração e ordenação da reralidade, um meio que permite criar um espaço plástico que idealmentesupera a própria realidade (p. 87)... existe um valor simbólico da luz? “A luz simbólica se entendecomo luz natural e a metáfora visual se estabelece através de uma acentuação do controle de luz quesubtrae seu valor através de um processo de acrescentar quantitativo (p. 90)... Ghiberti em seusComentarii... notou como as igrejas eram concebidas brancas para eliminar toda a reminiscência deidolatria.

Idéia que se identifica com o conceito de ‘pureza’ dos interiores e a omissão daqueleselementos que ‘dissimulassem’ a própria corporalidade e diafanidade do edifício (p. 95)... naharmonia das partes, a claridade na distribuição dos diferentes núcleos espaciais e o jogo de

proporções é a base sobre a qual se estabelece a idéia de um espaço ideal... o interior da igreja éuma entidade clara e diáfana, iluminada por luz natural sem cromatismo mágico criado por um filtrode vitrais... tendendo-se a ter muros brancos (p. 102)... a igreja não deve conter motivosdecorativos, nem de outro tipo que sejam capazes de distrair a atenção dos fiéis. É suficiente uma

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iluminação diáfana e natural dos interiores e uma perfeita visibilidade dos elementos arquitetônicospara conseguir uma imagem que reflita uma realidade superior e sirva com toda a eficácia àsfunções do culto... assim a idéia de iluminação do interior com a luz natural do exterior” (p. 106).

A simbololgia é obvia, embasada pelo iluminismo, como mostra Rouanet, em seu livroAs razões do iluminismo, onde define a modernidade citando Weber: “é o processo de

racionalização que ocorreu no ocidente, desde o final do século XVII, e que implicou namodernização da sociedade e a modernização da cultura. (...) Compreende a modernização socialpela diferenciação da economia capitalista e do Estado Moderno (...), supõe a existência de força detrabalho formalmente livre e um tipo de organização racional de produção baseado no cálculocontábil e na utilização técnica de conhecimentos científicos”.

A modernização cultural é umprocesso de racionalidade das visões de mundoe especialmente da religião. Na modernidade,existe uma obsessão pela tecnologia, umaadmiração pelas máquinas. A lâmpada elétricapoderia ser perfeitamente um dos símbolos damodernidade, tudo iluminado, eliminando astrevas da irracionalidade, ou como diziaGropius, “um máximo de luz, sol, ar paratodas as habitações”... “para o novo homem,ávido de luz, de sol, de ar puro”, completa o

 jovem Corbusier.

Depois da Segunda guerra mundial, o então já “velho” Corbusier diz na sua citada carta

qye está interessado em ver o tosco, imperfeito e o feio e seus possíveis significados de contrastes:“... decidi fazer a beleza pelo contraste. Acharei os complementares e estabelecerei um jogo entre obruto e o acabado, entre o opaco e o intenso, entre a precisão e o ocidental. Farei as pessoaspensarem e refletirem, está é a razão da violenta, clamorosa, triunfante policromia das fachadas,ilustrado pelo seu desenho que onde uma figura parte Apolo, parte Medusa, parte um sorridente solda razão, parte uma sensual figura dionisíaca do submunndo – uma amarga penumbracontrabalanceada pelo prazer e pela luz”.

Outros aspectos simbólicos, porém, estão realcionados principalmente à obra de Kahn eWright, como mostra Riichi Miyake: “para os metres da arquitetura moderna, a arte de iluminarestava embasada na idéia que luz e espaçoo são iguais. A luz pode ser transmitida e difundidaatravés do espaço ilimitadamente. Entratanto, alguns arquitetos sentiram a necessidade de esplorar o

significado das sombras, tentando compreender o espaço através dessa dualidade. Outro grupo dearquitetos pretendia desenhar significados místicos inerentes da luz. Em ambos os casos, suasintenções eram descobrir qualidade trancendentes além do espacço arquitetural”(Miyake apudFutagawa, 1994, p. 174).

A luz, utilizada como mero instrumento de alacramento, geralmente mostra um espaçosem ter pretensões simbóllicas. Porém, em certos momentos da arquitetura, como no caso do gótico,assume um senntido transcendente, pois “ através da articulação dos vitrais do edifício, como umautêntico muro translúcido, criou um espaço determinado por uma luz colorida e mutante... aintenção baseava-se no princípio de alterar a luz física natural, como meio que nos permite ver,identificar, medir e dimensionar a realidade por uma iluminação fingida que visualmente fossedistinta do natural. A luz gótica, através do brilho dourado dos fundos das pinturas ou por meio da

luz colorida e mutante do espaço arquitetônico, confere aos objetos... uma dimensão irreal, nãonatural, e, por extensão, transcedental” Alcaide, 1985, p. 13).

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Para melhor compreender essa questão na arquitetura moderna, deve-se traçar umparalelo com o momento arquitetônico acima ccitado, como foi feito anteriormente entre a luz deGropius e do jovem Corbusier e a luz da renascença. Mas, anterior ao gótico, o romântico játrabalhava a questão simbólica da luz em suas catedrais, que transmitem a idéia de solidez, de forçamas com poucos ornamentos, poucas janelas. A luta da igreja é contra os poderes da escuridão, as

trevas de barbárie. Os fiéis entram na catedral romântica e simbolicamente estão imersos na sombra.A pouca luz proovém das altas janelas, quase inacessíveis. O candelabro da Catedral de Gloucestertraz a seguinte inscrição: “quem carrega a luz foi moldado pela virtude, a luz ennsina para nãoficarmos na escuridão, no pecado”(Gombrich, 1974, p. 135). Podeia discutir-se aqui se as poucasaberturas nas catedrais românticas deniam-se a motivos técnicos. O historiador Szentkirályi diz queos imperativos técnicos prevaleciam, mas mesmo onde poderiam ser abertas mais janelas, isso nãoacontecia e cita John Scotus para melhor esclarecer essa kquestão: “tomemos como exemplo aordem interior da natureza. Esta pedra ou esta madeira para mim é luz. Se você erguntar como, arazão me faz responder que olhando esta ou aquela pedra descubro muitas coisas que iluminamminha alma. Assim aprendendo com a pedra, a luz surge para mim, isto é, ilumina-me. O mesmo éválido para todas as criaturas, que geram luz se as examinarmos e se a visão clara da nossa razão asreconhecer”(Scotus apud Szentkirályi, p. 108).

Portanto, assim é a igreja romântica: não foi feita para ser admirada com olhoscorporais. Foi feita para a fé; e a fé não necessita de luz natural, pelo contrário, a penumbra ajuda aconcentração na necessária solidão. Assim a luz, componente do mundo exterior, foi excluída doespaço romântico para não distrair a fé, pois a verdadeira luz vem da fé.

O abade beneditino Suger, que dirigia o convennto de Saint Denis, faz nascer uma novaproposta que mudaria radicalmente a história da arquitetura e a consequente simbologia de luz.Entendia que “ no topo das hierarquias terrestres, a igreja tem que expandir os brilhos dos raios daglóoria de Deus... sendo Deus a própria luz que não foi criada, mas que cria todas as criaturas. Ouniverso, que se criou de uma radiação, de uma iluminação, não passa de ondas de luz, que caemcomo cachoeira... mas que une a todos.

Como todos os objetos de certa forma refletem a luz, a radiação e reflexão criam omovimento contrário da escuridão, para o centro da luz, que é Deus. Tudo volta para Deus, atravésdo visível, que na escala das hierarquias cada vez mais refletem a luz criadora a arte irá refletir essaconcepção”(Duby, 1984, p. 95).

Assim, Suger criou em Saint Denis um espaço litúrgico inido pela luz. Tendo comoidéia básica a unidade do universo, fez com que a luz passasse sem obstáculos do altar à porta;todos os espacós internos e todo o edifício se transformou no símbolo da criação mística.

Um dos melhores estudos sobre a simbologia da luz do gótico foi feito por Victor NietoAlcaide em seu já citado livro La luz, simbolo y sistema visual: para introduzir a questão, Alcaidecita uma significativa afirmação de Pierre de Roissy, chanceler da catedral de Charles, por volta de1200: “os vitrais que estão nessa igreja, pelos quais passa a claridade do sol, significam asEscrituras Sagradas, que nos protegem do mal e nos iluminam a todo o momento”.

Eis um breve resumo da exposição de Alcaide (1979): “ o sistema de iluminação gótico‘finge’ a desmaterialização visual dos elementos construtivos do edifício. O efeito da luz nãonatural e transcendente se associa a imagem de um âmbito espiritual dissociado de nossasexperiências e vivências do mundo sensível (p. 27)... este processo, que conduz do espaço isoladoao espaço figurado... idéia do interior como espaço figurado persistiu até seu questionamento pelosarquitetos do renascimento (p. 37)... o simbolismo destas metáforas visuais da luz, a diferença daleitura parcial que oferecem os temas iconográficos, se propõe como uma idéia trancendente queabarque a totalidade do interior e visualize o tema de Deus como luz do mundo. A base doutrinal

desta idéia não se elaborou ad hoc para sua implantação na catedral gótica, mas existia previamenteem uma tradição literátia que se remonta aos primeiros tempos do cristianismo... a luz do interiorgótico, através do processo de transformação desenvolvido pelo filtro das vidraças, apresenta-secomo a contraposição da luz natural (lux corporalis) – manifestação ou expressão de Deus),

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encarnando a idéia de símbolo da lux spiritualis, ou imagem de Deus. Através do artifício da luznão natural do interior gótico estrutura-se toodo um complexo sistema de metáforas visuais quesimbolizam a divindade (p. 43)... na catedral gótica o sistema de iluminação estabelece umaconcepção figurada do espaço” (p. 57).

Como relacionar esta simbologia do romântico e do gótico com a dos arquitetos que

pretendiam desenhar significados místicos inerentes à luz e descobrir qualidades trancenndentesalém do espaço arquitetural, como diz Miyake? Será que questões como a dualidade da luz e dasombra, o significado da sombra, o significado da transformação da luz natural, a relação entre a luze a matéria, o significado da luz interior, a luz como símbolo da criação, a luz como unidade básicado universo são levantadas pelos modernos?

Wright encerra seu Testamento (1961) com as seguintes palavras: “Humanidade – a luzdo mundo. Tenho me referido constantemente a uma arquitetura mais ‘humana’, de modo quetratarei de explicar o que a palavra ‘humana’ significa para mim, arquiteto. Como na arquiteturaorgânica, a qualidade da humanidade é interior ao homem. Assim como o sistema solar se consideraem termos de anos-luz, assim pode a luz interior ser o que chamamos humanidade. Este elementohomem como a luz está além de toda a consideração. Buda foi conhecido como a luz da Ásia, Jesuscomo a luz do mundo. A luz solar é para a Natureza o que esta luz interior é para o espírito dohomem: Luz Humana”.

“A luz Humana esta’acima do instinto. É por meio dessa luz interior que a imaginaçãohumana nasce, concebe cria: não morre senão para continuar a luz da existência, sempre que estaluz vive no homem. O espírito é iluminado por ela até o ponto em que sua vida torne-se esta luz eproceda dela, iluminando seus semelhantes. As afirmações desta luz na vida e no trabalho humanossão a verdadeia felicidade do homem”.

“Na consciência humana não existe nada mais elevado que os raios dessa luz interior.

Chamamo-la de beleza. A beleza não é senão o brilho da Luz Humana – irradiação do

elevado romantismo da sua humanidade, no sentido em que sabemos são românticas a Arquitetura,as Artes, a Filosofia e a Religião. Todos são nutridos por essa luz inestinguível denntro da alma dohomem. Ele não pode dar consideração intelectual alguma por cima ou além dessa inspiração.Desde o berço até a sepultura seu autêntico ser respira está realidade para assegurar a continuidadede sua vida como Luz depois dela”.

“Como a luz solar cai ao redor de algo inerte, revelando sua forma e seu aspecto, assim aluz corresponde, dela que o sol é o símbolo, brilha desde a inspirada criação da humanidade. Estaluz interior é a segurança de que a Arquitetura, a Arte e a Religião do Homem são uma coisa só,seus emblemas simbólicos. Então podemos chamar Humanidade a luz que nunca falha. Os maisbaixos elementos do homem estão sujeitos a este milagre de sua própria luz. A aurora e ocrepúsculo são adequados símbolos da exist6encia do homem sobre a terra”.

“Não há elemento de imortalidade mais precioso que a humanidade desta maneirahumana. O céu pde ser símbolo da luz das luzes apenas ao ponto em que o céu é um porto derefúgio”.

“A humanidade tem vários nomes para esta luz interior, por exemplo ‘a alma’. Serverdadeiramente humano é divindade no único sentido concebível. Não pode existir tal coisa comomorte absoluta ou o mal extremo, pertencendo tudo, de uma certa forma, à luz. Em última análisenão existe o mal, porque mesmo a sombra é feita pela luz”.

“Assim quando Jesus disse: “o reino de Deus está em vós’, acredito que era isso quequis dizer. Mas seus discípulos trairam seu sentido quando mudaram o Pai, luz suprema do coraçãohumano, para um reino próprio, porque era demasiado difícil para os seres humanos falar de fé para

o homem. Assim foi que o cristianismo, mal conduzido, apagou sua luz interior com o objetivo deorganizar o culto da vida como luz exterior. O homem está agora por demasia sujeita a seu intelectoem vez de permanecer fiel a seu próprio espírito. Quando essa luz interior do homem foi

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submergida na escuridão da discórdia, o fracasso inventou o ‘Satanás’ para explicar a sombra.Enquanto a luz for inorgânica, a humanidade nunca descobrira’a unidade da humanidade. Isto só épossível por meio da lu interior. A ciência parece se dirigir a descoberta de que a luz é a essênciado ser humano, até o ponto em que a própria vida possa ser conhecida”.

“Gênesis: faça-se a luz, e a luz se fez”.

“Mais luz, disse Goethe moribundo e, sem dúvida, ele a enncontrou”.

“Que esta redescoberta da Arquitetura como Homem e do Homem como Arquiteturailumine então o edifício em cada um de seus rasgos e brilhe de agora em diante como um aspecto daverdade. A liberdade de sua arte encontrará assim consagração na alma do homem”.

“É assim que o gênio de nossa democracia jaz escondido na eterna lei da mutabilidade: oCrescimento, nossa maior esperança, consiste em compreender por fim o que outras civilizaçõessabiam e nos legaram, consolando-nos entretanto com a verificação de que tudo que um faz a favorou contra a Verdade lhe serve igualmente bem” – Taliesin, Frank Lloud Wright.

Com este belo texto de Wright poder-se-ia estabelecer um diálogo com o pensamento de

Kahn, pois quando Wright diz “... a Luz Humana está acima do instinto. É por meio dessa luzinterior que a imaginação humana nasce, concebe cria”, Kahn responderia: “inspiração é osentimento de começar do princípio, onde Silêncio e Luz se encontraram... viver é expressar. Toda ainspiração serve a isso”.

Wright ccontinuaria: “na consciência humana não existe nada mais elevado que os raiosdessa luz interior. Chamamo-la de beleza. A beleza não é senão o brilho da Luz Humana...”,enquanto Kahn comentaria: “... a luz que dá a consciência; pela esperança, pela lei. Você pode dizerque a luz, que sempre dá a consciência. É o que faz o material, e o material foi ffeito para moldar asombra, e a sombra pertence à luz “, e e Wright: “em última análise não existe o mal, porquemesmo a sombra é feita pela luz”.

Voltando para os aspectos físicos, Wright diria: “como a luz solar cai ao redor de algoinerte, revelando sua forma e seu aspecto...”, e kahn: “... a luz natural revela espaço pelas nuancesda luz nos vários períodos do dia, das estações do ano, penetranndo e modificando o espaço”, ecomplementaria: “luz é vida materializada”.

Quando Wright diz que “a aurora e o crepúsculo são adequados símbolos da existênciado homem sobre a terra”, sua afirmação poderia ser mais assim complementada; “ a Natureza fazseu desenho através do princípio da ordem - a Natureza não sabe quanto belo é o por do sol - aNatureza é uma existência não consciente - A regra é consciente. A lei não é consciente”.

E quando Wright fala que “enquanto a luz for inorgânica, a humanidade nuncadescobrirá a unidade da humanidade. Isto só é possível por meio da luz interior. A ciência parece sedirigir à descoberta de que a luz é a essência do ser humano...”, imediatamente se pensa no conceito

kahniano de Silêncio e Luz: “o silêncio tende a expressar algo, a luz o cria, dando-lhe forma. Ogênio criador possui dois aspectos, um luminoso e o outro não luminoso. O luminoso faz-se em luz,chama e matéria, da qual surgem os meios, as possibilidades e as evidências. Em consequência asmontanhas, os rios, e o ar são luz extinguida... Luz é vida materializada. As montanhas, os riachos,a atmosfera é luz apagada (...) Nós somos provenientes da luz apagada. (...) Da luz que ficouexausta... a feição física do mundo é composta pela luz que se perdeu no ato da sua criação. Luz,então, e o sentido de expressão presente na Natureza que foi domesticada e utilizada para criar oque agora existe”.

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IX) CRÍTICAS À LUZ DOS MODERNOS

...e perguntamos se, por trás dessa vida,

numa luz primitiva, não se poderia descobrir uma vida

mais modestamente terrestre.Gaston Bachelard

“Os deuses morrem, os homens vicem”, comenta o escritor húngaro Lázló Cs. Szabó

(1985, p.320, “e os espertos descendentes dos titãs arquitetônicos em extinção trabalham hoje com

truques atraentes e astutos para compensar as prometidas novas jerusaléns não construídas. Por uma

questão de hierarquia empresarial que valoriza o status simbólico, um bom freguês é o alemão,

embriagado pelo sucesso de sua economia. É possível encontrar fora de Munique, mas ainda dentro

do código postal da cidade, um esnobe conjunto de escritórios de grandes empresas e bancos, com

vista para as plantações. Em uma das torres as persianas estão automatizadas. Quando os raios do

sol chegam às janelas, as persianas abaixam de uma vez só em todos os quatorze pavimentos. As

lâmpadas fluorescentes acendem imediatamente. E se uma nuvem cobrir o sol, toque a sombra faz

as persianas se recolherem em todos os quatorze andares. Não são apenas automáticas, são também

inacessíveis, porque a máquina e o objeto devidamente programados são mais inteligentes que os

homens. E se, mesmo assim, uma pessoa quisesse um pouco de sol em seu escritório? Um sol

verdadeiro, experimentado, à moda antiga, o mesmo que se aliara a Apolo, Aknathon e Alexandre,

o Grande? Uma idéia extremamente extravagante, o delinqüente de idéias retrógradas quer fazer

valer sua própria vontade!”“Se Chaplin soubesse dessas persianas...”

Sem dúvida uma critica contundente à luz que os arquitetos impõem aos usuários do

espaço. Mas por onde começar uma crítica? No início da conclusão foram citadas duas

demonstrações de Rasmussen (1986) que servem perfeitamente de introdução a uma crítica da luz

dos modernos: “seria bom explicar o que entendo por ‘luz excelente’. Isso é necessário porque, para

a maioria das pessoas, uma boa luz significa apenas muita luz. E, com muita freqüência,

verificamos que tal noção é inconseqüente, já que a quantidade de luz está longe de ser tão

importante quanto a sua qualidade (p182); no início, o funcionalismo era mais uma questão de

slogans do que de soluções definitivas para o problema de design e estrutura. Muitas palavras comolivre, aberto, luz, eram a tônica do novo estilo. Muitas vezes, porém, o que se procurava era mais a

quantidade do que a qualidade da luz” (p.199).

Quantidade X qualidade

Rasmussen aborda aqui a questão da quantidade versus qualidade; é inegável que

Gropius e o “jovem” Corbusier consideravam uma das principais qualidade de sua luz a quantidade

abundante, pois queriam “um máximo de luz, para todas as habitações” (Gropius) “para o novohomem ávido de luz, de sol, de ar puro” (Corbusier).

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Essa valorização da quantidade leva a dois problemas. Primeiro, ao empobrecimento da

iluminação do espaço, pela homogeneização de seu caráter, pois se sabe que “a luz é de importância

decisiva para sentirmos a arquitetura. A mesma sala pode ser organizada para dar diferentes

impressões espaciais mediante o simples expediente de mudar as dimensões e a localização das

aberturas. Transferir uma janela do centro para uma ponta de uma parede transformaráprofundamente todo o caráter da sala...Imaginamos estar olhando para um ângulo projetado pelo

encontro de dois planos brancos. Se os dois planos estiverem uniformemente iluminados por fontes

que podem ser controladas, a luz poderá ser regulada de tal modo que os dois lados apresentem

iluminação igual. Quando isso acontece, nossos olhos já não podem mais observar a aresta do

ângulo. Talvez ainda a reconheçamos em virtude do caráter esteroscópico de nossa visão ou porque

podemos ver onde os dois planos cortam outros planos. Mas teremos perdido um meio essencial de

ver que há uma aresta. De nada adianta aumentar a luz, se esta for aumentada igualmente de ambos

os lados. Porém , se a luz for reduzida em um dos lados para que haja uma diferença nítida na

iluminação dos dois planos, a aresta irá se destacar claramente, mesmo que a intensidade total daluz seja inferior” (Rasmussen, 1986, pp.180 e 182).

Um comentário de Venturi (1978, p.28) é bastante esclarecedor sobre essa questão; ele

cita Paul Rudolph, que expôs claramente as implicações do ponto de vista de Mies van der Rhohe,

de que todos os problemas nunca podem ser resolvidos: “verdadeiramente é uma característica do

século XX que os arquitetos sejam muito seletivos ao determinar que os problemas querem

resolver”. No caso, escolheu-se solucionar o problema sanitarista, esquecendo-se que quando só

tem uma proposta de solução para qualquer problema de iluminação, perde-se a riqueza da

diversidade.

Desconsideração do contexto

O segundo problema é a desconsideração dos aspectos contextuais. Apesar da

advertência de Wright de que “...casas humanas não devem ser como caixas ardendo ao sol”,

adotou-se este modelo quantitativo nas mais conflitantes situações geográficas possíveis, de Berlim

a Nova York, de Paris a São Paulo. Le Corbusier projeta a Maison Clarté, onde o nome significa

literalmente Claridade e Pierre Chareau projeta a Maison de Verre: “desde que os arquitetoscomeçaram a utilizar materiais industrializados do século XX, suas edificações podem ser descritas

como ‘máquinas de luz’, onde uma estética mecânica aliada a transparência, à penetração profunda

da luz resulta em um ‘espaço de luz inorgânico’” (Portoghesi apus Futagawa, p.131).

“É espaço e luz, uma luz como elemento que distorce o espaço para obter uma

dramatização maior...os complexos claros diagonais e os muros e coberturas envidraçadas da

primeira arquitetura industrial respondiam à necessidade de luz natural e de um mínimo de uso das

luz artificial em uma jornada de trabalho de doze horas e em latitudes em que os dias são muito

curtos no inverno e os invernos muito compridos. Por outro lado, o fabricante de Manchester

baseava seus cálculos na existência de um clima fresco no verão, baixos níveis de aquecimento no

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inverno e de uma mão de obra dócil e barata que aguentaria estas condições de trabalho e repararia

em seguida as infiltrações. Sem dúvida, a maioria dos edifícios necessita, hoje, mais de janelas para

as vistas externas do que áreas envidraçadas com a luz diurna; as superfícies de vidro devem ser

reduzidas e os tetos devem ser razoavelmente baixos porque assim o exige o ar condicionado.

Portanto, nosso impacto estético não deve originar-se na luz, mas em critérios mais simbólicos emenos espaciais” (Venturi, 1982, p.172).

Essas idéias, porém, eram bastante populares. De Fusco (1984) observa que “a ação

política de Le Corbusier e suas propostas ‘técnicas’ para resolver questões sociais menos

espetaculares e impopulares nos anos vinte do que normalmente se pensa....o ambiente europeu

(era) particularmente receptivo às teorias de Le Corbusier, que se dirige, salvo raras exceções, ao

homem da rua...as suas concepções simplistas têm antes de mais a vantagem de serem simples”

(pp.211-2).

Simplismo

Entretanto, “onde a simplicidade não funciona, o simplismo funciona. A simplificação

flagrante indica uma arquitetura frouxa. Menos, é o enfado”, observa Venturi (1978). “O

reconhecimento da complexidade na arquitetura não nega o que Louis Kahn chamou de ‘o desejo de

simplicidade’. Mas a simplicidade estética, que é uma satisfação para a mente, é proveniente -

quando é válida e profunda -, da complexidade interior” (p.29).

Talvez seja essa visão simplista que tenha gerado a tese de Kalff (1971) de que a

arquitetura moderna já não consegue criar a riqueza de efeitos de luz que se pode verificar no

decorrer da história da arquitetura. Sua tese é que, “com a ajuda da luz, um instrumento dos mais

poderosos, é possível dar vida aos espaços interiores...algumas vezes um belo projeto é o resultado

lógico da construção ou o uso apropriado do material de construção; em outros tempos, construções

ilógicas e artificiais têm sido projetadas para se obter bons efeitos de luz...na arquitetura moderna,

usando novos métodos construtivos, direcionada para ser menos individualizada e caracterizada

pelo uso destinado, é mais difícil usar a luz natural como parte da concepção” (p.51).

Essas críticas são basicamente dirigidas ao pensamento de Gropius e do “jovem”

Corbusier, onde, como observa Venturi (1978), elementos de dupla identidade (luz e sombra) sãopouco utilizados, preferindo-se trabalhar co9m a separação (só luz) e especialização em todos

níveis, tanto nos materiais como no programa e no espaço (p.53). Ao se analisar o pensamento e as

obras de Wright, do “velho” Corbusier e de Kahn os efeitos da luz reclamados por Kalff aprecem,

com a valorização dos jogos de luz e sombra. Negando-se a máxima “menos é mais”, que em

termos de luz e sombra significa um ou outro e ao se propor trabalhar com um e outro, toda uma

série de possibilidades negadas pelo “jovem” Corbusier e por Gropius se abrem. “tais manifestações

de articulação e claridade são estranhas a uma arquitetura de complexidade e contradição, que tende

a incluir ‘um e o outro’...se a fonte do fenômeno do um e o outro é a contradição, sua base é a

hierarquia que admite vários níveis de significados entre elementos de valores diferentes. Podeincluir elementos que são de uma vez bons e ruins, grandes e pequenos, fechados e abertos,

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contínuos e articulados, redondos e quadrados, estruturais e espaciais. Uma arquitetura que inclui

diversos níveis de significados cria ambigüidade e tensão” (Venturi, 1978, p.39), ou como diz

Kahn, a arquitetura deve Ter tanto espaços ruins como bons.

A crítica de Wright

Wright, em seu Testamento (1961), tece uma série de críticas a essas posturasdefendidas por Gropius e o “jovem” Corbusier. Ao considerar que exuberância é beleza entendidacomo plenitude da Natureza, pede para não se confundir exuberância com excesso, que sempre évulgar. O desenho deve revelar a verdade interior, posturas formais são, portanto, vazias designificação, o clichê sem significado humano (p.10): “nós não devemos ser vistos amanhã comomeramente idade científica ou sanitária...(devemos) habitar casas que sejam verdadeiras obras dearte. Os edifícios belos são mais do que científicos. São verdadeiros organismos, espiritualmente

concebidos (p.56)...a máquina deve ser um instrumento de libertação, não um status de ritual, comoquerem os modernos, um fim em si mesmo (p.133)...se está destinada a ser conhecida como ‘erasanitarista’, nossa liberdade está ameaçada. A democracia morre. Para cultivar a beleza nasociedade, o cidadão deve voltar a vida para a poesia, estudar o princípio poético como guia, comoconselheiro e como amigo (p.157)...a quantidade nunca deve ser de nenhuma maneira, em nenhumaparte e em nenhum tempo, usada para entorpecer a qualidade de novos recursos para o proveitohumano e deleite do vivar. Viver deve ser uma qualidade de espírito próprio do homem” (p.192).

A influência de Kahn

Em 1963 Kahn (apud Tyng, 1984, p.168) escreve um texto sobre Corbusier: “acreditoque Le Corbusier, mesmo na luz de suas maravilhosas revelações em arquitetura, está apenascomeçando a criar sua grande obra. Eu arriscaria pensar em um edifício que ele poderia fazer, umgrande edifício, que é cortado de alto a baixo em várias partes e em várias formas como um casteloou um templo, criando luz nos espaços e passagens às áreas contíguas, chegando a um glorioso eúnico espaço central, com a luz caindo nas parede em planos refletidos, as formas trabalhadas,unidas pela serenidade da luz zenital”. É um texto de elogio ao “velho Corbusier”, de Ronchamp eLa Tourette e não ao “jovem” Corbusier purista.

Nesse momento o pensamento de Kahn é determinante. Seu pensamento colocará emxeque os cânones do modernismo, seu ensino irá influenciar toda uma geração de arquitetos comoRobert Venturi e Charles Moore.

Faz parte dessa geração o arquiteto Robert Stern. Seu seguinte escrito reflete bem opensamento dessa geração pós-kahniana: “a arquitetura não pode florescer por muito tempoenquanto os arquitetos acreditarem que se encontram frente a uma tabula rasa, enquanto acreditaremque o edifício individualizado é produto de um talento individual e de uma personalidadeindividual. Arquitetura é síntese dos valores tradicionais e das circunstâncias imediatas. A sínteseparticular que cada arquiteto faz é decorrência do que cada um é, ou acredita: esta é a nossaresponsabilidade pessoal moral...o que estou dizendo pode ser colocado de uma outra forma: paramim o prazer na arquitetura não é meramente realizar o desenho dos edifícios pela sua própriaforma – o que Le Corbusier emotivamente descrevia como o ‘jogo das formas sob a luz’ – masrequer que aquelas formas incorporem a memória dos edifícios do passado individual, do passadoem geral, da cultura” (apud Arnell, 1981, p.10)”. Stern, que durante seu aprendizado aos poucospercebeu que tinha que se libertar dos princípios da arquitetura moderna e Ter uma visão mais

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ampla, o que foi possível através da leitura das obras de Robert Venturi, diz: “Acredito que três

paradigmas – ou talvez mais corretamente, a interação entre três paradigmas – caracterize a

arquitetura moderna: o paradigma clássico, o paradigma vernacular e o paradigma da

produção...uma vez que a arquitetura em oposição à mera construção, é a representação da

realidade, e não sua expressão direta; em outras palavras: é arte. Portanto, a relação entre aprodução arquitetônica atual e cada uma dessas três tradições ou modelos – a clássica, a vernacular

e a tecnológica – é simbólica, e esse relacionamento simbólico que dá a esses três modos sua

natureza paradigmática no processo do desenho...minha atitude perante a forma, baseada no amor e

no conhecimento da história não é concebida como uma cópia acurada. É eclética e usa a colagem e

a justaposição como técnica para dar um novo significado às formas familiares e, ao fazer isso, criar

uma nova paisagem...escrevi essas palavras e formulei esse projetos acreditando que o modernismo

enquanto movimento na literatura e nas artes visuais terminou. Mas, ao mesmo tempo, gostaria de

sugerir que arquitetura moderna, vista de uma maneira mais ampla, permaneça uma proposta

viável” (p.12).E continua Stern: “a era da ideologia na arquitetura acabou. Agora não existem regras;

apenas escolhas e invenções. O que leva ao processo de desenho é a síntese crítica como T.S. Eliott

sugeria, os pólos opostos entre os quais a criatividade oscila: tradição e talento individual...em

1923, Le Corbusier mostrou a alternativa diferente, em um tom mais conciliatório: ‘tradição e

modernidade” (apud Rueda, 1986, p.6). No texto de título curioso chamado The Yin, the Yang, and

the Three Bears Moore (apud Johnson, 1991, p.15) comenta esta proposta de tradição e vanguarda,

moderno e pós-moderno se defrontam. “Acredito que isso pode ser retratado nos termos de yin e

yang, o diagrama chinês dos opostos, um complementando o outro”.

Esse tom mais conciliatório, que nega a tábula rasa, valoriza o contexto e procura

compreender a tradição e o vernacular. Essa valorização da janela tradicional é uma contundente

crítica às revolucionárias concepções de espaço e aberturas dos modernos, concepções assim

comentadas por De Fusco: “...de fato, aquilo que ainda distingue a planta é o seu valor distributivo e

não o valor de signos visuais. A eliminação das aberturas dos planos de construção é uma outra

tentativa de reduzir o conjunto do organismo arquitetônico a uma intencionalidade estilística

unívoca. Os espaços vazios nas fachadas transformam-se assim em planos ou superfícies vazias

com um papel em tudo análogo ao dos planos preenchidos” De Fusco, 1984, p.160). Os seguintes

textos, escritos por Charles Moore e Christopher Alexander, retratam essa postura de valorização da janela tradicional.

Moore

No livro La casa: forma y diseño, Moore (1985) escreve: “a habitação, limitada pelo seu

contorno, está animada pela luz. Tradicionalmente, as habitações nem sempre tinham muita luz,

porque uma série de preocupações – a necessidade de calor e privacidade, assim como o custo do

vidro – atuavam de maneira contrária e o costume decretava freqüentemente o uso de cortinas,

persianas e venezianas para controlar e, ao mesmo tempo, minimizar a pouca luz que as pequenas janelas podiam oferecer. A fonte de luz natural tem sempre um grande poder de evocação e, por

exemplo, a imagem da luz que atravessa a janela, esparrama-se no solo, ilumina as laterais das

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 janelas profundas ou desliza sobre o muro branco, ilumina fortemente nossa lembrança dos lugares,

como os interiores que Vermeer pintava. Assim, o que recordamos normalmente não é

propriamente a fonte de luz, mas as superfícies sobre as quais a luz cai: o piso encerado, os batentes

das janelas, a parede” (p.93).

Assim comenta o posicionamento das aberturas: “quando entra nas habitações, a luzapresenta variantes do mais diverso tipo. As direções de procedência são de suma importância. O

olho humano se sente ferido quando enfrenta agudos contrastes de luz e sombra. Uma habitação

cuja luz proceda somente de um lado pode gerar ofuscamentos e objetos e pessoas no interior geram

sombras desconcertantes; se dentro estiver bastante escuro e fora, muito iluminado, o esforço

adaptativo dos olhos será penoso”, apesar desta luz, incidindo da mesma direção Ter suas

qualidades segundo Rasmussen: “uma luz mais ou menos concentrada – isto é, luz de uma ou mais

fontes incidindo na mesma direção – é a melhor para se verem forma e textura. Ao mesmo tempo,

esse tipo de iluminação enfatiza o caráter fechado de uma sala. A luz pode, por si só, criar o efeito

de espaço fechado” (p.201).Mas Moore prefere equilibras a luz: “se a fonte de luz principal se equilibra coma a luz

procedente de outra direção, que seja de cima, ou de um muro lateral, obter-se-à um ambiente muito

mais agradável.

“Uma superfície que reflete a luz como os muros brancos da habitação de Vermeer, ou

um piso ou teto luminosos, pode propagar a luz e ao mesmo tempo suavizar a fonte de luz.

Inclusive uma superfície iluminada por raios do sol, próxima de uma janela, interior ou exterior,

pode proporcionar uma fonte de luminosidade intermediária, mais suave que o forro brilhante que a

parede interior sobre a qual não brilha o sol, e esta mediação é consoladora para visão”.

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“As características da luz – suave, aguda, translúcida ou cristalina – se conservam vivasem nossas mentes. O mesmo ocorre com as variações diárias, que condicionam nossa impressão dashabitações: o brilhante sol de uma manhã, a fria escuridão das alcovas fechadas, a luz sem sombrasdo estúdio do artista. Podemos criar todas essas características dentro dos limites da geografia e doclima local, e projetar de acordo, pois o sol segue, em qualquer lugar, uma trajetória conhecida. A

luz natural, que varia a cada hora durante todo o dia, e que varia com o tempo e a estação, é a quedá vida a uma habitação”.“A luz artificial, por conseqüência, é somente um complemento necessário e

necessariamente limitado. As qualidades mutantes da luz natural mantêm-nos conectados aosprocessos naturais da terra e do tempo, e a luz artificial não conseguiu se aproximar sequer de suainfinita variedade. Ainda que nosso domínio da eletrônica permita certamente programariluminações artificiais que mudem no decorrer do tempo (‘Martha, coloque a tarde de Marrakesch,com tempestade’), a ausência de qualquer conexão real com a natureza e o que esta nos significa, édeterminante. A luz artificial, por mais arte que possa gerar de suas fontes, permanece constante nodecorrer do tempo e reserva-se realmente poucas surpresas” (p.94).

Alexander

Já Cristopher Alexander é muito mais incisivo; em seu livro A pattern language/ un

lenguage de patrones (1985). Primeiro, tece forte crítica sobre as propostas modernas: “os

quadrados e retângulos perfeitamente cristalinos de arquitetos ultramodernos não tem sentido algum

nem em termos humanos nem em termos estruturais. Expressam apenas os desejos rígidos e

fantasias de pessoa que se preocuparam excessivamente pelos sistemas e meios de produção” (773).

Em seguida, comenta a necessidade imperativa de criar áreas voltadas para o sul (seu

texto, escrito no hemisfério norte, leva em consideração aquele contexto, sendo o contrário no

hemisfério sul). Feita uma pesquisa, “nenhuma das pessoas entrevistadas mostrou preferência por

um pátio sombrio” (p.463)..”este padrão foi desenvolvido na área da baia de São Francisco. Assim,

sua importância varia com a latitude é de 50graus norte, este padrão adquire importância maior: as

fachadas voltadas ao sul dos edifícios são espaços exteriores valiosíssimos em dias de sol. Nos

colimas desérticos, ao contrário, este padrão perde importância; as pessoas não desejam permanecer

no exterior a não ser que exista um equilíbrio entre o sol e sombra...portanto, oriente sempre os

espaços contíguos exteriores dos edifícios ao sul. Não permita uma faixa larga de sombra entre os

edifícios e a área insolada do exterior” (p.464).

Retoma seu ataque aos modernos “amiúde se desenham os edifícios modernos sem

preocupação alguma com a luz natural, assim muitos dependem quase exclusivamente da luz

artificial. Mas os edifícios que desprezam a luz natural como fonte básica de iluminação não são

adequados para se passar o dia” (p.472), e sua concepção de aberturas é bastante coincidente com a

de Moore: “...toda a habitação confortável deve Ter mais de uma janela, e situadas em lados

diferentes. Isso condiciona a estrutura formal do edifício, pois exige não apenas que tenhaprofundidade máxima de oito metros”, pois se quer luz natural, diz Alexander, nenhum edifício

deve Ter mais de seis-oito metros de profundidade, pois nenhum de seus pontos que distem mais de

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quatro ou cinco metros de uma janela podem ser bem iluminados, “mas também que suas paredes

exteriores sejam continuamente interrompidas por esquinas e reentrâncias, para que todos os

espaços tenham ao menos duas paredes voltadas ao exterior”, resumindo: “disponha o edifício de

modo que se decomponha em alas que correspondam aproximadamente aos grupos sociais naturais

mais importantes que se tem de abrigar. Cada ala será a mais larga e a mais estreita que a circulação

permita, e nunca terá uma largura superior a 7.500m” (p.474).

Trabalhando-se coma orientação correta, ganhar-se-à qualidade de vida nos espaços: “se

os ambientes estão voltados para o sul, a casa será luminosa, insolada e alegre, se não for assim

orientada, a casa será escura e triste” (p.548).

Em capítulo intitulado “Tapete de luz e sombra”, escreve: “em um edifício com um

nível de iluminação uniforme, existem poucos lugares que funcionem como marcos eficazes dos

acontecimentos humanos. Isso acontece porque, em grande parte, tais lugares são definidos pelaluz”.

“As pessoas são ‘fototrópicas’ por natureza: movem-se para a luz e, quando estão

quietas, orientam-se também pela luz. Como resultado disso, os lugares mais usados e amados dos

edifícios, onde ocorrem mais coisas, são as cadeiras frente às janelas, as galerias, os cantos frente à

chaminé, o pergolado; todos definidos pela descontinuidade da luz e pela possibilidade de as

pessoas se orientarem pela luz”.

“Podemos dizer que tais espaços se convertem em cenários dos eventos humanos queacontecem no edifício. Como há boas razões para se acreditar que as pessoas necessitam de uma

rica variedade de cenários para suas vidas...e como esses cenários estão definidos por lugares que,

por sua vez, parecem definidos pela luz, e como os lugares da luz só podem ser definidos mediante

o contraste com os de sombra, tudo isso indica que aqueles interiores do edifício, onde se passa

muito tempo, devem oferecer uma elevada dose de alternância de luz e sombra. O edifício deve ser

como um tapete de luz e sombra” (p.573).

Suas posições coincidentes às de Moore são expostas no capítulo “Luz em dois lados de

cada espaço”: “quando podem escolher, as pessoas escolhem aqueles espaços que recebem luz por

dois lados e abandonam as que só são iluminados por um”.“Este padrão, mais do que qualquer outro, determina o êxito ou o fracasso de um espaço.

A distribuição de luz diurna em um quarto e a presença de janelas em dois lados são fundamentais.

Se você constrói um espaço iluminado apenas por um lado, quase com certeza está desperdiçando

seu dinheiro. As pessoas evitarão esse espaço, se lhes for possível. Naturalmente, se todos os

espaços estão iluminados apenas por um lado, as pessoas não terão outro remédio senão usá-los.

Mas podemos nos assegurar que estão ali incomodadas, desejando sempre andar, e estamos seguros

do que fazem quando podem escolher” (p.659).

“Sua importância apoia-se parcialmente em atmosfera social que cria. As habitações

iluminadas por dois lados com luz natural geram menor ofuscamento em torno de objetos e pessoas;e isso nos permite ver as coisas mais elaboradamente; e o que é mais importante, permite-nos ler

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com mais detalhes as expressões diminutas que reduzem nos rostos das pessoas, nos movimentos de

suas mãos, etc...e, com isso, entendemos com maior claridade seu significado. A luz em dois lados

facilita que a gente se entenda”.

“Em um espaço iluminado apenas por um lado a graduação de luz nas paredes e pisos do

interior é muito agudo, o que faz que as zonas mas distantes da janela fiquem desagradavelmenteescuras em comparação com as próximas. E o que ainda é pior, como a luz que se reflete nas

superfícies interiores do espaço é muito escassa, a parede interior imediatamente contígua à janela

pode ficar na sombra, o que provoca um incômodo contraste com sua luminosidade. Nos espaços

iluminados por um lado, o resplendor que rodeia os rostos das pessoas impede um entendimento

entre essas”.

Para acentuar a validade dessa sua proposta, faz uma contundente crítica aos modernos,

em especial a Le Corbusier: “o melhor exemplo do completo menosprezo deste padrão são as

moradias da unidade de habitação de Marselha de Le Corbusier. Cada unidade é muito comprida e

relativamente estreita e obtém luz por um dos extremos, pelo ponto mais estreito. Assim ashabitações são muito luminosas perto das janelas e muito escuras no resto. Como resultado disso, o

resplendor criado por esse contraste de luz e sombra em torno das janelas é muito perturbador”.

“Em um edifício pequeno é fácil que cada espaço fique iluminado por dois lados. Basta

colocar um espaço em cada uma das quatro esquinas da casa”.

“Em um edifício muito grande pode ser necessário incorporar algum tipo de ampliação

sistemática da planta ou distorcer ainda mais o contorno para que cada espaço tenha luz por dois

lados” (p.660).

Feitas as considerações sobre a melhor disposições das janelas, parte para o

detalhamento das mesmas: “as janelas de borda aguda, de encontro entre o marco e o muro criam

um resplendor ofuscante e violento e fazem os espaços incômodos”.

“Tem o mesmo efeito que os faróis acesos de um carro que se aproxima: o resplendor

nos impede de ver qualquer outra coisa que esteja na estrada porque o olho não pode se adaptar

simultaneamente ao brilho dos faróis e a escuridão da calçada. Pela mesma razão, uma janela

sempre é muito mais brilhante que a parede interior, e esta tende a alcançar sua escuridão máxima

 justamente na borda da janela. A diferença de luminosidade entre a janela brilhante e a parede

escura do alredor é a causa do resplendor”.

“Para resolver este problema, a borda da janela deve ser chanfrada, criando umamoldura ou ângulo entre a parede e a janela. A moldura cria então uma área de transição – uma

zona de luminosidade intermediária – entre o brilho da janela e a escuridão da parede. Se este

ângulo é bem selecionado e é fundo o bastante o resplendor desaparece por completo....nossas

experiências demostram que esse ótimo (ângulo) quase se alcança quando a moldura forma um

ângulo de 50-60 graus com o plano da janela, naturalmente esse ângulo variará segundo as

circunstâncias de cada lugar. Para satisfazer a necessidade de uma moldura grande, sua largura

deverá ser de pelo menos 25 a 30 cm”.

“Portanto o marco da janela será uma borda grossa, funda e chanfrada, de uns 30 com de

largura e formando um ângulo entre 50 e 60 graus com o plano da janela, de modo que o gradientede luz estabeleça uma transição suave entre a luminosidade da janela e a escuridão da parede

interior” (p.913).

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E essas janelas devem se abrir: “atualmente muitos edifícios carecem totalmente de

 janelas práticas; e grande parte das práticas que se constróem não cumprem a tarefa própria dessas

 janelas”.

Encaixa aqui mais uma crítica ao modernismo: “está-se tornando regra do desenho

moderno selar as janelas e criar climas interiores ‘perfeitos’ com sistemas mecânicos de arcondicionado. Isso é alucinante”.

“A janela é a nossa conexão com o exterior. É uma fonte de ar fresco; um método

simples para trocar a temperatura com rapidez quando a habitação está demasiado quente ou

demasiado fria; um lugar onde se pode olhar e cheirar o ar, as árvores, as flores e uma abertura

através da qual as pessoas podem falar umas com as outras” (p.957).

E termina seu detalhamento de janelas sugerindo subdivisões pequenas: “quando as

 janelas com fechamento de vidro se tornaram possíveis, pensou-se que se poderia estar em contacto

mais direto com natureza. Na realidade, seu efeito foi o contrário”.

“As vistas nos afastam. Quanto menores são as janelas e menores suas subdivisões,maior é a intensidade da união com o exterior através dessas janelas”.

“Isso é um paradoxo importante. A janela de vidro contínuo dá-nos a impressão que nos

poderia aproximar mais da natureza, simplesmente porque se parece mais com um buraco puro,

envolvido pelo mesmo ar. Mas, na realidade, nosso contato com a vista exterior, com as coisas que

vemos através das janelas, depende de como estas a enquadram. Quando consideramos a janela

como um olho através do qual vemos algo, compreendemos o que nos incrementa a visão, sua

intensidade sua variedade e até o número de vistas que podemos ver, e os graus que essa janela

emoldura a vista, e por essa razão as janelas são decompostas em subjanelas, cheias de pequenas

subdivisões que nos colocam em um contato mais intimo com outro lado. E ao se criar mais

molduras, cria-se mais vistas... as janelas pequenas e estreitas possibilitam vistas diferentes

enquanto que as grandes e horizontais apresentam sempre uma vista uniforme” (p.965).

Reforça seu raciocínio com mais uma crítica aos modernos: “outro argumento em favor

disso: a arquitetura e a edificação modernas esforçaram-se deliberadamente para que as janelas

parecessem cada vez menos janelas, criando a sensação que entre um e o exterior não há nada. Mais

isso contradiz totalmente a natureza da janela, cuja função é oferecer uma vista e proporcionar uma

relação com o exterior. Mas isso não significa que, ao mesmo tempo, não tenham uma função

igualmente importante: a de criar uma sensação de proteção do exterior, assim como fazem asparedes e a cobertura. É desagradável sentir que não há nada entre o interior e o exterior, quando na

realidade se está dentro do edifício. Pertence à natureza própria da janela criar uma relação entre

nós e o exterior, mas criando ao mesmo tempo uma relação de recinto”.

“E não é só isso, As grandes superfícies de vidro são inclusive perigosas. As pessoas

caminham diretamente para elas, de encontro a elas, pois não se distinguem do ar, Ao contrário, as

 janelas com pequenas subdivisões emitem uma clara mensagem funcional: as molduras nos dizem

com clareza que ali há algo que nos separa do exterior. E contribuem para criar a luz filtrada”, e por

que luz filtrada?: “a luz filtrada através das folhas da árvores ou de uma veneziana é maravilhosa.

Mas por quê?”“Sabemos que a luz que se filtra através de uma árvore frondosa é muito agradável,

estimula a alegria, o júbilo e o interesse; e sabemos também que se a iluminação é uniforme, criam-

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se espaços monótonos e carentes de atrativos”, e segue uma série de argumentos já mencionados no

capítulo “Algumas conclusões”.

“Para criar a luz filtrada, cubra parcialmente aquelas janelas sobre as quais incide

diretamente o sol com trepadeiras ou venezianas. As folhas naturais são especialmente indicadas

porque se movem. A borda da janela pode ter uma moldura, isto é, a própria borda de vidro e não omarco, de maneira que a luz que entre se intensifique gradualmente desde a borda até o centro da

 janela, a moldura tem uma eficácia máxima no topo da janela, onde a luz é mais intensa. Muitas

 janelas antigas combinam essas idéias” (p.962).

Voltando as subdivisões, “portanto divida cada janela em pequenos pedaços, cujo

tamanho pode ser realmente pequeno, sem nunca superar os 10 cm². Para determinar seu tamanho

exato, divida a largura e a altura da janela pelo número de subdivisões. Assim, cada janela terá

subdivisões de tamanhos diferentes, de acordo com suas dimensões totais” (p.966).

Assim, como resposta às persianas automatizadas que abaixam de uma vez só em todos

os quatorze pavimentos e as lâmpadas fluorescentes que acendem imediatamente, programadas porcomputador em um edifício que é mais inteligente que o homem, como descrito na introdução deste

capítulo, colocam-se os textos de Moore e Rasmussen, propondo janelas tradicionais para pessoas

que queiram um pouco de sol em seu escritório ou em qualquer outro espaço. “Um sol verdadeiro,

experimentado, à moda antiga, o mesmo que se aliara a Apolo, Aknathon e Alexandre, o Grande”,

um sol que iluminou as pirâmides do Egito, templos gregos, o Panteão romano, igrejas românicas,

góticas, renascentistas e barrocas, um sol que recriou, revelou e transformou as obras de Wright,

Gropius, Corbusier e Kahn, um sol que mostra as indefinições arquitetônicas atuais e que iluminará

a arquitetura do futuro, seja ela qual for.

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BIBLIOGRAFIA

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7/24/2019 Texto Visões de Luz - Ladislão Pedro Szabo

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